ANNE HAMPSON - BRINCADEIRA DO DESTINO - JULIA 203

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BRINCADEIRA DO DESTINO Anne Hampson

JULIA 203

Título Original: Bride for a Night Publicado originalmente em 1979 pela Mills & Boon Ltd., Londres, Inglaterra

Quando o avião aterrissou em Londres, Melissa pensou que estava livre: tinha conseguido escapai de Darius, o grego arrogante com quem se casara no dia anterior, obrigada pelo pai. Na Grécia era comum o casamento por conveniência. Mas, para Melissa, filha de uma inglesa, esse costume era absurdo. Queria se apaixonar, conhecer o verdadeiro amor. Por isso resolveu fugir, depois da desastrosa noite de núpcias… Agora, saindo do avião, achava que nunca mais veria Darius. Mal sabia ela que o destino lhe armaria uma cilada fazendo com que, oito anos depois, reencontrasse o marido transformado num homem muito diferente: bonito, sensual, capaz de provocar paixões irresistíveis!to Revisoras

Este livro faz parte de um projeto sem fins lucrativos. Sua distribuição é livre e sua comercialização estritamente proibida. Cultura: um bem universal.

Digitalização: Palas Atenéia Revisão: Cynthia M. CAPÍTULO 1

Pai e filha se encararam, os olhos brilhando de raiva. — Não vou me submeter a este casamento arranjado! — Melissa

quase gritava, furiosa. — Não sou grega! Minha mãe é inglesa e prefiro fugir e encontrá-la a me casar com um homem que nem conheço! — Seu inglês era perfeito, ainda que aqui e ali usasse uma ou outra palavra grega, por causa do calor do momento. — Sua mãe! — Marcos Palides exclamou com desprezo. — Ela a

abandonou quando você ainda era um bebê. O que a faz pensar que vai querer você agora? Melissa teve de silenciar, pois não sabia como responder. Depois de apenas quinze meses de casamento, sua mãe havia decidido que não se importava com o marido e não queria mais viver na ilha de Chipre. Ela partiu de surpresa, quando Marcos estava no escritório, sem uma palavra de aviso ou um gesto de remorso. Melissa ficou com sua tia Sofia, que trabalhava com Marcos. Nunca teve notícias da mãe. Sabia apenas que estava casada novamente. Melissa meneou a cabeça. Ela sabia que, em Chipre, as filhas nunca pensavam em desobedecer aos pais, mesmo quando estes resolviam a respeito de seus casamentos, sem ao menos consultálas. Mas ela tentava argumentar: — Pai, não quero me casar ainda. Tenho só dezessete anos e… — Tem idade suficiente para casar! — ele interrompeu. — Você

fará como estou dizendo, Melissa! Não foi fácil conseguir que este

homem a pedisse em casamento. Darius é rico e será muito mais quando o pai morrer. E o velho está com os dias contados, sabe disso. É por isso que Darius anda tão ansioso para casar: seu pai quer ver outra geração garantida, quer um herdeiro para a fortuna dos Valaris… — Não! — Melissa protestou, furiosa. — Não quero ser tratada

como uma garota grega, que casa só para produzir filhos! — Ela virou-se, incapaz de fitar o pai. Sentia o coração amargurado, queria conhecer um pouco a vida antes de casar. E, de qualquer maneira, gostaria de escolher o próprio marido, um homem que amasse. Como lastimava estar sob o completo domínio do pai. Oh, por que sua mãe a tinha abandonado? — Existem dezenas de garotas que dariam tudo para trocar de

lugar com você! — Marcos continuou. — É muito difícil achar um marido rico hoje em dia e, além do mais, Darius não faz questão que você tenha um dote, o que já é outro ponto a favor dele! — Ele é muito velho para mim! — ela explodiu, sentindo que o

desespero fazia seu estômago doer. Em sua cabeça apareciam idéias de fugir, desaparecer para bem longe, mas eram idéias vagas e confusas. — Darius tem vinte e quatro anos, sete a mais que você, portanto

deixe de dizer tolices! — Marcos falava com voz inflexível e determinada. Era um homem sem sentimentos, que nunca amou a esposa que lhe deu uma filha em vez do filho herdeiro que ele tanto queria. E, além de cometer esse “crime”, ela ainda teve a coragem de abandoná-lo, deixando em suas mãos uma criança de quatro meses. Margaret mesma chegou a dizer que nunca devia ter casado com um estrangeiro, mas se deixou levar pelo clima romântico daquelas férias na ilha de Chipre. Conheceu Marcos num baile no hotel da cidade e um mês depois já estavam casados. Muitas vezes Melissa pensava na mãe, tentando imaginar como ela seria, seu caráter, sua aparência. Como gostaria de encontrá-la! Oh, se pelo menos pudesse ir para a Inglaterra procurá-la… — No que está pensando, Melissa? — o pai perguntou, a mesma

voz dura e ríspida. Ainda era um homem atraente e não era difícil compreender por que sua mãe tinha sido vítima dele. — Não… não é nada. , . pai, não posso me casar com um homem que nem conheço. Por favor, não me obrigue a… — Já dei minha palavra a Darius.

— Mas eu sei que vou acabar odiando esse homem! Já o odeio

por ter me pedido em casamento sem ao menos me conhecer, obedecendo a esse absurdo costume grego! — Ele a viu e gostou de você! — A voz de Marcos agora era calma

e os olhos frios como aço. — Vocês se encontrarão amanhã à noite, na festa de noivado, e daqui a uma semana já estarão casados. — Ê o costume, sempre soube disso. É melhor parar com essa

desobediência, Melissa! — Eu vou dizer a Darius que estou sendo obrigada a fazer isso!

Talvez ele seja suficientemente cavalheiro para se recusar a casar comigo nestas circunstâncias! — Você não vai dizer nada! Lembre-se que tratamos as filhas

desobedientes com o chicote! — Ninguém pode me castigar por… — Melissa não terminou o que ia dizer. Lembrou-se de uma garota que havia sido punida terrivelmente por se encontrar com um homem, em segredo. Ela jurou ao pai que nada tinha acontecido entre eles, mas mesmo assim o castigo desabou sobre sua cabeça. — Já é o bastante! — Marcos avisou, secamente. Melissa fez um

gesto de impotência, admitindo a derrota. As lágrimas deslizavam por sua face é tinha consciência de que não podia fazer nada por si mesma. Se ao menos tivesse algum dinheiro… Virou-se quando ouviu passos. .Era sua tia, que entrou na sala e, vendo aquela cena, perguntou ao irmão o que acontecia. — Melissa está se rebelando contra minha autoridade, não quer

se casar com Darius Valaris. — Ele fez um gesto de impaciência. — Não consegue perceber a sorte que tem! — Que tolice! — a irmã de Marcos replicou. — Darius será um milionário daqui a algum tempo. — Não me importo com o dinheiro dele, tia Sofia! — Melissa gritou. — Quero me casar por amor, como fazem as garotas inglesas!

Sofia aproximou-se dela, balançando a cabeça. Era mais suave que Marcos, mas também achava que Melissa devia agradecer aos céus por Darius tê-la pedido em casamento.

— Será que não percebe que foi sua beleza que o atraiu? Devia

se sentir lisonjeada. — Não estou lisonjeada! Eu o odeio por ter me pedido em

casamento desta forma! — Como é que pode odiá-lo se ainda nem o conhece? Melissa

nada disse, pois sabia que era inútil. Tinha que obedecer o pai, não havia escapatória. Sua tia a fitava, pensativa. — Talvez… — disse Sofia — … eu não devesse ter persuadido seu

pai a deixá-la freqüentar a escola inglesa em Nicósia. — Mas eu sou grata por isso, tia Sofia. Sempre serei! — Ela aprendeu demais sobre a Inglaterra! —— Marcos falou,

irado. — Não sei por que fui dar ouvidos a você, Sofia! Melissa desviou o olhar do pai. Era sincera quando dizia que agradecia à tia por tê-la feito estudar na escola inglesa. Lá, tinha aprendido a língua de sua mãe e conhecido outras garotas, filhas de oficiais ingleses, que lhe falavam da liberdade que existia na Inglaterra e de como as mulheres se casavam com homens pelos quais estavam apaixonadas. Desejava conhecer aquele país e compará-lo com a ilha de Chipre, que ela tanto amava, apesar dos costumes tradicionais e repressivos. Melissa era feliz e foi somente depois que seu pai anunciou que já estava chegando a hora de ela se casar, há alguns meses, que começou a sentir-se perdida, vendo escapar a chance de conhecer mais sobre o mundo. — Você será feliz quando as crianças começarem a chegar! — Sofia falava com suavidade, mas Melissa sentiu um estremecimento ao pensar em ter filhos com um homem que não amava. — Oh, eu preferia estar morta… Por favor, tia Sofia, me ajude… — Vá para seu quarto! — Marcos indicou-lhe a porta com um gesto ríspido. — Já disse besteiras demais por hoje! Você vai se casar com o homem que escolhi, como acontece com todas as garotas gregas. E está acabado!

Melissa estava de branco, um lindo vestido de cetim cheio de laços. Seu rosto se mostrava pálido e sem expressão, como o de uma estátua, e ela não se dignava a fitar o homem que, de pé a seu lado, tornava-se seu marido; um grego de cabelos castanhos e olhos que pareciam penetrar na alma dela; o homem que a tinha pedido em

casamento para seu pai, obedecendo ao velho costume grego, indiferente a seus sentimentos. O pai dele estava doente, prestes a morrer, e Darius queria lhe dar o herdeiro que tanto desejava. E era Melissa quem devia trazer essa felicidade, produzindo o filho tão esperado. Parecia incrível que Darius não percebesse a miséria e a infelicidade dela, quando estavam lado a lado no altar, ouvindo o padre que celebrava o casamento. Nunca uma noiva tinha se sentido tão desolada, ela pensou. Era um casamento muito elegante, como convinha a um noivo como Darius. A festa seria no Hotel Hilton, com convidados ricos e influentes, como a família do noivo. Dormiriam no hotel aquela noite e em seguida partiriam para Atenas em lua-de-mel. Darius já tinha providenciado tudo, inclusive o passaporte de Melissa. Quando retornassem, iriam viver na linda mansão com vista para o mar, em cima de um penhasco na ilha de Chipre. Pálida e em silêncio, Melissa sentou ao lado daquele estranho, que agora era seu marido, na grande mesa do banquete. Respondia a Darius com monossílabos e notava que ele já começava a ficar irritado com suas maneiras. Mas ela queria mesmo que ele se sentisse infeliz e se arrependesse de tê-la pedido em casamento daquela maneira. Mais tarde, posaram para os convidados que queriam fotografar os noivos, mas Melissa não sorria. Estava linda naquela roupa, sua beleza era suave, mas não radiante, como sempre sonhou estar no dia de seu casamento. O banquete finalmente terminou e os convidados começaram a partir. Alguns deles se aproximaram de Melissa e prenderam notas de dinheiro em seu vestido. Aquele era um antigo costume grego, que estava desaparecendo nos casamentos mais elegantes, mas ainda vigorava. Melissa olhou para baixo… Uma das notas era nada mais, nada menos, de cem libras… E havia outras… Muitas outras… Dinheiro! O coração dela começou a bater acelerado quando a idéia lhe ocorreu. Dinheiro… dinheiro suficiente para levá-la até a Inglaterra! Darius se aproximou e, com um gesto, impediu que outros convidados colocassem mais cédulas no vestido de Melissa. Mais do que nunca ela o odiou, porém já havia o suficiente para a viagem! Ela estava no meio do quarto, ainda usando o vestido de noiva, e olhou ao redor. Era um hotel muito fino e elegante, como convinha a alguém como Darius. Ele não tardou a entrar também, fechando a

porta atrás de si. Melissa fitou-o com atenção pela primeira vez, e só então reconheceu que era um homem atraente. Alto, forte, a pele bronzeada ressaltando o branco imaculado da gravata de seda… Ele parecia mais velho do que seus vinte e quatro anos, mas seu rosto ostentava um sorriso quase de garoto. Melissa afastou-se e percebeu que aquilo irritava Darius profundamente. Os homens gregos não estavam acostumados a essa indiferença por parte das mulheres. — Olhe para mim! — ele pediu com voz suave mas imperativa.

Melissa virou-se e fitou aquele homem forte e impressionante, que parecia um pouco assustador. Darius tomou-lhe as mãos e puxou-a para junto de si, envolvendo-a em seus braços. Ela retraiu-se imediatamente, por instinto. Sua voz tinha um tom de desespero, quando falou: — Oh, não faça isso, por favor… Eu… eu ainda não tive chance de

conhecê-lo. Por favor, deixe-me sozinha esta noite. — Está me pedindo para deixá-la sozinha na noite do nosso

casamento? Será que não percebe como isso é absurdo, Melissa? — Eu não o conheço! Fui obrigada a me casar! Será que não tem

compaixão de mim, compreensão para com os meus sentimentos? — Seus olhos retinham lágrimas que queriam saltar e sua voz tinha um tom de súplica. — Eu lhe imploro, Darius, me dê somente algum tempo para que possa conhecê-lo melhor. Prometo que tentarei demorar o mínimo possível e… — Melissa calou-se ao pensar que aquelas palavras eram inúteis. Darius era como seu pai, como todos os homens gregos: duro e inflexível, incapaz de compreender os sentimentos de uma mulher. Subitamente, lembrou do dinheiro que havia escondido na manga do vestido. Podia sentir as notas contra sua pele. Tinha que ser cuidadosa e não deixar que Darius o encontrasse, pois ele certamente o tomaria dela. Uma luz apareceu nos olhos de Darius. Era certo que ele conhecia os sentimentos de Melissa, que ela fez questão de não esconder durante a cerimônia de casamento. Contudo, nunca imaginou que a garota fosse oferecer alguma resistência. Devia abaixar a cabeça e se dar a ele sem protestos, pronta a entregar-lhe a virgindade. Era assim com as mulheres gregas, era isso que lhes ensinavam desde o nascimento, a submissão completa ao pai e, depois, ao marido! Mas não era assim com Melissa. Ela estava ali, imóvel, parada defronte a Darius e seus olhos tinham um brilho que só podia ser descrito como ódio!

Darius havia nascido em Chipre e sempre viveu lá, nunca conheceu outros lugares. Considerava os do próprio sexo como deuses supremos, aos quais as mulheres, meras mortais, tinham que se subjugar. Devia ser algo muito inesperado para. ele ter Melissa à sua frente, naquela atitude desafiadora. A expressão dele não deixava dúvida de que estava decidido a mostrar de uma vez por todas quem é que mandava ali! Ele estava furioso! — Venha aqui! — ordenou, apontando para o chão a seus pés.

Melissa meneou a cabeça, o coração parecia querer estourar dentro do peito. — Eu… eu não quero… — Ela não pôde dizer mais nada, pois

Darius agarrou-lhe o pulso e lhe deu um violento puxão. Seus lábios se fecharam sobre a boca de Melissa, rosada e sensível, beijando-a com fúria e domínio. Mas ela continuava impassível, o que o enfurecia ainda mais. Certamente nenhuma mulher conseguira resistir ao ardor daquele homem tão atraente, e a atitude de Melissa o deixava louco. Quando seus lábios foram libertos, por um rápido instante, ela ainda suplicou que a deixasse sozinha, mas nenhum vestígio de compreensão surgiu nos olhos de Darius. — Tire a roupa! — ele mandou, fitando o corpo dela. — Ou será

que deseja que eu mesmo faça isso? Ela permaneceu impassível, o medo não a permitia articular nem uma palavra. Seu coração ainda batia loucamente, mas, em contraste, era como se o resto do corpo estivesse morto e insensível. Darius se aproximou e a virou de costas com um gesto violento. Abriu o zíper do lindo vestido de noiva, que caiu aos pés dela. Melissa prendeu a respiração. Era horrível ter o corpo assim exposto àquele homem brutal que agora lhe ordenava que desse um passo adiante, para sair do vestido caído no chão. Ela teve que obedecer e Darius jogou o vestido sobre uma cadeira. Como que hipnotizada, ela observou a manga que jazia pendurada… Felizmente, o dinheiro estava bem escondido. Darius a fitava sedento de desejo, os olhos passeavam sobre cada centímetro daquele lindo corpo. Tomou-a nos braços, num gesto brusco, e novamente a beijou, com fúria. Melissa gostaria de gritar para que a socorressem, mas era impossível. Mal conseguia respirar, vítima daqueles beijos brutais. Seus corpos estavam colados, Darius acariciava os seios dela e Melissa sentia a virilidade daquele homem contra o próprio corpo. Sua garganta estava seca. Sabia que não haveria saída esta noite… mas amanhã ganharia a liberdade! Possuía dinheiro e passaporte e estava decidida a fugir.

— Você é linda! — Darius murmurava enquanto beijava seus

seios. — Por Deus, como a desejo! Sabia que a queria desde o primeiro momento em que a vi! Tinha certeza que era a esposa exata para mim! — Desejo! — Melissa gritou, tentando se afastar daquele contato

que a repugnava. — É só o que quer: um objeto para satisfazer seus desejos! — E para que serve o casamento, então? — Ele parecia surpreso. — Acontece que existe algo chamado amor! Amor entre um

homem e uma mulher! — Amor? — Darius começava a se divertir com tudo aquilo. — As

mulheres costumam falar dessa tolice… O que é o amor senão sexo? Melissa sentiu que corava. Aquela era uma palavra proibida, que jamais poderia.ter sido pronunciada na frente de seu pai, por exemplo. Era a primeira vez que ouvia um homem dizendo aquilo. — O amor… — ela disse, meio temerosa — … tem a ver com

outras coisas. — Com o quê, por exemplo? — Com o espiritual e o afetivo. Duas pessoas podem até mesmo se amar sem que exista sexo entre elas! — Ora, que tolice! Essa história de amor espiritual só tem a ver

com Deus e com a Igreja. — Não é verdade! Pode existir amor espiritual entre um homem e

uma mulher e é isso que desejo quando me casar… Isto é… — Não pense em seguir o exemplo de sua mãe — Darius

ameaçou. — Você é minha agora, nunca se esqueça disso, pois se fizer alguma bobagem vai acabar desejando nunca ter nascido! Melissa sabia que ele falava sério e viu com terror que Darius se aproximava novamente. Ele a envolveu em mais um abraço selvagem, enquanto seus lábios brutais feriam-lhe a boca. Sentiu que era erguida do chão e, em seguida, depositada sobre a cama. Escondeu a cabeça no travesseiro, pois sabia que não adiantava lutar contra o inevitável. No fundo de sua alma, porém, uma idéia ganhava força: a certeza de que fugiria para a Inglaterra, de que conseguiria o divórcio, como sua mãe fizera, e, algum dia, encontraria um homem inglês, que soubesse amá-la como mulher e como pessoa.

Darius deixou-a e foi ao banheiro, retornando pouco depois. Usava agora um roupão escuro, e seu corpo cheirava a colônia; um aroma agradável, que chamou a atenção de Melissa. Ele. se deitou ao lado dela e começou a fazer-lhe carícias sensuais. Por menos que o desejasse, Melissa não conseguia evitar que seu corpo ficasse excitado com aqueles toques que nunca havia experimentado antes. Percebendo essa reação, Darius adquiriu um ar triunfante e seus carinhos se tornaram mais e mais suaves. E foi com uma espécie de selvagem gentileza que ele a possuiu, incendiando cada nervo do corpo de Melissa. Pouco depois, ela repousava entre os braços de Darius, seu corpo agora calmo e relaxado. Não tardou muito para que seus olhos se fechassem e ela mergulhasse num sono profundo e sem sonhos. O sol brilhava forte quando Melissa entreabriu a cortina da suíte do hotel. Seu marido ainda dormia. Lá fora, o dia estava maravilhoso… Ela se moveu silenciosamente e retirou o dinheiro escondido no vestido. Deu um suspiro de espanto ao contar quinhentas libras! Havia duas notas de cem e as demais eram de cinqüenta libras. Nos casamentos da aldeia, o máximo que um convidado dava para a noiva era cinco libras. Contudo, numa cerimônia tão elegante como a dela, o menos que se podia dar era cinqüenta libras! Possuir aquele dinheiro lhe dava uma nova autoconfiança. Sim, encontraria a mãe, não tinha idéia de como conseguiria isso, mas estava certa de que não ia falhar. Felizmente, seu pai havia deixado escapar um dia, por acaso, o sobrenome dela: Mountchesney. Melissa não sabia que era um nome muito raro até mencioná-lo para as amigas na escola, que lhe disseram que jamais o tinham ouvido antes. Sim, iria para a Inglaterra e pelo menos encontraria alguém da família de sua mãe e assim poderia chegar até ela. Tinha ouvido falar de um programa de rádio inglês, chamado “Onde está você, agora?”, por meio do qual muitas pessoas encontravam parentes desaparecidos. Seus planos ainda eram vagos, mas sabia que poderia pensar com mais clareza quando tivesse escapado do marido e chegado à Inglaterra. Isto era o mais importante agora. Aquelas pessoas que colocaram o dinheiro no seu vestido jamais poderiam imaginar para que ele seria usado! Nesse momento, Darius abriu os braços e se espreguiçou. Fitoua com um sorriso ao qual Melissa correspondeu, timidamente. Não poderia deixar que suspeitasse de nada, pois a manteria ali como sua prisioneira. — Você dormiu bem? —, ele quis saber.

— Sim, obrigada. — Venha aqui.

Melissa permaneceu imóvel, odiando a idéia de ter que adiar a fuga. Pensava em desaparecer enquanto Darius ainda estivesse no banheiro, antes mesmo do café da manhã. — Eu… eu gostaria de tomar um banho… — ela começou a dizer,

mas Darius fez um gesto impaciente. — Disse para vir aqui! Você terá que aprender a me obedecer de

uma vez por todas! Prudentemente, ela fez como Darius ordenava. Desde o berço estava acostumada a aceitar a autoridade do pai. Era assim que as mulheres se comportavam com os homens, em Chipre, quer eles fossem pais, irmãos ou maridos. Contudo, na Inglaterra era diferente. Lá, a esposa participava dos planos do marido. Havia uma espécie de camaradagem no casamento, com a qual as gregas nem sonhavam. Quando Melissa se aproximou, Darius fez com que se deitasse na cama. Imediatamente, atirou-se sobre ela e começou a amá-la. Melissa tentou afastá-lo, por instinto, e isso o irritou profundamente. Suas maneiras estavam longe de ser gentis, como na noite anterior… ele agora tomava o que era seu, subjugando-a completamente para satisfazer o próprio desejo, fazendo Melissa sentir-se como uma escrava, uma vassala obediente. Pareceu uma eternidade antes que a deixasse livre. Ela foi para o banheiro, sentindo-se tonta e perturbada. Mas logo estava melhor, depois de ter se banhado e tirado do corpo o cheiro de Darius. O dinheiro e o passaporte já estavam em sua bolsa. Melissa pegou algumas peças de roupa, colocou numa maleta, e antes que seu marido terminasse de tomar banho, já havia partido. O corredor do hotel estava silencioso e o elevador a conduziu para o saguão em questão de minutos. Ela passou despercebida entre os hóspedes e os empregados do hotel e tomou um dos táxis estacionados frente ao elegante edifício. — Vamos para Limassol! — ela disse, prendendo a respiração. —

Estou com muita pressa, pois tenho de pegar um barco que partirá em poucos minutos! — Pois não, senhorita.

Ao chegar ao porto, pagou o motorista e esperou que se afastasse. Imediatamente, tomou outro táxi, desta vez para o aeroporto, pensando que talvez tivesse de ficar escondida até conseguir um vôo para Londres. Assim que chegou, soube que um avião partiria para Atenas dentro de uma hora e que de lá ela poderia fazer conexão com Londres. Seu coração estava cheio de medo enquanto esperava pela partida do avião, mas Melissa sabia que tinha encoberto todas as pistas, e mesmo que Darius encontrasse o táxi que fazia ponto frente ao hotel, o motorista diria que ela estava em Limassol. Era até possível que nem existisse barco naquele dia, mas Darius certamente iria até lá atrás dela. Ela agora estava no avião, e quando decolaram pôde finalmente respirar aliviada. Sim, estava livre! O que será que seu pai iria dizer? A culpa era dele mesmo, por tê-la obrigado a casar com um estranho. Tia Sofia ficaria envergonhada, mas talvez acabasse por entender a sobrinha. Ela foi sempre mais tolerante que o irmão. E os amigos de Darius… Ele se sentiria terrivelmente humilhado quando soubessem que a esposa o tinha abandonado no dia seguinte ao casamento… Mas, por que se preocuparia com um homem que havia feito tanto mal a ela? E sua mãe, como seria? Será que receberia bem a filha que abandonou quando ainda era um bebê? Bem, mesmo que não fosse aceita, permaneceria na Inglaterra, trabalhando como doméstica, que era a única coisa que poderia fazer de imediato. De qualquer maneira, era melhor do que continuar escrava de um homem que não amava, que havia casado com ela para satisfazer ao pai, à beira da morte. O avião não tardou a chegar em Atenas e, algumas horas depois, já aterrissava em Londres. Melissa estava feliz e excitada. Carregava o dinheiro cipriota na bolsa e não sabia que já poderia tê-lo trocado no próprio aeroporto. Farei isso no banco, amanhã de manhã, pensou, grata pelas informações que as amigas da escola inglesa lhe haviam dado. Uma enorme sensação de alívio invadia todo seu ser quando deixou o aeroporto. Livre! Pela primeira vez em sua vida, era livre e dona de si própria, de suas ações, de seu corpo. Um táxi levou-a para um pequeno hotel em Earl Court, recomendado pelo próprio motorista. Pela janela ela via o movimento e a agitação da cidade. Já tinham lhe dito como era Londres, mas havia muito mais gente do que imaginava. Entretanto, o hotel ficava num bairro tranqüilo, numa rua ensolarada e cheia de árvores.

Era um hotel que se ajustava a seu gosto e a seu bolso. Melissa tinha consciência de que podia levar algum tempo até descobrir onde estava sua mãe, e portanto era necessário economizar o máximo possível. Sabia que a mãe havia se casado novamente mas, por um comentário que tia Sofia deixou escapar um dia, adivinhou que seu marido falecera. Assim, a menos que tivesse se casado uma terceira vez, ela era viúva e seria provável que ficasse feliz em reencontrar a filha que não via há tanto tempo. O quarto era pequeno e imaculadamente limpo. Uma camareira gentil havia carregado a maleta, e agora esperava pela gorjeta. Melissa teve de se desculpar e prometeu que lhe daria o dinheiro no dia seguinte, depois que passasse no banco. Mais tarde, após o jantar, subiu para o quarto e deixou-se ficar na escuridão, olhando as luzes que brilhavam lá fora. Sentia-se solitária e desamparada. Foi com esforço que reteve as lágrimas que lutavam para sair. Tinha que manter a coragem, pensou. Algum dia poderia olhar para trás e rir de tudo aquilo… Uma noite de sono reconfortante foi suficiente para restaurar sua energia. Depois do café, viu o gerente do hotel na recepção e lhe disse que estava ansiosa para encontrar alguns parentes que tinham o sobrenome Mountchesney. Falou que sabia do programa de rádio e perguntou como poderia participar dele. — Você deve escrever uma carta — ele a instruiu —, dando todas

as informações que puder. Em seu caso, terá de mencionar o nome e dizer o que sabe sobre esses parentes, em que lugar da Inglaterra eles moram, etc… — Melissa escutava avidamente, meneando a cabeça. Estava quase dizendo que não sabia nada a respeito dos parentes. Aliás, nem podia garantir com certeza que sua mãe tivesse parentes… Porém, logo depois já estava no quarto, escrevendo a carta para a rádio B.B.C. A moça do correio sugeriu-lhe que publicasse um anúncio no jornal, quando soube o destino da carta. Ela fez isso sem mais demora: tomou um ônibus e logo chegou ao Times. Orientada pelo rapaz do balcão de classificados, colocou inicialmente um anúncio por três dias. Se não obtivesse resposta, colocaria outro. Caminhando agora pela rua, a fim de pegar a condução que a levaria de volta ao hotel, Melissa sentia-se ainda mais otimista do que quando acordou de manhã. Algo dentro dela dizia que não levaria muito tempo até que, finalmente, viesse a encontrar sua mãe. CAPÍTULO II

Ainda que Melissa tivesse a esperança de ser bem recebida na casa da mãe, nunca imaginou que a acolhida pudesse ser tão calorosa. O encontro acabou se realizando por meio do programa radiofônico. Melissa recebeu várias cartas, todas de parentes de sua mãe. Assim, veio a saber que possuía duas tias e um tio, e quatro primos e primas, filhos dele. Como se isso não bastasse, sua mãe estava noiva de um homem simpático e atraente, que se emocionou muito com o encontro das duas. Roger Waltham conheceu Margaret Blane, a mãe de Melissa, durante um cruzeiro pelos mares do Caribe. Ficaram noivos antes mesmo do fim da viagem. Ele vivia na América, metido em grandes negócios, e Margaret havia concordado em mudar para lá depois do casamento. Contudo, ela ainda continuava na Inglaterra, para onde Roger viajava a cada dois meses. Para Melissa parecia uma união meio estranha, mas sua mãe explicou que não estava ansiosa para se casar. Fora viúva muitos anos e se acostumou à própria liberdade. — Devemos nos casar em um ano ou dois — ela disse para

Melissa certa noite. — Roger pode então se aposentar e vender o negócio para amigos. Melissa estava confortavelmente deitada sobre o sofá da sala de estar. Vivia com a mãe há quinze dias, em sua casa em Cheshire, um dos bairros mais agradáveis de Londres. — Ainda não posso acreditar como foi fácil encontrá-la, mãe… A

palavra saía de sua boca com um grande prazer. Sim, agora ela também possuía sua própria mãe, que tinha ficado imensamente feliz em reencontrá-la. Melissa fitou Margaret e viu que era uma mulher muito bonita e segura, em seus trinta e oito anos. Seus traços eram firmes, decididos, e não lembravam muito os de Melissa, que puxara mais a seus ancestrais gregos. Tinham cabelos parecidos, negros e escorridos, que davam um ar juvenil para mãe e filha. Margaret ficara horrorizada por terem obrigado “aquela criança” a se casar! Ela assegurou-lhe que a união podia ser dissolvida legalmente, e era o que fariam! — Sei como se sente, querida — Margaret falava gentilmente. —

Fiquei atônita quando minha irmã telefonou dizendo que uma garota de Chipre procurava pela mãe. Tive certeza que era minha filha que estava aqui na Inglaterra. — Ela sorriu e meneou a cabeça. — Sempre pensei em você, querida, acredite. Contudo, a vida ao lado de seu pai teria sido insuportável. Os homens naquele país não

compreendem as mulheres, não sabem fazer amor. É tudo uma questão de vamos fazer um filho, e está resolvido. — Margaret se calou e riu um pouquinho. — Acho que estou embaraçando você, não é? Sinto muito, querida, mas teve uma noite de amor com um deles e acho que pode me compreender. — Eles são selvagens — Melissa falou, depois de concordar com a

cabeça. — É maravilhoso ter escapado de meu marido! Você tem certeza que ele não pode vir aqui e me obrigar a voltar? — Claro! — Margaret afirmou vigorosamente. — Você é livre

agora e vai permanecer desta maneira! Proteção! Era maravilhoso ter alguém com quem pudesse contar, alguém para lhe dar apoio e protegê-la contra Darius Valaris. Ele que casasse com uma mulher do povo dele, se desejasse ter filhos! — Quanto tempo terei de esperar até conseguir o divórcio? —

Melissa perguntou, pensativa, os olhos passeando pela janela, percorrendo as pequenas casas ensolaradas, tão antigas e delicadas, a rua cheia de árvores. Lembrou-se de Chipre, de como as paisagens eram diferentes, e sentiu-se uma estranha ali. Seu coração encheuse de dor e ela quase disse: Gostaria que tivesse me trazido com você, mamãe…, mas conteve-se a tempo. Sua relação com a mãe era a melhor possível, e ela não diria nada que pudesse magoá-la. Sabia que ainda não existia amor entre elas, mas afeição e muito carinho. Tinha certeza, porém, de que com o passar do tempo aprenderiam a se amar de fato. — Bem — Margaret começou a dizer —, aqui temos de esperar dois anos antes de iniciar o divórcio, mas como você se casou em Chipre, talvez as leis de lá sejam diferentes. Não se preocupe, querida, vou consultar alguém a respeito e estará livre tão logo quanto possível! — Ela sorriu para a filha e piscou o olho, divertida. — Nós vamos arranjar um ótimo rapaz inglês… Bem rico, naturalmente. 18

Não quer passar o resto da vida limpando a casa e cuidando das roupas, não é? Pelo menos quanto a isso, seu pai acertou: esse Darius é um milionário, não foi o que você disse? — Ainda não é, mas será daqui a pouco tempo. Seu pai possui

vastas plantações de laranja. — Compreendo por que Marcos estava tão ansioso por esse

casamento. Um marido rico para a filha é o sonho de todo pai de Chipre … Bem, daqui a algum tempo talvez ainda queira que você me conte a respeito dele, mas por agora, tudo que desejo é mostrar

minha linda filha para o resto da família! Amanhã vamos visitar minha irmã, a que ouviu o programa pela primeira vez e me telefonou. Eles viajaram nos feriados “e chegaram ontem. — Onde é que moram? — Em Chester. Você ainda não conhece… Oh, querida, ainda há

tantas coisas para fazermos! Roger partirá daqui a duas semanas e então teremos todo o tempo. Não será ótimo? Melissa concordou com a cabeça. Estava feliz, o que transparecia no brilho de seu sorriso. Ela não sabia, mas fora esse mesmo sorriso a primeira coisa que chamou a atenção do homem que se tornou seu marido… — Não vejo a hora de conhecer tia Lucie e sua filha… Marcelle,

não é? — Sim, o nome dela é Marcelle — Margaret respondeu, franzindo

um pouco a testa. —… Você gostará de tia Lucie, porém Marcelle é um tipo de garota muito intempestiva, agradável num dia e completamente hostil no outro. — Ela fitou a filha, com as pernas sobre o sofá. Seu corpo era frágil e gracioso. — Receio que ela tenha ciúme de você, querida. Marcelle sempre foi considerada a mais bonita da família. — Tenho certeza que ela não sentirá ciúme de mim. Não sou realmente bonita. — Isso é o que você pensa, minha filha. Você é uma mulher

linda. — Darius me disse isso — Melissa falou, surpresa consigo mesma.

Não sabia como havia trazido Darius para a conversa. — Tenho certeza que ele achava isso, caso contrário não a teria

pedido em casamento. Para um homem da posição dele, você precisava ser algo muito especial! — Ela fez uma pausa, os olhos brilhando com uma certa curiosidade. — Acho que gostaria de conhecê-lo. Tenho certeza que deve ter um caráter interessante. Vinte e quatro anos, você disse? Ele parece mais velho? Mas os homens gregos são de fato mais velhos! Foi o que descobri com seu pai… Talvez Darius ainda se torne um homem atraente com o passar dos anos. — Ele já é um homem atraente, mamãe. O que aconteceu é que eu não o amava. Eu o odiava por ter se casado comigo como se fosse

apenas mais uma garota de Chipre, onde os casamentos são arrumados pelas famílias! — Sim, ele devia ter tido mais bom-senso e tentado se aproximar

de você em vez de resolver tudo com seu pai. Se tivesse feito isso, talvez conquistasse o seu amor… — Nunca! Eu o odiei quando esteve comigo e… Ele foi brutal, violento e… — Melissa calou-se, reprimindo aquelas lembranças que a deixavam enjoada.

Sua mãe falou com voz suave: — Esqueça, querida. Isso tudo é passado e você tem um futuro

maravilhoso pela frente. O amor surgirá e você terá um casamento verdadeiro, diferente deste que tanta tristeza lhe causou. Melissa engoliu fundo. Seu casamento… O lindo vestido, trazido de Paris. A elegância da igreja, dos convidados… Como poderia ter sido maravilhoso! Ela decidiu que quando se casasse com um inglês, seu casamento seria simples e tranqüilo. Nunca mais usaria outro vestido branco de casamento. Na tarde do dia seguinte, as duas seguiram para Chester, no peque-”•'no carro esporte de Margaret. A casa de tia Lucie ficava numa alameda com árvores frondosas. Era toda de tijolos aparentes, com a cerca de madeira… tão diferente das casas de Chipre… No jardim, nada de samambaias e jacarandás, mas rosas e pequeninos pinheiros. Sim tudo era tão diferente. … Lucie era uma mulher efusiva, dez anos mais velha que Margaret, tempo que havia deixado suas marcas nas rugas do rosto e nos cabelos quase totalmente prateados. Contudo, era uma pessoa que conquistava à primeira vista pela gentileza e calor com que tratava os outros. Recebeu Melissa com enorme alegria, comentando como era linda e jovem. Disse-lhe que, apesar dos cabelos e olhos escuros, sua pele era tão clara, que não se podia tomá-la por outra coisa senão inglesa. Melissa sentia-se à vontade quando entraram na espaçosa sala de estar. Lá fora o dia estava quente, mas dentro da casa a temperatura era fresquinha. Ela sempre se perguntara se não sentiria frio na Inglaterra, e agora via que, pelo menos no verão, era quase como em Chipre. — Marcelle está trabalhando — tia Lucie explicou quando voltava

da cozinha, depois de colocar água no fogo, para o chá. — Trabalha

num escritório, mas voltará daqui a meia-hora. Eles não funcionam na quarta à tarde, pois trabalham no sábado de manhã. — Quantos anos ela tem? — Melissa perguntou com timidez. — Vinte… Bem, logo vai completar vinte e um. — Ela já esteve noiva — Margaret entrou na conversa — … mas

os dois resolveram romper. — Marcelle é uma pessoa difícil de contentar — tia Lucie disse

com um suspiro. — Prefere os homens altos e fantásticos, desses que dificilmente são encontrados na vida real. Certa vez esteve apaixonada por um italiano mas, depois de umas férias na Espanha, achou que gostava de um espanhol. Às vezes acho que nunca vai se casar. — Ela fitou Melissa e deu-lhe um grande sorriso. — Mas você não tardará a encontrar o homem certo, quando chegar a hora… Por enquanto, o melhor que pode fazer é aproveitar a vida. — É justamente o que ela fará! — Margaret replicou,

enfaticamente. Tinha decidido que ninguém precisava saber a respeito do casamento de Melissa. O divórcio correria calmamente e, após algum tempo, ela seria livre outra vez. Margaret explicou a presença da filha dizendo que seu pai queria obrigá-la a se casar, mas ela recusou e conseguiu obter seu consentimento para vir encontrar a mãe, na Inglaterra. Não era necessário que ninguém soubesse que fora obrigada a um casamento que não desejava! — Deve estar morrendo de vontade de conhecer as coisas por

aqui, não é? — Sim, estou — Melissa respondeu à tia. — Quero me casar

algum dia, mas antes desejo conhecer melhor o mundo e me divertir um pouco! Tia Lucie sorriu, mas em seus olhos havia um estranho brilho de compaixão. — Espero que todos os seus desejos se realizem, querida.

Compreendo sua vontade de vir para cá, mas este é um mundo muito diferente daquele a que está habituada. Estamos sempre com pressa, sempre correndo atrás de não se sabe o quê… Pelo que já li e sua mãe me contou, Chipre é um lugar muito diferente, com uma vida mais calma.. . Deve ser uma ilha muito bonita. .. — Sim, é maravilhosa — Melissa completou, lembrando com saudade do lugar em que nascera e que era tão belo. Contudo, não poderia ter permanecido lá, como a esposa do arrogante e dominador

Darius Valaris. Se pudesse escolher para marido um homem que amasse, então nunca teria partido daquela ilha encantadora. — Você voltará para visitar seu pai, eu suponho? — Oh, sim — Margaret respondeu antes que Melissa dissesse

qualquer coisa. — Você não está brigada com ele, não é? Melissa balançou a cabeça, aliviada por sua mãe ter respondido por ela. — Não… claro que não. — Acho que ele sentirá saudades suas, depois de viverem juntos

por tantos anos. — Sim… suponho que sim.

Depois disso, a conversa enveredou por vários assuntos. Lucie foi até a cozinha, de onde voltou trazendo o chá e anunciando que seria uma ótima idéia dar uma festa, para que Melissa conhecesse novas pessoas. Poderia ser no Grosvenor Hotel, de Chester, ela sugeriu. — Marcelle convidaria alguns amigos, assim como Joan e Mary.

David, seu outro primo, talvez aceite o convite… Você sabe como ele é! Agora anda completamente absorvido com o veleiro e está sempre no mar. Na semana que vem, acho que vai para Gales… Enquanto saboreava o chá, Melissa ouvia as duas mulheres combinando os preparativos da festa. Já conhecia Joan e Mary, filhas de Phyllis, a outra irmã de sua mãe. Porém, ainda não conhecera David, que era órfão e morava num apartamento junto com outro rapaz. Tia Phyllis era viúva e trabalhava numa grande loja de departamentos, em Chester. O único tio de Melissa era Fred, marido de Lucie. Margaret havia dito que era um homem alegre e jovial, mas Melissa não o encontrou. Ela estava gostando de todos até agora. Ainda faltavam Marcelle e David, e esperava gostar deles também. Foi decidido que a festa seria dali a duas semanas, no Grosvenor Hotel. A decisão acabava de ser tomada quando a porta se abriu e Marcelle entrou, vestida elegantemente com uma jaqueta e calças compridas. Os sapatos eram caros e combinavam com a bolsa. Melissa, que usava sandálias e um vestido de algodão estampado com flores, sentiu-se subitamente feia e deslocada. — Vi o carro de tia Margaret, então adivinhei que tinham

chegado! — Marcelle aproximava-se devagar e graciosamente, os

cabelos loiros caídos sobre os ombros, os olhos azuis se estreitando imperceptivelmente para fitar Melissa. Ela logo sorriu e estendeu a mão para a prima. — Então você é Melissa! É um prazer encontrá-la! Claro que sabíamos a seu respeito, mas era algo nebuloso, uma pessoa que talvez jamais viéssemos a conhecer. O que está achando da Inglaterra? — É maravilhosa. — A voz de Melissa saiu baixa e tímida. Ela se sentia desajeitada frente a Marcelle. Lucie e Margaret observavam a cena e por um momento seus olhares se encontraram. Lucie não tinha ilusões sobre a filha e já se perguntara como ela reagiria à chegada na família de uma garota tão bela e suave como Melissa. — Vamos dar uma festa para Melissa — Margaret anunciou,

quebrando o silêncio embaraçoso. — Pensamos que o Grosvenor Hotel seria um ótimo lugar! — Uma festa? — Marcelle jogou a bolsa sobre o sofá e começou a

desabotoar a jaqueta. — Parece ótimo. Quem virá? — Bem, pretendemos convidar o maior número de pessoas

possível — Lucie explicava. — Sua prima ainda não conhece ninguém por aqui, a não ser a família, e assim poderá entrar em contato com mais gente. Marcelle meneou a cabeça, seus olhos voltaram a fitar Melissa. — Você ainda não conhece David, não é? — Não, ainda não. — Será que era imaginação ou havia um tom estranho na voz da prima? — David é muito bonito, rico e descompromissado! — Margaret começou, divertida. —É um primo em segundo grau, ainda que sempre o tenhamos considerado como um parente direto.

-— Sim, é verdade. — Lucie concordou com a irmã. — De qualquer maneira, o que importa é que ele venha à festa. David tem muitos amigos jovens, que você adoraria conhecer, Melissa. — Acho que já está na hora de irmos andando — Margaret falou, depois de consultar o relógio. — Quero levar Melissa para jantar no Midland, em Manchester, e depois vamos ver o show do Palace.

Melissa a seguiu. Mais do que nunca sentia-se mal vestida, com aquele vestido de menina. Tia Sofia é quem o havia feito e ela possuía vários outros iguais àquele. — Até logo, tia Lucie! — Ela se despediu. — Até logo, querida! — Lucie sorriu. — Você parece

amedrontada… É por causa de Marcelle? Não se preocupe, ela causa um pouco de medo no começo, mas tenho certeza que serão boas amigas! Boas amigas… O que mais queria era se dar bem com todos os parentes, Melissa pensava, sentada no carro ao lado da mãe. Entretanto, não tinha certeza de que realmente pudesse vir a ser uma boa amiga da prima. Finalmente chegaram à casa de Margaret. O carro de Roger estava estacionado à porta. — E então, se divertiram? — ele perguntou, no jardim. — Sim, gostei multo de tia Lucie. — Ela conheceu Marcelle — Margaret acrescentou.

Roger se aproximou e colocou o braço sobre os ombros das duas, enquanto caminhavam em direção à casa. — E o que achou dela, Melissa? — quis saber. — Bem… não tive muito tempo para formar uma opinião. — Não disse o bastante. — Roger riu, divertido. — Marcelle é

difícil de compreender… Ela é muito presunçosa! Entraram pelo hall e foram para a sala. Melissa sentiu mais uma vez a sensação de aconchego que aquele lugar lhe transmitia. O chão todo acarpetado, as cortinas grossas, a mobília antiga… Na casa de seu pai não havia carpete nem muitos panos, as paredes eram azulejadas por causa do calor. — … É a única pessoa da família com a qual não simpatizo — Roger continuou, referindo-se a Marcelle. — David pode ser um pouco arredio e distante, mas é um ótimo sujeito. Marcelle, no entanto.. . — Ele fez uma pausa. — Margaret, acho que vou jantar com vocês hoje à noite!

— Vai mesmo? Você disse que tinha negócios para resolver! — Os

olhos de Margaret brilhavam de satisfação. — Sim, mas eles podem esperar. Quero ficar com vocês. — Oh, estou tão feliz que venha conosco, Roger — Melissa falou

com um grande sorriso. — Margaret — Roger começou a dizer, enquanto seus olhos

passeavam sobre Melissa até se fixaram em sua face. — Será que já lhe disse como tem sorte em ter reencontrado esta menina tão encantadora? — Sim, claro que disse. Mais de uma vez! Melissa corou,

embaraçada. — Acho que… que vou para o quarto — disse, pensando que os

dois talvez desejassem ficar sozinhos. De qualquer maneira, não se sentia muito bem, tinha um pouco de dor de cabeça e uma sensação meio enjoada no estômago. — Está bem, amor — era Margaret quem falava. — Descanse um

24 pouco, pois vamos voltar tarde esta noite… Você esta um pouco pálida! Está se sentindo bem? — Sim estou bem, só um pouco cansada — Melissa sorriu. -Papai

sempre dizia que eu ficava pálida quando me cansava.

CAPÍTULO III

Foi só uma semana mais tarde que Melissa se conscientizou de que algo havia acontecido. Estava tomando banho quando uma forte náusea apoderou-se dela, tonteando sua cabeça e enjoando seu estômago. Com tudo o que ocorrera nos últimos dias, nem lhe passou pela cabeça a idéia de que poderia estar grávida, mas agora… E não era o enjôo do estômago que a perturbava, e sim o grande desespero do coração. Acontecer isto justamente agora, que tinha um futuro maravilhoso à sua frente! Pior de tudo, ela não desejava a criança: quando quisesse ter um filho, seria com um pai inglês! Enrolou o corpo com a toalha e pensou em Margaret. O que ela diria? Era uma mulher jovial, ativa, que gostava de ir ao teatro,

jantar fora, sair… Certamente não gostaria de uma criança em casa, a exigir grandes cuidados! As lágrimas surgiram nos olhos de Melissa. Em seu coração crescia o ódio por Darius, desejava que estivesse morto! Ter feito isso com ela… e, no entanto, era justamente o que ele mais queria: uma criança para dar felicidade ao seu pai doente! Foi com grande esforço que se enxugou. Gostaria de correr para Margaret e chorar em seu peito, mas decidiu manter sua gravidez em segredo, pelo menos até quando já não fosse mais possível escondêla. Parecia incrível que ainda ontem estivesse tão feliz. Na noite anterior, David as visitara e ele e Melissa tinham simpatizado instantaneamente um com o outro. Ele parecia um pouco mais velho que seus vinte e cinco anos, e era a imagem exata do que Melissa considerava um inglês: loiro, cabelos lisos, olhos azuis. Seu corpo era forte e bem formado e Melissa sentiu-se envergonhada quando ele elogiou a aparência dela e o vestido que Margaret comprou numa loja elegante e lhe deu de presente. Antes de partir, já perto da meianoite, David prometeu que viria à festa e traria alguns amigos. — Você marcou um ponto! — Margaret disse, assim que ficaram a

sós. — Marcelle vai ficar furiosa! — Ela gosta de David? — Mais do que isso! Ele é a razão pela qual Marcelle ainda não encontrou nenhuma outra pessoa. Acredita que algum dia David vai afinal se interessar por ela. O estranho é que ele não é o tipo de homem de que Marcelle gosta: moreno, de cabelos escuros, latino… — Espero que Marcelle não pense que eu… — Melissa calou-se,

sem saber exatamente o que dizer. — Se ele gostar de você, querida, Marcelle terá de aceitar o fato,

não é mesmo? Será que David poderia se interessar por ela?, Melissa pensou. Não seria difícil gostar dele, aliás não seria difícil até mesmo se apaixonar por ele… Sua mãe já estava pronta para tomar o café da manhã quando Melissa desceu. Sorriu e se comportou como se não houvesse nada de estranho, enquanto ocupava seu lugar à mesa.

— Vamos para Manchester hoje, querida. — Margaret estava

animada. — Você precisa de algo especial para usar em sua festa! — Um vestido comprido, a senhora acha? — Exatamente. Gostaria que experimentasse algo verde… Você

não é supersticiosa, não é mesmo? — Não… mas tia Sofia é muito supersticiosa. — Ora, é uma mulher tola! Lembro-me dela, tão desajeitada que nunca conseguiu se casar, mesmo tendo um grande dote a oferecer, como é costume naquela ilha. — Ela sempre disse que não desejava casar. — Toda garota grega deseja casar! — Eu não quis… Papai foi cruel por me obrigar. — Melissa pensou em seu terrível segredo. Queria ter certeza de que não estava grávida! — Ele sempre foi muito dominador. Eu não conseguiria ter

continuado a seu lado… — Um ar de tristeza anuviou os olhos de Margaret. — Devia tê-la trazido comigo, mas na época tudo que queria era a liberdade da qual tinha desistido como uma tola! Fui levada pelo ar romântico da ilha, pela beleza de Marcos, pela idéia de me casar com um estrangeiro. Acho que daria dez anos da minha vida para poder voltar atrás… — Ela deu de ombros e passou uma torrada para Melissa. — Mas não se pode voltar atrás, não é… temos de reconhecer os próprios erros e assumi-los. Em seu caso, porém, é diferente, pois foi obrigada a casar com Darius. Graças a Deus que não teve um filho! Isso sim seria uma calamidade! — Margaret bebeu um gole de suco, sem notar que a mão de Melissa tremia um pouco ao passar a manteiga na torrada. Uma calamidade… Subitamente, Melissa sentiu-se compelida a saber como sua mãe reagiria à idéia de uma possível gravidez. — Você não teria me recebido de volta se eu tivesse um filho? —

ela perguntou, parecendo o mais natural possível. Margaret franziu um pouco a testa e ficou pensativa por alguns segundos, segurando na mão o copo com suco. — Bem, não seria muito agradável ter uma criança pequena em casa — ela afinal admitiu, com honestidade.

— Seria… seria um incômodo muito grande para você? — Sim, seria, Melissa. Quem é que deseja uma criança na minha

idade? Nem sei porque as mulheres mais jovens as desejam! Não precisam realmente de filhos e deviam tirar maior vantagem de tudo que os cientistas já descobriram para nós! Não, não quero crianças chorando e gritando a meu lado, mesmo sabendo que Roger adoraria a idéia! — Se ninguém mais tivesse filhos, então o mundo acabaria em

alguns anos. — Não, ele não acabaria. Voltaria para os animais, que podem

tomar conta do mundo muito melhor do que os homens. — Você tem idéias estranhas, mamãe. — Só precisa olhar em volta para ver como existem tantos

prédios onde outrora existiam colinas, fábricas onde antes haviam florestas… O homem está destruindo o mundo! Melissa comia a torrada e decidiu fazer o assunto retornar à questão da criança. — Acho que eu logo acabaria tendo filhos. — Se tivesse ficado, sim… Teria um filho a cada ano, como a maioria das mulheres gregas. — Hoje em dia as famílias têm apenas três ou quatro filhos. — Três ou quatro seria um inferno para mim! Como já disse,

mesmo um já seria um grande incômodo. No caminho para Manchester, Melissa pensava no que sua mãe havia dito. E se ela não a quisesse mais em casa? Teria que retornar para o marido. Não! Isso nunca aconteceria, não poderia se submeter à escravidão. Além do mais, como Darius a receberia? Nunca tinha pensado no marido desde que chegou à Inglaterra, preferindo mantêlo afastado de seus pensamentos. Contudo, agora era difícil… como deixar de lembrar daquele que era o pai de seu filho? . No fim das contas, o vestido terminou não sendo verde, mas branco. Como um vestido de casamento, Melissa pensou, surpresa consigo mesma ao ver retornarem as lembranças da igreja, da cerimônia, do banquete. E depois, daquela noite, quando seu marido a tinha tratado como se fosse uma escrava, usando-a para satisfazer seus desejos de forma egoísta.

— Você está linda! — Margaret acabava de entrar no quarto e

olhava para Melissa, cheia de orgulho e satisfação. — Oh, como sou feliz em tê-la aqui! Vamos nos divertir muito nos próximos dois anos e então me casarei com Roger e iremos para a América. Quem sabe você não se casará com um americano? Melissa pensou em David, que estaria na festa à noite. David, que não sabia que ela estava se divorciando… não sabia que ela esperava um filho… Talvez não seja verdade, quase murmurou para si mesma, talvez seja um alarme falso! O jantar estava ótimo, e assim que terminou todos seguiram para o salão de dança. David a tirou imediatamente para dançar. — Você é linda, Melissa — ele murmurou, enquanto passavam

entre os vários pares do salão, abraçando-a como se a protegesse dos demais casais. Melissa fitou Marcelle, casualmente, e não pôde acreditar no que via: os olhos dela estavam cheios de veneno e ódio. Ficou feliz quando a dança terminou e pôde voltar para perto de sua mãe e Roger. Tia Lucie e o marido estavam no bar. Joan e Mary conversavam com dois rapazes, amigos de David, que agora caminhava em direção a eles. Foi então que ela b viu! Seu coração deu um salto e instintivamente Melissa segurou o braço da mãe. — O que foi, querida… ? — Darius, mãe! É… é meu marido… — Melissa apontou. Ele tinha

entrado no salão, com ar superior e arrogante, sua altura fazendo com que sobressaísse entre os demais. Não havia visto Melissa ainda. O sangue subia à face de Melissa enquanto via Darius caminhando, as atenções se voltando para ele. Quem era aquele estrangeiro alto e moreno? Que estaria fazendo ali? A orquestra se preparava para tocar outra música. — Seu marido? — Margaret não queria acreditar no que tinha

ouvido. — Aqui? — Sim, este homem que vem vindo — a voz de Melissa estava

trêmula. — Oh, ele já me viu, vem em nossa direção. Por que não me escondi quando o vi?

— Porque não é necessário! Você estará segura comigo, criança.

Deixe que eu cuido dele. Roger, que estava conversando com um amigo, acabava de se sentar à mesa e percebeu que algo acontecia. — Algo errado? — foi tudo que pôde dizer, pois neste momento

Darius já estava em pé, defronte à mesa, fitando Melissa com olhos que brilhavam como brasa viva. Roger também se levantou, pronto para desafiá-lo. — Até que enfim a encontrei. — A música começou a tocar e,

antes que alguém pudesse fazer alguma coisa, ele tomava a mão de Melissa e a obrigava a se levantar. — Agora é minha vez de dançar com você. Se não quer provocar uma cena, Melissa, então comportese naturalmente. Temos muito a conversar. — Eu… eu não tenho nada a conversar com você. — O medo

começou a tomar conta dela, ao ver que se afastavam de Roger e Margaret, que conversavam excitadamente, mas não faziam menção de se mover: não seria inteligente atrair atenção para eles ou para o casal que agora chegava à pista de dança. Mais uma vez Melissa viu que Marcelle a fitava com curiosidade, ao lado daquele estrangeiro desconhecido. — Por favor, leve-me de volta — Melissa pediu, com dificuldade

para articular as palavras. Devia ter pensado antes que Darius poderia encontrá-la, que seu pai certamente diria que ela estava com a mãe, na Inglaterra. — Não quero saber de você, Darius. Eu não o amo! — Nós temos que conversar, mas quero fazê-lo em particular.

Conversaremos depois. — Depois? — Sim, Melissa, sei onde é a casa de sua mãe; sei onde você está

vivendo. — Ele fitou a face pálida da esposa e acrescentou: — Será que pensava que ia esquecê-la? Que sofreria a humilhação dos amigos saberem que minha mulher me abandonou? Por Deus, Melissa, devia me conhecer melhor. Não sou fraco como esses homens ingleses! — Eles não são fracos! Você não conhece nada, Darius, pois nunca esteve na Inglaterra, nunca saiu de Chipre! — Melissa sentia a coragem retornando aos poucos. — Se tivesse feito isso, saberia que as mulheres não são escravas, que existe igualdade em outros lugares do mundo, onde somos tratadas com respeito e… amor!

Darius fitou-a com certa surpresa. Era verdade que nunca saíra de Chipre, onde as mulheres eram tratadas como simples vassalos dos maridos. — Precisamos conversar — foi tudo que disse, e agora seu tom já era um pouco mais conciliatório. — É inútil. Vou dar a entrada no divórcio e… — Não, você jamais fará isso! — Minha mãe está arrumando os papéis e serei livre novamente!

— Ela quase soltou um gemido quando Darius lhe apertou a mão com força. — Você é minha esposa, e este é o seu destino. Em Chipre não se permite que as mulheres decidam estas coisas! — Não será difícil conseguir o divórcio, você sabe disso. — Só é fácil quando há consentimento mútuo, era Chipre. E eu

nunca concordarei! Tinham se aproximado de um canto mais isolado do salão, e Darius a fez sentar-se numa mesa vazia. — Você não tem nenhuma chance, Darius. Estamos na Inglaterra,

um país civilizado. Oh, eu amo Chipre e gostaria de poder voltar lá. Tive que fugir quando meu pai me obrigou a este casamento. — Ela fitou o marido, e seus lindos olhos estavam imensamente tristes. — Sinto muito pela humilhação que lhe causei. Você não devia ter me pedido em casamento, sabendo que eu era inglesa e com certeza me ressentiria de uma união arranjada. Darius fiada dizia e Melissa se perguntava se a sua sinceridade o teria impressionado. — Se pelo menos você estivesse esperando um filho meu… — ele

parecia estar falando a si mesmo e não notou o leve tremor nos lábios de Melissa. Mais cedo ou mais tarde ela precisaria lhe dizer, pensou com temor, mas não tinha certeza ainda de que estava mesmo grávida. Oh, Deus, como desejava que não fosse verdade! — Bem, como não estou grávida, não há nada que nos una,

então…

— Pensa que a deixarei assim tão facilmente? — Os olhos dele

tinham de novo um brilho infernal. Darius fitou o grande salão e apontou Margaret. — Presumo que aquela seja a sua mãe… — Sim, é ela. — Quem é o homem junto dela? — Seu nome é Roger, é noivo de minha mãe. Ele é americano. — Foi difícil encontrar sua mãe? — Não, foi mais fácil do que imaginei. — Pena… se tivesse sido difícil, teria sido obrigada a me procurar!

A propósito, quanto dinheiro lhe jogaram no vestido naquela noite? — Quinhentas libras. Teria durado até eu conseguir um emprego. — Minha mulher não iria trabalhar! — ele falou indignado, como

se tivesse acabado de ser desrespeitado. — Eu teria feito o que fosse melhor para mim! Nunca teria

voltado para você, mesmo que não encontrasse minha mãe. Preferiria trabalhar como. doméstica a fazer isso! — Você me odeia tanto assim? — Darius perguntou depois de uma breve pausa. Antes de responder, Melissa fitou-o diretamente nos olhos. — Eu não o odeio, exatamente. Fiquei magoada por ter me

pedido em casamento a meu pai, sem ao menos me consultar e… e depois houve aquela noite e… Você podia ter sido paciente comigo e… Você era um estranho, Darius! Se tivesse esperado, talvez pelo menos pudéssemos ser amigos… — A voz de Melissa era amargurada e seus olhos tinham uma profunda expressão de tristeza. — …Nunca daria certo, Darius. Como disse, nunca devia ter me pedido em casamento. Que direito tinha de fazer isso? — O direito que todo grego tem: eu queria você, e ninguém mais. — A tradição… você seguiu a tradição. — E o que mais poderia ter seguido? — Esse costume já está ultrapassado, Darius. — A voz de Melissa

agora era calma e quase gentil. — Não sou uma garota grega e nunca me submeteria a essa tradição.

— Talvez eu devesse ter dado mais atenção ao fato de que você

era meio-inglesa — ele admitiu, para surpresa de Melissa. — Mas agora estamos casados, e você tem de se conformar com isso. — Acredita mesmo que poderá me obrigar a voltar? — Não sente saudades do lugar onde nasceu? Não quer voltar

para Chipre? — Claro que sim — ela respondeu sem hesitar, pensando nas

praias e nos bosques daquela linda ilha que tanto amava. Sim, ela haveria de voltar, mas somente para uma visita! — Então, por que se opõe a voltar comigo? Será que Darius

percebia que tinha acabado de admitir que não podia forçar Melissa a acompanhá-lo? — Por que, como já disse, eu não o amo, Darius. — Amor? Coisa de mulher! Já lhe disse isso antes. — Talvez seja coisa de mulher em seu país, mas aqui os homens também se apaixonam. — Mas este não é o seu lugar, como não é o meu. Você logo se

cansará da Inglaterra, do clima, das pessoas que fazem tudo correndo, da preocupação com o dinheiro! Em Chipre temos tempo para outras coisas. — Aqui também há tempo para se fazer outras coisas. — Como o quê, por exemplo? — Como se apaixonar, Darius —— ela replicou e

inadvertidamente olhou para David, que lhe retribuiu o olhar com um sorriso. Melissa também sorriu e Marcelle não pôde ver aquela troca de gentilezas, pois estava de costas, dançando com o rapaz. Darius, entretanto, tudo observava, e seus olhos brilhavam, furiosos. — Com os diabos, quem é aquele homem? — Um amigo, Darius. — Mulheres casadas não possuem amigos! — Darius parecia

inclinado a ir tomar satisfações com David e Melissa ficou em pânico ao pensar que ele poderia revelar que era seu marido. — Ele não é esse tipo de amigo que você está pensando, Darius.

— Que tipo de amigo? Vamos, responda!

Melissa sentiu que corava fortemente, Margaret e Roger, ao longe, pareciam não poder esperar mais e faziam menção de vir a seu encontro. De maneira alguma ela queria que uma briga ou confusão estragasse sua festa. — Ele é meu primo, na verdade — explicou, tentando amainar a fúria de Darius. — Tenho quatro primos, duas tias e um tio. — Compreendo… — A voz de Darius era sarcástica. — Todo o

apoio de que precisa, não é? Suponho que estão todos aqui esta noite? — Sim, estão. — E prontos para defendê-la de seu marido, não é? — Eles não sabem que… — Melissa calou-se, mas já era muito

tarde. Darius a fitava com ar incrédulo. — Não sabem que você é casada? Quem teve a péssima idéia de

esconder isso? — Minha mãe. Ela decidiu que, já que eu ia me divorciar, não

havia necessidade de contar para ninguém, pelo menos por enquanto. — Sua mãe, não é? Tão preocupada com você… Será que já

esqueceu que ela a abandonou assim que nasceu? — Não, não esqueci. Só que eu a perdoei, pois sei que era muito

infeliz ao lado de meu pai. — E isso justifica abandonar uma criança? Se tivéssemos um filho, você o abandonaria?

Melissa meneou a cabeça, sentindo o coração se enternecer. — Não… nunca poderia abandonar meu próprio filho. Mas as pessoas são diferentes, Darius, e temos de ser tolerantes. — A voz de Melissa era tão gentil, tão compreensiva, que parecia tocar Darius de alguma maneira indefinível. — Mas você não foi tolerante comigo. — Era diferente. Você me magoou, me tratou sem respeito… Mas

não tem mais importância. Não fomos feitos para viver juntos e

devemos nos divorciar. Acredito que ainda encontraremos alguém com quem possamos ser felizes. — Nunca! Somos casados e quero que continuemos assim. Você

supõe que desistirei sem lutar? Pois está enganada. E tenho certeza de que vencerei! — É impossível… Não há dúvida de que obterei minha liberdade. Na verdade, minha mãe está pensando em anular o casamento, já que fui obrigada. — Você não foi obrigada! Não estava amarrada e amordaçada

quando entrou na igreja! — Você sabe o que quero dizer, Darius. — Melissa suspirou

fundo, desejando acabar com aquela conversa. — Por favor, me esqueça. Não vai ganhar nada arrumando problemas. Acho que já tive o suficiente, sendo obrigada a fugir, vir para um país estranho, que não conhecia, sem ter certeza de que poderia encontrar minha mãe. Por favor, seja gentil e me esqueça! A expressão de Darius era tão suave como Melissa jamais tinha visto, era como se tivesse compreendido e aceitado o fato. Mas, de repente, o rosto dele foi mudando, mostrando o mesmo rancor e hostilidade de antes. — Lutarei por você! Casou-se comigo porque quis, e um dia ainda vai assumir nosso casamento!

Nesse momento, Margaret se aproximou, convencida de que Melissa precisava de seu apoio. Roger devia ter sido instruído para ficar onde estava, pois não se moveu. — Então, você é Darius! — Margaret disse sem mais preâmbulos,

aceitando a cadeira que ele oferecia. Darius sentou-se na outra cadeira vazia. — Sim, é Darius — era Melissa quem falava, pois os dois se

olhavam intensamente, como se medissem forças. Mais tarde, Margaret lhe diria que a face ríspida de Darius a tinha amedrontado, mas mesmo assim admitia que era um homem bonito e atraente. — Afinal… por que veio aqui? — ela perguntou. — Para buscar minha esposa! — Verdade? E o que o faz pensar que poderá tirar minha filha de

mim?

— Ela é minha esposa. — Por coerção! — Margaret estava calma e controlada, com plena

confiança em si mesma. — Seria inteligente de sua parte esquecer que Melissa um dia foi sua esposa, Sr. Valaris. Foi tolice vir até aqui pensando que poderia levá-la! Vocês, gregos, são muito arrogantes… Marcos dizia a mesma coisa: que eu pertencia a ele para o resto da vida! Melissa tremeu ao ver a mudança no rosto de Darius. Ele parecia pronto para assassinar sua mãe, para torturá-la vagarosamente, sem compaixão. — Tenho certos direitos, senhora, e lutarei por eles. — Melhor desistir dessa luta, Darius.

Darius fez uma breve pausa e voltou a fitar Margaret. — Suponho que a fez passar por uma mulher solteira… Pela

primeira vez, Margaret ficou desconcertada. — Você contou para ele? — Ela olhava para a filha. — Não havia

necessidade de fazer isso. — Eu poderia me levantar neste minuto e declarar a todos que

sou marido de Melissa — Darius ameaçou. — Por favor, não faça isso — Melissa pediu. — Que bem isso lhe

trará? — Pelo menos manteria os homens afastados de você. — Melissa não está interessada em nenhum homem, Sr. Valaris.

Tudo que deseja é um pouco de paz e a oportunidade de conhecer a vida. É muito jovem para se casar, especialmente para o tipo de vida que as mulheres casadas levam em Chipre, tendo um filho a cada ano! Não, você jamais conseguirá levar Melissa de volta. Portanto, e melhor se resignar com a situação e aceitar o divórcio.

CAPÍTULO IV

Já não havia mais duvidas. Melissa estava esperando um filho de Darius. Sentada na beira da cama ela chorava amargurada, temendo o futuro negro que se desenhava à sua frente. Sua mãe não ia querer a criança, e Melissa não a culpava. Entendia que era uma mulher livre, ativa, noiva de Roger, pronta para aproveitar a vida. Por algumas semanas, tinha pensando no que seria o melhor a fazer. Voltar para o marido, só como último recurso! Gostaria de conhecer melhor o mundo, saber como agir numa situação daquelas. Não devia ser a primeira vez que uma garota enfrentava este tipo de problema, e devia haver uma maneira de solucioná-lo. Mas, como? O tempo ia passando e Melissa estava cada vez mais temerosa, guardando seu segredo sozinha. Certo dia Margaret comentou, medindo-a de cima a baixo: — Você está engordando, querida. Sei que sua nova vida deve

ser a culpada por isso, mas precisa cuidar do corpo. Melissa sabia que não poderia esconder a gravidez por muito tempo. Sua vida social era organizada por Margaret, que parecia disposta a fazê-la recuperar o tempo perdido, levando-a para espetáculos, shows, bailes e jantares. Roger havia sugerido que fossem passar uns dias em sua linda mansão em Miami, e Melissa teria adorado a idéia se não estivesse preocupada demais com seu estado. — Marcelle vai fazer vinte e um anos, e estamos convidadas para

sua festa de aniversário — Margaret comentou alegremente, certo dia. — Será no Concert Hall, em Baybridge! A menção da festa fez Melissa recordar da sua, quando Darius apareceu tão inesperadamente, querendo carregá-la para Chipre. Sua arrogância era inacreditável, dizia Roger algum tempo depois. Marcelle também se interessou por ele e perguntou a Melissa quem era o belo estrangeiro. Foi difícil despistá-la, sem revelar que Darius era seu ex-marido, que queria levá-la de volta. Mas Darius não havia desistido facilmente naquela ocasião. No dia seguinte, foi até a casa de Margaret, dizendo que vinha buscar Melissa. Roger, que o recebeu à porta, mandou que fosse embora. Num gesto rápido, Darius passou por ele e entrou na casa. Melissa estava sozinha na sala, nervosa e amedrontada. Seu coração quis saltar pela boca quando Darius apareceu e a agarrou pelo pulso, dizendo que ela iria com ele. Roger interveio e os dois homens começaram a lutar, para horror de Melissa. Roger era forte, mas Darius tinha a seu favor o vigor da

juventude. Completamente desnorteada e apavorada, Melissa quis correr para o telefone, mas percebeu que não havia tempo. Agarrou um castiçal e estava pronta para atacar o marido quando Margaret apareceu à porta. — Não faça isso! — ela gritou. — Vou chamar a polícia!

Felizmente, conseguiu evitar que a filha fizesse algo de que se arrependeria pelo resto da vida. Os dois homens pararam de lutar ante sua intervenção e Darius falou, o suor escorrendo pelo rosto: — Vamos, chame a polícia! Quando souberem o que está

acontecendo, serão os primeiros a me ajudar a levar minha esposa de volta para casa! — Isso é o que aconteceria em Chipre, mas não aqui! Como é

que se atreve a deixar minha filha neste estado? -— Ela apontava para Melissa que tremia apavorada, num canto da sala. — Se for por mim, você passará esta noite na cadeia! Darius afinal aceitou a derrota e partiu, logo depois que Margaret telefonou para a polícia. Roger se aproximou de Melissa e deu-lhe um abraço confortador. — Meu Deus! — Margaret exclamou quando Darius partiu. — Que sorte você ter escapado deste monstro! Marcos era um anjo em comparação com Darius! — Pobre criança! — Roger confortava Melissa. — Este homem

tem muito a aprender com a vida! — Talvez ele aprenda… mas nunca levará minha filha de volta!

Margaret insistiu, então, para que Melissa subisse e deitasse um pouco. Mas tudo que ela conseguiu fazer foi vomitar várias vezes, abalada pelo que havia acontecido. — É melhor esquecê-lo, querida! — Margaret tentava confortar a

filha. — Ele vai se opor ao divórcio! — Melissa dizia, morrendo de

medo. — Azar dele! Quando descobrir que está derrotado, terá de

admitir que não é o Todo Poderoso! Diante dos argumentos da mãe, Melissa pensou que a experiência de ser derrotado certamente seria algo considerável para um homem acostumado à absurda tradição de tratar as mulheres como escravas.

Marcelle estava linda em seu vestido de cetim escuro, mas parecia insignificante ao lado de Melissa, ainda que esta se vestisse com mais simplicidade. Margaret sabia exatamente que roupas e que jóias usar em cada ocasião, e também como deixar a filha linda. Melissa ostentava um delicado diamante preso nos cabelos, uma das jóias com que Roger havia presenteado Margaret. A festa era num buffet, haveria um jantar seguido de baile. Assim que chegaram, David se aproximou e disse que queria dançar todas as músicas com Melissa e que gostaria de acompanhá-la no jantar também. Marcelle ouviu o convite, pois estava por perto, e não passou despercebida a maneira hostil como fitou Melissa. Na opinião de Roger, teria atacado a prima, se pudesse, tamanha era sua inveja e ciúme ao ver que fora deslocada do lugar especial que ocupava na família, como a mais bonita e mais adorável. — Joan e Mary são tão diferentes! — Roger comentou. — Estão

encantadas por terem mais uma prima na família! — Sim, mas elas não estão atrás de David, como Marcelle! —

Margaret replicou. — Ela sempre pensou que poderia conquistar o rapaz e agora sabe que terá de lutar muito para conseguir isso. Melissa, parada por perto, podia ouvir a conversa, e pensava que não havia motivo para Marcelle ficar enciumada, pois ela não só era casada, como estava esperando um filho. Marcelle logo veria que não havia o que temer da parte dela, e David também saberia que a garota da qual começava a gostar não era para ele. Então, talvez ele se voltasse para Marcelle… Melissa não podia evitar uma ponta de inveja, pois, se nada daquilo houvesse acontecido em sua vida, agora poderia corresponder ao interesse de David. Ela suspirou, pensando se, no fim das contas, seu destino não seria voltar para o marido! Marcelle aproximou-se de Melissa e David, quando percorriam a comprida mesa do buffet, colocando as deliciosas iguarias nos pratos. — Não coma demais! — ela sussurrou no ouvido da prima. —

Você está engordando muito… Deve ser a mudança na dieta. Tomada de surpresa, Melissa mal sustentou o prato que tinha nas mãos, e um pouco de comida caiu no chão. Sentiu que corava fortemente, ainda mais agora, que David a fitava. — Eu… eu… — ela não conseguiu fazer nada enquanto David se

aproximava com um sorriso, tomava seu prato e tornava a servi-la com um pedaço de torta. — Obrigada! — murmurou afinal,

consciente de que sua reação tinha deixado Marcelle surpresa e curiosa. — Eu a embaracei por ter comentado a respeito de sua silhueta?

— ela perguntou com um sorriso sarcástico, em voz baixa o suficiente para que David não pudesse ouvi-la. — Não acho que tenha mudado tanto! — Melissa respondeu, surpresa, para conseguir se opor a Marcelle. Entretanto, corava cada vez mais e a prima contou isto antes que lhe desse as costas e se virasse para David. Por um momento, teve certeza de que Marcelle havia adivinhado toda a verdade, mas logo percebeu que era impossível. Se soubesse que era casada, sem dúvida teria pensado nisto, mas ela não sabia, acreditava que a prima era solteira. — Vamos sentar aqui? — David indicou uma mesa vazia. — Ora, Melissa, será que não está com fome? Você mal colocou comida em seu prato!

Ela já ia responder que sim, que tinha fome, quando percebeu que nunca sentira tamanha falta de apetite em toda vida. Olhou o prato quase vazio e desejou estar longe dali, entregue à própria miséria e infelicidade, resignada a enfrentar o futuro que, sem dúvida, seria negro para ela. — Posso me sentar com vocês? — Marcelle perguntou com voz

gentil. — Sinto muito que esteja sem apetite, querida! — Ora, você deve comer alguma coisa. Dê-me seu prato que eu

vou servi-la! — David tomou o prato de Melissa e levantou imediatamente, voltando à mesa do buffet. — Tia Margaret nunca explicou direito o porquê de você

abandonar Chipre e seu pai… — Marcelle começou a dizer assim que ficaram a sós. — Disse qualquer coisa a respeito de seu pai querer obrigá-la a casar mas… ninguém levou esta história muito a sério… — Verdade? E por quê? — a pergunta saiu antes que Melissa pudesse refletir melhor, e ela logo se arrependeu, pois sua voz vinha carregada de medo e culpa. — Ora, Melissa, seja franca.. . Não foi esta a verdadeira razão,

foi? — Marcelle falava com suavidade, mas repleta de veneno. — Claro que… que foi esta a razão. — Por que ela parecia tão

insegura e amedrontada? Como era difícil deixar de ser aquela menina tola, crida com cuidados pelo pai e pela tia, sem nunca ter conseguido conhecer melhor o mundo!

David voltou logo, impedindo que Marcelle pudesse continuar seu implacável interrogatório. Melissa sentiu-se aliviada. Estava salva, mas… até quando? Uma semana depois da festa de Marcelle, Melissa teve de ir até a casa de tia Lucie. É que seus tios foram convidados para um jantar elegante, e a tia pediu a Margaret que lhe emprestasse a estola de peles. Como Margaret estava ocupada naquela tarde, disse a Melissa que levasse a estola até a casa de Lucie. Ela partiu logo depois do almoço, pois sabia que Marcelle não chegava do trabalho antes das cinco horas. Mas, para* seu desagrado, a prima foi a primeira pessoa que encontrou, deitada no sofá da sala, lendo um revista de moda. Não havia sinal de Lucie. — Onde está tia Lucie? — perguntou, assim que a empregada a

conduziu até Marcelle. — Saiu para fazer umas compras… Vejo que trouxe a estola. —

Marcelle deixava a revista de lado e olhava para a prima. — É, vou deixá-la aqui. Você não está bem, Marcelle? — Só um resfriado, por isso não fui trabalhar. — Bem… desejo que sare logo, então — Melissa falou

preparando-se para ir embora. —— Você também não parece muito saudável — a voz de Marcelle era sarcástica. —— Está pálida…

Melissa meneou a cabeça, concordando. De fato não se sentia muito bem, pois tinha dor de cabeça e estava enjoada. — Sim… acho que é melhor voltar para casa. — Tem se encontrado com David? — a pergunta tomou Melissa

de surpresa. — Não, a última vez que nos vimos foi em sua festa de

aniversário. — Ele está interessado em você. — Os olhos de Marcelle eram

frios e hostis. — Antes de você aparecer, era comigo que ele queria ficar.

— Seu comentário é meio estranho… isto é, se ele quisesse ficar

com você, teria feito isso e… — Ela percebeu, tarde demais que dissera aquilo da pior maneira possível, sem nenhum tato. Não estava acostumada a lidar com este tipo de situação e agora sentia que tornava a fúria de Marcelle cada vez maior. — Eu… eu sinto muito… queria que soubesse que jamais poderá existir algo entre David e eu… Será que isso deixaria Marcelle satisfeita?, ela pensou, enquanto caminhava em direção à porta. Virou-se fitou a prima mais uma vez. — Devo ir embora… — ela disse, mas a sala começou a girar e

Melissa foi ficando tonta até sentir que caía suavemente sobre o carpete da sala. Quando voltou a si, estava deitada no chão, com a cabeça sobre uma almofada. Já não sentia enjôo, mas uma espécie de letargia, que a fazia desejar ficar ali para sempre, de olhos semicerrados. Sabia agora como seria difícil carregar dentro de si um filho que não desejava. Percebeu que Marcelle a fitava com expressão interrogativa e de súbito quis desaparecer daquele lugar. — Oh, que absurdo… — disse, tentando parecer convincente. —

Devo estar muito cansada. — Sentou-se no chão, apoiando-se nas mãos. — Provavelmente. . , Quando entrou por aquela porta, parecia mesmo muito cansada, como se não tivesse dormido a noite inteira. Você dormiu bem esta noite, Melissa? — Ora, claro que sim! — Melissa baixou os olhos para que

Marcelle não pudesse ler a mentira neles. Há semanas que não conseguia dormir direito, desde que descobriu que estava grávida. — Tenho que voltar para casa. — Ela levantou-se sem que Marcelle oferecesse a menor ajuda. Suas pernas estavam moles como geléia, e o estômago doía com uma sensação de vazio. Inadvertidamente, levou a mão à barriga, deixando-a ficar ali por um momento… quando virou-se para Marcelle, esta tinha percebido seu gesto e um sorriso quase imperceptível pairava em seus lábios. Margaret fitava Melissa, horrorizada. — Mas por que me contou só agora? — Seu rosto estava tão pálido quanto o da filha. — Esperar tanto tempo! Oh, é impossível ter paciência com você!

Melissa começou a chorar. Sabia que faria isso quando chegasse a hora de falar com a mãe sobre sua gravidez. Margaret estava de pé

contra a janela da sala de estar, a expressão crispada, apertando as mãos num gesto nervoso. — Eu vou embora… — Melissa murmurou, desesperada. —

Voltarei para Darius, não há nada mais que possa fazer… — As lágrimas corriam soltas por seu rosto, e Margaret, ainda completamente aturdida, não tentava confortar a filha. — Oh, preferia estar morta… Sinto muito todo o problema que estou causando, nunca pensei na possibilidade de ficar grávida… tudo que queria era escapar daquela tortura a que me condenaram… Melissa calou-se, pois não conseguia dizer mais nada. Não tinha falado nada com a mãe a respeito da cena na casa de tia Lucie, presenciada por Marcelle, apesar de ter certeza de que a prima contaria para outras pessoas da família. Mas era certo que ela não ousaria insinuar que Melissa estava grávida, pois não sabia que era casada. Entretanto, daí por diante, seria praticamente impossível continuar escondendo o fato dos demais. — Eu vou embora… — ela disse mais uma vez, fitando a mãe com

os olhos marejados de lágrimas — … Acho que nunca devia ter vindo… devia ter pensado na possibilidade de estar esperando um filho, não é? — Você não vai voltar para lá!

Margaret e Melissa se viraram para Roger, que entrava na sala, tão consternado que Melissa jamais o vira assim. Devia estar no hall, pois não havia dúvida de que ouvira a conversa. Ele atravessou a sala, sem desviar o olhar de Margaret. — Estou envergonhado de você! — disse-lhe, antes de se dirigir para Melissa e tomá-la nos braços, deixando-a soluçar sobre seu peito, molhando a camisa fina e alva. Então, Margaret pareceu voltar a si, saindo de uma espécie de transe que a impedia de demonstrar compreensão para com a filha. Aproximou-se de Melissa com os braços abertos. — Sinto muito, querida… Não tinha a menor intenção de deixá-la

voltar para aquele monstro, mas o choque foi tão grande que fui incapaz de dizer qualquer coisa! Já tinha pensado na possibilidade de você ter engravidado na noite de núpcias e planejei até como resolver a situação. Mas você demorou demais a me contar e agora é impossível negar os fatos. — Ela aproximou-se suavemente, erguendo o queixo da filha, para que ela a olhasse. — Você não tinha necessidade de ter esta criança.

Melissa fitou-a com olhar inocente, sem compreender exatamente o que a mãe queria dizer. — Não havia necessidade de ter a criança? … Mas como? — Agora já não importa mais — Roger replicou, com suavidade. — Temos de enfrentar a situação como ela é e não como poderia

ter sido, se esta pobre menina ousasse nos contar antes. — Sim, você tem razão — Margaret concordou com um suspiro. — Qual a melhor coisa a fazer? Você tem alguma idéia?

Roger meneou a cabeça. Melissa olhou de um para outro, seu coração mais aliviado do que ela jamais pensou que pudesse ficar. — Oh, muito obrigada a vocês dois! — Seus olhos ainda estavam úmidos e tudo que ela desejava era poder se deitar e descansar um pouco. — Vou para o quarto, se não se importarem. — Claro que não nos importamos, querida. Eu e Roger saberemos

decidir o que será melhor para você — Margaret disse sorrindo com segurança. — Sim, tenho certeza disso — Melissa concordou, um sorriso

aflorando em seu rosto de menina. — Fico tão grata a vocês, e tão aliviada… Gostaria que Roger fosse meu pai, ela pensava pouco depois, enquanto tirava a roupa e se preparava para descansar um pouco. Sim, ele teria sido um pai maravilhoso.. . Melissa enfiou-se dentro dos lençóis e pouco depois adormecia num sono profundo e tranqüilo.

CAPÍTULO V

Um lindo jardim tropical, plantas com folhas enormes e exuberantes, orquídeas penduradas nas árvores, flores em tons fortes e sensuais… fontes de água límpida e cristalina, frutas cheias de sumo e sabor… uma ilha sob o sol!

Coral Cay fica nas Bahamas, é uma das numerosas ilhas ao longo do litoral da Flórida, espalhadas no oceano como pequenas jóias sobre a água. Não media mais que duas milhas de extensão, cheia de plantas e coqueiros, uma lagoa de águas tranqüilas em seu centro, rodeada de areia fina como talco. As praias, sempre vazias, eram protegidas por uma barreira de coral que impedia as ondas mais fortes de chegarem até a costa. Para além dos corais, o Atlântico brilhava, verde e azul-marinho, imenso e tranqüilo; sobre ele deslizavam veleiros com suas velas brancas. Melissa, serena e bonita, com a pele bronzeada, estava deitada no sofá da ampla sala de estar de Mangrove Lodge, uma das duas mansões que seu pai adotivo possuía. A outra ficava em Miami Beach, na Flórida. Segurava um livro entre as mãos mas não o lia, tinha a atenção voltada para a maravilhosa paisagem do mar e da praia que se descortinava pela imensa parede de vidro que separava a sala do jardim, lá fora. Estava tranqüila agora, a vida parecia ter se assentado depois daquele período negro, quando carregava dentro de si o filho que não desejava… Estivera no hospital, o parto fora difícil… Tentava pensar em outras coisas, mas as lembranças insistiam em voltar à sua cabeça; lembranças do que havia ocorrido há tanto tempo… há oito anos. Margaret e Roger tinham decidido, naquela época, que o melhor a fazer seria casarem-se, e mudarem para a Flórida. E foi em Miami que, depois de muito sofrimento, Melissa afinal deu à luz um garoto. Ficou em coma por alguns dias, sua vida por um fio. E quando voltou a si, soube que tudo havia sido inútil: a criança estava morta. Era estranho, ela pensava agora; sempre disse que não desejava o filho mas, no momento derradeiro, quando o parto se aproximou, queria aquela criança com todas as forças de seu ser. Sabia que todo sofrimento teria valido a pena quando pusessem o filho em seus braços… Contudo, nada aconteceu assim. Quando perguntou à sua mãe onde a criança estava enterrada, Margaret lhe contou que o bebê não era perfeito, e tinha sido cedido para pesquisas científicas. A notícia foi terrível para Melissa e ela insistiu em saber para que lugar haviam levado o corpo de seu filho recém-nascido.

— Para um hospital em Nova York, querida, onde se fazem

estudos desse tipo. —— Nova York? Mas é tão longe… — E isso importa? — Não, suponho que não — Melissa meneou a cabeça. — É que odeio a idéia de meu filho ser… ser todo cortado para ser estudado. — Melissa, querida, pense no bem que isso poderá trazer a outras crianças que poderiam sofrer do mesmo problema… Estudando estes casos, os médicos aprendem a preveni-los, para que não aconteçam a outras mães!

Margaret não queria se estender sobre o assunto mas, tempos depois, quando já se recuperava na casa em Coral Cay, Melissa novamente lhe perguntou a respeito do filho que nunca tinha visto. Queria saber o que havia de errado com ele. — A cabeça dele, querida — Margaret falava vagamente, um

pouco impaciente —, era muito grande, muito maior que o normal. Foi toda a informação que conseguiu obter, e mais tarde ficou pensando em como Darius se sentiria ao saber que seu filho tinha nascido anormal. Margaret lhe explicou que qualquer pai poderia gerar um bebê como aquele, era algo que às vezes acontecia. Melissa resignou-se com o fato, mas sentia-se estranhamente satisfeita por Darius não saber nada sobre a criança. Sentada na sala de Mangrove Lodge, Melissa agora pensava em sua amiga Katie Gorman, filha do dono do pequeno hotel da ilha. Ela era mãe de uma linda criança, de seis anos. Caso seu filho tivesse vivido, teria agora oito anos… Darius tinha lutado contra o divórcio, mas Roger contratou um brilhante advogado, que impressionou o Juiz com sua história de uma garota de dezessete anos, obrigada a casar com um homem que não conhecia. Dias depois da separação ser legalizada, Darius escreveu uma carta, dizendo que ainda considerava Melissa como sua legítima esposa, e que assim sempre o faria. Ela nunca respondeu, seguindo o conselho de Margaret, que achava que o rompimento devia ser total. Sua vida tinha sido muito boa, depois da crise com o nascimento da criança. Passava a maior parte do tempo com Margaret, em Coral Cay. Roger continuava trabalhando em Miami, o que o obrigava a permanecer na cidade freqüentemente. Sempre que possível, porém, ficava com, elas na ilha, o que fazia Melissa imensamente feliz.

Gostava muito de Roger, sábia que o amava mais do que amava sua própria mãe. Ela e Margaret gostavam muito uma da outra, se aceitavam, se respeitavam e conviviam felizes, mas não existia aquele amor de mãe e filha entre elas. Roger havia se oposto à idéia de Melissa trabalhar e, por respeito a ele, ela terminou concordando. De qualquer maneira, não tinha muito que fazer naquela pequenina ilha. Mas não era um lugar onde não pudesse se divertir. O hotel oferecia sempre jantares dançantes, com shows de conjuntos musicais. Sempre aparecia gente nova, a maior parte americanos em férias. Às vezes surgiam alguns ingleses também, mas não era freqüente. De qualquer maneira, era uma ilha completamente virgem, quase intocada pelos homens. E como as únicas formas de diversão eram as oferecidas pelo pequeno hotel, não era um lugar muito procurado pelos turistas. As pessoas que construíram casas na ilha eram justamente aquelas que queriam desfrutar de um lugar onde se pudesse ter muita tranqüilidade, longe da agitação e do movimento dos pontos turísticos da região. Os proprietários dessas casas em geral eram homens de' negócios, como Roger, que vinham para a ilha em seus magníficos iates. — Querida… você está dormindo? — a voz suave de sua mãe a despertou daqueles pensamentos. — Não, não estava dormindo, só sonhando acordada. — E sonhando com quê? — Margaret perguntou, enquanto

avançava pela sala, olhando a filha. Melissa era mais linda agora do que quando tinham se reencontrado, anos atrás. Havia crescido, amadurecido, ganhando um ar tranqüilo e sereno. Por um momento, Margaret lembrou-se de Darius e pensou como o futuro da filha teria sido ruim se continuasse em Chipre. Estaria hoje muito mais velha, acabada, presa dentro de casa e cuidando de seis ou sete filhos! — Oh, sonhava com muitas coisas… Pensava em como este

pequeno pedaço de paraíso, que é Coral Cay, acabou caindo do céu… — Sim, você tem razão. Esta ilha é como um pedaço do paraíso!

Espero que seja protegida e que nunca nenhum especulador venha para cá, trazendo todas aquelas coisas que atraem hordas de turistas! — Margaret suspirou. — Você gosta mais daqui do que de Chipre,

não é?

— Sim, acho que gosto mais daqui… Chipre é linda, foi o lugar

onde nasci, mas… Sim, acho que me sinto melhor em Coral Cay! — Melissa meneou a cabeça. Seus cabelos agora eram longos e

caíam sobre os ombros, muito bem cortados e tratados. — … Os trópicos.. . Soa até mais romântico, não é? Margaret concordou com a cabeça, absorta. Ela fitava Melissa e seu corpo esbelto e esguio, muito bonito. — Você é uma mulher adorável, filha. — Parecia haver um tom

melancólico em sua voz. — Quando jovem, eu também era como você, bonita e atraente. — Ora, mamãe, que tolice dizer isso! Você continua tão bonita

como sempre. Parece que tem dezoito anos! — Ora, um pouco mais. — Margaret sorriu para a filha. — Você,

querida, já tem quase vinte e seis, e é claro que não pareço mais jovem que minha própria filha. — Vinte e seis… — Melissa repetiu num murmúrio. Sua juventude

ia ficando para trás e ela continuava sozinha. Roger tinha feito vagas referências a rapazes jovens, em geral filhos de amigos seus, mostrando para Melissa que estavam interessados nela. Ela é que não havia se interessado por ninguém até agora. Estava feliz e contente e às vezes parecia que queria continuar assim para o resto da vida. Entretanto, em outras ocasiões, percebia um vazio dentro de si, algo que pedia para ser preenchido, especialmente quando estava junto de Roddy, o pequeno filho de sua amiga Katie. Era nesses momentos que gostaria que seu filho tivesse vivido e estivesse junto dela. Às vezes, pensava em Darius e se perguntava se ele teria casado novamente e teria vários filhos agora. Sim, porque apesar de ele afirmar que a consideraria sempre como sua esposa, era natural que depois de algum tempo percebesse a futilidade dessa atitude. Será que havia mudado com a idade? Tinha trinta e dois anos agora… Mas homens como Darius não mudavam muito, era mais conveniente para eles continuar apegados às tradições e costumes. Roger disse, certa vez, que talvez Darius melhorasse com o passar dos anos, compreendendo que as mulheres não eram criadas dos homens e que uma esposa pode ser uma companheira e amiga, além de amante. Será que isso aconteceria mesmo? Melissa não entendia por que ainda lembrava de Darius. Talvez fosse difícil mesmo para uma mulher esquecer aquele que tinha sido o pai de seu filho. Ê, devia ser isso, ela pensava.

— Sonhando de novo, meu amor? —” Margaret falou e sorriu. —

O que é desta vez? — Estava pensando em Darius… e no que teria lhe acontecido

durante estes oito anos. — Ora, que maneira mais tola de passar o tempo! Quem é que se

importa com o que ele está fazendo agora? — Margaret fez uma pausa e fitou a filha. — Você nunca pensa em casar, Melissa? Existem muitos rapazes bonitos e simpáticos tanto aqui como em Miami, que gostariam de se aproximar de você. — Acho que saberei quando encontrar alguém que me complete. — O que acha que Vance Haldene? Sabe que ele ergueria

montanhas por sua causa. Seu pai é milionário e ele é filho único… — Nunca deixarei que o dinheiro me influencie — Melissa

interrompeu. — Quero casar por amor e só por isso. — Claro, o amor é importante — Margaret concordou sem hesitar.

— Mas quando se pode uni-lo ao dinheiro para conseguir uma vida agradável, nada melhor! — Como você e Roger… — Sim, como nós! Ele foi uma ótima descoberta, como sempre digo. E Roger sempre diz que eu também fui um grande achado para ele! — Vocês se dão maravilhosamente, não é? — Sim, sempre foi assim. Roger não me requisita demais, e talvez seja este o segredo do sucesso de nossa união. — Você é muito honesta, mamãe — Melissa disse, sem esconder

um sorriso. — A respeito de não conseguir amar profundamente? — Não estava pensando nisso quando falei… — ela começou a se justificar, mas Margaret a interrompeu. — Inconscientemente, minha querida, foi o que você disse.

Admito que não sou dotada da capacidade de amar alguém profundamente, como você é. Trata-se de um fato do qual não posso

fugir, é uma maneira de ser, algo que nasce com a gente. Se não fosse assim, eu não a teria abandonado, como fiz quando nasceu. Melissa franziu a testa, consternada. — É melhor mudarmos de assunto. Não gosto quando fala desta

maneira, mamãe — ela disse, mas Margaret não parecia disposta a interromper a conversa. — Você tem esta capacidade de amar, querida, o que é maravilhoso. Talvez dentro de mim exista um pouco da amargura que existe em pessoas como Marcelle.

Marcelle… Ela chegou a suspeitar da gravidez de Melissa, mas nunca ousou afirmar nada. Aliás, ninguém na família ficou sabendo, pois Roger e Margaret casaram-se em seguida, e os três mudaram para Miami. Já haviam sido visitados, até mesmo por tia Lucie e Marcelle, que vieram certa vez passar uns dias com elas. Mas Melissa já estava recuperada e nada foi mencionado. Marcelle não tinha mudado nada e, na ocasião, Roger disse que não a receberia mais em sua casa. Ela fora hostil e venenosa com Melissa, com inveja de sua beleza e da vida confortável que seu rico pai adotivo podia lhe proporcionar. Melissa virou-se para a mãe ao ver que ela se levantava da cadeira. — Vou nadar. Quer vir também? — Margaret convidou. — Daqui a pouco. Quero ficar aqui mais uns minutos, olhando a

praia, as flores e os pássaros no jardim. É tudo tão bonito… — Às vezes você me lembra os gregos, querida. Eles têm dentro

de si este apego à natureza. Melissa concordou com a cabeça. — É por isso que não gostaria que maltratassem esta ilha,

erguendo prédios e hotéis que afastariam os pássaros e ocupariam o lugar das plantas. — É uma idealista, meu amor. Às vezes sinto vontade de ser

como você. — Ela deu um sorriso e se afastou em direção à praia, andando com tanta elegância que causaria inveja a uma manequim profissional. A mãe tinha tudo, Melissa pensou, pois apesar de seus quarenta e seis anos, aparentava e se sentia como uma mulher de trinta. Possuía segurança e orgulho de si mesma. Podia navegar no iate do marido, jogar golfe e tênis, nadar no mar todas as manhãs e,

às vezes, à tarde também. Possuía até mesmo um marido rico e adorável, que era apaixonado por ela. Depois de ficar por algum tempo pensando nisso, Melissa saiu. Em frente àquele pedaço de praia particular erguiam-se ao longe duas pequenas ilhotas de coral, um santuário para as aves marítimas. A praia, onde estava, era recoberta de coqueiros que balançavam ao vento, fazendo um ruído agradável. Ela se estendia para o sul, numa longa faixa de areia, toda ladeada pelos coqueiros. Era uma linda praia, sem dúvida. Certa vez, um empreendedor imobiliário comprou o terreno e obteve permissão para construir um hotel com várias lojas e instalações para um clube. Mas o protesto dos proprietários de casas na ilha acabou impedindo que ele realizasse seus planos, obrigando-o a vender o local por um preço menor do que havia pago. Era o que merecia, comentavam, por querer estragar um lugar tão especial como Coral Cay. — Venha — Margaret chamava de dentro do mar —, a água está

ótima! — Está bem! — Melissa foi caminhando devagar, sentindo o

suave toque da areia nos pés. A água estava morna e tranqüila e, depois de nadar um pouco, deixou-se ficar flutuando de costas, observando o céu que brilhava com um azul imaculado. — Estou chegando, garotas, portanto preparem-se para o banho! — Vance! — Melissa virou-se e nadou para a praia. Apesar de

dizer que não se interessava por homens, Vance às vezes exercia forte atração sobre ela. Era um rapaz forte, de cabelos escuros, com a pele bronzeada e os músculos bem delineados. Usava short e trazia uma toalha no braço. — Não sabia que você estava aqui, Vance. Seus pais também vieram? — Não, eu vim sozinho. Minha mãe vai dar uma festa na quinta-

feira, mas eu não sentia a menor vontade de enfrentar aquela multidão em minha casa. Como não poderia fugir da festa, disse que gostaria de vir para Coral Cay passar uns dias, pois precisava descansar um pouco. Eles devem chegar na sexta ou no sábado. — Oh, é tão bom encontrar você, Vance — Melissa disse, sorrindo. Sua mãe tinha se afastado, nadando. — Estou voltando do hotel, onde fui almoçar. Acabei de receber

uma notícia que me deixou chocado! — Chocado? — Melissa estava pegando a toalha que Margaret

deixou sobre a areia. — Por quê?

— Este pedaço de praia, até a ponta sul, foi vendido novamente,

desta vez para um milionário grego ou qualquer coisa assim. Parece que ele já obteve licença para construir e… — Construir? — Agora era ela quem estava chocada. — Mas como

é possível? Quero dizer, ninguém foi avisado, não tivemos tempo de fazer nada! — Bem, parece que ele trabalha rápido, Melissa. — Não compreendo como pode ter obtido permissão para construir sem o conhecimento dos residentes. E o que pretende construir, você sabe? — Um hotel e um shopping center, além de pequenos

apartamentos, daqueles bem baratos, que atraem milhares de turistas. Pelo visto, nos próximos verões teremos de nos conformar com as praias cheias de gente e com a sujeira que elas fazem! — Mas não temos aeroporto aqui — Melissa argumentou,

pensando na única maneira de se ir para Miami. Era necessário pegar uma lancha-táxi até uma das ilhas um pouco maiores e, de lá, seguir num pequeno aeroplano para Nassau, onde enfim se podia tomar o avião para a Flórida. — Não acho que vá fazer este hotel aqui, Vance, pois… — Você ainda não sabe! Ele pretende construir um pequeno

aeroporto, suficiente para receber aeroplanos. — Não! — Melissa estava revoltada. — Não queremos aeroplanos nesta ilha tão pequena. — Receio que tenhamos que nos resignar. O homem é bastante rico, herdou uma enorme fortuna do pai há alguns anos. E parece que tem influência também, dizem até que já está comprando mais terras na ilha. — Mais? Onde?

Vance hesitou, sabendo o que aquilo significava para Melissa. Mas ela o olhava impaciente, e ele teve de dizer. — Clearwater Cove, foi o que me disseram.

Ela sentiu um aperto no estômago e por um instante não foi capaz de falar nada.

— Meu lugar favorito — afinal sussurrou. — Oh, não, ninguém

poderá construir nada em Clearwater Cove! — Sinto muito ter sido justo eu a lhe trazer as más notícias —

Vance falou, impressionado com o efeito que tudo aquilo causava sobre ela. — Não posso acreditar… Você acha que o dono do terreno vai concordar em vendê-lo para esse milionário? Estou me referindo a Clearwater Cove.

Vance explicou então que tinha encontrado com Sam Walsh, e este lhe dissera que a venda de Clearwater Cove já podia estar consumada. Sam ouviu dizer que outros empreendedores estavam atentos ao que se passava na ilha, pois se o hotel fosse mesmo construído, o fato abriria um precedente para que eles adquirissem terrenos e construíssem em Coral Cay. — Mas assim a ilha vai virar um amontoado de edifícios — Melissa reclamou, abalada a ponto de quase chorar. — Prédios e praias — Vance corrigiu, dando de ombros. —

Existem vários lugares de veraneio famosos que não são mais que isso: prédios e praias! — Este homem… ele é grego, você disse… Por que um grego vem

até aqui estragar nossa ilha? Eles têm tantas por lá, por que não estragam as deles? — Não sei se ele é exatamente grego. Está hospedado no hotel e pretendo jantar lá para ver se consigo saber quem é, ou falar com ele. — Hesitou um momento e então prosseguiu. — Ei, você não gostaria de vir comigo? Poderíamos dançar e… — Ele calou-se e por um momento só houve silêncio entre os dois. — Sim, Vance, eu gostaria de ir com você. A que horas quer que

eu esteja pronta? Melissa preparou-se cuidadosamente, colocando um lindo vestido longo que Roger lhe trouxera do Marrocos, numa ocasião em que viajou a negócios. Era simples e sofisticado ao mesmo tempo, e realçava sua beleza. Quando ela o usou pela primeira vez, sentiu que atraía olhares de admiração. Recebeu Vance na sala e ele ficou parado alguns segundos olhando-a sem nada dizer, encantado com a beleza dela. Foi ela quem quebrou o silêncio:

— Se já está pronto, Vance, podemos ir. Ele sorriu e tomou-a

pelo braço. — Tem medo dos elogios, não é, Melissa? Você está tão linda,

que acho que vou pedi-la em casamento. Escolho um lugar bem romântico, sob o luar, e me ajoelho a seus pés. . — Ora, Vance, não amole! — ela sorriu alegremente. Seguiram de carro pela pequena alameda, cercada de árvores; depois de acompanharem a praia por algum tempo e cruzarem uma pequena ponte, chegaram à entrada do hotel.

Quando estacionou o carro, Vance virou-se para Melissa e olhoua profundamente. Sua voz era séria e persuasiva. — E então, Melissa, já tem uma resposta? Será que é aquela que eu gostaria tanto de ouvir?

Ela meneou a cabeça e suspirou. — Não amo você, Vance… Quem sabe algum dia… — Bem, não é muito encorajador — ele disse, mantendo o bom

humor. — Não quero perder as esperanças, mas algo me diz que elas são em vão! Melissa olhou para ele e um sorriso brilhou em seus olhos. — Você é um rapaz maravilhoso, Vance… e, se isso serve de consolação, não existe outra pessoa na minha vida. — Já é alguma coisa — ele replicou —, apesar de eu já imaginar que não havia mais ninguém. — Tomou a mão de Melissa e beijou suavemente, num gesto galante e amigo. — Vamos, querida, vamos jantar e nos divertir. — Quero dar uma olhada neste homem que pretende estragar

nosso paraíso — ela falou, lembrando que aquela noite não seria tão alegre como tantas outras em que tinham vindo se divertir no hotel.

CAPÍTULO VI

Era inevitável que Melissa causasse sensação com aquele vestido que tanto realçava sua beleza. A confiança em si mesma, adquirida depois de deixar Chipre, só fazia ressaltar ainda mais sua fina elegância. Os olhares se voltaram quando ela entrou acompanhada por Vance. Ele se vestia com um terno esporte, de tecido leve e apropriado para o clima tropical da ilha. Sentia-se orgulhoso por acompanhar Melissa, e conduziu-a até uma mesa vazia, puxando a cadeira para que se sentasse. Acomodou-se em seguida e fez sinal para o garçom. Melissa olhou em volta. Não havia muita gente no bar do hotel, mas o restaurante, que podia ver através do arco que dividia as duas salas, já tinha várias mesas ocupadas. — Ele não está aqui — disse Vance, ao ver que Melissa

examinava o lugar atentamente. — Dizem que é um tipo estranho de homem, gosta de ficar isolado. Talvez esteja jantando no quarto. — Gostaria que Roger estivesse aqui — ela suspirou. — Ele diria

umas verdades para esse homem! — Ora, Melissa, não se preocupe muito com isso. Até agora, são

apenas rumores.. . — Os rumores sempre têm um fundo de verdade, você sabe

disso, Vance. O rapaz meneou a cabeça, concordando, e em seguida perguntou como Margaret reagira à notícia. — Ela tentou avisar Roger imediatamente, mas ele estava fora, cuidando de negócios. — Ele é um homem muito ocupado, como meu pai, e… — Vance

se calou abruptamente. Enquanto observava a mudança de expressão no rosto do amigo, Melissa percebeu que algo estava acontecendo. Virou a cabeça para trás. devagar, quase que contra a própria vontade, para ver o que perturbava Vance. Foi então que ela o viu. Seu corpo tremeu inteiro, diante da visão daquele homem bonito e másculo, parado perto da porta, olhando em volta à procura de um lugar para sentar. Seu olhar cruzou com o dela, e ele pareceu gelar também, enquanto ela se retraía, dos pés à cabeça.

A sensação foi rápida. Logo Melissa recobrou a naturalidade, lembrando que não tinha nada a temer, pois ele não significava mais nada para ela… nada! Ele se moveu, finalmente, na direção dela. Melissa virou o rosto, voltando-se para Vance. — Puxa, parece que viu um fantasma — Vance disse, sem saber o

que acontecia. — Você conhece esse homem? É ele o milionário de quem lhe falei. — Eu… sim, nós já nos encontramos antes — ela confessou,

conseguindo manter a voz calma. — Suponho que ele também me reconheceu. — Quanto a isso não há dúvida. Está vindo direto para cá. — Boa noite, Melissa. Que agradável surpresa encontrá-la aqui.

— Darius parecia ter superado a própria surpresa, e agia como se tivesse o total controle de suas emoções. Sua voz era tranqüila e calorosa. — Está passando férias? — Eu moro aqui — ela respondeu laconicamente, antes de

apresentá-lo a Vance, com voz educada e fria. Os dois homens apertaram as mãos e Vance, julgando-se obrigado a fazer aquilo, convidou Darius para lhes fazer companhia. Darius aceitou, com um leve inclinar de cabeça, e sentou-se na cadeira oposta à de Melissa, que estava vazia. — Que coincidência vocês já se conhecerem. — Vance fitou

Melissa com olhar significativo, como a dizer que ela poderia talvez interferir na possível construção do hotel. — De onde é que se conhecem? Desta vez foi Darius quem olhou para Melissa, e ela notou o sorriso levemente irônico que se insinuava nos lábios dele. Melissa já tinha imaginado, em certas ocasiões, que um dia poderia se encontrar com Darius. A princípio, achava que se sentiria humilhada e embaraçada, mas, com o passar dos anos, ganhou segurança suficiente para saber que poderia manejar a situação sem se abalar demais. Ao imaginar essas cenas, porém, não pensava que o tempo também passaria para Darius. Ela o via sempre como o jovem impetuoso com o qual se casara, o rapaz que tinha tanto orgulho de si próprio, e uma postura de arrogante superioridade. Percebia agora,

entretanto, que também para Darius os anos tinham trazido transformações! — Nós nos conhecemos em Chipre — ela ouviu Darius responder

a Vance. — Primeiro nos encontramos numa festa de noivado e depois num casamento. — Darius a fitava intensamente, sem revelar seus sentimentos. Melissa corou um pouco, mas logo se recuperou. O fato de ser filha adotiva de Roger há oito anos tinha lhe ensinado a lidar com qualquer situação sem perder a dignidade. “Sempre retribua o que lhe oferecem”, era o conselho de Roger, e ela o seguia agora. — Sim, lembro-me bem, Sr. Valaris. A noiva havia sido obrigada

a um casamento arranjado pelo pai. — Sua voz era tranqüila e sua boca chegava a esboçar um sorriso. — Ela tinha só dezessete anos e mal conhecia aquele que viria a ser seu marido. — Melissa esperava pela reação de Darius, o levantar das sobrancelhas, a irritação… O rosto dele, porém, mantinha-se inalterado, como uma máscara. — Obrigada a casar? — Vance estava perplexo. — Como isso é

possível? Está querendo dizer que o casamento era contra a vontade dela? — Totalmente contra a sua vontade! Em Chipre, na Grécia e em

alguns outros países, a mulher é considerada um ser inferior, sem importância. Desde o nascimento até a morte, ela está sob o controle de algum homem. No caso em questão, a garota foi obrigada ao casamento pelo pai. O homem que se tornaria seu marido a desejava, e então pediu-a em casamento ao pai. — E ela não conhecia o marido? — Vance perguntou, achando a

história difícil de se acreditar. — Sim, casou com um estranho — Melissa respondeu, satisfeita

com seu tom de voz. Era exatamente como se falasse de outra pessoa, e não de si própria. — Puxa vida! — Vance fitou Darius, espantado. — Esse tipo de

coisa ainda ocorre em seu país? São costumes muito atrasados, e não sei como conseguem sobreviver! — Infelizmente, eles sobrevivem — Melissa recomeçou a falar

quando o garçom, distraidamente, passou pela mesa sem perceber a presença de Darius. Vance imediatamente levantou para buscar um drinque para o convidado. Perguntou o que Darius desejava e se Melissa queria um outro drinque. Ela recusou, dizendo que beberiam vinho no jantar e não ia correr o risco de voltar tonta para casa. Vance sorriu e se afastou. Darius e Melissa ficaram sozinhos…

Eles se fitaram por um longo tempo antes que Darius quebrasse o silêncio: — Seu amigo não sabe que você é de Chipre? — Não, agora tenho o sobrenome de meu pai adotivo. Ele insistiu

para que eu o usasse e, para mim, era melhor assim. Não fazia sentido continuar cork o seu sobrenome, Darius. — Você mudou bastante… Ninguém diria que não é inglesa. — As pessoas mudam muito em oito anos! Você também mudou

bastante. — Alguns fios de cabelo ficando cinzentos, não é? — Ele deu de

ombros. — Sim, admito que mudei bastante… em vários sentidos. Melissa o fitou em silêncio, sem reparar no burburinho de vozes e na música que o conjunto tocava. Estava se lembrando mentalmente do homem que havia sido seu marido por um dia. Sim, ele estava mudado, sem sombra de dúvida. Além da expressão do rosto, que se tornara bem mais suave, suas maneiras haviam mudado, a maneira como se comportava… Parecia agora ser um homem culto e refinado, de gosto cultivado; Era mais polido quando falava, mais educado. Percebia-se um certo cinismo em sua voz, mas era algo controlado, que passaria despercebido a uma pessoa que não o conhecesse antes. Na superfície, era um perfeito aristocrata, um homem do mundo, urbano, muito diferente do jovem arrogante e pomposo que só conhecia a pequena ilha onde nasceu e sempre viveu, cujos habitantes seguiam costumes que pareciam absurdos aos povos mais adiantados. Darius vestia um terno muito elegante. Estava mais velho, mais maduro, e os traços de seu rosto mostravam isso. Suas mãos, aquelas que a havia machucado tanto há oito anos, eram agora mais suaves, pousadas sobre a mesa. Ele olhou a mão esquerda de Melissa, esperando talvez encontrar ali uma aliança. — Pensei que você tivesse se casado novamente — ele disse. — Ainda não encontrei ninguém por quem me apaixonasse. Os

lábios dele se curvaram cinicamente. — … Ainda romântica? E esse homem que está com você? — A

voz dele era tranqüila e indiferente, como se não estivesse de fato interessado em Vance e no lugar que ele ocupava na vida de Melissa.

— É um ótimo amigo — ela respondeu. — E você, Darius,

também não se casou novamente? — Não sabia por que perguntava aquilo, era como se algo lhe desse a certeza de que ele também não havia se unido a outra mulher. — Tenho estado muito ocupado desde a morte de meu pai, há

oito anos. — Oito… — Melissa franziu a testa. — Então, ele faleceu logo

depois que… — Não conseguiu terminar o que ia dizer e se calou. — Teve um ataque do coração depois de saber que minha esposa

tinha me abandonado. — Ele falava calmamente, não havia condenação em sua voz. — Você me culpa… pela morte dele? Para alívio de Melissa, Darius

meneou a cabeça, dizendo que não. — Acredito que cada um morre quando chega a sua hora… Meu pai teria morrido, de qualquer maneira. A única coisa triste é que faleceu sentindo-se muito infeliz.

Por causa do que fiz, Melissa pensou, mas nada disse. Ela não tinha remorsos de nada do que havia feito. Era sua vida que estava em jogo, seu futuro. O pai de Darius não significava nada para ela e, ainda que não desejasse que morresse infeliz, não podia agora sentirse responsável por isso. Olhou em volta, para ver se Vance já não estava voltando para a mesa. — Essas coisas que você diz que o mantiveram muito ocupado… elas o obrigaram a se afastar de Chipre? — Era uma pergunta, mas ela falava como se fizesse uma afirmação. — Deve estar claro para você que já viajei bastante. — Sim, tem razão. — Estive na América, por alguns anos. Antes disso, cheguei a passar algum tempo na Inglaterra e na França, além da Alemanha. — Parece que gosta bastante de viajar — ela comentou vagamente, pensando nas ironias do destino. Sim, ali estavam eles, encontrando-se numa chance em mil, numa pequena ilha no Atlântico… Um casal divorciado conversando sem hostilidades, de maneira quase amigável! — Bem, na maior parte das vezes fui obrigado a viajar por causa

de negócios.

Ela inclinou-se na cadeira, pegou o copo e levou-o aos lábios. Sem saber, Darius havia lhe dado condições para tocar no assunto, e agora procurava as palavras certas para dizer o que tinha em mente. — Você trabalha com compra e venda de terras? — disse, afinal, lembrando que Darius possuía extensas áreas em Chipre, ocupadas por grandes plantações de laranja. — Sim, tenho trabalhado com isso. Adquiri alguns terrenos por

aqui e pretendo construir um hotel, para vendê-lo mais tarde. Na verdade, já tenho uma proposta de compra, já existe um comprador interessado. — Nós… nós não queremos um hotel em Coral Cay — ela disse,

consciente de que nada que pudesse falar ou fazer o demoveria da decisão de construir o hotel. Esperava que, no entanto, Darius não conseguisse comprar Clearwater Cove. Ocorreu-lhe que podia persuadir Roger a comprar aquele terreno; isso significaria um ponto final nos planos de Darius ou de qualquer outra pessoa que quisesse construir ali. — Você disse que vive aqui…? — Sim, meus pais têm uma casa aqui. Os negócios de Roger são

em Miami, e temos uma casa lá também. Mas ele vai se aposentar, daqui a pouco, e pretende morar na ilha. Não queremos um hotel e as centenas de turistas que ele traria para cá. A ilha é muito pequena! — Ela fitou a face de Darius, impenetrável como a de uma estátua. Sabia que ele não abandonaria os próprios planos, apesar das objeções que os habitantes de Coral Cay pudessem fazer. — Como já disse, o negócio com o terreno já foi fechado. O hotel

será mesmo contraído. Melissa bebeu mais um gole do drinque, sentindo um nó na garganta. Darius continuava tão sem coração quanto antes, e todo o ódio que sentira por ele quando carregava seu filho no próprio ventre voltou com a mesma intensidade. Sim, ela o odiava e sempre o odiaria! Darius já era milionário e mesmo assim se dispunha a estragar aquele pequeno pedaço do paraíso para enriquecer ainda mais. — Só posso esperar que aconteça alguma coisa capaz de fazê-lo

mudar os planos — ela disse, fitando-o diretamente nos olhos. — Teria que ser um milagre… — Seu tom desesperançoso parecia não ter o menor efeito sobre Darius.

— Tal como eu morrer de repente… — ele disse com ironia. — É

uma chance bastante pequena, Melissa, e acho que não devia perder seu tempo esperando por ela! — Não desejo que você morra.

Darius a fitou com certa surpresa, mas ainda cético. — Apesar de dizer isso, tenho certeza que ficaria aliviada se

acontecesse um acidente que me tirasse a vida. Ela pousou o copo sobre a mesa, o gelo balançando dentro da bebida. — Se e isso que acha, não posso obrigá-lo a mudar de idéia. — Você se tornou uma mulher lindíssima, Melissa! — Ele mudou

de assunto subitamente. — Por que nunca se casou? — Já falei: ainda não encontrei um homem pelo qual me

apaixonasse a ponto de desejar o casamento. Sim, ele tinha mudado bastante, Melissa pensou mais uma vez, lembrando de sua fúria, na ocasião do divórcio, e da promessa de que sempre a consideraria como esposa legítima. Parecia que a promessa havia se desfeito há muito tempo, era óbvio que não a considerava mais como esposa. Sua total indiferença era a maior prova disso. — Você já tem quase vinte e seis anos.. . Pode acabar ficando

solteira. — Não sou como as garotas de Chipre, com seu medo crônico de

ficarem solteiras. Sou feliz assim como estou, minha vida tem sido muito boa desde que… — Ela se calou ao perceber que ia dizer uma indelicadeza —… desde que encontrei minha mãe! — completou, afinal, tomando o copo e bebendo mais um gole. — Quer dizer que está feliz assim? — Darius tinha um sorriso

incrédulo. — Você é do tipo de mulher que precisa se completar! Acho que, ficando solteira, não poderá conseguir isso, não? — Depende do que pensa ser, esse “se completar”! Meus pais e eu temos uma vida ótima, aqui na ilha. Temos muita sorte de viver em Coral Cay e… suponho que Roger será capaz de encontrar um outro lugar, tão lindo e tranqüilo como esta ilha — ela disse, notando que Vance estava de volta, trazendo dois drinques.

— Obrigado! — Darius agradeceu, quando o rapaz lhe ofereceu

um dos copos. — Vai jantar no restaurante, Sr. Valaris? — Vance perguntou,

antes de pensar que era uma pergunta tola. Afinal, ninguém se vestiria tão elegantemente se pretendesse jantar no quarto. — Sim, estava esperando um amigo que ia chegar de iate. Mas algo deve tê-lo atrasado.

Melissa fitou Darius com o rabo dos olhos. Não sabia por quê, mas algo dentro dela dizia que aquele homem que ele esperava era o dono dos terrenos em Clearwater Cove. Se pelo menos conseguisse entrar em contato com ele antes que Darius o fizesse… — Será que seu amigo chegará ainda hoje? — perguntou. Darius deu de ombros e respondeu que não sabia. — Mas é certo que amanhã estará aqui — ele acrescentou. — De qualquer maneira, terei de ficar na ilha por alguns dias. — Você tem algum negócio com ele? — Melissa perguntou,

tentando parecer o mais natural possível. O sorriso irônico nos lábios de Darius, no entanto, mostrava que ela não tinha tido sucesso. — Sim — ele respondeu laconicamente, antes de começar a ler o

cardápio. — Tenho negócios a fazer com ele. Melissa não sabia porque Vance tinha achado necessário convidar Darius para jantar com eles, mas o rapaz explicou mais tarde, dançando com ela, que ficou em dúvida, pois não sabia até onde Darius era amigo dela. — Mesmo que fosse um mero conhecido, teria sido indelicadeza

deixá-lo jantar sozinho, não é? Mas, você não parece muito satisfeita, Melissa. — É que não gosto muito dele — ela replicou, acrescentando em seguida que não tinha importância, que Vance não devia se preocupar. — Estou pensando se aquela pessoa que ele esperava não é justamente o dono de Clearwater Cove. Na verdade, tenho certeza de que é! — O Sr. Valaris falou algo a respeito do hotel, quando saí para

pegar os drinques? — Sim, ele vai mesmo construir lá. Já tem até um comprador

para quando ficar pronto.

— Que péssima notícia! Não consigo entender como obteve a

permissão para construir. Deve ter amigos influentes em algum lugar! — Não necessariamente. Acho que, mesmo que tivesse

influência, não teria conseguido a permissão se as autoridades decidissem preservar a ilha. Suponho que o desenvolvimento do arquipélago seja planejado tendo em vista o turismo. De qualquer maneira, deviam ter escolhido um lugar maior que Clearwater Cove! — Se o hotel for como me descreveram, enorme, com um centro de compras e outras atrações, você pode ter certeza que em dois anos a ilha vai se transformar num amontoado de edifícios! — É isso mesmo. — Oh, como ela odiava Darius! Que direito

tinha ele de chegar com seu dinheiro para arruinar um lugar tão lindo? Talvez alguma coisa acontecesse, algum milagre… Mas parecia algo bastante remoto, pois ele já tinha os terrenos e a construção devia começar dentro de algumas semanas. Mais tarde foi a vez de Darius convidá-la para dançar. Apesar de não poder recusar, Melissa o fitou de uma maneira que deixou claro que não apreciava aquilo nem um pouco. Já havia dançado com Darius antes… no dia do casamento… Ele a segurava com delicadeza, mantendo-se distante. Melissa estava surpresa por sua refinada consideração e por compreender e respeitar os sentimentos dela. Lembrou-se das palavras de Roger e Margaret, sobre a possibilidade de ele melhorar com o passar dos anos. Sim, Darius havia melhorado bastante sob vários aspectos, mas tinha uma sede de dinheiro que o tornava capaz de transformar aquela ilha adorável num inferno de turistas! Ela sentia vontade de chorar. Darius a tinha magoado uma vez e agora queria o destino que ele a magoasse novamente. E ela não podia fazer nada para impedir isso. Entretanto, era certo que faria todo o possível para que ele não conseguisse comprar os terrenos em Clearwater Cove! — Você está muito quieta, Melissa! — A voz era quase murmúrio,

próximo ao ouvido dela. — Não tenho vontade de conversar. — Você me odeia por ter vindo aqui e comprado os terrenos. —

Era uma afirmação e não uma pergunta. Honestamente, ela disse que ele tinha razão.

— Podia ter escolhido outra ilha — ela acrescentou, fitando-o nos

olhos. — Existem outras, muito maiores, onde o turismo já se estabeleceu. — Eu sei. Na verdade, comprei terrenos em várias outras ilhas,

também. — Você é um especulador, então? — Era incrível como a mudança havia sido enorme, ela pensou. Darius era agora um homem de negócios, que se movia com desenvoltura pelo mundo, sabendo muito bem o que fazia! — Como seu pai adotivo — ele disse, com tranqüilidade.

Eles permaneceram em silêncio, até voltarem para a mesa. Mais tarde, porém, ele a convidou para dançar novamente. Já tinham terminado o jantar e outro casal se juntara a eles, depois de serem apresentados informalmente a Darius. Eram amigos de Melissa e Vance, que economizaram durante anos para construir uma casa pequena, mas muito aconchegante na ilha. Vinham para Coral Cay várias vezes por ano. — Você tem amigos muito agradáveis — ele comentou, como se o

silêncio o incomodasse. Melissa se perguntava por que é que ele a convidara para dançar mais uma vez. Parecia que aquilo era resultado de uma estranha compulsão, sobre a qual Darius não tinha controle. — Está falando dos Grayson? Sim, são pessoas ótimas. Sempre

jantam lá em casa uma ou duas vezes, quando estão na ilha. O Sr. Grayson, assim que passar seus negócios para o filho, deverá morar aqui permanentemente. A Sra. Grayson também trabalha, mas como tem andado um pouco doente, ficará aqui descansando, quando o marido voltar para a Flórida. — Fale-me a respeito das outras pessoas que moram na ilha, ou

que costumam vir descansar aqui. Ela ergueu a cabeça para fitá-lo. Estava surpresa. — Você está mesmo interessado? — perguntou. Darius deu de ombros e disse que, pelo menos, era um assunto para conversarem.

Mas ela permaneceu calada e foi Darius quem novamente quebrou o silêncio, convidando-a para respirar um pouco de ar fresco lá fora. Melissa retraiu-se por um momento, mas logo relaxou. Não havia nada a temer, nem razão para não o acompanhar. De fato,

estava calor, e lá fora o ar devia estar fresquinho e perfumado pelas flores noturnas. Ela concordou e, tomando-a pelo braço, Darius conduziu-a para a varanda e o jardim do hotel, onde um pequeno caminho de pedras levava até a praia, pouco mais adiante. A lua estava alta, iluminando a noite com sua luz prateada. Ficaram ali, na varanda que dava para a praia, de pé e lado a lado, o silêncio tornando-se cada vez mais intenso, até que tudo começasse a ganhar um ar de irrealidade para Melissa, como se não passasse de um sonho, uma fantasia. Ela virou-se e deu voz aos próprios pensamentos, pois era impossível se calar. — Por que você está aqui e por que acontece tudo isto? Era

improvável que algum dia nos encontrássemos outra vez, a menos que eu voltasse para Chipre. E aqui estamos, neste hotel, nesta ilha tão pequenina, tão longe de casa. Como é que isso pôde acontecer e por quê? — Coincidência. — Foi a fria resposta dele. — Ela pode fazer coisas muito estranhas. — Eu culparia o destino — Melissa replicou, descansando as mãos sobre o ferro do gradil da varanda. — Culparia? — A triste verdade é que você mais uma vez cruzou meu caminho para me magoar.

Darius estava consternado, Melissa podia sentir isso mesmo sem olhar para ele. — Não vim aqui deliberadamente para ferir você, Melissa. — Ele

colocou a mão sobre a dela e se calou por um momento. Surpresa, ela recebia aquele toque suave como uma brisa. Dentro dela alguma coisa se retesou, algo perdido em seu inconsciente. — Não acredito que tenha sido deliberado, eu não o acusei disso. — Ela quase deu-lhe as costas, mas sua mão continuava sob a de Darius. — Você não pode ter sofrido muito por causa do nosso casamento

— ele disse inesperadamente, com um duro tom de voz que parecia trazer à tona antigos ressentimentos. — Não fomos casados tempo suficiente para isto!

Como ele sabia pouco, ela pensou, será que deveria contar-lhe? Dizer-lhe que tinha gerado um filho anormal, que não conseguira sobreviver? A idéia foi prontamente deixada de lado. Nunca apreciou machucar as pessoas e não tencionava começar agora. — … Você não pode dizer o quanto eu sofri ou deixei de sofrer,

pois os homens não sentem tão profundamente como as mulheres. — Sim, admito isso — Darius replicou. — O que acontece é que a ferida foi funda demais… — Ela virou-

se para fitá-lo, retirando a mão do gradil e do contato de Darius. Na meia-luz da varanda, podia ver o rosto dele de linhas duras e a expressão sombria dos olhos. Mas havia ali uma rara suavidade, algo atraente, na exata expressão da palavra. Ao olhá-lo, viu com surpresa e fascinação que uma veia palpitava sutilmente em seu pescoço, conferindo-lhe um ar de certa fragilidade, contraditória com o resto de sua face, seu queixo ligeiramente erguido, seus olhos que a observavam atentamente. Ele tinha mudado, Melissa pensou mais uma vez… e aquela imagem do jovem arrogante que ela guardou por tanto tempo já não fazia mais sentido agora. Restava somente um vazio no qual este homem não se encaixava. Era como se não pudesse ser ele o pai daquela criança que nasceu morta! — Acho que não teria conseguido superar tudo que aconteceu se

não fosse por Roger e por minha mãe… — A voz dela vacilou um pouco, quando percebeu que tinha mencionado primeiro o pai adotivo. É que não podia deixar de admitir para si mesma que sempre o amara mais do que a Margaret, não por causa do que ele fazia financeiramente por ela, mas sim por todo o carinho e afeição que lhe devotou, desde o princípio. — Eles foram maravilhosos e nunca poderei retribuir tudo que me fizeram. — O amparo de sua mãe chegou um pouco tarde em sua vida,

não é Melissa? — ele falava com voz áspera, e seus olhos eram frios. — Já pertence tudo ao passado, Darius. — Assim como nosso casamento, que também já pertence ao

passado… — Ele parecia subitamente cansado e Melissa perguntou se desejava voltar para o salão. Darius meneou a cabeça e apontou a praia silenciosa.

— Vou andar um pouco lá embaixo — disse, e, depois de um

momento de incerteza, acrescentou: — Você não desejaria vir comigo, eu suponho. Ela fez que não com a cabeça. A areia fina e delicada da praia, o mar tranqüilo iluminado pela lua, o som longínquo das ondas se quebrando nos corais. .. aquilo era para os amantes, o cenário ideal para romances e beijos. Meneou a cabeça mais uma vez, e disse que voltaria para a companhia dos amigos. Darius fez um pequeno gesto com a mão, de aceitação e despedida, e afastou-se vagarosamente. Ela queria se mover, mas não conseguia, como se alguma força a compelisse a ficar ali, até que aquele homem sumisse de vista. Darius parecia tão solitário, uma pessoa sem objetivo real na vida. Melissa perguntou-se como teria passado aqueles anos depois da morte do pai… Tinha entrado no mundo dos negócios e, com certeza, aprendido muita coisa a respeito da vida no Ocidente, algo que talvez o convencesse de que as noções que lhe foram ensinadas pelos antepassados já estavam fora de época há muito tempo. Talvez compreendesse agora que o casamento obrigado era muito cruel para uma mulher, que a idéia da superioridade do macho já não cabia no mundo atual. Teve a súbita consciência de que estava se interessando demais por aquele homem que sempre odiara. Se era solitário é por que merecia sê-lo! De qualquer maneira, sempre havia um remédio: ele poderia se casar. Deviam existir muitas mulheres loucas para se unir a um milionário. . e ele era muito bonito, verdadeiramente atraente. Algumas delas talvez até gostassem de suas maneiras dominadoras e autoritárias. Sim, ele poderia se casar, ter filhos, e não seria mais um homem solitário. Melissa seguiu-o com os olhos até que Darius parou subitamente, ao longe, e ficou olhando o mar. Um incontrolável suspiro escapou dos lábios dela… Por que deveria ter compaixão por Darius, depois de tudo que a fizera sofrer? Se ao menos ele não tivesse vindo para aquele lugar… Bem, já que estava ali, seria ótimo que terminasse o que tinha para fazer e partisse novamente! Ela virou-se finalmente, rumo ao salão, onde a luz das velas sobre as mesas e o perfume das flores nos vasos predispunham as pessoas a conversarem em voz baixa, ouvindo o som suave da orquestra. Quando pisou no salão, porém, algo a fez virar-se para fora. Darius continuava lá, uma silhueta escura contra o mar, um homem sozinho, desprendido do mundo…

Que estranha impressão ele causava agora! Era como se, nos negócios, fosse obrigado a tratar com as pessoas mas, na vida pessoal, preferisse estar a sós, sem a companhia de ninguém…

CAPÍTULO VII

Melissa estava ao telefone, às oito e meia da manhã seguinte, ligando para Roger. Sua mãe ainda não tinha levantado, disse que se sentia um pouco indisposta quando a filha foi até o luxuoso quarto azul e branco, perguntar se não a acompanharia no café. — Não, querida, vou ficar deitada um pouco mais. Ligue para seu

pai em seguida e diga-lhe para vir para cá imediatamente. Pensando sobre a reação da mãe, na noite anterior, quando ela lhe contou o que estava acontecendo, Melissa ficou perplexa por ver que tudo aquilo tinha perturbado mais a Margaret do que a ela mesma. Parecia que não era somente o fato de Darius estar na ilha e pretender construir um hotel que. a perturbava. Era como se existisse algo mais, um estranho temor. O que poderia ser? — Roger… — ela disse com a voz suave, que não escondia sua

afeição. — Estou telefonando por causa de algo muito importante — começou sem preâmbulos, explicando em seguida tudo o que estava acontecendo. — Darius já conseguiu comprar alguns terrenos, mas é Clearwater Cove que está nos preocupando. Ou pelo menos, está preocupando a mim, você sabe como gosto daquele lugar. Roger, será que não poderia comprá-lo antes que ele fizesse isso? Roger estava perplexo e custou a responder. Prometeu que faria o possível e estaria em casa na hora do almoço, desde que conseguisse um avião para levá-lo às ilhas maiores e, de lá, um barco para Coral Cay. — Você acha que o proprietário estará por aí ainda hoje? — ele

acrescentou, e pelo tom de voz era possível ver que se esforçava para lembrar quem era o dono de Clearwater Cove. — Darius ia se encontrar ontem com alguém que chegaria num iate, mas essa pessoa não apareceu. Tenho a impressão de que se trata do proprietário, mas não estou certa. Foi só uma intuição.

— Bem, nós logo saberemos. Estarei com vocês tão rápido

quanto possível. Depois de desligar o telefone, Melissa voltou ao quarto de Margaret, para falar sobre a conversa com Roger, e o que tinham combinado. — Tomara que ele consiga tomar o avião! Oh, nunca tinha percebido como é difícil chegar aqui num momento de urgência! — Margaret estava sentada na cama, muito bonita numa camisola leve e sedosa. Seu cabelo parecia imaculado, e era óbvio que havia se levantado para penteá-lo. — Bem, não há nada que possamos fazer para acelerar as coisas

— Melissa comentou. — Vou ver se o tal homem já chegou e procurálo para dizer que talvez tenhamos uma oferta melhor por Clearwater Cove, se ele não se importar de esperar um pouco mais. — É só uma possibilidade que este homem do iate seja o proprietário do terreno — Margaret falou com um suspiro, parecendo distante e arredia, imersa em pensamentos que não tinha a menor intenção de revelar à filha. — Sim, mas se minha intuição estiver certa, talvez ainda

consigamos impedir que Darius compre Clearwater Cove! Ela partiu pouco depois, dirigindo-se à marina onde aportavam os barcos e iates. Havia vários deles que não estavam lá no dia anterior, e Melissa franziu a testa enquanto caminhava pela passarela de madeira sobre a água. Era impossível dizer qual deles procurava e, de qualquer maneira, talvez nem fosse mesmo do proprietário de Clearwater Cove. — Então, nos encontramos de novo! — A voz suave e sem

expressão a fez virar-se rapidamente. Sem querer, corou, sentindo uma ansiedade no estômago. — Darius… você levantou cedo! — Sentia-se nervosa, intranqüila. Onde estavam a segurança e o autocontrole que tinha adquirido nos últimos oito anos? — Cedo? — Ele erguia levemente a sobrancelha. — Já são quase

nove horas! — Bem, em geral as pessoas estão tomando café nesta hora, pelo

menos aqui na ilha. — Você não está tomando café.

— Não… Bem, eu tinha algo a fazer. — Automaticamente seus

olhos passearam pelos iates. — O que era… ?

Melissa deu de ombros, indiferente. — Nada de importante… Nada que lhe interesse — acrescentou,

baixando os olhos por temer que Darius percebesse que estava mentindo. — Vou me encontrar com um amigo, mas ele ainda não chegou. — Seu amigo é o proprietário de Clearwater Cove? — Por que se referiu a Clearwater Cove? — Darius parecia interessado, observando-a com atenção. — Eu ouvi dizer que você está pensando em comprar este lugar. — Sua garganta estava seca, o que tornava difícil o ato de falar.

Darius continuava a fitá-la intensamente, com uma expressão estranha nos olhos. — Tem alguma razão especial pela qual não deseja uma casa em

Clearwater Cove? — Seu tom de voz era suave, mas havia nele algo diferente, . . algo que parecia muito profundo e íntimo. Era estranho olhar aquele homem, que possuía a face vigorosa de um deus grego. Como havia mudado! Melissa lembrava daquele jovem presunçoso e arrogante, que não conseguia compreender que ela não se sentia lisonjeada em ser pedida em casamento, ainda mais pelo filho de um milionário de Chipre. Naquela época, ele era odioso, tentando parecer imponente, quando na verdade era uma pessoa de espírito pobre. Mas, agora. .. suas maneiras, seus sentimentos davam mostras de uma sensibilidade refinada e cultivada. Ele parecia estar além dela, muito mais alto, e a idéia chocava Melissa. Ela falou num tom muito gentil e tranqüilo, e isso pareceu afetá-lo profundamente. — Sim, Darius, tenho uma razão muito especial para não querer

uma casa em Clearwater Cove. È um lugar que adoro, onde vou quando desejo estar sozinha e em paz com meus pensamentos… — Ela calou-se, pois um nó tomou conta de sua garganta, e as lágrimas quiseram explodir pelos olhos. Darius parecia comovido, mas disse que já tinha comprado o terreno em Clearwater Cove, e que seu amigo estava vindo só para concluir o negócio.

— É o homem que mencionei na noite passada — Darius admitiu. — É óbvio que você já tinha adivinhado. — Melissa virou-se,

queria esconder o que sentia. Darius ficou fitando suas costas por um longo tempo, antes de voltar a falar. — Estou construindo uma casa para mim. Melissa voltou-se rapidamente. — Para você? — Ela balançou a cabeça, desanimada. — —

Pretende morar aqui, em Coral Cay? — Sim, Melissa, pretendo. — Você não pode! — ela quase gritava. — Por que deseja viver

aqui? Está a milhares de quilômetros de casa! — Assim como você — ele lembrou com suavidade. Ela não tinha

resposta para aquilo, e Darius continuou. — Existe espaço suficiente para nós dois na ilha, Melissa. — Não, não existe! Não quero você aqui, tão perto! Eu o veria

todos os dias! Darius sorriu levemente, o que lhe deu um ar simpático e atraente. Melissa sentiu-se mal, principalmente pelo fato de reconhecer que ele era bonito. Devia estar sentindo ódio naquele momento, por tudo o que lhe fizera no passado, e pelo que continuava fazendo agora! — Sinto muito se a simples visão de minha pessoa a ofende

tanto, mas não posso mudar meus planos por causa disso. Pretendo morar aqui permanentemente e se isso não serve para você, então sabe o que deve fazer! — ele falou tranqüilamente e começou a se afastar, logo sumindo de vista entre os iates ancorados lado a lado na marina. Havia lágrimas nos olhos de Melissa quando ela voltou para casa e encontrou a mãe tomando um pequeno desjejum na varanda. — O que foi? — Margaret estava preocupada e se levantou

imediatamente. — Você parece pronta para começar a chorar! — E estou realmente pronta para começar a chorar! — Melissa, por favor, diga o que aconteceu.

— Darius vai construir uma casa para ele em Clearwater Cove.

Pretende ficar morando aqui! — Não… não pode ser verdade! Ele não pode viver aqui! Melissa

estreitou os olhos ao perceber como sua mãe estava profundamente perturbada. — Alguma coisa errada? — ela perguntou. — Quero dizer, você parece aterrorizada!

Margaret se recompôs, tentando não deixar transparecer s> que sentia. — Aterrorizada? — repetiu, os olhos abertos de espanto. — Por

que estaria aterrorizada, Melissa? — Não sei, mas você parecia com muito medo.

Melissa se lembrou imediatamente da noite anterior, quando contou a respeito de Darius e do hotel. Havia medo nos olhos de Margaret, sim, tinha certeza disto! Mas, o que poderia atemorizá-la? Darius certamente não faria mal a ela, pelo menos não poderia fazer mais mal do que à própria Melissa. — Tomara que Roger venha logo! — Margaret disse, sentando-se

de volta à mesa e passando manteiga numa torrada. Ela fitava Melissa, via seus cabelos brilhantes contrastando com a pele bronzeada, e o sorriso que se desenhou em seus lindos lábios ante a menção de Roger. Sua filha o adorava, Margaret pensou, com uma ponta de ressentimento por saber que não era ela alvo de tamanha afeição. Aquela sensação, porém, logo passou, pois era feliz em saber que a filha se dava tão bem com seu marido. — Ele vai chegar sim, eu tenho certeza — Melissa disse,

confiante. — Mas não poderá fazer mais nada, pois é tarde demais. Darius já comprou os terrenos! — É um desastre, Melissa, não poderemos continuar morando aqui quando ele mudar para cá. — Você tem razão, eu concordo. Roger vai sentir muito, já que

desejava viver aqui quando se aposentasse. Melissa ainda estava espantada com a atitude da mãe, pois, apesar de Margaret agora parecer fria e imperturbável, ela ainda sentia que algo profundo e indefinível a incomodava.

— É um mistério — disse para si mesma, enquanto entrava em

casa. Entretanto, o mistério tornou-se ainda maior quando Roger chegou. Pela primeira vez, em tantos anos, ele a tratou de forma apressada, quase fria. Depois de lhe dar um beijo e um abraço, entrou rapidamente em casa, onde Margaret o esperava. Afetada por estranhos presságios, Melissa preferiu sentar num banco do jardim, envolvida pelas plantas tropicais, altas e com folhas exuberantes. Alguns minutos depois, ouviu as vozes de Roger e Margaret, que passavam por perto. Pensou em juntar-se a eles e se levantou, mas ficou imóvel quando ouviu a mãe dizer claramente, num tom cheio de medo e temor: — Suponha que ele venha a descobrir… — é impossível, querida. Quantas vezes terei de lhe dizer isso? —

A voz de Roger era impaciente, ainda que nunca perdesse a suavidade. — é impossível pelo simples fato de que eles não vivem nesta parte do mundo. — Não nas Bahamas, mas na Flórida! Ê perto o suficiente para… — Tolice, querida. Você está se preocupando sem necessidade…

— Eles se afastavam e Melissa já não conseguia ouvir o que diziam. Sobre o que conversavam, afinal? Era certo que se referiam a Darius, e à sua presença em Coral Cay. Mas era impossível saber por que Margaret estava em pânico. Sim, pois era óbvio que ela estava em pânico! “Suponha que ele venha a descobrir…” Um suspiro escapou de

Melissa e, por um momento sentiu vontade de alcançá-los, somente para ver como reagiriam. No entanto, sabia que sua mãe ia negar tudo, pois aquilo era algo para ser dito somente nos ouvidos de Roger e de mais ninguém. Algum tempo depois, todos se juntavam para o chá, servido no terraço. Roger parecia preocupado e deprimido, e afirmava com decisão que não pretendia ainda vender Mangrove Lodge, pois achava que Darius nunca viria de fato se estabelecer em Clearwater Cove. — Ele é um especulador imobiliário e constrói para vender! Margaret não estava assim tão autoconfiante. — Darius mudou muito, pelo que Melissa me contou, e não consigo imaginá-lo dizendo uma coisa e fazendo outra.

— Talvez você tenha razão — Roger concordou, mas continuou

dizendo que não tomaria nenhuma atitude até saber exatamente como as coisas iam ficar. Melissa percebeu a agitação da mãe, que já tinha bebido o chá e agora parecia completamente absorvida nos próprios pensamentos. — Gostaria de viver em nossa outra casa, Roger — ela disse com

um suspiro. Sua voz era persuasiva, quando acrescentou: — Tenho certeza que Melissa se sentirá muito melhor longe daqui. — Melissa não tem motivo para se preocupar por enquanto! Esie homem já interferiu em sua vida antes, mas não conseguirá fazê-lo outra vez!

Como ele estava enganado, ela pensava quinze dias depois, após ter se encontrado involuntariamente algumas vezes e percebido, contra-feita e incrédula, que se tornava cada vez mais consciente dele como homem. Acompanhados por Vance, tinham jantado juntos mais três vezes, ele sempre a tratando com gentileza e suavidade. Convidava Melissa para dançar e sua conversa era sempre agradável e interessante. Será que estava tentando se redimir um pouco de tudo que havia feito a ela? Sem dúvida Darius concordava agora que casamentos arranjados eram uma injustiça contra as mulheres. Ele chegou a admitir uma vez, o que a surpreendeu. Mas isso era algo a se esperar do novo homem no qual ele havia se tornado após a morte do pai. A construção do hotel ainda não tinha começado, apesar de algum material já ter chegado à ilha, tal como cimento e tijolos. Um trator fora trazido num barco para derrubar as árvores e limpar o terreno. Os moradores estavam muito tristes com tudo aquilo e Melissa se desprezava ao reconhecer que o homem que causava toda aquela infelicidade a atraía, e muito! Falava para si mesma que devia estar odiando Darius, mas seus sentimentos eram muito diferentes de ódio. Vance a tinha pedido em casamento mais uma vez, e ela recusou. Gostava dele e Roger e Margaret disseram para que pensasse seriamente sobre o assunto. Roger era muito compreensivo e agora já nem falava mais nisso. Margaret, contudo, era mais persistente, e de vez em quando se lembrava da simpatia de Vance, dizendo que era um ótimo rapaz, muito educado e rico. — Ele é um ótimo partido, querida! — Margaret lia uma carta

enquanto falava. Melissa sentia que as palavras eram automáticas, ditas só para quebrar o silêncio. Estavam tomando o café da manhã no jardim, rodeadas de árvores e flores, o céu azul como safira, tornando o mar mais brilhante.

— Talvez seja um bom partido, mamãe, mas acontece que não

estou apaixonada por ele. — Hummm… — Margaret franziu a testa, preocupada. — O que foi? O que tia Lucie diz na carta? — Bem, dá as notícias, como de costume. O problema é Marcelle: quer vir passar uns dias aqui! — Roger não vai gostar nem um pouco dessa visita… — Ele prometeu que nunca mais a receberia em casa novamente,

mas não vejo como poderemos fazer para nos livrar dessa! — Margaret levou a xícara com café à boca, e bebeu um gole. — Ela foi impossível com você, da última vez, invejando-a o tempo todo. E mesmo antes de nos mudarmos, quando ainda estávamos no Inglaterra, lhe causou uma série de aborrecimentos, não foi? — Sim, você tem razão. — Melissa concordou com a cabeça.

Marcelle, desde o princípio, vira a prima como uma rival em potencial, na disputa pelo amor de David. O rapaz simpatizava enormemente com Melissa e prometeu que viria visitá-la em breve, quando ela se mudou para Miami. Mas isso jamais chegou a acontecer, e eles acabaram perdendo contato. Melissa pensou que talvez ele voltasse a atenção para Marcelle, agora que ela estava longe. Porém, os dois continuavam solteiros. — Vou consultar Roger — disse Margaret. — Receio que

tenhamos de receber Marcelle por aqui, pois não há um motivo razoável para impedi-la de vir! Roger chegou no fim de semana e foi informado do conteúdo da carta. Era contra a visita de Marcelle; no entanto, teve de concordar que seria impossível escrever de volta a Lucie, dizendo que a filha não deveria vir. — Ela chegará no barco do correio, na sexta-feira — Melissa ouviu a mãe dizendo para Roger, alguns dias depois. — Melissa poderá ir encontrá-la e … — Preferia que você viesse comigo — Melissa interrompeu-a,

juntando-se a eles na varanda. — Não me sinto à vontade quando estou sozinha com ela, apesar de não ser mais ingênua e insegura como eu era quando a conheci. Da última vez que ela esteve por aqui, nos demos muito mal, vocês se lembram…

— É o jeito dela que me incomoda — Roger disse. — Em minha

opinião, não há nada favorável a respeito de Marcelle, nada que a recomende! — Exceto sua beleza — Margaret explicou. — Ela é de fato uma

mulher muito bonita, até mesmo você tem de concordar com isso, Roger! — A beleza dela é só superficial — ele disse com decisão, fitando

Melissa com um olhar afetuoso. — Melissa é bonita por dentro, também! Ela corou levemente, mas não se sentiu embaraçada. Estava acostumada aos elogios de Roger, que nunca se cansava de fazê-los. — Você tem visto Darius? — Margaret perguntou, mudando de assunto. — Sim, eu o vi várias vezes esta semana. — Desta vez ela corava fortemente, e parecia mesmo embaraçada. Tinha que admitir o que sentia, e se perguntava por que o ódio tinha se dissolvido e agora suas emoções se manifestavam de uma forma que ela absolutamente não desejava. — Ele costuma conversar com você? — Sim, naturalmente. — Melissa tentava parecer natural, mas sabia que ficava cada vez mais vermelha. Não havia contado a Margaret nem a Roger que tinha jantado com ele diversas vezes, que tinham dançado juntos. — É impossível ignorarmos a presença um do outro numa ilha tão pequena como esta! — Eu ainda não o encontrei nem uma vez — Margaret replicou,

com voz aparentemente tranqüila. O medo que ela parecia sentir quando falavam de Darius tinha sumido agora. Mas Melissa ficara muito impressionada com a reação da mãe, a ponto de tentar obter mais informações de Roger. Entretanto, suas tentativas haviam sido infrutíferas. — Eu também não o encontrei ainda — era Roger quem falava —

. .. e nem desejo vê-lo! Ele vai destruir esta ilha e ninguém pode fazer nada para impedir isso. Melissa nada falou mas, naquela mesma noite, quando ela e Vance se encontraram com Darius, ele disse algo estranho. — Estou começando a gostar muito desta ilha, e sinto que ela

não deve ser estragada.

Melissa fitou-o incrédula. Darius não parecia mais o insensível homem de negócios. — Você quer dizer que… que talvez reconsidere a decisão de

construir o hotel, apesar de tudo? — A esperança e a emoção a faziam falar depressa, ainda que sua voz tivesse a mesma doçura de sempre. Darius parecia estranhamente afetado pelo jeito de Melissa e por um longo tempo ficou perdido nos próprios pensamentos… Será que gostava dela? O pulso de Melissa acelerou quando a pergunta assomou à sua mente. Sim, lá dentro, na parte mais inconsciente de seu ser, ela desejava que Darius gostasse dela! Era incrível, difícil de acreditar, mas era verdade! — O hotel que pretendo construir já está vendido, há um contrato

assinado. — A voz dele era séria e grave, ainda mais atraente aos ouvidos de Melissa. Vance e Melissa se entreolharam, e parecia que o rapaz ia dizer alguma coisa. Neste momento, porém, um homem se aproximou e,~ depois de se desculpar com os demais, pediu a Vance que o acompanhasse por uns instantes. Sem poder recusar, ele partiu com o conhecido, deixando Melissa e Darius a sós. Ela tomou um gole do drinque que bebia. O bar estava calmo e tranqüilo, com uma atmosfera serena. Foi Melissa quem falou, finalmente, quebrando o silêncio que se alongava, sem contudo tornar-se perturbador. — Você está determinado, então, a construir o hotel?

Darius não respondeu imediatamente, seus olhos castanhos se estreitando, como que para fitá-la melhor. — Como disse, o hotel já tem um comprador. Eu perderia uma

considerável soma de dinheiro se quebrasse o contrato que assinamos. Ela calou-se, considerando as palavras de Darius, e tendo que concordar que a decisão de não mais construir o hotel seria uma tolice, do ponto de vista dos negócios. Tinha certeza de que se Roger estivesse na mesma posição, nunca mudaria de idéia. — Clearwater Cove — ela murmurou, decidindo deixar de lado a

questão do hotel. — Você pretende mesmo construir a casa? — Sim, Melissa, estou decidido quanto a isso. Você disse uma vez

que aquele é seu lugar preferido aqui na ilha, não é? — A voz de

Darius era grave e compenetrada, e ela o fitava intensamente, tentando ler o que seus olhos diziam. — Sim, é o meu lugar favorito — ela disse com um suspiro. — Prometo que não vou estragar Clearwater Cove, Melissa. — Qualquer construção estragaria aquele lugar. — Não concordo. Pretendo construir uma casa muito bonita. — Para você mesmo?

Darius olhou Melissa como se examinasse cada pequeno traço de seu rosto, de seus olhos, seus cabelos. Pareceu uma eternidade antes que ele respondesse. — Sim, para mim… a princípio! — A princípio? — Posso me casar qualquer dia desses, não é? — Ele tomou o

copo e bebeu um gole. Ela viu-se pensando na possibilidade de ele um dia se casar e trazer a esposa para Coral Cay, para morar naquele lugar que considerava o mais lindo da ilha… Uma dor lancinante apertou-lhe o coração. O bar já não era mais tranqüilo e sereno, as luzes pareciam se confundir em seus olhos… Lá fora, o jardim com suas plantas iluminadas parecia agora triste e desolado, o mar ao longe tinha perdido toda a beleza e era somente uma grande mancha escura… Darius percebeu prontamente a mudança em Melissa, e apressou-se a repetir que não destruiria a beleza de Clearwater Cove. Ela meneou a cabeça quando ele terminou de falar. — Não é isso… — Não? O que é, então? — Os olhos dele a fitavam com uma

intensidade desconfortável. Ela brincava com o próprio copo, balançando a bebida dentro dele. Desejava que Vance voltasse logo para que aquela conversa não continuasse. — Fiquei deprimida… a respeito da casa que você vai construir. — A casa? Foi só por isso que se sentiu deprimida?

— Claro que sim! Que outro motivo poderia haver? — O medo de

que ele adivinhasse seus sentimentos fazia sua voz ficar vacilante. Um leve sorriso surgiu nos lábios de Darius. — Nenhum motivo… você tem razão.

Vance não tardou a voltar, desculpando-se pela ausência e explicando que o amigo dele tinha estado muito doente. O médico o aconselhou, então, a descansar num lugar tranqüilo, e ele veio para as Bahamas. — Decidiu vir para cá, pois sabia que meus pais possuíam uma

casa aqui e que sempre costumo passear na ilha — Vance continuava explicando, já sentado à mesa com eles. — Ele é um pouco tímido e reservado e não quis juntar-se a nós, para um drinque ou para o jantar, mais tarde! Vance parecia embaraçado e Melissa, para espanto próprio, ouviu-se dizendo: — Quer fazer companhia a ele, Vance? Se desejar, não se

preocupe conosco. Darius e eu podemos jantar sozinhos… — Ela olhou para o ex-marido, interessada em sua reação. O rosto dele era neutro e impassível, quando replicou: — Sim, não nos incomodaremos se você preferir fazer companhia

a seu amigo. — Estão certos disto? — Claro que sim, Vance. — Bem, então muito obrigado. Mas eu a levarei de volta para

casa, Melissa. — Não se incomode — Darius apressou-se em dizer. —

Caminharei junto com ela até sua casa. Provavelmente, ficaremos até bem tarde, pois dançaremos um pouco depois do jantar. Vance logo se despediu e Melissa virou-se para o homem que sempre imaginara odiar para o resto da vida. — Você tem certeza que… que deseja jantar a sós comigo?

Havia um quê de insegurança em sua voz, que fez Darius sorrir.

— Fico muito feliz em poder jantar a sós com você, Melissa!

Não havia dúvida de que ele estava sendo sincero. A vida pareceu ganhar corpo dentro dela, uma energia quente e vital invadiu-lhe o ser. Seus olhos brilharam e um lindo sorriso tomou conta de seus lábios, iluminando ainda mais o rosto de menina… — Como você é jovem, Melissa… jovem e linda — Darius comentou, sem razão aparente.

Jantar a sós com ele acabou se revelando algo extremamente agradável. Era a companhia perfeita, com uma conversa interessante e inteligente … O ambiente era novamente acolhedor, as velas e as flores sobre a mesa davam um encanto especial ao jantar. A comida, típica das Bahamas, nunca esteve tão deliciosa e lá fora a noite parecia mais uma vez ganhar alegria e perfume. — Você está tão quieta, Melissa. — O comentário de Darius a fez

sorrir. — É que estou gostando tanto de tudo isto! Esta ilha não é

realmente maravilhosa? — Sim… Mas você já amou Chipre também, não é? Uma sombra

passou pelos olhos de Melissa. — Sim, Darius, há muitos anos. E agora, quando olho para o passado, vejo o quanto de minha vida eu perdi naquele lugar. — Será que perdeu a capacidade de se apaixonar, Melissa? Alguma coisa na maneira como ele perguntava aquilo a fez indagar: — Você ainda pensa que o amor é algo que só diz respeito às

mulheres.. . que para os homens não faz sentido? — Eu disse isso algum dia? — ele perguntou, bem-humorado. —

… Sim, sei que disse. Mas, Melissa, não acredito que o amor seja uma coisa que só diga respeito às mulheres! O coração dela acelerou como louco, como se quisesse explodir. Mais uma vez Melissa se perguntava se seria possível Darius se apaixonar por ela… Pensou em Roger e Margaret e imediatamente afastou a idéia que lhe viera à cabeça, a idéia de que pudessem se apaixonar e casar. Não, isso não aconteceria! Traria enorme infelicidade para aquelas pessoas que tinham cuidado dela e a amparado naqueles tempos negros, quando carregava no ventre uma

criança que não desejava, cujo pai ela odiava mais do que permitiam suas próprias forças! — Vamos dançar, Melissa? — Darius já tinha levantado e agora a

conduzia à pista de dança. Dançaram, Melissa sentindo o prazer de seus corpos que se tocavam. Estava embriagada pelo aroma da colônia que Darius usava, e que lembrava os bosques de Chipre, quando era verão e o vento trazia das montanhas o cheiro dos* pinheiros. — Você nunca teve outra pessoa, Melissa? Um namorado, uma

coisa marcante que tenha acontecido em sua vida? Ela meneou a cabeça, olhando para cima, para fitá-lo nos olhos, enquanto corava levemente, o que a deixava ainda mais bela. — Não, Darius, nunca existiu outra pessoa. — Ela se sentia feliz em poder dizer aquilo com franqueza, mas se perguntava se o mesmo teria acontecido com ele. Era provável que não. Darius tinha as mulheres que o serviam na cama antes do casamento, e devia continuar com elas. Os gregos cipriotas possuíam a fama de ser a raça mais sensual e calorosa do mundo. — Este homem… Vance… ele não é especial para você? — Sim, ele é uma pessoa especial para mim, mas não da maneira

como você está pensando. Darius a conduziu para o terraço, onde a luz era mais fraca. Lá dentro, vinham os sons das músicas alegres tocadas pela pequena orquestra. — Você nunca pensou em se casar? — ele perguntou, depois de

uma breve pausa. — Acho que já lhe disse que ainda não me apaixonei por ninguém. — A voz dela era vacilante, pois não tinha mais a certeza de que nunca esteve apaixonada por um homem. — Aquele que ganhar o seu amor será um homem de muita

sorte, Melissa — Darius disse inesperadamente, e ela olhou para ele mais urna vez. Uma sensação estranha lhe assomava ao coração, algo indefinível, um misto de calor e desejo. — É estranho de ouvir, vindo de sua parte — ela murmurou. — Sim, compreendo que ache estranho, mas é a pura verdade.

— Um elogio… — Foi essa minha intenção — ele disse, e em seguida a guiou em

direção ao fim do comprido terraço, onde afinal pararam. Darius a fitava intensamente, como que penetrando dentro dela através de seus olhos. Cada nervo de Melissa se retesava, uma sensação próxima daquilo que devia ser o êxtase. Ela sentia que algo novo nascia dentro de si, um desejo que era como um sonho, algo nebuloso como uma fantasia. Nada mais diziam, e agora já se aproximavam da praia. Gentilmente, Darius fez com que ela sentasse numa grande pedra de coral e se ajoelhou para lhe tirar as sandálias. — Ande descalça — ele disse. — A sensação da areia fina nos pés

é deliciosa. — Eu sei… já fiz isso muitas vezes… — Suas mãos se

encontraram e agora começavam a caminhar. Darius carregava as sandálias dela. Isso nunca teria acontecido em Chipre, onde os homens não fazem gentilezas com as mulheres, como abrir uma porta ou carregar algo pesado para elas. — Você parece mesmo alguém que nasceu deste lado do mundo,

Darius. — Espero que a mudança em mim tenha sido para melhor. — Ora, não seja humilde! — ela falou, sem perceber o tom

irritado que usava. Não gostava que os homens fossem humildes, nem arrogantes. Existia um meio termo, acreditava. — Não estou sendo humilde, Melissa — ele replicou rapidamente.

— É que aprendi muito durante estes oito anos. Espero ter mudado para melhor neste tempo todo. Era tolice, mas aquelas palavras a tinham feito chorar. Darius esperou enquanto ela retirava um lenço e enxugava o rosto. Ele não disse nada e recomeçaram a caminhar pela praia deserta, onde os únicos ruídos eram da brisa soprando nas palmeiras e das ondas que se quebravam contra a barreira de corais, ao longe. Darius então começou a contar a respeito da casa que pretendia construir. Ela seria erguida no topo da colina, e teria assim uma das vistas mais lindas das Bahamas. Seria como uma das antigas casas típicas da região, construídas com pedras que vinham do mar e que, com o tempo, ganhavam um tom amarelado.

— Como as construções da antigüidade, em Olímpia — ele

acrescentou, com um de seus raros sorrisos. — Mas acho que você não as conhece, não é? — Não, nunca viajei pela Grécia. — É um país maravilhoso. Você deve conhecê-lo, algum dia. Será

que era sua imaginação ou Darius tinha dito aquilo com uma certa esperança, como se cultivasse a idéia de um dia levá-la a viajar pela Grécia? — Conte-me mais a respeito de sua casa… — ela sugeriu com um

sorriso. — Você não parece mais zangada por eu construir em Clearwater

Cove. Ela ficou em silêncio por um minuto, caminhando e sentindo a areia sob seus pés. Era como caminhar sobre plumas, pensou. — Não — murmurou afinal —, não estou mais zangada… Acho

que nem tenho esse direito, o terreno é seu, e portanto pode construir o que quiser dentro dele. Como disse, não vou estragar o lugar. — Agora tenho certeza disso, Darius. — Obrigado por confiar era mim. — A voz dele era serena e foi

com um sorriso nos lábios que ele acrescentou: — Não vou desapontá-la. Pela maneira como falava, era como se dissesse… “não farei isto, desta vez!” Melissa estava emocionada, gostaria que ele a tomasse nos braços… a segurasse junto de si… Que loucura tudo aquilo, todas aquelas sensações! Ela se recuperou rapidamente, voltando ao assunto da casa, indagando a respeito do tamanho. — Quero que tenha uns quatro ou cinco quartos, um escritório e

os aposentos tradicionais… Haverá uma piscina, rodeada de plantas e flores… Quero que seja moderna por dentro, mas pareça simples e antiga, vista do lado de fora! — Ele fez uma pausa e Melissa nada disse. Estava refletindo sobre a dramática transformação na personalidade de Darius… Antigamente, nunca teria desejado construir algo tão belo como a casa que queria ter em Coral Cay! — … Quero muitos pátios e jardins. Já contratei um paisagista em Miami.

Os jardins serão feitos durante a construção da casa, para que as plantas já tenham crescido quando ela estiver pronta! Caminhavam mais devagar e agora já estavam distantes das luzes do hotel. Melissa começou a se perguntar o que sua mãe diria se soubesse o que a filha fazia naquele momento. Roger também ficaria desapontado e triste. Seu comportamento não lhes traria felicidade e seu impulso era o de sair correndo, afastar-se daquele homem que tinha causado tamanha revolução em sua vida e na de seus pais. Mas ela não correu, nem fugiu, não seria capaz de fazer isso. Não só desejava estar com Darius, como tinha absoluta certeza de que o magoaria se fizesse isso. E Melissa sabia que jamais seria capaz de magoá-lo! — Sua casa parece grande demais para uma pessoa — ela falou,

finalmente, pois precisava quebrar o silêncio e afastar aquele sentimento de culpa e deslealdade para com Margaret e Roger. — Eu lhe disse que posso me casar um dia desses. — Darius

parou e a fitou nos olhos, a face iluminada pela luz da lua. Mas sua expressão não revelava o que poderia estar pensando. Será que tinha alguma mulher em mente, alguém que se casaria com ele e viria morar em Clearwater Cove, o lugar da ilha que ela mais gostava? Melissa sentiu uma terrível angústia invadir-lhe o coração. Não poderia viver ali se Darius se casasse e trouxesse a esposa para a ilha!… E, é claro, havia somente uma razão pela qual não poderia suportar essa situação… Ela afastou o pensamento da cabeça. Não, não podia se apaixonar por Darius, isso jamais deveria acontecer! — Vamos voltar — ela disse, estendendo as mãos para pegar as

sandálias. — Quero ir para casa, Darius. — Sim, como preferir… mas não ponha as sandálias ainda. — Ele

fitou os pés de Melissa, semi-escondidos pela saia comprida e leve que ela usava. Em seguida, voltou a olhar para aquela que por um dia havia sido sua esposa. E, sem lhe dar chance para reagir, inclinou-se levemente e a beijou nos lábios, com infinita doçura e gentileza.

CAPÍTULO VIII

Marcelle estava sentada no gramado do jardim, lendo um jornal. Melissa, da janela do quarto, podia ver a prima, que não sabia que era observada. Fazia uma semana que ela havia chegado e, apesar de tratar Melissa de urna maneira amiga e cordial, era óbvio que tudo não passava de fingimento. Pior ainda é que Marcelle chegou dizendo que ficaria apenas uns quinze dias e agora já dizia que continuaria ali por mais tempo. A decisão de ficar em Coral Cay tinha sido tomada depois que ela conheceu Darius, foi o que Melissa concluiu. Marcelle parecia, ou fingia, não perceber que não era bem-vinda naquela casa. — Onde está você, Melissa querida? — Era Margaret quem chamava, falando no corredor. — Estou aqui, em meu quarto. Venha para cá.

Margaret não tardou a aparecer na porta e ficou parada um instante, fitando a filha. — Você fica tão linda com este vestido, querida, tão atraente! Já lhe disse que devia usar roupas verdes com mais freqüência: caem tão bem em você! — Ela caminhou até a poltrona perto da janela e, antes de sentar, olhou para fora e viu a sobrinha, na grama. — Gostaria que Marcelle saísse para passear de vez em quando… Está sempre por perto, em todos os lugares da casa! — Margaret deu de ombros. — Bem, ela veio para descansar, então é justo que o faça. Tenho pena de Roger, que precisa fazer um grande esforço para aturá-la! — Roger disse que iremos jantar no hotel esta noite — Melissa

falou e fez uma pequena pausa, antes de continuar. — Darius estará lá, mamãe, e Vance também. Tenho certeza de que ele convidará Darius para juntar-se a nós. Espero que não se incomode. Margaret franziu a testa, um ar de insatisfação. — Bem, não é a primeira vez que sou obrigada a suportar a

presença dele… Contudo, é sua atitude que não compreendo, Melissa. Na semana passada, quando fomos ao hotel, foi com surpresa que descobri como vocês haviam se tornado amigos! Roger também ficou chocado… De qualquer maneira, dissemos isso para você quando voltamos para casa, portanto tem consciência de como desaprovamos essa amizade com Darius. Sempre achei que depois daquela gravidez, você preferiria morrer do que ter este homem como amigo! Além do mais, veja só o que ele está pretendendo fazer

aqui! A maioria dos residentes terá de procurar outro lugar se quiser continuar a viver em paz. — Ele mudou muito — Melissa a interrompeu. — Com relação ao

que pretende fazer… bem, a construção do hotel ainda não foi iniciada, não é? — O que quer dizer com isto? Acha que Darius poderia mudar de

idéia? — Não sei, ele tem me perguntado sobre as pessoas que moram

aqui. Já conheceu os Grayson e sabe que pretendem viver aqui quando se aposentarem. Sabe também do sacrifício que significou para eles economizar para construir a casa aqui na ilha. Sabe também que qualquer pessoa que desejar vender propriedades aqui nunca conseguirá um bom preço, por causa do projeto do hotel e dos turistas que virão quando ele estiver pronto. — Melissa fez uma pausa, pensando no interesse que Darius tinha demonstrado a respeito dos outros residentes. Havia também os Philpots, por exemplo, donos de uma casa pequenina, comprada de nativos da ilha. Eram aposentados e já moravam lá há seis meses. Completavam a reforma da pequena casa na medida de suas possibilidades financeiras, que eram limitadas. — …Darius tem andado por todo lado, conhecendo a vila e os nativos. Achou Coral Cay um local lindo, que nunca deveria ser transformado. Disse que a simpatia e amabilidade das pessoas daqui ainda eram maiores do que em Chipre! — Ele disse isso? Pelo visto, Darius realmente mudou muito! — Sim, é uma pessoa completamente diferente hoje em dia. Mas

você, com certeza, já tinha notado isso, não é? — Bem, não o tenho visto muito. Outro dia nos encontramos

numa loja, mas pouco fizemos além de nos cumprimentarmos como pessoas civilizadas. Eu não gosto dele, nem um pouco. E, se quiser agradar a mim e a Roger, então é melhor evitá-lo. Melissa engoliu em seco. Agora já admitia que estava apaixonada pelo ex-marido. Como ou porque este sentimento tinha nascido, era um completo mistério para ela, pois, pela lógica, Darius seria o último homem pelo qual se apaixonaria! — Tenho um pressentimento de que ele vai desistir de construir o

hotel — ela disse, mudando de assunto, pois não tinha o que comentar a respeito do que sua mãe havia dito. — Ele perderá muito dinheiro!

— Sim, eu sei. Darius é um homem de negócios, mas… Bem,

tudo que sinto é que ele já não está tão disposto a levar adiante a construção do hotel. — E com relação à casa em Clearwater Cove? A construção já foi

iniciada e está indo rápido. Acho que ele não poderá mais mudar de idéia a respeito dela, não é? — Ele nunca decidiria parar com a construção, pois está muito

entusiasmado com ela. — Assim como eu, Melissa pensou. Darius tinha lhe mostrado os desenhos e ela sabia que a casa seria a mais linda de toda a ilha, mais linda ainda que Mangrove Lodge. Marcelle estava presente quando Darius veio discutir mais uma vez o projeto da casa com Melissa. Havia decidido colocar mais um quarto, cuja janela dava para um recanto especial, e Melissa ficou encantada. Marcelle mostrou um interesse incomum por Darius e pediu que ele a levasse para conhecer a casa. Melissa não pôde ir junto, pois tinha hora marcada no cabeleireiro, e Marcelle foi sozinha com ele. Quando voltou estava estranhamente quieta, e disse para a prima que ela e Darius haviam se dado muito bem. — Ele é incrível! E que enorme coincidência vocês se

reencontrarem aqui, já que se conheciam de Chipre, não é? — Foi só o que Marcelle comentou. — Não posso acreditar que Darius pretenda morar sozinho naquela casa — Margaret falou, interrompendo os pensamentos da filha. — Certamente, está construindo e pensando em vendê-la depois.

Melissa nada comentou. Sua mente estava caótica. Não tinha ainda sido capaz de decifrar o que Darius sentia por ela. Sim, sabia que desejava ser seu amigo… mas, somente isso? Aquilo era uma pergunta para a qual não encontrava resposta. Às vezes, ficava com a impressão de que ele poderia estar se apaixonando… mas era só uma impressão… E mesmo que isso acontecesse, será que teria vontade de casar com aquele homem que a magoou tão cruelmente há oito anos? Pensava, também que Darius agora era um homem diferente, que 86 nada faria para magoá-la e jamais adotaria sua antiga postura arrogante. A questão é que havia outros problemas, muito maiores que esses. Precisava pensar em Roger e em sua mãe, que ficariam horrorizados com um casamento entre Darius e ela. Poderia significar um rompimento com eles, coisa que jamais suportaria.

— Talvez ele pretenda se casar — Melissa disse, afinal, quando

Margaret pigarreou de modo a mostrar que esperava algum comentário da parte dela. — Não acredito que esteja construindo a casa para vendê-la depois. — Casar? — Margaret repetiu, levantando as sobrancelhas. —

Não gostaria de estar na pele da pobre mulher que casar com um homem como aquele! Melissa usava um vestido comprido, de algodão fino. Tinha também brincos de ouro, que combinavam com o bracelete. O vestido era branco é ressaltava sua pele delicada e bronzeada. Marcelle estava mais sofisticada, com uma saia comprida de cetim. Quando a viu, Roger a observou com desgosto e, na primeira oportunidade em que ficaram a sós, Margaret comentou com a filha: — Imagine usar uma roupa daquelas! É apropriada para um hotel

de luxo, em Londres! Será que ela não olha em volta e percebe como as outras pessoas se vestem? — Acho que fica muito bem em Marcelle. — Acha mesmo? — Sim… é como ela, se você compreende o que estou dizendo.

Margaret nada comentou, pois Roger já tinha se juntado a elas, pronto para levá-las ao hotel. Os aperitivos foram servidos na sala de drinques, onde já se encontravam Vance e Darius. Melissa percebeu a maneira como o olhar do ex-marido percorria seu corpo adorável, num misto de admiração e orgulho. As bebidas logo foram servidas e Marcelle, tentando ser o mais cativante possível, dirigiu-se a Darius. — Foi tão bom conhecer uma pessoa como você, Darius. Vai ficar

aqui no hotel permanentemente? — Não, não vou… — ele respondeu com educação. — …é só por algum tempo, até que minha casa fique pronta. — Ele fitou Melissa e um sorriso parecia se esconder em seus lábios. Ela corou levemente e abaixou a cabeça. Ninguém podia suspeitar! E muito menos seus pais! Sentia que os olhos de Marcelle acompanhavam tudo o que acontecia, assim como os de Vance.

— A casa é linda e grande demais para alguém morar nela

sozinho — Margaret comentou. — Você vai terminar se casando, eu

suponho. — Talvez — Darius replicou friamente, tomando a taça para beber

um gole. — Tudo depende… — Depende? — Marcelle insistiu. — Depende de alguém me querer. — Ele olhava para Melissa

novamente. Roger interrompeu a conversa, num tom seco e ríspido, ainda que educado. — Será que pode me passar um dos cardápios, Vance?

Logo decidiram que o jantar seria à base de frutos do mar, e pediram alguns pratos típicos das Bahamas. A mesa ficava ao lado de uma grande janela, pela qual entrava uma brisa perfumada. Dali se avistavam os jardins do hotel e, mais ao longe, a praia e o mar. Marcelle conversava animadamente, em especial com Darius, e era óbvio que tentava lhe chamar a atenção. Mas foi com Melissa que ele dançou primeiro. — Você fica tão linda com esse vestido branco… E mais linda ainda quando cora ao ouvir um elogio — ele disse, assim que começavam a dançar.

Melissa nada comentou, os pensamentos que lhe ocorriam provocavam grande confusão no seu coração. Sabia agora que Darius estava prestes a se apaixonar, mas não havia futuro para eles, mesmo reconhecendo que poderia retribuir ao amor dele. Mais tarde, ela observava Darius e Marcelle dançando e, ao cruzar o olhar hostil da prima, veio novamente à sua memória aquela tarde em que tinha desmaiado na frente dela. Não podia explicar porque se lembrava daquilo agora, nem aquele estranho pressentimento de que devia ser cautelosa, de que algum perigo se aproximava… — O telefone está tocando, quer que eu atenda? — Marcelle estava no terraço e falava com a prima, sentada no jardim.

— Sim, por favor. Mas acho que deve ser para Roger. Minutos

depois, Marcelle voltava, os olhos revelando irritação, a boca meio crispada. — E Darius… para você! Melissa levantou-se e caminhou para

dentro da casa, passando por Marcelle, que vestia short e camiseta e já tinha a pele bem bronzeada. Pensou que a prima era uma mulher muito bonita e atraente, sendo de espantar que nunca tivesse se casado. Então lembrou-se de tia Lucie dizendo que ela gostava de homens bonitos e, de preferência, com cabelos meio claros. — Alô, Melissa? — A voz de Darius era gentil do outro lado do

telefone. — Gostaria de convidá-la para jantar comigo esta noite. O coração dela deu um salto. A última vez que jantaram sozinhos foi naquela noite em que Vance saiu para fazer companhia ao amigo recém-chegado, deixando-a com Darius. Fora maravilhoso, ela lembrava, e apesar de saber que deveria recusar, acabou dizendo: — Sim, gostaria muito, Darius. A que horas quer que esteja pronta? — Lá pelas oito. Eu lhe telefono e… — Oh… bem… eu o encontro no hotel.

Um breve silêncio se seguiu. Ela podia imaginar a insatisfação estampada na face de Darius. — Sua mãe e seu pai não me aprovam, não é? — foi o que ele

terminou dizendo. Doía ouvir aquilo, e era difícil responder. Assim, ela explicou na voz mais natural do mundo que seria mais fácil se encontrarem no hotel. — Será gostoso andar um pouco ao ar livre — ela acrescentou, no

mesmo tom de voz. — Irei buscá-la assim mesmo — ele disse, firme e decidido. —

Também gosto de caminhar à noite!

As coisas tiveram de ficar combinadas daquela maneira, mas foi com um olhar preocupado que Melissa desligou o telefone. Marcelle estava perto o suficiente para ter ouvido tudo que ela dissera e agora a examinava atentamente, notando a expressão consternada da prima. — Algo errado? — perguntou suavemente. — Você parece

preocupada… — Não, nada de errado. — Procurou mostrar-se natural. Não

sabia que sua expressão tinha sido tão reveladora. — Darius vai sair com você, esta noite? — Sim, ele me convidou para jantar.

Marcelle inclinou um pouco a cabeça, de modo que os cabelos escondessem a expressão de seu rosto. — Continuo achando uma incrível coincidência vocês se

reencontrarem aqui, tão distante de Chipre. — Ele está aqui porque investe na compra de terras — Melissa

replicou, ignorando as segundas intenções de Marcelle. — Homens de negócio do mundo inteiro vêm para as Bahamas, atrás de terras baratas. Marcelle ficou olhando para ela em silêncio. Melissa estava pronta para pedir licença e se retirar, quando a prima falou: — Parece que Darius gosta muito de você. Ela deu de ombros,

fingindo indiferença. — Talvez. Eu não sei. — Tia Margaret e tio Roger não parecem gostar muito dele.

Melissa não fez comentário algum, começando a ficar irritada. Foi Marcelle quem continuou, com voz estudada e gentil. — Às vezes me pergunto por que será que eles não gostam de

Darius… — Ele pretende construir um edifício nesta ilha, e ninguém deseja

isso. — Melissa estava ficando impaciente, não aceitava a idéia de ser obrigada a falar sobre o que não desejava. — Você gosta dele? — Marcelle perguntou, inesperadamente.

— Bem, eu o considero uma pessoa simpática. — Está apaixonada por ele? — Ora, que tolice! — Melissa não podia acreditar nas coisas que Marcelle era capaz de dizer e perguntar. — Por que não se preocupa com seus próprios assuntos, Marcelle?

Ela sorriu e deu de ombros. — Estava só pensando… — falou com voz de veludo. — Já me

disseram que os gregos fazem questão de casar com mulheres… bem, que nunca tenham tido nada com outros homens. Procuram uma mulher virgem quando desejam uma esposa. Melissa sentiu que as mãos tremiam um pouco, sua irritação começava a se tornar incontrolável. Era claro, agora, que Marcelle sabia do seu filho. — Não compreendo direito o porquê dessa conversa, Marcelle,

mas se você.. . — Por que tia Margaret casou tão inesperadamente e a levou

correndo para longe da Inglaterra? — Marcelle a interrompeu. Ela não procurava mais esconder as idéias que lhe passavam pela cabeça. — Por que não pergunta a ela? Sim, isso mesmo, pergunte a ela!

Afinal de contas, é problema dela e de Roger, não meu! Os olhos frios de Marcelle pareciam brilhar com um ar de triunfo. — Será que tia Margaret me contaria a verdade?.. . Tenho dúvidas… — Fez uma breve pausa, como que procurando as próximas palavras. — Tia Margaret disse que você fugiu de Chipre porque seu pai queria obrigá-la a casar… mas acho que foi por outra razão que fugiu… Estava em pânico porque… porque tinha algo com um homem e acabou ficando… — Cale-se! — Melissa gritou. — Preocupe-se com sua própria

vida! Como se atreve a fazer insinuações desse tipo a meu respeito? Você é uma hóspede em nossa casa, devia ter vergonha de se comportar assim! — Mas o que está acontecendo? — A voz de Margaret fez as duas

se virarem. — Vocês estão discutindo? — Oh, não, tia Margaret — Marcelle respondeu rapidamente, com

um falso sorriso nos lábios. — Foi só um pequeno desentendimento,

nada demais… Bem, se me dão licença, acho que vou nadar um pouco. O mar deve estar ótimo! Vejo-as mais tarde. — Bem… — Margaret começou a falar quando a sobrinha se

afastou — …qual o problema com ela? — Ela sabe que tive um filho! — Sabe? — Os olhos de Margaret se encheram de medo. — Como

poderia? Melissa contou o que tinha se passado na casa de tia Lucie, na Inglaterra. Sabia que, naquela ocasião, Marcelle havia suspeitado de sua gravidez. — Ora, que infâmia… Mesmo que ela tivesse adivinhado, não era

um assunto que devia trazer à tona tanto tempo depois! — Ela não chegou de fato a dizer isto, mamãe, mas é certo que

sabe. — Não pode ter certeza absoluta! Seu filho nasceu em Miami, e

ela jamais esteve lá. — Sim, eu concordo que não possa ter certeza absoluta… —

Melissa deu um profundo suspiro — …mas não tenho dúvida de que ela sabe. Ia dizer justamente isso quando a interrompi e… Oh, eu estava tão irritada! — Melissa fez uma pausa antes de continuar explicando que Marcelle tinha perguntado por que Margaret e Roger se casaram tão inesperadamente, mudando em seguida para Miami e a levando consigo. — Ela falou que eu saí de Chipre porque estava envolvida com um homem, e tenho certeza de que ia dizer que sabia de minha gravidez quando a interrompi… Calou-se novamente, não por causa do espanto da mãe, mas porque acabava de ouvir um ruído às suas costas. Marcelle tinha dito que ia nadar e Melissa esperava vê-la caminhando pela trilha do jardim que levava à praia. Mas ela não passou por ali. As duas empregadas estavam longe, no interior da casa, os jardineiros trabalhavam lá fora I Roger havia saído. Quem teria, então, produzido aquele ruído… ? — Como é que a conversa caiu nisso? — Margaret queria saber. — Quero dizer, qual a razão para entrarem neste assunto de você

ter tido um filho? Melissa hesitou. Era difícil acreditar que a prima estivesse escutando, às escondidas. Por via das dúvidas, sugerindo que fossem

conversar num outro lugar… Mas, se tivesse realmente escutado, Marcelle sabia de tudo…! Ou melhor, de quase tudo! Não sabia que o filho era legítimo e que seu pai era Darius! — Vamos sentar num banco no jardim — Margaret sugeriu, e elas foram para fora. O dia estava quente, mas sob a sombra da frondosa árvore onde sentaram a temperatura era agradável e fresquinha. Ao longe, o mar brilhava sob o sol de verão.

Melissa começou a explicar como tudo aconteceu, tomando cuidado para não falar a respeito do papel de Darius na história. Mas tinha de contar sobre o convite para jantarem e, quando o fez, o interesse de Margaret pela briga entre a filha e a sobrinha foi superado pela indignação. — Você não devia ter aceitado! — Mas eu queria aceitar, mamãe. — Melissa falava com voz

baixa, quase se desculpando. Se Margaret tivesse ouvidos aguçados, teria percebido a nota de angústia e desespero que se escondia nas palavras da filha. — Queria aceitar? — Seu tom era francamente acusativo. — Mas

o que está acontecendo com você, Melissa? — perguntou. Ao ver que a filha não respondia, continuou: — Sabe muito bem que Roger e eu não gostamos da idéia de que se torne amiga de Darius. Parece ter esquecido o que ele fez a você! — Darius mudou muito, mamãe, já lhe disse isso. — A maneira

como ela falava era mais ansiosa e significativa do que gostaria que fosse. — Bem, você não está se apaixonando por ele, eu espero.

Melissa meneou a cabeça e um profundo suspiro escapou de seus lábios. — Não faria nada que magoasse você ou Roger. Margaret a

observava atentamente. — Você gosta dele mas coloca meus sentimentos e os de Roger à

frente de seus próprios desejos, não é? — Sim — ela admitiu, finalmente —, é verdade. — Nunca imaginei que pudesse vir a perdoar aquele homem Margaret falou com profundo desgosto.

— Não é o mesmo homem. — É o mesmo homem, só que mais velho, mais maduro, posso

lhe garantir isto! Ele ainda é um grego, ainda tem a arrogância que o faz se considerar superior aos demais. E as tradições devem estar profundamente enraizadas em sua personalidade! — Você está enganada, mamãe. Ele sabe que o que fez comigo foi muito cruel, que casamentos arranjados são cruéis para qualquer garota. Agora ele pensa como nós, acho que você deve ter notado. — Não quero notar nada! Só quero que ele vá embora! — De

novo havia uma sombra de medo nos olhos de Margaret. — Existem razões pelas quais você não deve se envolver com esse homem, Melissa. — Razões? Que razões? — Ela fitava a mãe com curiosidade,

sabendo que Margaret estava sendo evasiva. Havia algum mistério, tinha certeza. Porém, tinha certeza também que sua mãe jamais o revelaria. Sentia-se frustrada por não conseguir entender a estranha reação de Margaret cada vez que o nome de Darius vinha à tona. — Razões com as quais você não precisa se preocupar. — Ela fez

uma pausa e em seguida perguntou: — Ainda pretende jantar com ele? — Se você não se incomodar… — Claro que me incomodo, e você sabe disso! Roger também vai

ficar desgostoso. Melissa virou-se para o lado, com um suspiro. Qualquer futuro cem Darius era sonho, fantasia, pois nunca seria capaz de fazer algo que magoasse Roger e Margaret. De qualquer maneira, não tinha nenhuma prova real de que seu ex-marido estivesse apaixonado por ela. — Tenho que manter a palavra, pois já aceitei o convite, mamãe — ela disse. — Mas não sairei novamente com ele. Esta será a última vez!

CAPÍTULO IX

Melissa não levaria muito tempo para descobrir se Marcelle tinha ou não ouvido a conversa. Estava se arrumando para o jantar com Darius quando ouviu as batidas na porta. Era ela e Melissa convidoua para entrar. Não faltava muito para o encontro, e já estava pronta, mais linda que nunca, num vestido de noite que lhe realçava a beleza. Usava diamantes no pescoço e no pulso, presente de Roger quando fizera vinte e um anos. Na mão, segurava a escova de cabelos. Marcelle ficou imóvel, ao lado da porta, fitando a prima, cuja beleza superava em muito a sua. Tinha ido até ali só para lhe fazer algumas perguntas, porém, a inveja e o ciúme agora tomavam conta dela, dominando-a completamente. Estava furiosa! Deu alguns passos e aproximou-se de Melissa. — O que aconteceu com a criança, Melissa? Alguma família a

adotou? Melissa não se moveu. Estava de costas para Marcelle, mas podia ver seus olhos cheios de ódio através do espelho. Tentou permanecer fria e só mesmo o leve rubor que tomou conta de sua face indicou que aquela pergunta a afetava. — Criança? — perguntou, erguendo um pouco o queixo. — Talvez

possa explicar melhor o que pretende dizer, Marcelle. Ela deu uma risada irônica, enquanto fitava Melissa nos olhos, ainda através do espelho: — Escutei sua conversa com tia Margaret. Sabia que tinha tido

um filho, e você sempre desconfiou que eu sabia! Bem, o que foi que fizeram com ele? Livraram-se da incômoda criança permitindo que fosse adotada ou a colocaram em algum lugar escondido? £ claro que, com o pai adotivo milionário que você tem, ela deve estar agora num internato caro e sofisticado. Já deve ter por volta de oito anos, não é? Melissa virou-se e fitou-a de frente. — Sabia que você tinha se escondido no jardim para escutar,

Marcelle. — A maneira como a olhava mostrava todo o desprezo que sentia. — Será que não está envergonhada? Uma hóspede em nossa casa, que fica atrás das portas para ouvir o que os outros dizem! — Ora, só me esforcei para descobrir o que queria: a prova de

que tinha tido um filho! — Seus olhos ganhavam um brilho maligno de triunfo. — Você ainda não respondeu à minha pergunta, Melissa.

— Meu filho nasceu morto. — Morto…? Que conveniente! Então, junto com ele você enterrou

a própria vergonha, não é? Melissa engoliu seco. Estava tão feliz há poucos minutos… e agora sentia um peso no estômago, uma sensação de nó na garganta. — Ele foi para um hospital de pesquisa. Não era uma criança

perfeita e… Por favor, Marcelle, vá embora! Não há mais nada que tenha a lhe dizer, você já sabe de tudo. — Era doente? — Marcelle parecia desconfiada. — Então, nunca

foi enterrado, não existe um túmulo… — Por favor, vá embora — Melissa pediu outra vez. — Não

consigo compreender esse interesse seu em saber de minha vida, e nem o que pretende ganhar com isso. Não desejo você aqui em meu quarto; na verdade, quero que vá embora desta casa. — Bem, está falando realmente claro, agora. .. — Foi você quem pediu, Marcelle. É desnecessário dizer que nunca mais será convidada para vir aqui. Espero que não queira ficar mais uma semana, como tinha dito. — Está me mandando embora? — Sim, é isso. Nós duas poderíamos ser amigas, mas desde o

princípio você não gostou de mim. Não temos nada em comum e, portanto, o melhor é ficar com seus planos originais e partir no final da semana. — Estou pensando… — Marcelle falava com odiosa malícia — … talvez arrume um emprego por aqui… e fique definitivamente em Coral Cay.

Melissa não podia acreditar no que acabava de ouvir. — Você tem um ótimo emprego na Inglaterra! — A idéia de eu ficar não a agrada, não é? Eu iria competir por Darius, o que não serve a seus planos ambiciosos de se casar com um homem pelo menos tão rico quanto seu pai… — Não estou pensando em me casar com ninguém — Melissa

disse em voz baixa, olhando o relógio e imaginando que devia ter se

encontrado com Darius há cinco minutos, no portão da grande casa de Roger. — Não tenho mais tempo para conversar! — Ela colocou a escova de cabelos sobre a penteadeira e passou um pouco de perfume nos pulsos. Marcelle a observava com malevolência nos olhos. — Se não fosse por você… David teria me pedido em casamento! — Se não fosse por mim? Ele estava interessado só em seu

barco, em sair velejando e… — E em você! Sabe muito bem disso! Nunca mais me procurou

depois que apareceu em cena! — Você se esquece de que eu logo fui embora e desapareci da

vida dele — Melissa disse, enquanto pegava a pequena bolsa e fazia menção de ir embora. Marcelle estava à sua frente. — Com licença, mas estou atrasada. A princípio parecia que Marcelle não ia deixar Melissa passar. Mas ela pensou melhor e deu um passo para o lado. Melissa dirigiu-se para a porta, mas parou subitamente e disse: — Vá na frente, Marcelle. — Sua voz era fria e impessoal. — Não confia em mim, não é? — Marcelle já se dirigia para a

porta que a prima tinha aberto. — Para dizer a verdade… realmente não confio! Você mesma

provou, ao escutar minha conversa com mamãe, que não é uma pessoa confiável! — Gostaria de saber… — Marcelle começou a dizer em voz

tranqüila, quando caminhavam pelo corredor — … o que Darius vai dizer quando souber que você já teve um filho… — Pretende contar a ele? — Melissa falava aparentando

tranqüilidade. Era engraçado pensar que Marcelle via naquela revelação uma forma de jogar Darius contra ela. Se ele soubesse de tudo, Melissa pensava, o efeito seria exatamente o contrário. Ou seja, ela e Darius ficariam muito mais unidos. No entanto, não queria que ele descobrisse que seu filho nasceu doente. Seria terrível demais, para um homem arrogante como Darius, ter de aceitar esse fato. Não, ele sofreria muito, seria melhor deixá-lo na ignorância. — Talvez eu lhe conte, talvez não… tudo depende! — A voz de Marcelle era suave como veludo, apesar do tom irônico. Como não era hora para discussões, perguntas e respostas, Melissa foi embora

rapidamente, saindo pelo jardim rumo ao enorme portão de ferro da casa de Roger. Seus pensamentos, contudo, ainda continuavam no que acabava de acontecer. Marcelle estava com ciúme, pois odiava o fato de a prima sair para jantar com Darius. Será que não estaria também apaixonada por ele? De acordo com tia Lucie, Darius era o tipo de homem que ela sempre desejara: alto, bonito, com um ar de estrangeiro… Era uma noite tropical, quente, o céu cheio de estrelas. Do restaurante do hotel, ouvia-se o barulho das ondas na praia. Melissa e Darius tinham jantado no terraço, bebendo vinho e comendo um exótico prato de lagostas, típico das Bahamas. Depois escutaram músicas da região tocadas pelo conjunto e enriquecidas pela dança de uma bailarina do lugar. Passaram ótimos momentos, e ela se sentia feliz. Darius parecia menos reservado do que das outras vezes, rindo e falando animadamente. Agora caminhavam pela praia, perto da água, sentindo no rosto a brisa refrescante que soprava do mar, enquanto Darius falava da casa que estava construindo. Queria que Melissa fosse até lá na manhã seguinte, para dar sua opinião a respeito do jardim que havia sido planejado, e da localização da quadra de tênis. Além do mais, ele desejava saber a opinião dela sobre a derrubada de alguns coqueiros. Se eles fossem transplantados para outro local, a vista da casa ficaria mais bonita. Mas a felicidade de Melissa subitamente evaporou, quando pensou que tinha prometido a Margaret jamais sair novamente com Darius. Ela tentou parecer natural quando falou: — Acho que estarei muito ocupada amanhã de manhã, Darius, e

não poderei vir. Sinto muito! — Quem sabe à tarde, então? — Ele parecia um garoto em idade

escolar com aquele sorriso nos lábios, a expectativa nos olhos. Como poderia recusar? Sabia que ficaria magoado. Melissa hesitou por algum tempo, mas acabou dizendo: — Sim, está bem. Poderemos ir depois do almoço, então. — Ótimo! Sabe, querida, — ele continuou, com imensa gentileza — é muito importante para mim que você goste daquela casa que está sendo construída em seu lugar preferido!

Darius a fitava com doçura e Melissa sentia o coração disparando, uma sensação de felicidade e leveza. Sentir-se assim por

causa daquele homem, que tinha odiado tanto! Sentir-se em êxtase por causa de algo que ele acabava de dizer… Era tão irônico! No entanto, também a tristeza rondava sua mente e seu espírito, pois sabia da desaprovação de seus pais a um relacionamento com Darius… Ele se inclinou e a beijou levemente nos lábios, abraçando-a e puxando-a de encontro a si, contra o corpo musculoso. Melissa o desejava, queria seus beijos, suas carícias… — Melissa, querida… — ele dizia sem afastar o rosto do dela — …

eu decidi que não vou mais construir o hotel! — Você… — Ela se afastou um pouco, os olhos brilhando de

espanto. — Imaginei que estivesse reconsiderando a decisão, mas … Oh, é uma notícia maravilhosa! Todos vão ficar contentes! — Sim, eu sei. — Você perderá muito dinheiro — ela disse, um pouco de

preocupação na voz. — Não há problema. Existem coisas muito mais importantes na

vida! — Ele puxou-a para si novamente e beijou-lhe os lábios com paixão. — Querida Melissa, acho que sabe o que quero dizer com isso,, não? A pergunta poderia ser tomada como uma proposta de casamento. Mas ela não respondeu nada, pensando nos pais, na promessa que havia feito para a mãe. Darius não parecia ter pressa, contudo, e recomeçaram a caminhar pela areia, A lua subia no céu agora, deixando no mar uma listra prateada que chegava até a praia. Ao longe, do hotel, vinham os sons de tambores, instrumentos tocados nas Bahamas, que produziam um som mágico. Darius passou o braço pela cintura de Melissa. Os dedos dele eram delicados sobre o tecido leve do vestido que ela usava. — Sabe que há algo mais importante com relação à construção deste hotel do que quanto eu iria lucrar, não é?

Melissa levantou a cabeça e concordou. — Você decidiu não construir… por minha causa? — Sim, querida. Não poderia magoá-la novamente, nunca mais.

— Ele parou e fitou os olhos dela, doces. — Você sabe, não é Melissa, que eu nunca a machucaria outra vez, não é?

Ela apertou os olhos com força e mesmo assim não conseguiu impedir as lágrimas que começaram a rolar por sua face delicada. Darius a fitava, emocionado. — Sua mãe, e seu pai adotivo… eles não aprovariam que se casasse comigo… — Era uma afirmação, e não uma pergunta. Ela concordou com a cabeça e escondeu o rosto no linho branco do paletó de Darius, tão sedoso e reconfortante como a mão que lhe acariciava os cabelos. — Eles lembram daquele dia, quando um jovem orgulhoso e arrogante invadiu a casa de sua mãe, ordenando que sua filha lhe fosse entregue. — Um suspiro escapou dos lábios dele e ele se calou. — Já falei para minha mãe que você agora é um homem muito

diferente, mas ela não me deu ouvidos. — Não se pode culpá-la — Darius admitiu. — Acho que me

sentiria da mesma forma se os papéis fossem trocados. — Acho que todos deveríamos aprender a perdoar, Darius. — Você me perdoou, Melissa?

Ela o fitou e sorriu da maneira como faria uma criança que gosta de alguém e sabe que seu amor é retribuído. — Claro que sim, Darius. Eu não seria capaz de amá-lo se não o tivesse perdoado.

Darius também parecia imensamente feliz, os olhos brilhando com alegria e gratidão. — Então, você me ama! Como sonhei com o momento em que

diria isto. — Talvez eu não devesse dizer isso, Darius. Nunca poderemos

casar, existe uma barreira gigantesca! — O amor não conhece barreiras, querida. Virei amanhã, para

conversar com seus pais. Quero você, Melissa, para minha esposa, minha companheira e amante. E terei você para mim! Por um rápido momento, ele pareceu novamente aquele grego arrogante que a desposara anos atrás, a voz imperiosa e inflexível. Ele sempre será o comandante, Melissa pensou, pois o sentimento de superioridade é inerente à sua personalidade. Mas seria gentil também, e infinitamente doce… se viessem a se casar. Talvez Roger

e sua mãe mudassem de opinião, convencidos da sinceridade dos sentimentos de Darius. Talvez não. Ela suspirou fundo, preocupada. — Darius… querido, Darius, não pode ser. É por causa do

passado… — O que passou está morto, meu amor! Devemos viver para o

presente e o futuro. Chorar o passado é perda de tempo. — Ele calou-se por um instante, ainda abraçando Melissa e passando a mão suavemente sobre seus cabelos. — Irei amanhã até Mangrove Lodge para conversar com seu pai e sua mãe. Quero lhes dizer que a amo e pretendo me casar com você… — Não, Darius! Por favor, ainda não. Conversarei com eles, com

Roger. Ele gosta muito de mim e só deseja minha felicidade. Pode ser que compreenda. — Ela fitou-o com os olhos doces marejados de lágrimas. — Por favor, deixe-me fazer as coisas à minha maneira — pediu, e Darius puxou-a para mais perto, murmurando que seria como ela desejava, antes que seus lábios se unissem novamente. Não disseram mais nada no caminho de volta para o hotel. O fato de estarem lado a lado e a maravilhosa natureza ao redor era “suficiente, enquanto caminhavam pela praia tranqüila, iluminada pelo luar. A mão de Darius segurando a sua trazia segurança para Melissa. Já não sentia aquele desespero que experimentara há pouco, pois acreditava no que ele havia dito, que o amor não conhece barreiras… Melissa conversou com Roger durante o café, na manhã seguinte. Ele a escutou com expressão compenetrada e quando falou não havia reprovação em sua voz. Admitiu que já esperava que aquilo acabasse acontecendo, pois tinha notado a maneira como ela e Darius se comportaram quando jantaram juntos. Darius havia dito na frente de todos eles que se casaria… caso “alguém” assim o desejasse! E havia fitado Melissa ao dizer isso. — Não era difícil saber o que ele pensava, não é? — Roger falou. — Você não parece zangado, ou aborrecido — ela disse, surpresa. — Não estou zangado, Melissa, mas não seria sincero se dissesse

que aprecio este casamento, pois sei que aquela noite de núpcias que passaram juntos foi um verdadeiro inferno para você. Será que já pensou seriamente no passo que está dando? Ela concordou com a cabeça; havia confiança em seus olhos e nenhum medo quando respondeu:

— Sim, papai, já pensei. Darius é um homem diferente, os anos

longe de Chipre o tornaram uma pessoa maravilhosa. Roger fez um gesto de compreensão. — Lembro-me de ter dito que ele podia mudar com a idade, e sua

mãe disse o mesmo… Sua mãe… ela nunca se sentirá bem ao lado de Darius! — A mudança no tom de voz dele era surpreendente. O rosto de Roger agora era preocupado e sombrio. — Não, ela nunca conseguiria! Não vai dar certo, querida! Você tem que desistir de Darius! Melissa o encarou, sem compreender o porquê daquilo tudo. — Roger — ela falou, depois de um momento —, há alguma coisa

que não sei, não é? Minha mãe ficou completamente aterrorizada ao saber que Darius estava aqui. E seu pavor não tinha nada a ver com os motivos dele estar aqui, mas com o simples fato de ele estar na ilha! — Ela fez uma pausa e esperou pela resposta, que não veio. — Existe um mistério, eu sei disso. Para dizer a verdade, escutei por acaso outro dia, no jardim, quando minha mãe disse a você: “E se ele vier a descobrir?”… O que queria dizer com isso? O que existe para Darius descobrir? Roger levou um susto ao saber que as palavras de Margaret tinham sido ouvidas, mas logo se recobrou. — Não era nada com relação a você, querida. Somente ansiedade

de Margaret, mais nada. — Ela mencionou alguma coisa a respeito de alguém que morava

na Flórida. Disse que era perto demais. — Melissa o fitou, do outro lado da mesa. Durante toda a conversa haviam parado de comer, era um assunto sério demais para que se preocupassem com outra coisa. Roger agora voltava a se servir, como se desejasse parecer mais natural. Melissa continuou falando. — Sei que isso tem a ver comigo também. É algo relacionado com o divórcio? Não pode ser, pois foi tudo resolvido da forma legal, através da corte. — Ela fez uma pausa e Roger ainda desta vez não disse nada. — Acho que a única solução é perguntar para ela. — Não! — Ele reagiu prontamente, e Melissa percebeu que estava

irritado quando continuou. — É melhor se manter afastada das coisas que não lhe dizem respeito, Melissa. Não vai ganhar nada embaraçando sua mãe, interrogando-a e forçando-a a dizer coisas que não deseja. Lembre-se sempre que o único desejo de Margaret é vê-la o mais feliz possível!

— Nesse caso —— Melissa replicou —, ela não poderá ter objeção

contra meu casamento. — Sua voz agora era firme e decidida. Queria se casar com Darius, era sua vida e seu destino que estavam envolvidos. Sentia neste momento que, quer a mãe concordasse ou não, escutaria somente o que o próprio coração lhe dizia. — Vamos ver quando ela levantar. Conversarei com ela e… —

Roger se calou abruptamente quando a porta se abriu e surgiu Marcelle, com um roupão de praia sobre o biquíni, um sorriso no rosto que só podia ser descrito como artificial. Ela se aproximou da mesa e disse animadamente: — Bom dia! Posso fazer companhia a vocês?

Roger tomou a xícara de café e terminou de bebê-la rapidamente. — Esteja à vontade, na companhia de Melissa. Peço desculpas,

pois tenho trabalho a fazer em meu escritório. — Ele virou-se para a filha adotiva, ignorando a maneira reprovadora com que ela o olhava. — Vejo você mais tarde, querida! — disse, e dali a instantes as

duas estavam sozinhas. Marcelle sentou-se na cadeira que Roger acabava de desocupar. — Tenho uma sensação de que tio Roger não gosta muito de mim — ela disse, com um sorriso irônico e despreocupado. — Ele é um homem muito ocupado. — Foi tudo que Melissa

respondeu. Sabia que pelo menos devia ser educada com aquela garota detestável, embora isso fosse cada vez mais difícil. Esperou ate que uma das duas empregadas viesse perguntar o que Marcelle desejava comer e levantou-se também. — Desculpe, mas também tenho coisas a fazer… — Claro, querida. Nos encontraremos mais tarde. Tenho algo

importante para lhe dizer. Por um momento, Melissa ficou pensando se devia ou não permanecer ali. Sabia que o que Marcelle tinha a dizer era relacionado com o que deixara no ar na noite passada. Achou melhor ir embora mesmo assim, pois não estava com humor suficiente, no momento, para ficar escutando coisas desagradáveis.

Foi na praia, bem mais tarde, que Marcelle encontrou Melissa. O céu estava claro e o mar parecia brilhar, refletindo o sol. Melissa estava num setor da praia que era privativo de Mangrove Lodge, sob um guarda-sol, com um livro aberto sobre a esteira. Ao longo da praia havia algumas pessoas tomando sol, deitadas sobre toalhas, e outras brincando no mar. Melissa queria permanecer calma, apesar de saber que precisava estar alerta. — Gomo parece feliz… — Marcelle comentou, enquanto colocava

sua esteira sobre a areia e sentava perto da prima. — Você tem tudo que uma garota pode desejar, não é? — Se está se referindo a meus pais, é verdade. — Por que será que algumas mulheres são muito mais afortunadas que outras? — Marcelle falava com ironia, mas não conseguia esconder a inveja e o ciúme que sentia da prima. — Divertiu-se muito com Darius, ontem à noite?

Melissa virou-se e fitou-a de frente. — O que quer me dizer, Marcelle? Fale logo, por favor, e então

me deixe sozinha. Não desejo ficar aqui, trocando palavras que não fazem sentido. Os olhos de Marcelle brilharam como fogo e Melissa notou que ela apertava uma das mãos. Era incrível como tamanha fúria podia se produzir dentro de alguém, tão de repente. — Como é orgulhosa da própria posição, não? A filha adotiva

mimada e convencida de um dos homens mais ricos de Miami! E como se não bastasse, tenta conquistar outro milionário, não é?… Bem, já disse que os gregos nunca se casam com mulheres que tenham sido de outros homens, e Darius não me parece do tipo que passaria por cima do fato de você já ter tido um filho! — Ela fez uma pausa, a mão ainda apertada com força. — Admito que ainda estou magoada porque você se intrometeu no meu caso com David. — Eu nunca fiz isso! — Não fosse por você e ele teria… Ora, David já não interessa

mais! Eu o odeio! Mas estou determinada a me vingar de você, Melissa! Ofereço-lhe a chance de escolher entre desistir de Darius ou deixar que ele desista de você: faça da maneira como preferir! — Está ameaçando contar para Darius que eu já tive um filho?

— É a arma que usarei, se for necessário. — Faz isso porque não pode suportar a idéia de eu me casar com

Darius? — Você já tem o bastante, mais do que suficiente! Eu a odeio,

Melissa, sempre a odiei. Da última vez que estive aqui, você estava tranqüila e formosa, levando uma vida de rainha numa ilha maravilhosa, enquanto eu tinha que trabalhar num escritório frio e cinzento, em Londres! — Nunca fui mimada e convencida em minha vida, Marcelle. — Mentira! E agora acho que Darius já a pediu em casamento,

não é? Só um bobo não notaria as atenções especiais que ele sempre lhe dispensou. Era você que ele tinha em mente quando falou durante o jantar, naquela noite, que talvez se casasse com alguém, desde que esta pessoa o desejasse! Melissa calou-se, pensando que talvez Darius viesse realmente a saber que seu filho não tinha nascido perfeito. Se pelo menos houvesse um túmulo… Mas, do jeito que as coisas se passaram, seriam obrigados a lhe dizer que o menino era anormal, pois teriam de lhe explicar a doação para o hospital. — Não sei o que dizer para você, Marcelle — ela falou com um

suspiro. — Se é sua intenção tentar estragar minha vida contando para Darius que já tive um filho, então não posso impedi-la. Só posso assegurar que isso não mudará a decisão dele de casar comigo. — O que… ? — Marcelle estreitava os olhos. — O que exata— .

mente pretende dizer com isso? — Não pretendo lhe explicar nada, Marcelle. — Melissa levantou-

se imediatamente, recolhendo a toalha e partindo de volta para casa. Sua mãe e Roger estavam sentados no pátio, e ambos viraramse para ela quando apareceu. Roger ofereceu-lhe a cadeira. — Obrigada, Roger. — Ela observou o rosto de sua mãe,

constrangido e preocupado. Roger trouxe outra cadeira, sentou-se e começou a falar. Disse que estavam desapontados por ela se apaixonar por Darius, que não era o homem que gostariam de ver casado com ela. Por outro lado, compreendiam que era dona de si mesma, e se decidisse casar, não havia nada que nenhum dos dois pudesse fazer. Melissa interrompeu para dizer que tudo que desejava era a benção deles para o casamento.

— Ele realmente é um homem diferente — explicou mais uma

vez. — Vocês deveriam saber que eu nunca me casaria com aquele Darius que conheci! — Sim, nós acreditamos nisto — Roger falou. — Ele deve ter

mudado muito para que você pudesse se apaixonar por ele. — Vão concordar com o casamento, então? — Melissa estava ansiosa com aquilo que parecia um milagre! Sabia que mesmo que eles continuassem se opondo, pelo resto da vida ela tentaria fazê-los aceitar e abençoar a união. Agora tinha certeza que, acontecesse o que acontecesse, ia se casar com Darius. — Nós já conversamos bastante e chegamos à conclusão de que

não há nada a fazer a não ser aceitar a situação — era Margaret quem falava, finalmente. Sua expressão não escondia o desapontamento com a idéia de Darius vir a se tornar seu genro. — Mas há algo, Melissa, que gostaríamos de lhe pedir. — Ela olhou o marido por um momento e depois voltou-se para a filha mais uma vez: — Queremos que prometa que jamais vai contar para Darius que tiveram um filho. Achamos que ele é o tipo de homem que vai querer saber tudo sobre o assunto, o que aconteceu com a criança, para onde foi… — Mas há alguma razão pela qual ele não possa saber disso? — Melissa perguntou, surpresa e aturdida. Viu que Margaret fitava Roger mais uma vez, e um arrepio lhe subiu pela espinha. — Eu… bem, nós achamos que ele não aprovaria a idéia de que .

o recém-nascido tenha sido doado para pesquisas científicas. Melissa ainda estava surpresa, mas havia algo que sua mãe não sabia, que tornava tolice continuar discutindo o assunto. Ela mesma teria feito tudo para que Darius jamais conhecesse a verdade, mas a ameaça de Marcelle não podia ser ignorada… — Eu suponho, mamãe, que tenhamos de contar a ele. Marcelle

ouviu quando falávamos a respeito, e agora já sabe que tive um filho. Ela ameaçou contar tudo, a menos que eu desista de me unir a Darius. Roger e Margaret olhavam para Melissa boquiabertos. — Mas o que está dizendo? — perguntou Roger.

Melissa contou tudo o que Marcelle tinha dito. O silêncio imperou por algum tempo e ela notou que Margaret ia ficando cada vez mais pálida, trocando olhares cheios de medo e receio com Roger.

— Você não pode se casar com ele! — Roger falou novamente, e

parecendo decidido. — É impossível! Melissa piscou os olhos. . — Impossível? Eu não compreendo… Há alguns minutos pareciam estar resignados e… — Nós estávamos, Melissa — Margaret a interrompeu —, mas só

se você não lhe contasse a respeito da criança. — Não faz sentido, mamãe. Eu seria a primeira a não desejar que

Darius soubesse disto. — Você não pode se casar com ele! — Roger falou novamente e havia um tom de rispidez em sua voz que Melissa jamais ouvira antes. — Está fora de discussão! Deve romper com ele e então nos mudaremos para Miami. Mangrove Lodge terá de ser vendida, não há mais nada a fazer. — Ele agora olhava para Margaret, que meneava a cabeça. Parecia se sentir na mais completa miséria, como se estivesse muito doente. — Nós temos de contar para ela, Roger! — Margaret falou, num

fio de voz. — Afinal, eu fiz tudo para o bem dela e ela não poderá me condenar! — À medida que falava, a voz de Margaret ia ficando cada vez mais aguda, como se ela estivesse à beira da histeria. Roger tomou-lhe a mão, para que se acalmasse. — Não é necessário que ela saiba! — ele disse, embora já fosse claro que teria de revelar o mistério para Melissa. Depois de um longo momento de silêncio, foi ela quem falou, afinal, os olhos fixos em Margaret. — O que têm para me dizer? E por que usou a palavra

“condenar”? O que fez que tem medo que eu condene? Não sabia o que esperar, sentada ali, aguardando que a mãe falasse. Margaret parecia ter envelhecido muitos anos… Finalmente começou a falar, com muitas pausas entre as palavras. Ela viu quando Melissa levou as mãos ao rosto que agora estava pálido, pois todo o sangue tinha fugido dali… os lábios tremiam como se quisessem dizer coisas que não conseguiam ser articuladas. — E agora você já sabe de tudo — Margaret finalizou. — Fiz isso

por você, por sua felicidade. — Meu filho… meu filho… não está morto! —— Melissa sentia o

próprio corpo congelado. — Ele… ele foi adotado! Meu filho… e de Darius… pertence a outras pessoas! — Ela apertou os olhos com toda

a força, pois não queria visualizar o garoto de oito anos que chamava outra mulher de mãe! — Melissa, minha querida criança… — Roger foi o primeiro a se

recobrar da espécie de letargia que tinha tomado conta dos três. Ele aproximou-se de Melissa, passando o braço em seu ombro, num gesto confortador. — Quando superar tudo isso, vai compreender que fizemos tudo para seu bem. Sim, achamos que você seria mais feliz sem a criança, que poderia ter o carinho e o afeto de outras pessoas. Se ficasse com ela teria de manter o nome do homem que detestava, teria menos chances de casar outra vez e… — Pare por favor! Eu não consigo pensar! — Mas tente, filha — Roger insistiu. — Tente considerar o que

estou dizendo. Você não queria a criança e… — Quando ela estava para nascer eu já a queria! — Só no fim, e achamos que não era tão importante. De qualquer

maneira, acreditamos que estávamos fazendo o melhor para você. Jamais poderíamos imaginar que Darius fosse surgir de novo em sua vida, principalmente por vivermos tão afastados, em outro país… Bem, acho que agora compreende porque é melhor desistir dele. Se souber que seu filho está vivo, então provavelmente vai querer tê-lo de volta. — E ninguém poderia culpá-lo por isso — Melissa disse, ainda

atordoada. Darius, pai de um garoto de oito anos de idade… era claro que ele ia querer recuperar o filho! — Se ele exigisse o garoto de volta — Roger prosseguiu —, seria

uma terrível tragédia para sua mãe. Você compreende o que estou falando, não compreende? — Sim, compreendo, ela disse… disse que o filho era dela… para

poder assinar os papéis da adoção, não é? — Melissa teve que fazer um enorme esforço para colocar para fora aquelas palavras que teimavam em ficar presas em sua garganta. Sua mãe era criminosa. Sim, do ponto de vista das leis, Margaret havia cometido um crime. — Se Darius insistisse em recuperar o garoto, tudo viria à tona!

Sua mãe poderia ir para a prisão… — Não, não! — Margaret explodia, finalmente. — Não diga estas

coisas, Roger! Seria uma tragédia. Você também poderia ser julgado como meu cúmplice. Nós dois seríamos condenados!

O silêncio tomou conta de tudo e de todos. Melissa começou a imaginar como seria seu filho, um lindo menino, sem dúvida, pois era filho de Darius. Seria grande para a idade, a pele bronzeada como a do pai… Oh, como Margaret podia ter dito que era uma criança deformada? E agora precisavam achar uma desculpa para o fato de o garoto não ter sido enterrado. Roger falava alguma coisa sobre a volta deles para Miami. — Isso não será necessário. — A voz de Melissa era seca. Sabia

que tinham feito tudo para seu bem, que talvez um dia os perdoasse, mas agora só conseguia pensar nas conseqüências daquele ato. Ela perderia Darius e ambos perderiam o filho… — Não posso me casar com Darius, papai — ela continuou, com

voz grave e os olhos sem expressão. — O nascimento da criança não poderá. ser ocultado dele, por causa de Marcelle. E também porque eu jamais conseguiria viver ao lado do meu marido mantendo esse segredo para o resto da vida! Manter em segredo que… que nosso filho está vivo… e pertence a outras pessoas! Eu… eu ainda vou querer saber, qualquer dia, a respeito de seus pais, sua casa… mas, agora… — Ela balançou a cabeça, vigorosamente — Por ora não desejo saber de nada. . Darius, ela pensava, iria embora de Coral Cay, venderia a casa em Clearwater Cove quando ela dissesse que tinha pensado melhor e decidido não casar com ele. Mentiria que não queria correr o risco de sofrer de novo, depois de tudo que havia acontecido. Sim, estava convencida de que ele partiria e, portanto, não haveria necessidade de Roger, Margaret e ela irem embora para Miami. — Melissa, querida… — era Roger quem falava. Ele fez menção de abraçá-la, mas ela afastou-o com um gesto. — Nós fizemos tudo por você — Margaret repetiu, e Melissa não pôde deixar de sentir uma certa indignação na voz da mãe, como se estivesse ressentida da atitude que a filha tomava. Melissa jamais poderia esquecer quando ela disse, há oito anos, que não estava interessada em netos naquela altura de sua vida. — Sim, eu sei que fizeram tudo por mim… — Foi tudo que ela

disse antes de levantar e sair caminhando vagarosamente, os pensamentos perdidos no pequeno menino que morava em algum lugar da Flórida e chamava outras pessoas de pai e mãe… Alcançou o quarto e seus pensamentos se voltaram para Darius. Sentiu uma terrível angústia quando pensou na fúria dele se soubesse que o filho havia sido adotado… E essa fúria seria toda

dirigida contra ela, pois teria de mentir que assinou os papéis e permitiu a adoção, deixando que o filho deles fosse entregue a outras pessoas… Sim, teria de fazer isso, pois era a única maneira de salvar Margaret.

CAPÍTULO X

O lugar adorável em que a casa estava sendo construída não era o cenário apropriado para o que Melissa vinha dizer. Entretanto, tinha prometido encontrar Darius ali, para discutirem sobre as obras, ela lembrou com amargura. A construção estava deserta, pois os operários se encontravam em horário de descanso. Ela olhou em volta e notou que as paredes já iam adiantadas, o que não era de se espantar, pois Darius tinha contratado muito mais homens do que o normal para que a construção fosse rápida. As lágrimas começaram a cair de seus olhos, enquanto caminhava por aquele lindo lugar e via como a vegetação natural estava sendo preservada. Era tudo por ela… porque aquele era seu local preferido e ela não queria vê-lo modificado. A praia era tão perto, já haviam feito uma trilha de pedras de coral, que saía pelo jardim da casa e ia dar na areia. A quadra de tênis estava «quase pronta, rodeada por coqueiros e com trepadeiras plantadas recentemente, que já começavam a subir pelas cercas de arame. Um ruído fez com que se virasse e ela viu Darius se aproximando, vestido com uma calça branca e uma camisa azul. Estava lindo, e como era sincero e adorável o sorriso que tinha no rosto. Se ele fosse assim quando se conheceram… Melissa afastou aqueles pensamentos, pois de. nada adiantavam, e forçou um sorriso quando Darius a alcançou e disse: — Faz muito tempo que está esperando, Melissa querida? Queria

chegar primeiro para recebê-la como minha convidada especial, mas — seu sorriso era ainda mais brilhante — você não é uma convidada nesta casa, não é, querida? É minha companheira e… — Darius… Pare! — ela disse, aflita. Sua voz tremia e levou a

mão ao rosto, tentando impedir as lágrimas que já escorriam dos olhos. — Não… não pode ser. Não posso me casar com você! Eu… eu

não vou correr o risco, depois de tudo que aconteceu. Seria loucura… Isto é um adeus, Darius, foi para isso que vim aqui hoje: para dizer adeus, de uma vez e para sempre! — Ela virou-se e teria corrido para fugir, mas Darius a agarrou pelo pulso e a puxou para perto de si, num gesto brusco. Com a outra mão, segurou seu queixo e a forçou a olhar para cima. — As coisas não correram bem com eles, não foi, Melissa? Seus pais é que estão por trás de tudo isso! Mas você acha que eu a deixaria partir assim? Minha querida Melissa! Posso ter mudado, mas continuo lutando para obter o que desejo! Ninguém, ninguém vai se colocar entre nós! Amamos um ao outro, chegamos onde chegaríamos caso tivéssemos permanecido casados. Sim, pois não há dúvida que eu me apaixonaria loucamente por você! E você também se apaixonaria por mim, quando me perdoasse.

Sua voz agora já não era áspera, e a maneira como lhe segurava o pulso era suave como uma carícia. Melissa tinha os olhos turvados pelas lágrimas, e não conseguia vê-lo direito. Porém, via o suficiente para perceber a ternura e o afeto nos olhos de Darius. Foi ele quem continuou falando. — Você não foi nada convincente, Melissa, seus olhos adoráveis

provam isso, me dizem tudo aquilo que quero saber! Fomos feitos um para o outro, mas o destino acabou nos juntando em circunstâncias que a fizeram fugir e sofrer. Perdemos muitos anos, Melissa, mas não desperdiçaremos nem mais um minuto de nossas vidas! Assim que esta casa estiver pronta, quero que venha morar comigo! Melissa tentou interrompê-lo várias vezes, sem conseguir. Era difícil recusar aquelas palavras tão doces a seus ouvidos… mas que diziam algo que jamais se realizaria… Ela e Darius estavam condenados à separação por causa de um pequeno garoto de oito anos que vivia na Flórida, um garoto que era filho deles e pertencia a outras pessoas! — Darius, eu… — Não diga mais nada, meu amor. Vou encontrar seus pais esta

noite. Eles não terão objeções quando eu disser que a adoro e que não posso viver sem você! Darius a puxou e beijou seus lábios suaves. Melissa não se afastou, queria aproveitar ao máximo aqueles momentos para guardá-los na memória para o resto da vida. Quando chegasse em casa, lhe escreveria uma carta dizendo que não fosse ver Roger e Margaret, que a decisão do rompimento cabia a ela apenas. Não queria casar-se com 110

ele, e era definitivo! Pensava em se mudar para Miami durante algum tempo, pois Darius não sabia onde ficava a outra casa de Roger, e ela esperava que não conseguisse jamais descobrir. — Querida… — Os lábios de Darius ainda tocavam os dela, suaves como a brisa que soprava da praia e agitava seus cabelos. — Não consigo acreditar que você se deixe influenciar a este ponto pela opinião de seus pais… Há algo mais além disso, Melissa?

Ela meneou a cabeça, com decisão. Seu coração deu um pulo. Se ele descobrisse… não, não havia chance disto acontecer. Ninguém poderia lhe dizer. Marcelle não faria isso quando soubesse que tinha desistido de Darius. — Não, Darius, não há mais nada além do que já lhe disse.

Ele não parecia completamente convencido, mas mesmo assim se inclinou e a beijou mais uma vez. Aqueles beijos eram como um sonho, uma fantasia de felicidade, e Melissa abraçou Darius com ternura. — Melissa, querida, eu te amo e… — Darius calou-se e a afastou

com gentileza. Ela sabia que algo estava acontecendo e, quando virou para trás, encontrou o olhar maligno da prima. — Marcelle! Há quanto tempo você está aí?

Antes que ela respondesse, Darius cumprimentou-a com educação. Sempre a tratava assim, em consideração ao fato de ser prima de Melissa e hóspede em Mangrove Lodge, — Veio até aqui para ver como a construção vai caminhando? — Sim… — Marcelle olhou em volta com um sorriso sarcástico.

Era fácil perceber como aquela casa seria linda, uma coisa de sonhos num lugar paradisíaco. Quando virou novamente e fitou Melissa, seu olhar estava cheio de ódio e veneno. Era claro que Marcelle tinha uma impressão errada do que estava acontecendo mas, assim que saíssem dali, diria a ela que havia desistido de Darius para sempre, Melissa pensou. — Você gosta? — Darius deu um passo adiante, como se fosse

mostrar a construção para Marcelle. — A piscina vai ficar naquela elevação e nós pretendemos… — ele ia continuar explicando, mas Marcelle o interrompeu. — Nós? Pensei que fosse morar sozinho nesta casa, Darius.

— Sim, foi o que eu disse, não é? Mas… esta casa será para

Melissa e para mim, pois vamos nos casar. Um silêncio se seguiu. Marcelle tinha a boca crispada, os dentes trincados, era claro que uma fúria imensa a agitava por dentro, como se fosse um tipo de loucura. Por um momento, ela pareceu incapaz de dizer qualquer coisa, mas logo se recuperou. — Casar? Ora, que surpresa! — Ela fez uma pausa e Melissa

sentiu que não havia um segundo a perder, aquela era a última chance de impedi-la de concretizar a ameaça que havia feito. Marcelle foi mais rápida, no entanto, e continuou a falar, no mesmo tom de voz ameaçador. — Você me surpreende, Darius, porque sempre me disseram que os gregos não se casam com mulheres que já tenham pertencido a outros homens, que já tenham tido filhos de outros homens! Melissa não contou a você sobre o bebê? Contou como sua mãe e o pai adotivo tiveram que retirá-la rapidamente da Inglaterra para que ninguém soubesse que estava grávida? Talvez não seja o único na vida dela, Darius! — Quando foi que ela teve este filho? — A voz de Darius era

grave, cheia de dignidade. — Há oito anos. — Marcelle estava um pouco surpresa. — Parece

estar bastante calmo a respeito do que lhe contei. Será que não se importa? — Darius… — Melissa conseguia finalmente falar, apesar de sentir

um nó na garganta. — Não dê ouvidos a ela, por favor, não… Marcelle ria histericamente, e seus olhos brilhavam com triunfo quando interrompeu a prima. — Ele não sabia! Bem, agora já sabe! — Virou-se para Darius. —

Será que vai se casar com Melissa, agora que sabe que ela já teve um filho? Melissa fitou Darius, sentindo uma espécie de torpor. Não podia ordenar os pensamentos. Se pelo menos tivesse encontrado com Marcelle antes daquilo tudo… mas agora já tinha acontecido e a única coisa que desejava era poder correr para longe, sumir e ficar sozinha para conseguir um pouco de paz. Quando respondeu à pergunta de Marcelle, a voz de Darius ainda era educada e grave. — Sim, Marcelle, vou me casar com ela mesmo assim. — Ele fitou

Melissa rapidamente e novamente se voltou para Marcelle. — O filho de Melissa era meu filho, também. Nós fomos casados em Chipre, quando ela estava com dezessete anos.

— Casados? — Marcelle estava perplexa. — Vocês já foram

casados?! — Deixe-nos a sós, por favor. — Darius lhe indicou o caminho

que levava para fora da casa. — Nenhum de nós dois deseja sua companhia; portanto, é melhor que vá embora. — Eu… — Vá embora! — A voz dele agora era ríspida. — Você é

desprezível, Marcelle. Por um instante, pareceu que ela ia ficar, fazer perguntas para compreender melhor o que acontecia. Mas os modos de Darius indicavam que seria capaz de obrigá-la pela força a deixá-los a sós. Marcelle ainda olhou para Melissa mais uma vez, os olhos com mais ódio que nunca. Em seguida, deu meia volta e saiu pelo caminho que Darius indicou. Um longo silêncio se seguiu entre os dois e foi Darius quem falou, afinal. — Onde está nossa criança?

A boca de Melissa estava seca, era como se o ar lhe faltasse. Desejaria que os operários voltassem para a construção, assim quem sabe se sentiria mais segura. — Era um menino… — ela respondeu, finalmente, fugindo à pergunta de Darius, enquanto tentava ordenar os pensamentos. — Era…? — Ele… ele foi… adotado. — Adotado? — Darius repetiu, incrédulo, apertando o pulso de

Melissa. Seu olhar era de acusação. — Você permitiu que fosse adotado… sem me consultar? — Ele era… era meu. — A voz de Melissa vacilava. — Na época me pareceu a melhor coisa a fazer.

O silêncio que se seguiu era cheio de tensão e expectativa. — Você não quis a criança porque… porque era meu filho? Ela abaixou a cabeça, lembrando de quantas vezes repetira para

Roger e Margaret que não desejava a criança. No final da gravidez, no entanto, o instinto de maternidade era mais forte, e tudo que desejava era ter o próprio filho nos braços, alimentá-lo com seu leite de mãe. — No princípio, Darius, eu não queria, pois… — Melissa parou e

só então percebeu que havia feito uma besteira dizendo aquilo. — A princípio…? — O olhar dele era duro e inflexível. — E o que

aconteceu depois, Melissa? Ela calou-se por um instante, procurando desesperadamente uma resposta razoável e convincente. — Eu já tinha feito os arranjos com o casal que o adotaria e… e

não podia mais voltar atrás. — Mentira! Uma mãe pode sempre voltar atrás num caso como

esse! Você não o queria só porque era meu filho! Deus, se pelo menos eu desconfiasse disso! Meu pai morreu infeliz quando poderia saber que… — Como é que eu poderia pensar em seu pai naquele momento? — Melissa parecia recobrar um pouco de coragem. — Não era

uma máquina, destinada a produzir um filho para a felicidade dos outros! — Você era minha esposa, mãe de meu filho! — Os olhos dele

brilhavam, furiosos. — Onde está a criança? Vou consultar um advogado imediatamente… — Não! — ela gritou, livrando-se da mão de Darius e afastando-

se. — Nunca! Você jamais saberá onde ele está, jamais! — Melissa

saiu correndo. Precisava voltar para casa e avisar os pais que Darius já sabia e em breve iria encontrá-los. Mas ele alcançou-a num instante, segurou seus ombros e a sacudiu com violência, sem nenhuma compaixão. As lágrimas explodiram nos olhos de Melissa. Ele não havia mudado nada, nem um pouco! Como é que podia ter pensado que Darius tinha evoluído? Mais uma vez aquele homem a tratava com violência física, sem compaixão. Novamente era um grego brutal e arrogante! — Onde está meu filho? — ele gritava, e Melissa estava apavorada. Pensou em Roger e em sua mãe, que seriam

considerados criminosos se Darius viesse a saber da verdade. Isto nunca poderia acontecer. — Nunca lhe direi! Permiti que fosse adotado, e isto não tem

nada a ver com você! A criança era minha… — E minha também! — A voz dele estava mais calma, mas

continuava irado. — Não podia tê-lo entregue a outras pessoas sem o meu consentimento. Os pais adotivos serão obrigados a me dar a criança de volta! Melissa o olhou com desespero. Ele não teria compaixão, não se importaria com o que viesse a acontecer a Margaret ou Roger. Mas tinha razão quando as coisas eram olhadas de seu ponto de vista! Darius possuía um filho, um garoto de oito anos, era seu pai legítimo, e por que deveria desistir de seus direitos? Queria a criança, seu herdeiro, e Melissa admitia que seu desejo era justo e natural. Mas havia tantas coisas envolvendo tudo aquilo… Ela só pensava em correr para casa e avisar os pais sobre o que estava acontecendo. Os operários começavam a voltar e Melissa sabia que era sua chance de escapar, pois Darius não a perseguiria na frente deles. Não importava o que pensassem a seu respeito, tudo de que precisava era correr para casa. E ela correu tão rápido quanto suas pernas permitiam. Darius, contrafeito, a seguia caminhando rapidamente. Era óbvio que estava decidido a não lhe dar muito tempo a sós com os pais. Melissa estava sem respiração quando chegou a Mangrove Lodge. Gritou, chamando a mãe e Roger, mas eles não responderam. Procurou loucamente pelo interior da casa, mas não conseguiu encontrá-los. — Meu Deus, onde é que eles estão? Na praia, talvez… — Ela

disparou para a praia, aliviada por Marcelle também não estar em casa. Não havia sinal deles, mas viu Vance, à distância. O rapaz também a viu e caminhou até a cerca que separava a praia particular da casa de Roger do resto da praia. — Olá! Vai nadar um pouco? — ele perguntou, despreocupado. — Não, estou procurando meus pais. Sabe onde estão? É terrivelmente urgente! — Ela não procurava esconder o nervosismo e a aflição.

— O que aconteceu? — Vance quis saber, mas Melissa o

interrompeu para perguntar mais uma vez a respeito dos pais. — Bem, eu os vi caminhando pela praia. — Em qual direção? — Naquela direção… — Ele apontou. — Acho que já devem ter se afastado bastante. — Preciso encontrá-los! Depois converso com você. — Ela saiu correndo na direção que Vance indicou.

Mas não conseguiu encontrá-los e voltou para casa. Sua mãe estava no jardim, olhando o mar… Roger estava um pouco atrás dela, não muito distante… conversando com Darius. Seu coração disparou, parecendo querer saltar pela boca! A face de Margaret estava sombria quando fitou a filha. — Ele já sabe de tudo. Sua mentira foi bem-intencionada, mas inútil… Darius logo descobriria que eu assinei os papéis. — Ela calouse por um momento e deu de ombros… — Pretende recuperar o garoto… quer se casar com você, deseja os dois… Ele a ama, querida, é impossível negar isso. Nunca pensei que um homem pudesse mudar tanto! Mas ele não vai ter clemência… e quem é que pode condená-lo por isso?

Melissa fitava a mãe, que agora voltava a olhar o mar. Parecia distante, resignada com uma situação contra a qual não podia lutar. Melissa não tinha nada a lhe dizer e se afastou, na direção de Roger e Darius. Eles pararam de conversar e olharam para ela. Foi Roger quem falou primeiro, com a voz calma, sem sinal de ressentimento. — A verdade tinha de ser revelada, Melissa — Ele suspirou. — Darius já disse o que pretende fazer e tanto sua mãe como eu concordamos que tem todo o direito de recuperar o próprio filho. — Você também deseja isso, minha querida? — Darius se

aproximou e tomou a mão dela entre as suas. — Meu amor… já soube como sofreu, como esteve perto da morte. -— Ele a encarou profundamente, sem se importar de que havia testemunhas por perto. — Eu lhe imploro que me perdoe, Melissa. Só o que posso dizer é que era um jovem ingênuo e inexperiente quando decidi me casar, mesmo contra sua vontade. Não sabia nada sobre a vida, sobre o amor, sobre o fato de que homens e mulheres são iguais, têm os mesmos direitos. Mas agora já sei disso tudo, e se você me quiser, nunca se arrependerá por isso!

A mente de Melissa, parecia dar voltas novamente, os pensamentos se cruzavam, confusos. — Não suportaria ver minha mãe na prisão, Darius. — Virou-se

para onde Margaret estava, e viu que ela havia desaparecido. Roger caminhava lentamente em direção à casa. — Será que não há nada que se possa fazer? — Sua mãe está resignada, querida, assim como Roger. Quero

nosso filho, Melissa, e sei que você também quer. Ela concordou com a cabeça, sentindo uma dor aguda no coração. — Eu adoraria ter nosso filho de volta, Darius… Mas o preço é tão

alto… — Ela o fitou com os olhos de súplica. — Oh, por favor, pense numa maneira de livrar meus pais do julgamento! — Isso não acontecerá se os pais adotivos concordarem em

entregar nosso filho amigavelmente. — Eles não farão isso! — Melissa sentia o desespero tomar conta

de si. — Você entregaria amigavelmente uma criança que educou e criou desde recém-nascida? Não, Darius, eles vão querer lutar, pois certamente aprenderam a amá-lo, o consideram como seu próprio filho! — As lágrimas vieram a seus olhos quando lhe passou pela

cabeça a imagem do garoto de oito anos, filho dela e de Darius. — O juiz poderia não concordar em entregá-lo para nós, você sabe… eles sempre pensam primeiro nos sentimentos da criança. Darius a abraçou e fitou seus olhos marejados de lágrimas. — Você fala como se não quisesse nosso filho de volta, Melissa. — Oh, é claro que eu quero. — Ela balançou a cabeça, confusa.

116 — É claro que quero meu filho, nosso filho, junto de mim… mas, por outro lado, isso trará tanta tristeza! — Sua mãe e Roger vão superar tudo isso. — A decisão de Darius era implacável. — E a criança… nosso filho?

— Só tem oito anos, ele também vai superar tudo. As crianças

são assim, querida. — Oh, meu Deus! — Melissa sentia-se a mais miserável das

mulheres. — Como terminará tudo isso, Darius? — Nós seremos uma família unida, Melissa — ele falava com

seriedade. — Durante todos esses anos estivemos separados, mas agora o destino quer nos juntar novamente. Querida, por favor, não chore! — Ele a puxou suavemente de encontro a seu corpo e inclinou a cabeça para beijá-la com doçura. — Daqui a algum tempo, tudo isto pertencerá ao passado e seremos então felizes, os três juntos. — Minha mãe… — Melissa estava desolada — e Roger! — Temos de persuadir a família que o adotou a devolvê-lo sem

recorrer à justiça. — Você já sabe onde vivem? — Sua mãe me deu o endereço. É na Flórida, e ela tem certeza

de que o casal continua morando lá. — Você sabe o nome de nosso filho? — Não, meu amor, não sei.

Que tragédia desabara sobre ela! Naquela noite, Melissa chorou lágrimas amargas, sentada em seu quarto, até que o sol começasse a nascer e a iluminar a praia. Alguns dias depois, quando Darius acertou a viagem para a Flórida, ela estava um pouco mais calma e controlada. Roger havia ordenado a Marcelle que arrumasse suas coisas e partisse imediatamente. Ninguém a viu ir embora, e nem esperavam jamais encontrá-la outra vez. A casa na Flórida ficava em Coral Gables, uma linda cidade ao sul de Miami. Melissa já estivera lá antes, mas para Darius eram novas as largas avenidas e alamedas, os grandes parques e praças, as casas de estilo latino, por causa da influência espanhola. Era uma cidade pequena, onde viviam pessoas em geral muito ricas. Quando Darius localizou a residência que procuravam e estacionou o carro, tanto ele como Melissa a examinaram em silêncio, por longos minutos, nenhum dos dois com coragem de dizer nada. — É melhor descermos do carro — ele falou finalmente. Melissa

sentia as mãos tremerem, o coração ansioso e cheio de expectativa, quando avançaram pelo lindo jardim tropical na frente da casa. Ouviu vozes de crianças, e um homem que dizia:

— Vamos, estou pronto para defender! Pode atirar a bola,

Richard! Um garoto apareceu correndo por detrás dos arbustos, segurando uma bola nas mãos. Ele sorria e estava excitado com o jogo. — Atenção, papai, vou jogar! — Quando preparava-se para atirar

a bola, o garoto virou-se e viu Melissa e Darius, que o olhavam a pouca distância. — Querem falar com meu pai? — Dirigiu-se a eles, sorrindo. Nem Darius nem Melissa foram capazes de dizer qualquer coisa. Ficaram olhando o menino, sua pele bronzeada, os cabelos castanhos, os olhos fundos, seus traços retos e angulosos, de clássica beleza masculina. Era tão parecido com Darius! — O senhor quer falar com meu pai? — O garoto perguntou novamente. Mas neste exato momento surgiu um homem que tinha por volta de quarenta anos. Era simpático e jovial. — Papai — o menino disse quando ele se aproximou — … acho que temos visita!

Duas outras crianças vieram correndo e pararam na frente deles, curiosos. Melissa olhou em volta e engoliu em seco. As crianças que acabavam de chegar eram outro menino, que devia ter por volta de seis anos, e uma menina ainda menor. — Estão procurando por mim? — O homem perguntou com um

sorriso. Foi Darius quem respondeu, com voz grave. — Não, acho que estamos no endereço errado. Deve ser a casa

vizinha, eu suponho. — Os Crockley? Eles estão viajando, devem voltar daqui a três

semanas. —— Compreendo… Bem, desculpe por tê-lo incomodado. —

Darius fez uma pausa e continuou. — O senhor tem uma família encantadora… este garoto, qual a idade dele? — Vai fazer oito anos. É bem grande para a idade dele, não? — Ele é alto — Darius corrigiu, com uma ponta de indignação da qual ele e Melissa ririam mais tarde. — É diferente de ser grande, acho que compreende. — Sim, tem razão. — O homem sorriu, com simpatia. — Da

próxima vez não me esquecerei disto! — Ele deu uma olhada para

Richard. — Meu filho se parece com você, tem a mesma cor dos cabelos e dos olhos… — Sim, ele é diferente dos outros. — Fui adotado — o garoto esclareceu com um sorriso — Mamãe

diz que eu lhe trouxe muita sorte e felicidade, porque não podia ter filhos mas, depois de mim, nasceram meus dois irmãos! O homem riu e disse ao garoto que os outros não estavam interessados naquelas coisas. — Oh, mas podem estar! — Melissa falou pela primeira vez, maravilhada com a sensação de alívio que começava a lhe preencher o coração. Toda a tensão que sentia desde que havia se levantado naquela manhã parecia agora desaparecer. — Acho que é uma linda história, Richard! — Eu também acho! Veja, tenho um irmão para jogar bola

comigo, apesar de que ela é menina e não sabe jogar bem! Mas se esforça bastante, não é, papai? — Ora, eu sei jogar muito bem! — a garotinha protestou. — Está certo… -— Richard concordou, sorrindo para a menina —

Você joga muito bem, Mandy! — Será que gostariam de entrar e tomar um café conosco? — O

pai das crianças convidou. Darius olhou para Melissa. Acima de tudo, ela desejava conhecer a mulher que havia criado seu filho desde o berço. Mas, por outro lado, sentia que seria melhor não vê-la, pois talvez fosse diferente do que esperava e desejava. No entanto, o destino mais uma vez tomou as rédeas de sua vida, pois uma jovem apareceu vindo da casa. Era simpática e bonita e, quando a viu, Richard correu a seu encontro. Ela sorriu e lhe estendeu a mão, que ele tomou com prazer. Era inquestionável que existia uma ligação fortíssima entre os dois, como se fossem mesmo mãe e filho. — Não, acho que não poderemos aceitar seu convite. Obrigado,

de qualquer maneira! — Darius falou. Mais tarde, ele diria para Melissa que, naquele momento, havia sentido que ela também desejava ir embora dali. — Bem, se têm certeza de que não querem entrar… — disse o simpático senhor, depois de explicar à esposa que Darius e Melissa tinham se enganado de casa.

— Obrigado, mais uma vez — Darius repetiu, sorrindo —, mas

temos de partir. — O garoto estava perto dele, e Darius afagou seus cabelos. — Continue assim — ele disse — e ainda vai se tornar um campeão, qualquer dia! A família ficou observando enquanto Darius e Melissa entravam no carro e davam adeus. Pouco depois, numa rua tranqüila, Darius estacionou e Melissa inclinou-se para abraçá-lo, antes que ele o fizesse. — É… é tolice chorar… mas ele se parece tanto com você! — ela

disse, com as lágrimas escorrendo. — E também com você, meu amor — Darius murmurou, seus

lábios acariciando o ouvido dela. — Parece ser tão gentil e suave… É um garoto feliz. — Sim, ele é feliz e está seguro. Oh, Darius, fiquei tão feliz por

tê-lo conhecido. Mas jamais teria coragem de levá-lo embora… Por favor, vai ter que me suportar se às vezes falar nele e chorar um pouco… Um terno sorriso surgiu nos lábios de Darius. — Estarei com você para enfrentarmos tudo juntos, meu amor.

Mas não deixarei que chore, pois não há realmente motivo para chorar, não é? — Não, Darius, não há nada para chorar ou lamentar, você tem

razão. Ele a beijou, então, com amor e ternura. — Nós teremos outros filhos, querida. Isto é, se você também

desejar… Daqui em diante, seus desejos e sentimentos serão respeitados, meu amor. Melissa nada respondeu, deixando-se ficar nos braços de Darius, confiante no amor e devoção que ele nutria por ela. Sabia que algum dia, não muito distante, haveria outra criança na vida deles, que iria crescer como Richard, feliz, segura e rodeada de amor.

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ANNE HAMPSON - BRINCADEIRA DO DESTINO - JULIA 203

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