Entre no jogo - Tatiana Pinheiro

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Janeiro de 2017 Manaus – Amazonas.

Copyright © 2017 Tatiana Pinheiro Todos os direitos reservados à autora Tatiana Pinheiro. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização da própria. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n° 9.610/98, punido pelo artigo 184 do Código Penal. Equipe Editorial: Revisão: Sara Rodrigues Capa & Diagramação Digital: Thais Lopes Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência. Essa obra foi escrita e revisada de acordo com a Nova Ortografia da Língua Portuguesa. O autor e o revisor entendem que a obra deve estar na norma culta, mas o estilo de escrita coloquial foi mantido para aproximar o leitor dos tempos atuais.

SINOPSE Era uma pacata vida monótona, idiota, sem graça e sem nenhuma expectativa. Mas eu tinha que estragar as coisas de uma maneira bem, bem... Bem I D I O TA. Da maneira que só eu consigo fazer. Diferente do que você pensa, eu não sou burra, retardada ou coisa do tipo. Certo que às vezes precisam me explicar algumas coisas mais de uma vez, mas isso é porque eu estou olhando para o nada e pensando no significado da vida. Porém isso acontece apenas umas três vezes no dia. Coisas de pisciana. Fora isso, algumas vezes me intitulam uma Einstein. Isso sempre é o diretor Geral da empresa. Mas por que eu estou me xingando e degradando a minha pessoa? Porque eu sou a menina nerd, apaixonada e inocente que se deixou seduzir pelo MARAVILHOSO ESPÉCIME DE HOMEM. E está completamente perdida. Pode ficar pior. Acredite em mim!

Podemos encontrar o bom em qualquer um, se você der uma chance a ele e o benefício da dúvida. Às vezes, as pessoas te desapontam. Às vezes te surpreendem. Mas você nunca conhece ele tão bem… Até ouvir seu coração One Tree Hiil

PRÓLOGO Eu só poderia ficar olhando para o que parecer ser o meu ex namorado com a sua noiva. Não demorou nem mesmo uma semana para começar a desfilar com ela por todos os cantos em que íamos quando estávamos juntos. Ainda me lembro das suas palavras. “É o que ela tem para me oferecer, Juli. Eu preciso de alguém que seja tão ambiciosa quanto eu, que me ajude a abrir os meus caminhos. E você não é essa pessoa.” Eu sei que eu não era, que eu nunca serei assim. Eu

só queria alguém que vivesse comigo dia após dia. Que vivesse a vida da forma que tem que ser. Alguém que realmente me amasse pelo que eu sou. Mas eu fui trocada por uma oportunidade de ingressão ao meio judiciário. Minha mente diz que isso é para que eu aprenda a não me importar com ninguém. Mas eu não sou feita dessa forma, eu não sei ser egoísta e mesquinha. Eu sei que sempre vou pensar em mim por último. E meu coração diz que um dia alguém vai me escolher me amar. Eu sonho com uma pessoa por muito tempo. Eu sonhei com ele por várias noites. Mas eu não acho que isso vai acontecer, depois de tanto tempo eu não sei se isso vai acontecer. Melhor assim, eu posso manter o meu coração inteiro.

“Lembra quando eu te disse o que as garotas querem? As garotas apenas querem alguém que as queira de volta. Pelo menos eu quero...” Brooke Davis – One Tree Hill

1 Eu me pergunto pela décima vez porque ainda estou aqui nesse maldito trabalho. Quatro anos, três aumentos de salários, várias viagens, um motorista sempre que preciso, conta do cartão de crédito pago pela empresa. Mais uma montanha de coisas para euzinha aqui, dar conta. Mas olhando para o novo iPhone 6 Plus, dourado, de 128 GB, que veio direto da Califórnia para mim, saído da própria sede, em uma linda caixa, com uma linda mensagem de agradecimento sobre ser uma excelente Secretária

Executiva. Me faz gritar internamente: “MELHOR EMPREGO E V E R” — Eu achei que você iria gostar, Juli. — Meu chefe lindo, maravilhoso, o qual eu nunca xinguei, comenta sorrindo. — Sei que você estava querendo mudar o seu. — Aii, chefinho... — droga. Eu tô chorando. — Desculpe, o senhor apenas me pegou desprevenida. — Afasto um pouco os óculos e bato com o dedo em meus olhos para não tirar o corretivo que faz milagre escondendo minhas olheiras. — Eu nem sei o que dizer. — Olho para os seus incríveis olhos azuis. — Eu.... Obrigada. — Seguro as suas mãos. — De verdade, isso foi uma das melhores coisas que eu ganhei. — Querida, por isso que eu peguei ele para você. — Diz mexendo no seu bolso, tirando o seu próprio aparelho. — Peguei o meu e da minha filha. E agradeça a ela, foi ela quem teve a ideia de dar ele a você. Nota mental: Levar Karina para uma noite de bebedeira. Só ela, é claro, já que eu quase não bebo. — Não, Juli. Você não vai sair com minha filha. — Senhor Duarte se levanta. — Eu não quero minhas duas meninas saindo pela cidade bêbadas. Minhas meninas. Ahh, disse que ele me chama de filha? Ele é o melhor

patrão! — Um cinema então? — Peço quando ele está na porta. — Obrigaaaaaaada! Grito quando ele sai. A controladoria nem mesmo perde a linha de concentração com meu grito. Todos eles estão bem acostumados com o meu comportamento que deve ser estudado. Feliz que tenho um tempo de sobra antes da próxima reunião com os gerentes, arrumo meu novo bebê. Depois de ter ele do jeito que quero, deixo guardado na minha gaveta e coloco a chave em meu bolso. — Vamos, amor. — Lorena, a assistente da gerente de compras, passa me chamando. Pego as coisas que separei para o meu chefe. Trabalhar em uma das maiores transportadoras da região Norte do Brasil não é fácil, mas vale a pena. — Por que está com esse sorriso no rosto? — Lori me pergunta enquanto levamos as guloseimas para a sala de reunião. — Conseguiu as suas férias? Isso acaba um pouco com minha alegria. Com o novo gerente chegando, tive que adiar minhas férias por algumas semanas. Quero minha mãe cozinhando para mim, meu pai me mimando e minha irmã sendo a minha escrava. — Sinto falta de casa! Lori vem até mim, me abraçando. Ela sabe como eu

me sinto em relação à minha família. Morar sozinha em uma cidade longe de casa é muito solitário. Mesmo para mim que não é social demais. Lori limpa as lágrimas com a proeza de não sujar as lentes dos meus óculos. — Assim que você arrumar o cara novo, eu mesma falo com seu Duarte para lhe dar seus dias de férias. Sorrio para ela agradecida. Não posso ficar mais do que dez dias longe. Seu Duarte não funciona sem mim aqui. Culpa minha, eu o mimei assim. Sou babá dele tanto fora quanto dentro da empresa. Cheguei aqui na época em que a sua esposa faleceu e cuido dele como cuidaria do meu pai. Penso nele como o meu pai de outro Estado. Por isso os poucos dias de férias. E tem o meu lado de não conseguir ficar parada. Estou sempre arrumando alguma coisa para trabalhar. — Vem, vamos. — Digo já indo para a sala de reuniões. — Ah, eu ganhei um iPhone novo do chefe e da Karina. — Vaca! — Ouço antes de sair da copa. Rindo enquanto Lori me xinga, arrumamos os aperitivos na mesa, depois as pastas em seus devidos lugares. Assim que deixamos tudo pronto, Lori vai e me deixa sozinha esperando os chefes. Infelizmente, sou

obrigada a estar aqui em todas as reuniões em que meu chefe está. Chefe mesmo, é seu Duarte, mas eu tenho que manter os olhos nos outros sete gerentes e por um mês ser babá do mais novo. A primeira a chegar é a gerente de recursos humanos. Sério, ela é insuportável, mas traz umas boas lembranças para mim quando está no Canadá. Depois tem a gerente de compras, o que ela tem de linda e inteligente, tem de estúpida, antipática e ignorante. Todos eles chegam cedo. Meu chefe puxa a cadeira ao seu lado para que eu me sente. Uma vez ele me falou que se um homem não puxa uma cadeira para que eu sente, ele não deve ter a minha companhia e muito menos uma chance. — Obrigada. — Bem, Califórnia ainda é a mesma. — Meu chefe começa atualizando os gerentes sobre a viagem que fez para onde é a sede de um dos nossos mais importantes clientes. Ele diz que o contrato com eles for renovado por mais três anos, com uma porcentagem de trinta e cinco do lucro anual dele. Ou seja, não vamos falir se depender deles. Eu tomo nota dos assuntos que os gerentes querem discutir com o meu chefe. Faço isso, pois antes deles agendarem hora com ele, vamos analisar se vale o tempo perdido ou não. Kátia, a irritante das compras, continua com a ideia

de um novo galpão para a expansão. — Kátia, nós já falamos sobre isso. Leonardo já disse que ainda não há necessidade de uma ampliação. Se compras, almoxarifado e produção, acharem necessário, falaremos sobre isso. Ela acena, mas não está nada satisfeita com isso. Vou conversar com Leo sobre isso. Quem sabe ele consegue tirar isso da cabeça oxigenada dela. — Agora, sobre o novo gerente. Juliane, por favor. Aceno para ele e ligo para Lorena que está com ele na outra sala. Não sei o porquê de toda essa encenação. O cara já está contratado, por que tem que ter todo esse processo? Todos ficam em silêncio, esperando o dito cujo. Olho para as minhas unhas e percebo que vou ter que tirar o esmalte delas depois dessa reunião para pintar hoje à noite. A porta se abre e vejo apenas a beleza em pessoa. Meu chefe levanta com um grande sorriso no rosto. Ele aperta a mão do cara e o apresenta a todos. — Deem as boas-vindas ao nosso novo diretor financeiro. Augusto Belmonte — É bom estar aqui. Ele se apresenta a todos. Eu rezo a todos os meus santinhos para que o chefe me esqueça. Mas não adianta. — Juliane estará à sua disposição enquanto você se

acostuma à cidade. — Meu chefe parece muito feliz. — Juli, querida. Mostre a sala do nosso novo amigo. — Claro! Me acompanhe, por favor. — Digo colocando os meus óculos no lugar. Observo como ele me encara. Parece confuso. Não, não! Nem pense nisso, mocinho. — A diretoria não é tão grande. — Éeeeee. Tagarelar é bom. — O senhor com certeza não vai se perder. — Tenho um bom senso de direção. Eca! Eca! Egocêntrico. A sala dele fica no mesmo corredor que o meu. Duas salas depois da minha. — Essa é sua sala. Pode arrumá-la do jeito que quiser. Aqueles são os papéis sobre algumas informações da empresa. — Aponto para a pasta. — O técnico de TI estará vindo até aqui para criar um login e senha para você. Ohhuu! Bato de frente com ele quando me viro. Meus óculos saem do lugar e mais uma vez tenho que arrumar. — Me lembre de falar com você da porta. Assim eu não corro o risco de mais um hematoma. Ele não para de me encarar. — Você é sempre faladeira assim? Oxiii!

— Na maioria das vezes, sim. Há uma lista de ramal ao lado do telefone. Logo mando um email quando Thiago arrumar o seu computador. Qualquer dúvida, pode vir até mim. Não dou a ele a chance de falar alguma coisa. Apenas vou embora para a minha sala. Alto, olhos lindos, cabelos escuros. Mais gato do que eu me lembro. De tantos caras que poderiam vir trabalhar aqui, tinha que ser justo a versão mais gostosa do Brian J. Smith? Crack Crack Já ouço meu coração idiota se partindo. Ω Hormônios, tão bons em algumas situações, mas tão impróprios em outras. Deveria existir um botão de liga e desliga. Sério, assim seria muito fácil de evitar situações de total descontrole e inconvenientes. Se bem que é até impossível algo ser conveniente quando se trata daquele pedaço de carne que se denomina homem. Meu Paizinho lindo e poderoso, o Senhor estava bem inspirado quando criou ele, hein?! Mas perdeu a

fórmula, não é? Porque difícil achar um desse tipo na esquina de casa. Eca! Eca! Na esquina de casa tem uma oficina com senhores muito barrigudos e com dentaduras. — Aii! — Bato nas minhas têmporas. — Isso ficou na mente, merda! — Isso é algum tipo de TOC ou você costuma se bater algumas vezes no dia? — A voz grossa que faria Bruce Wayne sentir inveja me assusta. — Minha Nossa Senhora, você não pode fazer isso com uma pessoa hipertensa. — Não que eu seja, mas se fosse? Meu chefe estaria perdido sem mim, minha mãezinha perderia a sua melhor amiga e meu pai ficaria sem o seu filho com saias. Já que meu irmão é frouxo. Esse espécime de homem me tiraria de minha linda família. — Você é hipertensa? — Levanto a cabeça e encontro lindos olhos claros. Augusto Belmonte não é nada além de lindo. Ele bate de frente com meu grande amor, Evans. Bate de frente, porque ninguém NUNCA vai chegar aos pés do meu homem. Mas esse cara chega no dedinho do pé dele. — Não, graças a Deus, mas se continuar a invadir minha sala assim, possa ser que eu esteja nas estáticas do Fantástico.

Ele me encara querendo entender o que quero dizer com isso. Não vou ter que explicar minhas loucuras pra mais ninguém. É exaustivo de muitas formas. — Esqueça o que eu disse. — Digo em um tom baixo. — O que posso fazer pelo senhor? Augusto se senta na cadeira à minha frente. Ele cruza as pernas e esfrega o seu lábio inferior. — Primeiro, vamos tirar esse senhor de todas as frases que vai se referir a mim. — Ele se inclina para frente, colocando a mãos cruzadas em cima da minha linda, muitíssimo organizada, mesa. — Não sou novo, mas também não sou velho a ponto de se referir a mim como senhor. Tudo bem, Garotão! — Segundo, pensei se você poderia me acompanhar dentro das instalações da empresa. Quero conhecer os supervisores e cada setor. Babá por um mês. — Posso fazer isso. — Dou a ele um sorriso de boas-vindas, aquele útil quando tento ser simpática, mas na maioria das vezes não dá muito certo. — Me deixe pegar alguma bata para você. Abro o armário que fica à minha direita. Facilmente pego uma bata tamanho grande para ele e a minha bata

azul, que a engenharia mandou pra mim. Sim, diferente da administração, se fosse branca, estaria todo dia mandando para a lavanderia. — Se for nova e der em você, pode ficar com ela, senão eu posso pedir ao RH para mandar uma nova. Ele pega a roupa sorrindo pra mim. — Essa vai servir, obrigado. — De nada. Amarro os meus cabelos em um rabo de cavalo, para que o gerente da produção não reclame quando passar por sua mesa. Tamborete de forró tinhoso aquele ali. Augusto abre a porta para que eu saia. Desligo a luz e ele me segue até a escada que dá acesso a nossa primeira parada. — Juli. — Silvia me para antes de chegarmos a escada. — Preciso da liberação para nota ainda hoje, lindinha. Salve minha vida, por favor. — Deixe em cima da minha mesa, peço para Herbert pegar as assinaturas ainda hoje, flor. — Digo jogando um beijo para ela. — Obrigada, Kátia me mata se não pagar essa nota para o treinamento. — Deixe que eu me viro com ela. — Me viro para Augusto que está atento em nossa conversa. — Silvia, esse é o nosso diretor financeiro, em pouca palavras, seu

novo chefe. Senhor Augusto, essa é Silvia, ela é nossa analista financeira sênior. Com certeza vocês vão trabalhar muito em me deixar louca. Eles apertam as mãos. — Bom conhecer você, chefe. — Diz divertida. — Vou deixar você seguirem. Augusto abre a porta pra mim mais uma vez e se põe ao meu lado quando descemos as escadas. Claro que eu vou devagar, sem correr o risco de cair e quebrar o pescoço sujando o nome da empresa. Se descalça, consigo cair só com o vento me batendo, com um salto de oito centímetros em uma escada, possivelmente posso parar na enfermaria. — Há quanto tempo está aqui? — Pergunta assim que passamos pela engenharia. Dou um aceno para Henrique, um mineiro muito do lindo que ainda não tive coragem de chamar para almoçar comigo. Século 21, as mulheres devem tomar atitudes sim! — Cinco anos daqui a algumas semanas. Me sinto em casa já. Ali. — Aponto para a entrada do grande galpão. — É onde a mágica acontece. Fico por mais ou menos uma hora apresentando a empresa para ele. Então chego no meu segundo setor favorito. Almoxarifado.

Augusto me ajuda a subir na cabine. Assim que coloco a perna direita dentro dela, os assovios começam. — Leo, sua prometida chegou. — Um dos caras grita quando me vê. Só que tenciono com uma grande mão em meio as minhas costas. Perto demais. — Eu sei! Eu ouvi os seus saltos assim que ela saiu do galpão. — Reviro os olhos com sua eterna implicância com meus sapatos. — Ela ainda não aceitou. — Leonardo aparece em minha frente em segundos. — Mas um dia vai, não é mesmo? — Depois que você se tornar o Evans, quem sabe? Leo, estou apresentando as instalações para o senhor Augusto, ele é o nosso novo diretor. Augusto, esse é Leonardo, ele é o supervisor de materiais, e o cara que está sempre me dando contas para pagar. Eles apertam as mãos. Leonardo está bem simpático, mas não posso dizer o mesmo de Augusto. — Já que você está aqui, mocinha. — Leo vai até a sua mesa e pega minha pasta L azul. — Aqui o que você me pediu, agradeça ao Levi pelo treinamento. Cadê as botas que lhe dei? — Não combina com minha roupa. E tenho autorização de todos os gerentes para estar aqui de salto.

— Amanhã? — Certo! — Me viro para a minha criança. — Vamos, agora preciso que você leia o grande email que mandei para você. — Nem eu mesmo sei o meu email. Todos na cabine riem. — Está falando com a Juli Guedes, claro que ela já sabe o seu email. — Leo aperta minha mão. — É por isso que ela trabalha pra você. — Exatamente. Assim que deixo Augusto em sua sala e volto para a minha, me afundo em programar a agenda do meu chefe e saber se tudo está certo com o apartamento da minha criança. Antes de conhecê-lo, eu não tinha nenhum tipo de interesse nele. Mesmo tendo feito o trabalho de fazer com que toda a viagem, chegada e permanência fosse a mais fácil e tranquila possível, ele não me despertou a curiosa ativa em mim. Mas agora. Tenho meu fiel Google aberto, junto com a pasta que o RH me enviou. Bruce Wayne deveria ter treinado comigo. Deveria sim. Ele deve morrer de inveja de minhas técnicas de investigação. Tenho toda vida do novo chefe em minha mão – quase toda –. Poderia sim, ter revirado o Google,

mas apenas tomei um lanche com meu chefe e ficou tudo bem. Seu Duarte pode ser uma fofoquita de plantão, quando aumentam o seu orgulho. — Algo mais que o senhor deseja acrescentar? Meu chefe desliga o seu computador. — Acrescento a sua ida para casa, nesse momento. Vá para casa, Juli, ainda estamos iniciando a semana e não quero deixar você cansada logo agora que tem que adaptar o Augusto. — Depois de fechar esse contrato, prometo que vou. Boa noite, chefe. — Boa noite, minha querida. A controladoria está vazia. Todos se foram, já são mais de cinco da tarde. E como sempre, ainda estou aqui. Recolho as entradas e protocolo antes que alguém as perca. Uma batida no vidro me assusta. Thiago do TI coloca a cabeça para dentro da sala. — Menina, um dia esse trabalho ainda acaba com sua vida. Quer carona? — Se isso acontecer, a indenização para minha família será grande. Valeu, mas eu tenho meu estoque de boleto de táxi intactos. Mordo a língua debochando dele. — Nerd.

— Que você ama. — Quinta? — Pergunta. — Mas é claro, meu amor. Me obrigue a não ir. Ele vai embora rindo, enquanto volto para os papéis em minha frente. Pego o meu novo bebê e coloco em cima da mesa. Abro o Spotify com a seleção de músicas de segunda. Não é depressiva, é apenas La Devotte. Minha paixão de treze anos, Brendon Urie, sabe compor músicas dramáticas, mas que levanta o teu ânimo. Depois de protocolar trinta documentos, dois pacotes de M&M, e quinze músicas, desligo o computador. Ligo para a portaria pedindo que chamem um táxi para mim. Jogando tudo em minha Kipling. — Você costuma fechar a empresa também? Filho do Pai Celeste! — Sério, por favor. Não faça mais isso. — Digo me agachando com a mão no peito e recolhendo as coisas que caíram. Ele sorri e me ajuda a levantar. — Você é daquelas pessoas que são as primeiras a chegar e as últimas a sair? Respiro fundo, sentindo o seu perfume. Nossa senhora das meninas que não fodem há meses,

por favor, tenha compaixão de mim. — Não, eu só faço isso quando estamos integrando alguém novo de cargo grande. O senhor também está até essa hora aqui. — Olho para o relógio. — Tenho que ir. — Então vamos, estou indo mesmo. Lá vem aquela mão em minhas costas de novo. Dou um passo para longe. Se ele percebeu que fugi, escondeu bem. Contato humano ou é tapa ou quando os finalmente acontecer. Augusto abre a porta de vidro para que eu passe. Ele vai para o estacionamento enquanto eu vou para a portaria esperar o meu táxi. — Boa noite, Julianne. Isso foi o meu corpo tremendo quando ele disse o meu nome pela primeira vez? Não. Foi apenas o raro vento da cidade que bateu em mim. A buzina do táxi me assusta. Dou tchau para o tio da portaria enquanto ando até o carro. Primeiro dia sobrevivido com sucesso.

2 Eu não me importo se tenho que pagar um horror de conta de luz - claro que não faço, porque estou o dia todo na empresa, são poucas as horas que eu fico no meu pequeno apartamento na zona sul. – Já que eu moro na pequena amostra do inferno que se chama Manaus. E me dou esse luxo de ficar embaixo do cobertor terminando de ler o próximo livro da amiga. Eu já quero matar essa pequena sirigaita que quer separar o casal. Meu telefone toca três vezes. E as três vezes eu

ignoro. Se for alguém importante, do tipo caso de vida ou morte, vai ligar para minha casa. Trim. Trim. Tá de sacanagem? Largo o meu Kindle de lado e pego o telefone sem fio. — Que que foi? — Tenho certeza que essa não foi a educação que eu te dei, Juliane. Atenda da forma que eu lhe ensinei. Merda! — Alô, quem fala? — Digo em um tom educado que eu simplesmente odeio. — Oi, querida, aqui é a mamãe! — Eliza diz do outro lado da linha. Mesmo que ela me faça esse tipo de coisa como: ser a menina que ela criou para ser uma moça, eu a amo e sinto falta dela. — Olá, dona Eliza! Lembrou que tem filha? — Digo me debruçando na cama. — Assim você machuca o coração da mamãe, Jujuba. Você está sempre em meus pensamentos, querida, a todo segundo. — Se eu disser que você está nos meus em todos os momentos, estarei mentindo, mamusca, porque tem horas

que só consigo pensar em planejamentos e números. Ouço a risada do meu pai ao fundo. — Estou no viva voz? — Sim. — Papusco! Sinto sua falta. — Eu também sinto a sua, meu moranguinho. — Ei, Julli Bobona! — Minha irmã Cassandra diz. — Hello, Cass Travosa. Papai e minha irmã se acabam em gargalhada. — Querida, quando você vem de férias? — Mamãe pergunta. — Assim que eu terminar minha operação babá com o novo chefe. Não se preocupe, mamusca, estarei aí e a senhora vai me expulsar depois de alguns dias. — Nunca, meu amor. Mamãe me prendeu por duas horas no telefone. E quando eu dei por mim, já estava na hora de me jogar na cama e dormir mesmo. Ω Assim que desci para a saída do pequeno condomínio onde eu moro, o senhor José estava me esperando na saída

do estacionamento. Ele desce do carro e abre a porta para mim. — Menina Juli. — Bom dia, seu José. Como não tomei café da manhã, o convidei para tomarmos café na estrada em que leva ao nosso trabalho. Como uma tapioca com queijo e seu José me acompanha. — Não incomoda o senhor ter que me pegar em casa? — Pergunto querendo ter uma das respostas que sempre quis ter. Ele me olha como se eu fosse alguma aberração. — Claro que não, menina. — Ele aperta minha mão com delicadeza. — Ter companhia em uma das muitas viagens que eu faço durante o dia, é com certeza a melhor. — Pensei que me achasse uma chata. Ele ri com vontade. — Juli, você é única, verdadeira, sincera, não sabe esconder o que sente e isso hoje em dia é tão difícil. Então não mude. Podem dizer que isso é um defeito. Mas eu acho que isso é a melhor defesa que uma pessoa pode ter. Com as suas palavras e com um humor tão leve, ele nos leva para a empresa. Do jeito que todos teclam desesperadamente em seus computadores, sei que estarei no telefone a maior parte do tempo.

Assim que sento, o telefone começa a tocar. Notas ficais vencidas, entradas de documentos perdidos, dois contêineres com materiais importantes que ficaram presos na alfândega, três notas que passaram despercebidas por mim e pela gerente de materiais. Para completar, seu Duarte está fora da empresa até depois do almoço. — Juli, eu preciso desse material para hoje. — Henrique está implorando. — Eu não consigo falar com o Gonçalves. — Leo mexe em seu celular mais uma vez. — Eu não acredito que você deixou passar isso, Juliane. Claro! Eu sou a filha da puta que errou. — Henrique, peça ao RH liberação de quatro horas extras para hoje. — Ele não perde tempo. — Leo, tente me colocar com Gonçalves ou Andrade o mais rápido possível. — Me viro para a megera. — Kátia, você pode tentar conversar com a Silvia para mudar as notas assim que estiver tudo certo, pode me dar. Meu erro, eu tenho que consertar. Digo isso e vou para a minha mesa tentar conter o incêndio. Deixo o meu celular no silencioso mesmo. Me tranco na sala como há muito tempo não fazia. A bina do meu

ramal diz que tenho o sub superintendente da alfândega na linha. — Andrade, você me deve um favor, eu estou cobrando ele. — Digo antes que ele diga alô. — Se você não me deu o seu alô legal, é porque o negócio é sério, o que eu posso fazer por você, garota? Depois de pedir a ele que liberasse o meu material, prometendo que eu mesma levarei os documentos para ele hoje, consigo ter Leonardo e Henrique com a pressão arterial normal. Meu chefe chegou antes do que eu imaginava. — Às vezes eu gosto de resolver problema, Juli, mas eu sei que não faria com a mesma rapidez que você. Dou a ele uma careta. — Minha burrada, nada mais justo do que eu mesma arrumar. — Nós dois sabemos que isso não é toda a verdade. — Diz se sentando na beirada da mesa. — Kátia tem a assistente dela para isso. Ou ela ainda usa Lorena para agendar os tratamentos de beleza para ela? — Não faço ideia, mas quer saber? Tanto faz. Minha ou não, sempre vão correr para mim quando não conseguirem arrumar alguma coisa. — Esse emprego ainda vai deixar você louca. Olho para ele que ri.

— Mais do que você já é, é claro. — Assim é melhor. O senhor já almoçou? Quer que eu peça alguma coisa? — Não se preocupe comigo, vá comer, respire fundo e, por favor, não deseje mal para a minha gerente de matérias. — Claro, eu posso comer alguma coisa. Um fato bem assumido em minha vida: Meu vício por batata frita. Sério! Guerras poderiam ser perdoadas com batatas fritas com molho cheddar e um tiquinho de bacon. E para selar a paz, uma Coca-Cola bem gelada para o brinde. E isso foi o meu almoço. Sério, precisava me prender na sala de reunião anexa à sala do meu chefe para enfim respirar depois de três horas resolvendo confusões para a semana inteira. Meu ramal móvel toca e não atendo. Ele toca por mais três vezes. — Hora de almoço. Não seja chato! Ignoro com vontade o telefone, ainda me falta quarenta minutos de almoço. Devorar uma porção de batata frita e um sanduíche de queijo com bacon, quando se está estressada, não demora muito para engolir tamanho orgasmo em forma de comida.

Me deito na pequena poltrona que tem no canto da sala. Coloco meus fones de ouvido, com o volume baixo eu ouço a minha lista de pacificação. Abro o WhatsApp e vejo as mensagens chegando uma atrás da outra. Espero o aplicativo atualizar e o primeiro grupo que vejo é o da minha família. Mamãe com as suas habituais flores de bom dia, papai reclamando do trânsito indo para o trabalho, minha irmã com seus dias e nada mais do que isso. E meu irmão me fazendo sorrir verdadeiramente quando envia uma foto da minha sobrinha de três anos. Saudade de Joaquim, meu irmão mais novo está sempre fazendo meu dia quando me mostra a pequena anjinha que trouxe ao mundo. Fim de semana eu vou até vocês. Eu posso fugir nesse feriado e fazer uma visita a eles. Tenho tempo o suficiente para isso. Um número desconhecido me deseja bom dia, mas eu nem mesmo me dou o trabalho de responder. Apago e deixo bem claro que eu ignorei. Meu irmão responde que está me esperando com três potes de sorvete de sonho de valsa, em troca, tenho que ficar de babá com minha sobrinha por uma noite. Tudo pelo amor. Meu irmão jogando na cara que faz tempo que eu não

sei o que é uma boa noite de sexo. Valeu, irmão, esfrega na cara que eu sou uma solteirona de vinte e seis anos que não tem a capacidade de arrumar um cara para que possa dar a ela um pouco de sexo bom, que melhore até o humor. Você sabe como levantar o meu humor. É a verdade, então me resta ter uma noite cheia de Pina e Luna com minha fofinha de três anos. Meu telefone continua a tocar e eu continuo ignorando. Fico olhando as promoções de passagens para as minhas férias. Minha nossa, companhias aéreas estão enriquecendo a cada dia. Deus me ajude! Descanso o meu corpo por mais uns minutos. Quando faltam dez minutos para encerrar o meu almoço vou até o banheiro e escovo os meus dentes. Coloco um pouco de batom em meus lábios e arrumo o meu cabelo em uma trança de lado. Assim que chego na minha sala, tenho as notas que a bruxa deixou em minha mesa. Totalmente desorganizado, para acabar com meu dia. — Ela não ganhou esse apelido de propósito, né, Juli? Digo já ligando o computador. Será que se eu pedir para não me incomodar, farão

isso? Muito provavelmente não. Eu que dou o recado de: Não quero ser incomodado. Não o contrário. Pedi mil desculpas ao Andrade, mas não posso levar os documentos para ele. Hoje é a sessão do Leo e a recuperação do meu amigo é mais importante do que qualquer material que ficou preso no porto. Ao menos o tempo passou rápido hoje. Comendo uma barra de chocolate eu pego a assinatura com o meu chefe que está ao telefone com alguém. Augusto passa por mim e ambos trabalhamos muito bem em nos ignorarmos. Augusto fica em frente à mesa enquanto dou os documentos para o meu chefe que rabisca com força os papéis. Ele só fica assim quando fala com uma pessoa. A sogra dele. — O senhor está bem? O que a Medusa criou dessa vez? Seu Duarte respira fundo. — Nada do que já não estou acostumado. — Ele me dá um sorriso me tranquilizando. — Não se preocupe, Juli, eu já sei como lidar com ela. — Por isso que eu comprei esse telefone para o senhor. — Aponto para o lindo aparelho que mandei trazer de São Paulo só para evitar isso. — Para ignorar a Medusa de sua sogra.

Meu chefe apenas ri, enquanto termina de assinar os documentos. — E você, Augusto? Já conheceu algum lugar da cidade? — Ainda não! — Ele olha diretamente para mim. — Ainda vou pedir algumas indicações para Juliane. Isso! Me joga no meio do tiroteio. — Juliane conhece lugares maravilhosos. Ela está sempre encontrando algum lugar novo pela cidade. Faço uma careta. O que ele quer dizer na verdade: “Aproveite e leve Juliane com você. Assim ela sai do seu apartamento no qual vive enfurnada. Leve ela para respirar fundo e apresente alguém para ela que não seja dessa maldita empresa.” Isso foi o que ele quis dizer. — Se ela quiser a minha companhia, tenho certeza de que ela vai me surpreender. Eu sorrio para o cara, mas belisco o braço do chefe discretamente, tirando um pequeno gemido de dor. — O senhor está bem? — Augusto pergunta para ele que balança a cabeça em negação. — Apenas a minha habitual dor nos ombros. Pequeno traidor. Duarte encontra o meu olhar e sorri. Sabe que em minha imaginação, ele já sofreu os piores

tipos de tortura que já existiram. — Então, vocês me contam depois como foi esse passeio. — Meu chefe diz encerrando o assunto e esfregando o local em que eu o belisquei. — Passo na sua sala antes de ir e combinamos as coisas. — Augusto diz baixo em um tom que me fez quase quebrar o pescoço apenas para encará-lo. Estreito os olhos para ele, que sorri, mas não por muito tempo, já que logo volta para o meu chefe. Deixo os dois sozinhos e vou para minha sala, pego as minhas coisas e logo fujo para o estacionamento indo até o carro de Leo, para irmos para a sua sessão. Ω Sabe o que mais me irrita nesse mundo? É pessoa que se intromete na conversa sem nem mesmo ser convidada. Certo, isso não é a única coisa que me irrita, há várias coisas que é impossível de serem listadas. Claro que eu fecho a cara e saio antes que possa estragar minhas unhas. E é isso que eu faço na maioria das vezes em que as duas gerentes se encontram na hora em quem estou tomando o café quando chego um pouco tarde na empresa, como hoje. Elas começam a dizer coisas que são irritantes para

mim. Vou para a minha sala e termino o meu café aqui. Mas minha paz reina por poucos minutos já que Augusto entra. — Bom dia, Juliane. — Diz baixo. — Posso? Pergunta se pode se sentar. Minha resposta deveria ser não, pois quero tomar o meu café em paz. Mas eu sou educada demais para isso. Minha mãe deve tá orgulhosa de mim. — Claro! Digo terminando o pouco do café que restava. — Reparei que você gosta muito de café. — Diz olhando para minha caneca vazia. Ela é uma caneca mágica, meu irmão que me deu. Essa e mais três, e eu trouxe essa com o desenho de bateria para o trabalho. Recarregando sempre. — Eu comprei duas caixas para mim no aeroporto. — Diz colocando uma caixa de grãos de café do Starbucks. — Pensei em dar uma a você. Olho para a caixa linda à minha frente. — Eu nem sei o que dizer. — Digo pegando-a com delicadeza. — Você me fez a mulher mais feliz do mundo com essa simples caixa. Ele sorri, como se estivesse satisfeito com tudo isso.

— Obrigada! Sério, obrigada mesmo. — Por nada, Juli. — Diz relaxando mais na cadeira. — Então, o que podemos fazer algum dia desses? Andei pesquisando bons lugares para conhecer. Não! Por favor, não! Você conseguiu estragar o momento, cara. — Senhor Augusto. — Como eu posso dizer isso? — É tão difícil que eu consiga encontrar um momento livre. — Segunda? — Aula de Ioga. — Terça? — Sessão de Fisioterapia do meu amigo. — Quarta? — Vôlei. — Quinta? — Cinema. — Sexta? — Dia das amigas. — Fim de semana? Ele não se altera em nenhum momento e vai insistir até o momento em que vou ceder a ele. — O amor da minha vida!

Ele arqueia uma sobrancelha não muito feliz com a minha resposta. — Que seria? — Netflix e uma possível passada na Saraiva ou estourando meu cartão na Amazon. Ele sorri. — Eu preciso conhecer alguns lugares na cidade, gostaria que você me acompanhasse. Um passeio na Orla? Você escolhe o primeiro local. Por favor, Juliane, não me faça ir sozinho, correndo o risco de me perder. Seus olhos estão como os de um cachorro que teve seu osso roubado. Por que eles sempre têm que possuir esse olhar? — Eu posso ver alguma coisa para esse fim de semana, tudo bem? Ele sorri mais amplamente. — Eu vou precisar que você responda as minhas mensagens para me atualizar dos planos. — Eu ainda não tenho o seu número pessoal. Desculpe. — Tento não soar estúpida. — Mas eu preciso entrar em contato com você sempre que puder. — Você o tem, mas parece que você já ignorou. — Como assim? — Você provavelmente não leu as mensagens de

ontem. As mensagens do número desconhecido. — Não, não li. Eu faço isso, desculpe. — Tudo bem. — Diz passando o indicador por seu lábio inferior. — Já que vai me responder agora, eu vou deixar você trabalhar. — Obrigada mais uma vez pelo café. — Você pode me agradecer me oferecendo um pouco dele enquanto estiver tomando. — Diz se levantando e arrumando o botão de sua manga esquerda. — Tenho certeza que você sabe fazer melhor do que ninguém um café tão bom. Diz indo sem me dar uma chance de responder. Meu telefone apita e sei que é uma mensagem dele. Assim que eu salvo o contato, posso ver a foto de perfil dele. Minha nossa!! Com todos os ss necessários. Ele está com uma blusa branca. Uma de suas mãos está ao que parece coçando a sua cabeça, enquanto a outra está apoiada em seu joelho. Seu sorriso é o mais cafajeste possível. O relógio caro diz que ele é tanto descontraído quanto alguém importante. Nunca uma foto de WhatsApp foi tão linda. O cara

consegue ser comível até por uma foto. Enquanto ele consegue ser tudo isso e mais um pouco, eu consigo ser mais Nerd que o normal. Minha foto com o cachorro do meu pai lambendo os meus óculos é o que me classifica como a garota que vai morrer solteira com vários cachorros e um vibrador para cada dia da semana. — Muito bem, Juliane! Minha paz volta a reinar até que Kátia aparece querendo que eu resolva o problema com a sua passagem para viagem ao sul. Ela quer trocar pela primeira classe e eu não sei se o chefe vai aceitar isso. E como meu chefe não está aqui, eu vou direto para Augusto que me atende rapidamente. — Você pode vir a mim sempre que quiser, não precisa se incomodar em ligar. Tudo bem. — Kátia quer trocar a passagem dela econômica por primeira classe. — Estalo minha língua. — Ela pode pagar com o dinheiro dela e depois a empresa reembolsa, ou você pode autorizar a mudança agora mesmo... — O que você acha de um almoço nessa cidade a poucas horas daqui? — Como? Ele sorri.

— Um almoço, perto da cachoeira. — Isso é legal, mas eu realmente preciso que você me ajude com isso. Kátia não é muito paciente e eu... — Se ela quiser ir de primeira classe, isso sairá do bolso dela, se não quiser pagar vai de econômica como qualquer outro funcionário da empresa. — Diz tão tranquilo quanto um monge. — Agora me diga, sobre essa cidade, Presidente Figueiredo, o que acha de um almoço no sábado? Fico olhando para ele me perguntado se ele quer minha opinião ou se está pedindo minha benção. — Juli? — É uma cidade linda, com certeza você irá gostar. — Então posso pegar você que horas no sábado? — Você quer que eu vá com você? — Sim, só agora que eu entendi. Augusto joga a cabeça para trás e ri com vontade. Que bom que minha lerdeza momentânea diverte as pessoas. — Juli, você é uma coisinha bem divertida. — Diz se ajeitando em sua cadeira que custou uma fortuna. — Faz esse tipo de coisa com frequência? Dou de ombros — Três ou quatro vezes no dia. Algo como isso. Mas sério? Você quer que eu vá?

Ele cruza as mãos em cima do seu estômago e me leva todo o esforço que meu corpo não tem, para não olhar onde suas mãos estão. — Sim, quero que vá comigo. Já que você tem o tempo muito escasso, resolvi procurar por você e apenas dizer o nosso plano para o fim de semana. — Se não envolver nada perigoso e com esforço físico, podemos fazer isso. — Que tipo de esforço físico você diz? — Tudo que possa me fazer ficar cansada, suada, em estado inicial de esgotamento físico e mental. — Mas você joga vôlei. Isso já é um esforço. — Certo, mas é apenas uma vez na semana, nada mais do que isso. E isso, é minha paixão de infância. Ele me dá um sorriso cafajeste. — Há outros tipos de esforço físico que eu tenho certeza que você gostaria de praticar todos os dias. — Renego! Sem chance de persuasão. — Eu posso fazer você mudar de ideia. — Obrigada, eu vou dar a notícia para Kátia. Seu olhar muda quando digo o que tenho que fazer. — Eu mesmo posso dar essa notícia a ela. Você pode chamá-la para mim?

— Eu não vou te impedir de ouvir por mim. Sério. — Digo já indo buscar a bruxa para o encontro do príncipe encantado. Ela se ilumina toda quando digo que ele quer falar com ela. Quero só ver se o sorriso vai continuar quando ela descobrir que o pedido de estar na primeira classe foi renegado. Assim é bom, pois Augusto descobre logo quem é a sua subordinada. Leo me chama para almoçar com ele e os meninos. E eu vou feliz. Sorrio muito quando eu vejo que suas mãos estão mais fortes, assim como o seu braço direito. Ele percebe que estou pensando demais e me enche de perguntas sobre o novo chefe. — Até agora eu não tive muito para saber. — Eu sim! — Ele diz baixo. Os rapazes estão em uma conversa sobre futebol, deixando nós dois de lado. — Eu dei uma pesquisada. — Sério? E o que você, Sherlock, descobriu? Leo termina de comer a sua sobremesa. — Filho mais novo e único homem depois de três mulheres. Formado na Universidade de Minas Gerais, MBA em Columbia. O mais novo de sua turma. E o mais importante. — Diz jogando o garfo em sua bandeja. — Uma enorme lista de ex namoradas com os corações

partidos. — Nada do que eu já não soubesse. — Digo. — E eu terei que ser a babá dele. Espero muito não ter que lidar com as meninas jogadas para escanteio quando ele se enjoar delas. Na verdade. — Penso em algo bom. — Ele pode me pagar por fora para fazer isso, já é uma grana a mais. Leo revira os olhos. — Como se você precisasse de dinheiro. Não tem um pinto para dá um pingo d’água, ganha uma grana legal por mês, boa parte das suas despesas a empresa paga, não sei porque precisa de mais dinheiro, Juli. Me aproximo mais dele. — Preciso juntar grana para pagar uma noite com o Chris Evans. — Olho para os lados. — Você sabe que isso é um caso de vida ou morte, Leo. — Juli, nem mesmo você vendendo a alma para o demônio, você conseguiria. — Você acaba de destruir as últimas gotas de esperanças que restavam em meu coração. Espero que esteja feliz, Leonardo. — Espero que tenha colocado um pouco de juízo em sua cabeça tão desligada do mundo. — Se nem minha mãe conseguiu, como você vai? Digo pegando minha bandeja e levando para a copa.

A senhora da limpeza, dona Neide, me entrega um chocolate de sonho de valsa. Se eu a agradeci? Com um grande abraço e um beijo demorado em sua bochecha pálida. Passo a maioria da tarde autorizando reuniões e trabalhos externos dos gerentes. Envio os convites para todos eles, sobre um jantar que a superintendência do polo industrial irá oferecer. Confirmei a presença de todos e meu chefe fez questão de confirmar a minha com um simples email. — José vai buscar você uma hora antes do jantar. Preciso que você esteja disponível para todos nós nessa noite em questão. A coisa legal de tudo isso é que eu muito provavelmente vou encontrar alguns amigos de faculdade e botar o papo em dia. A outra coisa legal disso, é que terá comida boa de graça. A outra parte mais extraordinária disso, é que eu vou ter o dobro de hora extra esse mês. Eu vou poder ir a Atlanta para conseguir uma noite incrível com o meu homem. Então sim, eu posso fazer isso antes de morrer. — Juli, querida! Nada soa mais falso do que a pessoa que não gosta de você, te chamando de querida. E pior, usando um tom tão agudo que qualquer cantor de opera teria inveja.

— Sim?! — Respondo ainda teclando furiosamente em meu computador. — Eu tenho a autorização do Guto. — Quem? — Me viro para ela que revira os olhos como se eu fosse a retardada do local. — Guto, querida. Do Augusto, desculpe, eu sei que você é obrigada a chamá-lo de senhor. — Autorização para que? — Para a mudança para a primeira classe, querida. O que mais séria? Você pode mudar para a madrugada? Com o jantar na sexta, eu acho que prefiro viajar na madrugada de domingo. — Diz sorridente. — Ah! E cancele o meu carro de sexta, eu estou indo com o Guto para o jantar. — Como quiser, mais alguma coisa? — Não, Juli. Mas eu sei que se precisar eu posso pedir a sua ajuda, afinal, você é a melhor, não é? Por isso trabalha para a gente. — É o que diz o meu contracheque todo final de mês. Ela parece feliz com a minha resposta e vai finalmente embora. — Sim, sua vaca. Eu sou a melhor nisso. E fique feliz por eu não arrancar os seus cabelos falsos fora.

Ω Eu esperei pacientemente o senhor José vir me buscar. Eu gostei do elogio que ele me ofereceu assim que me viu. A viagem para o salão de eventos foi rápida, uma fina chuva começa a cair. Seu José me ajudou com o guarda-chuva. — Se precisar de uma carona para cara, me avise, Juli. — Não se preocupe, eu consigo uma. — Então tenha uma boa noite. Eu aceno um adeus para ele e então entro no salão. Espero que o meu vestido longo verde esteja bom o suficiente. Pego uma taça de vinho olhando ao redor para ver se alguém chegou. O chato de tudo isso é que eu não vou ter ninguém com quem poderei conversar de verdade. Eu fico no pequeno bar no canto afastado das mesas. Vejo que três dos meus gerentes estão aqui, me faltam apenas dois. Beberico o restante do vinho. Converso com alguns dos conhecidos e alguns colegas de faculdade, consigo algumas fofocas que me tiram gargalhadas internas. Eu posso ser uma louca na maior parte do dia, mas eu sei quando o meu lado civilizado deve prevalecer. Mas depois de dois copos de vinho me pergunto o porquê eu

tenho que estar aqui. Eu não sou nem um pouco importante nesse tipo de reunião, mas me lembro que sou babá deles na maioria do tempo. Assim como eu tenho que saber de toda agenda de cada um, preciso saber se eles precisam de papel higiênico para limpar a bunda deles diariamente. — Se me permite dizer, você está deslumbrante, Juliane. Por segundos e pela ajuda do meu demônio da guarda, eu consigo segurar a taça. — Obrigada. — Digo sem me virar. E deveria ter ficado olhando para o balcão. Se o cara é comível em uma foto de perfil, ao vivo em um terno escuro desenhado apenas para ele, é um atentado ao meu controle de não me tornar uma abusadora em série apenas dele. — O senhor está muito elegante. Sei que ele não gostou de que eu o chamasse de senhor, mas eu não posso mudar isso. — Já pedi que não me chamasse assim. Me chame pelo primeiro nome, não temos muita diferença de idade. Só oito anos. — Tudo bem. — Acho que estamos os dois deslocados aqui, hein? — Ele se encosta no balcão elegantemente. — Isso aqui ainda é muito novo para mim.

— Você logo se acostuma. — Me viro para encarálo. — Mesmo eu nascendo aqui, quando voltei, foi como se nunca tivesse colocado os pés na cidade. — Cresceu em outra cidade? — Pergunta interessado. — Meu pai é um ótimo médico, ele foi trabalhar no interior de Mato Grosso, eu deixei a família para faculdade, voltei para a terrinha e apenas volto nas férias para matar a saudade de quem eu tanto amo. — Eles devem ter muito orgulho de você. — Eu acho que sim. Não estou sendo presunçosa, mas eu tenho orgulho de mim mesma e meus pais estão sempre dizendo que estão felizes por mim, então eu tenho certeza que sim. E você? O que pode me contar além do que eu já li no seu documento da empresa. Augusto dá de ombros e agradece ao senhor que lhe entrega a sua bebida. — Nada de tão aventureiro, você saiu das asas de seus pais com o que? Dezoito anos? Você com certeza é mais aventureira do que eu, quando eu apenas com trinta e quatro criei coragem para sair debaixo das asas dos meus pais. — Isso não é verdade. — Digo o contrariando. — Você mora sozinho desde os vinte anos e já tem uma grande carreira em tão pouco tempo.

— Você sabe o que eu quis dizer, Juli... — Aí está você. — A bruxa aparece entrelaçando o braço dela ao dele. — Quero apresentar você a algumas pessoas. Diz arrastando-o. Ainda bem que ela não se dirigiu a mim. Acabaria com a minha noite, já muito acabada. O jantar é servido, mas eu não quero comer nada. Estou apenas me sentindo mal sobre essa noite. Seu Duarte apenas acenou para mim, quando me viu de relance. Eu sabia que nenhum deles viria falar comigo. Eu apenas estou aqui para ter os papéis que serão entregues. A pasta vermelha em minha mão diz que meu trabalho acabou. Mas não, a vida quer jogar na minha cara que ela ainda não fodeu com a minha noite. Já não me sinto mal quando encontro Eduardo nesses tipos de evento. Só que dessa vez há algo diferente nisso tudo. Assim que ele bate os olhos em mim, não recebi o seu sorriso de saudação. Ele vem até mim. Ele larga a sua mulher e vem até mim como se eu pudesse fugir dele. Ele continua lindo. Qual é? Eu tenho um óculos na minha cara, eu posso ver que meu ex ainda é gostoso. Muitas das vezes eu me perguntava como eu consegui namorar com esse cara por três anos. Eu não sou o

protótipo da mulher linda e irresistível. Me limito em sessenta quilos, um e sessenta e cinco de altura. Com uma linda coleção de quadrinhos de todas as editoras de super heróis que existem. Eduardo sempre foi doce comigo, mas depois que terminamos, percebi que não fui nada mais do que o cérebro para ele enquanto nos formamos. Eu nunca perguntei a ele se eu fui a única fiel em nosso relacionamento, eu tenho medo da resposta até hoje. — Jules. — Ele parece muito surpreso em me ver. Por um momento, ele voltou a ser o cara que parecia estar apaixonado por mim. Eu amava o jeito que ele me olhava quando conseguia ser mais estranha que o normal quando estava resolvendo algum problema matemático que a turma me pedia ajuda. Eduardo poderia não ter me amado como desejei que ele fizesse, mas ele tinha algum tipo de orgulho de mim. E isso me fez ter um pouco de apreço com a pessoa dele. Mas foi apenas isso mesmo. — Eduardo! — Faz... — ele limpa a garganta. — Faz tempo que eu não vejo você. Muito tempo sem notícias suas, acho que estou em falta com você. — Não tem porque pensar assim. Você é importante agora, é promotor, tem coisas mais importantes para dar atenção. Eu com certeza não mereço o tempo para recordação.

— Pare de besteira. Você sabe que isso não é verdade. — Diz até mesmo envergonhado. — Eu... Jules, eu sei que fui um idiota naquela época com você e tem todo o direito de não querer falar comigo. Queria poder ter a chance de me desculpar de verdade. Eu queria essa conversa cinco anos atrás, mas isso é um assunto já arquivado. Eu aprendi muitas coisas em meu relacionamento com Eduardo e isso eu vou levar para sempre. — Não tem porque pedir desculpas. Já passou, estamos bem com as escolhas que tomamos, é isso que importa, não é mesmo? Eduardo abre o seu lindo sorriso. Ele se aproxima e beija o meu rosto. — Eu sempre soube do coração bom que você possui. Foi por isso que eu amei você. Não respondo a ele, até porque não tem nada que poderia responder. — A gente se esbarra por aí, Jules. Aceno que sim para ele. Torcendo que isso não aconteça. Não é porque terminou tudo bem que não devemos seguir uma vida feliz como se ele nunca tivesse machucado o meu coração. Respiro fundo e vou até o bar pegar um pouco d’água. O jantar continua no seu melhor, mas eu só quero

dormir mesmo. Dou tchau ao meu chefe e ele não faz nada além do que um aceno de sim. Olho para uma mesa em questão e vejo Kátia muito perto de Augusto. Ela com certeza quer saber qual é cor da cueca que ele está usando essa noite. Augusto olha para cima e me encontra os encarando. Kátia continua tagarelando como se ele estivesse prestando atenção. Um vento passa pelo local onde eu estou e me faz estremecer. Mas eu não perco o olhar dele. O jeito que me encara me faz ter pensamento muito vulgares. Típica discrição de livro erótico. “Ele me encara com intensidade e isso me faz estremecer. Minhas pernas ficam bambas e eu quero apenas que ele me coma aqui e agora! ” Só que não é isso que acontece aqui. Isso só funciona nos livros. Dou um tchauzinho para ele e vou embora. Não há uma viva alma na saída para a avenida. Espero um táxi, mas nada. Um vento mais frio ainda me faz estremecer. Penso em ligar para o senhor José, mas está tarde demais e sei como é chato quando me acordam. — Oi, gatinha. — Uma voz bêbada me assusta e caio contra a calçada. — Veja como você é lindinha e tão gostosinha.

Antes que eu possa raciocinar o que está acontecendo, o bêbado está em cima de mim. — SOCORRO! ME AJUDE! O bêbado puxa o meu cabelo com força e dói. — Assim não, gatinha. Eu tento me livrar de baixo dele e consigo acertar o seu peito, o desiquilibrando. Consigo me levantar, mas ele segura minha perna me fazendo cair. Bato com a testa na beirada da calçada. Antes de eu apagar, eu ouço o meu nome ao longe. Não tenho chance! Penso antes de desmaiar.

3 Eu sinto que vou ter uma conta alta de luz esse mês. Mas eu não me lembro de ter deixado o ar condicionado tão baixo assim. Mas tudo bem, eu posso fazer isso. — Juliane? Não! Pare com isso. Me deixe dormir! Viro para o lado e isso faz a minha cabeça latejar. Muito! Algo prende no lençol e isso faz doer ainda mais. Gemo de dor e abro os olhos. Por saber que não estou no meu quarto entro em desespero. Levanto com tanta rapidez

que quase caio da cama alta. — Juliane! A voz que me chamava agora me repreende. Minha vista está embaçada demais. Uma mão segura meu ombro esquerdo e a outra está no final de minhas costas me levando para a cama. Só então eu me lembro do que aconteceu ontem. — NÃO! ME SOLTA! As mãos automaticamente saem de mim. — Juliane... Quase caio por tanta tontura. Minha cabeça dói tanto. Tento ficar acordada, mas não consigo. Meus olhos estão pesados demais, meu cérebro parece estar fritando dentro da minha cabeça. Quero saber o que está acontecendo, mas meu corpo não deixa. Ω Alguém mexendo na minha testa me assusta. Consigo pegar a mão da pessoa que está querendo me machucar. — Está tudo bem, Juliane, estou apenas trocando o seu curativo. — Consigo abrir apenas o meu olho direito, já que uma senhora está pressionando contra o lado esquerdo da minha testa. — Você está no hospital e estou trocando o curativo de sua cabeça.

Eu não consigo segurar. Eu começo a chorar com o tamanho alívio que toma conta de mim. Antes de apagar pela segunda vez eu acho, pedi muito que nada de mal acontecesse comigo. Lágrimas caem por meu rosto e fecho os meus olhos para evitar que atrapalhe o trabalho da enfermeira. — Está tudo bem, menina. — Diz segurando a minha mão. — Você foi muito corajosa. Eu não consigo dizer nada. Deixo que ela faça o seu trabalho, mas só consigo pensar no que aconteceu, instintivamente eu sinto o toque daquele imundo em meus braços e seio. Em minha cabeça. — Eu preciso ir ao banheiro. A senhora me dá um sorriso dizendo que entende. Eu sinto tanta dor, mas eu não consigo saber se lá... e me pergunto se... Um soluço doloroso sai de mim. — Não, querida. — Ela me ajuda. — Você está bem, ele não fez nada com você. Mas isso não manda o medo embora. Consigo chegar ao banheiro sem cair. Ligo a torneira e com cuidado limpo o meu rosto. Tento me convencer de que estou segura. Meu vestido está sujo de lama, meu cabelo está horrível e meu rosto está deformado de alguma maneira que eu nem sei explicar. Quando caí antes de apagar pela primeira vez,

lembro de ter batido minha cabeça na calçada. Isso deve ter feito um corte, pois mesmo com o curativo, consigo ver um pouco de linha que sai do mesmo. Em uns segundos idiotas meus, agradeço por não ter que raspar parte do meu cabelo. — Juliane! É a mesma voz que eu ouvi antes de chegar aqui. Andando devagar, eu volto para o quarto. Encontro Augusto da mesma forma que o vi da última vez. Eu não quero, mas me sinto aliviada em estar com alguém conhecido. Mesmo que seja um conhecido de sete dias. Ele vem até a mim e eu deixo que ele me abrace. Agarro a sua blusa e choro em cima dele. Suas mãos ficam no meio de minhas costas. Eu choro mandando o medo ir embora, choro por não ter acontecido nada de ruim. E choro por ter sido idiota o bastante em ir atrás de um táxi tarde da noite. — Você está bem agora. Augusto repete isso muitas e muitas vezes, querendo me fazer acreditar que isso seja verdade. Porém isso vai me perturbar por muito tempo, eu sei disso. Assim como o acidente em que estava com Leonardo no último ano. Eu me afasto dele e nem quero saber o que ele pensa nesse momento. — Eu, eu... — respiro fundo. — O que aconteceu? —

Tento, mas minha voz sai débil. Ele me leva para a cama. Ele se ajoelha na minha frente. Augusto estremece quando olha para o curativo em meu rosto. Relaxo quando ele toca suavemente o local ferido. E não dói como eu pensei que aconteceria. — Eu estava indo até você. Iria oferecer uma carona para casa. — Ele parece com raiva. — Eu vi quando o filho da puta estava indo até você. — Ele olha para o lado. — O seu grito... Eu senti o meu coração rasgar quando o ouvi. — Há uma emoção em sua voz que me faz chorar novamente. — Gritei para que chamassem a polícia e fui até você. Cheguei a tempo de ver você cair e machucar a cabeça. Estremeço apenas por ouvir e lembrar mais uma vez. — Eu queria ir até você, mas o animal estava indo até você de novo. — Vejo ele trincar os dentes. — Eu o deixei inconsciente e com a polícia, enquanto vinha com você até o hospital. Você estava sangrando muito e desacordada. Ele para de falar e eu não quero falar nada também. Penso que vamos ficar em silêncio até que ele diz. — Eu nunca senti tanto medo na minha vida como ontem. — Eu também. — Minha voz sai fraca. — Eu nunca vou conseguir te agradecer o suficiente.

Ele se levanta vindo para perto de mim. Percebo que ele está cansado e até mesmo sem saber o que fazer. Apesar de que ele tomou conta de mim, quando o trabalho deveria ser o oposto. — Você não tem o que agradecer, Juliane. — Diz tenso. — Eu faria isso por qualquer garota que estivesse em perigo. Quero apenas que você descanse, vou pedir para o médico vir avaliar você e dependendo do que ele vai fazer, sei que você não sairá daqui agora. — Ele segura a minha mão. — Há alguém que você possa chamar para trazer roupas para você? Aceno que não. Meu irmão é o mais próximo, mas ele mora a cinco horas daqui. — Você quer que eu passe em sua casa e pegue algo? Eu me lembro que Leo tem a cópia da chave do meu apartamento. — Você sabe onde está o meu celular? Ele vai até a pequena cômoda que está no canto do quarto. Não posso deixar de ficar um pouco feliz em saber que meu novo celular está bem. Ligo para Leo que atende no segundo toque. — Ei, que milagre é esse que você está acordada cedo em pleno sábado? — É uma longa história, mas eu preciso de um grande favor, Leo.

Digo a ele o que eu preciso, mas eu tive que garantir a ele que estava tudo bem. Enquanto eu falava com meu amigo, percebi que Augusto me olhava com muita curiosidade. — Ele está vindo com algumas roupas. — Ótimo, estou indo, volto aqui depois que trocar de roupa. Olho para longe dele. — Não precisa voltar, Augusto, você já fez muito por mim, Leo pode ficar... Eu paro de falar quando o médico entra. Quando o mesmo vai falar alguma coisa, Augusto em um tom de autoridade diz a ele o que vai fazer. — Estou indo para casa trocar de roupa e comer algo. O amigo de Juliane, Leonardo Pacheco, está vindo com algumas roupas para ela, por favor, me ligue se algo acontecer, eu vou estar de volta aqui mais ou menos em uma hora. Eu fico apenas olhando para ele como se ele quem tivesse batido a cabeça. — Bom dia, Juliane, você assustou muito o seu namorado. — Ele não é meu namorado. — Digo baixo. Que constrangedor.

— Não? — O médico parece confuso. — Pois foi isso que ele me disse quando chegou com você aqui. Olho para o crachá do médico e vejo o seu nome. — Doutor Paulo, desculpe se meu chefe teve que mentir para você. E mesmo que eu adoraria descobrir o que mais ele disse, eu não estou conseguindo pensar direito, meu cérebro parece fritar sempre que eu tento pensar mais nos intervalos em que eu estava parcialmente consciente. O médico parece surpreso com a minha facilidade de tagarelar. — Deite-se para que eu possa examiná-la. Ele faz o seu trabalho. Diz que eu levei dois pontos em minha testa e que posso tirar daqui a cinco dias. Como eu sangrei muito e estava desacordada, fui direto para a emergência, mas a ressonância mostrou que até agora não há nada de errado em minha cabeça. Doutor Paulo riu quando eu disse que estava surpresa que no exame não deu que minha cabeça é oca em alguns momentos do dia. Ele disse que só vai me liberar quando sair o resultado da tomografia, ele quer ter certeza de que está tudo bem. Ele sai e diz que a enfermeira volta logo para dar a minha última dose de remédio. E nesse instante, Leo aparece com a minha mochila. Assim que ele me vê fica mais pálido do que já é.

— Você me prometeu que estava bem. Dou um sorriso de desculpa para ele. Leo me abraça e se senta ao meu lado na cama. Seus olhos estão preocupados, sei que ele deve estar pensando mil coisas. Conto a ele o que aconteceu, e dessa vez eu consigo segurar o choro. Eu sei que agora eu vou evitar andar sozinha. O medo vai ser constante em minha vida agora. Leo me ajuda a chegar até o banheiro, ele só saiu quando me convenceu a deixar a porta um pouco aberta para que eu grite caso aconteça algo de errado. Tiro o curativo querendo lavar o meu cabelo, tomo um banho da melhor forma possível. O tão bem quanto o meu corpo levemente dolorido permita. Minha cabeça já não lateja tanto, mas ainda está pesada. Visto o pequeno vestido da estampa do R2D2 que Leo me deu no ano passado. Meu amigo sabe me ajudar a sorrir. — Obrigada. — Agradeço quando volto para o quarto do hospital. — Você sabe como ninguém as roupas que vão melhorar o meu humor. — Agora me diga, quem estava com você? E você avisou a sua mãe? — Não! — Digo alto e gemo um pouco. — Ela não precisa saber isso. Mamãe vai apenas voar para cá e vai querer me levar

com ela para casa, simplesmente não. — Juli, você sabe que uma hora ela vai saber, que seja melhor saber por você. Aceno para ele, só para ele ficar quieto. — Por que não me ligou para ir buscar você? Sabe que iria. Se eu soubesse que... — Não pense assim, não vai nos ajudar em nada ficar pensando nessas coisas. Estou bem, Augusto me salvou... — Eu devo a ele minha vida por ter salvo a minha melhor amiga. — Eu faria isso por qualquer garota! Tanto eu quanto Leo viramos nossas cabeças para a porta. — Ainda sim, eu sou grato por estar lá para ajudá-la. — Leo segura a minha mão. — Você sabe quando será liberada? — Ela já foi. — Augusto estende a mão para mim. — Acabei de falar com o Doutor Paulo, ele está trazendo a sua liberação. Suspiro aliviada. Eu pego a sua mão e mesmo com o remédio em meu sistema consigo me manter firme. — Vamos para casa. — Leo diz pegando a minha bolsa. — Não será necessário, Leonardo. Eu vou ficar com

Juliane essa noite, eu me sinto responsável por ela depois de tudo o que houve. Mais uma vez, tanto eu quanto Leo o encaramos surpresos. — Eu acho que... — Juliane, você está com dois pontos na cabeça. Com remédios fortes em seu sangue, isso aconteceu quando estava a serviço da empresa, sim, é meu dever saber que você está bem. Mesmo que eu tenha que ficar com você mais uma noite. Trabalho. É isso! Nada mais do que trabalho. Ω O bom de morar sozinha é que eu tenho a minha própria Bat-Caverna. Eu posso fazer as coisas da minha maneira. Não que eu seja uma menina desorganizada, na verdade eu tenho um pouco de TOC quando se trata de organização. E eu agradeço muito pela menina que arruma meu apartamento ter vindo essa semana. Pois eu não tinha ideia de que teria uma visita inesperada do meu chefe. Eu abro a porta do meu pequeno e confortável apartamento. Estou mais lenta que o normal,

culpa dos remédios. Eu tentei muito fazer que Augusto mudasse de ideia e que estava bem para ficar só. Mas ele apenas me ouviu em silêncio, me colocou em seu carro e me trouxe para casa. Eu me senti muito intimidada com a sua BMW. Quase nem respirei por medo de acontecer algum desastre. Até porque, o meu próprio nascimento foi um desastre natural. Então, naturalmente, respirar pode ser um acidente sem limites trágicos. E eu não posso pagar por um carro caro. Para que pudesse fazer isso, eu provavelmente deveria vender meus dois ruins, pulmão, coração e parte do meu cérebro para o mercado negro de órgãos. E ainda deveria umas três ou quatro parcelas. — Quer que eu abra? — Ele pergunta impaciente. — Agradeço, mas se não percebeu, estou sem os meus óculos. Franzo o cenho querendo enxergar o buraco da fechadura. — Você parece se virar sem ele. Dou de ombros. — Consigo na maioria das vezes, mas sou um caso perdido quando se trata de enxergar a um metro de distância. Ele fica em silêncio. Tenho certeza que ouvi o seu

suspiro de alívio quando consigo abrir a porta. Ligo a luz e coloco minha bolsa em cima da mesa. — É pequeno, mas é meu. — Digo quando dou espaço para meu chefe entrar. — Eu fico feliz que esteja tudo em seu devido lugar, não sei como ficaria se recebesse você aqui com uma enorme bagunça. Augusto me encara como se ele quisesse saber se está tudo bem comigo. — Legal o seu apartamento. Diz olhando ao redor. Aqui na sala eu sou uma pessoa normal, mas não posso dizer o mesmo do meu quarto. Ali sim, é a minha Bat-Caverna. E apenas os convidados mais do que confiáveis são recebidos. — Eu tento manter o conforto. Quer beber alguma coisa? Eu sei que estou morrendo de fome. — Porque foi teimosa, deveria ter aceitado o seu café da manhã do hospital. Olho bem para ele, fazendo valer minhas palavras. — Não confio em ninguém que toma café requentado. E café de hospital é a mais pura traição para os consumidores de cafeína. — Ele parece entender o que digo a ele. — Eu vou preparar aquele café que você me deu. Fique à vontade. Antes que eu possa dar um passo, Augusto me segura pelo cotovelo e me coloca sentada em meu sofá.

— Eu acho que posso dar conta da sua cafeteira, não se preocupe em me dizer onde as coisas estão, eu sei procurar e não gosto de ter ninguém me dizendo o que fazer. Espero que entenda isso. Estreito os olhos para ele. — Eu só estou aceitando isso, porque é o seu trabalho e pelo o que me lembre, você foi o único que bateu o martelo e sentenciou que estava vindo comigo. Augusto parece de fato surpreso comigo jogando toda a verdade nele. Bem, desculpe se eu não sou de ficar calada. — Estou fazendo alguma coisa para você comer. Deixo que ele faça isso e vou para o meu quarto. Meu lindo quarto de Nerd. Me orgulho da forma que eu consegui montá-lo. Pode ser uma coisa muito idiota para as pessoas normais, mas para nós, apaixonados pelo mundo da fantasia e superheróis, é uma espécie de paraíso na Terra. O papel de parede que mandei fazer saiu caro, mas deixou o meu quarto do meu jeito. Os DVDs, livros, HQs, séries, tudo arrumando em minha estante de canto que ganhei do meu irmão. Por falar nisso, eu preciso dizer a ele antes que Leonardo abra o bico fofoqueiro dele. Mando uma mensagem no grupo da família, dizendo

que eu apenas me desiquilibrei e caí. Não quero alarde desnecessário. Pensando nisso, eu não sei como ficou o cara que tentou... Eu caio na cama, com o meu peito muito pesado. É a terceira vez que choro hoje, acho que vou precisar do meu estoque de Nutella, com certeza teremos uma monstruosa TPM vindo aí. Pare com isso, Juliane, você não é uma medrosa e muito menos uma fracote. Respiro fundo e desfaço a bolsa que Leo levou para mim. Meu vestido está destruído, nem mesmo a mais maravilhosa máquina de lavar consegue tirar essa meleca em que ele se tornou. Como eu não sei me comportar de vestido, visto um dos meus conjuntos de ficar em casa. Fazendo a minha melhor cara de negociadora, volto para a cozinha, querendo me livrar do meu auto convidado indesejado. Mas a visão que tenho me faz mudar de ideia por alguns segundos. Com certeza me julgariam por estar babando descaradamente pela bunda do meu mais lindo e delicioso chefe. Epaaaaaaaaa!! De onde é que isso veio? — Você precisa de ajuda? Ele parece não se incomodar com minha repentina intromissão. — Olha, eu agradeço muito, de verdade o que você

fez por mim, mas acho que você está exagerando aqui e eu não quero... Acho que a minha panela de aço inox quebrou de alguma forma quando ele a soltou em cima da pia. O estrondo pode ter sido ouvido da portaria, tenho certeza. Vejo que Augusto respira fundo, antes de se virar para me encarar. Ele anda até mim em passos lentos, mas não esconde nenhum pouco a sua raiva. — Exagero! Essa foi a única coisa que eu consegui ouvir! — Diz em um tom baixo e muito chateado. — Você não viu o que eu presenciei, Juliane. — Certo, deve ter sido difícil. — Difícil? Sério que você está diminuindo o que aconteceu em menos de vinte e quatro horas? Ou você está fingindo que está bem para não ter que chorar mais uma vez na minha frente. Respiro fundo para não ter que gritar com ele quando está tentando me ajudar. Mas querer ajudar é uma coisa totalmente diferente de fazer por obrigação. E eu odeio que façam coisas para mim porque se sente no dever de fazer isso. — Eu não estou diminuindo nada. Caso você não se recorde, eu estava lá. Eu que estou com o corpo dolorido, eu que tenho dois pontos na cabeça. Então não. Não estou minimizando todo o ocorrido. — Minha voz sai baixa pois quase não tenho mais forças. Os remédios estão

começando a fazer mesmo o efeito. — Estou apenas querendo dizer que você não tem obrigação alguma em ficar comigo, eu sei me virar sozinha, faço isso há quase dez anos, não é como se fosse a primeira vez que estou doente e dopada. Augusto alcança um pano de prato que está no meu armário e limpa as suas mãos. Ele pega a minha mão e me leva de volta para a sala. Ele se senta ao meu lado, o jeito que ele está, parece meu pai quando queria me convencer a não tentar mais cortar o cabelo da minha irmã. — Eu gosto de saber que pode tomar conta de si mesma. Mas eu estarei mais tranquilo sabendo que você pode pedir o que precisar de mim. — Ele respira fundo. — Juliane, quando eu vi você desmaiada e com sangue em seu rosto, eu pensei em muitas coisas que não quero ter que lembrar. Eu só vou conseguir me livrar de todo esse acontecimento, quando o médico tirar esses pontos de seu cabeça e me garantir por escrito que não há nada de errado com a sua cabeça. Eu tento muito, mas eu tenho que falar. — Tenho problemas na cabeça desde o dia em que nasci. E lá está ele. O seu mais novo e encantador sorriso que me faz querer olhar para ele eternamente. — Você é... Muito espontânea.

— Ah, qual é? Sei que você quis dizer que eu sou uma louca, tagarela, Nerd que não consegue enxergar o seu rosto direito mesmo estando bem na minha frente. Droga. — Me levanto devagar, mas ainda fico tonta. — Vou ter que recorrer aos óculos de anos atrás, vou voltar a ter dezoito anos. Porcaria! Augusto não me segue. Graças a Deus! Não quero ter que explicar a ele o meu quarto. Isso levaria horas. Encontro minha antiga armação de óculos grossa de cor preta e a coloco. Pisco algumas vezes e vejo que está bom. — É, velha amiga, parece que somos eu e você de novo! Volto para a cozinha estranhando nenhum pouco que eu tenho um desconhecido nela, mexendo em minhas panelas e em meu estoque de comida. — Você parece saber cozinhar! Ele comenta quando eu pego um pouco de suco. — Minha mãe nos criou para ela, mas sabia que uma hora tomaríamos o nosso caminho. Por isso ela se empenhou muito em nos ensinar a trabalhar sozinhos. — Você tem quantos irmãos? — Pergunta quando tira o que parece ser a lasanha congelada do micro-ondas. — Somos três irmãos. Casse é a mais velha, Joaquim o mais novo e eu sou a filha do meio. Isso foi bom, porque

eu tinha pouca atenção. Augusto franze o cenho pensativo. — Eu queria ter a sorte de ser do meio. — Cada caso é diferente, deve saber disso. Mas eu tenho certeza de que você foi um filho mais novo. Um sorriso de canto aparece. — Sim e não. Ser o mais novo foi legal, mas ser o mais caçula e homem, essa parte não foi. — Elas eram irritantes? — Não, minhas irmãs são maravilhosas. Mas minha mãe sabia como encher o saco quando queria. Ah! Coitadinho. — Vem, eu sei que está pronta para se livrar de mim, eu vou dar comida a você e prometo que vou embora. Eu não queria, mas me sinto envergonhada. — Eu não estou expulsando você, estou apenas dizendo que não precisar tomar conta de mim quando eu estou bem. Consigo terminar a frase antes de dar um alto bocejo. — Estou vendo. — Diz estendendo a mão para mim. — Venha. Eu como a lasanha toda. Augusto não come, pois diz que está sem fome. Sinto muito por ele, mas eu tenho uma

fome tremenda. Ele faz cara feia quando vou lavar o prato. Depois que percebe que eu estou bem, diz que vai me deixar por agora, mas volta pela noite. — E o que aconteceu com o cara? — Digo a ele quando chegamos a porta. — Eu não me lembro de você ter comentado algo sobre isso. Augusto suspira e cruza os seus braços. Leva toda a minha força de vontade para não ter que olhar para eles. — Eu o apaguei com dois socos para que não fugisse, bêbado como ele estava, desmaiou na hora. Os seguranças do local chamaram a polícia e disseram o que houve, dei o meu número para eles e disse que o meu advogado cuidaria de tudo, eles vão precisar que você vá até a delegacia, você não precisa se preocupar com nada. — Mas é claro que eu tenho... Ele balança a cabeça, calmo como um lago em um dia de verão. — Não tem, eu já disse que tomei conta de tudo. E eu quero que me diga, por que estava indo sozinha? Poderia ter pedido a mim para lhe dar uma carona. Dou de ombros. — Nesse tipo de festa eu estou sempre só, a única coisa que tenho que fazer é guardar os documentos... Drooooooga! — Acalme-se. Ou vai acabar ficando mais tonta do

que já está. Os documentos estão com Duarte. E só para você saber, ele ouviu de mim. — Como? — Pergunto, perplexa, a ele. — Sim, ele ouviu. Nessa semana em que eu estou na empresa, reparei mais do que todos que trabalham há anos ali, como você toma conta do seu chefe. Até mesmo se livra da sogra dele quando ele não consegue fazer isso. E quando se trata da sua segurança ele nem mesmo se importa. Ao menos ele teve a capacidade de ficar envergonhado. — Mas... — Nada disso, Juliane. Você correu risco de vida enquanto estava trabalhado, o mínimo que ele poderia fazer era se certificar que você tinha condução para casa. Coisa que ele não fez, e se me lembro bem, ele nem mesmo te deu boa noite. Baixo o olhar, sabendo que não posso ir contra ele. Não sabia que ele havia notado tanta coisa. — Duarte deve levantar as mãos para o céu e agradecer por ter você na vida dele e naquela empresa. — Obrigada! Eu... — engulo o choro. — Eu... Obrigada por notar. Ele se aproxima. Sinto o seu olhar em mim e isso me faz continuar olhando para baixo. — Eu posso te fazer uma pergunta?

Aceno que sim. — Quem era aquele cara que parou você antes de ir? Levanto o olhar para ele, surpresa que ele tenha me visto conversar com Eduardo. — Ele era um amigo. — Era? — Ouço um tom de alívio em sua pergunta Aceno novamente que sim. — Azar o dele que não está mais em sua vida. — Augusto se aproxima mais e beija minha testa. — Até depois, Juliane.

4 Eu consegui me livrar de Augusto até segunda de manhã. Pois é, eu tentei evitar que ele me visse, mas ele parecia saber qual era o meu plano. Porque ele está me esperando na minha sala. Ele está sentado na minha cadeira, com os braços cruzados, sem nenhuma emoção em seu lindo rosto. — Bom dia, senhor Augusto. — O que está fazendo aqui, Juliane? — Bom dia, senhor Augusto?!

— Juliane! — Bom dia, senhor Augusto. — Continuo até que eu consiga a resposta que quero. Eu fico o encarando sentado na minha cadeira. Se ele pensa que pode ser chato, ele não sabe que eu levo a chatice em um nível totalmente novo. Eu abro o meu armário e coloco minha bolsa dentro, passo por trás da cadeira onde ele está e ligo o meu computador. — Juliane! — Bom dia, senhor Augusto. É uma risada que ouço vindo dele? — Bom dia, Juliane. — Como foi o fim de semana, senhor? — Pergunto quando coloco a minha senha para abrir o meu email. — Bom. Já que eu respondi o seu bom dia e a sua pergunta, responda a minha: O que está fazendo aqui, Juliane? — Puft! Trabalhando, oras. O que mais seria? Pode me dar a minha cadeira, por favor? Ele se vira ainda na cadeira. — Você deveria estar em casa, só tem que voltar na quarta-feira. Então eu vou levar você de volta. — Não há necessidade, estou bem, melhor do que deve imaginar, mas sério, eu preciso da minha cadeira. —

Digo chutando a sua canela devagar. Ele suspira exasperado. — Juliane, estou levando você para casa. — Você e mais quantos? — Pergunto me encostando na parede. Ele me dá um olhar de repreensão. — Eu estou falando sério! — Idem, companheiro. Mas sério, eu preciso trabalhar. — Você precisa descansar. Ficar de repouso, tem sentido tontura ou enjoo? — Tenho sentido tédio, isso sim. E você está começando a me irritar. Está chegando aquela época do mês e não é nada legal quando alguém me irrita. — Isso é verdade! — Viro para a porta e encontro Leo segurando a sua xícara de café. — E desculpe, mas você nunca vai conseguir dobrá-la. Juli consegue ser pior que uma mula velha empacada. Sorrio com a melhor descrição que meu amigo conseguiu para minha teimosia. — Mas é a saúde dela que está em risco. — Augusto tenta me comprar com uma voz mais branda. — Deixe Leo me dar esse café que eu estarei cem por cento. — Me viro para encarar Augusto. — Eu

prometo que procuro você se sentir alguma coisa, juro que estou bem. Ele não gosta da ideia, mas aceita. — Eu venho ver se você está bem, depois de algumas horas. — Diz me encarando com fervor. — Claro, chefe! — Dou um sorriso doce para ele e empurro os meus óculos de volta para meus olhos. — Eu prefiro essa armação. Ela consegue me dizer mais sobre você. Então ele vai embora, mas acena para Leo antes de ir. Eu me sento e tomo uma boa parte do café do meu amigo. Ele apenas ri quando vê que estou bem. Sei que ficou preocupado, mas sabe que eu odeio drama quando se trata de mim. — Ele vai aprender como você funciona. — Diz tomado a sua caneca de mim. — E a cabeça? Continua oca? — Tão vazia quanto uma concha velha do mar. Vai trabalhar, Leonardo, eu preciso de você na reunião hoje. Ou a sua chefe vai me infernizar pelo resto do dia. — Me viro para ele e dou o meu olhar de menina meiga. — E tanto eu quanto você sabemos que não posso me esforçar muito até tirar os pontos na quinta — Claro, chefe! Até depois. — Ele dá meia volta quando percebe algo importante. — Vou precisar andar

com um pote de Nutella essa semana? — Com certeza! Ele vai embora rindo. E eu mergulho nos mais de vinte emails que preciso responder. E por um milagre divino, ninguém veio me incomodar, e por incrível que pareça, isso é até estranho para mim. É como se o povo estivesse preso em suas próprias mentes e aprendido a resolver os problemas sem ter que pedir ajuda para mim. Alguma coisa está bem errada nisso tudo. Estou me levantando para ir até o meu chefe, quando o encontro entrando em minha sala. — Oi, Juli! — Diz entrando e fechando a porta. Eu percebo que ele está nervoso. E sei que a conversa é séria quando ele tranca a porta da minha sala. — Podemos conversar? — Claro! — Quero dar a ele um sorriso tranquilizador, mas não consigo. Estou pensando muito no que Augusto me contou antes de ir embora. Eu não queria pensar muito sobre isso, mas foi impossível. Ele conseguiu me fazer ver mais do que conseguia. E de alguma forma eu agradeço a ele por ter me dito tudo aquilo. Não que eu odeio o meu trabalho e que me sinto injustiçada. De maneira nenhuma, mas eu vejo que me dou mais do que todos e às vezes saio despercebida. Sei que

não sou a peça principal, mas eu sou aquela que serve para toda a hora. Uma espécie de reserva. E mesmo que não seja o meu trabalho, eu sempre dou um jeito de arrumar a casa para que o convidado não perceba que há algo de errado. E nem digo sobre as coisas pessoais que eu tenho que arrumar para todos os gerentes. Claro que eu tenho a minha parcela de culpa, não nego. Mas eles como cargo maior que o meu, deveriam saber o que pedir ou não para mim. Mas como minha mãe diz, eu sou boba e as pessoas percebem isso. E usam isso para conseguir as coisas fáceis através da minha vontade de ajudar os outros. E tem sido tão normal, que nem percebi até que Augusto chegou e me mostrou isso. Eu não culpo seu Duarte pelo que aconteceu, mas se ele tivesse feito o que Augusto sugeriu depois do ocorrido, nada disso teria acontecido. E é por isso que estou pouco à vontade com ele aqui, pois no sábado à noite, enquanto procurava algum filme para assistir na Netflix, veio a pergunta do porquê seu Duarte não ficou comigo quando estava desacordada. Por que ele não veio ver se eu estava bem. Me senti muito triste quando percebi que ele nem mesmo ligou para saber se precisava de alguma coisa. Certo que não é uma obrigação como pessoa, mas como chefe, ao menos um telefonema, sim? Pois era para a

empresa dele que eu estava de serviço. Percebo que sou trouxa mesmo quando se trata de retribuição de sentimentos. Qualquer que fosse o problema, mesmo que não me afete, eu pergunto se precisam de ajuda e me disponibilizo, não importa qual seja a ocasião. Sempre estive com ele nesses quase quatro anos. Sendo uma babá dele e da filha na maior parte do tempo. Agora sei como uma babá de verdade se sente quando a mãe ganha o mérito por algo que ela ensinou a criança. Só que no meu caso é apenas sobre gratidão. Ao que parece, meu papel aqui é apenas o faz tudo para todos. Eu que me mate em fazer as coisas, e que eu me foda quando estiver doente. A vida me ensina mais um pouco. — Primeiro me diga se você está bem? — Pergunta baixo e até mesmo hesitante. — Sim, senhor, não estaria aqui se não pudesse lidar com emails. Ele sorri com a minha resposta. — Fico tão aliviado em saber que está bem, querida. — Olho para baixo quando ele diz isso. — Sei que você deve ter se perguntado o porquê não procurei você, mas eu não sabia se você queria ou não falar comigo. — O senhor está sendo bobo. — Digo, mas ainda

olho para baixo. — Eu fui um estupido, isso sim. E você vai ter que concordar comigo. — Ele suspira. — Augusto teve que abrir os meus olhos e fico muito grato que ele tenha feito isso. Eu já não conseguia ver as coisas. Eu estou falhando com você, Juliane, e eu não gosto disso. — Não tem o que falhar. — Querida, pare de querer evitar essa conversa. — Diz com um sorriso suave. — Você sabe que é verdade e é por isso que não olha para mim. Eu peço desculpas pela forma como tenho tratado você, não é nada justo, pelo tanto que você faz pela empresa, por mim e por minha filha. Resolvendo coisas que nem é o seu trabalho, mas faz sem nem pensar duas vezes. — Faço porque é o meu trabalho. Ele me olha cético. — Seu trabalho não é ter que ver a nota da faculdade da minha filha e muito menos reservar uma mesa para ela e as amigas numa boate. Eu engulo em seco quando percebo que ele descobriu o pequeno segredo que tenho com Karina. — Eu sei o que você faz por ela e por mim, e me deixei levar pela leveza que é ter você tomando conta de tudo. É fácil quando você apenas aprecia o show, sem ter que se preocupar com os bastidores, mas isso não é para

você carregar em suas mãos. — Ele parece envergonhado. — Eu esqueci de continuar a agradecer você por tudo o que você fez, faz e vai fazer. Augusto tem razão, você é um tesouro e eu tenho que levantar as mãos para o céu e agradecer por ter você. Sinto que devo desculpas para sempre, mas sei que você não vai gostar disso. Então eu decidi que estou mudando algumas coisas com relação a gerência. Isso não é legal! — Deixe, eu que vou resolver isso, os únicos que você terá mesmo que estar disponível a toda hora sou eu e Augusto. — Diz sorrindo. — Eu vou melhorar, prometo, e tenho certeza que Augusto vai saber como lidar com você. — Obrigada! — Aliás, ele foi muito atencioso quando você estava no hospital. — Ele pega a minha mão. — Aquele rapaz salvou você, e eu sempre vou ser grato a ele por isso. — Ele estava apenas fazendo o trabalho dele, arrumando as coisas para uma empregada. E sei que ele faria isso por qualquer pessoa. — Talvez sim, talvez não. Isso apenas ele pode dizer. Mas ele salvou você. Aceno concordando, gostando nenhum pouco do rumo que essa conversa tomou. — Eu vou deixar você com seus email, por favor, não

se esforce muito. Eu o observo sair, mas ele para antes de destravar a porta. — Quando eu vi você desacordada, com parte do seu vestido levantado, sangue em seu rosto, eu me senti um inútil. Consegui imaginar Karina no seu lugar, mas me lembrei que eu tenho você como uma filha. E foi a mesma coisa. Ω — Por que você não tem um carro? — Augusto entra na minha sala perguntando isso de cara. — Porque eu não quero! — Respondo sem olhar para ele. — Você tem carteira e a empresa pode disponibilizar um carro para você. — Eu me recuso a pegar um carro da empresa. — Por que não tem um carro, Juliane? — Mais uma vez: Porque eu não quero. — Juliane, por favor, responda minha pergunta sem me irritar. Tadinho. Está de TPM. Eu também, querido, a maldita desceu não tem nem

meia hora e você já está testando a minha quase inexistente paciência. Viro a minha cadeira para enfrentá-lo. — Há um ano, eu estava indo para a aula de vôlei com meus amigos, passei para pegar Leonardo na casa da irmã dele, para irmos juntos. Pegamos um trânsito horrível, mas nada disso importava, já que eu estava com meu seminovo HB20, só que um idiota não pensava assim. Ele ultrapassou o sinal fechado e nos atingiu em cheio. Leonardo quebrou a mão direita, dois dedos, uma costela, e o tornozelo. Eu saí com um pé quebrado, braço esquerdo fraturado, mão esquerda torcida, ombro deslocado e traumatizada em dirigir mais uma vez um carro. Augusto parece em choque, até mesmo com medo do que eu disse a ele. Espero pela sua réplica, mas o que vem me surpreende. — É por isso que você vai toda terça para a fisioterapia. Ele lembrou! — Sim, eu vou com Leo, todas as terças. O carro do outro cara bateu direto nele. Leonardo saiu mais danificado do que eu, essas são as últimas sessões antes da avaliação do ortopedista. Augusto fica em silêncio. — É uma coisa boa o que faz com seu amigo. Você

não para de me surpreender. — É apenas isso, senhor Augusto? Ele estreita os olhos para mim. — Por enquanto, Juliane! Ω Eu acho que poderia me acostumar com a paz que reina depois de uma tempestade. Faz seis dias desde o ocorrido. Minha cabeça doeu algumas vezes, mas sei que é pelas lentes antigas dos meus óculos. Mas graças a Deus que o novo já está pronto. Fiquei pobre, porém, fim de dor de cabeça. E o que mais me agrada esses dias, é que mesmo tendo motivos de sobra para estar com humor de cão, estou mais calma do que Bruce Banner depois de fazer Ioga. Seu Duarte fez jus a sua palavra. Nesses quatro dias de trabalho, foram poucas as vezes que vierem atrás de mim e foi apenas para obter minhas assinaturas. Não sei se alguém sabe do que aconteceu. E espero de verdade que não. Será muito embaraçoso caso alguém saiba. E por isso devo agradecer imensamente a Augusto, ele conseguiu deixar tudo por debaixo dos panos. E trabalhou junto com seu Duarte com a proposta de fazer apenas o meu trabalho. Na terça eu percebi o que estava

acontecendo. Com certeza os dois tiveram uma reunião geral, falando sobre as tarefas que estarão vindo para mim. Na terça feira, mesmo tendo que chantagear Leo, ele me deixou ir com ele para a fisioterapia. Ficamos até dez da noite no shopping comendo besteira. Como sempre, usei a TPM como desculpa para comer besteira. E essa foi uma das raras vezes em que senti fome quando estou nesses. Na maioria das vezes, eu não como nada. Fome zero. Além de comer o que eu queria sem pecado algum, a conversa com Leo foi boa. Pois eu consegui entender mesmo que esqueci Eduardo. Por muitas vezes, pensava que eu era o problema, sempre que sentia saudades dele. Mas depois do nosso pequeno encontro no jantar, descobri que os nossos planos apenas não se conciliaram. Doeu ele ter me trocado, doeu muito. E isso causou um pouco de insegurança de minha parte. Nem todos vão ser tão egoístas como Eduardo. Mas ainda me sinto medrosa quando se trata de dar o meu coração idiota para alguém. Eu não vou mentir, o medo maior é sentir na mesma proporção, se não maior, a dor do abandono que tive quando Eduardo terminou comigo. Eu quero nunca mais sentir isso. E como eu sei que me apego às pessoas tão rapidamente, evito qualquer

contato com o sexo oposto. Ainda mais os bonitos que tem uma enorme fila de ex. Uma fila tão grande que pode ser comparada com a fila do SUS. Claro que me sinto só. Mesmo tendo pessoas que eu ame tão fortemente, eu sinto a falta de ter alguém ao meu lado que se preocupe comigo, que sorri quando fala ou pensa em mim. Sou uma romântica estúpida, mas o que eu posso fazer? Eu fui feita para amar em grandes proporções. Soube disso no namoro com Eduardo. Eu sei que ele tinha sentimentos por mim. E tive minha confirmação na sexta. Mas não foi o suficiente. Ele disse que me amou, mas não foi assim. Descobri que ele tinha uma espécie de orgulho, carinho e apreço por mim. Para ele pode ter sido amor. Deixo que ele pense assim. Na época doeu a sua perda. Mas agora eu estou feliz que ele esteja bem, feliz e realizado. Sua esposa parece ser uma boa mulher, nunca falei com ela e espero que nunca faça. Às vezes eu xingava a pessoa, dizendo que ela roubou o meu homem. Mas depois eu me lembrava que ele nunca foi meu de verdade. E às vezes eu acredito que nunca vou encontrá-lo. Leo diz que eu tenho preguiça de procurar. E ele tem razão. “Você nunca vai encontrar o cara certo com essa sua bunda sentada no sofá, controle na mão, navegando na TV

fechada, procurando por filmes bons.” Deveria! — Juliane, querida! Eu preciso que você reserve a sala de reunião para mim e Guto. Temos assuntos importantes para tratar. — Kátia entra com tudo dentro da minha sala. Respiro fundo e sem olhar para ela, digo: — Bom dia. — Ah, desculpe. — Diz com a voz mais sem graça do mundo. — Essa semana está tão corrida para mim. Duarte me deu novas tarefas e estou com muitas coisas em cima da mesa. Minha vontade é de revirar os olhos e de dizer: Essas sempre foram as suas tarefas, mas você sempre as empurrava para eu fazer. Enquanto eu me matava fazendo isso, você estava apenas ao telefone ou viajando por aí, ganhando méritos por algo que não fez nem mesmo trinta por cento. Mas o que eu digo: — Claro, sei como é. Você quer a sala por quantas horas? Eu tenho ela livre até as três da tarde. Digo ainda sem encará-la. — Isso é ótimo. É tudo que eu preciso para ficar com ele.

Mas hein? — Certo, está reservado! Mais alguma coisa? — Apenas, querida. Se ela me chamar mais uma vez de querida, eu arranco esses cabelos louros falsos em que ela paga uma fortuna. Quando estou voltando para o meu planejamento, meu celular toca. — Oi! — Dona Juliane Guedes? — Uma voz que parece ser de uma senhora diz o meu nome. — Sim, com quem eu falo? — Sou a delegada Kamila, estou responsável pelo seu caso. Gostaria de saber se pode vir hoje pela tarde dar o seu depoimento. Um arrepio percorre a minha espinha. — Sim, claro, eu vou apenas avisar ao meu advogado. — Começo a tagarelar. — Pode ser às três? É o melhor horário para mim. — Claro, é um ótimo horário, eu vou estar aguardando a senhora aqui na delegacia da mulher. — Certo, certo, estarei aí às três. Desligo a ligação sem nem esperar pela sua resposta. Eu não quero, mas fico com um pouco de medo

instantaneamente. E nessa hora que eu perco a fome de vez. Tomo o resto de café que estava em minha xícara, ligo para o advogado da empresa e peço para que ele me encontre na delegacia. Ele estava me esperando. E está às ordens. E quanto mais eu fico ansiosa, mais as horas custam a passar. Ω Disse ao meu chefe que estava com dor de cólica, ele me deu um sorriso de que entende o que sinto, mas não quer lidar comigo nessas circunstâncias. Pedi ao advogado da empresa que avisasse ao nosso chefe apenas quando tivéssemos saído da delegacia. Pois eu sabia que ele se prontificaria a vir comigo. E eu não quero ter que contar as coisas na frente dele. Já é constrangedor demais ter que contar a outra pessoa. A Dra. Kamila me recebe com um cumprimento de mão e um sorriso suave. Ela parece saber lidar muito bem com o nervosismo que estou tendo. — Agradeço que tenha vindo, Juliane. — Diz se sentando. — Fique à vontade. Como se isso fosse fácil! — Obrigada! — Minha voz sai mais patética do que

já é. — Se não se importa, doutora, eu gostaria que a senhora começasse, eu quero acabar com isso o mais rápido que puder. — Entendo perfeitamente, Juliane. — Ela acena para o rapaz à sua direita. — Esse é meu escrivão, ele vai escrever o seu relato. Pode começar quando quiser. Começo por relatar desde o momento em que eu estava indo encontrar um táxi. Eu não vi ninguém na rua. Ele foi sorrateiro e rápido para chegar até mim. Não demoro muito, já que tudo aconteceu tão rápido, que sou de nenhuma serventia nisso tudo. — Eu tenho os exames que foram feitos em você. Eles serão arquivados junto ao processo. O seu caso está feito em perfeita discrição. São poucas as pessoas envolvidas e que sabem do que houve na semana passada. Não se preocupe com isso, tudo bem? — Ela parece pensar. — Me estranha que Augusto Belmonte não esteja aqui com você. — Ele é meu chefe, e tem coisas mais importantes para fazer. — Digo mudando de assunto. — Ele estava apenas se certificando de que a empresa não fosse exposta. Kamila parece confusa com a minha afirmação. — O que aconteceu com o cara? Pergunto baixo.

— Ele está preso, sem direito a fiança. Não se preocupe, você não vai ter que vê-lo outra vez, nossa lei ampara às vítimas, não aos agressores. — Obrigada. — Não há o que agradecer, querida, você está bem. Isso é o que importa. — Doutora, ela vai precisar voltar? — O advogado pergunta. — Não por enquanto, o caso dela está em processo, e mesmo que o julgamento seja em poucos dias, ela não precisará estar presente. Ela receberá o resultado através de uma carta. — Eu vou ter esse caso em prioridade, Juliane. Ele diz. E sei que ele vai fazer isso. Não por obrigação, mas porque quer. Percebi como ele ficou quando disse a eles o relato da noite de sexta feira. — Você está liberada, Juliane. Por favor, tenha cuidado. — Diz. — Você não estava errada em ir atrás de condução para voltar para sua casa, você não estava errada em andar sozinha. Isso é um direito seu, mas o mundo está mais perverso, o mundo está um caos. Infelizmente para nós mulheres, proteção é mais do que importante, é uma necessidade. Dou o melhor aceno que consigo, antes de ir. Espero o táxi parar em frente à delegacia para que

ele me leve ao hospital. Preciso tirar os pontos hoje. Coloco os meus fones de ouvido e ouço a minha lista do dia. Já quero os fones que leem as ondas cerebrais, para tocar a música que precisamos ouvir. Mando uma mensagem para Leo dizendo que vou estar em casa antes das sete, se o trânsito ajudar. Mas só que o hospital não está ajudando. Fico por uma hora até ser chamada. E a espera para que eu seja atendida apenas para retirar os pontos, é de quarenta minutos. A sorte é que eu tenho meu Kindle, então posso ler o resto dos capítulos que minha amiga mandou. Estou tão imersa na leitura que nem percebo que já me chamaram três vezes. A retirada dos pontos não demorou muito. Cicatrizou muito bem, mas ainda tenho que ficar atenta se minha cabeça latejar mais que o normal. Uma mensagem chega e sem querer aperto no ícone para ler, mas rapidamente saio para não saber que estou online. A volta para casa é rápida e tranquila. Definitivamente estarei usando os boletos de táxi por mais esses dias. Dou boa noite ao porteiro e pego as correspondências. Conta, contas, revistas, contas. — Dona Juliane. — O senhor vem até mim segurando uma caixa. — Chegou ainda pouco para a senhora. — Obrigada! Subo com as coisas e deixo tudo em cima da mesa.

Assim que vejo o remetente, minha primeira ação é pular para cima e para baixo com tamanha alegria que toma conta de mim. Fiquei tão submersa no que houve que esqueci que minhas compras estavam vindo. Obrigada aos deuses da promoção e descontos. A primeira blusa que eu pego é de Star Wars. Os vizinhos vão ligar para a portaria dizendo que estou ficando louca. E eu estou mesmo. Se eu me arrependo de ter dado uma nota em tudo isso? Nenhum pouco. Me arrependeria se não aproveitasse todos aqueles descontos maravilhosos. Tiro todas das embalagens e coloco em cima da pequena mesa na minha cozinha, arrumo para que cada estampa apareça, tiro uma foto e coloco no Instagram, marcando a loja mais linda do mundo. Depois coloco tudo na máquina de lavar e espero ela fazer a mágica. O meu interfone toca e eu atendo. — Juliane, seu amigo está aqui. — Claro. Pode deixar ele subir. Leo com certeza esqueceu de me mandar mensagem dizendo que estava vindo. Coloco o meu roupão e tomo um copo d’água, a campainha toca e corro para abrir a porta. Assim que a abro, quero cair para atrás com a surpresa de quem vejo na porta.

Augusto segurado uma garrafa de vinho em uma mão e uma pasta na outra. Mas o que mais me intimida mesmo e me faz querer me trancar no quarto, é o olhar que eu só presencio nas cenas de livros. E está acontecendo agora mesmo. Tenho certeza que abri e fechei minha boca muitas vezes. Eu não estou nua, mas estou muito exposta para receber o meu chefe. — Boa noite, Juliane. — Sua voz é rouca, baixa e muito convidativa para fazer coisas impertinentes. — Vim saber se você está bem. Eu continuo a encará-lo, querendo saber se ele está aqui de verdade ou se é uma miragem. Ele está com o cabelo um pouco bagunçado, uma camisa polo azul e uma bermuda cor de creme. Eu consigo ver bem que ele tem boas pernas. Será que ele me aguentaria se pulasse no corpo dele? Minha nossa, Juliane! Você precisa se controlar. — Juliane? — Oi! — Minha voz sai mais aguda do que eu poderia imaginar. — O que você está fazendo aqui? Ele dá um sorriso cínico, eu acho. — Eu disse que vim ver como você está. — Ele olha para mim mais uma vez e engole em seco. — Você saiu cedo e depois eu ouvi que você não estava se sentindo

bem. Ah, o chefe deve ter dito isso a ele. Ao menos ninguém sabe que eu fui à delegacia, não quero contar a ninguém sobre isso. Eu sei que ele iria de alguma forma levar o processo mais rápido, mas eu não quero isso, não quero que se sintam na obrigação de cuidarem de mim. — Juliane? — Desculpe, entre. — Que droga. — Eu vou apenas colocar uma roupa. Corro para o meu quarto e jogo o primeiro vestido que encontro no meu armário. Morrendo de vergonha volto para a sala onde encontro Augusto olhando a caixa. — Recebeu uma grande encomenda? — Pergunta divertido. — Eu não diria que você é uma garota que vive comprando coisas na internet. Você com certeza não sabe nada sobre mim. — Eu comprei uma nova coleção de blusas que estava esperando. Pego a caixa e levo para a cozinha. Quando estou indo de volta para a sala, encontro com Augusto vindo ao meu encontro. Ele agarra firmemente meus braços, me mantendo firme no lugar. — Cuidado, querida. — Diz próximo a mim. — Não queremos que você se machuque novamente. Respiro fundo e encontro os seus olhos claros.

Ignorando o fato de que ele me chamou de querida. Queria muito poder saber o que ele está pensando. Saber o que se passa na mente desse homem tão intenso e ao mesmo tempo cauteloso. Faz tanto tempo que eu estive tão perto do sexo oposto, que tenho certeza de que pareço uma adolescente idiota olhando para o irmão mais velho da amiga. — Obrigada! — Faço uma careta. — Por favor, não me chame de querida, isso soa muito falso para mim. Ele me olha confuso, mas em segundos abre um lindo sorriso. — Você é boa em sinceridade, gosto disso. — Ele me solta. Então sua mão vai diretamente para onde estava os pontos em minha cabeça. — Você foi ao hospital tirar os pontos. — Ele passa o polegar delicadamente pela pele sensível em minha cabeça. Estremeço à sua frente com o repentino e mais simples contato que nossos corpos testemunham. Tomo uma respiração profunda, com tamanha força que a reação de seu toque fez em mim. Augusto continua a acariciar o pequeno ferimento. Com nossa proximidade, sinto que ele toma uma respiração profunda, quando desce o seu toque pelo meu rosto. Abro os meus olhos e o vejo me encarando com total desejo. Não sei se é a solidão falando mais alto, mas eu vejo isso. Não sei se é uma boa ideia, não sei como mudar

isso, só sei que é isso que está acontecendo. Seu telefone toca e isso quebra o transe em que estávamos. Augusto vê quem está ligando e parece não ser importante já que ele não atende. — Gostaria que você tivesse me dito. Iria com você. Respiro fundo mais uma vez e dou um passo para trás. — Não precisava de babá, já estou bem. Sua vigília já não é mais necessária. É a vez dele de respirar fundo, fecha os olhos e percebo que ele está se contendo para não ter que perder a paciência comigo. Quando abre os seus olhos, Augusto me encara com fervor. — Eu não faço isso por obrigação, Juliane. Realmente esses seus óculos não lhe ajudam em muita coisa. — Ele aperta minha mão. — Só queria saber que você está bem, antes de ir jantar com a Kátia. Fico feliz que não precise mais de babá. — Diz saindo da cozinha. — Vejo você amanhã.

5 Eu posso viver assim para sempre. Estou de alguma forma não pirando com as coisas que tenho que arrumar até hoje. Não quero perder o meu fim de semana em frente ao meu notebook, trabalhando. A única coisa em que quero manter os meus olhos, é na minha TV. Nada mais do que isso. Mas todos os gerentes decidiram colocar várias coisas em minhas mãos em plena sexta feira depois das duas da tarde.

O Azar é irritante quando ele quer. Ou seja, comigo é quase todos os dias. Fazendo da minha vida um passeio diário pelo inferno. Não tive nem tempo de engolir o meu almoço e já estavam me incomodando. Se não fizermos a digestão com calma, nosso corpo não funciona como deveria. Mas que se foda minha digestão, quando o que eles querem é ganhar mais dinheiro. Que azar o meu, hein. — Juliane, eu preciso que você fique aqui comigo. — Kátia diz da minha porta. — Estarei em uma reunião com Augusto até tarde, vou precisar que você fique aqui, para nos dar suporte. — Claro! — Digo sorrindo por que eu amo o meu trabalho e me lembro que é isso que paga o meu cartão de crédito. Apoio meus cotovelos na mesa e cubro meu rosto com minhas mãos. Respirando fundo, eu tento tirar um pouco da tensão de meus ombros, mas não dá muito certo. Eu sei o que deu mim, mas não quero pensar nisso. É mais fácil culpar a TPM, mas não é justo tamanha carga de culpa na coitada. O problema é eu e um cara que chegou todo espaçoso em minha vida. Isso é o que aconteceu de ruim nessa semana. Se gritar em plenos pulmões ajudasse, eu teria feito há muito tempo, mas isso não faz a confusão ir embora. Queria muito que fosse isso. Na verdade, eu quero muito

poder ir visitar o meu irmão, mas o feriado está muito longe. E minhas férias estão perto de chegar. É um direito meu, mas eu também não posso simplesmente deixar todo mundo na mão e ir. Tenho que saber das minhas obrigações também. E precisa coincidir com as férias de Joaquim e papai, para estarmos todos juntos. No Natal quem sabe? Faria bem para todos nós. Ou então eu poderia viajar rapidamente por alguns dias para apenas estar nos braços de minha mãe. Argh! Por que eu estou tão emotiva? E eu nem mesmo assisti à nenhum filme de cachorro que se perde. Você sabe a verdade, Juli, está apenas evitando pensar nela. Tiro os meus óculos e esfrego os meus olhos. Muito bom que eu não passei nada além de base hoje, ou estaria pior que a menina Ester do filme A órfã. Meu dedo passa por cima do meu dolorido ferimento. Não estremeço por ter apertado um pouco o local sensível, mas por lembrar de ontem à noite, o que aconteceu antes de Augusto sair da minha casa. Eu não sabia que poderia me sentir boba com um simples toque, a mais inocente carícia que o meu corpo receberia. Mas descobri isso ontem à noite. E me recuso a

deixar que isso aconteça novamente. Principalmente com ele. Se eu não soubesse um pouco da vida dele, poderia muito bem cair em seus braços, dando a desculpa que seria apenas uma noite. Mas eu sei que comigo nunca será uma noite. E o histórico dele não me ajuda em nada. Sei que não devo olhar para uma pessoa baseada no que outros falam dela. Mas eu confio na minha intuição. E ela me diz que isso é barco furado, muito lindo, porém não é bom entrar nele. Ou ele entrar em você. Droga, Juliane. Para de ficar pensando nessas coisas. Você tem coisas demais para perder. Concentre-se. Além do mais, eu não faço o tipo de caras como ele. Primeiro de tudo e o mais importante: Eu sou estranha. O meu jeito afasta de primeira qualquer cara que me vê. Minha nerdice e obsessão por livros, música, filmes e séries, não é algo que seja sexy para um homem. E minha independência com certeza abala a maioria da masculinidade que muitos idiotas adoram esbanjar por aí. Não que Augusto seja dessa forma. Pelo contrário ele é educado, respeitador. Mas não deixa de ser um cara em grande nível que pode quebrar as grades do meu coração para logo em seguida machucá-lo.

Ele pode isso, pois eu sei que estou meio que encantada com ele. Pronto, falei. A menina solitária em mim fala alto e quer mais desse cara. Mas eu não vou deixar que ele estrague as muralhas que eu construí. Mesmo sabendo que detê-lo é um trabalho muito pesado. Eu não posso lutar contra mim mesma, mas posso de alguma forma enganá-la. Dizendo a essa parte minha, que ele vai me fazer chorar e esquecer assim que conseguir o que quer de mim. Meu telefone toca e quando vejo o nome no identificador, dou um enorme sorriso. — Oi, Eliza! Minha mãe resmunga no telefone, mas sei que ela está sorrindo. — Oi, minha filha, não ouço você tem semanas. E ela ainda pergunta de onde herdei o exagero. — Mãe, falei com a senhora semana passada e mando mensagem todo dia no grupo, por favor, nada de exagero. — Certo, eu só liguei para saber se seu irmão já combinou com você os dias em que ele vai passar aí. — É, não. Ele está vindo para a cidade? — Digo olhando para o meu celular e então vejo as mensagens do meu irmão. — Ele mandou mensagem, mas eu ainda não respondi. Deixe que eu resolva com ele as coisas.

— Claro que você vai. Só quero saber se está tudo bem com você recebê-lo. Quem resmunga agora sou eu. — Que pergunta mais sem jeito, mãe. É claro que eu vou receber o meu irmão e a família dele. — Só queria ter certeza. — Assim que eu descobri o que fazer com ele, eu aviso a senhora. Posso ligar depois? Tenho algumas coisas para fazer agora. — Certo, querida, eu falo com você depois, seu pai manda beijos. — Mande outro pra ele. Ω São sete da noite e eu deveria estar em casa assistindo à uma das minhas séries favoritas. Comendo um pedaço de torta ou tomando uma taça de vinho que Augusto esqueceu em minha casa. Não, aquele vinho não é meu e eu deveria ter trago para ele e devolvido, mas acabei esquecendo mesmo. Eu me recusei a pensar que seria para o jantar dele com a bruxa. Então deixei no local onde ele esqueceu e me recusei a tomá-lo. Tenho que lembrar de entregar para ele. Não quero que pense que fiquei de propósito.

Eu não sei o porquê de estar aqui, só sei que estou cumprindo um pedido que me fizeram. E como fiquei até agora, pude finalizar todos os serviços que me solicitaram. Ligo o meu celular e começo a ouvir música aleatórias. E me cai uma música para bater mesmo o desânimo. De tarde quero descansar, Chegar até a praia e ver Se o vento ainda está forte Vai ser bom subir nas pedras Sei que faço isso pra esquecer Eu deixo a onda me acertar E o vento vai levando tudo embora Agora está tão longe ver, A linha do horizonte me distrai Dos nossos planos é que tenho mais saudade Quando olhávamos juntos na mesma direção Aonde está você agora Além de aqui, Dentro de mim? Agimos certo sem querer Foi só o tempo que errou Vai ser difícil eu sem você

Porque você está comigo o tempo todo E quando eu vejo o mar Existe algo que diz Que a vida continua E se entregar É uma bobagem Já que você não está aqui O que posso fazer é cuidar de mim Quero ser feliz ao menos Lembra que o plano era ficarmos bem? Yey, yey, yey, yey, yey Olha só o que eu achei: Cavalos-marinhos Sei que faço isso pra esquecer Eu deixo a onda me acertar E o vento vai levando tudo embora. — Mesmo você usando fone de ouvido, eu consigo ouvir a música da minha sala. — Suspiro quando ouço a voz da pessoa que quero passar a evitar. — Escutar músicas com esse volume pode acabar prejudicando a sua audição. Nem está tão alta assim. Já que eu ouvi você. Tiro os fones e dou pause na música. — Vou me lembrar disso. — Limpo a garganta. — Precisa de alguma coisa?

Ele engole em seco quando termino a minha pergunta. Augusto mexe os ombros como se estivesse desconfortável com ele mesmo. — Preciso que esses documentos sejam levados ao cartório na segunda-feira cedo, e que estejam registrados na minha mesa até as três da tarde. Kátia terá que levá-los para a Alfândega na terça. Você dá mais uma olha para mim? Preciso saber se não está faltando nada. Diz me entregando a mesma pasta que estava com ele ontem à noite. — Claro, faço isso agora mesmo. — Digo já folheando as páginas. — Isso pode esperar. Dou a ele um sorriso de ironia. — Se você quer esses documentos registrados para a Alfândega na terça, então não posso esperar. — Volto a verificar cada folha. — Eu vou mandar um email para uma amiga que estudou comigo. Ela é assistente do superintendente, vou pedir que ela libere o inventário antes do meio dia. Isso está bom para você? — Claro, eu agradeceria. — Tudo bem, eu posso fazer isso. Infelizmente não vou poder buscá-los pessoalmente, mas eu posso pedir ao seu José para fazer isso por mim. Ele acena concordando.

— Mais alguma coisa, senhor Augusto? — Sim, quero saber que hora devemos sair para o passeio de amanhã? É a minha vez de ficar desconfortável. Penso em me fazer de idiota. Coisa que eu consigo sem nem mesmo tentar. — O RH programou um passei que eu não estou sabendo? — Abro a minha agenda para procurar. — Acho que Cris esqueceu de me avisar. É algo sobre workshop? Ou apenas uma reunião de colegas de trabalho? Augusto se senta na cadeira à minha frente. — É o passeio que você concordou em me levar, para conhecer algumas cachoeiras. Por que ele apenas não esqueceu? Isso faria a minha vida mais fácil. — Ah, desculpe, mas eu esqueci e acabei nem mesmo procurando algum local... — Lembra que eu fiz isso por você? — Ele me dá aquele sorriso. — Está tudo organizado. Tenho a pousada em que vamos ficar, guias que estarão nos levando para alguns locais, até mesmo podemos fazer uma pequena trilha se você quiser. E se não quiser dormir por lá, tudo bem. Voltamos pela noite. — Suponho que você estará dirigindo, certo? Ele acena que sim. Esperando pacientemente que eu

aceite a sua ideia. — Com tudo isso que você me disse, eu tenho certeza que você estará exausto no fim do dia, então será uma péssima ideia voltarmos pela noite na BR esburacada. Então acho que... — Voltamos no domingo pela manhã então. — Diz dando outras opções. — Ou podemos ir e voltar de táxi. Sei que não será muito caro se conseguirmos encontrar um camarada que possa nos levar e trazer de volta quando encerramos nossas atividades. — Você diz isso como se fosse a coisa mais fácil do mundo. Ele sorri. — É, se for o caso de chantagear você, eu vou fazer. — Como é que é? — Pergunto perplexa. — Isso mesmo! — Diz caindo contra a cadeira e cruzando os seus braços. Estou tão afoita que só posso olhar para a sua cara de pau. — E como exatamente você faria isso? Ele me dá um sorriso egocêntrico. Se ele não fosse tão lindo, eu arrancaria os olhos dele nesse momento. — Usaria o que eu fiz por você na semana passada para colocar um pouco de culpa em seu coração. E sei que

conseguiria. Sei que é dessas pessoas que odeiam deixar uma dívida, mesmo que seja estúpida. E eu conseguiria convencê-la com isso. Você me deve um favor, e eu quero que seja pago. Eu fiquei com você, cuidei de você, fiquei preocupado. E agora eu preciso que alguém venha comigo para uma pequena viagem, você disse que estaria à disposição caso eu precisasse. — Ele sabe que acertou em cheio. — E eu preciso que você venha comigo. O que me diz, Juliane? Certo, eu vou ser sincera. Eu disse sim porque eu quis, não porque ele usou de chantagem emocional que funcionaria se não conseguisse me convencer. Mas eu deixei que ele acreditasse que foi por um pagamento de dívida, não por vontade própria. Deus me livre ajudar que o ego do cara aumente. Isso é inaceitável de minha parte. E ontem à noite, antes de dormir, disse a mim mesma em frente ao espelho, que eu serei a mulher mais profissional que aquele cara já viu. Coloquei uma calça de tactel na minha mochila. Mesmo vestindo um short, se ele quiser andar dentro do mato, eu vou ter que estar coberta de alguma forma. Coloquei as mesmas coisas que eu coloquei a última vez que meu irmão me fez ir com ele em uma excursão. E não foi a melhor aventura da minha vida, fiquei com febre, enjoada e com o pé machucado.

Depois disso, disse que nunca iria com ele em nenhum lugar. Meu interfone toca e sei que Augusto está me esperando. E deixei meu irmão avisado, caso o meu chefe seja algum serial killer e queira me amarrar contra uma árvore e deixar que alguma onça me faça de refeição. Desço até o estacionamento e encontro a sua BMW em frente ao meu prédio. Augusto sai do carro e vem até mim. Pega a minha mochila com um sorriso divertido. — Bom dia, Juliane! — Diz quando abre a porta do carro para mim. Empurro o óculos em meu rosto e murmuro um bom dia. Primeiro de tudo: Se você é obrigada a acordar antes das sete da manhã em pleno sábado, depois de dias de puro estresse, com uma convocação que frustra todos os seus planos de ficar no quarto e ser recebida com um sorriso de diversão, o resultado é nada mais nada menos do que: HUMOR DE CÃO! Espero que Augusto não tente, não fale, nem mesmo aja como se eu realmente quisesse estar aqui. Eu pensei nisso alguns momentos atrás, mas depois que saí do meu apartamento, lembrei dos meus planos que foram destruídos. — Você parece não ser uma pessoa matutina nos fins

de semana. Finjo que não ouvi o seu comentário estúpido. Apenas coloco o cinto de segurança. — Podemos passar em alguma padaria ou algo assim, para pegar algum café? — Não tomou café? Há algo de errado? — Apenas não estava com humor para enfrentar a cafeteira. — Digo tentando inutilmente não soar malhumorada. Os próximos quinze minutos de viagem são feitos em completo e absoluto silêncio. Comprei café para nós dois. Augusto me agradeceu com um sorriso, enquanto eu tomava meu café como se ele pudesse me dar o poder de desaparecer. Eu quero poder ligar o rádio e ouvir o jornal, mas o medo de me mexer e quebrar alguma coisa me deixa quieta. Augusto tira o olho da rua e me olha alguma vezes. E quando penso que ele vai falar alguma coisa, acaba fechando a boca de novo. Pego o meu celular e mando uma mensagem de bom dia. Sei que eles vão me encher o saco por estar de pé bem cedo no sábado. Mas sacrifícios são necessários quando se quer algo na vida. Quem disse isso não sabe o que é acordar cedo na porra do fim de semana. — Você sabe que é mais ou menos duas horas de

viagem daqui até o nosso destino, não sabe? — Humhum! — Vamos fazer mesmo essa viagem em silêncio? Me viro no banco para encará-lo. Sério mesmo isso? A primeira vez que ele me viu jogou logo na minha cara que eu sou uma tagarela. Se isso não é se incomodar, então eu não sei o que é. Se ele quer conversar, eu empresto a SIRI para ele. Eu não respondo a ele. Sei que estou sendo uma idiota, mas eu preciso de algumas horas para melhorar o meu humor. Já que a opção mais desejada está fora de questão aqui. O jeito é respirar fundo e tentar de alguma forma, não xingar toda a descendência dele. Possa ser que xingar em pensamento possa dar um jeito nisso. — Olha, eu queria que viesse para não me sentir sozinho. E eu não quero que você passe toda a viagem calada, Juliane. Gosto quando você fala sobre qualquer coisa. Como consegue deixar tudo interessante, até mesmo as coisas mais estranhas. — Pensei que eu fosse uma tagarela na maior parte do tempo! Meu tom não é nem raivoso e nem amigável. Acho que frio é a melhor maneira de classificar minha voz. E Augusto percebeu, pois ficou por muito tempo olhando

para a estrada quando saímos da cidade. Sinto muito se eu joguei isso para ele assim, quando ele está tentando me fazer relaxar. Mas o que eu posso fazer? Uma hora ele diz que fez o que fez por se sentir na obrigação. Em outra está dizendo que fez porque se preocupou. E para me fazer pensar que ele é instável, diz que gosta que eu fale, quando reclamou logo de cara que eu sou uma tagarela. — Eu fui infeliz em minhas palavras, desculpe por isso. — Diz baixo, até mesmo envergonhado. — Sei que isso te fez ter uma visão arrogante de mim, mas eu não estava querendo isso quando disso aquilo. Muito pelo contrário, eu gostei disso. Gostei disso em você. Mesmo com a responsabilidade que tem, você não deixa de ser você mesma, e isso me encantou em você, Juliane. A única coisa que posso fazer é empurrar os óculos de volta ao seu lugar. — E se pedi que viesse, é porque quero sua companhia. — Diz segurando firme o volante. — E se você não cedesse à minha chantagem, de alguma forma, eu iria conseguir passar algum tempo em sua presença. Tenho plena certeza. Estou em um carro com um Serial Killer. — Poderíamos voltar, se você quisesse, mas eu não faria isso. — Diz virando-se rapidamente para me olhar. — Eu vou tentar melhorar o seu humor e então podemos aproveitar um pouco o dia. — Sua voz se torna baixa. —

Por favor, vamos fazer isso juntos. E mais uma vez eu empurro os meus óculos de volta para o lugar. — Você pode ligar o rádio? Eu gosto de ouvir o jornal! Ela liga o rádio rapidamente. Um pouco aliviado por eu ter dado a ele algumas palavras. Ω Eu consegui dar um pequeno cochilo por um tempo, mas a estrada esburacada não deixou que isso fosse a melhor viagem de estrada que eu já tive. A cada chacoalhada que eu tinha dentro do carro, era a estrada zombando de mim. Como se dissesse: Você não vai dormir, criatura! Então, aceitei a derrota e fiquei prestando atenção nas notícias, até quando o sinal deixou, é claro. Augusto me olha de vez em quando para saber se estou acordada. Bem, sonâmbula eu não sou. — Estou acordada. — Digo baixo. — O governo joga na minha cara através dessa estrada que não faz porra nenhuma com os impostos que eu pago. Ouço a sua risada baixa e divertida. — As suas expressões são as melhores, Juliane,

saiba disso. Dou de ombros e me arrumo no banco. Meu ombro esquerdo tem a marca do cinto de segurança, se não ficar roxo, será um grande milagre. Passamos por uma placa que diz estarmos a vinte quilômetros de nosso destino. E mesmo que eu ame ficar sentada, eu preciso esticar as minhas pernas. — Já estamos chegando. — Diz como se eu não soubesse ler. Juro que eu estou tentando, mas é difícil, quando ele consegue ser tão idiota de muitas maneiras. Não, ele não é idiota. Ele é legal, educado, cavalheiro, atencioso e por alguma razão totalmente desconhecida, quer a minha companhia. Augusto passa pela primeira parte da cidade e estaciona em frente a uma pousada muito bonitinha. Eu não espero ele abrir a porta para mim, minhas pernas exigem que o sangue circule entre elas e não posso esperar mais. Augusto pega sua mochila e quando eu vou pegar a minha ele me dá um olhar que com certeza poderia me fazer recuar. Poderia. Mas não fez. Em vez dele continuar a me encarar assim, me dá um pequeno sorriso. — Eu levo para você, Juliane. Certo! Evito a dor nos ombros depois. Eu o sigo até a

recepção onde ele dá a sua carteira de motorista. Ele diz que reservou dois quartos e pega as chaves. — Você sabe, se quiser voltar, basta me avisar. — Diz quando dá a chave do meu quarto. Fico muito feliz que cada quarto é bem distante um do outro. O meu é em um corredor, enquanto o do meu querido chefe é em outro bem distante do meu. Graças ao Pai Celeste por isso. Só que isso não o impede de vir até aqui para que, de alguma forma, fique me azucrinando. Como agora por exemplo. Eu só quero esticar minhas pernas, enquanto ele quer ir por aí, se aventurar. Mas me lembro que eu devo isso a ele. Sim, Juli querida. Seja uma boa menina e ajude o pobre rapaz a conhecer o lugar. Pague a sua dívida e se divirta. É, poderia ser um cenário bem pior. Troco minha sandália por meu tênis e vou até Augusto. Com apenas o meu celular e a cópia da minha identidade, eu vou com ele andar por aí. — O que? — Pergunto quando ele não para de me olhar. Seus olhos vagueiam por todo o meu corpo. Seus olhos claros estão com scanners detalhando cada parte que para. Fico quieta, deixando que ele faça isso. Na verdade, eu finjo que não percebo o que ele está fazendo. — Eii? — Estalos os dedos em frente ao seu rosto.

— Podemos ir? Aonde quer que seja!? Ele sorri e estende a mão para mim. Dou a ele minha mão e vamos para fora da pousada. A cidade é bem tranquila. Mesmo que todo o fim de semana, sempre recebem pessoas de fora que querem descansar. Eu posso aproveitar isso. Posso mesmo. Preciso de um banho de rio para levar tudo de ruim que possa estar ao meu redor. Preciso dar um descanso ao meu corpo. Mais do que ele precisa, é óbvio. — Eu não acho uma boa ideia você ir até Asframa. — Digo quando o faço parar. — Não de primeira, é claro. Augusto para à minha frente, confuso. — O que quer dizer? Dou de ombros. — Na minha opinião, é bem difícil de aproveitar alguma coisa. — Olho em seus olhos e percebo que ele está bem atento ao que digo. — Eu conheço uma, que vim com meu irmão uma vez, eu acho que nessa você vai poder se divertir melhor, é apenas meia hora daqui. Mas é claro. — Digo rapidamente. — Se você quiser, se não, tudo bem. Ele estende a chave do carro para mim. E eu automaticamente dou um passo para trás. — Não acho que seja uma boa ideia. Ele me encara por segundos. Augusto passa sua

língua por seu lábio superior e eu quero apenas... Ai Meu Deus! — Eu sei que você pensa que não pode, Juliane, mas eu estou com você. Não vou deixar que nada aconteça. — Diz pegando a minha mão na sua. Olho para longe, me sentindo exposta demais. E se tem uma coisa que pode me deixar inquieta, é exposição de sentimentos. Augusto se aproxima de mim, segura minha mão com delicadeza. — Eu sei que é difícil, Juliane, mas também sei que você é forte e uma hora vai conseguir. — Diz afagando minha mão. E por isso, eu olho para ele. — Vem, eu dirijo enquanto você me diz aonde ir. — Ele inclina a cabeça. — Acha que podemos fazer isso? Aceno que sim para ele. — Então vamos lá. Entramos em seu carro e liga o som. — Pode conectar o seu celular se quiser. — Diz me mostrando o cabo conector. — Sei que você quer isso, Juliane. Eu estremeço apenas pela forma como ele disse a última frase. Como se ele sugestionasse outra coisa. Como se há algo oculto em meio a sua frase inocente. Não é a primeira vez que eu percebo isso. Ele já fez isso antes, mas estava lerda demais para perceber o que ele estava

tentando falar. Ou eu estou na seca por muito tempo e estou levando as coisas inocentes para o lado sugestivo. Ou ele está mesmo dizendo essas coisas e estou desligada demais para ver qual é a dele nisso tudo. Vou optar pela opção que estou na seca e estou levando tudo para o lado sugestivo. Sim, vou fazer isso. Até porque, perturbada eu já sou, colocar a culpa em mim é mais fácil. — Você tem gosto bem diversos sobre música. — Ele comenta divertido. — Vária muito do meu humor. — Digo deixando a minha playlist tocar. — Como as de segunda. — Diz quando vira para a esquerda. — Você coloca as músicas calmas para ter um pouco de paciência, eu imagino. Me viro para encará-lo. Totalmente surpresa com sua observação. — E nas quartas, para ter um pouco de animação, você coloca algo como Ariana Grande ou aquela band girl que todo mundo adora. — E como é que você sabe disso? Ele consegue parecer envergonhado com isso. E por alguma razão, isso me faz rir. Muito.

Augusto não parece entender o que houve comigo. Ele alterna entre me olhar e dirigir. Sorte a dele que somos os únicos na estrada, senão estaríamos em apuros. Tomo fôlego quando a risada cessa. Mas ainda estou com uma pequena crise de risadinhas. — Posso saber qual o motivo de tanta alegria? Eu tomo longas e profundas respirações, mas é difícil já que ele ainda está envergonhado. Eu fico olhando para ele mordendo a parte interna da minha bochecha para me controlar um pouco. — Desculpe, mas é que você fica tão fofo quando está envergonhado. E lá vai ele fazer isso de novo. — Desculpe, eu não queria dar esse show. Mas é que foi impossível de resistir. Augusto engole em seco e olha para a estrada. E isso só me diz que ele está desconfortável com isso. Me arrumo no banco e limpo a minha garganta. — Eu sinto muito. Não queria que... — Não peça desculpas por ser você mesma. E não me peça desculpas, quando eu sou o errado na situação. Quando observei coisas em você que não deveria. — Ele para no acostamento. — Se alguém aqui tem que se desculpar, sou eu. Mudança de assunto. Legal.

— E acho que também fiz algo a você. — Digo baixo. Augusto vira para mim. Seu antebraço apoiado ao volante e a outra no freio de mão que está bem perto da minha coxa. Eu praticamente sinto o calor de sua mão sobre ela, sinto a aspereza que sua mão vai causar ao me tocar. — O que, Juli? Minha vez de engolir em seco. — Eu deixei você envergonhado! Seus olhos claros se arregalam e para minha surpresa, Augusto encosta sua testa no volante rindo baixo e ainda assim, gostosamente. Eu olho para ele e me junto a sua risada. Mas paro quando sua mão toca a minha perna. E lá está, o calor que eu havia imaginado. — Sim, você me deixou envergonhado. E foi a primeira vez que alguém me fez isso. — Jura? — Sim. — Diz sorrindo. — Cara, eu tirei a virgindade de alguém. — Paro o encarando assustada. — Eu não fui grosseira, fui? — Não! — Diz segurando o riso.

— Não machucou, não é? — Definitivamente não! — Você gostou? — Pergunto hesitante. Augusto pondera a sua resposta. — Acho que não terei nenhuma melhor do que essa. Respiro aliviada. — Foi bom para mim também. — Agarro a sua mão. — Obrigada por confiar em mim. — Não sei se daria isso para outra pessoa. — Diz ele, muito sério. — Vem, eu quero ter um pouco de água corrente em mim. Diz saindo do carro com a sua bolsa. O local está de fato vazio. Não exatamente vazio, há no máximo umas cinco pessoas. Na verdade, cinco adolescentes com certeza fazendo coisas que não deveriam fazer. Apoio-me no ombro de Augusto quando descemos uma pequena escada de terra. Ele parece um pouco ansioso demais para apenas um banho de cachoeira. Será que ele é mesmo um Serial Killer? Mas assassinos em série não ficam nervosos quando vai fazer a sua vítima, eles não demonstram nenhum tipo de emoção. Eles estão bem consigo mesmos, quando está próximo de fazer sua vítima. Criminal Minds serve de

alguma coisa. Dou um tropeço contra ele, que rapidamente me segura. — Devagar aí! — Diz com um sorriso. Seus olhos estão ligados aos meus. E diferente de mim, Augusto está bem com isso. “É apenas você, Juliane. Apenas Você, que está sentindo isso.” — Desculpe, é que eu... — Essa é a minha voz falhando? Desde quando minha voz falha? — Eu não pisei firmemente. Augusto continua sorrindo enquanto me solta lentamente. Me obrigo a ficar firme sobre os meus pés. Augusto larga a sua bolsa em um tronco que parecia ser uma árvore enorme. Antes que eu possa ver a paisagem e se eu vou aproveitar ou não. Meu chefe muito diferente dos que eu já tive, simplesmente tira a sua blusa sem nenhuma cerimônia. Abro e fecho minha boca umas dez vezes seguidas. O cara é grande. Em tudo. Eu já sabia disso, mas eu não queria ter que ver isso de perto. Desconhecer o material, faz dele algo indesejável. Mas agora ele está bem desejável. E pra finalizar, ele tem que tirar a sua bermuda. Sim, ele fez isso. Ele é como o tio Hale gostoso de Teen Wolf. Só que mais jovem, maior e mais simpático ao

que parece. Fico olhando para a cachoeira, sim. Ela é mais linda e menos desejável de transar do que o meu chefe. É isso mesmo, vamos olhar para a cachoeira. Isso foi uma péssima ideia. Uma porcaria de ideia. A ideia mais imbecil que eu poderia ter tido. A pior das ideias, das ideias já tomadas em todo o Universo. Que droga! — Juli? — Ele parece confuso. — Você não vai aproveitar a água? Não se vire, Juliane. Eu te proíbo de se virar. — Não, eu... Eu vou ficar aqui, olhando a paisagem. Uma que não seja o seu corpo maravilhoso. Que eu com certeza faria um banquete dele. — Qual é o problema? — Pergunta. Ouço as folhas debaixo dos seus pés cada vez que ele se aproxima de mim. — Você não sabe nadar? — Também! — Digo sincera. — Mas é que eu não estou no clima, sabe? É, mas... — Mas...? — Pode ir, eu fico olhando você daqui, só não se afogue, tá bem? Eu não vou poder fazer muita coisa sobre isso. Augusto sorri e olhando ele agora, assim, desse jeito tão relaxado, solto, sendo ele mesmo, tenho noção de que, se antes ele era irresistível, agora, ele é praticamente a

melhor imagem que as lentes dos meus óculos já viram. Seus olhos brilhando, seu sorriso radiante, o jeito que seu peito sobe e desce quando ele se entrega a uma risada baixa. Uma covinha em sua bochecha direita. Foco em me sentar, estico a toalha na terra e me sento. Olhando as pessoas aproveitarem o seu dia. O sol já está esquentando, mas ainda posso continuar com minha blusa. Quando estou indo pegar o protetor solar, uma quantidade absurda de água me atinge. As lentes dos meus óculos estão embaçadas, minha camiseta um pouco encharcada, minha franja cai no meu rosto fazendo mais bagunça. — Está no clima agora? — Augusto pergunta agachado à minha frente. — Eu te odeio! — Digo quando tiro os meus óculos. — Sério, eu te odeio mesmo. Ele sorri ainda mais. — Já que é assim. — Diz pegando o meu óculos e colocando na caixinha de proteção que tira da minha mochila. Então em segundos eu estou no ar e logo em seguida, dentro d’água. Assim que eu volto para cima, cuspo água e só então percebo que Augusto está à minha frente rindo de mim. Eu tento ficar com raiva, tento fazer cara de brava, mas eu não consigo. A sua risada é contagiante. Vejo que a água

está em volta de sua cintura. E sem nem pensar mais de uma vez, pulo em cima dele e caímos os dois na água. Ω De alguma forma, eu não molhei o carro de Augusto, na verdade, ele foi bem gentil em me emprestar uma blusa sua. Mesmo que estivesse com as roupas debaixo molhadas. Eu não cedi ao seu pedido de tirar a roupa. Fiquei do jeito que estava e não me importei com isso. Augusto ficou fascinado com a cachoeira, com o gelo que a água é. Com a calma que estava o local. Cada mergulho que ele dava, sempre que voltava, parecia mais diferente, como se as águas estivessem de alguma forma levando as coisas que estavam o preocupando. Eu sei como é isso, pois em apenas um mergulho, eu estava mais leve. E foi o bastante para me ajudar a aproveitar a companhia divertida do meu chefe. Mas depois que eu pulei em cima dele nos derrubando na água, algo mudou. Não que eu não tenha aproveitado tudo, não que eu não tenha me divertido junto com ele. Mas de alguma forma, tudo parecia diferente. Como eu o encarava e ele me olhava de volta, como ele sorri para mim sempre que faz alguma coisa idiota, ou quando ele me puxou mais para o fundo, enquanto eu gritava como uma menina desesperada. E então me

segurou mais perto dele e me acalmou. Eu não sentia o chão em meus pés e isso fez com que eu me agarrasse a ele mais fortemente. E quando ele me pediu para confiar nele e eu fiz. Eu senti que tinha alguma coisa de errada. E então me lembrei que é apenas eu sentindo isso. — Está com fome? — Augusto me pergunta quando sai com o carro de volta para cidade. — Sim. — Respondo amarrando meu cabelo para que não molhe muito o carro. — Não se preocupe com isso. — Hã? Ele sorri. — Em molhar o carro, não se preocupe com isso, terça estarei mandando ele para a limpeza, não precisa se preocupar com isso. — Diz e depois de segundos ele completa. — Aliás, o seu cheiro no carro é algo muito bom de manter. — O que você disse? — Eu tenho certeza que imaginei as coisas que ele disse. — Nada, apenas não se preocupe, tudo bem? Logo vamos estar na pousada para comermos alguma coisa. Concordo com ele e então relaxo contra o banco do seu carro.

— Obrigado por hoje. Eu tenho certeza que não seria divertido se você não estivesse aqui. Dou um sorriso para ele. — Obrigada por me chantagear — digo rindo e isso é bom, já que ele faz o mesmo. — Acho que agora eu estaria em casa assistindo os peitorais dos gêmeos alfas de Teen Wolf. Não molhada dentro do seu enorme e caro carro. — Eu me viro e o encaro. Augusto está olhando para a estrada, mas eu sei que ele sente o meu olhar. Pois vejo ele conter a tensão em sua mandíbula. E a veia pulsante na sua têmpora está muito visível. Sem querer e sem pensar também, eu solto o cinto e me aproximo dele. Passo o meu polegar pela veia, tentando o acalmar e acho que consigo, já que ele solta o ar lentamente. Eu continuo com isso até que vejo um pouco mais de calma vindo dele. — Eu li uma vez, que quando a veia saliente na têmpora ou testa de alguém, está visivelmente pulsante, temos que ser rápidos em acalmar a pessoa, dar a ela algo para se concentrar, pois o risco de acidente vascular é cinco vezes maior de acontecer em uma situação como essa. — Eu me afasto um pouco. — Eu não queria fazer isso, mas eu não quero que isso aconteça a você. Mesmo pensando nisso ser algo bem sexy, eu não quero que você se machuque. — Obrigado!

É tudo o que ele diz. E eu não quero mais do que isso. Na verdade, eu quero sim, mas não é nada de bom, na verdade é muito bom, mas é um passo que pode tanto estragar tudo, como melhorar tudo. Ainda não sei para qual lado está mais fadado a ser. Não demorou muito para chegarmos aonde vamos passar a noite. Eu preciso mandar uma mensagem para o meu irmão e ver o meu email. Quando estou entrando no banheiro, uma batida na porta do meu quarto diz que Augusto quer alguma coisa. Assim que abro a porta, praticamente tenho um ataque de hormônio que eu não posso controlar. Ele está apenas de toalha na porta. E mereço um super parabéns, já que olho para dentro dos olhos dele. — Não é só você que está sentindo isso, Juliane. — Diz entrando no meu quarto, fecha a porta e para na minha frente. — Eu estou sentindo também, e acho que se não der um passo agora, eu corro o risco de ter aquele acidente vascular que você mencionou horas atrás. — Eu. — Molho os lábios. — Eu quero que... — Graças a Deus. — Diz antes de me agarrar e me levar para a cama.

6 Eu não sei como vai ser depois disso, não quero nem pensar nisso. Me concentro apenas na sensação que meu corpo há muito tempo não sentia. E nossa, é melhor do que eu lembrava. Augusto não tem nenhuma vergonha em passar as mãos pelo meu corpo e os gemidos que ele solta sempre que ele aperta a minha bunda é contagiante. Assim que sinto a cama em meus joelhos, eu o agarro com mais força. Cravo as minhas unhas em seu pescoço e ele aperta

mais a minha cintura. Gosto disso! Augusto nos gira, ele está sentado na cama, e me mantém em pé na sua frente. Augusto segura a minha mão firmemente e logo em seguida, ele a solta. Eu não faço nenhum movimento brusco, como se por qualquer movimento, ele pudesse me comer literalmente, ou desistir de tudo. Se a segunda acontecer, eu juro que pego o primeiro cara na rua. — Tire a roupa! — Seu tom é firme e desejoso. — Tire cada peça lentamente. Eu posso fazer isso, mas se ele pensa que é o único a dar as ordens aqui, não tem ideia de onde se meteu. — Se você me quer sem elas, por que não tira você? Assim que minhas palavras são ouvidas, ele levanta o olhar para me encarar. Surpresa, desejo, luxúria, desafio e perversidade é tudo o que seus lindos olhos me mostram. E eu não desvio o olhar do seu e percebo que ele gosta disso. — Eu quero você, nua, mas quero que você. — Ele engata o seu dedo dentro do meu short e me puxa para mais perto dele. Sua boca na direção do meu umbigo. Mesmo com a blusa ainda molhada, eu sinto o seu hálito quente atravessando o pano e encontrando a minha pele.

— As tire. — Pois vai ficar esperando. — Digo dando um passo para trás. E pelo olhar de medo que ele me dá, sei que eu ganhei essa. Augusto se levanta mais do que depressa, enfia as mãos por dentro da minha camisa e as tira com uma pressa assustadora, mas também excitante. E faz a mesma coisa com o short dele que eu uso. Assim que me vê apenas de sutiã e calcinha, ele parece precisar de uma bolsa de oxigênio. Mas é por pouco tempo, já que suas mãos vão diretamente para minha cintura, apertando com mais força do que a primeira vez. Uma de suas mãos sobe por minhas costas e encontra os meus cabelos bagunçados. Ele puxa a minha cabeça para trás e desfaz o coque que prendia-os. Seus olhos estão com um brilho perverso e não me assusta de jeito nenhum. — Vai ficar me encarando ou vai fazer as coisas que tem em mente? — Alfineto sem nenhum medo. — Eu apenas não sei por onde começar. — Ele parece dizer a verdade. Certo, eu vou ter que começar o trabalho. Agarro o seu pescoço e trago o seu rosto próximo ao meu. Ele está de alguma forma esperando por isso, ou se controlando. Assim que seus lábios encontram os meus, suas mãos

instintivamente vão para o final de minhas costas e não demora muito para ir até a minha bunda. Mordo seu lábio quando ele me aperta mais contra ele. Ele tem gosto de Coca-Cola, seus lábios estão gelados, seu gosto é bom demais. Levo minhas mãos para a toalha e a desfaço. Passo minhas mãos pela sua barriga, ele estremece e geme contra a minha boca. Meu corpo treme com o retorno que ele me dá, Augusto com destreza solta o meu sutiã e me vira para a cama me jogando na mesma. Eu posso dar uma boa olhada nele agora. Muito melhor do que eu imaginei. Só que ele não me deixa apreciar o bastante, já que ele se ajoelha ao chão, segura minhas pernas e me puxa mais para a beirada da cama. Ele não mostra nenhuma reação. Seus dedos vão para a minha calcinha, que a tira com uma lentidão agonizante. — Você pode abrir as pernas, Juli? — Pede beijando minha perna. — Uii! — Gemo quando Augusto morde uma parte da minha perna, que faz ondas de prazer retumbarem pelo meu corpo. Eu faço o que ele me pede. Ouço quando ele inspira com força para logo em seguida morder a minha coxa na medida certa. Eu não grito, nem mesmo ouso gemer, o único sinal de prazer que demostro é pelo meu corpo que se contorce na cama. Sua língua faz o seu caminho até onde eu mais

preciso dela, mas ele para, me fazendo suspirar de frustração. Um de seus dedos percorrem a parte interna da minha coxa. Seguro a língua para não ter que gritar ou até mesmo implorar. Se tem algo que eu não vou fazer, mesmo que tenha sido anos de seca, será implorar. — Eu sabia que você seria linda, Juli. — Augusto lambe minha virilha e deixa um beijo estalado nela. — Sabia que não iria aguentar por muito tempo. — Agarro o lençol da cama quando sua língua passa levemente pela minha boceta já necessitada. — Precisava apenas de um sinal seu. — Ele me puxa para mais perto de seu rosto. — E você me deu. — Sinto o seu hálito quente como prelúdio do que vai acontecer. — Agora eu vou comer você, de todas as maneiras que minha mente trabalhou nessas últimas duas semanas. Eu não estava pronta para sua boca. Ela é implacável. Augusto aperta minhas pernas no lugar, enquanto ele alterna entre sua língua e dentes na minha boceta. Quanto tempo eu não sei o que é isso? Meu sangue ferve cada vez que sua língua circula o meu clitóris muito sensível. Sua língua quente entra em mim para apenas me fazer querer gritar. Mas eu seguro a língua. E isso o irrita, já que ele solta minha coxa e coloca dois dedos dentro de mim. Só que eu sou mais forte. Apenas reviro os olhos em

êxtase. Com o trabalho de seus dedos e a sua língua em meu clitóris, o orgasmo começa a vir com uma força descomunal. Agarro os seus cabelos com força, o punindo por ser tão bom nisso. Choques de prazer percorrem o meu corpo. — Teimosa, hein?! — Ele volta a me lamber sem hesitação. Ele encontra a parte sensível mais uma vez e suga com certa força que deveria doer, mas apenas intensifica o prazer. Seus dedos trabalhando com ritmo implacável em mim, construindo a sensação já esquecida pelo meu corpo. Meu corpo inflama, minha barriga se contrai, meus olhos se fecham com força, minha boca por livre e espontânea vontade solta um gemido alto e de puro prazer. Ouço a sua risada baixa, que agora é a que eu mais odeio. — Do jeito que você gozou rápido. — Morde com certa força a parte interna da minha coxa. — Me diz que faz tempo que ninguém te chupa como você merece. Mesmo com a respiração acelerada e com os choques ainda percorrendo o meu corpo, eu sei que minha voz vai sair desesperada, mas o que importa? Já que estou com o pirulito desembrulhado, porque não colocar na boca? — E como deve ser isso? — Pergunto com os olhos fechados, saciada demais para encará-lo. Estremeço quando seu dedo passa pela minha boceta

espalhando lubrificação por onde passa. Seus lábios vão para o osso púbico. Augusto alterna entre seus dentes e língua em meu corpo. Agarro o lençol da cama, não querendo participar do seu jogo. Mas ele sabe o que está fazendo. Quer saber? Eu vou exigir muito dele, só por se achar o gostosão. — Bem, você deve ser chupada como se fosse a mais deliciosa fruta que um homem já pôs na boca. — Augusto se arrasta para cima do meu corpo. — Saboreada como se fosse a mais rara das delícias divinas. — Ele morde minha barriga e se satisfaz quando me vê estremecer. — Comida como se fosse a última e a primeira vez. — Sempre diz isso para as mulheres que está querendo comer? — Não consegui segurar a língua. Sinto que ele fica quieto, ponderando o que vai dizer em resposta. — Quando eu quero comer alguém, eu digo diretamente. — Augusto agarra as minhas mãos e as coloca acima de minha cabeça. — Como agora, por exemplo. — Ele morde meu lábio e o puxa com força me fazendo gemer de dor e prazer. — Eu quero comer você. — Ele abre minhas pernas e sinto-o duro em minha coxa. — Eu vou comer você. — Diz, beijando o topo do meu seio direito. — Mas antes, eu vou me deliciar, vou provar você. — Augusto levanta a cabeça me encarando com tanta luxúria, que provavelmente me queimaria com tanto

fogo que ele tem. — Então eu vou fazer com você tudo o que eu quiser e mais um pouco. Isso soou como um Serial Killer. Mas eu não me importo, pois ele é um assassino muito, muito delicioso. — Então, vamos nós dois nos divertir. Livro minhas mãos das suas e agarro os seus ombros nos virando na cama. Eu não posso deixar de rir de sua expressão surpresa. Mas assim como ele se surpreendeu, também se excitou mais com a minha súbita vontade de brincar com ele. Fico em seu quadril. Suas mãos automaticamente vão até a minha cintura, mas eu as tiro e as seguro nas minhas. — Quer mesmo medir poder? — Pergunta se remexendo embaixo de mim. Seu pau cutuca minha bunda, mas sou forte o bastante para não dar a ele o que quer. Dou um sorriso para ele e deslizo para suas pernas. Seu pau grosso, cheio de veias, está duro e lubrificado para entrar em mim. Ele não é grande, mas tenho certeza que ele vai me ajudar a gozar quando estiver em cima dele. Corro minhas unhas pelo seu estômago, ele treme quando raspo minhas unhas por seu abdome bem desenhado. Com o dedo do meio, desenho todo o seu membro. Augusto fecha os olhos em êxtase, com o mais simples toque que lhe proporciono.

— Você vai ficar aí olhando? Ou vai me montar? Passo a língua pelos meus lábios. Me ajoelhando na cama. — Eu nunca conto os meus planos. Assim que digo, agarro seu pau com força em minha mão. Augusto solta um assovio quando espera impacientemente pelo próximo passo. Eu posso ter ficado anos sem uma foda, mas é como andar de bicicleta, você nunca perde o jeito. Lentamente eu passo minha língua por seu membro duro e quente. Ele pulsa contra a minha língua e isso me faz gemer. Augusto a minha mercê, me deixando chupá-lo é uma imagem que eu nunca imaginei. Lentamente o coloco em minha boca, sugando devagar, torturando-o como ele fez comigo, só que eu não tenho piedade. Chupo e trabalho com minha mão ao mesmo tempo, apertando, sugando, lambendo-o como se fosse a única chance que eu tenho. E eu acho que é. — Essa sua boca! — Augusto agarra meus cabelos, querendo que eu seja mais rápida. Mas eu não dou isso a ele. Continuo com a minha lentidão, relaxo a minha garganta levando-o até o fundo. Augusto xinga alto quando começa a pulsar dentro da minha boca. Tiro da minha boca e continuo apenas com minhas mãos, observando atentamente. Seu rosto está vermelho,

se não o estivesse masturbando, pensaria que estivesse tendo um colapso nervoso. — Eu acho que você está prestes a gozar, não é? Ele respira fundo e se levanta rápido. Augusto me joga na cama. Estamos de atravessado na cama. Augusto está em cima de mim. Ele me beija com desespero e com tanta força que nossos dentes se batem. Gemo contra a sua boca e envolvo minhas pernas em sua cintura querendo que ele entre em mim. É a vez dele de sorrir. — Juliane, você quer mesmo saber quem tem mais poder aqui? — Pergunta esfregando seu pau molhado na entrada do meu sexo. — Quer mesmo pôr à prova? Me inclino para baixo e ele entra em mim. Minha cabeça cai para trás com o tamanho prazer, choque, desejo e paixão que se apossa do meu corpo e da minha alma. Augusto me preenche por completo. Estou tão preenchida por ele que chega a doer. Augusto respira fundo quando sai lentamente de dentro de mim. Gemo com a fricção que nossas peles unidas fazem. Eu gemo e ele me acompanha. Agarro os seus cabelos com força, o que faz com que ele entre em mim com um pouco mais de força. A ponta do seu membro bate fundo no meu corpo, me fazendo gritar. — Isso mesmo! — Diz quando começa a se mexer em mim.

A queimação que faz no meu sexo, se espalha por todo o meu corpo. Eu consigo apenas cravar minhas unhas em seus braços, morder meu lábio e segurar o quanto posso o imenso prazer que ele me dá. Sua ida e vinda em mim em uma velocidade maravilhosa, se acomodando em mim, como se fosse a sua casa. Seus lábios encontram a pele de meu pescoço, clavícula, seios, lábios. Nada passa despercebido por ele. Augusto sussurra coisas como “bom” “minha nossa” “delícia” quando se move dentro de mim. Encolho minha perna até que ela fique encostado em seu peito, deixando que ele entre mais fundo, mas deliciosamente em mim. Augusto fecha os olhos como se ele se controlasse. Sua mão agarra minha outra perna me abrindo mais para ele. Seu olhar encontra o meu e vejo um brilho que me faz queimar ainda mais. Me esticando, me queimando, me fazendo querer gritar, mas eu não vou dar isso a ele. — Grite, Juliane. — Diz entre dentes. Sua voz rouca, quase demoníaca quando exige isso. — Quero a sua voz preenchendo esse quarto. Mordo o meu lábio, me negando a ceder a ele. Ele sorri e começa a me comer em um ritmo implacável. — Sabia que você seria teimosa. — Diz antes de chupar o meu mamilo com força. Isso faz com que minha parte baixa se contraia. — Sabia que sua boceta seria

deliciosa. Mas não assim. — Ele revira os quadris atingindo até então um ponto desconhecido dentro de mim. — Tão gostosa, tão quente que está me sugando como se estivesse com fome de mim. Sua boca chega até a minha orelha. — Você sabe que quer, Juli. — Ele lambe minha orelha e morde em seguida. — Sabe que vai gozar gostoso comigo. — Sua respiração está superficial, seu corpo está tenso, pronto para gozar assim como eu. — Eu imaginei isso desde o momento em que coloquei os olhos em você. Ele empurra com mais força em mim. E eu gozo, apertando o seu pau dentro de mim. Contraindo em torno dele. Gozo em silêncio, mordendo o seu queixo com força, apertando minhas pernas em sua cintura, trazendo ele junto comigo. Augusto cai sua cabeça junto a minha, quando ele se entrega junto comigo. A tensão toma conta de nós dois. Um grito fica preso em minha garganta. Ele luta para ser liberto, mas eu não vou dar isso a ele. Mas Augusto não pensa assim. Mesmo o sentindo tremer em cima do meu corpo, ele sai de dentro de mim e me vira de bruços na cama. Com seu corpo enorme, suado e muito apetitoso, ele me esmaga na cama. Seu membro duro, cutucando as minhas costas, me indicando que ele está pronto para mais uma.

E como eu quero isso. Augusto pega minhas mãos nas suas e me mantem em seu cativeiro. Ele esfrega o seu nariz na minha nuca, não se importando com os meus cabelos no meio do caminho. Ele larga uma de minhas mãos e agarra firmemente meus cabelos, puxando com força. Inclinando minha cabeça para o lado. Sua língua vai da base do meu pescoço até minha orelha onde ele chupa com força. Me mexo embaixo dele, querendo mais movimento do que isso. — Abra as pernas. — Pede suavemente. Eu faço o que ele pede, porque eu quero continuar a brincadeira, não porque ele exigiu. — Levante essa bunda para mim. Assim que faço, ele entra mais uma vez, mas agora, ele faz bem lentamente. Augusto xinga ao meu ouvido. Sentindo a mesma coisa que eu. Só que ele consegue ter reação em palavras, eu não consigo nem mesmo abrir minha boca. Augusto se levanta um pouco, mas não me soltando de seu domínio. Sua mão continua em meu cabelo e a outra vai para o meio de minhas costas apertando levemente. Assim, ele consegue ir até onde é possível. Seu entra e sai lento, constrói deliciosamente mais um orgasmo. Mas o que mais me incita a chegar lá, são os seus assovios e gemidos que ele solta sempre que entra em mim.

Agarro os lençóis da cama quando meu ventre começa a se contorcer dentro de mim. Minha cabeça está sendo puxada com força para trás. A dor que seus puxões causa, erradia por todo o meu corpo. — Juli. — Seu tom é de súplica, desespero e imenso prazer. Sua mão aperta o meu quadril dolorosamente. E então ele começa em um ritmo de total descontrole. — Porra. Me apoio em meus cotovelos tentando ter mais contato com ele. E Augusto percebe isso. Ele larga o meu cabelo e cai sobre mim. Sua boca volta para o meu pescoço, onde sua boca trabalha com fome e muita vontade de mim. Gemo quando ele suga minha pele. A sensação vai diretamente para o meu ventre e desce mais para minha boceta que mais uma vez recebe um grande trabalho. Consigo segurar a sua cabeça trazendo sua boca até a minha. Ele está com o meu gosto e nunca pensei que isso seria bom. Meu beijo faz com que ele perca o último resquício de controle. Então ele me come com força. Empurrando e acertando bem em cheio na parte deliciosa que meu corpo possui. Fazendo com que eu me perca em uma das melhores coisas da vida. Ω

Eu sei que dormi, pois eu tenho o meu cabelo por todo o meu rosto. Meu braço esquerdo está dormente, pois dormi em cima dele. E do jeito que eu não quero sair da cama, sei que dormi por mais de três horas. Porque é isso que acontece quando meu corpo se acostuma com tamanha liberdade de hibernar. Com cautela, tiro meu braço debaixo de mim e só então percebo que eu estou nua. Abro os olhos com tudo, mas minha cegueira não ajuda. Tudo está embaçado, mas eu consigo ver o corpo grande à minha frente. Vivo eu sei que está, já que sinto a sua respiração suave contra o meu rosto. Augusto parece sereno em seu sono. Suas feições relaxadas dizem que é tão amante de sono como eu. Ou possa ser apenas que ele esteja cansado do que fez hoje. E do que fizemos essa tarde. Ou foi noite? Nem sei, pela paz que reina aqui no quarto, eu não estranharia que seja mais do que dez da noite. E vou ter que pedir uma relevância. Claro que sim. Quanto tempo que o meu corpo não tem se esforçado tanto desse jeito? Esse, por incrível que pareça, é o único exercício que eu não reclame de fazer. E é compreensível que eu tenha apagado assim que terminamos. Eu não me lembro do que houve depois que meu corpo tremeu e caí na cama. Mas sei que houve algum tipo

de carinho em meus cabelos assim que eu caí exausta. E acho que foi a mesma coisa que aconteceu com ele. Sinal que foi bom para ele também, né? Mas ele provavelmente tem mais preparo físico do que eu. Grande, alto, porte de esportista mesmo. Sua pele branca em perfeito contraste contra a minha muito morena. Certeza que isso não é nem mesmo dez por cento do que ele pode fazer em uma cama. Se ele quiser tentar comigo, eu não vou impedir. Não mesmo. Mas a culpa e o desespero me aparecem. Logo agora? Sério mesmo? É, sério mesmo. Eu não posso voltar atrás e dizer não para ele. Se bem que se isso acontecesse, eu faria do mesmo jeito. Não consigo ser a certinha a todo momento. E o que foi aquilo de ficar jogando com ele? O que foi que aconteceu comigo? Desde quando eu sou essa menina ousada que está brincando com um cara que está a ponto de comê-la? Nunca fui assim. Talvez fosse e não havia percebido. Talvez, ele conseguiu tirar isso de mim. Porque a sua arrogância realmente me irrita de uma proporção louca. Uma necessidade insana de não me entregar logo de cara em seus braços. Juli, você deu pra ele na primeira oportunidade! Sim, eu fiz. Talvez fosse a única que teria, então, por

que não? Mas mesmo assim, eu era uma desconhecida se tratando da sedução. Nunca que faria e diria algo como aquilo. Ele conseguiu me irritar e me deixar louca da mesma forma. Jogando o meu jogo, de acordo com as minhas regras. Mas eu não iria ceder a ele do jeito que ele tanto desejava. Não me entreguei de forma completa como ele com certeza almejava. Mas ele fez. Ele fez mais do que me comer, eu vi, senti e apreciei tudo o que aconteceu. Estremeço quando me lembro de suas palavras e do jeito que ele me beijou. Augusto com certeza não é de esconder o seu jogo, ele coloca as cartas na mesa e faz o que tem que ser feito. Ele isso fez comigo. E mesmo ele com o jogo na mão, eu ganhei com um incrível cheque mate. Olhando para ele, me levanto e vou para o banheiro, enfim tomar um banho. Eu não acredito que estou da mesma forma que entrei no meu quarto. Não pensei que isso iria acontecer. Desejava, mas não tinha fé que meus mais obscuros desejos fossem ser realizados. Assim que tomo o meu banho, me enrolo na toalha e pego o meu celular. São oito da noite e meu irmão deixou quatro mensagens no WhatsApp querendo saber se estou viva. Respondo que sim, e peço a ele o seu plano de passar uns dias em casa. Vou aproveitar meu irmão, minha

cunhada e minha linda sobrinha que eu amo muito. — Estou com fome! — Augusto diz sentado na cama. — Quer sair para comer? Quase deixo o meu celular cair. Fui uma heroína agora. Nem sabia que tinha bons reflexos. — Já disse para não me assustar assim! Ele sorri um pouco envergonhado. — Desculpe, pensei que estava atenta. — Ele sai da cama completamente nu. — Vamos sair para comer? Eu sou um exemplo. Porque eu consigo firmar meu olhar no seu. E ele sabe disso, porque sorri e caminha até mim. Augusto segura meu rosto com as duas mãos e esfrega o seu nariz ao meu antes de me beijar. Lentamente, molhado e barulhento. Aqueles beijos adolescentes, os primeiros beijos de namoros, tímidos e tão excitantes que chega a ser doloroso. Sua língua prova toda minha boca, quase desfaleço contra o seu corpo. Augusto geme contra minha boca e intensifica mais. Ele morde meu lábio e o suga logo em seguida. Ele parece gostar de fazer isso. Assim que termina o beijo, ele beija minha testa. — E aí? — Ele parece divertido com minha falta de voz. — Vamos sair para comer? — Hã?

Ele ri mais forte. — Comer, Juli! Aquilo que fazemos desde que estamos na barriga de nossa mãe. — Ele me solta. — Ou você quer ficar aqui? — Comer é uma boa ideia! — Digo concordando com ele em uma resposta patética e com os olhos ainda fechados. — Com certeza é! E você pode abrir os olhos, Juli! É tá na hora de abrir os olhos. Certo! — Vou apenas tomar um banho e podemos sair. — Diz passando por mim. Eu respiro fundo quando a porta do banheiro do meu quarto se fecha. Que Deus me ajude com o que vai acontecer a partir de agora. Porque simplesmente não sei nada sobre pegar o gostoso do chefe. Mas agora eu preciso me arrumar para irmos comer alguma coisa. Ainda bem que eu coloquei uma legging na mochila. Pego a minha blusa cinza do XPTO, que comprei na loja online. Assim que estou arrumando o meu cabelo em uma trança, Augusto sai do banheiro já arrumado. Ele tem uma toalha esfregando em seu couro cabeludo. Ele é um modelo típico de shampoo masculino. Ele não esconde nenhum pouco que gosta de me pegar o observando. Bem, se eu tenho um óculos na cara, eu vou capturar todos os

detalhes possíveis que me é permitido. Ele estende a toalha na cadeira e pega a sua carteira com as chaves. — Você é linda com suas roupas de trabalho. — Diz me encarando intensamente. — Mas você sendo você mesma, com suas roupas de nerd. — Ele para à minha frente. Olhando minha blusa. — Consegue ser mais gostosa. — Ele puxa minha trança fazendo-me encará-lo. — Mais deliciosa. — Ele puxa os meus lábios em seus dentes. — Mais irresistível com as suas loucuras de nerd. Diz beijando minha boca aberta. — Vamos, estou com fome. — Diz me levando para porta. — Quanto mais cedo formos, mas cedo podemos voltar e podemos aproveitar essa cama um pouco mais. O restaurante em frente à cachoeira é bem agradável. Augusto está apaixonado pela vista e eu entendo seu fascínio. É a primeira vez que ele tem essa visão. Isso acontece com todos que vêm a primeira vez. Ele deixou que pedisse o jantar. Eu não costumo comer peixe que não tenha sido minha mãe a fazer, mas eu sei que esse restaurante é um dos melhores que o interior do Estado possui. Então eu vou dar a eles a chance de me dar um escabeche de piranha. — O que é escabeche? — Pergunta quando um senhor sai com os nossos pedidos.

Sorrio para ele. — É algo da nossa região. — Digo. — Com temperos, você cozinha o peixe já frito, com molhos, verduras, azeite. Deixando o peixe mais saboroso. Eu particularmente adoro ele com baião de dois e farinha. — Parece gostoso. — Ele não consegue esconder a confusão. — Mas eu nunca comi piranha, então acho que vai ser novo para mim. Sorrio para ele e como um pedaço de macaxeira frita. — Meu irmão está vindo na próxima semana, ele, dos três filhos, é quem herdou os genes de cozinheiro da família. — Empurro o prato para que ele prove. — Ele faz um pirarucu a casaca, que eu juro para você, é a coisa mais gostosa que você vai provar. — Vou poder jantar com vocês? — Ele parece surpreso. Aceno que sim enquanto limpo os meus dedos. — Claro, bobo. Você vai poder conhecer minha sobrinha linda. Eles vão chegar sexta pela tarde. Eu vou ficar com minha sobrinha no sábado e domingo, enquanto meu irmão e minha cunhada namoram um pouco. — Digo feliz com o plano que elaborei para meu irmão e sua mulher relaxar um pouco. — Eles não sabem disso, mas sei que eles precisam. Ter um bebê com certeza não dá a ele tempo para aproveitar alguma coisa.

Augusto ouve atentamente o que eu digo. — Você é próxima dos seus irmãos? — Pergunta curioso. Sorrio ao lembrar deles. — Muito. Éramos uns pentelhos insuportáveis quando crianças. A pouca diferença de idade é a melhor coisa que poderia acontecer. Aprontávamos tudo junto, pegávamos a culpa no lugar do outro, roubávamos iogurte da mochila de Cass na hora de ir para escola. — Sorrio apenas de lembrar. E a saudade bate em mim com tudo. — Tenho certeza que você foi uma menina muito difícil. — Com certeza. — Tremo com o pensamento que me atinge. — Joaquim vai te dizer cada coisa. Digo logo que eu era uma pentelha de dez anos que achava tudo divertido. Ele sorri de lado inclinando a cabeça, curioso. — Por que eu tenho a sensação de que você era a pior dos três? — Porque eu era! — Não tenho porque mentir. Eu era mesmo. — Mas como eu disse, achava tudo divertido. Tudo pra mim era algo que podia ser mais uma aventura. — Isso é desculpa para: Eu era a pior de todos e não sossegava até que alguém estivesse em muita confusão. — Algo como isso

Nosso jantar chega e eu vejo receio de sua parte. — Prove um pouco do meu. — Dou a ele um pouco no garfo. — Se você não quiser, podemos pedir outra coisa. Pensei que ele iria rejeitar, mas ele não faz. E o que ele apronta é impróprio para local público. Não é algo indecente aos olhos dos demais, mas pra mim é. Muito indecente. Augusto inclina a cabeça para a esquerda e lentamente abre a boca, sua língua passa pela carne do peixe tão indecentemente, que aperto minhas pernas juntas para não gozar apenas com isso. Ele fecha os dentes em uma boa parte do peixe, um pouco de caldo cai por seu queixo. Ele fecha os olhos quando sente o gosto. Eu continuo com o garfo erguido observando ele se deliciar com o peixe. Seu dedo indicador limpa a gota que ainda está em seu queixo, ele suga o seu dedo e logo em seguida geme como se estivesse gozando. Sei que seu gemido é assim, ouvi ele algumas horas atrás quando ele gozava dentro de mim. — Só não é mais gostoso do que você. — Diz pegando o garfo. — Mas eu vou ter você depois. Ótima escolha, Juli. Eu fico olhando para ele. Como se ele fosse louco ou apenas quer me deixar louca. Na verdade, eu descobri que

ele gosta de agir assim para me deixar sem graça. E ele sabe que consegue. Porque dizendo essas coisas pra mim, eu fico como uma adolescente que está envergonhada porque o menino mais bonito da turma sorriu para ela. E não deixa de ser um bom exemplo. Não há muito a se fazer depois das dez na cidade. Se fosse na temporada da festa do cupuaçu, com certeza não faltariam opções para aproveitar a noite. Mas eu estou bem cansada, preciso realmente dormir. Poderia fugir e voltar para casa, mas não vou fazer isso. Não quando Augusto está todo agarrado em mim, que chega a ser insano. Não sei o que há com ele, não se se foi pelo incrível sexo que tivemos, que o fez mais calmo. Assim como eu também. Não quero admitir, mas estava realmente precisando de um pouco de atividade. — Essa era a atividade física que você queria ensinar para mim? — Pergunto parando por um momento. Augusto, que continuou a andar, volta um passo para trás e envolve minha mão na sua. — Esse é a única atividade física que eu quero fazer com você. — Diz acariciando minha bochecha. — Você tem pique para isso, Juli. Seu corpo te dá forças para aprontar junto com o meu. E eu sabia disso. — Ele beija a pele abaixo de minha orelha. — Apenas não sabia que você iria acabar comigo logo na primeira vez.

Nossa! Ele não tem vergonha mesmo. — Você é sempre tão descarado assim? — Só quando eu quero deixar você com vergonha. Parece que é toda hora! Caminhamos até o carro. Augusto faz questão de abrir a porta para mim, espera estar colocando o cinto para se abaixar e colocar sua mão em minha coxa. — Se isso não fosse um estacionamento público. — Sua voz é baixa e rouca, assim como ele disse o meu nome antes de entrar em mim. — Eu colocaria você no banco de trás, tiraria sua roupa, e faria de você a minha sobremesa. — Augusto segura meu queixo e me beija delicadamente. — Mas vamos ter que fazer isso quando chegarmos na pousada. Suspiro frustrada quando ele fecha a porta e vem para o banco do motorista. Não falamos nada durante a volta para a pousada, acho que o tesão no local já diz por si. Estamos apenas segurando tudo para quando chegarmos lá, colocar tudo para fora. — Me espere no quarto. Fui tudo o que ele disse quando estacionou no carro. Em outra ocasião, eu ficaria puta por alguém me dar uma ordem assim, mas dadas as circunstâncias, isso não faz nada além de me excitar. Vou para o banheiro tomar um banho, porque eu não

consigo chegar em qualquer que seja o quarto e não cair embaixo do chuveiro. Tremenda loucura. Eu tomo um banho rápido, mas paro assim que penso que Augusto pode se juntar a mim no chuveiro. Ai meu pai, que ele pense o mesmo que eu. Só que está ficando frio então eu vou para o quarto me arrumar. Eu fico olhando para a porta, esperando que ele entre. Sacudo a cabeça percebendo o quão patética eu sou. Eu não posso ficar esperando por ele. Não me importando eu vou até o quarto dele. Bato na porta três vezes. Ele abre antes que eu bata a quarta vez. Augusto abre a porta e está segurando o celular contra a orelha. Ele dá uma boa olhada em mim. Seus olhos ganham um grande brilho de pura luxúria. Mas ele apenas balança a cabeça e fala com a outra pessoa na linha. — Estou indo, espera apenas algumas horas. Ele diz com raiva e muita frustração. — Eu tenho que ir. — Diz pegando a sua mochila. — Aconteceu algo que requer minha presença. — Certo, eu arrumo as coisas em apenas um minuto. — Digo voltando para o quarto. — Estou indo agora, preciso que feche a estadia e me consiga um apartamento na cidade ainda pra hoje. Com

uma sala de reunião se possível. Você é a melhor secretária no ramo, vai conseguir me arrumar isso rapidinho. Acho que um soco não doeria tanto. Respiro fundo e dou um passo para trás. — Mais alguma coisa? — Leonardo pode vir buscar você? Uma facada nem mesmo se compararia. — Eu posso me virar sozinha. Pode ir, eu arrumo tudo isso. Se tem uma coisa que eu posso fazer muito bem. Melhor do que todos esses gerentes mimados que tomo conta. É me virar sozinha. Saber arrumar as coisas sem precisar de ninguém. — Vejo você amanhã. Aceno que sim. Mas pensando: “Não, eu vou dar um jeito de me livrar de você antes mesmo que você venha com mais um ‘Bom dia, Julianne!’ ” Com uma raiva demoníaca eu volto para o meu quarto. Prevenida como todas as vezes, tenho o meu cartão comigo. Vou até a recepção e pago tudo, espero a senhora ver se está tudo certo com o quarto e faço o pagamento. Ligo para o táxi e volto para minha casa.

Claro, mando uma mensagem para o meu irmão com a placa do carro. Ele responde com uma interrogação e apenas digo que tem que dar isso para a polícia, caso eu não mande uma mensagem para ele dentro de três horas dizendo que eu estou viva. Assim que o carro já está na estrada, fecho os meus olhos sentindo algo que eu não sei explicar. Nem sei mesmo o que aconteceu. A sensação de ser usada vem com tudo. Mas não tenho quem culpar a não ser euzinha aqui. Deveria ter ficado em casa com os gostosos da série, apenas comendo eles com a imaginação. Não ter feito isso com o meu chefe idiota que depois de tudo o que fizemos, me faz lembrar que eu sou a sua babá. Eu não queria, mas eu choro como há tempos não fazia.

7 Eu estou pronta para começar a semana de uma maneira calma e única. Passei o dia de domingo pensando em muitas maneiras de matar uma certa pessoa. Mas sabia que não tinha essa decisão em minhas mãos. Augusto não me prometeu amor eterno e tudo mais. Ele foi direto dizendo que queria me comer, mas isso não justifica em nada a forma como ele me deixou. Mesmo sendo uma emergência familiar e o que quer que tenha sido. Se não quisesse que tudo se repetisse, jogasse a real

para mim. Eu não sou idiota quando se trata de sinceridade. Ao contrário, sou perdidamente apaixonada por pessoas sinceras e diretas. Elas fazem minha vida muito mais fácil e por isso possuem meu total amor. E eu pensei que Augusto teria isso pra mim. Eu senti sinceridade em suas palavras. Teria sido bem legal da parte dele me dizer que seria uma coisa de uma só noite. Mas ele tinha que ser um babaca e fazer me sentir inútil. Mas não é por isso que eu vou ficar com a cara emburrada, desejando a morte dele. Não, eu sou mais do que isso. Eu não vou ficar chorando como uma idiota por ter levado um fora. Acho que já sou grande o bastante para entender as coisas. Não vou mudar com ele por isso. Ele me conheceu de um jeito e desse jeito eu vou continuar. Eu recusei a carona de seu José hoje. Na verdade, vou chegar um pouco tarde hoje, vou até a concessionária, conseguir o meu carro de volta. Já tem um ano que ele está parado. E acho que está na hora dele sair de lá. O gerente foi bem legal me respondendo ontem e dizendo que eu poderia buscá-lo hoje mesmo. Eu não sei se estou pronta, mas devo tentar. Não posso mais ficar dependente dos outros. Mesmo que eu tenha milhões de boletos de táxi. Olho para o meu HB20 preto que nem parece que estava com a carroceria

acabada. — Aqui as chaves e os documentos, senhora. — O gerente me entrega uma pasta preta. — Qualquer coisa pode me chamar, posso não responder na hora, mas respondo quando puder. Dou a ele um sorriso. — Obrigada! Abro o carro e entro, ele ainda está equipado do mesmo jeito que eu entreguei a eles para arrumarem. Vale a pena o gordo seguro que pago para eles. Coloco minha bolsa no banco do passageiro. Ligo o carro e antes de tentar sair, sincronizo meu celular com o rádio. Ouvindo músicas aleatórias. Respiro fundo e seguro o volante com força. Tudo bem, Juli. Tudo bem, você vai conseguir. Você é forte e sabe fazer de tudo. Não é um carro que vai te derrubar. Coloco o cinto e dou ré, saindo da garagem. A sensação é como se fosse a primeira vez. E é uma segunda primeira vez. Depois do acidente, é a primeira vez que eu seguro um volante. E estou confiante que eu vou me sair muito bem. Sim, eu vou fazer isso. Pego a estrada do distrito e na velocidade permitida, vou até o trabalho. Meu coração está pulando dentro do meu peito. Ele

com certeza acha que é a primeira vez que isso acontece. Minhas mãos estão suando, mas estou firme. Se Leo estivesse ao meu lado, diria que estaria orgulhoso. Pensando nisso, assim que paro no sinal fechado, mando uma mensagem para ele me esperar na garagem. Espero que ele fique feliz com isso. Porque eu estou louca por isso. Afinal, ele se culpa por isso. E eu já briguei muito com ele por causa isso. Pensei muitas vezes que nunca conseguiria me sentar atrás de um volante de novo. Mas eu acho que a raiva e frustração do fim de semana me fizeram criar uma coragem que até então era desconhecida. Eu não sou manipulável e que sempre cai na lábia de todos. Na verdade, eu sou, mas acho que está na hora de mudar isso. E um dos medos já se foram. O portão de entrada não abre, um dos meninos vem até o meu carro. Assim que baixo o vidro, ele fica surpreso. — Eu sabia que conhecia esse carro. — Ele brinca. — Bom dia, dona Juliane. — Obrigada, David. A vaga ainda é minha, não é? Ele ri. — Nunca deixou de ser. — diz apertando o botão do controle preso em seu colete. — Até depois. — Obrigada! Eu entro na empresa e vou até a minha vaga. E assim

que puxo o freio de mão, meu amigo Leo aparece pela saída de emergência. Assim que me vê saindo do carro, seu mais verdadeiro sorriso preenche o seu rosto. Ele não perde tempo e vem até mim. Assim que chega perto, ele me abraça como um urso polar abraça os seus filhotes. — Eu nem posso acreditar! — Diz olhando para o carro. — Caramba, Juli, isso é, porra, ótimo. — Ele aperta os meus ombros. — Estou tão orgulhoso de você. — Eu estou orgulhosa de mim. — Digo pegando a minha bolsa. — Almoço hoje? Ele concorda. — Vou pegar algo para comermos, aviso quando chegar. — Diz e beija meus cabelos. — Você é a Sahyera Hol, mesmo. — Falta apenas um John pra mim. — Pisco para ele que ri e se vai. Paro no cartão de ponto e passo o meu crachá. Não é toda vez que eu faço isso, apenas quando eu chego um pouco mais tarde e fico um pouco mais tarde, para mostrar a gerente do RH que eu sempre venho. Ela que é uma vaca que sempre arruma alguma coisa para dizer que não faço as coisas de forma correta. Engraçado que, quando ela precisa de algo, sempre corre pra mim. Se ao menos ela tivesse vergonha na cara, teria a decência de parar com isso. Assim que entro na

sala da produção e engenharia, meus saltos anunciam minha chegada. Henrique sem mesmo me olhar, balança a cabeça em plena diversão. Ele me chama e vou até a sua mesa. — Bom dia, meu muso! Ele ri mais ainda. — Bom dia, Juli. — Ele pega alguns papeis na sua impressora. — Pode levar isso para Silvia? Eu tenho que terminar esses cálculos até o almoço. — O que você não me pede com esses lindos olhos que eu não faço com gosto? — Sair pra jantar comigo. Nossa! — Eu adoro massa. Eu pago o vinho. Henrique ri. — Combinado! — Quando estou dando a volta em sua mesa, ele me chama de volta. — Ei, Juli! — Oi. — Eu vou cobrar. — Pagarei com juros, prometo! Rindo eu vou para minha sala. Mas antes paro na copa e pego um iogurte grego para mim. Me empenho em terminar os documentos do

inventário do RH hoje, é o único setor que está faltando. Faço uma nota no meu computador sobre ligar para minha amiga que trabalha na Alfândega para saber se os documentos estão prontos. E como eu sabia, eles já estão. Sabia que minha amiga iria quebrar esse galho, mesmo que Augusto não merecesse. — Bom dia, menina! — Meu chefe aparece com um agradável sorriso. — Como foi o fim de semana? Eu o encaro como se pudesse ou não dizer a ele o que houve. Depois de muitos cenários imaginados, opto por mentir. — Bom, nada de tão importante. E o seu? Ela dá de ombros e coloca uma barra de chocolate na minha mesa. — Karina ficou estudando todo o fim de semana, minha única opção era ficar em casa e saber se ela estava viva, alimentada e se ainda continua humana. Passei no mercado ontem e peguei esse para você. Nem preciso dizer que é meu favorito. — Obrigada, com certeza faz o meu dia melhor. Seu Duarte sorri. — É chocolate! Guerras podem ser perdoadas por chocolate. Ele me deixa sozinha na sala e eu me ponho em trabalhar nas agendas. Quero que tudo fique certo essa

semana, para não ter que me preocupar quando meu irmão chegar aqui. Estou tão feliz com a visita dele. Preciso de alguém que me ame loucamente, nem que seja por dois dias. E nada melhor que o meu pirralho para fazer isso. Kátia está me cobrando o reembolso da viagem do mês passado. Se eu fosse uma sem coração, com certeza adiaria, mas eu sei que ela precisa do tratamento para os cabelos oxigenados dela. Então, envio um email para Silvia e Augusto, pedindo que autorizem isso até sexta feira. E para não ter mais problema, eu encaminho o mesmo para ela. Assim espero que ela não me perturbe mais por isso. Refaço treze relatórios que o gerente da produção me pediu. Ele tem sorte por eu estar livre, ou toda a sua programação iria falhar. Ele fez mal em ter dispensado a ajuda da assistente do Henrique que o ajudava. Agora está cobrando uma assistente para ele ao RH. Se fosse a Cristiane, mandava ele catar coquinho por sempre ser esse protótipo de trol. E como eu sou uma boa pessoa mais uma vez, faço isso porque não gosto de ver ninguém desesperado. Isso faz mal ao coração, e negar ajuda, não faz de mim a melhor pessoa do mundo. Então... Leo me manda uma mensagem dizendo que o nosso almoço chegou. Desligo o meu computador, pego o meu celular e vou até o almoxarifado.

Os meninos me recebem com palmas. Tenho certeza que Leo contou a eles minha pequena vitória. Não me surpreende que eles estejam felizes com isso. Todos eles estiveram ao nosso lado durante todo o processo de recuperação. Como eu sou a única que sou sozinha aqui, todos eles se revezavam em cuidar de mim. — Nossa menina voltou! — Leo me empurra para sentar em sua cadeira. — Agora vou poder usar a gasolina dela. Mostro língua para ele e começamos a comer. A carne de sol que ele pediu está uma delícia. Seria mais delicioso se tivesse um vinho para ajudar a descer, mas infelizmente, não podemos. E ainda é segunda feira. — Eu estou indo mesmo na quinta. — Leo diz com a boca cheia. — Kátia não conseguiu adiar o treinamento, então não vou poder ver Joaquim e nem minha sobrinha linda. Isso me deixa triste, de verdade. Leo é tão amigo meu como de meu irmão. Ele é meu melhor amigo, e é claro que conhece e adora toda minha família. Sempre que meu irmão está na cidade, fazemos um passeio pela orla, aproveitando o máximo que podemos. E esse ano, Leo vai perder. — Eu guardo o especial do chefe para você. — Claro que vai guardar, eu estou contando com isso. Mas diz aí? Agora que está motorizada de novo, rola

carona para o aeroporto? — Puff! Claro, bobo. Só me diz que horas tem que estar lá, que eu levo você. Comemos na maior alegria. Eu gosto dos meninos. Acho que deveria ter nascido homem. A menina pirralha em mim, se dá bem com eles. E além do que, sempre estou no mesmo nível de loucura. Leo me dá a única sobremesa que veio, o mousse de morango. Os meninos nem reclamam sobre isso. Essa é uma das coisas legais de ser a única garota no meio de tanto macho. Depois de fazer a digestão. Infelizmente, eu tenho que voltar para a minha sala. E nem é surpreendente que tenha duas pilhas de documentos para organizar. É um crime enorme contra a natureza essa quantidade de papel. Eu fiz minha parte e consegui uma empresa que recicla papel e nos manda de volta. Mas esse pessoal insiste em estragar coisas. Separo tudo para rascunho e os que vão para a reciclagem. Deixo isso de lado quando o inventário do financeiro chega em meu email. Rapidamente dou a minha assinatura e vou pegar dos demais gerentes. E é nesse momento que eu percebo que terei o encontro que estava adiando. Assim que Augusto me vê parada em sua porta, ele pede que eu entre. Ele me encara como se eu fosse a qualquer momento sacar uma arma e atirar em sua cabeça. Mas dou a ele um sorriso de simpatia. Como minha irmã

diria: Quero paz! Como ele está ocupado demais para falar, deixo os documentos juntos com os de entrada e volto para a minha sala. Vejo se está tudo certo para a viagem do meu amigo. Leo é inteligente, mas ele não é a pessoa mais esperta que eu conheço. Assim que pego o horário de seu voo e mando tudo para o email dele, estou pronta para começar a agenda do mês que vem e programar a auditoria interna que terá daqui a duas semanas. — Aqui estão os documentos. — Eu sabia que ele estava chegando. Por isso eu não me assustei. — Obrigado por conseguir isso tão rapidamente. — Sem problema, chefe! — Giro minha cadeira e sorrio para ele. — Sou a melhor do ramo, por isso trabalho para vocês. Eu não queria dizer isso, mas saiu. Minha língua não sabe a hora de conter o veneno. Ele recebeu isso e não retrucou. — Fez boa viagem de volta? — Pergunto. — Estava cansado, teria pedido um táxi para o senhor, mas saiu antes mesmo que eu lhe oferecesse. Sinto a tensão que irradia de seu corpo tomar conta da sala. — Voltar dirigindo foi bom, assim consegui me

concentrar melhor nas coisas. Concordo com ele. Já que ele também não quer falar do assunto. Podemos fingir que nada aconteceu. Ao menos eu consegui extravasar um pouco de feromônio que estava acumulado dentro de mim. — Mais alguma coisa, senhor? — Juliane, acho que depois de sábado, o senhor não é mais necessário. — Eu não entendo! Acho que... — Jules, porque tem um carro igual ao seu na sua vaga? — Meu chefe aparece de supetão na sala. Olho para ele confusa. — Talvez porque ele seja meu? Minha resposta simplesmente fez ele abrir a boca umas quatros vezes seguidas. Seu Duarte esfrega a nuca confuso. — Como seu carro veio parar aqui? — Seu Duarte, a desligada da empresa sou eu, não o senhor. Não tente roubar o meu lugar. Eu vim dirigindo, é óbvio! Ele parece mais confuso com minha resposta. — Mas você não dirige tem mais de um ano. Dou de ombros.

— Estava na hora de voltar. Nem sempre vou ter carona para casa. E depois do que aconteceu, não quero correr o risco de ter que esperar um táxi em uma rua deserta. Os dois homens parecem surpresos com isso. — Estava na hora de deixar o medo para trás. Sou uma menina responsável, não posso deixar que as consequências de um idiota bêbado atrapalhem minha vida. Estou bem, Leo está bem também, então estou com o meu carro de volta. Meu chefe dá um enorme sorriso. — Estou tão orgulhoso de você, Jules. Fico mesmo feliz que tenha superado isso. — Obrigada, e já que está aqui. Posso pedir algo? Meu chefe ri e acena que sim. — Meu irmão está chegando na sexta, estou pensando em sair mais cedo, se estiver tudo bem, é claro. E eu vou dar uma carona para Leo, antes disso, ou seja, vou ficar por aqui até o meio dia. Seu Duarte balança a cabeça. — Claro, menina. Estarei fora depois do almoço, e os outros podem recorrer aos subordinados. A não ser que Augusto precise de você. Não queria que ele dissesse isso. Não queria mesmo.

— Na verdade, eu vou precisar de você até as três da tarde, presumo que Leonardo precise de outra carona para o aeroporto. Respira, Juliane. Respira! — Claro, tudo bem. Vou falar com Leo e vejo se ele pode ir mais cedo para o aeroporto. — Sorrio para os dois. — Precisam de alguma coisa agora? — Não, queria apenas saber sobre o seu carro. Mais uma vez, Jules, estou orgulhoso de você. Isso me anima com tanta força, que eu sorrio de verdade para ele. Depois que tivemos a nossa conversa, seu Duarte voltou a ser aquele chefe que eu poderia contar. Ele sempre foi uma boa pessoa. Sempre companheiro, amigo, conselheiro e um segundo pai pra mim. Mesmo que ele tivesse se afastado, não deixou de estar ao meu lado. E depois do que houve, acho que voltamos a ser como antes. Sei que ele diz a verdade, pois quando tudo aconteceu, ele foi um dos que me incentivou a pegar em um volante novamente. E sua surpresa também é compreensível, já que de uma hora para outra resolvo pegar meu carro e voltar a dirigir como se não fosse grande coisa. E vendo agora, não é mesmo. — Obrigada, chefe! Olho para Augusto que está me encarando na mesma

proporção. Só que ele está sério demais, e eu não quero começar a semana assim. — Precisa de alguma coisa? Ele acena que não e vai embora. Melhor assim, vamos levar as coisas da maneira mais fácil. Finja que nada aconteceu que eu faço o mesmo. Minhas emoções são como espelhos. Refletem os seus. Seja raiva, indiferença ou alegria. Minha alma depende da sua. — Pensei que você fosse mais madura do que isso! — Augusto entra na minha sala e fecha a porta. Certo, agora quem não entende nada sou eu. Normal, Juli! — Como? — Por que não respondeu minhas mensagens e não me atendeu? Certo, agora estamos falando disso. — Bem, depois que cheguei em casa, eu apenas dormi, como sempre faço nos fins de semana. Então eu não peguei meu celular até hoje de manhã e apaguei todas as mensagens. Até as de minha mãe. Então me desculpe. Augusto me em encara como se tivesse duas cabeças. — Tem ideia de como eu fiquei preocupado? Só sosseguei quando liguei para o seu prédio e me disseram que você havia chegado.

Ele não está colocando a culpa em mim! — Se você tivesse feito o que eu havia pedido, não teria gasto a sua preciosa preocupação. E eu disse a você, eu sei me virar. Não era porque você me deixou sozinha a mais de cem quilômetros longe de casa que eu iria me desesperar. Agradeço a sua preocupação, mas também a recuso. — Arrumo os papéis a minha frente. — Mais alguma coisa? Augusto respira fundo e parece querer se controlar. Fico apenas o encarando. O máximo que ele pode fazer é se virar e ir para a sua sala com o que restou de sua dignidade. — Ainda não terminamos. Seus olhos claros se estreitam para mim e eu não me retraio com isso. Se tem alguém que tem o direito de estar com raiva aqui. Sou eu. E eu nem estou. — Está tudo bem, não tem porque ficar preocupado. Deu tudo certo. Estamos bem e o que precisamos fazer agora é trabalhar. Augusto sai da minha sala nenhum pouco feliz com isso. E eu volto a trabalhar. Estou pronta para encerrar o dia. Mas as duas bruxas não pensam assim. Elas estão fofocando na sala de reuniões. Eu tenho que fechar a sala, sou a única que pode

ficar com a chave. Então, tenho que esperar. Olho para o meu iPhone e vejo o nome do meu irmão. Quiqui: Eu ainda tenho alguma roupa em sua casa? Eu: Tem duas blusas e uma cueca nojenta. Por que? Quiqui: Não quero levar muita coisa, Ly vai ter muito o que levar. Separa uma gaveta da cômoda só para as roupas de sua sobrinha. Eu: Por ela eu faço qualquer coisa. Por você, fique feliz que não tem que ficar em um hotel. Quiqui: Também te amo, irmã. Eu: Me manda uma lista do que eu tenho que comprar, vou no mercado hoje. Ele manda uma porrada de coisas. Adeus cartão de crédito. Mas assim é bom. Quando meu irmão está aqui, eu como saudavelmente, já que compro muitas coisas que vai agradá-lo. Eu não posso ir contra o obstetra da família. Ele foi o único que seguiu os passos do papai. Eu e Casse não temos estômago para isso. E chegou a época do ano em que a minha geladeira é fitness. Meu irmão vai ficar orgulhoso de mim. Kátia aparece na minha sala com a sua cara de sonsa. — Terminamos, Juliane. Desculpe ter feito você esperar. Vou fingir que eu acredito.

— Tudo bem! Só peço que me avisem antes, ok? Eu tenho coisas para fazer e se seu Duarte descobrir que deixei vocês usarem a sala sem ter reservado, ele não vai ficar feliz. E não vai ser a mim que ele vai reprender. Ela faz uma cara de desgosto. Nem precisa, ela já é desgostosa de nascença. — Eu vou pedir para ter uma cópia. Assim você não precisa ficar. — Tudo bem. Eu vou indo, tenha uma boa noite. Ela nem se dá ao trabalho de responder. Sinceramente, eu não sei como ela chegou até aqui. É como dizem, quanto mais se estuda, mas ignorante fica. E essa aí é um bom exemplo disso. Normal da vida. Deixo os documentos na mesa de Henrique e desligo a cafeteira que deixaram ligada próximo ao bebedouro. Há apenas cinco carros no estacionamento, e um deles é a BMW de Augusto. Passei por sua sala e não o vi. Deve estar preso em algum outro lugar. Acho muito bem feito isso. Chego no meu carro e há um papel preso nele. Olho ao redor e não encontro ninguém. “Você já reparou nos olhos dela? São assim de cigana oblíqua e dissimulada. Pois apesar deles, poderia passar, se não fosse a vaidade e a adulação. Oh! A adulação! Isto é, uma criatura mui particular, mais mulher do que eu era homem. ”

Dom Casmurro. Eu olho para os lados e não vejo ninguém. O ser humano gosta de complicar as coisas, é só uma brisa, quem sabe ela bagunce teu cabelo, quem sabe te acaricie o rosto, quem sabe, quem sabe… Quem nesse século conhece as melhores citações de Dom Casmurro? Olho mais uma vez para o papel em minha mão. Uma letra desenhada e encantadora. Coloco o papel protegido dentro de minha bolsa. Ligo o carro e vou para o supermercado. Preciso deixar as coisas prontas para meu irmão e a família dele. Saber que eles estão vindo me deixa muito feliz. E sei que, quando estiver deixando-os no aeroporto, a vontade de ir com eles virá com força. Assim como será quando estiver voltando das minhas férias da casa dos meus pais. Eu nunca consigo me despedir sem choro dolorido e com saudade. E o pior é não poder olhar para trás e ver que as duas pessoas que eu mais amo no mundo estão me amparando com seus olhares amorosos e protetores. E a ideia de ficar perto da minha família grita cada vez mais alta. Estaciono meu carro bem próximo à saída do

supermercado. Pego minha bolsa e vou fazer as compras para os próximos dois meses. Uma das minhas músicas favoritas está tocando. Começo a pegar as coisas que meu irmãozinho pediu, das marcas que eu sei que ele gosta. Só que em um certo momento, me vem a citação em minha mente. Quem é o louco que poderia ter feito isso? Me recuso a pensar que tenha sido Augusto. Não depois de tudo. Apesar de que ele é o único que poderia entender com perfeição a magnitude da obra prima de Machado de Assis. Ele é o único provável que sabe quem é Jorge Amado. Colocando isso de lado pego as últimas coisas que faltam. As verduras. Meu irmão deveria ter nascido um coelho. Oh criatura que gosta de folha. Pego os brócolis que minha bebê chama de arvorezinha. Ela come essa coisa com vontade. Isso só me faz ter vergonha dos meus hábitos alimentares. Uma bebê de três anos, que ainda usa fralda, dá um show em mim em questão de alimentos. — A única verdura que me desce é batata e olhe lá. Se for frita melhor ainda. — Digo colocando as últimas coisas que faltam, dentro do carrinho.

— Eu posso comprar umas para você. — Pelo Odin, Loki e Thor! — Praticamente grito quando o ser aparece ao meu lado. A sacola cai dentro do carrinho, mas ainda faz uma bagunça. — Por favor, não faça mais isso. Eu não tenho um coração forte. Augusto se abaixa e arruma as coisas na sacola. — Desculpe, eu apenas pensei que poderia comer alguma coisa comigo. — Não, eu tenho coisas para fazer. E se me lembro bem, já tive uma refeição sua. Viro o carrinho e vou para o caixa. Augusto me alcança, é claro. Ele quer uma resposta que agrade a ele. — Eu tenho certeza que mereço isso, mas acho que mereço uma chance para explicar, não é? — Não. Porque não tem nada para ser explicado. Mas eu digo que sim, eu sou mais mulher do que você é homem. — Eu paro para encará-lo. — Não te culpo, mas me culpo por ter esperado mais. Eu caí no seu jogo. Mas esperava sinceridade, não me importaria se fosse apenas uma vez. — Suspiro, então olho bem direto em seus olhos. — Se tem uma coisa que eu aprecio em minha vida, Augusto, é a sinceridade. Ela dói, mas te faz ver melhor o mundo. Você nunca vai me ver sendo falsa com as pessoas que me querem mal, porque essa é a minha arma. E mesmo ela falhando às vezes, ela sempre vai estar comigo.

8 Augusto Belmonte Eu não posso argumentar contra isso. Não posso sequer justificar o que fiz com ela naquele dia. Nada no mundo fará com que ela entenda o que houve. Mesmo sendo a verdade. E como sempre, a pequena menina nerd e estranha tem algo para me ensinar. Ela jogou a verdade para mim. E doeu. Doeu porque eu sabia que era a verdade, mas busquei o caminho mais

fácil para mim. Juli não se importa de ser magoada com a sinceridade. Ela é movida por ela e eu deveria ter dito a verdade. E perder a chance de ficar com ela apenas uma única vez? Você sabe que não conseguiria. Ótimo, estou falando como ela. Sorrio com o pensamento de que ela de alguma forma já está se infiltrando em minha vida. Mas ela está mais do que infiltrada. Ela ficou e tomou um lugar sem nem mesmo querer. E depois de sábado, eu não sei se vou conseguir me livrar dela. E acho que eu não quero. Em todos esses anos em que tive casos duradouros e até mesmo de alguns dias, eu não me senti tão bem como me senti na noite de sábado. Eu não sou um amante atencioso e nem mesmo carinhoso. Sempre fui direto quando eu preciso de algum tipo de distração nessa situação, engraçado que eu poderia ter dito isso à linda morena, mas fui covarde. E agora vendo ela ir embora chateada comigo e sem que eu possa fazer nada, faz com que o meu peito sinta algo estranho. — Juliane! — Chamo alto o suficiente para que ela ouça. Ela não apressa o passo, ao contrário, acho que sabia que estaria indo até ela. — Você pode ao menos tentar me escutar?

Ela para ao chegar no caixa esperando uma mulher terminar de arrumar as sacolas em seu carrinho. Ela começa a arrumar as coisas na esteira. — Pode dizer, tem no mínimo dez minutos. — Diz empurrando seus óculos. Esse é o tic mais lindo que eu já vi. Sei que ela faz isso quando está nervosa, ou chateada. Prefiro muito que nessa ocasião seja a primeira opção. — Tive que resolver um problema, por favor, não quero que pense que fiz de caso pensado, não era isso o que eu queria. — Ajudo ela a colocar as coisas na esteira. — Eu fui um idiota em ter deixado você para trás, Juli. Ela para quando pega os brócolis junto comigo. Nossos dedos quase entrelaçados. Uso meu polegar para acariciar a sua mão e tremo de prazer ao perceber que ela suspira audivelmente. — Eu posso concordar com isso. — Ela puxa a verdura de minha mão e dá para a moça do caixa. — Eu entendo, Augusto, e sei que está falando a verdade. Mas não muda o fato que você fez me sentir largada e usada. — Nossa, Juli! — Bem, desculpe por todo o drama, mas acho que isso seria mais fácil se tivesse sido sincero. — Ela balança a cabeça. — Vá para casa, Augusto. Esqueça isso, vamos voltar do zero e fingir que nada aconteceu, é o

melhor a ser feito por nós dois. Ela se vira e continua a esperar que suas compras sejam registradas. — Duzentos e três reais e setenta e sete centavos. — a moça do caixa diz chamando a nossa atenção. Não sei se ser sincero faria algo para mudar tudo isso. Pensando bem, não vejo nada mudando isso. Juliane não é uma garota que com um simples pedido de desculpa, vai sorrir e dizer que está tudo bem. Ela é teimosa demais para simplesmente esquecer as coisas assim, facilmente. E isso me encanta. Demais. — Minha ideia de você ser um Serial Killer está começando a ser verdade. — Ela diz seguindo para o seu carro comigo ao seu lado. — Não sou um assassino em série. — Digo pegando três sacolas de suas mãos. — Eu pensei a mesma coisa do Peter na primeira temporada. — Ela abre o porta malas e olha para dentro do carro. — Acabou dele ser o Alfa psicótico que queria matar todo mundo. — Como? Ela ri e pega as sacolas de minha mão. — Você não assiste série, não é? — Pergunta pegando as coisas de minha mão e colocando em seu carro. — Peter Hale era um cara em coma, mas ao que

parece, ele era um louco sádico que queria vingança. — E onde eu entro nisso? — Me diz você. — Ela fecha o porta malas. — Você tem essa cara de moço certinho, mas pode ser que esteja planejando minha morte e vai comer meus restos mortais. — Ela dá a volta no carro. — Nunca se sabe. Ela entra no carro. Paro em frente a sua janela. Coloco as mãos nos bolsos de minha calça, sem saber o que dizer a ela. Se é que existe algo a ser dito. Juli abaixa o vidro do carro e me encara. — O melhor que podemos fazer é deixar pra lá... Não podemos mudar as coisas. O que aconteceu não podemos fazer diferente. — Juli olha para o volante de seu carro. — Você queria? — É claro que eu queria, Juliane! — Eu também, mas isso não saiu como o planejado. Nos resta apenas seguir em frente. — Ela liga seu carro e fecha a janela. Ela não sai imediatamente, fica por segundos parada e eu faço o mesmo, quando vou bater na janela, ela pisa fundo e vai embora. Me deixando com um sentimento horrível de culpa. Esfrego meu rosto e vou para o meu carro. Com vontade de ir até o seu apartamento explicar tudo, mas não posso fazer isso quando eu não consigo explicar nem mesmo

para mim o que está acontecendo. Meu celular toca e vejo uma mensagem de quem eu não queria ouvir hoje. Pensando bem, não quero ouvir sobre isso, nunca mais. Mas o caso ainda está inacabado. Meu maior erro foi ter partido sem resolver tudo o que ficou lá atrás. Ω E estou pagando por isso. Já se passaram dois dias e continuou recebendo a mais bela e linda educação que Juliane tem. Ela continua sendo ela mesma, até comigo, mas eu sinto a distância que ela colocou entre nós dois. E o que mais me irrita, é o senhor que sempre pronuncia quando se refere a mim. Ela tentou levar isso de mim, dizendo que fala isso a todos os superiores a ela. Mas sei que faz isso para não ter que me explicar e falar comigo mais do que o necessário. Seria mais fácil aceitar o seu plano. Mas quem disse que é isso que eu quero? E o que me irrita ainda mais, é o jeito que ela sempre encanta os demais ao seu redor. E vendo isso, quase quebrei meu celular quando a vi saindo para almoçar com o supervisor da manutenção elétrica. Me recuso a pensar que ela é desse jeito. Sei que

ela é uma garota que é amiga e querida por todos. Ela não saiu para dar para ele. — Porcaria! — Bato com o mouse com tudo em cima da mesa apenas por ter imaginado os dois juntos. E eu não julgo o cara por tentar. Eu sei como é tê-la embaixo de mim. Sei como é beijar aqueles seus lábios pequenos, mas cheios e deliciosos. Sei como ela é quente por dentro. Sei como ela tem o seu próprio jogo de sedução que acabou comigo na primeira rodada. Eu sei que eu quero mais dela. Sei que eu nunca vou poder saciar essa sede que tenho pela pequena menina Nerd. E isso me lembrou uma coisa que posso usar para ela falar comigo. Pego dois documentos que ela me pediu para assinar e levo para ela. Tenho a sorte de encontrá-la sozinha protocolando as notas e reembolsos dos gerentes. Bato delicadamente na porta. Ela se vira e sorri para mim com aquele sorriso de menina que não fez nada demais, mas que se puder, vai aprontar. — Em que posso ajudar o senhor? Eu não gosto quando senhor sai de sua boca, mas a forma petulante em que ela pronuncia, me causa um frenesi insuportavelmente doloroso. — Tenho os documentos que você me pediu. — Coloco em sua mesa e me escoro na mesma. — Tenho algo que quero falar com você.

— Claro! — Coloca os arquivos anexados com os outros. Só então ela olha pra mim. Diretamente em meus olhos. Me precavi em saber que não há ninguém que possa nos ouvir. Estamos apenas nós dois aqui e mais três pessoas no RH que não tem motivo algum para aparecer. Então eu posso falar com ela abertamente. Isso, se eu tiver uma chance. — Você sabe que eu não usei nada no sábado. Juli continua com seu olhar calmo e imperturbável. — Sei, e antes que você queria entrar nesse papo nada agradável, vou aliviar a sua mente e dizer que eu não tenho nada, que eu tomo injeção todo mês e eu sei que você também não tem nada, já que eu recebi seus exames e enviei ao RH. — Ela guarda a pasta dentro de uma gaveta e pega a chave. — Mais alguma coisa, senhor Augusto? — Sim... Sem nem hesitar, agarro sua cabeça e moldo seus doces lábios aos meus tão desesperadamente que chega a latejar quando sinto o seu gosto. Juliane sem pensar agarra meus ombros me puxando mais para perto de seu corpo. Eu me arrasto para baixo ficando de joelhos entre as suas pernas. Minha Nerd morde meu lábio com força que me tira um gemido que pode chamar a atenção.

— Não! — Ela tenta me empurrar, mas falha quando minha boca cai contra sua garganta. — Uii! Juliane segura minha nuca arranhando levemente. Minha mão encontra a sua pele linda escondida por uma saia cor de vinho. Ela treme sob o meu toque. E seu arrepio me contagia. Minha pele está queimando com a necessidade enorme de tê-la mais uma vez. Nunca foi assim. Sempre precisei mais do que um simples beijo para me excitar. Subo minha mão mais um pouco e encontro a sua calcinha. — Não! — Ela diz mais uma vez. Mas isso é mais um pedido pra ter piedade do que para parar. Ela solta minha cabeça e agarra minhas mãos. — Não aqui, Augusto. Isso me afasta dela. Juliane encosta sua cabeça na cadeira com os olhos fechados, sua respiração rápida e sua aparência de quem está prestes a fazer algo que não deve. Eu não fico para trás. Se me levantar, mostrarei a ela que eu não sei me controlar. Que eu perco o controle apenas ao tocá-la. — Aonde então? — Pergunto sério. — Aonde, Juliane, me diga aonde que eu vou até você. Ela continua com os olhos fechados. Ela segura

fortemente os braços da cadeira. Se concentrando, tentando ficar mais calma. Eu me levanto e seguro a sua mão. Ela estremece novamente com o meu toque suave. — Juliane, por favor. — Peço suavemente. Minha voz baixa e tão suave que eu nem sei se ela ouviu. Mas acontece que nesse momento, eu preciso dar isso a ela. De alguma forma, eu sei qual tom usar, como agir, mas isso só acontece quando eu não sou um completo idiota. — Eu não sei, Augusto. — Ela abre seus lindos olhos castanhos. — Não sei se é uma boa ideia. — Vamos apenas conversar! Ela me dá um sorriso de deboche e ironia. — Nós dois sabemos que não é isso que queremos. Que não é só isso que vai acontecer. — Ela aperta a minha mão. — E esse é o problema: querer. Eu sei o que eu quero, mas eu não sei o que você quer, não sei como vai reagir, se vai fazer aquilo de novo. — Ela solta a minha mão. — Eu não sou feita assim, Augusto, eu não sou feita para apenas uma noite. Se era isso que você queria, conseguiu. Agora, por favor, deixa isso para lá. Ela tenta virar sua cadeira para frente do computador, mas eu não deixo. Ela suspira cansada de mim ou se controlando, eu não sei. — Não foi só uma noite, Juliane, saiba disso. — Seguro seu queixo e olho dentro dos seus olhos. — Me dê

uma chance de falar com você, por favor. Me deixe te explicar um pouco do que houve naquela noite. Se você não quiser mais falar sobre isso, eu juro a você que não falo mais. Vejo a indecisão neles e oro internamente para que ela ao menos me ouça. — Na minha casa hoje! Agora, por favor, me deixe trabalhar.

9 Vejo a BMW de Augusto estacionar atrás do meu carro. Eu não sei o porquê concordei com isso, mas eu não estava no meu estado normal. Ele estava me tocando, não era nada justo comigo. Mas ao menos vamos jogar limpo e acabar logo o que quer que seja tudo isso. Saio do carro e pego as compras que fiz essa manhã na melhor padaria do mundo. Meu irmão vai ficar orgulhoso de mim. Augusto não diz nada, apenas pega todas as sacolas e

me deixa apenas com duas. Ele sorri quando passo por ele e reviro os olhos. Arrogante estúpido. — Algumas mulheres agradeceriam por ter ajuda. — Diz ele atrás de mim. — Mas você não é algumas mulheres. — Completa. Não respondo. Pois não seria uma resposta agradável. — Obrigada pela ajuda. — Digo assim que entramos no elevador. — Mas não me lembro de ter pedido isso a você. Augusto balança a cabeça e ri com meu comentário. — Mas, muito obrigada. Ele inclina a cabeça sorrindo e acenando. Se eu não estivesse com tanta raiva e decepcionada com ele, com certeza sorriria e o beijaria, mas basta apenas lembrar do que ele fez que tudo isso passa. Em menos de um mês, Augusto já conhece mais meu apartamento do que meu pai e minha mãe. Mas ainda tenho a melhor parte pra mim. Minha Bat-Caverna é proibida para ele. Coloco as coisas em cima da mesa. — Pode deixar que eu guardo isso depois. — Digo me sentando no sofá. — Vamos lá, vamos conversar. Ele continua parado próximo a porta. Deslocado e até mesmo intimidado com o que está acontecendo. Mas o que eu posso fazer? Simplesmente nada. Estou apenas

dando a ele o que quer. — Augusto? Ele suspira e se aproxima de mim. Senta no meu Puff preto com os cotovelos apoiados em seus joelhos. Cruzo uma perna e fico o encarando. Augusto olha para mim, e o vejo engolir em seco e gemer baixo. Olho para ele confusa da sua reação. — Sua saia subiu quando cruzou sua perna. — Diz com os olhos cravados em minha coxa. Desço minha perna e quando estou puxando minha saia, sua mão agarra meu pulso fortemente, não chega a ser doloroso, mas é firme. Se não conhecesse esse seu olhar de luxúria, poderia ficar com medo, mas isso leva o resto de juízo que tenho. Augusto abre as minhas pernas e se coloca dentro dela. — A gente conversa depois. Ele não precisou me beijar. Eu faço isso por ele. Deito no sofá e trago o seu corpo para cima do meu. Sua boca domina e castiga a minha como se eu tivesse feito algo de errado. Ele agarra minha cintura puxando-me mais pra perto dele. Mordo seus lábios o punindo também. Ele rosna com dor e se afasta de mim. Há sangue em seus lábios. — Por que fez isso? — Seu aperto em minha cintura

machuca um pouco. — Porque você é um idiota. — Digo mesmo que esteja difícil respirar. Augusto fecha os olhos e sem pensar tira a sua camisa social. Seu abdome trincado e lindo é uma visão e tanto daqui de baixo. — A gente conversa depois. Eu o trago pra cima de mim mais uma vez. Nosso beijo é necessitado, divino e cheio de raiva e frustração. Estou chateada com ele por não me dizer a verdade. E a sua raiva comigo é por não ter entrado em seu jogo. Augusto aperta minha coxa com força. Suas unhas arranhando por onde passa. Sua boca está em minha garganta, onde ele puxa a pele com seus dentes. A sensação faz um tremor ir diretamente para onde mais se precisa de atenção. Levo minhas mãos até o cinto em sua calça e o desfaço. Raspo levemente minhas unhas por sua virilha e Augusto treme em cima de mim. Seu braço vem a minha volta e ele me coloca sentado em cima dele. Minha saia completamente enrolada em minha cintura, minha blusa de mangas totalmente amarrotada em meu tronco. Lentamente Augusto solta o fio da frente da minha blusa e desfaz o laço soltando o meu corpo do pano. Minha blusa cai aberta mostrando meu sutiã amarelo. Ele geme quando agarro o seu rosto e volto a beijá-lo. Só que com mais calma.

Ele acompanha o meu ritmo. Suas mãos subindo por minha costela, elevando o nível de excitação. Minha boca por vontade própria solta um gemido baixo, tirando dele um gemido muito excitante. Ela abaixa meu sutiã e sua boca faz o que quer com meu seio. Suas duas mãos vão para o meio de minhas costas quando começo a cair. Mas ele não para. Chupa, morde, lambe, se delicia comigo como se fosse a sua primeira e última refeição. Eu me esfrego contra ele. Fazendo um atrito frenético e desesperado para gozar. E ele nem mesmo me tocou mais do que o necessário. Isso é que dá ficar cinco anos sem dar, Juliane. Augusto me suspende um pouco, baixando a sua calça. Mordo meu lábio quando vejo seu pau pronto para entrar em mim. — Afasta a calcinha pro lado, Juli. — Pede ele com paciência e cheio de luxúria. Eu faço como ele pede, quando tenho o pano fora do seu caminho, Augusto me puxa para cima dele, me fazendo sentar e ser preenchida por ele. Augusto joga a cabeça para trás com os olhos fechados e a boca aberta, seus olhos tremem a cada deslize em volta dele. Quando ele está totalmente dentro de mim. Sua mão aperta minha cintura me mantendo parada. Eu quero me mexer, mas ele não deixa.

— Augusto! — Calma, Juli. — Sua voz é rouca e tensa. Caio contra o seu corpo. O meu quer movimentos e liberdade. As mãos de Augusto acariciam minhas costas, logo em seguida aperta minha bunda com força. Sinto-o pulsar dentro de mim. Com as mãos novamente em minha cintura, Augusto me move pra frente e pra trás em cima dele. — Assim, amor. — Ele me encara com a mais perfeita adoração. — Desse jeito, devagar. Faço o que ele pede. Suas mãos agarram as minhas enquanto eu danço em cima dele. Com meu balançar, meus cabelos se soltam caindo sobre mim. Augusto segura uma mexa suavemente. Ele está apenas apreciando tudo o que posso fazer em cima dele. Percebo que nem mesmo tiramos as roupas. Augusto inclina o quadril indo mais fundo em mim. Suas duas mãos vão até o meu pescoço puxando a sua boca pra minha. Então, ele começa e me comer. Rápido e sem dó. Seus quadris trabalhando com força, acertando um ponto incrível em mim. — Tão gostosa. — Ele geme contra a minha boca. — Sinto como se fosse a sua primeira vez, Juli.

Eu caio contra o seu ombro. Meus joelhos apoiados no sofá. Augusto me segura e começa a me bater com toda a força que ele tem. Agarro com força os seus ombros extravasando minha frustração. Augusto agarra minha garganta com uma mão, me obrigando a olhá-lo. — Se mexa mais rápido. E assim eu faço. Com toda força que meu corpo tem. Seu entra e sai certeiro em mim, ligando aquele botão que me faz gritar de prazer. Agarro mais seus ombros evitando gritar quando sinto que vou gozar. — Vamos lá, amor. — Augusto aperta meus seios com força me levando àquele lugar que eu realmente não quero sair. Seu pulsar dentro do meu corpo me leva ao limite e trago ele junto comigo. Ω — Não lembro de você ter trancado a porta. — Augusto diz contra o meu pescoço. Estamos os dois deitados no sofá. Ele está atrás de mim completamente nu. E eu não fico pra trás. Isso não era o que eu tinha em mente para essa noite. Mas eu não posso mudar as linhas da vida. E se é assim que as coisas têm que acontecer, vamos deixar. Mas eu sei o que isso pode trazer.

— Você está pensando demais. — Diz me puxando mais para seu corpo. Seus braços me apertando contra ele. Seu nariz esfregando contra a minha nuca mesmo com a tonelada de cabelo que há nela. Sua mão entrelaçada à minha, nossas pernas enroladas umas nas outras. Os dois saciados depois de três sessões de safadeza no meu sofá. — Eu deveria fechar a porta. — Digo brincando com o anel no seu dedo. — Preciso guardar as compras. — Preciso que você fique aqui comigo. — Diz e beija meu pescoço. Solto nossas mãos e me viro o encarando. Augusto afasta um pouco de mim para olhar em meus olhos. Seus olhos estão suaves, brilhantes e satisfeitos com o que aprontou aqui. Sua mão vem para o meu lábio acariciando levemente. Sinto um pouco de aspereza neles. — Estão inchados. — Seu polegar acaricia o lábio inferior. — Eu poderia pedir desculpas por isso, mas não farei. — Ele chega bem próximo de mim. — Eu gosto de beijar você. Sua boca suga meu lábio inferior me fazendo contorcer contra ele. Augusto beija mais do que bem. Ele é um deus na arte do beijo. Seus dentes beliscam levemente meu lábio e sua língua em seguida acaricia com o último toque de tortura. — Eu tenho que arrumar as coisas. — Digo contra

seus lábios. Ele me morde mais uma vez e se levanta. — Eu ajudo você. Diz colocando a sua cueca e indo até a minha porta para trancá-la. Eu vejo como ele vai até a cozinha como se fosse de casa. Rindo e perturbada, louca vou até o meu quarto pegar o meu roupão. Assim que chego à cozinha, ele tem tudo desembalado. E as sacolas estão dobradas em cima da pia. — Pode me dizer onde posso colocar as coisas? Digo a ele em que armário colocar e ele faz obedientemente. Como se fosse dono do local. — Você é bem relaxado. Ou está assim por causa do que fizemos? Ele fecha meu armário e se vira para me encarar. — Como assim? Dou de ombros. — Você é sempre tão sério, controlado, centrado. Que é difícil saber se você consegue sorrir ou não. Mas é claro, eu já vi seu sorriso algumas vezes, então sei que é capaz. Mas eu nunca... — Paro para pensar em minhas palavras. — Nunca esteve assim, solto, relaxado com tudo isso. Isso com certeza não faz parte do seu dia a dia, e

você se sai bem mesmo assim. — Isso é culpa sua. — Diz chegando junto a pequena mesa que tenho na cozinha. Ele se apoia nela, o que faz com que os músculos de seus braços tencionem. — Eu sempre sou centrado e controlado. — Augusto dá volta a mesa e para na minha frente. — Só que isso some quando estou com você. — Augusto brinca com o cordão do meu roupão. — Isso é culpa sua. — Ah claro. Eu tenho a tendência a deixar pessoas descontroladas e faço elas perderem parte da sua identidade sem nem mesmo piscar. Isso soa como um poder meu. Pena que o Stark ainda não me recrutou para Os Vingadores. Augusto joga a cabeça para trás e ri com vontade. — Juli, você é única. — Ele beija minha testa. — É o que minha mãe diz, mas já que fizemos coisas que não deveríamos, podemos conversar agora. Augusto olha para o lado nada feliz com a mudança de planos. E mesmo que eu tenha dado pra ele de novo, eu ainda quero resposta sinceras. — Seja sincero, por favor. Augusto respira fundo e me encara com total atenção. — Eu fui um idiota em ter falado com você daquele jeito. Entendo se você não me desculpar por isso, mas a ligação que eu tive enquanto você estava em seu quarto na

pousada, me fez lembrar o porquê de eu ter vindo para cá. O porquê de ter aceito esse cargo. E depois do que fizemos, eu só conseguia agir como estúpido. — Augusto cruza os braços. — Tentando colocar a culpa em você. — Você conseguiu. Ele faz uma careta. — Eu sei que magoei você. E peço perdão por isso, Juli. — Ele se aproxima de mim. — Eu queria afastar você de mim. Mas no momento em que eu entrei no carro lembrei de como foi estar com você. — Sua mão toca a minha bochecha acariciando levemente. — De como é estar com você. E eu não vou abrir mão disso. — Sua testa descansa na minha. — O que você veio fazer aqui, Augusto? Ele suspira. — Vim mostrar que eu posso seguir sozinho, sem a ajuda de ninguém. — Ele segura meu rosto com as duas mãos. — Mas eu não sei se consigo sem você agora, Juli. — Isso diz sobre uma pessoa que perdeu totalmente o seu foco e senso de direção. E que quer ajuda de alguém que não consegue encontrar o shopping mesmo com o GPS ativo. Seu plano é falho, amigo. Sinto muito por isso. Augusto ri e me empurra contra a pequena mesa. Ele me inclina para trás e beija minha boca com suavidade. — Nem todo plano é infalível, Juli. — Ele segura

minhas pernas e me coloca sentada na mesa. — E pra provar isso a você, eu vou te comer mais uma vez. — O que isso prova? — Pergunto baixo quando ele desfaz o meu roupão e baixa a sua cueca. — Nada de importante. Só quero uma desculpa pra te comer mais uma vez. — Certo. — Digo quando ele está entrando em mim. — Você me convenceu. Ω A pior parte da reunião é quando as duas gerentes botam para tagarelar, e eu tenho que tomar nota de tudo. Elas conseguem ser mais irritantes que duas hienas juntas. Sério! Mas ao menos eu posso apreciar Augusto do canto onde eu estou. Ele está gostoso. Muito gostoso mesmo! Sua blusa social azul está dando a ele um ar de menino importante, mas a gola de sua camisa enrolada em seu crachá e as mangas de sua blusa enroladas até a metade de seu braço, dizem que ele pode ser um cara de brincar também. E como ele sabe brincar. Meu Pai, o homem sabe muito bem usar o seu corpo para o prazer. O diabo deve usar homens assim para corromper

moças inocentes para ir ao inferno. — Os inventários estão prontos um mês e meio antes do prazo, isso é o bastante para não se preocupar com os pedidos de matérias para o próximo ano. Meu chefe corta mais uma vez Katia. Ela nunca aprende. — Agora eu preciso avisar vocês sobre a viagem que farei daqui a duas semanas para São Paulo. Não vou ficar mais do que cinco dias. — Diz firme e sei que ele está pronto para fechar a reunião. — E vou deixar Augusto aqui e Juliane vai assinar por procuração qualquer documento com urgência. Oi?! Levanto a minha cabeça com tanta força que todos os ossos possíveis estalaram com o movimento. Eu olho para o meu chefe e todos olham para mim. — Não há ninguém que eu confie para julgar decisões aqui, além de Juliane. E lembrando sobre o seu pedido, Katia. Não darei uma cópia da chave da minha sala de reunião para você. — Ele olha para ela que se remexe visivelmente em sua cadeira. — Assim como os outros gerentes, você terá que agendar um horário, os únicos que tem acesso livre a minha sala, sou eu e Augusto. E eu quando quero comer em paz, mas ninguém

precisa saber disso. — Sim, senhor, apenas pedi uma para mim para não ter que ficar dependente da Juliane. — Ela tenta soar meiga, mas é tão cínica que nem isso a oxigenada consegue. Meu chefe ri assim como Augusto. E para minha surpresa maior, o homem que tem minha atenção diz. — Todos aqui somos dependentes da Juliane. — Ele me olha. Meu corpo se aquece e eu luto contra o choque que está querendo dominar o meu corpo. Augusto sorri de canto dizendo tudo o que ele quer fazer comigo. — Querendo ou não. — Ele completa voltando a olhar todos na mesa. — Eu tenho que concordar com o garoto. E avisando que Juli está indo cedo hoje e eu estarei o resto do dia fora. Todos saem e eu fico recolhendo os papeis que ficaram para trás. Quando tenho todos recolhidos, ouço passos de alguém se aproximado. Quando Augusto aparece na porta, é a primeira vez que ele não me assusta. — Seu corpo está reconhecendo o meu. — Diz travesso. — Eu gosto disso. — Meu coração agradece pelos ataques cardíacos evitados. — Digo quando o observo se aproximar. —

Você está se expondo. Ele dá de ombros. — Você está indo embora daqui vinte minutos para deixar o seu amigo no aeroporto. — Ele segura minha mão na sua. — Vai ficar com ele até a hora de embarcar, enquanto eu vou estar aqui, analisando números e ouvindo reclamações da Kátia por não ter acesso a sala. — Você aguenta. — Dou um beijo rápido em seus lábios. — E pense que mais tarde você vai jantar comigo e com meu irmão. — E então eu vou poder comer você? — Não, meu irmão com certeza não vai gostar dessa sua ideia. — Digo passando por ele. — Agora eu vou indo porque meu irmão chega cedo e eu não quero minha boneca esperando do lado de fora do meu apartamento. — Paro na porta e olho para ele. Augusto é tão lindo. Ele me dá o seu sorriso envergonhado. — Eu senti a sua falta hoje de manhã. Augusto fecha os olhos e suspira. — Seu irmão pode me matar, mas eu não vou deixar você hoje, Juli. Com sua declaração eu vou para minha sala arrumar minhas coisas e ir ao aeroporto com meu amigo e nisso chega uma mensagem de Leo. Léo: Não sei se tenho tudo o que eu preciso.

Rindo eu respondo a ele que é apenas dois dias e o que precisar, ele se vira. O importante é ter o RG e o cartão com ele. O resto é o de menos. Desligo tudo e deixo a minha sala aberta, para caso alguém precise de algum material. Ruim de ter todos no meu armário, é que sempre tem gente vindo me pedir canetas, post-it e tanta coisa. E o bom disso é poder controlar essas pequenas coisas. Pego o carro e vou até o condomínio onde meu amigo mora. O sortudo conseguiu morar perto do trabalho. Ele não sabe o que é trânsito vindo para cá. Leonardo já está me esperando quando chego no portão de onde ele mora. Ele joga a sua pequena mala no banco de trás do carro. — Sério mesmo que não aprendeu nada todos esses anos? — Pergunto pegando a saída e ir ao aeroporto. — E a lista que eu ensinei a você? Leo sorri. — Esqueça isso e vamos logo, não quero que a Ly fique esperando você por muito tempo. Ω Fiquei com Leo no aeroporto até ele entrar na sala de embarque. Depois disso, eu corri para casa. Claro que não fiz isso. Dirigi no limite para chegar bem. Arrumei o quarto para meus três visitantes. E enquanto faço isso, tive

a ideia de arrumá-lo para fazer dele o refúgio da minha menina quando ela quiser ficar os feriados comigo. Meu irmão não precisa saber disso. Quiqui: Acabamos de chegar na rodoviária. Vou conseguir um táxi. Pulo quando vejo a sua mensagem. Meu irmão preferiu vir de ônibus a ter que dirigir. Mas minha preocupação era minha boneca. Não quero que ela se estresse por uma viagem de cinco horas. Mas ela é uma menina bem-comportada. Tenho certeza que eles fizeram uma boa viagem. Eu queria ir buscá-lo na rodoviária, mas minha cunhada me proibiu. Tomo um banho rápido e me visto para recebê-los. Já deixei avisado na portaria que estou esperando eles. Cara, eu não me contenho com tanta animação. Estou mandando uma mensagem para mamãe quando a campainha toca. Quase quebro o meu queixo quando tropeço e caio perto do meu sofá. Assim que abro a porta, tenho a visão perfeita da minha boneca vestida com sua linda macaquinha azul. — Ly! — Eu a pego e aperto em meus braços. Minha sobrinha segura os meus cabelos e ri gostosamente quando eu começo a beijar o seu rosto gordinho. Depois de atacála, eu a abraço e sinto o seu cheirinho de bebê que eu amo. — Titia sentiu tanto a sua falta. — Afasto o seu rosto

do meu e vejo que ela sorri pra mim. — Tia Juju! — Nicole beija o meu nariz. — Sim, é a tia Juju. — Digo quase chorando. — Qual é, Juli. — Meu irmão estraga o momento. — Você a viu tem cinco meses. — Faz muito tempo. — Eu aperto mais minha sobrinha e então a coloco no chão e me viro para o meu irmão. — Eu também senti a sua falta, Quiqui! Meu irmão mais novo revira os olhos e me puxa para um grande e apertado abraço. Como eu senti falta dele. Como eu sinto falta de todos eles. Seu abraço é o que desencadeia o sentimentalismo preso em mim. Quando percebe que estou chorando, meu irmão me abraça com mais força ainda. — Juli, Juli! — Ele me acalenta e beija os meus cabelos. — Como eu senti a sua falta, minha periquita. Ouvir o meu apelido de infância me faz rir. Eu me afasto dele. Joaquim é mais novo do que eu um ano, mas ele, dos três filhos, parece o mais velho. Seus cabelos castanhos, cortados de forma militar dá a ele um ar de cara perigoso e que não se deve mexer. Mas ele é apenas um cara que é mais da paz, amor e zoeira, do que de briga. — Eu achei que também fosse da família. — Minha cunhada Bianca diz atrás do meu irmão. Joaquim dá um

passo para trás e deixa que eu abrace a sua esposa. — Cunha! — Oi, princesa! — Digo isso apenas para irritá-la e ela sabe disso. Dou um passo para trás e a encaro. — Ui! Tá uma gata! Acho que vou te apresentar uns amigos meus. — Nem pense nisso. — Recebo uma repreensão do meu irmão. Deixo que eles entrem e vejo que minha sobrinha está sentada no sofá quietinha. Babo como uma tia muito idiotamente orgulhosa. — Ela é tão linda. — Digo ao lado do meu irmão. — Vocês criam ela tão bem. Quando eu, Joaquim e Cass fomos comportados desse jeito? Eu já estaria me suspendendo no rack. Nós três rimos ao mesmo tempo e Nicole nos encara curiosa. — Vou dar um banho nela enquanto vocês conversam. — Então, você comprou as coisas que eu te pedi? — Meu irmão pergunta me encarando. — Sou fitness essa semana por sua culpa. Ele me abraça mais uma vez. — Senti sua falta, periquita. Tanto! Eu também, e nem preciso dizer em voz alta. Digo através do meu abraço. Para nós, que estávamos sempre

juntos, ficarmos separados depois de adultos foi um enorme golpe. Joaquim é o mais próximo de mim em questão de distância. E mesmo que estejamos perto, sinto como se houvesse um Oceano nos separando. — Vamos fazer o jantar. — Digo arrastando ele para a cozinha. — Pensei que era o almoço, Juli. Dou a ele uma piscadela. — Então, meu maninho. Você vai fazer o nosso jantar, porque amanhã cedo, você e minha linda cunhada, que por sinal é sua esposa, estão indo aproveitar um dia em uma pousada. Meu irmão abre e fecha a boca duas vezes. — Juli! — Nem vem, sei que é difícil pra vocês aproveitarem alguma coisa com Ly ainda pequena. E eu sou mais do que responsável para ficar com minha sobrinha de três anos. — Aperto a sua mão. — Aproveite o dia com sua esposa. E enquanto vocês estão fazendo coisas, eu vou levar minha sobrinha ao shopping e estragá-la. E quando vocês voltarem à noite, vamos jantar fora. É uma boa ideia pra mim. — Eu não posso recusar isso. — Diz beijando minha testa e abrindo a geladeira. — Já que vamos jantar aqui, quero contar os planos que fiz com papai.

— Esqueci de te avisar. Estamos tendo um convidado hoje e não é o Leo. Ouço a tigela caindo no chão. Eu consegui chocar o meu irmão.

10 Nicole é a bebê mais comportada que eu já vi. Nem mesmo quando é algo que ela poderia conseguir apenas com o choro. Ela não faz birra. Sua mãe e pai dizem “não” e ela concorda com um aceno de cabeça. Mamãe com certeza se sentiria orgulhosa de Joaquim por isso. Ele é um ótimo pai e maravilhoso marido. Digo isso, pois vejo como ele ajuda a sua mulher a cuidar de sua filha. Ele trata Bianca como uma rainha e a pequena Nicole como o seu mais precioso tesouro.

E ele está me mimando também. Fez o meu peixe favorito assim como o meu suco e bolo. Eu não pedi nada, ele que disse que iria me mimar hoje pelo que eu aprontei para ele e sua esposa. — Nicole, porque não diz como sua tia está linda. — Bianca entra na sala com um lindo vestido rosa. Seus cabelos negros estão em uma trança muito elegante. De canto de olho, vejo como meu irmão se ilumina pelo simples fato dela ter entrada na sala. — Tia Juju. — Minha sobrinha vem até mim. Ela segura a minha mão e sorri lindamente. — Está linda, é uma princesa. — Você é a única princesa aqui, meu amor. — Eu a pego em meu colo. — E por ser essa linda princesa comportada, amanhã eu vou levar você para um lugar onde as tias estragam as sobrinhas e depois devolvem aos pais. Bianca faz uma careta, mas ela sabe que não pode me impedir. — Pode ir tomar banho vocês dois. — Bianca coloca sua filha sentada no sofá. Eu criei um perfil na Netflix só para ela. — Ly vai ficar aqui assistindo Peixonauta, não é, filha? — Sua filha concorda. Bianca olha para o Joaquim. — Amor, eu deixei a sua roupa na cama. Por favor, não a amarrote.

— Vinte e cinco anos e ainda não aprendeu a passar roupa? — Empurro meu irmão com meu ombro e ele faz a mesma coisa. — Você vive de comida de micro-ondas na maioria do tempo. Não tem porquê falar de mim. — Pelo menos eu sei passar minhas roupas. — E eu sei cozinhar! Meu irmão vai para o banheiro do corredor e eu para o do meu quarto. Pego o meu celular e vejo uma mensagem de Augusto. A.B: Estou levando um vinho. Estarei aí em uma hora. Não vejo a hora de te ver. Isso foi há quinze minutos. Sorte minha que lavei e escovei meu cabelo essa manhã. Tomo um banho demorado o suficiente para estar apresentável ao meu convidado. Depilo minhas pernas e passo hidratante para não irritar minha pele depois. Coloco uma calça vermelha e uma blusa branca que ganhei da minha irmã. Passando um batom nos lábios, vou para sala. Quase deixo o meu celular cair quando encontro Augusto sentado em frente ao meu irmão, conversando como se já se conhecessem. Assim que meu irmão me vê, o engraçadinho abre um sorriso de quem está aprontando. Augusto vira o rosto e me enxerga, logo se levanta sem tirar os olhos de mim. Sua boca desenha um sorriso

encantador. Deixa o meu irmão de lado e vem até mim. Augusto segura a minha mão e beija devagar, então, assustando a todos na sala, segura o meu rosto com uma mão e me beija. Aquele beijo que não esconde nada. Que diz para todos que estamos mais íntimos do que imaginam. Um beijo molhado e barulhento. Estou começando a gostar desse beijo. — Oi. — Ele coloca meu cabelo para trás. — Oi, eu não vi sua mensagem cedo. Perdi a hora. Augusto inclina a cabeça e sorri. — Eu entendo bem isso. Já sou intruso o bastante por estar aqui quando deveria ser apenas você. Aliás, sua sobrinha é linda. Olho por cima do ombro e vejo minha princesa olhando curiosa para o grande homem à minha frente. — Ela é sim e está curiosa. — Então eu vejo o meu irmão me encarando. — Bem, acho que conheceu meu irmão, Joaquim, e minha cunhada, Bianca. — Sim, nada esconde que vocês são irmãos. E Nicole, com todo o respeito, tem o encantamento da mãe. Augusto vai até a sacola preta e pega um embrulho. — Como não tenho sobrinhos, não sabia o que comprar para ela. Mas Juliane me disse uma vez, que sua

sobrinha gosta muito de pintar. — Augusto entrega o embrulho para Nicole. — Espero ter acertado. Eu disse? Minha princesa olha para os seus pais e recebendo o consentimento de ambos, ela começa a abrir o seu presente. — Me ajude, por favor! — Ela pede à pessoa que tem a sua total atenção. Augusto tem gosto de ajudá-la. Ambos tomam cuidado para não rasgar o papel. Os olhos da minha sobrinha se tornam estrelas quando ela vê um grande caderno de desenho junto com um estojo com vários lápis de cor. — Obrigada! — Diz toda animada. — Eu gostei muito. Augusto parece encantado com a educação da minha menina. — Por nada, estrelinha. — Diz e pega outra coisa na sacola. — Pelo que você me disse naquele dia o que seria nosso jantar, não sabia qual o certo para a ocasião. Ele me entrega o vinho. Olho para o meu irmão que quer rir, mas se controla. — Bem, não é o que eu pensei para acompanhar. — Ele bate nos ombros de Augusto. — Estava pensando mais para uma cerveja gelada.

Augusto concorda com ele. — Claro, o chefe é quem sabe das coisas da cozinha. — Augusto volta a sua atenção para mim. Ele sorri mais uma vez e acaricia meu rosto. — Foi tranquila a ida para o aeroporto? Aceno que sim. — Que bom. — Continua acariciando. — Seu irmão parece ser um cara legal. — Ele é, quando não está sendo irritante. Como agora. — Digo olhando para Joaquim que está com os braços cruzados me encarando da porta da cozinha. — Não sabia que você era um fofoqueiro, Joaquim. Meu irmão continua rindo. — Estou apenas de olho na minha irmã. — Ele aponta com o queixo para Augusto. — Se ele tem irmã, sabe o que eu quero dizer. Augusto concorda com isso. — Sei, mas eu sou o mais novo, não podia fazer nada sobre cuidar delas, quando as mesmas me compravam com jogos novos de vídeo game. Isso me tira uma risada. — Cass e eu batíamos nele. Nada mais do que isso. Augusto me encara chocado com minha confissão. Um barulho me faz olhar para o lado de fora da janela e

vejo a chuva caindo com força total. — Vamos jantar ao som da chuva caindo. — Joaquim se pronuncia e vai para a cozinha. — Penso em outras coisas que podemos fazer ao som da chuva. Sorrio envergonhada para ele. — Mas primeiro, vamos jantar com a sua família. — Diz segurando a minha mão na sua e vamos para a cozinha. A mesa está cheia com tudo o que há tempos eu não sei mais descrever o gosto. Amo as visitas do meu irmão. Ele fica comigo sempre que pode. E me mima a todo o momento, fazendo todas as minhas comidas favoritas. A fumaça e o cheiro que sai da panela que está no centro da mesa, é o suficiente para me dar água na boca. — Pirarucu, como minha irmã solicitou. — Joaquim nos autoriza a nos servir. Não espero nada, sou a primeira a comer. Não tenho nenhuma vergonha em gemer na primeira prova do peixe delicioso. — Você tem garantia no céu, apenas por esse jantar. — Digo a ele. Não consigo me concentrar em mais nada, apenas na comida à minha frente. Meu irmão começa a conversar com Augusto sobre futebol e essas coisas. Eu apenas foco

no peixe e na sobremesa que vem depois. — Juliane disse que você é médico. É especialista em algo? Meu irmão me encara curioso e debochado. — Engraçado, Juliane nunca comentou sobre você até hoje pela tarde. Minha vontade é de pular essa mesa e dar na cara do meu irmão. — Sou obstetra, o único que seguiu a carreira de nosso pai. E você, Augusto, de onde conheceu minha irmã? Suspiro frustrada com essa inquisição. — Trabalho na mesma empresa que Juliane. Na verdade, ela salva a minha vida toda a semana. — Sua mão encontra a minha sobre a mesa. — Eu tenho o prazer de conhecer mais dela a cada dia. Não é apenas apreço profissional, percebo isso a cada dia que se passa. Meu irmão me encara. E eu não consigo identificar o que seja. — Bem, faz tempo que eu não ouço que minha irmã está namorando alguém. — Joaquim toma um gole de sua cerveja. — E gosto de conhecer você antes que as coisas fiquem sérias. — Joaquim!

Augusto aperta minha mão e esfrega o seu polegar sobre a minha pele. Olho para ele que sorri tranquilo com a ousadia do meu irmão. — Estou apenas dizendo o que penso, Juliane. Você sabe disso. Sabe que depois da última vez, eu prometi que tomaria conta de você. — Você não está tomando conta de mim, está se intrometendo demais. Bianca limpa a garganta e encara seu marido de forma bem repreensiva. — Juliane é uma mulher independente e sabe o que fazer da vida, Joaquim. — Diz firme. — Acho lindo que você queira protegê-la, querido. Mostra que vai fazer o mesmo com nossa filha. Mas acho que com sua irmã, há limites que você não deve ultrapassar. — Eu sei como ela ficou depois do... — Joaquim! — Chuto a sua canela. Respiro fundo. — Eu te amo, muito. E amo que você está aqui comigo. Amo que você esteja conhecendo Augusto e vou te amar mais ainda, se me trouxer um pedaço da torta de floresta negra que você me fez. Meu irmão suspira. — Desculpe, Augusto. Eu só não quero que a história se repita. Só vou pedir a você que tome conta da minha irmãzinha.

— Claro, cara! Joaquim vai até a geladeira e traz a torta. Nicole está ao meu lado, terminando sua comida. Sorrio para ela que me devolve um lindo sorriso. — Amanhã vamos estourar o cartão do papai nas lojas. Esse é o meu castigo pra ele. Meu irmão geme e se senta em sua cadeira. Augusto se serve mais do peixe e não tem dó da cerveja. Mas ele não parece ficar bêbado. Ficamos conversando sobre qualquer bobagem que apareça. Augusto aproxima mais a minha cadeira da sua, puxando minha mão para descansar na sua coxa. Ele entrelaça os meus dedos e de vez em quando ele beija os meus cabelos. Isso não passa despercebido pela minha cunhada e nem por mim. Já que sempre sorrio quando ele faz isso. — Ela sempre fazia a mesma coisa do mesmo jeito. — Joaquim diz pegando mais uma cerveja e entrega ao Augusto. — Nossa irmã teve que trocar de quarto comigo. — Eu não consigo acreditar. — Pois é, amigo. Juli sempre dava um jeito de fazer as coisas. Mesmo com Cass em outro quarto, ela conseguiu cortar a franja da nossa irmã no meio da testa. — Joaquim se acaba de rir. — Cass ficou quatro meses usando uma presilha para esconder o corte francês que Juli deu a ela.

Augusto me encara espantado. — Por que fazia isso? Dou de ombros. — Eu era meio vingativa naquela época... — Meio? — Meu irmão pergunta, divertido. — Você rasgou com o canivete do papai a sola do meu sapato favorito porque eu não deixei você jogar bola comigo e os meninos. — Então, como eu estava dizendo: Não me dava bem com rejeição não naquela época. E como eles sempre estavam me proibindo de fazer as coisas que eu mais gostava, eu fazia o mesmo. Mas Cass foi mais malvada. — Digo olhando para longe. — Ela sabia que o dia que eu mais gostava na semana era as quintas quando ela ia me buscar na escola e íamos lanchar. — E o que aconteceu, querida? — Ela arrumou um namorado. Ela ia me buscar na escola e me deixava na esquina de casa, me vigiando até entrar. Me fez mentir para a mamãe cinco vezes, dizendo que ela estava indo para a biblioteca. Então eu comecei a cortar o seu cabelo. Augusto joga a cabeça para traz e ri. — Juli, você é única. — Mamãe diz a mesma coisa. — Eu e meu irmão dizemos juntos.

— Mas sempre que eu fazia isso, acabava doente, febre principalmente, e acabava tendo os dois pra mim de volta. Augusto me olha depois dessa informação. — Juliane tem febre emocional. — Meu irmão termina de tomar a sua cerveja. — Depois que papai descobriu isso, evitamos muito gritar com ela ou algo do tipo. — Meu irmão me dá um sorriso. — Eram noites em que estávamos sempre com ela. E essa bruxinha fazia o que queria com a gente. Augusto me puxa mais para perto dele. — E você me disse que era a filha esquecida. — Ele brinca empurrando os meus óculos. — Não o tempo todo. Seu telefone toca e ele pega em seu bolso. — Juju, quando você vai me dar um iPhone de presente? — Meu irmão pergunta. — Acho que mereço depois de tudo o que eu fiz por você hoje. — Não enche! Joaquim sorri e olha para a sua filha. — Ly, minha princesa. Pergunte a sua mãe que horas são. Minha sobrinha olha para minha cunhada com a cabeça inclinada.

— Hora de dormir, mamãe? — Ela pergunta já levantando os braços para ir ao colo. — Sim, meu amor. Eu fico olhando os três juntos. — Cara, eu adoraria ficar e conversar mais. Mas tenho planos para amanhã... — Meu irmão estende a mão para Augusto. — Volte no domingo. Ainda não sei o que vamos fazer, mas Juliane vai te avisar. — Obrigado pelo jantar. Bianca diz alguma coisa para sua filha e a coloca no chão. Nicole timidamente vem até Augusto e inclina a cabeça. — Boa noite! — Diz estendendo a sua pequena mãozinha. Augusto a pega em seus braços, colocando-a em pé em suas coxas. — Boa noite, estrelinha. — Deposita um beijo em sua testa e ganha um beijo na ponta do seu nariz. Rindo, minha sobrinha corre para os braços de seu pai. Ela agarra o pescoço do meu irmão e volta a observar ao redor. — Boa noite, Augusto! — Minha cunhada diz e sai com meu irmão e sua filha. Olho para a mesa e vejo a bagunça que tem. Serei uma ótima anfitriã e vou arrumar tudo agora para amanhã

poder aproveitar minha sobrinha. Mas eu tenho um ajudante que vai fazer tudo ser mais rápido. — Eu ajudo você com a louça! — Ele faz uma careta e me dá um beijo. — Quanto mais rápido terminarmos, mais rápido eu vou abraçar você na sua cama. E eu vou ter que dizer. Augusto é bom lavando a louça. Não digo sobre ele saber usar uma esponja de detergente. Mas como os seus músculos ficam quando ele faz o mínimo de esforço para esfregar o sabão no alumínio da panela. Eu posso apenas olhar embasbacada para ele enquanto faz o seu trabalho. — Não sabia que era bom com uma esponja. — Me encosto na pia enxugando o copo. — Pensei que fosse bom apenas com os números. Augusto fecha a torneira. Ele se vira para mim e tira o guardanapo de minhas mãos. — Eu tenho outros segredos também. — Ele dobra o pano e coloca em cima da pia. — O que vamos fazer agora? Ele se aproxima e descansa uma mão em meus ombros e a outra vai para o final de minhas costas, puxando o meu corpo para junto dele. Ele me olha por segundos infinitos antes de me beijar. Sua língua se enrosca na minha. Seus dentes beliscam meus lábios. Agarro os seus cabelos trazendo ele para

mais perto. Augusto me coloca sentada na pia. Ele abre as minhas pernas e se coloca no meio delas. Ele bate com certa força a sua mão no pequeno armário em cima de nós dois. — O que foi? — Pergunto ofegante. — Não aqui, onde alguém pode nos pegar! — Parece que ele faz um grande esforço em dizer isso. — Seu irmão se importaria se eu dormir aqui? Bufo com esse comentário idiota. — Meu irmão sabe que eu não sou mais virgem e que se der, eu vou deixar você me comer hoje. — Arrumo a sua blusa. — Vai por mim, ele não se importa nem um pouco. O presente que eu dei pra ele vai valer por um ano dele me aturando. E ele vai fazer o que temos em mente, o dia inteiro amanhã. Ele se inclina para trás para me encarar mais visivelmente. — Não quero pensar em meu irmão tendo essas coisas. — Eu o empurro para trás e desço da pia. Suspiro sabendo o que vai acontecer agora. — Promete que você não vai rir de mim. — Por que faria isso? — Me pergunta segurando minha mão na sua. — Você vai entrar no meu pequeno santuário. Provavelmente vai sair correndo quando ver a minha

obsessão. Augusto pensa por alguns instantes. — Você não perece gostar de sadomasoquismo nem coisa do tipo. Faço uma careta por isso. — Acho que não seria tão assustador assim. Seguro sua mão mais apertado e o levo para o meu quarto. Assim que abro a porta, dou um passo para o lado e deixo que ele entre. Agora eu sei como o Grey ficou quando mostrou o quarto vermelho da dor para a Anastácia. Augusto se volta para mim. — Eu teria inveja de você se tivesse treze anos de idade. — Diz batendo na cabeça do funko do Batman que está ao lado da tv. — Eu estou com inveja de você por ter tudo isso. Cara, Juli. Isso é um paraíso para qualquer pessoa que gostou por pelo menos dois meses de algum herói. Minha boca cai aberta com o seu comentário. — Minha irmã diz que é perda de tempo e de dinheiro. — Digo passando a mão pelo quadro do Capitão América que mandei desenhar. — Claro que não, Juli. Você gosta de qualquer coisa que envolva mundo de fantasia. É normal você querer colecionar coisas do tipo. — Ele pega uma miniatura de

um ranger vermelho. — Eu tinha um desses quando era pequeno. Dormia com ele na cama. Sorrio com isso. Alguém enfim não me olha com medo quando vê meu quarto. Eu sempre gostei de tudo que envolva heróis e tantas outras coisas. E amo sempre que lança algo novo. Sempre sou a primeira a comprar coisas. — Você é a filha que todo pai pediu a Deus! — Ele comenta se sentando na cama segurando o boneco nas mãos. Me sento ao seu lado observando-o brincar com o boneco. — Não do meu pai, ele queria que eu seguisse os passos dele, mas tenho certeza que ele já superou tudo isso. — Pego um boneco cogumelo do Mario Bros. — Agora ele me agradece todo ano quando o ajudo com a declaração de imposto. Augusto pega o boneco de minha mão e coloca no lugar assim como o outro que estava em suas mãos. Ele volta a se sentar ao meu lado, pega minha na sua e fica olhando para nossas mãos entrelaçadas. — Uma das coisas que eu adoro em você, Juliane, é que você é a mesma sempre. Em qualquer lugar, com qualquer pessoa, em qualquer circunstância. Você é fiel a si mesma e eu acho que em toda a minha vida, eu não conheci alguém como você. — Ele segura meu queixo e levanta o meu rosto para encará-lo. — Se tudo isso é

você, eu não irei te achar louca, um pouco obsessiva talvez, mas eu vou admirar você ter algo para amar tão grandemente. — Quando eu tinha quinze anos, eu disse pra mim mesma que iria ter todas as coisas que eu quisesse em meu quarto. — Olho ao redor e vejo tudo o que eu tenho. — Eu acho que consegui. Olho para ele. — Mas estão sempre inventando e lançando mais alguma coisa. Então acho que vou ter que mandar tudo para o outro quarto ou me mudar. Augusto ri e me beija. — Você vai dar um jeito, Juli. — Ele esfrega o seu nariz no meu. — Eu quero muito poder fazer muitas coisas com você hoje. — Sua mão agarra meus cabelos inclinando a minha cabeça para trás. — Mas eu vou respeitar a sua sobrinha que está no quarto ao lado. Acho que tenho uma cara de decepção, pois ele morde o seu lábio evitando rir. — Então se você não se importar, eu vou ficar apenas de cueca na sua cama, te abraçando enquanto esse barulho da chuva vai nos fazendo dormir nos braços um do outro. Ele começa a tirar as suas roupas. A primeira que vai é a sua blusa e sem nenhuma cerimônia, ele tira a sua calça jeans. — Você dorme assim? Faço que não e vou até o meu armário e pego a blusa

grande que eu comprei das relíquias da morte. Com os olhos de Augusto em mim, me dispo, um pouco de vergonha aparece, mas eu mando embora de repente. Quando tiro o meu sutiã, vejo que seus olhos se abrem mais, mostrando que está desejando fortemente o meu corpo. Quando cubro o meu corpo com a camisa. Ele inclina a cabeça para a cama. — Eu deito no meio. — Digo. — Como vamos fazer isso? Augusto sorri e coloca o edredom para o lado e se deita na minha cama. Ela parece minúscula embaixo do seu grande e musculoso corpo. — Vamos dar um jeito. — Ele me chama para a cama. Como esse indivíduo entrou na minha vida assim? Ele não tem nenhum pingo de decência. E nem se importou de pedir autorização. Rindo desse pensamento estúpido, vou até ele. Quando estou deitando ao seu lado, Augusto me surpreende ao me colocar em cima dele. Minhas pernas em cima das suas. Sua mão direita segura a minha, enquanto seu braço esquerdo está no meio de minhas costas. Com minha cabeça bem em cima de seu coração. Seus músculos são uma boa cama para o meu corpo. Eu poderia tirar minha blusa e sentir a pele dele na minha,

mas não é uma boa ideia com o meu irmão em casa. — O que seu irmão quis dizer com: depois de? Eu não pensei que ele iria lembrar disso. Juro, não pensei mesmo. Não sei se ele realmente ouviu a minha discussão com Joaquim, mas ele estava bem atento em tudo o que meu irmão me dizia. Eu sinceramente não quero falar sobre isso. Muito menos com ele. Não estamos juntos tempo o bastante para declararmos coisas assim, como se fôssemos amigos desde infância. — Juliane. Pressiono mais o meu rosto em seu peito. Sentindo o seu cheiro. Agora eu posso sentir um pouco mais do álcool que ele ingeriu. Fraco, mas eu sinto. — Joaquim foi o que ficou mais chateado com tudo depois do que houve. Por isso ele disse aquilo. Por favor, esqueça o que ele disse. — Peço apertando sua mão suavemente. — É passado. Ele puxa meu cabelo para olhá-lo. — Se ele me deu um aviso, não é passado para ele, Juli. Eu sou um bom ouvinte. Ele não vai mudar de ideia. Contar para ele vai me machucar. Mesmo tendo superado tudo aquilo. Mas não é fácil dizer tudo isso e não sentir um pouco da dor que um dia esteve em seu

coração. Vai me lembrar o quanto eu fui burra e estúpida de muitas maneiras. De como eu desperdicei meu tempo e vida com alguém que na primeira chance que teve de ter uma grande virada na vida, não pensou nem duas vezes em me descartar. E dizer isso para o cara que não é só o cara que está se relacionando comigo muito intimamente, mas como também é um dos meus chefes. Um que eu deveria estar ajudando a se estabelecer na cidade e não ajudando a tirar a roupa e descobrir outras formas de fazer sexo em cima de uma cama. Não sei se é uma boa. Mas e se eu contar? O que ele vai pensar? Ele está pedindo isso, porque está curioso ou porquê quer saber mais de mim? Eu acho que só vou ter essas respostas se contar a ele ou fazer as perguntas sem me importar se Augusto vai respondê-las ou não. Olhando para ele, vejo que me observa pacientemente, esperando que eu crie coragem e o responda. Respirando fundo, saio de cima de seu corpo e deito ao seu lado. Ele se vira para mim, aguardando a minha resposta. — Quando eu voltei para a cidade, morei por três meses em uma república no centro. Não conhecia ninguém, apenas a senhora da padaria onde tomava café da manhã todos os dias. As meninas que moravam comigo, um dia me chamaram para sair para um bar. Nunca gostei

de beber, mas resolvi ir para conhecer mais pessoas da faculdade. Foi lá onde tudo começou. — Não tinha apenas a nossa turma da faculdade, tinha também de outros cursos. Uma das meninas da minha turma estava namorando uma cara de Direito, acabou que todos estavam na mesma mesa. — Não posso deixar de sorrir quando me lembro daquele dia. — Não sei como, mas alguém descobriu que dois dias depois seria o meu aniversário. Então eles conseguiram algo para fazer de bolo e cantaram parabéns pra mim. Um pastel, eles colocaram uma vela em cima do pastel. Augusto me encara atentamente. Acariciando o meu cabelo enquanto continuo falando. — Tinha esse cara. Eu o vi umas duas vezes na portaria da faculdade. Ele estava do meu lado na mesa. Ele me perguntou quantos anos eu estava fazendo. Disse que era dezenove. Começamos a conversar sobre tudo o que você possa imaginar, enquanto o resto estava lá, gritando e bebendo. Nós dois estávamos isolados de todos em nosso próprio mundo. — Respiro fundo e continuo. — Ele me perguntou o que eu queria de presente, eu não sabia o que ele poderia me dar. Então ele improvisou e me beijou. Fecho os olhos e vejo a cena de longe em minha mente.

— Eu nunca chamei a atenção de caras como ele. Isso eu posso afirmar a você. Mas naquela noite, eu tinha alguém que estava olhando para mim. Eu sabia que era apenas o meu presente de aniversário. Só que eu não sabia que Eduardo estaria levando isso a sério na semana seguinte. Lembro-me da surpresa que tive quando ele estava me esperando na porta da minha sala. — Eu não me lembro se ele pediu para namorar, só lembro de estarmos juntos, com namoro assumido e tudo. Eduardo começou a me levar para sair com ele e a sua turma, mas às vezes era apenas nós dois. Depois de três meses, ele me apresentou à família dele. Quando percebi, no final do ano, ele estava comigo em um avião para passar o natal comigo e com minha família. Papai adorou ele de primeira. Joaquim conseguiu o irmão que sempre quis. Todos os planos que fazíamos, mamãe fazia questão de colocá-lo no meio. Como pode tudo isso ter sido uma mentira? — Eu adorava aquele garoto. Sempre que ele sorria para mim, era como o alvorecer de felicidade dentro do meu coração. Sempre fiz as coisas que ele gostava, cuidava dele, o ajudava nas aulas da faculdade. E ele fazia o mesmo por mim. Eduardo sempre se orgulhou de me ver resolvendo os mais difíceis cálculos que a turma de física propunha. Adorava assistir cada apresentação

minha de faculdade. Era um aluno aplicado no inglês, mesmo quando estava querendo me agarrar em vez de estudar. — Éramos bons juntos. Juli e Edu. Algumas pessoas diziam que éramos aquele tipo de casal que se conhece na faculdade e vai para a vida inteira. Eu comecei a pensar assim e queria que ele pensasse da mesma maneira. Augusto tira as mãos do meu cabelo. — Eu estava chegando no meu penúltimo período, quando tudo começou a acontecer. Eduardo já estava se formando e estava animado com isso. E eu estava muito feliz por ele. Quando perguntei a data que iriamos visitar meus pais, ele disse que não iria, pois estava procurando estágios. Eu entendi, juro a você que entendi. Até mesmo ajudei ele com a escolha de vários escritórios e tudo mais. Com meu coração doendo, eu fui passar as férias com meus pais. Fiquei com eles até quando tive que voltar. E eu via a mudança que aconteceu em apenas três semanas. Olho bem nos olhos de Augusto, querendo mostrar a ele tudo o que eu sinto. — Eduardo não era mais o mesmo. Ele quase nem falava comigo. Quando vinha até o meu novo apartamento que meus pais me deram, era como se fosse escondido. Como se estivesse querendo esconder que estava comigo. Eu aceitava a ideia de que era o seu último período, que

ele estava ficando cansado e estressado. E eu tentava a todo custo ajudá-lo. Até mesmo mimando-o quando ele ficava comigo pela noite. Eu o amava, muito. Queria vê-lo feliz mais do que tudo nessa vida. Augusto agarra a minha mão na sua suavemente. — Leonardo estudava na mesma faculdade. Ele fazia aula de planejamento comigo. Um dia ele me disse que viu Eduardo com uma loira no shopping. Disse a ele que poderia ser a irmã dele, já que ela vivia pintando o cabelo. Mas uma semana depois eu o vi com uma loira. E ele me viu também. E não escondeu que estava com ela. Veio até mim e disse: “Eu queria contar para você antes, mas eu não conseguia. Não queria machucá-la. É o que ela tem para me oferecer, Juli. Eu preciso de alguém que seja tão ambiciosa quanto eu, que me ajude a abrir os meus caminhos. E você não é essa pessoa”. Ele terminou comigo assim, no meio de um shopping lotado. — Não bastasse tudo isso, ele começou a desfilar com ela por todos os lados que ele ia comigo. E eu percebi que eu só ia com ele, que todos os locais que eu conhecia era graças a ele. Que provavelmente eu não tinha uma identidade que não envolvesse ele no meio de tudo. Eu me isolei, estudei, me formei, terminei meu curso de espanhol. E fui contratada assim que saí da faculdade. — Mas não foi fácil. Eu fiquei depressiva. Fui magoada pela pessoa por quem eu estava disposta a lutar

ao seu lado. Mas eu sou assim, Augusto. Eu me importo com as pessoas, eu amo as pessoas. Eu sempre faço de tudo para ajudar. Eduardo foi apenas alguém que não queria o meu amor, não me queria ao seu lado. Mas eu estou muito feliz por ele ter conseguido o que ele queria. Que ele está feliz agora. Augusto me puxa para perto dele. Sinto o seu coração bater contra a minha mão que está bem em cima do seu peito. — Ele não está tão feliz assim. Ele perdeu você e vai viver com isso para o resto da vida dele. Estando bem ou não. Ele me puxa para cima dele mais uma vez. Coloca a mão por dentro da camisa e começa a acariciar minhas costas até que eu comece a sentir sono. Mesmo com o forro do quarto, ouço a chuva caindo com força total lá fora. Depois de contar isso a ele, percebo que não doeu tanto quanto eu imaginei que doeria. Eduardo é uma lembrança em minha vida. Afinal ele foi o meu primeiro em tudo. Não foi apenas um namoro. Foi uma amizade e irmandade que nós dois construímos em quatro anos. E quando eu digo que estou feliz por ele, digo isso de coração aberto e de verdade. Pois mesmo ele tendo feito aquilo, ele foi sincero comigo. E eu reconheço isso nele. E espero que ele consiga mais conquistas.

— Você não deve jamais pensar que merece o que acha necessário, aceitar o que acha que merece, Juliane. Nem todas as migalhas são o bastante para nos dar um pouco de alegria. Você é incrível e merece todo o carinho e respeito que alguém tem para dar. Digo a você que ele saiu perdendo a incrível mulher que você é. E se você está aqui comigo em meus braços nessa noite. Depois de um jantar maravilhosa com a sua família. Eu vou ter que agradecer ao babaca por ter me dado você, assim. Você pode não ter sido o que ele queria. Mas é o que eu quero agora. Ω Acordo com as risadinhas altas que minha sobrinha está dando. Ela com certeza é como o seu pai. Matutina e animada a cada manhã. Mas o cara em cima de mim, parece entender que hoje é sábado e não quer acordar de jeito nenhum. Augusto está com a cabeça em meu estômago. Um de seus braços está embaixo de mim e o outro, entre os meus seios. Ele parece sereno em seu sonho e não quero que ele acorde. Tento tirá-lo de cima de mim, mas ele é pesado demais. Então terá que ser brusco e rápido como a perda da virgindade. E dá certo. Augusto está de frente para mim enquanto eu estou há alguns milímetros de cair da cama.

Em silêncio eu deixo o quarto. Encontro meus três convidados na cozinha. Ly está comendo sua maça raspada com seu suco. Ela é a primeira a me notar. Seu sorriso aparece, levantando a sua mão livre ela me chama. — Titia. Bom dia! — Bom dia, meu amor. — Beijo os seus cabelos. — Seu lanche parece ser gostoso só para você. Meu irmão ri e beija minha testa. — Iria deixar você dormir mais um pouco. Vou até a cafeteira e faço o meu café. Bianca diz querer um pouco. — Não precisa, esse fim de semana é de vocês e eu tenho a minha menina aqui para aproveitar. — Olho para o relógio que fica na porta da cozinha. — Vocês já deveriam ter saído. — Eu sei, mas eu tenho que tomar café com a minha filha. — Meu irmão diz acariciando a menina. — Amor. — Ele chama sua mulher. — Você trouxe aquele ursinho que ela gosta? — Está na bolsa dela. Ele acena. — Olha, Juli. É a primeira vez que eu deixo minha filha assim, com você. Ela é a criança mais comportada que eu conheço e não vai te dar nenhum trabalho. Mas eu estou com medo de que algo aconteça...

— O máximo que pode acontecer, é Nicole e eu ficarmos até o shopping fechar. Vamos nos alimentar de besteiras e acabar com a alimentação dela por um dia. — Juliane! Estou falando sério, aqui. — Meu irmão se irrita. — Ei, eu também! — Digo rindo. — Sério, mano. Está tudo bem, eu sei como essa mocinha funciona, vamos apenas aproveitar o dia de compras enquanto vocês se aproveitam. Eu ligo se alguma coisa acontecer, mas nada vai acontecer. Confie em mim. Bianca se aproxima e beija meu irmão. — Sua irmã é louca pela nossa filha e se tem alguém que Ly ama mais do que você, é a sua tia Juju. Então sabemos que tudo vai ficar bem. Meu irmão suspira e eu sei que ganhei isso. Não que eu entenda. Dos irmãos eu sou a única que não tenho uma criança diariamente comigo. Até a Cass tem um diploma com trabalho com crianças. Tomo todo o meu café em um gole tirando um gemido do meu irmão. — Já tenho o meu estoque hoje. Vocês dois, vão e divirtam-se. Conseguindo isso, os dois vão se arrumar levando a sua filha. Enquanto eu troco de roupa, passo pela cama e vejo Augusto ainda dormindo. Sorrindo tomo um banho e

me arrumo para que os dois possam ir. Ly nem se importa de ver os pais saindo sem ela. Até a garota sabe que os dois precisam de um tempo para eles. — Dê tchau para mamãe e papai. — Tchau, tchau! — Diz enquanto vê os dois indo para o elevador. Assim que fecho a porta, coloco ela no chão e ponho as mãos na cintura. — E agora, mocinha, o que vamos aprontar? Ela bate palmas, feliz demais. — Soping! Sorvete e Pepa! Ela parece saber muito bem o que quer e vou fazer a vontade dela. — Que tal você acordar o moço que está no meu quarto. Ela inclina a cabeça e dá um sorriso travesso. — Hora de acordar. Segurando a minha mão, vamos até o meu quarto onde Augusto ainda está dormindo. Alguém que me entende que no fim de semana o sono é mais do que sagrado. Ajudo Ly a subir na cama. Ela engatinha até ficar em frente ao rosto do grande homem. Então ela sacode a cabeça dela.

— Hora de acordar! Hora de acordar! — Ela continua a fazer isso até obter uma reação dele. Augusto se mexe e abre os olhos lentamente. Assim que enxerga minha sobrinha, ele parece perceber onde está. Ele se vira de barriga para cima e me enxerga. Eu não posso evitar, olho diretamente para o seu estômago muito delicioso. — Bom dia, meninas! — Diz sorrindo e então se vira para minha sobrinha. — Eu estou estragando o seu plano, não é? Nicole ri para ele e começa a descer da cama. — Vamos no Soping. Tomar sorvete. Vamos, vamos. — Ela pula e bate palma ao mesmo tempo. — Vamos, vamos! — Repete a mesma frase dela. — Ly, vá assistir ao desenho enquanto eu me arrumo. Eu não falo nem duas vezes e Nicole já está indo para a sala. Assim que ela sai do quarto, Augusto se levanta, ficando de joelhos na cama. Mostrando a exuberância de todo o seu corpo másculo. — Eu tenho que ir em casa trocar de roupa. — Ele sai da cama e para à minha frente. — Podemos nos encontrar lá. — Não precisa vir com a gente se não quiser. Augusto segura a alça do meu vestido cor de creme. Seu indicador passando pela extensão do fio até chegar à

parte em que encontra o botão na parte da frente. — Eu adoraria passar o dia com vocês hoje. A não ser que se importe, é claro! Tiro a sua mão do meu pequeno decote. — Se não tiver nada importante para fazer, por mim tudo bem. — Agarro a sua mão na minha. — Você terá apenas que se comportar, não quero que minha sobrinha tenha uma referência de safadeza na minha primeira chance que tenho de ficar a sós com ela. Joaquim não vai permitir se ela de alguma forma me dedurar. O sorriso do desgraçado se alarga. — Já mostrei que posso me comportar! E eu sei como é importante para você passar um tempo com a sua sobrinha. Por isso eu quero estar com vocês. Mimando as duas o quanto eu puder. Ω Não tinha ideia de que Augusto poderia ser a pessoa mais paciente com uma menina de três anos. Ele com toda certeza tem o dom de encantar o sexo oposto, mesmo que seja uma garotinha que ainda está aprendendo a falar e escrever o nome. Ele nos encontrou no shopping uma hora depois de termos saído de casa. Não era nem dez da manhã e Ly já

estava com seu sorvete nas mãos tomando-o como uma mocinha que ela é. Mas eu vou ter que dizer que é fácil cuidar de uma criança, quando ela não dá trabalho algum. Porém eu vou devolver minha sobrinha um pouco estragada para os seus pais. Em cada loja de brinquedo que entramos, era um boneco ou pelúcia diferente. Nas lojas de roupas então, Ly conseguiu roupa para o próximo ano sem nem dar um sorriso. Augusto segurava todas as sacolas enquanto eu e minha sobrinha entrávamos de uma loja a outra. Eu fiquei pobre mesmo, quando entramos na sapataria. Nicole não esconde que é sobrinha de Cassandra. Se tem uma coisa que minha irmã é perdidamente louca em vida, é por sapatos. O resto é apenas acessório. E sendo que estou estourando todo o meu cartão, compro presentes para toda minha família que logo estarei vendo. Não vejo a hora de chegar o Natal para estar com eles. Só mais um mês, Juli. Só mais um mês. Pensado assim, procurei de alguma forma agradar os gostos de cada um. Minha irmã vai ter que ser minha empregada por todas as minhas férias pelo que eu gastei nessa bota. Augusto apenas suspirou quando levamos as coisas

para o carro e voltamos ao shopping novamente, apenas para comer. Nicole foi comigo em um grande sanduíche. A menina pode ser pequena, mas é um dragãozinho quando se trata de comida. E ela está certíssima em aproveitar a vida. Junto comigo, é claro. Depois das três, voltei com Ly para casa, pois minha sobrinha estava bem sonolenta. Não é pra menos, já que ela andou e se divertiu por todo o shopping. E nesse tempo em que está dormindo, eu aproveitei e tirei o meu sono de beleza também. E só acordei quando Ly me chamou e disse que estava com fome. E logo depois recebi uma mensagem de Augusto dizendo que estava vindo nos buscar para irmos passear. E assim que o interfone tocou, eu peguei minha bolsa e a de Ly e descemos. Augusto nos espera fora do carro. Ele se aproxima de nós duas, mas sua atenção é para mim. Ele me beija com devoção. Se sua mão não estivesse a minha volta, haveria uma poça de Juli aos seus pés agora. — Você está linda, Juli. — Ele me olha na minha macaquinha verde. — Mesmo nessa roupa? — Pergunto a ele. Como ele não me disse aonde estamos indo, eu fiquei sem saber o

que colocar, então me arrumei para ele nos levar de acordo como eu estou arrumada. — Especialmente nessa roupa. — Ele olha para as minhas coxas expostas. — E Nicole está linda, também. Ouvindo o elogio, minha sobrinha dá a ele um lindo sorriso. Ela segura a barra da sua blusa vermelha que combina muito com a sua pequena legging preta. — Você também, tio! Solto uma risadinha com a forma que ela o chamou. E Augusto parece gostar também, já que ele a pegou no colo a levando para o carro. Minha boca vai até o chão quando eu vejo uma cadeirinha rosa no banco de trás do seu carro. — Onde foi que você conseguiu isso? Augusto prende Nicole pacientemente na sua nova aquisição. — Antes de vir aqui, passei em uma loja e peguei ela. Se Nicole estava vindo com a gente, ela vai estar em segurança, o mais segura possível. Assim que ele fecha a porta, eu o puxo para perto, dando a ele – e a mim – um beijo de deixar sem fôlego. Estamos dando um show na porta do meu prédio. Augusto enrola a mão em meus cabelos me inclinando para baixo. Sua língua busca a minha como se sofresse por isso. Ele me aperta contra ele por segundos que parece ser uma

eternidade. — Juli! — Ele se afasta, mas mantém o seu aperto em mim. — Menina, o que você acha que está fazendo me beijando assim? Mordo o meu lábio um pouco envergonhada. — Se continuássemos seria um atentado ao pudor. Augusto me leva para o outro lado do carro abrindo a porta do passageiro para mim. Logo estamos indo para a orla da zona oeste da cidade. Eu ainda não fui lá, mesmo que Leo e os meninos tenham me chamado várias vezes. — Acredita que com quase um ano de adaptado e eu ainda não conheço a nova orla? — Claro que eu acredito. — Ele me encara por uns instantes. — Você é a menina que fica assistindo séries em casa. É mais provável que você conheça toda a Europa pela TV do que a sua própria cidade. Seu comentário me faz rir muito. Não demorou muito para chegarmos. E mesmo que seja um sábado, o local não está tão cheio como eu imaginava. Algumas crianças estão brincando no pequeno parque e homens estão bebendo com a turma aquela cerveja que meu pai e irmão idolatram em um fim de semana. Homens e o seu jeito de aproveitar a vida. Nicole segura a minha mão e na outra ela tem a sua

bolsa de ursinho que comprei para ela hoje. Augusto nos leva para um pequeno restaurante. Ele faz os pedidos e não me importo, já que estou mais feliz com a vista que a cidade adquiriu do que com o que vou comer. Nicole enxerga doce de longe. — Algodão doce, titia! — Ela puxa o meu cabelo querendo a minha atenção. — Eu quero o roxo, titia. Por favor. — Depois que você comer. Ela faz um biquinho de birra. Isso que dá você mimar a menina, Juliane. Mas não me engano com essa manha. Continuo com o meu olhar firme. Mas o trouxa do meu lado não é. E Nicole sabe disso. Ela se vira para ele e abre tanto os seus olhos que chega até a me assustar. Seu lábio inferior treme e pela arfada que Augusto dá, eu sei que minha sobrinha ganhou essa. Ele se levanta e vai até o senhor que está a poucos passos de nós. Olho para minha sobrinha que tem um enorme e brilhante sorriso de quem conseguiu o que queria. E eu acho que com ele, ela vai conseguir até ser a próxima mini miss se quiser. Volto a olhar para Augusto ele está de lado e posso ver um pouco da sua expressão. Ele pega dois algodões

doces. Quando o senhor dá a ele o troco, diz algo que o faz olhar para o mesmo com perplexidade, mas logo seu semblante muda para um grande sorriso. Augusto diz algo e volta pra nós duas. Ele entrega o pacote roxo para Nicole e o branco para mim. — Obrigada, titio! — Nicole agradece e começa a comer o seu doce. Me inclino pra perto dele. — Você é trouxa. Se vendeu por um pequeno bico. Ela vai acabar tomando o seu carro, caso ela chore. Ele me encara como se estivesse dizendo que os cachorros miam. Ele olha para Nicole que está comendo muito feliz o seu doce. A pentelha não tem nenhum pingo de culpa nessa cara de anjo. Está nem aí se ela precisou chorar para ter o que ela queria. Mas eu não a culpo, Augusto que foi trouxa mesmo. Mas ele não tem experiência com crianças, acho que o primeiro pensamento é fazer tudo o que os pequenos demônios em forma de mini humanos querem. Não que minha sobrinha seja um, mas a pirralha já está sabendo usar isso. Essa é a minha garota. A comida estava deliciosa. Nicole nem mesmo tocou em sua sopa. Mas eu sei que ela vai querer comida de

verdade depois de algumas horas. Mas enquanto isso não acontece, passeamos pela orla. Fico por minutos sentada no balanço enquanto Augusto brinca com minha sobrinha no escorregador. Ela parece ficar cada vez com mais energia. Subindo e escorregando no mínimo umas cinco vezes por minuto. Espero que quando ela chegar em casa, só precise de um banho e durma até amanhã. Então eu vou poder ficar mais algum tempo com os três antes deles me deixarem na segunda pela manhã. O choro assustador de Nicole me assusta. Ela está em suas mãos e joelhos ao chão. Corro para ela e a pego em meus braços. Ela me abraça com força, ainda chorando muito. Augusto fica ao meu lado e me ajuda a sentar no banco. Afasto Nicole de meus ombros olhando o seu rosto. — Pode me dizer onde machucou? — Pergunto tirando os cabelos de seu rostinho molhado pelas lágrimas. Ela acena e mostra a sua mão direita. Enquanto vejo a sua mão, Augusto se inclina e vê se seus joelhos estão bem. — A calça ajudou a não machucar. — Ele diz puxando a perna da calça de volta. — Eu virei apenas por dois segundos, eu... Agarro a sua mão e beijo sua boca rapidamente.

— Está tudo bem. Foi apenas um acidente. Isso é normal. — Limpo com o lenço o rosto da minha sobrinha que está apenas suspirando agora. — Ela está bem? — Uma mulher morena aparece. Ela olha para Nicole preocupada. — Eu vi quando ela caiu, de onde estava pensei que estava machucada. Sorrio para a moça. — Apenas um acidente de parque. — Beijo a mão machucada de Nicole. — Ela está bem, já está louca de vontade de voltar a brincar de novo. Ouvindo isso, Nicole me dá um sorriso, mas olha para Augusto e me surpreendendo estende os braços para ele. Ele a pega em seu colo e beija os seus cabelos. Não há dúvidas de que ele já está na mão dela. E que ela gosta muito dele. Sem sombra de dúvidas que ela gosta muito dele. Os dois vão de volta para o parque. Mas Augusto vai para a direita em direção a pequena sorveteria. Minha sobrinha vai ter uma overdose açucarada. — Seu esposo com certeza faz tudo pela filha de vocês. Olho pra ela surpresa com a sua grande observação. Mas eu não desminto isso. Porque eu apenas me choquei com o quanto Augusto está na minha vida. Fodeu!

Ω Queria poder estar presa no espaço temporal onde deito no domingo e acordo na sexta feira que é um feriado. Quando Barry deve acabar com a linha temporal, ele não faz. E isso resulta em ter que trabalhar na segunda depois de deixar meu irmão e família dele na rodoviária. Eu não me lembro de ter ficado tão feliz e relaxada em tempos como fiquei no fim de semana. E pensando assim resolvo fazer da melhor forma uma semana bem produtiva. Mas enquanto eu tomo meu café escondida na copa, percebo que não posso ignorar os fatos. No domingo à noite, depois de um passeio divertido pelo parque do shopping onde levei meu irmão e cunhada para brincar no carrinho de bate e bate, tomar mais sorvete e até mesmo estragar a alimentação do meu irmão por um dia, Joaquim deitou comigo na minha cama e conversamos até duas da manhã. Ele me contou mais sobre o plano de nosso pai. E estou mais do que feliz com essa ideia deles. Papai sabe o que faz. E se mamãe apoia, é porque vai dar certo. Mas isso significa que estarei mais longe do meu irmão. E eu odeio isso. — Mas me conte mais sobre Augusto. — Joaquim me pediu quando ele se encostou na cabeceira da cama.

Não tinha muito o que dizer. Apenas que trabalhamos juntos e numa de minhas sessões de baba acabei comendo ele. Claro, não disse assim para o meu irmão. Apenas disse que estamos nos conhecendo e isso inclui conhecer o corpo um do outro também. Sei que Joaquim sempre terá um pé atrás com qualquer cara que eu vá conhecer. Ele se culpa por ter permitido que eu ficasse com Eduardo. E deu no que deu. Mas ele também não entende que é o meu julgamento que conta. Claro, eu não vou me permitir ficar em um relacionamento louco. Augusto é apenas um cara que é difícil de entender. Como disse ao meu irmão, eu não sei muito sobre ele, mas o que eu sei, me diz que ele é um cara bom que está se adaptando em sua nova casa. — Ele te fazendo feliz como faz agora, é a única coisa que eu preciso saber! Não sabia que meu irmão estava sendo observador demais. Mas eu também não sabia que eu e Augusto estávamos grudados demais na noite de domingo até quando minha sobrinha perguntou se ele seria o seu tio de verdade. Coitadinha, mal sabe ela que nem eu sei essa resposta. Minha cunhada salvou o dia quando mostrou a sua filha mais fichas para o carrossel. Porém isso não significou que tanto eu quanto Augusto ficamos

desconfortáveis com a pergunta. Mas isso logo foi esquecido quando ele me deu um beijo de me fazer derreter. E eu não posso não imaginar coisas. Desculpe, mas eu sou projetada de expectativas. E Augusto está aumentando as minhas rápido demais e em níveis incalculáveis. Não sei se ele está fazendo isso de propósito, mas sei que o que quer que seja, ele está conseguindo. Com uma grande chance de sair com seu plano em excelência. Tenho apenas que tentar conseguir saber as regras do jogo. Mas sinceramente, eu nem sei se eu posso com esse jogo. Se isso é um jogo ou algo que está apenas acontecendo rápido demais. Ou se é diversão. Ou, ou, ou... Há infinitas possibilidades em todos os pensamentos que terei em saber como conseguir que o que eu quero aconteça. Só não sei qual pegar e colocar em prática. Mas enquanto isso, seguir de acordo com a correnteza pode ser o melhor a ser feito. Assim que me sento em minha confortável cadeira o dia começa daquele jeito. — Juliane, preciso que você esteja pronta às duas da tarde. — Augusto entra na minha sala sem o bom dia. — Estará indo comigo para o porto. Estaremos recebendo pessoalmente a carga de janeiro. — Ele me encara por segundos e me presenteia com um belíssimo sorriso. —

Bom dia, Juli. — Bom dia, senhor Augusto. Estarei pronta antes mesmo. Mas me conte como foi o seu fim de semana? Augusto se senta e empurra minha xícara para mais perto de mim. Ele cruza as mãos em cima de seu estômago se inclinando mais na cadeira. Seus olhos estão brilhantes e suas feições bem suaves. Se ele fosse gay, diria que encontrou o boy magia que tanto procurava. Mas como ele não é... Vai ter que me contar. — Foi melhor do que eu pensei que seria. É a única coisa que eu posso dizer a você, Juli. Termino de tomar o meu café e coloco ao lado do meu computador. — Pensei que fôssemos amigos. — Digo me virando de volta para ele. — Que confiava em mim para contar as coisas. Augusto passa o indicador por seus lábios olhando para mim de forma luxuriosa. Fazendo-me contorcer na cadeira. Cruzo as minhas pernas tentando ao máximo fingir naturalidade, quando na verdade eu quero apenas pular em cima dele e matar a saudade que sinto. E eu o vi ontem. Mas ele não estava comigo como eu queria. Apesar de Augusto ficar se desculpando por ter tomado o meu tempo com minha família. Eu pedi que ele parasse com

isso. Acho que eu não me divertiria tanto. Ele com certeza não encantou apenas a minha sobrinha, mas fez o mesmo com meu irmão e minha cunhada. Augusto e Joaquim conversaram por tanto tempo que pareciam velhos amigos. E isso me agradou muito, como também me fez imaginar coisas. — Está fazendo de novo, Juli. — Ele se aproxima da mesa com o seu rosto em frente ao meu. — Volte para mim. Dou a ele um sorriso de desculpas. — Você não me deu a sua resposta. — Dei sim, apenas não quero dar a você os detalhes. Eles são meus e quero que estejam seguros comigo. Inclino a minha cabeça e ele sabe que eu vou insistir. — Meus sentimentos, Juli. Eu não vou dar eles a você. — Anda! Divide comigo! Ele ri e arruma a manga de sua blusa. — Esteja pronta! — Diz se levantando. Quando está na porta eu digo alto o bastante para apenas ele ouvir. — Você sabe que eu sempre estou! E acabou que as horas passaram como se estivesse com doze toneladas nelas. Quanto mais eu olhava para o relógio, mais o ponteiro custava a correr. Triste as

segundas feiras. Garfield deveria ser mesmo o rei. Nomeando assim, segundas um dia de fim de semana e a terça o primeiro dia útil da semana. Então me resta apenas deixar as coisas arrumadas para os meus protegidos antes de ir. Meu telefone apita e vejo uma mensagem do meu amigo. Leo: Cheguei ainda pouco. Trouxe o que me pediu. Mas eu vou dormir agora. Juli: Bons sonhos, Bela adormecida ZZZ. Fico feliz que ele tenha tido tempo de fazer as compras que eu pedi a ele. Afinal, é o melhor pagamento por fazer tudo mais fácil para ele. Arrumando os papéis, guardo tudo na gaveta e tranco-a. Odeio ter que fazer isso, mas o povo tá sempre vasculhando tudo quando eu não estou por aqui. Kátia principalmente, parece que ela gosta de deixar os rastros de catita por onde passa. — Você está pronta? — Augusto aparece na sala com a sua bolsa. — Pensei em ir em seu carro. Pensei que iriamos de táxi. — Claro! — pego as minhas coisas e minha chave. — Estou pronta como prometi. Ele ri e me deixa passar. Ele para e fala com Silvia dizendo algo. Não consigo ouvir e também não me interessa. Quando chego na engenharia, deixo Augusto ir

na frente e vou até Henrique dizer a ele sobre o email que encaminhei a ele. — Boa tarde, muso! — Empurro a cadeira dele para o lado e o meu muso ri. — Cuida, Henrique, abre o teu email logo. Ele me dá um sorriso de implicância, mas faz. — Essa planta aqui, foi a que eu recebi do Tiago. Não entendo nada, ele só está pedindo para ver essa parte aqui em vermelho. — Laranja! — Essa cor aqui. — digo apontando para a tela do computador. — Te encaminhei o email que ele me mandou. Mas apenas tenha cuidado com a explicação, tudo bem? Tiago é bem mais sensível que eu. Henrique me encara rindo. — Juli, ninguém consegue ser mais sensível do que você. — Diz isso para o meu irmão quando o time dele perde. — Aperto o ombro dele. — Eu vou indo, qualquer coisa de extrema e perigosa urgência, me manda uma mensagem. Vou estar externo com o chefe caçula. — Não se preocupe! Dou tchau para ele e ando depressa para a saída onde Augusto me encara. Não consigo decifrar o seu semblante. Mas assim que chego perto dele, Augusto olha por cima

do meu ombro e encara intensamente Henrique. Olho para trás e fico aliviada em ver que o muso está concentrado em seu computador. — O que foi? Augusto olha para mim, nem um pouco alegre como minutos atrás. — Vamos! Certo, senhor zangado. Ignorando o seu mau humor repentino e sem sentido vou para o carro. Quando chego no portão da empresa, digo para o vigilante que se o senhor Duarte ligar para saber de mim, peça para ligar no meu celular. E que possivelmente eu não voltarei para a empresa hoje. — Nós não vamos voltar para a empresa hoje. — Augusto diz. — Avisem quem puder sobre isso. — Augusto olha para frente. — Vamos. Sem nem falar, saio da empresa. Augusto segue por alguns instantes calado. Mas assim que estamos na avenida que leva até o porto, ele pergunta. — Você parece ser muito amiga do supervisor da engenharia. Certo. Ciúmes. Eu acho que é a primeira vez que alguém sente ciúmes de mim. — Tudo bem, ele é uma pessoa bem legal de conversar. E sim, somos amigos, desde quando ele chegou

aqui. — Viro para a entrada do porto. — Se você não percebeu, eu sempre sou a pessoa que vai ajudar o novo contratado a se sentir em casa. Eu sei como é ser novo na faculdade, no trabalho, entendo muito de como se sentir descolada. Então eu faço de tudo para fazer qualquer que seja a pessoa, se sentir em casa. Porque é o que aquele local é. Nossa casa, ficamos mais lá do que com nossa família. Eles estão bem, porque assim que chegam em casa, tem alguém esperando por eles. Enquanto pra mim, no mínimo é uma caixa com alguma compra nova que fiz na semana. Então se eu posso melhorar um pouco o humor de cada um deles, para não chegarem em casa estressados e poder aproveitar a família, eu farei! Digo isso em um folego só e eu sei que ele nem mesmo pensou em me interromper. Augusto nem sequer me olha depois de minhas respostas. Não se se soei grossa, mas é a única resposta que eu tenho para isso. Digo isso, porque é o que gosto de fazer. Às vezes eu me estresso com tudo caindo em cima de mim, mas eu não tenho ninguém para brigar em casa então aguento tudo numa boa. E a maioria deles são pessoas boas e animadas. Henrique apesar de ser um gato, é competente, sempre me ajudou nas poucas vezes em que pedi a ajuda dele. Assim com os outros. Paro o carro na guarita e o vigilante vem até mim.

— Boa tarde. Estão em visita, senhora? — Boa tarde. Vamos receber nosso material. — Pego minha CNH e dou a ele. — Robert está nos esperando. O senhor procura o meu nome. — Possa ser que esteja no nome de Augusto Belmonte. Ele acena concordando. — Sim, aqui está. — Ele me entrega meu documento. — Poderia me dar um documento seu, senhor? Com raiva, Augusto pega a sua identidade e dá a ele. Percebo que o senhor está desconfortável com o olhar que ele recebeu. — Não ligue para ele, tudo bem? Ele apenas não gosta de segundas e está com raiva porque não deixei ele dirigir para cá. O senhor ri e Augusto resmunga alguma coisa. — Seja um bom menino e melhore o seu humor. O senhorzinho entrega a identidade para ele. — Podem ir, Robert está no pavilhão sete. Pavilhão impares são à esquerda. — Diz abrindo o portão com o controle em sua mão. Estaciono na pequena vaga que sobrava. Quando eu vou pegar minha bolsa no banco de trás, Augusto segura os meus pulsos e me puxa para perto dele. Ele me beija

com vontade. E aproveito para matar a saudade que eu tenho dele. Seu aperto em meus pulsos fica mais forte, assim como o seu beijo. Antes que eu perceba ele me solta. Continuo com os olhos fechados e a respiração acelerada. — Eu sabia que você era especial no primeiro momento em que te vi. — Seu dedo contorna os meus lábios. — Mas eu não sabia que você faria um estrago em mim logo de primeira. — Claro! — Eu nem sei porque eu disse isso. — Vamos, Juli. Temos que trabalhar.

11 A única certeza que eu tenho nessa noite é que se não fosse por minha irmã, eu não estaria encarando a versão Juliane Gostosa. Sério, essa não sou eu. Talvez uma Juliane de uma dimensão muito distante. — Juliane! Estou esperando! — minha irmã grita para que eu mostre a ela como estou. — Não me faça ir até aí e te bater. Pego meu celular e o coloco no suporte de carga, fazendo com que ela me veja inteira. Estamos há uma hora

conversando pelo Face Time. Cassandra fica em silêncio por torturantes segundos, e isso me faz ter uma mini crise de ansiedade. — Cass, você não está ajudando com todo esse suspense! Empurro o meu óculos esperado o veredito da minha irmã mais velha. — Nossa, irmãzinha, eu preciso dizer: Hoje você tira esse atraso! — Cassandra! A vaca ri quando grito com ela. Irmãs mais velhas. Amigas e vacas ao mesmo tempo. — Eu estou falando sério sobre você tirar o atraso. Se você escolher qualquer cara, vai conseguir um “sim” sem nem perguntar. Claro, se ele for hétero. Mas homo também serve. Eles sabem comer uma mulher. — Cassandra! Consigo ver que seu corpo vibra com a gargalhada do mal que ela dá. — Sério, mana. Você de Geek gostosa está boa demais. — Ela gira o seu dedo indicador. — Deixa eu ver como ficou a sua bunda nessa saia. Faço o que ela pede e quando estou de lado para a câmera ela grita para parar.

— Sabia que com um pouco de safadeza em suas roupas, você seria uma Scarlett Johansson brasileira e morena. — ela suspira satisfeita consigo mesma. — Meu trabalho foi realizado com êxito. Minha irmãzinha está pronta para transar. — Cass, para com isso, por favor! Ela para de rir e toma uma longa e profunda respiração. Sorrindo ela aproxima mais o celular de seu rosto. — Você está linda, Juli. Demais. Eu adoro que você tenha o seu jeito único. Mesmo com seu jeito Geek, você é linda e encantadora. E mesmo estando bem diferente do que vejo, você continua linda. E sim, estou sendo a irmã vaca que implica com a caçula. Mas é o meu jeito de dizer que eu te amo. Ainda bem que dei essa saia para você. Respiro, um pouco calma. — Obrigada, Cass. Mesmo. Ela pisca. — Agora, pegue a sua bolsa e, por favor, use camisinha. Ou não. Se o boy for um deus, tenha ao menos a decência de engravidar e me dar um sobrinho lindo. Ela consegue estragar o momento. — Tchau! — Nem dou a ela a chance de falar. Desligo a chamada e me encaro mais uma vez no espelho. Nada indecente, mas também nada comportado. A

saia prateada que Cass me deu há dois anos serve muito bem em mim. Na verdade, eu nunca tive a chance de usála. E onde mais iria vestir algo como isso? Pro trabalho é que não seria. Com a ajuda da minha irmã, consegui achar uma blusa que ficasse bem. A blusa de mangas curtas preta combinou com tudo. O salto preto também, é um presente da filha do meu chefe. E é a coisa mais cara que eu já usei na vida. Não dou seiscentos reais em um sapato. Em livros sim, mas em sapato. NUNCA! Com a maquiagem leve, apenas minha boca se destacando pelo batom vermelho bem cabaré mesmo, eu acho que estou pronta para a inauguração da boate. Quando Augusto me disse que queria que estivesse com ele no sábado, pensei que fôssemos ficar em casa. Mas quebrei minha cara quando ele jogou para mim dizendo que estaríamos indo para a inauguração de uma boate, disse que não, que ele poderia ir sozinho. Minha vontade era de dar naquele lindo rosto dele. Nunca entrei em uma boate na minha vida. E nem pretendia. Mas ele foi tão insistente com aquela língua perversa dele, que acabei cedendo. E acho que sim, poderia ter uma boa primeira vez com ele. Mesmo estando deslocada, de alguma forma, Augusto me ajudará a aproveitar a noite. Meu interfone toca e nem preciso atendar para saber

que é ele. Respirando fundo e pedindo que a força esteja comigo, desço indo encontrar o gostosão do meu chefe. Acabei de dizer isso mesmo? Dou um olá ao porteiro e ando até a BMW de Augusto. Ele desce e vem ao meu encontro. Fico olhando para ele como uma idiota. Como é que eu tô ficando com esse homem? Nada de insegurança, sério. Ele é gostoso demais, pode ter qualquer piranha por aí. Mas ele está aqui, comigo. Me comendo com seus lindos olhos claros. Então eu tenho o poder escondido afinal. Augusto para à minha frente. Seus olhos cravados em mim, demonstrando o fogo que tem dentro dele. Eu posso dizer que agora eu tenho o meu momento livro, aqui. Porque esse belíssimo espécime de homem me quer. E se eu quiser, vamos subir e ficar a noite toda dentro do meu quarto. — Você está uma delícia, Juli. Uma coisinha que estou querendo provar muito. — Ele segura o meu queixo e me beija devagar. — Mas eu quero aproveitar a noite com você. Então quem sabe eu deixo você cobrar o que quiser de mim. Com os olhos ligados ao dele, sei que essa noite é para jogar. Não sei que tipo de jogo ele está preparando, mas eu sei que estarei fazendo o meu também. Porque sim,

eu quero de alguma forma estremecer o mundo desse homem. Dizer a ele que eu também posso jogar para ganhar. — Eu vou cobrar com juros. — Seguro a sua mão. — E a primeira coisa que eu vou querer, é aproveitar a pista de dança com você. Augusto sorri presunçoso quando me leva para o seu carro. Quando penso que ele vai abrir a porta para mim, Augusto me pressiona contra o carro. Sua mão vai direto para a minha coxa apertando com força. Arfo contra a sua boca. E quando eu vou retribuir, ele se afasta e segura uma mecha do meu cabelo em suas mãos. — Eu já deveria ter dito. Mas eu tenho um enorme tesão nesses seus cabelos longos. Ele também está gostoso em sua calça jeans preta assim como a blusa. Nada mais do que simplesmente comestível na mais pura simplicidade. Ω Para uma inauguração, a boate está cheia até demais. Pensei que a inauguração era apenas para convidados. Não para toda a população jovem e bêbada de toda a cidade. Não é nem mesmo nove da noite e já tem pessoas bem bêbadas.

— Você pode beber o que quiser. — Augusto diz quando se coloca atrás de mim. — Basta colocar em meu nome. — Ele aponta para um cara que está do outro lado do bar. — Eu tenho a minha própria comanda aqui. — VIP? Hoje é a primeira noite e você já é VIP! Augusto ri contra o lado direito do meu rosto. — Eu apenas sei com quem falar, Juli. Então, aproveite a noite. — Eu não sei como fazer isso. Ele me encara e pelo jeito que sorri bem amplamente, me diz que ele lembrou que essa é a minha primeira vez em uma boate. Ele se aproxima de mim, segura minha mão na sua e beija meus lábios devagar. — Você não tem que fazer nada que não queira. Apenas se divirta, estou do seu lado. Nada vai estragar a sua noite, Juli. Apenas aproveite. E é o que eu faço. A única coisa que eu consigo beber é caipirinha. Fico bem feliz de ter jantado antes de sair de casa. Não sei dizer se eu aguentaria. A música começa alta e a pista de dança começa a tocar. Fico feliz por estar sempre atualizando as mais tocadas no Spofity. Pego o meu iPhone e tiro uma foto para mandar para minha irmã. Mas o meu celular é tomado de minhas mãos e então eu estou contra o peito de Augusto. Ele está com os lábios no meu maxilar e assim,

sem nem mesmo pensar, ele tira uma foto nossa. Augusto me entrega o celular e se senta no banco ao meu lado. Rindo, eu vejo a imagem. Tento muito não prestar atenção na forma em que meu peito se aperta pelo simples fato de ver essa foto. Mas é inevitável. Eu gosto de Augusto. Gosto muito. E isso deveria me assustar. E de alguma forma, estou me sentindo bem sobre isso. Ele não é o Eduardo, Juliane. Vocês nem estão mesmo juntos. Estão apenas aproveitando a companhia um do outro. Basta se lembrar disso. O cara deixa a minha caipirinha na minha frente e de uma só vez, eu tomo tudo. A bebida sai rasgando minha garganta e de alguma forma vai me alertando sobre tudo isso. — Devagar. — Augusto me abraça pela cintura. — Quero que se divirta, mas eu não quero que fique bêbada. — Olho para ele que está um pouco preocupado. — Aconteceu alguma coisa? O que houve? Seus olhos estão fixos em mim. Demonstrando a sua total preocupação comigo. Não pode ser apenas algo carnal. Eu sinto que é mais do que isso. Eu sinto que tem algo nele que me faz querer estar perto, querer saber se ele está bem. Me faz querer saber que ele gosta de mim. Quão idiota é se apaixonar em tão pouco tempo? Quão estúpido é se entregar assim, sem nem mesmo pensar nas consequências?

Eu nem mesmo pensei sobre ações e reações. Apenas aconteceu. — Juli? — Ele acaricia o meu rosto. — Está bem? Dou a ele o melhor sorriso possível. — Sim, apenas tive um pensamento que me bateu, mas já passou. Ele me encara querendo saber se estou mentindo ou não. Empurro o meu óculos para cima. E isso faz com que ele franza o cenho. — Tem certeza? Envolvo meus braços ao redor de seu pescoço, colando os nossos corpos. — Sim. E eu nunca dancei em uma boate. E eu simplesmente adoro essa música. Augusto me dá um lindo sorriso e me puxa para a pista de dança. Ele me mantém perto do seu grande corpo. Para em uma parte que não tem muita gente, mas as luzes ainda nos alcançam, e me vira de frente para ele. Augusto coloca meus cabelos para trás. Com as mãos em minha cintura, ele me move junto com ele de um lado para o outro. — Como você nunca veio em uma boate, Juli? — Ele pergunta assim que seu rosto fica em meu pescoço. Mesmo com o salto, eu ainda sou menor que ele. — Qualquer cara que tivesse a chance, levaria você para se

divertir. Seguro a sua nuca e fico com a minha cabeça apoiada em seu ombro. — Já disse a você a minha história. Apenas não chamo a atenção. Prefiro o anonimato. Augusto aperta minha cintura com um pouco mais de força. — Pois não deveria. — Ele morde de leve o meu pescoço. Arrepios se espalham pelo meu corpo. — Você é a coisa mais linda que eu já vi. Você é subestimada e não gosta de atenção. — Ele suga a minha orelha me fazendo gemer baixo. — Mas eu vi você, enxerguei quem é de verdade. Essa menina meiga, inteligente, educada, valente, apaixonada por fantasia. — Augusto enfia a sua mão por dentro da minha blusa. — Que se esconde nesse jeito de menina nerd. Mas por debaixo dessa camada, existe uma mulher linda esperando pra ser explorada. — Suas duas mãos estão bem abaixo dos meus seios. — Mas não queria deixar ninguém chegar perto. Seus dedos acariciam minha barriga por debaixo da renda. Causando um frenesi de choques. Meu corpo começa a pesar. Me aperto mais contra ele. Augusto se mexe contra mim, mostrando que está tão ligado quanto eu. — Mas ela me deixou chegar perto. — Uma de suas mãos sai de dentro da minha blusa e segura o meu

pescoço. Augusto levanta meu rosto para me encarar. Seus olhos claros estão cheios de promessas que eu quero que ele cumpra. — Ela não só me deixou prová-la, como me prendeu sobre o seu domínio. — Ele morde meu lábio inferior e tudo dentro de mim derrete. — E eu não acho que posso me livrar disso. Augusto sabe dançar. Eu não preciso fazer nada além de me agarrar a ele e deixar que ele guie o meu corpo. Podemos estar discretos, mas não é assim pra mim. Augusto eleva a dança para sexo com roupa em meio uma multidão. Suas grandes mãos parecem famintas por meu corpo. Sua boca não para de me beijar e me excitar com os gemidos que ele dá. Estamos na terceira música e eu já estou mais do que molhada e necessitada dele. E o filho da mãe sabe disso. Quando uma nova música começa a tocar, ele me gira, colando minhas costas em seu peito largo. Estamos suados, ofegantes, excitados e nenhum pouco longe de desistir de tudo isso. Esse jogo, essa dança, nossos sussurros, é apenas o início do que está por vir. Suas mãos vão diretamente para minha barriga. Augusto morde o meu pescoço levemente, o gesto me faz arquear contra ele. Ele sorri baixinho enquanto suas mãos sobem lentamente pelo meu corpo. — Você vai me fazer ser preso, Juli. — Diz contra meu pescoço. — Se isso acontecer, eu não vou poder ajudar nós dois.

— Humm! A batida muda. Eu conheço essa música, é uma das minhas favoritas. Só que ela está com uma batida mais animada. Mas a letra é o que sempre me interessou. “Quando ela era apenas uma garota Ela tinha expectativas com o mundo Mas isso voou além de seu alcance Então ela fugiu em seu sono E sonhou com o para-para-paraíso.” Pela energia e a vontade louca de me entregar, começo a dançar com ele. Mais contato, mais beijo, mais necessidade do que antes. Com uma mão no fim de minhas contas e outra em minha nuca, Augusto faz do meu pescoço a sua principal refeição. Seus dentes beliscam, chupam, lambem cada milímetro da minha pele. Agarro os seus cabelos com força, tirando gemidos de prazer de nós dois. Augusto coloca uma perna no meio das minhas. Gemo quando sem nem perceber começo a me esfregar nela. — Caralho! — Ele geme antes de me beijar. Sua boca praticamente suga a minha. Me excitando mais e mais. Agarro sua blusa e beijo-o como se ele fosse a última coisa que iria provar. Uma de suas mãos desce para encontrar a minha coxa. Eu não consigo acreditar que

estamos fazendo isso em uma pista de dança. — Eu preciso comer você. — Ele grunhe antes de me soltar. Penso em protestar, mas ele está me arrastando para um corredor. Eu quase não consigo acompanhar ele. Estou um pouco alta e até mesmo perdi o pouco do equilíbrio que eu tinha. Augusto abre uma porta com uma chave e me puxa para dentro. — Onde...? Ele liga uma pequena luz azul e me empurra contra a parede. — Prometi a você que te daria uma primeira vez em uma boate. Augusto prende as minhas mãos junto a parede apenas com uma mão. Segurando a minha perna esquerda, ele a coloca em volta de sua cintura. Com os olhos ligados aos meus, Augusto sobe minha saia até que esteja enrolada em minha cintura. Solta a minha mão e pede em um tom baixo. — Tire a sua blusa. — Diz e beija minha boca rapidamente. Mordendo o lábio, eu faço o que ele me pediu. Seus olhos estão escuros, suor desce por seu rosto. Seu peito sobe e desce em desespero por ar. A veia de sua têmpora está mais do que saliente.

Assim que estou apenas com o sutiã, Augusto se ajoelha a minha frente. — Se segure! Pegando minha perna direita, ele a coloca sobre o seu ombro. Morde com força na medida certa a parte interna da minha coxa. Então ele despedaça minha calcinha. Tremo contra a parede e tento me segurar para não cair. Não precisa ser um gênio para saber o que vai acontecer. Antes de tomar minha próxima respiração. Augusto coloca a sua boca no local onde mais se precisa de atenção. Mordo meu lábio com tanta força que sinto o sangue. Mas eu não posso gritar. Se quiser gozar, não posso chamar atenção para nós dois. Sua língua sobe e desce, e então lentamente circula meu nervo, que faz irradiar prazer por todo o meu corpo. Augusto suga, lambe, alternando nas mais deliciosas torturas. Seguro o seu cabelo para não cair, mas eu sei que em algum momento eu não vou aguentar. — Meu pai! — Digo o tão baixo quanto posso. Seu dedo entra em mim. Esfregado para trás e para frente. Assim ele coloca mais um, me fazendo desfalecer por segundos. Dois dedos entrando e saindo enquanto a sua língua continua com o seu trabalho. Meu corpo começa a pesar. Levo as minhas mãos aos meus seios, apertando, forte. Baixo o sutiã e aperto os

meus mamilos que doem de tão duros que estão. — Merda! — Ouço ele xingar. Com os olhos semiabertos, consigo ver o seu olhar de puro prazer em mim. Ele trabalha com mais rapidez a sua língua. É a melhor vista que eu tenho. Seu corpo ajoelhado perante a mim, me dando prazer, me devorando como eu preciso. Eu gozo. Sussurrando o seu nome baixo. Meu corpo parece estar ligado em um fio de energia. Enquanto o meu corpo treme, Augusto ainda com minha perna erguida, me levanta, fazendo com que rodeie seu quadril com as minhas pernas. Seu pau, duro, mesmo sob sua calça, acerta em cheio a minha boceta. Jogo a cabeça para trás com apenas esse simples contato. De alguma forma, ele conseguiu tirar a sua blusa. Ajudo-o com o zíper de sua calça. Segurando o meu rosto, ele me faz encará-lo. Há algo em seus olhos que me acerta em cheio. Ele está exposto assim como eu. Seu corpo grande e suado. Seus olhos com uma chama que me faz querer gritar. Sua mandíbula trincada. A sua veia em seu rosto que eu tanto adoro. E a sua boca... — Nossa! — Grito jogando a cabeça para trás quando ele entra em mim sem nenhum aviso. Seus quadris deslizam para fora, me fazendo

protestar quando ele sai. Mas não por muito tempo. Augusto entra com mais força em mim. Fecho os meus olhos quando ele vai me preenchendo a cada estocada. Fortemente, deliciosamente. Tão bom. Há algo de diferente nessa noite. Algo novo, eu... — Juli! — Augusto encontra meus lábios e me beija mais ardentemente. Ele sai por completo do meu corpo e então volta com força. Acertando os nervos dentro de mim. Suor escorre por todo o meu corpo. É loucura tudo isso. Augusto parece mais frenético a cada investida. Sua boca encontra meu seio e ele suga com força me fazendo gritar o seu nome. Ele gira os quadris e mete mais fundo, me fazendo ficar louca. Meu orgasmo começa a crescer. Mas eu não quero parar agora. Seguro o seu rosto e o encaro. Meu pai do céu! Ele está quebrado. E está tentando de alguma forma, consertar isso com a minha ajuda. Ele fecha os olhos e quero pedir que ele me olhe. Mas eu não posso, já que está... Deus, isso é loucura. Eu grito mais alto quando ele intensifica ainda mais os seus impulsos. O prazer me choca com a intensidade que me domina. Não ouso fechar os meus olhos enquanto gozo envolta em Augusto. Já ele tem seus olhos fechados e mandíbula travada enquanto me come mais forte. Ele

continua, não para por nada. Apenas nossos corpos se chocando um com o outro. Minhas costas começam a doer, mas o prazer volta com raiva. Me prendendo em sua ira. Eu não aguento por muito tempo e gozo novamente e dessa vez trago Augusto comigo. Ele geme meu nome enquanto continua suas investidas em mim. Ele está delicioso assim e me faz querer ficar aqui nessa sala o resto da noite. Depois de segundos ou minutos, eu não sei, Augusto deita a cabeça em meus ombros. Sua respiração está acelerada e seu corpo ainda está tremendo assim como o meu. E com uma aproximação, consigo sentir a batida de seu coração. Acaricio o seu cabelo e o simples contato parece têlo despertado. Augusto se afasta um pouco, mas ainda me mantém presa entre a parede e seu corpo. Ele me olha por milésimos de segundos e então me desce. Ele começa a se arrumar e quando faço menção de me cobrir, ele me para e me arruma com paciência, arruma meu sutiã, alcança minha blusa e me ajuda a vestir. Mordo o meu lábio quando ele ajeita a minha saia. Então segura a minha perna e limpa o líquido que desce por ela. Meu rosto fica vermelho enquanto ele sorri. Depois que estou arrumada ele se afasta. Só então, ele termina de se arrumar. E está diferente, perdi o seu sorriso. Perdi o Augusto que estava se divertindo comigo. Não quero acreditar que

foi pelo que compartilhamos aqui. Não quero pensar assim. — Você está bem? — Ele me pergunta quando abotoa sua calça. Aceno que sim, mas o jeito que ele me olha me faz perceber que ele quer que eu diga. — Estou sim! Apenas recuperando o fôlego. Ele me dá um sorriso, mas não dura muito. E isso faz meu estômago vibrar. E não é algo bom. Ele arruma o seu cabelo e eu faço o mesmo com o meu. Prendo-o em um coque, mas ele se aproxima um pouco hesitante e desfaz. — Deixe-o solto, por favor. — Diz massageando o meu couro cabeludo. — Você fica ainda mais linda com eles soltos. — Estou suada. — Dou a primeira desculpa que vem em minha mente. — Vou acabar ficando com brotoejas se deixá-los soltos. Augusto me rodeia, pega os meus cabelos delicadamente e assopra contra a minha nuca. O suor em meu corpo contra o seu hálito quente me faz estremecer. E ele continua. Então deixa um pequeno beijo em minha nuca. — Isso vai ajudar! Ele abre a porta e me dá passagem para sair. Quando ouço a música alta da boate, só então

percebo que provavelmente a sala era à prova de som. Pois nem me lembrava que estávamos a poucos metros dessa multidão. Augusto segura a minha mão. E com esse simples gesto eu sei que há algo de errado. Ele não me segura firmemente como faz. Se não fosse eu segurando, já estaríamos separados. É como se ele quisesse isso. Meu Deus! Eu paro um pouco e ele faz o mesmo. — Tudo bem? Aceno que sim. Não, por favor! Não faça isso. — Tem certeza? Me diga você. O que aconteceu? Por favor, me diga. Mas ele não faz nada a não ser me encarar. Ele não vai dizer. — Estou com sede! — Digo passando por ele e indo até o bar. Sua mão está em minhas costas enquanto ele me acompanha. Pego o meu celular e vejo que são onze da noite. Eu já poderia estar em casa. — Quer comer algo? — Ele me pergunta bem próximo de mim. — Estou sem fome! Augusto concorda e pede algo para ele. Alguns instantes depois ele pega o seu telefone e começa a teclar

furiosamente. E eu continuo a beber. Mas paro no segundo copo que tomo depois de nosso retorno. Ele me encara alguns segundos e vejo que está preocupado com alguma coisa. — Você tem que ir? — Eu juro que tentei ter um pouco de paciência. Ele parece incerto em me contar. — Augusto, você tem que estar em outro lugar? Ele acena relutante. — Eu vou pedir um táxi para mim. — Juliane! — Não, sério, está tudo bem. Eu estou indo para casa e tentar encontrar uma resposta plausível em saber o que deu em você. Vá para onde você tem que ir. Conversamos outra hora. — Juli...! — Ele olha para o seu celular como se o aparelho fosse dar alguma luz a ele. — Eu tenho mesmo que está em um lugar, mas eu não quero deixar você. Eu odeio ter que fazer isso. — Qual é o mais importante, Augusto? Deixa eu melhorar essa pergunta: Eu sou importante, Augusto? Ele parece sem chão nessa hora. Augusto olha mais uma vez para o celular e eu tenho uma resposta. — Nem precisa responder. — Aceno em desdém. —

Sério, eu nem sei porque estou surpreendida. — Merda... — É, algo como isso. Eu falo com você depois. Ou não! Vou até o bar não ligando para a forma que ele está me chamando. Você não vai chorar, Juliane. Eu te proíbo. Pago a comando que está no nome dele. Dessa vez eu não sou estúpida. Pego um dos táxis que estão em frente à boate. E por um milagre divino eu não derramo nenhuma lágrima.

12 Eu não ouvi falar de Augusto por três dias. E chegando agora na empresa em plena terça feira, eu não sei o que fazer caso ele apareça. Ele não me ligou, não mandou mensagem e nem mesmo deu sinal de fumaça. A parte idiota em mim, queria que ele fizesse isso e me dissesse o que está acontecendo. Mas a parte sensata que resolveu tomar a frente de tudo, disse que isso tudo não vale nada. Já que é a segunda vez que ele faz isso.

Claro que eu não esqueci o que houve da primeira vez. E de cara, eu sabia naquele quarto de pousada que não era simples. E no sábado, eu tive plena certeza de que estou completamente ferrada. Eu quero acreditar que isso é só coisa da minha cabeça louca. Mas meu coração retardado diz que não é. Nós dois naquela sala não foi apenas carne e desejo louco um pelo outro. Foi mais. Eu senti na minha última gota de sangue, que é mais do que isso. Eu só não sei se é a mesma coisa para Augusto. Nossa, aquilo foi... Nem sei descrever. Mas eu senti algo vindo dele. E tenho certeza que ele sentiu muito vindo de mim. Eu não parei de gritar o nome dele. E a forma que ele continuou mesmo tremendo de prazer. Era como se ele quisesse que nunca acabasse. Que nunca saíssemos dali. Ou era apenas eu vendo o que queria. E depois de tudo o que compartilhamos naquela minúscula sala. Tudo foi por água abaixo. Tem que ser algo para ele. Ele não pode não ter sentido aquilo. Meu Deus, eu estou fazendo papel de idiota? Acho que sim. Já que ele não veio trabalhar ontem. Eu não dei uma de perseguidora. Me recuso a ser assim. Seu Duarte pediu para tentar falar com ele, mas não tivemos respostas. Mas depois do almoço, meu chefe veio até mim dizendo que Augusto está gripado. Ele até me perguntou se poderia ir ver como ele está. Mas inventei

uma desculpa besta e disse que não poderia. Sei que ele deve me achar uma ingrata, já que Augusto não hesitou em ficar comigo no hospital. E eu estou evitando ele. Mas como Augusto mesmo disse. Era a obrigação dele. E essa não é a minha. Se ele não quer falar comigo, eu não vou ficar insistindo. Posso ser uma louca desligada, mas não sou idiota em ficar me arrastando por ele. Somos bem crescidos para aprender quando somos bem-vindos ou não. E nesse caso eu não sou. E nem ele é para mim. Mentirosa! Sim, eu estou preocupada. Mas isso não muda nada. Augusto nunca me chamou para ir ao seu apartamento e não acho que ele vai querer que eu vá assim. Ele mostrou que eu não sou importante. E devo continuar assim em sua vida. Doeu quando ele não me disse. Eu queria muito que ele me dissesse qualquer que fosse o problema, mas ele escolheu ficar calado mais uma vez. Eu pedi que fosse sincero. Que jogasse limpo em dizer se era algo apenas de uma vez. Não exigi dele amor eterno. Apenas a verdade sobre o que há de errado. Eu não consegui a resposta para isso. Ele teve duas chances de me dizer e desperdiçou ambas. Eu não sei se posso dar a ele uma terceira.

Afinal, eu não consigo nem mesmo pensar nele me contando os seus problemas. Das duas histórias, a minha foi a única que foi revelada. Enquanto Augusto continuava apenas escutando e conhecendo mais de mim, eu não sei nada dele. A não ser as coisas que eu sei pelo que descobri com a empresa. Contei a ele sobre tudo o que me lembrava, enquanto não tive nenhuma lembrança dele. É, Juliane, teu papel de trouxa merece um Oscar. — Juli, querida. — Kátia entra na minha sala segurando duas pastas. — Daqui a pouco estarei em uma reunião com Augusto, se puder ir nos ajudar eu vou agradecer. Aceno com um sorriso para ela. Eu vou ter que aturar os dois de papo enquanto apenas assisto sem servir para nada. Nem tudo são flores no trabalho. Já deveria saber disso. Pego meu celular e vou até o almoxarifado almoçar com os meninos. Léo me arrasta até o refeitório. Nada contra, mas eu não confio na comida do restaurante. Mas hoje ele quer me torturar. E para deixar um pouco Augusto de lado, aceito ir com ele. — Você pretende ir em outro momento em São Paulo esse ano ainda? — Pergunto na esperança que ele diga sim. — Não, acho que só depois da Páscoa. — diz quando

nos sentamos em uma das grandes mesas. — Acabou o seu café? — Sim! — Eu faço um biquinho. Começo a comer o que parece ser o arroz, mas para mim está mais para um mingau de cereais, se é que isso existe. Ao menos a carne está boa. Meu telefone toca e vejo o nome do advogado. — Oi! — Juliane, que bom que atendeu. Estou ligando para avisar a você que seu processo foi marcado para duas semanas. — Nossa, que rápido! Estou aliviada que tudo isso pode acabar. Na verdade, eu tentei ao máximo esquecer isso. — Sim, parece que o promotor está agilizando alguns processos. — Ele pensa em algo. Mas acho que decidiu não dizer, já que ele suspira. — E o seu foi um deles. Eu vou te mandar um email com os detalhes. Mas queria dizer isso a você. — Claro, obrigada mesmo. E eu vou esperar o seu email. — Estou mandando. Fique bem, Juliane. Desligo o celular e coloco em cima da mesa. Eu até tento me manter calma, mas as minhas mãos começam a tremer. Leo percebe e logo aperta minhas mãos nas suas.

— Juli? Olho para ele. Meus olhos já embaçados com as lágrimas. — Juli, diga o que houve? — O julgamento... Foi marcado. Ele parece não entender. Mas logo seus olhos se arregalam. — Isso é bom, Juli. Assim você vai se livrar de tudo. — Ele aperta minhas mãos. — Não se preocupe, vai ficar tudo bem. Concordo com ele. Mas eu não consigo evitar de pensar que eu quero Augusto ao meu lado. Como ele esteve em todos esses dias. — É apenas isso mesmo, Juli? Sei que Leo percebe que não é apenas isso. Sei que ele sabe que há algo mais. Mas eu não quero envolver ele em toda essa coisa. — Sim. É apenas isso. Eu fiquei essas semanas bem quieta. Esquecendo tudo isso, então vem o julgamento e tudo volta. Leo dá a volta na grande mesa e me abraça. — Não sei como está se sentindo, mas eu estou aqui. Me avise quando será, que eu vou com você. Aceno agradecida. Mas eu preciso ficar só por

alguns instantes. Vou para a sala de reunião que é onde sempre encontro um pouco de silêncio. Sentada na poltrona eu começo a pensar em tudo. Em como Augusto me salvou. Em como ele me irritou e logo em seguida me conquistou. Como ele me viu e me vê. Como me aceitou como eu sou, sem me achar uma louca. Ele conseguiu ver a verdadeira Juliane. E ficou com ela. Escutou, abraçou e desejou. Mas foi apenas isso. Eu não sei o que pode estar de errado com ele. Mas eu sei que comigo não tem, que meu coração não tem nada de errado em se apaixonar pelo cara que me quis. Mesmo que o sentimento não seja recíproco, ele é mais do que verdadeiro. Eu percebo que me apeguei a alguém que provavelmente não queria nada de compromisso. E eu nem posso cobrar isso dele, já que o assunto nunca veio. Eu deixei que ele se aproximasse, me conhecesse e me encantasse. Fiquei exposta. E minha falta de atenção momentânea se tornou permanente quando se tratava dele. Mais uma vez eu me deixei apaixonar pelo cara bonito. Só que dessa vez, eu não sei o que é o problema. Se é ele ou eu. Meu telefone apita e sei que tenho que voltar para o trabalho. Vou ao banheiro e retoco a maquiagem. Meus olhos estão vermelhos. Posso dizer que são as lentes

novas – que não existem – que estou me adaptando. Com certeza todos vão engolir essa desculpa. Assim que eu chego à minha sala, Augusto aparece. Meu olhar encontra o seu. E ficamos os dois nos observando em absoluto silêncio. Ele parece bem de sua gripe. Mas seus olhos parecem pesados, como se ele não conseguisse dormir. Ele me olha dos pés à cabeça, mas volta a me olhar nos olhos. Eu quero bater nele. Meus instintos violentos se aflorando. — Você está bem? — Nós dois perguntamos ao mesmo tempo. Seria engraçado, mas não consigo pensar em nada que me faça sorrir nesse momento. Me lembro do que aconteceu sábado e consigo segurar a língua e ser educada. Me sento e ligo o meu computador. Ouço ele respirar fundo quando não dou a ele o que quer. Já passamos por isso. Ele sabe muito bem como as coisas são. — O senhor precisa de alguma coisa? Ele respira alto mais uma vez. — Preciso que você aprove esse reembolso para hoje se possível. Quero que Silvia faça a transferência antes do fim da tarde.

Pego o papel de sua mão. — Mais alguma coisa? Ele acena que não e se vira para ir. Ele para antes de sair da minha pequena sala e por míseros segundos eu penso que ele vai falar. Mas ele balança a cabeça e vai embora. Resignada, eu faço o que ele me pediu e tenho tudo pronto em meia hora. Recebo um email do meu chefe dizendo que minhas férias estão certas para daqui a duas semanas. Corro para ver a data do julgamento e vejo que é dois dias antes da minha viagem para a casa dos meus pais. Ao menos isso eu consigo. Apenas não sei como dizer para os meus pais o que aconteceu. Implorei muito para que Augusto não contasse para meu irmão. Mas eu não quero ter que me lembrar daquela noite. Na verdade, eu nem sei se vou ter que testemunhar. Encaminho o email do meu chefe ao RH. Assim eu vou poder ficar mais tranquila. Vejo a minha passagem e escolho o assento. Ainda não peguei a passagem de volta. Isso eu ainda não decidi com seu Duarte quanto tempo eu vou tirar. Mas olhando assim de fora, as coisas estão bem calmas. Minha única preocupação mesmo, era Augusto. Mas ele já está mais do que integrado. Então, ficarei um pouco mais de tempo com minha família em casa. Deixo os papéis na portaria e me arrumo para a

reunião com Augusto e Kátia. Assim que eu entro na sala, vejo que não é apenas os dois. Eu não sabia que teríamos alguém de fora. Na verdade, eu nem sei do que essa reunião se trata. Assim que entro, Augusto se levanta com tudo, fazendo a cadeira cair. — Nossa, querido. Estava tão distraído assim que não viu a sua secretária chegar? Ele não responde, apenas me encara com desespero e medo! — O que está fazendo aqui, Juliane? Sua voz sai dura e desesperada. — Kátia disse que vocês iriam precisar de mim. — Me viro para a loira. — Boa tarde, sou Juliane. Sou a secretaria executiva da empresa. — Estendo a minha mão para ela que aperta firmemente. — Ah, você é Juliane? A moça que ficou cuidando do meu noivo enquanto eu chegava. Eu posso ouvir o meu coração se quebrando em vários pedaços. Deixo as coisas que estavam em minhas mãos caírem. Inconscientemente, levo minhas mãos ao meu pescoço. Bem em cima da marca que ele deixou em mim enquanto me comia na pequena sala. Eu nunca imaginei que seria isso. Nem mesmo passou por minha cabeça. Mas tudo faz sentido. E quando me

lembro da pergunta que eu fiz a ele no sábado, a verdade vem como um tapa forte na minha cara dizendo quão estúpida e idiota eu sou. — Acho que você não sabia disso! — A loira ri quando vê a minha surpresa. Ela pode estar achando divertido. Ele deve estar achando isso muito engraçado. Eu não consigo olhar para ele. Eu não consigo nem mesmo ouvir qualquer coisa que seja dito. Apenas o ruído dos pedaços do meu coração caindo ao chão. Nem mesmo consigo saber se eu estou respirando. Automaticamente me abaixo e pego os papéis e meu celular. Aperto os meus olhos com força. Lutando contra a explosão dentro de mim. Respiro fundo. E me levanto. Mesmo que meu peito pese mais que uma tonelada nesse momento. Olho para a loira que sem nem saber, me deu a maior surra da vida. — Acho que sou eu. E sim, estou bem surpresa com isso. Ela sorri e segura a mão de Augusto. Mantenho o meu olhar na mesa. — Obrigada por ajudá-lo a se adaptar. — Ela está mesmo agradecida. Dou um sorriso e me viro para Kátia que tem um sorriso arrogante e nojento. Ela sabia. Ela sempre soube.

E o jeito que parece vitoriosa apenas afirma que ela sabia sobre mim e Augusto. Como uma pessoa pode ser tão inescrupulosa dessa forma? — Eu acho que não preciso estar aqui. — Por mim você ficaria. — A peçonhenta diz jorrando veneno. — Mas acho que Augusto não ache a sua presença importante. Eu sinto a tensão do corpo dele chegando até mim. Eu posso sentir todas as emoções fluindo ao meu redor. Mas ao mesmo tempo, sinto como se litros e litros de morfina estivessem por todo o meu corpo. — Se é assim, eu vou voltar para a minha sala. — Arrumo os papéis em minhas mãos e só agora vejo que a tela do meu iPhone está mais do que trincada. Sem olhar para qualquer pessoa, corro para o banheiro, assim me isolando do mundo. Por favor, Juliane, não se atreva a isso. Mas assim que eu me olho no espelho, uma lágrima rebelde cai sobre o meu rosto. A dor já sentida, reaparece depois de anos. Mas dessa vez, com mais força, com mais raiva e muito mais desprezo. É muito doloroso. Queima e me acerta com mais força cada vez que o meu coração bate. Limpo rapidamente o rastro da pequena lágrima que caiu. — Você é mais forte do que isso, Juli. — Digo

limpando minha garganta e enfrentando o meu reflexo mais do que machucado pelo espelho. Ele não está aparecendo, mas está aqui. Eu sinto isso. Limpando um pouco do rímel que mancha o canto do meu olho eu vou para a minha sala. Tento manter a minha maravilhosa energia ativa, mas eu simplesmente não consigo. Dou meia volta e vou até a sala do meu chefe. E assim que coloca os olhos em mim, sabe que tem alguma coisa de errada. Mas eu sei que ele não irá me perguntar, assim como eu não vou dizer a ele. Ah, sim. Eu estava transando com Augusto e acabei me apaixonando assim, na primeira vez que ele me comeu. E agora descobri que ele está noivo. E nem para ser detetive eu sou boa, já que não descobri isso. Não estarei falando isso ao meu chefe. — Eu pensei em sair cedo hoje, se estiver tudo bem. — Pego o meu celular e mostro a tela quebrada. — E quero correr ao shopping e descobrir se eu posso arrumar ele ainda hoje. Seu Duarte arregala os olhos, mas sorri nos seguintes segundos. — Claro, eu não vou mais precisar de você hoje. Eu quero chorar agora, por ele ser tão bom quando eu mais preciso.

— Obrigada mesmo. Vou indo. — Jules? — Eu paro na porta quando ele me chama. — Aconteceu alguma coisa? Eu não queria perguntar, mas desde ontem você está bem estranha. Me viro para encará-lo. E dou algum tipo de sorriso. — Sim, estou apenas pensando em algumas coisas. Não se preocupe, está tudo bem. — Paro novamente antes de sair. — Obrigada mais uma vez por me liberar. Sei que já disse umas milhões de vezes, mas você é o melhor chefe que eu poderia encontrar. Ele parece surpreso com minha declaração. E sem esperar por qualquer que seja a sua resposta, dou meia volta e vou para minha sala pegar a minha bolsa. Eu não perco tempo falando com ninguém. Preciso apenas sair. E eu consigo fazer todo o trajeto para o shopping sem nem mesmo soluçar. Acho que estou dopada com tudo isso. O atendente da assistência técnica é bem legal. — Vou apenas no estoque saber se eu ainda tenho tela para trocar, você pode esperar uns minutos? — Claro. Me sento na pequena poltrona azul esperando o diagnóstico do meu celular. Com os cotovelos apoiados em meus joelhos e as mãos cobrindo o meu rosto. Paro para pensar na grande onda de ruina que minha vida tomou.

Augusto jogou direitinho comigo. Ele se aproximou e me fez cair sobre o seu encanto de rapaz educado e direito. Eu facilitei tudo para ele. Eu pensei que com ele seria diferente. Eu não queria a princípio. Mas como eu poderia lutar com tamanha atração que estava me consumindo? Como resistir àquele charme que consegue o que quer? E o seu cavalheirismo que sempre foi dedicado a mim sem nenhum resguardo. Seu sorriso, humor e dedicação. E teve o jeito que ele cuidou de mim, quando tudo aquilo aconteceu. Como me salvou e me abraçou enquanto eu chorava de medo e de alívio. Quando eu fiquei assustada com o que poderia ter acontecido. Como ele brincou comigo na cachoeira, me fazendo ser uma menina de dez anos mais uma vez. Me fazendo sorrir por mais tempo do que eu me lembro. Me fazendo ser eu mesma como há muito tempo eu não era. Me aceitando quando a maioria das pessoas não conseguiam. Me ajudando a perceber que eu sou única e que devo me aceitar com todas as minhas esquisitices. Me fez sentir prazer como eu nunca havia sentindo. Me adorou com o seu corpo. Me protegeu e cuidou de mim. Fez parte da minha família se apaixonar por ele. Me fez me apaixonar por ele, quando tudo não passou

de uma mentira. Mas agora nada mais vale o que aconteceu. Todos os sorrisos, as declarações, os segredos compartilhados. Nada foi de verdade. Ele mais uma vez apenas conseguiu acrescentar mais um nome à sua enorme lista de pobres iludidas. Eu deveria saber que seria assim. Mas, mais uma vez, o que eu entendo de homem? De relacionamento? Nada. Uma eterna leiga. Então o que eu senti no sábado à noite? O que foi aquilo que eu vi em seus olhos? Nada, apenas o meu coração querendo ver algo que não existiu e nunca vai existir. Quanto tempo vai levar para arrumar a bagunça que está no meu peito? — Senhora, eu posso consertar ainda hoje. Essa simples frase que não tem nada a ver com o que eu estou sentindo, faz com que eu me acabe de chorar em frente ao jovem que está tentando me ajudar. O pobre rapaz não sabe o que fazer. Pergunta se eu quero água ou lenço para limpar o meu rosto. Mas apenas extravaso tudo em meu choro. — Isso é pelo seu telefone? Não se preocupe, ele tem conserto. Por favor, não chore. Sua pergunta inocente me faz rir. Pego o copo d’água que está em suas mãos. Depois de esvaziar o copo, eu

conto a ele toda a história. Nenhum pouco preocupada se ele tem dezoito anos ou não. Às vezes apenas precisamos desabafar com algum desconhecido. — Ele é um idiota! — Diz me entregando outro copo d’água. — Deveria saber que você iria descobrir. E por que mentir? Ele é um idiota por ter feito tudo isso. — Penso a mesma coisa que você. O rapaz segura a minha mão levemente. — Não sei porque ele fez tudo isso. Mas de uma coisa eu tenho certeza. Olho para o pequeno rapaz que parece mais sábio do que eu em toda a minha vida. — Em algum momento ele percebeu o quão especial você é. E quem sabe isso deve tê-lo assustado. Mas não importa, ele viu isso e deve ter se sentido sortudo por ao menos ter estado com você esses poucos dias. E a minha certeza é que ele vai se arrepender amargamente pelo resto da vida dele. Não se pode deixar uma menina como você. Especialmente se ela tem uma coleção enorme de HQ’s e sabe a diferença entre Star Wars e Star Trek. Meninas assim é raro encontrar hoje em dia. Ele consegue me tirar uma risada com esse comentário. — Estou falando sério. E o que vou dizer agora é

mais sério ainda. — Ele se levanta e coloca as mãos no bolso. — É por caras idiotas como ele que existe a frase: Os homens são todos iguais. Mas isso é um erro. Eu posso afirmar a você que eu não faria isso com você, nem com nenhuma garota. E é ele quem sai perdendo. E mais uma vez, você merece mais do que isso. Merece alguém que coloque você no topo. Mas primeiro de tudo, você tem que estar no topo em sua vida. Agora eu vou arrumar o seu celular, acho melhor ir até lá embaixo e comer alguma coisa. Olho para o jovem. Muitíssimo agradecida por ele ter aguentado o drama que eu joguei em cima dele. E faço como ele pediu. Vou me permitir comer muita batata frita essa tarde. Olho para o meu relógio e vejo que são apenas quatro da tarde. Bater perna pelo shopping é a única opção que me resta. Há três semanas eu estava nesse mesmo shopping com Nicole e Augusto. Me divertindo e estragando a minha sobrinha. Agora estou andando sem rumo, gastando tempo enquanto um jovem conserta meu celular. Enquanto eu tento descobrir uma forma de colar meu coração idiota. Vou para a livraria, pego um livro e começo a ler, mas eu não consigo entender nem mesmo a sinopse dele. Chego na pequena cafeteria que tem na livraria e peço um café puro. Não é Starbucks em frente à Cultura na Av. Paulista, mas pode me enganar. Será que meu chefe aceita a ideia de abrir uma franquia aqui?

Provavelmente não! Mas vale a apena a ideia. Eu tento inúmeras formas de não pensar na dor em meu peito, mas é impossível de ignorar. A cada batida é o lembrete que mais uma vez eu fui rejeitada. Deixada de lado. “Eu sou importante Augusto?” Não! “Mas acho que Augusto não ache a sua presença importante.” Por que a rejeição é tão presente em minha vida? Por que eu não posso me apaixonar por alguém que me queira de volta? Por que dói tanto? Qual o problema comigo? Com certeza eu sou uma boa coisa para rir para as pessoas que estão passeando pelo shopping. A menina estranha que está chorando por ter sido enganada pelo chefe. E para piorar, o celular está quebrado. Ω — Não alterei nada nele, apenas o vidro da tela mesmo. — Diz me entregando a coisa mais importante da minha vida. — Vai ficar quanto?

Com tudo isso, eu nem mesmo perguntei se o seguro iria cobrir. Acho que uma dor inesperada em minha conta bancária pode ajudar com a dor insistente em meu coração. — O seguro cobre em casos de corações partidos por idiotas egocêntricos. — Diz me dando uma piscadela. — É como um presente de Natal para você. Eu não queria, mas volto a chorar novamente. O pequeno rapaz já não se desespera como a primeira vez. — Obrigada. — Sem problema. — Ele dá a volta no balcão e meio sem jeito me abraça. Eu retribuo. — Você vai encontrar alguém que vai te colocar sempre lá em cima. Não vai demorar muito. E espero que você deixe esse babaca se virando sozinho na empresa. Infelizmente eu não posso. — Eu trabalho para ele, não posso fazer isso. O rapaz pensa e arruma a gola de sua blusa. — Você pode fazer como da primeira vez. Seja você mesma. Agradeço a ele mais uma vez e vou para casa. Pelo menos uma coisa voltou a ser inteira essa noite. Segurando as correspondências em uma mão e

procurando a chave de casa na outra, eu consigo sair do elevador sem cair de cara no chão. — Já disse para você colocar a chave da sua porta no chaveiro do carro, Juli. Paro ao ouvir a voz que até dois dias atrás era algo que me fazia sorrir. Nesse momento me faz querer voltar ao elevador e ir embora sem rumo. Augusto está do mesmo jeito que eu vi hoje pela tarde. Assim como eu. Só que ele continua com sua arrogância inabalada. Enquanto estou um caco e sem previsão de voltar a ser inteira. Ele desvia o olhar quando seus olhos encontram os meus por segundos. Com certeza percebendo o impacto da dor que eu simplesmente não consigo e não posso esconder. Passo por ele, mas infelizmente encosto com meu ombro em seu peito. Estremecemos juntos com esse contato insignificante. — Precisamos conversar, Juli. Existe apenas uma dolorosa súplica em sua voz. Mas não posso deixar isso me abalar. — A mesma resposta que eu dei a você na primeira vez que me machucou, serve para hoje e vai servir para sempre. — Abro a minha porta e quando vou fechá-la, ele empurra com força o suficiente para conseguir entrar. — Você pode continuar dando essa reposta pra sempre, mas você precisa me ouvir. — Ele fecha a porta

quando está dentro do que deveria ser o meu porto seguro. — E você quer me ouvir. Jogo a minha bolsa no sofá, cruzo os braços e encaro o grande homem à minha frente. Estou exausta e sinto que isso vai apenas sugar as últimas gotas de energia que me restam. Dou a volta no sofá, ficando o mais longe possível dele. E mesmo que eu queira muito sentir raiva dele, estou usando tudo o que me resta para segurar isso dentro de mim, sei que o que eu mais preciso, é saber o porquê. Ele nem começou a falar e já estou chorando. Sento com as mãos em meu rosto e para piorar o cenário, um soluço escapa. Sinto que ele se aproxima, quando sinto suas mãos vindo até mim, grito com ele. — Fica longe! — Digo entre os soluços. — Diga o que tem a dizer e vá embora. Posso sentir a sua impotência. O seu desespero pra me acalentar, mas eu simplesmente não consigo deixar que ele me toque e não sentir nojo. Mesmo que tudo não tenha passado de uma mentira para ele, foi de verdade para mim. E eu não vou estragar um pouco da felicidade que tive em pequenos dias. — Juli... — Só termine com isso de uma vez, por favor. Estou implorando para que ele cause a dor em mim. Implorando para que ele arranque logo o meu coração e

apenas vá embora. Meu Deus, por que isso dói tanto? Por que tem que ser sempre assim comigo? — Eu não queria que… Eu não consigo fazer isso com você assim, Juli. Limpo o meu rosto e o encaro. Eu não consigo saber se ele está angustiado ou desesperado ou com medo. Ou fingindo muito bem tudo isso. Só posso esperar que ele diga o que quer dizer e torcer para que eu não tenha feito o grande papel de idiota que ele guardou para mim. — Não se preocupe comigo. Apenas diga tudo. É a única coisa que eu te peço, e espero que você possa me dar. Ele dá um passo para trás sentindo a frieza de minhas palavras. Sentindo a dor que está fluindo de mim. Augusto engole em seco, passa as mãos por seus cabelos, visivelmente chateado e furioso. Ele está perdendo a sua pose, seu posto de homem controlado. — Paula é minha noiva há sete meses. Eu a conheci em uma conferência que fiz em Brasília, namoramos por mais de um ano e pensei que ela seria a mulher da minha vida. Que tudo seria com ela. Mantivemos tudo às escondidas, não querendo que nada pudesse atrapalhar nossos planos. — Ele conta enquanto anda de um lado

para o outro na minha pequena sala. — Meus pais adoram ela. Ela é essa mulher que está sempre ajudando o mundo. Sempre fazendo de tudo para melhorar projetos. Dá tudo de si. Quem não amaria ela? Ela é tudo isso que você quer. Ela pode dar a você o que você tanto precisa. Mais uma vez, Juliane. Mais uma vez você está sendo trocada por interesses de sucesso. — Mas há dois meses eu descobri que ela me traiu com o primo mauricinho dela. Levanto minha cabeça tão rapidamente que minha cabeça dói. Augusto está olhando para os seus sapatos. Com vergonha e raiva. — Resolvemos manter um pouco de distância e foi quando aceitei a proposta de Duarte para assumir a diretoria. Era o que eu precisava. Distância, algo novo para dar meu espírito. Cidade nova, longe de tudo e todos que estão sempre me apontando como exemplo. Eu vim para cá pensar no meu noivado e se conseguiria me encontrar. Paula me ligava todos os dias, pedindo que não desistisse dela. Dizendo que estava disposta a vir me encontrar e ficar comigo. E eu estava disposto a fazer isso, a pedir isso dela. Mas então, quando eu vou conhecer o meu novo local de trabalho, dou de cara com essa menina nerd que me deu uma lição todos os dias.

Aperto a mão sobre meus olhos, não querendo derreter com o que ele acabou de me dizer. — Você tem que acreditar em mim, Juli. Tudo o que fizemos, tudo o que eu disse a você foi real.... Por… Eu não posso terminar com ela assim. — Então não termine, fique com ela, perdoe ela pelo erro que ela cometeu assim como eu vou fazer com você. — Você não entende... Se eu terminar com ela, tudo o que eu assinei para a empresa vai ser perdido. Uma lágrima cai. Mais uma rebelde se junta a tantas outras que caíram hoje. — Não. — Balanço a cabeça enquanto prendo o meu cabelo. Tirando uma careta dele. — Não tente mais uma vez me fazer de burra. Nada do que você fez foi especial. — Juli. — Ele tenta me segurar. — Por favor, se afaste. — Tiro meu braço do seu alcance. — Não foi importante para você. Se fosse, você teria terminado com ela. Teria se afastado de mim, não teria feito me apaixonar por você. Teria me dado algo para ser meu, mas tudo o que me deu não passou de uma mentira. Me levanto deixando a dor de lado, ficando a poucos centímetros de distância dele. Abraço o meu corpo me protegendo de qualquer coisa que possa me machucar. — Você está certo, eu deixei você se aproximar,

Augusto. Deixei você ficar, dei espaço a você. Sem nem pensar nas consequências. E mais uma vez eu saí machucada. — Limpo uma lágrima, mas outras começam a vir. As lentes dos meus óculos ficam sujas. — Sim, eu estava estagnada, presa no meu mundo protegido, sem nenhuma vontade de sair de casa. E eu deveria ter ficado assim, Augusto. Isso teria me evitado muitas coisas. Teria evitado tudo isso. Toda essa dor que está rasgando o meu peito. Ele dá um passo para trás, sentindo o impacto de cada palavra que dou a ele. — Mas não, você tinha que ter isso, ter mais uma na sua lista. E eu me perguntando: O que foi que ele viu em mim? O que em mim chama a atenção dele? Essas perguntas de menina insegura que aparecem quando o menino mais bonito da escola sorri pela primeira vez para a pobre coitada. Mas eu não sabia que poderia ser algo tão ruim. — Você não é mais uma... — Eu deveria ter dito “não” todas as vezes, mas todo o seu esforço teria sido em vão, não é? Sendo o meu herói, ficar comigo no hospital, cuidar de mim aqui, se preocupando, comprando remédios. Tendo todo o trabalho de falar com a polícia e tudo mais. Não ter caído no seu papo teria sido muito por nada, não é? Mas o golpe final foi a chantagem. E sabemos que isso foi o que te deu a

vitória. Foi o que me fez cair em seus braços. Vou para perto da porta. — Sabe, Augusto, em todas essas noites antes de dormir, eu pensei coisas que em meu coração, eu sentia que nunca mais iria imaginar. Que não tinha porque isso passar pela minha cabeça oca. Eu pensei que você seria a pessoa que ficaria ao meu lado. Como eu sou idiota, como eu sou burra em imaginar que o grande Augusto Belmonte se apaixonaria por mim. Que me escolheria para estar ao seu lado. Que seria a pessoa que pudesse contar. Imaginei que você pudesse sentir o mesmo por mim. Que tudo começaria a dar certo. Que você se apaixonaria do mesmo jeito que eu sou apaixonada por você. Outro soluço escapa de mim. — Eu não sei porque fez isso comigo. Eu não sei porque sempre fazem isso comigo. Qual é o problema em me amar? Augusto dá um passo até mim. — Não! — Levanto a minha mão, parando-o. — É a minha esquisitice? É porque eu sou uma menina que não sai pra beber? Que não me aventuro, porque estou com medo de viver a vida como as outras pessoas? Ou porque atrapalho as ambições de todos? Ele fica calado. Seu corpo está totalmente duro. Quero que ele me diga que o problema não sou eu. Que

tudo é apenas culpa dele. — Por favor, me dê essa resposta! — Eu imploro a ele. Mas a resposta não vem. — Você disse tanto sobre eu não aceitar migalhas. Sobre ser a prioridade de alguém. — Abro a porta do meu apartamento para que ele saia. — Você não é diferente do Eduardo. — Consigo ter um sorriso de ironia nisso tudo. — Mas ao menos ele teve a decência de terminar comigo, antes de erguer uma vida nova. Augusto fica parado me encarado. Ele não consegue dizer nada. — Acho que você já falou o que era necessário. Não se preocupe, eu não vou estragar o seu noivado. Na verdade, eu tenho vergonha que alguém descubra que eu deitei com um homem comprometido. Só não espere sorrisos de mim. Pois eu não consigo esconder como eu me sinto. Augusto caminha até a porta e para na minha frente. Sua mão acaricia suavemente meu cabelo. Fecho os meus olhos soluçando baixinho. Seus lábios estão em minha testa e eu sinto as suas lágrimas banhando o meu rosto. — Você é especial, Juliane.

Nove dias depois.

Eu acreditei que poderia conseguir, acreditei que tudo poderia ser o mais normal possível, que poderia fingir para todos que o meu coração está bem. Claro que a última parte funcionou, já que para todos, eu sou uma solteira que foge de homem como o diabo foge da cruz. Mas infelizmente, eu não consigo esconder como me sinto. Como no dia seguinte de tudo aquilo que dissemos um ao outro no meu apartamento. Cheguei tarde no trabalho naquele dia. Comi na minha sala, não me importando se iria ouvir reclamação depois. Só queria encontrar uma forma de me concentrar no trabalho. E fiquei feliz com a quantidade de trabalho que Silvia deixou em minhas mãos. Não deixei minha mesa até as oito da noite, quando o chefe da segurança veio saber se estava tudo bem comigo. Queria dizer que não, mas menti descaradamente. Com a quantidade de trabalho que tinha, poderia ter levado para casa, mas decidi deixar para o outro dia. Assim eu continuaria em meu mais novo estado: Vegetativo Trabalhista. Porém, não saiu como eu esperava. Porque eu tenho o meu melhor amigo que me conhece e que se preocupa comigo. Sua pergunta me deixou até mesmo comovida: Chegou algum filme novo sobre cachorro na Netflix? Ele sabe como estou apenas em me olhar. Mas preferi deixar Léo de fora da história. É melhor

para ele, e para o estado físico de Augusto. E porque não quero que meu amigo perca o seu emprego. Depois que ele voltou da viagem, foram poucas as vezes em que conversei com ele mesmo. Léo me perdoou por não ter deixado algo para ele. Mas pediu que eu contasse a ele o que havia de errado. Não queria, mas usei outra coisa que estava me incomodando. Disse ao meu amigo que estava ficando nervosa com a chegada do julgamento. Falta apenas quatro dias para que tenha que ir ao fórum. Não é totalmente mentira, mas não é a causa principal. De tudo isso. Tem nove dias que eu tento ser eu mesma, mas simplesmente não consigo. E tem apenas uma maneira de que tudo isso acabe. De que eu posso voltar a minha vida. — Juliane, preciso que você avalie e cadastre esses documentos e dê a Augusto hoje. Kátia me desperta quando joga uma quantidade absurda de papéis em minha mesa. Essa mulher deve ser presa pela quantidade de crime que ela causa à natureza. Sem nem olhar para ela, pego os papéis e começo a fazer o que ela me pediu. — Deve estar sofrendo, não é? Como é difícil ter infelicidade em sua vida perfeita. O veneno escorre em cada sílaba. Sempre que pode, ela ataca. E sempre quando estou de costas para ela. Sempre sendo traiçoeira. Só que hoje minha fiel amiga

paciência, não veio junto comigo para o trabalho. — Qualquer ser humano decente, tem os seus momentos de infelicidade, essas pequenas coisas que nos fazem humanos. Esses pequenos golpes que a vida dá, é um alerta que não somos melhores do que ninguém. Estamos aqui para errar e aprender com os erros. Eu aprendi, mas eu não me arrependo. E se tem uma coisa que eu posso tirar disso, é que minha opinião sobre você sempre foi certa. Me viro para encarar a peçonhenta. Seus olhos estão arregalados. Cheio de ódio e com certeza está explodindo internamente. — Você sempre foi e sempre será falsa. Essa mulher vazia, que apenas o exterior é aceitável. Mas eu te agradeço mesmo assim. Obrigada por ter permitido apanhar mais uma vez, obrigada por me mostrar que eu sou assim, inocente. Mas não pense que você me dizer essas coisas vai me fazer ter ódio de você ou me diminuir. O efeito é contrário, você vai se odiar mais e vai morrer um pouco a cada dia. Volto a me virar para o meu computador e fazer o trabalho que me pediu. Sei que Kátia foi embora, pois ouço seus passos detonando o pobre piso da controladoria. Não me dói em nada dizer isso a ela. Acho que ainda foi pouco tudo o que disse. Mas isso não é o que eu devo pensar nesse momento.

Mas volto a pensar em como melhorar as coisas. Quando Eduardo terminou comigo, fiquei meses sofrendo, mas tinha o estágio me ajudando como distração. Então foi mais fácil arrumar a bagunça que eu era. E ajudou muito não ter ido em todos os lugares que costumávamos ir juntos. Ficar em casa fazendo trabalho e estudando o meu espanhol, foram boas distrações. Mas agora o que me resta é o trabalho. Mas isso não funciona muito bem. Já que a causa do meu sofrimento está a poucos metros de distância. Deveria funcionar, mas não ajuda. Tentei fazer as coisas como da primeira vez, mas eu não estava tão machucada como estou hoje. Não doeu tanto essa traição. Traição. Acorda, Juli, você quem foi a traidora. Eu sei que isso não é verdade, mas eu também sei que de uma forma indireta eu contribui para isso. E por noites demorando a dormir, eu entendo o porquê de Augusto ter fugido, mas não muda ele ter mentido para mim sem nenhum escrúpulo. E por que logo eu? Se ele tinha a peçonhenta se jogando para ele no primeiro dia em que colocou os pés aqui. Me iludo por alguns minutos acreditando no que ele me disse noites atrás. Mas essa ilusão se dissolve quando me lembro que ele saiu sem olhar para trás. Me fazendo ser o erro que ele cometeu em um momento de fraqueza.

Ele não me disse isso. Mas é como me fez sentir depois de tudo. E fazer sentir é pior do que falar, pois o silêncio é a mais concreta resposta diante de todo caos de sentimentalismo que sentimos. E é o que estamos dando um ao outro. Muito silêncio. Esquecendo disso, acesso a minha conta do Spotify e coloco músicas aleatórias para escutar. Espero que o aplicativo me ajude. Faço tudo o que Kátia me pediu. Com anos de experiência, eu termino tudo e vou para a parte mais difícil de tudo isso. Respiro fundo e vou levar os papéis para Augusto. Caminho tão devagar que uma tartaruga conseguiria chegar primeiro do que eu. Nem mesmo o meu ritmo está normal. Tudo faz parecer que eu não sou. É como se estivesse perdendo a minha identidade. Bato à porta e quando ouço a sua autorização, entro devagar. Mas seus olhos estão em mim assim que abro a porta. Augusto me encara como se não me visse há dias, meses, ou como se fosse a primeira vez. Pode ser, já que em todos esses dias, conto nos dedos as vezes em que tive que estar em sua presença. Acho que ele entendeu o meu plano, já que está seguindo ao pé da letra. — Kátia pediu para entregar esses papéis ao senhor. — Fecho a porta e logo os deixo arrumados em cima da mesa dele. — Devo lembrar ao senhor que amanhã terá a

reunião com o consultor da Alfândega e o senhor Duarte quer o senhor presente, ele também perguntou onde prefere a reunião. Seus olhos claros me encaram com tanto sentimento que eu preciso desviar o olhar. Ouço sua respiração se alterar ou será a minha? Não sei. Apenas preciso sair daqui. Olhar para ele e não pensar nas coisas boas que eu vivi com ele, é impossível. É torturador, doloroso. Vê-lo todos os dias é um tapa da vida dizendo que mesmo que eu implorasse para ele ser meu, ele nunca vai ser. — Eu não conheço a cidade direito ainda, se puder me dar a sua opinião. Ele não disse isso. Ele. Não. Disse. Isso. Por que ele tem que fazer essas coisas? Por que ser um babaca completo? Por que não fingir que eu não existo? Continuo olhando para o chão. Eu não quero ver o sorriso sádico em seu rosto, não quero manchar mais a imagem que meu coração criou dele. Minha indiferença não fica comigo quando o assunto é Augusto. Ela é falha. Porque não se pode esconder as coisas de quem se ama. — Vou falar com seu Duarte sobre o local. — Engulo em seco. — Precisa de alguma coisa? Pergunto olhando para o chão.

— Que você olhe para mim. Droga! Balançando a cabeça em negação, digo a ele que não posso fazer isso. Não sem chorar. Dando um passo para trás eu quase bato na cadeira perto da parede. — Se não precisa de mais nada, vou voltar para minha sala. Dou meia volta e chego até a porta. Quando estou com a mão na maçaneta hesito por um minuto e quando vou sair... — Juli. Eu paro, mas não viro para trás. — Tem algo que eu quero que você faça. — Sua voz é baixa e hesitante. Como se não quisesse me pedir isso. — Me deixe olhar pra você, só mais uma vez. Ele realmente não deveria ter pedido isso. Isso nem deveria ter passado por sua mente. — Juli, por favor. Com esse seu pedido, eu sei que não consigo mais com isso. Eu vou dar a ele o que me pede, pela última vez. Assim que me viro para encará-lo, me encosto à porta quando vejo que ele está bem perto de mim. E agora de perto, vejo o cansaço em seus olhos. Sua barba está crescendo, seus cabelos estão revoltos. Augusto parece distraído demais. Algo que não é característica dele. Não sinta pena dele, Juli. Não pense

que ele está sofrendo. Não seja fraca mais uma vez. Augusto dá um passo mais perto, mas para quando percebe que me achego mais à porta. Augusto enfia as mãos em seus bolsos, com certeza para evitar que tente me tocar e sem nem pensar, eu agradeço por isso, porque eu mesma quero tocá-lo. Quero beijá-lo e pedir que ele me escolha. Mas eu não posso fazer isso. Não posso obrigar ninguém a me escolher. — Precisa de algum documento? — Minha voz falha, mas consigo terminar a pergunta. Ele faz que não com a cabeça. — Quero pedir uma coisa a você. — Diz olhando para o chão. — Quero que você seja feliz, que seja sempre você mesma. — Uma de suas mãos saem de seus bolsos indo para os seus cabelos. — Eu me arrependo de como tudo aconteceu. Meu coração para de bater por míseros segundos. — Mas eu não me arrependo de ter tido você por esses dias. Juli, olhe para mim, por favor. — Ele me pede e assim eu faço. Quando nossos olhares se prendem, sinto como se um raio atravessasse o meu corpo. — Eu nunca vou me arrepender disso. Mas está me deixando da mesma maneira. — Eu só não posso ter você para sempre. — Ele

alcança meu pulso e eu permito que ele me toque. — Você merece alguém que te dê tudo e eu não sou essa pessoa. — Augusto entrelaça nossas mãos. — Não vou te pedir perdão, pois eu não mereço, mas eu quero que saiba que você foi, é e sempre será especial para mim. — Sua outra mão toca o meu rosto. — Você é a coisa mais linda que eu já vi. Sua personalidade me acertou em cheio. Vou levar você sempre em meu coração, mas eu não posso fazer isso com você. Augusto dá um passo para trás. — Eu não estarei fazendo seus dias difíceis aqui, vou falar com você o mais breve possível, pedindo apenas o necessário. — Augusto se senta em sua mesa. — Quero agradecer por me ajudar a me adaptar aqui, por ter tido paciência comigo. Fico olhando para ele como se estivesse assistindo um filme de horror. É o último golpe que Augusto acerta em mim. — É apenas isso, senhor? — Abro a porta e o encaro antes de sair. Sem levantar a cabeça ele me dispensa. — Apenas isso, Juliane! Como um zumbi, ando até a minha sala com o meu coração apenas bombeando sangue para o meu corpo. A única função que ele tem nesse momento.

Sentando em frente ao computador que foi meu fiel companheiro em todo esse tempo, percebo que eu tenho a minha decisão. Ω

— Eu posso apenas lamentar por isso, Juli. — Seu Duarte diz cruzando as mãos em cima da mesa. — Não esperava por isso e pra falar a verdade, sempre pensei que você acabaria se aposentando aqui. Agarro as suas mãos, tentando confortá-lo, assim como a mim também. — Sinto muito deixar o senhor na mão, mas eu preciso mesmo ir. Se não fosse tão importante, eu daria um jeito, mas é uma coisa que eu não posso mudar. Sei que eu vou sair apenas com os dias trabalhados... — Claro que não. — É ele quem aperta a minha mão agora. Os seus olhos castanhos transmitem sua tristeza, mas também agradecimento. — Você fez tanto por essa empresa e está na hora dela fazer por você. Eu vou falar com Cristiane e você vai sair com todos os direitos, faço questão de pagar as férias. — Ele aperta minha mão mais uma vez. — Sei que nunca vamos conseguir alguém como você, mas eu agradeço imensamente tudo o que fez por mim, por Karina e pela empresa. — Ele sorri. — Perdi

uma grande secretária, mas eu não vou perder uma amiga e filha. Sem aguentar mais, me levanto e vou até ele para abraçá-lo. Tudo isso, será uma das coisas que eu vou sentir falta. Irei perder um pouco da família que eu tenho aqui. As loucuras que tenho que arrumar, os colegas que estão sempre me fazendo rir de alguma forma. Até mesmo de ser babá eu vou sentir falta. Senhor Duarte me abraça apertado, sinto todo o seu amor por mim quando ele me prende. Eu não consigo e começo a chorar baixinho. — Eu vou sentir muita falta sua, Juli. — Meu chefe me aperta mais em seu abraço. — Mas se está fazendo isso, eu não posso fazer nada, a não ser apoiá-la em sua decisão. — Obrigada. Você com certeza é o melhor chefe que eu vou ter. E foi um grande pai sempre que eu precisei. — Me afasto dele e limpo as minhas lágrimas. — Eu agradeço muito por tudo o que fez por mim. Sempre vou levar você e Karina em meu coração. Ele acaricia meu cabelo e beija minha bochecha uma vez. — Se precisar de alguma coisa, o que quer que seja, pode me pedir, farei o que puder para ajudar você. Pensando assim.

— Tem uma coisa que eu não confio em mais ninguém para fazer.

Dia do Julgamento. Com Leo ao meu lado, o nervosismo parece ceder um pouco por alguns minutos, mas isso muda quando mais três mulheres chegam na mesma sala que eu. Duas delas estão com maridos, eu acho. E a mais nova está com um jovem ao seu lado. — Elas também são vítimas do desgraçado. — Charles, o advogado da empresa, sussurra. — Não se preocupe, você não vai ter que ficar em frente a ele. Aceno para ele e aperto a mão do meu amigo. — Pensei que Augusto estaria aqui com você. Meu corpo tensiona com a menção de seu nome. Eu também queria que ele estivesse aqui e dissesse que ficaria comigo para sempre. Mas ele não pode, já que tem compromisso com uma loira que pode dar a ele tudo o que ele quer. Pensar nisso me faz criar o ódio que eu realmente preciso. Mas não dura muito tempo, porque meu coração é idiota demais e vive se lembrando que eu o amo e vai ser difícil de esquecer isso. Porque ainda estou vendo ele

todos os dias. — Que tal irmos almoçar na sua churrascaria amanhã? Meu amigo pergunta quando Charles é chamado à sala com o juiz e promotor. — Se você pagar! — Tento brincar e até consigo, mas não estou tão divertida. Eu não sei o que vai ser decido lá dentro. E estou ansiosa demais para pensar em comer e fazer planos. Meu amigo sabe o que estou fazendo. Ele, meu chefe e a gerente do RH, são os únicos que sabem que estou indo embora. É melhor assim, eu não quero ter que ficar explicando sobre as minhas decisões para mais ninguém. — Se eu estou chamando é porque eu vou pagar, Juliane. — Leo belisca minha mão. — Assim eu vou poder aproveitar a minha amiga um pouco mais antes dela ir. Deito minha cabeça em seu ombro e o abraço pela cintura. — Desculpe por estar deixando você assim rápido demais. Mas está acontecendo muitas coisas e ainda não posso contar a você sobre isso. — Leo me abraça pelos ombros e acaricia meu braço. — Não quero que fique preocupado comigo, quando deve se preocupar apenas com você.

Ele bufa e me aperta mais. — Eu sempre vou me preocupar com a minha melhor amiga, mesmo que ela vá embora, assim me deixando sozinho. Minha vez de bufar. — Você não está sozinho. Vai apenas ficar sem a sua faz tudo quando acumula muito trabalho. Ω

Charles sai da sala depois de duas horas e com ele dois advogados que parecem ser das outras mulheres que estão na sala comigo. Ele olha para o Leo, que entende o que ele quer dizer. — Vem, Juli. Vamos para um lugar mais tranquilo. Eu fico dura quando penso que tudo deu errado. Leo percebe meu estresse e é rápido em me acalentar. — Está tudo bem, Juli, apenas quero tirar você daqui, tudo bem? Não quero mais estresse para minha amiga. Leo segue Charles para fora do fórum comigo agarrada em seu braço. Leo anda devagar, pensado em mim para não cair. Mas me surpreende que eu não esteja correndo para fora daqui. Acho que é todo o acúmulo de emoções que estão em mim. E me faz estar lerda o dia

todo. — Juliane! — Nós três paramos quando ouvimos meu nome. Leo é o primeiro a virar, ele fica tenso contra mim quando se coloca a minha frente. Fico na pontas dos pés para ver quem me chama e o meu corpo fica mais duro do que eu me lembre. Eu não acho que posso lidar com isso. Não hoje pelo menos. — Ela não está em condições de falar com você hoje, cara. Vocês podem falar depois. Eduardo não se irrita com a proteção que meu amigo detém sobre mim. — Eu sei, eu era o promotor do caso dela. Tanto eu quanto meu amigo ficamos de boca aberta. — Isso faz sentindo. — Charles diz ao meu lado. Ele percebe que estou olhando para ele e me esclarece. — Eu não entendi como o seu processo foi rápido para ter o julgamento e quando o promotor ligou para o meu escritório querendo confirmar os seus dados, desconfiei que ele poderia conhecer você. — Ele olha para o cara que está andando até mim. — Agora faz sentido. Ele deu um jeito de agilizar o seu processo. Eduardo fez isso? — Pensei se você poderia almoçar comigo. — Meu ex namorado parece implorar por isso. Leo me encara querendo saber se eu vou aceitar ou

não. Eu não tenho ideia do porquê a necessidade enorme de conversar. Ele me pediu isso no jantar em que fui atacada. E agora seu desespero por um almoço. Eu acho que devo isso a ele, já que correu com o meu processo, não ajudando apenas a mim, mas como as outras mulheres também. Aperto o braço do meu amigo e sorrio para ele. — Está tudo bem, Leo. É apenas um almoço. — Olho para meu amigo. — E é a única oportunidade de me despedir dele. — Tudo bem. — Ele olha para Eduardo. — Deixe ela em casa, certo? Eu a trouxe no meu carro. Eduardo acena enfaticamente. — Claro. — Eduardo acena com a cabeça para segui-lo. — Vem, podemos comer aquele cachorro quente que você gosta tanto. E ele fez o que prometeu. Me trouxe para a lanchonete que tem o cachorro quente que eu adoro. O garçom é rápido em nos atender e em questão de segundos, estou tentando engolir meu lanche. Eduardo percebe que estou sem fome. — Isso é novo para mim. — Ele aponta para o meu lanche intocado. — Você sem fome é algo que eu não conheço. — Ele serve um pouco de refrigerante em seu

copo. — É sobre hoje? Aceno que não. Eu nem mesmo quero estar aqui. — Pode me dizer o que quer falar comigo? Eduardo me encara por segundos e deixa o guardanapo em cima da mesa. Ele parece entender que eu não quero estar aqui. Ele deve se lembrar que eu não sou uma pessoa que gosto que enrolem comigo. — Direta, não é? Havia me esquecido que você é uma pessoa que gosta de tudo em pratos limpos. — Eduardo suspira. — Eu só quero que você sabia que eu me arrependo muito das coisas que eu fiz a você. Não posso voltar atrás, posso apenas seguir com a minha decisão. Mas em todos esses anos, sempre tive em meu coração a vontade de dizer como você foi importante para mim, Juli. Posso não ter dado o valor que você merece, mas eu te dei o que eu podia. — Mas me trocou por um cargo... Eduardo recebe o meu golpe. Pelo jeito que seus olhos se arregalam, sei que ele não esperava por isso. — Sim, eu fiz isso. E não me orgulho nenhum pouco por isso. Mas eu preciso dizer a você, Juliane. Que você não fez nada de errado. Que nada do que eu fiz teve a ver com você. Minhas decisões foram egoístas e mesquinhas. Não há nada de errado com você, Juli. Você é a mulher que qualquer homem teria o prazer de chamar de sua. E

quem tiver isso, deve agradecer a Deus pelo enorme presente que tem. Eu fico olhando para ele. E mesmo depois de todos esses anos, eu sei que ele diz a verdade. — Obrigada por não ter me escolhido. — Digo me levantando. — Obrigada por me mostrar que o mundo não é esse conto de fadas que sempre imaginei. Ele parece atordoado. — Eu amei você, demais. Idolatrei você como nunca fiz com ninguém. E espero que todas a decisões que fez, tenham sido as certas. Porque você não pode mudar nada. Apenas tente melhorar o seu futuro, como eu vou fazer agora. E obrigada pela ajuda. Isso eu nunca vou esquecer. Dito isso, pego a minha bolsa e vou embora da lanchonete. Dando adeus a uma parte da minha vida.

13 Augusto Belmonte É a sexta noite seguida que eu não consigo dormir. Isso está virando um hábito que me recuso a aceitar. Porém, é difícil quando tudo o que eu mais preciso é uma pessoa. E ela se recusa a me olhar. Tento me convencer de que eu fiz a coisa certa saindo da sua vida, contudo, isso não é a coisa mais fácil de aceitar, quando tudo o que eu mais preciso é dela em

minha vida. Mesmo que me mate a cada segundo, sabendo que ela pode seguir em frente, eu tento acreditar que é o melhor assim. Mas cada dia que ela passa por mim e age como se eu nunca tivesse existido em sua vida, é um soco e um lembrete de que eu a perdi para sempre. Mas eu não posso fazer mais nada sobre isso. Ela aceitou o que dei a ela sem nenhuma objeção. Fiquei noites me perguntando se eu tinha de alguma forma fragilizado a mulher forte, determinada e inteligente que Juliane é. Mas não demorou muito para saber que eu sou idiota por pensar assim. Juliane não iria perder o equilíbrio por um idiota como eu. Ela é mais forte do que a dor que eu causei a ela. Sua educação me diz isso todos os dias em que ela faz o seu trabalho de forma eficiente. Mas eu não vejo o brilho que estava lá todos os minutos. E isso é minha culpa. Mais uma vez a sua confiança no mundo foi abalada pelo que eu fiz a ela. E não foi apenas pela mentira, mas também por ter estragado uma das coisas que ela mais preza no mundo. O seu emprego. Eu sempre vi a dedicação e amor que ela dá por seu trabalho a cada dia. É o seu meio de compensar a falta que sente da família. Dando tudo de bom que ela tem, para não se sentir tão vazia quando chegasse em casa. Se eu pudesse ao menos conseguir apenas um minuto

da atenção dela, diria que eu a amo mais do que jamais fiz na minha vida. O barulho da pasta caindo ao chão me assusta. E fui eu quem deixou cair. Eu amo? Foi isso mesmo que eu pensei? Isso que ecoou em minha mente foi: Eu a amo? Claro que sim. Claro que é isso. Certeza que já sabia disso, mas queria apenas ignorar para deixar que ela seguisse em frente. Mas como eu fico agora quando sei da forma mais profunda que eu preciso dela? Fica a ver navios, porque é um imbecil que não soube fazer as coisas da forma correta. Eu não fiz nada diferente do desgraçado do ex de Juli. Fiz pior. Menti para ela, quebrei a confiança que ela depositou em mim. E escolhi o trabalho em vez dela. Escolhi ter a vida sem graça e monótona, em vez da alegria e loucura que era estar ao seu lado. Eu vivi algo novo nessas semanas com ela. Algo que nunca pensei em experimentar. Mesmo que estivesse sempre medindo meus passos, não me impedia de sentir e aproveitar o que o seu espírito livre me proporcionaria. Seu sorriso contagiante, seu jeito de levar tudo para o lado positivo, a tranquilidade de resolver as coisas mais difíceis e complicadas apenas mexendo em seu celular. A sua obsessão louca por heróis. Nunca imaginei que ter uma garota me explicando vários mundos alternativos

poderia ser tão fascinante e excitante ao mesmo tempo. O jeito que ela é fiel a si mesma em todas as ocasiões. E a inocência. Como foi bom aproveitar a inocência dela em todas as oportunidades que eu tive. Juli pode ser a menina nerd, como ela gosta de ser chamada. Mas ela é fogosa e apaixonante. Eu pude aproveitar cada chance que tive de prová-la. De estar dentro dela, de sentir o fogo que ela esconde muito bem, aflorar na cama, ou no sofá. Ou em qualquer lugar em que esse fogo nos consumisse. Ela me faz perder o controle apenas por sorrir. Apenas em respirar. E quando ela me toca, mesmo da forma mais simples, eu não consigo segurar. Mas não tenho mais isso. Nem mesmo a sua indiferença. Que me mostrava que ela ainda estava sentindo. Mesmo que seja ódio e decepção, mas ela ainda sente algo por mim. Mas essa semana, ela nem mesmo me olha. Tudo levar a crer que eu a perdi. Quando descobri o que Paula fez, me senti... Decepcionado. Mas não deu nem mesmo um terço do que senti quando vi Juli chorando por minha culpa. Saber que eu causei aquelas lágrimas, foi sem dúvida algo que eu nunca mais quero sentir. Não gosto da ideia dela chorando. Sem poder acalentá-la e dizer que está tudo bem.

Sem poder estar com ela em meus braços dizendo que eu estou com ela e nada mais vai acontecer. Uma batida na porta me assusta e me traz de volta ao trabalho. Olho para o relógio do meu computador e vejo que são duas da tarde de quarta-feira. Tenho apenas mais dois dias antes de Juli tirar férias e ir para a casa de seus pais. — Pode entrar. Kátia entra na sala toda sorridente. Eu ainda não consegui descobrir o que fazer com ela. Sei que foi ela quem fez Paula vir para cá. Sei que ela de alguma forma descobriu sobre mim e Juli. Sei que ela fez de propósito para machucar minha Juli, sem nenhum remorso. Não sei o que ela ganhou com isso. Nada, a não ser tirar o brilho que Juliane tem e a megera conseguiu. Mas ainda tenho coisas para fazer com ela. E não vai demorar muito. — Falta apenas a sua assinatura. — Kátia me entrega alguns papéis e um cartão de agradecimento eu acho. — E o que seria isso? Ela sorri em desdém. — Os papéis são a demissão de Juliane e o cartão é nosso agradecimento a ela pelos anos de serviço. Eu acho que não ouvi direito. Demissão de Juliane? — O que você disse? — Pergunto revirando os papéis.

Ela nem precisa me responder. Férias pagas. Sem Aviso prévio. Todos os direitos pagos. Juliana Guedes Couto de Alcântara. Passo por Katia tão rápido, que ela até perde o equilíbrio quando saio da minha sala. Com passos duros e mais do que raivosos, vou até a sala de Duarte, e detenho todos os olhares em mim. Assim que estou em sua sala, vejo que ele está ao telefone. Me encarando, Duarte deve ter percebido que eu já sei do que ele e os outros esconderam de mim. — Como permitiu que isso acontecesse? Ele me encara e cruza os braços em cima de sua barriga. — Não posso fazer nada sobre isso, pedi que ela tirasse férias e pensasse, mas Juli já tomou a decisão dela. — Ele acena para os papéis em minha mão. — Eu posso apenas dar a ela tudo o que ela tem direito e uma boa carta de recomendação. — Ele me encara triste. — Se alguém está mais perdido com a decisão dela, sou eu, Augusto. Estou perdendo uma filha e os dois braços. Eu não sei o que dizer. E se falar, é apenas assumindo a culpa por estar tirando a coisa que Juli mais gosta nessa vida.

— Tem que haver algo que possamos fazer. Tem que ter um jeito de fazer com que ela mude de ideia. — Nada vai me fazer mudar de ideia. Me viro para a porta para encontrar Juliane com papéis em suas mãos. Ela está linda. Seus cabelos estão amarrados em um rabo de cavalo na altura de sua nuca. Seus óculos em uma armação nova, não esconde a sua beleza. Sua calça jeans preta moldando seu corpo da cintura para baixo. A blusa azul apertando seu tronco, deixando seus seios mais volumosos. — O senhor assinou os papéis? — Ela pergunta pedindo os papéis. — Eu preciso levá-los para o RH hoje. Vendo que não darei a ela os papéis, Juli da a volta e entrega o que tem nas mãos para seu chefe. — Eu falei com meu ex gestor, ele me indicou quatro de sua confiança e já dei uma conferida na lista e deixei apenas duas, que sei que será de mais utilidade aqui. Duarte pega os papéis e sorri para ela. — Até mesmo quando está me deixando, você toma conta de mim. — Ele pega a mão de Juliane e beija. — Você vai me fazer uma falta, menina, vai deixar isso aqui, uma loucura sem você. Ela aperta a mão dele e beija-a também.

— E eu vou sentir falta de tomar conta de tudo isso aqui, mas já passou da hora de mudanças em minha vida. Preciso expandir os meus limites. — E você vai conseguir, querida. Ela se vira pra mim e sorri. — Mais tarde passo em sua sala para pegar os papéis assinados. — Ela se vira para Duarte. — Fico pronta em dez minutos. — É tudo o que preciso ouvir. Dito isso ela sai da sala sem nenhuma cerimônia. — Estou levando Juliane para o almoço de despedida, com certeza, não voltarei até as duas da tarde. — Ele se levanta e pega a sua carteira e chaves do carro. — Sei que está chateado por não ter contado a você, mas foi um pedido dela. Os outros só souberam hoje, quando receberam o email. — Eu não recebi nenhum email. — Digo, mesmo que tenha um nó em minha garganta. — Bem, talvez ela tenha esquecido de adicionar o seu endereço. Ou ela não queria que eu soubesse. — Sabe, às vezes não tem como consertar as coisas na hora em que acontece. — Duarte para à minha frente e apontado a chave para mim, ele continua. — E nessas horas devemos correr atrás do prejuízo e arrumar as

coisas. E quem sabe não sai melhor do que antes. Então ele sai da sua sala. Eu preciso fazer uma coisa. Eu preciso fazer alguma coisa. Eu não sei se posso consertar isso.

14 Duas semanas depois. — MAX. HELP ME... I'm FEELING!!!! Eu e meus irmãos gritamos isso junto com Grinch. — Eu já falei para os três pararem de gritar! Mamãe grita da cozinha, nos repreendendo. Estamos os três no enorme sofá da sala de nossos pais. Cass esticada de um lado. Joaquim sentado e eu deitada com a

cabeça no colo do meu irmão. Os três ainda de pijamas com um balde enorme de pipoca com o meu perfil da Netflix aberto em plena manhã, um dia depois do Natal. E não são nem dez da manhã. — Ela nos reprende por estarmos gritando, mas grita conosco por gritarmos. Será que ela sabe que isso não faz nenhum sentido? Minha irmã mais velha pergunta colocando um bocado de pipoca em sua boca. Sim, esse é o nosso café da manhã. E com uma boa e gelada Coca-Cola para acompanhar. — Mães nunca fazem sentido. — Joaquim responde. Estamos os três assim, como se estivéssemos com menos de dez anos. E é o que acontece quando estamos os três reunidos. E isso vai acontecer muito, agora que estamos juntos novamente. Essas duas últimas semanas foram uma loucura. Com a mudança então, nem sei como não matei alguém nesse tempo. Mas deu tudo certo. Quando seu Duarte disse que poderia sim fazer as mudanças, minha e do meu irmão, eu simplesmente dei o melhor abraço que pude. Ele com certeza evitou uma dor de cabeça maior. E eu também, não confiaria em mais ninguém para trazer os meus pequenos tesouros para cá. Ainda não estou em meu apartamento. Mas pretendo nesse mês me mudar para lá. Mamãe e papai ainda insistem que eu fique aqui. E tem

espaço de sobra. A casa antes da reforma era grande. E com a reforma que papai e mamãe fizeram, dá para habitar todo o elenco de Teen Wolf. E se isso acontecesse, queria poder dividir o quarto com os Gêmeos Alfas e depois uma passada no quarto do Derek. Mas eu não consigo mais ficar aqui. Eu amo meus pais, adoro meus irmãos, mas depois de tanto tempo morando sozinha, a independência ficou. Mesmo que eu tenha reclamado de estar sempre só, meu espírito exige o seu próprio espaço. E eu não estou só. Tenho as pessoas mais importantes em minha vida a apenas alguns minutos de distância. Já que meu novo apartamento fica apenas duas ruas abaixo da casa dos meus pais. Com a ajuda de Léo, eu consegui vender meu apartamento em uma semana. Claro, a irmã do meu amigo estava louca para se mudar com o marido. Então ele juntou o útil ao bem agradável. Ela deu o preço que eu queria e com a grana em minhas mãos, comprei o primeiro que me agradou de cara. É maior que o meu antigo, mas a cozinha precisa de apenas uma reforma. De resto, eu mesma dou um jeito. Meu irmão caiu na lábia da minha mãe e decidiu ficar com ela. Bianca também não foi contra, mas claro que vão ajudar com as despesas. E isso é uma coisa que meu pai e mãe sempre nos

dão dor de cabeça. Se com a reforma foi uma batalha árdua para eles aceitarem nossa ajuda, agora conosco sob o teto deles, vão ter que ajudar, não dando shows de teimosia. Mas se tratando de Humberto e Eliza, cabeças duras nem mesmo descrevem. Mas do jeito que minha cunhada é, eles vão ceder rapidinho. Minha irmã nem mesmo liga. Ela é louca e sempre que puder, vai estar debaixo das asas dos nossos pais. Meus pais não ligam, se pudessem arrumar um jeito, ainda teríamos dez anos. Mas eu não quero isso. Estarei sim todo fim de semana com eles, e todos os dias da semana também. Já que estou entrando no negócio da família. Não, não estou fazendo faculdade de Medicina, a única coisa que ainda sei da área é a diferença de Dipirona e Buscopan. De resto, apenas remédios que são ótimos trava-línguas. Entrei no ramo, porque papai precisava de um administrador para a sua clínica. E eu entendo de números e organização. Então, por que não? Papai não aguentava mais trabalhar em clínicas particulares que não lhe davam condições boas para trabalhar, além de não ter quase nenhum repasse de dinheiro. E com o dinheiro que ele tem guardado junto com mamãe, ele resolveu arriscar e chamou meu irmão que, na hora, aceitou. E eu fiquei nos bastidores fazendo o que eu sei fazer de melhor. Arrumar a casa. Em duas semanas consegui

arrumar todo o processo da empresa. E em um acordo com meu pai, usei o que recebi de rescisão e investi na clínica. Eu sei que não vou me arrepender. Porque além de ser algo que eu gosto, estou ajudando meu irmão e pai a fazer o que eles gostam. Joaquim não vê a hora de chegar o grande dia. Faltam apenas alguns dias para começarmos e já temos uma grande procura para o atendimento. Claro que os pacientes fiéis de meu pai vão para onde ele for. Não é por me gabar, mas meu pai é o melhor pediatra que essa cidade já viu. E com os colegas do meu pai, que também estavam se sentindo frustrados, vindo junto com a gente, sei que vamos começar com o pé direito o ano novo. E é por isso que eu estou aqui. Para não deixar que as coisas desandem. Meu pai é um ótimo médico, mas quando o assunto é organização, não é o forte dele. E em nossa primeira reunião, tomei a frente da conversa e disse que tudo o que é referente à administração, será resolvido comigo. Claro que antes de tomar qualquer decisão, irei sempre falar com eles. Ou seja, eu sou o Senhor Duarte e os médicos são os outros gerentes. Quando disse isso em uma mensagem com meu antigo chefe, ele riu demais. Mas gostou da referência. Não tem uma semana que eu não fale com ele. Afinal, foram anos de companheirismo naquela empresa. Não poderia acabar

assim. E eu vou usar tudo o que aprendi com ele e é claro, também pedir conselhos e opiniões quando eu precisar. Uma cutucada em minha cabeça me faz voltar para a sala junto com os meus irmãos. — Estava onde, mocinha? — Meu irmão me pergunta. — Aqui, assistindo Grinch! Ele ri. — O filme está por quatro minutos em pause, porque Cass foi buscar mais pipoca, então você está mentindo. Vamos, mocinha, diga onde estava. Não me faça usar a força. Reviro os olhos para ele e me sento com os joelhos junto ao peito. — Estava pensando em como fizemos as coisas acontecerem nos últimos dias. — Pego o controle e ligo o filme de volta. — Foi uma loucura, mas conseguimos. Meu irmão passa os braços pelos meus ombros. — Claro que conseguimos, nós temos você. — Ele aperta a minha bochecha. — E eu tenho que dizer a você, mais uma vez, obrigado! — Joaquim deita a cabeça em meu ombro. — Não sei se nós conseguiríamos sem você. Reviro meus olhos e percebendo ele puxa o meu cabelo.

— Não menospreze a sua capacidade. — Ele deita em meu colo e me encara firmemente. — Eu não sou o filho mais inteligente porque fiz Medicina como o papai. — E eu não sou a filha mais esperta porque estou sempre conseguindo aumentos e promoções. — Cass diz chegando com outro balde de pipoca. Eu fico olhando para meus dois irmãos que parecem estar em algum tipo de ligação mental. — Você tem os dois em você. Por isso é a filha mais bem-sucedida da família, e eu tenho o maior orgulho de você, sua vaca. — Cass me entrega o balde de pipoca. — Não é verdade. — Puft, claro que é! — Meu irmão já está pegando as minhas manias de falar. — Você é a que tem mais experiência em seu currículo, nem preciso dizer dos vistos que possui. E nem consigo imaginar a sua conta bancária hoje. — Joaquim se senta e me puxa para que possa me abraçar. — Mas não é isso que importa... — O que Joaquim está querendo dizer. — Cass interrompe o nosso irmão mais novo. — É que sabemos que tem alguma coisa de errada com você. — Ela pega o controle e desliga a TV. — E queremos saber o que aconteceu. Ela se vira para me observar. — Não aconteceu nada. — Respondo rápido demais.

— Apenas quis fazer parte da família de novo. Joaquim começa a arrumar os meus cabelos. — Você nunca deixou de ser, mesmo estando longe, Juli. Você sabe disso. — Ele separa camada por camada de meus cabelos. — E na primeira vez que eu citei a você sobre o plano do papai, você ficou animada, mas não ao ponto de deixar tudo e vir se arriscar aqui. E então, dias depois, você me liga de madrugada dizendo que já tem toda a nossa mudança arrumada junto com as passagens. — Meu irmão termina a trança e coloca o meu cabelo delicadamente em meus ombros para não desmanchar o seu trabalho. — Desde quando você faz trança? — Eu e minha irmã perguntamos juntas. Joaquim faz uma careta. — Desde quando eu tenho uma filha que gosta que eu penteei os cabelos dela. Mas o assunto não sou eu aqui. — Ele chama de volta a atenção para mim. — Juli, o que aconteceu para você mudar de ideia? — Nada, eu já disse! — Digo dando de ombros. Cass suspira quando pega as minhas mãos nas suas. — Eu recebi um telefonema do Leonardo, dias depois de vocês chegarem aqui. — Ela olha para Joaquim que parece concordar em me dizer o quer que seja. — Ele pediu para ficar de olho em você, pois tem alguma coisa

te incomodando. — Ela aperta minhas mãos e com o olhar bondoso que usa com as suas criancinhas, ela começa a falar. — Você está diferente, minha irmã, mesmo brincando e sorrindo como faz com a gente, tem algo que está incomodando você. Eu sei disso. — Cass tira os fios de cabelo de meu rosto. — Eu sei que você chora à noite antes de dormir, tem feito isso desde que chegou, eu não aguento mais ver isso e não poder fazer nada. Por favor, minha irmã, me conte o que há de errado, me deixe te ajudar. Deixe que a gente tente te ajudar. — Ela pede quase chorando. Eu não aguento. Eu choro quando tudo dentro de mim se transborda. Joaquim e Cass me abraçam de uma vez. De alguma forma, os dois conseguem se abraçar. Fazendo assim, um sanduiche de irmão, nós três ficando tão próximo quanto possível. — Chore, pode chorar. — Minha irmã sussurra cada vez que um soluço explode. — Tire isso de dentro de você. Joaquim nos solta e vai até a cozinha pegar um copo d’água. — Não conte a mamãe, por favor. — Peço baixo quando ele me entrega o copo. Joaquim sorri e então limpa as minhas lágrimas. — Ela está ocupada demais ouvindo as histórias da neta dela. — Meu irmão beija minha testa. — Eu vou

manter Dona Eliza longe até você se recompor, mas enquanto ela não aparece, me diga o que houve. E eu quero que me diga tudo. Eu conto para eles. E por alguma intervenção divina, eu já não choro mais, mas não consigo melhorar minha fisionomia. Se minha mãe me ver assim, aí é que eu não vou aguentar. Porque mãe é outra coisa. Mas eu me contento com o colo dos meus dois irmãos. — Se eu disser que quero matá-lo, estarei dando um péssimo exemplo para minha filha. E se disse que não quero matá-lo, também estarei dando péssimo exemplo sendo um mentiroso. Eu até sorrio com o seu drama. — Eu posso fazer isso por você, Quiqui. — Cass se levanta com raiva. — O que esse idiota pensa que é? O Rei da Cocada preta? Ela começa a andar de um lado para o outro. — Eduardo teve sorte de não ter esbarrado comigo. Pois estaria bem hábito ao celibato nesse tempo. — Ela se ajoelha à minha frente. — Oh, minha irmã, por que não nos disse antes? Ficou com toda essa dor guardada, manchando esse seu lindo coração. Dou de ombros. — Pensei que conseguiria esquecer assim que começasse a trabalhar. Mas não é a mesma coisa, não

doeu tanto quanto a primeira vez. — Minto e limpo uma lágrima que cai. — Mas... Podemos não falar mais sobre isso? Meus dois irmãos se encaram e parecem deixar isso de lado. — Certo, o que você quer fazer então, maninha? Eu olho para Cass. E espero que ela não tente me impedir. E pelo jeito que ela me encara, eu sei que ela vai tentar. — Quero cortar o meu cabelo. Ω Não doeu tanto quanto eu pensei que seria. Acho que foi mais para um alívio do que perda. Minha cabeça está mais leve e agora tudo será mais prático. Gosto como eles estão arrumados sobre os meus ombros. Nunca pensei que uma mudança radical poderia me ajudar a melhorar o meu humor. — Nunca pensei que você ficaria mais gata, maninha. — Cass aparece ao meu lado e me encara pelo espelho. Ela segura parte do meu cabelo cortado em suas mãos. — Isso vai te ajudar a economizar mais com shampoo. Sorrio para ela e fecho os olhos quando o cara começa a espirrar algum produto em meu cabelo. Eu não

sei o que é. Nunca fui em um salão para fazer nada tão radical quanto hoje. No máximo uma hidratação. — Esse corte deu a você um ar mais ousado. — Cass se apoia na cadeira. — Se colocar um piercing no nariz, vai ser uma Geek bem fodona. — Nada de piercing! Joaquim diz de onde está. Ele está folheando uma revista de barbas. — Não tente estragar o seu lindo, rosto. — Digo me levantando e pegando o meu cartão de crédito. — Nada de barba. Meus irmãos me acompanham enquanto eu faço o pagamento. E agora eu me lembro porque salão era uma coisa semestral na minha vida. Apenas um corte e escova já pagaria a minha conta de telefone. — Podemos ir para casa? Estou morrendo de fome. — Joaquim diz desligando o alarme do seu carro. Conseguimos trazer tudo conosco. Seu Duarte não deixou nada para trás quando me ajudou com a mudança. E nossos carros foram os primeiros a chegarem aqui. — Podemos levar mamãe e papai para jantar fora. O que acham? — Ele pergunta quando entramos no carro. — Tirar a mãe da cozinha essa noite. — Quero comer alguma coisa gordurosa. Com bastante batata frita e sorvete de sonho de valsa. — Digo

salivando apenas em pensar nisso. — Tô dentro. — Cass praticamente grita. — Mas sorvete de morango. — Eu acho que sou adotado. — Joaquim geme do banco do motorista. — Eu não sei de onde vocês tiram tanta vontade de acabar com seus corpos. Minha irmã e eu sorrimos quando ele sai com o carro para nossa casa. Ω — Eu quero conversar com a senhora depois. Bastou minha mãe dizer isso que o meu humor foi para o espaço em milésimos de segundos. Estava muito enganada em pensar que eu poderia enganar a mulher que me deu à luz. Certo, eu pensei mesmo que estava dando certo e que conseguiria manter assim, até que meu coração estivesse sarado mais uma vez. Porém não entreguei logo de cara que há algo de errado. E não estou fingindo a minha alegria, estou mesmo feliz com essa noite em família. Olhando assim do final da mesa, observo que papai e mamãe se olham como se fosse a primeira vez que se vissem. E observando isso, um dos pedaços rachados do meu peito conserta por alguns instantes.

Com certeza eles são realizados na vida, tendo uma família que é unida. E o principal, os dois estão juntos, acho que isso é a coisa mais importante para eles. — Vovô, eu quero sobemesa! — Nicole diz o desejo de todos. — E o que minha princesa quer de sobremesa? — Papai praticamente ronrona para ela a sua pergunta. O velho é um babão total quando se trata da sua neta. — Sorvete! Meu velho é rápido em chamar o garçom, mas para o meu desespero, eles não têm o que eu quero. Mamãe sorri e pega sua bolsa. Ela chega até mim. — Tem uma sorveteria aqui na esquina que com certeza tem o que você quer. Mas o que ela quis dizer: Vem, agora eu vou poder conversa com você sozinha. E ai de você se não me contar. E eu, como a boa e obediente filha que sou, vou. Arrumo a jaqueta sobre mim. Já que hoje o tempo está frio. E acho que vai ser assim o dia todo. Campo Grande é um gelo em relação à Manaus. Tudo é um gelo em relação à Manaus. Com os braços entrelaçados juntos ao de minha mãe, vamos até a sorveteria. Sim, estou reclamando do frio,

mas eu quero sorvete de sonho de valsa. Assim que eu tenho uma taça média em minhas mãos, mamãe me leva para fora da sorveteria e me faz andar lentamente ao seu lado. — Seu cabelo está lindo assim, filha. — Obrigada! Acho que eu precisava de um fechamento. Algo que me representasse a mudança que tive. — Agora que você tem o que quer, pode ir me dizendo que aconteceu. — Sua voz é suave. — E não tente me enrolar, garota. E conto para ela. Mamãe me conhece melhor do que eu mesma. Me fez contar enquanto eu comia uma das coisas que me acalentam. E eu nem mesmo percebi o jogo dela. Essa Mamusca! — Então você apenas resolveu pegar as suas coisas e correr para cá?! — Do jeito que ela diz, parece que é um pecado. — Estou decepcionada, Juliane. — Diz com as mãos na cintura. — Eu não criei você para fugir quando na verdade tem que lutar. Descarto a taça e me viro para a mulher que eu mais amo nesse mundo. — Sim, eu devo ter fugido. Sim, deveria ter lutado e o que mais quer que a senhora pense. Mas eu estava

cansada, mãe. Eu ainda estou cansada de tudo isso. E o que está me ajudando, é o novo trabalho. E esse foco que minha vida está tomando. Então se deixar para trás o que me decepcionou é fugir, então fiz assim. Mamãe ouve o que digo e logo me abraça. — Ele te machucou muito, não é? Aceno que sim. — Não estou julgando você, querida. Deus sabe que eu fui uma idiota quando se tratava de seu pai, mas acho que ainda tinha algumas coisas para você resolver antes de ir. — Por que diz isso? Ela faz uma cara de paisagem. E isso só acontece quando ela sabe de alguma coisa. — Mãe, por que diz isso? Ela me abraça e caminhamos de volta para onde estão nos esperando. — Intuição de mãe. — Ela beija minha bochecha. — Isso eu tenho desde que Cass foi concebida. E eu aprendi a ouvi-la. — Mãe, eu não gosto quando fica falando assim. Ela ri e começa a andar na minha frente. E então me lembro do que meu irmão disse hoje de manhã. “Mães nunca fazem sentido.”

Assim que paro em frente ao restaurante em que estávamos, meu telefone começa a tocar. — Ei, sumido! Digo atendendo o meu amigo. — Juli, eu nem sei como te contar. — Léo diz eufórico demais. Vejo meus irmãos indo até o caixa e corro para rachar a conta. Do jeito que somos, vai ter briga. — Aguenta aí, rapidinho. — Peço a ele. — Divida a conta em três, por favor. — Sério, Juli. — Minha irmã pega o seu cartão e praticamente joga na cara da moça. — Toda a conta nesse cartão. Joaquim puxa o cartão dele. — Meninos! — Papai tenta nos repreender, mas não dá muito certo. — Sério, gente, vamos rachar, assim ninguém morre. — Digo apoiada em cima do balcão. — Aguenta aí, Leo. — Digo ao telefone. — Claro! — Consigo ouvir a resposta dele. Todos começam a saudá-lo. Gritando, é claro, e chamando a atenção para a gente. Essa é a minha família. Depois de termos rachado a conta, vamos até o Escalade do papai. Ele tem esse carro desde que descobriu que

seria avô. E vem muito a calhar quando estamos todos juntos. — Então, amigo, comece do princípio. Léo ri e então despeja a novidade em cima de mim. — Eu sou o mais novo gerente de matérias, Juli! — O que? — Grito e todos param para me olhar. — Desculpe. — Digo cobrindo o telefone. — É ataque de meninas. — Volto para meu iPhone. — Como foi que isso aconteceu? — E eu sei?! — Ouço ele abrindo a porta do seu apartamento. — Eu nem mesmo sabia que Kátia estava indo embora. — Ele ri alto quando diz isso. — Juli, você perdeu a melhor cena que aquela empresa já viu. Papai espera eu entrar no carro para poder fechar a porta. Ele aponta para o cinto de segurança. Revirando os olhos, eu coloco e recebo um puxão de orelha por isso. — Uiiii. O que aconteceu? Desculpe, papai puxou minha orelha por não querer usar o cinto. — O cinto, Juli. Sempre use o cinto. Mas voltando. Kátia nem sabia que ela estava sendo demitida. Ela apenas recebeu a notícia de que estava indo embora. UAU! — Detalhes, Leonardo! Detalhes. Ouço ele mexer em alguma coisa.

— Bem, Cristiane deu a notícia para ela. Eu apenas tive a sorte de estar no RH e ver o pequeno escândalo que ela deu. — Era esperado. — Digo em desdém. — Mas ainda não te contei a melhor. — Está esperando o que? — Eu tento falar baixo dentro do carro, mas eu simplesmente não consigo. — Augusto ameaçou chamar a segurança se ela não se acalmasse. Ele tinha que estragar o momento. — Você deveria ser um amigo legal e ter filmado a vergonha alheia. — Minha irmã ri quando digo isso. — Até Cass concorda comigo. — Eu posso tentar conseguir as imagens com o pessoal da segurança e se disser que é para você, com certeza eu vou conseguir. — Eu perdi isso. Mas agora faz sentido. — Penso alto e nem deveria. — O que faz sentindo, Juli? Todos no carro estão em silêncio me ouvindo conversar com meu amigo. E não há nada para esconder então. — Semana passada, seu Duarte me ligou para falar sobre o seu desempenho como supervisor, pensei que era

apenas para um aumento de salário. E você sabe que eu guardo tudo, então pedi para ele procurar a pasta dos resultados do nosso último treinamento de líderes. Eu não tenho nenhuma resposta. — Léo? — Olho para o telefone e ele está ativo. — Léo, está me ouvindo? — Obrigado, Juli! — Diz baixo. — Eu consegui isso graças a você. — O que? Claro que não, bobo. Você conseguiu isso sozinho. E eu nem sabia o que estava acontecendo. Se você está na gerência agora, é tudo mérito seu. E só te lembrando, eu não estou mais aí para salvar a sua pele. Mais responsabilidade agora, homem! Leonardo ri. — Eu falo com você depois, vá curtir a sua família. Faço uma careta. — Já estou quase matando meus irmãos. Mando uma mensagem quando chegar em casa. Mamãe segura a minha mão. — Está tudo bem? — Aham! Leo ganhou uma promoção. — Encosto minha cabeça no banco. Eu, Cass e mamãe estamos no banco de trás, enquanto Bianca e minha sobrinha estão com o espaço do meio, e Papai e Joaquim em uma

conversa baixa na frente do carro. — Isso é bom, porque ele é ótimo no que faz. Mas é péssimo também. — Olho para mamãe que não entende o que digo. — Eu não estou mais lá para salvar a vida dele. Ela apenas ri. Papai estaciona o carro em frente de casa e Joaquim pede para esperarmos no carro. — O que há de errado? — Mamãe está preocupada. De onde estou eu posso ver um jovem rapaz em uma moto. Acho que meu irmão quer saber se ele é perigoso antes de sairmos do carro. Papai vem até o carro e pega a sua neta. — É apenas um entregador. — Às nove da noite? — Cass pergunta fechando a porta. — Ele recebeu quanto de gorjeta para esperar nesse frio. Cinquenta conto? O rapaz ri. — Algo como isso. — Ele olha para o papel. — Quem é Juliane? — Eu! Não é nenhuma mensagem de morte, né? Ele me entrega o papel e vai até a sua moto onde tem uma enorme cesta. De dentro dela, ele tira rosas vermelhas. Minha irmã pega minha bolsa na hora. — Eu apenas preciso de uma foto sua com as flores. — Diz pegando o seu celular.

— Podemos fazer melhor. — Minha irmã pega o meu iPhone e tira a foto. Tenho certeza de que estou com cara de idiota nela. Ela envia por mensagem para o celular do carinha, que com a prova de que me entregou a encomenda nos deseja boa noite e vai embora. Pego o cartão e vejo a mensagem. Tinha suspirado Tinha beijado o papel devotamente Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades E o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas Como um corpo ressequido que se estira num banho tépido Sentia um acréscimo de estima por si mesma! E parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante... Onde cada hora tinha seu intuito diferente Cada passo conduzia um êxtase... E a alma se cobria de um luxo radioso de sensações... Até tento ter um tico de raiva, mas eu não consigo. Na verdade, não sinto nada além de frio. — Vamos entrar? Está frio demais e Ly pode acabar

resfriando. Papai concorda, mas me olha intrigado. Com um olhar que dou a minha mãe, ela entende o meu pedido e distrai o papai mostrando alguma coisa que ela quer arrumar na varanda de casa. Com as rosas em minhas mãos, entro em casa. E meus dois irmãos atrás de mim. — Boa noite, titias. — Nicole diz. Ela está com a cabeça apoiada no ombro de sua mãe. Com certeza esgotada da nossa noite. — Boa noite, meu amor. — Digo colocando as rosas em cima da pequena mesa. — Noite, princesa. — Cass diz já pegando as rosas e o cartão para xeretar. Tiro meu sapato e deito no sofá. Joaquim levanta as minhas pernas e se senta, colocando-as em cima dele. Ouço um suspiro apaixonado vindo da minha irmã. Ela com certeza se encantou com o bilhete. — Ele é bom com as palavras. Bufo com a sua lerdeza. — Isso é o verso da música da Marisa Monte. — Ofereço o meu iPhone para ela. — Está na minha Playlist. Ela se joga do lado de Joaquim. — De qualquer forma, a pessoa é romântica. E quem é ele?

Como se ela não soubesse. — Um idiota que tá perdendo tempo. E eu vou dormir. Eles se encaram, mas decidem por não dizer nada. Melhor assim, eu não quero ter que lidar com os xeretas dos meus irmãos. Nem mesmo me preocupo em dar boa noite para eles. Coloco meu celular para carregar. Olhando para meu quarto provisório, decido que no segundo dia do ano, eu vou preparar a minha mudança. Preciso apenas conseguir um caminhão. E fazer com que meus pais não surtem com isso. Depois de tomar um banho e me arrumar para deitar, percebo que eu não estou com sono. Caçando meu novo fone azul que ganhei do meu irmão, vou para o quintal. A casa já está em silêncio, todos devem estar dormindo, ou quase isso. Com um cobertor velho em volta do meu corpo, me sento na pequena cadeira de balanço que mamãe sempre arruma um jeito de manter, já que papai vive insistindo para ela jogar fora. Como ele conseguiu meu endereço? E por que ainda insistir nisso? É o meu perdão que ele quer? Eu já dei. No momento em que ele saiu do meu apartamento naquele mesmo dia, eu entendi um pouco a sua atitude. E ele mesmo me disse adeus naquela tarde em sua sala.

Não tem porque ficar insistindo em um perdão absoluto. Só se por um passe de mágica eu esquecer que um dia ele existiu em minha vida. Mas como eu sei que isso não vai acontecer, tenho apenas a opção de levar as coisas mais fáceis e agradáveis para mim. Como já deixei para ele. Não estava fácil olhá-lo todos os dias e fingir que não me machucava. Eu não sou feita assim. Não sei colocar um sorriso no rosto e fingir que está tudo bem. Até tentei. E foi um recorde para mim todos aqueles momentos. Mas não foi por tempo o bastante. Uma brisa vem com tudo e aperto mais o cobertor em mim. Eu te dou o meu perdão, Augusto. Ω O sol está bem forte em meu rosto. Pego o travesseiro e coloco em cima da minha cara para dormir mais um pouco. Vou usar o status de férias e ficar aqui. Mamãe não vai se importar se eu levantar às cinco da tarde. Acho que ela vai agradecer por isso, já que de acordo com ela, durmo apenas seis horas. E isso não é saudável. Não é mesmo, mas quando estou me adequando, é o

único jeito de fazer as coisas. E estou sem pressa alguma para fazer alguma coisa hoje. Mas meu telefone parece “pensar” diferente. Uma mensagem do síndico de onde é meu novo apartamento, diz que minha encomenda chegou. Mas não tem nada para chegar pra mim. Tudo está lá. Gemendo, tiro o travesseiro da minha cara e abro os olhos, para ver minha irmã de pé em frente à minha cama. — Esse gemido está muito para orgasmos frustrados, maninha. — Ela estende a mão para mim e me levanta. — O seu novo síndico que por um acaso é um chato de galochas, já ligou duas vezes atrás de você. — Acabei de ver a mensagem dele. Não entendo, eu tenho certeza que eu trouxe tudo comigo, o que será que chegou lá? — E eu é que sei? O apartamento é seu, Juli, não me faz pergunta difícil antes do almoço, que não rola respostas. Diz e sai do meu quarto. Não me resta nada a não ser ir lá e resolver isso. Depois de tomar café – Porque nenhum café se compara ao da minha mãe – pego o meu carro e vou até o pequeno condomínio em que eu vou morar. Um senhor de cabeça raspada sorri quando me vê chegando. — Você deve ser Juliane, certo? — Pergunta quando

me aproximo. — Sim, o senhor deve ser Lauro. — Aperto a mão dele. — Então, o que é que chegou que nem sabia que iria chegar? Eu realmente não esqueci nada e nem pedi nada. — Bem, mas está em seu nome. — Ele pega o papel e me entrega. — E não quero que fique aqui correndo o risco de pegar chuva. Olho para ele sem nenhum pingo de paciência. — E não poderia colocar em um depósito? E se eu estivesse viajando? Ia deixar isso aqui? Ele parece envergonhado. Pegando a chave em minha bolsa, eu vou com o porteiro no elevador, junto com a encomenda. Pego a nota e vejo o que é. Estante de Decoração Yin Yang Eu nunca vi uma dessa na minha vida. E de acordo com a nota, esta é minha. Pego o contato da loja. E eles atendem rapidamente. — Oi, estou ligando para saber sobre uma encomenda. — Peço um minuto para o senhor para abrir a porta do meu apartamento. — Ela está em meu nome e endereço, mas eu não me lembro de ter pedido nada. Será que vocês poderiam me... Meu celular cai com tudo no chão, quando eu vejo o que parece ser a sala do meu novo apartamento. Está totalmente organizada.

— Oi? — Olho para o senhor ao meu lado. — Pode me dizer o que significa isso? — Bem, seu irmão veio arrumar esses dias, ele tem a chave do apartamento e está na lista dos visitantes regulares. Suspiro frustrada demais. Mesmo que esteja arrumado da forma que eu faria, isso não tá certo. Pego o meu celular e desligo a chamada na grosseria mesmo. E ligo para o meu irmão. — Que merda você acha que está fazendo, seu idiota? Vindo no meu apartamento sem... — O que você tá fazendo aí? — Ele grita de volta. — Merda, Juliane, não era para estar aí... — E por que não? Esse é meu apartamento, seu retardado, e eu vou te xingar até ter usado todos os nomes que existem, imbecil. Joaquim ri do outro lado da linha. — Ai, Juliane. Eu não consigo gritar com você, periquita. Mordo a parte interna da minha bochecha. — Eu sim, seu babaca. — Grito com ele. — Pode deixar aqui mesmo, senhor. Olha, Joaquim, espero que você tenha uma boa razão para estar me escondendo isso. — Eu tenho e, por favor, mesmo que não lhe agrade, não me odeie, tá bem? Tudo o que eu faço é para ver a

minha irmãzinha feliz. Agora saia daí. Revirando os olhos eu tento me acalmar um pouco, mas saio mesmo assim. — Eu te mato se alguma coisa acontecer com os meus bebês. Dito isso eu saio do meu apartamento e vou para onde será o meu mais novo emprego.

15 Joaquim está estranho e pelo jeito que Cass olha para ele, eu sei que ela também pensa da mesma forma. E da forma que ele abre e fecha sua mão direita, diz que ele fez coisa que não deveria. — O que há de errado com a sua mão? — Pergunto como quem não quer nada. Assim como todos da família, Joaquim não consegue esconder quando está mentindo. E o jeito que ele olha desesperado para a sua esposa, só me afirma que tem algo

acontecendo. — Tive a proeza de cair quando desci do carro ontem à noite. Acabei ralado a palma. Olho para Cass que retribui o olhar com uma sobrancelha arqueada. — E como os nós de seus dedos estão machucados também? — Minha irmã pega ele na mentira. Se eu não estivesse querendo saber o porquê de ele estar mentindo, estaria rindo da cara de bobo que ele está fazendo agora. Joaquim deixa cair a sua pasta e se atrapalha todo quando se inclina para pegá-la. — Eu me apoiei com a palma e depois com a mão fechada, Cassandra. Por isso está machucado. Tomo o meu café e Cass termina de mastigar o seu pão. — Que jeito estranho de descobrir que meu irmão é masoquista. Bianca se vira para nos olhar e também não resiste e se entrega à gargalhada. Hoje é o dia em que vamos todos voltar ao trabalho. Eu, meu pai e irmão, estamos indo para a clínica antes das nove. Mesmo que na sexta e sábado tenhamos ficamos até tarde, arrumando tudo e treinando as meninas que vão trabalhar na recepção, não queremos ser pegos de surpresa com alguma coisa que possa dar errado.

Cass está inda para a escola onde trabalha. Arrumar o conteúdo do primeiro semestre dos seus pirralhos. E Bianca vai com ela, para conhecer a escola onde sua filha vai ficar. Eu, sendo implicante, perguntei umas mil vezes se eles confiam em Cass para educar a filha deles. Nas primeiras vezes, minha irmã apenas se irritou, depois disso, passou a fingir que não era com ela. — Vá se arrumar antes que eu acabe deixando você aqui, de propósito. — Diz a Cass quando pega a sua filha. Ela corre para o seu quarto enquanto eu fico olhando para o meu celular. Três mensagens de número desconhecido. Cinco ligações perdidas. E eu não irei ler e nem atender. O som da Abertura de Game Of Thrones começa a soar novamente. Número que não está em meus contatos. Deixo o celular tocando até que pare, mas humanos são irritantes quando querem. E o meu celular começa a tocar novamente. — Não vai atender? — Minha cunhada pergunta quando deixa a bolsa de Nicole ao meu lado. — Não! Ela não diz mais nada e vai tomar o seu café. Sem esperar por eles, pego o meu carro e vou para o trabalho. Quando pego as chaves em cima da mesa, vejo as rosas que recebi na semana passada. Elas estão começando a murchar, mas mamãe vai fazer com que elas fiquem lindas

por mais alguns dias. Isso não vai estragar o meu humor. Saindo da casa dos meus pais, entro em meu carro e vou para onde eu posso ter total atenção em algo que não seja o meu coração partido e nem no psicopata que está me ligando a cada meia hora. — Me enganei com você, do mesmo jeito que me enganei com Peter Hale. Puxo o carro para fora de casa. Com o rádio ligado, começam a tocar as antigas. Aumento o volume, nem um pouco preocupada com a poluição sonora. Mas não é poluição sonora quando se trata do rei. Ouvindo a letra agora, eu poderia muito bem atender o telefone e deixar que o imbecil ouça o que a música pode dizer por mim. Você tem a vida inteira pra viver E saber o que é bom e o que é ruim É melhor pensar depressa e escolher Antes do fim Daqui pra frente Tudo vai ser diferente Você tem que aprender a ser gente Seu orgulho não vale nada, nada Você não sabe Nem nunca procurou saber

Que quando a gente ama pra valer Bom mesmo é ser feliz e mais nada, nada — Eu teria ensinado a você, como viver de verdade, idiota. — Sussurro quando eu agarro o volante do carro com mais força. — Eu teria te dado tudo de mim, porque é isso que as pessoas fazem quando amam. Droga! Idiota! Idiota! Idiota. Extravaso todo a minha raiva desses dias no volante. Eu odeio que ele tente contato, odeio que ele me faça voltar a pensar nele. Odeio que ele ainda seja a última pessoa em que penso antes de dormir. Odeio que eu ainda chore todas as noites. — Pare de seu uma menina mimada, Juli. — Digo olhando para o sinal. — Você é maior do que isso. Quem dera se as palavras fossem mágicas e fizessem tudo melhorar. Mas não. A vida é cruel, e não está nem aí se podemos com ela ou não. Mas é bom, a cada rasteira, você aprende a levantar e já não dói mais na próxima queda. Estaciono em uma das sete vagas que a clínica tem. Há dois carros ao lado do meu me dizendo que alguns dos médicos já chegaram. Fecho os olhos e respiro fundo. Querido Deus. Que tudo o que venha a fazer seja o

melhor. Que todas as decisões sejam tomadas com sabedoria. Que meus conceitos continuem sendo o mesmo. Me dê sabedoria e controle. Amém! Eu entro no salão e vejo que começamos com tudo. E isso me faz sorrir amplamente. E eu perco metade do meu dia assim. Arrumando pequenas coisas e ajudando as meninas na recepção. Elas são espertas e pegam rápido as coisas. E os médicos são pacientes e bem-humorados. Espero muito que as coisas continuem assim. Papai e Joaquim não vão almoçar agora, então é a minha deixa para fugir. Depois do almoço, as coisas começaram a acalmar um pouco, mas ainda tem muito trabalho para ser feito. Pegando a minha carteira na bolsa, o meu ramal toca. — Desculpe, dona Juliane. Mas tem um representante querendo falar com a senhora. A menina ao telefone parece incerta. Olho para o relógio e vejo que são duas e quinze e eu ainda não almocei. — Se quiser, posso pedir para ele voltar outra hora. Eu não consigo evitar. Sorrio quando ouço isso. Algumas semanas atrás, era eu quem dizia isso, não pessoas que faziam por mim. Que reviravolta, hein, Juliane?!

— Não, tudo bem, pode deixar ele subir, mas depois dele, eu vou almoçar, minhas pernas estão tremendo. — Claro. — Ouço ela dizer que ele pode vir antes de desligar o telefone. Quando estou me sentando, a porta se abre, revelando o meu mais terrível pesadelo em pessoa. Ele está terrível mesmo. Há um hematoma grande em sua bochecha esquerda. A parte direita de seu lábio inferior está cortado. E dos dois passos que ele deu até entrar, vi como ele segurou sobre as costelas esquerdas. Mas sua chegada inesperada e destruída não me faz ter pena dele. Seus olhos claros estão cheios de medo e saudade. — O que pensa que está fazendo aqui? — Perguntei a ele indo para trás da minha mesa. Colocando alguma barreira entre nós dois. Augusto continua a me encarar, vejo quando ele estremece quando respira profundamente. Ele ainda não me responde. Ele vem até mim, não ligando para saber se eu estou o fuzilando com o olhar ou não. — Você está tão linda. — Ele se ajoelha na minha frente. Seus dedos alcançam uma camada do meu cabelo curto. Augusto sente a textura dele, como se fosse o seu principal alimento. Empurro a minha cadeira para trás me afastando dele.

— Olha, eu não sei o que você acha que está fazendo e não estou nem aí. — Mentira. — Eu estou no meu novo trabalho e não quero que você estrague isso também. Eu não tinha a intenção de magoá-lo, mas foi o que aconteceu. Eu não quero que nenhum de nós dois fique mais machucado do que já estamos. E isso aqui, é tudo o que eu tentei evitar. Por isso vim embora. Augusto não diz nada, ele apenas deita a cabeça em minhas pernas e procura as minhas mãos. Hesito por alguns segundos, mas apenas com um simples contato, eu cedo a ele. É porque você ama esse idiota. Não digo nada, espero por ele fazer. Em nossa última conversa, ele me desejou tudo de bom e que torcia para eu ser feliz. Eu aceitei isso dele e tomei minhas decisões decidindo o que era melhor para mim. E a distância era tudo o que eu precisava nisso tudo. — Augusto? — Me desculpe. — Diz com a voz rouca. — O que você está fazendo? — Pergunto hesitante. Augusto levanta a cabeça e segurando as minhas mãos nas suas, ele me responde. — Eu precisava ver você. — Bem, você já me viu, na verdade. Poderia ter pedido uma foto 3x4 que eu não me importaria.

Ele aperta os seus lábios e acho que doeu quando fez isso pois estremece. Mas ainda consegue sorrir. — Você não atende as minhas chamadas. Eu não respondo a isso. Ele sabe que não respondo a números que eu não conheço. Respirando fundo mais uma vez, Augusto me encara e se põe a falar. — Eu terminei com Paula, terminei com tudo. Sei que meus olhos estão arregalados nesse momento. — Eu deveria ter feito isso no momento em que descobri sobre a traição. — Diz de forma patética. — Pensei que eu a amava naquela época, tentei fazer as coisas darem certo pois achava que ela era a mulher da minha vida. — Ele se levanta devagar e segura as suas costelas esquerdas. — Sente-se. Eu te odeio, mas não gosto de ver nenhum ser humano com dor. — Me levanto, dou a volta e o faço sentar. Ele parece agradecido e admirado com isso. — Você tem o coração mais lindo que eu já conheci, Juli. — Diz simplesmente. Aceno com o queixo para cima para que ele continue a falar. — Mas eu estava apenas acomodado com a vida que estava tendo ao lado dela. As coisas que fazíamos, os planos, tudo o que pensei que era o que eu queria ao lado

da mulher que para mim era tudo, mas não passou de uma maneira idiota de conseguir tudo o que queria, tudo o que eu desejava. Que estaria mais do que satisfeito com isso. — Augusto olha para longe, como se sentisse dor em dizer essas coisas. — Mas não era. — Você diz isso porque teve o coração machucado. Ele me dá um olhar de raiva. Como se quisesse me estrangular por dizer isso. Mas logo suas feições mudam. — Eu também pensei assim, por isso não terminei logo com ela, aceitei a ideia de dar um tempo. Mas no fundo, eu sabia que não poderíamos continuar. Eu me encosto na mesa. Seus olhos vão para os meus braços cruzado abaixo dos meus seios. Estalo os dedos para ele manter o foco. — Desculpe! — Diz limpando a garganta. — Eu estava perdido, querendo saber em que local da minha vida eu me perdi. Porque era isso que eu estava. Perdido. Ele se levanta. E segura as minhas mãos quando eu tento fazer com ele sente novamente. — Não, eu quero ficar próximo de você. — Augusto segura a minha mão. — Eu não descobri isso até você, Juliane. É minha vez de desviar o olhar. — Eu não sabia que estava faltando uma coisa até que eu encontrei de repente. Até que eu vi como as coisas

se encaixavam, até que eu perdi novamente. — Sua mão segura o meu queixo, me fazendo encará-lo. — Paula era apenas um falso brilho que pensei ser importante em minha vida. — Seu polegar contorna os meus lábios levemente. Ter ele assim, perto demais, me deixa estúpida e triste também. Ele olha em meus olhos e vê algo que o faz engolir em seco. — Eu não poderia ter isso com ela. E também não saberia disso se ela não tivesse feito tudo aquilo lá atrás. E eu não descobriria que estaria arruinando a minha vida. — Sua mão desce pelo meu pescoço e deixo que isso aconteça. Mesmo que eu me odeie depois. Que me sinta fraca e idiota, eu sinto falta disso. Sinto falta dele. — Sabe quem fez isso acontecer, Juliane? — Ele pede com a boca próxima a minha. Eu tenho que responder essa pergunta? Sua mão coloca meu cabelo atrás da orelha. Sua respiração quente em meu rosto causa arrepios. Aperto minhas mãos sobre a mesa, evitando de tocá-lo. De sentir a sua pele. Me impedindo de sucumbir ao desejo que tenho por esse homem. — Você, Juli. — Ele beija a minha testa e continua com seus lábios nela por vários segundos. Aperto ainda

mais minhas mãos na mesa. — Você era a luz que faltava em minha vida. Eu fui tão burro por não ter percebido isso antes. Eu apenas não percebi o que era, mesmo se tivesse uma luz de neon indicando você. Mas quando você foi embora... — Augusto, hesitante, limpa as lágrimas que caem do meu rosto. — Eu morri um pouco. Eu não senti nada, nem mesmo quando Paula me traiu. Nada chegou perto da dor que meu coração sofreu quando eu não estava com você. Você... Você é... Nossa! Incrível. Inteligente, esperta, bem-humorada, linda. — Ele olha bem em meus olhos. Seus olhos claros estão com resquício de luxúria. — Gostosa, determinada, com um pouco de loucura que me faz rir em qualquer momento. Com a sua tagarelice que eu não sei mais viver sem. Eu olho para ele, considerando tudo o que ele falou. Eu queria ouvir isso, naquela noite em que ele me deixou sozinha depois de praticamente ter implorado para ele me escolher. Eu queria que isso acontecesse, em vez dele pisar em meu coração. Vou para o lado e saio de perto dele. Limpando as lágrimas que caem, eu me pronuncio sobre a sua súbita vontade de arrumar as coisas. — Você acha que vindo aqui e dizendo tudo isso, vai me fazer te perdoar e me jogar em seus braços? Pela sua cara, você pensou isso. Mas eu não posso, Augusto. Eu não consigo esquecer que você me deixou sem nem pensar. — Um soluço quebra a minha fala. — Você não

pode simplesmente vir aqui e... — Eu escolhi você, Juli. — Ele é rápido em me dizer isso. — Você é importante para mim. Você é a única coisa importante. Eu te amo, caramba! Tremo quando ele diz isso. — A louca aqui sou eu. Não você. Não tente me tirar isso. — Tiro os meus óculos e aperto os meus olhos. — Você disse que me escolheu, mas até quando? Até quando eu vou ser importante para você? Quem me garante que você não vai me deixar por outra loira socialite que é herdeira de alguma coisa? E além do mais, eu não acredito em você. Ficamos olhando um para o outro por vários minutos. Até que eu, não aguentando mais, dou a conversa por encerrado. — Olha, você perdeu tempo viajando até aqui. Eu não vou voltar com você. Eu não tenho mais nada lá. Tudo o que eu tenho está aqui. Só... Só vai embora, Augusto. Eu não estou te pedindo muito. Alcanço a minha carteira e quando estou saindo, eu vejo o embrulho perto da minha impressora. — Eu te trouxe batata frita com bacon. — Ele diz parando atrás de mim. — A Coca-Cola, seu irmão está trazendo, sei que não gosta dela quente, então... Ele deixa a frase no ar.

— Eu vou te mostrar que eu escolhi você para sempre. Ω

Cinco dias depois Eu consigo me encontrar depois de dois dias de mudança. Tudo está em seu devido lugar. Pois meu pai e irmão estavam aqui, como o castigo por eles agirem pelas minhas costas. Mas isso foi fácil de perdoar, pois meu irmão teve o orgulho de me contar que foi ele quem causou os hematomas em Augusto. Por isso os machucados nas mãos. Bem, isso foi um grande ponto para ele ser o irmão do ano. Não sou a favor da violência. Mas aceito o ato, quando se trata de um irmão que quer vingar a irmã que teve o coração machucado por um idiota qualquer. A campainha do meu apartamento toca. Por uma coisa idiota eu abro sem olhar pelo olho mágico. E me arrependo por isso. Augusto está na minha frente, em uma bermuda preta, da mesma cor que sua regata. Ele tem correspondências em suas mãos. — Oi, eu moro aqui ao lado. — Ele aponta para o

apartamento à esquerda. — Peguei por engano as suas cartas. Augusto estende as cartas para mim e eu pego mais perdida que quaisquer pessoas que começam a assistir uma série pela terceira temporada. — Meu irmão bateu demais na sua cabeça? Ele ri e coça sua barba que está começando a crescer. — Eu conheço o seu irmão? Ai meu Deus. Joaquim deixou sequelas no pobre coitado. — Eu pensei em conhecer o meu vizinho, mas acabo por ter uma bela surpresa. — Ele estende a mão — Prazer, meu nome é Augusto, acabei de me mudar. — Juliane. É a resposta automática. — Eu sou novo aqui, pensei se poderia me ajudar a conhecer a cidade. Fechando a cara para ele, dou uma resposta direta. — Desculpe, mas da última vez que eu ajudei um cara, ele acabou por simplesmente acabar com a minha vida. Augusto nem mesmo vacila com minha súbita raiva. Ele parece bem tranquilo consigo mesmo.

— Ele foi um babaca então. — Você descreveu bem. Então, boa caçada por alguém para ajudar você. Eu realmente não posso. — Me dê uma chance. — Ele diz implorando. E percebo que isso não é um jogo para ele. É o meu Augusto falando agora. — Droga, Juli, eu tô aqui. Morando do seu lado, dizendo que eu vou ficar com você. O que mais você quer? Agora ele está gritando. Ai meu pai, lá vem meu primeiro barraco no prédio. — Quer que eu me ajoelhe para você? Eu faço. — Ele cai de joelhos na minha frente e segura minha cintura. — Eu dou um ataque desesperado, Juliane. Respiro fundo e conto até dez. — Entra. — Digo entredentes. — Agora. Ele se levanta rapidamente e entra no meu apartamento. — Sete passos para trás, ou eu te jogo do sétimo andar e não tô nem aí se eu vou ser presa ou não. Augusto me encara nervoso, mas faz o que eu peço. Eu juro que tento manter a calma, mas eu não consigo. — Você está me deixando louca. Me perseguindo no trabalho, ajudando minha mãe no mercado. Agora está morando do meu lado. Que porcaria é essa? Já deu disso, Augusto. Você está ficando psicopata.

— Você está criando um. — Ele se aproxima de mim. — Estou ficando louco. Isso é mesmo possível? Ficar louco por não estar perto de quem se ama? É loucura deixar a nova casa para ir atrás de quem se ama? É loucura alugar um apartamento ao lado do da pessoa que ama, para ficar mais próximo dela? É loucura ficar olhando para uma foto sua com ela antes de dormir? Ficar imaginando as filhas lindas que ela te daria. Ficar feliz das besteiras que ela faz, mas não importa, já que deixa sua vida mais incrível. Me diz, Juliane? Eu estou ficando louco? Augusto parece desesperado. Mas do jeito que ele diz, me faz querer bater na cara dele por vários minutos. — Você poderia ter tido isso, Augusto. É a única coisa que eu digo a ele. Ele recebe o tapa sem nenhum resmungo. Eu não deveria fazer isso, mas é uma pequena vingança. Seus ombros caem e com um último suspiro ele vai embora do meu apartamento. Olho para o relógio e espero dar três minutos. Augusto foi tão forte jogando os seus sentimentos para mim, que eu senti até a última veia ligada ao meu coração. Está na cara que ele me escolheu. Que ele vai ficar comigo. Eu ainda consigo ver a verdade em seus olhos. Consigo sentir o sentimento em suas palavras. E naquele dia na clínica, eu sabia que ele não iria aceitar o

meu primeiro “não” e voltar para casa com o rabo entre as pernas. Mas eu tinha que fazer valer que eu sou mais importante do que ele. Que não era apenas declarar seu amor, que tudo estaria certo. Mas eu sabia que não poderia dizer “não” ao homem que me escolheu. Que mudou todos os planos para me mostrar que eu sou mais importante que qualquer coisa no mundo para ele. Fechando o meu apartamento, dou alguns passos e bato à sua porta. Ouço o seu resmungo do outro lado da porta e sorrio com o seu mau humor. Sorte a dele que eu percebi que o amo e que eu perdoo. Porque se seguisse o plano da minha irmã, ele estaria sofrendo mais do que isso. — O... Hã?... Juli? O... — Ele não fala muita coisa. — Primeiro de tudo: Essa é a sua última chance. Augusto acena intensamente. — Segundo: Eu ainda estou com raiva de você. Terceiro: Eu que dou as regras. Ando até ele que não desgruda os olhos de mim. — E o mais importante. — Seguro o seu rosto. — Eu te amo, Augusto Belmonte. Mais do que eu me lembro de ter amado alguém. E se você é louco, eu sou mais ainda. — Eu beijo a sua boca aberta. — Acho que isso em comum é o bastante para começar do zero, não é?

Ele continua me olhando. Sem entender nada. Vamos ver se ele está totalmente idiota. — Ou podemos começar de onde paramos e você pode me levar para o seu quarto e começarmos a fazer aquilo que sei que você está pensando só por esse seu sorriso malicioso. — Grito a última palavra, já que ele me jogou por cima do ombro. Sim, vamos com a segunda opção.

EPÍLOGO Augusto Belmonte De duas uma, eu peço para que ela pare, ou deixo que ela continue. Eu não vou estragar o momento The Voice que minha mulher gosta de ter quando está tomando banho. Porém, é um problema para nossa boa conivência no prédio. Como cantora, Juliane é uma maravilhosa administradora. Mas eu não vou dizer isso a ela.

Você pode até não perceber Mas o meu coração se amarrou em você E precisa de alguém Pra te mostrar o amor que o mundo te dá Meu alegre coração palpita Por um universo de esperança Me dê a mão A magia nos espera Vou te amar por toda minha vida Vem comigo por este caminho Me dê a mão Pra fugir desta terrível Escuridão De acordo com ela. Essa é a nossa música. Claro, não seria nenhuma música do Coldplay ou Bom Jovi. Minha mulher tinha que ser diferente com músicas. E eu gosto da abertura do Dragon Ball. — Amor, liga para minha irmã e pede pra ela ir na frente comprar as pipocas, eu não quero perder o combo. Eu descobri que amo essa mania que ela tem de gritar quando está no banho. Ou apenas a amo. Juliane deu um novo significado de viver quando apareceu em minha

vida. E cada dia é uma coisa nova que eu sei dela. E sei também, que eu nunca vou me acomodar com ela ao meu lado. — Augusto! — Certo, já estou ligando. — Rindo eu pego o meu celular e mando uma mensagem de texto para minha cunhada. Cassandra consegue ser mais louca que sua irmã, mas só mostra para as pessoas próximas. Recebo um joinha, de Cass. E sei que ela nem está pronto, muito saiu de casa. Nesses últimos dois meses, encontrei algo em mim, desvendei emoções que eram desconhecidas, na verdade, eram renegadas por mim. O que a pessoa certa, não faz por você? Juliane abriu os meus olhos e cada dia amplia meu horizonte, que acontece de ser ela. Nunca fui um cara religioso. Às vezes quando estava com meus pais, mamãe me arrasta para igreja. Na verdade, conto nos dedos, as vezes em que eu entrei em uma por vontade própria. Porém, sempre que eu acordo e vejo, Juliane em cima de mim ou ao meu lado, eu agradeço ao ser supremo por essa mulher ser minha. Mesmo sendo esse ser destrambelhado e cheio de manias, Juliane coloca tudo em ordem na minha vida. Na nossa vida. Houve dias, que pensei de verdade que eu havia perdido minha nerd para sempre. Mas mais uma vez, Juliane me deu uma lição.

Mas eu precisei ser dramático. E faria tudo de novo se fosse preciso. Mas Juli, não precisa dessas coisas. Ela queria apenas uma coisa: Meu amor. E ela tem e sempre terá. Essa menina estranha está grava em mim. Na verdade, ela tomou a minha vida para ela. Que cuida muito bem. Acho que nunca recebi tanto amor em minha vida, quanto estou recebendo isso. Acho que eu nunca dei tanto amor, como agora. A necessidade de saber se ela está bem, feliz e protegida, é a coisa mais importante em minha vida. E é por isso que eu quero que ela se mude para o meu apartamento. Mas Juli é mais teimosa do que esperta. “Eu não vou morar com você. E nem tente falar nisso de novo até três anos”. E mesmo que eu jogue levemente o assunto, ela finge que não ouviu. Apenas diz que precisa apenas gritar que eu estarei aqui em segundos. Então reversamos. Às vezes dormimos aqui e em poucas vezes em meu apartamento. De acordo com ela, seu território é mais confiável. Ela não precisou dizer mais nada. Eu sei que ela ainda não confia em mim cem por cento. E mesmo que ela ainda não consiga, eu vou manter o que eu tenho de crédito com ela. — Ela nem ta pronta! Juliane sai do banheiro nua. Apenas uma toalha

enrolada em seus cabelos. Não contenho o gemido quando ela se abaixa para abrir a sua gaveta de calcinhas. Essa bunda entre tudo é a meu calcanhar de Aquiles. Meu tesão sempre foi para o seu cabelo e continua sendo. Mas quando ela se inclina desse jeito. — Para de olhar para minha bunda e vá se arrumar. — diz tirando a toalha da cabeça e joga na cama. Me levanto e vou até ela. — E nem tenha ideia. — ela se afasta. Pensa que colocando a calcinha vai se proteger de mim. — Tô esperando esse filme tem um ano e minha amiga já disse que ta bom. — Nem uma rapidinha? — É Assassin’s Creed, Augusto. Nem mesmo se Michael Fassbender aparecesse aqui, me pedindo uma rapidinha eu aceitaria. Poderia ficar com raiva por isso. Ter um ataque idiota, mas isso é minha mulher. Ela não tem filtro para dizer o que pensa. — Nem mesmo o Evans? Ela se vira de frente pra mim. Seus olhos semicerrados. Então Juli inclina a cabeça me encarando. — Nesse caso, nós negociaríamos. — Sabe que você machuca o meu ego, falando que

daria para outro homem. Juli se aproxima de mim e segurando a barra da minha blusa, ela tira de mim. — Você sabe que eu te amo, mas é o Evans amor. Já viu aquele cara? O gay dentro de mim, comeria ele no café da manhã. — seu dedo passa por todo o meu estomago. — Eu deixaria você assistir, sem problema. Ela desfaz o botão da minha cala e enfia a mão dentro da minha cueca. Com o primeiro aperto dela no meu pau, meus olhos giram por completo em minha cabeça. — O que você acha? Ela começa a bombear meu pau com um pouco mais de força. Me deixando em segundos. — O que? — O que você, Augusto? Juli baixa minha cueca e tem meu pau por completo em suas mãos. Meus tímpanos conseguem assimilar apenas o batimento do meu coração. E tudo está concentrado apenas em meu pau. — Augusto? — Merda, Juli. — empurro ela contra a sua pequena cômoda e termino o serviço dela. Afinal de contas é o meu nome que ela grita quando goza.

Ω — Precisa de um calmante? — pergunto quando saímos do cinema. — Preciso surtar! — Juli diz indo até banheiro. O plano não saiu como eu queria. Eu não sabia que Juliane levava a sério o assunto de filme. Cass não pode vir, então somos apenas nós dois. Eu queria me comportar como um adolescente e ter uma sessão de amassos na sala do cinema. Mas o tom de raiva que ela me cortou, percebi que não teria isso. Não deveria estar surpreso. Vejo de longe um boneco que Juli me mostrou. Ela me disse que queria esse boneco mais do que tudo. É aquele boneco cabeçudo que ela tanto gosta. Tenho uma ideia, mas penso duas vezes antes de fazer Eu vou mesmo chantagear, Juliane com um boneco? Sim. Se tem um jeito de ganhar o seu sim, é com as suas pequenas obsessões. Pago mais de cem reais nessa coisa. E peço para embrulhar para presente. Assim que sai da loja, vejo Juliane olhando para todos os lados me procurando. Fico aonde estou esperando que ela termine o seu trabalho. Mas ela perde a paciência e me liga. Não atendo até a terceira tentativa.

— Olha para a sua direita. Isso, agora continua olhando que você vai me ver. Ela me enxerga e guarda o seu celular no bolso. Ela está curiosa quando olha para o nome da loja em que estou na frente. — Pensei que tinha se perdido. — Você estava mais perdida. Tenho uma coisa para você. — Me dê. — Ela estende a mão. — Não é assim tão fácil, mocinha. — Coloca a sacola atrás de minha costa. — Você vai ter que dizer sim para aquela minha pergunta. — Não! Minha expressão cai quando ouço essa palavra chata. — Você nem sabe o que é! Pode ser algo que você queira muito, mas não conseguiu. Ela me abraça e tenta pegar o embrulho. — É o que eu estou pensando? — Talvez. Mas deixa eu tentar te comprar. — Com uma mão em suas costas trago ela para mais perto de mim. — Sim, fomos rápidos demais. Sim, eu te magoei muito. Sim, eu sou e sempre serei um idiota. Sim, moramos um do lado do outro. Mas eu quero estar com você a todo momento. Quero ter certeza que estamos construindo algo

junto. Eu te amo, acho que você me ama também e quero morar com você. Viver em pecado, fazer seu pai e irmão me odiarem mais. Juliane olha para o lado pensando. Enquanto eu continuo a encara-la. Esperando que ela seja legal e faça o que estou pedindo a ela. — Você se importaria se fosse no meu apartamento? — Até na casa dos seu pais. — digo rápido. Extremamente ansioso com a sua resposta. — É um Baby-Groot? Aceno que sim. Seu rosto se ilumina com um enorme sorriso. — Eu pago a luz e condomínio, você se vira com o resto. Diz pulando em meu colo. E me beija com toda devoção. Ouço alguns assovios e palmas com o show que ela dá em meio ao shopping. Separando nosso lábios, Juli olha ao redor e olha para uma menina que está nos assistindo encantada. — Ele me deu um Baby-Groot. Eu não aguento, jogo a cabeça para trás e solto uma gargalhada. — Você é única, Juli. Ela se vira para mim e me beija de novo.

— Eu sei. E seu sou sua. Então seja legal e me dê o meu presente.

PLAYLIST Palpite — Vanessa Rangel Ando meio desligado — Marisa Monte Ela me deixou saudade — Skank La Tortura — Shakira Dias atrás — CPM 22 Só por uma noite — Charlie Brown Jr. Segredos — Frejat Na Sua Estante — Pitty Garota Nacional — Skank Vamos Fugir — Skank Vento no Litoral — Legião Urbana My Love — Justin Timberlake Want To Want Me — Jason Derulo Só Hoje — Jota Quest Paradise — Coldplay Big Girls Don't Cry — Fergie The Sweet Escape — Gwen Stefan (feat. Akon)

AGRADECIMENTOS A todos que me apoiam e me dão forças para continuar. Em especial as minhas betas. As quais estão sempre me ajudando, não importa a situação. Sempre me ajudando, mas também puxando minha orelha quase todos os dias. A minha família que agora não tem uma Tati xingando toda hora, já que estou no meu cantinho escrevendo. Mas que em muitas das vezes alguém vem me ver pra saber se eu estou viva. Sara, por ter me ajudado com a revisão e xingado Augusto sempre! A Míddian e Marta, por apesar de tudo que estamos passando, sei que posso contar com vocês. Sei que sou uma vaca chata, mas essa vaca aqui, ama muito as duas. A Kami por me apoiar em tudo. Nem imaginava que eu acabaria gostando de você, minha Guete linda. E uma pessoa em especial, que eu não vou poder citar nomes. Mas quem em sua curta passagem em minha vida, me ensinou muito e que querendo ou não, me ajudou muito com esse livro.

A minha pretinha que nos deixou. Paixão, a pequena cadela da família, em muito tempo foi a minha companheira de quarto, sempre quieta na hora em que estava escrevendo. E quando estava terminando esse livro, ela nos deixou drasticamente. Ela é um anjo agora. E isso me ajuda um pouco, em saber que ela está sob o cuidado de nosso São Francisco. Você vai fazer falta, pretinha. E as leitoras que eu sei que me apoiam e que sempre estão me cobrando. Quero que saibam que a pressão dá certo. Obrigada por tudo! Beijos Tatiana Pinheiro
Entre no jogo - Tatiana Pinheiro

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