Fisiopatologia Porth 9Ed.1

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VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 ■ As autoras deste livro e a EDITORA GUANABARA KOOGAN LTDA. empenharam seus melhores esforços para assegurar que  as  informações  e  os  procedimentos  apresentados  no  texto  estejam  em  acordo  com  os  padrões  aceitos  à  época  da publicação, e todos os dados foram atualizados pelas autoras até a data da entrega dos originais à editora. Entretanto, tendo em  conta  a  evolução  das  ciências  da  saúde,  as  mudanças  regulamentares  governamentais  e  o  constante  fluxo  de  novas informações sobre terapêutica medicamentosa e reações adversas a fármacos, recomendamos enfaticamente que os leitores consultem  sempre  outras  fontes  fidedignas,  de  modo  a  se  certificarem  de  que  as  informações  contidas  neste  livro  estão corretas  e  de  que  não  houve  alterações  nas  dosagens  recomendadas  ou  na  legislação  regulamentadora.  Adicionalmente,  os leitores podem buscar por possíveis atualizações da obra em http://gen­io.grupogen.com.br. ■ As  autoras  e  a  editora  se  empenharam  para  citar  adequadamente  e  dar  o  devido  crédito  a  todos  os  detentores  de  direitos autorais  de  qualquer  material  utilizado  neste  livro,  dispondo­se  a  possíveis  acertos  posteriores  caso,  inadvertida  e involuntariamente, a identificação de algum deles tenha sido omitida. ■ As  autoras  e  a  editora  envidaram  todos  os  esforços  no  sentido  de  se  certificarem  de  que  a  escolha  e  a  posologia  dos medicamentos apresentados neste compêndio estivessem em conformidade com as recomendações atuais e com a prática em vigor na época da publicação. Entretanto, em vista da pesquisa constante, das modificações nas normas governamentais e do fluxo contínuo de informações em relação à terapia e às reações medicamentosas, o leitor é aconselhado a checar a bula de cada fármaco para qualquer alteração nas indicações e posologias, assim como para maiores cuidados e precauções. Isso é particularmente importante quando o agente recomendado é novo ou utilizado com pouca frequência. ■ Traduzido de: Porth’s Pathophysiology: Concepts of Altered Health States, ninieth edition Copyright © 2014 Wolters Kluwer Health | Lippincott Williams & Wilkins Copyright  ©  2009  by  Wolters  Kluwer  Health  |  Lippincott  Williams  &  Wilkins.  Copyright  ©  2005,  2002  by  Lippincott Williams & Wilkins. Copyright © 1998 by Lippincott­Raven Publishers. Copyright © 1994 by J.B. Lippincott Company. All rights reserved. 2001 Market Street Philadelphia, PA 19103 USA LWW.com Published by arrangement with Lippincott Williams & Wilkins, Inc., USA. Lippincott Williams & Wilkins/Wolters Kluwer Health did not participate in the translation of this title. ISBN: 978­1­4511­4600­4 ■ Direitos exclusivos para a língua portuguesa Copyright © 2016 by EDITORA GUANABARA KOOGAN LTDA. Uma editora integrante do GEN | Grupo Editorial Nacional Travessa do Ouvidor, 11 Rio de Janeiro – RJ – CEP 20040­040 Tels.: (21) 3543­0770/(11) 5080­0770 | Fax: (21) 3543­0896 www.editoraguanabara.com.br | www.grupogen.com.br | [email protected] ■ Reservados todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, em quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição pela Internet ou outros), sem permissão, por escrito, da EDITORA GUANABARA KOOGAN LTDA. Produção digital: Geethik ■ Ficha catalográfica

  G917f 9. ed. Grossman, Sheila C. Fisiopatologia/Sheila C. Grossman, Carol Mattson Porth; [tradução Carlos Henrique de Araújo Cosendey, Maiza Ritomy Ide,  Mariângela Vidal  Sampaio  Fernandes  e  Sylvia Werdmüller  von  Elgg  Roberto].  –  9.  ed.  –  Rio  de  Janeiro:  Guanabara Koogan, 2016.

il.

VENDEDOR [email protected]

Tradução de: Porth´s pathophysiology http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 ISBN 978­85­277­2838­6 1. Fisiologia humana. 2. Fisiopatologia. I. Título. 15­25043

 

CDD: 612 CDU: 612

VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Cynthia Bautista,

PhD, RN, CNRN, CCNS, ACNS-BC

Neuroscience Clinical Nurse Specialist Yale New Haven Hospital New Haven, Connecticut (CAPÍTULOS 17, 18, 19, 20) Jaclyn Conelius, PhD, APRN, FNP­BC Assistant Professor Fairfield University School of Nursing Fairfield, Connecticut (CAPÍTULOS 29, 30, 31, 32, 33, 34) Sally O. Gerard, DNP, RN, CDE Assistant Professor of Nursing and Coordinator, Nursing Leadership Track Fairfield University School of Nursing Fairfield, Connecticut (CAPÍTULOS 48, 50) Lisa Grossman, MD, MPH Administrative Chief Resident Obstetrics/Gynecology Columbia University Medical Center New York, New York (CAPÍTULOS 6, 7, 53, 54, 55) Theresa Kessler, PhD, RN, ACNS­BC, CNE Professor Valparaiso University Valparaiso, Indiana (CAPÍTULOS 21, 40) Melissa Kramps, DNP, APRN Nurse Practitioner Memory Disorders Center New York, New York (CAPÍTULO 3) Zachary Krom, MSN, RN, CCRN Service Line Educator: Adult Surgery

Yale New Haven Hospital New Haven, Connecticut VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 (CAPÍTULOS 44, 45, 46) Christine Kurtz, DNP, PMHCNS­BC Adjunct Assistant Professor Valparaiso University College of Nursing Valparaiso, Indiana (CAPÍTULO 21) Jessie Moore, MS, APRN Program Coordinator, Weight Loss Surgery Yale New Haven Hospital – Saint Raphael Campus New Haven, Connecticut (CAPÍTULO 47) Nancy Moriber, PhD, CRNA, APRN Visiting Assistant Professor and Director, Nurse Anesthesia Track Fairfield University School of Nursing Fairfield, Connecticut (CAPÍTULOS 13, 15) Martha Burke O’Brien, MS, ANP­BC, APRN Director of Student Health Services Trinity College Hartford, Connecticut (CAPÍTULO 23) Eileen O’Shea, DNP, RN Assistant Professor Fairfield University School of Nursing Fairfield, Connecticut (CAPÍTULO 2) Kathleen Wheeler, PhD, APRN, PMHNP­BC, FAAN Professor Fairfield University School of Nursing Fairfield, Connecticut (CAPÍTULO 22)

VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Mary Fisler Aebi,

RN, MSN

Associate Professor Mt. Hood Community College Yachats, Oregon Beverly Anderson, MSN, RN Associate Professor of Nursing Salt Lake Community College West Jordon, Utah Lou Anne Baldree, MD Clinical Associate Professor of Nursing College of Nursing East Carolina University Greenville, North Carolina Karen Chandra, RN, MSN, MBA Assistant Professor Harper College Palatine, Illinois Dale E. Collins, MS, RT(R)(M)(QM), RDMS, RVT Clinical Coordinator University of Arkansas for Medical Sciences Massachusetts General Hospital Imaging Associates of Providence Little Rock, Arkansas Kent Davis, MD Professor of Biology Brigham Young University – Idaho Rexburg, Idaho Wendy Dusek, BS, DC Natural Science Instructor Wisconsin Indianhead Technical College New Richmond, Wisconsin Kelly L. Fisher, RN, PhD

Dean and Associate Professor of Nursing VENDEDOR [email protected] Endicott College http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Beverly, Massachusetts Catherine Jennings, DNP, MSN, APN­C Assistant Professor Graduate Nursing Felician College Newton, New Jersey Brian H. Kipp, PhD Associate Professor Grand Valley State University Allendale, Michigan Lori Knight, CHIM Instructor Health Information Management Program SIAST, Wascana Campus Regina, Canada Kay Luft, MN, CNE, CCRN Associate Professor St. Luke’s College of Health Sciences Kansas City, Missouri Dr. Nicholas Lutfi, DPM, MS Associate Professor of Anatomy Nova Southeastern University Ft. Lauderdale­Davie, Florida Barbara McGeever, BSN, MSN, PhD Assistant Professor Neumann University Aston, Pennsylvania Jack Pennington, PhD Assistant Professor Goldfarb School of Nursing Barnes Jewish College St. Louis, Missouri Kathy Sheppard, PhD Chair ADN Program Associate Professor University of Mobile Mobile, Alabama Paula S. Steiert, MS Instructor of Biology

St. John’s College of Nursing VENDEDOR [email protected] Southwest Baptist University http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Springfield, Missouri

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Ao  longo  dos  últimos  30  anos,  Fisiopatologia,  de  Carol  M.  Porth,  adquiriu  significativa  notoriedade  para estudantes  de  enfermagem  e  para  todos  os  profissionais  da  área  da  saúde.  É  um  testamento  do  seu  extensivo conhecimento,  das  suas  habilidades  e  do  seu  comprometimento,  que  resultaram  na  criação  de  um  livro indispensável para estudantes. É uma grande honra perpetuar essa tradição como nova autora da nona edição. O  objetivo  desta  edição  é  manter  o  sólido  alicerce  do  texto  e  ao  mesmo  tempo  atualizar  e  incorporar  os  novos avanços  na  ciência  e  na  tecnologia.  Mais  uma  vez,  clínicos  talentosos,  pesquisadores  e  acadêmicos  contribuíram com suas especializações e seus conhecimentos. A principal ênfase permanece na relação da função corporal normal com  as  alterações  fisiológicas  resultantes  de  uma  doença,  bem  como  na  capacidade  do  corpo  de  compensar  essas alterações  por  meio  dos  mecanismos  da  cicatrização  e  daqueles  que  atuam  para  evitá­las  e  resistir  a  elas.  Embora primariamente projetado como um tratado, o livro também atua como referência útil aos estudantes em todo o seu programa educacional e, finalmente, na prática. As características comprovadamente eficazes nas edições anteriores foram mantidas, e muitas atualizações foram feitas  no  conteúdo.  A  sequência  das  partes  também  foi  atualizada  para  estabelecer  um  encadeamento  lógico  dos assuntos:  dos  conceitos  básicos  aos  mais  complexos.  Criaram­se  estudos  de  caso  para  cada  parte,  os  quais  foram integrados  aos  capítulos  relevantes.  As  referências  bibliográficas  de  cada  capítulo  sofreram,  igualmente, atualização,  e  foi  incorporado  um  selecionado  conteúdo  de  aplicação  clínica  em  todo  o  texto  para  intensificar  a compreensão dos estudantes sobre a fisiopatologia das condições mais observadas. Atentou­se  para  a  incorporação  dos  avanços  mais  recentes  nos  campos  da  genética,  imunidade,  microbiologia  e biologia  molecular.  Quanto  à  tecnologia  em  saúde,  esses  avanços  foram  apresentados  por  meio  da  inclusão  de estudos  internacionais,  diretrizes  da  OMS  e  variantes  de  saúde  de  diversas  populações. Alegro­me  em  apresentar esta  nova  edição  e  em  desempenhar  um  papel  na  continuidade  do  legado  deste  recurso  valioso  para  estudantes  e profissionais de saúde. Sheila C. Grossman   Esta  edição  marca  o  30o  aniversário  de  Fisiopatologia.  Desde  a  primeira  publicada  em  1982,  a  obra  vem  se aprimorando até se tornar um recurso confiável e definitivo para estudantes e profissionais de saúde. O objetivo de cada edição tem sido desenvolver um texto atual, preciso e coerente. Embora a visão e a finalidade da  obra  tenham  permanecido  as  mesmas  durante  todas  as  edições,  os  métodos  utilizados  para  agrupar,  analisar, apresentar  e  disponibilizar  as  informações  sofreram  alterações.  Uma  miríade  de  fatores  culturais,  políticos  e tecnológicos  ajudou  no  aprimoramento  do  texto,  que  hoje  é  um  reflexo  da  comunidade  global.  A  tecnologia possibilitou que eu trabalhasse com colaboradores de todo o mundo, obtivesse informações de fontes aparentemente ilimitadas e as disponibilizasse para um público cada vez maior. A cada edição, a tarefa em mãos era criar um ambiente de aprendizado que, nas palavras de acadêmicos chineses, “abriria as portas ao leitor para o conhecimento”. A arte de introduzir um assunto e suscitar entusiasmo em relação a ele é o que proporciona a autonomia do estudante e, finalmente, sua independência. Enquanto outros textos com base  em  fisiologia  adotam  uma  abordagem  centrada  em  “como  fazer”  ou  fortemente  direcionada  à  aplicação,  essa não é nossa intenção. Em vez disso, este texto ressalta a base científica sobre a qual os componentes práticos das profissões na área da saúde estão fundamentados, estimulando o profissional com o conhecimento e as habilidades a desenvolver soluções criativas em uma carreira dinâmica. Uma estrutura conceitual holística utiliza os sistemas corporais como plataforma de organização e mostra a inter­

relação  dos  sistemas. A  seleção  do  conteúdo  teve  por  base  os  problemas  de  saúde  comuns  durante  a  vida.  Neste [email protected] sentido,  estão  incluídos  VENDEDOR os  recentes  avanços  nos  campos  da  genética,  imunologia,  microbiologia  e  biologia http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 molecular.  Os  conceitos  são  apresentados  de  maneira  lógica  e  compreensível  para  os  estudantes,  direcionando­os desde  o  básico  até  o  mais  complexo.  Os  capítulos  estão  dispostos  de  modo  que  acompanhamentos  comuns  dos estados  de  doença,  tais  como  inflamação  e  reparo,  controle  genético  da  função  e  da  herança  celular  e  processos imunológicos,  apareçam  nos  capítulos  iniciais,  antes  das  discussões  específicas  sobre  os  estados  de  doença  em particular. Entre as principais características desta edição, destacam­se capítulos expandidos sobre saúde e doença; nutrição; sono  e  transtornos  do  sono;  pediatria;  gerontologia;  e  transtornos  do  pensamento,  da  emoção  e  do  humor.  Os avanços  em  saúde  são  apresentados  por  meio  da  inclusão  de  estudos  internacionais,  diretrizes  da  Organização Mundial da Saúde e das variantes da saúde de diversas populações. Muitos  recursos  foram  elaborados  para  facilitar  o  aprendizado;  dentre  eles,  mais  de  700  ilustrações  coloridas  e detalhadas, que expõem as manifestações clínicas de diversas doenças. Os objetivos do aprendizado estão listados no início de cada seção do capítulo, e o resumo do conteúdo de cada seção encontra­se ao final das mesmas. Esse tipo  de  organização  do  conteúdo  encoraja  os  estudantes  a  revisarem  os  pontos  importantes.  Os  boxes  Conceitos fundamentais  em  cada  capítulo  ajudam  os  estudantes  a  compreenderem,  de  fato,  o  assunto,  em  vez  de  meramente memorizarem  o  texto.  Os  boxes  Compreenda,  encontrados  em  alguns  capítulos,  fragmentam  os  processos  e  os fenômenos fisiológicos de modo sequencial, fornecendo percepções sobre as inúmeras oportunidades que a doença apresenta  para  romper  os  processos.  Os  boxes  Exercícios  de  revisão  foram  incluídos  para  que  o  estudante,  ao utilizar a abordagem conceitual, pratique o que aprendeu no intuito de solucionar os problemas relacionados com as situações  dos  clientes.  Outras  ferramentas  úteis  são  o  Glossário  e  o Apêndice,  composto  de  tabelas  com  valores laboratoriais normais. Ao  desenvolver  o  conteúdo  em  relação  às  edições  anteriores,  minha  perspectiva  como  enfermeira­fisiologista conduziu  a  uma  abordagem  com  base  na  relação  da  função  corporal  normal  com  as  alterações  fisiológicas  que ocasionam  a  doença  e  que  ocorrem  como  um  resultado  dela.  Também  frisei  a  notável  capacidade  do  corpo  de compensar essas alterações. A beleza da fisiologia está na integração de todos os aspectos da genética humana, da biologia  molecular  e  celular,  e  da  anatomia  e  da  fisiologia  em  um  todo  funcional,  que  pode  ser  utilizado  para explicar  os  aspetos  físicos  e  psicológicos  da  saúde  alterada.  Em  sua  essência,  cada  edição  refletiu  meu  desejo  de compartilhar  a  beleza  do  corpo  humano  e  ressaltar  que,  na  doença,  assim  como  na  saúde,  existem  mais  coisas “correndo bem” no organismo do que “correndo mal”. Durante  esses  30  anos,  a  composição  do  livro  tem  exigido  um  esforço  significativo.  O  preparo  de  cada  edição tem sido uma tarefa desafiadora e, ao mesmo tempo, despretensiosa. Senti extrema satisfação em envolver o leitor e compartilhar  a  admiração  que  tenho  pela  base  fisiológica  da  vida  e  pela  saúde  alterada.  Com  esta  nona  edição, damos as boas­vindas a uma nova voz à medida que a Dra. Sheila Grossman compartilha a experiência de “abrir as portas para o conhecimento”. Carol Mattson Porth

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Este  livro  aborda  a  relação  da  função  corporal  normal  com  as  alterações  fisiológicas  resultantes  de  uma  doença, bem como a notável capacidade do corpo de compensar essas alterações. De fato, são elas que representam os sinais e sintomas da doença. A utilização de uma obra como esta pode ser simplificada ao investir tempo descobrindo os recursos disponíveis e  localizar  de  imediato  as  informações  quando  necessário.  O  Sumário  no  início  do  livro  proporciona  uma  visão geral  de  sua  organização  e  do  conteúdo,  além  de  fornecer  indicações  a  respeito  das  relações  entre  as  áreas abordadas.  Por  exemplo,  a  localização  do  capítulo  sobre  neoplasias  na  parte  sobre  a  função  e  o  crescimento celulares  indica  que  as  neoplasias  são  produtos  do  crescimento  celular  alterado.  O  Índice  Alfabético  ao  final  do livro pode ser visto como um mapa para a localização de cada tema, uma ferramenta para encontrar rapidamente o conteúdo em diferentes capítulos ou para responder às questões que surgem em outros cursos.

Organização O livro está organizado em partes e capítulos. As  Partes identificam áreas de conteúdo amplo, tais como alterações no sistema circulatório. Muitas apresentam um capítulo introdutório, que contém informações essenciais a respeito da estrutura e da função dos sistemas corporais discutidos na parte. Esse capítulo proporciona o fundamento para a compreensão do conteúdo fisiopatológico apresentado nos capítulos subsequentes. Os Capítulos enfocam conteúdos específicos, tais como insuficiência cardíaca e choque circulatório.

Recursos que auxiliam o aprendizado Em  um  mundo  com  um  volume  cada  vez  maior  de  informações,  você  não  conseguirá  ler,  quanto  mais  relembrar, tudo  o  que  está  neste  livro,  ou  em  qualquer  livro,  em  relação  a  determinado  assunto.  Considerando  isso, desenvolvemos uma diversidade de recursos especiais que o ajudarão a focar e dominar o conteúdo essencial para suas necessidades atuais e futuras. Os objetivos  que  aparecem  no  início  de  cada  seção  do  capítulo  proporcionam  um  foco  para  o  seu  estudo. Após finalizar de cada seção, você poderá voltar a eles e assegurar­se de que alcançou cada um desses objetivos.

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Conhecer a de

De

nição de saúde estabelecida pela Organização Mundial da Saúde

nir 図siopatologia

É essencial que cada profissional utilize e compreenda o vocabulário relativo à sua profissão. Em todo o texto, você encontrará termos em itálico, o que significa que o aprendizado a respeito deles e das ideias a eles associadas é  importante.  Além  disso,  é  fornecido  um  glossário  para  ajudá­lo  a  expandir  seu  vocabulário  e  melhorar  sua compreensão  sobre  o  que  está  lendo.  O  Glossário  contém  definições  concisas  dos  termos  encontrados  com frequência.  Se  você  estiver  inseguro  acerca  do  significado  de  um  termo,  poderá  recorrer  ao  glossário  ao  final  do livro antes de prosseguir.

Boxes Os  boxes  são  utilizados  em  todo  o  texto  para  resumir  e  destacar  as  informações­chave.  Com  frequência  você encontrará dois tipos de boxes: Conceitos fundamentais e Resumo.

Um  dos  modos  de  abordar  o  aprendizado  é  atentar  para  as  principais  ideias  ou  conceitos,  em  vez  de  tentar VENDEDOR [email protected] memorizar uma lista de pequenas informações relacionadas e não relacionadas. Como você provavelmente já sabe, é http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 impossível memorizar tudo o que se encontra em uma seção ou um capítulo. Seu cérebro não só tem dificuldade de tentar descobrir onde armazenar todas as diferentes informações, como também não sabe o que fazer para recuperá­ las  quando  você  precisa  delas.  Além  disso,  listas  de  conteúdos  memorizadas  raramente  podem  ser  aplicadas diretamente a uma situação clínica real, isso se puderem, de fato, ser aplicadas. Os boxes Conceitos fundamentais o orientarão na identificação das principais ideias ou conceitos que formam o fundamento para a compreensão plena das  áreas  de  conteúdo  principais.  Quando  compreender  os  conceitos  nesses  boxes,  você  terá  uma  estrutura  para relembrar e utilizar as informações fornecidas no texto.

Conceitos fundamentais

Comunicação celular



As células se comunicam umas com as outras e com ambientes internos e externos mediante uma série de mecanismos, incluindo sistemas elétricos e químicos

de sinalização que controlam potenciais elétricos, o funcionamento celular global e a atividade dos genes necessária para a divisão e a replicação celulares



As células podem regular sua resposta aos mensageiros químicos aumentando ou diminuindo o número de receptores ativos em sua superfície

Os  boxes  Resumo  ao  final  de  cada  seção  fornecem  uma  revisão  e  um  reforço  sobre  o  conteúdo  principal abordado. Utilize­os para assegurar que compreendeu tudo o que leu.

Resumo

A  célula  é  uma  estrutura  extremamente  autônoma  que  funciona  de  maneira  muito  semelhante  à  do  organismo como  um  todo.  Na  maioria  das  células,  um  único  núcleo  controla  a  função  celular  e  é  o  centro  de  controle.  Ele contém  DNA,  que  fornece  as  informações  necessárias  para  a  síntese  das  diversas  proteínas  que  a  célula  deve produzir para se manter viva e transmitir informação de uma geração para outra. O núcleo é também o local para a síntese dos três tipos de RNA (mRNA, rRNA e tRNA) que se deslocam para o citoplasma e efetuam a verdadeira síntese de proteínas.

Tabelas e quadros As  tabelas  e  os  quadros  são  projetados  para  apresentar  informações  complexas  em  um  formato  que  torna  a memorização  mais  fácil.  As  tabelas  apresentam  duas  ou  mais  colunas  e,  com  frequência,  são  utilizadas  com  a finalidade  de  comparar  ou  contrastar  as  informações.  Os  quadros  apresentam  uma  coluna  e  são  utilizados  para fornecer as informações resumidas. Tabela 2.1

Índice de Apgar.

Sinal

0

1

2

Frequência cardíaca

Ausente

Lenta, < 100 bpm

> 100 bpm

Esforço respiratório

Ausente

Lento e irregular

Bom, choro forte

Tônus muscular

Flácido

Alguma

Movimento ativo

Nenhuma

Caretas

Tosse ou espirro

Pálida, azulada

Corpo rosado, membros azulados

Totalmente rosado

Irritabilidade re

Coloração

exa

exão das extremidades

Extraída  de  Bowden  V.  R.,  Greenberg  C.  S.  (2010).  Children  and  their  families:  The  continuum  of  care  (2nd  ed.,  p.  526). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.

Quadro 31.1

Lesões dos órgãos-alvo





Coração

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°

Hipertro

a ventricular esquerda

°

Angina ou história de infarto do miocárdio

°

História de revascularização coronariana

°

Insu

ciência cardíaca

Encéfalo

°

Acidente vascular encefálico ou ataque isquêmico transitório



Doença renal crônica



Doença vascular periférica



Retinopatia

Adaptado do National Heart, Lung and Blood Institute. (2003). The seventh report of the National Committee on Detection, Evaluation and Treatment

of High Blood Pressure. Publication no. 03-5233. Bethesda, MD: National Institutes of Health.

Ilustrações e fotos As  ilustrações  coloridas  ajudarão  você  a  construir  sua  própria  imagem  mental  do  conteúdo  apresentado.  Cada desenho  foi  desenvolvido  para  respaldar  e  representar  cabalmente  as  ideias  no  texto.  Algumas  ilustrações  são utilizadas  para  que  você  consiga  visualizar  as  complexas  interações  dos  múltiplos  fenômenos  envolvidos  no desenvolvimento de uma doença em particular; outras, para ajudá­lo a visualizar a função normal ou compreender os  mecanismos  por  meio  dos  quais  os  processos  de  doença  exercem  seus  efeitos. Além  disso,  as  fotografias  de processos patológicos e lesões fornecem uma visão realista dos mesmos.

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Figura 13.12 • Órgãos e tecidos linfoides centrais e periféricos.

Compreensão dos processos fisiológicos Os boxes Compreenda enfatizam os processos fisiológicos e os fenômenos que formam a base para a compreensão dos  distúrbios  apresentados  no  texto.  Eles  fragmentam  um  processo  ou  fenômeno  em  suas  partes  componentes  e apresentam­no  de  modo  sequencial,  fornecendo  uma  percepção  sobre  as  muitas  oportunidades  para  que  os processos de doença rompam a sequência.

Compreenda

Metabolismo celular

Metabolismo celular é o processo que converte o combustível alimentar na forma de carboidratos, proteínas e gorduras em ATP que fornece a

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energia necessária ao funcionamento celular ATP é formado por três vias principais: (1) via glicolítica, (2) ciclo do ácdo ítrico e (3) cadeia de

transporte de elétrons. Em seu metabolismo, que é uma reação de oxidação-redução, o combustível cede elétrons e é oxidado, e as coenzimas

+

NAD

e FAD recebem elétrons e são reduzidas.

Via glicolítica A glicólise, que ocorre no citoplasma da célula, envolve a quebra da molécula de glicose de seis carbonos em duas moléculas de três carbonos de

ácido pirúvico. Como a reação que divide a molécula de glicose exige a energia de duas moléculas de ATP, existe um ganho líquido de apenas

duas moléculas de ATP para cada molécula de glicose metabolizada. O processo é anaeróbico e não necessita de oxigênio (O ), nem produz 2

dióxido de carbono (CO ). Quando há O , o ácido pirúvico se desloca até a mitocôndria, onde entra no ciclo do ácido cítrico, que é um processo 2

2

aeróbico. Em condições anaeróbicas, o piruvato é convertido em ácido láctico, possibilitando que a glicólise continue como um meio para o

fornecimento de ATP para as células, mesmo na falta de O . 2

Ciclo do ácido cítrico Em condições aeróbicas, as duas moléculas de ácido pirúvico formadas pela via glicolítica entram na mitocôndria, em que cada uma se combina

com acetil-coenzima para formar acetilcoenzima A (acetil-CoA). A formação de acetil-CoA dá início às reações que ocorrem no ciclo do ácido

cítrico. Algumas reações liberam CO

2

e outras cedem elétrons do átomo de hidrogênio para NADH ou FADH. Além do ácido pirúvico formado pela

glicólise de glicose, produtos da degradação de ácidos graxos e aminoácidos também podem entrar no ciclo do ácido cítrico. Os ácidos graxos,

que são a principal fonte de combustível no corpo, são oxidados por um processo denominado betaoxidação da acetil-CoA para que entrem no

ciclo do ácido cítrico.

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Estudos de caso Novos  nesta  edição,  os  estudos  de  caso  abrem  cada  parte  apresentando  o  histórico  e  os  sintomas  de  um  paciente. Nos capítulos de cada parte, mais informações são adicionadas ao caso, apresentadas nos boxes contendo um ícone colorido,  à  medida  que  se  relacionam  com  o  que  está  sendo  abordado,  mostrando  aos  estudantes  um  exemplo  de aplicação do conteúdo à vida real. Jennifer  tem  1  dia  de  vida,  nasceu  de  parto  vaginal  sem  complicações  de  uma  mulher  primípara  com  46  anos  de idade. Foram observados fraqueza no tônus muscular e aspecto facial irregular, incluindo olhos oblíquos e puxados para cima e um perfil facial achatado, com depressão da ponte nasal. Por ela também apresentar sopro no coração, os médicos se questionam sobre a possibilidade de problemas cardíacos. O pediatra acredita que ela tenha nascido com  síndrome  de  Down  (trissomia  do  21).  Foi  coletada  uma  amostra  de  sangue  para  o  cariótipo  e  enviada  para  o laboratório.  Os  resultados  indicam  47,  XX,  +21;  isso  significa  que  Jennifer  tem  47  cromossomos,  incluindo  dois cromossomos  X  e  uma  cópia  extra  do  cromossomo  21.  Jennifer  e  os  problemas  associados  a  sua  condição  serão discutidos nos Capítulos 4, 6 e 7.

Você se lembra de Jennifer, a recém-nascida do estudo de caso que abre esta Parte? Quando crianças nascem com características

fenotípicas especí

cas, como tônus muscular fraco, depressão da ponte nasal, per

l achatado e olhos amendoados oblíquos e

virados para cima, realizase um cariótipo. Os resultados indicam positivo para trissomia do cromossomo 21.

Exercícios de revisão Uma  importante  ferramenta  foi  introduzida  no  texto  para  ajudar  você  a  avaliar  sua  compreensão  sobre  o  material apresentado. Após finalizar a leitura e estudar o capítulo, responda às questões nos boxes  Exercícios de revisão ao final. Eles foram projetados para que você integre e sintetize os conceitos apreendidos. Se não conseguir responder a uma questão, releia a seção sobre o assunto no capítulo.

Exercícios de revisão

1.

Um homem de 30 anos de idade sofreu uma fratura na perna há 2 meses. A perna foi engessada e o gesso acabou de ser removido. Ele está

impressionado com o grau com que os músculos de sua perna se retraíram.

A.

Você considera isso uma resposta adaptativa normal? Explique.

B.

Essas alterações têm efeito imediato e/ou a longo prazo sobre o funcionamento da perna?

C.

2.

Que medidas podem ser tomadas para restaurar a função completa da perna?

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Uma mulher de 45 anos tem sido tratada com radioterapia para câncer de mama.

A.

Explique os efeitos da radiação ionizante na erradicação de células tumorais.

B.

Por que a radioterapia é administrada em pequenas doses divididas, ou doses fracionadas, em vez de uma única dose grande?

C.

Durante o programa de tratamento, a mulher percebe que a pele sobre a área irradiada

cou avermelhada e irritada. Qual é a razão para

isso?

3.

Indivíduos que sofreram um infarto do miocárdio podem apresentar danos adicionais depois de restaurado o

uxo sanguíneo; um fenômeno

conhecido como lesão de reperfusão.

4.

A.

Qual é o mecanismo proposto subjacente à lesão de reperfusão?

B.

Que fatores podem in

uenciar esse mecanismo?

Diariamente, as células do sangue em nosso organismo se tornam senescentes e morrem, sem produzir sinais de in

maciço ou a destruição do tecido, como ocorre em casos de infarto do miocárdio, produz sinais signi

A.

cativos de in

amação, porém um dano

amação.

Explique.

Apêndice O  Apêndice  Valores  laboratoriais  proporciona  acesso  rápido  aos  valores  normais  em  relação  a  muitos  exames laboratoriais, bem como uma descrição dos prefixos, dos símbolos e dos fatores (p. ex., micro, μ, 10–6) utilizados para  apresentar  esses  valores.  O  conhecimento  dos  valores  normais  pode  ajudar  você  a  introduzir  os  valores anormais no contexto. Esperamos que este guia lhe tenha fornecido instruções claras sobre como explorar todos os recursos que a obra oferece. Boa sorte e aproveite a jornada!

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Com  a  primeira  edição  de  Fisiopatologia,  foi  iniciada  uma  promissora  jornada.  Foram  muitos  os  que  me acompanharam nela. Cada um deles brindou esta obra com uma contribuição única. Algumas  pessoas  merecem  reconhecimento  especial,  tendo  em  vista  que  a  nona  edição  contém  a  impressão indelével de sua habilidade e especialização. Muitas têm contribuído desde as edições iniciais, e o texto e as figuras que criaram persistem, uma vez que grande parte de seus escritos aparece nesta revisão. Em virtude do meu sincero apreço por seu trabalho, eu seria negligente em não valorizá­las e agradecer­lhes. São elas: • Judith Aberg, MD, Associate Professor, New York University School of Medicine, Principal Investigator, AIDS Clinical Trial Unit e Director HIV, Bellevue Hospital Center. Capítulo 16, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida.

• Toni Ballestrieri, RN, BSN, CCNS, Milwaukee, Wisconsin. Capítulo 32, Distúrbios da Função Cardíaca. • Anna  Barkman,  RN,  MSN,  CCNS,  Faculty  School  of  Nursing,  Mount  Royal  College,  Calgary,  Alberta, Canada. Capítulo 34, Insuficiência Cardíaca e Choque Circulatório. • Diane Book, MD, Assistant Professor, Department of Neurology, Medical College of Wisconsin.  Capítulo 20, Distúrbios da Função Encefálica. • Edward  W.  Carroll,  PhD  (Falecido),  Clinical  Assistant  Professor,  Department  of  Biomedical  Sciences, Marquette University. Capítulo 4, Características de Células e Tecidos; Capítulo 6, Controle Genético da Função Celular  e  Herança;  Capítulo  17,  Organização  e  Controle  da  Função  Neurológica;  Capítulo  23,  Distúrbios  da Visão. • Robin  Curtis,  PhD,  Professor  Aposentado,  Department  of  Cellular  Biology,  Neurobiology  and  Anatomy, Medical  College  of  Wisconsin.  Capítulo  17,  Organização  e  Controle  da  Função  Neurológica.  Capítulo  23, Distúrbios da Visão. • W.  Michael  Dunn  Jr.,  PhD,  Professor  of  Pathology  and  Immunology,  Washington  University  School  of Medicine. Capítulo 12, Mecanismos de Doenças Infecciosas. • Jason Faulhaber, MD, Fellow, Division of Infectious Diseases and Immunology, New York University School of Medicine. Capítulo 16, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. • Suzanne  Fontana,  RN,  PhD,  APRN­BC,  Associate  Professor  and  Family  Nurse  Practitioner,  College  of Nursing, University of Wisconsin – Milwaukee. Capítulo 24, Distúrbios das Funções Auditiva e Vestibular. • Kathryn Gaspard, PhD, Clinical Associate Professor Emerita, College of Nursing, University of Wisconsin – Milwaukee. Capítulo 25, Células Sanguíneas e Sistema Hematopoético. Capítulo 26, Distúrbios da Hemostasia; Capítulo 27, Distúrbios das Hemácias. • Kathleen Gunta, RN, MS, OCNS­C, Clinical Nurse Specialist, Aurora St. Luke’s Medical Center, Milwaukee, Wisconsin. Capítulo 57, Distúrbios da Função Musculoesquelética | Trauma, Infecção e Neoplasias; Capítulo 58, Distúrbios da Função Musculoesquelética | Distúrbios do Desenvolvimento e Metabólicos. • Safak  Guven,  MD,  MBA,  FACE,  FACP,  Las  Vegas,  Nevada.  Capítulo  50,  Diabetes  Melito  e  Síndrome Metabólica, com Glenn Matfin e Julie Kuenzi. • Surena Hung, MD, Assistant Professor, Department of Neurology, Medical College of Wisconsin.  Capítulo 19, Distúrbios da Função Motora. • Scott  A.  Jens,  OD,  FAAO,  Director  Optometry,  Isthmus  Eye  Care,  Middleton,  Wisconsin.  Capítulo  23, Distúrbios da Visão. • Mary  Kay  Jiricka,  RN,  MSN,  CCRN,  APN­BC,  Cardiac  Intensive  Care  Unit,  Aurora  St.  Luke’s  Medical Center, Milwaukee, Wisconsin. Capítulo 11, Tolerância à Atividade e Fadiga.

Mary  Pat  Kunert,  RN,  PhD  (falecida), Associate  Professor,  College  of  Nursing,  University  of  Wisconsin  – VENDEDOR [email protected] Milwaukee. Capítulo 9, Estresse e Adaptação. Capítulo 10, Alterações na Regulação da Temperatura. • Nathan  A.  Ledeboer, http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 PhD,  Assistant  Professor  of  Pathology,  Medical  College  of  Wisconsin.  Capítulo  12, Mecanismos de Doenças Infecciosas. •

• Kim Litwack,  RN,  PhD,  FAAN, APNP.  Capítulo 18,  Função  Somatossensorial,  Dor  e  Cefaleia;  Capítulo  35, Estrutura e Função do Sistema Respiratório; Capítulo 40, Distúrbios do Equilíbrio Acidobásico. • Judy  Wright  Lott,  RN,  PhD,  DSN,  FAAN,  Dean  and  Professor  of  Nursing,  Louise  Herrington  School  of Nursing, Baylor University, Waco, Texas. Capítulo 2, Conceitos de Saúde Alterada em Crianças. • Patricia  McCowen  Mehring,  RN,  MSN,  WHNP,  Nurse  Practitioner  of  OB­GYN,  Medical  College  of Wisconsin. Capítulo 53, Estrutura e Função do Sistema Reprodutor Feminino; Capítulo 54, Doenças do Sistema Reprodutor Feminino; Capítulo 55, Infecções Sexualmente Transmissíveis. • Carrie J. Merkle, RN, PhD, FAAN, Associate Professor, College of Nursing, University of Arizona, Tucson, Arizona. Capítulo 5, Adaptação, Lesão e Morte Celulares; Capítulo 8, Neoplasias. • Kathleen  Mussato,  RN,  PhD,  Research  Manager,  Henna  Heart  Center,  Children’s  Hospital  of  Wisconsin. Capítulo 32, Distúrbios da Função Cardíaca. • Janice Kuiper Pikna, RN, MSN, CS, Clinical Nurse Specialist – Gerontology Froedtert Hospital, Milwaukee, Wisconsin. Capítulo 3, Conceitos de Saúde Alterada em Idosos. • Sandra  Kawczynski  Pasch,  RN,  MS,  MA,  Assistant  Professor,  Columbia  College  of  Nursing,  Milwaukee, Wisconsin. Capítulo 22, Transtornos do Pensamento, das Emoções e da Memória. • Joan Pleus, RD, MS, CDE, Program Manager/Biomedical Core, Clinical Research Center, Medical College of Wisconsin. Capítulo 47, Alterações do Estado Nutricional. • Charlotte  Pooler,  RN,  BScN,  MN,  PhD  (Nursing),  CNCC  (C),  CNC  (C),  Director,  Baccalaureate  Nursing Program,  Grant  MacEwan  College,  Edmonton,  Alberta,  Canada.  Capítulo  37,  Distúrbios  de  Ventilação  e  da Troca Gasosa. • Debra  Bancroft  Rizzo,  RN,  MSN,  FNP­C,  Nurse  Practitioner,  Rheumatic  Disease  Center,  Glendale, Wisconsin. Capítulo 59, Distúrbios da Função Musculoesquelética | Doenças Reumáticas. • Gladys  Simandl,  RN,  PhD,  Professor  Columbia  College  of  Nursing,  Glendale,  Wisconsin.  Capítulo  60, Estrutura e Função da Pele. Capítulo 61, Distúrbios da Integridade e da Função da Pele. • Cynthia  Sommer,  PhD,  MT  (ASCP),  Associate  Professor  Emerita,  Department  of  Biological  Sciences, University  of  Wisconsin.  Capítulo  13,  Imunidade  Inata  e  Adaptativa.  Capítulo  14,  Inflamação,  Reparação  de Tecidos e Cicatrização de Feridas. • Jill Winters,  RN,  PhD, Associate  Professor  and  Director  of  Research  and  Scholarship,  Marquette  University, Milwaukee, Wisconsin. Capítulo 33, Distúrbios da Condução e do Ritmo Cardíacos. Em relação aos capítulos para os quais contribuímos como autores e coautores: Carol  M.  Porth,  RN,  MSN,  PhD  (physiology),  FAHA.  Capítulo  1,  Conceitos  de  Saúde  e  Doença;  Capítulo  7, Doenças  Genéticas  e  Congênitas;  Capítulo  15,  Distúrbios  da  Resposta  Imunológica;  Capítulo  21,  Sono  e Transtornos  do  Sono;  Capítulo 28,  Distúrbios  dos  Leucócitos  e  dos  Tecidos  Linfoides;  Capítulo  29,  Estrutura  e Função  do  Sistema  Cardiovascular;  Capítulo  31,  Distúrbios  da  Regulação  da  Pressão  Arterial;  Capítulo  36, Infecções,  Neoplasias  e  Doenças  Infantis  do  Sistema  Respiratório;  Capítulo  38,  Estrutura  e  Função  Renais; Capítulo 40,  Distúrbios  do  Equilíbrio Acidobásico,  com  Kim  Litwack;  Capítulo 41,  Distúrbios  da  Função  Renal; Capítulo 42,  Lesão  Renal Aguda  e  Doença  Renal  Crônica;  Capítulo 43,  Doenças  da  Bexiga  e  das  Vias  Urinárias Inferiores;  Capítulo  44,  Estrutura  e  Função  do  Sistema  Digestório;  Capítulo  45,  Distúrbios  da  Função Gastrintestinal; Capítulo 46, Distúrbios das Funções do Sistema Hepatobiliar e do Pâncreas Exócrino; Capítulo 56, Estrutura e Função do Sistema Musculoesquelético. Glenn Matfin,  BSc  (Hons),  MB,  ChB,  DCM,  FPPM,  FACE,  FACP,  FRCP.  Capítulo  30,  Distúrbios  do  Fluxo Sanguíneo  na  Circulação  Sistêmica;  Capítulo  39,  Distúrbios  do  Equilíbrio  Hidreletrolítico;  Capítulo  48, Mecanismos  de  Controle  Endócrino;  Capítulo  49,  Distúrbios  do  Controle  Endócrino  do  Crescimento  e  do Metabolismo; Capítulo 50,  Diabetes  Melito  e  Síndrome  Metabólica;  Capítulo 51,  Estrutura  e  Função  do  Sistema

Geniturinário Masculino; Capítulo 52, Doenças do Sistema Geniturinário Masculino. VENDEDOR [email protected] A  Dra. Kathryn Gaspard também merece reconhecimento. Ela tem participado da confecção da obra desde as http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 edições  iniciais,  fornecendo  consultoria  e  percepções  sobre  o  desenvolvimento  do  conteúdo  e  das  ilustrações. Georgianne Heymann, que também tem colaborado desde as primeiras edições, auxiliou na edição do manuscrito e nos deu encorajamento e apoio quando as tarefas associadas à elaboração se tornaram muito frustrantes. Diz­se com frequência que uma ilustração vale mil palavras. Isso é particularmente verdadeiro em um livro como este, no qual as figuras formam a base para a compreensão de conceitos difíceis. Elas devem sua origem a Carole Hilmer, que desenvolveu as ilustrações para as primeiras cinco edições, bem como a Jennifer Smith, Anne Rains, e Wendy  Jackelow,  que  continuaram  esse  trabalho  acrescentando  muitas  outras  e  modificando  as  que  vinham  sendo usadas. Agradeço  àqueles  na  Lippincott  Williams  &  Wilkins  (anteriormente  J.  B.  Lippincott),  que  me  ofereceram  esta oportunidade pela primeira vez, por seu apoio e sua confiança durante o processo de publicação. À equipe editorial e  de  produção,  e  também  aos  revisores  e  consultores,  que  me  aconselharam  e  orientaram  com  instruções inestimáveis na elaboração da obra. Sem os estudantes nas aulas que ministrei ao longo dos anos não haveria livro. Eles merecem um agradecimento especial, em virtude de serem a inspiração que serviu de fundamento para este material. Na área da saúde, sempre em constante atualização, foi por meio dos olhos dos meus alunos que pude enxergar seu “mundo real” no tocante aos  cuidados  com  os  pacientes.  Eles  forneceram  as  perguntas,  as  sugestões  e  o  contato  que  direcionaram  a organização e a seleção do conteúdo para esta nova edição. Por  último,  mas  não  menos  importante,  agradeço  à  minha  família  e  aos  meus  amigos  por  sua  paciência  sem limites, pela compreensão e pelo encorajamento durante a jornada. Fui agraciada nesta experiência por estar cercada de pessoas com as quais vivo em perfeita simbiose. Obrigada a todos. Carol Mattson Porth

VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Parte 1

Conceitos de Saúde e Doença

1 Conceitos de Saúde e Doença 2 Conceitos de Saúde Alterada em Crianças 3 Conceitos de Saúde Alterada em Idosos

Parte 2

Função e Crescimento Celulares

4 Características de Células e Tecidos 5 Adaptação, Lesão e Morte Celulares 6 Controle Genético da Função Celular e Herança 7 Doenças Genéticas e Congênitas 8 Neoplasias

Parte 3

Transtornos da Função Integrativa

9 Estresse e Adaptação 10 Alterações na Regulação da Temperatura 11 Tolerância à Atividade e Fadiga

Parte 4

Infecção, Inflamação e Imunidade

12 Mecanismos de Doenças Infecciosas 13 Imunidade Inata e Adaptativa 14 Inflamação, Reparação de Tecidos e Cicatrização de Feridas 15 Distúrbios da Resposta Imunológica 16 Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

Parte 5

Transtornos da Função Neurológica

17 Organização e Controle da Função Neurológica 18 Função Somatossensorial, Dor e Cefaleia 19 Distúrbios da Função Motora 20 Distúrbios da Função Encefálica 21 Sono e Transtornos do Sono 22 Transtornos do Pensamento, das Emoções e da Memória

Parte 6

Transtornos da Função Sensorial Especial

23 Distúrbios da Visão 24 Distúrbios das Funções Auditiva e Vestibular

Parte 7

Distúrbios do Sistema Hematopoético

25 Células Sanguíneas e Sistema Hematopoético 26 Distúrbios da Hemostasia

27 Distúrbios das Hemácias

VENDEDOR [email protected] 28 Distúrbios dos Leucócitos e dos Tecidos Linfoides Parte 8

http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Distúrbios da Função Cardiovascular

29 Estrutura e Função do Sistema Cardiovascular 30 Distúrbios do Fluxo Sanguíneo na Circulação Sistêmica 31 Distúrbios da Regulação da Pressão Arterial 32 Distúrbios da Função Cardíaca 33 Distúrbios da Condução e do Ritmo Cardíacos 34 Insuficiência Cardíaca e Choque Circulatório

Parte 9

Distúrbios da Função Respiratória

35 Estrutura e Função do Sistema Respiratório 36 Infecções, Neoplasias e Doenças Infantis do Sistema Respiratório 37 Distúrbios de Ventilação e da Troca Gasosa

Parte 10 Distúrbios da Função Renal, Líquidos e Eletrólitos 38 Estrutura e Função Renais 39 Distúrbios do Equilíbrio Hidreletrolítico 40 Distúrbios do Equilíbrio Acidobásico 41 Distúrbios da Função Renal 42 Lesão Renal Aguda e Doença Renal Crônica 43 Doenças da Bexiga e das Vias Urinárias Inferiores

Parte 11 Distúrbios da Função Gastrintestinal 44 Estrutura e Função do Sistema Digestório 45 Distúrbios da Função Gastrintestinal 46 Distúrbios das Funções do Sistema Hepatobiliar e do Pâncreas Exócrino 47 Alterações do Estado Nutricional

Parte 12 Distúrbios da Função Endócrina 48 Mecanismos de Controle Endócrino 49 Distúrbios do Controle Endócrino do Crescimento e do Metabolismo 50 Diabetes Melito e Síndrome Metabólica

Parte 13 Distúrbios das Funções Geniturinária e Reprodutiva 51 Estrutura e Função do Sistema Geniturinário Masculino 52 Doenças do Sistema Geniturinário Masculino 53 Estrutura e Função do Sistema Reprodutor Feminino 54 Doenças do Sistema Reprodutor Feminino 55 Infecções Sexualmente Transmissíveis

Parte 14 Distúrbios da Função Musculoesquelética 56 Estrutura e Função do Sistema Musculoesquelético 57 Distúrbios da Função Musculoesquelética | Trauma, Infecção e Neoplasias 58 Distúrbios da Função Musculoesquelética | Distúrbios do Desenvolvimento e Metabólicos 59 Distúrbios da Função Musculoesquelética | Doenças Reumáticas

Parte 15 Distúrbios da Função Tegumentar VENDEDOR [email protected] 60 Estrutura e Função da Pele http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 61 Distúrbios da Integridade e da Função da Pele   Apêndice Valores Laboratoriais Glossário

VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

A Sra. Maria, de 85 anos, nasceu durante um período de profunda crise econômica. Ela é uma viúva que se mudou recentemente  com  a  filha,  desde  que  seu  benefício,  pago  pela  previdência  social,  passou  a  não  ser  suficiente  para manter  a  própria  casa.  Ela  se  sente  dolorida  e  com  dor  nas  costas,  descrita  como  “formigamento  e  sensação  de queimação  no  lado  esquerdo  das  minhas  costas  logo  acima  da  cintura”.  O  desconforto  começou  cerca  de  2  dias atrás, e ela pensou que passaria espontaneamente. No entanto, aumentou de intensidade, e esta manhã ela notou uma erupção sobre a região dolorida.

Sua  filha  suspeita  que  a  visão  da  mãe  tenha  diminuído  devido  a  quedas  recentes  durante  a  noite.  Também  está VENDEDOR [email protected] preocupada  com  a  perda  da  acuidade  auditiva,  do  apetite  e  a  fadiga  crescente  de  sua  mãe.  Ela  acrescenta  que  sua http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 mãe foi hospitalizada devido a pneumonia cerca de 4 meses atrás, e aparentava confusão mental durante o curso da doença. Os sinais vitais da Sra. Maria estão todos dentro dos limites normais (pressão arterial = 122/68 mmHg, pulso = 77,  frequência  respiratória  =  14/min  e  temperatura  =  37°C).  O  exame  físico  da  erupção  nas  costas  da  Sra.  Maria revela  pápulas  vesiculares  agrupadas  sobre  o  dermátomo  T7  do  lado  esquerdo.  O  desconforto  é  sentido  com palpação  leve.  No  questionamento  posterior,  a  Sra.  Maria  diz:  “Sim,  eu  tive  catapora  quando  estava  na  primeira série.” A erupção é diagnosticada como vírus varicela­zóster (VZV). O caso dela é discutido com maiores detalhes no Capítulo 3, juntamente com outras preocupações relatadas pela filha da paciente.

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O termo fisiopatologia,  que  é  o  foco  deste  livro,  pode  ser  definido  como  a  fisiologia  da  saúde  alterada.  O  termo combina  as  palavras  patologia  e  fisiologia.  Patologia  (do  grego  pathos,  que  significa  “doença”)  é  a  disciplina relacionada com o estudo das alterações estruturais e funcionais nas células, nos tecidos e nos órgãos do organismo que  causam  ou  são  causadas  por  doença.  Fisiologia  é  a  disciplina  que  lida  com  as  funções  do  corpo  humano. Assim, fisiopatologia não aborda só as alterações em células e órgãos que ocorrem com a manifestação da doença, mas também os efeitos dessas mudanças sobre a função total do corpo (Figura 1.1). Exemplos de atrofia do cérebro (Figura 1.1 A) e de hipertrofia do miocárdio (Figura 1.1 B) ilustram as alterações fisiopatológicas decorrentes de um  acidente  vascular  cerebral  por  longo  tempo  de  hipertensão  não  gerenciada  e  a  maneira  como  isso  afeta  o miocárdio.  A  fisiopatologia  também  estuda  os  mecanismos  patológicos  subjacentes  e  fornece  informações  para auxiliar  no  planejamento  preventivo,  bem  como  procedimentos  e  práticas  terapêuticas  de  saúde,  tais  como  seguir uma  dieta  saudável,  fazer  exercícios  e  aderir  aos  medicamentos  prescritos.  Este  capítulo  se  destina  a  orientar  o leitor  sobre  os  conceitos  de  saúde  e  doença,  os  diferentes  termos  empregados  no  decorrer  do  texto,  as  fontes  de dados  e  seu  significado,  assim  como  sobre  os  aspectos  mais  abrangentes  da  fisiopatologia  em  termos  de  saúde  e bem­estar das populações.

Conceitos de saúde e doença

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Conhecer a de쾎�nição de saúde estabelecida pela Organização Mundial da Saúde



De쾎�nir 〼‾siopatologia



Explicar o signi쾎�cado de con쾎�abilidade, validade, sensibilidade, especi쾎�cidade e valor preditivo no que se refere a observações e testes utilizados

no diagnóstico da doença

Muitas vezes é difícil determinar o que constitui saúde e doença devido à maneira como diferentes pessoas veem este tópico. O que pode ser definido como saúde é determinado por vários fatores, incluindo genética, idade, sexo, diferenças culturais e étnicas, bem como expectativas do indivíduo, do grupo e do governo.

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Figura  1.1  •  A.  Atrofia  do  lobo  frontal  do  cérebro.  Os  giros  são  finos  e  os  sulcos  se  apresentam  extremamente ampliados.  B.  Hipertrofia  miocárdica.  Esta  secção  transversal  do  coração  ilustra  um  caso  de  hipertrofia  ventricular esquerda  resultante  de  hipertensão  de  longa  data.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (2012)  Rubin’s  pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., pp. 2, 4). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Saúde Em 1948, o Preâmbulo da Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu saúde como “um estado de  completo  bem­estar  físico,  mental  e  social,  e  não  meramente  a  ausência  de  doenças  e  enfermidades”,  definição esta que não foi alterada desde então.1 Embora ideal para muitas pessoas, esta era uma meta considerada irreal. O Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA,a no documento Healthy People 2020, descreve as condições de saúde como: • Alcançar uma vida livre de doença, incapacidade, lesões e morte prematura passíveis de prevenção

• Alcançar a equidade em saúde e eliminar as disparidades • Promover a boa saúde para todos

• Promover comportamentos saudáveis por toda a vida.2 VENDEDOR [email protected] A cada década, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA lidera iniciativas que visam facilitar os http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 objetivos de uma nova década em seu relatório, como acontece com o atual Healthy People 2020. Estes relatórios de consenso são desenvolvidos especificamente para auxiliar na prevenção de alguns problemas de saúde e oferecer conselhos para promoção da saúde, como definido pela OMS.

Doença Doença  é  considerada  uma  enfermidade  aguda  ou  crônica  que  a  pessoa  adquire  ou  nasce  com  ela  e  que  provoca disfunção fisiológica em um ou mais sistemas orgânicos. Geralmente, cada doença apresenta sinais e sintomas que caracterizam  sua  patogênese  e  etiologia  identificável.  Os  aspectos  do  processo  patológico  incluem  etiologia, patogênese, alterações morfológicas, manifestações clínicas, diagnóstico e curso clínico.

Etiologia As causas de uma doença são conhecidas como fatores etiológicos. Entre os agentes etiológicos reconhecidos estão agentes  biológicos  (p.  ex.,  bactérias  e  vírus),  forças  físicas  (p.  ex.,  traumatismo,  queimaduras,  radiação),  agentes químicos (p. ex., venenos e etanol), herança genética e excessos ou déficits nutricionais. A  maioria  dos  agentes  causadores  de  doença  é  inespecífica,  e  muitos  agentes  diferentes  podem  causar  uma doença  em  um  mesmo  órgão.  Por  outro  lado,  um  único  agente  ou  evento  traumático  pode  conduzir  ao desenvolvimento  de  uma  doença  em  diferentes  órgãos  ou  sistemas.  Por  exemplo,  em  casos  de  fibrose  cística, doença  falciforme  e  hipercolesterolemia  familiar,  um  único  aminoácido,  molécula  transportadora  ou  proteína  do receptor  produz  uma  doença  generalizada.  Embora  um  agente  patológico  possa  afetar  mais  de  um  órgão isoladamente e diferentes agentes patológicos possam afetar o mesmo órgão, a maioria dos estados patológicos não tem uma única causa. Ao contrário, a maioria das doenças tem origem multifatorial. Isto se aplica, em especial, a câncer,  doenças  cardíacas  e  diabetes  melito. A  Figura 1.2  ilustra  esse  fato  e  traça  as  cinco  causas  do  câncer  e  a fisiopatologia, que evolui a partir dos mecanismos da doença desencadeada por uma das causas. Os diversos fatores que predispõem a uma doença específica são frequentemente referidos como fatores de risco. Uma das maneiras de classificar os fatores que causam a doença é agrupá­los em categorias, conforme ocorram no momento do nascimento ou sejam adquiridos ao longo da vida. Condições congênitas são defeitos manifestados no  nascimento,  embora  possam  não  ser  evidentes  no  começo  e  até  mesmo  nunca  se  manifestar.  As  alterações congênitas  podem  ser  causadas  por  influências  genéticas,  fatores  ambientais  (p.  ex.,  infecções  virais  na  mãe,  uso abusivo de substâncias pela mãe, exposição à radiação ou posição do feto no útero) ou uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Defeitos adquiridos são causados por eventos após o nascimento; incluem lesões, exposição a agentes infecciosos, alimentação inadequada, falta de oxigênio, resposta imune inadequada e neoplasia. Acredita­ se  que  muitas  doenças  resultem  de  uma  predisposição  genética  e  de  um  ou  mais  eventos  que  funcionam  como gatilho  para  o  desenvolvimento  da  doença.  Existem  35.000  genes  no  genoma  humano,  de  1  a  10  milhões  de proteínas e de 2 a 3 mil metabólitos no metaboloma humano.3 Os enormes avanços na área da biologia molecular e a  ampla  variabilidade  pessoal  resultaram  na  evolução  da  biologia  de  sistemas  e  da  medicina  personalizada.  Essas conquistas  auxiliam  na  identificação  da  etiologia  das  doenças  e  no  desenvolvimento  de  intervenções individualizadas.3

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Figura  1.2  •  Resumo  dos  mecanismos  gerais  do  câncer.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (2012).  Rubin’s pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  204).  Philadelphia,  PA:  Lippincott  Williams  & Wilkins.)

Patogênese Enquanto a etiologia descreve aquilo que deflagra o processo patológico, a patogênese explica como ele evolui. Em outras  palavras,  patogênese  é  a  sequência  de  eventos  que  ocorrem  nas  células  e  tecidos  a  partir  do  momento  do contato  inicial  com  um  agente  etiológico  até  a  última  expressão  de  uma  doença.  Embora  etiologia  e  patogênese

sejam  termos  frequentemente  empregados  como  sinônimos,  o  significado  é  bastante  diferente.  Por  exemplo,  a aterosclerose frequentemente é citada como etiologia (ou causa) de uma doença arterial coronariana. Na realidade, a VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 progressão  de  um  processo  inflamatório  de  uma  camada  de  gordura  até  a  lesão  provocadora  da  oclusão  do  vaso, observada  em  pessoas  com  doença  da  artéria  coronária,  representa  a  patogênese  da  doença. A  verdadeira  etiologia da aterosclerose permanece incerta.

Morfologia e histologia A morfologia está relacionada com a estrutura ou forma fundamental de células ou tecidos. Alterações morfológicas dizem  respeito  tanto  a  mudanças  anatômicas  macroscópicas  quanto  microscópicas  características  de  determinada doença. Histologia é a disciplina que estuda as células e a matriz extracelular dos tecidos orgânicos. O método mais comumente empregado no estudo de tecidos é a preparação de secções histológicas – secções finas e translúcidas de tecidos  e  órgãos  analisadas  com  a  ajuda  de  um  microscópio.  As  secções  histológicas  desempenham  um  papel importante  no  diagnóstico  de  diversos  tipos  de  câncer.  Uma  lesão  representa  descontinuidade  patológica  ou traumática de um órgão ou tecido orgânico. As descrições do tamanho e das características da lesão frequentemente podem ser obtidas pela utilização de radiografia, ecografia e outras modalidades de exames por imagem. Também podem ser coletadas amostras da lesão para realização de biopsia e amostras de tecidos para estudos histológicos. A doença  diagnóstica  evoluiu  muito  nos  últimos  anos,  passando  a  incluir  ferramentas  imunológicas  e  da  biologia molecular para o estudo de estados patológicos (Figura 1.3).4

Manifestações clínicas As doenças podem manifestar­se de várias maneiras. Às vezes, a condição produz manifestações como febre, que tornam  evidente  a  doença  do  indivíduo.  Em  outros  casos,  a  doença  é  silenciosa  no  início  e  é  detectada  durante exame realizado para outra finalidade ou depois de seu estado já estar avançado. Sinais e sintomas são termos empregados para descrever as alterações estruturais e funcionais ligadas à doença. Sintoma  é  a  queixa  subjetiva  percebida  pelo  indivíduo  portador  de  uma  doença,  enquanto  sinal  é  a  manifestação possível de ser percebida por um observador. Dor, dificuldade em respirar e tonturas são sintomas de uma doença. Temperatura  elevada,  edema  nos  membros  e  alteração  no  tamanho  das  pupilas  são  sinais  objetivos  de  fácil observação  por  alguém,  além  do  portador  da  doença.  Sinais  e  sintomas  podem  estar  relacionados  com  o  distúrbio principal  ou  podem  representar  uma  tentativa  do  organismo  de  compensar  a  alteração  funcional  causada  pela condição patológica. Muitos estados patológicos não são diretamente observados. Por exemplo, não se pode ver que o indivíduo está com hemorragia ou se apresenta redução na troca gasosa pulmonar. Em vez disso, o que pode ser observado  é  a  tentativa  do  organismo  em  compensar  as  alterações  funcionais  provocadas  pela  doença,  como  a taquicardia seguida da perda de sangue ou do aumento da frequência respiratória que ocorre com pneumonia.

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Figura 1.3 • Tecido conjuntivo frouxo. A. Fotomicrografia de um esfregaço de mesentério corado com hematoxilina de  Verhoeff  para  mostrar  núcleos  e  fibras  elásticas.  As  fibras  elásticas  aparecem  em  azul­preto  como  um emaranhado  de  ramificações  longas  e  finas,  sem  começo  nem  fim  discerníveis.  As  fibras  de  colágeno  aparecem como longos perfis lineares corados em laranja e são consideravelmente mais espessas do que as fibras elásticas. Também  existem  núcleos  de  outros  tipos  de  células  (p.  ex.,  linfócitos,  plasmócitos  e  macrófagos),  mas  não  são

facilmente identificáveis. B. Diagrama esquemático ilustrando os componentes do tecido conjuntivo frouxo. Observe a associação de diferentes tipos de células à matriz extracelular circundante, que contém os vasos sanguíneos e os VENDEDOR [email protected] diferentes  tipos  de  fibras. http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 (Extraída  de  Ross  M.  H.,  Pawlina  W.  (2011).  Histology: A  text  and  atlas  with  correlated cell and molecular biology (6th ed., p. 159). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Síndrome é uma compilação de sinais e sintomas (p. ex., síndrome de fadiga crônica) característica de um estado patológico específico. Complicações  são  possíveis  extensões  adversas  de  uma  doença  ou  podem  ser  resultado  do tratamento. Sequelas são lesões ou deficiências que acompanham ou são causadas por uma doença.

Diagnóstico Diagnóstico é a designação quanto à natureza ou causa de um problema de saúde (p. ex., pneumonia bacteriana ou acidente vascular cerebral hemorrágico). O processo de diagnóstico requer a obtenção de histórico clínico criterioso, exame  físico  e  exames  complementares.  No  histórico,  a  entrevista  é  empregada  para  obter  o  relato  do  indivíduo sobre  sintomas  e  sua  progressão,  assim  como  sobre  fatores  que  possam  contribuir  para  o  diagnóstico.  O  exame físico  é  feito  para  observar  se  existem  sinais  de  alteração  funcional  ou  na  estrutura  orgânica.  Os  exames complementares  são  solicitados  para  comprovar  o  que  se  acredita  ser  o  problema.  Também  podem  ser  realizados para determinar outros possíveis problemas de saúde que não foram detectados pela entrevista e pelo exame físico, mas que podem existir considerando os sinais e sintomas identificados. O desenvolvimento de um diagnóstico envolve a ponderação de possibilidades concorrentes e a seleção da mais provável  entre  as  condições  que  podem  ser  responsáveis  pela  apresentação  clínica  do  indivíduo. A  probabilidade clínica  de  determinada  doença  em  um  indivíduo  de  certa  idade,  sexo,  raça/etnia,  estilo  de  vida,  antecedentes genéticos  e  lugar  de  origem  muitas  vezes  influencia  o  estabelecimento  de  um  diagnóstico  presuntivo.  Os  exames laboratoriais e de imagem são utilizados para confirmar o diagnóstico. Um  fator  importante  na  interpretação  dos  resultados  de  um  exame  complementar  é  a  determinação  de normalidade ou de anormalidade. O hemograma apresenta valores acima do normal, dentro da faixa de normalidade ou abaixo do normal? O que é considerado valor normal para um exame laboratorial é estabelecido estatisticamente a  partir  de  resultados  de  testes  obtidos  de  uma  amostra  selecionada  de  indivíduos.  Um  valor  normal  representa  o resultado de um exame que se enquadra dentro da curva do sino [curva de Gauss] ou representa uma distribuição de 95%.  Assim,  o  nível  sérico  normal  de  sódio  (entre  136  e  145  mEq/l)  representa  os  níveis  médios  de  sódio  no plasma na população de referência ± 2 desvios padrão. Para determinados exames laboratoriais, o valor normal deve ser  ajustado  conforme  o  sexo,  outras  comorbidades  ou  a  idade  do  paciente.  Por  exemplo,  o  intervalo  de hemoglobina normal para mulheres fica entre 12,0 e 16,0 g/dℓ,  e  para  homens  entre  14,0  e  17,4  g/dℓ.5 Os níveis séricos  de  creatinina  geralmente  são  ajustados  de  acordo  com  a  idade  em  pacientes  idosos;  os  valores  normais  de fosfato sérico diferem entre adultos e pacientes pediátricos. Os  parâmetros  laboratoriais  devem  ser  interpretados  com  base  na  confiabilidade,  validade,  sensibilidade  e especificidade da medição.5,6 Validade se refere ao grau em que uma ferramenta de medição afere o que se pretende medir.  Por  exemplo,  a  validade  das  medidas  de  pressão  arterial  obtidas  por  um  esfigmomanômetro  pode  ser comparada  com  os  valores  obtidos  intra­arterialmente,  que  são  medidas  obtidas  a  partir  de  procedimentos invasivos, com a inserção de cateteres arteriais em artérias radiais de indivíduos com doença aguda. Confiabilidade se  refere  à  extensão  a  que  uma  observação,  se  for  repetida,  fornece  o  mesmo  resultado.  Um  aparelho  de  pressão arterial  mal  calibrado  fornecerá  valores  inconsistentes  de  pressão  arterial,  particularmente  em  faixas  de  pressão muito alta ou baixa. A confiabilidade também depende da habilidade do profissional em fazer a medição. Os valores de  pressão  arterial  podem  variar  de  um  indivíduo  para  outro  devido  à  técnica  empregada  (p.  ex.,  observadores diferentes podem desinflar o manguito a uma taxa diferente, obtendo, assim, valores distintos), à maneira como é feita a leitura do manômetro ou a diferenças de acuidade auditiva entre os profissionais. No campo das medições de laboratório clínico, a padronização visa aumentar a veracidade e a confiabilidade dos valores  aferidos.  A  padronização  depende  da  utilização  de  normas  estabelecidas,  procedimentos  de  medição  de referência  e  material  de  referência.7  Nos  EUA,  a  agência  governamental  Food  and  Drug Administration  (FDA)  é responsável  pela  regulamentação  de  dispositivos  de  diagnóstico  in  vitro,  incluindo  os  aparelhos  de  laboratório clínico, kits  de  teste  e  reagentes.b  Fabricantes  que  ofereçam  ao  mercado  novos  dispositivos  de  diagnóstico  devem apresentar  à  FDA  informações  sobre  o  aparelho,  kit  de  teste  ou  reagente,  conforme  as  exigências  dos  estatutos  e

regulamentos  vigentes. A  FDA  analisa  essas  informações  para  decidir  se  o  produto  pode  ser  comercializado  em território americano. VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Medidas  de  sensibilidade  e  especificidade  estão  relacionadas  com  a  determinação  de  probabilidade  ou desempenho  do  teste  ou  observação  na  identificação  de  indivíduos  com  doença  e  sem  doença  (Figura  1.4). Sensibilidade se refere à proporção de indivíduos com uma doença específica que são positivos para esta doença em determinado  teste  ou  observação  (chamado  de  resultado  verdadeiro­positivo).  Se  o  resultado  de  um  teste  de  alta sensibilidade é negativo, isso indica que o indivíduo não é portador daquela doença, que é excluída ou “descartada” como possibilidade diagnóstica. Especificidade  se  refere  à  proporção  de  indivíduos  sem  a  doença  que  apresentam resultado negativo em determinado teste ou observação (chamado resultado verdadeiro­negativo). A especificidade pode ser calculada somente entre indivíduos que não são portadores de determinada doença. Um teste com 95% de especificidade  identifica  corretamente  de  95  a  100  indivíduos  normais.  Os  5%  remanescentes  representam resultados  falso­positivos.  Um  resultado  falso­positivo  pode  ser  extremamente  estressante  para  o  indivíduo  em teste, enquanto um resultado falso­negativo pode retardar o diagnóstico e comprometer o resultado do tratamento.

Figura  1.4  •  Relação  entre  um  resultado  de  exame  complementar  e  a  ocorrência  de  doença.  Existem  duas possibilidades  para  que  o  resultado  do  teste  esteja  correto  (verdadeiro­positivo  e  verdadeiro­negativo)  e  duas possibilidades  para  que  o  resultado  esteja  incorreto  (falso­positivo  e  falso­negativo).  (Extraída  de  Fletcher  R.  H., Fletcher S. W. (2005). Clinical epidemiology: The essentials (4th ed., p. 36). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Valor preditivo é a medida do grau em que o resultado de uma observação ou teste é capaz de prever determinada doença  ou  condição.8  Um  valor  preditivo  positivo  se  refere  à  proporção  de  resultados  verdadeiro­positivos  que ocorre  em  dada  população.  Em  um  grupo  de  mulheres  com  “nódulos  mamários  suspeitos”  em  um  programa  de triagem  de  câncer,  a  proporção  posteriormente  determinada  como  portadora  de  câncer  de  mama  constituiu  o  valor preditivo positivo. Um valor preditivo negativo se refere às observações verdadeiro­negativas em dada população. Em  um  teste  de  triagem  de  câncer  de  mama,  o  valor  preditivo  negativo  representa  a  proporção  de  mulheres  sem nódulos suspeitos que não são portadoras de câncer de mama. Embora um valor preditivo dependa parcialmente da sensibilidade  e  da  especificidade,  depende  mais  da  prevalência  de  determinada  doença  naquela  população. Independentemente  da  imutabilidade  da  sensibilidade  e  da  especificidade,  o  valor  preditivo  positivo  de  uma observação aumenta com a prevalência, enquanto o valor preditivo negativo cai.

Curso clínico O curso clínico descreve a evolução de uma doença. A doença pode apresentar curso agudo, subagudo ou crônico.

Doença  aguda  é  aquela  que  é  relativamente  grave,  porém  autolimitante.  Doença  crônica  indica  um  processo contínuo  a  longo  prazo.  VENDEDOR Uma  doença  crônica  pode  ter  curso  contínuo  ou  apresentar  exacerbação  da  condição [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 (agravamento dos sintomas e da gravidade da doença) e remissão (período em que se observa redução na gravidade e  nos  sintomas).  Doença subaguda  é  um  processo  intermediário  entre  um  curso  agudo  e  um  crônico.  Não  é  tão grave quanto a condição aguda nem tão prolongada quanto a crônica. O  espectro  de  gravidade  para  doenças  infecciosas,  como  hepatite  B,  pode  variar  de  pré­clínico  até  infecção crônica persistente. Durante a fase pré­clínica, a doença não é clinicamente evidente, mas está destinada a progredir para  um  estágio  de  doença  clínica.  Como  acontece  com  a  hepatite  B,  a  transmissão  do  vírus  é  possível  durante  a fase  pré­clínica.  Uma  doença  em  fase  subclínica  não  é  clinicamente  evidente  e  não  está  destinada  a  tornar­se clinicamente evidente. Pode ser diagnosticada por meio de testes com anticorpos ou cultura. A maioria dos casos de tuberculose  não  é  clinicamente  aparente,  e  a  evidência  de  sua  manifestação  pode  ser  estabelecida  por  testes cutâneos. A doença em  fase clínica se manifesta por sinais e sintomas. Uma doença infecciosa crônica persistente pode  durar  anos,  às  vezes  por  toda  a  vida.  O  estado  de  portador  se  refere  ao  indivíduo  que  abriga  um microrganismo  patogênico,  mas  não  está  infectado,  como  evidenciado  por  resposta  de  anticorpo  ou  manifestações clínicas. Este indivíduo ainda pode infectar outras pessoas. O estado de portador pode ter duração limitada ou ser crônico, com vigência de meses ou anos.

Resumo

O termo fisiopatologia, que é o foco deste livro, pode ser definido como a fisiologia da saúde alterada. Doença foi definida como qualquer desvio ou interrupção da estrutura ou função normal de qualquer parte, órgão ou sistema orgânico,  que  se  manifesta  por  um  conjunto  característico  de  sinais  ou  sintomas  e  cuja  etiologia,  patogênese  e prognóstico  podem  ser  conhecidos  ou  desconhecidos.  As  causas  de  determinada  doença  são  conhecidas  como fatores etiológicos. Patogênese  descreve  a  evolução  do  processo  patológico.  Morfologia  se  refere  à  estrutura  ou forma  de  células  ou  tecidos;  alterações  morfológicas  são  alterações  na  estrutura  ou  forma,  consideradas características de uma doença. A doença pode manifestar­se de várias maneiras.  Sintoma é a queixa subjetiva, como dor ou tontura, enquanto sinal é a manifestação observável, como temperatura elevada ou garganta avermelhada. Síndrome é a compilação de sinais e sintomas característicos de um estado patológico específico. Diagnóstico  é  a  designação  sobre  a  natureza  e  a  causa  de  um  problema  de  saúde.  Os  profissionais  de  saúde devem realizar históricos e exames físicos completos e validar os resultados por meio de exames complementares, incluindo  exames  laboratoriais,  exames  por  imagem  (p.  ex.,  tomografia  computadorizada)  e  outros.  O  valor  de muitos  exames  complementares  baseia­se  em  sua  confiabilidade  e  validade,  bem  como  em  sua  sensibilidade  e especificidade. Ter uma compreensão abrangente da fisiopatologia auxilia o profissional de saúde na identificação de problemas durante a realização do histórico do paciente, incluindo a entrevista e o exame físico, e na utilização dos dados de laboratório como validação adicional.7 O curso clínico  de  uma  doença  descreve  sua  evolução. A  doença  pode  ser  aguda  (relativamente  grave,  porém autolimitada),  crônica  (contínua  ou  episódica,  mas  de  longa  duração)  ou  subaguda  (não  tão  grave  como  na  fase aguda  nem  tão  prolongada  como  na  fase  crônica).  Dentro  de  um  espectro,  a  doença  pode  ser  considerada  pré­ clínica ou não evidente clinicamente; subclínica, não evidente clinicamente e não destinada a tornar­se; ou clínica, caracterizada por sinais e sintomas.

Saúde e doença nas populações

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



De쾎�nir o termo epidemiologia



Comparar o signi쾎�cado dos termos incidência e prevalência enquanto medidas de frequência da doença



Diferenciar níveis primário, secundário e terciário de prevenção

A  saúde  de  um  indivíduo  está  intimamente  relacionada  com  a  saúde  da  comunidade  e  da  população  no  seu entorno. A capacidade de atravessar continentes em questão de horas abriu o mundo para as questões associadas às VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 populações  em  nível  global.  Doenças  que  antes  se  mantinham  confinadas  a  determinadas  regiões  do  globo atualmente representam uma ameaça para as populações de todo o mundo. À  medida  que  avançamos  no  século  21,  somos  constantemente  lembrados  de  que  o  sistema  de  saúde  e  os serviços  que  ele  oferece  são  direcionados  para  populações  específicas.  Sistemas  de  cuidados  gerenciados  estão focalizados em uma abordagem baseada na população para planejamento, oferta e avaliação dos cuidados de saúde. O foco dos cuidados de saúde também começou a ser encarado como uma parceria, na qual o indivíduo é convidado a assumir maior responsabilidade por sua saúde.

Epidemiologia e padrões de doença Epidemiologia  é  o  estudo  da  ocorrência  de  doenças  em  populações  humanas.8  Inicialmente,  foi  desenvolvida  para explicar a propagação de doenças infecciosas durante epidemias e surgiu como ciência para estudar fatores de risco para  doenças  multifatoriais,  como  doenças  cardíacas  e  câncer. A  epidemiologia  procura  padrões  entre  indivíduos afetados  por  uma  doença  em  particular,  como  idade,  raça,  hábitos  alimentares,  estilo  de  vida  ou  localização geográfica. Em contraste com os pesquisadores biomédicos, que estudam os mecanismos de produção de doenças, os  epidemiologistas  voltam­se  mais  para  o  motivo  do  fato  do  que  para  o  seu  desdobramento.  Por  exemplo,  o epidemiologista  está  mais  preocupado  em  avaliar  se  o  fato  de  fumar  em  si  está  relacionado  com  a  doença cardiovascular  e  se  o  risco  de  doença  cardíaca  diminui  quando  o  indivíduo  abandona  o  vício.  Por  outro  lado,  o pesquisador biomédico está mais preocupado com o agente causador existente na fumaça do cigarro e com as vias por intermédio das quais isso contribui para a manifestação de uma doença cardíaca. Muito  do  nosso  conhecimento  sobre  doença  é  proveniente  de  estudos  epidemiológicos.  Os  métodos epidemiológicos  são  utilizados  para  determinar  como  uma  doença  é  transmitida,  como  controlá­la,  evitá­la  e eliminá­la. Os métodos epidemiológicos também são empregados para estudar a história natural da doença, avaliar novas estratégias de prevenção e tratamento, explorar o impacto de diferentes padrões de prestação de cuidados de saúde e prever futuras necessidades nos cuidados de saúde. Como tal, os estudos epidemiológicos servem de base para  tomada  de  decisão  clínica,  alocação  de  recursos  no  sistema  de  saúde  e  desenvolvimento  de  políticas relacionadas com questões de saúde pública.

Incidência e prevalência A medida de frequência da doença é um aspecto importante da epidemiologia. Estabelece um meio para prever quais doenças estão atuando em determinada população e fornece indicação da velocidade com que estão aumentando ou diminuindo.  Um  caso  de  doença  pode  representar  um  caso  específico  ou  o  número  de  novos  episódios  de  uma doença em particular, diagnosticada dentro de determinado período. A  incidência reflete o número de novos casos que  surgem  em  uma  população  em  risco  durante  um  período  de  tempo  especificado.  A  população  em  risco  é considerada  como  os  indivíduos  sem  a  doença,  mas  que  estão  em  risco  de  desenvolvê­la.  É  determinada  pela divisão do número de novos casos de uma doença pela parte da população em risco de desenvolvimento da doença durante o mesmo período (p. ex., novos casos por mil ou 100 mil indivíduos na população que estão em risco). A incidência cumulativa estima o risco de desenvolvimento da doença durante esse intervalo de tempo. A  prevalência é  a  medida  de  doença  existente  em  uma  população  em  determinado  ponto  no  tempo  (p.  ex.,  número  de  casos existentes dividido pela população atual).8 A prevalência não é uma estimativa do risco de desenvolvimento de uma doença,  porque  é  uma  função  tanto  de  novos  casos  quanto  do  tempo  em  que  os  casos  permanecem  na  população. Incidência e prevalência são sempre relatadas como taxas (p. ex., casos por 100 ou casos por 100.000).

Morbidade e mortalidade Estatísticas  de  morbidade  e  mortalidade  fornecem  informações  sobre  os  efeitos  funcionais  (morbidade)  e causadores  de  morte  (mortalidade)  característicos  de  determinada  doença.  Estas  estatísticas  são  úteis  por possibilitar a antecipação das necessidades de cuidados de saúde, o planejamento de programas de educação pública, o direcionamento dos esforços de pesquisa em saúde e a alocação de recursos para a área da saúde. Morbidade  descreve  os  efeitos  de  uma  doença  sobre  a  vida  de  um  indivíduo.  Muitas  doenças,  como  a  artrite,

apresentam  taxas  de  mortalidade  baixas,  mas  têm  impacto  significativo  na  vida  do  indivíduo.  Morbidade  está relacionada não apenas com a ocorrência ou incidência, mas com a persistência e as consequências a longo prazo de VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 determinada doença. As  estatísticas  de  mortalidade  fornecem  informações  sobre  as  causas  de  morte  em  determinada  população.  Na maioria  dos  países,  os  indivíduos  são  legalmente  obrigados  a  registrar  determinados  fatos,  como  idade,  sexo  e causa  da  morte  no  atestado  de  óbito.c  Procedimentos  de  classificação  estabelecidos  por  acordos  internacionais (como a Classificação Internacional de Doenças [CID] criada pela OMS) são utilizados para a codificação da causa de  morte,  com  dados  expressos  em  taxas  de  mortalidade.1 As  taxas  brutas  de  mortalidade  (ou  seja,  o  número  de mortes  em  determinado  período)  não  levam  em  consideração  idade,  sexo,  raça,  condição  socioeconômica  e  outros fatores.  Por  esta  razão,  a  mortalidade  geralmente  é  expressa  como  taxas  de  mortalidade  para  uma  população específica, como a taxa de mortalidade infantil. A mortalidade também pode ser descrita em termos das principais causas de morte de acordo com idade, sexo, raça e etnia. Por exemplo, entre os indivíduos com 65 anos de idade ou mais, as cinco principais causas de morte nos EUA são doença cardíaca, doença cerebrovascular, doença maligna, doenças crônicas do sistema respiratório inferior e acidentes.9

Determinação dos fatores de risco As condições consideradas suspeitas de contribuir para o desenvolvimento de uma doença são chamadas fatores de risco.  Podem  ser  inerentes  ao  indivíduo  (pressão  arterial  elevada  ou  excesso  de  peso)  ou  externos  (tabagismo  ou alcoolismo). Existem diferentes tipos de estudos empregados para determinar os fatores de risco, incluindo estudos transversais, estudos de caso­controle e estudos de coorte.

Estudos transversais e estudos de caso­controle Os  estudos  transversais  (cross­sectional)  utilizam  a  coleta  simultânea  de  informações  necessárias  para  a classificação do estado de exposição e do resultado. Podem ser utilizados para comparar a prevalência da doença em indivíduos com o fator (ou exposição) com a prevalência da doença em indivíduos que não são expostos ao fator, por  exemplo,  comparando  a  prevalência  de  doença  cardíaca  coronária  entre  fumantes  e  não  fumantes.  Estudos de caso­controle são projetados para comparar indivíduos com resultado de interesse conhecido (casos) e aqueles sem resultado de interesse conhecido (controles).8 As informações sobre exposição ou características de interesse são, então, coletadas de indivíduos em ambos os grupos. Por exemplo, as características de consumo materno de álcool em recém­nascidos com síndrome alcoólica fetal (casos) podem ser comparadas com as de crianças nascidas sem a síndrome (controles).

Estudos de coorte Uma  coorte  é  um  grupo  de  indivíduos  que  nasceram  aproximadamente  na  mesma  época  ou  partilham  algumas características  de  interesse.8  Os  indivíduos  que  fazem  parte  de  estudo  de  coorte  (também  chamado  estudo longitudinal) são acompanhados por um período de tempo para que possa ser observado um resultado específico de saúde.  Uma  coorte  pode  ser  constituída  por  um  único  grupo  de  indivíduos  selecionados  por  terem  sido  ou  não expostos a fatores de risco suspeitos. Por exemplo, dois grupos especificamente selecionados porque os indivíduos de  um  deles  foram  expostos  e  o  outro  não;  ou  um  único  grupo  exposto  em  que  os  resultados  possam  ser comparados com a população geral. Estudo  de  Framingham.  Um  dos  exemplos  mais  conhecidos  de  estudos  de  coorte  é  o  estudo  de  Framingham, realizado  em  Framingham,  cidade  do  estado  americano  de  Massachusetts.10  A  cidade  foi  escolhida  devido  ao tamanho  da  população,  à  relativa  facilidade  com  que  os  indivíduos  podiam  ser  contatados  e  à  estabilidade  da população com relação à movimentação para dentro e para fora daquela área. Esse estudo longitudinal, que começou em  1950,  foi  criado  pelo  Public  Health  Service  americano  para  estudar  as  características  de  indivíduos  que posteriormente desenvolveriam uma doença cardíaca coronariana. O estudo consistiu em 5.000 indivíduos, entre 30 e  59  anos  de  idade,  selecionados  aleatoriamente  e  acompanhados  por  um  período  inicial  de  20  anos.  Durante  esse tempo,  a  previsão  era  de  que  1.500  deles  desenvolveriam  doença  cardíaca  coronariana. A  vantagem  deste  tipo  de estudo  é  que  pode  explorar  determinado  número  de  fatores  de  risco  ao  mesmo  tempo  e  estabelecer  a  importância relativa de cada um. Outra vantagem é que os fatores de risco podem ser relacionados após outras doenças, como

acidente vascular cerebral. VENDEDOR [email protected] Nurses’  Health  Study.  Outro  estudo  de  coorte  bem  conhecido  é  o  Nurses’  Health  Study,  desenvolvido  pela http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Universidade de Harvard e pelo Brigham and Women’s Hospital. O estudo teve início em 1976, com uma coorte de 121.700  profissionais  de  enfermagem  do  sexo  feminino,  com  idade  entre  30  e  55  anos,  residentes  nos  EUA.11  O estudo foi ampliado em 1989 para incluir um grupo de 238.000 enfermeiras.11 Inicialmente projetado para pesquisar a  relação  entre  o  uso  de  contraceptivos  orais  e  a  incidência  do  câncer  de  mama,  as  enfermeiras  participantes  do estudo  forneceram  respostas  a  perguntas  detalhadas  sobre  ciclo  menstrual,  tabagismo,  dieta,  peso,  medida  da cintura, padrões de atividade, problemas de saúde e uso de medicamentos. Os pesquisadores coletaram amostras de urina,  sangue  e  até  amostras  de  unha. A  seleção  da  coorte  foi  justificada  pelo  fato  de  que  as  enfermeiras  seriam pessoas  bem  organizadas,  precisas  e  atentas  em  suas  respostas,  e  que  fisiologicamente  não  seriam  diferentes  de outros grupos de mulheres. Também foi previsto que seus padrões de fertilidade, alimentação e tabagismo seriam semelhantes aos de outras mulheres que trabalham.

História natural A  história  natural  de  uma  doença  se  refere  à  progressão  e  ao  resultado  projetado  da  doença  sem  intervenção médica. Ao  estudar  os  padrões  de  uma  doença  ao  longo  do  tempo  nas  populações,  os  epidemiologistas  entendem melhor  sua  história  natural.  O  conhecimento  da  história  natural  pode  ser  usado  para  determinar  a  evolução  da doença, estabelecer prioridades para os serviços de saúde, estabelecer os efeitos de programas de triagem e detecção precoce  na  evolução  da  doença  e  comparar  os  resultados  de  novos  tratamentos  com  o  resultado  esperado  sem tratamento. Existem  algumas  doenças  para  as  quais  não  são  conhecidos  métodos  eficazes  de  tratamento,  ou  cujas  medidas terapêuticas atualmente disponíveis se mostram eficazes apenas em determinados indivíduos. Neste caso, a história natural da doença pode ser utilizada para prever resultados. Por exemplo, a história natural da hepatite C indica que 80%  dos  indivíduos  infectados  não  conseguem  eliminar  o  víras  e  evoluem  para  um  quadro  de  infecção  crônica. 12 Informações sobre a história natural de uma doença e a disponibilidade de métodos de tratamento eficazes fornecem indicações  para  a  tomada  de  medidas  de  prevenção.  No  caso  da  hepatite  C,  a  triagem  cuidadosa  de  doações  de sangue e a conscientização de usuários de substâncias psicoativas intravenosas podem ser empregadas para evitar a transmissão  do  vírus.  Concomitantemente,  os  cientistas  tentam  desenvolver  uma  vacina  capaz  de  prevenir  a infecção  em  indivíduos  expostos  ao  vírus.  O  desenvolvimento  de  vacinas  para  impedir  a  propagação  de  doenças infecciosas  como  a  poliomielite  e  a  hepatite  B,  indubitavelmente,  tem  sido  motivado  pelo  conhecimento  sobre  a história natural dessas doenças e pela falta de medidas eficazes de intervenção. Com outras doenças, como o câncer de mama, a detecção precoce pelo autoexame da mama e a mamografia aumentam as chances de cura. Prognóstico se refere ao resultado provável e à perspectiva de recuperação do paciente afetado por determinada doença.  Pode  ser  designado  como  com  chance  de  recuperação  completa,  possibilidade  de  complicações  ou  tempo previsto de sobrevida. Geralmente, é apresentado em relação às opções de tratamento, ou seja, o resultado esperado ou  a  possibilidade  de  sobrevivência,  com  ou  sem  determinado  tipo  de  tratamento.  O  prognóstico  associado  a determinado tipo de tratamento geralmente é apresentado juntamente com o risco associado ao tratamento.

Prevenção de doenças Basicamente,  uma  vida  saudável  contribui  para  a  prevenção  de  doenças.  Existem  três  tipos  fundamentais  de prevenção: primária, secundária e terciária (Figura 1.5).8  É  importante  observar  que  os  três  níveis  são  dirigidos  à prevenção. A  prevenção  primária  se  destina  a  impedir  a  doença  pela  remoção  de  todos  os  fatores  de  risco.  Exemplos  de prevenção  primária  incluem  a  administração  de  ácido  fólico  para  gestantes  e  mulheres  que  estejam  pensando  em engravidar,  para  evitar  defeitos  do  tubo  neural  fetal;  vacinação  de  crianças  para  evitar  doenças  transmissíveis,  e aconselhamento  para  que  o  indivíduo  adote  estilos  de  vida  saudáveis  como  modo  de  evitar  doenças  cardíacas. 8 A prevenção primária muitas vezes é realizada fora do sistema de cuidado de saúde no nível da comunidade. Algumas medidas  de  prevenção  primária  são  obrigatórias  por  lei  (p.  ex.,  uso  de  cinto  de  segurança  em  automóveis  e  de capacete  em  motocicletas).  Outras  são  observadas  em  relação  a  ocupações  específicas  (p.  ex.,  uso  de  tampões  de

ouvido ou máscaras contra poeira). VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Figura 1.5 •  Níveis  de  prevenção. A  prevenção  primária  visa  impedir  a  doença. A  prevenção  secundária  detecta  e cura a doença na fase assintomática. A prevenção terciária reduz complicações da doença. (Extraída de Fletcher R. H.,  Fletcher  S.  W.  (2005).  Clinical  epidemiology:  The  essentials  (4th  ed.,  p.  149).  Philadelphia,  PA:  Lippincott Williams & Wilkins.)

A prevenção secundária detecta a doença precocemente, quando ainda é assintomática, e as medidas terapêuticas podem efetuar a cura ou impedir a progressão da doença. O uso do Papanicolaou para a detecção precoce do câncer do  colo  do  útero  é  um  exemplo  de  prevenção  secundária.  A  triagem  também  inclui  a  realização  de  entrevista (perguntando  se  a  pessoa  é  fumante),  exame  físico  (medição  da  pressão  arterial),  exames  laboratoriais (determinação  do  nível  de  colesterol)  e  outros  procedimentos  (colonoscopia)  que  podem  ser  “aplicados  de  modo razoavelmente rápido em indivíduos assintomáticos”.8 A maioria das medidas de prevenção secundária é realizada em  ambiente  clínico.  Todos  os  tipos  de  profissionais  de  saúde  (p.  ex.,  médicos,  enfermeiras,  dentistas, fonoaudiólogos, optometristas) participam na prevenção secundária. A  prevenção  terciária  é  dirigida  a  intervenções  clínicas  que  impeçam  deterioração  posterior  ou  reduzam  as complicações  de  uma  doença  já  antes  diagnosticada.  Um  exemplo  é  o  uso  de  medicamentos  β­adrenérgicos  para reduzir  o  risco  de  morte  em  indivíduos  que  tiveram  infarto  do  miocárdio.  Os  limites  da  prevenção  terciária  vão além de tratar o problema apresentado pelo indivíduo. Em pacientes diabéticos, por exemplo, a prevenção terciária requer mais do que um bom controle da glicose. Inclui também realização de exames oftalmológicos regulares para a  detecção  precoce  da  retinopatia,  orientação  para  o  cuidado  com  os  pés  e  tratamento  para  outros  fatores  de  risco cardiovasculares,  como  hiperlipidemia.8  A  prevenção  terciária  também  abarca  medidas  para  limitar  o comprometimento físico e o impacto social provocado pela doença. A maioria dos programas de prevenção terciária faz parte do sistema de saúde e envolve a atuação de diferentes tipos de profissionais de saúde.

Prática baseada em evidências e diretrizes para a prática clínica A  prática  baseada  em  evidências  e  as  diretrizes  para  a  prática  clínica  ganharam  popularidade  entre  médicos, profissionais  de  saúde  pública,  organizações  de  saúde  e  junto  ao  público  como  meio  de  aprimorar  a  qualidade  e  a eficiência  dos  cuidados  de  saúde.  Seu  desenvolvimento  ocorreu,  pelo  menos  parcialmente,  devido  à  enorme quantidade  de  informações  publicadas  sobre  diagnóstico  e  medidas  de  tratamento  para  várias  condições  clínicas, bem como a demandas por cuidados de saúde de melhor qualidade e custo mais baixo. Prática baseada em evidências  se  refere  à  tomada  de  decisões  na  área  da  saúde  com  base  em  dados  científicos que demonstram um modo específico de gerenciar determinada doença, sintomas e queixas do paciente. O emprego da prática baseada em evidências obriga os profissionais de saúde a não exercerem a prática apenas à “sua” maneira ou  porque  “sempre  foi  feito  assim”. A  prática  baseada  em  evidências  tem  como  fundamento  a  integração  entre  a expertise clínica do profissional e a melhor evidência clínica externa produzida por pesquisas sistemáticas.13 O termo expertise clínica implica a proficiência e o julgamento que os clínicos adquirem individualmente com a experiência  e  a  prática  clínica.  A  melhor  evidência  clínica  externa  se  baseia  na  identificação  de  pesquisas

clinicamente relevantes, muitas vezes de ciências básicas, mas especialmente a partir de estudos clínicos centrados no  paciente  e  focalizados VENDEDOR na  exatidão  e  na  precisão  dos  testes  e  métodos  de  diagnóstico,  no  poder  de  indicadores [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 prognósticos e na eficácia e na segurança dos esquemas terapêuticos, de reabilitação e de prevenção. Diretrizes  para  a  prática  clínica  são  normatizações  sistematicamente  desenvolvidas  destinadas  a  fornecer informações  aos  profissionais  e  indivíduos  na  tomada  de  decisões  sobre  os  cuidados  de  saúde  em  circunstâncias clínicas específicas.6,13  Os  profissionais  de  saúde  devem  não  apenas  rever,  mas  também  contrabalançar  diversos resultados,  tanto  positivos  como  negativos,  e  fazer  recomendações.  Diretrizes  são  diferentes  de  revisões sistemáticas. Podem ter a forma de algoritmos, que são métodos passo a passo para resolver um problema, normas publicadas para os cuidados com o paciente, ou uma combinação dos dois. O  desenvolvimento  de  diretrizes  para  a  prática  baseada  em  evidências  frequentemente  utiliza  métodos  como  a meta­análise para combinar evidências de diferentes estudos e produzir estimativa mais acurada da precisão de um método  de  diagnóstico  ou  dos  efeitos  de  um  método  de  intervenção.14  O  desenvolvimento  de  diretrizes  para  a prática  baseada  em  evidências  exige  revisão  constante.  Os  profissionais  responsáveis  por  essas  revisões  incluem aqueles  com  experiência  no  conteúdo  clínico,  que  podem  verificar  a  integridade  da  revisão  da  literatura  e  garantir sensibilidade  clínica;  especialistas  no  desenvolvimento  de  diretrizes,  que  podem  examinar  o  método  pelo  qual  a diretriz foi desenvolvida; e usuários em potencial destas diretrizes.13 Uma  vez  desenvolvida,  uma  diretriz  para  a  prática  clínica  deve  ser  constantemente  revista  e  alterada  para  se manter  atualizada  em  relação  a  novos  resultados  de  pesquisas  e  novos  métodos  de  diagnóstico  e  tratamento.  Por exemplo,  tanto  as  Guidelines  for  the  Prevention,  Evaluation,  and  Treatment  of  High  Blood  Pressure,7 desenvolvidas inicialmente em 1972 pelo Joint National Committee, como também as Guidelines for the Diagnosis and  Management  of  Asthma, 15  criadas  em  1991  pelo  Expert  Panel,  passaram  por  várias  revisões,  à  medida  que surgiam novas evidências a partir de pesquisas. As  diretrizes  para  a  prática  baseada  em  evidências,  que  se  destinam  ao  cuidado  direto  do  paciente,  também  são importantes na orientação da pesquisa para os melhores métodos de diagnóstico e tratamento de problemas de saúde específicos. Por exemplo, os profissionais de saúde utilizam os mesmos critérios para o diagnóstico da extensão e gravidade  de  uma  condição  específica,  como  a  hipertensão  arterial,  por  meio  de  diretrizes  comprovadas  para hipertensão  (The  7th  Report  of  the  Joint  National  Committee  on  Prevention,  Detection,  and  Evaluation,  and Treatment of High Blood Pressure [JNC7]). Os profissionais de saúde também utilizam os mesmos protocolos de tratamento  com  seus  pacientes  de  hipertensão  até  que  novos  dados  forneçam  suporte  a  uma  mudança,  como  a utilização de novos agentes farmacológicos.

Resumo

Epidemiologia  se  refere  ao  estudo  de  doenças  em  populações.  Busca  padrões,  como  idade,  raça  e  hábitos alimentares entre os indivíduos afetados por uma doença específica. Esses padrões são utilizados para determinar em que circunstâncias ocorre essa doença. Incidência é o número de novos casos que surgem em dada população durante  certo  período  de  tempo.  Prevalência  é  o  número  de  indivíduos  em  uma  população  portadores  de determinada doença em um ponto no tempo ou período. Incidência e prevalência são relatadas como proporções ou taxas (p. ex., casos por 100 ou 100 mil habitantes). Morbidade descreve os efeitos de uma doença sobre a vida de um  indivíduo.  Está  relacionada  com  a  incidência  da  doença,  bem  como  com  a  persistência  e  as  consequências  a longo  prazo. As  estatísticas  sobre  mortalidade  fornecem  informações  sobre  as  causas  de  morte  em  determinada população. As condições suspeitas de contribuir para o desenvolvimento de uma doença são denominadas fatores de risco. Os estudos empregados para estabelecer os fatores de risco incluem estudos transversais, estudos de caso­controle e  estudos  de  coorte.  A  história  natural  se  refere  à  progressão  e  ao  resultado  previstos  de  uma  doença  sem intervenção  médica.  Prognóstico  é  o  termo  empregado  para  designar  o  resultado  provável  e  a  perspectiva  de recuperação de uma doença. Os três tipos fundamentais de prevenção são a primária, a secundária e a terciária. A prevenção primária, como imunizações,  está  direcionada  para  a  remoção  de  fatores  de  risco,  impedindo  a  doença.  A prevenção secundária, como um exame de Papanicolaou, detecta a doença quando ainda é assintomática e pode ser curada com tratamento

adequado. A prevenção terciária, como o uso de medicamentos β­adrenérgicos na redução do risco de morte em indivíduos  que  tiveram VENDEDOR infarto  do  miocárdio,  concentra­se  em  intervenções  clínicas  que  impeçam  maior [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 deterioração ou reduzam as complicações de uma doença. A prática baseada em evidências e as diretrizes para a prática clínica são mecanismos que utilizam a melhor evidência científica atual para a tomada de decisões sobre a saúde dos indivíduos. Baseiam­se na experiência do profissional  integrada  à  melhor  evidência  clínica  de  uma  revisão  sistemática  ou  de  trabalhos  de  pesquisa confiáveis. As diretrizes de práticas podem assumir a forma de algoritmos, que são métodos passo a passo para resolução de problemas, normas por escrito, ou uma combinação destes.

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________________ a N.R.T.: No Brasil, o conceito de saúde e o Sistema Único de Saúde (SUS) estão definidos na Constituição Federal, 2008, do VENDEDOR [email protected] artigo 196 ao 200. Fonte: http://conselho.saude.gov.br/web_sus20anos/20anossus/legislacao/constituicaofederal.pdf.

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bN.R.T.: No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) atua em todos os setores relacionados com produtos e

serviços que possam afetar a saúde da população. Fonte: http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/anvisa/home. c N.R.T.: No Brasil, a categoria raça/cor é de preenchimento obrigatório em vários formulários da saúde, incluindo o atestado de óbito. Fonte: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/declaracao_de_obito_final.pdf.

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Crianças  não  são  adultos  em  miniatura.  A  maturação  física  e  psicológica  e  o  desenvolvimento  influenciam fortemente  no  tipo  de  enfermidade  que  poderá  acometer  a  criança  e  na  sua  resposta  às  doenças.  Embora  muitos sinais e sintomas sejam os mesmos para indivíduos de todas as faixas etárias, determinadas doenças e complicações têm  maior  probabilidade  de  ocorrer  em  crianças.  Este  capítulo  apresenta  uma  visão  geral  dos  estágios  de desenvolvimento  da  infância  e  das  necessidades  de  cuidados  de  saúde  relacionadas.  Doenças  específicas  serão tratadas em diferentes capítulos ao longo do livro. No  final  do  século  19,  a  taxa  de  mortalidade  infantil  era  de  200  em  cada  1.000  nascidos  vivos.1  As  doenças infecciosas  proliferavam  e  as  crianças,  com  seu  sistema  imunológico  imaturo  e  inexperiente  e  sua  exposição frequente a outras crianças infectadas, eram especialmente vulneráveis. Atualmente, as taxas de mortalidade infantil nos EUA mostram­se significativamente reduzidas como resultado de vários fatores, incluindo: • Introdução de agentes antimicrobianos

• Controle de doenças infecciosas • Avanços tecnológicos e na área nutricional • Iniciativas  de  colaboração  preventiva,  patrocinadas  por  programas  federais  e  estaduais,  departamentos  de  saúde locais, setor privado e iniciativas comunitárias.2 No entanto, o baixo recorde nos EUA de 6,4 óbitos infantis por 1.000 nascidos vivos em 2009 foi maior do que o de  muitos  países  do  mundo  industrializado.3,4  Igualmente  preocupante  é  a  diferença  entre  as  taxas  de  mortalidade para crianças brancas e não brancas.a Recém­nascidos negros não hispânicos e americanos nativos do Alasca e de ascendência indígena vêm mantendo consistentemente uma taxa de mortalidade mais alta do que a de outros grupos étnico­raciais.4  A  maior  disparidade  é  observada  entre  lactentes  negros  não  hispânicos.  Em  2006,  a  taxa  de mortalidade infantil para crianças negras não hispânicas alcançava uma média de 13,4 por 1.000 nascidos vivos, em contraste com crianças brancas não hispânicas, cuja taxa de mortalidade média era de 5,6 por 1.000. 3 Uma  das  causas  mais  desconcertantes  de  mortalidade  infantil  é  a  incidência  de  parto  prematuro  e  de  recém­ nascidos de baixo peso ao nascer (BPN) entre mulheres de todas as raças e classes. As razões para a disparidade e a incidência  de  prematuros  e  recém­nascidos  de  baixo  peso  estão  relacionadas  com  a  falta  de  assistência  pré­natal entre mulheres negras não hispânicas e com a quantidade de gêmeos, trigêmeos e nascimentos múltiplos de maior número entre mulheres brancas.2,5

Crescimento e desenvolvimento

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:

o



Caracterizar o uso de percentis para descrever o crescimento e o desenvolvimento durante o 1

ano de vida e a infância

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Descrever os principais eventos ocorridos durante o desenvolvimento pré-natal, da fecundação até o nascimento



De䎫䀀nir os termos baixo peso ao nascer, pequeno para a idade gestacional e grande para a idade gestacional

Os termos crescimento e desenvolvimento descrevem um processo dinâmico contínuo que começa com um óvulo fertilizado e continua durante o l  o ano de vida, a infância e a adolescência até alcançar a idade adulta. Crescimento aponta  as  alterações  físicas  no  tamanho  corporal  como  um  todo  ou  em  suas  partes  individuais.  Desenvolvimento, por  outro  lado,  considera  outros  aspectos  do  crescimento,  como  mudanças  nas  capacidades,  aquisições  de habilidades  e  comportamento  psicossocial.  A  aquisição  de  competências  ocorre  de  maneira  padrão  –  do  mais simples para o mais complexo e do geral para o específico.6 Além disso, o desenvolvimento pediátrico progride em uma  sequência  previsível,  da  cabeça  para  os  pés  (cefalocaudal)  e  da  linha  média  para  a  periferia  (proximodistal)6 (Figura  2.1).  Cada  fase  de  desenvolvimento  se  baseia  no  sucesso  obtido  na  fase  anterior,  com  a  finalidade  de alcançar uma habilidade de nível superior. Por exemplo, antes de ser capaz de sentar­se, o lactente deve aprender a rolar o corpo. Do mesmo modo, antes de conseguir andar, a criança deve aprender a sustentar o corpo. Crescimento  e  desenvolvimento  englobam  uma  complexa  interação  entre  influências  genéticas  e  ambientais, como  qualidade  nutricional  e  estimulação  sensorial.6,7  A  experiência  de  cada  criança  é  única,  e  os  padrões  de crescimento  e  desenvolvimento  podem  ser  profundamente  diferentes  dentro  do  contexto  considerado  normal. Devido a esta enorme variabilidade, essas normas muitas vezes podem ser expressas apenas em termos estatísticos. A avaliação do crescimento e do desenvolvimento requer a comparação do crescimento e do desenvolvimento da criança  com  relação  a  um  padrão.  As  estatísticas  são  cálculos  derivados  de  medições  e  são  empregadas  para descrever  a  amostra  medida  ou  para  fazer  previsões  sobre  o  restante  da  população,  representada  pela  amostra. Como toda criança cresce e se desenvolve em um ritmo particular, o padrão deve, de algum modo, considerar essa variação individual. Tipicamente, o padrão é derivado de medições feitas a partir de uma amostragem de crianças, considerada representativa da população total. Quando são feitas diversas medições das variáveis biológicas, como altura, peso, circunferência cefálica e pressão arterial, a maioria dos valores se situa em torno do centro ou meio de todos os valores. A disposição dos dados em um gráfico dá origem a uma curva em forma de sino, que representa a distribuição  normal  desses  valores  continuamente  variáveis.  Média  e  desvio  padrão  são  valores  estatísticos comumente  empregados  para  descrever  as  características  de  uma  população.  A  média  representa  o  valor  médio encontrado nas medições. A média representa a soma dos valores dividida pelo número de valores. Uma curva de Gauss normal é simétrica, com a média localizada no centro da curva e metade dos valores localizados nas laterais. O desvio padrão determina o quanto um valor varia ou se afasta da média. O primeiro ponto de um desvio padrão acima  e  abaixo  da  média  incluem  68%  de  todos  os  valores;  dois  desvios  padrão,  95%  de  todos  os  valores,  e  três desvios padrão, 99,7% de todos os valores.7 Se a altura de uma criança está dentro de um desvio padrão da média, significa que ela é tão alta quanto 68% das crianças da população. Se a altura de uma criança é maior do que três desvios padrão acima da média, ela é mais alta do que 99,7%) das crianças daquela população.

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Figura 2.1 • O padrão de crescimento infantil é considerado na direção da cabeça aos pés, ou cefalocaudal, e em um  padrão  do  centro  para  as  extremidades,  chamado  proximodistal.  (Extraída  de  Bowden  V.  R.,  Greenberg  C.  S. (2010). Children and their families: The continuum of care (2nd ed., p. 77). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

A curva de sino também pode ser marcada por percentis, que são úteis para comparar os valores de um indivíduo com  outros  valores.  Quando  os  dados  quantitativos  são  dispostos  em  ordem  ascendente  e  descendente,  pode  ser descrito um valor intermediário chamado mediana, com a metade (50%) dos valores encontrados em cada um dos lados. Os valores podem ainda ser divididos em percentis. Um percentil é um número que indica a porcentagem de valores  para  a  população  que  é  igual  a  ou  abaixo  do  número.  Os  percentis  são  usados  com  mais  frequência  para comparar o valor de um indivíduo com um conjunto de normas. São usados de modo extensivo para desenvolver e interpretar gráficos de crescimento físico e medidas de capacidade e inteligência. A utilização de gráficos de crescimento padronizados pode fornecer aos profissionais de saúde um meio de aferir o  que  representa  uma  trajetória  de  crescimento  normal  da  criança  ou  alertá­los  sobre  o  que  representa  um  padrão

atípico.8 Atualmente, nos EUA são utilizadas duas tabelas diferentes de crescimento, com base na idade da criança. O  CDC  (Centers  for  Disease  Control  and  Prevention)  recomenda  que  seja  usado  o  gráfico  de  crescimento  criado VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (2006) para medir crianças de 0 a 2 anos e o gráfico criado pelo CDC em  2000  para  todas  as  crianças  com  mais  de  2  anos  de  idade.8  O  gráfico  da  OMS  (2006)  difere  dos  gráficos  de crescimento  anteriormente  utilizados  pelo  CDC  pelo  fato  de  que  os  gráficos  da  OMS  foram  desenvolvidos  como resultado  de  um  estudo  longitudinal  rigoroso,  no  qual  foi  incluída  uma  amostra  internacional  de  crianças  de diversos grupos étnicos.8–12 Como os gráficos da OMS foram desenvolvidos com base em uma amostra global de crianças, eles podem ser aplicados para todas elas, independentemente da etnia, condição socioeconômica e tipo de alimentação.12  Os  resultados  de  alguns  estudos  recentes  confirmam  que  as  tabelas  de  crescimento  da  OMS apresentam um indicador mais sensível, que possibilita intervenção mais precoce na faixa etária que inclui crianças muito  novas.13–15  As  tabelas  de  crescimento  para  crianças  estão  disponíveis  no  site  do  CDC:b http://www.cdc.gov/growthcharts/data_tables.htm.

Crescimento e desenvolvimento pré­natal Considera­se que o desenvolvimento humano começa com a fecundação, a união do espermatozoide com o óvulo, formando  o  zigoto  (Figura  2.2).  O  processo  se  inicia  com  a  união  de  um  número  haploide  de  cromossomos paternos  (23,  X  ou Y)  e  maternos  (23,  X)  na  ampola  da  tuba  uterina  ou  oviduto,  onde  se  fundem  para  formar  o zigoto.16,17  Em  um  intervalo  de  24  h,  o  organismo  unicelular  se  transforma  em  um  organismo  de  duas  células  e, dentro de 72 h, em um organismo de 16 células denominado mórula. Esta série de divisões mitóticas é denominada clivagem  [ou  segmentação].  Durante  a  clivagem,  essa  massa  de  células  de  rápido  desenvolvimento  percorre  o oviduto  até  o  útero  por  meio  de  uma  série  de  movimentos  peristálticos.  Pouco  tempo  depois  de  entrar  no  útero (cerca de 4 dias após a fecundação), a mórula é separada em duas partes por um fluido uterino. A camada exterior dá  origem  à  placenta  (trofoblasto)  e  a  camada  interna  dá  origem  ao  embrião  (embrioblasto).  Neste  estágio,  a estrutura  é  denominada  blastocisto.  No  6o  dia,  o  blastocisto  adere  ao  endométrio.  Este  é  o  início  da  fase  de implantação, que se completa durante a segunda semana de desenvolvimento.16,18 O  desenvolvimento  pré­natal  é  dividido  em  dois  períodos  principais.  O  primeiro  período,  ou  embrionário,  se inicia no decorrer da 2a semana e continua até a 8a semana após a fecundação.17,18 Durante o período embrionário, são  desenvolvidos  os  principais  sistemas  orgânicos  e  diversas  funções  em  um  nível  mínimo.  O  segundo  período, período fetal,  se  inicia  no  decorrer  da  9a  semana  gestacional.  Durante  o  período  fetal,  ocorrem  o  crescimento  e  a diferenciação dos sistemas e órgãos do corpo humano.

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Figura 2.2 • Marcos do desenvolvimento embrionário.

Desenvolvimento embrionário O  desenvolvimento  embrionário  evolui  em  três  estágios.16  Durante  o  primeiro  estágio,  o  crescimento  se  dá  por meio  do  aumento  do  número  de  células  e  pela  elaboração  de  produtos  celulares.  O  segundo  estágio  é  de morfogênese  (desenvolvimento  da  forma),  que  inclui  grande  movimentação  celular.  Durante  esta  fase,  a movimentação  das  células  lhes  possibilita  interagir  umas  com  as  outras  para  a  formação  de  tecidos  e  órgãos.  O terceiro  estágio  é  a  fase  de  diferenciação  ou  maturação  dos  processos  fisiológicos. A  conclusão  da  diferenciação resulta na formação de órgãos capazes de executar funções especializadas. O  desenvolvimento  embrionário  se  inicia  no  decorrer  da  2a  semana  de  gestação,  com  a  implantação  do blastocisto.  À  medida  que  progride  o  processo  de  implantação  do  blastocisto,  forma­se  um  pequeno  espaço  no embrioblasto,  que  é  o  primórdio  da  cavidade  amniótica.  Concomitantemente,  ocorrem  alterações  morfológicas  no embrioblasto,  que  resultam  na  formação  de  uma  placa  quase  circular  plana  e  bilaminada,  denominada  disco embrionário. O disco embrionário, que forma o embrião propriamente dito, dá origem às três camadas germinativas do embrião (ectoderme, mesoderme e endoderme). A 3 a semana é um período de rápido desenvolvimento, em que se  destaca  a  conversão  do  disco  embrionário  bilaminar  em  um  disco  embrionário  trilaminar  por  um  processo denominado gastrulação.16–18 A ectoderme se diferencia em epiderme e sistema nervoso, e a endoderme dá origem ao revestimento epitelial das vias respiratórias, do aparelho digestivo e células glandulares de órgãos como o fígado e  o  pâncreas.  A  mesoderme  dá  origem  ao  tecido  muscular  liso,  tecido  conjuntivo,  vasos  sanguíneos,  células  do sangue, medula óssea, tecido ósseo, tecido muscular estriado e os órgãos do sistema reprodutivo e excretor. A  notocorda,  que  é  o  eixo  primitivo  sobre  o  qual  se  forma  o  esqueleto  axial,  também  se  forma  durante  a  3 a semana. O sistema neurológico começa seu desenvolvimento durante esse período. Neurulação, que é um processo que  envolve  a  formação  da  placa  neural,  pregas  neurais  e  seu  fechamento,  se  completa  durante  a  4a  semana.16,17 Distúrbios durante esse período podem resultar em defeitos no cérebro e coluna vertebral, como espinha bífida. O sistema cardiovascular é o primeiro sistema orgânico a se desenvolver. O coração primitivo, que bate e através do qual  o  sangue  circula,  se  desenvolve  durante  este  período.  Este  também  é  um  período  em  que  podem  ocorrer cardiopatias congênitas.6 No decorrer da 4a semana, o tubo neural está formado. O embrião começa a se curvar e se dobrar na estrutura em

forma  de  “C”  característica.  Os  brotos  dos  membros  são  visíveis,  bem  como  as  fossas  óticas  (primórdios  dos ouvidos  internos)  e  os  placódios  (primórdios  das  lentes  do  cristalino).  A  5 a  semana  se  destaca  pelo  rápido VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 crescimento da cabeça, secundário ao crescimento do cérebro. Durante  a  6a  semana,  os  membros  superiores  são  formados  pela  fusão  de  intumescências  em  torno  do  sulco braquial.  Na  7a  semana,  começa  a  formação  dos  dedos,  e  os  intestinos  penetram  o  cordão  umbilical  (hérnia umbilical). No decorrer da 8a semana, o embrião já lembra um ser humano na aparência – os olhos estão abertos, e as pálpebras e aurículas podem ser facilmente identificadas.

Desenvolvimento fetal O período fetal se estende da 9a semana até o nascimento.16–18 Entre a 9a e a 12a semana, o crescimento da cabeça do  feto  passa  a  ser  mais  lento,  enquanto  o  crescimento  do  corpo  no  comprimento  é  muito  acelerado.  Na  altura  da 11a  semana,  os  intestinos,  na  porção  proximal  do  cordão  umbilical,  retornam  para  o  abdome.  Há  centros  de ossificação primária no crânio e ossos longos, e a maturação da genitália externa do feto é estabelecida no decorrer da 12a  semana.  Durante  o  período  fetal,  o  fígado  é  o  principal  órgão  de  formação  de  hemácias  (i.  e., responsável pela eritropoese). Com 12 semanas, esta atividade no fígado diminuiu e a eritropoese começa a ser feita pelo baço. O rim se torna funcional em torno da 12a semana, quando a urina é passada para o líquido amniótico.18 O período entre a 13a e a 16a semana se destaca pela ossificação do esqueleto, padronização do cabelo no couro cabeludo  e  diferenciação  dos  ovários  nos  fetos  do  sexo  feminino.16  No  período  entre  a  17a  e  a  20a  semana,  o crescimento  se  desacelera.  A  pele  do  feto  é  recoberta  por  uma  penugem  fina,  denominada  lanugem  e  por  um material branco, com aparência de queijo, denominado vernix caseoso. As sobrancelhas e os cabelos da cabeça são visíveis.  Em  fetos  do  sexo  masculino,  os  testículos  começam  a  descer  e  forma­se  o  útero  em  fetos  do  sexo feminino.  A  gordura  marrom,  um  tipo  especializado  de  tecido  adiposo  que  produz  calor  por  oxidação  de  ácidos graxos, também se forma durante este período.16 Esta gordura é encontrada próximo ao coração e vasos sanguíneos que alimentam o cérebro e os rins, onde se acredita que desempenhe um papel na manutenção da temperatura desses órgãos durante a exposição às alterações ambientais ocorridas após o nascimento. No intervalo entre a 21a e a 25a semana, ocorre ganho de peso fetal significativo. Com 21 semanas, começam os movimentos  oculares  rápidos,  e  existem  relatos  de  reflexos  blink­startle  (piscar­sobressalto)  entre  a  22a  e  a  23a semana,  após  a  aplicação  de  uma  fonte  de  ruído  vibroacústica  no  abdome  materno. 16  As  células  do  tipo  II  dos alvéolos pulmonares começam a secretar surfactante. O sistema pulmonar amadurece e passa a manter a respiração no  intervalo  entre  a  26a  e  a  29a  semana.  Ocorrem  movimentos  respiratórios,  como  resultado  da  maturação  do sistema  nervoso  central  (SNC).  Nessa  idade,  um  feto  consegue  sobreviver  se  nascer  prematuramente  e  receber cuidados especializados no período pós­natal. Há ganho de peso substancial durante este período. Embora ainda um pouco magro, o feto é mais proporcional. O  intervalo  entre  a  30a  e  a  34a  semana  se  destaca  pela  quantidade  crescente  de  gordura  branca  (8%  do  peso corporal),  o  que  confere  aos  membros  fetais  uma  aparência  mais  gordinha. 16  Durante  a  35a  semana,  aparecem  os reflexos  pupilares  à  luz  e  o  reflexo  de  agarrar.  Se  um  feto  com  peso  normal  nasce  durante  este  período,  é considerado prematuro por “data”, em oposição a ser prematuro pelo “peso”. 17 O  tempo  esperado  até  o  nascimento  é  de  266  dias  ou  38  semanas  após  a  fecundação,  ou  40  semanas  depois  da última menstruação (DUM) materna.16  Neste  momento,  os  sistemas  neurológico,  cardiovascular  e  pulmonar  estão suficientemente desenvolvidos para que o lactente possa fazer a transição para a vida extrauterina. A sobrevivência de um recém­nascido depende desta adaptação após a remoção da placenta.

Peso ao nascer e idade gestacional O  desenvolvimento  durante  o  período  fetal  está  relacionado  principalmente  com  o  rápido  crescimento  e  a diferenciação de tecidos, órgãos e sistemas. O ganho de peso fetal é linear da 20a até a 38a semana de gestação. Na última  metade  da  gestação  o  feto  ganha  85%  de  seu  peso  ao  nascer.  Depois  de  38  semanas  de  gestação  a  taxa  de crescimento diminui, e isto provavelmente está relacionado com a restrição de espaço no útero e com a redução da função placentária.16 Após o nascimento, o ganho de peso retoma uma taxa semelhante à taxa intrauterina. No momento do nascimento, a média de peso de um recém­nascido a termo fica entre 3 e 4 kg. Recém­nascidos pesando 2,5 kg ou menos são classificados como portadores de baixo peso ao nascer (BPN). O BPN é subdividido

em muito baixo peso (MBP) e extremo baixo peso (EBP). MBP é definido como peso ao nascer inferior a 1,5 kg e 19 EBP como peso inferior a 1,0 kg. VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 O recém­nascido é considerado a termo quando o nascimento ocorre entre o início da 38 a semana e o fim da 41a semana. O recém­nascido é considerado prematuro quando nasce antes do final da 37a semana e pós­termo quando nascido  após  completada  a  41a  semana. As  menores  taxas  de  mortalidade  ocorrem  entre  os  recém­nascidos  com peso entre 3,0 e 4,0 kg e idade gestacional entre a 38a e a 42a semana.20

Crescimento intrauterino anormal O crescimento do feto no útero depende de uma multiplicidade de fatores intrínsecos e extrínsecos. O crescimento fetal ideal depende de função placentária eficiente, fornecimento adequado de energia e substratos de crescimento, ambiente hormonal adequado e espaço suficiente no útero. A variabilidade do peso ao nascer em uma população é determinada  principalmente  por  fatores  genéticos,  sexo  do  feto,  saúde  e  nutrição  maternas,  paridade,  potencial intrínseco  de  crescimento  fetal,  bem  como  outros  fatores  fisiológicos  e  ambientais.21 O crescimento anormal, que pode  ocorrer  a  qualquer  momento  durante  o  desenvolvimento  fetal,  pode  ter  consequências  imediatas  e  a  longo prazo. Na década de 1960 nos EUA, Lubchenco e Battaglia estabeleceram padrões de peso ao nascer, idade gestacional e crescimento intrauterino.22,23  Com  estes  padrões,  a  idade  gestacional  pode  ser  avaliada  e  pode  ser  identificado  o crescimento  normal  ou  anormal  do  feto. A  Curva  de  Crescimento  do  Colorado  posiciona  os  recém­nascidos  em percentis.22  O  intervalo  entre  os  percentis  de  crescimento  intrauterino  10  e  90  abrange  80%  dos  nascimentos.24 O crescimento  é  considerado  anormal  quando  um  recém­nascido  se  situa  acima  ou  abaixo  dos  percentis  90  e  10, respectivamente. Pequeno para a idade gestacional. Pequeno para a idade gestacional (PIG) é um termo que denota crescimento fetal  abaixo  do  esperado.  PIG  é  definido  como  um  peso  de  nascimento  menor  que  dois  desvios  padrão  abaixo  da média  para  a  idade  gestacional  ou  abaixo  do  percentil  10.  Os  termos  pequeno  para  a  idade  gestacional  e crescimento  intrauterino  restrito  (CIUR)  são  usados  de  maneira  intercambiável,  mas  não  são  sinônimos.16,21,25 CIUR se refere a um processo que provoca redução no padrão esperado de crescimento. PIG, no entanto, se refere a um recém­nascido com peso ao nascer inferior a um ponto de corte predeterminado. 25 CIUR pode ocorrer em qualquer momento durante o desenvolvimento fetal. Dependendo do momento do agravo, o recém­nascido pode apresentar crescimento restrito simétrico ou proporcional ou crescimento restrito assimétrico ou  desproporcional.19  O  comprometimento  que  ocorre  no  início  da  gravidez,  durante  a  fase  de  crescimento hiperplásico,  resulta  em  crescimento  restrito  simétrico,  e  acontece  diminuição  proporcional  no  comprimento,  no peso e no tamanho da cabeça para a idade gestacional. 19,25 Este comprometimento é irreversível após o nascimento. As  causas  de  CIUR  incluem  anomalias  cromossômicas,  infecções  congênitas  e  exposição  a  toxinas ambientais.16,19,25  O  comprometimento  que  aparece  mais  tarde  na  gravidez,  durante  a  fase  de  crescimento hipertrófica,  acarreta  crescimento  restrito  assimétrico.19  Recém­nascidos  com  CIUR  resultante  de  desnutrição intrauterina frequentemente apresentam redução de peso desproporcional à estatura ou circunferência cefálica, mas são  poupados  do  comprometimento  do  crescimento  da  cabeça  e  do  cérebro.  Os  tecidos  e  órgãos  são  pequenos devido  à  dimensão  reduzida  das  células,  mas  não  por  redução  no  número  de  células.  No  período  pós­natal,  o comprometimento pode ser parcialmente corrigido com boa nutrição. O crescimento gestacional pode ser afetado por fatores maternos, placentários e fetais. O ambiente materno terá possivelmente  efeito  significativo  sobre  peso  e  tamanho  ao  nascer.25  Mães  abaixo  do  peso  apresentam  maior propensão de dar à luz um recém­nascido de baixo peso.25 A nutrição materna e o ganho de peso são influenciados por  vários  fatores.  Mulheres  em  risco  nutricional  e  crescimento  fetal  precário  incluem  adolescentes,  mulheres  de baixa  condição  econômica,  mulheres  com  intervalo  intergestacional  curto,  mulheres  com  restrições  dietéticas incomuns ou rígidas e mulheres que fazem trabalho físico pesado durante a gravidez.25 Diversas doenças maternas têm sido associadas a crescimento fetal restrito, incluindo hipertensão antes da gravidez, diabetes melito e doenças e  infecções  maternas  crônicas.25  O  crescimento  restrito  do  feto  também  pode  estar  relacionado  com  a  exposição materna  a  agentes  ambientais,  como  drogas  recreativas  (uso  abusivo  de  drogas  ilícitas),  fármacos  terapêuticos  e riscos  ambientais.  O  tabaco  consumido  na  forma  de  cigarro  durante  a  gravidez  reduz  o  peso  do  feto  ao  nascer. A redução no peso está relacionada com o número de cigarros consumidos.16,25

Riscos ocupacionais vinculados à exposição a agentes – como solventes industriais utilizados como diluentes de tinta,  colas  e  vernizes  –  podem  representar  uma  ameaça  tanto  para  a  gestante  quanto  para  o  feto. 25 Outros fatores VENDEDOR [email protected] possíveis  de  reduzir  o http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 crescimento  fetal  incluem  o  comprometimento  uteroplacentário  e  a  circulação 16 fetoplacentária.   Uma  grande  variedade  de  processos  patológicos  pode  conduzir  à  redução  no  fluxo  sanguíneo uterino ou à circulação do sangue para o feto; ambas as condições podem resultar em CIUR. 16 Fatores  fetais  associados  ao  CIUR  incluem  aberrações  no  número  e  na  estrutura  dos  cromossomos  e anormalidades nos genes.16 Além disso, nascimentos múltiplos provocam diminuição progressiva do peso fetal e da placenta, à medida que aumenta o número de fetos. Recém­nascidos de gestações de gêmeos e trigêmeos tendem a apresentar peso mais baixo do que na gestação de um único feto.25 As  taxas  de  mortalidade  entre  recém­nascidos  com  CIUR  são  de  10  a  20  vezes  maiores  do  que  naqueles  cujo tamanho e peso são apropriados para a idade gestacional.25 As causas dessa mortalidade devem­se, principalmente, a  hipoxia  e  anomalias  congênitas,  embora  possam  ocorrer  outras  complicações,  como  policitemia, hiperbilirrubinemia e hipoglicemia.25  Recém­nascidos  PIG  apresentam  aumento  no  volume  plasmático  e  na  massa circulante  de  hemácias,  o  que  provavelmente  é  o  resultado  de  hipoxia  fetal  e  produção  de  eritropoetina subsequente.25 Muitos dos recém­nascidos PIG também experimentam hipoglicemia de jejum durante os primeiros dias de vida, provavelmente como resultado de depleção no armazenamento de glicogênio hepático. 25 Os  efeitos  a  longo  prazo  no  atraso  do  crescimento  dependem  do  tempo  e  da  gravidade  da  lesão.  Muitas  dessas crianças apresentam problemas de desenvolvimento nos exames de acompanhamento, especialmente se o atraso de crescimento for simétrico.19  Se  a  lesão  ocorrer  mais  tarde,  devido  a  insuficiência  placentária  ou  restrição  uterina, uma boa nutrição pode levar à retomada do crescimento, possibilitando à criança alcançar as metas de crescimento apropriadas. Grande  para  a  idade  gestacional.  Grande  para  a  idade  gestacional  (GIG)  é  um  termo  que  denota supercrescimento  fetal  e  peso  ao  nascer  acima  do  percentil  90.20,25  O  crescimento  excessivo  é  possivelmente resultado  de  fatores  maternos  ou  fetais.  Fatores  maternos  incluem  obesidade  materna  e  diabetes.  Fatores  fetais consistem  principalmente  em  anomalias  genéticas  e  cromossômicas.25  O  tamanho  da  mãe  biológica  é  reconhecido como fator influenciador no peso ao nascer. Mulheres pesadas tendem a dar à luz recém­nascidos GIG.25 Mulheres com diabetes também tendem a ter recém­ nascidos GIG, especialmente se o diabetes foi mal controlado durante a gestação.25 As  complicações  de  um  recém­nascido  GIG  incluem  asfixia  e  traumatismo  devido  a  problemas  mecânicos durante o processo de nascimento, hipoglicemia, policitemia e hiperbilirrubinemia.25 A hiperglicemia materna expõe o  feto  ao  aumento  dos  níveis  de  glicose,  os  quais  estimulam  a  hiperplasia  das  ilhotas  pancreáticas  fetais  e  o aumento  na  secreção  de  insulina.  A  insulina  eleva  a  deposição  de  gordura,  e  o  resultado  é  um  recém­nascido macrossômico (tamanho do corpo grande). Recém­nascidos com macrossomia apresentam vísceras ampliadas e são grandes  e  gordos  devido  ao  aumento  na  quantidade  de  gordura  corporal.  Hiperinsulinemia  fetal  está  associada  a hipoxia fetal e policitemia induzida por eritropoetina. Policitemia coloca o recém­nascido em risco de desenvolver hiperbilirrubinemia.25  Recém­nascidos  GIG  e  filhos  de  mães  diabéticas  também  estão  em  risco  de  desenvolver hipoglicemia  (isso  ainda  precisa  ser  discutido).  Outros  efeitos  potenciais  a  longo  prazo  para  recém­nascidos  GIG incluem  resistência  à  insulina,  síndrome  metabólica,  sobrepeso  ou  obesidade,  diabetes  e  doença  cardiovascular precoce. Além disso, existem evidências crescentes que associam peso alto ao nascer a aumento no risco geral para leucemia.26

Avaliação da idade gestacional A avaliação da idade gestacional pode ser dividida em duas categorias: avaliação pré­natal e avaliação pós­natal. A avaliação  pré­natal  da  idade  gestacional  inclui  mais  comumente  cuidadoso  histórico  menstrual,  aspectos  físicos importantes durante a gestação (p. ex., tamanho do útero, detecção da frequência cardíaca e movimentos fetais), e testes para verificar a maturidade do feto (p. ex., ultrassonografia, exame do líquido amniótico). Para calcular o dia do parto, a regra Naegele usa o primeiro dia da data da última menstruação (DUM), adiciona 7 dias à DUM e conta 3 meses para trás.16,27 Este pode ser um método impreciso se a mãe não apresentar um histórico acurado ou tiver histórico de menstruação irregular, o que interfere na identificação de um ciclo normal. A  avaliação  pós­natal  da  idade  gestacional  é  feita  pela  análise  de  características  físicas  e  neuromusculares

externas, isoladamente ou combinadas. A avaliação da idade gestacional deve fazer parte do exame inicial de cada recém­nascido.  Uma  avaliação  precisa  da  idade  gestacional  facilita  a  avaliação  dos  riscos  e  a  identificação  de VENDEDOR [email protected] anormalidades  e  viabiliza http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 intervenções  mais  precocemente.  Dubowitz  e  Ballard  desenvolveram  os  métodos  mais comumente  utilizados  nos  berçários  atuais.  O  método  Dubowitz  é  abrangente  e  inclui  21  critérios  que  utilizam sinais  físicos  externos  (11)  e  neuromusculares  (10).28 A  estimativa  da  idade  gestacional  é  mais  bem  realizada  no intervalo de 12 h após o nascimento e é precisa dentro de 1 semana de idade gestacional. O método é menos preciso para recém­nascidos com idade gestacional inferior a 30 semanas. O método de Ballard é um método de Dubowitz abreviado,  que  inclui  12  critérios,  utilizando  6  sinais  físicos  externos  e  6  neuromusculares.27  O  Novo  Método  de Ballard (NBS, New Ballard Score) foi atualizado e modificado para incluir recém­nascidos com idade gestacional de 20 a 44 semanas e, atualmente, é o mais utilizado.20,24

Resumo

O crescimento e o desenvolvimento começam com a união do óvulo com o espermatozoide e se mantêm durante toda  a  vida,  desde  a  infância  até  a  idade  adulta.  Anormalidades  durante  este  processo  podem  produzir consequências profundas sobre o indivíduo. O desenvolvimento pré­natal é composto por dois períodos: período embrionário  e  período  fetal.  Durante  esses  períodos,  o  zigoto  vai  sofrendo  transformações  e  fazendo  os  ajustes necessários para a vida extrauterina, até que com a maturidade dos órgãos se torna o recém­nascido. Um recém­ nascido  é  considerado  a  termo  quando  nasce  entre  o  início  da  38a  semana  e  o  fim  da  41a  semana  de  idade gestacional;  é  considerado  prematuro  quando  nasce  antes  do  final  da  37a  semana  e  pós­maduro  quando  nascido após o final da 41a semana de idade gestacional. No  momento  do  nascimento,  o  peso  médio  total  de  um  recém­nascido  a  termo  fica  entre  3  e  4  kg.  Recém­ nascidos  com  peso  de  2,5  kg  ou  menos  ao  nascer  são  classificados  como  sendo  de  baixo  peso.  O  BPN  se subdivide ainda em MBP (  25  a  30  mg/dl),  na  qual  a  bilirrubina  atravessa  a  barreira hematencefálica  e  criam­se  depósitos  de [email protected] bilirrubina  não  conjugada  nos  núcleos  da  base  e  no  núcleo  do  tronco VENDEDOR 39,40 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 encefálico.  Kernicterus se desenvolve com níveis mais baixos de bilirrubina em recém­nascidos prematuros. O nível exato em que a bilirrubina pode ser considerada prejudicial para recém­nascidos PIG não foi estabelecido. Embora  seja  incomum,  icterícia  e  níveis  elevados  de  bilirrubina  não  conjugada  também  podem  ocorrer  em lactentes  alimentados  com  leite  materno  (icterícia  do  leite  materno).  Isto  ocorre  após  o  7o  dia  de  vida,  com concentrações máximas altas, que alcançam de 10 a 12 mg/dl durante o período entre a segunda e a terceira semana de vida.40  Recomenda­se  interromper  a  amamentação  por  1  ou  2  dias  e  substituir  por  uma  fórmula  infantil.  Isso geralmente  resulta  em  um  rápido  declínio  nos  níveis  de  bilirrubina  sérica,  após  o  qual  a  amamentação  pode  ser retomada sem o retorno da hiperbilirrubinemia. O objetivo da terapia para icterícia e hiperbilirrubinemia neonatal é impedir que a concentração de bilirrubina no sangue  alcance  níveis  neurotóxicos.39,40 As  intervenções  terapêuticas  incluem  amamentação  frequente,  para  evitar desidratação; fototerapia com o uso de protetores de fibra óptica e, nos casos mais graves, transfusão sanguínea.39 A  fototerapia  utiliza  uma  luz  azul  artificial  especial  para  alterar  a  estrutura  da  bilirrubina,  de  modo  que  possa  ser excretada na urina e nas fezes com maior facilidade. A necessidade de transfusões não é frequente, mas é indicada quando os níveis de bilirrubina alcançam 25 a 30 mg/dℓ ou quando há anemia, que se desenvolve como resultado do processo hemolítico.39

Lesões ao nascimento Lesões sofridas durante o parto são responsáveis por menos de 2% da mortalidade e da morbidade neonatais. 41 Os fatores predisponentes para lesões ao nascer incluem: • Idade materna – mães com menos de 16 ou mais que 35 anos de idade

• Primigesta • Desproporção cefalopélvica • Trabalho de parto muito longo ou muito rápido • Profunda parada transversal na descida da parte que apresenta oligo­hidrâmio fetal • Apresentação anormal • Uso de fórceps ou extração a vácuo • Recém­nascido MBP • Prematuridade extrema • Feto com cabeça muito grande (p. ex., hidrocefalia) • Anomalias fetais • Peso do feto.41 Lesões cranianas. O contorno da cabeça do recém­nascido muitas vezes reflete os efeitos da apresentação durante o  parto. A  maleabilidade  dos  ossos  do  crânio  e  as  conexões  frouxas  nas  suturas  e  fontanelas  possibilitam  que  a forma da cabeça se molde durante o parto. No parto em vértice (apresentação cefálica), a cabeça geralmente mostra achatamento da fronte, com o topo elevado e formando um plano na extremidade dos ossos parietais com a porção posterior do crânio ou com o occipital descendo abruptamente (Figura 2.7). Com 1 ou 2 dias de vida, a cabeça do recém­nascido assume formato mais ovalado.27 Esta moldagem não ocorre nos partos com apresentação pélvica ou cesariana. Bossa  serossanguinolenta  é  uma  área  localizada  de  edema  no  couro  cabeludo  causado  pela  pressão  contínua  da parte que se apresenta contra o colo do útero durante um parto em vértice. 42,43 A bossa serossanguinolenta pode se estender através das linhas de sutura e apresenta petéquias, púrpura ou equimoses. Não é necessário tratamento e, geralmente,  desaparece  ao  longo  da  primeira  semana  de  vida.  Céfalo­hematoma  é  uma  coleção  subperiosteal proveniente da ruptura de vasos sanguíneos.42,43 As margens são bem delineadas e não cruzam as linhas de sutura. Normalmente  é  unilateral,  mas  também  pode  ser  bilateral;  ocorre  com  frequência  ao  longo  da  zona  parietal.  O sangramento subperiosteal pode ser lento e, portanto, não visível por um período de 24 a 48 h. A pele que recobre a área  não  apresenta  descoloração.  Pode  haver  fratura  craniana  associada. As  fraturas,  em  geral,  são  lineares,  sem apresentar  áreas  de  depressão,  e  não  requerem  tratamento.  Os  recém­nascidos  com  céfalo­hematomas  são

assintomáticos.  Os  cuidados  devem  incluir  o  controle  de  hiperbilirrubinemia.  A  resolução  ocorre  durante  um período de 2 semanas a 3 meses. Raramente, um céfalo­hematoma pode desenvolver complicações. Grandes céfalo­ VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 hematomas  podem  resultar  em  perda  significativa  de  sangue,  causando  anemia  e  hiperbilirrubinemia.  Em  casos raros,  o  recém­nascido  pode  desenvolver  hemorragia  subdural  ou  subaracnoide.  Ocasionalmente,  se  desenvolvem depósitos de cálcio, e a tumefação pode permanecer durante todo o primeiro ano de vida.

Figura  2.7  •  Moldagem  de  calota  craniana  ou  da  porção  posterior  do  crânio  de  um  recém­nascido.  (Extraída  de Moore K. L., Dalley A. F. (2006).  Clinically oriented anatomy (5th ed., p. 903). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Fraturas.  Fraturas  do  crânio  são  incomuns  porque  o  crânio  compressível  do  recém­nascido  é  capaz  de  se  moldar para caber nos contornos do canal vaginal. No entanto, as fraturas podem ocorrer, e acontecem mais frequentemente após  um  parto  a  fórceps  ou  grave  contração  da  pelve,  com  trabalho  de  parto  difícil  e  prolongado. As  fraturas  do crânio  são  lineares  ou  deprimidas.  Fraturas  lineares  não  complicadas  muitas  vezes  são  assintomáticas  e  não requerem tratamento. Fraturas deprimidas no crânio são observadas pela chanfradura palpável na cabeça do recém­ nascido.  Exigem  intervenção  cirúrgica  se  houver  compressão  do  tecido  cerebral  subjacente.  Uma  fratura  linear simples cicatriza em um intervalo de meses.41–43 A  clavícula  é  o  osso  mais  frequentemente  fraturado  durante  o  parto. 44,45  Isso  ocorre  quando  a  passagem  dos ombros  é  difícil  em  um  parto  em  vértice  (apresentação  cefálica)  ou  com  apresentação  pélvica.  O  recém­nascido pode ou não apresentar restrição de movimentos nos membros superiores, mas um movimento passivo provoca dor. Pode haver descoloração ou deformidade e, à palpação, podem ser encontradas crepitação (o som de crepitação dos ossos  raspando  uns  contra  os  outros)  e  irregularidade.  O  tratamento  de  fraturas  totais  consiste  em  imobilizar  o braço e o ombro e em proporcionar o alívio da dor.44,45 Lesões  dos  nervos  periféricos.  Os  plexos  braquiais  se  situam  acima  das  clavículas,  nas  bases  anterolaterais  do pescoço.  São  constituídos  por  ramos  ventrais  do  quinto  nervo  cervical  (C5),  através  do  primeiro  nervo  torácico (T1).  Durante  um  parto  em  vértice,  a  excessiva  tração  lateral  da  cabeça  e  pescoço  se  afastando  dos  ombros  pode causar lesão por estiramento do plexo braquial. Em uma apresentação pélvica, a tração lateral excessiva no tronco antes da passagem da cabeça pode lacerar as raízes mais baixas do cordão cervical. Se a apresentação pélvica incluir um  parto  com  os  braços  do  recém­nascido  acima  da  cabeça,  poderá  resultar  em  lesão  da  quinta  e  da  sexta  raízes cervicais.  Quando  ocorre  lesão  de  plexo  braquial,  o  resultado  é  paralisia  do  membro  superior.  Frequentemente,  é uma paralisia incompleta.43,45 As lesões do plexo braquial podem ser de três tipos: paralisia de Erb (paralisia alta; grupo superior dos nervos

do braço), paralisia de Klumpke (paralisia baixa) e paralisia de todo o braço. Os fatores de risco incluem os recém­ nascidos GIG e um parto difícil e traumático. A paralisia de Erb ou lesão do plexo superior com envolvimento de VENDEDOR [email protected] 42 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 C5 a C7 é responsável por aproximadamente 90% das lesões do plexo.  Pode manifestar­se com graus variáveis de paralisia  do  ombro  e  do  braço.  O  braço  afetado  assume  a  “postura  em  gorjeta  de  garçom”,  com  adução  e  rotação interna  do  ombro,  extensão  do  cotovelo,  pronação  do  antebraço  e  flexão  do  punho  e  dos  dedos42,43 (Figura  2.8). Quando  o  recém­nascido  é  erguido,  a  extremidade  afetada  mostra  flacidez.  O  reflexo  de  Moro  fica  comprometido ou ausente, mas o reflexo de preensão permanece. A paralisia de Klumpke ou lesão do plexo inferior entre C5 e T1 é  rara  e  se  apresenta  com  paralisia  da  mão.42,43,45  O  punho  do  recém­nascido  é  caído,  os  dedos  mostram­se relaxados e não há reflexo de preensão palmar. O reflexo de Moro é prejudicado, com o membro superior fazendo extensão e abdução normalmente, enquanto o punho e os dedos permanecem flácidos. 43,45

Figura 2.8 • Posição do braço direito em uma criança com paralisia de Erb. Após paralisia parcial do braço, este se mantém  na  “postura  em  gorjeta  de  garçom”,  com  adução  e  rotação  interna  do  ombro,  extensão  do  cotovelo  com pronação do antebraço e flexão do punho e dos dedos.

O  tratamento  de  lesões  do  plexo  braquial  inclui  imobilização,  posicionamento  adequado  e  um  programa  de exercícios. A maioria dos recém­nascidos se recupera em um período de 3 a 6 meses. Se a paralisia persistir para além deste intervalo de tempo, poderá ser realizado um reparo cirúrgico (neuroplastia, anastomose de extremidade com extremidade, enxerto de nervo).43,45

Problemas de saúde do recém­nascido prematuro Os neonatos que nascem antes de 37 semanas de gestação são considerados prematuros. Frequentemente, podem ser

enquadrados na categoria BPN, com a maioria pesando menos de 2,5 kg e muitos com peso inferior a 1,5 kg. As taxas  de  morbidade  e  mortalidade  são [email protected] mais  altas  na  população  de  prematuros,  com  valores  inversamente VENDEDOR http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 proporcionais ao período de gestação. Embora as taxas de nascimentos prematuros nos EUA no geral estejam em declínio  (12,3%  em  2008),c  continua  a  ser  uma  preocupação  nacional  a  redução  maior  da  incidência  de  recém­ nascidos BPN e MBP.46 A meta nacional é reduzir o número de crianças com BPN para menos de 5% dos nascidos vivos  e  RNMBP  para  uma  incidência  de  menos  de  0,9%  de  nascidos  vivos  de  linhas  de  base  de  7,6%  e  1,4%, respectivamente.27  Os  objetivos  desta  iniciativa  são  melhorar  o  atendimento  pré­natal  para  todas  as  etnias  e  evitar os  partos  prematuros  e  as  complicações  médicas  associadas  que  surgem  nos  recém­nascidos  prematuros  como resultado  do  aumento  da  suscetibilidade  e  de  sistemas  orgânicos  imaturos.  O  recém­nascido  prematuro  está  mal equipado  para  suportar  os  rigores  da  transição  para  a  vida  extrauterina.  Os  sistemas  orgânicos  são  imaturos  e podem não ser capazes de sustentar a vida. O sistema respiratório pode não ser capaz de suportar a troca gasosa, a pele  pode  ser  fina,  gelatinosa  e  facilmente  danificada,  o  sistema  imunológico  está  comprometido  e  não  pode combater  uma  infecção,  e  a  falta  de  gordura  subcutânea  coloca  a  criança  em  risco  de  instabilidade  na termorregulação  corporal. As  complicações  associadas  à  prematuridade  incluem  síndrome  da  angústia  respiratória aguda (SARA), hemorragia pulmonar, taquipneia transitória, pneumonia congênita, extravasamento de ar pulmonar, displasia broncopulmonar, apneia recorrente, instabilidade nos níveis de glicose, hipocalcemia, hiperbilirrubinemia, anemia,  hemorragia  intraventricular,  enterocolite  necrosante,  instabilidade  circulatória,  hipotermia,  infecção bacteriana ou viral, retinopatia da prematuridade e coagulopatias intravasculares disseminadas. Problemas  respiratórios.  A  síndrome  da  angústia  respiratória  aguda  ou  doença  da  membrana  hialina  é  a complicação mais comum da prematuridade. A causa principal de SARA é a falta de surfactante nos pulmões. Com 24  semanas  de  gestação,  existe  surfactante  em  pequenas  quantidades  e  alguns  sacos  aéreos  terminais  (alvéolos primitivos), com trama vascular pulmonar subdesenvolvida. Se o parto ocorrer nesse momento, há pouca chance de sobrevivência do feto. Entre a 26a e a 28a semana, geralmente há surfactante e desenvolvimento pulmonar suficiente que possibilitam a sobrevivência do recém­nascido. A deficiência de surfactante leva a diminuição da complacência pulmonar,  redução  da  ventilação  alveolar  e  atelectasia.  As  manifestações  clínicas  incluem  grunhidos,  respiração rápida e superficial, retrações, abertura das narinas e cianose. A disponibilidade de terapia de reposição de surfactante exógeno tem melhorado muito o resultado da SARA. Foi demonstrado  que  a  administração  de  corticosteroides  em  mulheres  em  trabalho  de  parto  prematuro  acelera  a maturação  pulmonar  em  seus  recém­nascidos.  Atualmente,  a  administração  pré­natal  de  esteroides  é  padrão  de atendimento  para  mulheres  em  trabalho  de  parto  prematuro  até  34  semanas.  No  entanto,  como  a  taxa  de sobrevivência  dos  recém­nascidos  mais  enfermos  aumentou  e  como  o  monitoramento  geralmente  inclui  ventilação mecânica,  a  incidência  de  outras  complicações  também  aumentou.  Isto  inclui  síndromes  de  extravasamento  de  ar, displasia broncopulmonar e hemorragia intraventricular.27,45 Respiração  periódica  e  apneia  da  prematuridade  são  outros  problemas  respiratórios  comuns  em  crianças prematuras.  Pausas  breves  de  apneia,  com  duração  de  5  a  10  segundos  (respiração  periódica),  são  um  achado comum e, na maioria das vezes, se resolvem sem nenhuma causa óbvia. Por outro lado, a apneia da prematuridade é  definida  como  a  incapacidade  de  respirar  por  um  período  de  15  a  20  segundos  ou  mais,  e  muitas  vezes  é acompanhada  de  bradicardia  ou  de  cianose.47  A  apneia  da  prematuridade  pode  ser  tanto  o  resultado  da  falta  de esforço respiratório (apneia central) como de uma obstrução nas vias respiratórias superiores (apneia obstrutiva).47 O  controle  da  apneia  e  da  respiração  periódica  inclui  o  uso  de  monitores  cardiorrespiratórios  e  vários  outros tratamentos,  dependendo  da  causa  da  apneia.  Muitas  vezes,  a  estimulação  tátil  imediata  é  suficiente  para interromper  episódios  leves  de  apneia.  Podem  ser  necessários  aspiração,  reposicionamento,  suporte  ventilatório  e oxigênio  para  casos  recorrentes  ou  apneia  prolongada.  Além  disso,  podem  ser  utilizadas  metilxantinas  (cafeína, teofilina) para aumentar o esforço respiratório central em casos recorrentes de apneia da prematuridade. 47,48 Recém­ nascidos  com  apneia  obstrutiva  respondem  ao  tratamento  por  pressão  positiva  contínua  nas  vias  respiratórias (CPAP) ou pressão positiva nas vias respiratórias a dois níveis (BIPAP).47,48 Hemorragia  intraventricular.  Este  tipo  de  hemorragia,  ou  sangramento  nos  ventrículos  cerebrais,  representa preocupação  importante  entre  a  população  de  recém­nascidos  prematuros  (Figura  2.9).  Acredita­se  que  o sangramento seja o resultado de alterações no fluxo sanguíneo cerebral para vasos danificados na matriz germinal, uma  estrutura  inicial  de  desenvolvimento  que  contém  um  leito  vascular  frágil,  com  fraco  suporte  de  tecido

conjuntivo.6 A incidência de hemorragia peri­intraventricular (HIVt) aumenta com a diminuição do peso do recém­ nascido  e  com  a  idade  gestacional. A  incidência  é  maior  naqueles  que  pesam  menos  de  1,5  kg  e  nos  que  nascem VENDEDOR [email protected] 6,43,44 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 com menos de 28 semanas de idade gestacional.  Uma HIVt de manifestação nova é rara após o primeiro mês 44 de vida.

Figura 2.9 •  Hemorragia  intraventricular  em  recém­nascido  prematuro.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.) (2012).  Rubin’s  pathophysiology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  260).  Philadelphia,  PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Os  fatores  de  risco  para  HIVt  incluem  prematuridade,  SARA,  hipotensão,  corioamnionite,  pré­eclâmpsia, hipotermia,  persistência  do  canal  arterial  e  linhas  umbilicais.6  Ultrassonografia  de  crânio  é  o  método  de  escolha para o diagnóstico de HIVt. É adotado um sistema de classificação padrão, utilizando a ultrassonografia de crânio para  avaliação  de  HIVt6  (Quadro  2.1).  As  manifestações  clínicas  são  determinadas  pelo  nível  (grau)  de envolvimento.  Os  sintomas  mais  comuns  são  tônus  muscular  ruim,  letargia,  apneia,  diminuição  do  hematócrito  e sonolência.44  Em  alguns  casos  (graus  I  e  II),  o  recém­nascido  é  possivelmente  assintomático.  A  maioria  das hemorragias  tem  resolução  espontânea,  porém  hemorragias  mais  graves  podem  obstruir  o  fluxo  do  líquido cefalorraquidiano, causando hidrocefalia progressiva ou outras anormalidades neurológicas.

Quadro 2.1

Classi䘀cação da hemorragia intraventricular

Grau I: hemorragia apenas na matriz germinal

Grau II: hemorragia na matriz germinal, com extensão para os ventrículos

VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Grau III: hemorragia na matriz germinal com dilatação dos ventrículos

Grau IV: hemorragia intraventricular com extensão para o parênquima cerebral

Extraído de Bowden V. R., Greenberg C. S. (2010). Children and their families: The continuum of care (2nd ed.). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.

Enterocolite necrosante.  É  uma  condição  adquirida  do  sistema  digestório  do  recém­nascido  que  oferece  risco  de morte. A doença se caracteriza por necrose das camadas da mucosa ou submucosa do intestino e é responsável por 1 a 7% das internações em unidades de terapia intensiva neonatal.45,49 Recém­nascidos prematuros estão sob risco maior  para  enterocolite  necrosante  (ECN)  devido  à  imaturidade  do  sistema  digestório.  A  doença  raramente  é observada em recém­nascidos a termo, e a incidência e mortalidade aumentam com a diminuição do peso e da idade gestacional.45,49 Embora  as  causas  exatas  da  ECN  sejam  desconhecidas,  suspeita­se  que  três  fatores  contribuam  para  a  doença: isquemia  intestinal,  efeito  da  alimentação  enteral  (substrato  metabólico)  e  existência  de  organismos patogênicos.6,45,49  ECN  provavelmente  se  desenvolve  a  partir  de  uma  interação  da  perda  de  funcionamento  da mucosa, causada por diferentes fatores (p. ex., isquemia intestinal, infecção, inflamação) com a resposta do lactente à  lesão  (circulatória,  imunológica,  inflamatória).45,49  Qualquer  porção  do  intestino  pode  ser  afetada,  mas  a  parte distal  do  íleo  e  o  segmento  proximal  do  cólon  estão  envolvidos  na  maior  parte  dos  casos. A  necrose  do  intestino pode  ser  superficial,  afetando  apenas  a  mucosa  ou  submucosa,  ou  pode  se  estender  por  toda  a  parede  intestinal (Figura 2.10). Se a espessura total da parede intestinal for danificada, ocorrerá possivelmente perfuração. Em geral, ECN tem seu início na segunda semana, mas pode acontecer mais tarde, até mesmo no 3o mês no caso de recém­ nascidos MBP.40 As  manifestações  clínicas  da  ECN  são  variáveis.  No  entanto,  os  sintomas  iniciais  clássicos  geralmente  são intolerância alimentar, distensão abdominal e fezes com sangue logo após a primeira semana de vida. 49 Os níveis da doença  variam  de  leve  a  grave,  em  que  ocorre  perfuração  intestinal  e  um  quadro  clínico  de  deterioração  que tipicamente leva ao choque.49  O  diagnóstico  clínico  é  principalmente  radiográfico. A  característica  radiográfica  da ECN é pneumatose intestinal ou ar intramural.45–49 Pneumoperitônio indica perfuração intestinal.45,49

Figura 2.10 •  ECN  neonatal.  Fotografia  da  necropsia  do  intestino  de  um  recém­nascido  que  veio  a  óbito  por  ECN mostra necrose e pneumatose do intestino. (Extraída de Centers for Disease Control and Prevention. (2008). Public Health Image Library. ID #857. Disponível em: http://phll.cdc.gov/phll/home.asp.)

O tratamento inclui interrupção da alimentação, descompressão nasogástrica, cobertura com antibiótico de largo 45,49 espectro, reposição de líquidos e eletrólitos e nutrição parenteral total.  Uma intervenção cirúrgica para extirpar a VENDEDOR [email protected] 45,49 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 porção necrosada do intestino e criar um estoma é necessária em 25 a 50% dos recém­nascidos com ECN.  As estratégias de prevenção incluem promoção do aleitamento materno, uma vez que há redução na incidência de ECN em recém­nascidos que recebem leite humano, e administração de preparações probióticas para aumentar a função de barreira da mucosa, melhorar a nutrição e reduzir a colonização da mucosa por patógenos potenciais. 45,49–51 Infecção e septicemia neonatal. A septicemia bacteriana é caracterizada por sinais de infecção sistêmica quando há bactérias na corrente sanguínea. A incidência de septicemia bacteriana no recém­nascido é de um a dois casos por 1.000 nascidos vivos nos EUA, e até 20% dos recém­nascidos internados em unidades de terapia intensiva neonatal apresentam  cultura  positiva.52  Recém­nascidos  prematuros  têm  risco  maior  de  se  tornarem  infectados  do  que  os nascidos  a  termo  (1:250  em  prematuros  e  1:1.500  em  recém­nascidos  a  termo),  porque  a  maioria  dos  anticorpos maternos (imunoglobulina [Ig] G) é transferida durante as últimas semanas de gestação.45 Além disso, os níveis de Ig no sangue do cordão umbilical são diretamente proporcionais à idade gestacional.45 Os  termos  manifestação  precoce  e  manifestação  tardia  são  muitas  vezes  empregados  para  descrever  duas categorias  diferentes  relacionadas  com  o  início  da  infecção.  Infecções  de  manifestação  precoce  tipicamente  são definidas como aquelas adquiridas durante o parto ou até 7 dias após o nascimento. A septicemia de  manifestação tardia  tipicamente  ocorre  após  a  primeira  semana  de  vida.45,52  A  infecção  de  manifestação  precoce  resulta, tipicamente, de bactérias que foram adquiridas durante a passagem do recém­nascido pelo canal vaginal ou que são provenientes do sistema geniturinário da mãe. Pode haver um histórico de complicações obstétricas, como ruptura prolongada de membranas, prolongamento da segunda fase do trabalho de parto ou extravasamento das membranas. A  saúde  do  recém­nascido  é  gravemente  afetada  por  infecções  de  manifestação  precoce,  que  atingem progressivamente  vários  sistemas  orgânicos.  Recém­nascidos  com  este  tipo  de  septicemia  frequentemente apresentam  insuficiência  respiratória,  choque,  meningite,  coagulação  intravascular  disseminada,  necrose  tubular aguda  e  gangrena  periférica  simétrica.45  Os  dois  microrganismos  que  podem  causar  até  80%  das  infecções  de manifestação  precoce  são  os  estreptococos  ß­hemolíticos  do  grupo  B  (GBS)  e  a  Escherichia  coli  (E.  coli).52–55 GBS  permanecem  como  patógenos  mais  frequentes  em  crianças  nascidas  a  termo,  e  a  E.  coli  é  o  patógeno  mais importante  nas  infecções  que  acometem  recém­nascidos  prematuros. 53–55  Embora  menos  comuns,  devem  ser considerados  outros  microrganismos,  como  Listeria  monocytogenes,  enterococos  e  bacilos  entéricos  gram­ negativos (que não E. coli). Uma  infecção  de  manifestação  tardia  normalmente  é  adquirida  por  transmissão  entre  indivíduos  ou  por equipamento  contaminado.  Pode  ser  causada  pelos  mesmos  agentes  patogênicos  encontrados  nos  casos  de manifestação precoce ou por agentes virais.45,54 Recém­nascidos com septicemia de manifestação tardia apresentam bacteriemia,  geralmente  localizada,  como  meningite,  osteomielite,  artrite  e  infecção  do  sistema  urinário. 45 Meningite  é  observada  com  mais  frequência  como  infecção  tardia  do  que  de  manifestação  precoce.  Sinais  e sintomas clínicos de infecção tardia incluem letargia, falta de apetite, hipotonia, apatia, convulsões, abaulamento da fontanela, febre e hiperbilirrubinemia.45 As  manifestações  da  infecção  bacteriana  em  recém­nascidos  resultam  de  duas  fontes:  os  efeitos  da  invasão bacteriana  pelo  microrganismo  e  a  resposta  do  sistema  imunológico  do  lactente  às  bactérias  invasoras.54  As bactérias  liberam  endotoxinas  e  outras  substâncias  vasoativas,  causando  vasodilatação  central,  vasoconstrição periférica  e  hipovolemia  sistêmica. A  resposta  imunológica  às  endotoxinas  resulta  em  alterações  hemodinâmicas, metabólicas,  respiratórias,  do  SNC,  gastrintestinais  e  dermatológicas.  Os  sinais  de  septicemia  bacteriana  em  um recém­nascido, que podem ocorrer em todos os sistemas orgânicos, geralmente são inespecíficos e não podem ser facilmente distinguidos de outras causas. Por isso, é importante ter um alto índice de suspeita de sepse no recém­ nascido,  especialmente  nos  prematuros. A  observação  de  que  houve  mudança  sutil  no  estado  geral  de  um  recém­ nascido,  muitas  vezes  assinalada  pela  avaliação  da  equipe  de  enfermagem  de  que  a  criança  “não  está  indo  bem”, pode ser a primeira indicação de infecção. No entanto, à medida que a septicemia progride, os sinais se tornam mais graves e específicos. A  otimização  do  prognóstico  depende  do  diagnóstico  precoce  e  da  implementação  de  tratamento  adequado. Portanto,  a  avaliação  frequente  e  cuidadosa  e  a  verificação  das  condições  físicas  do  recém­nascido  podem  ter impacto  significativo  sobre  o  resultado.  A  administração  de  agentes  antimicrobianos  para  as  mães  durante  o

trabalho  de  parto  ou  para  os  recém­nascidos  imediatamente  após  o  parto  tem  demonstrado  reduzir  o  risco  de aparecimento  precoce  de  VENDEDOR infecção  por  GBS.  O  CDC  americano,d  em  colaboração  com  o  American  College  of [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Obstetricians  and  Gynecologists  e  a American Academy  of  Pediatrics,  estabeleceu  diretrizes  para  a  prevenção  de doença neonatal por GBS em 1996.53 A infecção por GBS continua a ser uma ameaça para o recém­nascido devido às  altas  taxas  de  mortalidade  e  morbidade  associadas  à  doença  e  ao  aumento  na  sobrevida  de  recém­nascidos prematuros de peso menor associada a maior risco para a aquisição de infecção por GBS.

Problemas de saúde do lactente Nos  EUA,  a  taxa  de  mortalidade  infantil  vem  caindo  de  modo  regular  nas  últimas  décadas.  No  entanto,  as  cinco principais  causas  de  morte  infantil  são  malformações  congênitas,  distúrbios  relacionados  com  gestação  de  curta duração  e  baixo  peso  ao  nascer,  síndrome  da  morte  súbita  infantil,  recém­nascidos  afetados  por  complicações maternas  durante  a  gravidez  e  lesões  não  intencionais.56  Entre  as  lesões  não  intencionais,  a  asfixia  foi  a  principal causa de morte nesta faixa etária.57 Lactentes também estão propensos à aquisição de diversos problemas de saúde durante  o  seu  primeiro  ano  de  vida,  que  podem  se  agravar  se  não  forem  reconhecidos  e  tratados  adequadamente. Muitos  deles  podem  ser  precipitados  pela  imaturidade  relativa  dos  sistemas  orgânicos.  Os  fatores  possíveis  de afetar o estado de saúde a longo prazo de um lactente incluem distúrbios nutricionais, dificuldades de alimentação, síndrome  do  recém­nascido  irritável  ou  cólica  e  déficit  de  crescimento. Além  disso,  as  doenças  infantis  serão  um problema se o lactente não estiver devidamente imunizado. Portanto, a prevenção de lesões e doenças é vital durante a infância.

Distúrbios nutricionais Alguns lactentes podem ter dificuldades para consumir o leite materno ou fórmulas infantis à base de leite de vaca devido à deficiência de lactase. A lactase é a enzima responsável pela quebra da lactose, o carboidrato encontrado no leite  materno  e  no  leite  de  vaca. Algumas  fórmulas  infantis  contêm  outros  carboidratos  que  substituem  a  lactose. Estas fórmulas são elaboradas a partir de grãos de soja. Também podem ocorrer outras intolerâncias alimentares. O tratamento  de  intolerância  ao  leite  ou  fórmula  depende  da  identificação  do  agente  causador  específico  e  de  sua eliminação  na  dieta.  Recém­nascidos  e  lactentes  frequentemente  regurgitam  a  fórmula,  mesmo  não  havendo intolerância  aos  componentes  da  fórmula.  Em  geral,  as  formulações  à  base  de  leite  de  vaca  são  preferíveis  às fórmulas à base de soja, e a troca para uma fórmula à base de soja deve ser realizada somente quando se observa um  caso  comprovado  de  intolerância.  É  importante  que  todas  as  reivindicações  de  intolerância  sejam cuidadosamente  investigadas,  antes  que  a  amamentação  do  lactente  seja  alterada  para  uma  fórmula  à  base  de  soja. Orientar os pais sobre os sinais e sintomas de intolerância e assegurar que a regurgitação da fórmula é normal pode ser  suficiente.  É  improvável  que  um  lactente  ganhando  peso,  alerta  e  bem  nutrido,  com  fezes  adequadas  e  apetite normal tenha intolerância alimentar.

Síndrome do intestino irritável infantil ou cólica A  cólica  geralmente  é  definida  como  dor  abdominal  paroxística  no  recém­nascido  que  se  manifesta  por  choro inconsolável, retração das pernas em direção ao abdome e extrema irritabilidade. 58 Os episódios de cólica duram de alguns minutos a várias horas por dia. Durante esse tempo, a maioria dos esforços para acalmar o lactente ou aliviar seu  sofrimento  são  malsucedidos.  Cólica  é  um  problema  temporário  que  na  maior  parte  dos  lactentes  (até  90%) desaparece em torno dos 3 a 4 meses de vida.59 “A cólica tem sido frequentemente descrita pela regra de três: chorar por mais de 3 h por dia, por mais de 3 dias na semana, por mais de 3 semanas” (p. 45).58 Quando os pais procuram aconselhamento sobre um recém­nascido com  cólica,  suas  preocupações  devem  ser  examinadas  pelo  profissional  de  saúde.  Com  a  possibilidade  de  haver uma causa orgânica subjacente, deve ser realizado um histórico e exame físico cuidadoso. Não existe um fator etiológico único para a causa de cólicas. Alguns dos motivos para o choro estão relacionados com problemas de alimentação, incluindo fome, engolir ar, refluxo gastresofágico e intolerância alimentar. Portanto, o  tratamento  da  cólica  não  é  específico.  Muitas  técnicas  não  médicas  e  preparações  farmacológicas  têm  sido testadas.  No  entanto,  os  medicamentos  não  se  mostram  eficientes  e  devem  ser  evitados.58  As  intervenções  não farmacológicas  incluem  conversar  ou  cantar  para  o  lactente  com  voz  suave,  balançar  em  ritmo  lento,  caminhar,

ruído  branco  e  vibração  suave,  como  um  passeio  de  carro.58  O  apoio  dos  pais  é,  provavelmente,  o  fator  mais importante no tratamento da cólica. Muitas vezes a mãe (ou o médico) pode se sentir constrangida por afirmar que é VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 frustrante não ser capaz de consolar o lactente. Uma conversa aberta sobre essa frustração pode ajudar as mães ou os  prestadores  de  cuidados  a  reconhecerem  que  seus  sentimentos  de  frustração  são  normais;  com  frequência,  isso lhes  dá  o  apoio  adicional  necessário  para  lidar  com  o  recém­nascido.  Como  a  incidência  de  cólicas  em  recém­ nascidos  amamentados  e  alimentados  com  mamadeira  é  semelhante,  as  mães  devem  ser  incentivadas  a  manter  a amamentação no peito, para que o lactente continue a receber os diversos efeitos benéficos da amamentação.

Retardo do crescimento O retardo do crescimento é um termo que se refere à incapacidade de atender aos padrões esperados de crescimento para lactentes e crianças mais novas devido à impossibilidade de obter ou utilizar os nutrientes essenciais.60 Pode ser definido como o crescimento abaixo do 3o ou 5o  percentil  ou  uma  alteração  no  padrão  de  crescimento  de  dois percentis para baixo em um curto período. Pode ter causa orgânica ou não orgânica.61 O retardo do crescimento de causa  orgânica  resulta  de  uma  causa  fisiológica  que  impede  o  lactente  de  obter  e  utilizar  os  nutrientes  de  maneira adequada. Um exemplo é o crescimento inadequado de um lactente com reserva de energia deficiente devido a um defeito  congênito  que  dificulta  a  sucção  e  a  alimentação.  O  retardo  do  crescimento  de  causa  não  orgânica  é  o resultado  de  fatores  psicológicos  que  impedem  a  ingestão  adequada  de  nutrição,  como  pobreza  ou  problemas  de interação dos pais com o lactente.61 O diagnóstico do tipo de retardo do crescimento depende de um exame e histórico cuidadoso e da avaliação com acompanhamento  seriado.  Casos  de  retardo  do  crescimento  de  causa  orgânica  geralmente  são  mais  fáceis  de diagnosticar  do  que  casos  não  orgânicos.  O  diagnóstico  de  retardo  do  crescimento  de  causa  não  orgânica  requer extensa  investigação  de  histórico,  situação  familiar,  relação  do  cuidador  com  o  lactente  e  avaliação  das  práticas alimentares. A base não orgânica deve ser considerada precocemente em todos os casos de retardo do crescimento, a fim de evitar possíveis atrasos no desenvolvimento e problemas de cunhos social e emocional.61 O tratamento desse tipo de retardo depende da causa. Como carências nutricionais a longo prazo podem resultar em  prejuízo  do  crescimento  físico  e  intelectual,  é  essencial  o  fornecimento  de  nutrição  adequada.  Nos  casos  de retardo do crescimento de causa orgânica, pode ser necessário utilizar métodos para aumentar a ingestão nutricional, ajustando a densidade calórica da fórmula ou implementando nutrição parenteral.

Morte súbita inesperada do lactente | Síndrome da morte súbita do lactente A  morte  súbita  inesperada  do  lactente  (MSIL)  é  definida  como  a  morte  inesperada  de  um  lactente  que,  depois  de necropsia  e  investigação,  pode  ser  atribuída  a  distúrbios  metabólicos,  hipotermia  ou  hipertermia,  negligência  ou homicídio,  envenenamento  ou  asfixia  acidental.62 A  síndrome  da  morte  súbita  do  lactente  (SMSL)  tem  definição similar, exceto que a causa da morte não é conclusiva e permanece inexplicada após necropsia, investigação da cena do  óbito  e  revisão  do  histórico  médico  da  criança  e  familiar.63,64  É  rara  durante  o  primeiro  mês  de  vida,  depois disso  aumenta  até  um  pico  entre  2  e  4  meses  de  vida  e,  em  seguida,  diminui.63,64  Embora  a  incidência  tenha diminuído desde que a campanha Back to Sleep (De costas para dormir), da American Academy of Pediatrics, foi iniciada nos EUA em 1994, a SMSL continua a ser responsável por mais mortes infantis além do período neonatal do  que  qualquer  outra  causa.64  Esta  campanha  orienta  que  os  recém­nascidos  sejam  posicionados  em  decúbito dorsal para dormir, a fim de evitar a síndrome da morte súbita do lactente. Fatores  associados  a  maior  risco  para  SMSL  incluem  dormir  em  decúbito  ventral,  particularmente  em  colchão macio;  prematuridade  e  baixo  peso  ao  nascer;  superaquecimento;  raça  negra  ou  indígena  e  exposição  ambiental  à fumaça de cigarro.63,65 Além disso, existem vários fatores de risco maternos que aumentam a incidência de SMSL: idade  materna  jovem  (menos  de  20  anos),  falta  de  assistência  pré­natal  ou  assistência  inadequada  e  tabagismo  ou uso de drogas ilícitas durante a gestação.63,65  Dormir  de  bruços  (decúbito  ventral)  tem  mostrado  consistentemente que  aumenta  o  risco  de  SMSL.  Atualmente,  a  Academia  Americana  de  Pediatria  recomenda  que  o  lactente  seja colocado  de  costas,  pois  é  a  posição  que  confere  menor  risco.64  Deitar  o  lactente  sobre  superfícies  macias,  como edredons e travesseiros, aumenta o risco de SMSL, assim como partilhar a cama com adultos. A  causa  exata  da  SMSL  é  desconhecida.  Várias  teorias  têm  tentado  explicar  a  incidência  dessa  síndrome, incluindo:

• Fatores genéticos

• Anormalidades  cerebrais  (anormalidades  nos  neurotransmissores  na  região  do  tronco  encefálico),  que  possam VENDEDOR [email protected] impedir um controle cardiorrespiratório eficiente http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 • Disfunção cardíaca (intervalo QT longo) • Reinalação do dióxido de carbono por dormir de bruços em superfície macia. 63,66 O  diagnóstico  de  SMSL  pode  ser  estabelecido  somente  se  for  realizada  necropsia  para  excluir  outras  causas  de morte.  Diferenciar  um  caso  de  maus­tratos  de  SMSL  é  uma  consideração  importante,  e  cada  caso  de  SMSL  deve ser submetido a exame cuidadoso. É fundamental oferecer apoio aos membros da família de um lactente que vai a óbito por SMSL. Os pais muitas vezes se sentem culpados ou se consideram inaptos a tratar de uma criança. A existência de um exame minucioso para  diferenciar  uma  morte  por  SMSL  de  uma  morte  por  maus­tratos  aumenta  a  culpa  e  a  decepção  sentida  pela família.  Depois  de  estabelecido  o  diagnóstico  de  SMSL,  é  importante  que  os  pais  e  outros  familiares  recebam informações  sobre  a  síndrome.  Os  profissionais  de  saúde  devem  ter  conhecimento  pleno  sobre  os  recursos disponíveis  para  famílias  em  caso  de  morte  por  SMSL.  Os  irmãos  do  lactente  que  sofreu  SMSL  também necessitam de informação e suporte para ajudar com a dor do processo de luto.67

Lesões Embora  as  principais  causas  de  morte  durante  a  infância  estejam  relacionadas  com  condições  médicas,  lesões  não intencionais  podem  ocorrer.  Na  verdade,  os  acidentes  são  a  quinta  causa  de  morte  durante  esse  período. 56,57 Sufocamento  foi  classificado  como  a  maior  causa  de  morte  relacionada  com  lesões  nesta  faixa  etária. 57 Acidentes podem  não  ser  a  principal  causa  de  morte  infantil,  mas  são  uma  causa  importante  e  é  fundamental  orientar  pais  e responsáveis quanto à prevenção. À medida que o lactente desenvolve um senso de exploração, a construção de um ambiente “à prova de crianças” pode ser uma precaução importante para evitar lesões. As famílias devem conhecer estratégias para promover a segurança infantil. Isso inclui informações relacionadas com a segurança do lactente no automóvel,  em  casa,  ao  brincar,  na  água,  ao  ar  livre,  o  cuidado  em  relação  a  estranhos  e  a  preparação  para emergências.6 Nenhuma casa ou ambiente é completamente seguro, por isso é essencial a supervisão do lactente por um cuidador competente, de modo que as lesões possam ser evitadas. Outros  fatores  influenciáveis  a  mortes  infantis  relacionadas  com  lesão  incluem  acidentes  automobilísticos.  A maioria  dos  estados  americanos  exige  que  os  recém­nascidos  sejam  colocados  em  um  assento  infantil,  ou dispositivo  de  retenção  aprovado  pelos  órgãos  competentes,  enquanto  trafegam  em  veículo  automotor.e  O  lugar considerado  mais  seguro  para  o  transporte  do  recém­nascido  e  lactente  é  o  meio  do  banco  traseiro,  com  o dispositivo  de  retenção  afixado  no  sentido  oposto  ao  da  posição  normal  dos  bancos  do  veículo.6  Essa  posição  é recomendada para a maioria dos lactentes até 2 anos de idade ou peso ou altura maior recomendados pelo fabricante do  assento  de  segurança.68  Muitos  hospitais  não  liberam  a  saída  do  lactente  a  menos  que  haja  um  sistema  de retenção de segurança no veículo. Se a família não puder pagar por um sistema de retenção, existem programas que fazem  doação  ou  empréstimo  desses  dispositivos.  Os  profissionais  de  saúde  devem  orientar  o  público  sobre  os perigos de transportar lactentes em veículos sem tomar as devidas precauções para sua proteção.

Doenças infecciosas Uma das melhorias mais impressionantes relacionadas com a saúde infantil tem sido a vacinação generalizada para as  principais  doenças  transmissíveis  na  infância,  incluindo  difteria,  coqueluche,  tétano,  poliomielite,  sarampo, caxumba,  rubéola,  hepatite  B  e  infecção  pelo  vírus  Haemophilus  influenzae  tipo  B.  O  CDC,  por  intermédio  do Comitê  Consultivo  em  Práticas  de  Imunização  em  colaboração  com  a  Academia  Americana  de  Pediatria  e  a Academia  Americana  de  Médicos  de  Família,  recomenda  que  nos  EUAf  os  lactentes  recebam  vacina  contra  16 doenças,  que  totalizam  21  injeções  até  os  18  meses  de  idade.69  A  imunização  contra  doenças  infecciosas  tem reduzido de modo significativo as taxas de morbidade e mortalidade em recém­nascidos e lactentes. Estas vacinas são  administradas  de  acordo  com  um  calendário  regular,  como  parte  da  promoção  da  saúde  para  recém­nascidos, lactentes  e  crianças.  No  entanto,  embora  tenha  diminuído  a  prevalência,  os  programas  de  imunização  ainda  não conseguiram  erradicá­las  totalmente.  A  efetividade  dos  programas  de  imunização  depende  da  adesão  dos envolvidos.  Embora  a  maioria  das  vacinas  possa  ser  recebida  nos  centros  de  saúde  locais,  sem  custo  ou  a  baixo

custo,  muitos  recém­nascidos  e  lactentes  não  costumam  ser  imunizados  ou  não  recebem  o  esquema  completo  de vacinação.  Um  dos  motivos  para  não  [email protected] imunizar  as  crianças  pode  ser  a  preocupação  do  público  de  que  as VENDEDOR 70 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 imunizações, especialmente aquelas que contêm o conservante timerosal, possam causar autismo.  Até a presente data,  o  Institute  of  Medicine  (IOM)  nega  haver  qualquer  relação  entre  o  uso  de  vacinas  contendo  timerosal  e  o autismo.  Uma  revisão  científica  de  estudos  epidemiológicos  foi  realizada  pelo  IOM,  e  o  comitê  concluiu  que  o corpo  de  evidências  epidemiológicas  favorece  a  rejeição  de  uma  relação  causal  entre  a  vacina  tríplice  viral  e  o autismo.71 Portanto, é necessária a criação de novos métodos para aprimorar a forma de orientação relacionada com os benefícios da vacinação e estratégias para melhorar o acesso às vacinas. As recomendações de imunização estão sujeitas  a  alterações,  à  medida  que  as  pesquisas  conduzam  ao  desenvolvimento  de  melhores  vacinas  ou  maior compreensão dos microrganismos.

Resumo

O primeiro ano de vida é definido como o período desde o nascimento até 12 meses de idade. Durante este tempo, o crescimento e o desenvolvimento são contínuos. A imaturidade relativa de muitos dos sistemas orgânicos coloca o  recém­nascido  e  o  lactente  em  risco  de  desenvolver  diferentes  doenças.  O  nascimento  dá  início  a  diversas mudanças  nos  sistemas  orgânicos,  como  modo  de  adaptação  à  vida  pós­natal.  O  momento  do  parto  é  um  evento crítico; desajustes e lesões durante este processo são a principal causa de morte ou invalidez nesta faixa etária. O parto  prematuro  é  um  importante  problema  de  saúde.  O  recém­nascido  prematuro  está  em  risco  de  desenvolver inúmeros  problemas  de  saúde  devido  à  interrupção  do  crescimento  intrauterino  e  à  imaturidade  dos  sistemas orgânicos.

Primeira infâncias

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Descrever o crescimento e o desenvolvimento da primeira infância

Discutir os problemas de saúde comuns na primeira infância

A  primeira  infância  é  considerada  o  período  entre  12  meses  e  4  anos  de  idade.  Durante  este  tempo,  a  criança passa  por  dois  estágios:  a  fase  em  que  está  começando  a  andar  (12  meses  a  3  anos)  e  a  fase  pré­escolar  (3  a  5 anos).6 Muitas mudanças ocorrem enquanto a criança vai passando do primeiro ano de vida, pela fase de 12 meses a 3 anos até a fase pré­escolar. As principais conquistas são o desenvolvimento e o aperfeiçoamento da locomoção e da linguagem, que ocorrem à medida que as crianças progridem de um estado de dependência para independência.

Crescimento e desenvolvimento A primeira infância é um período contínuo de crescimento e maturação física. Em comparação com o primeiro ano de vida, o crescimento físico não é tão significativo. Em média, uma criança ganha cerca de 2 kg e 7 cm de altura por  ano.6  O  abdome  das  crianças  dos  12  meses  aos  3  anos  se  nivela,  e  o  corpo  vai  se  tornando  mais  magro. Acontecem os picos de energia física e a necessidade de sono cai para 8 a 13 h por dia, geralmente incluindo uma soneca.6 Com 3 anos de idade, a acuidade visual chega a 20/30 e já irromperam os 20 dentes decíduos. 6 A maturação dos sistemas orgânicos é contínua durante a primeira infância. O sistema respiratório mantém seu crescimento  e  maturação,  mas,  devido  à  imaturidade  relativa,  ao  comprimento  menor  e  ao  pequeno  diâmetro  das estruturas  das  vias  respiratórias,  são  comuns  otite  média  e  infecções  respiratórias.  Lactentes  e  crianças  dos  12 meses aos 3 anos têm o tórax em forma de barril e os músculos intercostais subdesenvolvidos, o que não é eficiente para o controle de períodos de angústia respiratória.6 A frequência respiratória se reduz na infância, com média de 20 a 30 incursões/min. A respiração abdominal permanece até 7 anos de idade. 6 O crescimento neural permanece rápido durante a primeira infância. Aos 12 meses de idade, o cérebro da criança tem  quase  2/3  do  tamanho  adulto  e  dobrou  de  peso  desde  o  nascimento.6  O  padrão  de  crescimento  cefalocaudal  e

proximodistal  se  mantém  à  medida  que  o  processo  de  mielinização  do  córtex,  do  tronco  encefálico  e  da  medula espinal  é  concluído.  Normalmente,  a  medula  espinal  está  completamente  mielinizada  aos  2  anos  de  idade.  Neste VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 momento, o controle dos esfíncteres anal e uretral e as habilidades motoras de locomoção podem ser alcançados e dominados.  A  maturação  contínua  do  sistema  neuromuscular  é  cada  vez  mais  evidente  à  medida  que  a  criança adquire melhor controle e coordenação das partes do corpo. O  crescimento  e  a  maturação  do  sistema  musculoesquelético  continuam,  com  a  ossificação  do  sistema esquelético,  o  crescimento  das  pernas  e  as  mudanças  na  proporção  entre  tecido  muscular  e  tecido  adiposo.  As pernas  crescem  mais  que  o  tronco  na  primeira  infância;  após  o  primeiro  ano  de  vida,  cerca  de  dois  terços  do aumento  da  altura  representam  o  crescimento  da  perna.  O  crescimento  muscular  é  equilibrado  pela  redução correspondente no acúmulo de tecido adiposo. Durante  a  primeira  infância,  a  criança  já  domina  muitas  tarefas  psicossociais  importantes.  A  independência começa  a  se  desenvolver,  e  a  criança  está  a  caminho  de  se  tornar  um  ser  social  no  controle  do  meio  ambiente.  O desenvolvimento e o aperfeiçoamento de habilidades motoras grossas e finas possibilitam o envolvimento com um número potencialmente infinito de tarefas e atividades. A aprendizagem é contínua e progressiva e inclui interações com os outros, comportamento social adequado e funções associadas ao papel sexual. O teórico psicanalítico Eric Erikson  descreveu  as  tarefas  a  serem  realizadas  na  primeira  infância.  Segundo  Erickson,  a  criança  de  1  a  3  anos deve  adquirir  um  senso  de  autonomia  e,  ao  mesmo  tempo,  superar  o  sentimento  de  dúvida  e  vergonha,  e  o  pré­ escolar deve desenvolver o espírito de iniciativa para superar a falta de propósito e os sentimentos de culpa.67

Conceitos fundamentais

Primeira infância



A primeira infância, que abrange o período de 12 meses até 4 anos de idade, é um período de crescimento e desenvolvimento contínuos



As principais conquistas são o desenvolvimento e aperfeiçoamento da locomoção e da linguagem, que ocorrem à medida que a criança evolui de um estado de

dependência para independência

Problemas comuns de saúde A  primeira  infância  pode  representar  riscos  significativos  para  a  saúde  da  criança  em  processo  de  crescimento  e amadurecimento. Os problemas de saúde mais comuns neste período incluem lesões, doenças infecciosas e maus­ tratos à criança.

Lesões Lesões  não  intencionais  são  a  principal  causa  de  morte  em  crianças  com  idade  entre  1  e  4  anos,  com  afogamento sendo citado como a causa mais prevalente para esta faixa etária. 56,72 A possibilidade de locomoção e a curiosidade natural,  aliadas  a  uma  falta  de  consciência  do  perigo,  colocam  crianças  de  1  a  3  anos  e  pré­escolares  em  risco especial para lesões. A incidência de lesões  não fatais, para crianças entre 1 e 19 anos de idade, é mais prevalente nos  indivíduos  do  sexo  masculino.56,72  As  taxas  de  acidentes  não  fatais  também  variam  de  acordo  com  a  faixa etária. As  taxas  para  afogamento,  incêndio,  queimaduras,  quedas  e  intoxicação  são  mais  altas  para  crianças  de  4 anos ou menos.72

Doenças infecciosas As doenças infecciosas podem ser um problema para as crianças durante a primeira infância devido à imaturidade do seu sistema imunológico. Este também pode ser o momento em que as crianças ingressam em uma creche, o que aumenta sua exposição a outras crianças e doenças infecciosas. Os principais distúrbios incluem as doenças infantis transmissíveis (resfriado comum, gripe, varicela, infecções do sistema digestório e otite média).6

Maus­tratos Os  maus­tratos  é  um  problema  crescente  nos  EUA.g  Embora  os  números  variem  de  acordo  com  métodos  e

definições  utilizadas,  as  melhores  estimativas  indicam  que  anualmente  cerca  de  3  milhões  de  denúncias  de  maus­ tratos  são  registradas  nas VENDEDOR agências  de  bem­estar  infantil,  e  cerca  de  1  milhão  dos  relatos  são  confirmados  após [email protected] 60 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 investigação.  O grupo de maior risco para abuso são crianças com menos de 4 anos de idade. Essas crianças são as mais vulneráveis por muitas razões, incluindo sua dependência, tamanho pequeno e incapacidade de se defender. As causas mais comuns de morte em casos de maus­tratos são lesões na cabeça, seguidas de lesões abdominais e sufocamento deliberado.6,73 Os maus­tratos à criança incluem abuso físico, abuso emocional, abuso sexual e negligência.74 Negligência é o tipo  mais  comum  de  maus­tratos  e  pode  assumir  a  forma  de  privação  das  necessidades  básicas  ou  não  satisfação das  necessidades  emocionais  ou  o  abandono  da  criança.60,74  Isto  frequentemente  é  atribuído  à  baixa  competência dos  pais.  De  acordo  com  o  National  Child  Abuse  and  Neglect  Data  System  (NCANDS),  53,8%  dos  agressores responsáveis por abuso e negligência infantil eram mulheres e 44,4%, homens.75 O abuso físico é definido como um dano físico não acidental deliberadamente infligido pelos pais, cuidadores ou responsáveis pela criança. A causa é  provavelmente  multifatorial,  com  fatores  predisponentes  que  incluem  pais,  filhos  e  meio  ambiente.  O  abuso emocional ou maus­tratos psicológicos incluem métodos de abuso verbal, humilhação, destruição de bens pessoais da criança, ferir ou matar o animal de estimação da criança e bullying. O abuso sexual é definido como o toque de outra  pessoa  sem  consentimento  e  inclui  relação  sexual,  sodomia  e  carícias.  Cerca  de  80.000  casos  são  relatados anualmente; contudo, estima­se que o número seja muito maior, devido à falta de relatos de casos.76 Todos os tipos de  maus­tratos  à  criança  podem  levar  a  efeitos  duradouros  relacionados  com  as  experiências  traumáticas.  Sendo assim,  a  meta  deve  ser  sempre  a  oferta  de  apoio  psicológico,  o  fomento  do  sentimento  de  autoestima  positiva  e  a prevenção de novos abusos. Além disso, deve ser fornecida aos pais orientação sobre maus­tratos à criança durante a visita ao profissional de saúde, na tentativa de evitar o principal problema de saúde na infância.

Resumo

A primeira infância é definida como o período que vai de 12 meses até 4 anos de idade e abrange a fase em que a criança começa a andar e a fase pré­escolar. O crescimento e o desenvolvimento são contínuos, mas não são tão significativos  como  no  período  pré­natal  e  o  primeiro  ano  de  vida. A  primeira  infância  é  um  período  em  que  a maioria  dos  sistemas  orgânicos  alcança  a  maturidade  e  em  que  a  criança  se  torna  um  ser  independente,  com mobilidade  própria.  Continua  a  haver  riscos  significativos  para  a  saúde  durante  esse  período,  especialmente  por doenças infecciosas e lesões. As lesões são a principal causa de morte durante esse período. Os maus­tratos vêm despontando rapidamente como importante problema de saúde.

Segunda infância

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Caracterizar o crescimento e o desenvolvimento que ocorrem durante os primeiros anos escolares

Discutir os problemas de saúde comuns na segunda infância

Neste texto, a segunda infância é definida como o período que se inicia quando a criança começa a frequentar a escola até o início da adolescência. Esses 7 anos, entre 5 e 12 anos de idade, envolvem uma grande quantidade de mudanças.  Quando  se  pensa  em  “infância”,  estes  são  os  anos  mais  frequentemente  lembrados.  As  experiências desse período têm efeito profundo sobre o desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial da criança e contribuem grandemente para o tipo de adulto que a criança se tornará.

Crescimento e desenvolvimento Embora  o  crescimento  físico  seja  constante  ao  longo  da  segunda  infância,  é  mais  lento  do  que  nos  períodos anteriores e do que no período seguinte, a adolescência. Durante a segunda infância, as crianças tipicamente ganham cerca de 3 kg e crescem uma média de 6 cm/ano. 6

Nesse  período,  as  pernas  crescem  mais,  a  postura  melhora,  e  o  centro  de  gravidade  se  desloca  para  um  ponto mais baixo. Essas mudanças, associadas ao aumento da força muscular e agilidade, ajudam a crianças a ter sucesso VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 em  suas  tentativas  de  escalada,  andar  de  bicicleta,  andar  de  patins  e  outras  atividades  físicas.  A  distribuição  da gordura  corporal  tipicamente  diminui  e,  em  combinação  com  o  alongamento  do  esqueleto,  a  criança  passa  a  ter aparência mais esbelta. À medida que a gordura corporal diminui, a massa muscular magra aumenta. Aos 12 anos de idade, meninos e meninas dobram sua força e capacidade física. Embora a força muscular tenha aumentado, os músculos  ainda  são  relativamente  imaturos.  Podem  ocorrer  lesões  pelo  exercício  de  atividades  extenuantes,  como esportes  que  exigem  alto  desempenho.  Com  o  ganho  de  estatura,  a  circunferência  cefálica  diminui  em  relação  à altura,  a  circunferência  da  cintura  diminui  em  relação  à  altura  e  o  comprimento  das  pernas  aumenta  em  relação  à altura. Com  6  anos  de  idade,  o  cérebro  da  criança  cresceu  significativamente  e  tem  cerca  de  90%  do  peso  do  cérebro adulto.6 As proporções faciais se alteram, à medida que crescem a face e a mandíbula. A dentição decídua (exceto pelos  segundos  e  terceiros  molares)  começa  a  ser  perdida  aos  5  ou  6  anos  de  idade,  quando  os  dentes  vão  sendo substituídos pela dentição permanente em um processo que se mantém por todo o período escolar. Quando nascem os primeiros dentes permanentes, podem parecer muito grandes em relação à boca e à face. Este é um desequilíbrio temporário que desaparece com o crescimento da face. As  necessidades  calóricas  para  as  crianças  mais  novas  em  idade  escolar  (entre  5  e  7  anos  de  idade)  geralmente são mais baixas, em comparação com períodos anteriores e com o período seguinte, a adolescência. Podem ocorrer estirões  de  crescimento  para  as  meninas  de  até  9  anos  de  idade  e  para  os  meninos  a  partir  de  10  ou  11  anos.67 A ingestão  calórica  e  as  exigências  nutricionais  aumentam  substancialmente  com  o  estirão  de  crescimento  na adolescência. Durante este período, também ficam evidentes alterações em outros sistemas orgânicos. As frequências cardíaca e respiratória continuam a diminuir e a pressão arterial sobe gradualmente. O crescimento dos olhos continua, e a acuidade visual é gradualmente convertida a 20/20 de visão por volta de 6 ou 7 anos de idade. 67 A ossificação e a mineralização  dos  ossos  continuam  a  se  desenvolver  com  aceleração  notável  no  crescimento  de  ossos  longos. 6 A estrutura óssea infantil não consegue resistir à pressão muscular tão bem como ossos maduros. Devem ser tomadas precauções para evitar alterações na estrutura óssea, como oferta de sapatos de tamanho adequado e incentivo para manter  a  postura  ereta.  As  crianças  devem  passar  rotineiramente  por  exames  de  triagem  de  saúde  durante  este período, para que possam ser avaliadas condições comuns da infância, como déficits visuais e auditivos, obesidade e escoliose.6 Quase no final da segunda infância, as diferenças físicas entre os dois sexos se tornam aparentes (Figura 2.11). As  meninas  geralmente  entram  na  puberdade  aproximadamente  2  anos  antes  dos  meninos,  o  que  resulta  em diferenças  notáveis  em  altura,  peso  e  desenvolvimento  das  características  sexuais  secundárias.  Existe  muita variação individual entre crianças do mesmo sexo. Pode ser extremamente difícil para as crianças lidar com essas diferenças. O ingresso no ambiente escolar tem grande impacto sobre o desenvolvimento psicossocial da criança dessa idade. Ela  começa  a  desenvolver  relacionamentos  com  outras  crianças,  formando  grupos.  O  grupo  se  torna  mais importante à medida que a criança deixa a segurança da família para entrar no mundo maior. Normalmente, durante esse período, a criança começa a formar laços mais estreitos com os “melhores amigos”. No entanto, pode mudar frequentemente  com  relação  a  quem  considera  seu  melhor  amigo. A  personalidade  da  criança  começa  a  aparecer. Embora ainda esteja em desenvolvimento, o temperamento básico e o modo de encarar a vida se tornam aparentes. Embora possam ocorrer mudanças na personalidade com a chegada da maturidade, os elementos básicos não podem ser  alterados.  A  principal  tarefa  desta  etapa,  conforme  identificado  por  Erikson,  é  o  desenvolvimento  de competências e produtividade.6  O  não  cumprimento  desta  tarefa  resulta  em  um  sentimento  de  inferioridade  ou  de incompetência, que pode dificultar a obtenção de mais progresso.6

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Figura 2.11 • Disparidades de tamanho em crianças na segunda infância. (Extraída de Bowden V. R., Greenberg C. S. (2010). Children and their families: The continuum of care (2nd ed., p. 77). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Conceitos fundamentais

Segunda infância



A segunda infância (de 5 a 12 anos) é o período em que a criança ingressa na vida escolar e vai até o início da adolescência

Problemas de saúde comuns Os problemas de saúde mais comumente observados na segunda infância incluem cárie dentária, lesões e doenças, além de sobrepeso e obesidade.

Cáries dentárias A incidência de cáries dentárias tem diminuído desde a adição de flúor à maioria dos sistemas de água nos EUA. h No entanto, continua sendo o maior problema dental nesta faixa etária.6 A alta incidência de cárie dentária durante esse  período  pode  estar  relacionada  com  atendimento  odontológico  inadequado  e  grande  quantidade  de  açúcar  na dieta.  Crianças  no  início  dessa  fase  podem  não  realizar  escovação  muito  eficiente  dos  dentes  e  podem  precisar  de assistência de adultos, porém, nesta idade, costumam se mostrar relutantes em aceitar a ajuda dos pais. Portanto, a promoção  da  saúde  deve  incluir  orientações  sobre  redução  da  quantidade  de  açúcar  na  dieta,  demonstração  da escovação adequada e atendimento odontológico apropriado.

Lesões e doenças A  principal  causa  de  mortalidade  nessa  faixa  etária  é  a  lesão  não  intencional,  principalmente  devido  a  acidentes automobilísticos. Especificamente, a maioria das mortes por lesões para crianças entre 5 e 19 anos de idade ocorreu devido  a  ser  ocupante  em  acidente  de  veículo  a  motor.72  Quedas  são  a  principal  causa  de  lesões  não  fatais  em crianças  de  todas  as  faixas  etárias  abaixo  de  15  anos  de  idade.72  O  estabelecimento  de  regras  consistentes  para  o comportamento  seguro  e  o  reforço  sobre  a  necessidade  de  usar  equipamentos  esportivos  de  proteção  são  duas medidas essenciais para a prevenção de lesões nesta faixa etária.

Embora raro, o câncer infantil é a segunda causa de mortei de crianças na faixa etária de 5 a 14 anos de idade.77 Os  tipos  mais  comuns  de  câncer  em  crianças  entre  0  e  14  anos  de  idade  são  leucemia  e  tumores  cerebrais  ou VENDEDOR [email protected] 78 79 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 malignidades do SNC.  A prevalência entre crianças brancas é maior do que entre outras etnias. Devido  ao  alto  nível  de  competência  do  sistema  imunológico  na  segunda  infância,  essas  crianças  têm  uma vantagem  imunológica  sobre  os  anos  anteriores.  A  imunização  contra  as  principais  doenças  transmissíveis  da infância  melhorou  muito  a  saúde  das  crianças  nos  anos  que  representam  o  meio  da  infância.  No  entanto,  crianças nessa  faixa  etária  têm  infecções  (virais,  bacterianas  ou  fúngicas)  por  estarem  em  contato  próximo  com  outras crianças.  Essas  infecções  ocorrem  frequentemente  como  doenças  dos  sistemas  respiratório,  digestório  ou  doenças de  pele.  Outros  problemas  agudos  ou  crônicos  de  saúde  podem  surgir  pela  primeira  vez,  incluindo  epilepsia  e dificuldades de aprendizagem, de desenvolvimento ou necessidades especiais. Nos EUA,j a asma é a doença crônica mais comum em crianças e jovens com menos de 18 anos de idade. 80

Sobrepeso e obesidade Sobrepeso  e  obesidade  representam  uma  preocupação  em  crianças  de  todas  as  idades  nos  EUA  e  no  resto  do mundo.k  O  excesso  de  peso  em  crianças  e  adolescentes  é  definido  por  um  índice  de  massa  corporal  (peso  em quilogramas dividido pelo quadrado da altura em metros) igual ou acima do percentil 85, mas abaixo do percentil 95 para crianças da mesma idade e sexo. A obesidade é definida como um IMC igual ou superior ao percentil 95 81 (Figura 2.12).  Dados  de  pesquisas  (National  Health  and  Nutrition  Examination  Surveys  [2007  a  2008])  mostram que cerca de 16,9% das crianças e adolescentes entre 2 e 19 anos de idade são obesos. 82 Dados específicos para a criança em idade escolar (6 a 11 anos de idade) mostram que a taxa de obesidade aumentou de 6,5% entre 1976 e 1980  para  19,6%  em  2007  a  200882 (Tabela 2.2).  Crianças  e  adolescentes  de  ascendência  negra  não  hispânica  e mexicana são desproporcionalmente afetados.80 Ao longo das duas últimas décadas, a incidência de obesidade para meninos  adolescentes  de  origem  mexicana  subiu  de  14,1%  para  26,8%,  em  comparação  com  meninos  negros  não hispânicos,  que  também  subiu  de  10,7%  para  19,8%,  e  adolescentes  brancos  não  hispânicos,  de  11,6%  para 16,7%.82  De  maneira  similar,  a  incidência  de  obesidade  cresceu  também  entre  as  meninas.  A  prevalência  da obesidade em meninas adolescentes de origem mexicana subiu de 13,4% para 17,4%, em comparação com meninas negras não hispânicas, que mostraram aumento significativo, passando de 16,3% para 29,2% e adolescentes brancas não hispânicas de 8,9% para 14,5%.82

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Figura  2.12  •  Índice  de  massa  corporal  para  os  percentis  de  idade  para  meninos  de  2  a  20  anos  de  idade.  O excesso  de  peso  em  crianças  e  adolescentes  é  definido  por  um  índice  de  massa  corporal  (peso  em  quilogramas dividido pelo quadrado da altura em metros) igual ou acima do percentil 95 para crianças da mesma idade e sexo. (Extraída  de  Centers  for  Disease  Control  and  Prevention.  (2007).  About  BMI  in  children  and  teens.  Disponível  on­ line:  www.cdc.gov/nccdphp/DNPA/obesity/defining.htm.  Calculadora  para  determinar  o  IMC.  Disponível  on­line: http://apps.nccd.cdc.gov/dnpabmi/Calculator.aspx) Tabela 2.2

Prevalência de obesidade* entre crianças e adolescentes americanos (com idade entre 2 e 19 anos) | Dados da NHANES (National Health and Nutrition Examination Survey).

Idade (anos)

NHANES I

NHANES II

NHANES III

NHANES IV

NHANES

 

1971-1974

1976-1980

1988-1994

2003-2004

2007-2008

5%

5%

7,2%

13,9%

10,4%

12 a 19

4%

6,5%

11,3%

18,8%

2a5

6 a ll

12 a 19

6,1%

5%

10,5%

17,4%

18,1%

VENDEDOR [email protected] *Nota: Obesidade é definida como índice de massa corporal (IMC) para sexo e idade específicos maior ou igual ao percentil 95, a http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 partir das tabelas de crescimento fornecidas pelo CDC 2000. † Exclui gestantes. Dados disponíveis on­line: http://www.cdc.gov/nchs/ data/hestat/obesity_ child_07_08/ obesity_child_07_08.pdf.

Existem diversos fatores que contribuem para o desenvolvimento de sobrepeso/obesidade na infância, incluindo genética, quantidade de calorias consumidas em alimentos e bebidas, bem como a quantidade de energia despendida com metabolismo, crescimento e exercício físico. As evidências são limitadas em relação a alimentos específicos ou padrões alimentares que contribuem para a ingestão calórica excessiva em crianças. No entanto, porções de tamanho grande  para  alimentos  e  bebidas,  refeições  fora  de  casa,  consumo  frequente  de  lanches  e  alimentos  de  alto  valor energético e consumo de bebidas com calorias adicionais muitas vezes são levantados como hipótese de fatores que contribuem para a ingestão calórica excessiva.6 Participar de atividades físicas é importante para a criança por seus efeitos benéficos não só associados ao controle do peso, mas também à pressão arterial e à resistência óssea. O uso de mídias, como computador e televisão, pode alterar o tempo que as crianças passam exercendo atividades físicas. Isso também pode contribuir para o aumento do consumo de calorias por meio de excesso de lanches e alimentação diante  da  televisão.  Fatores  genéticos  podem  aumentar  a  suscetibilidade  de  uma  criança  a  se  tornar  obesa.  No entanto, a suscetibilidade genética deve existir em conjunto com outros fatores contributivos, como maior ingestão de alimentos calóricos e mínimo de atividade física.83 A obesidade infantil não é apenas uma questão estética. Também está associada a carga significativa de doenças. A obesidade na infância está associada à obesidade na idade adulta e influencia a tendência familiar, o que coloca os indivíduos  em  maior  risco  de  desenvolver  diabetes  e  doença  cardíaca  posteriormente. 83 Assim,  as  famílias  devem ser incentivadas a planejar um tempo para as refeições, oferecer alimentos saudáveis e porções adequadas à idade de cada um, participar de atividade física rotineira e limitar o comportamento sedentário. 83–85

Resumo

A  segunda  infância  é  definida  como  o  período  em  que  a  criança  começa  a  frequentar  a  escola  e  vai  até  a adolescência. Durante esses 7 anos, o crescimento é constante, porém mais lento do que na primeira infância. O ingresso  na  escola  inicia  o  processo  de  formação  de  relacionamentos  com  seus  pares  e  tem  grande  impacto  no desenvolvimento  psicológico.  Este  é  um  período  maravilhoso,  de  saúde  relativamente  boa,  secundária  a  uma vantagem imunológica, mas as doenças respiratórias representam uma das principais causas de enfermidade, e os acidentes de trânsito são a principal causa de morte. Vários problemas de saúde crônicos, como asma, epilepsia e câncer infantil, podem surgir durante esse período. Sobrepeso e obesidade são problemas cada vez mais comuns que começam na infância. As causas do excesso de  peso  infantil  são,  sem  dúvida,  multifatoriais,  mas  em  última  análise  refletem  um  desequilíbrio  entre  a quantidade  de  calorias  que  a  criança  consome  em  alimentos  e  bebidas  e  as  calorias  que  a  criança  gasta  para  dar suporte a seu crescimento e desenvolvimento, metabolismo e atividades físicas.

Adolescência

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Caracterizar as mudanças físicas e psicossociais durante a adolescência



Citar as tarefas de desenvolvimento que os adolescentes precisam cumprir



Discutir de que maneira as mudanças durante a adolescência podem in䎱 uenciar as necessidades de saúde do adolescente

A adolescência é um período de transição entre a infância e a idade adulta. É um período de crescimento físico, emocional e cognitivo, aliado à maturidade reprodutiva. As mudanças na adolescência não seguem um cronograma

rigoroso. Ao contrário, ocorrem em momentos diferentes de acordo com um calendário interno original. Em termos de definição, considera­se que a adolescência começa com o desenvolvimento de características sexuais secundárias, VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 em  torno  de  11  ou  12  anos  de  idade,  e  termina  com  a  conclusão  do  crescimento  somático  entre  18  e  21  anos  de 86 idade.  As  meninas  geralmente  começam  e  terminam  a  adolescência  mais  cedo  do  que  os  meninos.  O  período  da adolescência é convenientemente chamado de anos teen (teenage years).l Foram  identificadas  diversas  “tarefas”  que  os  adolescentes  precisam  cumprir.  Essas  tarefas  incluem  alcançar independência  em  relação  aos  pais;  adotar  o  código  dos  seus  pares  e  fazer  escolhas  de  estilo  de  vida  individual; formar  ou  revisar  sua  imagem  corporal  e  chegar  a  um  acordo  com  ela  se  não  é  “perfeita”  e  estabelecer  uma identidade sexual, do ego, vocacional e moral.6

Crescimento e desenvolvimento A  adolescência  é  influenciada  pela  realização  de  metas  de  desenvolvimento  relacionadas  com  a  puberdade  e  as influências  da  família,  da  escola  e  dos  pares.6  O  crescimento  físico  ocorre  simultaneamente  com  maturidade sexual.6 A  maior  parte  do  crescimento  físico  ocorre  na  área  do  tronco. A  idade  de  início,  duração  e  extensão  do crescimento varia entre meninos e meninas. Nas meninas, o estirão de crescimento geralmente começa em torno de 9 a 14 anos de idade, aproximadamente 2 anos antes dos meninos.6 Também termina mais cedo nas meninas, com mudanças menos drásticas no peso e na altura. As meninas geralmente ganham cerca de 2,5 a 20 cm de altura e de 7 a  25  kg  de  peso.67 A  maioria  das  meninas  já  completou  o  estirão  de  crescimento  em  torno  de  16  ou  17  anos  de idade. Os meninos começam o estirão de crescimento mais tarde, tipicamente na idade de 13 anos, e geralmente é mais pronunciado, com aumento na altura de pelo menos 10 cm e aumento de peso de 7 a 30 kg. 67 Meninos podem continuar a crescer até 18 ou 20 anos de idade.6 As mudanças no tamanho do corpo físico têm um padrão característico. O crescimento de bruços, pernas, mãos, pés e pescoço é seguido por aumento na largura dos quadris e tórax e vários meses depois pelo aumento na largura e  profundidade  dos  ombros  e  no  comprimento  do  tronco.6  O  período  dessas  mudanças  rápidas  e  dramáticas  pode ser  difícil  para  o  adolescente  e  para  os  pais.  O  tamanho  dos  sapatos  pode  mudar  várias  vezes  ao  longo  de  alguns meses. Embora o tamanho do cérebro não aumente significativamente durante a adolescência, o tamanho e a forma do  crânio  e  dos  ossos  da  face  se  alteram,  fazendo  os  traços  do  rosto  parecerem  estar  fora  de  proporção  até  que  o rosto  alcance  as  proporções  de  um  rosto  adulto.6,67  A  massa  muscular  e  a  força  também  aumentam  durante  a adolescência. Em alguns casos, pode haver discrepância entre o crescimento dos ossos e a massa muscular, criando disfunção temporária, que resulta em movimentos mais lentos ou menos suaves, decorrentes da incompatibilidade entre  a  estrutura  óssea  e  muscular.  As  proporções  do  corpo  sofrem  as  alterações  típicas  da  adolescência.  Nos meninos,  o  tórax  se  torna  mais  largo  e  a  pelve  permanece  estreita.  Nas  meninas,  ocorre  o  inverso:  o  tórax permanece estreito e a pelve se amplia. Os sistemas orgânicos também sofrem alterações funcionais, e alguns também passam por alterações estruturais. O  coração  aumenta  de  tamanho,  como  resultado  do  aumento  do  tamanho  da  célula  do  músculo.  A  frequência cardíaca  diminui  para  as  taxas  normais  de  um  adulto,  enquanto  a  pressão  arterial  aumenta  rapidamente  para  os valores  do  adulto.  Aumentam  o  volume  de  sangue  circulante  e  a  concentração  de  hemoglobina.  Meninos demonstram  maiores  alterações  no  volume  de  sangue  e  maior  concentração  de  hemoglobina  devido  à  maior estimulação androgênica da medula óssea.86 A pele se torna mais espessa e ocorre crescimento de pelos adicionais em ambos os sexos. Aumenta a atividade das  glândulas  sebáceas  e  sudoríferas. A  produção  suprarrenal  de  androgênios  estimula  as  glândulas  sebáceas,  que contribui para o desenvolvimento da acne. O aumento da atividade das glândulas sudoríferas resulta em transpiração e  odor  corporal. As  alterações  de  voz  têm  grande  importância  durante  a  adolescência,  para  ambos  os  sexos.  No entanto, a mudança é mais acentuada nos meninos.86 A mudança de voz é o resultado do crescimento da laringe, da faringe  e  dos  pulmões.6  O  maior  crescimento  ocorre  na  laringe  dos  meninos.  Os  seios  paranasais  alcançam  as proporções de indivíduos adultos, o que aumenta a ressonância da voz, tornando o som mais parecido com a voz do adulto.6,67 As  alterações  dentárias  incluem  crescimento  da  mandíbula,  perda  dos  dentes  decíduos  finais  e  erupção dos caninos, pré­molares e molares permanentes.6 Pode ser necessário o uso de aparelho ortodôntico. O sistema endócrino desempenha papel principal nas alterações ocorridas ao longo da adolescência. O gatilho que dispara  o  processo  não  está  completamente  esclarecido.  No  entanto,  o  resultado  da  maturação  suprarrenal  revela

mudanças  físicas  no  corpo  do  adolescente,  como  desenvolvimento  de  pelos  pubianos  e  axilares,  aumento  da 87 oleosidade na pele e cabelo, acne e odores corporais.  Outro processo fisiológico que ocorre é a maturação do eixo VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 hipotalâmico­hipofisáriogonadal,  responsável  pelo  aumento  da  circulação  de  esteroides  gonadais.87  Uma  vez secretados  os  hormônios  esteroides  gonadais  a  uma  taxa  elevada,  sinais  evidentes  da  puberdade  podem  ser facilmente  identificados.  Nas  meninas,  os  primeiros  sinais  da  puberdade  são  observados  com  o  desenvolvimento das mamas, seguido de pelos pubianos e da menstruação aproximadamente 2 a 2,5 anos depois, em conjunto com a aquisição  do  pico  de  altura.6  A  puberdade  começa  mais  tarde  para  os  meninos,  com  a  ampliação  dos  testículos, seguida pelo crescimento do pênis e, depois, o desenvolvimento dos pelos pubianos.6 Meninos também podem ter ereções espontâneas ou emissões seminais noturnas, como característica normal do desenvolvimento da puberdade. 6 Durante  esse  período,  indivíduos  de  ambos  os  sexos  crescem  de  8  a  10  centímetros  ao  longo  de  um  período  de  2 anos.6 Além  da  maturidade  reprodutiva,  também  ocorrem  alterações  nos  circuitos  corticais  e  límbicos  do  cérebro.  A ligação  entre  esses  dois  processos  é  o  fato  de  que  o  cérebro  é  um  órgão­alvo  para  os  hormônios  esteroides.88 Essencialmente,  os  neurocientistas  defendem  a  hipótese  de  que  existe  um  “pareamento”  no  desenvolvimento  do adolescente  entre  o  cérebro  e  os  hormônios  da  puberdade.88  Como  circuitos  corticais  e  límbicos  sofrem remodelação,  os  processos  de  cognição  e  tomada  de  decisão  se  desenvolvem  ainda  mais,  juntamente  com comportamentos sociais.88 Embora sejam necessárias novas pesquisas a fim de aumentar o conhecimento sobre esta relação,  os  cientistas  têm  levantado  questões  quanto  ao  tipo  de  variáveis  e  interações  que  ocorrem  entre  os hormônios  da  puberdade,  o  desenvolvimento  do  cérebro,  da  cognição  e  a  maturação  comportamental  durante  o período adolescente.88 As  alterações  comportamentais  e  psicossociais  durante  a  adolescência  são  comparáveis  às  mudanças  no  físico. Não é possível desenvolver um guia para descrever de maneira adequada e explicar as grandes mudanças durante a adolescência, porque a experiência é única para cada adolescente. Felizmente, podem ser observadas semelhanças no processo,  que  podem  ser  utilizadas  para  facilitar  a  compreensão  dessas  mudanças.  A  transição  de  criança  para adulto  não  é  um  processo  suave  e  contínuo,  ou  uniforme.  Sucedem  períodos  frequentes  de  mudanças  rápidas, seguidas de breves platôs. Esses períodos podem mudar com pouco ou nenhum aviso, o que muitas vezes dificulta a convivência com adolescentes. Existe uma questão de que os indivíduos que lidam com adolescentes devem lembrar­se: não importa quão dura seja  a  transição  de  criança  para  adulto,  a  adolescência  não  é  um  estado  permanente.  A  maioria  passa  pela adolescência com pouca ou nenhuma dificuldade duradoura. Os profissionais de saúde que cuidam de adolescentes podem  ter  de  oferecer  apoio  a  pais  preocupados,  que  não  têm  certeza  se  são  normais  as  dificuldades  que  o adolescente está enfrentando e, consequentemente, toda a família. O adolescente também pode precisar de garantias de que o modo como se sente não é anormal.6,67 As  preocupações  comuns  de  adolescentes  incluem  conflitos  com  os  pais,  os  irmãos,  preocupações  com  o desempenho  escolar  e  com  seus  colegas  e  relacionamentos.6 A  identidade  pessoal  é  uma  preocupação  esmagadora expressa pelos adolescentes. Os  pais  dos  adolescentes  também  podem  ter  preocupações  com  o  filho. As  preocupações  comuns  relacionadas com o comportamento do adolescente incluem rebeldia, desperdício de tempo, comportamentos de risco, mudanças de  humor,  curiosidade  em  experimentar  drogas  ilícitas,  problemas  escolares,  queixas  psicossomáticas  e  atividade sexual.6  A  adolescência  é  um  período  de  transição  entre  a  infância  e  a  vida  adulta,  e  é  muitas  vezes  cheia  de conflitos, pelas tentativas do adolescente de assumir um papel adulto. A comunicação aberta entre o adolescente e sua família pode ajudar a tornar a transição um processo menos estressante. No entanto, a comunicação entre pais e adolescentes pode ser um grande desafio.

Conceitos fundamentais

Adolescência



O período da adolescência, que se estende de 11 ou 12 anos até 18 ou 21 anos de idade, é um tempo de mudanças rápidas no tamanho e forma do corpo e no

funcionamento físico, psicológico e social

A adolescência é uma época em que os hormônios e maturação sexual interagem com as estruturas sociais para promover a transição da infância para a idade



adulta

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Problemas de saúde comuns A  adolescência  é  considerada  um  período  de  tempo  relativamente  saudável.  No  entanto,  ocorrem  morbidade  e mortalidade  significativas.  Os  problemas  de  saúde  mais  comuns  vividos  por  adolescentes  incluem  cefaleia, distúrbios alimentares, ganho ou perda de peso e insônia.6 Esses distúrbios podem ser de origem psicossomática. O profissional de saúde precisará possivelmente encaminhar o adolescente para aconselhamento ou assistência médica específica, se alguma dessas preocupações em relação à própria saúde se mostrarem exageradas. m Problemas  de  saúde  adicionais  durante  a  adolescência  (discutidos  a  seguir)  incluem  lesão;  suicídio;  câncer; comportamento  sexual  de  risco  e  gravidez  na  adolescência  e  uso  abusivo  de  substâncias  psicoativas,  incluindo drogas ilícitas, bebidas alcoólicas e tabaco.89 A promoção da saúde é de extrema importância durante o período da adolescência.

Lesões Ocorrem  menos  problemas  reais  de  saúde  física  durante  o  período  da  adolescência,  porém  existe  risco  maior  de morbidade e mortalidade por lesões não intencionais.56,57 De acordo com os dados do Federal Interagency Forum on Child  and  Family  Statistics,  aproximadamente  70%  das  mortes  por  lesões  entre  a  população  adolescente  estão relacionadas com acidentes de veículos a motor (21 por 100.000) ou armas de fogo (12 por 100.000).3 Além disso, os homicídios foram responsáveis por 21% das mortes por lesões e 14% delas foram atribuídas a suicídio.3 Embora a principal causa de mortalidade na adolescência se deva a lesões não intencionais, a incidência de lesões não fatais também predomina. Lesões não fatais, na maioria das vezes, resultam de ser atingido por um objeto ou indivíduo,  devido  a  violência,  atividades  relacionadas  com  esporte  ou  acidentes  de  automóvel. 3  Muitas  lesões poderiam  ser  evitadas  com  medidas  simples  de  segurança,  incluindo  o  uso  de  cinto  de  segurança  no  automóvel  e capacetes em bicicletas e motocicletas.6 Vários fatores contribuem para o risco de lesão durante a adolescência. Frequentemente, o adolescente é incapaz de reconhecer situações potencialmente perigosas, devido a uma discrepância entre a maturidade física e cognitiva e o  desenvolvimento  emocional.  Certas  características  comportamentais  e  de  desenvolvimento  do  adolescente exacerbam esse problema. Os adolescentes geralmente sentem a necessidade de desafiar a autoridade dos pais ou do outro. Eles também têm um forte desejo de se “encaixar” no grupo a que pertencem. Adolescentes exibem um tipo de  comportamento  de  risco  e  têm  necessidade  de  experimentar  situações  ou  comportamentos  potencialmente perigosos. Acreditam que situações ruins não acontecerão com eles, apesar de se envolverem em comportamentos de risco.

Suicídio Outra  causa  importante  de  morte  nessa  faixa  etária  é  o  suicídio.  Mesmo  que  o  número  de  adolescentes  que  relate pensamentos suicidas tenha diminuído na última década, o número de tentativas de suicídio permanece constante. 89 Os  fatores  de  risco  para  o  suicídio  em  adolescentes  incluem  uso  abusivo  de  substâncias  psicoativas,  histórico individual ou familiar de depressão, transtornos de ansiedade, problemas na escola, problemas de comunicação com os pais, ter um amigo ou colega que se cometeu suicídio e ter arma de fogo na família. 6

Câncer A quarta maior causa de morte na população de adolescentes e adultos jovens, com idades entre 15 e 24 anos, é o câncer.78  Durante  a  adolescência  ocorre  aumento  na  incidência  de  determinados  tipos  de  câncer.  De  acordo  com  o Instituto Nacional do Câncer americano, a maior incidência de câncer em adolescentes com idade entre 15 e 19 anos inclui linfoma, tumor de células germinativas em indivíduos do sexo masculino (câncer dos testículos) e carcinoma (de tireoide) nas mulheres, seguido por leucemia.90

Comportamento sexual de risco e gravidez na adolescência O  aumento  da  prevalência  de  atividade  sexual  entre  os  adolescentes  tem  criado  problemas  de  saúde  únicos.  Isto

inclui gravidez na adolescência, doenças sexualmente transmissíveis e a transmissão do vírus da imunodeficiência humana (HIV).6  Os  problemas  associados  incluem  uso  abusivo  de  substâncias  psicoativas,  como  álcool,  tabaco, VENDEDOR [email protected] 6,89 inalantes  e  outras  drogas http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 ilícitas.   Os  profissionais  de  saúde  não  devem  negligenciar  em  discutir  a  atividade 86 sexual com o adolescente.  A comunicação aberta, factual e imparcial é essencial para tratar das práticas sexuais do adolescente. Discutir a atividade sexual frequentemente é difícil para o adolescente e sua família. Se o profissional de  saúde  consegue  estabelecer  um  relacionamento  com  o  adolescente,  isso  pode  proporcionar  um  fórum  valioso para  que  o  jovem  obtenha  informações  precisas  sobre  sexo  seguro,  incluindo  medidas  de  contracepção  e  a prevenção  de  comportamentos  de  alto  risco  na  aquisição  de  infecções  sexualmente  transmissíveis  ou  síndrome  da imunodeficiência adquirida (AIDS).86 As últimas décadas vêm demonstrando um declínio geral nos casos de gravidez na adolescência, desde 1991, com exceção de uma breve elevação no período entre 2005 e 2007. 3 Entretanto, a gravidez na adolescência continua a ser uma  preocupação  importante  de  saúde  devido  aos  desafios  a  longo  prazo  para  os  pais  e  a  criança,  frequentemente associados  a  esta  situação.  Os  resultados  preliminares  do  National  Center  for  Health  Statistics,  National  Vital Statistics  System  (2011)  afirmam  que  94%  dos  partos  de  mulheres  com  idade  entre  15  e  17  anos  eram  de  mães solteiras.3 Dentro  desse  grupo  de  risco,  existem  disparidades  raciais  e  étnicas.  Em  2009,n  as  adolescentes  hispânicas  com idade  entre  15  e  17  anos  apresentaram  a  maior  taxa  de  gravidez,  com  41  de  cada  1.000  nascimentos;  seguidas  de adolescentes negras não hispânicas, com 32,1, e indígenas norte­americanas ou nativas do Alasca, com 30,6. 3 Os  riscos  para  mães  solteiras  adolescentes  estão  associados  a  falta  de  uma  rede  de  apoio  e  estímulo  cognitivo, dificuldades socioeconômicas e diminuição das taxas de formação no ensino médio. Além disso, existem os riscos para os recém­nascidos de mães jovens, que incluem aumento da incidência de baixo peso ao nascer e mortalidade infantil.3 O  tema  da  gravidez  na  adolescência  envolve  questões  relacionadas  com  maturidades  física  e  biológica  da adolescente,  necessidades  de  crescimento  do  adolescente  e  do  feto  e  os  requisitos  específicos  para  o  pré­natal  da adolescente gestante. Devem ser consideradas também as respostas emocionais e as questões psicológicas sobre a relação da adolescente com sua família e com o pai da criança, bem como a influência da gravidez no futuro dessa adolescente.

Uso abusivo de substâncias psicoativas O  uso  abusivo  de  substâncias  psicoativas  entre  adolescentes  aumentou  rapidamente  durante  os  anos  1960  e  1970, mas  vem  caindo  desde  então.  No  entanto,  ainda  é  prevalente  na  faixa  etária  adolescente.  Os  resultados  de  uma pesquisa nacional recente entre alunos do 9o ao 12o ano relata o seguinte: 20% haviam consumido cigarros em pelo menos 1 dia durante os 30 dias que antecederam a pesquisa; 42% haviam consumido pelo menos um drinque com álcool  em  pelo  menos  1  dia  durante  os  30  dias  que  antecederam  a  pesquisa  e  21%  usaram  maconha  uma  vez  ou mais durante os 30 dias que antecederam a pesquisa.91 Estes resultados confirmam que muitos usuários de tabaco e álcool começam a usar a substância durante a adolescência. 86,92 O uso precoce pode levar a uma vida de dependência ou uso abusivo.o Pesquisas têm descrito uma associação entre a idade em que se inicia o uso de álcool e o aumento nos  problemas  de  alcoolismo  (dependência  e  uso  abusivo)  mais  tarde  no  decorrer  da  vida.92  Os  profissionais  de saúde devem ter conhecimento sobre os sintomas do uso abusivo de substâncias psicoativas, as consequências e a gestão  adequada  de  adolescentes  com  esse  problema.  O  uso  abusivo  de  substâncias  entre  os  adolescentes  inclui  o uso de produtos derivados do tabaco, especialmente cigarros e tabaco “sem fumaça” (rapé, fumo de mascar), álcool, maconha, estimulantes, inalantes, cocaína, alucinógenos, tranquilizantes e sedativos.3,6 Os adolescentes apresentam alto risco para sucumbir à pressão dos colegas e participar de atividades que envolvem o abuso de substâncias. Eles têm  um  forte  desejo  de  se  encaixar  e  ser  aceitos  por  seu  grupo.  É  difícil  para  eles  “simplesmente  dizer  não”.  O comportamento de risco leva o adolescente a acreditar que não vai se tornar um “viciado” ou que as consequências ruins  não  acontecerão  com  ele.  É  importante  que  os  adolescentes  conheçam  o  “resto  da  história”  mediante orientação  e  comunicação  constante  com  os  pais,  professores,  profissionais  de  saúde,  e  outros  que  possam  ter influência positiva sobre eles.6

Resumo

A  adolescência  é  um  período  de  transição  entre  a  infância  e  a  idade  adulta.  Começa  com  o  desenvolvimento  de VENDEDOR [email protected] características sexuais secundárias (11 a 12 anos) e termina com a cessação do crescimento somático (18 aos 21 http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 anos). Este é o período importante do estirão de crescimento, mais pronunciado nos rapazes. O sistema endócrino tem  papel  fundamental,  com  as  inúmeras  alterações  hormonais  e  por  dar  início  e  continuidade  ao  estirão  de crescimento. As alterações psicossociais são igualmente substanciais durante esse período e muitas vezes colocam enorme  pressão  sobre  as  relações  entre  adultos  e  adolescentes.  A  adolescência  é  um  período  relativamente saudável, mas existem significativa morbidade e mortalidade como resultado de acidentes, homicídio e suicídio. A prevalência de atividade sexual e uso abusivo de substâncias psicoativas coloca o adolescente em situação de risco para infecção pelo HIV, abuso de álcool, tabaco e outras drogas ilícitas e gravidez na adolescência.

Exercícios de revisão

1.

Os sinais vitais de um recém-nascido a termo com 1 dia de vida apresentaram os seguintes valores: temperatura de 38,5°C (axilar); frequência

cardíaca de 188 bpm; frequência respiratória de 70 incursões/ min e pressão arterial de 56/36 mmHg.

A.

Qual(is) teste(s) de laboratório deve(m) ser realizado(s)?

B.

Que informação pode ser obtida a partir dos registros maternos e ser útil no estabelecimento de um diagnóstico diferencial para esse

recém-nascido?

C.

2.

Que outros sinais clínicos devem ser avaliados?

Um recém-nascido pré-termo, de aproximadamente 30 semanas de idade gestacional, é admitido na unidade de terapia intensiva neonatal.

A criança apresenta angústia respiratória, incluindo taquipneia, retrações e grunhidos expiratórios.

3.

A.

Identi䎫䀀que as duas causas mais comuns de angústia respiratória para recém-nascidos nestas condições.

B.

Explique a etiologia das duas causas identi䎫䀀cadas.

Um menino de 10 anos de idade está sendo atendido para um exame físico de rotina. Seu peso é 50 kg e sua altura é 1,49 m. Sua mãe

reclama que ele está constantemente assistindo à televisão ou jogando videogame e parece não se interessar por andar de bicicleta ou

praticar atividades físicas. Além disso, está constantemente “beliscando” e bebendo refrigerante.

A.

Use

a

calculadora

do

índice

de

massa

corporal

(IMC)

para

crianças

e

adolescentes

fornecida

pelo

CDC

(http://apps.nccd.cdc.gov/dnpabmi/) para calcular o IMC do menino e determinar se ele está acima do peso.

B.

4.

Que sugestões você pode oferecer para o menino e sua mãe?

Um adolescente está sendo atendido no posto de saúde para um exame esportivo de rotina. A enfermeira observa que o adolescente tem um

caso de acne facial entre leve e moderado. A enfermeira discute causas, prevenção e tratamento da acne com o jovem.

A.

Que alterações 䎫䀀siológicas contribuem para o desenvolvimento da acne em adolescentes?

B.

Que outras mudanças físicas também ocorrem durante a adolescência?

C.

Quais são os problemas de saúde comuns em adolescentes?

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Sisk C. L., Zehr J. L. (2005). Pubertal hormones organize the adolescent brain and behavior. Frontiers in Neuroendocrinology 26, 163–174. Eaton D. K., Kann L., Kinchen S., et al.; Centers for Disease Control and Prevention (CDC). (2010). Youth risk behavior surveillance—United States, 2009. Morbidity and Mortality Weekly Report 59(5), 1–142. National Cancer Institute. (2004–2008). Surveillance epidemiology and end results: Childhood cancer. Age­Adjusted SEER Incidence,  by  Age  Group  and  Sex.  Available:  http://seer.cancer.gov/csr/1975_2008/browse_csr.php? section=32&page=sect_32_table.01.html Centers for Disease Control and Prevention (CDC). (2011). Youth risk behavior surveillance—United States, 2009. Author. 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________________ a N.R.T.:  No  Brasil,  os  dados  de  2009  revelaram  que,  em  1.000  nascidos  vivos,  os  negros  (21,24)  e  os  pardos  (13,42),  após  os VENDEDOR [email protected] indígenas (41,16), são aqueles com a maior taxa de mortalidade infantil. A taxa de brancos é de 13,24, e a de amarelos, 11,37. http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Fonte: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=2688:catid=28&Itemid=23. bN.R.T: 

No  Brasil,  o  Ministério  da  Saúde  incluiu  as  tabelas  na  Caderneta  da  Criança.  Fonte: http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/cadernetasaudedacrianca.pdf. c N.R.T.: No Brasil, o SINASC, sistema do Ministério da Saúde, apontava discreto aumento no percentual de prematuridade, de 6,8%  para  7,2%  entre  2000  e  2010.  Entretanto,  o  atual  estudo  corrige  o  valor  de  2010  para  11,7%.  Fonte: http://www.unicef.org/brazil/pt/media_25849.htm. dN.R.T.: No Brasil, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas publicou em 2008 e atualizou em 2013 o protocolo clínico para

sepse neonatal. Fonte: http://www.fhemig.mg.gov.br/pt/protocolos­clinicos. e N.R.T.: No Brasil, a lei vale para todos os estados e engloba crianças até 10 anos de idade. fN.R.T.: 

No  Brasil,  em  1973  foi  criado  o  Programa  Nacional  de  Imunização  –  PNI.  Fonte: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/programa_nacional_imunizacoes_pni40.pdf. gN.R.T.: No Brasil, o Ministério da Saúde tornou compulsória a notificação de violências doméstica, sexual e outras agressões para  todos  os  serviços  de  saúde.  Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/arquivos/violencias%20e%20acidentes/ficha_SIVVA_site.pdf. hN.R.T.: No Brasil, dados de 2012 do Ministério da Saúde mostram que, aos 5 anos de idade, mais de 53% das crianças já tiveram

cárie.  Fonte:  http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2012­10­25/no­brasil­mais­de­50­das­criancas­de­5­anos­tem­ carie­alerta­associacao. iN.R.T.: No Brasil, o câncer já representa a primeira causa de morte por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos, para todas as regiões. Fonte: http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/infantil. jN.R.T.: No Brasil, em 1998, a prevalência de asma entre as crianças brasileiras foi de 7,7%; em 2003, 8,1%; e, em 2008, 8,5%.

Fonte: http://revistapesquisa.fapesp.br/2012/04/10/o­avanco­da­asma­em­criancas­e­adolescentes/. kN.R.T.: No Brasil, o sobrepeso acomete 34,8% dos meninos e 32% das meninas na faixa etária de 5 a 9 anos. Já a obesidade foi constatada entre 16,6% dos meninos e entre 11,8% das meninas. Já entre as crianças a partir de 10 anos e os jovens de até 19 anos, o  excesso  de  peso  acomete  21,7%  do  total  dos  meninos,  e  a  obesidade,  5,9%.  Entre  as  meninas  nessa  faixa  etária,  15,4% mostravam  sobrepeso  e  4,2%,  obesidade.  Fonte:  http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2012­01­25/obesidade­cresce­ mais­entre­criancasbrasileiras­na­faixa­de­5­9­anos. lN.T.: Pelo padrão americano, as idades que abrangem esse período terminam em “teen”: dos 13 (thirteen) aos 19 (nineteen). No

Brasil, a maioridade civil começa aos 18 anos. mN.R.T.: No Brasil, o Ministério da Saúde publicou em 2010 as diretrizes para atenção integral à saúde do adolescente. Fonte:

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_nacionais_atencao_saude_adolescentes_jovens_promocao_saude.pdf. nN.R.T.:  No  Brasil,  12%  das  adolescentes  de  15  a  19  anos  tinham  pelo  menos  um  filho  em  2010.  Fonte: http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013­11­02/gravidez­na­adolescencia­prejudica­futuro­da­mae­e­dacrianca­diz­ professor­da­unb. oN.R.T.:  A  Pesquisa  Nacional  de  Saúde  do  Escolar  (PeNSE),  realizada  pelo  IBGE  em  2009,  mostrou  que  mais  de  70%  dos

estudantes brasileiros entre 12 e 17 anos já haviam consumido bebida alcoólica alguma vez e 24,2% já haviam fumado tabaco. Quando o assunto são drogas ilícitas, segundo o PeNSE, 8,7% dos jovens brasileiros em idade escolar admitiram já ter usado substâncias  psicoativas  ao  menos  uma  vez,  sendo  os  meninos  os  usuários  mais  frequentes  de  drogas  ilícitas,  como  maconha, cocaína, crack, cola, loló, lança­perfume, ecstasy, entre outras. Fonte: http://www.brasil.gov.br/saude/2012/04/brasil­combate­o­ uso­de­substancias­psicoativas­entreosjovens.

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A  velhice  não  é  uma  doença,  é  força  e  sobrevivência,  é  um  triunfo  sobre  todos  os  tipos  de  vicissitudes  e decepções, provações e enfermidades. MAGGIE KUHN Envelhecer  é  um  processo  natural  que  se  desenvolve  ao  longo  da  vida  e  traz  consigo  mudanças  biopsicossociais específicas.  Para  muitos  idosos,  ocorrem  mudanças  no  funcionamento  do  corpo,  aparência  física,  habilidades cognitivas,  estrutura  familiar  e  ambiente  social.  Gerontologia  é  a  disciplina  que  estuda  o  envelhecimento  e  os idosos a partir de perspectivas biológica, psicológica e sociológica. Explora os processos dinâmicos associados às complexas alterações físicas, ajustes no funcionamento psicológico e alterações nas identidades sociais. Uma  primeira  distinção  importante  é  que  envelhecimento  e  doença  não  são  sinônimos.  Infelizmente,  é  comum supor  que  o  envelhecimento  esteja  inevitavelmente  acompanhado  por  doença,  incapacidade  e  declínio  geral  na função.  O  fato  é  que  o  corpo  envelhecido  pode  realizar  a  maioria  das  funções  da  sua  juventude,  senão  todas. A diferença  é  que  a  realização  dessas  funções  pode  demorar  mais  tempo,  requerer  maior  motivação  e  ser  menos precisa. No entanto, como na juventude, a manutenção da função fisiológica advém do uso continuado.

O idoso e teorias sobre o envelhecimento

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





De䶦nir as categorias de idosos – idoso-jovem, idosomédio e idoso-idoso – e caracterizar a tendência de mudança na população idosa

Discutir teorias do envelhecimento biológico

Quem são os idosos? A  população  idosa  é  tipicamente  definida  em  termos  cronológicos  e  inclui  indivíduos  com  65  anos  de  idade  ou mais. Esta idade foi escolhida de maneira arbitrária e historicamente está associada ao Social Security Act de 1935. a Com  este  ato,  foi  desenvolvido  o  primeiro  sistema  nacional  de  pensões,  nos  EUA,  que  designou  65  anos  como  a idade  para  aposentadoria.  Desde  então,  a  expressão  terceira  idade  (old  age)  é  aplicada  a  qualquer  indivíduo  com mais  de  65  anos.  Como  existe  uma  considerável  heterogeneidade  entre  este  grupo,  a  categoria  de  idosos frequentemente é subdividida em idoso­jovem (65 a 74 anos), idoso­médio (75 a 84 anos) e idoso­idoso (85 anos ou mais), para refletir com maior precisão as mudanças funcionais ocorridas nesse período da vida. Parâmetros de idade, no entanto, são um pouco irrelevantes, porque a idade cronológica é um indicador ruim da função biológica. No entanto, a idade cronológica ajuda a quantificar o número de indivíduos em um grupo e possibilita estabelecer previsões.

No  ano  de  2009,  quase  13%  da  população  total  dos  EUA  (39,5  milhões)  tinha  65  anos  de  idade  ou  mais.  A VENDEDOR [email protected] proporção de idosos caiu pela primeira vez na década de 1990, em parte devido ao relativamente baixo número de http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 nascimentos no final de 1920 e início dos anos de 1930. Esta tendência foi interrompida em 2010, quando os baby boomers (indivíduos nascidos de 1946 a 1964) começaram a chegar aos 65 anos.1 A própria população de idosos está envelhecendo. A expectativa média de vida vem aumentando como resultado dos avanços tecnológicos globais nos cuidados de saúde, melhoria da nutrição e do saneamento básico. Em 2008, a faixa etária de 65 a 74 anos (20,8 milhões) era 9,5 vezes maior do que em 1900, enquanto a faixa etária de 75 a 84 anos de idade (13,1 milhões) era 17 vezes maior, e o grupo com mais de 85 anos de idade (5,6 milhões) era quase 46 vezes maior.1 A  população  total  de  idosos  deve  aumentar  para  cerca  de  72  milhões  de  indivíduos  até  o  ano  de 2030 (Figura 3.1). Mulheres atualmente com 65 anos podem esperar viver um adicional de 19,9 anos (97,8 anos de idade), e homens um adicional de 17,2 anos (90,1 anos de idade).1,2

Figura  3.1  •  Gráfico  da  população  de  65  anos  ou  mais:  1990  a  2050.  Este  gráfico  mostra  o  grande  aumento  na população de 65 anos ou mais, que cresceu de 3,1 milhões de indivíduos em 1900 para 35 milhões em 2000, com projeção de 72 milhões em 2030. (Fontes: as projeções para 2010 até 2050 são da Tabela 12 em Projections of the Population  by Age  and  Sex  for  the  United  States:  2010  to  2050  (NP2008­T12),  Population  Division,  U.S.  Census Bureau; data de lançamento: 14 de agosto de 2008. A fonte dos dados de 1900­2000 é a Tabela 5 em Population by  Age  and  Sex  for  the  United  States:  1900  to  2000,  Part  A.  Number,  Hobbs,  Frank  and  Nicole  Stoops,  U.S. Census  Bureau,  Census  2000  Special  Reports,  Series  CENSR­4,  Demographic  Trends  in  the  20th  Century.  Esta tabela foi elaborada por U.S. Administration on Aging com o uso de dados observados no Censo.)

Mulheres tendem a viver mais que os homens em todas as fases do processo de envelhecimento. Em 2009, havia uma proporção de 136 mulheres para cada 100 homens com mais de 65 anos nos EUA. Essa proporção alcança 216 mulheres para cada 100 homens na faixa etária com 85 anos ou mais. O estado civil também muda com o avanço da idade.  Em  2009,  quase  metade  de  todas  as  mulheres  idosas  eram  viúvas,  e  havia  três  vezes  mais  viúvas  do  que viúvos.1 Embora cerca de 6,5 milhões de idosos fizessem parte da força de trabalho em 2009 (trabalhando ou procurando ativamente  um  trabalho),  a  maioria  era  de  aposentados.1  A  aposentadoria  representa  uma  mudança  de  papel importante para a população de idosos. As atitudes e ajustes necessários para a aposentadoria são influenciados pelo estilo de vida e valores pré­aposentadoria. Indivíduos com atividades de lazer durante a vida de trabalho parecem se adaptar melhor à aposentadoria do que aqueles cujas vidas foram dominadas pelo trabalho. Para muitos dos idosos de  hoje,  especialmente  no  grupo  de  idosos­idosos,  a  ética  de  trabalho  da  Grande  Depressão  permanece profundamente enraizada como o objetivo central na vida. Quando não há mais o trabalho, o idoso sente uma perda significativa  e  algo  deve  ser  encontrado  como  substituto.  Como  o  lazer  nem  sempre  foi  uma  atividade  altamente valorizada, os idosos podem ter dificuldade em aprender a envolver­se em entretenimentos que tenham significado em sua vida. A  perda  do  trabalho  produtivo  é  apenas  uma  das  muitas  perdas  possíveis  de  acompanhar  o  processo  de envelhecimento.  A  perda  de  um  cônjuge  é  um  evento  altamente  significativo  que  comumente  tem  implicações

negativas para o parceiro sobrevivente. Especialistas citam aumento da taxa de mortalidade entre os idosos recém­ [email protected] enlutados  (principalmente VENDEDOR homens);  aumento  da  incidência  de  depressão,  sofrimento  psíquico  e  solidão;  e  taxas http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 mais altas de doenças crônicas. A perda da saúde física e a perda da independência são outras mudanças possíveis de afetar os aspectos psicossociais do envelhecimento, assim como a realocação, a perda de amigos, parentes, e as mudanças na estrutura familiar. A pobreza é comum entre a população idosa. Em 2009, 8,9% dos indivíduos com 65 anos ou mais viviam abaixo da linha da pobreza, e outros 5,4% foram classificados como “quase pobres” (renda entre o nível de pobreza e 125% deste nível). As taxas de pobreza variam entre os subgrupos de idosos, com nível de  pobreza  em  2009  de  19,5%  entre  os  americanos  afrodescendentes;  18,3%  entre  os  hispânicos  e  6,5%  entre  os brancos. As  principais  fontes  de  renda  para  os  idosos  em  2008  eram  Seguro  Social  (87%  dos  idosos),  renda  de ativos (54,6%), pensões públicas e particulares (28%) e dividendos (25%).1,2 Ao contrário da crença popular, a maioria dos idosos vive em ambientes comunitários. A maioria vive em algum tipo  de  ambiente  familiar  com  o  cônjuge,  os  filhos  ou  outros  parentes,  enquanto  aproximadamente  30%  moram sozinhos. Apenas 4,1% de todos os indivíduos com 65 anos de idade ou mais residem em instalações de cuidados a longo prazo ou asilos. No entanto, esse número sobe para 14,3% entre o grupo com 85 anos ou mais. Além disso, existem outros 2,4% vivendo em diferentes habitações para idosos, muitas com serviços de apoio disponíveis aos residentes.1,2

Você deve se lembrar da Sra. Maria, a mulher de 85 anos de idade apresentada no início desta Parte. A Sra. Maria nasceu durante

a Grande Depressão. Ela morava com o marido e criou uma família na mesma casa por 60 anos. Seu marido morreu há 5 anos, e

ela se viu incapaz de cumprir com as obrigações 䶦nanceiras, tendo apenas sua renda do Seguro Social. No ano passado, a Sra.

Maria se mudou para outro estado para viver com sua 䶦lha Beth. Embora a Sra. Maria esteja feliz por estar perto da família, ela

sente falta de sua rotina e dos amigos de sua antiga vizinhança.

Idosos são os maiores consumidores de cuidados de saúde.b Em 2009, 37% dos idosos relataram apresentar uma deficiência  ou  mais.  Na  população  acima  de  80  anos,  mais  de  50%  têm  pelo  menos  uma  deficiência  grave,  e aproximadamente  um  quarto  dos  idosos  integrados  à  sociedade  têm  dificuldades  para  exercer  atividades  da  vida diária  (AVD).  Quase  metade  de  todos  os  leitos  hospitalares  destinados  a  pacientes  adultos  está  ocupada  por indivíduos com 65 anos ou mais.2

Conceitos fundamentais

Idosos



A população de idosos está se expandindo rapidamente; aqueles com mais de 85 anos de idade representam o segmento de crescimento mais rápido. A

expectativa média de vida é de 77,9 anos, e as mulheres tendem a viver mais que os homens



Ao contrário da crença popular, a maioria dos idosos vive em sociedade. Apenas 4% dos indivíduos com 65 anos de idade ou mais residem em instalações de

cuidados a longo prazo ou asilos. Daqueles que vivem nesse ambiente, a maioria tem 85 anos de idade ou mais 1



Os idosos são os maiores consumidores de cuidados de saúde. Um terço apresenta pelo menos uma de䶦ciência.

Em certos casos, a de䶦ciência interfere em sua

capacidade de executar AVD

Teorias do envelhecimento Diversas  teorias  têm  tentado  explicar  a  biologia  do  envelhecimento  por  meio  de  diferentes  observações  científicas nos  níveis  molecular,  celular,  orgânico  e  sistêmico.  Em  geral,  essas  teorias  são  divididas  em  extrínsecas (estocásticas) ou intrínsecas (não estocásticas; teorias que levam em consideração o desenvolvimento e a genética). As teorias estocásticas postulam que as mudanças resultam de um efeito cumulativo de eventos ou danos aleatórios causados por agentes ou influências ambientais. As  teorias não estocásticas propõem que as mudanças associadas ao  envelhecimento  são  geneticamente  programadas. 3  Na  realidade,  as  evidências  sugerem  que  o  processo  de envelhecimento e longevidade é multifacetado, com a influência tanto da genética quanto de fatores ambientais. Nos seres  humanos,  uma  vida  muito  longa,  para  além  dos  90  anos  de  idade,  parece  ter  uma  base  genética  mais  forte.

Isso  explica  por  que  os  centenários  ou  quase  centenários  tendem  a  se  agrupar  entre  membros  de  uma  mesma família.4 VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Teorias estocásticas

As teorias estocásticas propõem como causa do envelhecimento um dano aleatório a moléculas de células vitais (p. ex.,  danos  ao  ácido  desoxirribonucleico  [DNA]  mitocondrial;  ligação  cruzada  [cross­linking]  do  DNA  nuclear). 5 Por  fim,  esse  dano  se  acumula  a  um  nível  suficiente  para  resultar  em  declínio  fisiológico  associado  ao envelhecimento. A  teoria  de  mutação  somática  do  envelhecimento  assevera  que  a  longevidade  e  o  funcionamento  das  células  em diferentes  tecidos  orgânicos  são  determinados  pela  molécula  de  cadeia  dupla  do  DNA  e  as  suas  enzimas  de reparação  específicas.  O  DNA  sofre  modificações  contínuas  em  resposta  tanto  a  agentes  exógenos  quanto  a processos  intrínsecos.  O  envelhecimento  resulta  talvez  de  condições  que  produzem  mutações  no  DNA  ou  déficits nos mecanismos de reparação do DNA.6,7 A teoria dos radicais livres oxidativos é outra ideia estocástica, em que se acredita que o envelhecimento resulta parcialmente  do  metabolismo  oxidativo  e  dos  efeitos  dos  danos  causados  pelos  radicais  livres.  O  principal subproduto do metabolismo oxidativo inclui superóxidos que reagem ao DNA, ao ácido ribonucleico, às proteínas e aos lipídios, levando a danos celulares e ao envelhecimento.3,5 Outra teoria associada aos danos, a chamada teoria de desgaste, propõe que os danos acumulados em partes vitais da célula conduzem ao envelhecimento e à morte. O DNA  celular  é  citado  como  exemplo.  Se  a  reparação  do  DNA  danificado  é  incompleta  ou  defeituosa,  como  se acredita ocorrer com o envelhecimento, o resultado é o declínio da função celular. 3,8,9

Teorias não estocásticas As  teorias  não  estocásticas  dão  ênfase  às  influências  genéticas  que  determinam  condição  física,  ocorrência  de doenças,  idade  da  morte,  causa  da  morte  e  outros  fatores  que  contribuem  para  longevidade. 3  Em  nível  celular, Hayflick e Moorhead10 observaram, há mais de 40 anos, que fibroblastos humanos cultivados têm uma capacidade limitada  de  replicação  (aproximadamente  50  duplicações)  e  depois  morrem.  Isto  é  conhecido  como  o  limite  de Hayflick. Antes  de  alcançar  esse  limite,  eles  desaceleram  a  taxa  de  divisão  e  manifestam  alterações  morfológicas identificáveis e previsíveis características de células senescentes. Outra  explicação  do  envelhecimento  celular  reside  em  uma  enzima  denominada  telomerase,  considerada  como responsável  pelo  controle  do  envelhecimento  cromossômico,  por  sua  ação  sobre  os  telômeros,  que  são  as extremidades  exteriores  dos  braços  cromossômicos.  A  cada  divisão  celular,  um  pequeno  segmento  de  DNA telomérico é perdido, a menos que a célula receba um suprimento constante de telomerase. Na falta dessa enzima, os telômeros encurtam, resultando na expressão de genes associada à senescência e à inibição da replicação celular. Acredita­se  que  em  determinadas  células,  como  células  cancerosas,  a  telomerase  mantenha  o  comprimento  dos telômeros, incrementando assim a replicação celular.11 Muitos  genes  associados  ao  curso  de  vida  dos  seres  humanos  não  são  “genes  da  longevidade”  por  si  sós.  Por exemplo, como as mutações nos genes supressores de tumor BRCA1 e BRCA2 aumentam as taxas de mortalidade associadas ao câncer de mama e de ovàrio, eles são raros entre mulheres de vida longa. 12 Pesquisas genéticas sobre o  envelhecimento  biológico  têm  explorado  o  envolvimento  de  variantes  alélicas  nos  genes  que  codificam  as apolipoproteínas, em particular a apolipoproteína E (apoE). A existência de apoE4 está relacionada com o aumento da  incidência  de  doenças  cardiovasculares  e  doenças  neurodegenerativas,  encurtando  assim  o  tempo  de  vida  por meio de processos patológicos.13–15 Por outro lado, os genes que reduzem o risco de aterosclerose podem ser mais comuns em indivíduos de vida longa.

Resumo

O  envelhecimento  é  um  processo  natural  que  se  desenvolve  ao  longo  da  vida  e  traz  consigo  mudanças biopsicossociais específicas. Envelhecimento não é sinônimo de doença ou de problemas de saúde. O organismo envelhecido  é  capaz  de  realizar  a  maior  parte  ou  a  totalidade  das  funções  da  sua  juventude.  No  entanto,  essas funções podem levar mais tempo, exigir maior motivação e ser menos precisas. A população idosa normalmente é definida em termos cronológicos como indivíduos com 65 anos de idade ou mais. É ainda definida como idoso­

jovem (65 a 74 anos), idosomédio (75 a 84 anos) e idoso­idoso (85 anos ou mais). O número de idosos aumentou e deve continuar crescendo. Como esperado, existirão 72 milhões de americanos com mais de 65 anos de idade no VENDEDOR [email protected] c http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 ano de 2030. Existem dois tipos principais de teorias empregadas para explicar as alterações biológicas que ocorrem com o envelhecimento:  as  teorias  estocásticas,  que  defendem  as  alterações  do  envelhecimento  como  resultantes  de  um efeito  cumulativo  de  eventos  ou  danos  aleatórios  causados  por  condições  ambientais;  e  as  teorias  que  levam  em consideração  o  desenvolvimento  e  a  genética  ao  propor  as  mudanças  associadas  ao  envelhecimento  como geneticamente programadas.

Alterações ䷇siológicas associadas ao envelhecimento

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever o processo de perda de massa óssea que ocorre com o envelhecimento



Expor as alterações comuns na regulação da pressão arterial que ocorrem com o envelhecimento



Descrever as alterações que ocorrem no sistema digestório com o envelhecimento



Explicar a importância da diminuição da massa corporal magra na interpretação da taxa de 䶦ltração glomerular (TFG), utilizando os níveis de

creatinina sérica

As  alterações  fisiológicas  observadas  nos  idosos  refletem  não  apenas  o  processo  de  envelhecimento,  mas  os efeitos  de  anos  de  exposição  a  agentes  ambientais,  como  a  luz  do  sol  e  a  fumaça  de  cigarro,  e  processos patológicos, como diabetes melito ou artrite. Em geral, ocorre redução geral na estrutura e função orgânica com o avançar  da  idade  (Figura  3.2).  O  declínio  resulta  em  capacidade  de  reserva  diminuída  nos  diversos  sistemas orgânicos  que,  consequentemente,  produzem  capacidades  homeostáticas  reduzidas,  tornando  o  idoso  mais vulnerável a fatores de estresse como doença, traumatismo, cirurgia, uso de medicamentos e mudanças ambientais. Pesquisas para identificar alterações verdadeiramente relacionadas com a idade, em oposição a estados de doença, são difíceis de realizar. Estudos utilizando metodologias transversais são os mais fáceis de executar. No entanto, a mortalidade  pode  confundir  os  resultados.  Embora  as  pesquisas  longitudinais  tendam  a  ser  mais  precisas,  elas exigem  anos  de  estudo  para  serem  executadas  e  podem  não  ser  capazes  de  explicar  as  inúmeras  variáveis  que entram na equação do processo de envelhecimento, como meio ambiente, ocupação e dieta. No entanto, é importante estabelecer  a  diferença,  tanto  quanto  possível,  entre  alterações  ocorridas  no  organismo  como  resultado  do envelhecimento daquelas sucedidas devido a um processo patológico. Esta distinção possibilita o diagnóstico mais preciso  e  o  tratamento  de  condições  patológicas,  além  de  ajudar  a  evitar  a  rotulagem  inadequada  de  alterações  do envelhecimento. Independentemente  da  dificuldade  em  definir  o  envelhecimento  normal  quanto  aos  diversos  sistemas  orgânicos, existe  um  padrão  de  perda  progressiva.  Muitas  dessas  perdas  começam  a  se  manifestar  no  início  da  idade  adulta, mas, devido à grande reserva fisiológica da maioria dos sistemas orgânicos, o declínio não se torna funcionalmente significativo até a perda alcançar determinado nível. Algumas alterações, como as que afetam a pele e a postura, são mais visíveis. Outras, como aquelas que acometem os rins, podem passar despercebidas até o indivíduo ser exposto a situações como, por exemplo, a necessidade de eliminação de medicamentos.

Alterações tegumentares As  alterações  cutâneas  refletem  de  maneira  mais  evidente  o  processo  de  envelhecimento  do  que  as  mudanças  em outros  sistemas  orgânicos.  O  envelhecimento  compromete  as  principais  funções  da  pele,  como  proteção  contra  o meio  ambiente,  regulação  da  temperatura,  equilíbrio  hidreletrolítico,  função  sensorial  e  excreção  de  resíduos metabólicos. A exposição à luz solar e o clima rigoroso aceleram o envelhecimento da pele. Com o envelhecimento, a pele se torna enrugada e seca e desenvolve uma pigmentação irregular. A espessura da derme, ou camada média da pele, diminui em cerca de 20%, o que confere à pele aparência fina e transparente. Isto também se aplica a áreas expostas à luz solar. As fibras de colágeno na derme sofrem reorganização e degeneração,

resultando  na  diminuição  da  resistência  e  elasticidade  da  pele.6,16  A  celularidade  e  a  vascularização  da  derme diminuem com o avançar da idade, o que pode causar fragilidade vascular, levando ao desenvolvimento de púrpura VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 senil  (hemorragia  cutânea)  e  lentidão  do  processo  de  cicatrização  da  pele.  Essa  lentidão  na  cicatrização  é influenciada por outros fatores, como problemas de nutrição e circulação, e por alterações na função imunológica. 17 A função das glândulas sebáceas diminui com a idade e conduz a uma redução na secreção de sebo. A diminuição do  tamanho,  do  número  e  da  atividade  das  glândulas  sudoríferas  écrinas  provoca  diminuição  na  capacidade  de produzir suor. As unhas tornam­se duras, quebradiças e espessas, principalmente como resultado da diminuição da vascularização do leito ungueal. 6,16,17

Figura 3.2 • Manifestações clínicas do envelhecimento.

Mudanças no cabelo relacionadas com a idade ocorrem também. Devido a um declínio na produção de melanina pelo folículo piloso, cerca de metade da população com mais de 50 anos de idade tem pelo menos 50% de cabelos brancos,  independentemente  do  sexo  ou  da  cor  original  do  cabelo.  Alterações  no  crescimento  do  cabelo  e  na distribuição também são identificadas.16 A quantidade de cabelo no couro cabeludo, nas axilas e no púbis se torna mais  escassa,  e  os  pelos  das  orelhas  e  narinas  ficam  mais  grossos.16,18  Doenças  de  pele  são  comuns  entre  a população  idosa  e  podem  incluir  câncer  de  pele,  queratoses  (i.  e.,  lesões  verrucosas),  xerose  (i.  e.,  secura excessiva), dermatite e prurido (i. e., comichão generalizado).17,19

A Sra. Maria tinha uma sensação de queimação no lado esquerdo das costas, onde se desenvolveu uma erupção alguns dias mais tarde. Esta

combinação de formigamento/sensação de queimação em um lado do corpo, seguida pela erupção de pequenas vesículas cheias de líquido, é

conhecida como herpes-zóster ou cobreiro, e é comumente observada nos idosos. Trata-se da reativação do vírus da varicela (varicela-zóster) e

ocorre ao longo do trajeto de um nervo. O que torna essa condição única é que ocorre apenas em um dos lados do corpo. Alguns

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indivíduos sentem dor na área da erupção muito depois da cicatrização. A razão para a reativação do vírus não está estabelecida,

mas parece estar relacionada com estresse e supressão imunológica.

Estatura e função musculoesquelética O  envelhecimento  é  acompanhado  por  um  declínio  progressivo  na  altura,  especialmente  entre  as  mulheres.  Essa redução  na  altura  é  atribuída  principalmente  à  compressão  das  vértebras  da  coluna. 20  A  composição  orgânica também  sofre  alterações.  A  quantidade  de  gordura  aumenta  e  a  massa  corporal  magra  e  a  água  corporal  total diminuem com o avançar da idade. Com  o  envelhecimento,  ocorrem  redução  no  tamanho  e  na  força  muscular,  relacionada  com  a  perda  de  fibras musculares,  e  diminuição  no  tamanho  das  fibras  musculares  existentes.  Embora  o  declínio  da  força  com  o envelhecimento  não  possa  ser  interrompido,  o  progresso  pode  ser  retardado  com  a  prática  de  exercícios  físicos. Sobrevém  um  declínio  no  desempenho  de  alta  velocidade  e  no  tempo  de  reação  devido  à  diminuição  de  fibras musculares  do  tipo  II.21  Deficiências  no  sistema  nervoso  também  podem  causar  a  lentidão  dos  movimentos.  No entanto, acredita­se que as fibras musculares do tipo I, que conferem resistência, se mantenham consistentes. Numerosos estudos têm relatado a perda de massa óssea com o envelhecimento, independentemente de sexo, raça ou tamanho do corpo. Com o envelhecimento, o processo de formação óssea (renovação) é retardado em relação ao processo de reabsorção (dano), o que resulta na perda de massa óssea e no enfraquecimento da estrutura óssea. 21,22 Isto  se  aplica  também  às  mulheres  na  pós­menopausa. Após  a  menopausa,  acontece  um  rápido  declínio  da  massa óssea devido à deficiência de estrogênio. Essa perda óssea é contínua. Dados sugerem que os homens mais velhos sofram  perda  de  massa  óssea  em  taxas  semelhantes  às  das  mulheres  idosas.23  Esse  processo  se  torna  patológico (osteoporose) quando aumenta significativamente a predisposição a fraturas e a complicações associadas. A  prevalência  de  doença  articular  é  maior  entre  os  idosos.  Por  volta  de  65  anos,  80%  da  população  apresenta algum  tipo  de  doença  articular.  A  osteoartrite  é  tão  comum  entre  idosos  que  frequentemente  é  vista,  de  modo equivocado, como alteração normal relacionada com a idade, e não como doença. Fundamentalmente, as articulações sinoviais são afetadas por osteoartrite, mais comumente as articulações das mãos, pés, joelhos, quadris e ombros. Caracteriza­se  por  perda  de  cartilagem  e  formação  de  osso  novo,  que  é  responsável  pela  distorção  da  articulação, limitação  dos  movimentos  e  instabilidade  articular.21,24  A  idade  é  o  único  fator  de  risco  principal  para  o desenvolvimento de osteoartrite, em parte por causa do impacto mecânico sobre as articulações ao longo do tempo, mas também está relacionada com lesões, alteração nas condições físicas da cartilagem articular, obesidade (p. ex., joelho), deformidades congênitas (p. ex., quadril), deposição de cristais sobre a cartilagem articular (p. ex., joelho) e hereditariedade. Isso frequentemente resulta em dor, imobilidade e inflamação das articulações. O tratamento visa minimizar os fatores de risco, perder peso, se indicado, praticar exercícios físicos para aumentar a força muscular e implementar medidas para o alívio da dor.

Função cardiovascular As  doenças  cardiovasculares  continuam  a  ser  a  principal  causa  de  morbidade  e  mortalidade  em  idosos.  Muitas vezes,  é  difícil  separar  as  alterações  verdadeiramente  relativas  ao  envelhecimento  manifestadas  no  sistema cardiovascular de processos patológicos. A aorta e as artérias tendem a se tornar mais rígidas e menos distensíveis com a idade, o coração se torna menos sensível à ação das catecolaminas, a frequência cardíaca máxima durante o exercício diminui e ocorre redução da taxa de relaxamento diastólico do ventrículo esquerdo.

Pressão arterial A  relação  entre  pressão  arterial  e  risco  de  doença  cardiovascular  é  contínua,  consistente  e  independente  de  outros fatores de risco. Muitos estudos têm evidenciado o aumento progressivo da pressão arterial sistólica com a idade, enquanto o aumento da pressão arterial diastólica tende a se estabilizar e até mesmo diminuir depois de 50 anos de idade.6,25  Como  resultado,  surge  um  aumento  acentuado  conhecido  como  hipertensão  arterial  sistólica  entre  os idosos, resultante da intensificação da rigidez nas artérias.26 Elevação na pressão arterial sistólica acompanhada por pressão diastólica normotensa provoca aumento dramático

na  pressão  diferencial.  Esse  é  um  indicador  de  prognóstico  conhecido  para  eventos  coronarianos  futuros. Assim, recomenda­se o tratamento agressivo da hipertensão sistólica, pois tem sido demonstrado que apresenta redução na VENDEDOR [email protected] manifestação  de  acidente http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 vascular  cerebral,  insuficiência  cardíaca,  doença  renal  e  outras  complicações. 26,27 Indivíduos normotensos aos 55 anos de idade apresentam um risco permanente de 90% para o desenvolvimento de hipertensão.28 Atualmente, há tentativas para intervir quando o indivíduo se apresenta pré­hipertenso (com pressão arterial sistólica de 120 a 139 mmHg ou pressão arterial diastólica de 80 a 89 mmHg) por meio de estratégias com vistas à modificação no estilo de vida para evitar a hipertensão.29 Hipotensão ortostática, ou queda significativa na pressão sistólica ao levantar­se, é mais comum entre idosos. Os mecanismos cardiovasculares compensatórios são frequentemente atrasados ou insuficientes, pois também é comum a  queda  da  pressão  arterial  devido  a  mudança  de  posição  ou  consumo  de  uma  refeição. 30  Mesmo  quando  não  há hipotensão ortostática, os idosos respondem ao estresse postural com alterações reduzidas da frequência cardíaca e da pressão diastólica. Acredita­se que esta resposta alterada ao estresse ortostático resulte de alterações na função do sistema nervoso autônomo, funcionamento inadequado do sistema circulatório, ou ambos.31

Função cardíaca Diversos  fatores  determinam  o  efeito  do  envelhecimento  sobre  a  função  cardíaca  em  idosos  saudáveis.  Com  o envelhecimento, ocorrem aumento na espessura da parede do ventrículo esquerdo, atraso no enchimento precoce do ventrículo  esquerdo,  diminuição  na  capacidade  de  resposta  à  estimulação  β­adrenérgica  e  a  catecolaminas circulantes, redução na frequência cardíaca máxima e no débito cardíaco e aumento da resistência vascular sistêmica e  da  pós­carga  do  ventrículo  esquerdo.  A  pós­carga  (oposição  à  ejeção  do  ventrículo  esquerdo)  aumenta progressivamente  com  a  idade,  a  aorta  ascendente  se  torna  mais  rígida  e  ocorre  aumento  da  resistência  nos  vasos arteriais  periféricos.25  Embora  o  tamanho  do  coração  não  sofra  alterações,  a  espessura  da  parede  do  ventrículo esquerdo pode aumentar com a idade, em parte para responder à elevação da pressão diastólica que se desenvolve devido às alterações que ocorrem com os vasos sanguíneos.26 Tanto  a  função  diastólica  do  ventrículo  esquerdo  quanto  a  função  sistólica  são  afetadas  pelo  envelhecimento. Embora  o  enchimento  diastólico  precoce  seja  reduzido  em  aproximadamente  50%  entre  20  e  80  anos  de  idade, ocorre  mais  enchimento  no  final  da  diástole,  em  parte  por  causa  de  contração  atrial  mais  vigorosa. 25 A contração atrial  aumentada  é  acompanhada  por  hipertrofia  e  dilatação  atriais.  Independentemente  da  redução  nas  alterações associadas  à  idade  no  padrão  de  enchimento  diastólico  em  indivíduos  mais  velhos,  seu  volume  diastólico  final  no ventrículo  esquerdo  em  decúbito  dorsal  não  difere  substancialmente  daquele  encontrado  em  indivíduos  mais jovens.25  No  entanto,  é  reduzido  em  menor  grau  nos  indivíduos  mais  velhos  do  que  nos  mais  jovens  durante  a mudança postural (passando do decúbito dorsal para a posição sentada) e durante exercícios em posição ortostática graduada. Além disso, a fração máxima de ejeção do ventrículo esquerdo (porcentagem do volume diastólico final do ventrículo esquerdo que é ejetado durante a sístole) possível de ser alcançada durante exercícios físicos diminui com a idade; neste caso, por causa de uma queda menor no volume sistólico final do ventrículo esquerdo. Acredita­ se  que  um  declínio  associado  à  idade  na  contratilidade  do  miocárdio  contribua  para  esse  defeito  na  regulação  do volume sistólico final. A frequência cardíaca de repouso em decúbito dorsal permanece inalterada ou reduz­se ligeiramente com a idade. Entretanto,  a  frequência  cardíaca  máxima  capaz  de  ser  alcançada  durante  exercícios  físicos  diminui. A  redução  da frequência cardíaca é a razão pela qual a reserva de débito cardíaco máximo diminui em idosos saudáveis. 25 Apesar de alterações associadas ao envelhecimento e de doenças cardiovasculares, a função cardiovascular global em  repouso  é  considerada  adequada  para  atender  às  necessidades  orgânicas  da  maioria  dos  idosos  saudáveis.  O débito  cardíaco  é  essencialmente  mantido  em  idosos  saudáveis  (nos  homens  mais  que  nas  mulheres)  durante  o exercício,  apesar  da  diminuição  da  resposta  da  frequência  cardíaca,  aparentemente  devido  ao  maior  volume  de bombeamento resultante do aumento do volume diastólico final durante a prática de exercícios. 32 O  sistema  de  condução  cardíaco  também  sofre  alterações.  O  nó  sinoatrial  sofre  fibrose  e  o  número  de  células marca­passo do nó sinusal é reduzido em cerca de 90%. O nó atrioventricular pode ser afetado devido à calcificação do  músculo  cardíaco  adjacente.  As  consequências  dessas  alterações  incluem  a  “síndrome  do  nó  sinoatrial”  e anormalidades na condução cardíaca.33,34

Função respiratória VENDEDOR [email protected] Como  a  função  pulmonar  sofre  alterações  com  a  idade,  muitas  vezes  é  difícil  diferenciar  os  efeitos  do http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 envelhecimento  daqueles  relacionados  com  fatores  ambientais  e  doenças.  O  consumo  máximo  de  oxigênio  ( O2máx),  medida  usada  para  determinar  a  função  cardiopulmonar  em  geral,  diminui  com  a  idade.  Diversos  estudos indicam que o  O2máx melhora significativamente com a prática de exercícios físicos, e que o  O2máx de idosos atletas pode ser semelhante ao de atletas mais jovens ou excedê­lo.35 A  perda  da  elasticidade  no  pulmão  não  é  causada  por  alterações  na  quantidade  de  elastina,  nem  na  composição das fibras de colágeno. Ao contrário, o aumento do diâmetro alveolar diminui a tensão superficial, reduzindo assim a  elasticidade.36  A  calcificação  dos  tecidos  moles  da  parede  torácica  causa  maior  rigidez  e,  portanto,  aumenta  a carga  de  trabalho  dos  músculos  respiratórios.  Ocorre  perda  na  estrutura  dos  alvéolos,  que  diminui  a  área  da superfície  de  troca  gasosa.  Embora  a  capacidade  pulmonar  total  permaneça  constante,  as  consequências  dessas alterações  resultam  em  aumento  do  volume  residual  pulmonar,  da  capacidade  de  reserva  funcional,  e  declínio  da capacidade vital.30,35 Há diminuição linear na tensão arterial de oxigênio (PO2) de aproximadamente 20 mmHg dos 20 aos 70 anos de idade. Acredita­se que isto resulte principalmente do descompasso entre a ventilação e a perfusão pulmonar em indivíduos mais velhos.36

Função neurológica As  alterações  se  dão  nos  níveis  estrutural,  químico  e  funcional  do  sistema  nervoso  relacionadas  com  o  processo normal  de  envelhecimento,  mas  no  geral  não  interferem  na  rotina  diária,  a  não  ser  quando  há  transtornos neurológicos  específicos.  O  peso  do  cérebro  diminui  com  a  idade,  e  ocorre  perda  de  neurônios  no  cérebro  e  na medula  espinal.  A  perda  de  neurônios  é  mais  pronunciada  no  córtex  cerebral,  especialmente  na  área  temporal superior.  Sobrevêm  outras  alterações  também  nos  neurônios  e  nas  células  de  suporte.  A  atrofia  dos  dendritos neuronais  resulta  em  conexões  sinápticas  deficientes,  redução  nas  reações  eletroquímicas  e  disfunção  neural.  As transmissões  sinápticas  também  são  afetadas  por  alterações  nos  neurotransmissores  químicos  dopamina, acetilcolina e serotonina. Como resultado, muitos processos neurais ficam mais lentos. São encontrados depósitos de  lipofuscina  (matéria  intracelular  insolúvel,  de  coloração  amarela)  em  maior  quantidade  no  cérebro  dos idosos.9,34,37 Alterações  sensorimotoras  mostram  declínio  na  força  motora,  lentidão  no  tempo  de  reação,  diminuição  de reflexos (especialmente nos tornozelos) e alterações na propriocepção. Essas alterações podem causar problemas de equilíbrio e movimentos mais lentos e deliberados, frequentemente observados em indivíduos mais velhos.38 Embora  as  alterações  do  cérebro  estejam  associadas  ao  envelhecimento,  as  capacidades  cognitivas  gerais permanecem intactas. Ainda que as habilidades de linguagem e atenção não se alterem com a idade, o desempenho e as habilidades de tarefas de construção podem diminuir, assim como a memória a curto prazo e a memória imediata. Mudanças na personalidade ou déficits cognitivos significativos são considerados incomuns ao processo normal de envelhecimento, e, se ocorrerem, deverão ser avaliados. Demência ou depressão podem ser a causa.

Função sensorial especial Alterações  sensoriais  associadas  ao  processo  de  envelhecimento  podem  afetar  significativamente  o  nível  de funcionamento  e  a  qualidade  de  vida  do  idoso.  Deficiências  visuais  e  auditivas  devido  a  estados  patológicos,  por exemplo, podem interferir nas habilidades de comunicação e levar ao isolamento social e à depressão.

Visão Acontece um declínio geral na acuidade visual com o avançar da idade, e quase todos os indivíduos com mais de 55 anos necessitam de correção da visão para leitura ou distância. Esse declínio resulta do menor diâmetro da pupila, da perda do poder de refração do cristalino e do aumento da dispersão da luz. O problema visual mais comum entre idosos  é  a  presbiopia  ou  dificuldade  em  focalizar  objetos  próximos.  É  causada  principalmente  pela  diminuição  da elasticidade do cristalino e pela atrofia do músculo ciliar. Clarão e mudanças de luminosidade abruptas são particularmente problemáticos para os idosos. Essas alterações aumentam  o  risco  de  quedas  e  lesões.  Além  disso,  representam  o  motivo  pelo  qual  os  idosos  frequentemente

desistem  de  dirigir  à  noite.  Alterações  na  capacidade  de  discriminação  das  cores  também  ocorrem  com  o envelhecimento.  Especificamente,  indivíduos  idosos  têm  mais  dificuldade  para  identificar  tons  de  azul  e  verde. VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 Acredita­se que isto esteja relacionado com problemas para filtrar comprimentos mais curtos da onda luminosa (ou seja,  violeta,  azul,  verde)  através  de  um  cristalino  já  amarelado  e  opaco. A  sensibilidade  da  córnea  também  pode diminuir com a idade, de modo que lesões ou infecções podem passar despercebidas.39 Doenças  e  distúrbios  oftalmológicos  são  comuns  em  idosos.  Catarata,  glaucoma  e  degeneração  macular  são condições  observadas  com  frequência  e  podem  prejudicar  muito  a  visão  e  a  função.  Tanto  intervenções  clínicas quanto cirúrgicas podem restaurar ou melhorar os problemas de visão resultantes de estados patológicos dos olhos. O  uso  de  certos  dispositivos,  como  lupas  especiais  e  iluminação  de  alta  intensidade  que  imita  a  luz  solar,  ajuda  a otimizar a visão sujeita a problemas não propensos à correção.

A Sra. Maria sofreu uma queda logo que se mudou para a casa da 䶦lha. Sua antiga casa era acarpetada, mas a casa de Beth tem

piso de madeira. O brilho da madeira polida prejudicou a visão da Sra. Maria, impedindo-a de ver o carrinho de brinquedo do

neto, fazendo-a escorregar e cair. Maria sofre de catarata, o que diminui sua tolerância ao brilho e provavelmente contribuiu para

a queda.

Audição A perda auditiva é comum entre os idosos, e algum grau de comprometimento é quase inevitável com o avanço da idade.  Entre  os  americanos  com  idade  entre  65  e  74  anos,  30%  sofrem  de  deficiência  auditiva,  número  que  sobe para 47% entre aqueles com mais de 75 anos de idade.40 A  presbiacusia,  ou  perda  de  audição  relacionada  com  o  envelhecimento,  é  considerada  multifatorial  em  sua etiologia.  Ocorre  como  resultado  do  envelhecimento  combinado  com  estresse  auditivo,  traumatismo,  influências ambientais e doenças otológicas, bem como fatores genéticos. É caracterizada por um início gradual e progressivo de  perda  auditiva  neurossensorial  bilateral  e  simétrica  para  tons  de  alta  frequência.  O  déficit  auditivo frequentemente apresenta tanto um componente periférico quanto central. A discriminação da fala, ou capacidade de distinguir  entre  palavras  que  são  quase  homônimas  ou  distinguir  palavras  pronunciadas  por  diferentes  falantes, muitas vezes é prejudicada. A fala acelerada e em voz muito alta pode aumentar a distorção e complicar ainda mais o  problema.  Ao  falar  com  idosos  com  deficiência  auditiva,  é  importante  olhar  para  eles  diretamente  para  que possam  observar  os  movimentos  labiais  e  as  expressões  faciais.  A  fala  deve  ser  lenta  e  direta.  Falar  alto  pode causar  irritação  no  idoso.  Reformular  mensagens  mal  interpretadas  também  pode  melhorar  a  compreensão  da palavra  falada.  Os  déficits  de  audição  associados  ao  envelhecimento  nem  sempre  se  limitam  a  um  aumento  do limiar  de  detecção,  mas  podem  incluir  outros  aspectos  da  audição,  como  a  capacidade  de  distinguir  sons,  a compreensão da fala e a discriminação de ruídos, como observado anteriormente.

A

Sra.

Maria

tem

di䶦culdade

de

entender

quando

seus

netos

ou

sua

䶦lha

falam

com

ela,

mas

não

tem

problemas

para

compreender o que seu genro diz. Isso ocorre porque a voz aguda de mulheres e crianças é mais difícil de ouvir quando se tem

presbiacusia.

Aparelhos  auditivos  indicam  ser  eficazes  para  diversos  níveis  de  perda  auditiva  e  podem  melhorar  muito  a capacidade de ouvir e se comunicar. O implante coclear pode ser sugerido para indivíduos com perda auditiva grave, que  não  são  beneficiados  pelo  uso  de  aparelhos  auditivos.41  A  pesquisa  na  área  de  restauração  da  audição  pela regeneração das células ciliadas da cóclea, bem como a terapia genética, tem se mostrado promissora. 42 A impactação de cerume no meato acústico externo também é comumente observada em idosos e pode prejudicar a audição. As glândulas produtoras de cerume, que são glândulas sudoríferas apócrinas modificadas, se atrofiam e passam a produzir um cerume mais seco. Isso pode ser parcialmente responsável pela impactação de cerume mais frequente entre a população de idosos.41

Olfato e paladar

O  olfato,  ou  a  capacidade  de  discriminar  odores,  diminui  com  a  idade,  possivelmente  como  resultado  da  atrofia generalizada  dos  bulbos  olfatórios  e  da  [email protected] perda  moderada  dos  neurônios  olfatórios.  O  olfato  é  um  mecanismo  de VENDEDOR http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 proteção, e indivíduos incapazes de sentir cheiro podem se expor a riscos ambientais. Por exemplo, um indivíduo que não consegue sentir o cheiro de fumaça está particularmente em risco na eventualidade de um incêndio. O sentido do paladar diminui com o envelhecimento, mas acredita­se ser menos afetado do que o olfato. De fato, em  muitos  casos,  o  que  é  percebido  como  um  declínio  na  capacidade  de  saborear  é  realmente  um  problema  de olfato.  Como  paladar  e  olfato  são  necessários  para  apreciar  o  sabor  dos  alimentos,  os  idosos  podem  não  sentir  o mesmo  prazer  com  a  comida  que  sentiam  quando  eram  mais  jovens. 39  O  uso  de  medicamentos  e  determinadas doenças  também  são  capazes  de  afetar  o  paladar. 38  As  alterações  no  paladar  e  no  olfato,  juntamente  com  outros fatores,  como  comer  sozinho,  não  conseguir  comprar  e  preparar  o  alimento,  e  o  alto  custo  de  alguns  alimentos, podem ser responsáveis pela ingestão nutricional deficiente em alguns idosos. Por outro lado, a falta de feed back sensorial levará alguns indivíduos a comer mais e ganhar peso. O declínio no paladar é mais marcado entre idosos com doença de Alzheimer (DA), provavelmente por causa das alterações neuropatológicas no cérebro. 38

Função imunológica Um sistema imunológico funcional é um componente fundamental para sobreviver a infecções por microrganismos e a danos causados por outros patógenos. A imunossenescência, ou alterações relacionadas com o envelhecimento que afetam o sistema imunológico, representa um possível aumento no risco de determinadas infecções em idosos.

Um exemplo disso seriam as erupções associadas ao herpes-zóster que surgiram na pele da Sra. Maria.

A involução do timo está completa quando o indivíduo alcança 45 ou 50 anos de idade, e, embora o  número  total  de  células  T  permaneça  inalterado,  existem  alterações  na  função  das  células  T  auxiliares  que modificam  a  resposta  imunológica  celular  dos  idosos.  Há  também  evidências  de  elevação  nos  níveis  de  diversos autoanticorpos  (p.  ex.,  fator  reumatoide)  à  medida  que  o  indivíduo  envelhece,  aumentando  o  risco  de desenvolvimento de uma doença autoimune. Muitos estudos mostram que, embora aconteçam alterações na imunidade com o envelhecimento, são os efeitos de  composição  de  doenças  relacionadas  com  a  idade  e  as  condições  externas  que  resultam  em  um  estado  geral  de imunidade disfuncional, responsável pelo aumento do risco e da gravidade das infecções mais comuns em idosos. Portanto,  a  imunossenescência  é  uma  condição  predisponente,  mas  sua  contribuição  para  o  risco  de  infecção provavelmente  é  pequena  até  se  desenvolver  um  comprometimento  mais  grave  da  imunidade,  como  resultado  de doença  crônica,  circunstâncias  externas  ou  infecções  de  repetição  ou  crônicas. 18  Isso  é  diferente  das  alterações relacionadas com a imunossupressão resultante de certas condições, como infecção pelo vírus da imunodeficiência humana ou uso de medicamentos imunossupressores, que acarretam infecções oportunistas incomuns. No entanto, os idosos são mais suscetíveis a infecções do sistema urinário, do sistema respiratório, de feridas e nosocomiais. A taxa de mortalidade pelo vírus influenza e por broncopneumonia é mais alta nesta população. 43 A  detecção  precoce  de  infecções  é  mais  difícil  em  idosos,  porque  os  sintomas  típicos,  como  febre  e  contagem elevada  de  leucócitos,  muitas  vezes  não  se  apresentam.  Mudança  no  estado  mental  ou  declínio  da  função frequentemente é o único sinal apresentado. Existem relatos de delirium em 50% dos idosos com infecções. Assim, um processo infeccioso em um indivíduo idoso pode estar muito avançado no momento do diagnóstico.18,43

Função gastrintestinal O  sistema  digestório  mostra  menos  alterações  funcionais  associadas  à  idade  do  que  outros  sistemas  orgânicos. Embora a perda dos dentes seja comum e aproximadamente 40 a 50% da população idosa não apresente dentição, isso não é considerado parte do processo normal de envelhecimento. A higiene dental precária associada a cáries e doença  periodontal  é  a  principal  razão  para  a  perda  da  dentição.  A  edentação,  ou  falta  de  dentes,  pode  levar  a alterações na dieta e estar associada à desnutrição. O uso de próteses pode melhorar a mastigação, no entanto inibe o paladar. Devido ao aprimoramento da tecnologia dental e do abastecimento de água fluoretada, um número maior de  indivíduos  é  capaz  de  manter  a  dentição  em  seus  últimos  anos  de  vida.  Xerostomia,  ou  boca  seca,  também  é

comum,  mas  não  universal  entre  os  idosos  e,  tipicamente,  ocorre  como  resultado  da  diminuição  das  secreções salivares. Outras causas podem incluir o uso de medicamentos, como anticolinérgicos e tranquilizantes, radioterapia VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 e doenças obstrutivas nasais que induzem à respiração pela boca. O  termo  presbiesôfago  tem  sido  empregado  para  indicar  alterações  na  função  esofágica,  como  diminuição  da motilidade  e  relaxamento  inadequado  do  esfíncter  esofágico  inferior,  que  acredita­se  que  ocorram  com  o envelhecimento. No entanto, em estudos com controle para certas doenças, como diabetes melito e neuropatias, não foi observado aumento na motilidade anormal. Em geral, a função fisiológica do esôfago parece permanecer intacta com o avanço da idade.34 Podem suceder atrofia da mucosa gástrica e diminuição da secreção gástrica dos idosos. A acloridria (diminuição da secreção de ácido clorídrico) provavelmente se desenvolve como resultado da perda de células parietais. Apesar de não ser universal, a acloridria é mais prevalente entre os idosos e pode causar redução na absorção gástrica de substâncias  que  requerem  um  ambiente  ácido.  Acredita­se  que  a  infecção  por  Helicobacter  pylori,  comum  em idosos, desempenhe algum papel na atrofia gástrica e subsequente declínio da secreção de ácido gástrico. 44 Gastrite  atrófica  e  diminuição  da  secreção  do  fator  intrínseco  são  condições  mais  comuns  no  processo  de envelhecimento e podem resultar em má absorção de vitamina B 12 (cobalamina). Como a vitamina B12 é necessária para  a  maturação  das  hemácias,  sua  deficiência  leva  possivelmente  a  um  tipo  de  anemia  macrocítica  chamada anemia  perniciosa.  A  deficiência  de  vitamina  B 12  também  demonstra  causar  anomalias  neurológicas,  como neuropatia periférica, ataxia e até mesmo demência. O tratamento tradicionalmente consistia na terapia de reposição de  vitamina  B12  injetável,  porque  se  acreditava  que  a  forma  oral  não  fosse  absorvida  devido  à  falta  de  fator intrínseco.  No  entanto,  uma  pesquisa  recente  fornece  suporte  ao  uso  de  altas  doses  de  cobalamina  oral  para aumentar os níveis séricos de vitamina B12 e melhorar os parâmetros hematológicos.45,46 O  uso  indiscriminado,  muitas  vezes  a  longo  prazo,  de  inibidores  da  bomba  de  prótons  (IBP)  para  distúrbios relacionados  com  a  acidez  estomacal  em  idosos  chamou  a  atenção  para  o  potencial  de  reações  adversas.  O  uso excessivo de terapia com IBP pode interferir na absorção de vitamina B 12 e contribuir para os efeitos associados a polifarmácia e interações medicamentosas. Potenciais reações adversas adicionais ao uso de IBP incluem aumento do  risco  de  diarreia  ligada  ao  Clostridium difficile  e  pneumonia  adquirida  na  comunidade.  O  ambiente  geralmente ácido  do  estômago  atua  como  defesa  contra  bactérias  ingeridas.  O  aumento  subsequente  do  pH  gástrico,  com  a utilização de IBP, facilita a sobrevivência de certos patógenos, que sucumbiram a um ambiente mais ácido. 47 O  intestino  delgado  apresenta  algumas  alterações  morfológicas  relacionadas  com  a  idade,  como  a  atrofia  da mucosa. No entanto, a absorção da maioria dos nutrientes e outras funções parecem manter­se intactas. A absorção de cálcio, contudo, diminui com o envelhecimento e pode refletir a redução da absorção intestinal, juntamente com outros  fatores,  como  ingestão  reduzida  de  vitamina  D,  diminuição  da  formação  de  vitamina  D3 pela pele devido à baixa exposição à luz solar e redução da ativação da vitamina D3 pelo fígado e rins. São  comuns  divertículos  no  cólon  de  indivíduos  idosos,  contudo  mais  de  50%  daqueles  com  mais  de  80  anos apresentam doença diverticular. A alta incidência parece resultar principalmente de uma dieta baixa em fibras. 48 A constipação  intestinal,  ou  eliminação  de  fezes  duras  e  infrequentes,  é  outro  fenômeno  que  ocorre  regularmente. Frequentemente,  é  atribuída  a  imobilidade  e  diminuição  da  atividade  física,  dieta  pobre  em  fibras,  diminuição  da ingestão de líquidos e uso de medicamentos; neoplasias e outras doenças também podem ser responsáveis por essa condição. As  complicações  da  constipação  intestinal  incluem  impactação  fecal  ou  obstrução,  megacólon,  prolapso retal, hemorroidas e uso abusivo de laxantes.49

Função renal Embora  ocorram  alterações  anatômicas  e  fisiológicas  relacionadas  com  o  envelhecimento,  o  rim  continua  a  ser capaz  de  manter  com  notável  eficácia  o  equilíbrio  hidreletrolítico.  As  alterações  associadas  ao  envelhecimento resultam na diminuição da capacidade de reserva, o que pode alterar a capacidade dos rins para manter a homeostase em  face  de  doenças  ou  fatores  de  estresse.  Em  geral,  ocorre  um  declínio  geral  da  massa  renal  com  o envelhecimento,  predominantemente  no  córtex  renal.  O  número  de  glomérulos  funcionais  diminui  em  30%,  com aumento da porcentagem de glomérulos escleróticos ou anormais.50 Diversos estudos transversais e longitudinais têm documentado um declínio constante relacionado com a idade no fluxo  sanguíneo  renal  total  de  aproximadamente  10%  por  década  após  20  anos  de  idade;  sendo  assim,  o  fluxo

sanguíneo renal de um indivíduo com 80 anos de idade apresenta valor médio de aproximadamente 300 ml/min, em comparação com 600 mℓ/min em um adulto jovem. O maior declínio no fluxo sanguíneo ocorre na área cortical dos VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 rins,  causando  diminuição  progressiva,  relacionada  com  a  idade,  na  TFG.  Os  níveis  séricos  de  creatinina,  um subproduto do metabolismo muscular, são frequentemente empregados para medir a taxa de filtração glomerular. O declínio da TFG advindo do envelhecimento não é acompanhado por aumento equivalente nos níveis de séricos de creatinina, porque a produção de creatinina é reduzida uma vez que a massa muscular diminui com a idade. 50,51 Os níveis  séricos  de  creatinina  muitas  vezes  são  usados  como  índice  da  função  renal  para  a  prescrição  e  o  cálculo  de dosagens  de  medicamentos  eliminados  pelos  rins.  Isso  tem  implicações  importantes  para  os  idosos.  Se  não  for cuidadosamente  considerada,  uma  dose  inadequada  pode  levar  ao  acúmulo  excessivo  de  fármacos  circulantes  e resultar em toxicidade. Existe uma fórmula disponível que calcula o ajuste para alterações relacionadas com a idade nos níveis séricos de creatinina para indivíduos de 40 a 80 anos de idade. A função tubular renal diminui com o avançar da idade, como também ocorre com a capacidade de concentrar e diluir  a  urina  em  resposta  à  deficiência  hidreletrolítica. A  capacidade  do  rim  envelhecido  de  conservar  sódio  em resposta  à  depleção  de  sódio  é  prejudicada  e  pode  resultar  em  hiponatremia.  A  diminuição  da  capacidade  de concentração  da  urina,  uma  diminuição  relacionada  com  a  idade  em  resposta  ao  hormônio  antidiurético  e  o comprometimento  do  mecanismo  que  regula  a  sede  podem  contribuir  para  a  maior  predisposição  dos  idosos  à desidratação durante períodos de estresse e doença. Os idosos também estão mais propensos a desenvolver hiper e hipopotassemia  quando  estressados,  em  relação  a  indivíduos  mais  jovens.  Níveis  séricos  elevados  de  potássio podem ser o resultado da diminuição na TFG, de níveis mais baixos de renina e aldosterona, além de alterações na função  tubular.  Baixos  níveis  de  potássio,  por  outro  lado,  são  mais  comumente  causados  por  distúrbios gastrintestinais ou uso de diuréticos. Nenhuma dessas condições resulta do envelhecimento.52

Função geniturinária Tanto homens como mulheres sofrem alterações na função geniturinária resultantes do processo de envelhecimento. Há  alterações  na  estrutura  e  na  função  vesical,  diminuição  dos  hormônios  sexuais  esteroides  e  modificações  nas estruturas genitais. As mudanças na estrutura da bexiga que ocorrem devido ao processo de envelhecimento podem provocar redução na  função.  Geralmente,  a  musculatura  lisa  e  o  tecido  elástico  de  suporte  são  substituídos  por  tecido  conjuntivo fibroso.  Isso  possibilita  o  esvaziamento  incompleto  da  bexiga  e  a  redução  na  intensidade  do  jato  urinário.  A capacidade vesical também diminui com a idade, enquanto a frequência de micção aumenta. Como o tecido elástico e os músculos se enfraquecem, a incontinência de esforço torna­se mais prevalente. Nas mulheres, o envelhecimento provoca atrofia das estruturas do períneo, o que pode causar o recuo do meato uretral  ao  longo  da  parede  vaginal.  Ocorre  atrofia  de  outros  órgãos  pélvicos  na  mulher  devido  à  diminuição  da produção de estrogênio após a menopausa: a secreção vaginal diminui, a mucosa vaginal fica mais fina, mais seca, menos  elástica,  facilitando  traumatismos;  além  disso,  a  flora  normal  sofre  alteração.  Estas  alterações  podem resultar em infecções vaginais, prurido e dor durante o intercurso sexual.53 Em homens idosos, a hiperplasia prostática benigna (HPB) é bastante comum. A incidência aumenta até alcançar aproximadamente 90% dos homens com 80 anos de idade. A condição muitas vezes é assintomática até 50 anos de idade. Depois disso, a incidência e a gravidade dos sintomas aumentam com a idade. A HBP pode causar sintomas obstrutivos, como hesitação urinária, redução na intensidade do jato, retenção e gotejamento de urina após a micção. Também pode provocar sintomas irritativos, como aumento na frequência, nictúria, urgência miccional e até mesmo incontinência de urgência.54 É  sabido  que  os  níveis  séricos  de  testosterona  diminuem,  acompanhando  o  processo  de  envelhecimento masculino, embora a definição e o tratamento de hipogonadismo permaneçam controversos. Os sintomas associados à  deficiência  androgênica  no  envelhecimento  masculino  podem  incluir  redução  da  força  muscular,  resistência  e energia; perda de massa muscular; baixa libido (com ou sem disfunção erétil); humor irritável; osteoporose e atrofia testicular.  Embora  diversos  grupos  tenham  desenvolvido  diretrizes  para  a  terapia  de  reposição  androgênica  em homens mais velhos, não existe consenso sobre a possibilidade de tratar a deficiência hormonal.55 A  atividade  sexual  permanece  possível  até  idade  avançada  tanto  para  homens  como  para  mulheres.  Em  geral,  a duração e a intensidade do ciclo de resposta sexual diminuem para ambos os sexos. As mulheres levam mais tempo

para  sofrer  as  alterações  fisiológicas  de  expansão  e  lubrificação  vaginal  durante  a  fase  de  excitação.  A  ereção peniana  em  homens  idosos  leva  mais  tempo  para  ocorrer  devido  a  alterações  na  inervação  neural  e  no  suprimento VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952 vascular. Fatores sociais que afetam o comportamento sexual incluem o desejo de permanecer sexualmente ativo, o acesso a um parceiro sexualmente ativo e a disponibilidade de um ambiente propício. 56,57

Resumo

O  envelhecimento  traz  um  declínio  geral  na  estrutura  e  na  função  do  organismo,  resultando  na  redução  da capacidade  de  reserva  dos  diversos  sistemas  orgânicos,  incluindo  tegumentar,  musculoesquelético, cardiorrespiratório,  nervoso,  sensorial,  imunológico,  digestório  e  geniturinário  (ver  Figura 3.2).  Isso  resulta  na diminuição  da  capacidade  de  homeostasia,  tornando  o  idoso  mais  vulnerável  a  fatores  de  estresse  como  doença, traumatismo, cirurgia, uso de medicamentos e mudanças ambientais.

Problemas funcionais associados ao envelhecimento

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Citar quatro fatores de risco para quedas em idosos



Listar cinco sintomas de depressão em idosos



Nomear uma ferramenta para avaliar a função cognitiva



Explicar a diferença entre delirium e demência

Embora envelhecimento não seja sinônimo de doença, o processo de envelhecimento está sujeito ao aumento da incidência  de  condições  patológicas.  À  medida  que  a  idade  cronológica  avança,  aumenta  a  probabilidade  do aparecimento  de  múltiplas  doenças  crônicas.  A  maioria  significativa  dos  idosos  tem,  pelo  menos,  uma  condição crônica, e muitos têm mais do que uma.1 A extensão desses problemas é descrita na Tabela 3.1. Os  idosos  são  mais  propensos  a  sofrer  um  declínio  geral  na  saúde  e  na  função  orgânica  devido  ao  aumento  da incidência  de  doenças  crônicas  propiciadas  pelo  avanço  da  idade.  Como  o  envelhecimento  também  traz  consigo redução na capacidade de manter a homeostasia, as doenças frequentemente se manifestam de maneira atípica. Por exemplo,  pode  ocorrer  infarto  do  miocárdio  sem  apresentação  de  dor  no  peito  ou  outros  sintomas.  É  comum  o desenvolvimento de septicemia sem febre, e um caso de pneumonia pode se apresentar com confusão mental, mas sem o sintoma prodrômico da tosse. Além  de  doenças  crônicas,  os  idosos  sofrem  desproporcionalmente  de  incapacidade  funcional,  ou  seja, incapacidade  de  realizar  AVD  necessárias.  É  provável  que  os  decréscimos  na  saúde  possíveis  de  acompanhar  o processo  de  envelhecimento  sejam  responsáveis  por  essa  incapacidade  funcional.  Dentre  os  problemas  funcionais mais comuns em idosos, destacam­se incontinência urinária, instabilidade e quedas, deficiência sensorial, além de depressão e déficit cognitivo.

Avaliação funcional A  avaliação  das  habilidades  funcionais  do  idoso  é  um  componente  importante  dos  cuidados  de  saúde gerontológicos.  O  diagnóstico  clínico  por  si  só  é  incompleto  sem  a  avaliação  da  função.  Dois  idosos  com diagnóstico  clínico  semelhante  de  artrite,  hipertensão  e  osteoporose,  por  exemplo,  podem  estar  em  extremos opostos do espectro de habilidades funcionais. Tabela 3.1

Problemas de saúde comuns em idosos.

Problema de saúde

Porcentagem afetada

Hipertensão

56%

Artrite

50%

Doença cardíaca

Qualquer câncer

32%

VENDEDOR [email protected] http://lista.mercadolivre.com.br/_CustId_161477952

Diabetes

23%

19%

Dados  do  Federal  Interagency  Forum  on Aging­Related  Statistics.  (Julho  de  2010).  Older Americans  2010:  Key  Indicators  of Well­Being. Federal Interagency Forum on Aging­Related Statistics. Washington, DC: Imprensa oficial dos EUA.

A  avaliação  do  estado  funcional  pode  ser  feita  de  diferentes  maneiras  com  uma  variedade  de  métodos.  As medidas  da  funcionalidade  devem  tentar  de  modo  sistemático  e  objetivo  avaliar  o  nível  em  que  o  indivíduo  se mostra funcional em diferentes áreas, incluindo biologia, psicologia e saúde social. A  seleção  de  uma  ferramenta  de  triagem  para  aferir  a  capacidade  funcional  depende  da  finalidade  da  coleta  de dados,  do  indivíduo  ou  população­alvo  a  ser  avaliada,  da  disponibilidade  e  aplicabilidade  dos  instrumentos,  da confiabilidade  e  validade  destes  e  do  cenário  ou  ambiente. Ao  avaliar  a  função,  surge  a  questão  da  capacidade  em relação  ao  desempenho.  Por  exemplo,  um  indivíduo  idoso  pode  ser  capaz  de  tomar  banho  sem  supervisão;  no entanto,  a  instituição  de  cuidados  a  longo  prazo  onde  ele  reside  pode  desencorajá­lo  por  motivos  de  segurança. Entre os instrumentos de avaliação mais utilizados estão aqueles que medem a capacidade de realização de AVD e a função cognitiva do paciente. Ao  avaliar  os  níveis  de  funcionalidade,  deve  ser  incluída  a  determinação  da  capacidade  do  idoso  para  realizar AVD e atividades instrumentais da vida diária (AIVD). AVD são tarefas básicas de autocuidado, como tomar banho, vestir­se,  cuidar  da  própria  higiene,  deambulação,  mobilidade  (p.  ex.,  de  uma  cadeira  para  a  cama),  alimentação  e comunicação.  AIVD  são  tarefas  mais  complexas  necessárias  para  o  desempenho  em  sociedade,  como  escrita, leitura,  capacidade  de  cozinhar,  limpar,  fazer  compras,  lavar  roupa,  subir  escadas,  usar  o  telefone,  administrar  as finanças,  usar  medicamentos  e  meios  de  transporte.  As  AIVD  podem  aferir  de  maneira  indireta  as  capacidades cognitivas, mesmo porque exigem certo nível de habilidade cognitiva para que sejam concluídas. Várias  ferramentas  estão  disponíveis  para  medir  o  estado  funcional.  Uma  das  mais  comumente  utilizadas  é  o Índice  de Atividades  de  Vida  Diária  [também  conhecido  com  Índice  de  Katz].  Desenvolvido  por  Katz  em  1963  e revisto em 1970, resume o desempenho em seis funções: • Banhar­se

• Vestir­se • Usar o toalete • Mover­se • Manter a continência • Alimentar­se. Esse  índice  é  usado  como  ferramenta  de  avaliação  para  determinar  a  necessidade  de  cuidados  e  a  adequação  do tratamento  e  como  orientação  no  contexto  de  reabilitação.  Por  meio  de  questionamento  e  observação,  o  avaliador desenvolve uma imagem mental do estado funcional do idoso como se encontrava nas 2 semanas que antecederam a avaliação,  utilizando  o  grau  mais  dependente  de  desempenho.58,59  Numerosos  estudos  utilizando  o  Índice  de  Katz como ferramenta de avaliação demonstram sua validade e confiabilidade significativas. A vantagem desse índice é sua facilidade em realizar e fornecer um “instantâneo” do nível de funcionamento físico do idoso. A desvantagem é que não inclui categorias de AIVD igualmente importantes, especialmente para idosos que vivem em comunidade. A  escala  de  Lawton  para  atividades  instrumentais  de  vida  diária  (AIVD)  avalia  as  habilidades  necessárias  para  a vida independente. Esta escala reflete o nível atual de funcionalidade do indivíduo e pode ser usada para identificar novas deficiências e fornecer uma avaliação mais aprofundada de idosos vulneráveis. 60 São medidos oito domínios de função: • Usar o telefone

• Fazer compras • Preparar refeições • Desempenhar tarefas domésticas • Lavar roupas

• Usar meios de transporte • Manusear a própria medicação • Lidar com as finanças.

Incontinência urinária A incontinência urinária, ou perda involuntária de urina, assola mais de 30% dos indivíduos com mais de 60 anos de idade que vivem em comunidade e de 60 a 80% dos residentes em instalações de cuidados a longo prazo.6 Essas estimativas podem não revelar toda a extensão do problema, porque muitas vezes o indivíduo não consegue relatar os  sintomas  de  incontinência  urinária,  talvez  pelo  estigma  social  associado.  Frequentemente,  os  profissionais  de saúde também negligenciam essa informação. A  incontinência  é  um  problema  dispendioso.  Uma  estimativa  conservadora  dos  custos  de  atendimento  direto  de adultos  com  incontinência  é  de  mais  de  19,5  bilhões  de  dólares  anualmente.61  A  incontinência  urinária  pode  ter consequências  deletérias,  como  isolamento  social  e  constrangimento,  depressão  e  dependência,  além  de  causar erupções  cutâneas  e  úlceras  de  pressão,  bem  como  dificuldades  financeiras.  Embora  a  incontinência  urinária  seja uma condição comum, não é considerada um aspecto normal do envelhecimento. Adultos com incontinência urinária podem ser tratados com sucesso e mesmo curados.62–64

Etiologia e patogênese As alterações no ciclo miccional que acompanham o processo de envelhecimento tornam o idoso mais propenso a desenvolver incontinência urinária. A diminuição da capacidade vesical, do tônus da bexiga e do esfíncter vesical e a  perda  da  capacidade  de  inibir  as  contrações  do  detrusor  (músculo  da  bexiga),  combinadas  com  o  aumento  da variabilidade  do  sistema  nervoso  para  interpretar  os  sinais  da  bexiga,  podem  provocar  incontinência.  O comprometimento da mobilidade e o tempo de reação mais lento também podem agravar a incontinência.6 As causas de incontinência são divididas em duas categorias: transitórias e crônicas. Tem importância particular o papel de produtos farmacêuticos como causa de incontinência urinária transitória. Diversos medicamentos, como sedativos e hipnóticos de ação prolongada, psicotrópicos e diuréticos podem induzir à incontinência. A distensão do reto  como  resultado  de  impactação  fecal  estimula  contrações  involuntárias  da  bexiga.  Cistite  aguda  ou  poliúria causada por hiperglicemia ou hipercalcemia podem precipitar incontinência.6 O tratamento da incontinência urinária transitória visa amenizar ou aliviar a causa, pressupondo que a incontinência desaparecerá. A incontinência urinária crônica ou estabelecida decorre da falha de armazenamento da bexiga ou incapacidade de verter urina. O problema no armazenamento de urina resulta de hiperatividade do músculo detrusor, com contrações inadequadas da bexiga (incontinência de urgência). Ocorre incapacidade de postergar o esvaziamento depois que se tem a percepção de bexiga cheia. A incontinência de urgência tipicamente se caracteriza por episódios de escape de grande  volume  de  urina,  diversas  vezes  ao  dia. A  incompetência  uretral  (incontinência  de  esforço)  também  causa um problema de armazenamento da bexiga. A pressão no interior da bexiga supera a resistência da uretra e resulta em  perda  de  urina. A  incontinência  de  esforço  provoca  perda  involuntária  de  pequenas  quantidades  de  urina  com atividades que aumentam a pressão intra­abdominal, como tossir, espirrar, rir ou se exercitar.6,63,65 A  incapacidade  de  verter  urina  dá­se  devido  a  uma  instabilidade  do  detrusor,  que  resulta  na  retenção  de  urina  e incontinência por transbordamento. Também chamado de incontinência neurogênica, este tipo de incontinência pode ser  observado  em  associação  a  danos  neurológicos,  resultantes  de  doenças  como  diabetes  melito  e  lesão raquimedular. A  obstrução  da  saída  de  urina,  como  acontece  em  casos  de  aumento  da  próstata  e  estenose  uretral, também pode causar retenção urinária com incontinência por transbordamento. A incontinência funcional, ou escape de urina devido a problemas para usar o vaso sanitário, deve­se a barreiras físicas, cognitivas ou ambientais.6,66

Tratamento Depois  de  estabelecido  o  diagnóstico  específico  de  incontinência  urinária,  o  tratamento  é  destinado  a  corrigir  ou amenizar o problema. Provavelmente, as intervenções mais eficazes para os idosos com incontinência são técnicas comportamentais.  Estas  estratégias  envolvem  a  educação  do  indivíduo  e  a  oferta  de  incentivo  para  o  esforço  e  o progresso. As  técnicas  incluem  treinamento  da  bexiga,  micção  programada  ou  treinamento  de  hábito,  indução  da micção,  exercícios  para  a  musculatura  do  assoalho  pélvico  (exercícios  de  Kegel)  e  modificações  na  dieta.6,65  O

biofeedback,  técnica  de  treinamento  para  ensinar  exercícios  de  fortalecimento  do  assoalho  pélvico,  utiliza  um equipamento  computadorizado  para  transmitir  informações  ao  indivíduo  sobre  suas  funções  fisiológicas.  As técnicas  de  biofeedback  podem  ser  úteis  quando  empregadas  juntamente  com  outras  técnicas  comportamentais  de tratamento.6 O uso de fraldas e absorventes deve ser encarado como medida temporária e não como cura. Diversos tipos de produtos estão disponíveis para atender a diferentes necessidades dos consumidores. Em  alguns  casos,  a  intervenção  farmacológica  pode  ser  útil.  A  terapia  de  reposição  de  estrogênio  oral  em mulheres na pós­menopausa não é mais recomendada como método de tratamento, em função dos relatos de efeitos colaterais  cardiovasculares  e  câncer  associados  ao  uso  de  produtos  à  base  de  estrogênio.  No  entanto,  formulações tópicas de estrogênio em baixas doses são eficazes na diminuição da incontinência de urgência e, em menor grau, da incontinência  por  estresse.6,65  Medicamentos  antimuscarínicos  (p.  ex.,  oxibutinina,  tolterodina,  darifenacina)  são aprovados  para  uso  em  casos  de  bexiga  hiperativa  e  incontinência  de  urgência.  Seus  efeitos  colaterais anticolinérgicos,  como  boca  seca,  constipação  intestinal  e  potencial  para  efeitos  secundários  no  sistema  nervoso central,  tornam  necessário  pesar  os  riscos  e  os  benefícios  que,  na  melhor  das  hipóteses,  são  limitados.  A duloxetina,  um  inibidor  da  recaptação  da  serotonina  e  norepinefrina,  tem  sido  estudada  para  o  tratamento  da incontinência  urinária  de  esforço.  Essa  substância  aumenta  o  tônus  α­adrenérgico  para  a  uretra,  mas  não  foi aprovada para esta indicação nos EUA.6,65,67 Uma intervenção cirúrgica pode ajudar a aliviar os sintomas de incontinência urinária em pacientes selecionados. A  suspensão  do  colo  da  bexiga  pode  ajudar  nos  casos  de  incontinência  urinária  de  esforço,  que  não  melhora  com outras  intervenções,  e  a  prostatectomia  pode  ser  adequada  para  homens  com  incontinência  por  transbordamento devido  a  um  aumento  da  próstata.  Opções  cirúrgicas  minimamente  invasivas  incluem  o  implante  de  slings  e  de esfíncter urinário artificial.6,63,65 Alguns idosos podem apresentar problemas de saúde que impeçam a realização de um procedimento cirúrgico. Outros  tratamentos  para  a  incontinência  de  esforço  incluem  o  uso  de  dispositivos,  como  a  inserção  de  um pessário, que fornece suporte ao prolapso de órgãos pélvicos, e a injeção de agentes preenchedores uretrais, como silicone ou colágeno.63,65,67 Casos de bexiga hiperativa com incontinência de urgência podem ser tratados com um dispositivo de neuromodulação sacral ou injeções de toxina botulínica A na bexiga. O autocateterismo intermitente é utilizado em alguns tipos de incontinência de transbordamento.65,67

Instabilidade e quedas Marcha instável e quedas são uma fonte comum de preocupação para a população de idosos. A literatura revela que, anualmente, 30% dos indivíduos com mais de 65 anos de idade que vivem em comunidade e 50% dos residentes de casas de repouso para idosos sofrem quedas. A maioria das quedas não resulta em lesões graves, mas o potencial para complicações mais graves e até a morte é real. Os acidentes são a quinta maior causa de morte entre os idosos, com as quedas ficando em primeiro lugar nesta categoria. O custo estimado das quedas entre idosos que utilizam o sistema de saúde dos EUA ultrapassava 19 bilhões de dólares no ano 2000. d Projeta­se um crescimento desse valor para 54,9 bilhões de dólares até o ano 2020.68 A  maneira  como  o  indivíduo  cai  frequentemente  determina  o  tipo  de  lesão  que  sofre.  Fraturas  de  punho  são comuns e refletem a tentativa de sustentar o corpo em uma queda para frente ou para trás com a mão estendida. As fraturas de quadril podem resultar de uma queda em calçadas e representam uma das complicações mais temidas de uma  queda. As  fraturas  de  quadril  predominam  na  faixa  etária  de  75  anos  ou  mais.  Uma  fratura  de  quadril  leva  a morbidade significativa. Os dados da literatura variam, mas, em 50% dos casos em que um idoso sofre uma fratura de quadril, ele nunca recupera a capacidade de caminhar de modo independente, e até 20% morrem no intervalo de 1 ano  após  a  fratura  de  quadril.62  O  problema  de  quedas  na  população  idosa  é  uma  questão  de  alta  incidência combinada  com  elevado  potencial  de  danos,  devido  à  alta  prevalência  de  problemas  de  saúde,  juntamente  com alterações  fisiológicas  acarretadas  pelo  avanço  da  idade. Além  disso,  a  recuperação  de  uma  lesão  relacionada  com queda pode ser demorada e resultar em problemas de condicionamento físico, fraqueza e anormalidade na marcha, potencializando ainda mais o risco de quedas subsequentes.62 A  atividade  do  idoso  pode  ser  restringida  por  medo do próprio idoso ou do seu cuidador quanto à possibilidade de outras quedas. Essa ansiedade pode levar a restrições desnecessárias  na  independência  e  mobilidade  e  geralmente  é  mencionada  como  o  motivo  principal  para institucionalização.69

Fatores de risco Embora  algumas  quedas  tenham  uma  única  causa  óbvia,  como  um  escorregão  em  uma  superfície  molhada,  a maioria  resulta  de  diversos  fatores.  Os  fatores  de  risco  que  predispõem  à  queda  incluem  uma  combinação  de alterações biopsicossociais relacionadas com idade, doenças crônicas e perigos situacionais e ambientais. A  Tabela 3.2 resume as possíveis causas de quedas. A marcha e a estabilidade exigem a integração de informações dos sentidos especiais, sistema nervoso e sistema musculoesquelético. As  alterações  na  marcha  e  postura  em  idosos  saudáveis  também  contribuem  para  o  problema de quedas. A passada do idoso é mais curta; os cotovelos, tronco e joelhos ficam mais flexionados; a elevação dos dedos  do  pé  e  do  calcanhar  diminui  ao  caminhar,  e  o  balanço  do  corpo  aumenta. A  força  muscular  e  o  controle postural  diminuem,  a  entrada  de  dados  de  propriocepção  diminui  e  os  reflexos  posturais  ficam  mais  lentos.6,70–72 Como o sistema nervoso central integra as informações sensoriais e envia sinais para os componentes efetores do sistema musculoesquelético, qualquer alteração na função neural é capaz de aumentar a predisposição a quedas. Por esta razão, quedas têm sido associadas a AVC, doença de Parkinson e hidrocefalia de pressão normal. Do mesmo modo,  as  doenças  ou  deficiências  que  afetam  o  sistema  musculoesquelético,  como  artrite,  fraqueza  muscular  ou deformidades dos pés, estão relacionadas com o aumento na incidência de quedas.6,73,74 Alterações  relativas  à  idade  e  a  doenças  da  visão  e  da  audição  podem  comprometer  os  dados  enviados  pelos sentidos, aumentando o risco de quedas.75,76 As alterações do sistema vestibular, como vertigem posicional benigna ou doença de Ménière, causam problemas de equilíbrio que tendem a resultar em quedas. Informações provenientes dos  sistemas  cardiovascular  e  respiratório  influenciam  a  função  e  a  deambulação.  Síncope,  um  tipo  de  tontura,  é uma hipoperfusão cerebral global transitória decorrente de sintomas cardiovasculares. A síncope ocorre de maneira muito  rápida  e,  geralmente,  resulta  em  queda.  Síncope  é  comum  entre  os  idosos.31  Condições  que  causam comprometimento  cognitivo  como  a  demência  têm  sido  associadas  a  maior  risco  de  quedas,  provavelmente  por causa da dificuldade de raciocínio e de resolução de problemas.74 Tabela 3.2

Fatores de risco para quedas.

Categoria do fator de risco

Exemplos

Acidentes e perigos ambientais

Escorregões, viagens Obstáculos, cordões, tapetes

Alterações funcionais relacionadas com a idade

Diminuição da força muscular, tempo de reação mais lento, diminuição da propriocepção,

re䰬exo postural prejudicado, aumento da oscilação postural, alteração da marcha,

comprometimento da visão e audição

Doenças cardiovasculares

Estenose aórtica, arritmias cardíacas, disfunção do sistema nervoso autônomo, hipovolemia,

hipotensão ortostática, síncope do seio carotídeo, insu䶦ciência vertebrobasilar

Distúrbios gastrintestinais

Diarreia, síncope pós-prandial, resposta vasovagal

Distúrbios geniturinários

Incontinência urinária, urgência urinária/frequência, nictúria

Uso de medicamentos

Álcool, anti-hipertensivos, medicamentos cardíacos, diuréticos, narcóticos, hipoglicemiantes

orais, medicamentos psicotrópicos, interações medicamentosas, polifarmácia

Distúrbios metabólicos

Anemia, desidratação, desequilíbrio eletrolítico, hipotireoidismo

Distúrbios musculoesqueléticos

Osteoartrite, artrite reumatoide, miopatia

Transtornos neurológicos

Transtornos do equilíbrio/marcha, disfunção cerebelar, AVC com efeitos residuais, espondilose

cervical, lesões do SNC, delirium, demência, hidrocefalia de pressão normal, neuropatia

periférica, doença de Parkinson, epilepsia, ataque isquêmico transitório

Tempo prolongado no leito

Hipovolemia, fraqueza muscular por desuso e falta de condicionamento

Doenças respiratórias

Hipoxia, pneumonia

Medicamentos são uma causa importante e potencialmente reversível de instabilidade e quedas. Medicamentos de ação central, como sedativos e hipnóticos, têm sido associados ao aumento do risco de quedas e lesões. Diuréticos podem  causar  depleção  de  volume,  distúrbios  eletrolíticos  e  fadiga,  predispondo  a  quedas.  Medicamentos  anti­

hipertensivos  podem  causar  fadiga,  hipotensão  ortostática  e  comprometer  o  estado  de  vigília,  contribuindo  para  o risco de quedas.6,70 Riscos ambientais desempenham um papel significativo na possibilidade de quedas. A maioria das quedas ocorre em casa e muitas vezes envolve objetos no chão, que fazem o indivíduo tropeçar, como cordas, tapetes e pequenos itens.  Má  iluminação,  sapatos  mal  ajustados,  superfícies  com  brilho  e  o  uso  indevido  de  dispositivos  de deambulação, como bengalas ou andadores, também contribuem para o problema.70,72

A segunda queda da Sra. Maria ocorreu durante a noite, quando ela teve um episódio de urgência urinária. Ela foi correndo

descalça para o banheiro com pouca iluminação e escorregou no tapete.

Prevenção de quedas A  prevenção  de  quedas  é  fundamental  para  controlar  as  possíveis  complicações  que  podem  resultar  delas.  Como diversos fatores contribuem para a queda, o objetivo da avaliação clínica é identificar fatores de risco possíveis de serem  modificados. A  avaliação  dos  sistemas  sensorial,  neurológico  e  musculoesquelético,  a  observação  direta  da marcha  e  do  equilíbrio  e  um  inventário  cuidadoso  da  medicação  podem  ajudar  a  identificar  possíveis  causas. As medidas  preventivas  incluem  uma  variedade  de  intervenções,  como  cirurgia  de  catarata  ou  remoção  de  cerume  no caso de deficiência auditiva relacionada com o acúmulo excessivo de cera nos ouvidos.6 Outras intervenções podem abranger  cuidados  especializados  com  os  pés,  interrupção  ou  alteração  do  regime  de  medicação,  programas  de exercícios,  fisioterapia  e  dispositivos  adaptativos  apropriados.71  O  ambiente  doméstico  também  deve  ser  avaliado por  um  profissional  de  saúde  (p.  ex.,  terapeuta  ocupacional)  para  fazer  recomendações  sobre  as  modificações necessárias à promoção da segurança. Alterações simples, como a retirada de tapetes, a melhoria da iluminação e a instalação de barras de apoio podem ajudar a evitar quedas.72 O  uso  de  protetores  externos  acolchoados  para  os  quadris,  no  caso  de  idosos  de  alto  risco,  tem  demonstrado redução  significativa  no  número  de  fraturas  de  quadril  ocorridas  após  uma  queda. A  força  de  impacto  e  a  energia liberada pela queda são enfraquecidas e desviadas da região do trocanter maior pelo uso do protetor de quadril. Os maiores benefícios são observados entre a população de idosos residente em instalações de cuidados a longo prazo. A adesão ao dispositivo, no entanto, pode ser complicada, porque o indivíduo pode se mostrar relutante em usar o protetor acolchoado.74,77 A suplementação de vitamina D também tem mostrado resultados promissores e pode ter um  papel  independente  na  prevenção  de  quedas. Acredita­se  que  o  uso  de  suplementos  de  vitamina  D  melhore  a força  e  o  desempenho  muscular  dinâmico,  reduzindo,  assim,  o  risco  de  quedas.78  Um  exame  recente  de  revisões sistemáticas e meta­análises sobre a suplementação de vitamina D para prevenção de fraturas de quadril revelou um efeito benéfico com a administração de altas doses de vitamina D combinada com suplemento de cálcio.77

Comprometimento sensorial Apesar de as deficiências sensoriais não serem eminentemente fatais, seu impacto na saúde pode ser substancial. A deficiência  auditiva  está  associada  a  diminuição  da  qualidade  de  vida,  depressão,  isolamento  e  demência.  A deficiência  visual  está  relacionada  com  aumento  do  risco  de  quedas,  fraturas  de  quadril,  incapacidade  física  e depressão. Idosos com deficiência visual residentes de casas de repouso apresentam maior propensão à necessidade de ajuda para o desempenho das AVD e podem estar em risco de quedas e fraturas do quadril. A deficiência visual também parece aumentar taxas de mortalidade.39,41,75,79 A  deficiência  sensorial  resulta  não  apenas  de  déficits  nas  estruturas  sensoriais  periféricas,  mas  também  no processamento  de  informação  sensorial.  A  dificuldade  do  indivíduo  idoso  para  processar  informação multissensorial é observada mais intensamente quando ocorre uma variação rápida na natureza da informação que é recebida a partir do meio ambiente.76 A  falta  de  informação  sensorial  pode  predispor  a  sintomas  psicológicos. A  síndrome  de  Charles  Bonnet  é  uma doença  orgânica  que  acomete  idosos  e  se  caracteriza  por  alucinações  visuais  complexas.  Está  relacionada  com doença ocular e, a rigor, é observada em idosos com a função intelectual preservada.80,81 Aqueles que têm  insights sobre o problema geralmente só precisam de garantias de que suas alucinações não representam doença mental. Para aqueles  com  conhecimento  limitado,  mas  angustiados  com  esse  sintoma,  o  uso  de  antipsicóticos  pode  trazer  certo

alívio.81  Tanto  deficiências  auditivas  como  visuais  têm  possivelmente  efeitos  psicológicos  importantes  em associação  a  demência.  Ideias  delirantes  têm  sido  associadas  à  deficiência  auditiva.82  No  entanto,  uma  recente revisão  sistemática  de  estudos  de  coorte  com  foco  sobre  a  psicose  de  manifestação  tardia  demonstrou  que  a deficiência visual é um fator de risco importante.83

Depressão A depressão é um problema de saúde importante que afeta a população idosa. É o transtorno psiquiátrico geriátrico mais  comum. As  estimativas  da  prevalência  de  depressão  em  idosos  são  muito  variáveis.  No  entanto,  existe  um consenso de que o tamanho do problema é subestimado, devido a erros de diagnóstico e de tratamento. Acredita­se que até 25% dos idosos que vivem em comunidade apresentem sintomas depressivos. A estimativa cai para cerca de 1  a  2%  quando  o  diagnóstico  é  restrito  à  depressão  maior.84,85  Os  sintomas  depressivos  são  mais  comuns  em residentes de casas de repouso.85,86

Manifestações clínicas e diagnóstico O termo depressão  é  empregado  para  descrever  um  sintoma,  a  síndrome  ou  a  doença.  Conforme  consta  na  quarta edição  do  Diagnostic  and  Statistical  Manual  of  Mental  Disorders  (DSM­IV­TR)  da  American  Psychiatric Association,  os  critérios  para  diagnóstico  e  tratamento  de  depressão  maior  devem  incluir  pelo  menos  cinco  dos seguintes  sintomas  durante  o  mesmo  período  de  2  semanas,  com  no  mínimo  um  dos  sintomas  sendo  humor deprimido ou anedonia (ou seja, perda de interesse ou prazer): • Humor deprimido ou irritável

• Perda de interesse ou prazer nas atividades habituais • Alterações de apetite e de peso • Perturbação do sono • Agitação ou retardo psicomotor • Fadiga e perda de energia • Sentimentos de inutilidade, autorrecriminação ou culpa excessiva • Redução na capacidade de raciocínio ou concentração • Ideação, planejamento ou tentativa de suicídio.87 Os  sintomas  depressivos  podem  ser  atribuídos  incorretamente  ao  processo  de  envelhecimento,  dificultando  o reconhecimento e o diagnóstico. O humor deprimido, principal sintoma da depressão, pode ser menos proeminente em idosos, com mais relatos de queixas somáticas e aumento da ansiedade, confundindo o diagnóstico.85 Sintomas de  comprometimento  cognitivo  podem  ser  observados  em  idosos  deprimidos.  Embora  seja  necessária  uma investigação  completa  para  verificar  se  os  sintomas  são  resultado  de  depressão  ou  demência,  as  evidências  mais recentes mostram que a depressão pode ser um sintoma prodrômico de demência.85,88 Doenças físicas também podem complicar o diagnóstico. A depressão pode ser sintoma de uma condição clínica, como câncer de pâncreas; hipotireoidismo ou hipertireoidismo; pneumonia e outras infecções; insuficiência cardíaca congestiva,  demência  e  AVC. 85,88,89  Na  verdade,  depressão  maior  é  uma  consequência  comum  de  AVC  e  se manifesta em aproximadamente um terço dos indivíduos com AVC isquêmico. 90,91 Medicamentos como sedativos, hipnóticos, esteroides, anti­hipertensivos e analgésicos também podem induzir um estado depressivo.88 Numerosos problemas  sociais,  como  luto,  perda  de  emprego  ou  renda  e  perda  de  suporte  social,  podem  contribuir  para  o estabelecimento do diagnóstico.85,92

A 䶦lha da Sra. Maria demonstra preocupação com o estado emocional da mãe. Desde que se mudou, ela tem se mostrado

retraída e não participa de atividades que costumava desfrutar, como fazer crochê. Ela não manifestou qualquer interesse em

visitar o centro de idosos, como modo de se socializar, e não come nada além do que é oferecido durante as refeições. Beth ouve

sua mãe tarde da noite assistindo à televisão, aparentemente incapaz de adormecer. Embora tenha sido submetida a um exame

físico completo e testes de laboratório, a Sra. Maria ainda reclama de “simplesmente não estar se sentindo bem”.

O curso da depressão em idosos é semelhante ao de indivíduos mais novos. Sofrem recorrência até 40% dos que têm  uma  primeira  crise. As  taxas  de  suicídio  são  maiores  entre  os  idosos.  Ocorre  um  aumento  linear  no  suicídio com  o  avançar  da  idade,  principalmente  entre  homens  brancos  com  mais  de  65  anos.  As  razões  exatas  não  são conhecidas.  Os  fatores  de  previsão  incluem  depressão,  doenças  físicas  e  invalidez,  perda  de  um  cônjuge  e isolamento social.93–95 Como  o  diagnóstico  de  depressão  pode  ser  difícil,  o  uso  de  uma  ferramenta  de  triagem  talvez  ajude  a  medir  o funcionamento  afetivo  objetivamente.  A  Escala  de  Depressão  Geriátrica,  um  instrumento  de  confiabilidade  e validade  conhecidas,  foi  desenvolvida  para  medir  a  depressão  especificamente  na  população  idosa  não institucionalizada. A escala dicotômica com 30 itens fornece informações sobre temas relevantes para sintomas de depressão  entre  idosos,  como  perda  de  memória  e  ansiedade.96,97  Existem  muitas  outras  ferramentas  de  triagem, cada uma com suas próprias vantagens e desvantagens, para avaliar o nível de funcionamento psicológico do idoso, em sua totalidade ou em componentes funcionais específicos.

A pontuação da Sra. Maria na Escala de Depressão Geriátrica indica depressão. O luto pela perda de seu esposo e o isolamento

social foram os dois grandes fatores de risco.

Tratamento Os  objetivos  do  tratamento  para  idosos  com  depressão  são  reduzir  os  sintomas,  melhorar  a  qualidade  de  vida, diminuir o risco de recorrência, melhorar o estado de saúde, reduzir os custos de saúde e a mortalidade. Tratamento farmacológico. A farmacoterapia (ou uso de antidepressivos) é um método de tratamento efetivo para o idoso deprimido. A seleção de determinado medicamento depende de uma série de fatores, como resposta positiva ou  negativa  anterior,  histórico  de  parentes  de  primeiro  grau  que  respondem  à  medicação,  condições  clínicas simultâneas  que  possam  interferir  no  uso  de  medicamentos,  uso  concomitante  de  medicamentos  de  outras  classes que possam alterar o metabolismo ou aumentar o perfil de efeitos secundários, probabilidade de adesão, preferência do paciente e custo. Os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), uma classe de antidepressivos (p. ex.,  sertralina,  citalopram,  escitalopram),  têm  especificidade  elevada,  bloqueando  ou  reduzindo  a  recaptação  da serotonina,  sem  antagonismo  aos  receptores  de  neurotransmissores  ou  efeitos  cardíacos  diretos.  Por  isso, representam  uma  primeira  escolha  atraente  para  a  farmacoterapia. A  dosagem  normalmente  é  de  um  comprimido por dia, o que facilita a administração. Eles também são menos letais em caso de superdosagem que outros tipos de antidepressivos,  como  os  antidepressivos  tricíclicos,  uma  consideração  importante  devido  à  alta  taxa  de  suicídio entre  idosos.  Os  efeitos  colaterais  anticolinérgicos  e  cardiovasculares,  capazes  de  representar  um  problema  com  o uso  de  antidepressivos  tricíclicos  (p.  ex.,  nortriptilina,  desipramina,  amitriptilina)  são  mínimos  com  os  ISRS. Antidepressivos atípicos (p. ex., bupropiona, mirtazapina) e inibidores da recaptação de serotonina e norepinefrina (IRSN) (p. ex., venlafaxina, duloxetina) começam a ter um papel no tratamento da depressão que se manifesta no fim  da  vida.  Com  eficácia  similar  à  dos  ISRS,  o  médico  pode  selecionar  uma  dessas  substâncias  tanto  por  suas qualidades antidepressivas como pelas propriedades associadas aos efeitos colaterais. Por exemplo, a mirtazapina –, um antidepressivo que associa sedação e aumento do apetite – seria apropriada para o tratamento de um idoso com depressão,  falta  de  apetite  e  insônia.  Independentemente  da  classificação,  medicamentos  psicotrópicos  devem  ser inicialmente  administrados  em  doses  baixas,  tituladas  gradualmente  de  acordo  com  a  resposta  e  os  efeitos colaterais. A  resposta  aos  antidepressivos  normalmente  requer  de  4  a  6  semanas  em  doses  terapêuticas.  Para  um único  episódio  de  depressão  maior,  o  tratamento  medicamentoso  geralmente  deve  ser  mantido  por  um  período mínimo  de  6  meses  a  1  ano,  com  a  mesma  dose  com  a  qual  foi  possível  alcançar  remissão,  e  2  a  5  anos,  para depressão recorrente, a fim de evitar recidiva.98–101 Terapia  eletroconvulsiva.  A  terapia  eletroconvulsiva  (TEC)  pode  ser  o  tratamento  de  escolha  para  idosos  com episódios graves de depressão maior, refratários à terapia com medicamentos. Estudos indicam que indivíduos com mais  de  60  anos  de  idade  são  o  maior  grupo  de  pacientes  que  recebem TEC. Apesar  da  publicidade  negativa  que tem  sido  associada  ao  uso  de  TEC,  são  fortes  as  evidências  de  sua  eficácia  no  tratamento  da  depressão. Infelizmente,  é  comum  recidiva  após  TEC,  e  estão  sendo  empregadas  estratégias  de  tratamento  alternativas,

incluindo manutenção de TEC ou manutenção do uso de antidepressivos após TEC.102–104 Psicoterapia. A  “terapia  da  conversa”,  como  aconselhamento  de  apoio  ou  psicoterapia,  é  considerada  uma  parte importante do regime de tratamento, sozinha ou em combinação com tratamento farmacológico ou TEC. Alterações nos  papéis  sociais,  falta  de  suporte  e  doenças  crônicas  são  apenas  alguns  exemplos  de  mudanças  nos  eventos cotidianos  que  podem  requerer  apoio  psicológico  e  novas  habilidades  de  enfrentamento.  O  aconselhamento  para  a população  idosa  requer  considerações  especiais.  Indivíduos  com  comprometimento  significativo  da  visão,  audição ou  problemas  cognitivos  têm  direito  a  abordagens  especiais.  Muitos  idosos  não  se  veem  como  deprimidos  e rejeitam  o  encaminhamento  a  profissionais  de  saúde  mental.  São  necessários  esforços  especiais  para  conseguir  a adesão  desses  indivíduos  ao  tratamento.  A  terapia  cognitivo­comportamental  ensina  os  idosos  a  identificar  e desafiar pensamentos angustiantes e, em seguida, reformular o modo como percebem uma situação ou reagem a ela. Alguns  idosos  podem  preferir  este  tipo  de  terapia,  pois  é  mais  breve  e  de  duração  limitada,  em  comparação  com outras  terapias,  como  a  psicanálise.100,105,106  Embora  a  depressão  possa  impor  grandes  riscos  à  vida  dos  idosos, acredita­se  que  represente  o  transtorno  psiquiátrico  mais  tratável  no  fim  da  vida;  portanto,  merece  ser  buscada  e tratada com métodos de intervenção agressivos.

Demência A  demência  é  um  problema  complexo  e  devastador  e  representa  a  principal  causa  de  incapacidade  funcional, dependência e mortalidade entre a população de idosos.e As estimativas variam, mas indicam que a prevalência de demência nos EUA é de 5 a 10% em idosos, com o crescimento da taxa conforme a idade avança.107 Embora  possa  trazer  uma  redução  na  capacidade  intelectual,  a  demência,  anteriormente  denominada  senilidade, não  é  um  processo  associado  ao  envelhecimento  normal.  A  demência  é  uma  síndrome  de  deficiência  adquirida, persistente  em  diversos  domínios  da  função  intelectual,  incluindo  a  memória,  a  linguagem,  a  habilidade visuoespacial e a cognição (capacidade de abstração, cálculo, julgamento e resolução de problemas). As alterações cognitivas  são  suficientes  para  comprometer  o  funcionamento  social  e  profissional.  Transtornos  de  humor  e alterações na personalidade e no comportamento muitas vezes acompanham a deterioração intelectual.87

Etiologia e patogênese Demência  ou  disfunção  cognitiva  tem  como  resultado  diferentes  condições,  incluindo  doenças  degenerativas, vasculares,  neoplásicas,  desmielinizantes,  infecciosas,  inflamatórias,  tóxicas  metabólicas  e  transtornos psiquiátricos.  Acredita­se  que  até  70%  dos  idosos  com  demência  (4,5  milhões  de  americanos  e  15  milhões  de indivíduos  no  mundo  todo)  sejam  portadores  da  doença  de Alzheimer  (DA),  um  transtorno  neurológico  crônico  e progressivo de causa desconhecida. Podem ser observadas duas alterações microscópicas no cérebro de indivíduos com  DA:  placas  senis,  desenvolvidas  entre  os  neurônios,  e  emaranhados  neurofibrilares,  desenvolvidos  nos neurônios.  Pesquisadores  têm  especulado  que  a  inflamação  em  torno  das  placas  destrói  os  neurônios  vizinhos.  O envolvimento  dos  neurônios  colinérgicos  provoca  redução  nos  níveis  de  acetilcolina  nas  sinapses.  Os  níveis  de acetilcolinesterase também diminuem, talvez para compensar a perda de acetilcolina.108–110 A demência vascular é a segunda  doença  mais  comum,  e  os  fatores  de  risco  incluem  AVC  isquêmico,  AVC  hemorrágico,  hipertensão, hiperlipidemia, doença cardíaca, tabagismo e diabetes melito.111–113

Diagnóstico Atualmente, não existem testes específicos de diagnóstico para determinar a manifestação da DA. O diagnóstico é feito por exclusão de outras possíveis causas para os sintomas de demência. O único teste capaz de confirmar DA é o  exame  do  tecido  cerebral  na  necropsia.  Mais  recentemente,  a  realização  de  tomografia  por  emissão  de  pósitrons (PET) do cérebro com o uso de uma nova molécula radioativa tem demonstrado grande valor no diagnóstico de DA. A pesquisa mostrou que pode ajudar no diagnóstico diferencial, determinando padrões cerebrais regionais de placas amiloides e o emaranhado neurofibrilar de proteína tau.114 Um  método  comumente  utilizado  para  medir  a  função  cognitiva  é  o  Miniexame  do  Estado  Mental  (MEEM), desenvolvido por Folstein et al. em 1975.115 Esta ferramenta fornece uma breve medida objetiva do funcionamento cognitivo e tem sido amplamente utilizada. O MEEM, que pode ser administrado em 5 a 10 min, consiste em várias questões que abrangem memória, orientação, atenção e capacidade de construção. O teste vem sendo estudado e foi

considerado  capacitado  a  cumprir  com  o  objetivo  original,  isto  é,  fornecer  uma  breve  ferramenta  de  triagem  que quantifica  o  comprometimento  cognitivo  e  documenta  alterações  cognitivas  ao  longo  do  tempo.  No  entanto,  tem sido advertido que o exame não deve ser utilizado isoladamente como ferramenta diagnóstica para identificação de casos de demência.116

Tratamento Tratamento  farmacológico.  Diversos  medicamentos  tornaram­se  disponíveis  ao  longo  da  última  década  para ajudar  a  interromper  a  progressão  do  declínio  cognitivo  nos  casos  de  DA.  No  momento,  três  substâncias (donepezila, rivastigmina e galantamina) estão disponíveis na categoria terapêutica de agentes de reforço cognitivo. Os  três  medicamentos  são  inibidores  da  acetilcolinesterase,  cuja  ação  eleva  as  concentrações  de  acetilcolina  no córtex  cerebral,  diminuindo  a  degradação  da  acetilcolina  liberada  por  neurônios  ainda  intactos.  Os  medicamentos têm eficácia semelhante, mas variam no perfil de dosagem e efeitos colaterais. Embora todos os três tenham efeitos colaterais gastrintestinais (p. ex., náuseas, fezes moles), a donepezila parece causar sintomas mais leves e também tem o benefício de uma dose diária. Donepezila é o único agente aprovado para os estágios leve, moderado e grave da DA. Rivastigmina está disponível como um sistema transdérmico de 24 h. Embora ainda não exista cura para a demência,  inibidores  da  acetilcolinesterase  são  considerados  eficazes  como  medicamentos  antidemência  com  base na  melhora  observada  em  testes  cognitivos  padronizados,  bem  como  no  declínio  mais  lento  na  perda  da  função resultante do processo patológico. Existem pesquisas que sugerem vantagem ao se iniciar o uso de um inibidor de colinesterase o mais cedo possível, depois de estabelecido o diagnóstico de DA ainda leve. 117,118 Não existem fortes evidências  sugerindo  que  fármacos  de  reforço  cognitivo  sejam  benéficos  para  indivíduos  com  demência  vascular. No entanto, seria apropriado usá­los em casos nos quais DA esteja associada à demência vascular.118 A memantina, antagonista do receptor N­metil­D­aspartato (NMDA), de afinidade moderada e não competitivo, é um novo agente que demonstrou consistentemente a utilização segura e eficaz em casos de demência. O glutamato é um  neurotransmissor  que  potencialmente  provoca  superexcitação  dos  receptores  NMDA,  e  acredita­se  que  a liberação excessiva de glutamato contribua para o processo de neurodegeneração associado à DA. A memantina tem eficácia  clínica  conhecida  no  tratamento  de  pacientes  com  DA  entre  moderada  e  grave.  Não  foi  comprovada  sua eficácia no tratamento de DA leve. 119 A desaceleração do declínio cognitivo e funcional oferecida pelos inibidores da colinesterase e memantina diminui a sobrecarga imposta ao cuidador e prolonga o período em que um idoso com DA  pode  permanecer  vivendo  em  comunidade.  Outros  fármacos  neuroprotetores  que  podem  atrasar  o  início  ou  a progressão  da  DA  também  têm  despertado  o  interesse  da  comunidade  científica.  Acredita­se  que  medicamentos anti­inflamatórios não esteroides (AINE) diminuam a resposta inflamatória de mediadores inflamatórios liberados a partir de células nervosas danificadas ou em processo de degeneração, embora os resultados do estudo sejam pouco conclusivos.  Devido  a  essas  questões  genéricas  sobre  a  falta  de  eficácia,  combinadas  com  possíveis  efeitos colaterais (p. ex., toxicidade cardíaca, hemorragia), os medicamentos da classe AINE não são considerados como tratamento  padrão  para  DA.120,121  O  colesterol  promove  a  produção  de  ß­amiloide.  Substâncias  que  reduzem  a concentração  de  lipídios  como  as  estatinas  diminuem  o  colesterol  e  a  inflamação.  No  entanto,  até  o  momento,  o resultado dos estudos tem decepcionado, já que não mostra nenhum efeito protetor contra o declínio cognitivo.120,121 Acredita­se  que  suplementos  dietéticos  e  nutricionais  tenham  efeitos  benéficos  na  prevenção  de  DA  ou  no retardamento  da  progressão  da  doença. A  vitamina  E,  antioxidante,  pode  desempenhar  um  papel  na  prevenção  de DA.  Esta  vitamina,  que  é  lipossolúvel,  interage  com  a  membrana  celular,  retendo  radicais  livres  e  podendo interromper  as  reações  em  cadeia  que  danificam  as  células.  Embora  estudos  anteriores  tenham  apresentado resultados  promissores,  a  pesquisa  mais  recente  sobre  o  uso  a  longo  prazo  de  vitamina  E  não  demonstrou benefícios cognitivos entre aqueles com comprometimento cognitivo leve ou DA. É preciso pesquisar mais o papel da vitamina E na prevenção primária de demência.117,120,121 Ginkgo biloba, outra substância antioxidante, apresenta benefícios  clínicos  pouco  claros.  Uma  revisão  feita  pelo  Centro  Cochrane  determinou  que  as  evidências  que  dão suporte  ao  uso  de  G.  biloba  não  são  consistentes  ou  confiáveis.122  Concentrações  plasmáticas  elevadas  de homocisteína  têm  sido  consideradas  como  fator  de  risco  vascular  no  desenvolvimento  de  demência  e  podem  ser reduzidas com a suplementação de ácido fólico. Uma revisão sistemática recente que pesquisou o uso de vitaminas do complexo B na prevenção e no tratamento de DA e demência determinou que não havia evidência suficiente para apoiar a teoria de que o aumento da ingestão dietética ou suplementação de ácido fólico causasse impacto sobre o

declínio cognitivo.123 Tratamento  não  farmacológico.  Estudos  também  demonstram  que  certos  exercícios  mentais  podem  compensar algumas  das  possíveis  alterações  cognitivas  decorrentes  do  envelhecimento.  O  treinamento  cognitivo  utiliza estratégias para melhorar as funções cognitivas, como memória, atenção ou capacidade de resolução de problemas. O objetivo é manter ou aprimorar a função e compensar déficits cognitivos. Isso pode ser feito tanto por meio de abordagens de treinamento de memória quanto por intervenções cognitivas assistidas por computador.124 Da mesma maneira,  a  atividade  física,  como  exercícios  aeróbicos  ou  musculação,  tem  potencial  para  retardar  o  declínio funcional em indivíduos com DA e pode até mesmo ajudar a adiar o aparecimento de transtornos de demência. 125– 127

Em  casos  mais  avançados  de  demência,  assegurar  que  sejam  atendidas  as  necessidades  físicas  do  indivíduo, como higiene, funcionamento intestinal e vesical, segurança e nutrição, pode ajudar a impedir reações catastróficas. Proporcionar uma rotina consistente no ambiente familiar também auxilia no alívio do estresse. Compatibilizar as necessidades  cognitivas  dos  idosos,  evitando  tanto  a  falta  quanto  o  excesso  de  estímulos,  muitas  vezes  colabora para a prevenção de problemas comportamentais. O trabalho de Hall tem demonstrado resultados positivos no cuidado de idosos com DA.128 O modelo conceitual de  Hall,  de  limiar  de  estresse  progressivamente  reduzido  (PLST,  progressively  lowered  stress  threshold),  propõe que  a  capacidade  do  indivíduo  com  demência  de  tolerar  qualquer  tipo  de  estresse  diminui  progressivamente  à medida  que  a  doença  avança.  Sendo  assim,  as  intervenções  para  o  idoso  com  demência  devem  focalizar  na eliminação  e  prevenção  de  estressores  como  modo  de  evitar  comportamentos  disfuncionais.  Estes  estressores incluem fadiga, alterações na rotina, demandas excessivas, estimulação excessiva e estressores físicos. O trabalho de Hall com o modelo PLST mostrou que indivíduos com demência tendem a despertar menos à noite, usar menos sedativos  e  hipnóticos,  comer  melhor,  socializar­se  mais,  desempenhar  tarefas  de  alta  complexidade  e  ter  menos episódios  de  ansiedade,  agitação  e  outros  comportamentos  disfuncionais.  Trabalhos  posteriores  revelam  que cuidadores familiares treinados no emprego do modelo PLST melhoraram sua habilidade para cuidar de seus entes queridos com demência e reduziram o nível de estresse.128,129 A  gestão  de  idosos  com  DA  e  outras  demências  envolve  geralmente  assumir  uma  responsabilidade  crescente  e fornecer  cada  vez  mais  cuidados  ao  indivíduo  com  demência,  à  medida  que  a  doença  o  torna  incapaz.  O comprometimento  cognitivo  e  da  capacidade  de  julgar  podem  impedir  que  o  idoso  faça  escolhas  e  tome  decisões razoáveis,  ameaçando,  eventualmente,  seu  bem­estar  geral.  Os  familiares  muitas  vezes  assumem  a  tarefa monumental de cuidar de idosos com demência. Com o agravamento da situação, muitos idosos são realocados em instituições de cuidados a longo prazo.

Delirium É importante diferenciar demência de delirium, também conhecido como estado de confusão aguda. Delirium pode ocorrer em qualquer faixa etária. No entanto, os idosos, especialmente idosos com demência, têm maior propensão ao  estado  delirante. A  manifestação  de  delirium  no  indivíduo  demente  pode  ser  confundida  com  exacerbação  da demência e, consequentemente, ele não recebe o tratamento adequado.130,131 Até 70% dos casos de  delirium não são detectados.132 O  delirium  é  uma  condição  aguda  desenvolvida  ao  longo  de  um  período  que  varia  de  horas  a  dias  e  é frequentemente  observado  em  idosos  hospitalizados.  As  taxas  de  prevalência  variam  de  14  a  56%  dos  idosos hospitalizados,133  até  62%  dos  idosos  depois  de  um  procedimento  cirúrgico  e  87%  dos  indivíduos  mantidos  sob cuidados intensivos.130 De acordo com DSM­IV­TR, delirium é definido como uma síndrome mental orgânica que apresenta déficit cognitivo global, transtornos de atenção, redução do nível de consciência, aumento ou diminuição da  atividade  psicomotora  e  desorganização  do  ciclo  sono­vigília.87  A  gravidade  dos  sintomas  tende  a  flutuar  de modo imprevisível, mas muitas vezes é mais acentuada no final da tarde ou começo da noite.130

Você lembra que a 䶦lha da Sra. Maria contou que sua mãe estava muito confusa havia 4 meses, enquanto era tratada da

pneumonia? Este é um exemplo de delirium. A combinação de infecção, desidratação, ambiente desconhecido, alto nível de ruído

e luzes brilhantes no departamento de emergência sobrecarregou os mecanismos de compensação da Sra. Maria, o que resultou

em um estado de desequilíbrio.

Ao  contrário  de  demência,  o  delirium  tem  um  início  rápido.  Deve  ser  considerado  emergência  médica,  porque pode  apresentar  as  características  de  uma  enfermidade  física  e  manifestar­se  com  doenças  como  infarto  do miocárdio, pneumonia e outras infecções, câncer e hipotireoidismo. Indivíduos com intoxicação por medicamentos também  podem  apresentar  delirium.  Desnutrição,  uso  de  medidas  físicas  de  contenção  e  eventos  iatrogênicos também podem precipitar uma crise.130,131 O delirium está associado ao aumento no tempo de internação hospitalar e ao resultado clínico desfavorável.130,132,133

Etiologia e patogênese O motivo exato pelo qual o delirium se manifesta não é bem compreendido. Especula­se que o mecanismo envolva o  comprometimento  reversível  de  diversos  neurotransmissores.131,133  Outros  possíveis  fatores  incluem  deficiência visual  e  auditiva,  estresse  psicológico  e  outras  condições  sistêmicas.130  O  delirium  tem  alta  taxa  de  mortalidade, variando entre 10 e 76%.133 Agitação, desorientação e medo, sintomas básicos do delirium, colocam o indivíduo em alto risco de lesões como fraturas resultantes de uma queda.134

Diagnóstico e tratamento O  diagnóstico  de  delirium  envolve  o  reconhecimento  da  síndrome  e  a  identificação  de  suas  causas.  O  método conhecido  como  CAM  (Confusion  Assessment  Method)  é  uma  ferramenta  de  triagem  comprovada  desenvolvida para identificar com rapidez e precisão uma manifestação de delirium. O profissional pode avaliar o indivíduo com manifestação  aguda  ou  curso  flutuante,  desatenção,  pensamento  desorganizado  e  alteração  do  nível  de consciência.135 O manejo envolve o tratamento da doença subjacente e o alívio dos sintomas por meio de terapia de suporte, que inclui a remoção de qualquer tipo de restrição (p. ex., contenção do punho, sonda de Foley), nutrição e hidratação  adequadas,  descanso,  medidas  de  conforto  e  apoio  emocional. A  prevenção  é  o  objetivo  geral.  Evitar  o estado  terrível  de  confusão  mental  aguda  e  com  risco  à  vida  muitas  vezes  é  a  chave  para  um  tratamento  bem­ sucedido.130,132,136

Resumo

Os  cuidados  de  saúde  para  idosos  requerem  considerações  exclusivas,  levando  em  conta  alterações  fisiológicas relacionadas  com  idade  e  estados  patológicos  específicos,  comuns  nesta  população.  Embora  envelhecimento  não seja  sinônimo  de  doença,  o  processo  de  envelhecimento  favorece  o  aumento  da  incidência  de  condições patológicas. O objetivo geral é ajudar o idoso a maximizar sua independência e capacidade funcional e minimizar deficiências que possam resultar de várias doenças agudas e crônicas. A  avaliação  das  habilidades  funcionais  do  idoso  é  um  componente  fundamental  para  a  gerontologia. Isoladamente, o diagnóstico clínico é incompleto sem uma avaliação da função. Ao avaliar os níveis funcionais do idoso, deve ser incluída a determinação da capacidade para realizar AVD e AIVD. Entre os distúrbios funcionais comuns na população idosa encontram­se incontinência urinária; instabilidade e quedas;  deficiência  sensorial,  além  de  depressão,  demência  e  delirium.  O  idoso  é  especialmente  propenso  à incontinência  urinária  devido  a  alterações  no  ciclo  da  micção  que  acompanham  o  processo  de  envelhecimento. Técnicas  comportamentais  podem  se  constituir  em  uma  maneira  eficiente  para  tratar  problemas  de  incontinência na população de idosos. Quedas são uma fonte comum de preocupação para a população idosa. Embora a maioria das  quedas  não  resulte  em  ferimentos  graves,  o  potencial  para  complicações  e  até  mesmo  a  morte  é  real.  A maioria  das  quedas  é  resultado  de  diversos  fatores  de  risco,  incluindo  aqueles  relacionados  com  alterações biopsicossociais  associadas  ao  processo  de  envelhecimento,  doenças  crônicas  e  riscos  situacionais  e  ambientais. Tanto  a  deficiência  visual  quanto  a  auditiva,  comuns  em  idosos,  contribuem  para  os  problemas  de  comunicação, depressão e isolamento social. A depressão é um problema relevante, mas tratável, que muitas vezes é diagnosticado e tratado corretamente na população idosa. Demência é uma síndrome adquirida, de comprometimento persistente em diversos domínios da função  intelectual,  incluindo  memória,  linguagem,  habilidade  visuoespacial  e  cognição  (capacidade  de  abstração,

cálculo, julgamento e resolução de problemas). Embora possa haver um ligeiro declínio da função intelectual com o envelhecimento, a demência não é parte do processo normal de envelhecimento. Delirium é um transtorno que provoca um estado agudo de confusão mental, que se desenvolve por um período que varia de horas a dias e que muitas  vezes  pode  ser  observado  como  uma  característica  de  apresentação  de  uma  doença  física  ou  de  um processo de intoxicação.

Tratamento medicamentoso em idosos

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Caracterizar a terapia medicamentosa na população idosa



Listar cinco fatores propulsores das reações adversas a medicamentos em idosos



Citar precauções que devem ser tomadas na prescrição de medicamentos para idosos

A  terapia  medicamentosa  na  população  idosa  é  um  fenômeno  complexo,  influenciado  por  inúmeros  fatores biopsicossociais.  Os  idosos  são  o  maior  grupo  de  consumidores  de  fármacos  com  prescrição  e  sem  prescrição médica. Embora a população idosa compreenda apenas cerca de 13% da população dos EUA, ela é responsável pelo consumo  de  um  terço  de  todos  os  medicamentos  prescritos  e  50%  de  todos  os  medicamentos  vendidos  sem prescrição médica. A incidência de reações adversas a medicamentos em idosos é de duas a três vezes maior que a encontrada  em  adultos  jovens.  Isto  é  considerado  uma  estimativa  conservadora,  porque  reações  adversas  nem sempre  são  bem  reconhecidas  em  idosos  e  muitas  vezes  podem  simular  os  sintomas  de  condições  patológicas específicas.

Fatores propulsores das reações adversas a medicamentos Erros tanto na administração de medicamentos quanto na adesão ao tratamento são comuns entre a população idosa que vive em comunidade. Os motivos para esta alta taxa de erros são numerosos, e alguns fatores incluem: • Falta de destreza manual

• Deficiência visual • Falta de compreensão sobre o regime de tratamento • Atitudes e crenças sobre o uso de medicação • Desconfiança em relação aos prestadores de cuidados de saúde • Esquecimento ou confusão mental. O  papel  do  profissional  de  saúde  também  pode  contribuir  para  o  uso  de  medicação  inadequada.  Ele  pode  ter  a tendência de tratar os sintomas com medicamentos, em vez de investigar em profundidade a causa desses sintomas. Para  piorar,  pode  ser  difícil  estabelecer  um  diagnóstico  preciso  para  condições  patológicas  específicas  porque  os idosos tendem a não relatar os sintomas e porque os sintomas apresentados muitas vezes são atípicos.6,137 Alterações  fisiológicas  relacionadas  com  o  envelhecimento  também  são  responsáveis  por  efeitos  adversos  de medicamentos.  Em  geral,  a  absorção  de  medicamentos  por  via  oral  permanece  essencialmente  inalterada  com  a idade, mesmo que sabidamente o pH gástrico aumente e o tempo de esvaziamento gástrico possa ser retardado. As alterações na distribuição dos fármacos, no entanto, são clinicamente significativas. Como a massa corporal magra e a água corporal total diminuem com a idade, substâncias solúveis em água, como digoxina e propranolol tendem a ter menor volume de distribuição, resultando em concentrações plasmáticas mais elevadas para determinada dose e maior  probabilidade  de  desenvolvimento  de  reações  tóxicas.  Inversamente,  fármacos  solúveis  em  gordura  como diazepam  têm  maior  distribuição  e  se  acumulam  no  tecido  adiposo,  devido  ao  aumento  na  quantidade  de  tecido adiposo  resultante  do  processo  de  envelhecimento.  Isto  pode  atrasar  a  eliminação  e  levar  ao  acúmulo  do  fármaco (meia­vida prolongada) com a administração de doses múltiplas do mesmo. Acredita­se que o metabolismo hepático de medicamentos se altere devido à diminuição do fluxo sanguíneo hepático observado em idosos. A excreção renal controla a eliminação de substâncias do organismo, e, como a função renal diminui com a idade, a taxa de excreção

do fármaco também é reduzida. Isto pode resultar no aumento da meia­vida, e, por esse motivo, as estimativas de clearance da creatinina são recomendadas para determinação de dosagem de medicamentos.6,138,139 O uso de medicamentos por idosos requer uma abordagem cautelosa. “Devagar e sempre” deve ser o ditado para a prescrição de medicamentos em farmacologia geriátrica. Frequentemente, o idoso alcança o resultado terapêutico com  doses  mais  baixas  do  medicamento.  Se  necessário,  a  dose  pode  ser  lentamente  titulada,  de  acordo  com  a resposta. Para complicar ainda mais, existe a questão da polifarmácia em idosos, que muitas vezes têm diversos distúrbios que  podem  exigir  diferentes  terapias  medicamentosas.  A  polifarmácia  aumenta  o  risco  de  interações medicamentosas  e  de  reações  adversas  a  medicamentos  e  diminui  a  adesão  ao  tratamento.  A  combinação  de determinada  substância  e  de  uma  condição  patológica  também  pode  causar  reações  adversas.  Por  exemplo,  os psicotrópicos  administrados  a  idosos  com  demência  podem  causar  piora  no  estado  de  confusão  mental; bloqueadores β­adrenérgicos administrados a um indivíduo com doença pulmonar obstrutiva crônica podem induzir o desenvolvimento de broncospasmo; e AINE administrados a um idoso com hipertensão podem elevar ainda mais a pressão arterial.6,137 A  utilização  de  determinados  tipos  de  medicamentos  envolve  um  risco  elevado  para  idosos  e  deve  ser  evitada sempre que possível. Em geral, o uso de medicamentos de ação prolongada ou fármacos com meia­vida longa pode ser  problemático.  Muitos  sedativos  e  hipnóticos  se  encaixam  nessa  categoria,  e  substâncias  como  diazepam  e flurazepam  devem  ser  evitadas.  Outras  classes  de  medicamentos,  como  antidepressivos  e  ansiolíticos,  podem proporcionar  o  alívio  sintomático  necessário  e  seu  uso  pode  ser  mais  apropriado  para  idosos  do  que  o  de  agentes sedativos  e  hipnóticos.  O  uso  destes  agentes  exige  prudência,  no  entanto,  tendo  em  vista  as  alterações farmacocinéticas  exclusivas  que  acompanham  o  processo  de  envelhecimento.  Medicamentos  com  propriedades anticolinérgicas  também  devem  ser  empregados  com  cautela.  Anticolinérgicos  são  utilizados  no  tratamento  de diversas  condições.  Contudo,  são  comuns  efeitos  colaterais  como  boca  seca  e  secura  nos  olhos,  visão  turva  e constipação  intestinal.  Essas  substâncias  podem  também  causar  efeitos  colaterais  mais  graves,  como  confusão mental,  retenção  urinária  e  hipotensão  ortostática.  Agentes  que  penetram  o  sistema  nervoso  central,  incluindo narcóticos  e  álcool,  podem  causar  uma  variedade  de  problemas,  principalmente  delirium.  Provavelmente,  estes problemas ocorrem como resultado de uma diminuição na capacidade de reserva do sistema nervoso central.6,137,140

Estratégias para aprimoramento do efeito terapêutico e prevenção de danos Devido a graves implicações do uso de medicamentos em idosos, devem ser empregadas estratégias para melhorar os  efeitos  terapêuticos  e  evitar  danos.  O  primeiro  passo  é  incluir  idosos,  mesmo  aqueles  com  comorbidades,  em ensaios clínicos. A segurança e a eficácia para os idosos não devem ser extrapoladas a partir de estudos feitos em jovens e adultos de meia­idade. É necessária uma amostra representativa.141 A avaliação cuidadosa da necessidade de medicação pelo profissional de saúde é o próximo passo. Uma vez decidido, é necessária uma análise do regime de medicação atual e da condição patológica para evitar interações medicamentosas, interações da substância com a condição  patológica  e  reações  adversas.  Têm  sido  desenvolvidos  métodos  de  triagem  para  evitar  o  uso  de medicamentos  potencialmente  inadequados  em  idosos.  O  mais  conhecido  é  o  Critério  de  Beers.  Um  mais  novo método  denominado  STOPP  (Screening  Tool  of  Older  Persons  Prescriptions)  também  contribui  para  impedir reações adversas que possam ser evitadas.140,142 A dosagem deve ser a mais baixa possível e a frequência de administração de medicamentos deve ser reduzida ao mínimo,  para  simplificar  a  rotina  e  aumentar  a  adesão. Também  se  deve  ter  o  cuidado  de  não  medicar  de  menos. Em alguns casos, os profissionais de saúde prescrevem medicamentos em doses subterapêuticas ou optam por não prescrever  medicamentos  importantes  pelo  medo  infundado  de  prejudicar  o  idoso.143  Um  exemplo  clássico  é  a suspensão  da  terapia  de  anticoagulação  em  idosos  com  função  cognitiva  intacta  e  expectativa  de  vida  significativa por  medo  do  risco  de  hemorragia.144  O  método  START  (Screening  Tool  to  Alert  doctors  to  Right  Treatment) é a primeira ferramenta a discutir a omissão de prescrição.142 Associar  a  hora  da  medicação  a  uma  atividade  específica  (p.  ex.,  “tomar  com  o  café  da  manhã”)  também  pode aumentar a adesão, do mesmo modo que dispositivos especiais de embalagem, como caixas de pílula e blisters. O custo  dos  medicamentos  é  outro  fator  importante  para  idosos  com  renda  fixa  e  reduzida. A  escolha  de  produtos mais  baratos  de  igual  eficácia  pode  aumentar  a  adesão. A  importância  de  orientar  o  idoso  sobre  a  medicação  não

pode  ser  subestimada.  Os  profissionais  de  saúde  precisam  fornecer  informações  verbais  e  escritas  sobre  os princípios do uso de medicamentos e sobre os medicamentos específicos administrados. Isso facilita a participação ativa do idoso e aumenta sua capacidade de tomar decisões com conhecimento de causa.6,137,40

Resumo

A  terapia  medicamentosa  na  população  idosa  é  um  fenômeno  complexo,  influenciado  por  inúmeros  fatores biopsicossociais. As  alterações  na  farmacocinética  que  ocorrem  com  o  processo  de  envelhecimento  aumentam  a probabilidade  de  reações  tóxicas.  “Devagar  e  sempre”  deve  ser  o  conselho  para  a  farmacologia  geriátrica. Medicamentos  de  ação  central  e  substâncias  com  meia­vida  longa  devem  ser  evitados  sempre  que  possível.  A possibilidade de interações medicamentosas, interações entre o fármaco e a doença e reações adversas é maior nos idosos.  Orientar  o  idoso  sobre  o  uso  de  medicamentos  é  um  fator  importante  para  garantir  a  adesão  e  a administração correta da medicação.

Exercícios de revisão

1.

Costuma ser dito que o corpo envelhecido pode realizar a maioria das funções, senão todas, da sua juventude; a diferença é que pode levar

mais tempo, requerer maior motivação e ser menos preciso.

A.

2.

Demência, delirium e depressão são três condições que comumente se manifestam na população idosa.

A.

3.

Explique como esse conceito pode contribuir para a ocorrência de quedas de idosos.

Quais características de䶦nem cada condição? Quais são as semelhanças entre elas? E as diferenças?

Erros de administração e reações adversas a medicamentos são uma ameaça contínua a idosos.

A.

Explique as causas mais comuns para o uso inadequado de medicamentos em idosos.

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________________ a N.R.T.:  No  Brasil,  a  idade  de  60  anos  foi  definida  no  Estatuto  do  Idoso,  assim  como  direitos  relacionados.  Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/110.741.htm. bN.R.T.: No Brasil, a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (Portaria MS/GM no 2.528, de 20 de outubro de 2006) direciona

medidas coletivas e individuais de saúde para população idosa em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de  Saúde,  a  fim  de  promover  a  recuperação,  a  autonomia  e  a  independência  dos  idosos.  Fonte: http://www.saudeidoso.icict.fiocruz.br/pdf/PoliticaNacionaldeSaudedaPessoaldosa.pdf. c N.R.T.: No Brasil, em 2025, as projeções calculam que serão 32 milhões de idosos, representando cerca de 15% da população brasileira.  Fonte:  http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/revista­em­discussao­edicao­agosto­2010/materias/ao­ contrario­de­outros­paises­brasil­nao­se­preparou­paraenvelhecer.aspx. dN.R.T.: Os dados sobre os idosos no Brasil podem ser obtidos no Sistema de Indicadores e Acompanhamento de Políticas do

Idoso. Fonte: http://www.saudeidoso.icict.fiocruz.br/index.php?pag=ind_pol&pol=p_n_s_p_idosa. e N.R.T.: No Brasil, há uma projeção de pequeno crescimento na taxa de prevalência de demência na população com 65 anos e mais de 7,6% para 7,9% entre 2010 e 2020, ou seja, 55.000 novos casos por ano. Fonte: Burla C. et al. Panorama prospectivo das demências  no  Brasil:  um  enfoque  demográfico.  Ciênc.  saúde  coletiva,  Rio  de  Janeiro,  2013  out;  18(10).  Disponível  em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413­81232013001000019&lng=en&nrm=iso>. Acessado em 21 de ago. de 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1413­81232013001000019.

Jennifer  tem  1  dia  de  vida,  nasceu  de  parto  vaginal  sem  complicações  de  uma  mulher  primípara  com  46  anos  de idade. Foram observados fraqueza no tônus muscular e aspecto facial irregular, incluindo olhos oblíquos e puxados para cima e um perfil facial achatado, com depressão da ponte nasal. Por ela também apresentar sopro no coração, os médicos se questionam sobre a possibilidade de problemas cardíacos. O pediatra acredita que ela tenha nascido com  síndrome  de  Down  (trissomia  do  21).  Foi  coletada  uma  amostra  de  sangue  para  o  cariótipo  e  enviada  para  o laboratório.  Os  resultados  indicam  47,  XX,  +21;  isso  significa  que  Jennifer  tem  47  cromossomos,  incluindo  dois

cromossomos  X  e  uma  cópia  extra  do  cromossomo  21.  Jennifer  e  os  problemas  associados  a  sua  condição  serão discutidos nos Capítulos 4, 6 e 7.

Na  maioria  dos  organismos,  a  célula  é  a  menor  unidade  funcional  capaz  de  manter  as  características  necessárias para  a  vida. As  células  são  organizadas  em  unidades  funcionais  maiores  denominadas  tecidos,  com  base  em  sua origem embrionária. Estes tecidos, por sua vez, se combinam para formar as diversas estruturas e órgãos do corpo. Embora as células de diferentes tecidos e órgãos tenham estrutura e função variáveis, determinadas características são comuns a todas as células. As células são muito semelhantes em sua capacidade de troca de materiais com o seu ambiente  imediato,  obtenção  de  energia  a  partir  de  nutrientes  orgânicos,  síntese  de  moléculas  complexas  e replicação.  Como  a  maior  parte  dos  processos  patológicos  se  inicia  no  nível  da  célula,  a  compreensão  de  seu funcionamento  é  essencial  para  entender  o  processo  patológico. Algumas  doenças  afetam  as  células  de  um  único órgão; outras, as células de um tipo de tecido em particular, e outras, ainda, as células de todo o organismo. Este capítulo  discute  os  componentes  estruturais  e  funcionais  da  célula,  a  integração  entre  as  funções  e  o  crescimento celular, o movimento de moléculas, como a passagem de íons através da membrana celular, e os tipos de tecido que formam o parênquima.

Componentes funcionais da célula

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever o núcleo da célula como sendo o “centro de controle” celular



Citar a função das organelas celulares



Citar quatro funções da membrana celular

Embora  diferentes  em  sua  organização,  todas  as  células  eucariontes  têm  em  comum  estruturas  que  executam funções específicas. As células eucariontes são maiores e têm partes mais específicas, divididas em compartimentos separados  por  membranas,  chamadas  organelas.  As  células  procariontes  não  têm  esses  compartimentos  e  não apresentam  um  núcleo  delimitado  como  o  de  organismos  eucariontes.  Quando  observada  ao  microscópio,  a  célula mostra três componentes principais: núcleo, citoplasma e membrana celular em células eucariontes (Figura 4.1).

Protoplasma Os  biólogos  chamam  a  matriz  interna  da  célula  de  protoplasma.  O  protoplasma  é  composto  por  água,  proteínas, lipídios, carboidratos e eletrólitos.1 Existem duas regiões distintas no protoplasma celular: • Citoplasma, que se encontra fora do núcleo

• Nucleoplasma, ou cariolinfa, que se encontra no interior do núcleo.

O protoplasma celular é composto por 70 a 85% de água.1 O segundo componente mais abundante (10 a 20%) no protoplasma  são  proteínas,  que  formam  as  estruturas  celulares  e  as  enzimas  necessárias  para  as  reações  ocorridas no  interior  da  célula.1  As  proteínas  se  ligam  a  outros  compostos  para  formar  nucleoproteínas,  glicoproteínas  e lipoproteínas.  Na  maioria  das  células,  os  lipídios  representam  de  2  a  3%  dos  constituintes.  Os  lipídios  mais importantes são fosfolipídios e colesterol, essencialmente insolúveis em água; eles se combinam com proteínas para formar  a  membrana  celular  e  as  barreiras  membranosas  que  separam  os  diferentes  compartimentos  da  célula. Algumas  células  contêm  também  grandes  quantidades  de  triglicerídios.  Em  células  de  gordura,  os  triglicerídios podem representar até 95% do total da massa celular.1 Esta gordura representa energia armazenada, possível de ser mobilizada e utilizada onde houver necessidade no organismo. Apenas alguns carboidratos (aproximadamente 1%) são  encontrados  nas  células  e  servem  principalmente  como  fonte  rápida  de  energia.1  Íons  potássio,  magnésio, fosfato,  sulfato  e  bicarbonato  são  os  principais  eletrólitos  intracelulares.  Pequenas  quantidades  de  íons  sódio, cloreto  e  cálcio  também  constam  na  célula.  Estes  eletrólitos  participam  de  reações  necessárias  ao  metabolismo celular e auxiliam na geração e transmissão de impulsos eletroquímicos em células nervosas e musculares.

Figura 4.1 • Diagrama celular concebido para mostrar em uma única célula os diferentes componentes do núcleo e do citoplasma. (Extraída de McConnell T. H., Hull K. L. (2011). Human form human function: Essentials of anatomy & physiology (p. 70). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Conceitos fundamentais

Organização funcional da célula



núcleo é o centro de controle celular. Além disso, contém a maior parte do material hereditário



As organelas, análogas aos órgãos do corpo, estão contidas no citoplasma. Entre elas estão mitocôndrias, que fornecem o suprimento para as necessidades de

energia da célula; ribossomos, que sintetizam as proteínas e outros materiais necessários para o funcionamento celular; e lisossomos e proteossomos, que

funcionam como sistema digestivo da célula

Núcleo O  núcleo  aparece  como  uma  estrutura  arredondada  ou  alongada,  situada  próximo  ao  centro  da  célula  (ver  Figura 4.1). Todas  as  células  eucariontes  têm  pelo  menos  um  núcleo  (células  procariontes,  como  as  células  de  bactérias, não têm núcleo nem membrana nuclear). Algumas células contêm mais do que um núcleo; os osteoclastos (um tipo de célula óssea) tipicamente apresentam 12 ou mais núcleos. As células da medula óssea produtoras de plaquetas, os megacariócitos, têm apenas um núcleo, mas geralmente contêm uma quantidade de cromatina 16 vezes maior que o normal.1 O  núcleo  pode  ser  considerado  o  centro  de  controle  celular.1  Nele  está  contido  o  ácido  desoxirribonucleico (DNA), essencial para a célula, pois seus genes codificam a informação necessária para a síntese de proteínas que a célula  precisa  produzir  para  se  manter  viva. As  proteínas  incluem  proteínas  estruturais  e  enzimas,  utilizadas  para sintetizar  outras  substâncias,  como  carboidratos  e  lipídios.  O  gene  também  representa  a  unidade  hereditária individual,  capaz  de  transmitir  informações  de  uma  geração  para  a  seguinte.  Também  é  no  núcleo  que  acontece  a síntese  dos  três  tipos  de  ácido  ribonucleico  (RNA  mensageiro  [mRNA],  RNA  ribossômico  [rRNA]  e  RNA transportador [tRNA]), que se deslocam para o citoplasma e realizam a verdadeira síntese de proteínas. O mRNA copia  e  transporta  para  o  citoplasma  as  instruções  do  DNA  para  a  síntese  de  proteínas;  o  rRNA  é  o  local  onde ocorre  a  síntese  de  proteínas,  e  o  tRNA  transporta  os  aminoácidos  até  o  local  de  síntese,  para  que  sejam incorporados à proteína em produção.1 Cromatina  é  o  termo  que  denota  a  estrutura  complexa  de  DNA  e  proteínas  associadas  dispersas  na  matriz nuclear.  Dependendo  de  sua  atividade  de  transcrição,  a  cromatina  pode  ser  condensada  em  uma  forma  inativa denominada  heterocromatina,  ou  distendida,  em  uma  forma  mais  ativa  chamada  eucromatina.  Como  regiões heterocromáticas do núcleo tingem mais intensamente do que regiões que consistem em eucromatina, a intensidade de  coloração  do  núcleo  pode  funcionar  como  um  guia  da  atividade  celular.  Evidências  sugerem  que  a  alteração  na cromatina, juntamente com a hipermetilação do DNA, desempenha um papel importante na progressão neoplásica.2 Parece  que  estes  dois  processos  funcionam  em  simbiose,  e  não  separadamente,  no  que  diz  respeito  ao desenvolvimento de câncer.2 O  núcleo  também  contém  um  corpo  redondo  de  coloração  escura  denominado  nucléolo.1  O  processamento  de rRNA e a montagem nos ribossomos ocorrem exclusivamente no nucléolo. Nucléolos são estruturas compostas por regiões de cinco cromossomos diferentes, cada um com uma parte do código genético necessário para a síntese de rRNA.1 Núcleos eucromáticos e nucléolos proeminentes são características de células em processo ativo de síntese proteica. Cercando o núcleo encontra­se o envoltório nuclear, formado por duas membranas nucleares (externa e interna), com um espaço entre elas denominado cisterna perinuclear.1 A membrana nuclear interna é suportada por uma rede rígida de filamentos proteicos que se ligam aos cromossomos e mantêm sua posição no núcleo. A membrana nuclear externa é semelhante à membrana do retículo endoplasmático (RE) e é contínua com ele. O envoltório nuclear contém milhares de poros circulares de estrutura complexa, onde as duas membranas se fundem e formam uma abertura preenchida por um fino diafragma proteico.1 Diferentes classes moleculares, como líquidos, eletrólitos,  RNA,  determinadas  proteínas  e  hormônios,  se  movimentam  nos  dois  sentidos  através  dos  poros nucleares.  Aparentemente,  os  poros  nucleares  regulam  a  troca  bidirecional  de  moléculas  entre  o  citoplasma  e  o núcleo.1

Citoplasma e suas organelas O citoplasma circunda o núcleo, e é no citoplasma que acontece o trabalho celular. O citoplasma é essencialmente

uma  solução  coloidal  que  contém  água,  eletrólitos,  proteínas,  gorduras  neutras  em  suspensão  e  moléculas  de glicogênio.1  Embora  não  contribuam  para  a  função  celular,  pigmentos  também  podem  se  acumular  no  citoplasma. Determinados  pigmentos,  como  a  melanina  que  dá  cor  à  pele,  são  constituintes  normais  da  célula. A  bilirrubina  é um  pigmento  normal  e  principal  constituinte  da  bile;  o  excesso  de  acúmulo  nas  células  pode  ser  evidenciado clinicamente por uma coloração amarelada na pele e esclera, uma condição chamada icterícia. Incorporadas ao citoplasma existem diversas organelas que funcionam como órgãos celulares. Entre as organelas encontram­se ribossomos, RE, complexo de Golgi, mitocôndriase lisossomos.1

Ribossomos Os ribossomos funcionam como locais de síntese de proteínas na célula. São pequenas partículas de nucleoproteínas (rRNA  e  proteínas),  mantidas  unidas  por  um  cordão  de  mRNA  para  formar  os  polirribossomos  (também denominados  polissomos).1  Os  polirribossomos  existem  como  aglomerados  isolados  de  ribossomos  livres  no citoplasma (Figura 4.2) ou ligados à membrana do RE. Enquanto os ribossomos livres estão envolvidos na síntese de  proteínas,  principalmente  enzimas  auxiliares  no  controle  da  função  celular,  os  que  estão  associados  ao  RE traduzem o mRNA, que codifica para proteínas secretadas a partir da célula ou armazenadas em seu interior (p. ex., grânulos, nos leucócitos).1

Figura  4.2  •  Retículo  endoplasmático  e  ribossomos.  O  RE  rugoso  consiste  em  membranas  intrincadamente dobradas, cravejadas de ribossomos. Os ribossomos são constituídos de proteína e rRNA, organizados em conjunto. (Extraída  de  McConnell T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of  anatomy  &  physiology (p. 72). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Retículo endoplasmático O RE é um extenso sistema de membranas emparelhadas e vesículas planas que unem as diversas partes do interior celular (ver Figura 4.2). Entre as membranas do RE existe um espaço preenchido por líquidos denominado matriz.1 A matriz conecta o espaço entre as duas membranas do invólucro nuclear, a membrana celular e diversas organelas citoplasmáticas.  Funciona  como  um  sistema  de  comunicação  tubular  para  o  transporte  de  diversas  substâncias  de uma  parte  da  célula  para  outra.  A  grande  área  de  superfície  e  os  diversos  sistemas  enzimáticos  ligados  às membranas do RE também fornecem o equipamento para grande parte das funções metabólicas da célula. Existem duas formas de RE nas células: liso e rugoso. O RE rugoso é coberto por ribossomos fixados em locais de  ligação  específicos  na  membrana. As  proteínas  produzidas  pelo  RE  rugoso  geralmente  se  tornam  componentes dos  lisossomos  e  outras  organelas,  são  incorporadas  às  membranas  celulares  ou  deixam  a  célula  na  forma  de proteína secretora. O RE rugoso segrega esse tipo de proteína de outros componentes do citoplasma e modifica sua estrutura  para  uma  função  específica.  Por  exemplo,  tanto  a  síntese  de  enzimas  digestivas  pelas  células  acinares pancreáticas  quanto  as  proteínas  do  plasma  pelas  células  hepáticas  ocorrem  no  RE  rugoso.  Todas  as  células precisam do RE rugoso para a síntese de enzimas lisossomais. O RE liso não contém ribossomos e é contínuo ao RE rugoso. Ele não participa da síntese de proteínas; em vez disso,  suas  enzimas  estão  envolvidas  na  síntese  de  moléculas  de  lipídios,  na  regulação  do  cálcio  intracelular  e  no metabolismo  e  processo  de  desintoxicação  de  determinados  hormônios  e  substâncias.  É  o  local  de  síntese  de lipídios,  lipoproteínas  e  hormônio  esteroide.  O  retículo  sarcoplasmático  de  células  musculares  esqueléticas  e cardíacas  é  uma  forma  de  RE  liso.  Os  íons  cálcio  necessários  para  a  contração  muscular  são  armazenados  e liberados a partir de cisternas do retículo sarcoplasmático. O RE liso do fígado está envolvido no armazenamento de glicogênio e no metabolismo de substâncias lipossolúveis. A capacidade de processamento do RE não é ilimitada. Se as proteínas se acumulam no RE mais rapidamente do que  podem  ser  processadas,  diz­se  que  a  célula  passa  por  “estresse  do  RE”,  e  mecanismos  de  sinalização  atuam para  diminuir  a  produção  de  proteínas  e  restaurar  a  homeostase.  Se  essa  resposta  homeostática  falhar,  poderá resultar em morte celular (apoptose). Defeitos na resposta ao estresse do RE podem causar inflamação e até mesmo morte celular. São implicados na doença inflamatória do intestino,3 em uma forma genética de diabetes melito4 e em um distúrbio da musculatura esquelética conhecido como miosite,5 e em muitos outros processos patológicos.

Complexo de Golgi O  complexo  de  Golgi,  também  chamado  de  aparelho  de  Golgi,  é  composto  por  quatro  ou  mais  pilhas  de  finas vesículas  achatadas  ou  sacos  (ver  Figura  4.3).1  Esses  corpos  de  Golgi  são  encontrados  próximos  ao  núcleo  e funcionam  associados  ao  RE.  As  substâncias  produzidas  no  RE  são  transportadas  para  o  aparelho  de  Golgi  em pequenas vesículas de transferência recobertas por uma membrana. Muitas células sintetizam proteínas maiores do que  o  produto  ativo.  O  complexo  de  Golgi  modifica  essas  substâncias  e  as  empacota  em  grânulos  de  secreção  ou vesículas. A  insulina,  por  exemplo,  é  sintetizada  como  uma  grande  molécula  de  proinsulina  inativa,  partida  para produzir uma molécula menor de insulina ativa no complexo de Golgi das células β do pâncreas. Além de produzir grânulos  de  secreção,  o  complexo  de  Golgi  é  considerado  responsável  pela  produção  de  grandes  moléculas  de carboidratos,  que  se  combinam  com  as  proteínas  produzidas  no  RE  rugoso  para  formar  as  glicoproteínas.  Dados recentes sugerem que o complexo de Golgi tem ainda outra função: pode receber proteínas e outras substâncias da superfície celular por um mecanismo de transporte retrógrado. Diversas toxinas bacterianas, como as liberadas por organismos  do  gênero  Shigella  e  toxinas  da  cólera,  e  também  toxinas  de  plantas,  como  a  ricina,  que  têm  alvos citoplasmáticos, utilizam essa via retrógrada.1

Lisossomos e peroxissomos Lisossomos  podem  ser  considerados  o  sistema  digestivo  celular.  Estes  pequenos  sacos  fechados  por  membranas contêm poderosas enzimas hidrolíticas. Estas enzimas podem quebrar excessos e partes desgastadas da célula, bem

como substâncias estranhas levadas para o ambiente celular. Todas as enzimas  lisossômicas são hidrolases ácidas, isto é, necessitam de um meio ácido para agir. Os lisossomos proporcionam esse ambiente ao manter o pH em cerca de 5 em seu interior. O pH do citoplasma, de aproximadamente 7,2, serve para proteger outras estruturas celulares desta acidez. Lisossomos primários  são  organelas  intracelulares  envoltas  por  uma  membrana  e  contêm  diferentes enzimas  hidrolíticas  que  ainda  não  entraram  no  processo  digestivo.  Recebem  suas  enzimas  e  suas  membranas  do complexo de Golgi. Lisossomos primários tornam­se lisossomos secundários depois de se fundirem com vacúolos ligados à membrana, os quais contêm a matéria a ser digerida. Os lisossomos fracionam o material fagocitado por heterofagia ou autofagia (Figura 4.4).

Figura 4.3 • Complexo de Golgi – vesículas contendo proteínas partem do RE rugoso e se fundem com a cisterna do complexo de Golgi. (Extraída de McConnell T. H., Hull K. L. (2011).  Human form human function: Essentials of anatomy & physiology (p. 73). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Figura  4.4  •  Os  processos  de  autofagia  e  heterofagia,  mostrando  lisossomos  primários  e  secundários,  corpos residuais, extrusão do conteúdo dos corpos residuais da célula e corpos residuais com lipofuscina.

Heterofagia diz respeito à digestão de uma substância exógena, fagocitada do meio extracelular.6 Uma dobra da membrana celular leva a matéria externa para dentro da célula para formar uma vesícula fagocítica circundante, ou fagossomo.  Os  lisossomos  primários,  em  seguida,  se  fundem  com  os  fagossomos  para  formar  os  lisossomos secundários.  A  heterofagocitose  é  mais  comum  em  células  fagocíticas  da  série  leucocitária,  como  neutrófilos  e macrófagos. Autofagia envolve a segregação e destinação de organelas celulares danificadas, como mitocôndrias ou RE,  que  os  lisossomos  devem  remover  para  manter  normal  o  funcionamento  da  célula.6 A  autofagocitose  é  mais acentuada  em  células  em  processo  de  atrofia.  Embora  as  enzimas  dos  lisossomos  secundários  possam  quebrar  a maioria das proteínas, carboidratos e lipídios em seus constituintes básicos, algumas substâncias permanecem sem serem  digeridas.  Esse  material  não  digerido  pode  permanecer  no  citoplasma  como  corpos  residuais  ou  ser removido  do  ambiente  celular  por  exocitose.  Em  determinadas  células  de  vida  longa,  como  os  neurônios  e  as células do músculo cardíaco, ocorre o acúmulo de grandes quantidades de corpos residuais na forma de grânulos de lipofuscina ou pigmentos associados ao processo de envelhecimento. Outros pigmentos incapazes de ser digeridos, como partículas inaladas de carbono e pigmentos empregados em tatuagens, também se acumulam e podem persistir na forma de corpos residuais por décadas. Os  lisossomos  desempenham  um  papel  importante  no  metabolismo  normal  de  determinadas  substâncias orgânicas. Em algumas doenças hereditárias conhecidas como doenças de armazenamento lisossômico, uma enzima lisossomal  específica  é  inexistente  ou  está  inativa,  caso  em  que  não  pode  ocorrer  a  digestão  de  determinadas substâncias celulares (p. ex., glicocerebrosídios, gangliosídios, esfingomielina).7 Como resultado, estas substâncias se  acumulam  nas  células.  Na  doença  de  Tay­Sachs,  uma  doença  autossômica  recessiva,  ocorre  deficiência  de hexosaminidase A,  que  é  a  enzima  lisossomal  necessária  para  a  degradação  do  gangliosídio  GM 2, encontrado nas membranas das células nervosas. Embora o gangliosídio GM2 possa se acumular em vários tecidos, como coração, fígado  e  baço,  seu  acúmulo  no  sistema  nervoso  e  na  retina  causa  os  piores  danos.7  Há  diversas  doenças  de armazenamento  lisossomal,  e  o American  College  of  Medical  Genetics  está  desenvolvendo  novas  orientações  em relação  aos  critérios  para  diagnóstico  e  controle  das  doenças  de  Fabry,  Gaucher  e  Niemann­Pick A/B;  doença  do

armazenamento  de  glicogênio  tipo  II;  leucodistrofia  celular  globoide;  leucodistrofia  metacromática  e  tipos  de mucopolissacaridoses.8 Menor  do  que  os  lisossomos,  organelas  esféricas  ligadas  à  membrana  chamadas  peroxissomos  contêm  uma enzima  especial  capaz  de  degradar  peróxidos  (p.  ex.,  peróxido  de  hidrogênio).  Ao  contrário  dos  lisossomos,  os peroxissomos  não  são  formados  pelo  aparelho  de  Golgi.  Os  peroxissomos  são  autorreplicantes  como  as mitocôndrias  e  são  inicialmente  formados  por  proteínas  produzidas  por  ribossomos  livres.  A  função  dos peroxissomos  está  associada  ao  controle  de  radicais  livres.6  A  não  ser  que  sejam  degradados,  estes  compostos químicos altamente instáveis podem danificar outras moléculas encontradas no citoplasma. Por exemplo, a catalase degrada em água moléculas de peróxido de hidrogênio – uma substância tóxica. Os peroxissomos também contêm enzimas  necessárias  para  quebrar  ácidos  graxos  de  cadeia  muito  longa,  pois  as  enzimas  mitocondriais  não conseguem  degradá­los  de  modo  eficaz.  Nas  células  hepáticas,  as  enzimas  peroxissomais  estão  envolvidas  na formação de ácidos biliares.6

Proteassomos Três  importantes  mecanismos  celulares  estão  envolvidos  na  degradação  de  proteínas,  ou  proteólise.6  Um  deles  é pela degradação endossomal­lisossomal anteriormente mencionada. Outro mecanismo de degradação citoplasmática é a via da caspase, que está envolvida no processo de morte celular por apoptose. O terceiro método de proteólise ocorre  dentro  de  uma  organela  denominada  proteassomo.  Proteassomos  são  pequenas  organelas  compostas  por complexos de proteínas que se acredita estarem tanto no citoplasma quanto no núcleo. Estas organelas são capazes de  reconhecer  proteínas  malformadas  ou  com  deformação,  direcionadas  à  degradação,  incluindo  fatores  de transcrição  e  ciclinas,  importantes  no  controle  do  ciclo  celular.  Tem  sido  sugerido  que  até  um  terço  das  cadeias polipeptídicas recém­formadas é selecionado para degradação pelos proteassomos, como um mecanismo de controle de qualidade celular.

Mitocôndrias As mitocôndrias são literalmente “usinas de energia” celular, porque transformam compostos orgânicos em energia facilmente  acessível  para  a  célula.  Não  produzem,  mas  extraem  energia  a  partir  de  compostos  orgânicos.  As mitocôndrias  contêm  as  enzimas  necessárias  para  capturar  a  maior  parte  da  energia  de  gêneros  alimentícios  e convertê­la em energia celular. Este processo, que envolve diferentes etapas, muitas vezes é chamado de respiração celular  por  demandar  oxigênio.1  As  células  armazenam  a  maior  parte  dessa  energia  em  ligações  fosfato  de  alta energia,  em  compostos  como  a  adenosina­trifosfato  (ATP),  utilizando­a  para  alimentar  as  diversas  atividades celulares. As  mitocôndrias  são  encontradas  próximo  ao  local  de  consumo  de  energia  na  célula  (p.  ex.,  perto  das miofibrilas em células musculares). O número de mitocôndrias em determinado tipo de célula varia de acordo com o tipo de atividade realizado pela célula e a energia necessária para cumprir essa atividade.1 Por exemplo, pode ser observado um aumento substancial no número de mitocôndrias na musculatura esquelética que sofre repetidamente estímulos de contração. As  mitocôndrias  são  constituídas  por  duas  membranas:  uma  membrana  externa  que  delimita  a  periferia  da mitocôndria,  e  uma  membrana  interna,  que  forma  projeções  em  forma  de  prateleiras,  denominadas  cristas  (Figura 4.5).  O  pequeno  espaço  entre  as  membranas  externa  e  interna  é  chamado  espaço  intermembranas,  enquanto  o grande  espaço  envolto  pela  membrana  interna  é  denominado  espaço matricial.6 A  membrana  mitocondrial  externa contém  um  grande  número  de  poros,  através  dos  quais  podem  passar  moléculas  solúveis  em  água.  Como  a membrana  é  relativamente  permeável  a  pequenas  moléculas,  incluindo  proteínas,  o  conteúdo  do  espaço intermembranas é semelhante ao do citoplasma. A membrana interna abarca as enzimas da cadeia respiratória e as proteínas  de  transporte  necessárias  para  a  síntese  de  ATP.  Em  determinadas  regiões,  as  membranas  externas  e internas  entram  em  contato;  estes  pontos  de  contato  funcionam  como  vias  para  entrada  e  saída  de  proteínas  e pequenas moléculas do espaço matricial. A mitocôndria contém seu próprio DNA e ribossomos, sendo autorreplicante. O DNA mitocondrial (mtDNA) é encontrado na matriz mitocondrial e é diferente do DNA cromossômico encontrado no núcleo. Também conhecido como  o  “outro  genoma  humano”,  o  mtDNA  é  uma  molécula  circular  de  cadeia  dupla,  que  codifica  o  rRNA  e  o tRNA  requeridos  na  síntese  intramitocondrial  das  proteínas  necessárias  para  a  função  de  geração  de  energia

realizada  pelas  mitocôndrias.  Embora  o  mtDNA  conduza  a  síntese  de  13  das  proteínas  importantes  para  a  função mitocondrial, o DNA nuclear codifica as proteínas estruturais das mitocôndrias e outras proteínas essenciais para a conclusão do processo de respiração celular.6,9 A herança do mtDNA é matrilinear (ou seja, herdada da mãe) e proporciona, assim, uma base para os estudos de linhagens  familiares.  Foram  encontradas  mutações  em  cada  um  dos  genes  mitocondriais,  e  começa  a  surgir  uma compreensão  do  papel  do  mtDNA  em  determinadas  doenças. A  maioria  dos  tecidos  orgânicos  depende  em  certa medida do metabolismo oxidativo, portanto pode ser afetada por mutações no mtDNA.6

Figura  4.5  •  Mitocôndria.  A  membrana  interna  forma  as  dobras  transversais  denominadas  cristas,  em  que  estão localizadas  as  enzimas  necessárias  à  etapa  final  da  produção  de  adenosina  trifosfato  (ATP)  (i.  e.,  fosforilação oxidativa).  (Extraída  de  McConnell T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of  anatomy  & physiology (p. 74). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

As  mitocôndrias  também  funcionam  como  reguladores  fundamentais  no  processo  de  apoptose  ou  morte  celular programada. A iniciação da via mitocondrial para apoptose resulta de um aumento na permeabilidade mitocondrial e subsequente  liberação  de  moléculas  pró­apoptose  para  o  citoplasma.  Uma  destas  moléculas  pró­apoptose  é  o citocromo  c,  que  é  ligado  à  cardiolipina  (um  fosfolípido).10  É  muito  conhecido  por  seu  papel  na  respiração mitocondrial. No citosol, o citocromo c se liga a uma proteína chamada fator­1 de ativação de apoptose, iniciando os  eventos  moleculares  envolvidos  na  cascata  de  apoptose.  Também  entram  no  citoplasma  outras  proteínas apoptóticas, onde se ligam aos diferentes inibidores de apoptose, cuja função normal consiste em bloquear a cascata de apoptose, e os neutralizam. Tanto a formação de espécies reativas de oxigênio (ROS) (p. ex., peróxidos) quanto a ativação do gene supressor de tumor p53, por danos no DNA ou outros meios, deflagram a sinalização apoptótica na  mitocôndria.  ROS  foram  determinadas  como  a  causa  etiológica  de  lesão  celular  em  diferentes  processos patológicos.10 A  desregulagem  do  processo  de  apoptose  (para  mais  ou  para  menos)  tem  sido  implicada  em  uma variedade  de  doenças,  incluindo  o  câncer,  no  qual  se  verifica  uma  taxa  inadequadamente  baixa  de  apoptose,  e doenças neurodegenerativas, em que ocorre um aumento da taxa de apoptose.

Citoesqueleto Além  das  organelas,  o  citoplasma  compreende  uma  rede  de  microtúbulos,  microfilamentos,  filamentos intermediários e filamentos grossos (Figura 4.6).6 Como controlam a forma e o movimento celular, essas estruturas representam um dos principais componentes dos elementos estruturais denominado ci­toesqueleto, que participa no

movimento de células inteiras.

Figura  4.6  •  Citoesqueleto.  O  citoesqueleto  é  composto  por  microfilamentos,  microtúbulos  e  filamentos intermediários. (Extraída de McConnell T. H., Hull K. L. (2011). Human form human function: Essentials of anatomy & physiology (p. 75). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Microtúbulos Os microtúbulos são formados por subunidades de proteínas chamadas tubulinas. São estruturas duras, cilíndricas e ocas que medem 25 nm de diâmetro externo, com um lúmen de 15 nm de diâmetro.9 Cada microtúbulo consiste em protofilamentos  paralelos,  cada  um  composto  de  dímeros  de  tubulina  a  e  b.9  Os  microtúbulos  são  estruturas dinâmicas capazes de se desmontarem rapidamente em um local e se remontarem em outro. Durante o processo de montagem, os dímeros de tubulina polimerizam de uma ponta à outra para formar protofilamentos. Como resultado do processo de polimerização, cada microtúbulo apresenta uma extremidade que não cresce, denominada “menos”, e uma  de  rápido  crescimento,  denominada  “mais”.  Durante  o  processo  de  desmontagem,  os  dímeros  de  tubulina  se dissociam dos protofilamentos e formam um pool de tubulina livre no citoplasma.9 Este grupo é usado no processo de polimerização para a remontagem dos protofilamentos.9 Os  microtúbulos  têm  diversas  funções,  incluindo  desenvolvimento  e  manutenção  da  forma  celular.  Eles participam  nos  mecanismos  de  transporte  intracelular,  incluindo  o  transporte  axoplasmático  em  neurônios  e  a dispersão de pigmentos de melanina nas células da pele. Outras funções englobam a formação da estrutura de base para  diversas  organelas  citoplasmáticas  complexas,  além  dos  centríolos,  corpos  basais,  cílios  e  flagelos9 (Figura 4.7). A  planta  alcaloide  colchicina  se  liga  às  moléculas  de  tubulina  e  impede  a  montagem  de  microtúbulos.  Este composto interrompe a mitose celular, interferindo na formação do fuso mitótico, e é frequentemente utilizado em

estudos  citogenéticos  (cromossomos).  É  adotado  também  no  tratamento  de  gota  para  evitar  a  migração  de neutrófilos  e  reduzir  a  capacidade  de  resposta  aos  cristais  de  urato  nos  tecidos.  Os  medicamentos  à  base  de alcaloides  da  vinca  (p.  ex.,  vimblastina  e  vincristina),  que  por  vezes  são  empregados  no  tratamento  de  câncer, também se ligam aos microtúbulos e inibem a formação do fuso mitótico, essencial para a proliferação celular.11 Centríolos  e  corpos  basais.  Centríolos  e  corpos  basais  são  organelas  estruturalmente  idênticas,  compostas  por microtúbulos  altamente  organizados.9  Internamente,  centríolos  e  corpos  basais  têm  um  núcleo  central  amorfo, cercado por feixes formados por conjuntos de três microtúbulos. Centríolos  são  estruturas  pequenas  e  cilíndricas  compostas  por  um  conjunto  de  microtúbulos  altamente organizado. Geralmente são estruturas pareadas, dispostas perpendicularmente uma em relação à outra. Nas células em divisão, os dois centríolos cilíndricos são inicialmente encontrados nas vizinhanças do complexo de Golgi, em uma região da célula chamada de centrossomo. Durante a divisão celular, os centríolos formam o fuso mitótico, que auxilia na separação e no movimento dos cromossomos.9 Corpos basais são mais numerosos do que centríolos e se localizam próximo à membrana celular, em associação a cílios e flagelos.9 São responsáveis pela formação do núcleo altamente organizado dos microtúbulos encontrados nos cílios e flagelos.9

Figura 4.7 • Microtúbulos e microfilamentos da célula. Os microfilamentos estão associados à superfície interna da célula  e  auxiliam  na  motilidade  celular.  Os  microtúbulos  formam  o  citoesqueleto  e  mantêm  as  organelas  em posição.

Cílios  e  flagelos.  Cílios  e  flagelos  são  extensões  celulares  formadas  por  microtúbulos  cuja  membrana  de revestimento é contínua com a membrana celular. Tipicamente, as células ciliadas apresentam um grande número de cílios, enquanto as células flageladas têm apenas um flagelo.9 Nos seres humanos, os espermatozoides são o único tipo  de  célula  com  um  flagelo.  Os  cílios  são  encontrados  na  superfície  apical  (luminal)  de  vários  revestimentos epiteliais, incluindo os seios nasais e brônquios no sistema respiratório superior. Também desempenham um papel proeminente nos tecidos sensoriais, como nas proteínas de fotorreceptores no olho, receptores olfatórios do epitélio olfatório  e  quinocílio  nas  células  ciliadas  do  ouvido  interno  (orelha  interna,  segundo  a  Terminologia Anatômica). Os cílios também atuam em funções sensoriais em fases críticas do desenvolvimento embrionário, e são essenciais para o funcionamento normal de muitos tecidos, incluindo o rim, durante a vida pós­natal. Pesquisas recentes têm

vinculado  a  patogênese  de  uma  condição  denominada  doença renal policística  a  um  defeito  genético  nos  cílios  de células tubulares renais. Um  cílio  móvel  compreende  nove  conjuntos  duplos  de  microtúbulos  que  formam  um  cilindro  oco  em  torno  de um par central de microtúbulos individuais. Os microtúbulos duplos da parte externa contêm complexos movidos a ATP  que  fazem  os  pares  de  microtúbulos  adjacentes  deslizarem  uns  sobre  os  outros.  Todos  estes  microtúbulos  e suas proteínas associadas estão ancorados em um corpo basal, responsável pela formação de uma estrutura central denominada axonema.9  O  axonema  funciona  como  uma  estrutura  interna,  pois  dá  suporte  ao  cílio  e  fornece  uma estrutura  sobre  a  qual  é  produzido  o  movimento  mecânico.  Evidências  recentes  sugerem  que  nem  todos  os  cílios apresentam esta estrutura interna, e que em alguns pode haver falta do par central de microtúbulos. Nos casos como este último, a estrutura é frequentemente denominada cílio primário e é imóvel. Cílios  e  flagelos  são  formados  por  um  processo  denominado  transporte intraflagelar,  durante  o  qual  grandes complexos de proteínas são transportados ao longo dos microtúbulos ciliares, do corpo basal até a ponta ciliar e, em seguida, de volta para o corpo basal. Acredita­se que esses complexos de proteínas transportem precursores ciliares do  seu  local  de  síntese  no  citoplasma  para  o  local  de  montagem  na  ponta  do  cílio.9  Defeitos  genéticos  podem resultar  em  uma  formação  ciliar  inadequada  e,  como  resultado,  os  cílios  podem  não  ser  funcionais.9  Uma  dessas doenças,  a  síndrome  dos  cílios  imóveis,  prejudica  a  mobilidade  do  esperma  ao  causar  esterilidade  masculina, enquanto também imobiliza os cílios do trato respiratório ao interferir na eliminação de bactérias inaladas e levar a uma doença pulmonar crônica chamada bronquiectasia.9,12 A síndrome de Kartagener é um exemplo de síndrome de imobilidade ciliar e se manifesta com bronquiolite difusa, aplasia dos seios paranasais e situs inversus totalis, que é uma inversão dos órgãos do tórax e abdome.12

Microfilamentos Microfilamentos  são  finas  estruturas  filiformes  encontradas  no  citoplasma.  Existem  três  classes  de microfilamentos: 1. Microfilamentos finos, equivalentes aos finos filamentos de actina no tecido muscular 2. Filamentos intermediários, um grupo heterogêneo de filamentos com diâmetros entre o de filamentos grossos e finos 3. Filamentos grossos de miosina, encontrados nas células dos músculos, mas também temporariamente em outros tipos de célula.6 A  contração  muscular  depende  da  interação  entre  os  finos  filamentos  de  actina  e  os  grossos  filamentos  de miosina. Na maioria das células, os microfilamentos estão na zona superficial do citoplasma. A atividade contrátil que  envolve  os  microfilamentos  e  grossos  filamentos  de  miosina  associados  contribui  para  a  movimentação  do citoplasma e da membrana celular durante os processos de endocitose e exocitose. Microfilamentos também estão nas microvilosidades do intestino. Os filamentos intermediários auxiliam na função de suporte e na manutenção da forma  assimétrica  das  células.  Exemplos  de  filamentos  intermediários  são  os  de  queratina  que  se  encontram ancorados  à  membrana  celular  dos  queratinócitos  epidérmicos  e  os  filamentos  gliais,  encontrados  nos  astrócitos  e em outras células da glia do sistema nervoso.6 O emaranhado neurofibrilar  identificado  no  cérebro  de  indivíduos com  doença  de  Alzheimer  contém  proteínas  e  neurofilamentos  associados  a  microtúbulos,  uma  evidência  do rompimento do citoesqueleto neuronal.

Membrana celular A  célula  é  envolta  por  uma  membrana  fina  que  separa  o  conteúdo  intracelular  do  ambiente  extracelular.  Para diferenciar de outras membranas celulares, como as mitocondriais ou nucleares, a membrana celular é muitas vezes denominada membrana plasmática. Em muitos aspectos, a membrana plasmática é uma das partes mais importantes da célula. Ela atua como uma estrutura semipermeável que cinde o ambiente intracelular do extracelular. Ela fornece receptores para hormônios e outras substâncias biologicamente ativas, participa nos eventos elétricos ocorridos nas células nervosas e musculares, e auxilia na regulação do crescimento e proliferação celular. A  membrana  celular  é  uma  estrutura  dinâmica  e  fluida  que  consiste  em  um  arranjo  organizado  de  lipídios, carboidratos e proteínas (Figura 4.8). Um dos principais componentes estruturais da membrana é sua camada dupla

lipídica.  Esta  é  uma  camada  biomolecular  constituída  principalmente  de  fosfolipídios,  com  glicolipídios  e colesterol.9  Esta  dupla  camada  lipídica  proporciona  a  estrutura  fluida  básica  da  membrana  e  funciona  como  uma barreira relativamente impermeável para todas as substâncias, exceto as lipossolúveis. Aproximadamente 75% dos lipídios são fosfolipídios, cada um com uma cabeça hidrófila (solúvel em água) e uma cauda hidrofóbica9 (insolúvel em  água). As  moléculas  de  fosfolipídios,  juntamente  com  os  glicolipídios,  se  alinham  de  modo  que  suas  cabeças hidrofílicas  ficam  viradas  para  fora  de  cada  lado  da  membrana  e  sua  cauda  hidrofóbica  se  projeta  em  direção  ao centro  da  membrana. As  cabeças  hidrofílicas  retêm  água  e  ajudam  a  manter  as  células  unidas  umas  às  outras.  Na temperatura  normal  do  corpo,  a  viscosidade  do  componente  lipídico  da  membrana  é  equivalente  à  do  azeite.  A existência de colesterol enrijece a membrana. Embora a dupla camada lipídica forneça a estrutura básica da membrana celular, são as proteínas que realizam a maioria  das  funções  específicas.  Proteínas integrais  constam  em  toda  a  dupla  camada  lipídica  e,  essencialmente, fazem  parte  da  membrana.  Como  a  maior  parte  das  proteínas  integrais  consegue  atravessar  diretamente  a membrana,  também  são  chamadas  de  proteínas  transmembranares.  Um  segundo  tipo  de  proteína,  as  proteínas periféricas,  permanece  ligado  a  um  ou  a  outro  lado  da  membrana,  e  não  consegue  atravessar  a  dupla  camada lipídica. A remoção de proteínas periféricas da superfície geralmente provoca danos à membrana.9 A  maneira  pela  qual  as  proteínas  se  associam  à  membrana  celular  frequentemente  determina  sua  função.  Desse modo,  as  proteínas  periféricas  estão  integradas  às  funções  que  envolvem  o  lado  interno  ou  externo  da  membrana onde se encontram. Diversas proteínas periféricas funcionam como receptores ou estão envolvidas em sistemas de sinalização  intracelular.  Por  outro  lado,  apenas  as  proteínas  transmembranares  têm  condições  de  funcionar  em ambos os lados da membrana ou transportar moléculas através dela. Muitas proteínas transmembranares integrais formam os canais de íons que se encontram na superfície da célula. Estas proteínas dos canais têm uma morfologia complexa e são seletivas em relação às substâncias que transmitem. Mutações nestas proteínas, muitas vezes denominadas canalopatias, são responsáveis por uma série de distúrbios genéticos.13  Por  exemplo,  na  fibrose  cística,  o  defeito  principal  reside  em  um  canal  anormal  de  cloreto,  o  que resulta no aumento da reabsorção de sódio e água, e faz as secreções do sistema respiratório ficarem mais espessas e  obstruírem  as  vias  respiratórias.  Uma  descoberta  recente  mostrou  existência  de  canais  de  água  específicos  ou poros  na  membrana  plasmática  chamados  aquaporinas.  Sabe­se  agora  que  distúrbios  nas  aquaporinas  são responsáveis por diversas doenças, incluindo diabetes insípido nefrogênico.9

Figura  4.8  •  Estrutura  da  membrana  celular  que  mostra  as  cabeças  hidrofílicas  (polares)  e  a  cauda  hidrofóbica (ácidos  graxos).  (Extraída  de  McConnell  T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of anatomy & physiology (p. 67). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Uma  camada  indistinta  que  circunda  a  superfície  da  célula  é  denominada  glicocálice. A  estrutura  do  glicocálice consiste  em  longas  cadeias  de  carboidratos  ligados  a  moléculas  de  proteínas  que  penetram  a  porção  exterior  da membrana (i. e., glicoproteínas); lipídios da membrana virados para fora (i. e., glicolipídios) e proteínas de ligação

a  carboidratos  denominadas  lectinas.  Estas  proteínas  são  responsáveis  por  distintas  atividades  e  têm  processos inibidores de transcriptase inversa antitumoral, imunomoduladores, antifúngicos e HIV­1.14 O glicocálice participa no reconhecimento e adesão célula­célula. Contém antígenos de transplante de tecido que rotulam as células como self e não self. O glicocálice de hemácias engloba os antígenos do grupo sanguíneo AB0. Existe uma íntima relação entre  a  membrana  celular  e  o  glicocálice.  Se  este  é  removido  enzimaticamente,  a  célula  permanece  viável  e  pode gerar uma nova camada de revestimento, mas uma lesão na membrana geralmente resulta em morte celular.

Resumo

A  célula  é  uma  estrutura  extremamente  autônoma  que  funciona  de  maneira  muito  semelhante  à  do  organismo como  um  todo.  Na  maioria  das  células,  um  único  núcleo  controla  a  função  celular  e  é  o  centro  de  controle.  Ele contém  DNA,  que  fornece  as  informações  necessárias  para  a  síntese  das  diversas  proteínas  que  a  célula  deve produzir para se manter viva e transmitir informação de uma geração para outra. O núcleo é também o local para a síntese dos três tipos de RNA (mRNA, rRNA e tRNA) que se deslocam para o citoplasma e efetuam a verdadeira síntese de proteínas. O citoplasma contém organelas e o citoesqueleto celular. Os ribossomos funcionam como locais para a síntese de proteínas na célula. O RE funciona como sistema de comunicação tubular que transporta as substâncias de uma parte  da  célula  para  outra  e  como  local  de  síntese  de  proteínas  (RE  rugoso),  carboidratos  e  lipídios  (RE  liso). Corpos de Golgi modificam o material sintetizado no RE e o embalam em grânulos de secreção para o transporte dentro da célula ou para que sejam removidos do meio celular. Os lisossomos, considerados o sistema digestivo da  célula,  contêm  enzimas  hidrolíticas  que  digerem  partes  celulares  desgastadas  e  matéria  estranha.  Eles  são estruturas  membranosas  formadas  no  complexo  de  Golgi  com  enzimas  hidrolíticas  sintetizadas  no  RE  rugoso. Outra  organela,  o  proteassomo,  digere  proteínas  deformadas  ou  com  malformação. As  mitocôndrias  funcionam como  usinas  de  energia  para  a  célula  porque  transformam  a  energia  do  alimento  em ATP,  fornecendo  a  energia necessária às atividades celulares. As mitocôndrias têm o próprio DNA extracromossômico, importante na síntese de RNA e proteínas mitocondriais utilizados no metabolismo oxidativo. Além das organelas, o citoplasma contém uma rede de microtúbulos, microfilamentos, filamentos intermediários e filamentos grossos. Os microtúbulos são estruturas  finas  rígidas  e  tubulares  que  influenciam  o  formato  da  célula,  proporcionam  um  meio  de  locomoção para as organelas através do citoplasma e efetuam o movimento de cílios e cromossomos durante a divisão celular. Microfilamentos  são  finas  estruturas  filiformes  citoplasmáticas  e  incluem  os  filamentos  de  actina  e  miosina  que participam na contração muscular. A  membrana  plasmática  é  constituída  de  uma  dupla  camada  lipídica  que  envolve  a  célula  separando­a  do ambiente  externo.  Embora  a  dupla  camada  lipídica  forneça  a  estrutura  básica  da  membrana  celular,  as  proteínas desempenham  a  maioria  das  funções  específicas.  Proteínas  transmembranares  frequentemente  formam  canais  de transporte  para  íons  e  outras  substâncias,  enquanto  proteínas  periféricas  funcionam  como  locais  receptores  para moléculas de sinalização. Uma camada de aparência difusa, glicocálice, envolve a superfície da célula. Ela contém antígenos teciduais e participa no reconhecimento e na adesão célula­célula.

Integração entre função celular e replicação

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever uma via de comunicação celular, começando no receptor e terminando com a resposta efetora, e explicar por que o processo é muitas vezes chamado de

transdução de sinal



Descrever as fases da divisão celular mitótica



Descrever a função do ATP no metabolismo celular

Comunicação celular Em  organismos  multicelulares,  as  células  precisam  se  comunicar  umas  com  as  outras  para  coordenar  seu

funcionamento e controlar o crescimento. O corpo humano tem diversos meios de transmissão de informação entre as  células.  Estes  mecanismos  incluem  a  comunicação  direta  entre  células  adjacentes  através  de  junções,  a sinalização  autócrina  e  parácrina  e  a  sinalização  endócrina  ou  sináptica.9 A  sinalização  autócrina  ocorre  quando uma  célula  libera  uma  substância  química  no  líquido  extracelular  que  afeta  a  sua  atividade  (Figura  4.9).  Com  a sinalização  parácrina,  as  enzimas  metabolizam  rapidamente  os  mediadores  químicos;  portanto,  eles  têm  ação principalmente sobre as células vizinhas. A  sinalização endócrina depende de hormônios transportados da corrente sanguínea  para  as  células  de  todo  o  organismo.  A  sinalização  sináptica  dá­se  no  sistema  nervoso,  no  qual neurotransmissores  agem  apenas  sobre  as  células  nervosas  adjacentes,  através  de  áreas  de  contato  especiais chamadas  sinapses.  Em  algumas  áreas  do  corpo,  um  mesmo  mensageiro  químico  pode  funcionar  como neurotransmissor, mediador parácrino e hormônio secretado por neurônios para a corrente sanguínea.

Figura 4.9 • Exemplos de secreção. A. Endócrina. B. Parácrina. C. Autócrina.

Conceitos fundamentais

Comunicação celular



As células se comunicam umas com as outras e com ambientes internos e externos mediante uma série de mecanismos, incluindo sistemas elétricos e químicos

de sinalização que controlam potenciais elétricos, o funcionamento celular global e a atividade dos genes necessária para a divisão e a replicação celulares



Mensageiros químicos exercem seus efeitos ligando-se a proteínas da membrana celular ou a receptores que convertem o sinal químico em sinais dentro da

célula, em um processo denominado transdução de sinal



As células podem regular sua resposta aos mensageiros químicos aumentando ou diminuindo o número de receptores ativos em sua superfície

Receptores celulares Sistemas de sinalização consistem em receptores localizados na membrana celular (receptores de superfície) ou no interior  das  células  (receptores  intracelulares).  Os  receptores  são  ativados  por  diferentes  sinais  extracelulares  ou primeiros mensageiros,  incluindo  neurotransmissores,  hormônios  proteicos  e  fatores  de  crescimento,  esteroides  e outros  mensageiros  químicos.  Alguns  mensageiros  químicos  lipossolúveis  se  movem  livremente  através  da membrana e se ligam a receptores citoplasmáticos ou nucleares para exercer seus efeitos fisiológicos. Os sistemas de  sinalização  também  incluem  transdutores  e  efetores,  envolvidos  na  conversão  do  sinal  em  resposta  fisiológica. Esta via pode incluir mecanismos intracelulares adicionais, denominados segundos mensageiros.9 Muitas moléculas envolvidas na transdução de sinal são proteínas. Uma propriedade única das proteínas que lhes possibilita funcionar desta  maneira  é  a  capacidade  de  alteração  de  sua  forma  ou  conformação,  alterando,  assim,  a  função  e, consequentemente,  as  funções  da  célula.  As  proteínas  realizam  estas  alterações  de  conformação  por  meio  de enzimas  denominadas  proteinoquinases,  que  catalisam  a  fosforilação  de  aminoácidos  encontrados  na  estrutura  da proteína.9

Receptores de membrana celular Cada  tipo  de  célula  do  corpo  humano  contém  um  conjunto  específico  de  receptores  de  membrana  que  lhes possibilita  responder  a  um  conjunto  complementar  de  moléculas  de  sinalização  de  uma  maneira  específica,  pré­ programada. Estas proteínas não são componentes estáticos da membrana celular; elas aumentam ou diminuem em número,  de  acordo  com  as  necessidades  da  célula.  Quando  há  um  número  excessivo  de  mensageiros  químicos,  a quantidade  de  receptores  ativos  diminui,  em  um  processo  denominado  regulação descendente  (down­regulation); quando  ocorre  uma  deficiência  de  mensageiros,  o  número  de  receptores  ativos  aumenta,  em  um  processo denominado regulação infrarregular (up­regulation).  Existem  três  classes  conhecidas  de  proteínas  atuantes  como receptores de membrana celular: acoplados à proteína G, acoplados a enzimas e acoplados aos canais iônicos.6 Receptores  acoplados  à  proteína  G.  Com  mais  de  1.000  membros,  os  receptores  acoplados  à  proteína  G representam a maior família de receptores de membrana.6 Embora existam muitos mensageiros intercelulares, eles contam com a atividade intermediária de uma classe separada de proteínas reguladoras acopladas à membrana para converter  sinais  externos  (primeiro  mensageiro)  em  sinais  internos  (segundo  mensageiro).  Como  essas  proteínas reguladoras  se  ligam  a  nucleotídios  de  guanina,  como  guanina  difosfato  (GDP)  e  guanina  trifosfato  (GTP),  são denominadas  proteínas  G.  Os  receptores  acoplados  à  proteína  G  fazem  a  mediação  de  respostas  celulares  para diversos  tipos  de  primeiros  mensageiros,  incluindo  proteínas,  pequenos  peptídios,  aminoácidos  e  derivados  de ácidos graxos como as prostaglandinas.6 Embora  existam  diferenças  entre  os  receptores  acoplados  à  proteína  G,  todos  compartilham  uma  série  de características.9 Todos eles têm um componente receptor extracelular de ligação do ligante, que funciona como um discriminador  de  sinal  ao  reconhecer  um  primeiro  mensageiro  específico;  e  todos  eles  passam  por  mudanças  de conformação com o receptor de ligação que ativa a proteína G (Figura 4.10). Todas as proteínas G se localizam no lado do citoplasma da membrana celular, e todas incorporam o ciclo de GTPase, que funciona como um interruptor molecular existente em dois estados. No estado ativado (ligado), a proteína G mostra alta afinidade com GTP e, no estado inativado (desligado), liga­se a GDP.6

Figura 4.10 • Ativação de um receptor acoplado à proteína G e produção de adenosina monofosfato cíclico (cAMP). A  ligação  com  um  hormônio  (primeiro  mensageiro)  faz  com  que  o  receptor  ativado  possa  interagir  com  o  conjunto inativo GDP acoplado à proteína G. Isto resulta na ativação da proteína G e na dissociação desta em subunidades α,  b  e  γ.  A  subunidade  da  proteína  G  alfa  ativada  pode  então  interagir  e  ativar  a  proteína  da  membrana adenilciclase  para  catalisar  a  conversão  de  adenosina  trifosfato  (ATP)  para  o  segundo  mensageiro  cAMP.  O segundo mensageiro, então, ativa um efetor interno, que leva à resposta celular.

No  nível  molecular,  as  proteínas  G  são  heterotriméricas  (ou  seja,  têm  três  subunidades)  (ver  Figura 4.10).7 As três  subunidades  são  designadas  como  alfa  (α),  beta  (β)  e  gama  (γ). A  subunidade  α  pode  se  ligar  tanto  a  GDP quanto  a  GTP  e  contém  atividade  GTPase.  GTPase  é  uma  enzima  que  converte  GTP,  com  os  seus  três  grupos fosfato, em GDP, com dois grupos fosfato.7 Quando  GDP  está  ligado  à  subunidade  α,  a  proteína  G  está  inativa;  quando  GTP  é  ligado,  torna­se  ativa.  A proteína  G  ativada  tem  atividade  GTPase;  por  fim,  o  GTP  ligado  é  hidrolisado  para  GDP,  e  a  proteína  G  reverte para o estado inativo. A ativação do receptor faz com que a subunidade α se dissocie do receptor e das subunidades β  e  γ  e  transmita  o  sinal  a  partir  do  primeiro  mensageiro  à  sua  proteína  efetora.  Muitas  vezes,  o  efetor  é  uma enzima que converte uma molécula precursora inativa em um segundo mensageiro, que se difunde no citoplasma e transporta  o  sinal  para  além  da  membrana  celular.  Um  segundo  mensageiro  comum  é  a  adenosina  monofosfato cíclico (cAMP). Ele é ativado pela enzima adenililciclase, que produz o cAMP pela transferência de grupos fosfato do ATP  para  outras  proteínas. 7  Esta  transferência  altera  a  conformação  e  o  funcionamento  destas  proteínas.  Essa alteração  produz  a  resposta  celular  para  o  primeiro  mensageiro,  seja  uma  secreção,  contração  ou  relaxamento muscular  ou  uma  mudança  no  metabolismo.  Às  vezes,  é  a  abertura  de  canais  de  membrana  envolvidos  com  o influxo de cálcio ou de potássio.

Receptores  acoplados  a  enzimas.  Tal  como  os  receptores  acoplados  à  proteína  G,  os  receptores  acoplados  a enzimas  são  proteínas  transmembranares  com  local  de  ligação  ao  ligante  na  superfície  exterior  da  membrana celular.6  Em  vez  de  ter  um  domínio  citosólico  que  se  associe  a  uma  proteína  G,  seu  domínio  citosólico  pode  ter atividade enzimática intrínseca ou estar associado diretamente a uma enzima. Existem diversas classes de receptores acoplados à enzima, incluindo aqueles que ativam ou que têm atividade tirosinoquinase. Os receptores acoplados a enzimas medeiam respostas celulares, como fluxo de cálcio, aumento da troca de íons sódio­potássio e estimulação da absorção de glicose e aminoácidos. A insulina, por exemplo, atua por ligação a um receptor de membrana com atividade de tirosinoquinase. As  cascatas  de  sinalização  geradas  pela  ativação  dos  receptores  de  tirosinoquinase  também  estão  envolvidas  no funcionamento de fatores de crescimento. Como seu nome sugere, muitos fatores de crescimento são mensageiros importantes na sinalização de reposição e crescimento celular. A maioria dos fatores de crescimento pertence a um dos três grupos: fatores que promovem a multiplicação e desenvolvimento de diversos tipos de células (p. ex., fator de crescimento epidérmico e fator de crescimento endotelial vascular); citocinas, que são importantes na regulação do sistema imunológico e fatores estimuladores de colônias, que regulam a proliferação e maturação de leucócitos e hemácias.  Todos  os  fatores  de  crescimento  funcionam  acoplando­se  a  receptores  específicos  que  fornecem  sinais para as células­alvo. Estes sinais têm dois efeitos genéricos: estimulam a transcrição de diversos genes que não se manifestam  nas  células  em  repouso,  e  regulam  a  entrada  de  células  no  ciclo  celular  e  sua  passagem  pelo  ciclo celular. Receptores  acoplados  aos  canais  iônicos.  Os  receptores  acoplados  a  canais  de  íons  estão  envolvidos  na sinalização sináptica rápida entre células eletricamente excitáveis.6 Diversos neurotransmissores fazem a mediação deste tipo de sinalização por abrir ou fechar transitoriamente os canais iônicos formados por proteínas integrais da membrana  celular.  Este  tipo  de  sinalização  está  envolvido  na  transmissão  dos  impulsos  em  células  nervosas  e musculares.

Receptores intracelulares Alguns mensageiros, como o hormônio da tireoide e hormônios esteroides, não se ligam a receptores de membrana, mas se movem diretamente através da camada lipídica da membrana celular e são transportados para o núcleo, onde influenciam a atividade do DNA. Muitos destes hormônios se ligam a um receptor citoplasmático, e esse complexo hormônio­receptor  é  transportado  para  o  núcleo.  No  núcleo,  o  complexo  hormônio­receptor  se  liga  ao  DNA, aumentando  a  transcrição  de  mRNA.  O  mRNA  é  traduzido  nos  ribossomos,  com  a  produção  de  quantidades crescentes de proteínas que alteram a função celular.7

Ciclo celular e divisão celular O ciclo de vida de uma célula é denominado ciclo celular. Normalmente é dividido em cinco fases: 1. 2. 3. 4. 5.

G0 G1 S G2 M (Figura 4.11).

G0 é a fase em que a célula pode deixar o ciclo celular e permanecer em um estado de inatividade ou reentrar no ciclo em outro momento. G1 é a fase durante a qual a célula começa a se preparar para a mitose por meio da síntese de DNA e proteínas e do aumento de organelas e elementos do citoesqueleto. A fase S é a fase de síntese, durante a qual ocorre a duplicação do DNA e os centríolos começam a se replicar. G2 é a fase pré­mitótica e é semelhante a G1 em termos de atividade de síntese de RNA e proteínas. A fase M é a fase durante a qual ocorre a mitose celular.9 Os  tecidos  podem  ser  compostos  principalmente  de  células  quiescentes  em  G0,  mas  a  maioria  deles  contém  uma combinação de células em movimento contínuo ao longo do ciclo celular e células quiescentes, que ocasionalmente entram  no  ciclo  celular.  Células  que  não  sofrem  divisão,  como  neurônios  e  células  da  musculatura  esquelética  e cardíaca, deixaram o ciclo celular e não são capazes de divisão mitótica durante a vida pós­natal.9

Figura  4.11  •  Ciclo  celular.  G0,  célula  sem  divisão;  G1,  crescimento  celular;  S,  replicação  do  DNA;  G2,  síntese  de proteínas; M, mitose. (Extraída de Wingerd B. (2014). The Human Body. Concepts of anatomy and physiology  (3rd ed). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

A  divisão  celular,  ou  mitose,  é  o  processo  em  que  uma  célula­mãe  se  divide  e  cada  célula­filha  recebe  um cariótipo cromossômico idêntico ao da célula­mãe.9 A divisão celular fornece ao organismo um meio de substituir as células que têm vida útil limitada, como as células da pele e do sangue, aumentando a massa de tecido durante os períodos de crescimento e promovendo reparação tecidual e cicatrização de feridas.

Você se lembra de Jennifer, a recém-nascida do estudo de caso que abre esta Parte? Quando crianças nascem com características

fenotípicas especí唀cas, como tônus muscular fraco, depressão da ponte nasal, per唀l achatado e olhos amendoados oblíquos e

virados para cima, realiza-se um cariótipo. Os resultados indicam positivo para trissomia do cromossomo 21.

A mitose é um processo dinâmico e contínuo. É dividido em quatro fases: prófase, metáfase, anáfase e telófase (Figura 4.12). A  fase  durante  a  qual  a  célula  não  está  se  dividindo  é  denominada  interfase. Durante a prófase, os cromossomos  se  tornam  visíveis  devido  ao  encurtamento  do  DNA;  os  dois  centríolos  se  replicam  e  cada  par  se desloca  para  cada  um  dos  polos  da  célula.  Simultaneamente,  os  microtúbulos  do  fuso  mitótico  aparecem  entre  os

dois pares de centríolos. Mais tarde, na prófase, o envoltório nuclear e o nucléolo desaparecem. A  metáfase envolve a organização dos pares de cromossomos na linha média da célula e a formação de um fuso mitótico composto de microtúbulos.  Anáfase  é  o  período  durante  o  qual  ocorre  a  separação  dos  pares  de  cromossomos,  com  os microtúbulos  puxando  um  braço  de  cada  par  de  46  cromossomos  em  direção  ao  polo  oposto  da  célula. A  divisão celular ou citocinese termina após a telófase, fase em que o fuso mitótico desaparece e um novo envoltório nuclear se desenvolve e engloba cada conjunto completo de cromossomos.9 A divisão celular é controlada por alterações nas concentrações e atividades de três principais grupos de proteínas intracelulares: 1. Ciclinas 2. Quinases dependentes da ciclina (CDK) 3. Complexo promotor de anáfase.9 Os  principais  componentes  do  sistema  de  controle  do  ciclo  celular  são  as  CDK,  cuja  atividade  depende  de  sua associação às unidades reguladoras, chamadas ciclinas. Oscilações na atividade das diferentes CDK levam ao início das diferentes fases do ciclo celular. A divisão celular também é controlada por diversos fatores externos, incluindo a  existência  de  citocinas,  diversos  fatores  de  crescimento,  ou  mesmo  fatores  de  adesão,  quando  a  célula  está associada a outras células de um tecido.9

Figura  4.12  •  Mitose  celular.  (Extraída  de  McConnell  T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function: Essentials of anatomy & physiology (p. 79). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Metabolismo celular e fontes de energia Energia  é  a  capacidade  de  realizar  trabalho.  As  células  utilizam  oxigênio  para  transformar  os  produtos  de degradação dos alimentos que ingerimos na energia necessária para realizar contração muscular, transporte de íons e outras  moléculas  através  das  membranas  celulares  e  síntese  de  enzimas,  hormônios  e  outras  macromoléculas. Metabolismo energético diz respeito aos processos pelos quais as gorduras, proteínas e carboidratos nos alimentos

que ingerimos são convertidos em energia ou fontes de energia complexas na célula. Catabolismo e anabolismo são as  duas  fases  do  metabolismo.  Catabolismo  consiste  na  quebra  de  nutrientes  armazenados  e  de  tecidos  orgânicos para produção de energia. Anabolismo é um processo construtivo em que moléculas mais complexas são formadas a partir de moléculas mais simples. O transportador especial de energia celular é o ATP. As moléculas de ATP são constituídas por adenosina, uma base nitrogenada; ribose, um açúcar de cinco carbonos; e três grupos fosfato (Figura 4.13). Os grupos fosfato são unidos  por  duas  ligações  de  alta  energia.9  São  liberadas  grandes  quantidades  de  energia  livre  quando  o  ATP  é hidrolisado para formar adenosina difosfato (ADP), uma molécula de adenosina que contém dois grupos fosfato. A energia livre liberada a partir da hidrólise do ATP é utilizada para conduzir reações que requerem energia livre. No organismo,  utilizamos  a  energia  proveniente  de  alimentos  para  converter ADP  em ATP.  Como  a  energia  pode  ser “armazenada ou gasta” pelo ATP, esta molécula é muitas vezes denominada a moeda de energia celular.

Figura 4.13 • O ATP é a principal fonte de energia celular.  A. Cada molécula de ATP contém duas ligações de alta energia, cada uma com aproximadamente 12 kcal de energia potencial. B. As ligações de alta energia da molécula de ATP  estão  em  fluxo  constante.  São  geradas  por  metabolismo  de  substrato  (glicose,  aminoácidos  e  gordura)  e consumidas de acordo com o gasto energético.

A transformação de energia acontece dentro da célula por meio de dois processos de produção de energia: a via glicolítica anaeróbica (ou seja, sem oxigênio), que ocorre no citoplasma; e a via aeróbica (i. e., com oxigênio), que se dá nas mitocôndrias. A via glicolítica anaeróbica funciona como uma introdução importante para a via aeróbica. As  duas  vias  envolvem  reações  de  oxidação­redução,  com  um  doador  de  elétrons,  que  é  oxidado  na  reação,  e  um receptor  de  elétrons,  que  sofre  redução.  No  metabolismo  energético,  os  produtos  de  degradação  de  carboidratos,

gordura  e  proteínas  cedem  elétrons  e  são  oxidados,  e  as  coenzimas  NAD+  (nicotinamida  adenina  dinucleotídio)  e FAD (flavina adenina dinucleotídio) recebem os elétrons e sofrem redução.9

Metabolismo anaeróbico Glicólise  é  o  processo  pelo  qual  é  liberada  energia  a  partir  de  uma  molécula  de  glicose.  Este  é  um  importante processo  de  fornecimento  de  energia  para  células  que  não  têm  mitocôndria,  organela  celular  em  que  ocorre  o metabolismo  aeróbico.  Esse  processo  também  fornece  energia  em  situações  em  que  o  aporte  de  oxigênio  para  a célula é retardado ou deficiente. A glicólise envolve uma sequência de reações que convertem glicose em piruvato, com a produção concomitante de ATP a partir de ADP. O ganho líquido de energia pela glicólise de uma molécula de  glicose  é  de  duas  moléculas  de ATP.  Embora  comparativamente  ineficiente  quanto  ao  rendimento  energético,  a via  glicolítica  é  importante  durante  períodos  em  que  existe  redução  no  fornecimento  de  oxigênio,  como  ocorre  no músculo esquelético durante os primeiros minutos de exercícios físicos. A  glicólise  requer  a  existência  de  NAD+.  Os  importantes  produtos  finais  da  glicólise  são  piruvato  e  NADH  (a forma reduzida de NAD+), mais H+. Quando há oxigênio, o piruvato é deslocado para a via mitocondrial aeróbica e o NADH + H+ entrega seu elétron e próton (H+) para o sistema oxidativo de transporte de elétrons.9 A transferência de elétrons de NADH + H+ para o sistema de transporte de elétrons possibilita o processo glicolítico a continuar por facilitar  a  regeneração  de  NAD+.  Em  condições  anaeróbicas,  como  em  casos  de  parada  cardíaca  ou  choque circulatório, o piruvato é convertido em ácido láctico, que se difunde para fora das células até o líquido extracelular. A  conversão  do  piruvato  em  ácido  láctico  é  reversível,  e,  depois  de  restaurado  o  suprimento  de  oxigênio,  o  ácido láctico é novamente convertido em piruvato e utilizado diretamente para produzir energia ou para sintetizar glicose. Grande parte da conversão do ácido láctico dá­se no fígado, mas uma pequena quantidade pode ser formada em outros tecidos. O fígado remove o ácido láctico da circulação sanguínea e o converte em glicose, em um processo denominado  gliconeogênese.  Esta  glicose  é  liberada  na  corrente  sanguínea  para  ser  novamente  utilizada  pelos músculos  ou  pelo  sistema  nervoso  central  (SNC).  O  músculo  cardíaco  também  é  eficiente  na  conversão  de  ácido láctico  em  ácido  pirúvico  e,  em  seguida,  usa  o  ácido  pirúvico  como  combustível.  O  ácido  pirúvico  é  uma  fonte particularmente importante de combustível para o coração durante a prática de exercícios físicos intensos, quando a musculatura esquelética está produzindo grandes quantidades de ácido láctico e liberando na corrente sanguínea.

Metabolismo aeróbico O metabolismo aeróbico ocorre na mitocôndria da célula e envolve o ciclo do ácido cítrico e a cadeia de transporte de  elétrons.  É  aqui  que  os  compostos  de  carbono  existentes  nas  gorduras,  proteínas  e  carboidratos  da  nossa  dieta são  quebrados  e  seus  elétrons  combinados  com  o  oxigênio  molecular,  para  formar  dióxido  de  carbono  e  água,  à medida que a energia é liberada. Ao contrário do ácido láctico, que é um produto final do metabolismo anaeróbico, o dióxido de carbono e a água são geralmente inofensivos e facilmente eliminados pelo organismo. Em um período de 24 h, o metabolismo oxidativo produz entre 300 e 500 mℓ de água.9 O ciclo do ácido cítrico, também denominado ciclo do ácido tricarboxílico (TCA) ou ciclo de Krebs, oferece a via  final  comum  para  o  metabolismo  dos  nutrientes.  No  ciclo  do  ácido  cítrico,  que  tem  lugar  na  matriz mitocondrial,  a  molécula  com  dois  carbonos  ativados  de  acetil­coenzima­A  (acetil­CoA)  se  condensa  com  a molécula  de  quatro  carbonos  do  ácido  oxalacético  e  se  desloca  por  várias  etapas  mediadas  por  enzimas.7  Este processo produz átomos de hidrogênio e dióxido de carbono. À medida que o hidrogênio é gerado, ele se combina com NAD+  ou  FAD  para  ser  transferido  para  o  sistema  de  transporte  de  elétrons.  No  ciclo  do  ácido  cítrico,  cada uma  das  duas  moléculas  de  piruvato,  formadas  no  citoplasma  a  partir  de  uma  molécula  de  glicose,  produz  outra molécula de ATP, juntamente com duas moléculas de dióxido de carbono e oito elétrons, que são cedidos para três moléculas de NADH + H+ e uma molécula de FADH2. Além do piruvato proveniente da glicólise de moléculas de glicose,  outros  produtos  de  degradação  de  aminoácidos  e  ácidos  graxos  entram  no  ciclo  do  ácido  cítrico  para contribuir com a geração de ATP.7 O  metabolismo  oxidativo,  que  fornece  90%  das  necessidades  de  energia  do  organismo,  tem  lugar  na  cadeia  de transporte  de  elétrons  na  mitocôndria.7  A  cadeia  de  transporte  de  elétrons  oxida  NADH  +  H +  e  FADH2  e  cede elétrons  para  o  oxigênio,  que  se  reduz  a  uma  molécula  de  água. A  energia  produzida  pela  redução  do  oxigênio  é utilizada para a fosforilação de ADP em ATP. Como a formação de ATP envolve a adição de uma ligação de fosfato

de alta energia na molécula de ADP, muitas vezes este processo é denominado fosforilação oxidativa.7 Entre  os  membros  da  cadeia  de  transporte  de  elétrons  encontram­se  diversas  moléculas  que  contêm  ferro, denominadas citocromos. Cada citocromo é uma proteína com uma estrutura heme semelhante à da hemoglobina. O último  complexo  de  citocromo  é  a  citocromo­oxidase,  que  cede  elétrons  do  citocromo  c  para  o  oxigênio.  A citocromo­oxidase  tem  afinidade  de  ligação  com  o  oxigênio  mais  baixa  que  a  mioglobina  (o  transportador intracelular  de  oxigênio  que  contém  heme)  ou  a  hemoglobina  (o  transportador  de  oxigênio  que  contém  heme  nas hemácias). Assim,  o  oxigênio  é  retirado  de  hemácias  da  mioglobina,  e  da  mioglobina  para  a  citocromo­oxidase, onde é reduzido a H2O.7 Embora a anemia por deficiência de ferro seja caracterizada pela diminuição dos níveis de hemoglobina,  os  citocromos  com  ferro  na  cadeia  de  transporte  de  elétrons  em  tecidos  como  os  da  musculatura esquelética também são afetados. Desse modo, a fadiga que se desenvolve nos casos de anemia por deficiência de ferro resulta, em parte, do comprometimento da cadeia de transporte de elétrons.

Compreenda

Metabolismo celular

Metabolismo celular é o processo que converte o combustível alimentar na forma de carboidratos, proteínas e gorduras em ATP, que fornece a

energia necessária ao funcionamento celular. ATP é formado por três vias principais: (1) via glicolítica, (2) ciclo do ácido cítrico e (3) cadeia de

transporte de elétrons. Em seu metabolismo, que é uma reação de oxidação-redução, o combustível cede elétrons e é oxidado, e as coenzimas

+

NAD

e FAD recebem elétrons e são reduzidas.

Via glicolítica A glicólise, que ocorre no citoplasma da célula, envolve a quebra da molécula de glicose de seis carbonos em duas moléculas de três carbonos de

ácido pirúvico. Como a reação que divide a molécula de glicose exige a energia de duas moléculas de ATP, existe um ganho líquido de apenas

duas moléculas de ATP para cada molécula de glicose metabolizada. O processo é anaeróbico e não necessita de oxigênio (O ), nem produz 2

dióxido de carbono (CO ). Quando há O , o ácido pirúvico se desloca até a mitocôndria, onde entra no ciclo do ácido cítrico, que é um processo 2

2

aeróbico. Em condições anaeróbicas, o piruvato é convertido em ácido láctico, possibilitando que a glicólise continue como um meio para o

fornecimento de ATP para as células, mesmo na falta de O . 2

Ciclo do ácido cítrico Em condições aeróbicas, as duas moléculas de ácido pirúvico formadas pela via glicolítica entram na mitocôndria, em que cada uma se combina

com acetil-coenzima para formar acetilcoenzima A (acetil-CoA). A formação de acetil-CoA dá início às reações que ocorrem no ciclo do ácido

cítrico. Algumas reações liberam CO

2

e outras cedem elétrons do átomo de hidrogênio para NADH ou FADH. Além do ácido pirúvico formado pela

glicólise de glicose, produtos da degradação de ácidos graxos e aminoácidos também podem entrar no ciclo do ácido cítrico. Os ácidos graxos,

que são a principal fonte de combustível no corpo, são oxidados por um processo denominado ß-oxidação da acetil-CoA para que entrem no

ciclo do ácido cítrico.

Cadeia de transporte de elétrons Ao 唀nal do ciclo do ácido cítrico, cada molécula de glicose produziu quatro novas moléculas de ATP (duas da glicólise e duas do ciclo do ácido

cítrico). Na verdade, a função principal destas fases anteriores é fazer com que os elétrons (e–) da glicose e de outros substratos da dieta 唀quem

disponíveis para oxidação. A oxidação dos elétrons transportados por NADH e FADH

2

é realizada por meio de uma série de reações catalisadas

+

por enzimas na cadeia de transporte de elétrons mitocondrial. Durante estas reações, prótons H

se combinam com O

2

para formar água (H O). 2

Grandes quantidades de energia são liberadas e utilizadas para adicionar um grupo fosfato de alta energia para converter a molécula de ADP em

ATP. A partir de uma molécula de glicose, o rendimento líquido é de 36 moléculas de ATP (2 da glicólise, 2 do ciclo do ácido cítrico e 32 da cadeia

de transporte de elétrons). Em geral, a quantidade de ATP formada a partir de cada grama de proteína metabolizada é menor que o rendimento

oferecido pela molécula de glicose, enquanto a quantidade de energia obtida a partir de gordura é maior (p. ex., cada molécula de ácido graxo

de 16 carbonos produz cerca de 129 moléculas de ATP).

Resumo

As células se comunicam umas com as outras por sistemas que utilizam mensageiros químicos. Em determinados tecidos, os mensageiros químicos se movem de uma célula para outra através de junções, sem penetrar o líquido extracelular.  Outros  tipos  de  mensageiros  químicos  se  acoplam  a  receptores  sobre  a  membrana  ou  próximos  à superfície  celular.  São  conhecidas  três  classes  de  proteínas  que  atuam  como  receptores  da  membrana  celular: receptores acoplados à proteína G; acoplados a enzimas e acoplados aos canais iônicos. Os receptores acoplados à proteína G dependem de uma classe de moléculas chamadas proteínas G, que funcionam como um interruptor que liga  e  desliga  para  converter  sinais  externos  (primeiro  mensageiro)  em  sinais  internos  (segundo  mensageiro). A sinalização  ligada  ao  canal  de  íon  é  mediada  por  neurotransmissores  que  transitoriamente  abrem  ou  fecham  os canais iônicos formados pelas proteínas membranares integrais. Os receptores acoplados a enzimas interagem com determinados hormônios peptídicos, como fatores de crescimento e insulina, e deflagram diretamente a atividade da enzima proteína intracelular tirosinoquinase. O ciclo de vida de uma célula é denominado ciclo celular. Geralmente é dividido em cinco fases: G0, ou fase de

repouso; G1, durante a qual a célula começa a se preparar para a divisão por meio de síntese de DNA e proteínas; S,  ou  fase  de  síntese,  durante  a  qual  ocorre  a  replicação  do  DNA;  G2,  que  representa  a  fase  pré­mitótica  e  é semelhante a G1 no que diz respeito à síntese de RNA e proteínas; e a fase M, na qual ocorre a divisão celular. A divisão celular, ou mitose, é o processo por meio do qual uma célula­mãe se divide em duas células­filhas, cada uma delas recebendo um par idêntico de cromossomos. O processo de mitose é dinâmico e contínuo e é dividido em quatro fases: prófase, metáfase, anáfase e telófase. Metabolismo  é  o  processo  pelo  qual  carboidratos,  gorduras  e  proteínas  provenientes  dos  alimentos  que ingerimos  são  quebrados  e,  posteriormente,  convertidos  na  energia  necessária  para  o  funcionamento  celular.  A energia é convertida em ATP, a moeda de energia da célula. A conversão de energia pode ocorrer em dois locais no interior da célula: a via glicolítica anaeróbica no citoplasma e a via aeróbica nas mitocôndrias. A via mais eficiente é o ciclo do ácido cítrico, que é um processo aeróbico e a cadeia de transporte de elétrons na mitocôndria. Essa via requer oxigênio e produz dióxido de carbono e água como produtos finais. A via glicolítica no citoplasma envolve a degradação da glicose para formação de moléculas de ATP. Essa via pode funcionar sem oxigênio, produzindo ácido láctico.

Transporte através da membrana celular e potenciais de membrana

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Discutir os mecanismos de transporte de membrana associados a difusão, osmose, endocitose e exocitose e compará-los com mecanismos de transporte ativo

Descrever as bases para potenciais de membrana

A  membrana  celular  funciona  como  uma  barreira  que  controla  o  tipo  de  substância  que  pode  entrar  e  sair  da célula. Esta função de barreira possibilita que entre o material essencial para a função celular, excluindo aqueles que são  prejudiciais.  A  membrana  é  responsável  pela  diferença  na  composição  de  líquidos  intracelulares  e extracelulares.

Transporte de substâncias através da membrana celular Basicamente, o movimento através da membrana celular ocorre de duas maneiras: de maneira passiva, sem gasto de energia,  ou  ativamente,  utilizando  processos  que  consomem  energia. A  membrana  celular  também  pode  englobar uma partícula, formando uma vesícula revestida por membrana; esta vesícula revestida por membrana é transferida para o interior da célula por endocitose ou para fora da célula por exocitose.6

Transporte passivo O  transporte  passivo  de  partículas  ou  íons  através  da  membrana  celular  é  diretamente  influenciado  por  gradientes químicos ou elétricos e não depende de gasto de energia. A diferença entre o número de partículas nos dois lados da membrana  cria  um  gradiente  químico,  e  a  diferença  de  partículas  ou  íons  carregados  cria  um  gradiente  elétrico. Gradientes químicos e elétricos muitas vezes estão associados e são denominados gradientes eletroquímicos.7 Difusão. A  difusão  diz  respeito  ao  processo  pelo  qual  moléculas  e  outras  partículas  em  solução  se  dispersam  e alcançam uma concentração uniforme, como resultado da energia criada por movimento cinético espontâneo (Figura 4.14 A).  Eletrólitos  e  outras  substâncias  se  movem  de  uma  área  de  maior  concentração  para  uma  área  de  menor concentração. Nos íons, a difusão é afetada pela energia fornecida por sua carga elétrica.7 Moléculas lipossolúveis, como oxigênio, dióxido de carbono, álcool e ácidos graxos, se dissolvem na matriz lipídica da membrana celular e se difundem através da membrana, assim como ocorre difusão na água. Outras substâncias se difundem através de pequenos poros da membrana celular. A velocidade do movimento depende da quantidade de partículas disponível para  difusão  e  da  velocidade  do  movimento  cinético  das  partículas.  O  número  de  aberturas  na  membrana  celular, através das quais as partículas podem se mover, também determina a taxa de transferência. A temperatura altera o movimento  das  partículas;  quanto  maior  a  temperatura,  maior  é  o  movimento  térmico  das  moléculas.  Portanto,  a difusão aumenta proporcionalmente ao aumento da temperatura.

Figura  4.14  •  Mecanismos  de  transporte  de  membrana.  A.  Na  difusão,  as  partículas  se  movem  livremente  e  se distribuem igualmente por toda a superfície da membrana. B. Na osmose, partículas osmoticamente ativas regulam o  fluxo  de  água.  C.  A  difusão  facilitada  utiliza  um  sistema  de  carreadores.  D.  No  transporte  ativo,  moléculas selecionadas  são  transportadas  através  da  membrana,  com  o  uso  de  uma  bomba  acionada  por  energia  (Na+/K +­ ATPase). E.  Na  pinocitose,  a  membrana  forma  uma  vesícula  que  engloba  as  partículas  e  as  transporta  através  da membrana, onde é liberada.

Osmose. A maior parte das membranas celulares é semipermeável, no sentido em que são permeáveis à água, mas não  a  todas  as  partículas  de  soluto.  A  água  se  movimenta  através  de  canais  de  água  (aquaporinas)  em  uma membrana semipermeável ao longo de um gradiente de concentração, deslocando­se da área de maior concentração para a de menor concentração (ver Figura 4.14 B). Este processo é denominado osmose, e a pressão produzida pela água à medida que se move através da membrana é denominada pressão osmótica.7 A  osmose  é  regulada  pela  concentração  de  partículas  não  difundidas  nos  dois  lados  de  uma  membrana semipermeável.  Quando  existe  uma  diferença  na  concentração  de  partículas,  a  água  se  movimenta  a  partir  do  lado com  menor  concentração  de  partículas  e  maior  concentração  de  água  para  o  lado  com  a  maior  concentração  de partículas e baixa concentração de água. A circulação de água continua até que a concentração de partículas nos dois lados  da  membrana  seja  a  mesma  ou  até  que  a  pressão  hidrostática  (osmótica)  criada  pelo  movimento  da  água  se oponha ao fluxo. Difusão  facilitada.  A  difusão  facilitada  ocorre  com  o  auxílio  de  uma  proteína  de  transporte  desvinculada  do metabolismo  energético  (ver  Figura  4.14  C).  Algumas  substâncias,  como  a  glicose,  não  conseguem  atravessar  a membrana celular sem ajuda, porque não são lipossolúveis ou são muito grandes para passar através dos poros da membrana.  Estas  substâncias  se  combinam  com  proteínas  especiais  de  transporte  na  superfície  externa  da membrana, são transportadas através da membrana acopladas ao transportador e, em seguida, liberadas no interior da  membrana.  Na  difusão  facilitada,  uma  substância  pode  se  mover  somente  de  uma  área  de  maior  concentração para outra de menor concentração. A taxa com que a substância se move através da membrana por difusão facilitada depende da diferença de concentração entre os dois lados da membrana. Também é importante a disponibilidade de proteínas  de  transporte  e  a  rapidez  com  que  podem  se  ligar  e  depois  liberar  a  substância  a  ser  transportada. Acredita­se  que  a  insulina,  que  facilita  o  transporte  de  glicose  nas  células,  atue  aumentando  a  disponibilidade  dos transportadores de glicose na membrana celular.7

Transporte ativo e cotransporte Mecanismos  de  transporte  ativo  envolvem  gasto  de  energia.  O  processo  de  difusão  descreve  o  movimento  de partículas  de  uma  zona  de  maior  concentração  para  outra  de  menor  concentração,  resultando  em  uma  distribuição

igual  através  da  membrana  celular.  Entretanto,  algumas  vezes  é  necessário  que  haja  diferença  de  concentração  de uma  substância  contida  nos  líquidos  intracelulares  e  extracelulares.  Por  exemplo,  o  funcionamento  da  célula necessita  de  uma  concentração  mais  elevada  de  íons  potássio  em  seu  interior  do  que  a  quantidade  existente  no líquido extracelular e, ao mesmo tempo, deve manter uma concentração intracelular mais baixa de íons sódio do que a do líquido extracelular. Em situações como essa, é necessário o gasto de energia para bombear os íons contra o gradiente  de  concentração.  Quando  as  células  usam  energia  para  a  movimentação  de  íons  contra  um  gradiente elétrico ou químico, o processo é denominado transporte ativo.7 O sistema de transporte ativo mais estudado é o da bomba de sódio­potássio (Na+/K+)­ATPase (ver Figura 4.14 D).  Esta  bomba  transporta  sódio  do  meio  celular  para  a  região  extracelular;  também  faz  o  transporte  de  potássio para  o  interior  da  célula.9 A  energia  empregada  para  bombear  sódio  para  fora  e  potássio  para  dentro  da  célula  é obtida  por  meio  da  quebra  da  ligação  do  grupo  fosfato  de  alta  energia  e  da  liberação  de  energia  a  partir  de  uma molécula de ATP pela enzima ATPase. Se não fosse a atividade da bomba (Na +/K+)­ATPase, as partículas de sódio osmoticamente  ativas  se  acumulariam  na  célula,  causando  edema  celular  devido  ao  influxo  de  água  que acompanharia o processo. Existem  dois  tipos  de  sistemas  de  transporte  ativo:  transporte  ativo  primário  e  transporte  ativo  secundário.  No transporte ativo primário, a fonte de energia (p. ex., ATP) é utilizada diretamente no transporte de uma substância. Mecanismos  de  transporte  ativo  secundário  aproveitam  a  energia  derivada  do  transporte  ativo  primário  de  uma substância, geralmente sódio, para o cotransporte de uma segunda substância. Por exemplo, quando os íons sódio são levados para fora da célula por transporte ativo primário, cria­se um alto gradiente de concentração (i. e., alta concentração  do  lado  de  fora  e  baixa  concentração  do  lado  de  dentro).  Este  gradiente  de  concentração  representa uma grande reserva de energia, porque os íons sódio estão sempre tentando se difundir para o interior da célula. De modo  semelhante  à  difusão  facilitada,  os  mecanismos  de  transporte  secundário  utilizam  proteínas  de  transporte. Estas proteínas têm dois locais de ligação, um para o sódio e o outro para o transporte secundário de substâncias. Os sistemas de transporte secundário são classificados em dois grupos: sistemas de cotransporte ou simporte, em que  o  íon  sódio  e  o  soluto  são  transportados  na  mesma  direção,  e  sistemas  de  contratransporte ou antiporte, em que  o  íon  sódio  e  o  soluto  são  transportados  em  direções  opostas  (Figura  4.15).9  Um  exemplo  de  cotransporte ocorre no intestino delgado, onde a absorção de glicose e aminoácidos é associada ao transporte de sódio.

Endocitose e exocitose Endocitose  é  o  processo  pelo  qual  as  células  engolfam  matéria  de  seus  arredores.  Inclui  pinocitose  e  fagocitose. Pinocitose  envolve  a  ingestão  de  pequenas  partículas  de  sólidos  ou  líquidos.  As  partículas  são  envoltas  em pequenas  vesículas  de  membrana  para  serem  transportadas  para  o  citoplasma.  O  processo  de  pinocitose  é importante no transporte de proteínas e soluções de eletrólitos fortes (ver Figura 4.14 E).6 Fagocitose significa literalmente o “comer celular” e pode ser comparado com pinocitose, que significa o “beber celular”. O processo envolve engolfar e depois destruir ou degradar microrganismos ou outras partículas. Durante a fagocitose, uma partícula entra em contato com a superfície celular e é envolta por todos os lados pela membrana celular,  formando  uma  vesícula  fagocítica  ou  fagossomo.  Depois  de  formado,  o  fagossomo  se  desprende  da membrana  da  célula  e  se  desloca  para  o  citoplasma,  onde,  posteriormente,  funde­se  com  um  lisossomo;  isso possibilitará ao material ingerido ser degradado por enzimas lisossomais. Determinadas células, como macrófagos e leucócitos  polimorfonucleares  (neutrófilos),  são  hábeis  em  engolir  e  descartar  organismos  invasores,  células danificadas e constituintes extracelulares desnecessários.6

Figura 4.15 • Sistemas secundários de transporte ativo. A. Simporte ou cotransporte, carrega o soluto transportado (S)  na  mesma  direção  que  a  de  íons  sódio  (Na+).  B. Antiporte  ou  contratransporte  carrega  o  soluto  e  os  íons  Na + em direções opostas.

Endocitose  mediada  por  receptores  envolve  a  ligação  de  substâncias,  como  lipoproteínas  de  baixa  densidade,  a um receptor na membrana celular. A associação do ligante ( i. e., substância de alta afinidade com um receptor) ao seu receptor resulta no acúmulo de receptores, normalmente bem distribuídos, em vesículas revestidas por clatrina. A agregação de proteínas específicas no lado citoplasmático da vesícula causa uma invaginação para fora, formando uma vesícula revestida de clatrina capaz de transportar o ligante e seu receptor para a célula.6,9 Exocitose  é  o  mecanismo  de  secreção  de  substâncias  intracelulares  para  o  espaço  extracelular.  É  um  processo inverso ao da endocitose, em que um grânulo de secreção se funde ao lado de dentro da membrana celular, onde é criada uma abertura. Esta abertura possibilita que o conteúdo do grânulo seja liberado para o líquido extracelular. A exocitose  é  importante  na  remoção  de  detritos  celulares  e  liberação  de  substâncias,  como  hormônios  sintetizados pela célula.6 Durante  a  endocitose,  porções  da  membrana  celular  transformam­  se  em  uma  vesícula  endocítica.  Durante  a exocitose,  a  membrana  vesicular  é  incorporada  à  membrana  plasmática.  Desta  maneira,  as  membranas  celulares podem ser conservadas e reutilizadas.6

Canais iônicos A  carga  elétrica  de  pequenos  íons  como  sódio  e  potássio  dificulta  o  transporte  através  da  camada  lipídica  da

membrana celular. No entanto, para muitos tipos de funções celulares, como a atividade nervosa, é necessário que esses íons se movimentem rapidamente. Isso é conseguido por difusão facilitada através de canais iônicos seletivos. Canais de íons são proteínas integrais distribuídas por toda a membrana celular e normalmente são constituídos por diversos polipeptídios ou subunidades de proteínas que formam um sistema de portas. Estímulos específicos fazem com  que  as  subunidades  da  proteína  sejam  submetidas  a  mudanças  em  sua  conformação  para  formar  um  canal aberto ou porta, através do qual os íons podem se movimentar (Figura 4.16). Desta maneira, os íons não precisam atravessar a porção lipossolúvel da membrana, mas podem permanecer na solução aquosa que preenche o canal de íons. Esses canais iônicos são altamente seletivos; alguns possibilitam apenas a passagem de íons sódio, e outros são  seletivos  para  íons  potássio,  cálcio  ou  cloreto.  Interações  específicas  entre  os  íons  e  os  lados  do  canal  têm condições  de  produzir  uma  taxa  extremamente  rápida  de  movimentação  dos  íons.  Por  exemplo,  os  canais  de  íons podem ficar carregados negativamente, promovendo a rápida circulação de íons carregados positivamente.9 A  membrana  plasmática  contém  dois  grupos  básicos  de  canais  iônicos:  canais  de  fuga  e  canais  com  portas. Canais  de  fuga  permanecem  abertos  mesmo  sem  estimulação,  enquanto  canais  com  portas  abrem  e  fecham  em resposta  a  estímulos  específicos.  Existem  três  tipos  principais  de  canais  com  portas  na  membrana  plasmática: canais dependentes de voltagem, com canais operados eletricamente, que se abrem quando o potencial de membrana é  alterado  para  além  de  determinado  ponto;  canais  dependentes  de  ligantes,  que  são  operados  quimicamente  e respondem  a  um  receptor  de  ligante  específico,  como  o  neurotransmissor  acetilcolina;  e  canais  com  portas operados mecanicamente, que abrem ou fecham em resposta a estímulos mecânicos, como vibrações, retesamento do tecido ou pressão (ver Figura 4.16).9

Potenciais de membrana Existem potenciais elétricos através das membranas da maioria das células do organismo. Como estes potenciais se manifestam no nível da membrana celular, são denominados potenciais de membrana.6 Em tecidos excitáveis, como os formados por células musculares ou nervosas, é necessário que haja alterações no potencial de membrana, para a geração  e  condução  dos  impulsos  nervosos  e  da  contração  muscular.  Em  outros  tipos  de  células,  como  as glandulares, alterações no potencial da membrana contribuem para a secreção de hormônios e outras funções. Potenciais elétricos, medidos em volts (V), descrevem a capacidade de trabalho de cargas elétricas separadas de polaridade oposta (+ e –). A diferença de potencial é a diferença entre as cargas separadas. Os termos  diferença de potencial e voltagem são sinônimos.6 A voltagem sempre é medida em relação a dois pontos em um sistema. Por exemplo, a voltagem da bateria de carro (6 ou 12 V) é a diferença de potencial entre  os dois terminais da bateria. Como a quantidade total de carga possível de ser separada por uma membrana biológica é pequena, a diferença de potencial também pequena é medida em milivolts (mV), ou a milésima parte de um volt. A diferença de potencial através da membrana celular pode ser medida pela inserção de um eletrodo muito fino na célula e outro no líquido extracelular  que  circunda  a  célula,  ligando­se  os  dois  eletrodos  a  um  voltímetro.  O  movimento  de  cargas  entre  os dois  pontos  é  chamado  corrente.  Isso  ocorre  quando  foi  estabelecida  uma  diferença  de  potencial  e  feita  uma conexão, de tal modo que partículas carregadas podem passar entre os dois pontos.

Figura  4.16  •  Canais  iônicos  que  se  abrem  em  resposta  a  um  estímulo  específico.  A.  Canais  dependentes  de voltagem  são  controlados  por  mudanças  no  potencial  de  membrana.  B.  Canais  dependentes  de  ligante  são controlados  pela  acoplagem  de  um  ligante  a  um  receptor.  C.  Canais  mecanicamente  controlados  são  os  que respondem a estímulos mecânicos, como alongamento, e frequentemente se conectam com o citoesqueleto.

Os  líquidos  extracelulares  e  intracelulares  são  soluções  eletrolíticas  que  contêm  aproximadamente  150  a  160 mmol/ℓ de íons carregados positivamente e uma concentração igual de íons carregados negativamente. Esses íons condutores de corrente são responsáveis pela geração e condução de potenciais de membrana. Normalmente, existe um pequeno excesso de íons carregados na superfície externa da membrana celular. Isso é representado por cargas positivas sobre o lado de fora da membrana e equilibrado por um número igual de cargas negativas no interior da membrana. Devido à espessura extremamente pequena da membrana celular, a acumulação destes íons sobre a membrana contribui para a criação de um potencial de repouso da membrana (PRM). O potencial de difusão descreve a voltagem gerada por íons que se difundem através da membrana celular. São necessárias  duas  condições  para  que  ocorra  um  potencial  de  membrana  por  difusão:  a  membrana  deve  ser seletivamente  permeável,  possibilitando  a  um  único  tipo  de  íon  se  difundir  através  dos  poros  da  membrana,  e  a concentração do íon que se difunde deve ser maior de um dos lados da membrana. Potencial de equilíbrio é aquele em  que  não  ocorre  movimentação  líquida  de  íons,  porque  as  forças  de  difusão  e  as  forças  elétricas  estão  em equilíbrio. Ao  utilizar  essa  fórmula,  geralmente  se  compreende  que  o  potencial  no  líquido  extracelular  fora  da  membrana permanece zero e que o potencial de Nernst está dentro da membrana.7 O sinal do potencial fica negativo (–) se um íon  positivo  se  difunde  do  interior  da  membrana  para  o  lado  de  fora,  e  fica  positivo  (+)  se  um  íon  carregado positivamente se difunde de fora para o interior da membrana.7 Em  repouso  ou  no  estado  de  não  excitação,  quando  a  membrana  é  altamente  permeável  ao  potássio,  a concentração de íons potássio no interior das células é aproximadamente 35 vezes maior do que no exterior. Devido ao alto gradiente de concentração existente através da membrana celular, os íons potássio tendem a se difundir para o exterior. Fazendo isso, levam suas cargas positivas com eles, tornando o interior negativo em relação ao exterior. Esta  nova  diferença  de  potencial  repele  o  movimento  adicional  para  fora  dos  íons  potássio  carregados positivamente.7  Diz­se  que  a  membrana  está  polarizada  durante  essa  fase  devido  a  um  potencial  de  membrana

negativo.  O  mesmo  fenômeno  sobrevém  durante  um  potencial  de  ação,  quando  a  membrana  se  torna  altamente permeável ao sódio, possibilitando que o íon de carga positiva seja difundido para o interior da célula. O influxo de íons  sódio  produz  uma  inversão  no  PRM  normal  para  um  potencial  de  polaridade  oposta  (positivo  no  interior  e negativo no exterior). Isto é denominado despolarização.

Compreenda

Potenciais de membrana

Potenciais eletroquímicos se manifestam através das membranas de praticamente todas as células do organismo. Algumas células, como as

que compõem o tecido muscular e nervoso, são capazes de gerar rapidamente alterações nos impulsos elétricos, e estes impulsos são usados

para transmitir sinais ao longo das membranas. Em outras células, como células glandulares, os potenciais de membrana são usados para

sinalizar a liberação de hormônios ou para ativação de outras funções celulares. A geração de potenciais de membrana depende de (1) difusão

de íons condutores de corrente; (2) desenvolvimento de um equilíbrio eletroquímico; (3) estabelecimento de um PRM; e (4) de嘀agração de

potenciais de ação.

Potencial de difusão Potencial de difusão é a diferença de potencial gerada através da membrana quando um íon capaz de transporte de corrente, como íons

+

potássio (K

), se difunde em direção ao gradiente de concentração. São necessárias duas condições para que isso ocorra: (1) a membrana deve

ser seletivamente permeável para um íon em particular, e (2) a concentração do íon que se difunde deve ser maior de um dos lados da

membrana.

A magnitude do potencial de difusão, medida em milivolts, depende do tamanho do gradiente de concentração. O sinal (+ ou –) ou

+

polaridade do potencial depende do íon que está sendo difundido. É negativo no interior quando um íon carregado positivamente como K

difunde do interior para o exterior da membrana, levando sua carga consigo.

se

Potenciais de equilíbrio Potencial de equilíbrio é o potencial da membrana quando os dois 嘀uxos do íon são iguais em grandeza, mas opostos na direção da difusão

líquida de um íon quanto ao seu gradiente de concentração. À medida que um cátion se difunde em direção ao seu gradiente de concentração,

conduz

sua

carga

positiva

através

da

membrana,

gerando

uma

força

elétrica

que

acabará

por

retardar

e

impedir

sua

difusão.

Equilíbrio

eletroquímico é aquele em que forças químicas de atração e forças elétricas de repulsão estão exatamente equilibradas, de modo a impedir o

prosseguimento da difusão. O potencial de equilíbrio (FEM, força eletromotriz) pode ser calculado pela inserção das concentrações iônicas

interna e externa na equação de Nernst.

Potencial de repouso da membrana O PRM, necessário para que ocorra excitação elétrica, manifesta-se quando a célula não está transmitindo impulsos. Como a membrana em

+

repouso é permeável ao K

+

+

, isto é essencialmente um potencial de equilíbrio de K

. E pode ser explicado em termos do alto gradiente de

+

concentração de K

(p. ex., 140 mEq/l internamente e 4 mEq/l do lado de fora), o que faz com que o K

carregado positivamente seja difundido

para o exterior, deixando para trás ânions (A–) carregados negativamente, que não se difundem. Isso faz a membrana se tornar polarizada, com

+

cargas negativas alinhadas internamente e cargas positivas dispostas ao longo da superfície externa da membrana. A bomba de Na

+

remove três íons Na

+

do meio interno, enquanto devolve apenas dois íons K

+

/K

para o meio interno, contribui para a manutenção do PRM.

, que

Potenciais de ação Os potenciais de ação envolvem mudanças rápidas no potencial de membrana. Cada potencial de ação começa com uma súbita mudança no

+

PRM negativo para um potencial limiar positivo, causando abertura dos canais de membrana para os íons Na

+

ação). A abertura dos canais de Na

+

possibilita que grandes quantidades de íons Na

(ou outros íons do potencial de

carregados positivamente sejam difundidas no meio

interno da célula, fazendo o potencial de membrana sofrer uma despolarização ou uma troca rápida de carga positiva no interior e negativa no

+

exterior. Isto é rapidamente seguido pelo fechamento dos canais de Na

ao restabelecimento do PRM.

+

e pela abertura dos canais de K

+

, o que leva a um rápido e嘀uxo de K

e

Aplicação clínica

Equação de Nernst para o cálculo do potencial de equilíbrio Esta equação, conhecida como equação de Nernst, pode ser usada para calcular o potencial de equilíbrio (força eletromotriz [FEM] em milivolts [mV] de um íon monovalente em temperatura corporal de 37°C). FEM (mV) = – 61 × log10 (concentração interna de íons/ concentração externa de íons) Por exemplo, se a concentração de um íon no interior da membrana é de 100 mmol/ℓ e a concentração do lado de fora da membrana é de 10 mmol/l, a FEM (mV) necessária para este íon seria de – 61 × log10 (100/10 [log10 de 10 é 1]). Portanto, seriam necessários 61 mV de carga no interior da membrana para equilibrar o potencial de difusão criado pela diferença de concentração através da membrana para o íon. A  FEM  para  íons  potássio  utilizando  a  concentração  normal  intracelular  estimada  de  140  mmol/  e  a concentração extracelular normal de 4 mmol/ é de – 94 mV: – 94 mV = – 61 × log10 (140 mmol dentro/ 4 mmol fora) Este valor assume que a membrana é permeável apenas a íons potássio. Este valor se aproxima dos – 70 mV a –90 mV do potencial de repouso da membrana para fibras nervosas, medido em laboratório.

Quando uma membrana é permeável a diferentes íons, o potencial de difusão reflete a soma dos potenciais de equilíbrio para cada um dos íons.

Resumo

O  transporte  de  material  através  da  membrana  celular  é  essencial  para  a  sobrevivência  da  célula.  Difusão  é  um processo pelo qual substâncias como os íons se movem de uma área de maior concentração para outra de menor concentração.  Osmose  diz  respeito  à  difusão  de  moléculas  de  água  através  de  uma  membrana  semipermeável  ao longo  de  um  gradiente  de  concentração.  Difusão  facilitada  é  um  processo  passivo  no  qual  moléculas  que normalmente  não  são  capazes  de  atravessar  a  membrana  celular  podem  fazê­lo  com  o  auxílio  de  uma  molécula transportadora.  Outro  tipo  de  transporte,  denominado  transporte  ativo,  requer  um  gasto  de  energia  para movimentar  íons  contra  um  gradiente  de  concentração.  Existem  dois  tipos  de  transporte  ativo,  primário  e secundário,  e  ambos  requerem  proteínas  transportadoras.  A  bomba  de  Na +/K+­  ATPase  é  o  mecanismo  mais conhecido  de  transporte  ativo.  Endocitose  é  um  processo  pelo  qual  as  células  engolfam  matéria  do  meio circundante. Partículas pequenas são ingeridas por um processo denominado pinocitose, e partículas maiores são ingeridas por fagocitose. Algumas  partículas  necessitam  de  ligação  com  um  ligante,  e  o  processo  é  denominado endocitose  mediada  por  receptor.  Exocitose  envolve  a  remoção  de  partículas  de  grandes  dimensões  da  célula  e, essencialmente, é o inverso da endocitose. Canais de íons são proteínas integrais transmembranares distribuídas por toda a superfície da membrana celular e,  normalmente,  são  constituídos  por  polipeptídios  ou  subunidades  de  proteínas  que  formam  um  sistema  de abertura  e  fechamento.  Muitos  íons  podem  se  difundir  através  da  membrana  celular  apenas  se  ocorrerem alterações na conformação das proteínas da membrana que formam o canal de íons. Existem dois grupos básicos de canais de íons: canais de fuga e canais dependentes de ligante, voltagem e forças mecânicas. Existem potenciais eletroquímicos através das membranas da maioria das células do organismo. O PRM resulta da permeabilidade seletiva da membrana celular para íons potássio; da existência de ânions que não se difundem dentro  da  membrana  celular;  e  da  atividade  da  bomba  de  Na+/ K+­ATPase,  que  retira  íons  sódio  do  interior  da membrana e devolve íons potássio. Dois  fatores  principais  contribuem  para  a  geração  de  potenciais  de  membrana:  a  diferença  na  concentração  de íons dentro e fora da membrana e a permeabilidade da membrana. Potencial de equilíbrio ou potencial de difusão é aquele  em  que  não  ocorre  movimento  líquido  de  íons,  porque  existe  um  equilíbrio  exato  entre  difusão  e  forças elétricas.  O  PRM  (negativo  no  interior  e  positivo  no  exterior)  é  essencialmente  um  potencial  de  equilíbrio  de potássio,  que  resulta  da  permeabilidade  seletiva  da  membrana  ao  potássio  e  da  grande  diferença  na  concentração de íons potássio existente entre os compartimentos intracelulares e extracelulares. Durante o potencial de ação, a membrana  da  célula  fica  altamente  permeável  ao  sódio,  causando  sua  despolarização  e  invertendo  a  polaridade, tornando­a positiva no interior e negativa no exterior.

Tecidos orgânicos

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Explicar o processo de diferenciação celular, em termos de desenvolvimento de sistemas orgânicos no embrião e da regeneração contínua de tecidos na vida pós-

natal



Descrever as características dos quatro tipos diferentes de tecidos



Caracterizar a composição e a função dos componentes extracelulares do tecido

Nas seções anteriores, discutimos a célula individual, seus processos metabólicos e mecanismos de comunicação e de replicação. Embora as células sejam semelhantes, sua estrutura e função variam de acordo com as necessidades especiais  do  organismo.  Por  exemplo,  células  musculares  executam  funções  diferentes  das  realizadas  por  células epiteliais  ou  nervosas.  Grupos  celulares  intimamente  associados  em  sua  estrutura  com  funções  comuns  ou

semelhantes são denominados tecidos. Existem quatro tipos de tecido: 1. 2. 3. 4.

Epitelial Conjuntivo (tecido de suporte) Muscular Nervoso.

Estes  tecidos  não  existem  como  unidades  isoladas,  mas  em  associação  uns  aos  outros  e,  em  proporções variáveis,  formam  as  diferentes  estruturas  e  órgãos  do  corpo.  Esta  seção  oferece  uma  visão  geral  das  células  de cada um dos quatro tipos de tecido, das estruturas que as mantêm unidas e da matriz extracelular em que vivem.

Diferenciação celular Após  a  concepção,  o  óvulo  fertilizado  passa  por  uma  série  de  divisões  e,  finalmente,  forma  cerca  de  200  tipos diferentes  de  células.  A  formação  de  diferentes  tipos  de  células  e  sua  disposição  nos  diferentes  tecidos  é denominada  diferenciação  celular,  processo  controlado  por  um  sistema  de  ativação  e  desativação  de  genes.  As células embrionárias precisam se diferenciar para desenvolver os diversos sistemas orgânicos e devem permanecer diferenciadas  depois  que  desaparece  o  sinal  que  deflagrou  a  diversificação  celular.  O  processo  de  diferenciação  é controlado pela memória celular, mantida por meio de proteínas reguladoras contidas em cada membro individual de um  tipo  celular  particular. A  diferenciação  celular  também  envolve  a  ativação  sequencial  dos  diversos  genes  e  de seus produtos proteicos. Isso significa que, após a diferenciação, o tipo de tecido formado não pode mais reverter para uma fase anterior de diferenciação. O processo de diferenciação normalmente se move para frente, produzindo células  mais  especializadas  que  suas  predecessoras.1  Normalmente,  tipos  celulares  altamente  diferenciados,  como da musculatura esquelética e do tecido nervoso, perdem a capacidade de se submeter à divisão celular na vida pós­ natal. Embora  a  maioria  das  células  se  diferencie  em  tipos  celulares  especializados,  muitos  tecidos  contêm  poucas células  estaminais  que,  a  princípio,  são  apenas  parcialmente  diferenciadas.1  Estas  células  ainda  são  capazes  de divisão celular e funcionam como uma fonte de reserva de células especializadas durante toda a vida do organismo. São  a  fonte  principal  de  células  que  tornam  possível  a  regeneração  de  alguns  tecidos.  As  células­tronco  têm habilidades distintas para se diferenciar. Em certos tecidos, como no tecido muscular esquelético, falta um número suficiente  de  células  indiferenciadas  com  capacidade  limitada  de  regeneração.  As  células­tronco  do  sistema hematopoético (sangue) apresentam o maior potencial de diferenciação. Estas células têm potencial para reconstituir inteiramente  os  sistemas  sanguíneo  e  imunológico.  Constituem  o  principal  ingrediente  em  transplantes  de  medula óssea. Outras células estaminais, como as que fazem a reposição da superfície da mucosa do sistema digestório, são menos especializadas, mas ainda podem sofrer diferenciação.

Conceitos fundamentais

Organização das células em tecidos



Células com origem embrionária ou função semelhante frequentemente são organizadas em unidades funcionais maiores chamadas tecidos, e estes, por sua

vez, se associam a tecidos diferentes para formar os diversos órgãos do corpo



O tecido nervoso consiste em dois tipos de células, as células nervosas ou neurônios e as células da glia ou de suporte; tem distribuição por todo o organismo e

funciona como um sistema de comunicação orgânico. O sistema nervoso é dividido anatomicamente em SNC, que consiste no cérebro e na medula espinal, e o

sistema nervoso periférico (SNP), que é composto pelo tecido nervoso encontrado fora do SNC

Origem embrionária dos tecidos Todos os cerca de 200 tipos diferentes de células do corpo humano podem ser classificados em quatro tipos básicos ou  primários  de  tecidos:  epitelial,  conjuntivo,  muscular  e  nervoso  (Tabela 4.1).10  Estes  tipos  básicos  de  tecidos muitas vezes são descritos por sua origem embrionária. O embrião é, essencialmente, uma estrutura tubular de três camadas (Figura 4.17). A  camada  externa  do  tubo  é  denominada  ectoderme;  a  camada  do  meio,  mesoderme,  e  a

camada  interna,  endoderme.  Todos  os  tecidos  do  organismo  adulto  se  originam  a  partir  destas  três  camadas celulares.  O  epitélio  tem  sua  origem  nas  três  camadas  embrionárias,  o  tecido  conjuntivo  e  o  muscular  se desenvolvem principalmente a partir da mesoderme, e o tecido nervoso se desenvolve a partir da ectoderme.

Tecido epitelial O  tecido  epitelial  recobre  a  superfície  externa  do  corpo  e  reveste  cavidades  internas  fechadas  (incluindo  os  vasos sanguíneos)  e  tubos  do  organismo  que  se  comunicam  com  o  meio  externo  (gastrintestinal,  respiratório  e geniturinário). O epitélio também forma porção responsável pela secreção de glândulas e seus ductos.

Origem e características O tecido epitelial é derivado das três camadas embrionárias.6 A maior parte do epitélio da pele, boca, nariz e ânus deriva da ectoderme. O revestimento do sistema respiratório, do gastrintestinal e das glândulas do sistema digestivo tem origem endodérmica. O revestimento endotelial dos vasos sanguíneos se origina da mesoderme. Muitos tipos de  tecido  epitelial  mantêm  a  capacidade  de  diferenciação  e  passam  por  um  processo  de  rápida  proliferação  para substituir células lesionadas. As células que compõem o epitélio apresentam três características gerais: • São caracterizadas por três superfícies distintas: superfície livre ou superfície apical, superfície lateral e superfície basal

• Estão dispostas próximas umas das outras e unidas por moléculas de adesão celular (CAM) que formam junções especializadas • Sua superfície basal é conectada a uma membrana basal subjacente (Figura 4.18).6 Tabela 4.1

Classificação dos tipos de tecido.

Tipo de tecido

Localização

Tecido epitelial

Cobertura e revestimento de superfícies orgânicas

Epitélio simples

   

Escamoso

Revestimento de vasos sanguíneos, cavidades e alvéolos pulmonares

Cuboide

Túbulos coletores renais; cobertura dos ovários

Colunar

Revestimento do intestino e vesícula biliar

Epitélio estrati唀cado

Escamoso queratinizado

Pele

Escamoso não queratinizado

Membranas mucosas da boca, esôfago e vagina

Cuboide

Ductos das glândulas sudoríferas

Colunar

Grandes ductos das glândulas salivares e mamárias; também encontrado na conjuntiva

Transicional

Bexiga, ureteres e pelve renal

Pseudoestrati唀cado

Passagens da traqueia e vias respiratórias

Glandular

Endócrino

Glândula hipó唀se, glândula tireoide, glândulas suprarrenais e outras glândulas

Exócrino

Glândulas sudoríferas e glândulas do sistema digestório

Neuroepitélio

Mucosa olfatória, retina, língua

Epitélio reprodutivo

Túbulos seminíferos do testículo; porção cortical dos ovários

Tecido conjuntivo

Tecido conjuntivo embrionário

 

Mesenquimal

Mesoderme embrionária

Mucoso

Cordão umbilical (geleia de Wharton)

Tecido conjuntivo adulto

Frouxo ou areolar

Áreas subcutâneas

Regular denso

Tendões e ligamentos

Irregular denso

Derme cutânea

Adiposo

Coxins gordurosos, camadas subcutâneas

Reticular

Estrutura de órgãos linfoides, medula óssea, fígado

Tecido conjuntivo especializado

Ossos

Ossos longos, ossos chatos

Cartilagem

Anéis da traqueia, pavilhão auricular, superfícies articulares

Hematopoético

Células do sangue, tecido mieloide (medula óssea)

Tecido muscular

Esquelético

Musculatura esquelética

Cardíaco

Músculos do coração

Liso

Sistema digestório, vasos sanguíneos, brônquios, bexiga e outros

Tecido nervoso

Neurônios

Neurônios centrais e periféricos e 唀bras nervosas

Células de suporte

Células gliais e ependimárias no SNC; células de Schwann e satélites no SNP

As características e a disposição geométrica das células do epitélio determinam sua função. A superfície livre ou apical  está  sempre  direcionada  para  a  superfície  exterior  ou  para  o  lúmen  de  uma  cavidade  ou  tubo  fechado;  a superfície  lateral  se  comunica  com  as  células  adjacentes  e  é  caracterizada  por  zonas  de  fixação  especializadas;  e  a superfície basal repousa sobre a membrana basal, fixando suas células ao tecido conjuntivo circundante. O  tecido  epitelial  é  avascular  (ou  seja,  sem  vasos  sanguíneos);  portanto,  recebe  oxigênio  e  nutrientes  dos capilares  do  tecido  conjuntivo  sobre  o  qual  repousa  (ver  Figura 4.18).  Para  sobreviver,  o  tecido  epitelial  deve  ser mantido úmido. Mesmo o epitélio cutâneo, aparentemente seco, é mantido úmido por uma camada não vitalizada e impermeável  de  células  superficiais  da  pele  chamada  queratina,  que  evita  a  evaporação  da  umidade  das  células vivas mais profundas. Membrana  basal.  Debaixo  de  todos  os  tipos  de  tecido  epitelial  existe  uma  matriz  extracelular,  denominada membrana basal.  A  membrana  basal  é  constituída  por  uma  lâmina  basal  e  uma  camada  reticular  subjacente.  Os termos lâmina basal e membrana basal são frequentemente empregados como sinônimos. As células epiteliais têm fortes  filamentos  intracelulares  de  proteínas  (citoesqueleto),  importantes  na  transmissão  de  estresse  mecânico  de uma célula para outra.6

Figura  4.17  •  Seção  transversal  do  embrião  humano,  ilustrando  o  desenvolvimento  de  estruturas  somáticas  e viscerais.

Junção e adesão celular. As  células  do  tecido  epitelial  estão  fortemente  unidas  por  junções  especializadas.  Estas junções especializadas possibilitam que as células formem uma barreira contra a passagem de água, os solutos e as células de um compartimento orgânico para o outro. Três tipos básicos de junções intercelulares são observados em tecidos epiteliais: junções de oclusão contínua, junções aderentes e junções comunicantes (Figura 4.19).

Figura  4.18  •  Arranjo  típico  de  células  epiteliais  em  relação  aos  tecidos  subjacentes  e  suprimento  sanguíneo.  O tecido  epitelial  não  recebe  suprimento  sanguíneo,  mas  conta  com  os  vasos  sanguíneos  no  tecido  conjuntivo subjacente para sua nutrição (N) e eliminação de escórias (E).

As zônulas de oclusão são encontradas apenas no tecido epitelial e selam as membranas de superfície de células adjacentes.  Este  tipo  de  junção  intercelular  impede  que  matérias  como  macromoléculas  do  conteúdo  intestinal penetrem o espaço intercelular.6 Junções aderentes representam locais de forte adesão entre as células. A função primária das junções aderentes deve  ser  impedir  a  separação  das  células.  Junções  aderentes  não  são  restritas  ao  tecido  epitelial;  também proporcionam  a  adesão  entre  as  células  adjacentes  do  músculo  cardíaco.  As  junções  aderentes  podem  ter  uma estrutura  contínua,  em  forma  de  cinto  (zônula  de  adesão),  ou  estar  dispersas,  em  pontos,  e  são  chamadas desmossomos  (mácula  de  adesão).  Uma  característica  especial  do  cinto  de  adesão  é  proporcionar  um  local  de ancoragem  à  membrana  da  célula  para  microfilamentos.6  Em  desmossomos  epiteliais,  feixes  de  filamentos intermediários  contendo  queratina  (tonofilamentos)  são  ancorados  à  junção  na  área  citoplasmática  da  membrana celular. Uma doença primária dos desmossomos é o pênfigo, causada pela acumulação de anticorpos das proteínas desmossômicas.10 Indivíduos afetados por essa condição apresentam bolhas na pele e mucosas. Hemidesmossomos, que têm aparência semelhante à de meio desmossomo, representam outro tipo de junção celular. São encontrados na base de células epiteliais e auxiliam na conexão entre as células epiteliais e o tecido conjuntivo subjacente. As junções comunicantes ou tipo gap envolvem a aderência próxima das membranas de células adjacentes, com a formação  de  canais  que  ligam  o  citoplasma  de  duas  células.  As  junções  comunicantes  não  se  encontram exclusivamente  no  tecido  epitelial;  elas  desempenham  um  papel  fundamental  em  muitos  tipos  de  comunicação celular.  Como  representam  canais  de  baixa  resistência,  as  junções  comunicantes  são  importantes  na  condução  de sinais  elétricos  entre  as  células  (p.  ex.,  entre  as  células  de  placas  de  músculo  liso,  ou  entre  células  adjacentes  do músculo  cardíaco,  em  que  funcionam  como  sinapses  elétricas).  Estes  diversos  canais  de  comunicação  também possibilitam a passagem direta de íons e pequenas moléculas de uma célula para outra.6,9

Figura 4.19 • Três tipos de junção intercelular encontrados no tecido epitelial: zônula de oclusão; junção aderente, que  inclui  cinto  de  adesão  (zônula  de  adesão),  desmossomos  (mácula  de  adesão)  e  hemidesmossomos;  e  junção comunicante (junção gap).

Tipos de epitélio Os  tecidos  epiteliais  são  classificados  de  acordo  com  o  formato  das  células  e  o  número  de  camadas  em:  epitélio simples, estratificado  e  pseudoestratificado.  Os  termos  escamoso  (fino  e  plano),  cuboide  (em  forma  de  cubo)  e colunar (semelhante a uma coluna) referem­se ao formato das células (Figura 4.20).6 Epitélio simples. O epitélio simples contém uma única camada de células que repousa sobre a membrana basal. O epitélio  escamoso  simples  está  adaptado  para  filtração;  é  encontrado  no  revestimento  de  vasos  sanguíneos, linfonodos  e  alvéolos  dos  pulmões.  A  camada  única  de  epitélio  que  reveste  o  coração  e  os  vasos  sanguíneos  é conhecida como endotélio. Um tipo semelhante de camada, denominada mesotélio, forma as membranas serosas que revestem  as  cavidades  pleural,  pericárdica  e  peritoneal  e  recobrem  os  órgãos  formadores  dessas  cavidades.  O epitélio  simples  cuboide  é  encontrado  na  superfície  do  ovário  e  na  tireoide.  O  epitélio  simples  colunar  reveste  o intestino.  Uma  forma  de  epitélio  simples  colunar  tem  projeções  semelhantes  a  pelos,  denominados  cílios, frequentemente  encontrados  em  células  secretoras  de  muco  especializadas  chamadas  células caliciformes (goblet). Esta forma de epitélio simples colunar reveste as vias do sistema respiratório.6 Epitélio  estratificado  e  pseudoestratificado.  O  epitélio  estratificado  contém  mais  de  uma  camada  de  células,  e apenas  a  camada  mais  profunda  repousa  sobre  a  membrana  basal.  Ele  é  projetado  para  proteger  a  superfície corporal.  O  epitélio  estratificado escamoso queratinizado  forma  a  epiderme  da  pele. A  queratina  é  uma  proteína fibrosa  e  resistente,  encontrada  na  forma  de  filamentos  nas  células  externas  da  pele.  O  epitélio  escamoso

estratificado queratinizado é composto de várias camadas. As camadas mais próximas aos tecidos subjacentes são cuboides  ou  colunares. As  células  vão  se  tornando  mais  irregulares  e  mais  finas  à  medida  que  se  aproximam  da superfície.  Células  superficiais  são  totalmente  preenchidas  com  queratina,  morrem  e  são  descartadas  para  serem substituídas  por  células  de  camadas  mais  profundas.  O  epitélio  estratificado  escamoso  e  não  queratinizado  é encontrado em superfícies úmidas, como a boca e a língua. Epitélio estratificado cuboide e colunar são encontrados nos  ductos  das  glândulas  salivares  e  nos  ductos  maiores  das  glândulas  mamárias.6  Em  fumantes,  as  células  de epitélio  colunar  ciliado  normalmente  encontradas  na  traqueia  e  nos  brônquios  são  muitas  vezes  substituídas  por células  do  epitélio  estratificado  escamoso,  com  maior  capacidade  para  suportar  os  efeitos  irritantes  da  fumaça  do cigarro.

Figura 4.20 • Diversos tipos de tecido epitelial.

O  epitélio  pseudoestratificado  é  um  tipo  de  epitélio  em  que  todas  as  células  estão  em  contato  com  a  matriz intercelular  subjacente,  mas  algumas  não  chegam  até  a  superfície.  Um  epitélio  pseudoestratificado  colunar  ciliado com células caliciformes forma o revestimento da maior parte do trato respiratório superior. Todas as células altas que alcançam a superfície deste tipo de epitélio são células ciliadas ou células caliciformes produtoras de muco. As células  basais  que  não  chegam  à  superfície  funcionam  como  células­tronco  para  células  ciliadas  e  caliciformes.6 Epitélio de transição é do tipo estratificado caracterizado por células que podem mudar de forma e se tornar mais finas quando o tecido é distendido. Este tecido pode ser distendido sem separar as células superficiais. O epitélio de transição é bem adaptado para o revestimento de órgãos que estão constantemente modificando seu volume, como a bexiga urinária. Epitélio glandular. O tecido epitelial glandular é formado por células especializadas na produção de uma secreção.6 Este  processo  geralmente  é  acompanhado  pela  síntese  intracelular  de  macromoléculas. A  natureza  química  destas

macromoléculas é variável. As macromoléculas tipicamente são armazenadas em pequenas vesículas no interior das células,  se  ligam  à  membrana  e  são  chamadas  de  grânulos  secretores.  O  epitélio  glandular  pode  sintetizar, armazenar  e  secretar  proteínas  (como  a  insulina),  lipídios  (p.  ex.,  hormônios  do  córtex  suprarrenal,  secreções  das glândulas sebáceas) e complexos de carboidratos e proteínas (p. ex., saliva). Menos comuns são as secreções que requerem mínima atividade sintética, como as produzidas pelas glândulas sudoríferas. Todas as células glandulares surgem a partir do epitélio superficial por meio de proliferação celular e invasão do tecido  conjuntivo  subjacente,  e  liberam  seu  conteúdo  ou  secreções  para  o  compartimento  extracelular.  Glândulas exócrinas,  como  as  glândulas  sudoríferas  e  glândulas  mamárias  de  mulheres  em  lactação,  conservam  sua  conexão com  o  epitélio  superficial  do  qual  se  originaram.  Essa  ligação  tem  a  forma  de  ductos  tubulares  com  revestimento epitelial, através do qual as secreções passam para chegar à superfície. As glândulas exócrinas são frequentemente classificadas segundo o modo como os produtos de secreção são liberados por suas células. Em células holócrinas (p.  ex.,  glândulas  sebáceas),  a  célula  glandular  se  rompe,  liberando  todo  o  seu  conteúdo  no  sistema  de  ductos. Novas gerações de células fazem a substituição por mitose de células basais. Glândulas merócrinas ou écrinas (p. ex.,  glândulas  salivares,  glândulas  exócrinas  do  pâncreas)  liberam  seus  produtos  por  exocitose.  Em  secreções apócrinas (p. ex., glândulas mamárias, determinadas glândulas sudoríferas), é eliminada a porção apical da célula juntamente com pequenas porções de citoplasma. As  glândulas endócrinas são estruturas epiteliais que tiveram sua ligação  com  a  superfície  obliterada  durante  o  desenvolvimento.  Essas  glândulas  não  têm  ductos  e  produzem secreções (hormônios) lançadas diretamente na corrente sanguínea.

Tecido conjuntivo O tecido conjuntivo ou conectivo é o mais abundante no corpo. Como o próprio nome sugere, ele conecta e liga ou dá suporte aos diversos tecidos.6 O tecido conjuntivo é especial, no sentido em que suas células produzem a matriz extracelular  que  dá  suporte  e  mantém  os  tecidos  unidos. As  cápsulas  que  rodeiam  os  órgãos  são  compostas  por tecido conjuntivo. Tecido ósseo, adiposo e cartilagem são tipos especializados de tecido conjuntivo que funcionam fornecendo suporte aos tecidos moles do organismo e armazenando gordura. A proximidade da matriz extracelular com  os  vasos  sanguíneos  possibilita  que  atue  como  um  meio  de  troca  de  nutrientes,  através  do  qual  passam  os resíduos metabólicos.

Origem e características A  maior  parte  do  tecido  conjuntivo  deriva  da  mesoderme  embrionária,  mas  uma  parte  é  derivada  da  crista  neural, originada da ectoderme. Durante o desenvolvimento embrionário, as células mesodérmicas migram do seu local de origem e, em seguida, circundam e penetram os órgãos em desenvolvimento. Estas células são denominadas células mesenquimais,  e  o  tecido  que  formam  é  denominado  mesênquima.  Tecidos  derivados  de  células  mesenquimais embrionárias incluem ossos, cartilagem e tecido adiposo. Além de fornecer a fonte ou ser a origem da maior parte do  tecido  conjuntivo,  o  mesênquima  se  desenvolve  em  outras  estruturas,  como  as  células  do  sangue  e  vasos sanguíneos.  As  células  de  tecido  conjuntivo  incluem  fibroblastos,  condroblastos,  osteoblastos,  células­tronco hematopoéticas,  células  do  sangue,  macrófagos,  mastócitos  e  adipócitos.6,9  A  matriz  do  cordão  umbilical  é composta  por  um  segundo  tipo  de  mesoderme  embrionária  denominado  tecido  conjuntivo  mucoso  ou  geleia  de Wharton.

Tipos de tecido conjuntivo O  tecido  conjuntivo  adulto  pode  ser  dividido  em  dois  tipos:  tecido  conjuntivo  propriamente  dito,  que  é  o  foco  da discussão  neste  capítulo,  e  tecido  conjuntivo  especializado  (cartilagem,  ossos  e  células  do  sangue),  que  será discutido  em  outros  capítulos.  Existem  quatro  tipos  reconhecidos  de  tecido  conjuntivo  propriamente  dito:  frouxo (areolar), adiposo, reticular e denso.6,9 Tecido conjuntivo frouxo. O tecido conjuntivo frouxo, também conhecido como tecido areolar, é macio e flexível. Preenche os espaços entre as bainhas musculares e forma uma camada que envolve os vasos sanguíneos e linfáticos (Figura 4.21).  O  tecido  conjuntivo  areolar  dá  suporte  aos  tecidos  epiteliais  e  fornece  os  meios  pelos  quais  esses tecidos recebem seu suprimento. Em um órgão que contém tecido epitelial funcional e suporte do tecido conjuntivo, o  termo  tecido  parenquimal  é  empregado  para  descrever  o  funcionamento  do  epitélio  em  oposição  ao  tecido

conjuntivo estrutural, ou estroma. O  tecido  conjuntivo  frouxo  é  caracterizado  por  uma  grande  quantidade  de  substâncias  de  base  e  de armazenamento  de  líquidos  das  células  fixas  do  tecido  conjuntivo:  fibroblastos,  mastócitos,  células  adiposas, macrófagos  e  leucócitos. As  células  do  tecido  conjuntivo  frouxo  secretam  substâncias  capazes  de  formar  a  matriz extracelular,  dar  suporte  e  ligar  as  células  do  organismo.  Os  fibroblastos  são  o  tipo  mais  abundante.  Eles  são responsáveis pela síntese da substância fibrosa e gelatinosa que preenche os espaços intercelulares e pela produção de fibras de colágeno, fibras elásticas e reticulares.

Figura  4.21  •  Representação  esquemática  de  células  que  podem  ser  observadas  no  tecido  conjuntivo  frouxo.  As células se localizam na matriz extracelular, banhada por líquido tecidual originário dos vasos capilares.

A  lâmina basal  é  um  tipo  especial  de  matriz  intercelular  encontrada  onde  o  tecido  conjuntivo  entra  em  contato com  o  tecido  ao  qual  dá  suporte.  É  visível  apenas  por  microscopia  eletrônica  e  é  produzida  por  células  epiteliais. Em muitos locais, fibras reticulares, produzidas por células do tecido conjuntivo, estão associadas à lâmina basal.6 A  lâmina  basal  e  a  camada  reticular  juntas  formam  a  membrana  basal,  que  pode  ser  observada  por  microscopia comum. A  membrana  basal  é  encontrada  ao  longo  da  interface  entre  o  tecido  conjuntivo  e  as  fibras  musculares, sobre  as  células  de  Schwann  do  SNP,  na  superfície  basal  de  células  endoteliais  e  em  células  de  gordura.  A membrana  basal  liga  as  células  ao  tecido  conjuntivo  subjacente  ou  circundante,  funciona  como  filtro  seletivo  para partículas que passam entre o tecido conjuntivo e outras células e contribui no processo de regeneração e reparação

celular. Tecido adiposo. O tecido adiposo é uma forma especial de tecido conjuntivo na qual predominam os adipócitos. Os adipócitos não produzem matriz extracelular, mas mantêm um grande espaço intracelular.6 Estas células armazenam grande quantidade de triglicerídios e são o maior repositório de energia do organismo. O tecido adiposo auxilia no preenchimento dos espaços entre os tecidos e ajuda a manter os órgãos no lugar. A gordura subcutânea coopera para dar  forma  ao  corpo.  Como  a  gordura  não  é  um  bom  condutor  de  calor,  o  tecido  adiposo  funciona  como  isolante térmico  para  o  corpo.  O  tecido  adiposo  existe  em  duas  formas:  unilocular  e  multilocular.  O  tecido  adiposo unilocular  (gordura  branca)  é  composto  por  células  em  que  a  gordura  está  contida  em  uma  única  grande  gota  no citoplasma. O tecido adiposo multilocular (gordura marrom) é composto por células que contêm várias gotículas de gordura e numerosas mitocôndrias. Tecido conjuntivo reticular. O tecido reticular se caracteriza por uma rede de fibras intercaladas com fibroblastos e  macrófagos.  Os  fibroblastos  sintetizam  fibras  de  colágeno  tipo  III.  O  tecido  reticular  forma  a  arquitetura  dos seios hepáticos, o tecido adiposo, a medula óssea e os tecidos linfoides, como os do baço. Tecido  conjuntivo  denso.  O  tecido  conjuntivo  denso  existe  em  duas  formas:  denso  regular  e  denso  irregular.  O tecido  conjuntivo  denso  irregular  é  constituído  pelos  mesmos  componentes  encontrados  no  tecido  conjuntivo frouxo,  mas  exibe  predominância  de  fibras  colágenas  e  menor  quantidade  de  células.  Este  tipo  de  tecido  pode  ser encontrado  na  derme  da  pele  (camada  reticular),  nas  cápsulas  fibrosas  de  muitos  órgãos  e  bainhas  fibrosas  de cartilagens  (pericôndrio)  e  nos  ossos  (periósteo).  Ele  também  forma  a  fáscia,  que  reveste  músculos  e  órgãos.  O tecido  conjuntivo  denso  regular  é  rico  em  fibras  de  colágeno  e  forma  os  tendões  e  aponeuroses  que  unem  os músculos aos ossos ou a outros músculos, e os ligamentos que unem um osso a outro.

Tecido muscular O tecido muscular, cuja função primária é a contração, é responsável pelo movimento do corpo e suas partes e por alterações no tamanho e na forma dos órgãos internos. O tecido muscular contém dois tipos de fibras responsáveis pela contração: filamentos finos e grossos. Os filamentos finos são compostos principalmente por actina, enquanto os  filamentos  grossos  são  compostos  de  miosina.  Os  dois  tipos  de  miofilamentos  ocupam  a  maior  parte  do citoplasma, que nas células musculares é denominada sarco­plasma.9 Existem três tipos de tecidos musculares: esquelético, cardíaco e liso. Os músculos esqueléticos e cardíacos são compostos  por  musculatura  estriada,  em  que  filamentos  de  actina  e  miosina  estão  dispostos  em  grandes  feixes paralelos,  conferindo  às  fibras  musculares  aparência  listrada  ou  estriada  quando  observadas  ao  microscópio.  O músculo liso  não  tem  estrias  e  é  encontrado  na  íris  dos  olhos,  paredes  dos  vasos  sanguíneos,  órgãos  ocos,  como estômago e bexiga urinária, e tubos ocos, como os ureteres e o ducto biliar comum, que conectam órgãos internos.9 Nem  a  musculatura  esquelética  nem  o  músculo  cardíaco  passam  por  atividade  mitótica,  necessária  para  a reposição  de  células  danificadas.  O  músculo  liso,  no  entanto,  pode  proliferar  e  passar  por  atividade  mitótica. Determinados aumentos na quantidade de músculo liso são fisiológicos, como ocorre no útero durante a gestação. Outros como o aumento do músculo liso, que ocorre nas artérias de pessoas com hipertensão crônica, derivam de processos patológicos. Embora  os  três  tipos  de  tecido  muscular  tenham  uma  estrutura  significativamente  diferente,  apresentam  muitas semelhanças  no  que  diz  respeito  a  propriedades  contráteis  e  mecanismos  de  controle.  Na  seção  seguinte,  são apresentadas  as  propriedades  estruturais  do  músculo  esquelético,  como  protótipo  de  tecido  muscular  estriado. Também são discutidas a musculatura lisa e a maneira em que difere do músculo esquelético.

Músculo esquelético O músculo esquelético é o tecido mais abundante no organismo, representando cerca de 40 a 45% do total do peso corporal.9 A  maior  parte  dos  músculos  esqueléticos  está  conectada  aos  ossos,  e  suas  contrações  são  responsáveis pelos  movimentos  do  esqueleto.  Cada  músculo  esquelético  é  um  órgão  separado,  constituído  por  centenas  ou milhares  de  fibras  musculares.  Na  periferia  das  fibras  do  músculo  esquelético,  encontram­se  células­satélites distribuídas  aleatoriamente.  Essas  células  representam  a  fonte  de  mioblastos  indiferenciados,  que  podem  estar envolvidos  na  capacidade  limitada  de  regeneração  de  músculos  esqueléticos.  Embora  as  fibras  musculares  sejam

predominantes,  também  são  encontradas  quantidades  substanciais  de  tecido  conjuntivo,  vasos  sanguíneos  e  fibras nervosas. Organização e estrutura. Em um músculo intacto, várias camadas diferentes de tecido conjuntivo mantêm unidas as  fibras  musculares  individuais.  Os  músculos  esqueléticos  como  o  bíceps  braquial  são  recobertos  por  tecido conjuntivo denso irregular, denominado epimísio (Figura 4.22 A). Cada músculo é subdividido em feixes menores denominados  fascículos,  recobertos  por  tecido  conjuntivo  denominado  perimísio. A  quantidade  e  o  tamanho  dos fascículos  variam  entre  os  diferentes  músculos.  Os  fascículos  consistem  em  diversas  estruturas  alongadas chamadas fibras musculares, cada uma delas recoberta por tecido conjuntivo denominado endomísio. Os músculos esqueléticos são estruturas sinciciais ou multinucleadas; isso significa que não existem limites verdadeiros entre as células de uma fibra de músculo esquelético.9 O sarco­plasma da fibra muscular está contido no sarcolema que representa a membrana celular. Embebidos no sarco­plasma  estão  os  elementos  contráteis  de  actina  e  miosina,  dispostos  em  feixes  paralelos  denominados miofibrilas.  Os  miofilamentos  finos  e  de  coloração  mais  clara  são  compostos  de  actina,  e  os  miofilamentos  mais grossos e de coloração mais escura são compostos por miosina. Cada uma das miofibrilas é composta por unidades repetidas regularmente ao longo do comprimento da miofibrila, denominadas sarcômeros (ver Figura 4.22 B).9 Os  sarcômeros  são  as  unidades  estruturais  e  funcionais  do  músculo  cardíaco  e  esquelético.  Um  sarcômero  se estende de uma linha Z a outra linha Z. Dentro do sarcômero se alternam faixas claras e escuras. A porção central do  sarcômero  contém  uma  banda  escura  (banda  A),  que  consiste  principalmente  em  miosina,  com  alguma sobreposição de filamentos de actina. Ocupando a linha Z, a banda I, mais leve, contém apenas filamentos de actina e,  portanto,  são  necessários  dois  sarcômeros  para  completar  uma  banda  I.  Uma  zona  H  é  encontrada  no  meio  da banda A e representa a região em que são encontrados apenas filamentos de miosina. No centro da zona H encontra­ se  uma  banda  fina  e  escura,  a  banda  M  ou  linha  M,  produzida  por  ligações  entre  os  filamentos  de  miosina. As linhas  Z  consistem  em  elementos  curtos  interconectados  e  fornecem  os  finos  filamentos  de  actina  de  dois sarcômeros adjacentes com um ponto de fixação.

Figura 4.22 • A. Componentes do tecido conjuntivo de um músculo esquelético. B. Estrias de miofibrilas mostrando a sobreposição de proteínas contráteis e as bandas A e I, a zona H e as linhas Z e M.  C. Estado de relaxamento e contração  miofibrilar  mostrando  a  posição  dos  filamentos  de  actina  (azul)  entre  os  filamentos  de  miosina  (rosa)  no músculo  relaxado  (acima)  e  as  membranas  Z  se  aproximando  umas  das  outras  (abaixo)  quando  o  músculo  se contrai. D. O retículo sarcoplasmático com túbulos T.

O retículo sarcoplasmático, possível de ser comparado ao RE liso, é composto de túbulos longitudinais, que se dão  paralelamente  à  fibra  muscular  e  circundam  cada  uma  das  miofibrilas  (ver  Figura 4.22 D).  Esta  rede  termina em  regiões  alargadas  em  forma  de  saco,  denominadas  sacos  laterais  ou  cisternas  terminais.  Estes  sacos armazenam  o  cálcio  liberado  durante  a  contração  muscular.  Uma  proteína  de  ligação  chamada  calsequestrina  e encontrada  nas  cisternas  terminais  possibilita  que  uma  grande  quantidade  de  íons  cálcio  seja  sequestrada  na cisterna.9 O nível de concentração de íons cálcio nas cisternas é 10 mil vezes maior do que no sarco­plasma. Um segundo sistema de túbulos consiste nos túbulos transversais ou túbulos T, que são extensões da membrana plasmática  e  correm  perpendicularmente  à  fibra  muscular.  A  porção  oca,  ou  lúmen,  dos  túbulos  transversais  é contínua  com  o  compartimento  de  líquido  extracelular.  Os  potenciais  de  ação,  rapidamente  conduzidos  sobre  a superfície das fibras musculares, são, por sua vez, propagados pelos túbulos T para o retículo sarcoplasmático. À medida  que  os  potenciais  de  ação  se  propagam  através  dos  sacos  laterais,  estes  liberam  o  cálcio,  iniciando  a contração muscular. A membrana do retículo sarcoplasmático apresenta também um mecanismo de transporte ativo para o bombeamento de cálcio de volta para o retículo. Isso impede a interação de íons cálcio com miofilamentos de actina e miosina após a interrupção de uma contração muscular. Contração  do  músculo  esquelético.  Durante  a  contração  muscular,  os  filamentos  grossos  de  miosina  e  finos  de actina  deslizam  uns  sobre  os  outros,  provocando  o  encurtamento  da  fibra  muscular,  embora  o  comprimento  dos

filamentos individualmente permaneça inalterado (ver Figura 4.22 C). As estruturas que produzem o deslizamento dos filamentos são as cabeças de miosina, que formam pontes cruzadas com os filamentos de actina (Figura 4.23). Quando  ativadas  por ATP,  as  pontes  cruzadas  giram  em  um  arco  fixo,  bem  parecido  com  o  que  acontece  com  os remos  de  um  barco,  à  medida  que  se  ligam  a  filamentos  de  actina.  Durante  a  contração,  cada  ponte  cruzada  passa por seu próprio ciclo de movimento, formando uma ligação ponte e liberando­a, para se deslocar para outro local, onde ocorre a mesma sequência de movimentos. Isto puxa os filamentos finos e grossos uns sobre os outros. Miosina é o principal constituinte do filamento grosso. É composta por uma fina cauda, que constitui a espinha dorsal estrutural do filamento, e uma cabeça globular. Cada cabeça globular contém um local de ligação capaz de se conectar  a  um  local  complementar  na  molécula  de  actina.  Além  do  local  de  ligação  para  a  actina,  a  cabeça  de miosina tem um centro ativo separado que catalisa a quebra da molécula de ATP, para fornecer a energia necessária para ativar a cabeça de miosina e então formar a ponte cruzada com a actina. Após a contração, a miosina também se liga ao ATP para quebrar a ligação entre actina e miosina. As moléculas de miosina são mantidas unidas lado a lado nos filamentos grossos, de modo que uma metade tem as cabeças voltadas para uma extremidade do filamento e as caudas para a outra, e a segunda metade está disposta ao contrário. Os filamentos finos são compostos principalmente de actina, uma proteína globular alinhada em duas filas que se enrolam uma sobre a outra para formar uma longa cadeia helicoidal. Associadas a cada um dos filamentos de actina existem duas proteínas reguladoras, tropomiosina e troponina (ver Figura 4.23 A). A  tropomiosina, que se localiza ao longo das fissuras dos filamentos de actina, fornece o local para fixação das cabeças globulares do filamento de miosina. No estado de relaxamento muscular, a troponina recobre os locais de ligação da tropomiosina e impede a formação de pontes cruzadas entre os filamentos de actina e miosina. Durante um potencial de ação, os íons cálcio liberados  do  retículo  sarcoplasmático  se  difundem  nas  miofibrilas  adjacentes  em  que  se  ligam  à  troponina.  A ligação  do  cálcio  com  a  troponina  descobre  os  locais  de  ligação  da  tropomiosina,  de  modo  que  as  cabeças  de miosina podem ser anexadas e formar as pontes cruzadas.6 A energia da molécula de ATP é utilizada para quebrar as  pontes  cruzadas  de  actina  e  miosina,  interrompendo  a  contração  muscular.  Depois  da  quebra  da  ligação  entre actina e miosina, a concentração de cálcio em torno das miofibrilas é reduzida à medida que o cálcio é transportado ativamente para o retículo sarcoplasmático por uma bomba de membrana que utiliza energia fornecida por ATP. As  bases  do  rigor  mortis  podem  ser  explicadas  pela  ligação  entre  actina  e  miosina.  Como  após  a  morte  o músculo começa a sofrer degeneração, as cisternas sarcoplasmáticas liberam seus íons cálcio, e isso possibilita que as  cabeças  de  miosina  se  conectem  aos  locais  de  ligação  na  molécula  de  actina.  Como  o  fornecimento  de  ATP diminui, não existe fonte de energia disponível para iniciar a interação normal dos filamentos de actina e miosina, e o músculo entra em um estado de rigor até que ocorra mais degeneração capaz de destruir as pontes cruzadas entre actina e miosina.6

Músculo liso O músculo liso é muitas vezes denominado músculo involuntário, pois sua atividade surge espontaneamente ou por atividade  do  sistema  nervoso  autônomo.  As  contrações  de  músculos  lisos  são  mais  lentas  e  se  mantêm  por  um tempo mais longo do que as contrações de músculos esqueléticos ou cardíacos. Organização  e  estrutura.  As  células  dos  músculos  lisos  têm  formato  de  fuso  e  são  menores  do  que  fibras musculares esqueléticas. As células da musculatura lisa têm o núcleo posicionado centralmente. Não há linhas Z e M  nas  fibras  musculares  lisas  nem  estrias  cruzadas,  porque  os  feixes  de  filamentos  não  são  paralelos,  mas  se cruzam  obliquamente  através  da  célula.  Os  filamentos  de  actina  são  conectados  a  estruturas  chamadas  corpos densos (Figura 4.24). Alguns corpos densos se ligam à membrana celular e outros ficam dispersos pelo citoplasma celular e são mantidos unidos por proteínas estruturais.6,9 A  ausência  de  linhas  Z  e  a  sobreposição  regular  dos  elementos  contráteis  proporcionam  maior  amplitude  para desenvolvimento de tensão. Isto é importante em órgãos ocos que são submetidos a alterações de volume, com as consequentes  variações  no  comprimento  das  fibras  musculares  lisas  de  suas  paredes.  Mesmo  com  a  distensão  de um  órgão  oco,  a  fibra  do  músculo  liso  retém  alguma  capacidade  para  desenvolver  a  tensão,  enquanto  esse  tipo  de distensão esticaria as fibras de um músculo esquelético para além da área na qual os filamentos grossos e finos se sobrepõem.

Figura  4.23  •  A.  Estrutura  molecular  do  filamento  fino  de  actina.  B.  Filamento  mais  espesso  de  miosina  de  um músculo  estriado.  O  filamento  fino  é  uma  hélice  de  cadeia  dupla  de  moléculas  de  actina  com  moléculas  de tropomiosina e troponina, que se localiza ao longo das fissuras dos filamentos de actina. C. Sequência de eventos envolvidos  no  deslizamento  de  filamentos  adjacentes  de  actina  e  miosina:  (1)  A  cabeça  da  miosina  se  levanta quando a molécula de ATP é quebrada para ADP, (2) pontes cruzadas, (3) movimento de potência durante o qual a cabeça  da  miosina  se  curva  para  deslocar  a  actina  para  a  frente  e  (4)  ocorre  o  desligamento  da  ponte  cruzada quando uma nova molécula de ATP se liga à cabeça da miosina.

Figura 4.24 •  Estrutura  do  músculo  liso  mostrando  os  corpos  densos.  Na  musculatura  lisa,  a  força  de  contração  é transmitida para a membrana celular por feixes de fibras intermediárias.

O músculo liso geralmente está disposto em folhas ou feixes. Em órgãos ocos como os intestinos, os feixes se organizam em uma dupla camada denominada muscular externa, que consiste em uma camada longitudinal externa e uma camada interna circular. Frequentemente, existe uma mucosa muscular mais fina entre a muscular externa e o endotélio.  Nos  vasos  sanguíneos,  os  feixes  são  dispostos  de  modo  helicoidal  ou  circular  em  torno  da  parede  do vaso. Contração do músculo liso. Do mesmo modo que acontece com o músculo cardíaco e esquelético, a contração do músculo  liso  é  iniciada  por  um  aumento  do  cálcio  intracelular.  No  entanto,  o  músculo  liso  difere  de  um  músculo esquelético pela maneira como são formadas as pontes cruzadas. O retículo sarcoplasmático de um músculo liso é menos  desenvolvido  que  no  músculo  esquelético  e  não  existem  túbulos  transversais.  O  músculo  liso  depende  da entrada  de  cálcio  extracelular  e  de  sua  liberação  a  partir  do  retículo  sarcoplasmático  para  que  ocorra  a  contração muscular.6 Esta dependência do movimento de cálcio extracelular através da membrana celular durante a contração

muscular  é  a  base  para  a  ação  de  fármacos  bloqueadores  do  cálcio,  utilizados  no  tratamento  de  doenças cardiovasculares. O  músculo  liso  também  carece  de  troponina,  a  proteína  reguladora  da  ligação  de  cálcio  encontrada  no  músculo esquelético  e  cardíaco.  Por  sua  vez,  ele  utiliza  outra  proteína  de  ligação  de  cálcio,  denominada  calmodulina.  O complexo cálcio­calmodulina se conecta e ativa os filamentos grossos contendo miosina, e estes últimos interagem com os filamentos de actina. Tipos de musculatura lisa. O músculo liso pode ser dividido em duas grandes categorias, de acordo com o modo de ativação, em músculo liso unitário e o formado por múltiplas unidades. No músculo liso formado por múltiplas unidades,  cada  unidade  funciona  praticamente  de  maneira  independente  e  muitas  vezes  recebe  inervação  de  um único nervo, como ocorre no músculo esquelético. Tem pouca ou nenhuma atividade inerente e depende do sistema nervoso  autônomo  para  ser  ativado.  Este  tipo  de  músculo  liso  é  encontrado  na  íris,  nas  paredes  dos  vasos deferentes e conectado aos pelos cutâneos. As fibras do músculo liso unitário estão em contato umas com as outras e podem se contrair espontaneamente, sem necessidade de estimulação nervosa ou hormonal. Normalmente, a maior parte  das  fibras  musculares  se  contrai  em  sincronia,  daí  o  termo  de  músculo  liso  unitário. Certos músculos lisos unitários,  como  o  encontrado  no  sistema  digestório,  é  autoexcitável.  Geralmente  isso  está  associado  a  um  ritmo básico de ondas lentas transmitido de uma célula para outra por nexos (i. e., junções comunicantes) formados pela fusão das membranas de células adjacentes. A causa dessa atividade de ondas lentas é desconhecida. A intensidade da  contração  aumenta  com  a  frequência  do  potencial  de  ação.  Determinados  hormônios,  outros  agentes  e  fatores locais  podem  modificar  a  atividade  do  músculo  liso  por  despolarização  ou  hiperpolarização  da  membrana.  As células  de  musculatura  lisa  encontradas  no  útero  e  vasos  sanguíneos  de  pequeno  calibre  também  são  de  músculo liso unitário.

Tecido nervoso O tecido nervoso é distribuído por todo o organismo como um sistema de comunicação integrado. Anatomicamente, o sistema nervoso é dividido em SNC, que consiste no encéfalo e na medula espinal, e SNP, que consiste em fibras nervosas  e  gânglios  existentes  fora  do  SNC.  As  células  nervosas  se  desenvolvem  a  partir  da  ectoderme embrionária. As  células  nervosas  são  altamente  diferenciadas  e,  portanto,  incapazes  de  regeneração  na  vida  pós­ natal. Estruturalmente, o tecido nervoso é constituído por dois tipos de células: células nervosas ou neurônios e células da glia ou de suporte. A maioria das células nervosas é composta de três partes: soma ou corpo celular, dendritos e axônio.  Os  dendritos  preenchidos  com  citoplasma  são  processos  alongados  múltiplos,  que  recebem  e  transportam os estímulos provenientes do meio ambiente, de células epiteliais sensoriais e de outros neurônios para a célula. O axônio  é  um  processo  único  preenchido  com  citoplasma  e  é  especializado  na  geração  e  condução  de  impulsos nervosos do corpo celular para outras células nervosas, células musculares e células glandulares. Os  neurônios  são  classificados  como  aferentes  e  eferentes,  de  acordo  com  sua  função.  Neurônios  aferentes  ou sensoriais  conduzem  informações  para  o  sistema  nervoso  central;  estão  envolvidos  na  recepção  de  informações sensoriais  provenientes  do  ambiente  externo  e  do  próprio  organismo.  Neurônios  eferentes  ou  motores  conduzem informações  que  partem  do  SNC;  são  necessários  para  o  controle  de  fibras  musculares  e  glândulas  endócrinas  e exócrinas. A  comunicação  entre  os  neurônios  e  órgãos  efetores,  assim  como  células  musculares,  ocorre  em  estruturas especializadas chamadas sinapses.  Na  sinapse,  os  mensageiros  químicos  (neurotransmissores)  alteram  o  potencial de membrana para conduzir os impulsos de um nervo para outro ou de um neurônio para uma célula efetora. Além disso, existem sinapses elétricas, nas quais células nervosas são conectadas por meio de junções comunicantes que possibilitam a passagem de íons de uma célula para outra. Neuróglia (glia significa “cola” em grego) são as células que dão suporte aos neurônios, formam a mielina e têm funções  tróficas  e  fagocíticas.  São  encontrados  quatro  tipos  de  neuróglia  no  SNC:  astrócitos,  oligodendrócitos, micróglia  e  células  ependimárias.  Os  astrócitos  são  os  mais  abundantes  na  neuróglia.  Eles  têm  vários  processos longos  que  circundam  os  vasos  sanguíneos  do  SNC.  Eles  fornecem  suporte  estrutural  para  os  neurônios,  e  suas extensões  formam  uma  barreira  estanque  que  protege  o  sistema  nervoso  central.  Os  oligodendrócitos  fornecem mielinização  para  os  processos  neuronais  no  SNC.  A  micróglia  é  composta  por  células  que  fazem  fagocitose,

representando  o  sistema  fagocítico  mononuclear  no  sistema  nervoso.  As  células  ependimárias  revestem  as cavidades do encéfalo e da medula espinal e estão em contato com o líquido cefalorraquidiano. No SNP as células de suporte consistem em células de Schwann e células­satélites. As células de Schwann fornecem mielinização para axônios e dendritos, e as células­satélites englobam e protegem os gânglios da raiz dorsal e as células ganglionares autonômicas.

Componentes extracelulares dos tecidos Até agora, a discussão tem sido focalizada nos componentes celulares de diferentes tipos de tecidos. Nos tecidos, as células são mantidas unidas por meio de junções celulares; o espaço entre as células é preenchido por uma matriz extracelular, e as moléculas de adesão formam contatos intercelulares.

Matriz extracelular Os  tecidos  não  são  compostos  unicamente  por  células.  Grande  parte  de  seu  volume  é  composta  por  uma  matriz extracelular. Esta matriz é composta por uma variedade de proteínas e polissacarídios (p. ex., moléculas compostas por diversos açúcares).6  Estas  proteínas  e  polissacarídios  são  secretados  localmente  e  organizados  em  uma  malha de suporte em estreita associação às células que os produzem. A quantidade e composição da matriz variam com os diferentes tecidos e sua função. No osso, por exemplo, a matriz é mais abundante do que o número de células; no cérebro, as células são muito mais abundantes, e a matriz é apenas um pequeno constituinte.6 Duas classes principais de macromoléculas extracelulares compõem a matriz extracelular. A primeira é composta de  cadeias  de  polissacarídios,  de  uma  classe  denominada  glicosaminoglicanos  (GAG),  normalmente  encontrados conectados a proteínas, na forma de proteoglicanos.10 O segundo tipo é constituído por proteínas fibrosas (colágeno e elastina) e proteínas adesivas fibrosas (fibronectina e laminina) encontradas na membrana basal. Os membros de cada uma destas duas classes de macromoléculas extracelulares se apresentam com formas e tamanhos variados. As  moléculas  de  proteoglicanos  e  GAG  no  tecido  conjuntivo  formam  uma  substância  gelatinosa  altamente hidratada,  ou  gel  de  tecido,  na  qual  ficam  embebidas  as  proteínas  fibrosas.10  O  gel  de  polissacarídios  resiste  a forças  de  compressão;  as  fibras  de  colágeno  fortalecem  e  ajudam  a  organizar  a  matriz;  a  elastina  acrescenta resistência,  e  as  proteínas  adesivas  auxiliam  as  células  a  se  conectarem  à  parte  apropriada  da  matriz.  Os polissacarídios  no  gel  de  tecido  são  altamente  hidrofílicos  e  podem  formar  o  gel  mesmo  a  baixas  concentrações. Eles também acumulam uma carga negativa que atrai cátions como sódio, osmoticamente ativos, fazendo com que grandes quantidades de água sejam sugadas para a matriz. Isto cria uma pressão chamada pressão de turgescência, que  possibilita  à  matriz  ser  capaz  de  suportar  grandes  forças  de  compressão.  Isso  está  em  contraste  com  as propriedades  do  colágeno,  que  resiste  a  forças  de  estiramento.  Por  exemplo,  a  matriz  cartilaginosa  que  reveste  a articulação do joelho pode suportar pressões de centenas de atmosferas por este mecanismo. As moléculas de GAG e proteoglicano no tecido conjuntivo normalmente constituem menos de 10% por peso de tecido  fibroso.  Como  formam  um  gel  hidratado,  as  moléculas  preenchem  a  maior  parte  do  espaço  extracelular, proporcionam  um  suporte  mecânico  para  os  tecidos  e,  ao  mesmo  tempo,  garantem  a  rápida  difusão  de  água  e eletrólitos e a migração de células. Acredita­se que um GAG, hialuronano ou o ácido hialurônico desempenhem um papel  importante  como  um  preenchedor  de  espaço  durante  o  desenvolvimento  embrionário.  Isso  cria  um  espaço livre para o qual as células podem subsequentemente migrar.10 Quando a migração de células e o desenvolvimento de  órgãos  estão  completos,  o  excesso  de  hialuronano  é  degradado  pela  enzima  hialuronidase.  O  ácido  hialurônico também é importante na orientação de reposição celular que ocorre durante o processo de cicatrização.10 São encontrados três tipos de fibras no espaço extracelular: colágeno, elastina e fibras reticulares. O colágeno é a proteína  mais  comum  no  organismo.  É  uma  fibra  branca  resistente  e  sem  vida  que  funciona  como  moldura estrutural para a pele, ligamentos, tendões e muitas outras estruturas. A  elastina age como uma banda elástica, que pode  ser  esticada  e  retornar  à  sua  forma  original.  Fibras  de  elastina  são  abundantes  em  estruturas  sujeitas  a frequente estiramento, como a aorta e alguns ligamentos. As fibras reticulares são extremamente finas e criam uma rede  flexível  em  órgãos  sujeitos  a  alterações  de  forma  ou  volume,  como  baço,  fígado,  útero  ou  camada  muscular intestinal.6

Moléculas de adesão

As  moléculas  de  adesão  (CAM)  representam  classes  importantes  de  macromoléculas  extracelulares.  As  CAM podem ser moléculas de adesão entre uma célula e outra e entre a célula e a matriz celular. Existem quatro classes principais de CAM: caderinas, selectinas, integrinas e proteínas da superfamília de imunoglobulinas (Ig).10 Todas as  caderinas,  selectinas  e  integrinas  dependem  de  íons  cálcio  extracelulares  (ou  magnésio  para  determinadas integrinas)  para  funcionar.  As  moléculas  de  adesão  celular  independentes  de  cálcio  pertencem  à  superfamília  de proteínas Ig. Caderinas.  As  caderinas  fazem  a  ligação  de  partes  do  citoesqueleto  interno  (actina  e  estruturas  denominadas cateninas)  com  caderinas  extracelulares  de  uma  célula  adjacente.10  Este  tipo  de  ligação  é  denominado  homofílico; isso significa que moléculas de uma mesma célula se ligam a moléculas do mesmo tipo em células adjacentes. São conhecidos mais de 40 tipos diferentes de caderinas, e são encontrados em junções intercelulares como zônula e a mácula aderente.10 Selectinas.  As  selectinas  ligam  os  carboidratos  nos  ligantes  de  uma  célula  adjacente  em  um  tipo  de  interação denominada heterofílica. Em interações heterofílicas, as moléculas de uma célula se ligam a moléculas de um tipo diferente nas células adjacentes. As selectinas são encontradas em células endoteliais ativadas de vasos sanguíneos, nos leucócitos e nas plaquetas. Estas juntamente com integrinas e Ig participam na circulação de leucócitos através do revestimento endotelial dos vasos sanguíneos durante processos inflamatórios.10 Integrinas.  As  integrinas  geralmente  ajudam  a  fixar  as  células  epiteliais  na  membrana  basal  subjacente. 10  Ao contrário de outras CAM, as integrinas são heterodímeros compostos por subunidades a e b. No meio extracelular estão  ligadas  a  fibronectina  e  laminina,  dois  componentes  principais  da  membrana  basal.  Como  as  caderinas,  sua porção intracelular é ligada à actina. Um grupo de integrinas está associado aos hemidesmossomos, enquanto outros se  associam  à  superfície  dos  leucócitos,  macrófagos  e  plaquetas.  As  integrinas  geralmente  apresentam  baixa afinidade com seus ligantes, a menos que estejam associados a contatos focais na célula e hemidesmossomos. Isso possibilita  algum  movimento  entre  as  células,  exceto  quando  é  necessária  uma  forte  ligação  para  fixar  as  células epiteliais ao tecido conjuntivo subjacente. Determinadas  integrinas  desempenham  um  papel  importante  ao  propiciar  aos  leucócitos  a  passagem  através  da parede  dos  vasos,  um  processo  denominado  transmigração.  Pessoas  afetadas  com  deficiência  de  adesão  de leucócitos são incapazes de sintetizar adequadamente as moléculas de integrina.10 Como resultado, esses indivíduos têm infecções bacterianas de repetição, porque seus leucócitos são incapazes de transmigrar através das paredes dos vasos. Superfamília  das  imunoglobulinas.  As  proteínas  da  superfamília  Ig  consistem  em  grupos  de  uma  ou  mais proteínas de adesão semelhantes à Ig, estruturalmente semelhantes a moléculas de anticorpo. O exemplo mais bem estudado  de  proteínas  da  superfamília  Ig  são  as  moléculas  de  adesão  de  células  neurais  (NCAM),  expressas  em uma variedade de células, incluindo a maioria das células nervosas. Todas são independentes de íons cálcio, mas, ao contrário de outras CAM, podem participar de interações homofílicas ou heterofílicas. Conexões heterofílicas são feitas com outros membros da superfamília, como de moléculas de adesão intracelular (ICAM). Durante o início do desenvolvimento do sistema nervoso central, as células do teto do tubo neural expressam altos níveis de NCAM em sua  superfície  celular  e  são  incapazes  de  se  mover  devido  a  adesões  intercelulares.  As  futuras  células  da  crista neural  perdem  NCAM  e  começam  a  migrar  para  diversas  áreas  do  organismo.  Os  membros  da  superfamília  Ig também desempenham um papel importante no processo de retorno de leucócitos durante a inflamação.

Resumo

As  células  do  organismo  são  organizadas  em  quatro  tipos  básicos  de  tecidos:  epitelial,  conjuntivo,  muscular  e nervoso.  O  epitélio  recobre  e  reveste  as  superfícies  corporais  e  forma  os  componentes  funcionais  de  estruturas glandulares.  O  tecido  epitelial  é  classificado  em  três  tipos,  de  acordo  com  o  formato  das  células  e  o  número  de camadas: simples, estratificado e pseudoestratificado. As células de tecido epitelial são mantidas unidas por três tipos de junções intercelulares: de oclusão, aderentes e comunicantes. Elas estão conectadas ao tecido subjacente por hemidesmossomos. O tecido conjuntivo sustenta e conecta as estruturas corporais; forma ossos e o sistema esquelético, estruturas

articulares, células do sangue e substâncias intercelulares. O tecido conjuntivo propriamente dito pode ser dividido em  quatro  tipos:  frouxo  ou  areolar,  que  preenche  os  espaços  orgânicos  e  é  caracterizado  por  uma  grande quantidade de substância de base; adiposo, que armazena gordura; reticular, que forma a estrutura arquitetônica de diversas  estruturas  corporais;  e  denso,  regular  e  irregular,  que  forma  as  estruturas  como  tendões  e  ligamentos (regular) e a derme cutânea (irregular). O  tecido  muscular  é  um  tecido  especializado  concebido  para  realização  de  contrações.  Existem  três  tipos  de tecido  muscular:  esquelético,  cardíaco  e  liso.  As  moléculas  de  actina  e  miosina  interagem  para  produzir  o encurtamento  do  músculo,  um  processo  ativado  pela  existência  de  cálcio.  No  músculo  esquelético,  o  cálcio  é liberado a partir do retículo sarcoplasmático, em resposta a um potencial de ação. O músculo liso é muitas vezes denominado músculo involuntário,  porque  pode  se  contrair  espontaneamente  ou  mediante  a  atividade  do  sistema nervoso autônomo. Difere do músculo esquelético pelo fato de que seu retículo sarcoplasmático é menos definido e depende da entrada de íons cálcio extracelular para que ocorra a contração muscular. O tecido nervoso é projetado para fins de comunicação e inclui os neurônios, as estruturas neurais que lhe dão suporte e as células ependimárias que revestem os ventrículos do cérebro e do canal espinal. A  matriz  extracelular  é  constituída  por  uma  variedade  de  proteínas  e  polissacarídios.  Estas  proteínas  e polissacarídios  são  secretados  localmente  e  organizados  em  uma  malha  de  suporte,  em  estreita  associação  às células que as produzem. A quantidade e composição da matriz variam de acordo com os diferentes tecidos e sua função.  Fibras  extracelulares  incluem  as  fibras  de  colágeno,  que  compreendem  tendões  e  ligamentos;  fibras elásticas, encontradas em artérias de grande calibre e alguns ligamentos; e fibras reticulares finas, abundantes em órgãos  sujeitos  a  alterações  de  volume  (p.  ex.,  baço  e  fígado).  Uma  classe  importante  de  macromoléculas extracelulares é a das moléculas de adesão que mantêm o contato intercelular. Existem três classes de moléculas de  adesão  que  dependem  de  cálcio  extracelular  para  funcionar  na  adesão  celular:  caderinas,  que  ligam  partes  do citoesqueleto interno com a caderina extracelular de uma célula adjacente; selectinas, que se ligam a carboidratos encontrados nos ligantes de células adjacentes; e integrinas (algumas são dependentes de magnésio), que auxiliam na fixação de células epiteliais na membrana basal subjacente. As proteínas da superfamília Ig são moléculas de adesão independentes de cálcio que mantêm unidas as células, como no sistema nervoso.

Exercícios de revisão

1.

Tatuagens consistem em pigmentos que foram injetados na pele.

A.

2.

Explique o que acontece com o corante, uma vez que foi injetado e por que, a唀nal, não pode ser removido por lavagens sucessivas.

As pessoas que ingerem quantidades su唀cientes de álcool apresentam mudanças rápidas no funcionamento do SNC, incluindo alterações

motoras e comportamentais, e o odor de álcool pode ser detectado em sua respiração.

A.

3.

Use os conceitos relacionados com a estrutura de dupla camada lipídica da membrana celular para explicar essas observações.

A absorção de glicose a partir do intestino envolve um mecanismo de cotransporte, em que o transporte primário ativo de íons sódio é usado

para proporcionar o transporte secundário de glicose.

A.

Estabeleça uma hipótese sobre como essa informação pode ser usada para projetar uma solução de reidratação oral para alguém com

diarreia.

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Quando confrontada com o estresse que coloca em perigo sua estrutura e função normais, a célula sofre alterações adaptativas que possibilitam a sobrevivência e a manutenção da função. Somente quando o estresse é esmagador ou a adaptação é ineficaz, ocorrem o dano e a morte celular. Este capítulo trata de adaptação, dano e morte das células.

Adaptação celular

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Citar o objetivo geral das alterações na estrutura e função das células que ocorrem como resultado de processos adaptativos normais

Descrever alterações celulares ocorridas com atro䎠a, hipertro䎠a, hiperplasia, metaplasia e displasia e as condições gerais em que se dão essas

alterações



Comparar a patogênese e os efeitos de calci䎠cações distró䎠cas e metastáticas

As células se adaptam a alterações do meio ambiente interno, do mesmo modo que o organismo como um todo se adapta  às  alterações  do  meio  ambiente  externo. As  células  podem  se  ajustar  passando  por  alterações  no  tamanho, número e tipo. Estas alterações, possíveis de ocorrer isoladamente ou em combinação, conduzem a: • Atrofia

• Hipertrofia • Hiperplasia • Metaplasia • Displasia. As  respostas  adaptativas  também  incluem  acúmulo  e  armazenamento  intracelular  de  produtos  em  quantidade anormal.1 Existem  diversos  mecanismos  moleculares  que  fazem  a  mediação  da  adaptação  celular,  assim  como  fatores produzidos  por  outras  células  ou  pelas  próprias  células.  Esses  mecanismos  dependem  em  grande  parte  dos  sinais transmitidos pelos mensageiros químicos, que exercem seus efeitos alterando a função do gene. Em geral, os genes expressos em todas as células se dividem em duas categorias: • Genes operacionais, que são necessários para o funcionamento normal de uma célula

• Genes que determinam as características de diferenciação de determinado tipo de célula. Em muitas respostas celulares adaptativas, a expressão dos genes de diferenciação é alterada, enquanto os genes operacionais permanecem inalterados. Assim, uma célula é capaz de alterar o tamanho ou a forma sem comprometer

sua função normal. Quando o estímulo que provocou a adaptação é removido, o efeito sobre a expressão dos genes de  diferenciação  também  é  removido  e  as  células  retomam  seu  estado  anterior  de  função  especializada.  As alterações  celulares  adaptativas  são  consideradas  normais  ou  anormais  se  a  resposta  tiver  sido  mediada  por  um estímulo  adequado.  Respostas  adaptativas  normais  vêm  em  atendimento  a  uma  necessidade  e  a  um  estímulo apropriado. Após a remoção da necessidade, cessa a resposta adaptativa.

Conceitos fundamentais

Adaptações celulares



As células são capazes de se adaptar ao aumento da demanda de trabalho ou a ameaças a sua sobrevivência, alterando seu tamanho (atro䎠a e hipertro䎠a),

número (hiperplasia) e forma (metaplasia)



A adaptação celular normal ocorre em resposta a um estímulo apropriado e cessa assim que a necessidade de adaptação deixa de existir

Atrofa Quando confrontada com uma redução das exigências de trabalho ou com condições ambientais adversas, a maioria das células é capaz de reverter para um tamanho menor e um nível mais baixo e mais eficiente de funcionamento, compatível com a sobrevivência. Essa diminuição no tamanho da célula é denominada atrofia e está na Figura 5.1, ilustrando a atrofia do endométrio. Células atrofiadas reduzem seu consumo de oxigênio e outras funções por meio da  diminuição  do  número  e  tamanho  de  suas  organelas  e  outras  estruturas  celulares.  Passa  a  haver  um  número menor  de  mitocôndrias,  miofilamentos  e  estruturas  de  retículo  endoplasmático.  Quando  ocorre  o  envolvimento  de um número suficiente de células, todo o tecido ou músculo sofre atrofia. O tamanho da célula, particularmente no tecido muscular, está relacionado com a carga de trabalho. À medida que a  carga  de  trabalho  das  células  diminui,  acontece  também  uma  redução  no  consumo  de  oxigênio  e  na  síntese proteica.  Além  disso,  a  massa  muscular  apropriada  é  mantida  por  níveis  suficientes  de  insulina  e  fator  de crescimento  semelhante  à  insulina  tipo  1  (IGF­1).2  Quando  os  níveis  de  insulina  e  IGF­1  estão  baixos  ou  na existência  de  sinais  catabólicos,  a  atrofia  muscular  dá­se  por  mecanismos  que  incluem  redução  de  processos  de síntese,  aumento  da  proteólise  pelo  sistema  ubiquitina­proteassoma  e  apoptose  ou  morte  celular  programada.3 No sistema ubiquitina­proteassoma, as proteínas intracelulares destinadas à destruição têm ligação covalente com uma pequena  proteína  denominada  ubiquitina  e  são  degradadas  por  pequenas  organelas  citoplasmáticas  denominadas proteassomas.3

Figura  5.1  •  Atrofia  de  células  no  endométrio.  A.  Ilustração  do  tecido  de  uma  mulher  em  idade  fértil,  com endométrio de espessura normal. B. Esta seção do endométrio é de uma mulher de 75 anos e mostra atrofia celular e glândulas císticas. (As duas lâminas têm o mesmo grau de ampliação.) (Extraída de Rubin R., Strayer D. (2012). Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  Fig.  1­2,  p.  3).  Philadelphia,  PA:  Lippincott Williams & Wilkins.)

As causas genéricas de atrofia podem ser agrupadas em cinco categorias:

1. 2. 3. 4. 5.

Desuso Desenervação Perda de estimulação endócrina Nutrição inadequada Isquemia ou diminuição do fluxo sanguíneo.

A  atrofia  por  desuso  sobrevém  quando  há  uma  diminuição  no  uso  da  musculatura  esquelética.  Um  exemplo extremo de atrofia por desuso pode ser observado na musculatura de membros imobilizados por aparelho gessado. Como  a  atrofia  é  adaptável  e  reversível,  o  tamanho  do  músculo  é  restaurado  depois  que  o  aparelho  gessado  é removido e o uso muscular é retomado. A atrofia por desenervação é um tipo de atrofia por desuso nos músculos de membros paralisados. A falta de estimulação endócrina produz um tipo de atrofia por desuso. Nas mulheres, a perda de estimulação pelo estrogênio durante a menopausa resulta em alterações atróficas nos órgãos reprodutores. Com  a  desnutrição  e  a  diminuição  do  fluxo  de  sangue,  as  células  diminuem  seu  tamanho  e  sua  necessidade energética como um meio de sobrevivência.

Hipertrofa Hipertrofia  representa  um  aumento  no  tamanho  celular,  bem  como  na  quantidade  de  massa  de  tecido  funcional (Figura 5.2). Isso resulta de um aumento da carga de trabalho aplicada sobre um órgão ou uma parte do organismo, e é frequentemente observado em tecidos do músculo cardíaco e esquelético que não podem se adaptar ao aumento da carga de trabalho por meio de divisão mitótica e formação de mais células.1 A hipertrofia envolve um aumento nos componentes funcionais da célula, que possibilita à célula alcançar o equilíbrio entre a demanda e a capacidade funcional. Por exemplo, à medida que as células musculares se hipertrofiam, são sintetizados filamentos adicionais de actina e miosina, enzimas celulares e adenosina trifosfato (ATP).1,4 A  hipertrofia  pode  resultar  de  condições  fisiológicas  normais  ou  patológicas.  O  aumento  da  massa  muscular associado à prática de exercícios físicos é um exemplo de hipertrofia fisiológica. A hipertrofia patológica é efeito de distúrbios  orgânicos  e  pode  ser  adaptativa  ou  compensatória.  Exemplos  de  hipertrofia  adaptativa  ocorrem  com  o espessamento  da  bexiga  por  obstrução  contínua  e  prolongada  do  fluxo  urinário  e  em  casos  de  hipertrofia  do miocárdio  resultante  de  doença  cardíaca  valvular  ou  hipertensão.  Hipertrofia  compensatória  é  o  aumento  de  um órgão  ou  tecido  remanescente  após  uma  parte  ter  sido  removida  ou  inativada  cirurgicamente.  Por  exemplo,  se  um rim é retirado, o rim remanescente aumenta de tamanho para compensar a perda.

Figura 5.2 • Hipertrofia miocárdica. Corte transversal do coração com hipertrofia ventricular esquerda. (Extraída de Rubin  R.,  Strayer  D.  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  4). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Os  sinais  iniciais  de  hipertrofia  parecem  ser  complexos  e  estar  relacionados  com  a  depleção  de  ATP;  forças mecânicas,  como  o  alongamento  das  fibras  musculares;  ativação  dos  produtos  de  degradação  celular  e  fatores hormonais.4 No caso do músculo cardíaco, os sinais iniciais podem ser divididos em duas grandes categorias: 1. Mecanismos biomecânicos e sensíveis ao estiramento 2. Mecanismos  neuro­humorais  associados  a  liberação  de  hormônios,  fatores  de  crescimento,  citocinas  e quimiocinas.5 Receptores internos sensíveis ao estiramento para sinais bioquímicos, assim como uma variedade de receptores ligados  à  membrana  para  ligantes  neuro­humorais  específicos,  como  IGF­1  e  fator  de  crescimento  epidérmico (EGF), ativam as vias de transdução de sinalização específicas.5 Essas vias controlam o crescimento do miocárdio alterando  a  expressão  do  gene  para  aumentar  a  síntese  e  reduzir  a  degradação  de  proteínas,  assim  provoca­se  um aumento hipertrófico do coração. Por fim, é alcançado um limite, para além do qual um novo aumento da massa de tecido  já  não  é  capaz  de  compensar  o  aumento  da  carga  de  trabalho.  Os  fatores  limitantes  para  a  hipertrofia continuada devem estar relacionados com as limitações no fluxo sanguíneo. Em caso de hipertensão, por exemplo, a sobrecarga de trabalho necessário para bombear o sangue contra a pressão arterial elevada na aorta resulta em uma intensificação progressiva na massa muscular ventricular esquerda e na necessidade de fluxo sanguíneo coronário. Os  estudiosos  continuam  a  mostrar  interesse  nas  vias  de  sinalização  que  controlam  a  disposição  dos  elementos contrácteis  em  casos  de  hipertrofia  cardíaca. As  pesquisas  apontam  determinadas  moléculas  de  sinalização  como possíveis de alterar a expressão do gene capacitado para controlar o tamanho e a estrutura de proteínas contrácteis das células do miocárdio hipertrofiado. Por exemplo, as células do miocárdio hipertrofiado de atletas bem treinados mostram um aumento proporcional na largura e comprimento. Isto é o contrário do que acontece com a hipertrofia que  se  desenvolve  em  casos  de  miocardiopatia  dilatada,  na  qual  as  células  hipertrofiadas  apresentam  um  aumento relativamente maior no comprimento do que na largura. Em sobrecarga de pressão, como ocorre com a hipertensão, as  células  hipertrofiadas  têm  largura  maior  do  que  o  comprimento.5  Acredita­se  que  a  elucidação  das  vias  de sinalização que determinam as características adaptativas e não adaptativas da hipertrofia cardíaca conduzirá a novos alvos de tratamento.

Hiperplasia Hiperplasia diz respeito a um aumento no número de células de um órgão ou tecido. Ocorre em tecidos formados por  células  capazes  de  realizar  divisão  mitótica,  como  na  epiderme,  epitélio  intestinal  e  tecido  glandular.1  Certos tipos de células como os neurônios raramente se dividem e, por conseguinte, têm pouca capacidade, se houver, para crescimento  hiperplásico.  Existem  evidências  de  que  a  hiperplasia  envolve  a  ativação  de  genes  que  controlam  a proliferação celular e a existência de mensageiros intracelulares que monitoram a replicação celular e o crescimento. Como  acontece  com  outras  respostas  celulares  adaptativas  normais,  a  hiperplasia  é  um  processo  controlado  que vem como resposta a um estímulo adequado e cessa após a remoção do estímulo. Os estímulos que induzem a hiperplasia podem ser fisiológicos ou não fisiológicos. Existem dois tipos comuns de  hiperplasia  fisiológica:  hormonais  e  compensatórias.  O  aumento  das  mamas  e  do  útero  durante  a  gestação  são exemplos de hiperplasia fisiológica, resultante da estimulação pelo estrogênio. A regeneração do fígado que ocorre após  hepatectomia  parcial  (remoção  parcial  do  fígado)  é  um  exemplo  de  hiperplasia  compensatória.  Hiperplasia também  é  uma  resposta  importante  do  tecido  conjuntivo  no  processo  de  cicatrização  de  feridas,  durante  o  qual  a proliferação de fibroblastos e vasos sanguíneos contribui com o reparo. Embora a hipertrofia e a hiperplasia sejam dois processos distintos, podem acontecer em conjunto e frequentemente são provocadas pelo mesmo mecanismo.1 Por  exemplo,  o  útero  grávido  sofre  tanto  de  hipertrofia  quanto  de  hiperplasia  como  resultado  da  estimulação  pelo estrogênio. A  maioria  dos  tipos  de  hiperplasia  não  fisiológica  advém  de  estimulação  hormonal  excessiva  ou  do  efeito  de fatores  de  crescimento  no  tecido­alvo.2  O  público  parece  acreditar  que  o  resultado  de  um  teste  de  laboratório  que inclui  o  termo  hiperplasia  geralmente  diz  respeito  a  uma  condição  grave.  Por  exemplo,  a  produção  excessiva  de

estrogênio  pode  causar  hiperplasia  endometrial  e  sangramento  menstrual  anormal. A  hiperplasia  do  endométrio  é considerada  um  fator  de  alto  risco  para  o  desenvolvimento  de  câncer  do  endométrio  e  é  uma  condição  a  ser cuidadosamente monitorada.6 A hiperplasia benigna da próstata (HBP), que é um distúrbio comum em homens com mais de 50 anos de idade, está relacionada com a ação de androgênios. A HBP é uma condição benigna que provoca sintomas  no  trato  urinário  inferior.  Algumas  vezes,  a  HBP  evolui  para  câncer  de  próstata. 2,7  Mulheres  com hiperplasia  atípica  da  mama  também  devem  ser  cuidadosamente  monitoradas,  uma  vez  que  têm  um  risco  quatro vezes  maior  de  desenvolver  carcinoma  ductal  in  situ  ou  câncer  de  mama  invasivo.8  Verrugas  na  pele  são  outro exemplo  de  hiperplasia  causada  pelos  fatores  de  crescimento  produzidos  por  determinados  tipos  de  vírus,  como papilomavírus.

Metaplasia Metaplasia  representa  uma  alteração  reversível  na  qual  um  tipo  de  célula  adulta  (epitelial  ou  mesenquimal)  é substituído  por  outro  tipo  de  célula  adulta.  Considera­se  que  a  metaplasia  envolva  a  reprogramação  de  células­ tronco indiferenciadas encontradas no tecido que sofre as alterações metaplásicas.1 Geralmente,  a  metaplasia  ocorre  em  resposta  a  irritação  e  inflamação  crônica  e  viabiliza  a  reposição  de  células mais capazes de sobreviver em circunstâncias nas quais um tipo de célula mais frágil pode não resistir. No entanto, a conversão de um tipo de célula nunca ultrapassa os limites do tipo de tecido primário (p. ex., um tipo de célula epitelial  pode  ser  convertido  em  outro  tipo  de  célula  epitelial,  mas  não  em  uma  célula  de  tecido  conjuntivo).  Um exemplo de metaplasia é a substituição adaptativa de células epiteliais escamosas estratificadas por células epiteliais cilíndricas  ciliadas  que  ocorre  na  traqueia  e  vias  respiratórias  de  um  fumante  habitual  de  cigarros.  Esôfago  de Barrett  é  uma  condição  pré­maligna  que  se  manifesta  no  esôfago  de  pessoas  com  casos  crônicos  de  doença  do refluxo  gastresofágico  (DRGE).  É  caracterizada  pela  transformação  do  epitélio  escamoso  normal  do  esôfago inferior  em  epitélio  cilíndrico.  Esôfago  de  Barrett  é  o  principal  fator  de  risco  para  o  desenvolvimento  de adenocarcinoma esofágico.9

Displasia A displasia é caracterizada pelo crescimento celular desordenado de um tecido específico ao resultar em células que variam  de  tamanho,  forma  e  organização.  Graus  menores  de  displasia  estão  associados  a  irritação  ou  inflamação crônica. O padrão é mais frequente em áreas do epitélio escamoso metaplásico do sistema respiratório e do colo do útero. Embora displasia seja um processo anormal, é adaptável no sentido em que é potencialmente reversível após a  remoção  da  causa.  Displasia  está  fortemente  implicada  como  precursora  de  câncer.1  Em  casos  de  câncer  do sistema  respiratório  e  do  colo  do  útero,  têm  sido  encontradas  alterações  displásicas  adjacentes  aos  focos  de transformação cancerosa. Por meio do esfregaço de Papanicolaou vem sendo documentado que o câncer do colo do útero  se  desenvolve  a  partir  de  uma  série  de  alterações  epiteliais  incrementais,  que  variam  de  displasia  grave  até câncer  invasivo.  No  entanto,  a  displasia  é  um  processo  adaptativo  e,  como  tal,  não  resulta  necessariamente  em câncer. Recém­nascidos  prematuros  ventilados  por  longos  períodos  devido  a  prematuridade  e  falta  de  surfactante,  e também  os  nascidos  a  termo  que  necessitam  de  intubação  e  oxigênio  ventilado  no  primeiro  mês  de  vida, frequentemente desenvolvem displasia broncopulmonar (DBP).10 Na verdade, como a taxa de sobrevivência atual de prematuros  é  mais  alta,  fica  evidente  um  número  maior  de  casos  de  DBP.  Aproximadamente  20%  dos  recém­ nascidos  com  menos  de  30  semanas  de  gestação  e  abaixo  de  1,5  kg  desenvolvem  DBP.10  Embora  tenha  havido resultados excelentes no tratamento, o que diminuiu um pouco o efeito negativo da disfunção pulmonar sofrida por crianças com DBP, muitas delas vão ter efeitos a longo prazo associados à destruição alveolar pelo resto da vida.1,10

Acúmulo intracelular Acúmulos intracelulares representam o armazenamento de substâncias que as células não podem usar imediatamente nem eliminar. Essas substâncias podem se acumular no citoplasma (frequentemente nos lisossomos) ou no núcleo. Em alguns casos, o acúmulo pode ser de uma substância anormal produzida pela célula e, em outros casos, a célula pode  estar  armazenando  material  exógeno  ou  produtos  de  processos  patológicos  que  ocorrem  em  outras  partes  do

organismo.  Um  exemplo  é  o  acúmulo  de  fragmentos  ß­amiloides,  que  evolui  para  uma  doença  da  musculatura esquelética denominada miosite.11 Essas  substâncias  podem  se  acumular  de  maneira  transitória  ou  permanente,  ser  inofensivas  ou  tóxicas  e agrupadas em três categorias: 1. Substâncias  normalmente  encontradas  no  organismo,  como  lipídios,  proteínas,  carboidratos,  melanina  e bilirrubina, armazenadas em quantidades anormalmente grandes 2. Produtos endógenos anormais, como os que resultam de erros inatos do metabolismo 3. Produtos exógenos, como agentes e pigmentos ambientais, que não podem ser degradados pela célula.2 A  acumulação  de  constituintes  celulares  normais  sucede  quando  uma  substância  é  produzida  em  uma  taxa  que excede a de seu metabolismo ou remoção. Um exemplo desse tipo de processo são as alterações lipídicas no fígado, devido  ao  acúmulo  intracelular  de  triglicerídios.  Normalmente,  as  células  hepáticas  contêm  um  pouco  de  gordura, que é oxidada e utilizada para produzir energia ou convertida em triglicerídios. Essa gordura é derivada de ácidos graxos livres liberados a partir do tecido adiposo. A acumulação anormal ocorre quando o fornecimento de ácidos graxos  livres  para  o  fígado  tem  uma  elevação,  como  acontece  no  jejum  e  em  casos  de  diabetes  melito,  ou  quando existe um distúrbio no metabolismo intra­hepático dos lipídios, como nos casos de alcoolismo. O  acúmulo  intracelular  pode  ser  o  resultado  de  distúrbios  genéticos  que  atrapalham  o  metabolismo  de determinadas  substâncias.  Uma  enzima  normal  pode  ser  substituída  por  uma  anormal,  resultando  na  formação  de uma substância que não pode ser utilizada nem eliminada pela célula; ou pode haver a falta de uma enzima, de modo que um produto intermediário se acumula na célula. Por exemplo, existem pelo menos 10 distúrbios genéticos que afetam  o  metabolismo  do  glicogênio,  mas  a  maioria  leva  ao  acúmulo  de  reservas  de  glicogênio  intracelular.  Na forma  mais  comum  desse  tipo  de  patologia,  a  doença  de  von  Gierke,  grandes  quantidades  de  glicogênio  se acumulam no fígado e nos rins, devido à deficiência da enzima glicose­6­fosfatase. Sem esta enzima, o glicogênio não pode ser decomposto em glicose. A condição leva não apenas ao acúmulo de glicogênio, mas também à redução dos níveis sanguíneos de glicose. Na doença de Tay­Sachs, outro distúrbio genético, lipídios anormais se acumulam no cérebro e outros tecidos, causando deterioração motora e mental, que se manifesta aproximadamente aos 6 meses de idade, seguida de morte entre 2 e 5 anos de idade. De maneira semelhante, outros defeitos enzimáticos conduzem ao acúmulo de outras substâncias. Pigmentos  são  substâncias  coloridas  possíveis  de  se  acumularem  nas  células.  Podem  ter  origem  endógena (proveniente do próprio organismo) ou exógena (proveniente de fora do organismo). A  icterícia se caracteriza por descoloração amarelada dos tecidos, devido à retenção de bilirrubina, um pigmento biliar endógeno. Esta condição pode ser o resultado de aumento na produção de bilirrubina pela destruição de hemácias, obstrução da passagem de bile para o intestino ou condições tóxicas que afetem a capacidade do fígado de remover a bilirrubina do sangue. A lipofuscina  é  um  pigmento  castanho­claro  oriundo  da  acumulação  de  resíduos  da  digestão  incompleta  de  restos celulares  durante  o  processo  normal  de  renovação  das  estruturas  celulares  (Figura 5.3). O acúmulo de lipofuscina aumenta  com  a  idade  e,  por  vezes,  é  chamado  de  pigmento do desgaste (wear­and­tear pigment).  É  mais  comum em células do coração, células nervosas e do fígado do que em outros tecidos e é observado com mais frequência em condições associadas à atrofia de um órgão. Um dos pigmentos exógenos mais comuns é o carbono sob a forma de pó de carvão. Naqueles que trabalham em minas  de  carvão  ou  em  pessoas  expostas  a  ambientes  altamente  poluídos,  o  acúmulo  de  pó  de  carvão  escurece  o tecido pulmonar e pode causar uma doença pulmonar grave. A formação de uma linha azulada ao longo das margens da  gengiva  é  um  dos  recursos  de  diagnóstico  do  envenenamento  por  chumbo.  Tatuagens  provêm  de  pigmentos insolúveis introduzidos na pele, onde são engolfados por macrófagos e duram a vida toda. O significado de acumulações intracelulares depende da causa e da gravidade da condição. Muitas acumulações, como  a  de  lipofuscina  e  leves  alterações  graxas,  não  têm  efeito  sobre  o  funcionamento  das  células.  Algumas condições, como a hiperbilirrubinemia que causa icterícia, são reversíveis. Outras doenças, como os distúrbios de armazenamento de glicogênio, produzem acúmulos que originam a disfunção orgânica e outras alterações na função fisiológica.

Figura  5.3  •  Acúmulo  intracelular  de  lipofuscina.  Fotomicrografia  do  fígado  de  um  homem  de  80  anos  de  idade mostra  grânulos  citoplasmáticos  dourados,  que  representam  depósitos  de  lipofuscina  nos  lisossomos.  (Extraída  de Rubin  R.,  Strayer  D.  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  121). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Calcificações patológicas Uma  calcificação  patológica  envolve  a  deposição  anormal  de  sais  de  cálcio  nos  tecidos  juntamente  com  menores quantidades de ferro, magnésio e outros minerais. É denominada calcificação distrófica quando ocorre em tecidos mortos, e calcificação metastática quando acontece no tecido normal.

Calcificação distrófica Calcificação distrófica representa a deposição macroscópica de sais de cálcio em tecidos orgânicos danificados.12,13 Muitas vezes, é visível a olho nu como depósitos que variam de aspecto, desde os pequenos como grãos de areia, até  um  material  duro  e  empedrado.  A  patogênese  da  calcificação  distrófica  envolve  a  formação  intracelular  ou extracelular de fosfato de cálcio cristalino. Os componentes dos depósitos de cálcio derivam de células mortas ou que estão morrendo, bem como a partir de líquidos da circulação e intersticiais. A calcificação distrófica é comumente observada em lesões ateromatosas na aterosclerose avançada, em áreas de lesão na aorta e grandes vasos sanguíneos, assim como em valvas cardíacas danificadas. Embora calcificação possa indicar apenas lesão celular prévia, como em lesões cicatrizadas de tuberculose, também é uma causa frequente de disfunção  do  órgão.  Por  exemplo,  a  calcificação  da  valva  aórtica  é  uma  causa  frequente  de  estenose  aórtica  em idosos (Figura 5.4).

Calcificação metastática Ao  contrário  da  calcificação  distrófica,  que  ocorre  em  tecidos  lesionados,  a  calcificação  metastática  aparece  em tecidos  normais,  como  resultado  de  um  aumento  dos  níveis  de  cálcio  no  plasma  (hipercalcemia).  Praticamente, qualquer condição que eleve os níveis séricos de cálcio pode levar à calcificação em locais inapropriados, como o pulmão, os túbulos renais e os vasos sanguíneos. As principais causas da hipercalcemia são hiperparatireoidismo, tanto primário quanto secundário à retenção de fosfato em casos de insuficiência renal; aumento na mobilização do cálcio  dos  ossos,  conforme  na  doença  de  Paget,  câncer  com  lesões  ósseas  metastáticas  ou  imobilização  e intoxicação por vitamina D.14

Figura  5.4  •  Estenose  aórtica  calcificada.  São  evidentes  os  grandes  depósitos  de  sais  de  cálcio  nas  válvulas  e margens livres da valva aórtica espessada, como observados de cima. (Extraída de Rubin R., Strayer D. (2008). Cell injury. In Rubin’s pathology: Clinicopathologic foundations of medicine  (5th  ed.,  p.  13).  Philadelphia,  PA:  Lippincott Williams & Wilkins.)

Resumo

As  células  se  adaptam  às  alterações  em  seu  ambiente  e  em  suas  demandas  de  trabalho,  modificando  tamanho, número  e  características.  Estas  alterações  adaptativas  são  consistentes  com  as  necessidades  da  célula  e  ocorrem em resposta a um estímulo adequado. As alterações geralmente são revertidas após a remoção do estímulo. Quando  confrontadas  com  uma  diminuição  na  demanda  de  trabalho  ou  condições  ambientais  adversas,  as células  sofrem  atrofia  ou  reduzem  de  tamanho  e  revertem  para  um  nível  mais  baixo  e  mais  eficiente  de funcionamento. A hipertrofia resulta de uma demanda maior de trabalho e é caracterizada por aumento no tamanho do tecido, provocado pelo crescimento no tamanho das células e componentes intracelulares funcionais. O número crescente  de  células  de  um  tecido  ou  órgão  que  é  ainda  capaz  de  divisão  mitótica  é  denominado  hiperplasia. Metaplasia ocorre em resposta à irritação crônica e representa a substituição por um tipo de célula mais capaz de sobreviver sob determinadas condições do que um tipo de célula mais frágil, que pode não resistir. A displasia é caracterizada pelo crescimento celular desordenado de um tecido específico, que resulta em células que variam em tamanho, forma e aparência. Muitas vezes, é um precursor do câncer. Sob  certas  circunstâncias,  as  células  podem  acumular  quantidades  anormais  de  diferentes  substâncias.  Se  a acumulação reflete um distúrbio sistêmico corrigível, como a hiperbilirrubinemia que provoca icterícia, o acúmulo é  reversível.  Se  a  condição  não  pode  ser  corrigida,  como  muitas  vezes  ocorre  em  casos  de  erros  inatos  do metabolismo, as células ficam sobrecarregadas, causando lesão e morte celular. Calcificação  patológica  envolve  a  deposição  anormal  de  sais  de  cálcio  nos  tecidos.  Calcificação  distrófica ocorre em tecido morto ou que está morrendo. Embora a existência de calcificação distrófica possa apenas indicar lesão  celular  anterior,  também  é  uma  causa  frequente  de  disfunção  orgânica  (p.  ex.,  quando  afeta  as  valvas cardíacas). A calcificação metastática se manifesta em tecidos normais, como resultado de níveis séricos elevados de cálcio. Praticamente, qualquer condição que eleve os níveis séricos de cálcio pode levar à calcificação em locais impróprios, como o pulmão, os túbulos renais e os vasos sanguíneos.

Lesão e morte celulares

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever os mecanismos pelos quais agentes físicos, como traumatismo contuso, forças elétricas e extremos de temperatura, produzem lesão celular



Diferenciar os efeitos de radiações ionizantes e não ionizantes em termos de sua capacidade de causar lesão celular



Nomear os mecanismos e manifestações de lesão celular associados a envenenamento por chumbo



Relacionar a formação de radicais livres e estresse oxidativo com lesão e morte celulares

As células podem ser lesionadas de muitas maneiras. A extensão em que qualquer agente prejudicial pode causar lesão e morte celular depende em grande parte da intensidade e da duração da lesão e do tipo de célula envolvida. Uma  lesão  celular  normalmente  pode  ser  revertida  até  o  ponto  depois  do  qual  se  verifica  uma  lesão  irreversível  e morte  celular.  Se  um  estresse  específico  provoca  lesão  celular  reversível  ou  irreversível,  depende  da  gravidade  da lesão  e  de  variáveis  como  suprimento  sanguíneo,  estado  nutricional  e  capacidade  de  regeneração.  Lesão  e  morte celular são processos contínuos; no estado de saúde, são contrabalançados pela renovação celular.

Conceitos fundamentais

Lesão celular



As células podem ser dani䎠cadas de diferentes maneiras, incluindo traumatismo físico, extremos de temperatura, lesão por forças elétricas, exposição a

substâncias químicas prejudiciais, danos por radiação, lesão por agentes biológicos e fatores nutricionais



A maioria dos agentes prejudiciais exerce seus efeitos nocivos pela produção descontrolada de radicais livres, redução no suprimento ou utilização de oxigênio,

ou pelos efeitos destrutivos da liberação descontrolada de cálcio intracelular

Causas de lesão celular O  dano  celular  pode  ocorrer  de  várias  maneiras.  Para  fins  de  discussão,  as  maneiras  pelas  quais  as  células  são danificadas foram agrupadas em cinco categorias: 1. 2. 3. 4. 5.

Lesão por agentes físicos Lesão por radiação Lesão química Lesão por agentes biológicos Lesão por desequilíbrio nutricional.

Lesão por agentes físicos Agentes  físicos  responsáveis  por  dano  celular  e  tecidual  incluem  forças  mecânicas,  extremos  de  temperatura  e forças  elétricas.  São  causas  comuns  de  lesão  devido  a  exposição  ambiental;  acidentes  de  trabalho  e  transporte;  e violência física e agressão. Forças mecânicas. A  lesão  ou  traumatismo  pela  ação  de  forças  mecânicas  ocorre  como  resultado  do  impacto  do corpo  contra  um  objeto.  Tanto  o  corpo  quanto  a  massa  podem  estar  em  movimento  ou,  como  às  vezes  acontece, ambos mostramse em movimento no momento do impacto. Esse tipo de lesão causa laceração nos tecidos, fraturas ósseas, danos aos vasos sanguíneos e interrupção do fluxo sanguíneo. Extremos  de  temperatura.  Calor  e  frio  extremos  causam  danos  para  a  célula,  suas  organelas  e  seus  sistemas enzimáticos. A  exposição  ao  calor  de  baixa  intensidade  (43  a  46°C),  como  ocorre  com  queimaduras  de  espessura parcial  e  insolação  grave,  provoca  lesões  nas  células  por  induzir  uma  lesão  vascular,  acelerando  o  metabolismo celular,  inativando  enzimas  sensíveis  à  temperatura  e  provocando  o  rompimento  da  membrana  celular.  Com  calor mais intenso sobrevém a coagulação dos vasos sanguíneos e das proteínas do tecido. A exposição ao frio aumenta a

viscosidade do sangue e induz à vasoconstrição por ação direta sobre os vasos sanguíneos e por atividade reflexa do sistema  nervoso  simpático.  A  resultante  diminuição  do  fluxo  sanguíneo  pode  levar  à  lesão  hipóxica  do  tecido, dependendo  do  grau  e  da  duração  da  exposição  ao  frio.  Uma  lesão  por  congelamento  provavelmente  se  origina  de uma combinação de formação de cristais de gelo e vasoconstrição. A diminuição do fluxo sanguíneo leva a estase capilar e trombose arteriolar e capilar. O edema resulta do aumento da permeabilidade capilar. Lesões elétricas. As lesões causadas por eletricidade podem afetar o organismo por meio de extensa lesão tecidual e  pela  interrupção  de  impulsos  neurais  e  cardíacos.  Voltagem,  tipo  de  corrente,  amperagem,  via  da  corrente, resistência do tecido e tempo de exposição determinam os efeitos da eletricidade sobre o organismo.15 A corrente alternada (AC) geralmente é mais perigosa que a corrente contínua (DC), porque provoca contrações musculares  violentas;  isso  impede  a  pessoa  de  se  libertar  da  fonte  elétrica  e,  por  vezes,  resulta  em  fraturas  e luxações. Nas lesões elétricas, o organismo funciona como um condutor de corrente.15 A corrente elétrica entra no corpo a partir de uma fonte elétrica como um fio exposto, atravessa e sai para outro condutor, como a umidade do solo ou um pedaço de metal que a pessoa está segurando. O caminho que a corrente percorre é fundamental, porque a energia elétrica interrompe os impulsos em tecidos excitáveis. O fluxo de corrente através do cérebro pode cessar os  impulsos  dos  centros  respiratórios  no  tronco  encefálico,  e  o  fluxo  de  corrente  através  do  tórax  pode  causar arritmias cardíacas fatais. A  resistência  ao  fluxo  de  corrente  em  circuitos  elétricos  transforma  eletricidade  em  calor.  É  por  isso  que  os elementos  em  dispositivos  elétricos  de  aquecimento  são  feitos  de  metais  altamente  resistentes.  Grande  parte  dos danos  produzidos  por  lesões  elétricas  é  causada  pela  produção  de  calor  em  tecidos  com  resistência  elétrica  mais alta.  A  resistência  à  corrente  elétrica  varia  da  maior  para  a  menor  em  ossos,  gordura,  tendões,  pele,  músculos, sangue  e  nervos. A  lesão  mais  grave  ocorre  geralmente  no  local  da  pele  onde  a  corrente  entra  e  sai  do  organismo (Figura 5.5). Depois que a eletricidade penetra a pele, atravessa rapidamente o corpo ao longo das linhas de menor resistência:  por  meio  de  líquidos  corporais  e  nervos.  Pode  ocorrer  degeneração  das  paredes  dos  vasos,  levando  à formação  de  trombos  enquanto  a  corrente  flui  ao  longo  dos  vasos  sanguíneos.  Isso  pode  causar  extensa  lesão muscular  e  danos  profundos  aos  tecidos. A  pele  grossa  e  seca  é  mais  resistente  ao  fluxo  de  eletricidade  do  que  a pele fina e úmida. Considera­se que quanto maior a resistência da pele, mais grave a queimadura na pele, e quanto menor a resistência, maior é o efeito profundo e sistêmico.

Lesões por radiação A  radiação  eletromagnética  compreende  um  amplo  espectro  de  energia  propagada  por  ondas,  que  varia  de  raios gama  ionizantes  até  ondas  de  radiofrequência  (Figura  5.6).  Um  fóton  é  uma  partícula  de  energia  de  radiação. Energia  de  radiação  acima  da  faixa  da  radiação  ultravioleta  (UV)  é  denominada  radiação  ionizante,  porque  os fótons têm energia suficiente para derrubar os elétrons de átomos e moléculas. Radiação não ionizante se refere à energia  de  radiação  em  frequências  abaixo  daquela  da  luz  visível.  Radiação UV  representa  a  parte  do  espectro  de radiação eletromagnética pouco acima da faixa visível.15 Contém raios com energia crescente que são poderosos o suficiente para interromper vínculos intracelulares e causar queimaduras solares. Radiação ionizante. A radiação ionizante impacta as células extraindo elétrons das moléculas e átomos (causando ionização).  Isso  ocorre  pela  libertação  de  radicais  livres  que  destroem  as  células  e  por  atingir  diretamente moléculas­alvo.16 A radiação pode matar imediatamente as células, interromper a  replicação celular ou causar uma variedade de mutações genéticas que podem ou não ser fatais. A maior parte das lesões por radiação é causada pela irradiação localizada, empregada no tratamento de câncer. Com exceção de circunstâncias incomuns, como o uso de dose elevada que antecede um transplante de medula óssea, é rara a exposição do corpo inteiro à radiação.

Figura 5.5 • Queimadura elétrica da pele. A vítima foi eletrocutada depois de tentar impedir uma queda da escada, segurando­se  em  um  fio  de  alta  tensão.  (Extraída  de  McConnell  T.,  Hull  K.  (2011).  Human  form  human  function: Essentials of anatomy & physiology (p. 158). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Figura 5.6 • Espectro de radiação eletromagnética.

Os efeitos negativos da radiação ionizante variam de acordo com a dose, taxa de dosagem (uma dose única pode causar  maior  prejuízo  do  que  doses  fracionadas)  e  a  sensibilidade  diferente  de  cada  tipo  de  tecido  exposto  à radiação.  Devido  ao  efeito  sobre  a  síntese  do  ácido  desoxirribonucleico  (DNA)  e  à  interferência  no  processo  de mitose, as células da medula óssea e do intestino que se dividem rapidamente são muito mais vulneráveis a danos causados  por  radiação  do  que  tecidos  ósseos  e  da  musculatura  esquelética.  Com  o  tempo,  uma  exposição ocupacional e acidental à radiação ionizante pode resultar no aumento do risco para o desenvolvimento de diversos tipos de câncer, incluindo o câncer de pele, leucemia, sarcoma osteogênico e câncer de pulmão. O mesmo se aplica a pessoas quando expostas à radiação durante a infância.17 Muitas  das  manifestações  clínicas  de  lesões  por  radiação  resultam  de  lesão  celular  aguda,  alterações  dose­ dependentes  nos  vasos  sanguíneos  que  alimentam  os  tecidos  irradiados  e  substituição  por  tecido  fibrótico.  A resposta inicial da célula aos danos causados pela radiação envolve edema, rompimento das mitocôndrias e outras organelas,  alterações  na  membrana  celular  e  alterações  significativas  no  núcleo. As  células  endoteliais  dos  vasos sanguíneos  são  particularmente  sensíveis  à  radiação.  Durante  o  período  imediato  após  a  exposição,  evidencia­se apenas a dilatação dos vasos (p. ex., eritema inicial da pele após radioterapia). Posteriormente, ou com níveis mais

elevados  de  radiação,  ocorrem  alterações  destrutivas  em  vasos  sanguíneos  de  menor  calibre,  como  capilares  e vênulas. A  necrose  aguda  reversível  é  representada  por  distúrbios,  como  cistite,  dermatite  e  diarreia  resultante  de enterite.  Danos  mais  persistentes  podem  ser  atribuídos  à  necrose  aguda  das  células  do  tecido  incapacitadas  para regeneração e isquemia crônica. Os efeitos crônicos dos danos causados por radiação se caracterizam por fibrose e cicatrização  em  tecidos  e  órgãos  da  região  afetada  (p.  ex.,  fibrose  intersticial  do  coração  e  dos  pulmões  após  a irradiação  do  tórax).  Como  a  radiação  administrada  na  radioterapia  inevitavelmente  atravessa  a  pele,  é  comum  a ocorrência de dermatite de radiação. Pode haver necrose da pele, comprometimento do processo de cicatrização de feridas e dermatite crônica por radiação. Radiação ultravioleta. A  radiação  ultravioleta  provoca  queimadura  solar  e  aumenta  o  risco  de  câncer  de  pele.  O grau  de  risco  depende  do  tipo  de  raios  UV,  da  intensidade  da  exposição  e  da  quantidade  de  melanina,  responsável pela  proteção  da  pele.  Considera­se  que  os  danos  na  pele  produzidos  por  radiação  UV  são  causados  por  espécies reativas de oxigênio (ROS) e por danos aos processos de produção de melanina na pele.18 A radiação UV também danifica o DNA, resultando na formação de dímeros de pirimidina (inserção de duas bases de pirimidina idênticas na replicação do DNA, em vez de uma). Outras formas de danos ao DNA incluem a produção de quebras de cadeia simples  e  formação  de  ligações  cruzadas  em  proteínas  do  DNA.  Normalmente,  os  erros  durante  a  replicação  do DNA são reparados por enzimas que removem a seção defeituosa e consertam o dano. A importância do reparo do DNA  na  proteção  contra  danos  causados  pela  radiação  UV  é  evidenciada  pela  vulnerabilidade  apresentada  por indivíduos  que  não  têm  as  enzimas  necessárias  para  reparar  danos  ao  DNA  induzidos  por  UV.  Em  um  distúrbio genético denominado xeroderma pigmentoso, falta uma enzima necessária para reparar o dano ao DNA induzido por luz solar. Essa doença autossômica recessiva é caracterizada por extrema fotossensibilidade e aumento no risco de câncer para a pele exposta ao sol.19 Radiação não ionizante. O espectro de radiação não ionizante inclui a luz infravermelha, ultrassom, micro­ondas e energia laser. Ao contrário da radiação ionizante, que pode quebrar diretamente as ligações químicas, a radiação não ionizante exerce seus efeitos causando vibração e rotação de átomos e moléculas.15 Toda essa energia vibracional e rotacional  é  então  convertida  em  energia  térmica.  A  radiação  não  ionizante  de  baixa  frequência  é  amplamente utilizada em sistemas de radar, televisão, operações industriais (p. ex., aquecimento, soldagem, fundição de metais, processamento de madeira e plástico), eletrodomésticos (p. ex., forno de micro­ondas) e aplicações médicas (p. ex., diatermia). Existem relatos de casos isolados de queimaduras na pele e lesões térmicas aos tecidos mais profundos ocorridas  em  ambientes  industriais  e  resultantes  do  manuseio  impróprio  de  fornos  de  micro­ondas  de  uso doméstico.  A  lesão  por  essas  fontes  é  principalmente  térmica  e,  devido  à  profundidade  de  penetração  dos  raios infravermelhos ou das micro­ondas, o dano tende a envolver a derme e o tecido subcutâneo.

Lesão química Produtos químicos capazes de causar danos às células estão por toda parte. Água e ar poluídos contêm substâncias químicas  capazes  de  causar  lesão  nos  tecidos  orgânicos,  assim  como  o  fumo  do  tabaco  e  alguns  alimentos  e conservas  industrializados. Alguns  dos  produtos  químicos  mais  prejudiciais  à  saúde  ocupam  regularmente  o  meio ambiente, incluindo gases como o monóxido de carbono, inseticidas e elementos­traço, como o chumbo. Os  agentes  químicos  podem  danificar  a  membrana  e  outras  estruturas  celulares,  bloquear  as  vias  enzimáticas, coagular  as  proteínas  celulares  e  romper  o  equilíbrio  osmótico  e  iônico  da  célula.  Substâncias  corrosivas  como ácidos  e  bases  fortes  destroem  as  células  ao  entrar  em  contato  com  o  organismo.  Outros  produtos  químicos danificam  o  processo  de  metabolismo  ou  eliminação  celular.  O  tetracloreto  de  carbono  (CCl4),  por  exemplo, provoca  poucos  danos  até  que  seja  metabolizado  pelas  enzimas  hepáticas  e  transformado  em  um  radical  livre altamente reativo (CCl3•). O tetracloreto de carbono é extremamente tóxico para células do fígado.20 Substâncias químicas.  Diversas  substâncias  lícitas  e  ilícitas,  como  etanol,  medicamentos  com  e  sem  prescrição médica e drogas ilícitas, são capazes de, direta ou indiretamente, danificar os tecidos. O álcool etílico pode lesar a mucosa  gástrica,  o  fígado,  o  desenvolvimento  do  feto  e  outros  órgãos.  Medicamentos  antineoplásicos  e imunossupressores  podem  causar  danos  diretamente  às  células.  Outras  substâncias  liberam  produtos  do metabolismo final que são tóxicos para as células. O paracetamol, um analgésico que dispensa prescrição médica e é amplamente utilizado pela população, é metabolizado pelo fígado, no qual pequenas quantidades do fármaco são

convertidas  em  um  metabólito  altamente  tóxico.  Esse  metabólito  é  processado  por  uma  via  que  utiliza  uma substância normalmente encontrada no fígado (glutationa). Quando são ingeridas grandes quantidades do fármaco, essa via se sobrecarrega e os metabólitos tóxicos se acumulam, causando necrose maciça do fígado. Intoxicação por chumbo. O chumbo é um metal particularmente tóxico. Pequenas quantidades vão se acumulando até  alcançar  níveis  tóxicos.  O  chumbo  está  no  meio  ambiente  de  diversas  maneiras  como  na  pintura  descascada, solo e poeira contaminados com chumbo, vegetais de raiz contaminados com chumbo, canos de água ou soldas de chumbo, cerâmica esmaltada, papel de jornal e brinquedos fabricados internacionalmente. Os adultos muitas vezes entram em contato com o chumbo por exposição ocupacional. As crianças são expostas ao chumbo pela ingestão de lascas de pintura, inalação de pó de tinta com chumbo ou por brincar em solo contaminado. Os níveis de chumbo no sangue de adultos e crianças têm caído desde a retirada do metal da gasolina e das soldas, assim como das latas de alimentos  em  conserva.21  Níveis  sanguíneos  elevados  de  chumbo  continuam  a  ser  um  problema,  particularmente entre  crianças.  Somente  nos  EUA,  existem  cerca  de  250.000  crianças  com  idade  entre  1  e  5  anos  com  níveis  de chumbo superiores a 10 μg/mℓ.22 A prevalência de níveis elevados de chumbo no sangue foi maior para crianças de áreas  mais  urbanizadas. A  prevalência  por  raça  ou  etnia  mostra  que  crianças  negras  não  hispânicas  residentes  de cidades grandes, com população de 1 milhão ou mais de habitantes, apresentam os mais altos índices de chumbo no sangue. O chumbo é absorvido pelo sistema digestório ou pelos pulmões e migra para a corrente sanguínea. A deficiência de cálcio, ferro ou zinco aumenta a absorção de chumbo. Em crianças, a maior quantidade de chumbo é absorvida pelos pulmões. Embora crianças possam ingerir a mesma quantidade, ou até uma quantidade menor de chumbo, a absorção em lactentes e crianças é maior e, portanto, elas são mais vulneráveis à intoxicação.22 O chumbo atravessa a  placenta,  expondo  o  feto  a  níveis  de  chumbo  comparáveis  aos  da  mãe.  O  chumbo  é  armazenado  nos  ossos  e eliminado  pelos  rins.  Embora  a  meia­vida  de  chumbo  varie  de  horas  a  dias,  a  quantidade  armazenada  pelos  ossos funciona  como  um  depósito  a  partir  do  qual  os  níveis  sanguíneos  são  mantidos.  Em  certo  sentido,  os  ossos protegem  outros  tecidos,  mas  a  lenta  taxa  de  eliminação  mantém  os  níveis  plasmáticos  estáveis  por  meses  e  até anos. A  toxicidade  do  chumbo  está  relacionada  com  diferentes  efeitos  bioquímicos.  O  chumbo  tem  a  capacidade  para inativar  enzimas,  competir  com  o  cálcio  na  incorporação  aos  ossos  e  interferir  na  transmissão  nervosa  e  no desenvolvimento  cerebral.  Os  alvos  principais  de  toxicidade  do  chumbo  são  os  glóbulos  vermelhos,  o  sistema digestório, rins e sistema nervoso. Anemia é um sinal importante de intoxicação por chumbo. O metal compete com as enzimas necessárias para a síntese  da  hemoglobina  e  com  enzimas  associadas  à  membrana  celular  que  impedem  a  lise  das  hemácias.  Os glóbulos  vermelhos  resultantes  mostram  um  pontilhado  grosseiro  e  são  hipocrômicos,  lembrando  a  aparência  nos casos de anemia por deficiência de ferro. O tempo de vida das hemácias também diminui. O sistema digestório é a principal  fonte  de  sintomas  no  adulto.  Um  sintoma  característico  é  a  chamada  “cólica  plúmbica”,  um  tipo  grave  e mal  localizado  de  dor  abdominal  aguda.  Pode  aparecer  uma  linha  de  chumbo  formada  por  sulfito  de  chumbo precipitado ao longo das margens gengivais. A linha de chumbo raramente é observada em crianças. Os rins são a principal  via  de  excreção.  O  chumbo  pode  causar  danos  difusos  nos  rins  que  podem  levar  à  insuficiência  renal. Mesmo sem sinais evidentes de danos renais, a intoxicação por chumbo conduz à hipertensão. No sistema nervoso, a toxicidade do chumbo se caracteriza por desmielinização da substância branca do cérebro e cerebelo  e  morte  de  células  corticais.  Quando  isso  ocorre  na  primeira  infância,  pode  afetar  o  desenvolvimento neurocomportamental  e  resultar  em  níveis  mais  baixos  de  QI  e  redução  do  desempenho  escolar.11  Nos  adultos, surge  uma  neuropatia  periférica  desmielinizante.  A  manifestação  mais  grave  de  intoxicação  por  chumbo  é  a encefalopatia  aguda,  que  se  manifesta  por  vômitos  persistentes,  ataxia,  convulsões,  papiledema,  alterações  da consciência e coma. A encefalopatia aguda pode se manifestar subitamente, ou pode ser precedida por outros sinais de intoxicação por chumbo, como alterações de comportamento ou queixas abdominais. Devido ao desenvolvimento de déficits cognitivos e neurocomportamentais a longo prazo ocorridos em crianças, mesmo com níveis de chumbo moderadamente elevados, os CDC americanos emitiram recomendações para triagem de  chumbo  em  crianças.22  Um  nível  plasmático  de  chumbo  considerado  seguro  ainda  é  incerto.  Um  índice  de  25 μg/dℓ   já  foi  considerado  seguro.  Pesquisas  têm  encontrado  QI  anormalmente  baixos  em  crianças  com  níveis  de chumbo de 10 a 15 μg/dℓ.

A triagem para a toxicidade do chumbo envolve o uso de sangue capilar obtido a partir de uma picada na lateral da polpa digital para medir os níveis de protoporfirina eritrocitária livre (EP). Níveis elevados de EP resultam da inibição causada pelo chumbo sobre a ação de enzimas necessárias à síntese da hemoglobina nas hemácias. O teste de EP é útil na detecção de níveis elevados de chumbo, mas geralmente não detecta níveis abaixo de 20 a 25 μg/dℓ. Assim,  um  teste  de  triagem  capilar  que  apresenta  valores  superiores  a  10  μg/  dℓ   deve  ser  confirmado  por  uma amostra  de  sangue  venoso.  Como  os  sintomas  da  intoxicação  por  chumbo  não  são  específicos  em  geral,  o diagnóstico muitas vezes é retardado. A existência de anemia pode apresentar as primeiras pistas do distúrbio. Os testes  laboratoriais  são  necessários  para  estabelecer  o  diagnóstico.  O  tratamento  envolve  a  remoção  da  fonte  de chumbo  e,  em  casos  de  intoxicação  grave,  a  administração  de  um  agente  quelante.  Crianças  assintomáticas  com níveis  sanguíneos  de  45  a  69  μg/d ℓ   normalmente  recebem  esse  tratamento.  Uma  equipe  de  saúde  pública  deve avaliar a fonte de chumbo, uma vez que é necessária a remoção meticulosa. Intoxicação por mercúrio. O mercúrio tem sido utilizado para fins industriais e médicos há centenas de anos. O mercúrio é tóxico, e os riscos ocupacionais e exposições acidentais associados ao mercúrio são muito conhecidos. Atualmente, mercúrio e chumbo são os metais mais tóxicos. O mercúrio é tóxico em quatro tipos primários: vapor de mercúrio, mercúrio inorgânico bivalente, metil­mercúrio e etil­mercúrio.23 Dependendo do tipo de exposição ao mercúrio, pode ocorrer toxicidade envolvendo o sistema nervoso central e os rins.24 No  caso  de  obturações  dentárias,  a  preocupação  envolve  o  vapor  de  mercúrio  liberado  na  boca.  No  entanto,  a quantidade  de  vapor  de  mercúrio  liberado  pelas  obturações  é  muito  pequena.  A  principal  fonte  de  exposição  ao metil­mercúrio  é  pelo  consumo  de  peixes  de  vida  longa,  como  o  atum  e  o  peixe­espada.  Os  peixes  concentram mercúrio  a  partir  de  sedimentos  na  água.  No  entanto,  apenas  alguns  tipos  de  peixe  representam  risco  potencial; outros tipos como o salmão têm quantidades minúsculas ou nenhuma. Como o cérebro em desenvolvimento é mais suscetível  a  danos  induzidos  por  mercúrio,  é  recomendável  que  crianças  pequenas,  gestantes  e  lactantes  evitem  o consumo  de  peixes  conhecidos  por  conter  alto  teor  de  mercúrio.  O  timerosal  é  um  conservante  que  contém  etil­ mercúrio, que ajuda a evitar o crescimento de microrganismos em vacinas. Devido a questões relacionadas com o uso desse conservante, ele quase nunca é utilizado nos EUA.

Lesão por agentes biológicos Os  agentes  biológicos  diferem  de  outros  agentes  nocivos  à  medida  que  são  capazes  de  se  replicar  e  conseguem continuar  a  produzir  seus  efeitos.  Esses  agentes  variam  de  vírus  submicroscópicos  até  parasitas  maiores.  Os agentes biológicos causam dano celular por diversos mecanismos. Os vírus entram na célula e se incorporam à sua estrutura de síntese de DNA. Algumas bactérias produzem exotoxinas que interferem na produção celular de ATP. Outras bactérias, como bacilos gram­negativos, liberam endotoxinas que provocam lesões nas células e aumentam a permeabilidade capilar.

Lesão por desequilíbrio nutricional Excessos e deficiências nutricionais predispõem as células a lesões. Considera­se que a obesidade e dietas ricas em gorduras  saturadas  predispõem  os  indivíduos  à  aterosclerose.  O  organismo  precisa  de  mais  de  60  substâncias orgânicas e inorgânicas, em quantidades que variam de microgramas a gramas. Esses nutrientes incluem minerais, vitaminas, certos ácidos graxos e aminoácidos específicos. As deficiências nutricionais podem ocorrer por escassez de alimentos, em que existe deficiência de nutrientes e vitaminas, ou devido à deficiência seletiva de um nutriente ou  vitamina.  Anemia  ferropriva,  escorbuto,  beribéri  e  pelagra  são  exemplos  de  danos  causados  pela  falta  de vitaminas  ou  minerais  específicos. As  deficiências  de  proteínas  e  calorias  provenientes  da  escassez  de  alimentos (fome) causam dano generalizado nos tecidos.

Mecanismos de dano celular Os mecanismos pelos quais agentes nocivos causam dano e morte celular são complexos. Alguns agentes como o calor  produzem  lesão  celular  direta.  Outros  fatores,  como  distúrbios  genéticos,  produzem  seus  efeitos indiretamente,  por  meio  de  doenças  metabólicas  e  alteração  da  resposta  imune.15  Parece  haver  pelo  menos  três mecanismos principais pelos quais a maioria dos agentes nocivos exercem seus efeitos: • Formação de radicais livres

• Hipoxia e depleção de ATP • Ruptura da homeostase do cálcio intracelular (Figura 5.7).

Danos pela formação de radicais livres Muitos  agentes  exercem  efeitos  nocivos  por  intermédio  de  espécies  químicas  reativas  conhecidas  como  radicais livres.23  Radicais  livres  são  espécies  químicas  altamente  reativas,  com  um  elétron  não  emparelhado  na  órbita externa (camada de valência) da molécula.15 Na literatura, o elétron não emparelhado é denotado por um ponto, por exemplo,  •NO.  O  elétron  não  emparelhado  torna  os  radicais  livres  instáveis  e  altamente  reativos,  de  modo  que reagem  de  maneira  inespecífica  com  moléculas  em  torno  deles. Além  disso,  os  radicais  livres  podem  estabelecer reações em cadeia, que consistem em eventos químicos que geram novos radicais livres. Nas células e tecidos, os radicais livres reagem com proteínas, lipídios e carboidratos e assim danificam as membranas; inativam enzimas e danificam ácidos nucleicos constituintes do DNA. As ações de radicais livres podem perturbar e danificar células e tecidos.

Figura 5.7 •  Mecanismos  de  lesão  celular. Agentes  nocivos  tendem  a  causar  hipoxia/isquemia  (acompanhe  a  seta do  meio,  que  ilustra  as  manifestações  que  acionam  o  metabolismo  anaeróbico  levando  à  lesão  celular).  No  lado esquerdo da figura, a formação de radicais livres provoca a oxidação de estruturas celulares ao ocasionar a depleção de ATP; no lado direito, o alto nível de cálcio intracelular danifica diversos processos celulares, que também causam depleção de ATP. Essas três vias ilustram o modo como os agentes nocivos promovem dano e morte celular.

Espécies  reativas  de  oxigênio  (ROS)  são  moléculas  que  contêm  oxigênio  e  incluem  radicais  livres,  como superóxido  (O2  –),  o  radical  hidroxila  (OH•)  e  não  radicais,  como  o  peróxido  de  hidrogênio  (H2O2).15  Essas moléculas são produzidas de maneira endógena por processos metabólicos normais ou atividades celulares, como a explosão metabólica que acompanha a fagocitose. No entanto, as causas exógenas, incluindo a radiação ionizante e UV,  podem  induzir  a  produção  de  ROS  no  organismo.  Estresse  oxidativo  é  uma  condição  que  ocorre  quando  a geração  de  ROS  excede  a  capacidade  do  organismo  de  neutralizar  e  eliminar  a  substância.15  O  estresse  oxidativo pode  levar  à  oxidação  dos  componentes  da  célula,  ativação  das  vias  de  transdução  de  sinalização  e  alterações  na expressão de genes e proteínas. Podem sobrevir danos e alterações no DNA como resultado de estresse oxidativo. Embora  a  produção  de  ROS  e  o  estresse  oxidativo  estejam  claramente  associados  a  dano  em  células  e  tecidos, evidências  mostram  que  ROS  nem  sempre  age  de  maneira  aleatória  e  nociva.  Estudos  recentes  têm  demonstrado que ROS também são moléculas de sinalização importantes, utilizadas em células saudáveis para regular e manter as atividades e o funcionamento normal, como o tônus vascular e a sinalização do fator de crescimento do endotélio vascular e insulina.25 O dano oxidativo tem sido implicado em várias doenças. As mutações no gene de SOD estão relacionadas  com  a  esclerose  lateral  amiotrófica  (ELA;  denominada  doença  de  Lou  Gehrig).26 Considera­se que o estresse  oxidativo  desempenha  um  papel  importante  no  desenvolvimento  de  câncer.15 O restabelecimento do fluxo sanguíneo  após  a  perda  de  perfusão,  como  ocorre  durante  um  infarto  do  miocárdio  ou  acidente  vascular  cerebral, está  associado  à  lesão  oxidativa  de  órgãos  vitais.27  Acredita­se  que  a  disfunção  endotelial  que  contribui  para  o desenvolvimento, progressão e prognóstico da doença cardiovascular seja causada em parte por estresse oxidativo.27 Além das muitas doenças e alterações no estado de saúde causadas por danos oxidativos, o estresse oxidativo tem sido associado aos declínios funcionais subjacentes ao processo de envelhecimento.28 Antioxidantes  são  moléculas  naturais  ou  sintéticas  que  inibem  as  reações  de  ROS  com  estruturas  biológicas  ou impedem a formação descontrolada de ROS. Antioxidantes incluem componentes enzimáticos e não enzimáticos. 15 A  enzima  catalase  pode  catalisar  a  reação  que  forma  água  a  partir  de  peróxido  de  hidrogênio. Antioxidantes  não enzimáticos  incluem  carotenos  (p.  ex.,  vitamina  A),  tocoferóis  (p.  ex.,  vitamina  E),  ascorbato  (vitamina  C), glutationa, flavonoides, selênio e zinco.15

Lesão celular hipóxica A  hipoxia  priva  a  célula  de  oxigênio  e  interrompe  o  metabolismo  oxidativo  e  a  produção  de ATP.  O  tempo  real necessário para produzir um dano celular irreversível depende do grau de privação de oxigênio e das necessidades metabólicas  da  célula.  Algumas  células,  como  as  do  coração,  cérebro  e  rins,  exigem  grandes  quantidades  de oxigênio  para  o  fornecimento  de  energia  para  realização  de  suas  funções.  As  células  do  cérebro,  por  exemplo, começam  a  sofrer  danos  permanentes  após  4  a  6  min  de  privação  de  oxigênio.  Pode  existir  uma  margem  mínima entre  o  tempo  necessário  para  causar  dano  celular  reversível  ou  irreversível.  Durante  condições  hipóxicas,  os fatores  indutores  de  hipoxia  (HIF)  provocam  a  expressão  de  genes  que  estimulam  a  formação  de  hemácias, produzem ATP na falta de oxigênio e aumentam a angiogênese29 (formação de novos vasos sanguíneos). A  hipoxia  pode  resultar  de  uma  quantidade  insuficiente  de  oxigênio  no  ar,  doença  respiratória,  isquemia (diminuição do fluxo sanguíneo devido a vasoconstrição ou obstrução vascular), anemia, edema ou incapacidade das células  de  utilizar  o  oxigênio.  A  isquemia  se  caracteriza  pela  redução  no  fornecimento  de  oxigênio  e comprometimento  na  remoção  de  produtos  finais  metabólicos,  como  o  ácido  láctico.  Ao  contrário  da  hipoxia propriamente  dita,  que  depende  do  teor  de  oxigênio  do  sangue  e  afeta  todas  as  células  do  organismo,  a  isquemia normalmente afeta o fluxo de sangue em um número limitado de vasos sanguíneos e produz uma lesão localizada no tecido.  Em  alguns  casos  de  edema,  a  distância  para  a  difusão  de  oxigênio  pode  se  tornar  um  fator  limitante  no aporte de oxigênio. Em estados hipermetabólicos, as células podem exigir mais oxigênio do que pode ser fornecido pela  função  respiratória  e  transporte  de  oxigênio  normal. A  hipoxia  também  funciona  como  causa  final  de  morte celular  em  outros  tipos  de  lesão.  Por  exemplo,  um  agente  físico  como  a  baixa  temperatura  pode  causar

vasoconstrição grave e prejudicar o fluxo sanguíneo. A hipoxia provoca uma falha de energia na célula, com efeitos generalizados sobre os componentes estruturais e funcionais. Como a tensão de oxigênio na célula cai, o metabolismo oxidativo cessa e a célula volta ao metabolismo anaeróbico, usando suas reservas de glicogênio limitadas, na tentativa de manter as funções celulares vitais. O pH celular  cai  devido  ao  acúmulo  de  ácido  láctico  na  célula.  Esta  redução  do  pH  pode  ter  efeitos  adversos  sobre  as estruturas  intracelulares  e  as  reações  bioquímicas  ocorridas  no  interior  da  célula.  O  pH  baixo  pode  alterar  a membrana celular e causar aglomeração de cromatina e retração celular. Um  efeito  importante  da  redução  de  ATP  é  a  turgência  celular  aguda  provocada  por  uma  falha  na  bomba  de sódio/potássio (Na+/K+)–ATPase,  que  se  localiza  na  membrana  e  depende  de  energia  o  que  retira  sódio  e  coloca potássio para dentro da célula. Com o comprometimento funcional dessa bomba, diminuem os níveis intracelulares de  potássio  e  se  acumulam  o  sódio  e  a  água  na  célula. A  circulação  de  água  e  dos  íons  no  interior  da  célula  está associada  a  várias  alterações,  incluindo  alargamento  do  retículo  endoplasmático,  permeabilidade  da  membrana  e redução da função mitocondrial.15 Em alguns casos, as alterações celulares resultantes da isquemia são reversíveis se  a  oxigenação  é  restaurada.  Se  o  suprimento  de  oxigênio  não  é  restaurado,  no  entanto,  ocorre  perda  contínua  de enzimas,  proteínas  e  ácido  ribonucleico  através  da  membrana  celular  hiperpermeável. A  lesão  das  membranas  dos lisossomos  resulta  no  extravasamento  de  enzimas  destrutivas  para  o  citoplasma  e  na  digestão  enzimática  dos componentes celulares. O extravasamento de enzimas intracelulares através da membrana celular permeável para o líquido extracelular fornece um indicador clínico importante de lesão e morte celular.

Comprometimento da homeostase do cálcio O cálcio funciona como um importante segundo mensageiro e sinalizador citosólico para muitas respostas celulares. Várias proteínas de ligação ao cálcio, como a calmodulina e a troponina, atuam como transdutores de sinalização do cálcio  citosólico. As  quinases  dependentes  de  cálcio/calmodulina  fazem  a  mediação  indireta  nos  efeitos  do  cálcio sobre respostas como a contração do músculo liso e a quebra de glicogênio. Normalmente, os níveis de íons cálcio intracelular  são  mantidos  extremamente  baixos  quando  comparados  aos  níveis  extracelulares.  O  baixo  nível  de cálcio  intracelular  é  mantido  por  um  sistema  de  troca  de  cálcio/magnésio  (Ca2+/Mg2+)–ATPase,  associado  à membrana.  Processos  isquêmicos  e  determinadas  toxinas  levam  a  um  aumento  nos  níveis  de  cálcio  intracelular devido  ao  maior  influxo  através  da  membrana  e  à  liberação  de  cálcio  das  reservas  intracelulares.  O  nível  mais elevado  de  cálcio  pode  inapropriadamente  ativar  diversas  enzimas,  com  efeitos  potencialmente  nocivos.  Essas enzimas incluem as fosfolipases, responsáveis por danos à membrana celular; proteases, que danificam as proteínas do  citoesqueleto  e  a  membrana;  ATPases,  que  quebram  a  molécula  de  ATP  e  aceleram  a  depleção,  e  as endonucleases, que fragmentam a cromatina. Embora se saiba que células danificadas acumulam cálcio, não se sabe se esta é a causa final de uma lesão celular irreversível.

Lesão celular reversível e morte celular Os mecanismos de lesão celular podem produzir lesão celular subletal e reversível ou levar à lesão irreversível, com destruição ou morte celular (Figura 5.8). A destruição e remoção da célula pode envolver um de dois mecanismos: • Apoptose, que é projetada para remover células danificadas ou desgastadas

• Morte celular ou necrose, que ocorre como processo irreversível em células danificadas.1

Lesão celular reversível A lesão celular reversível, embora impeça o funcionamento normal da célula, não resulta em morte celular. Podem ser  observados  dois  padrões  de  lesão  celular  reversível  sob  o  microscópio:  edema  e  degeneração  gordurosa.  A tumefação da célula ocorre pelo comprometimento da bomba de Na+/K+­ATPase dependente de energia, geralmente como resultado de lesão celular hipóxica.

Figura  5.8  •  Resultados  de  lesão  celular:  lesão  celular  reversível;  apoptose  e  remoção  programada  de  células;  e morte celular e necrose.

A  degeneração  gordurosa  está  relacionada  com  o  acúmulo  intracelular  de  gordura.  Quando  ocorrem  essas alterações, pequenos vacúolos de gordura se dispersam por todo o citoplasma. Normalmente o processo causa um comprometimento  maior  que  o  edema  celular  e,  embora  seja  reversível,  indica  lesão  grave  em  geral.  Essas alterações  gordurosas  podem  aparecer,  porque  células  normais  apresentam  uma  carga  de  gordura  aumentada  ou porque  células  danificadas  são  incapazes  de  metabolizar  a  gordura  adequadamente.  Em  indivíduos  obesos,  muitas vezes ocorrem infiltrados gordurosos no interior e entre as células do fígado e do coração, devido à maior carga de gordura. As vias para o metabolismo da gordura podem ser comprometidas durante uma lesão celular e a gordura pode se acumular na célula, uma vez que a produção é maior que o uso e a exportação. O fígado, onde a maioria das gorduras  é  sintetizada  e  metabolizada,  é  particularmente  sensível  à  degeneração  gordurosa,  mas  essas  alterações também podem ocorrer no rim, coração e outros órgãos.

Morte celular programada Na maioria das células não tumorais normais, o número de células nos tecidos é regulado por meio de um equilíbrio entre  proliferação  e  morte  celular.  A  morte  celular  se  dá  por  necrose  ou  de  maneira  programada  denominada apoptose.1 Apoptose  é  um  processo  altamente  seletivo,  que  elimina  células  danificadas  e  envelhecidas,  controlando  a regeneração dos tecidos. As células em apoptose têm características morfológicas específicas, bem como alterações bioquímicas. Como mostrado na Figura 5.9, ocorrem retração e condensação do núcleo e citoplasma. A cromatina aglomera­se  no  envelope  nuclear  e  sucede  a  fragmentação  do  DNA.  Em  seguida,  toda  a  célula  se  fragmenta  em vários  corpos  apoptóticos  de  um  modo  que  mantém  a  integridade  da  membrana  plasmática  e  não  precipita  um processo  inflamatório.  Alterações  na  membrana  plasmática  induzem  a  fagocitose  dos  corpos  apoptóticos  por macrófagos e outras células, completando assim o processo de degradação. A  apoptose  é  considerada  responsável  por  diversos  processos  fisiológicos  normais,  incluindo  a  destruição programada de células durante o desenvolvimento embrionário, involução de tecidos hormônio­dependentes, morte de células do sistema imunológico, morte celular por células T citotóxicas e morte celular em populações de células em  proliferação.  Durante  a  embriogênese,  no  desenvolvimento  de  diversos  órgãos  como  o  coração,  que  começa como  um  tubo  pulsante  e  é  gradualmente  modificado  até  se  tornar  uma  bomba  com  quatro  cavidades,  a  morte celular por apoptose possibilita aos órgãos passarem para a próxima etapa de desenvolvimento. A apoptose também

separa as membranas interdigitais em dedos das mãos e pés no embrião em desenvolvimento (Figura 5.10).

Figura 5.9 • Remoção celular por apoptose: retração das estruturas celulares (A), condensação e fragmentação da cromatina  nuclear  (B  e  C),  separação  de  fragmentos  nucleares  e  organelas  citoplasmáticas  em  corpos  apoptóticos (D e E) e englobamento dos fragmentos apoptóticos pelo fagócito (F).

Figura  5.10  •  Exemplos  de  apoptose.  A.  Separação  dos  dedos  das  mãos  e  pés  por  membranas  no  embrião.  B. Desenvolvimento  de  conexões  neurais;  neurônios  que  não  estabelecem  conexões  sinápticas  e  recebem  fatores  de sobrevivência  podem  ser  induzidos  a  sofrer  apoptose.  C.  Remoção  de  células  das  vilosidades  intestinais;  novas células  epiteliais  são  continuamente  formadas  na  cripta,  migram  para  a  ponta  das  vilosidades  à  medida  que envelhecem  e  sofrem  apoptose  na  ponta  ao  final  do  seu  tempo  de  vida.  D.  Remoção  de  células  sanguíneas senescentes.

A  morte  celular  por  apoptose  ocorre  na  involução  de  células  endometriais  hormônio­dependentes,  durante  o  ciclo menstrual, e na regressão do tecido mamário, após o fim do aleitamento materno. O controle do número de células do sistema imunológico e destruição de células T autorreativas no timo foram creditados à apoptose. As células T citotóxicas e células citotóxicas naturais são consideradas responsáveis pela destruição de células­alvo por indução de morte celular por apoptose. A  apoptose  está  associada  a  muitos  processos  patológicos  e  doenças.  Por  exemplo,  a  interferência  com  a apoptose  é  conhecida  por  ser  um  mecanismo  que  contribui  para  carcinogênese.30 A  apoptose  também  pode  estar implicada em doenças neurodegenerativas, como doença de Alzheimer, doença de Parkinson e ELA. No entanto, os mecanismos exatos envolvidos nessas doenças continuam sob investigação. Foram descritas duas vias básicas para a apoptose (Figura 5.11). São elas a via extrínseca, que é dependente do receptor de morte celular, e a via intrínseca, que é independente de receptor de morte. A fase de execução das duas vias  é  realizada  por  enzimas  proteolíticas  denominadas  caspases,  encontradas  na  célula  como  pró­caspases  e ativadas por clivagem de uma porção inibidora de sua cadeia polipeptídica. A via extrínseca envolve a ativação de receptores, como receptores do fator de necrose tumoral (TNF) e receptor do  ligante  Fas.31  O  ligante  Fas  pode  ser  expresso  sobre  a  superfície  de  determinadas  células,  como  células  T citotóxicas, ou aparecem em forma solúvel. Quando o ligante Fas se une ao seu receptor, as proteínas se reúnem na extremidade citoplasmática do receptor de Fas para formar um complexo que inicia a morte celular. Em seguida, o complexo  converte  a  pró­caspase­8  em  caspase­8. A  caspase­8,  por  sua  vez,  ativa  uma  cascata  de  caspases,  que executam o processo de apoptose.31 O resultado final inclui a ativação de endonucleases que causam a fragmentação do DNA e a morte celular. Além do TNF e do ligante Fas, moléculas de sinalização primárias conhecidas por ativar a via extrínseca incluem o ligante indutor de apoptose relacionado com TNF (TRAIL); a citocina interleucina­1 (IL­ 1) e lipopolissacarídios (LPS), uma endotoxina encontrada na parte externa da membrana celular de bactérias gram­ negativas. A via intrínseca, ou via induzida pela mitocôndria, é ativada por condições como danos ao DNA, ROS, hipoxia, diminuição  dos  níveis  de  ATP,  senescência  celular  e  ativação  da  proteína  p53  por  dano  ao  DNA. 32  Envolve  a abertura  de  poros  de  permeabilidade  da  membrana  mitocondrial,  com  liberação  do  citocromo  c  das  mitocôndrias para o citoplasma. O citocromo c citoplasmático ativa as caspases, incluindo a caspase­3. A ativação da caspase­3 é uma  etapa  comum  tanto  à  via  extrínseca  quanto  intrínseca.  Além  disso,  a  ativação  ou  aumento  dos  níveis  de proteínas pró­apoptóticas, como Bax e Bid, após a ativação da caspase­8 na via extrínseca pode conduzir à liberação mitocondrial  de  citocromo  c,  unindo,  desse  modo,  as  duas  vias  de  apoptose.  Muitos  inibidores  de  apoptose  nas células  são  conhecidos  e  considerados  contribuintes  para  o  desenvolvimento  de  câncer  e  doenças  autoimunes.33 A ação terapêutica de determinados fármacos pode induzir ou facilitar a apoptose. O processo de apoptose continua a ser uma área de pesquisa ativa, para melhor compreensão e tratamento de diversas doenças.

Figura  5.11  •  Vias  extrínseca  e  intrínseca  da  apoptose. A  via  extrínseca  é  ativada  por  sinais  como  o  ligante  Fas (FasL), que, ao se ligar ao receptor de Fas, forma um complexo de indução de morte, unindo o domínio de morte associada a Fas (FADD) ao domínio de morte do receptor Fas. A via intrínseca é ativada por sinais como espécies

reativas  de  oxigênio  (ERO)  e  danos  ao  DNA  que  induzem  a  liberação  de  citocromo  c  da  mitocôndria  para  o citoplasma. As duas vias ativam as caspases para executar a apoptose.

Necrose Necrose  diz  respeito  à  morte  de  células  em  um  órgão  ou  tecido  que  ainda  é  parte  de  um  organismo  vivo.15  O processo de necrose é diferente da apoptose, uma vez que provoca a perda da integridade da membrana celular e a degradação enzimática de partes da célula e desencadeia um processo infla­matório.1 Ao contrário da apoptose, que funciona  removendo  células  para  que  novas  células  possam  substituí­las,  a  necrose  interfere  frequentemente  na reposição de células e na regeneração dos tecidos. Com a morte celular por necrose, ocorrem alterações significativas na aparência do conteúdo citoplasmático e do núcleo.  Essas  alterações  muitas  vezes  não  são  visíveis,  mesmo  sob  o  microscópio,  por  horas  depois  da  morte  da célula. A dissolução da célula ou tecido necrosado pode seguir diferentes caminhos. A célula pode sofrer liquefação (necrose  de  liquefação);  pode  ser  transformada  em  massa  firme  e  acinzentada  (necrose  de  coagulação)  ou  ser convertida em um material caseoso por infiltração de substâncias como gorduras (necrose caseosa).1 A  necrose de liquefação  surge  quando  algumas  células  morrem,  mas  suas  enzimas  catalíticas  não  são  destruídas.1 Um exemplo de  necrose  de  liquefação  é  o  amolecimento  do  centro  de  um  abscesso  com  descarga  do  seu  conteúdo.  Durante  a necrose de coagulação, desenvolve­se acidose, que desnatura as enzimas e proteínas estruturais da célula. Este tipo de  necrose  é  característica  de  lesão  hipóxica  e  é  observada  em  regiões  infartadas.1  O  infarto  (morte  dos  tecidos) sucede quando uma artéria que alimenta um órgão ou uma parte do corpo sofre obstrução e não existe outra fonte de suprimento sanguíneo. Como regra geral, a forma do infarto é cônica e corresponde à distribuição da artéria e suas ramificações.  Uma  artéria  pode  ser  obstruída  por  um  êmbolo,  um  trombo,  uma  doença  da  parede  arterial  ou  uma pressão externa ao vaso. Necrose  caseosa  é  um  tipo  distinto  de  necrose  de  coagulação  em  que  as  células  mortas  persistem indefinidamente.1 É mais comumente encontrada no centro de granulomas tuberculosos.1 Gangrena. O termo gangrena é aplicado quando massa considerável de tecido sofre necrose. A gangrena pode ser classificada como seca ou úmida. Nos casos de gangrena seca, a parte afetada seca e se retrai, a pele mostra vincos e sua coloração muda para marrom­escuro ou preto. A propagação da gangrena seca é lenta e os sintomas não são tão  evidenciados  como  os  da  gangrena  úmida. A  irritação  causada  pelo  tecido  morto  produz  uma  linha  de  reação inflamatória  (linha  de  demarcação)  entre  o  tecido  morto  da  área  gangrenosa  e  o  tecido  saudável. A  gangrena  seca geralmente  resulta  de  interferências  no  suprimento  de  sangue  arterial  para  determinada  área,  sem  interferir  no retorno venoso, e representa um tipo de necrose de coagulação. Na  gangrena  úmida,  a  área  se  mostra  fria,  edemaciada  e  sem  pulso.  A  pele  da  região  fica  úmida,  preta  e tensionada. Formam­se bolhas na superfície, ocorre liquefação e pode ser sentido um odor fétido, causado pela ação de  bactérias.  Não  existe  uma  linha  de  demarcação  entre  tecido  normal  e  doente,  e  a  propagação  dos  danos  nos tecidos  é  rápida.  Os  sintomas  sistêmicos  geralmente  são  graves,  e  pode  ocorrer  a  morte  a  menos  que  a  condição seja  detida.  A  gangrena  úmida  advém  principalmente  de  interferências  no  retorno  venoso  da  região  afetada.  A invasão  bacteriana  desempenha  um  papel  importante  no  desenvolvimento  de  gangrena  úmida  e  é  responsável  por muitos dos sintomas proeminentes. A gangrena seca é confinada quase que exclusivamente nos membros do corpo, mas a gangrena úmida pode afetar órgãos internos ou extremidades. Se uma bactéria invade o tecido necrosado, um caso de gangrena seca pode se transformar em gangrena úmida. Gangrena gasosa é um tipo especial que resulta da infecção de tecidos desvitalizados por um dos diferentes tipos de  bactéria  do  gênero  Clostridium,  mais  comumente  o  Clostridium  perfringens.1  Esses  microrganismos anaeróbicos  que  formam  esporos  são  comuns  na  natureza,  especialmente  no  solo.  A  gangrena  gasosa  costuma ocorrer  em  casos  que  envolvem  traumatismo  e  fraturas  compostas,  em  que  são  incorporados  detritos  e  sujeira. Algumas espécies foram isoladas no estômago, vesícula biliar, intestino, vagina e pele de indivíduos saudáveis. A característica  dessa  condição  é  a  formação  de  bolhas  de  gás  de  sulfeto  de  hidrogênio  nos  músculos. A  gangrena gasosa  é  uma  doença  grave  e  potencialmente  fatal.  São  utilizados  antibióticos  para  tratar  a  infecção,  e procedimentos  cirúrgicos  para  remover  o  tecido  infectado.  Pode  ser  necessária  a  amputação  da  área  para  evitar  a propagação da infecção que envolve tal membro. Tem sido empregada a oxigenoterapia hiperbárica, mas os dados clínicos que dão suporte à eficácia do procedimento ainda não passaram por avaliação rigorosa.

Envelhecimento celular Tal como acontece com adaptação e lesão, o envelhecimento é um processo que envolve células e tecidos orgânicos. Têm sido propostas inúmeras teorias para explicar as causas do envelhecimento. Essas teorias não são mutuamente exclusivas  e,  provavelmente,  o  envelhecimento  é  um  processo  complexo,  com  múltiplas  causas.  As  principais teorias  do  envelhecimento  podem  ser  classificadas  com  base  em  uma  explicação  evolutiva,  molecular,  celular  e sistêmica.1 As teorias evolutivas dão destaque à variação genética e ao sucesso reprodutivo. Passados os anos reprodutivos, não  está  claro  se  a  longevidade  continuada  contribui  para  a  aptidão  das  espécies.  Assim,  os  genes “antienvelhecimento” não seriam necessariamente selecionados, preservados e prevalentes no pool genético. As teorias moleculares  do  envelhecimento  celular  se  concentram  mais  em  mutações  ou  alterações  na  expressão gênica.  Como  aparência,  propriedades  e  função  celulares  dependem  da  expressão  do  gene,  este  aspecto provavelmente está envolvido em certo nível do processo de envelhecimento. Recentemente, tem sido dada atenção aos chamados genes do envelhecimento, identificados em sistemas modelo. Atualmente,  existem  várias  teorias  da  senescência  celular  sob  investigação,  incluindo  aquelas  que  destacam  o encurtamento  dos  telômeros,  os  danos  causados  por  radicais  livres  e  apoptose.  Desde  os  meados  de  1960,  há conhecimento  de  que  determinadas  células  em  cultura  apresentam  um  limite  na  capacidade  de  replicação,  o denominado  limite  de  Hayflick,  que  representa  cerca  de  50  duplicações  de  população.  Esse  limite  parece  estar relacionado  com  o  comprimento  dos  telômeros,  que  são  sequências  de  DNA  localizadas  nas  extremidades  dos cromossomos.  Cada  vez  que  uma  célula  se  divide,  os  telômeros  se  encurtam,  até  que  um  comprimento  mínimo  e crítico é alcançado, seguindo­se senescência e interrupção da capacidade de replicação celular. Algumas células têm telomerase,  uma  enzima  que  “reconstrói”  os  telômeros  e  diminui  ou  evita  o  encurtamento.  Células  cancerosas apresentam  níveis  elevados  de  telomerase,  que  impede  a  senescência  e  contribui  para  a  imortalidade  celular  que caracteriza o câncer. O encurtamento dos telômeros parece estar relacionado com outras teorias sobre as causas do envelhecimento  celular.  Por  exemplo,  os  danos  causados  por  radicais  livres  e  danos  oxidativos  podem  matar  as células  e  precipitar  o  encurtamento  dos  telômeros. A  restrição  calórica,  que  parece  aumentar  a  longevidade,  pode estar  relacionada  com  a  redução  na  geração  de  radicais  livres  mitocondriais,  devido  à  redução  na  ingestão  de metionina ou outros aminoácidos encontrados na dieta.34 As  teorias  de  nível  sistêmico  focalizam  no  declínio  de  funções  integradoras  de  sistemas  orgânicos,  como  os sistemas  imunológico  e  neuroendócrino,  que  são  necessários  para  o  controle  de  outros  sistemas. A  capacidade  do sistema imunológico pode diminuir com a idade e reduzir a eficiência da proteção do organismo contra infecção ou câncer.  Além  disso,  mutações  e  manipulações  genéticas,  como  daf­2,  que  é  similar  aos  genes  do  receptor  de insulina/IGF­1  humana,  no  modelo  de  envelhecimento  do  verme  Caenorhabditis  elegans  causa  alterações significativas na longevidade do parasita.35 Vias relacionadas com daf­2 podem ser responsáveis pela relação entre restrição calórica e prolongamento do tempo de vida em roedores e outros animais. Os mecanismos que regulam o envelhecimento provavelmente são complexos e multifatoriais, como será qualquer intervenção para prolongá­lo.

Resumo

O dano celular pode ser causado por diferentes agentes, incluindo agentes físicos, químicos, biológicos e fatores nutricionais.  Entre  os  agentes  físicos  que  provocam  lesões  na  célula  estão  forças  mecânicas  que  produzem traumatismo  do  tecido,  extremos  de  temperatura,  eletricidade,  radiação  e  transtornos  alimentares.  Agentes químicos  podem  danificar  a  célula  por  meio  de  vários  mecanismos:  podem  bloquear  as  vias  enzimáticas,  causar coagulação de tecidos e interromper o equilíbrio osmótico ou iônico da célula. Os agentes biológicos diferem de outros agentes nocivos, pois são capazes de se replicar e continuar a produzir a lesão. Entre os fatores nutricionais que contribuem para o dano celular estão excessos e deficiência de nutrientes, vitaminas e minerais. Os agentes nocivos exercem seus efeitos, em grande parte, por meio da geração de radicais livres, produção de hipoxia  celular,  ou  por  desregular  os  níveis  de  cálcio  intracelular.  Espécies  de  oxigênio  parcialmente  reduzido denominados radicais  livres  são  importantes  mediadores  do  processo  de  lesão  celular  em  diferentes  condições patológicas. São também uma importante causa de lesão celular em casos de hipoxia e após exposição à radiação e a determinados agentes químicos. A falta de oxigênio é a base da patogênese da lesão celular em casos de hipoxia

e  isquemia.  A  hipoxia  pode  ser  o  resultado  de  uma  quantidade  insuficiente  de  oxigênio  no  ar,  doença cardiorrespiratória, anemia ou incapacidade das células para utilizar o oxigênio. O aumento de cálcio intracelular ativa uma série de enzimas, com efeitos potencialmente prejudiciais. Agentes  nocivos  podem  produzir  dano  celular  subletal  e  reversível  ou  podem  levar  a  uma  lesão  irreversível  e morte  celular.  A  morte  celular  podem  envolver  dois  mecanismos:  apoptose  e  necrose.  Apoptose  envolve  a destruição  celular  controlada  e  é  o  meio  pelo  qual  o  organismo  remove  e  substitui  células  que  tenham  sido produzidas  em  excesso,  se  desenvolveram  de  maneira  inadequada,  apresentem  dano  genético  ou  estejam desgastadas. Necrose se refere ao processo de morte celular caracterizado por edema celular, ruptura da membrana e inflamação. Tal  como  os  processos  de  adaptação  e  lesão,  o  envelhecimento  é  um  processo  que  envolve  células  e  tecidos orgânicos.  Diversas  teorias  têm  sido  propostas  para  explicar  as  causas  complexas  do  envelhecimento,  incluindo aquelas baseadas em mecanismos evolutivos, que explicam o envelhecimento como uma consequência da seleção natural,  em  que  os  traços  que  maximizam  a  capacidade  reprodutiva  de  um  indivíduo  são  selecionados  em detrimento daqueles que maximizam a longevidade; teorias moleculares, como as que explicam o envelhecimento como sendo o resultado de alterações na expressão gênica; teorias que explicam a senescência celular em relação ao  comprimento  dos  telômeros  ou  eventos  moleculares,  danos  por  radicais  livres,  acúmulo  de  desgaste  (wear­ and­tear)  ou  apoptose;  e  teorias  de  sistemas,  que  atribuem  o  envelhecimento  celular  a  um  declínio  nas  funções integradoras de sistemas orgânicos, como o sistema neuroendócrino e imunológico.

Exercícios de revisão

1.

Um homem de 30 anos de idade sofreu uma fratura na perna há 2 meses. A perna foi engessada e o gesso acabou de ser removido. Ele está

impressionado com o grau com que os músculos de sua perna se retraíram.

2.

A.

Você considera isso uma resposta adaptativa normal? Explique.

B.

Essas alterações têm efeito imediato e/ou a longo prazo sobre o funcionamento da perna?

C.

Que medidas podem ser tomadas para restaurar a função completa da perna?

Uma mulher de 45 anos tem sido tratada com radioterapia para câncer de mama.

A.

Explique os efeitos da radiação ionizante na erradicação de células tumorais.

B.

Por que a radioterapia é administrada em pequenas doses divididas, ou doses fracionadas, em vez de uma única dose grande?

C.

Durante o programa de tratamento, a mulher percebe que a pele sobre a área irradiada 䎠cou avermelhada e irritada. Qual é a razão para

isso?

3.

Indivíduos que sofreram um infarto do miocárdio podem apresentar danos adicionais depois de restaurado o 䎥uxo sanguíneo; um fenômeno

conhecido como lesão de reperfusão.

4.

A.

Qual é o mecanismo proposto subjacente à lesão de reperfusão?

B.

Que fatores podem in䎥uenciar esse mecanismo?

Diariamente, as células do sangue em nosso organismo se tornam senescentes e morrem, sem produzir sinais de in䎥amação, porém um dano

maciço ou a destruição do tecido, como ocorre em casos de infarto do miocárdio, produz sinais signi䎠cativos de in䎥amação.

A.

Explique.

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Jennifer é uma criança com 1 dia de vida, nascida depois de um parto vaginal sem complicações. Foi percebido que ela tem tônus

muscular fraco e fácies irregular, incluindo olhos oblíquos voltados para cima e um per䒡l facial achatado com depressão da ponte

nasal. Ela também apresenta sopro carotídeo, e o pediatra está preocupado com um problema cardíaco em potencial. O pediatra

acredita que ela possa ter síndrome de Down (trissomia do 21). Uma amostra de sangue foi enviada para cariotipagem e o

resultado encontrado foi 47, XX, +21. O caso de Jennifer é discutido mais adiante neste capítulo e no Capítulo 7.

Nossa  informação  genética  está  armazenada  na  estrutura  do  ácido  desoxirribonucleico  (DNA),  uma macromolécula  extremamente  estável.  A  informação  genética  orienta  a  função  das  células  do  nosso  organismo, determina nossa aparência e como reagimos ao meio ambiente, além de funcionar como unidade da herança passada de geração em geração. Os genes também determinam nossa suscetibilidade a doenças e o modo como reagimos aos fármacos. A compreensão do papel que a genética desempenha na patogênese das doenças cresceu muito ao longo do século passado. Atualmente, é evidente que muitas doenças, incluindo câncer, diabetes e doenças cardiovasculares, têm um componente  genético.  No  caso  do  câncer,  avanços  genéticos  recentes  levaram  a  novos  métodos  para  a  detecção precoce e tratamento mais eficaz. Os avanços na imunogenética tornaram a transfusão de sangue e o transplante de órgãos uma realidade, e a tecnologia do DNA recombinante fornece os métodos para produção de insulina humana, hormônio  do  crescimento  e  fatores  de  coagulação.  Talvez  o  uso  mais  intensivo  da  tecnologia  genética  tenha envolvido  o  Projeto  Genoma  Humano,  iniciado  em  1990  e  concluído  em  2003,  por  meio  do  qual  foi  sequenciado todo o complemento genético humano (genoma). Este capítulo inclui discussões sobre o controle genético da função celular, cromossomos, padrões de herança e tecnologia genética.

Controle genético da função celular

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Relatar os mecanismos de reparação do DNA para o desenvolvimento de uma mutação genética



Descrever a função do RNA mensageiro, do RNA ribossômico e do RNA transportador e como se relacionam com a síntese de proteínas



Citar os efeitos do processamento pós-tradução sobre a estrutura e função das proteínas

O  DNA  que  contém  nossa  informação  genética  é  uma  molécula  extremamente  estável.  Devido  à  sua  estrutura estável,  a  informação  genética  no  DNA  pode  sobreviver  às  várias  fases  de  divisão  celular  e  ao  processo  diário  de renovação celular e crescimento dos tecidos. A sua estrutura estável também possibilita que a informação sobreviva

aos  diversos  processos  de  divisão  de  redução  envolvidos  na  formação  de  gametas  (óvulo  e  espermatozoide), processo  de  fertilização  e  divisões  celulares  mitóticas  envolvidas  na  formação  de  um  novo  organismo  a  partir  do óvulo unicelular fertilizado, chamado zigoto. Um  segundo  tipo  de  ácido  nucleico,  o  ácido  ribonucleico  (RNA),  está  envolvido  na  verdadeira  síntese  de proteínas  celulares. A  informação  contida  em  determinado  gene  é  transcrita  primeiramente  do  DNA  para  o  RNA, processada no núcleo e, em seguida, transportada para o citoplasma, onde é traduzida e sintetizada em proteínas. Embora as moléculas de DNA e RNA tenham recebido muita atenção, são as proteínas codificadas pelos genes que compõem a maioria das estruturas celulares e executam a maior parte das funções vitais. As proteínas são responsáveis pela diversidade funcional de células, realizam a maioria das funções biológicas e é no nível das proteínas que acontecem muitos processos reguladores, ocorrem muitos processos patológicos e em que  se  encontra  a  maioria  dos  alvos  dos  fármacos.  O  termo  proteoma  define  o  conjunto  completo  de  proteínas codificadas  por  um  genoma.  A  proteômica,  o  estudo  do  proteoma,  utiliza  métodos  tecnológicos  altamente sofisticados para examinar os eventos moleculares e bioquímicos de uma célula.

Conceitos fundamentais

Função do DNA no controle do funcionamento celular



A informação necessária para o controle da estrutura e funcionamento celular está incorporada na informação genética codi䒡cada na molécula estável de DNA



Embora todas as células do organismo contenham a mesma informação genética, cada tipo de célula utiliza apenas uma parte dessa informação, dependendo

de sua estrutura e função

Estrutura e função do DNA A  molécula  de  DNA  que  armazena  a  informação  genética  no  núcleo  é  uma  longa  estrutura  de  cadeia  dupla helicoidal.  O  DNA  é  composto  por  nucleotídios,  constituídos  por  ácido  fosfórico,  um  açúcar  com  cinco  carbonos chamado desoxirribose  e  uma  de  quatro  bases  nitrogenadas  (Figura 6.1).  Essas  bases  nitrogenadas  transportam  a informação genética e são divididas em dois grupos: bases pirimídicas, timina (T) e citosina (C), que têm um anel nitrogenado,  e  bases púricas,  adenina  (A)  e  guanina  (G),  que  têm  dois.  A  espinha  dorsal  do  DNA  consiste  em grupos alternados de açúcar e ácido fosfórico, com pares de bases projetando­se para dentro na lateral da molécula de açúcar.

Dupla­hélice e pareamento das bases A estrutura original do DNA, descoberta por James Watson e Frances Crick em 1953, é semelhante a uma escada em espiral, com as bases pareadas representando os degraus (ver Figura 6.1). Existe um pareamento complementar preciso entre bases púricas e pirimídicas na molécula de DNA de cadeia dupla, em que A pareia com T e G pareia com C. Cada nucleotídio em um par pertence a uma cadeia da molécula de DNA, com as bases pareadas nas cadeias opostas  de  DNA  unidas  por  pontes  de  hidrogênio  extremamente  estáveis  em  condições  normais.  A  estrutura  de cadeia  dupla  das  moléculas  de  DNA  lhes  possibilita  reproduzir­se  com  precisão  separando  as  duas  cadeias  e sintetizando  duas  novas  cadeias  complementares.  Do  mesmo  modo,  o  pareamento  das  bases  complementares possibilita uma reparação eficaz e correta de moléculas danificadas de DNA. De  várias  centenas  até  cerca  de  1  milhão  de  pares  de  bases  podem  representar  um  gene,  com  o  tamanho proporcional ao produto de proteína que ele codifica. Das duas fitas de DNA, apenas uma é utilizada na transcrição da informação para a construção de proteínas na célula. A informação genética de uma cadeia tem um significado e é utilizada como modelo para a transcrição; o código complementar da outra cadeia não faz sentido e é ignorado. No entanto, as duas cadeias estão envolvidas na duplicação do DNA. Antes da divisão celular, as duas cadeias da hélice se  separam  e  uma  molécula  complementar  é  duplicada  ao  lado  de  cada  cadeia  original.  As  duas  fitas  tornam­se quatro. Durante a divisão celular, as moléculas de cadeia dupla recém­duplicadas são separadas e colocadas em cada célula­filha por um mecanismo de mitose. Como resultado, cada uma das células­filhas volta a conter a cadeia com significado  e  a  cadeia  complementar,  unidas  como  uma  hélice  dupla.  Em  1958,  Meselson  e  Stahl  caracterizaram

essa replicação de DNA como semiconservativa, em oposição à replicação conservativa, em que as cadeias parentais se reassociam quando as duas fitas são unidas (Figura 6.2).1

Figura 6.1 • Replicação da hélice de DNA. A hélice do DNA é desenrolada e as regras de pareamento das bases (A com  T  e  G  com  C)  operam  para  montar  uma  nova  fita  de  DNA  em  cada  cadeia  original.  Depois  de  completa  a replicação do DNA, cada molécula (cromátides) consiste em uma cadeia antiga e uma nova sintetizada. Elas estão unidas  pelo  centrômero.  (Extraída  de  McConnell  T.,  Hull  K.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of anatomy & physiology (p. 78). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Figura 6.2 • Modelo semiconservativo e conservativo de replicação do DNA, como proposto por Meselson e Stahl,

em  1958.  Na  replicação  semiconservativa  de  DNA,  as  duas  cadeias  originais  se  desenrolam  e  uma  cadeia complementar é formada ao longo de cada cadeia original.

Compactação do DNA O  genoma  ou  conteúdo  genético  total  é  distribuído  em  cromossomos.  Cada  célula  somática  humana  (exceto  os gametas  [espermatozoide  e  óvulo])  tem  23  pares  de  cromossomos  diferentes,  um  par  derivado  da  mãe  e  outro  do pai.  Um  dos  pares  de  cromossomos  representa  os  cromossomos  sexuais.  Os  genes  são  dispostos  linearmente  ao longo  de  cada  cromossomo.  Cada  cromossomo  contém  uma  hélice  linear  contínua  de  DNA.  O  DNA  no cromossomo  mais  longo  mede  mais  de  7  cm  de  comprimento.  Se  o  DNA  dos  46  cromossomos  fosse  enfileirado, cobriria uma distância de cerca de 2 m. Devido  ao  grande  tamanho,  as  moléculas  de  DNA  se  combinam  com  vários  tipos  de  proteína  e  pequenas quantidades de RNA em uma estrutura em espiral conhecida como  cromatina. A organização do DNA na cromatina é essencial para o controle da transcrição e para a compactação da molécula. Algumas proteínas associadas ao DNA formam  locais  de  ligação  para  moléculas  de  repressão  e  hormônios  que  regulam  a  transcrição  genética;  outras podem bloquear a transcrição genética, impedindo o acesso de nucleotídios à superfície da molécula de DNA.2 Um grupo específico de proteínas chamadas histonas  é  considerado  responsável  pelo  controle  das  dobras  da  cadeia  de DNA.2  Cada  molécula  de  DNA  de  cadeia  dupla  se  enrola  periodicamente  em  torno  de  histonas,  o  que  mantém  a organização  do  DNA.3  Nas  células  que  não  se  dividem,  as  fitas  de  DNA  estão  em  uma  forma  menos  compacta, denominada  cromatina.  A  Figura  6.3  ilustra  como  os  cromossomos  e  a  cromatina,  que  consistem  em  DNA cromossômico, se enrolam em torno das histonas. Embora resolvendo o problema estrutural de modo a acondicionar uma grande quantidade de DNA no núcleo, a fibra de cromatina, quando forma um complexo com as histonas e se dobra em vários níveis de compactação, torna o  DNA  inacessível  durante  os  processos  de  replicação  e  expressão  do  gene.  Para  acomodar  esses  processos,  a cromatina  deve  ser  induzida  a  modificar  sua  estrutura,  um  processo  chamado  de  remodelação  da  cromatina.4 Atualmente,  são  conhecidas  diversas  interações  químicas  possíveis  de  afetar  esse  processo.  Uma  delas  envolve  a acetilação de um grupo de aminoácidos da histona ligado à abertura da fibra de cromatina e ativação do gene. Outra modificação  química  importante  envolve  a  metilação  de  aminoácidos  da  histona  relacionados  com  a  inativação  do gene.

Figura 6.3 • Organização da cadeia de DNA. As cadeias de DNA são mostradas nos cromossomos, para as células em processo de divisão, e na cromatina, para células em repouso, e estão também enroladas em torno de histonas. (Extraída  de  McConnell T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of  anatomy  &  physiology (p. 71, Figure 3.5). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Código genético Quatro  bases  –  guanina,  adenina,  citosina  e  timina  (uracila  substitui  a  timina  no  RNA)  –  compõem  o  alfabeto  do

código  genético.  Uma  sequência  de  três  dessas  bases  forma  o  tripleto  fundamental  utilizado  na  transmissão  da informação  genética  necessária  para  a  síntese  de  proteínas.  Esse  tripleto  é  chamado  códon  (Tabela  6.1).  Um exemplo é a sequência de nucleotídios UGG (uracila, guanina, guanina), que é o tripleto de RNA para o aminoácido triptofano.  O  código  genético  é  uma  linguagem  universal  utilizada  pela  maioria  das  células  vivas  (i. e.,  o  código para o aminoácido triptofano é o mesmo em uma bactéria, uma planta e um ser humano). Também existem códons de parada (stop codons),  que  sinalizam  o  fim  de  uma  molécula  de  proteína.5  Matematicamente,  as  quatro  bases podem  ser  dispostas  em  64  combinações  diferentes.  Sessenta  e  um  dos  códigos  tripletos  correspondem  a aminoácidos específicos e três são sinais de parada. Nos seres humanos, apenas 20 aminoácidos são utilizados na síntese de proteínas. Diversos tripletos codificam o mesmo aminoácido; por isso, o código genético é considerado redundante  ou  degenerado.  Por  exemplo,  AUG  é  uma  parte  do  sinal  de  iniciação,  bem  como  o  códon  para  o aminoácido  metionina.  Códons  que  especificam  o  mesmo  aminoácido  são  chamados  sinônimos.  Os  sinônimos geralmente têm as mesmas duas primeiras bases, mas diferem na terceira. Tabela 6.1

Código tripleto dos aminoácidos.  

 

 

 

GAC

 

 

 

 

GAA

GAG

 

 

 

 

Alanina

GCU

GCC

GCA

GCG

 

 

Arginina

CGU

CGC

CGA

CGG

AGA

AGG

Asparagina

AAU

AAC

 

 

 

 

Cisteína

UGU

UGC

 

 

 

 

Fenilalanina

UUU

UUC

 

 

 

 

Glicina

GGU

GGC

GGA

GGG

 

 

Glutamina

CAA

CAG

 

 

 

 

Histidina

CAU

CAC

 

 

 

 

Isoleucina

AUU

AUC

AUA

 

 

 

Leucina

CUU

CUC

CUA

CUG

UUA

UUG

Lisina

AAA

AAG

 

 

 

 

Metionina

AUG

 

 

 

 

 

Prolina

CCU

CCC

CCA

CCG

 

 

Serina

UCU

UCC

UCA

UCG

AGC

AGU

Tirosina

UAU

UAC

 

 

 

 

Treonina

ACU

ACC

ACA

ACG

 

 

Triptofano

UGG

 

 

 

 

 

Valina

GUU

GUC

GUA

GUG

 

 

De iniciação (CI)

AUG

 

 

 

 

 

De parada (CT)

UAA

UAG

UGA

 

 

 

Aminoácido

Códons do RNA

Ácido aspártico

GAU

Ácido glutâmico

Reparação do DNA Raramente,  podem  ocorrer  erros  acidentais  na  duplicação  do  DNA.  Esses  erros  são  chamados  de  mutações.  As mutações são o resultado da substituição de um par de bases por outro, da perda ou adição de um ou mais pares de bases ou de rearranjos nos pares de bases. Muitas dessas mutações acontecem espontaneamente, enquanto outras se dão devido a agentes ambientais, produtos químicos e radiação. As mutações podem surgir em células somáticas ou

células germinativas. Apenas alterações no DNA em células germinativas podem ser herdadas. Considerando  os  milhões  de  pares  de  bases  que  devem  ser  duplicados  em  cada  divisão  celular,  não  é surpreendente  que  possam  surgir  alterações  aleatórias  na  replicação.  A  maioria  desses  defeitos  é  corrigida  por mecanismos  de  reparo  no  DNA.  Há  vários  mecanismos  de  reparação,  e  cada  um  depende  de  enzimas  específicas, denominadas  endonucleases,  que  reconhecem  distorções  locais  na  hélice  do  DNA,  cortam  a  cadeia  anormal  e removem a porção distorcida.6  O  intervalo  é,  em  seguida,  preenchido  quando  os  desoxirribonucleotídios  corretos, criados  pela  DNA  polimerase  utilizando  a  cadeia  complementar  intacta  como  molde,  são  adicionados  ao  DNA clivado.  O  segmento  terminal  recentemente  sintetizado  se  junta  ao  restante  da  cadeia  de  DNA  por  uma  ligase. A regulação normal desses mecanismos de reparação genética está sob o controle de genes de reparação do DNA. A perda  de  função  desses  genes  torna  o  DNA  suscetível  ao  acúmulo  de  mutações.  Quando  isso  afeta  os  proto­ oncogenes ou genes supressores tumorais, um provável resultado é o câncer.

Variabilidade genética À  medida  que  progredia  o  trabalho  do  Projeto  Genoma  Humano,  foi  se  tornando  evidente  que  a  sequência  do genoma  humano  é  quase  exatamente  a  mesma  (99,9%)  em  todas  as  pessoas.  A  pequena  variação  (0,01%)  na sequência dos genes (chamado haplótipo) é considerada responsável pelas diferenças individuais nos traços físicos, comportamento  e  suscetibilidade  a  doenças.  Essas  variações  algumas  vezes  são  chamadas  de  polimorfismos (pela existência  de  mais  de  um  tipo  morfológico  ou  corporal  em  uma  população).  Foi  organizado  um  esforço internacional  para  desenvolver  um  mapa  (HapMap)  dessas  variações,  com  a  intenção  de  estabelecer  um  vínculo entre  as  variações  genéticas  e  doenças  complexas  comuns,  como  câncer,  doenças  cardíacas,  diabetes  e  algumas formas de doença mental.7

DNA mitocondrial Além do DNA nuclear, uma parte do DNA de uma célula está localizada nas mitocôndrias. O DNA mitocondrial é herdado da mãe por seus filhos (herança matrilinear). É um círculo fechado de cadeia dupla que contém 37 genes, 24  dos  quais  são  necessários  para  a  tradução  do  DNA  mitocondrial  e  13  que  codificam  enzimas  necessárias  para metabolismo  oxidativo.8  A  replicação  do  DNA  mitocondrial  depende  de  enzimas  codificadas  pelo  DNA  nuclear. Assim,  o  aparelho  de  síntese  proteica  e  os  componentes  moleculares  para  o  metabolismo  oxidativo  são  derivados em conjunto de genes nucleares e mitocondriais. Doenças genéticas de DNA mitocondrial, embora raras, geralmente afetam os tecidos, como os do sistema neuromuscular que têm alto requerimento de metabolismo oxidativo.

Dos genes às proteínas Embora o DNA determine o tipo de produto bioquímico necessário para a célula e dirija sua síntese, é o RNA, por meio do processo de tradução, que responde pela montagem dos produtos.

Estrutura e função do RNA RNA, como o DNA, é uma grande molécula formada por uma longa cadeia de nucleotídios. No entanto, difere do DNA em três aspectos estruturais. Primeiro, o RNA é uma cadeia simples e não uma molécula de cadeia dupla. Em segundo  lugar,  o  açúcar  em  cada  nucleotídio  do  RNA  é  a  ribose  e  não  a  desoxirribose.  Em  terceiro  lugar,  a  base pirimídica timina do DNA é substituída por uracila no RNA. As  células  contêm  três  tipos  de  RNA:  RNA  mensageiro  (mRNA),  RNA  ribossômico  (rRNA)  e  RNA transportador (tRNA).9  Os  três  tipos  de  RNA  são  sintetizados  no  núcleo  por  enzimas  de  RNA  polimerase  e,  em seguida,  transferidos  para  o  citoplasma,  onde  ocorre  a  síntese  proteica.  O  RNA mensageiro  carrega  as  instruções para  a  síntese  de  proteínas,  obtidas  a  partir  da  molécula  de  DNA,  para  o  citoplasma.  O  RNA transportador  lê  as instruções e fornece os aminoácidos apropriados ao ribossomo, em que o RNA ribossômico traduz as instruções e fornece o maquinário necessário para a síntese de proteínas. RNA mensageiro.  O  RNA  mensageiro  é  o  modelo  para  a  síntese  de  proteínas.  É  uma  longa  molécula  de  várias centenas  a  vários  milhares  de  nucleotídios.  Cada  grupo  de  três  nucleotídios  forma  um  códon  que  é  exatamente complementar a um tripleto de nucleotídios da molécula de DNA. O RNA mensageiro é formado por meio de um processo  denominado  transcrição.9  Nesse  processo,  as  fracas  ligações  de  hidrogênio  do  DNA  são  quebradas  de

modo que os nucleotídios de RNA livres podem emparelhar com seus homólogos, expostos na cadeia significativa da molécula de DNA (ver Figura 6.4). Tal como acontece com o pareamento de bases das cadeias de DNA, as bases de RNA complementares formam pares com as bases de DNA. No RNA, a uracila (U) substitui a timina e pareia com a adenina. Como no DNA, a guanina pareia com a citosina. RNA ribossômico.  O  ribossomo  é  a  estrutura  física  no  citoplasma  em  que  acontece  a  síntese  proteica.  O  RNA ribossômico constitui 60% do ribossomo, com o restante composto por proteínas estruturais e enzimas necessárias à síntese proteica.9 Tal como acontece com os outros tipos de RNA, o rRNA é sintetizado no núcleo. Ao contrário dos  outros  dois  tipos,  o  rRNA  é  produzido  em  uma  estrutura  nuclear  especializada,  chamada  nucléolo.  O  rRNA formado  se  combina  com  proteínas  ribossômicas  no  núcleo  para  produzir  o  ribossomo,  que  é  então  transportado para  o  citoplasma.  Ao  alcançar  o  citoplasma,  a  maioria  dos  ribossomos  se  prende  ao  retículo  endoplasmático  e inicia a tarefa de síntese de proteínas. RNA transportador. O RNA transportador é uma molécula em forma de trevo que contém apenas 80 nucleotídios, tornando­o a menor molécula de RNA.9  Sua  função  é  fornecer  a  forma  ativada  de  um  aminoácido  para  a  proteína que  está  sendo  sintetizada  nos  ribossomos.  São  conhecidos  pelo  menos  20  tipos  diferentes  de  tRNA,  e  cada  um reconhece e se liga com apenas um tipo de aminoácido. Cada molécula de tRNA tem dois locais de reconhecimento: o primeiro é complementar ao códon de mRNA e o segundo é para o aminoácido. Cada tipo de tRNA carrega seu aminoácido específico para os ribossomos, nos quais está ocorrendo a síntese de proteínas; lá ele reconhece o códon apropriado no mRNA e entrega o aminoácido à molécula de proteína em formação.

Transcrição A transcrição se dá no núcleo das células e envolve a síntese de RNA a partir de um molde de DNA ( Figura 6.4).9 Os genes são transcritos por enzimas denominadas RNA polimerases que geram uma cadeia simples de RNA com sequência  idêntica  (com  exceção  de  U  no  lugar  de  T)  a  uma  das  cadeias  de  DNA.  A  transcrição  se  inicia  pela montagem  de  um  complexo  de  transcrição  composto  por  RNA  polimerase  e  outros  fatores  associados.  Esse complexo  se  liga  ao  DNA  de  cadeia  dupla  em  um  local  específico  chamado  região promotora.  Dentro  da  região promotora,  localiza­se  a  chamada  caixa  TATA.  A  caixa  TATA  contém  a  sequência  fundamental  de  nucleotídios, timina­adenina­timina­adenina  (TATA),  que  a  RNA  polimerase  reconhece  e  à  qual  se  liga.  Essa  ligação  também requer  fatores  de  transcrição,  um  local  de  iniciação  de  transcrição  e  outras  proteínas. A  transcrição  continua  para copiar a cadeia significativa em uma única cadeia de RNA à medida que se desloca ao longo do gene, firmando­se apenas quando alcança um local de parada com um códon de parada. Ao chegar ao sinal de parada, a enzima RNA polimerase deixa o gene e libera a fita de RNA. A fita de RNA então é processada.

Figura 6.4 • A  hélice  de  DNA  e  a  transcrição  do  RNA  mensageiro  (mRNA). A  hélice  de  DNA  se  desenrola  e  uma nova fita de mRNA é construída sobre o molde de DNA. O mRNA contém a mesma sequência de bases da cadeia de  DNA,  exceto  que  as  bases  T  são  substituídas  por  bases  U.  O  mRNA  deixa  o  núcleo  através  de  poros  na membrana nuclear. (Extraída de McConnell T., Hull K. (2011).  Human form human function: Essentials of anatomy & physiology (p. 83). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

O processamento envolve a adição de certos ácidos nucleicos nas extremidades da cadeia de RNA e o corte e o processamento  (splicing)  de  certas  sequências  internas.  O  splicing  é  a  remoção  de  trechos  (íntrons)  de  RNA. Devido ao processo de splicing, a sequência de final de mRNA é diferente do modelo original de DNA. As regiões de  codificação  de  proteínas  retidas  das  sequências  de  mRNA  são  chamadas  éxons e as regiões entre os éxons são chamadas  íntrons.10  A  função  dos  íntrons  é  desconhecida.  Acredita­se  que  estejam  envolvidos  na  ativação  ou desativação dos genes durante várias fases de desenvolvimento. O splicing  possibilita  que  a  célula  produza  uma  variedade  de  moléculas  de  mRNA  a  partir  de  um  único  gene. Variando os segmentos de splicing do mRNA inicial, são formadas diversas moléculas de mRNA. Por exemplo, em uma  célula  muscular,  o  mRNA  tropomiosina  original  sofre  até  10  splicings,  fornecendo  diferentes  produtos proteicos.  Isso  torna  possível  que  diferentes  proteínas  sejam  expressas  a  partir  de  um  único  gene  e  reduz  a quantidade de DNA que deve estar contida no genoma.

Tradução A  tradução  ocorre  no  citoplasma  celular  e  envolve  a  síntese  de  uma  proteína  usando  o  molde  de  mRNA. 9  As proteínas são feitas a partir de um conjunto padrão de aminoácidos, que são unidos de ponta a ponta para formar as longas cadeias de polipeptídios das moléculas proteicas. Cada cadeia de polipeptídio pode chegar a 100 e ter mais de 300 aminoácidos. Além do rRNA, a tradução requer ações coordenadas entre o mRNA e o tRNA ( Figura 6.5). Cada  uma  das  20  diferentes  moléculas  de  tRNA  transporta  seu  aminoácido  específico  até  o  ribossomo,  para  ser incorporado à molécula de proteína em desenvolvimento. O RNA mensageiro fornece a informação necessária para a  colocação  ordenada  dos  aminoácidos,  de  acordo  com  cada  tipo  específico  de  proteína.  Durante  a  síntese  de proteínas, mRNA se acopla e passa pelo ribossomo, que “lê” as instruções para a síntese. À medida que o mRNA passa através do ribossomo, o tRNA entrega os aminoácidos adequados para serem fixados à cadeia polipeptídica em  crescimento.  A  longa  molécula  de  mRNA  normalmente  percorre  e  dirige  a  síntese  proteica  em  mais  de  um ribossomo de cada vez. Depois que a primeira parte do mRNA é lida pelo primeiro ribossomo, ele se move para um segundo  e  um  terceiro.  Como  resultado,  os  ribossomos  que  estão  ativamente  envolvidos  na  síntese  proteica  são frequentemente encontrados em grupos chamados polirribossomos.

Figura  6.5  •  Síntese  proteica.  Uma  fita  de  RNA  mensageiro  (mRNA)  é  mostrada  se  movendo  ao  longo  de  uma pequena subunidade do ribossomo no citoplasma. À medida que o códon do mRNA passa ao longo do ribossomo, um novo aminoácido é adicionado à cadeia peptídica em crescimento pelo RNA transportador (tRNA), que carrega o anticódon  para  o  aminoácido  designado  pelo  mRNA. Ao  passo  que  cada  aminoácido  se  une  ao  seguinte  por  uma ligação peptídica, seu tRNA é liberado.

O processo de tradução não termina quando o código genético foi utilizado para criar a sequência de aminoácidos que constituem a proteína. Para ser útil a uma célula, essa nova cadeia de polipeptídio deve se dobrar para adquirir sua  conformação  tridimensional  única.  A  dobragem  de  muitas  proteínas  é  mais  eficiente  pela  ação  de  classes especiais  de  proteínas  chamadas  chaperonas  moleculares.11  Tipicamente,  a  função  da  chaperona  é  ajudar  a  cadeia polipeptídica recémsintetizada no alcance de uma conformação funcional como nova proteína e, em seguida, auxiliar a chegada da proteína no local celular em que ela desempenha sua função. Chaperonas moleculares também ajudam a evitar a dobragem incorreta de proteínas existentes. Distúrbios nos mecanismos das chaperonas fazem com que as moléculas intracelulares se desnaturem e fiquem insolúveis. Essas proteínas desnaturadas tendem a se unir umas às outras, precipitar e formar corpos de inclusão. O desenvolvimento de corpos de inclusão é um processo patológico comum nas doenças de Parkinson, Alzheimer e Huntington. A  nova  cadeia  sintetizada  de  polipeptídio  também  pode  precisar  se  combinar  com  uma  ou  mais  cadeias  de polipeptídios a partir do mesmo ou de um cromossomo adjacente, ligando pequenos cofatores para a sua atividade ou  promovendo  modificação  na  enzima  apropriada.  Durante  o  processo  de  póstradução,  duas  ou  mais  cadeias peptídicas  podem  combinar­se  para  formar  um  único  produto.  Por  exemplo,  duas  cadeias  de  α 2­globina  e  duas cadeias  de  ß2­globina  se  combinam  para  formar  molécula  de  α 2­ß2­hemoglobina.  Os  produtos  proteicos  também podem  ser  modificados  quimicamente  pela  adição  de  vários  tipos  de  grupos  funcionais.  Por  exemplo,  podem  ser adicionados  ácidos  graxos,  proporcionando  a  criação  de  regiões  hidrofóbicas  para  ligação  a  membranas  celulares. Outras  modificações  podem  envolver  a  clivagem  da  proteína,  ou  a  remoção  de  uma  sequência  de  aminoácidos específica,  ou  a  divisão  da  molécula  em  cadeias  menores.  Um  exemplo  disso  são  as  duas  cadeias  que  formam  a

molécula ativa de insulina circulante, uma contendo 21 e outra 30 aminoácidos, que originalmente faziam parte de uma molécula de proinsulina com 82 aminoácidos.

Regulação da expressão gênica Apenas cerca de 2% do genoma codifica instruções para a síntese de proteínas; o restante é constituído por regiões não  codificadoras,  que  servem  para  determinar  onde,  quando  e  em  que  quantidade  as  proteínas  devem  ser elaboradas.  O  grau  em  que  um  gene  ou  grupo  de  genes  em  particular  é  ativo  é  chamado  expressão  gênica.  Um fenômeno denominado indução é um importante processo que aumenta a expressão do gene. Repressão gênica é um processo  pelo  qual  um  gene  regulador  atua  para  reduzir  ou  impedir  a  expressão  gênica.  Locais  ativadores  e repressores geralmente monitoraram os níveis de produto sintetizado e regulam a transcrição gênica por meio de um mecanismo  de  feedback  negativo.  A  redução  nos  níveis  do  produto  aumenta  a  transcrição  do  gene,  e  quando  os níveis aumentam, ocorre repressão. Embora o controle da expressão gênica possa ocorrer em múltiplas etapas, muitos eventos reguladores acontecem ao nível da transcrição. A iniciação e a regulação da transcrição requerem a colaboração de uma bateria de proteínas, designadas coletivamente de fatores de transcrição.9 Os fatores de transcrição são uma classe de proteínas que se ligam  à  sua  própria  região  específica  no  DNA  e  funcionam  de  modo  a  aumentar  ou  diminuir  a  atividade  de transcrição  dos  genes.  O  papel  dos  fatores  de  transcrição  na  expressão  gênica  explica  por  que  neurônios  e  células hepáticas  têm  estruturas  e  funções  completamente  diferentes,  embora  todas  as  células  nucleadas  de  um  indivíduo contenham o mesmo DNA e, portanto, a mesma informação genética. Alguns, chamados de  fatores de transcrição genéricos,  são  necessários  para  a  transcrição  de  todos  os  genes  estruturais.  Outros,  chamados  fatores  de transcrição  específicos,  têm  funções  mais  especializadas,  ativando  genes  apenas  em  fases  específicas  do desenvolvimento.  Por  exemplo,  a  família  de  fatores  de  transcrição  PAX  está  envolvida  no  desenvolvimento  de tecidos embrionários como os olhos e porções do sistema nervoso.

Compreenda

Síntese proteica dirigida por DNA

O ácido desoxirribonucleico (DNA) dirige a síntese dos milhares de proteínas contidos nas diferentes células do corpo. Embora algumas das

proteínas sejam proteínas estruturais, a maioria são enzimas que catalisam as diferentes reações químicas na célula. Como o DNA está

localizado no núcleo da célula e a síntese de proteínas ocorre no citoplasma, um segundo tipo de ácido nucleico, o ácido ribonucleico (RNA),

participa na montagem propriamente dita das proteínas.

Existem

três

tipos

de

RNA:

RNA

mensageiro

(mRNA),

RNA

ribossômico

(rRNA)

e

RNA

transportador

(tRNA),

que

participam

na

(1)

transcrição das instruções de DNA para a síntese de proteína e na (2) conversão dessas instruções na montagem dos polipeptídios que

compõem as diferentes proteínas.

O código genético é um tripleto de quatro bases (adenina [A], timina [T], guanina [G] e citosina [C], com a timina do DNA sendo

substituída por uracila [U] no RNA) que controlam a sequência de aminoácidos da molécula de proteína que está sendo sintetizada. O código

tripleto de RNA é denominado códon.

Transcrição A transcrição envolve copiar o código genético que contém as instruções para a síntese de proteínas do DNA para uma cadeia complementar de

mRNA. A transcrição é iniciada por uma enzima chamada RNA polimerase, que se liga a um local promotor no DNA. Muitas outras proteínas,

incluindo os fatores de transcrição, funcionam aumentando ou diminuindo a atividade de transcrição dos genes. Depois da transcrição o mRNA

se separa do DNA e é processado por corte e remoção de íntrons e splicing dos éxons de RNA para produzir uma variedade de moléculas de

mRNA a partir de um único gene. Assim que é processado, o mRNA se difunde através dos poros nucleares para o citoplasma, onde controla a

síntese de proteínas.

Tradução O processo de tradução envolve pegar as instruções transcritas a partir do DNA para o mRNA e transferilas para o rRNA dos ribossomos

localizados no citoplasma. Quando o mRNA que transporta as instruções para determinada proteína entra em contato com um ribossomo, ele se

liga a uma subunidade de rRNA. Em seguida, ele se move através do ribossomo, no qual as instruções transcritas são comunicadas ao tRNA, que

entrega e transfere o aminoácido correto para a sua posição correta na cadeia peptídica em crescimento. Existem 20 tipos de tRNA, um para

cada um dos 20 tipos diferentes de aminoácidos. Cada tipo de tRNA transporta um anticódon complementar ao códon de mRNA demandando o

aminoácido transportado pelo tRNA, e é o reconhecimento do códon do mRNA pelo anticódon tRNA que assegura a sequência correta de

aminoácidos de uma proteína sintetizada.

Para

ser

funcional,

a

proteína

recém-sintetizada

encaminhada para sua posição 䒡nal na célula.

deve

assumir

sua

conformação

funcional,

ainda

mais

modi䒡cada

e,

em

seguida,

é

Mediadores genéticos do desenvolvimento embrionário A regulação da expressão gênica também desempenha um papel essencial no desenvolvimento do embrião. Durante o  desenvolvimento  embrionário,  milhares  de  genes  são  expressos  para  controlar  a  especificação  axial (ventral/dorsal;  anterior/posterior;  medial/lateral;  esquerda/direita),  a  formação  de  padrão  (arranjo  espacial  de células  diferenciadas  em  tecidos  e  órgãos)  e  a  organogênese  (desenvolvimento  dos  diferentes  órgãos).  Muitos desses  genes  codificam  fatores  de  transcrição  que  produzem  moléculas  de  sinalização.  Dois  exemplos  são  sonic hedgehog  (SHH)  e  fator  de  crescimento  de  fibroblastos.12  As  moléculas  de  sinalização  se  ligam  a  células  e  são transportadas  para  o  núcleo,  onde  iniciam  alterações  na  expressão  de  genes.  Dependendo  do  tecido  embrionário, esses  fatores  de  transcrição  e  as  moléculas  de  sinalização  são  produzidos  em  diferentes  fases  durante  o

desenvolvimento embrionário. A  via  de  sinalização  sonic hedgehog  está  envolvida  em  vários  eventos  essenciais  em  diferentes  fases  durante  a embriogênese.12 Participa em diversas etapas do desenvolvimento, como o estabelecimento do eixo esquerda­direita responsável pela orientação rostro­caudal do sistema nervoso; separação do cérebro em dois hemisférios cerebrais; orientação olho direito e esquerdo e separação e desenvolvimento do número correto de dedos das mãos e dos pés. Os  fatores  de  crescimento  de  fibroblastos  participam  em  uma  ampla  variedade  de  processos  de  desenvolvimento, incluindo  a  migração,  crescimento  e  diferenciação  celular.  Eles  são  amplamente  expressos  no  desenvolvimento  de ossos; muitas doenças autossômicas dominantes de crescimento ósseo são mutações de genes do receptor do fator de  crescimento  de  fibroblastos. A  mais  prevalente  dessas  condições  é  chamada  acondroplasia,  que  se  caracteriza por baixa estatura, membros desproporcionalmente menores do que o tronco e macrocefalia (cabeça grande).

Resumo

Os  genes  são  a  unidade  fundamental  de  armazenamento  de  informação  na  célula.  Eles  determinam  o  tipo  de proteínas  e  enzimas  produzidas  pela  célula  e,  portanto,  controlam  a  herança  e  o  funcionamento  celular.  A informação genética está armazenada em uma macromolécula estável conhecida por DNA. Os genes transmitem as informações  contidas  nessa  molécula  por  meio  de  um  código  tripleto.  O  código  genético  é  determinado  pela disposição das bases nitrogenadas de quatro nucleotídios (adenina, guanina, timina [uracila no RNA] e citosina). Mutações  genéticas  representam  erros  acidentais  na  duplicação,  rearranjo  ou  exclusão  de  partes  do  código genético. Felizmente, a maioria das mutações é corrigida por mecanismos de reparo do DNA na célula. A transferência da informação armazenada no DNA para a confecção de produtos celulares é realizada por meio de  um  segundo  tipo  de  nucleotídio,  o  RNA.  O  RNA  mensageiro  transcreve  as  instruções  para  a  síntese  de produtos  a  partir  da  molécula  de  DNA,  sofre  um  processo  de  processamento  de  corte  e  união  denominado splicing, em que íntrons são removidos, e desloca­se para o citoplasma da célula, onde o RNA ribossômico usa as informações para dirigir a síntese de proteínas por meio de um processo conhecido como tradução. A transcrição é iniciada  pela  RNA  polimerase  e  outros  fatores  associados  que  se  ligam  ao  DNA  de  cadeia  dupla  em  um  local específico  chamado  região  promotora.  O  RNA  transportador  atua  como  um  sistema  para  a  entrega  dos aminoácidos apropriados para os ribossomos. O  grau  em  que  um  gene  ou  grupo  de  genes  em  particular  é  ativo  é  chamado  expressão gênica.  A  expressão genética  envolve  um  conjunto  de  inter­relações  complexas  entre  os  diferentes  níveis  de  controle,  incluindo  a transcrição  do  RNA  e  o  processamento  pós­tradução.  A  iniciação  e  regulação  da  transcrição  de  RNA  são controladas por fatores de transcrição que se ligam a regiões específicas de DNA e funcionam de modo a regular a  expressão  gênica  de  tipos  diferentes  de  células  orgânicas.  O  processamento  póstradução  inclui  a  dobragem correta  da  cadeia  polipeptídica  recém­sintetizada  até  alcançar  sua  conformação  original  tridimensional.  Classes especiais de proteínas chamadas chaperonas moleculares são responsáveis pela dobragem mais eficiente de muitas proteínas. O processamento póstradução também pode envolver a combinação de cadeias de polipeptídios a partir do mesmo cromossomo ou cromossomo adjacente, a ligação de pequenos cofatores ou a modificação de enzimas.

Cromossomos

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



De䒡nir os termos autossomos, cromatina, meiose e mitose



Listar as etapas na construção de um cariótipo por meio de estudos citogenéticos



Explicar o signi䒡cado do corpúsculo de Barr

A  maior  parte  da  informação  genética  de  uma  célula  é  organizada,  armazenada  e  recuperada  em  pequenas estruturas  intracelulares  chamadas  cromossomos.  Embora  os  cromossomos  sejam  visíveis  apenas  em  células  em divisão,  eles  mantêm  sua  integridade  entre  as  divisões  celulares.  Os  cromossomos  são  organizados  em  pares;  um

membro do par é herdado do pai, outro da mãe. Cada espécie tem um número característico de cromossomos. Nos seres humanos, existem 46 individualmente ou 23 pares de cromossomos. Dos 23 pares de cromossomos humanos, 22 são chamados de autossomos e são iguais nos dois sexos. Cada um dos 22 pares de autossomos tem o mesmo aspecto em todas as pessoas e a cada um foi dada uma designação numérica para fins de classificação (Figura 6.6). Na  célula  diploide,  cada  um  dos  22  cromossomos  autossômicos  tem  um  homólogo.  Cromossomos  homólogos contêm  uma  série  semelhante  de  genes;  em  outras  palavras,  eles  têm  sequências  semelhantes.  Contudo,  não  são idênticos,  porque  um  homólogo  vem  do  espermatozoide  haploide  do  pai  e  o  outro  do  óvulo  haploide  da  mãe.  Os cromossomos sexuais, que compõem o par de cromossomos 23, determinam o sexo do indivíduo. Todos os homens têm um cromossomo X e um Y (um cromossomo X da mãe e um cromossomo Y do pai); todas as mulheres têm dois  cromossomos  X  (um  de  cada  progenitor).  O  cromossomo  Y,  muito  menor,  contém  a  região  específica masculina (MSY) que determina o sexo.13 Esta região compreende mais de 95% do comprimento do cromossomo Y.

Figura  6.6  •  Cariótipo  de  cromossomos  humanos.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  (Eds.).  (2012).  Rubin’s pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  221).  Philadelphia,  PA:  Lippincott  Williams  & Wilkins.)

Apenas um dos cromossomos X no sexo feminino é ativo no controle da expressão de características genéticas; no  entanto,  os  dois  cromossomos  X  são  ativados  durante  a  gametogênese.  Na  mulher,  o  cromossomo  X  ativo  é invisível,  mas  o  cromossomo  X  inativo  pode  ser  visualizado  com  coloração  nuclear  adequada. Acredita­se  que  a inativação envolva a adição de um grupo metil no cromossomo X. A massa inativa de cromatina pode ser observada como corpúsculo de Barr em células epiteliais, ou como a ponta da baqueta de um tambor (drumstick) na cromatina de neutrófilos.14  O  sexo  genético  de  uma  criança  pode  ser  determinado  por  estudo  microscópico  de  amostras  de células ou tecidos. O número total de cromossomos X é igual ao número de corpúsculos de Barr mais um (i. e., um inativo mais o cromossomo X ativo). Por exemplo, as células de uma mulher normal têm um corpúsculo de Barr e, portanto,  um  total  de  dois  cromossomos  X.  Um  homem  normal  não  tem  corpúsculos  de  Barr.  Homens  com síndrome de Klinefelter, que têm um cromossomo Y e dois X (um ativo e um inativo), exibem um corpúsculo de

Barr.  Na  mulher,  se  o  cromossomo  X  ativo  será  derivado  da  mãe  ou  do  pai  é  determinado  poucos  dias  após  a concepção, sendo uma seleção aleatória para cada linha celular pós­mitótica. Assim, os tecidos de mulheres normais têm cromossomos X ativos, em média, 50% de origem materna e 50% de origem paterna. Isto é conhecido como o princípio de Lyon.14

Divisão celular Ocorrem  dois  tipos  de  divisão  celular  em  seres  humanos  e  muitos  outros  animais:  mitose  e  meiose.  A  mitose envolve a duplicação de células somáticas e é representada pelo ciclo celular (Figura 6.7). A  meiose é um processo limitado à replicação de células germinativas e acontece apenas uma vez na linha celular. Isso resulta na formação de  gametas,  ou  células  reprodutoras  (óvulo  e  espermatozoide),  com  cada  célula  tendo  apenas  um  conjunto  de  23 cromossomos. A meiose é dividida em duas fases distintas, meiose I e meiose II. Semelhante à mitose, as células que  passarão  pela  primeira  divisão  meiótica  replicam  seu  DNA  durante  a  interfase.  Durante  a  metáfase  I,  os cromossomos  autossômicos  homólogos  se  emparelham,  formando  uma  sinapse  ou  tétrade  (duas  cromátides  por cromossomo). Às vezes são chamados bivalentes. No entanto, se emparelham em várias regiões. Os cromossomos X e Y não são homólogos e não formam bivalentes, embora na metáfase I haja possibilidade de um intercâmbio de segmentos  de  cromátides.  Esse  processo  é  chamado  de  permuta  (crossing­over)  (Figura  6.8).  O  crossing­over possibilita  novas  combinações  de  genes,  aumentando  a  variabilidade  genética.  Depois  da  telófase  I,  cada  uma  das duas  células­filhas  contém  um  membro  de  cada  par  de  cromossomos  homólogos  e  um  cromossomo  sexual  (23 cromossomos de fita dupla). Não ocorre síntese de DNA antes da divisão meiótica II. Durante a anáfase II, os 23 cromossomos  de  fita  dupla  (duas  cromátides)  de  cada  uma  das  duas  células­filhas  da  meiose  I  se  dividem  nos centrômeros. Cada célula­filha subsequente recebe 23 cromátides individuais. Assim, uma divisão meiótica de uma célula forma um total de quatro células­filhas.

Figura  6.7  •  Mitose. A  mitose  consiste  na  divisão  do  núcleo  e  é  composta  por  quatro  etapas:  telófase,  anáfase,

metáfase  e  prófase.  (Extraída  de  McConnell  T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of anatomy & physiology (p. 79, Figure 3.12) Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

A  meiose,  que  ocorre  apenas  em  células  produtoras  de  gametas  encontradas  nos  testículos  ou  ovários,  tem  um resultado diferente em indivíduos do sexo masculino e feminino. Nos homens, a meiose (espermatogênese) resulta em quatro células­filhas viáveis chamadas espermátides, que se diferenciam em espermatozoides. Nas mulheres, a formação  de  gametas  ou  oogênese  é  bem  diferente.  Depois  da  primeira  divisão  meiótica  de  um  ovócito  primário, são  formados  um  ovócito  secundário  e  outra  estrutura  denominada  corpo  polar.  Esse  pequeno  corpo  polar  contém pouco  citoplasma,  mas  pode  passar  por  uma  segunda  divisão  meiótica,  resultando  em  dois  corpos  polares.  O ovócito  secundário  sofre  uma  segunda  divisão  meiótica,  produzindo  um  ovócito  maduro  e  outro  corpo  polar.  São produzidos  quatro  espermatozoides  viáveis  durante  a  espermatogênese,  mas  apenas  um  óvulo  é  gerado  por oogênese.

Conceitos fundamentais

Cromossomos



O DNA que armazena o material genético está organizado em 23 pares de cromossomos. Existem 22 pares de autossomos, que são iguais para homens e

mulheres, e um par de cromossomos sexuais, com o par XX em mulheres e XY nos homens



A divisão celular envolve a duplicação dos cromossomos. A duplicação de cromossomos em linhas de células somáticas envolve a mitose, em que cada célula-

䒡lha recebe um par de 23 cromossomos. A meiose é limitada à replicação de células germinativas e resulta na formação de um único conjunto de 23

cromossomos

Figura 6.8 • Permuta (crossing­over) do DNA no momento da meiose.

Estrutura do cromossomo Citogenética  é  o  estudo  da  estrutura  e  características  numéricas  dos  cromossomos  de  uma  célula.  Estudos cromossômicos  podem  ser  feito  em  qualquer  tecido  ou  célula  que  cresce  e  se  divide  em  cultura.  Os  linfócitos  do sangue venoso são frequentemente utilizados para este fim. Depois que as células foram cultivadas, uma substância chamada  colchicina  é  empregada  para  manter  a  mitose  na  metáfase.  O  preparo  é  feito  espalhando  e  fixando  os cromossomos  em  uma  lâmina.  Depois,  técnicas  de  coloração  apropriadas  mostram  os  padrões  de  bandas cromossômicas para que possam ser identificados. Os cromossomos são fotografados e as microfotografias de cada um dos cromossomos são cortadas e arranjadas em pares de acordo com um sistema de classificação padronizado

(ver  Figura  6.6).  A  imagem  completa  é  chamada  cariótipo  e  o  processo  de  preparação  da  imagem  é  chamado cariotipagem.  Um  sistema  uniforme  de  classificação  cromossômica  foi  originalmente  proposto  em  1971  na  Paris Chromosome Conference e mais tarde foi revisto para descrever os cromossomos como observados em preparações mais alongadas na prófase e prometáfase. Na lâmina de metáfase, cada cromossomo toma a forma de cromátides para formar um “X” ou padrão do “osso da  sorte”.  Os  cromossomos  humanos  são  divididos  em  três  tipos,  de  acordo  com  a  posição  do  centrômero.  Se  o centrômero  está  no  meio  e  os  braços  têm  aproximadamente  o  mesmo  comprimento,  o  cromossomo  é  chamado metacêntrico;  se  não  está  centralizado  e  os  braços  têm  comprimento  claramente  diferente,  é  chamado submetacêntrico;  e  se  está  próximo  a  uma  das  extremidades,  é  chamado  acrocêntrico.  O  braço  curto  do cromossomo é designado pela letra “p”, de pequeno (petite, em francês) e o braço longo é designado pela letra “q” simplesmente  porque  é  a  próxima  letra  do  alfabeto.14  Os  braços  do  cromossomo  são  indicados  pelo  número  do cromossomo  seguido  pela  designação  p  ou  q  (p.  ex.,  15p).  Os  cromossomos  13,  14,  15,  21  e  22  têm  pequenas massas de cromatina chamadas satélites conectadas a seus braços curtos por hastes estreitas. Nas extremidades de cada  cromossomo  existem  sequências  especiais  de  DNA,  chamadas  telômeros.  Os  telômeros  possibilitam  que  a extremidade da molécula de DNA seja totalmente replicada. Os  padrões  de  bandas  de  um  cromossomo  são  utilizados  para  descrever  a  posição  de  um  gene  em  um cromossomo.  Cada  braço  do  cromossomo  é  dividido  em  regiões,  que  são  numeradas  a  partir  do  centrômero  para fora (p. ex., 1, 2). As regiões são divididas em faixas, que também são numeradas (Figura 6.9). Esses números são utilizados para designar a posição de um gene no cromossomo. Por exemplo, Xp22 se refere à banda 2, região 2 do braço curto (p) do cromossomo X.

Figura  6.9  •  Localização  de  doenças  hereditárias  como  representadas  no  cariótipo  em  bandas  do  cromossomo  X. Observe  a  nomenclatura  dos  braços  (p;  q),  regiões  (1;  2)  e  bandas  (p.  ex.,  22  [região  2,  banda  2]).  (Extraída  de Rubin R., Strayer D. (Eds.). (2012). Rubin’s pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 251). Philadelphia,  PA:  Lippincott  Williams  &  Wilkins.)  G6PD,  glicose­6­fosfato  desidrogenase;  ICG,  imunodeficiência combinada grave.

Resumo

Resumo

A  informação  genética  de  uma  célula  é  organizada,  armazenada  e  recuperada  na  forma  de  pequenas  estruturas celulares chamadas cromossomos.  Em  seres  humanos  existem  46  cromossomos  dispostos  em  23  pares.  Vinte  e dois  destes  pares  são  autossomos.  O  23o  par  representa  os  cromossomos  sexuais,  que  determinam  o  sexo  do indivíduo. Existem dois tipos de divisão celular, meiose e mitose. A divisão mitótica ocorre em células somáticas e  resulta  na  formação  de  23  pares  de  cromossomos. A  meiose  é  limitada  à  replicação  de  células  germinativas  e resulta  na  formação  de  gametas  ou  células  reprodutivas  (óvulo  e  espermatozoide),  cada  um  com  apenas  um conjunto de 23 cromossomos. Cariótipo é uma fotografia dos cromossomos de uma pessoa. Ele é preparado por meio  de  técnicas  especiais  de  laboratório  no  qual  as  células  são  cultivadas,  fixadas  e  coradas  para  exibir  um padrão  de  bandas  identificáveis.  Depois  é  feita  a  microfotografia.  As  microfotografias  de  cromossomos individuais costumam ser cortadas e reagrupadas de acordo com o número do cromossomo.

O cariótipo de Jennifer revelou um cromossomo 21 adicional. Este cromossomo adicional resultou de uma não disjunção. Esse

evento acontece com mais frequência à medida que a mulher envelhece. Assim, mulheres de 35 anos de idade e ou mais são

especialmente incentivadas a passar por uma triagem pré-natal, como será descrito no Capítulo 7.

Padrões de herança

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Construir uma linhagem hipotética para uma característica recessiva e dominante de acordo com as leis de Mendel



Diferenciar genótipo de fenótipo



De䒡nir os termos alelo, locus, expressividade e penetrância

As características herdadas dos pais estão inscritas em pares de genes, encontrados ao longo dos cromossomos. São  possíveis  formas  alternativas  do  mesmo  gene  (ou  seja,  uma  herdada  da  mãe  e  outra  do  pai)  e  cada  uma  pode produzir um aspecto diferente de um determinado traço.

Definições A genética tem seu próprio conjunto de definições. O genótipo de um indivíduo é a informação genética armazenada no  código  de  tripleto  da  sequência  de  bases.  O  fenótipo  se  refere  às  características  físicas  ou  bioquímicas conhecidas,  associadas  a  um  genótipo  específico.  Muitas  vezes,  o  genótipo  não  é  evidente  pelos  métodos  de detecção  disponíveis.  Mais  de  um  genótipo  pode  ter  o  mesmo  fenótipo. Algumas  pessoas  de  olhos  castanhos  são portadoras  do  código  para  olhos  azuis  e  outras  pessoas  de  olhos  castanhos  não  são.  Fenotipicamente,  essas  duas pessoas de olhos castanhos são as mesmas, mas genotipicamente são diferentes. No que diz respeito a uma doença genética, nem todas as pessoas com um gene mutante são afetadas na mesma extensão. Expressividade se refere ao modo como o gene é expresso no fenótipo, e esta pode ser uma variação leve ou grave. Penetrância representa a capacidade de um gene para expressar sua função. Setenta e cinco por cento de penetrância  significa  que  75%  das  pessoas  com  um  genótipo  particular  apresentam  um  fenótipo  reconhecível. Sindactilia e esclera azul são mutações genéticas que muitas vezes não apresentam 100% de penetrância. A posição de um gene em um cromossomo é chamada  locus, e formas alternativas de um gene no mesmo locus são chamadas alelos. Quando apenas um par de genes está envolvido na transmissão da informação, emprega­se o termo traço de único gene. Traços de único gene seguem as leis de herança mendelianas. Herança  poligênica  envolve  múltiplos  genes  em  loci  diferentes,  com  cada  gene  exercendo  um  pequeno  efeito aditivo  na  determinação  de  uma  característica.  Vários  pares  de  genes,  muitos  deles  com  códigos  alternativos, determinam  a  maioria  dos  traços  humanos,  sendo  responsáveis  por  algumas  formas  diferentes  que  ocorrem  com algumas doenças genéticas. Os traços poligênicos são previsíveis, mas com menor confiabilidade do que os traços

de  único  gene.  Herança  multifatorial  é  semelhante  à  herança  poligênica,  no  sentido  de  que  vários  alelos  em diferentes loci  afetam  o  resultado;  a  diferença  é  que  a  herança  multifatorial  inclui  os  efeitos  ambientais  sobre  os genes. São conhecidas muitas outras interações gene­gene. Isso inclui a epistasia, em que um gene mascara os efeitos fenotípicos de outro gene não alelo; alelos múltiplos, em que mais do que um alelo afeta a mesma característica (p. ex.,  tipos  sanguíneos  ABO);  genes  complementares,  em  que  cada  gene  é  mutuamente  dependente  e  genes colaborativos,  em  que  dois  genes  diferentes  que  influenciam  a  mesma  característica  interagem  para  produzir  um fenótipo que nenhum dos genes isoladamente poderia produzir.

Imprinting genômico Além  dos  genes  autossômicos  e  ligados  ao  sexo  e  à  herança  mitocondrial,  verificou­se  que  determinados  genes exibem  um  tipo  de  transmissão  de  “origem  parental”,  na  qual  os  genomas  parentais  nem  sempre  contribuem igualmente  para  o  desenvolvimento  do  indivíduo  (Figura  6.10).  A  transmissão  desse  fenômeno  é  chamada  de imprinting genômico. Embora raro, estima­se que cerca de 100 genes exibam imprinting genômico. As evidências sugerem  que  ocorre  um  conflito  genético  no  embrião  em  desenvolvimento:  o  genoma  do  homem  tenta  estabelecer um  número  maior  de  descendentes,  enquanto  o  da  mulher  prefere  uma  descendência  menor,  para  conservar  sua energia para as gestações subsequentes.

Figura  6.10  •  Linhagem  do  imprinting  genômico.  Na  geração  I,  o  indivíduo  A  do  sexo  masculino  herdou  um  alelo mutante de sua mãe afetada (não mostrado), o gene é “desligado” durante a espermatogênese e, portanto, nenhum dos seus descendentes (geração II) expressa o alelo mutante, independentemente do fato de serem portadores. No entanto, o gene será novamente “ligado” durante a oogênese em qualquer uma de suas filhas (B) que herdaram o alelo.  Todas  as  crianças  (geração  III)  que  herdarem  o  alelo  mutante  serão  afetadas.  Todos  os  descendentes  de crianças  normais  (C)  vão  produzir  uma  prole  normal.  Filhos  do  indivíduo  D  do  sexo  feminino  expressarão  todos  a mutação se herdarem o alelo.

Foi a análise patológica de teratomas ovarianos (tumores compostos por vários tipos de células derivadas de uma célula  germinativa  indiferenciada)  e  mola  hidatiforme  (tumores  gestacionais  feitos  de  tecido  trofoblástico)  que tornou  possível  a  primeira  evidência  de  imprinting  genômico.  Verificou­se  que  todos  os  teratomas  ovarianos  têm

um  cariótipo  46,  XX.  Os  resultados  da  análise  detalhada  do  polimorfismo  cromossômico  confirmaram  que  tais tumores  se  desenvolveram  sem  o  genoma  derivado  do  pai.  Por  outro  lado,  a  análise  da  mola  hidatiforme  sugeriu que eram tumores de origem paterna. Exemplos muito conhecidos de imprinting genômico são a transmissão das mutações nas síndromes de Prader­ Willi e Angelman. 15 As  duas  síndromes  apresentam  retardo  mental  como  uma  característica  comum. Verificou­se também  que  ambos  os  distúrbios  tinham  a  mesma  deleção  no  cromossomo  15.  Quando  a  exclusão  é  herdada  da mãe, a criança apresenta a síndrome de Angelman (“fantoche feliz”). A mesma exclusão herdada do pai resulta na síndrome de Prader­Willi. Um  distúrbio  cromossômico  relacionado  é  a  dissomia  uniparental.  Isso  ocorre  quando  dois  cromossomos  de mesmo número são herdados de um dos pais. Normalmente, isso não é um problema, exceto nos casos em que um cromossomo tenha sido impresso por um dos pais. Se o imprinting inativa um alelo, os descendentes terão apenas uma cópia funcionante do cromossomo, originando possíveis problemas.

Conceitos fundamentais

Transmissão de informação genética



A transmissão de informações de uma geração para a seguinte é fornecida pelo material genético transferido de cada um dos pais no momento da concepção



Os padrões de herança mendeliana, ou de único gene, incluem traços dominantes e recessivos autossômicos que são transmitidos de pais para 䒡lhos de

maneira previsível. A herança poligênica, que envolve vários genes, e a herança multifatorial, que também envolve vários genes além de fatores ambientais,

são menos previsíveis

Leis de Mendel A  principal  característica  da  herança  é  a  previsibilidade:  dadas  certas  condições,  a  probabilidade  de  ocorrência  ou recorrência  de  um  traço  específico  é  extremamente  previsível. As  unidades  de  hereditariedade  são  os  genes,  e  o padrão  de  expressão  de  único  gene  frequentemente  pode  ser  previsto  usando  as  leis  de  Mendel  em  relação  à transmissão  genética.  Técnicas  e  descobertas  desde  que  o  trabalho  original  de  Gregor  Mendel  foi  publicado  em 1865 levaram a algumas modificações nas leis originais. Mendel descobriu o padrão básico de herança por meio da realização de experiências cuidadosamente planejadas com ervilhas de jardim. Fazendo experiências com diversas características fenotípicas em ervilhas, Mendel propôs que características hereditárias são transmitidas de pais para filhos por meio de fatores herdados independentemente –  agora  conhecidos  como  genes  –  e  que  esses  fatores  são  transmitidos  como  traços  recessivos  e  dominantes. Mendel  chamou  os  fatores  dominantes  (ervilhas  redondas)  de  “A”  e  os  fatores  recessivos  (ervilhas  enrugadas)  de “a”. Geneticistas continuam a empregar letras maiúsculas para designar traços dominantes e letras minúsculas para identificar traços recessivos. As combinações possíveis de se formarem com a transmissão de traços dominantes e recessivos de único gene podem ser descritas mediante a construção de uma figura chamada quadrado de Punnett, que usa letras maiúsculas e minúsculas (Figura 6.11). Os traços observáveis da herança de único gene são herdados pelos descendentes dos pais. Durante a maturação, as  células  germinativas  primordiais  (espermatozoide  e  óvulo)  de  ambos  os  pais  sofrem  meiose,  ou  divisão  de redução, na qual o número de cromossomos é dividido pela metade (de 46 para 23). Nesta altura, os dois alelos de um locus do gene se separam de modo a que cada célula germinativa receba apenas um alelo de cada par (primeira lei de Mendel). De acordo com a segunda lei de Mendel, os alelos dos diferentes loci de genes segregam de maneira independente  e  se  recombinam  aleatoriamente  no  zigoto.  Indivíduos  nos  quais  dois  alelos  de  um  determinado  par são  iguais  (AA  ou  aa)  são  chamados  homozigotos.  Os  heterozigotos  têm  alelos  diferentes  (Aa)  em  um  locus  do gene.  Uma  característica  recessiva  é  aquela  expressa  apenas  em  um  par  homozigoto,  e  uma  característica dominante  é  expressa  tanto  em  um  par  homozigoto  quanto  heterozigoto.  Todos  os  indivíduos  com  um  alelo dominante  (dependendo  da  penetrância  dos  genes)  manifestam  a  característica.  Portador  é  um  indivíduo heterozigoto  para  um  traço  recessivo  que  não  manifesta  essa  característica.  Por  exemplo,  os  genes  para  cabelos loiros  são  recessivos  e  os  para  cabelos  castanhos  são  dominantes.  Portanto,  apenas  as  pessoas  com  genótipo  com dois  alelos  para  cabelos  loiros  serão  loiras;  aquelas  com  um  ou  dois  alelos  para  cabelo  castanho  terão  cabelo

castanho.

Figura  6.11  •  Quadrado  de  Punnett,  que  mostra  todas  as  combinações  possíveis  para  a  transmissão  de  uma característica  de  único  gene  (bochechas  com  covinhas).  No  exemplo  mostrado  os  dois  pais  são  heterozigotos  (Dd) para o traço. Os alelos carregados pela mãe estão à esquerda, e os do pai estão acima. O alelo D é dominante, e o alelo d é recessivo. Os descendentes DD e Dd têm covinhas, e os descendentes dd não as têm.

Linhagem Linhagem  é  um  método  gráfico  (ver  Figuras 6.10  e  6.11)  para  retratar  o  histórico  familiar  de  uma  característica hereditária.  É  construída  a  partir  de  um  histórico  familiar  cuidadosamente  obtido  e  é  útil  para  traçar  o  padrão  de herança de uma característica particular.

Resumo

Herança  representa  a  probabilidade  de  ocorrência  ou  recorrência  de  uma  característica  genética  específica. Genótipo se refere à informação armazenada no código genético de um indivíduo, enquanto o fenótipo representa os traços reconhecíveis, físicos e bioquímicos, associados ao genótipo. Expressividade diz respeito à expressão de um gene no fenótipo, e penetrância é a capacidade de um gene para expressar sua função. O ponto da molécula de DNA que controla a herança de uma característica em particular é chamado  locus genético. Formas alternativas de um  gene  em  um  locus  genético  são  chamadas  alelos.  Os  alelos  de  um  locus  genético  podem  resultar  em  traços recessivos  ou  dominantes.  Um  traço  recessivo  é  expresso  apenas  quando  há  duas  cópias  (homozigotos)  do  alelo recessivo.  Traços  dominantes  são  expressos  pelo  par  de  alelos  homozigótico  ou  heterozigoto.  Linhagem  é  um método gráfico para retratar o histórico familiar de uma característica hereditária.

Tecnologia genética

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever sucintamente os métodos utilizados em estudos de ligação, estudos de dosagem e estudos de hibridização



Descrever o processo da tecnologia do DNA recombinante



Caracterizar o processo de interferência de RNA

As  últimas  décadas  foram  testemunhas  de  avanços  fenomenais  no  campo  da  genética.  Esses  avanços  incluem  a elaboração  de  mapas  físicos  e  genéticos  por  intermédio  do  Projeto  Genoma  Humano;  a  criação  do  Projeto Internacional  Hap­Map  para  mapear  os  haplótipos  dos  muitos  polimorfismos  de  nucleotídio  único,  estreitamente relacionados no genoma humano; e no desenvolvimento de métodos para a aplicação da tecnologia desses projetos no diagnóstico e tratamento de doenças. Muitos profissionais de saúde também estabeleceram competências clínicas para  suas  profissões  específicas  sobre  genômica  e  genética,  uma  vez  que  a  aplicação  da  genética  está  se  tornando mais  evidente  em  todas  as  áreas  de  rastreamento  e  tratamento  das  doenças.  Existem  vários  métodos  novos  de diagnóstico genético sendo utilizados, que são capazes de avaliar os pacientes para várias alterações genéticas. As informações  obtidas  a  partir  dessas  tecnologias  auxiliam  muito  no  planejamento  do  cuidado  e  gestão especificamente  farmacológica  de  muitos  tipos  de  doenças.  Os  profissionais  de  saúde  precisam  ser  capazes  de responder  a  perguntas  e  explicar  aos  pacientes  e  familiares  uma  informação  genética  e  como  esse  conhecimento pode ou não influenciar o curso da sua saúde.

Mapeamento genético Mapeamento genético é a atribuição de genes a cromossomos ou partes de cromossomos específicos. Outro tipo de estratégia  de  mapeamento,  o  mapa  de  haplótipos,  concentra­se  em  identificar  pequenas  variações  no  genoma humano  que  afetam  a  suscetibilidade  de  um  indivíduo  à  doença  e  as  respostas  a  fatores  ambientais,  como micróbios, toxinas e substâncias. Existem  dois  tipos  de  mapas:  mapas  genéticos  de  genes  e  mapas  físicos.  Mapas  genéticos  são  como  mapas  de estrada.  Eles  usam  estudos  de  ligação  (p.  ex.,  dosagem,  hibridização)  para  estimar  a  distância  entre  marcos cromossômicos (marcadores genéticos). Mapas físicos são semelhantes ao mapa de um agrimensor. Eles fazem uso de  técnicas  de  citogenética  e  técnicas  moleculares  para  determinar  os  verdadeiros  locais  físicos  de  genes  nos cromossomos.  Os  mapas  genéticos  e  mapas  físicos  vêm  sendo  aperfeiçoados  ao  longo  das  décadas.  Os  primeiros esforços  de  mapeamento  genético  localizaram  genes  no  cromossomo  X.  A  atribuição  inicial  de  um  gene  de  um cromossomo  em  particular  foi  feita  em  1911  para  o  gene  do  daltonismo  herdado  da  mãe  (seguindo  o  padrão  de herança ligada ao X [X­linked]). Em 1968, foi determinado o local específico do grupo sanguíneo Duffy no braço longo do cromossomo 1.

Projeto Genoma Humano O Projeto Genoma Humano, iniciado em 1990 e concluído em 2003, buscou identificar todos os genes do genoma humano.  O  projeto  internacional  foi  responsável  pelo  desenvolvimento  de  mapas  genéticos  e  físicos  que possibilitaram  a  localização  precisa  de  genes  e  a  exploração  de  tecnologias  que  viabilizem  o  sequenciamento  de grandes quantidades de DNA com alta precisão e baixo custo. Parte do que foi descoberto era bastante inesperada, incluindo  a  revelação  de  que  os  seres  humanos  têm  meros  30.000  genes,  em  vez  dos  100  mil  previstos.  Outra descoberta  surpreendente  foi  que,  em  média,  duas  pessoas  compartilham  99,9%  de  sua  sequência  de  DNA;  isso indica  que  a  notável  diversidade  existente  entre  os  seres  humanos  está  investida  em  aproximadamente  0,1%  do nosso DNA.1,2 Até  o  momento,  foram  mapeados  locais  de  mais  de  25.000  genes  para  um  cromossomo  específico,  e  a  maioria deles  para  uma  região  específica  do  cromossomo.16  Contudo,  o  mapeamento  genético  prossegue  tão  rapidamente que esses números estão sendo constantemente atualizados. Uma excelente fonte de artigos sobre o sequenciamento de  cromossomos  específicos  em  seres  humanos  é  o  National  Center  for  Biotechnology  Information  (NCBI) (www.ncbi.nlm.nih.gov/index.html).16  Outra  fonte  é  o  Genome  Data  Base,  uma  base  de  dados  central  para  genes mapeados e um repositório internacional para a maioria das informações sobre mapeamento genético.17

Métodos de mapeamento genético

Têm  sido  utilizados  diversos  métodos  para  o  desenvolvimento  de  mapas  genéticos.  Os  mais  importantes  são estudos  de  ligação  familiar,  métodos  de  dosagem  gênica  e  estudos  de  hibridização.  Muitas  vezes,  a  atribuição específica de um gene é feita por meio de informações de diversas técnicas de mapeamento. Estudos de ligação. Os estudos de ligação estabelecem a premissa de que os genes estão dispostos em um arranjo linear  ao  longo  dos  cromossomos.  Durante  a  meiose,  os  cromossomos  emparelhados  de  células  germinativas diploides  trocam  material  genético  pelo  fenômeno  crossing­over  (ver  Figura 6.8).  Essa  troca  geralmente  envolve mais  de  um  gene;  normalmente  são  trocados  grandes  blocos  de  genes  (que  representam  grande  parte  do cromossomo). Embora o ponto em que um bloco se separa do outro seja um acontecimento aleatório, quanto mais próximos  dois  genes  estiverem  em  um  mesmo  cromossomo,  maior  é  a  chance  de  que  sejam  repassados  para  os descendentes. Quando dois traços herdados acontecem juntos em uma taxa maior do que a esperada pelo acaso, diz­ se que existe entre eles uma ligação gênica. Muitos métodos aproveitam o crossing­over e a recombinação de genes para mapear um gene particular. Em um método,  qualquer  gene  que  já  esteja  atribuído  a  um  cromossomo  específico  pode  ser  usado  como  marcador  para designar  outros  genes  ligados.  Por  exemplo,  verificou­se  que  um  cromossomo  1  mais  longo  e  o  grupo  sanguíneo Duffy eram herdados como traço dominante, posicionando o gene do grupo sanguíneo próximo ao material extra no cromossomo  1.  O  daltonismo  tem  sido  associado  à  hemofilia  clássica A  (inexistência  do  fator  VIII)  em  algumas linhagens;  a  hemofilia A  vem  sendo  associada  à  deficiência  de  glicose­6­fosfato  desidrogenase  em  outras;  e,  em outras  ainda,  o  daltonismo  é  associado  à  deficiência  de  glicose­6­  fosfato  desidrogenase.  Como  o  gene  para  o daltonismo  é  encontrado  no  cromossomo  X,  os  três  genes  devem  ser  encontrados  em  uma  pequena  seção  do cromossomo X. A análise de ligação pode ser empregada clinicamente para identificar indivíduos afetados em uma família com um defeito genético conhecido. Os indivíduos do sexo masculino, por terem um cromossomo X e um Y, são chamados hemizigotos para traços ligados ao sexo. Indivíduos do sexo feminino podem ser homozigotos ou heterozigotos  para  características  ligadas  ao  sexo.  Mulheres  heterozigotas  são  conhecidas  como  portadoras  para defeitos ligados ao X. Uma  doença  autossômica  recessiva  ultimamente  diagnosticada  com  sucesso  no  pré­natal  por  estudos  de  ligação utilizando a amniocentese é a hiperplasia suprarrenal congênita (deficiência da 21­hidroxilase), que está ligada a um tipo  de  gene  de  resposta  imunológica  (antígeno  leucocitário  humano  [HLA]).18  Estudos  de  ligação  pós­natal  têm sido  utilizados  no  diagnóstico  de  hemocromatose,  que  está  intimamente  ligada  a  outro  tipo  de  HLA.19 Indivíduos com esse distúrbio são incapazes de metabolizar o ferro, que se acumula no fígado e outros órgãos. A condição não pode  ser  diagnosticada  por  meios  convencionais  até  que  um  dano  irreversível  já  tenha  se  manifestado.  Com  o histórico familiar da doença, a tipagem de HLA pode determinar se o gene existe e, se existir, pode ser utilizada a restrição dietética de ingestão de ferro para a prevenção de danos aos órgãos. Estudos  de  dosagem  gênica.  Estudos  de  dosagem  envolvem  a  medição  da  atividade  de  uma  enzima.  Genes autossômicos normalmente estão dispostos em pares e, geralmente, ambos são expressos. Se os dois alelos existem e são expressos, a atividade da enzima deve ser de 100%. Se um membro do par de genes não existe, apenas 50% da atividade da enzima se manifestam, o que reflete a atividade do alelo normal restante. Estudos  de  hibridização.  Uma  recente  descoberta  biológica  revelou  que  duas  células  somáticas  de  espécies diferentes, quando colocadas em conjunto na mesma cultura, se fundem então para formar uma nova célula híbrida. São utilizados dois métodos de hibridização em estudos genômicos: hibridização de células somáticas e hibridização in situ. Hibridização  de  células  somáticas  envolve  a  fusão  de  células  somáticas  humanas  com  células  de  uma  espécie diferente  (tipicamente,  de  camundongos),  para  se  obter  uma  célula  contendo  os  cromossomos  das  duas  espécies. Como essas células híbridas são instáveis, elas começam a perder cromossomos das duas espécies durante divisões celulares subsequentes. Isso possibilita a obtenção de células com diferentes combinações parciais de cromossomos humanos. As  enzimas  dessas  células  são,  então,  estudadas  com  a  compreensão  de  que,  para  que  uma  enzima  seja produzida,  determinado  cromossomo  deve  existir  e,  por  conseguinte,  a  codificação  para  a  enzima  deve  estar localizada neste cromossomo. A hibridização in situ envolve a utilização de sequências específicas de DNA ou RNA para localizar genes não expressos  na  cultura  de  células.  As  moléculas  de  DNA  e  RNA  podem  ser  quimicamente  identificadas  com

marcadores  radioativos  ou  fluorescentes.  Essas  sequências  de  DNA  ou  de  RNA  quimicamente  marcadas  são utilizadas como sondas para detectar a localização de genes. A sonda é adicionada a um cromossomo depois que as cadeias  de  DNA  foram  separadas.  Se  a  sonda  corresponde  com  o  DNA  complementar  de  um  segmento  de cromossomo,  hibridiza  e  permanece  no  local  exato  (daí  o  termo  in  situ)  em  um  cromossomo.  Marcadores radioativos ou fluorescentes são usados para localizar a sonda.

Mapeamento de haplótipos À  medida  que  progredia  o  trabalho  do  Projeto  Genoma  Humano,  muitos  pesquisadores  argumentaram  que  seria possível a identificação dos padrões comuns de variações na sequência do DNA no genoma humano. Foi organizado um  projeto  internacional,  conhecido  como  o  Projeto  Internacional  Hap­Map,  com  a  intenção  de  desenvolver  um mapa de haplótipos dessas variações.7 Uma das descobertas do Projeto Genoma Humano foi a sequência do genoma ser 99,9% idêntica para todos os seres humanos. É de se esperar que a variação de 0,1% possa afetar fortemente a resposta  de  um  indivíduo  a  fármacos,  substâncias  psicoativas  e  toxinas  e  sua  predisposição  para  várias  doenças. Locais na sequência de DNA em que a diferença entre os indivíduos se apresenta em uma única base de DNA são chamados de polimorfismos  de  nucleotídio  único (SNP, single  nucleotide  polymorphisms).  Um  haplótipo  consiste em vários SNP proximamente ligados em um único cromossomo e que geralmente são passados como um bloco de uma  geração  para  outra  em  determinada  população.  Uma  das  motivações  do  projeto  HapMap  foi  a  constatação  de que  a  identificação  de  alguns  SNP  era  suficiente  para  identificar  os  haplótipos  em  um  bloco.  Os  SNP  específicos que identificam os haplótipos são chamados tag SNP. Um HapMap é um mapa desses blocos haplótipos e seus tag SNP.  Esta  abordagem,  além  de  reduzir  o  número  de  SNP  necessários  para  analisar  um  genoma  inteiro,  torna  os métodos  de  verificação  genômica  muito  mais  eficientes  para  encontrar  regiões  com  genes  que  contribuem  para  o desenvolvimento da doença. Muita atenção tem sido dada à utilização de SNP para decidir se uma variante genética está  associada  ao  risco  de  maior  suscetibilidade  à  doença  em  determinada  população  em  relação  a  outra.  A farmacogenética trata da variabilidade da resposta aos medicamentos por características hereditárias, possibilitando a identificação de indivíduos que provavelmente responderão de modo favorável a um medicamento e aqueles que se espera que apresentem reações adversas. Isso resulta no uso mais seguro, eficaz e econômico em termos de custo de um medicamento.

Tecnologia de DNA recombinante O termo DNA recombinante refere­se a uma combinação de moléculas de DNA que não são encontradas juntas na natureza.  A  tecnologia  de  DNA  recombinante  viabiliza  a  identificação  da  sequência  de  DNA  em  um  gene  e  a elaboração  do  produto  proteico  codificado  pelo  gene. A  sequência  específica  de  nucleotídios  de  um  fragmento  de DNA pode frequentemente ser identificada por meio da análise da sequência de aminoácidos e do códon do mRNA do seu produto proteico. Sequências curtas de pares de bases podem ser sintetizadas, marcadas radioativamente e, em  seguida,  utilizadas  para  identificar  sua  sequência  complementar.  Deste  modo,  é  possível  a  identificação  de estruturas normais e anormais nos genes. Testes  de  sequências  de  DNA  são  particularmente  úteis  na  identificação  de  polimorfismos,  incluindo  os  SNP anteriormente mencionados, associados a diversas patologias. Como as variações são específicas, podem ser usadas impressões digitais genéticas (análise das diferenças na sequência de DNA) para determinar as relações familiares ou  auxiliar  na  identificação  de  indivíduos  envolvidos  em  atos  criminosos.  Os  métodos  de  tecnologia  de  DNA recombinante  também  podem  ser  empregados  no  tratamento  de  uma  doença.  Por  exemplo,  a  tecnologia  de  DNA recombinante é utilizada na fabricação de insulina humana, que é utilizada no tratamento do diabetes melito.

Isolamento e clonagem genética Os métodos de isolamento e clonagem de genes utilizados na tecnologia de DNA recombinante contam com o fato de  que  os  genes  de  todos  os  organismos,  de  bactérias  até  mamíferos,  têm  por  base  uma  organização  molecular semelhante.  A  clonagem  genética  requer  o  corte  e  a  modificação  de  uma  molécula  de  DNA  e  a  subsequente remontagem  de  seus  fragmentos  e  a  produção  de  cópias  modificadas  do  DNA,  seu  mRNA  e  produtos  do  gene. A molécula  de  DNA  é  cortada  utilizando  uma  enzima  bacteriana,  chamada  enzima de restrição,  que  se  liga  ao  DNA onde  quer  que  uma  curta  sequência  específica  de  pares  de  bases  seja  encontrada  e  cliva  a  molécula  em  um  local

específico  de  nucleotídios.  Deste  modo,  uma  longa  molécula  de  DNA  pode  ser  dividida  em  fragmentos  menores distintos,  um  dos  quais  provavelmente  contém  o  gene  de  interesse.  Há  muitas  enzimas  de  restrição  disponíveis comercialmente, que cortam o DNA em diferentes locais de reconhecimento. Os fragmentos restritos de DNA frequentemente podem ser reproduzidos por meio da inserção de um organismo unicelular,  como  uma  bactéria.  Para  fazer  isso,  é  utilizado  um  vetor  de  clonagem,  como  um  vírus  bacteriano  ou  o pequeno círculo de DNA que se encontra na maior parte das bactérias, denominado  plasmídio. Os vetores virais e plasmídio  replicam  de  maneira  autônoma  na  célula  bacteriana  hospedeira.  Durante  a  clonagem  de  genes,  um  vetor bacteriano e o fragmento de DNA são combinados e unidos por uma enzima especial denominada  DNA ligase. Os vetores recombinantes são em seguida introduzidos em um meio de cultura adequado para a bactéria e ela pode se replicar e expressar o gene do vetor recombinante. Às vezes, o mRNA retirado de um tecido que expressa um nível elevado  do  gene  é  utilizado  para  produzir  uma  molécula  de  DNA  complementar,  que  pode  ser  empregada  no processo de clonagem. Como fragmentos da molécula inteira de DNA são utilizados no processo de clonagem, são necessárias etapas adicionais para identificar e separar o clone que contém o gene de interesse.

Aplicações farmacêuticas A  tecnologia  de  DNA  recombinante  tornou  possível  também  produzir  proteínas  que  apresentam  propriedades terapêuticas.  Um  dos  primeiros  produtos  a  ser  produzido  foi  a  insulina  humana.  O  DNA  recombinante  que corresponde  à  cadeia  A  da  insulina  humana  foi  isolado  e  inserido  em  plasmídios  que,  por  sua  vez,  foram empregados para transformar Escherichia coli. As  bactérias,  então,  sintetizaram  a  cadeia  de  insulina.  Um  método semelhante foi utilizado para se obter a cadeia B. As cadeias A e B foram então misturadas e foi viabilizado que se dobrassem  formando  pontes  de  dissulfeto,  produzindo  moléculas  ativas  de  insulina.  O  hormônio  do  crescimento humano  também  foi  produzido  em  E.  coli.  Proteínas  mais  complexas  são  produzidas  em  cultura  de  células  de mamífero  com  a  utilização  de  técnicas  de  DNA  recombinante.  Entre  elas,  a  eritropoetina,  que  é  utilizada  para estimular a produção de hemácias; fator VIII, empregado no tratamento de hemofilia; e ativador de plasminogênio tecidual (AP­t), administrado frequentemente após um infarto do coração para dissolver trombos.

Impressão digital genética A  técnica  de  impressão  digital  genética  se  baseia,  parcialmente,  em  técnicas  utilizadas  na  tecnologia  de  DNA recombinante e naquelas originalmente utilizadas em genética médica para detectar pequenas variações nos genomas de diferentes indivíduos.20 Com o uso de enzimas de restrição, a molécula de DNA é clivada em regiões específicas (Figura 6.12). Os fragmentos de DNA são separados de acordo com o tamanho por eletroforese e desnaturados (por aquecimento  ou  tratamento  químico)  para  que  todo  o  DNA  seja  de  cadeia  simples.  O  DNA  de  cadeia  simples  é então transferido para papel de nitrocelulose, aquecido para fixar o DNA ao papel e tratado com diferentes sondas radioativas. Depois que as sondas radioativas se ligam ao DNA desnaturado, realiza­se uma radiografia para revelar os fragmentos de DNA marcados. Quando  empregado  em  patologia  forense,  esse  procedimento  é  aplicado  a  amostras  do  suspeito  e  a  amostras forenses.  Os  padrões  de  bandas  são  analisados  para  verificar  a  combinação.  Com  os  métodos  convencionais  de análise  de  enzimas  no  sangue  e  no  soro,  há  uma  possibilidade  de  uma  em  100  a  1.000  de  que  as  duas  amostras correspondam por acaso. Com impressões genéticas, essa probabilidade é de 1 em 100.000 a 1 milhão. Quando  necessário,  pode  ser  usada  uma  reação  em  cadeia  da  polimerase  (PCR)  para  amplificar  segmentos específicos de DNA. Isso é particularmente indicado para ampliar regiões de DNA para testes clínicos e forenses, porque apenas uma pequena amostra de DNA é necessária como material de análise. As regiões no DNA podem ser amplificadas a partir de um único fio de cabelo ou gota de sangue ou saliva.

Terapia genética Apesar de serem bastante diferentes da inserção de material genético em um organismo unicelular, como bactérias, estão  disponíveis  algumas  técnicas  para  a  inserção  de  genes  no  genoma  de  plantas  multicelulares  e  animais. Veículos  de  liberação  promissores  para  esses  genes  são  os  adenovírus.  Tais  vírus  são  veículos  ideais  porque  seu DNA não se integra ao genoma do hospedeiro. No entanto, muitas vezes é necessário repetir as inoculações, pois o sistema  imunológico  do  organismo  geralmente  ataca  células  que  expressam  proteínas  de  adenovírus.  Lipossomas

estericamente  estabilizados  também  se  têm  se  mostrado  promissores  como  mecanismos  de  liberação  de  DNA.21 Esse  tipo  de  terapia  é  um  dos  métodos  mais  promissores  para  o  tratamento  de  doenças  genéticas  como  fibrose cística, alguns tipos de câncer e várias doenças infecciosas. São  empregadas  duas  abordagens  principais  em  terapia  genética:  genes  transferidos  podem  substituir  os defeituosos ou podem inibir seletivamente os deletérios. Sequências clonadas de DNA geralmente são os compostos utilizados na terapia genética. No entanto, a introdução do gene clonado no organismo multicelular pode influenciar apenas  as  poucas  células  que  recebem  o  gene.  Uma  solução  para  esse  problema  seria  a  inserção  do  gene  em  um espermatozoide ou óvulo; após a fertilização, o gene será replicado em todos os tipos de células de diferenciação. Mesmo assim, técnicas de inserção celular são limitadas. Existem não apenas questões morais e éticas envolvidas, mas o problema de que essas técnicas não podem direcionar o DNA inserido para ser anexado a um cromossomo em particular ou suplantar um gene existente, deslocando­o de seu local original.

Figura 6.12 •  Impressão  digital  genética.  Enzimas  de  restrição  são  usadas  para  quebrar  o  DNA  cromossômico  em fragmentos,  que  são  então  separados  por  eletroforese  em  gel,  desnaturados  e  transferidos  para  o  papel  de nitrocelulose; as bandas de DNA são marcadas com uma sonda radioativa e observadas utilizando autorradiografia. (Modificada  de  Smith  C.,  Marks A.  D.,  Lieberman  M.  (2005).  Marks’  basic  medical  biochemistry  (2nd  ed.,  p.  309). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Atualmente,  a  terapia  genética  tem  sido  utilizada  com  sucesso  no  tratamento  de  crianças  com  doença  de imunodeficiência combinada grave e na transferência de gene suicida para facilitar o tratamento de doença enxerto contra o hospedeiro após a infusão de linfócitos do doador.

Tecnologia do RNA interferente Uma abordagem de terapia genética está centralizada na substituição de genes em falta ou defeituosos, previamente descrita.  No  entanto,  várias  doenças  genéticas  são  o  resultado  não  da  falta  de  genes,  mas  da  atividade  defeituosa. Com isso em mente, alguns cientistas estão abordando o problema usando RNA interferente (iRNA) para impedir que  os  genes  produzam  as  proteínas  indesejadas  da  doença.22  O  iRNA  é  um  processo  natural  em  que  pequenos pedaços  de  RNA  de  cadeia  dupla  (small interfering RNA  [siRNA])  suprimem  a  expressão  do  gene.  Os  cientistas acreditam  que  o  iRNA  pode  ter  se  originado  como  uma  defesa  contra  infecções  virais  e  invasores  genômicos potencialmente  prejudiciais.  Nas  infecções  virais,  o  iRNA  poderia  servir  para  controlar  a  infecção  por  evitar  a síntese de proteínas virais. Com o aperfeiçoamento contínuo das técnicas de silenciamento de genes, o iRNA já teve um impacto importante

sobre a biologia molecular. Por exemplo, ele deu aos cientistas a capacidade de praticar genômica reversa, na qual a função  de  um  gene  pode  ser  inferida  por  meio  do  silenciamento  de  sua  expressão.  Cada  vez  mais,  as  empresas farmacêuticas estão usando iRNA para identificar alvos terapêuticos relacionados com a doença. Também existe um interesse  considerável  no  aproveitamento  de  iRNA  para  fins  terapêuticos,  incluindo  o  tratamento  do  vírus  da imunodeficiência  humana  (HIV)  e  vírus  da  hepatite  C.  Antes  que  isso  possa  ocorrer,  no  entanto,  os  métodos terapêuticos devem se mostrar seguros e eficazes, e devem ser superados os obstáculos para entrega de iRNA em células­alvo. É difícil para o RNA atravessar a membrana celular e enzimas no sangue podem rapidamente quebrar a molécula.

Resumo

Genoma é o complemento genético de um organismo. Mapeamento genético é um método utilizado para atribuição de  genes  a  cromossomos  específicos  ou  partes  de  um  cromossomo.  Os  mais  importantes  são  utilizados  em estudos  de  ligação  familiar,  métodos  de  dosagem  genética  e  estudos  de  hibridização.  Muitas  vezes,  a  atribuição específica  de  um  gene  é  determinada  por  meio  de  informações  de  diversas  técnicas  de  mapeamento.  Estudos  de ligação atribuem um local no cromossomo para os genes, com base em sua estreita associação com outros genes do local conhecido. Estudos de DNA recombinante envolvem a extração de tipos específicos de mRNA, utilizados na  síntese  de  cadeias  complementares  de  DNA.  As  fitas  complementares  de  DNA,  marcadas  com  um radioisótopo, se ligam com os genes aos quais são complementares e são utilizadas como sondas genéticas. Um haplótipo  consiste  em  vários  SNP  proximamente  ligados  em  um  único  cromossomo  e  geralmente  são  passados como  um  bloco  de  uma  geração  para  outra  em  determinada  população.  O  Projeto  Internacional  HapMap  foi desenvolvido para mapear os SNP no genoma humano, com a expectativa de que possam ser úteis na previsão e gestão de diversas doenças. A  engenharia  genética  proporcionou  os  métodos  para  a  manipulação  de  ácidos  nucleicos  e  recombinação  de genes  (DNA  recombinante)  em  moléculas  híbridas  que  podem  ser  inseridas  em  organismos  unicelulares  e reproduzidas  muitas  vezes.  Como  resultado,  as  proteínas  antes  disponíveis  apenas  em  pequenas  quantidades podem  agora  ser  produzidas  em  grandes  quantidades,  uma  vez  que  os  respectivos  genes  foram  isolados. Impressão  digital  genética,  que  se  baseia  na  tecnologia  de  DNA  recombinante  e  no  mapeamento  genético,  é frequentemente empregada em investigações forenses. Uma nova estratégia para a gestão de doenças genéticas tem se  concentrado  no  silenciamento  de  genes  com  o  emprego  do  iRNA  para  impedir  a  produção  de  proteínas indesejadas que geram doenças.

Exercícios de revisão

1.

O Projeto Genoma Humano revelou que os seres humanos têm apenas de 30.000 a 35.000 genes. Somente cerca de 2% do genoma codi䒡ca

instruções para a síntese de proteínas, enquanto 50% é constituído por sequências repetidas, que não codi䒡cam proteínas.

A.

Utilize esta informação para explicar como o pequeno número de genes que codi䒡ca proteínas é capaz de produzir a grande variedade de

proteínas necessárias para o desenvolvimento de órgãos e estruturas no embrião, bem como os necessários para o funcionamento

orgânico normal na vida pós-natal.

2.

Uma criança prestes a ser submetida a um procedimento cirúrgico faz um teste de tipagem sanguínea para possíveis transfusões de sangue.

Contam aos pais que a criança é tipo O positivo. Tanto a mãe quanto o pai são tipo A positivo.

A.

3.

Como você explicaria essa variação no tipo de sangue para os pais?

Anualmente, mais de 100 mil pessoas morrem como resultado de reações adversas a medicamentos; outros 2,2 milhões desenvolvem reações

graves, enquanto outras não respondem às ações terapêuticas dos fármacos.

A.

Explique como o uso de informações sobre polimor䒡smos de nucleotídio único (SNP) pode ser feito para mapear variações individuais nas

respostas aos medicamentos.

4.

A insulina humana, preparada por meio de tecnologia de DNA recombinante, é utilizada no tratamento de diabetes melito.

A.

Explique as técnicas empregadas para a produção de um hormônio humano com essa tecnologia.

Referências bibliográficas 1. Holmes F. L. (2001). Meselson, Stahl, and the replication of DNA: A history of “the most beautiful experiment in biology.” New Haven, CT: Yale University Press. 2. McConnell T. H., Hull K. L. (2011).  Human form human function: Essentials of anatomy & physiology.  Philadelphia,  PA: Lippincott Williams & Wilkins. 3. Gahan P. B. (2011). Circulating nucleic acids in plasma and serum. New York: Springer. 4. Wie C. (2004). Methods in enzymology: Chromatin and chromatin remodeling enzymes, Part A. St. Louis, MO: Elsevier. 5. Sund J., Ander M., Aqvist J. (2010). Principles of stop­codon reading on the ribosome. Nature 465, 947–950. 6. Jogland S. N. (2009). Gene biotechnology. New Delhi, India: Himalaya Publishing House. 7. Chung  D.  C.,  Haber  D. A.  (2010).  Principles  of  clinical  cancer  genetics:  A  handbook  from  the  Massachusetts  General Hospital. New York: Springer. 8. Ahmad S. (2010). Diseases of DNA repair. New York: Springer. 9. Hall  J.  E.  (2011).  Guyton  and  Hall  textbook  of  medical  physiology  (12th  ed.).  Philadelphia,  PA:  Lippincott  Williams  & Wilkins. 10. Primrose S. B., Twyman R. (2003). Principles of genome analysis and genomics (3rd ed.). Malden, MA: Wiley­Blackwell. 11. Wyttenbach A., O’Connor V. (Eds.) (2011). Folding for the synapse. New York: Springer. 12. Stanton  B.  Z.,  Peng  L.  F.  (2010).  Small  molecule  modulators  of  the  Sonic  Hedgehog  signaling  pathway.  Molecular Biosynthesis 6(1), 44–54. 13. Skaletsky  H.,  Kuroda­Kawaguchi T.,  Minx  P.  J.,  et  al.  (2003). The  malespecific  region  of  the  human Y  chromosome  is  a mosaic of discrete sequence classes. Nature 423(6942), 825–837. 14. Rubin  R.,  Strayer  D.  (Eds.).  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine.  Philadelphia,  PA: Lippincott Williams & Wilkins. 15. Gurrieri  F., Accadia  M.  (2009).  Genetic  imprinting:  The  paradigm  of  Prader­Willi  and Angelman  syndromes.  Endocrine Development 14, 20–28. 16. National  Center  for  Biotechnology  Information.  (2009).  Human  genome  and  maps.  [Online].  Available: www.ncbi.nlm.nih.gov/index.html. Retrieved November 25, 2011. 17. National  Center  for  Biotechnology  Information.  (2009).  Genome  database.  [Online].  Available: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/genome. Retrieved November 25, 2011. 18. Nimkarn  S.,  Lin­Su  K.,  New  M.  I.  (2011).  Steroid  21  hydroxylase  deficiency  congenital  adrenal  hyperplasia.  Pediatric Clinics of North America 58(5), 1281–1300. 19. McElroy V. (2009). Hemochromatosis: A literature review. Journal of Diagnostic Medical Sonography 25(6), 325–330. 20. Laino C. (2008). Genetic fingerprinting is changing clinical practice. Oncology Times 30(15), 5–6. 21. Gregoriadis G. (2006). Liposome technology. Volume 1: Liposome preparation and related techniques. London, UK: Informa Healthcare. 22. Petrocca F., Lieberman J. (2011). Promise and challenge of RNA interference­based therapy for cancer. Journal of Clinical Oncology 29(6), 747–754.

Defeitos congênitos, às vezes chamados de defeitos de nascimento, são anormalidades em uma estrutura, função ou metabolismo orgânico já no momento do parto. Afetam mais de 185 mil crianças nascidas anualmente nos EUAa e são  a  principal  causa  de  morte.1  Defeitos  congênitos  podem  ser  causados  por  fatores  genéticos  (herança  de  único gene, herança multifatorial ou aberrações cromossômicas) ou fatores ambientais ativos durante o desenvolvimento embrionário ou fetal (p. ex., doença materna, infecções ou medicamentos tomados durante a gravidez). Embora os defeitos  congênitos  estejam  evidentes  ao  nascimento,  as  doenças  genéticas  podem  se  manifestar  mais  tarde.  Este capítulo apresenta uma visão geral de doenças genéticas e congênitas e divide­se em três partes: 1. Doenças genéticas e cromossômicas 2. Doenças causadas por fatores ambientais 3. Diagnóstico e aconselhamento.

Doenças genéticas e cromossômicas

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever três tipos de doenças de único gene e seus padrões de herança



Diferenciar as doenças por herança multifatorial daquelas causadas por herança de um único gene



Descrever três padrões de quebra e rearranjo cromossômico

  Uma  doença  genética  pode  ser  descrita  como  um  evento  distinto  que  afeta  com  as  expressão  do  gene  em  um grupo  de  células  relacionadas  umas  com  as  outras  por  correlação  genética. A  maioria  das  doenças  é  causada  por alterações na molécula de DNA (ácido desoxirribonucleico), que modificam a sequência de síntese de um produto genético específico. Outras resultam de aberrações cromossômicas causadoras de deleção ou erros de duplicação.2 Algumas doenças genéticas são o resultado de um número anormal de cromossomos.2 Os  genes  em  cada  cromossomo  estão  dispostos  em  pares  em  uma  ordem  estrita,  com  cada  gene  ocupando  um determinado  local  ou  locus.  Os  dois  membros  de  um  par  de  genes,  um  herdado  da  mãe  e  outro  do  pai,  são chamados alelos. Se os membros de um par de genes são idênticos (i. e., codificam exatamente o mesmo produto genético), o indivíduo é considerado homozigoto, e se os dois membros são diferentes, o indivíduo é heterozigoto. A  composição  genética  de  uma  pessoa  é  chamada  genótipo,  enquanto  o  fenótipo  é  a  expressão  observável  de  um genótipo  em  termos  de  características  morfológicas,  bioquímicas  ou  moleculares.  Se  o  traço  é  expresso  no heterozigoto (somente um membro do par de genes codifica a característica), diz­se que é dominante. Se é expresso apenas no homozigoto (os dois membros do par de genes codificam a característica), é recessivo.

Embora a expressão genética normalmente siga um padrão dominante ou recessivo, é possível que os dois alelos de um par de genes sejam totalmente expressos no heterozigoto, uma condição denominada codominância. Muitos genes têm apenas uma versão normal, e os geneticistas a chamam de alelo selvagem. Outros genes têm mais do que um  alelo  normal  (formas  alternativas)  no  mesmo  locus.  Isto  é  chamado  de  polimorfismo.  A  herança  do  grupo sanguíneo (p. ex., A0, B0, AB) é um exemplo de codominância e polimorfismo. Uma mutação genética é um evento bioquímico, como uma alteração, deleção ou inserção de um nucleotídio, que produz  um  novo  alelo.  Um  único  gene  mutante  pode  ser  expresso  em  diferentes  partes  do  corpo. A  síndrome  de Marfan,  por  exemplo,  é  um  defeito  em  uma  proteína  do  tecido  conjuntivo,  que  tem  efeitos  disseminados envolvendo estruturas esqueléticas, cardiovasculares e os olhos. Em outras doenças de único gene, o mesmo defeito pode ser causado por mutações em vários loci  diferentes.  É  possível  que  a  surdez  infantil  resulte  de  muitos  tipos diferentes de mutações autossômicas recessivas. Doenças  genéticas  possivelmente  envolvem  uma  característica  de  único  gene,  uma  herança  multifatorial,  uma anomalia cromossômica ou um distúrbio de gene mitocondrial. A doença pode ser herdada como um traço familiar ou surgir como um caso esporádico devido a uma nova mutação.

Doenças de um único gene Doenças de um único gene são causadas por um alelo defeituoso ou mutante em um único locus genético e seguem padrões  de  hereditariedade  mendeliana.  Doenças  de  único  gene  afetam  principalmente  a  faixa  etária  pediátrica. Menos de 10% dessas condições se manifestam após a puberdade e apenas 1% após os anos reprodutivos.3 Doenças de um único gene são caracterizadas por seus padrões de transmissão, que geralmente são obtidos pelo histórico genético familiar. Os padrões de herança dependem de o fenótipo ser dominante ou recessivo e de o gene estar  localizado  em  um  cromossomo  autossômico  ou  sexual.  Além  de  doenças  causadas  por  mutações  de  genes localizados  nos  cromossomos  do  interior  do  núcleo,  outra  classe  de  doenças  com  um  padrão  de  herança  materna envolve o genoma mitocondrial. Praticamente  todas  as  doenças  de  único  gene  conduzem  à  formação  de  uma  proteína  anormal  ou  diminuição  da produção  de  um  produto  genético.  A  doença  é  passível  de  originar  uma  enzima  deficiente  ou  a  redução  da quantidade  de  uma  enzima,  defeitos  em  proteínas  receptoras  e  na  sua  função,  alterações  em  proteínas  não enzimáticas,  ou  mutações  que  resultam  em  reações  incomuns  a  medicamentos.  A  Tabela  7.1  lista  algumas  das doenças comuns de único gene e suas manifestações.

Doenças autossômicas dominantes Nas doenças autossômicas dominantes, um único alelo mutante de um dos pais afetado é transmitido para um filho, independentemente do sexo. O progenitor afetado tem 50% de chance de transmitir a doença para cada indivíduo da prole (Figura 7.1).  Os  parentes  não  afetados  de  um  dos  pais  ou  irmãos  não  afetados  da  prole  não  transmitem  a doença.  Em  muitas  circunstâncias,  a  idade  de  manifestação  é  atrasada  e  os  sinais  e  sintomas  da  doença  não aparecem até mais tarde na vida, como nos casos de doença de Huntington. Doenças  autossômicas  dominantes  também  podem  se  manifestar  como  uma  nova  mutação.  A  mutação  será transmitida  para  a  próxima  geração  dependendo  da  capacidade  reprodutiva  do  indivíduo  afetado.  Muitas  mutações autossômicas  dominantes  são  acompanhadas  de  uma  capacidade  reprodutiva  reduzida  e,  portanto,  o  defeito  não  se perpetua  nas  gerações  futuras.  Se  um  defeito  autossômico  é  acompanhado  por  uma  total  incapacidade  de reprodução, essencialmente todos os novos casos da doença serão devidos a novas mutações. Se o defeito não afeta a capacidade de reprodução, é mais provável que seja herdado. Tabela 7.1

Algumas doenças de herança mendeliana ou de único gene e seu significado.

Doenças

Signi伀䌀cado

Autossômicas dominantes

Acondroplasia

Nanismo de membros curtos

Doença renal policística do adulto

Doença renal crônica

Doença de Huntington

Doença neurodegenerativa

Hipercolesterolemia familiar

Aterosclerose prematura

Síndrome de Marfan

Doença do tecido conjuntivo com anormalidades nos sistemas esquelético, ocular e

cardiovascular

Neuro䏳馜bromatose (NF)

Tumores neurogênicos: tumores cutâneos 䏳馜bromatosos, lesões cutâneas pigmentadas e

nódulos oculares em NF-1; neuroma do acústico bilateral em NF-2

Osteogênese imperfeita

Doença dos ossos frágeis devido a defeitos na síntese de colágeno

Esferocitose

Doença das hemácias

Doença de von Willebrand

Diátese hemorrágica

Autossômicas recessivas

Fibrose cística

Distúrbio de transporte de íons cloreto através de membrana em glândulas exócrinas, que

causa doença nos pulmões e pâncreas

Doenças de armazenamento de glicogênio

Excesso de acúmulo de glicogênio no fígado e hipoglicemia (doença de von Gierke); acúmulo

de glicogênio no músculo estriado em formas miopáticas

Albinismo oculocutâneo

Hipopigmentação de pele, pelos, cabelos e olhos resultante da incapacidade de sintetizar

melanina

Fenilcetonúria (PKU)

Falta de fenilalanina hidroxilase com hiperfenilalaninemia e comprometimento do

desenvolvimento cerebral

Anemia falciforme

Defeito nas hemácias

Doença de Tay-Sachs

De䏳馜ciência de hexosaminidase A; deterioração mental e física grave que começa na infância

Recessivas ligadas ao X

Hipogamaglobulinemia do tipo Bruton

Imunode䏳馜ciência

Hemo䏳馜lia A

Diátese hemorrágica

Distro䏳馜a de Duchene

Distro䏳馜a muscular

Síndrome do X frágil

De䏳馜ciência intelectual

Figura 7.1 • Heredograma simples de um traço autossômico dominante. O círculo ou quadrado colorido representa um dos pais afetado com um gene mutante. Um dos pais afetado com um traço autossômico dominante tem 50% de chance de passar o gene mutante para cada criança, independentemente do sexo.

Embora  exista  uma  chance  de  50%  de  herdar  uma  doença  genética  dominante  de  um  progenitor  afetado,  pode haver  grande  variação  na  penetração  e  na  expressão  do  gene.  Quando  uma  pessoa  herda  um  gene  mutante dominante,  mas  não  consegue  expressá­lo,  a  característica  é  descrita  como  tendo  penetrância  reduzida.  A

penetrância é expressa em termos matemáticos: uma penetrância de 50% indica que a pessoa com o gene defeituoso herdado tem 50% de chance de expressar o transtorno. A pessoa com um gene mutante que não se expressa é uma exceção importante à regra, pois esta estabelece que indivíduos não afetados não transmitem um traço autossômico dominante.  Essas  pessoas  são  capazes  de  transmitir  o  gene  para  seus  descendentes  e  assim  produzir  a  condição pulando  uma  geração.  Doenças  autossômicas  dominantes  também  exibem  expressividade  variável;  isso  significa que são expressas de maneira diferente entre os indivíduos. A polidactilia, ou dedos extranumerários, por exemplo, pode ser expressa em qualquer um dos dedos das mãos ou dos pés. Os produtos dos genes de doenças autossômicas dominantes geralmente são proteínas reguladoras envolvidas em componentes  limitados  por  taxa  de  vias  metabólicas  complexas  ou  componentes  fundamentais  de  proteínas estruturais,  como  o  colágeno.4  Neste  capítulo  são  descritas  duas  doenças  de  herança  autossômica:  síndrome  de Marfan e neurofibromatose (NF). Síndrome de Marfan. A  síndrome  de  Marfan  é  uma  doença  autossômica  dominante  do  tecido  conjuntivo  que  dá forma  e  estrutura  a  outros  tecidos  do  corpo  e  os  mantém  no  lugar. A  anomalia  bioquímica  básica  na  síndrome  de Marfan  afeta  a  fibrilina  I,  que  é  um  dos  principais  componentes  das  microfibrilas  encontradas  na  matriz extracelular.5 Essas microfibrilas formam a armação para a deposição de elastina e são consideradas componentes integrais  das  fibras  elásticas. A  fibrilina  I  é  codificada  pelo  gene  FBNI,  mapeado  no  cromossomo  15q21.  Foram encontradas  mais  de  100  mutações  no  gene  FBNI,  tornando  inviável  o  diagnóstico  genético.  A  prevalência  da síndrome  de  Marfan  é  estimada  em  1  por  5.000.  Aproximadamente  de  70  a  80%  dos  casos  são  familiares  e  o restante são casos esporádicos, resultantes de novas mutações nas células germinativas dos pais.5

Figura 7.2 • Características clínicas da síndrome de Marfan.

A  síndrome  de  Marfan  afeta  diversos  sistemas  orgânicos,  incluindo  os  olhos;  o  sistema  cardiovascular, especificamente  relacionado  com  a  grande  ocorrência  de  aneurismas  da  aorta;  e  o  sistema  esquelético  (ossos  e

articulações).5–8 Existe uma grande variação na expressão da doença. As pessoas podem ter anormalidades em um, dois  ou  mais  sistemas  orgânicos.  As  deformidades  ósseas,  que  são  as  características  mais  evidentes  da  doença, incluem  um  corpo  longo  e  fino,  com  membros  excepcionalmente  longos  e  dedos  compridos  e  afilados,  às  vezes chamados de dedos de aranha ou aracnodatilia; articulações hiperextensíveis; e uma variedade de deformidades da coluna  vertebral,  incluindo  cifose  e  escoliose  (Figura  7.2).  Muitas  vezes  ocorrem  deformidades  torácicas,  peito escavado (esterno com depressão profunda) ou peito carinado, possíveis de exigir a realização de um procedimento cirúrgico. A doença ocular mais comum é a luxação bilateral do cristalino devido à fraqueza dos ligamentos. Miopia e  predisposição  ao  descolamento  de  retina  também  são  comuns,  resultantes  do  aumento  do  globo  ocular  devido  a alterações no tecido conjuntivo que dá suporte às estruturas oculares. No entanto, os aspectos com mais risco à vida são  os  defeitos  cardiovasculares,  que  incluem  prolapso  da  valva  mitral,  dilatação  progressiva  do  anel  da  valva aórtica  e  fraqueza  da  aorta  e  outras  artérias. A  dissecção  e  ruptura  da  aorta  podem  levar  à  morte  prematura.  Nas mulheres, o risco de dissecção aumenta durante a gestação. O diagnóstico da síndrome de Marfan se baseia em critérios diagnósticos principais e secundários, que incluem deformidades  esqueléticas,  cardiovasculares  e  oculares.  Não  há  cura  para  a  síndrome  de  Marfan.  O  plano  de tratamento  deve  incluir  a  realização  de  ecocardiograma  e  eletrocardiograma  para  avaliar  o  estado  do  sistema cardiovascular,  exames  periódicos  dos  olhos  e  avaliação  do  sistema  esquelético,  especialmente  em  crianças  e adolescentes. O risco associado à prática esportiva depende dos sistemas envolvidos. Neurofibromatose. A neurofibromatose é uma doença causadora do desenvolvimento de tumores a partir de células de  Schwann  encontradas  no  sistema  neurológico.4  Existem  pelo  menos  duas  formas  genética  e  clinicamente distintas da doença: 1. NF tipo 1 (NF­1), também conhecida como doença de von Recklinghausen 2. NF tipo 2 acústica bilateral (NF­2).4,9 As  duas  doenças  resultam  de  um  defeito  genético  no  gene  supressor  de  tumor  que  regula  a  diferenciação  e crescimento  das  células.  O  gene  para  NF­1  foi  mapeado  no  braço  longo  do  cromossomo  17  e  o  gene  de  NF­2  no cromossomo 22.4 A NF tipo 1 é uma doença comum com frequência de 1 em 4.000 e afeta pessoas de todas as raças. 4,10 Em mais de  90%  dos  casos  de  NF­1,  desenvolvem­se  neurofibromas  cutâneos  e  subcutâneos  no  final  da  infância  ou adolescência.4 Os neurofibromas cutâneos, que variam em número de uns poucos a centenas, se manifestam como lesões  moles  e  pedunculadas  ao  se  projetarem  da  pele.  São  o  tipo  mais  comum  de  lesão,  muitas  vezes  não  são aparentes  até  a  puberdade  e  apresentam  maior  densidade  no  tronco  (Figura 7.3).  As  lesões  subcutâneas  crescem logo  abaixo  da  pele.  São  firmes,  arredondadas  e  podem  ser  dolorosas.  Neurofibromas  plexiformes  envolvem  os nervos periféricos maiores. Eles tendem a formar grandes tumores responsáveis pelas graves deformações na face, pelo  crescimento  excessivo  dos  membros  ou  pelas  deformidades  esqueléticas,  como  escoliose.  Nódulos pigmentados da íris (nódulos de Lisch), específicos para NF­1, geralmente se apresentam após os 6 anos de idade.11 Eles  não  apresentam  qualquer  problema  clínico,  mas  são  importantes  para  o  estabelecimento  do  diagnóstico.  Se  a pessoa  se  apresenta  com  perda  visual  súbita  e  sem  alterações  radiológicas  ou  aumento  da  pressão  intracraniana,  é um aviso de possível aumento no crescimento do tumor no sistema nervoso central (SNC).9 O segundo componente principal de NF­1 são pigmentações cutâneas planas e grandes (geralmente ≥ 15 mm de diâmetro),  conhecidas  como  manchas  café  com  leite.4  Geralmente  são  de  coloração  castanho­clara  uniforme  em indivíduos de pele clara e marrom­escura em pessoas de pele mais escura, com bordas muito demarcadas. Embora pequenas lesões individuais possam ser encontradas em crianças normais, lesões maiores ou em quantidade de seis ou mais medindo acima de 1,5 cm de diâmetro sugerem NF­1. Uma lâmpada de Wood, que utiliza luz ultravioleta, pode ser usada para detectar manchas mais claras. As pigmentações cutâneas tornam­se mais evidentes com a idade, na medida em que os melanossomas das células epidérmicas acumulam melanina.

Figura  7.3  •  Neurofibromatose  tipo  1.  Podem  ser  observados  vários  neurofibromas  cutâneos  na  face  e  no  tronco. (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.)  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine (6th ed., p. 238). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Crianças com NF­1 também estão suscetíveis a complicações neurológicas. Existe um aumento na incidência de dificuldades  de  aprendizagem,  transtornos  de  déficit  de  atenção  e  alterações  da  fala  em  crianças  afetadas. Convulsões  parciais  complexas  e  tônico­clônicas  generalizadas  são  uma  complicação  frequente.  Neoplasias malignas são também um problema significativo em pessoas com NF­1. Uma das principais complicações da NF­1 que  ocorrem  em  3  a  5%  dos  casos  é  o  aparecimento  de  um  neurofibrossarcoma  em  um  neurofibroma,  geralmente um neurofibroma plexiforme maior.4 NF­1 também está associada ao aumento da incidência de outros tumores de origem neural, incluindo meningiomas, gliomas ópticos e feocromocitomas. Neurofibromatose  tipo  2  se  caracteriza  por  tumores  do  nervo  coclear.  Na  maioria  das  vezes,  a  doença  é assintomática durante os primeiros 15 anos de vida. Esse tipo de NF acontece com menos frequência, a uma taxa de 1  em  50.000  indivíduos.4  Os  sintomas  mais  frequentes  são  cefaleia,  perda  de  audição  e  zumbido.  Pode  estar associada a meningiomas intracranianos e medulares.4 A  condição  muitas  vezes  é  agravada  por  uma  gestação,  e  o uso de contraceptivos orais pode aumentar o crescimento e os sintomas dos tumores, porque muitos neurofibromas expressam  receptores  de  progesterona.4  Indivíduos  com  a  doença  devem  ser  avisados  de  que  pode  ocorrer  grave desorientação  durante  a  prática  de  mergulho  ou  natação,  que  pode  resultar  em  afogamento.  Pode  haver  indicação

cirúrgica para a remoção ou redução do volume dos tumores.

Doenças autossômicas recessivas Doenças  autossômicas  recessivas  se  manifestam  apenas  quando  os  dois  membros  do  par  de  genes  são  afetados. Neste  caso,  ambos  os  pais  podem  não  ser  afetados,  mas  são  portadores  do  gene  defectivo.  Doenças  autossômicas recessivas  afetam  os  dois  sexos.  O  risco  de  ocorrência  em  cada  gestação  é  de  um  em  quatro  para  uma  criança afetada,  dois  em  quatro  para  uma  criança  portadora  e  um  em  quatro  para  uma  criança  homozigota  normal  (não portadora  e  não  afetada)  (Figura  7.4).  Cruzamento  consanguíneo  (casamento  de  duas  pessoas  aparentadas),  ou consanguinidade,  aumenta  a  chance  de  que  essas  duas  pessoas  sejam  portadoras  de  uma  doença  autossômica recessiva.3 Com  doenças  autossômicas  recessivas,  a  idade  de  manifestação  frequentemente  é  no  início  da  vida. Adicionalmente, a sintomatologia tende a ser mais uniforme do que com doenças autossômicas dominantes. Além disso, doenças autossômicas são caracteristicamente causadas pela perda de mutações de função, muitas das quais podem comprometer ou eliminar a função de uma enzima. No caso de um portador heterozigoto, a existência de um gene  mutante  em  geral  não  produz  sintomas,  porque  são  sintetizadas  quantidades  iguais  de  enzimas  normais  e defeituosas. Esta “margem de segurança” garante funcionamento normal às células com metade da quantidade usual de  enzima.  Em  contraste,  a  inativação  dos  dois  alelos  de  um  homozigoto  resulta  na  perda  completa  da  atividade enzimática.  Doenças  autossômicas  recessivas  incluem  quase  todos  os  erros  inatos  do  metabolismo.  Doenças enzimáticas  que  prejudicam  vias  catabólicas  dão  origem  a  acúmulo  de  substâncias  contidas  na  dieta  (p.  ex., fenilcetonúria  [PKU])  ou  constituintes  celulares  (p.  ex.,  doenças  de  depósito  lisossômico).  Outras  doenças  advêm de  um  defeito  na  síntese  mediada  por  enzimas  de  uma  proteína  essencial  (p.  ex.,  o  regulador  da  condutância transmembranar  na  fibrose  cística).  Dois  exemplos  de  doenças  autossômicas  recessivas  não  discutidos  em  outras partes deste livro são PKU e doença de Tay­Sachs.

Figura  7.4  •  Heredograma  simples  de  um  traço  autossômico  recessivo.  O  círculo  e  o  quadrado  divididos  ao  meio representam um gene mutante. Quando ambos os pais são portadores de um gene mutante, existe uma chance de 25% de ter uma criança afetada (círculo ou quadrado colorido), 50% de ter uma criança portadora e 25% de ter uma criança  não  portadora  ou  não  afetada,  independentemente  do  sexo.  Todas  as  crianças  (100%)  com  um  dos  pais afetado são portadoras.

Fenilcetonúria. É uma doença autossômica recessiva metabólica rara que afeta aproximadamente 1 em cada 10.000 a 15.000 crianças nos EUA. A doença é causada por uma deficiência da enzima fenilalanina hidroxilase no fígado que  permite  o  acúmulo  de  níveis  tóxicos  do  aminoácido  fenilalanina  nos  tecidos  e  no  sangue.12  Se  não  tratada,  a doença  resulta  em  retardo  mental,  microcefalia,  atraso  na  fala  e  outros  sinais  de  comprometimento  do desenvolvimento neurológico. Como os sintomas da fenilcetonúria (PKU) se desenvolvem gradualmente e seriam difíceis de avaliar, têm sido desenvolvidas políticasb para que todos os recém­nascidos sejam testados para níveis anormais de fenilalanina.12,13 É  importante  que  as  amostras  de  sangue  sejam  obtidas  pelo  menos  24  h  após  o  nascimento  para  assegurar  a

precisão da triagem.12 Crianças  com  a  doença  devem  ser  tratadas  com  uma  dieta  especial,  que  restringe  a  ingestão  de  fenilalanina.  Os resultados  da  terapia  alimentar  em  crianças  com  PKU  têm  sido  impressionantes.  A  dieta  pode  evitar  o  retardo mental,  bem  como  outros  efeitos  neurodegenerativos  de  PKU  não  tratada.  No  entanto,  o  tratamento  dietético  deve ser iniciado precocemente na vida neonatal para evitar danos cerebrais. Crianças com níveis elevados de fenilalanina (> 10 mg/dℓ) devem começar o tratamento com 7 a 10 dias de vida; isso demonstra a necessidade do diagnóstico precoce.  Evidências  sugerem  que  altos  níveis  de  fenilalanina,  mesmo  durante  as  primeiras  2  semanas  de  vida, podem ser muito prejudiciais.13 Pesquisas recentes sobre o uso de dicloridrato de sapropterina no controle de casos de PKU de leves a moderados são promissoras, mas são necessários dados mais completos sobre os resultados.14 Doença de Tay­Sachs. A doença de Tay­Sachs é uma variante de uma classe de doenças de depósito lisossômico, conhecidas como gangliosidoses, em que ocorre falha na quebra dos gangliosídios GM2 da membrana celular.15 A doença  de  Tay­Sachs  é  herdada  como  traço  autossômico  recessivo  e  acontece  dez  vezes  mais  frequentemente  em judeus originários do Leste Europeu (asquenazes), em comparação com a população geral.16 Na  doença  de  Tay­Sachs,  o  gangliosídio  GM2  se  acumula  nos  lisossomos  de  todos  os  órgãos,  porém  é  mais proeminente  nos  neurônios  e  na  retina.4  O  exame  microscópico  revela  neurônios  túrgidos  com  vacúolos citoplasmáticos,  cada  um  representando  um  lisossomo  excessivamente  distendido,  preenchido  por  gangliosídios. Com o tempo, sobrevém a destruição progressiva dos neurônios no interior da substância cerebral, assim como o cerebelo, núcleo da base, tronco encefálico, medula espinal e sistema nervoso autônomo. O envolvimento da retina é detectado por oftalmoscopia e aparece como uma mancha vermelho­cereja sobre a mácula. Recém­nascidos  com  doença  de  Tay­Sachs  têm  aparência  normal  no  nascimento,  mas  começam  a  manifestar progressivamente fraqueza, flacidez muscular e déficit de atenção a partir de 6 a 10 meses de idade. Isso é seguido por  uma  rápida  deterioração  da  função  motora  e  mental,  muitas  vezes  com  o  desenvolvimento  de  convulsões generalizadas. O envolvimento da retina conduz a deficiência visual e eventual cegueira. A morte geralmente se dá antes  de  4  a  5  anos  de  idade. A  análise  do  plasma  sanguíneo  para  a  enzima  lisossomal  hexosaminidase A,  que  é deficiente  na  doença  de  Tay­Sachs,  possibilita  a  identificação  precisa  de  portadores  genéticos  da  doença.  Embora não  haja  cura,  evidências  sugerem  que  o  desenvolvimento  da  enzima  (β)­hexosaminidase  A  lisossomal  humana recombinante possa ajudar algumas pessoas com a doença de Tay­Sachs a ter melhor qualidade de vida.16

Doenças recessivas ligadas ao cromossomo X Doenças  ligadas  ao  sexo  estão  quase  sempre  associadas  ao  cromossomo  X,  ou  feminino,  e  o  padrão  de  herança  é predominantemente  recessivo.  Devido  a  um  gene  pareado  normal,  mulheres  heterozigotas  raramente  sofrem  os efeitos de um gene defeituoso, enquanto todos os homens que recebem o gene tipicamente são afetados. O padrão de herança comum é aquele em que a mãe não afetada carrega um gene normal e um alelo mutante no cromossomo X. Isso significa que ela tem 50% de chance de transmitir o gene defeituoso para seus filhos, e suas filhas têm 50% de chance de serem portadoras do gene mutante (Figura 7.5). Quando o filho afetado se reproduz, transmite o gene defeituoso para todas as suas filhas, que se tornam portadoras do gene mutante. Como os genes do cromossomo Y não  são  afetados,  o  homem  afetado  não  transmite  o  defeito  a  qualquer  um  de  seus  descendentes,  e  eles  não  serão portadores ou transmitirão a doença a seus filhos. Doenças recessivas ligadas ao X incluem a deficiência de glicose­ 6­fosfato desidrogenase, hemofilia A e agamaglobulinemia ligada ao X.

Síndrome do cromossomo X frágil A síndrome do X frágil é uma doença de único gene que provoca deficiência intelectual. 4 A mutação ocorre no local frágil do Xq27 e se caracteriza por amplificação de uma repetição do códon CGG.4 A doença, que afeta cerca de um em  1.250  homens  e  1  em  2.500  mulheres,  é  a  forma  mais  comum  de  deficiência  intelectual  herdada.4  Como acontece  com  outras  doenças  ligadas  ao  X,  a  síndrome  do  X  frágil  afeta  meninos  mais  frequentemente  do  que meninas.

Figura 7.5 • Heredograma simples de um traço recessivo ligado ao X. Traços recessivos ligados ao X são expressos fenotipicamente  na  prole  masculina.  O  pequeno  círculo  colorido  representa  o  cromossomo  X  com  o  gene defeituoso, e o quadrado colorido maior, o indivíduo afetado. O homem afetado passa o gene mutante para todas as suas filhas, que se tornam portadoras do traço e têm 50% de chance de passar o gene; seus filhos e suas filhas têm 50% de chance de serem portadores do gene (lembre­se de que o pai deles tem um X normal).

Patogênese.  O  gene  X  frágil  foi  mapeado  no  braço  longo  do  cromossomo  X,  denominado  local  FMR1 (fragile X mental retardation 1).17 O produto do gene, a proteína FMRP, é uma proteína citoplasmática amplamente expressa. É mais abundante no cérebro e nos testículos, órgãos mais afetados pela doença. Cada gene contém uma região de introdução ou promoção e uma região de instruções que executa as orientações para a síntese de proteínas. A região promotora  do  gene  FMR1  contém  repetições  de  um  código  tripleto  específico  CGG  (citosina,  guanina,  guanina) que,  quando  normal,  controla  a  atividade  do  gene.  O  mecanismo  pelo  qual  o  gene  FMR1 normal é convertido em um  gene  alterado,  ou  mutante,  capaz  de  produzir  os  sintomas  da  doença,  envolve  um  aumento  no  número  de repetições de CGG na região promotora do gene. Assim que a repetição excede um comprimento limite, não sucede mais produção de FMRP, o que resulta no fenótipo X frágil. Pessoas sem a síndrome do X frágil têm entre 6 e 40 repetições.  Um  gene  com  55  a  200  repetições  geralmente  é  considerado  uma  permutação  e  um  com  mais  de  200 repetições, uma mutação completa.17 A herança do gene  FMR1  segue  o  padrão  de  traços  ligados  ao  X,  com  o  pai  transmitindo  o  gene  para  todas  as suas  filhas,  mas  não  seus  filhos.  Cerca  de  20%  dos  homens  portadores  da  mutação  do  X  frágil  são  clínica  e citogeneticamente  normais.17  Como  esses  portadores  masculinos  transmitem  o  traço  por  meio  de  todas  as  suas filhas (que são fenotipicamente normais) aos netos afetados, são chamados homens transmissores. Manifestações  clínicas  e  diagnóstico.  Meninos  afetados  são  intelectualmente  deficientes  e  compartilham  um fenótipo  físico  comum,  que  inclui  rosto  alongado,  com  queixo  grande  e  orelhas  grandes  e  evertidas.  A hiperextensibilidade das articulações, palato ogival e prolapso da valva mitral, que são observados em alguns casos, imitam  sintomas  de  uma  doença  do  tecido  conjuntivo.  Algumas  anomalias  físicas  podem  ser  sutis  ou  ausentes. Como  meninas  têm  dois  cromossomos  X,  apresentam  maior  possibilidade  de  ter  um  desenvolvimento  cognitivo relativamente normal ou podem apresentar dificuldades de aprendizagem em determinada área, como matemática. O diagnóstico da síndrome do X frágil se baseia em características físicas e mentais. Podem ser realizados testes moleculares  de  DNA  para  confirmar  se  há  um  gene  FMR1 anormal.  Como  as  manifestações  da  síndrome  do  X frágil  podem  ser  semelhantes  às  de  outros  transtornos  de  aprendizagem,  recomenda­se  que  indivíduos  com deficiência intelectual de causa desconhecida, atraso no desenvolvimento, dificuldades de aprendizagem, autismo ou comportamentos  do  espectro  autista  sejam  avaliados  para  a  doença.17 Atualmente,  a  triagem  do  X  frágil  é  muitas vezes oferecida juntamente com a triagem pré­natal de rotina para determinar se a mulher é portadora.

Conceitos fundamentais

Doenças genéticas e alterações cromossômicas



Doenças genéticas são herdadas como doenças autossômicas dominantes, nas quais cada descendente tem 50% de chance de herdar a doença; ou por herança

autossômica recessiva, em que cada descendente tem 25% de chance de ser afetado, 50% de chance de ser um portador e 25% de chance de não ser afetado



Doenças ligadas ao sexo quase sempre estão associadas ao cromossomo X e são predominantemente recessivas



Doenças cromossômicas re䏺ᦜetem eventos ocorridos no momento da meiose e resultam do movimento defeituoso de um cromossomo inteiro ou da ruptura de

um cromossomo, com perda ou translocação de material genético

Doenças de herança multifatorial Doenças  de  herança  multifatorial  são  causadas  por  diversos  genes  e,  em  muitos  casos,  por  fatores  ambientais.4 O número  exato  de  genes  que  contribuem  para  traços  multifatoriais  não  é  conhecido,  e  esses  traços  não  seguem  o mesmo padrão evidente de herança como acontece com doenças de único gene. As doenças da herança multifatorial podem  ser  expressas  durante  a  vida  fetal  e  ao  nascimento,  ou  podem  ser  expressas  mais  tarde  na  vida.  Doenças congênitas, conforme se considera, surgem por meio de herança multifatorial e incluem fenda labial ou palatina, pé torto, luxação congênita do quadril, doença cardíaca congênita, estenose pilórica e malformação do sistema urinário. Acredita­se que os fatores ambientais desempenhem um papel importante nas doenças de herança multifatorial ao se desenvolverem na vida adulta, como doença arterial coronariana, diabetes melito, hipertensão arterial e câncer. Embora traços multifatoriais não possam ser previstos com o mesmo grau de precisão das mutações mendelianas de  único  gene,  existem  padrões  característicos.  Primeiramente,  malformações  congênitas  multifatoriais  tendem  a envolver  um  único  órgão  ou  tecido  proveniente  do  mesmo  campo  de  desenvolvimento  embrionário.  Em  segundo lugar, o risco de recorrência nas futuras gestações é para o mesmo defeito ou similar. Isso significa que os pais de uma criança com um defeito como fenda palatina têm um risco maior de ter outro filho com o mesmo defeito, mas não  com  espinha  bífida.  Em  terceiro  lugar,  o  aumento  do  risco  (em  comparação  com  a  população  em  geral)  entre parentes  de  primeiro  grau  da  pessoa  afetada  varia  de  2  a  7%,  e  entre  parentes  de  segundo  grau  é  de aproximadamente a metade.4 O risco é maior de acordo com o aumento da incidência do defeito entre parentes. Em outras  palavras,  o  risco  é  muito  maior  quando  um  segundo  filho  com  o  defeito  nasce  para  um  casal.  O  risco também  aumenta  de  acordo  com  a  gravidade  da  doença  e  quando  o  defeito  ocorre  no  sexo  que  geralmente  não  é afetado pela doença.

Fissura labial e fenda palatina A fissura labial com ou sem fenda palatina é um dos defeitos congênitos mais comuns, ocorrendo em quase 0,1% de todas as gestações.4 É também um dos defeitos congênitos mais evidentes, resultando em uma aparência anormal na  face  e  comprometimento  da  fala.  A  fissura  labial  com  ou  sem  fenda  palatina  é  mais  frequente  entre  recém­ nascidos  do  sexo  masculino,  enquanto  a  fenda  palatina  é  duas  vezes  mais  comum  entre  o  sexo  feminino.4  A incidência de fenda palatina é de aproximadamente 1 em 2.500 nascidos vivos.4 Em  termos  de  desenvolvimento,  o  defeito  tem  a  sua  origem  por  volta  do  35o  dia  de  gestação,  quando  as protuberâncias  frontais  das  estruturas  craniofaciais  se  fundem  com  o  processo  maxilar  para  formar  o  lábio superior.4  Esse  processo  está  sob  o  controle  de  muitos  genes,  e  perturbações  (hereditárias  ou  ambientais)  na expressão  do  gene  neste  momento  podem  resultar  em  fissura  labial  com  ou  sem  fenda  palatina  (Figura  7.6).  O defeito  também  pode  ser  causado  por  teratógenos  (p.  ex.,  rubéola,  medicamentos  anticonvulsivantes)  e  é frequentemente encontrado em crianças com anomalias cromossômicas. Defeitos  de  fissura  labiopalatal  podem  variar  na  aparência,  desde  um  pequeno  entalhe  no  vermelhão  do  lábio superior até a completa separação, envolvendo o palato e se estendendo para o assoalho nasal. As fissuras podem ser  unilaterais  ou  bilaterais  e  podem  envolver  a  borda  alveolar.  A  condição  é  acompanhada  por  deformação  nos dentes,  dentes  excedentes  ou  ausentes.  A  fissura  palatina  isoladamente  ocorre  na  linha  média  e  pode  envolver apenas a úvula ou se estender até os palatos mole e duro. Uma criança com fissura labial ou palatina exigirá possivelmente anos de tratamento com especialistas médicos e odontológicos,  incluindo  um  cirurgião  plástico,  odontopediatra,  ortodontista,  fonoaudiólogo  e  enfermeira

especialista.  O  problema  imediato  em  uma  criança  com  fissura  labiopalatal  é  a  alimentação.  Tanto  o  aleitamento materno quanto a mamadeira dependem de sucção, que se desenvolve pressionando com a língua a aréola ou o bico da mamadeira contra o palato duro. Embora geralmente crianças com fissura labial não apresentem problemas com a  alimentação,  aquelas  com  fenda  palatina  muitas  vezes  precisam  de  bicos  artificiais  macios  especialmente desenvolvidos, com grandes aberturas e uma mamadeira compressível.

Figura 7.6 • Fissura labial e fenda palatina.

Ocorreram grandes avanços no cuidado de crianças nascidas com fissura labiopalatal no último quarto do século 20.18 O fechamento cirúrgico do lábio costuma ser realizado por volta dos 3 meses de idade, com o fechamento do palato  geralmente  sendo  feito  antes  do  primeiro  ano  de  vida.  Dependendo  da  extensão  do  defeito,  podem  ser necessárias cirurgias adicionais à medida que a criança cresce. Em algumas situações, o palato é reparado antes da fissura labial, e os resultados indicam que a cirurgia do palato é mais fácil quando realizada antes da reparação do lábio.19 Além  disso,  quando  a  fenda  palatina  é  corrigida  antes  da  reparação  do  lábio,  o  tempo  entre  as  cirurgias  é mais curto.19 O deslocamento dos arcos superiores e o mau posicionamento dos dentes exigem, em geral, correção ortodôntica. A fissura labiopalatal também pode causar defeitos de fala. Os músculos do palato mole e das paredes laterais e posterior  da  nasofaringe  formam  uma  válvula  que  separa  a  nasofaringe  da  orofaringe  durante  a  deglutição  e  na produção de determinados sons.

Doenças cromossômicas Doenças  cromossômicas  constituem  a  maior  categoria  de  doenças  genéticas,  sendo  responsáveis  por  uma  grande proporção  de  desperdício  reprodutivo  (abortos  precoces  de  gestação),  malformações  congênitas  e  deficiência intelectual.  Citogenética  é  o  termo  dado  a  doenças  cromossômicas,  classificadas  de  acordo  com  o  Sistema

Internacional de Nomenclatura para Citogenética Humana.4 Durante  a  divisão  celular  de  células  não  germinativas,  os  cromossomos  se  duplicam  de  modo  que  cada  célula receba um número inteiro diploide. Nas células germinativas, ocorre um tipo diferente de divisão, chamado meiose. Durante a meiose, os conjuntos duplos de 22 autossomos e 2 cromossomos sexuais (número diploide normal) são reduzidos  a  conjuntos  individuais  (número  haploide)  em  cada  gameta.  No  momento  da  concepção,  o  número haploide no óvulo e no espermatozoide se funde e restaura o número diploide de cromossomos. Anormalidades  cromossômicas  são  comumente  definidas  de  acordo  com  a  descrição  abreviada  do  cariótipo. Neste  sistema,  o  número  total  de  cromossomos  é  colocado  em  primeiro  lugar,  seguido  do  complemento  do cromossomo  sexual  e  da  descrição  de  qualquer  anormalidade.  Por  exemplo,  um  homem  com  trissomia  do  21  é designado 47,XY,+21. As  aberrações  cromossômicas  subjacentes  a  doenças  podem  tomar  a  forma  de  alterações  da  estrutura  de  um  ou mais  cromossomos  ou  de  um  número  anormal  de  cromossomos.  Ocasionalmente,  erros  de  mitose  no  início  do desenvolvimento dão origem a duas ou mais linhas de células caracterizadas por cariótipos distintos, uma condição conhecida  como  mosaicismo.  O  mosaicismo  pode  resultar  de  erros  de  mitose  durante  a  clivagem  do  óvulo fertilizado ou em células somáticas. Às vezes, o mosaicismo consiste em um cariótipo anormal e um normal, caso em que as deformidades físicas causadas pela linha de células anormais geralmente são menos graves.

Anormalidades cromossômicas estruturais As alterações estruturais nos cromossomos geralmente advêm da quebra de um ou mais cromossomos, seguido de rearranjo  ou  eliminação  de  partes  do  cromossomo.  Entre  os  fatores  que  se  acredita  causarem  quebras cromossômicas encontram­se a exposição a fontes de radiação, como raios X; influência de determinados produtos químicos; mudanças extremas no ambiente celular e infecções virais. Podem  sobrevir  diversos  padrões  de  ruptura  e  rearranjo  do  cromossomo  (Figura  7.7).  Deleção  da  porção quebrada do cromossomo é provável. Quando apenas um cromossomo está envolvido, as porções quebradas podem ser invertidas. Ocorre a formação de um isocromossomo quando o centrômero, ou porção central, do cromossomo se separa horizontalmente e não verticalmente. A  formação de anel acontece quando a deleção é seguida pela união das cromátides para formar um anel. A  translocação ocorre quando há quebras simultâneas em dois cromossomos de  pares  diferentes,  com  troca  de  porções  cromossômicas.  Com  uma  translocação  recíproca  equilibrada,  nenhuma informação  genética  é  perdida;  portanto,  indivíduos  com  translocações  geralmente  são  normais.  No  entanto,  essas pessoas são portadoras de translocação e podem ter filhos sem ou com deficiências. Uma  forma  especial  de  translocação  chamada  de  fusão  cêntrica  ou  translocação  robertsoniana  envolve  dois cromossomos  acrocêntricos  nos  quais  o  centrômero  está  próximo  à  extremidade,  mais  comumente  nos cromossomos 13 e 14 ou 14 e 21. Tipicamente, a quebra ocorre perto do centrômero, afetando o braço curto de um cromossomo e o braço longo de outro. A transferência dos fragmentos do cromossomo conduz à formação de um fragmento  extremamente  longo  e  outro  curto.  O  fragmento  curto  normalmente  é  perdido  durante  divisões subsequentes. Neste caso, o indivíduo tem apenas 45 cromossomos, mas a quantidade de material genético perdido é  tão  pequena  que  muitas  vezes  passa  despercebida.  No  entanto,  surge  uma  dificuldade  durante  a  meiose,  que resulta em gametas com um número desequilibrado de cromossomos. A principal importância clínica deste tipo de translocação  é  que  os  portadores  de  uma  translocação  robertsoniana  envolvendo  o  cromossomo  21  têm  maior probabilidade de gerar uma criança com síndrome de Down. As  manifestações  de  aberrações  na  estrutura  cromossômica  dependem,  em  grande  parte,  da  quantidade  de material  genético  que  é  perdido  ou  deslocado.  Muitas  células  com  quebras  não  restauradas  são  eliminadas  nas mitoses seguintes, devido a deficiências que podem ser fatais. Isso é benéfico, pois evita que células danificadas se tornem parte permanente do organismo ou, se ocorre nos gametas, de dar origem a zigotos com defeitos grosseiros. Alguns cromossomos alterados, assim como com as translocações, são passados para a geração seguinte.

Figura 7.7 • Anormalidades estruturais no cromossomo humano.  A. A deleção de parte de um cromossomo leva a perda  de  material  genético  e  encurtamento  do  cromossomo.  B.  Uma  translocação  recíproca  envolve  dois cromossomos não homólogos, com troca do segmento acêntrico. C. A inversão requer duas quebras em um mesmo cromossomo,  com  inversão  para  o  lado  oposto  do  centrômero  (pericêntrica)  ou  com  o  fragmento  invertido,  mas permanecendo  no  mesmo  braço  (paracêntrica).  D.  Na  translocação  robertsoniana,  dois  cromossomos  acrocêntricos não homólogos sofrem uma quebra próximo ao centrômero, depois do que os braços longos se fundem para formar um grande cromossomo metacêntrico. E. Isocromossomos surgem da divisão defeituosa do centrômero, que leva à duplicação  do  braço  longo  e  deleção  do  braço  curto,  ou  o  inverso.  F.  Um  cromossomo  em  anel  se  forma  com quebras  das  duas  porções  teloméricas  de  um  cromossomo,  deleção  dos  fragmentos  acêntricos  e  fusão  da  porção cêntrica  remanescente.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.)  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 223). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Doenças numéricas envolvendo autossomos Ter  um  número  anormal  de  cromossomos  é  denominado  aneuploidia.  Entre  as  causas  da  aneuploidia  encontra­se uma  falha  dos  cromossomos,  que  não  se  separam  durante  a  oogênese  ou  espermatogênese.  Isso  pode  dar­se  em qualquer  um  dos  autossomos  ou  dos  cromossomos  sexuais  e  é  chamado  de  não  disjunção  (Figura  7.8).  A  não disjunção  dá  origem  a  células  germinativas  com  um  número  par  de  cromossomos  (22  ou  24).  Os  produtos  da concepção formados a partir desse número par de cromossomos têm um número ímpar de cromossomos, 45 ou 47. Monossomia  se  refere  à  existência  de  apenas  um  membro  de  um  par  de  cromossomos.  Os  defeitos  associados  à monossomia de autossomos são graves e geralmente causam aborto. A monossomia do cromossomo X (45, X), ou síndrome de Turner, causa defeitos menos graves. Polissomia,  ou  a  existência  de  mais  do  que  dois  cromossomos  de  um  conjunto,  sucede  quando  uma  célula germinativa contendo mais de 23 cromossomos é envolvida na concepção. Casos de trissomia do 18 (síndrome de Edwards) e trissomia do  13  (síndrome  de  Patau)  compartilham  várias  características  cariotípicas  e  clínicas  com  a trissomia  do  21  (síndrome  de  Down).  Em  contraste  com  a  síndrome  de  Down,  no  entanto,  as  malformações  são muito  mais  graves  e  de  grande  abrangência.  O  resultado  é  que  esses  recém­nascidos  raramente  sobrevivem  além dos primeiros anos de vida.5

Figura  7.8  •  Não  disjunção  como  causa  de  doenças  no  número  de  cromossomos.  A.  Distribuição  normal  de cromossomos durante a meiose I e II. B. Se ocorre uma não disjunção na meiose I, os gametas contêm um par de cromossomos ou a falta de cromossomos. C. Se acontece não disjunção na meiose II, os gametas afetados contêm duas cópias de um cromossomo parental ou a falta de cromossomo.

Síndrome de Down. Descrita pela primeira vez em 1866 por John Langdon Down, a trissomia do 21 ou síndrome de  Down  causa  uma  combinação  de  defeitos  congênitos,  incluindo  um  certo  grau  de  deficiência  mental, características faciais específicas e outros problemas de saúde. É a doença cromossômica mais comum. Aproximadamente  95%  dos  casos  de  síndrome  de  Down  são  causados  por  não  disjunção  ou  por  um  erro  na divisão celular durante a meiose, resultando em uma trissomia do cromossomo 21. Uma forma rara de síndrome de

Down pode se desenvolver em filhos de pessoas nas quais houve uma translocação robertsoniana (ver Figura 7.7) envolvendo o braço longo do cromossomo 21q e o braço longo de um dos cromossomos acrocêntricos (na maioria das vezes o cromossomo 14 ou 22). A translocação adiciona tamanho ao braço normalmente longo do cromossomo 21. Portanto, um indivíduo com esse tipo de síndrome de Down tem 46 cromossomos, mas, essencialmente, uma trissomia do 21q.4–6 O  risco  de  gestar  uma  criança  com  síndrome  de  Down  aumenta  com  a  idade  materna.4,20  A  razão  para  essa correlação entre idade materna e não disjunção é desconhecida, mas acredita­se ser o reflexo de algum aspecto do envelhecimento  do  ovócito.  Embora  os  homens  continuem  a  produzir  espermatozoides  durante  toda  a  sua  vida reprodutiva,  as  mulheres  nascem  com  todos  os  ovócitos  que  terão.  Esses  ovócitos  podem  sofrer  alterações  como resultado do processo de envelhecimento. Com o aumento da idade, existe uma chance maior de que a mulher tenha sido  exposta  a  agentes  ambientais  nocivos,  como  fármacos,  drogas  ilícitas,  produtos  químicos  e  radiação.  Ao contrário  da  trissomia  do  21,  a  síndrome  de  Down  resultante  de  uma  translocação  cromossômica  (21;  14)  não apresenta relação com a idade materna, mas tem risco relativamente alto de recorrência em famílias quando um dos pais, especialmente a mãe, é portador. Uma  criança  com  síndrome  de  Down  tem  características  físicas  específicas  classicamente  evidentes  ao nascimento.4,20  Essas  características  incluem  cabeça  pequena  e  quadrada.  O  perfil  facial  é  achatado,  com  nariz pequeno  e  depressão  da  ponte  nasal;  pequenas  dobras  nos  cantos  internos  dos  olhos  (pregas  epicânticas)  e  olhos oblíquos voltados para cima; orelhas pequenas e malformadas, com implantação baixa; coxim gorduroso na parte de trás do pescoço; e a boca aberta com língua grande e protuberante (Figura 7.9). As mãos da criança geralmente são curtas e grossas, com dedos que se curvam para dentro, e geralmente existe apenas um único vinco palmar (prega simiesca).  Existe  uma  grande  distância  entre  o  hálux  e  o  segundo  dedo  do  pé.  Hipotonia  e  frouxidão  articular também ocorrem em lactentes e crianças jovens. Muitas vezes acompanham cardiopatias congênitas e um aumento no risco de malformações gastrintestinais. Aproximadamente 1% das pessoas com síndrome de Down por trissomia do 21 têm mosaicismo (populações celulares com número normal de cromossomos e com trissomia do 21). Essas pessoas  podem  ser  menos  gravemente  afetadas.  Existe  uma  alta  correlação  com  o  desenvolvimento  de  leucemia aguda, tanto mieloide quanto linfoblástica entre crianças com síndrome de Down.21 Além disso, há um aumento do risco de doença de Alzheimer entre pessoas mais velhas com síndrome de Down, e muitas dessas crianças têm uma chance maior de adquirir doenças cardiovasculares.

Figura 7.9 • Características clínicas de uma criança com síndrome de Down.

Existem vários exames de triagem pré­natal que podem ser realizados para determinar o risco de ter uma criança com  síndrome  de  Down.18  Os  mais  usados  são  exames  de  sangue  que  medem  os  níveis  séricos  maternos  de  α­ fetoproteína (AFP), gonadotrofina coriônica humana (hCG), estriol não conjugado, inibina A e proteína plasmática A associada à gravidez (PAPP­A) (ver seção Diagnóstico e aconselhamento). Os resultados de três ou quatro desses exames,  juntamente  com  a  idade  materna,  são  frequentemente  utilizados  para  verificar  a  probabilidade  de  uma gestante  ter  um  filho  com  síndrome  de  Down.  Translucência  nucal  (espaço  sonolucente  na  parte  posterior  do pescoço do feto) é outro exame possível de ser feito para avaliar esse aspecto do feto por ultrassonografia e também de  ser  realizado  entre  a  10a  e  a  13a  semanas  de  gestação.18  O  feto  com  síndrome  de  Down  tende  a  ter  uma  área

maior  de  translucência  em  comparação  com  uma  criança  cromossomicamente  normal.  Esse  exame  normalmente  é utilizado em combinação com outros de triagem. A única maneira de ter precisão da síndrome de Down no feto é pela  análise  cromossômica  com  o  uso  de  amostra  de  vilosidade  coriônica,  amniocentese  ou  biopsia  percutânea  de sangue do cordão umbilical, que será discutido mais adiante neste capítulo.

Você se lembra de Jennifer, a recém-nascida com síndrome de Down apresentada na abertura da Parte 2? Sua doença poderia ter

sido diagnosticada no pré-natal. Sua mãe tinha 46 anos, considerada uma idade materna avançada e associada a maior risco de

aneuploidia, como trissomia do 21. Foi oferecido à mãe um exame de triagem para o primeiro trimestre em sua primeira

ultrassonogra䏳馜a na 12a semana de gestação e ela aceitou. Foi observado um aumento da translucência nucal, e o risco para

trissomia do 21 calculado a partir do exame de primeiro trimestre indicou um risco de 1:20 de trissomia do 21. Ela recusou exames invasivos, como

c

a amniocentese, e declarou que resultados positivos de outros ensaios não mudariam sua decisão de manter a gestação.

Na ultrassonogra䏳馜a para

avaliar a anatomia e nas ultrassonogra䏳馜as de acompanhamento, foi observada no feto a inexistência de um osso nasal, intestino ecogênico, ossos

longos curtos e foco ecogênico no coração, que são marcadores para uma possível síndrome de Down. Mulheres que apresentam anormalidades no

exame do primeiro trimestre, no exame do segundo trimestre, achados anormais de ultrassonogra䏳馜a, histórico pessoal ou familiar de doenças

genéticas ou casos de idade materna avançada devem ser encaminhadas ao aconselhamento genético durante a gestação para uma discussão mais

aprofundada e gestão adequada da situação.

Doenças numéricas envolvendo cromossomos sexuais Doenças cromossômicas associadas aos cromossomos sexuais são muito mais comuns do que as relacionadas com os  autossomos,  com  exceção  da  trissomia  do  21. Além  disso,  os  desequilíbrios  (excesso  ou  deleção)  são  muito melhor  tolerados  do  que  aqueles  que  envolvem  os  autossomos.  Isso  está  relacionado,  em  grande  parte,  com  dois fatores peculiares aos cromossomos sexuais: 1. Inativação de todos, menos um cromossomo X 2. Pequena quantidade de material genético transportada pelo cromossomo Y. Embora meninas normalmente recebam tanto um cromossomo X do pai quanto da mãe, as manifestações clínicas de  anormalidades  no  cromossomo  X  podem  variar  bastante  devido  ao  processo  de  inativação  do  X  (discutido  no Capítulo  6).  Nas  células  somáticas  de  indivíduos  do  sexo  feminino,  apenas  um  cromossomo  X  é transcricionalmente ativo. O outro cromossomo está inativo. O processo de inativação do X, que é aleatório, ocorre no  início  da  vida  embrionária  e  geralmente  está  completo  quase  no  final  da  primeira  semana  de  desenvolvimento. Depois  que  um  cromossomo  X  foi  inativado  em  uma  célula,  todas  as  células  descendentes  dela  têm  o  mesmo cromossomo  X  inativado.  Embora  grande  parte  de  um  cromossomo  X  seja  inativada  nas  mulheres,  várias  regiões contêm genes que escapam do processo de inativação e continuam a ser expressos por ambos os cromossomos X. Esses  genes  podem  explicar  algumas  das  variações  nos  sintomas  clínicos  observados  em  casos  de  anormalidades numéricas do cromossomo X, como a síndrome de Turner. É  bem  conhecido  o  fato  de  que  o  cromossomo  Y  determina  o  sexo  masculino.  O  gene  que  define  o desenvolvimento  testicular  (Sry:  região  do  gene  Y  determinante  do  sexo)  foi  localizado  no  braço  curto  distal. 5 Estudos  recentes  sobre  o  cromossomo Y  produziram  informações  adicionais  sobre  famílias  de  genes  na  chamada “região específica masculina” ou região MSY (male­specific Y). Acredita­se que todos esses estejam envolvidos na espermatogênese. Alguns genes adicionais com homólogos no cromossomo X foram mapeados para o cromossomo Y, mas, até agora, não foram descritas doenças resultantes de mutações nesses genes. Síndrome de Turner. A  síndrome  de  Turner  descreve  a  ausência  de  todos  (45,X/0)  ou  de  parte  do  cromossomo X.22  Algumas  mulheres  com  síndrome  de  Turner  podem  ter  parte  do  cromossomo  X,  e  outras  podem  exibir mosaicismo com uma ou mais linhas celulares adicionais. Essa doença afeta em torno de 1 em cada 2.500 nascidos vivos e é a doença genética que acomete mais frequentemente as mulheres.22 Caracteristicamente,  a  menina  com  síndrome  de  Turner  tem  baixa  estatura,  mas  as  proporções  do  corpo  são normais (Figura 7.10). Mulheres com síndrome de Turner perdem a maioria de seus ovócitos com 2 anos de idade. Portanto,  elas  não  menstruam  e  não  mostram  sinais  de  características  sexuais  secundárias.  Existem  variações  na manifestação da síndrome, com alterações desde essencialmente nenhuma até anormalidades cardíacas, como valva

aórtica  bicúspide  e  coarctação  da  aorta,  problemas  de  audição  e  visão,  mandíbula  de  tamanho  reduzido,  rim  em ferradura e um pequeno pescoço alado.4 Foi verificado que mulheres com síndrome de Turner desenvolvem doenças autoimunes associadas à predominância masculina, como diabetes melito tipo 1 e tireoidite de Hashimoto.23 Embora  a  maioria  das  mulheres  com  síndrome  de  Turner  tenha  inteligência  normal,  elas  podem  ter  problemas com  a  organização  visuoespacial  (p.  ex.,  dificuldade  para  dirigir,  tarefas  que  envolvem  a  resolução  de  problemas não verbais, como exercícios matemáticos, e dificuldades com habilidades psicomotoras) e transtornos de déficit de atenção.24 Frequentemente, o diagnóstico da síndrome de Turner é atrasado até o final da infância ou início da adolescência em  meninas  que  não  apresentam  as  características  clássicas  da  síndrome. Apenas  cerca  de  20  a  33%  das  meninas afetadas recebem o diagnóstico ainda recém­nascidas, pela observação de mãos e pés inchados ou a pele redundante na  nuca.  Outras  33%  são  diagnosticados  no  meio  da  infância,  devido  à  baixa  estatura.  O  restante  das  meninas  é diagnosticado  principalmente  na  adolescência,  quando  não  entram  na  puberdade.24  É  importante  diagnosticar meninas com síndrome de Turner o mais cedo possível, para que o plano de tratamento possa ser implementado e monitorado ao longo de sua vida.

Figura 7.10 • Características clínicas da síndrome de Turner.

O controle da síndrome de Turner deve começar na infância e requer avaliação e tratamento contínuo. O uso de terapia com hormônio de crescimento geralmente pode resultar em um ganho de 6 a 10 cm na altura final. A terapia com  estrogênio,  que  deve  ser  instituída  aproximadamente  na  idade  normal  da  puberdade,  é  empregada  para promover o desenvolvimento e a manutenção de características sexuais secundárias.24 Síndrome  de  Klinefelter.  A  síndrome  de  Klinefelter  é  uma  condição  de  disgenesia  testicular  acompanhada  pela existência  de  um  ou  mais  cromossomos  X  extras,  além  do  complemento  normal  XY  do  sexo  masculino. 4,25  A maioria  dos  homens  com  síndrome  de  Klinefelter  tem  um  cromossomo  X  adicional  (47,  XXY).  Em  casos  raros, pode  haver  mais  do  que  um  cromossomo  X  adicional  (48,  XXXY).  O  cromossomo  X  extra  no  indivíduo  do  sexo

masculino  47,XXY,  resulta  da  não  disjunção  durante  a  divisão  meiótica  em  um  dos  pais.  O  cromossomo  X adicional  geralmente  é  de  origem  materna,  mas,  em  torno  de  1/3  das  vezes,  é  de  origem  paterna. A  causa  da  não disjunção  é  desconhecida.  Idade  materna  avançada  aumenta  o  risco,  mas  apenas  um  pouco.  A  síndrome  de Klinefelter ocorre em quase 1 em cada 1.000 nascidos vivos do sexo masculino. Embora  a  existência  do  cromossomo  extra  seja  bastante  comum,  a  síndrome  que  acompanha  com  sinais  e sintomas possivelmente derivados do cromossomo extra é incomum. Muitos homens vivem sem saber que têm um cromossomo  adicional.  Por  essa  razão,  tem  sido  sugerido  o  termo  síndrome  de  Klinefelter  a  ser  substituído  por homem 47,XXY.26 A  síndrome  de  Klinefelter  se  caracteriza  por  aumento  das  mamas,  pelos  faciais  e  corporais  esparsos,  testículos pequenos  e  incapacidade  de  produzir  espermatozoides  (Figura  7.11).25,27  Independentemente  do  número  de cromossomos X, o fenótipo masculino é mantido. Frequentemente, a condição passa despercebida ao nascimento. O recém­nascido geralmente tem genitália masculina normal, com um pênis pequeno e testículos pequenos e firmes. Na  puberdade,  os  testículos  intrinsecamente  anormais  não  respondem  à  estimulação  das  gonadotrofinas  e  sofrem degeneração.  Isso  conduz  à  alta  estatura,  com  proporções  do  corpo  anormais  em  que  a  parte  inferior  do  corpo  é mais comprida que a parte superior. Mais tarde na vida, a compleição física pode se tornar pesada, com distribuição feminina da gordura subcutânea e graus variáveis de aumento das mamas. Pode haver deficiência nas características sexuais  secundárias  masculinas,  como  o  tom  de  voz  que  continua  a  ser  feminino  e  pouca  barba  e  pelos  pubianos. Embora  o  intelecto  geralmente  seja  normal,  a  maioria  dos  indivíduos  47,XXY,  apresenta  certo  grau  de comprometimento da linguagem.

Figura 7.11 • Características clínicas da síndrome de Klinefelter.

O  controle  adequado  da  síndrome  de  Klinefelter  requer  uma  avaliação  abrangente  do  desenvolvimento neurológico.  Na  primeira  infância,  isso  muitas  vezes  inclui  uma  abordagem  multidisciplinar  para  definir  o tratamento  adequado,  como  fisioterapia,  programas  de  estimulação  infantil  e  terapia  da  fala.25  Homens  com síndrome de Klinefelter têm hipogonadismo congênito, que resulta na incapacidade de produzir quantidades normais de testosterona, acompanhada por um aumento nos hormônios gonadotróficos do hipotálamo. A terapia hormonal é, em  geral,  iniciada  quando  existem  evidências  de  um  déficit  de  testosterona. A  infertilidade  é  comum  em  homens com  síndrome  de  Klinefelter,  devido  à  baixa  contagem  de  esperma.  Se  existirem  espermatozoides,  pode  ser  útil  a criopreservação  para  o  planejamento  familiar  futuro.  No  entanto,  recomenda­se  o  aconselhamento  genético  devido ao  aumento  do  risco  de  anomalias  cromossômicas  autossômicas  e  sexuais.  Homens  com  síndrome  de  Klinefelter também têm risco maior para osteoporose e precisam ser orientados sobre modos de prevenção.28

Doenças do gene mitocondrial As  mitocôndrias  contêm  seu  próprio  DNA,  que  é  distinto  do  DNA  contido  no  núcleo  da  célula.  Existem  várias doenças  afetadas  por  rearranjos  e  mutações  pontuais.  O  DNA  mitocondrial  (mtDNA)  é  armazenado  em  um cromossomo  circular  de  fita  dupla  localizado  dentro  da  mitocôndria.29  O  DNA  mitocondrial  contém  37  genes:  2 genes  de  RNA  ribossômico  (rRNA),  22  genes  de  RNA  transportador  (tRNA)  e  13  genes  que  codificam  as subunidades estruturais das enzimas da cadeia respiratória mitocondrial, que participam na fosforilação oxidativa e geração de adenosina trifosfato.4 Em contraste com o padrão de herança mendeliana do DNA nuclear, doenças de mtDNA são herdadas pela linha materna.  Isso  se  explica  pelo  fato  de  que  o  óvulo  contém  numerosas  mitocôndrias  no  seu  citoplasma  abundante, enquanto os espermatozoides contêm poucas, se houver. Assim, o mtDNA no zigoto é derivado apenas da mãe. O zigoto e as células­filhas têm muitas mitocôndrias, cada uma contendo várias cópias do mtDNA de origem materna. Durante  o  crescimento  do  feto  ou  posteriormente,  é  possível  que  algumas  células  sejam  compostas  apenas  de mtDNA normal ou mutante (uma situação chamada  homoplasmia), enquanto outras recebam uma mistura de DNA normal  e  mutante  (heteroplasmia).  Por  sua  vez,  a  expressão  clínica  de  uma  doença  produzida  por  determinada mutação de mtDNA depende do conteúdo total de genes mitocondriais e da porcentagem que é mutante. A fração de mtDNA mutante deve exceder um valor crítico para que uma doença mitocondrial se torne sintomática. Esse limiar varia em diferentes órgãos e presumivelmente está relacionado com as necessidades de energia das células. Mutações no DNA mitocondrial geralmente afetam tecidos que dependem de fosforilação oxidativa para atender a alta demanda de energia metabólica. Assim, mutações do mtDNA com frequência afetam o sistema neuromuscular e produzem doenças, como encefalopatias, miopatias, degeneração da retina, perda da função do músculo extraocular e  surdez.29,30  Entretanto,  existe  uma  gama  de  doenças  mitocondriais  que  pode  incluir  disfunção  hepática, insuficiência  de  medula  óssea  e  disfunção  de  células  das  ilhotas  pancreáticas  e  diabetes,  entre  outras  doenças. A Tabela 7.2 descreve exemplos representativos de doenças devido a mutações no DNAmt. Tabela 7.2

Algumas doenças associadas a mutações no DNA mitocondrial.

Doença

Manifestação

Oftalmoplegia externa progressiva crônica

Fraqueza progressiva dos músculos extraoculares

Surdez

Surdez neurossensorial progressiva, muitas vezes associada a antibióticos aminoglicosídios

Síndrome de Kearns-Sayre

Fraqueza progressiva dos músculos extraoculares de manifestação precoce com bloqueio

cardíaco, pigmentação da retina

Neuropatia óptica hereditária de Leber

Perda visual bilateral, indolor, subaguda, com manchas de cegueira central (escotomas) e

visão anormal das cores

Doença de Leigh

Fraqueza muscular proximal, neuropatia sensorial, atraso no desenvolvimento, ataxia,

convulsões, demência e de䏳馜ciência visual devido à degeneração pigmentar da retina

MELAS (mitochondrial encephalomyopathy,

and strokelike syndrome)

ℓactic

acidosis

Encefalomiopatia mitocondrial (alterações na estrutura cerebral), acidose láctica e síndrome

tipo AVC, convulsões e outras anormalidades clínicas e laboratoriais; pode se manifestar

apenas como diabetes melito

MERRF (myoclonic epilepsy with ragged red fibers)

Epilepsia mioclônica com 䏳馜bras rotas vermelhas no músculo, ataxia, surdez neurossensorial

Epilepsia mioclônica com 䏳馜bras rotas vermelhas

Convulsões mioclônicas, ataxia cerebelar, miopatia mitocondrial (fraqueza muscular, fadiga)

Resumo

Doenças  genéticas  podem  afetar  um  único  gene  (herança  mendeliana)  ou  vários  genes  (herança  poligênica). Doenças  de  único  gene  podem  ocorrer  em  um  autossomo  ou  no  cromossomo  X  e  ser  expressas  como  traço dominante ou recessivo. Em doenças autossômicas dominantes, um único alelo mutante de um dos pais afetado é transmitido para um filho, independentemente do sexo. O pai afetado tem 50% de chance de transmitir a doença a cada descendente. Doenças autossômicas recessivas se manifestam apenas quando são afetados os dois membros do par de genes. Geralmente, os pais não são afetados, mas são portadores do gene defeituoso. Suas chances de ter uma criança afetada são de uma em quatro; de ter um filho portador, de duas em quatro; e de ter um filho não portador e não afetado, de uma em quatro. Doenças ligadas ao sexo, que estão associadas ao cromossomo X, são aquelas em que a mãe não afetada transporta um alelo normal e um alelo mutante no cromossomo X. Ela tem 50% de chances de transmitir o gene defeituoso para seus filhos homens, que são afetados, e suas filhas têm 50% de chances de serem portadoras do gene mutante. Devido a um gene normal no par, mulheres heterozigotas raramente sofrem  os  efeitos  do  gene  defeituoso.  A  síndrome  do  X  frágil  é  uma  forma  hereditária  de  retardo  mental  que resulta  da  repetição  de  uma  sequência  de  três  nucleotídios  em  um  único  gene  no  cromossomo  X.  Doenças  de herança multifatorial são causadas por diversos genes, em muitos casos, fatores ambientais. Doenças  cromossômicas  resultam  de  uma  alteração  no  número  ou  na  estrutura  dos  cromossomos.  Uma alteração no número de cromossomos é chamada de aneuploidia. Monossomia envolve a existência de apenas um membro de um par de cromossomos, como pode observado na síndrome de Turner, em que ocorre monossomia do  cromossomo  X.  Polissomia  se  refere  à  existência  de  mais  do  que  dois  cromossomos  em  um  conjunto.  A síndrome de Klinefelter envolve polissomia do cromossomo X. Trissomia do 21 (síndrome de Down) é a forma mais comum de doença cromossômica. Alterações na estrutura dos cromossomos envolvem a supressão ou adição de material genético, que pode implicar uma translocação de material genético de um par de cromossomos para o outro. As mitocôndrias contêm seu DNA próprio, que é distinto do DNA nuclear. Este DNA, que é herdado pela linha materna, está sujeito a mutações em uma taxa maior do que o DNA nuclear, e não tem mecanismos de reparação. Doenças  de  genes  mitocondriais  interferem  no  processo  de  fosforilação  oxidativa  e  produção  de  energia  celular. Existe uma gama de doenças de genes mitocondriais, com predominância de doenças neuromusculares.

Doenças causadas por in䤀刀uências ambientais

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Citar o período mais suscetível na vida intrauterina para o desenvolvimento de defeitos resultantes de agentes ambientais

Descrever os cuidados que devem ser observados quando se considera o uso de substâncias durante a gestação, incluindo os possíveis efeitos do

uso abusivo de etanol, derivados de vitamina A e de䏳馜ciência de ácido fólico no desenvolvimento fetal

O  embrião  em  desenvolvimento  está  sujeito  a  muitas  influências  não  genéticas.  Após  a  concepção,  o desenvolvimento é influenciado por fatores ambientais que o embrião compartilha com a mãe. O estado fisiológico da  mãe  –  equilíbrio  hormonal,  estado  geral  de  saúde,  estado  nutricional  e  uso  de  substâncias  –  indubitavelmente influencia o desenvolvimento do feto. Por exemplo, o diabetes melito materno está associado ao aumento do risco de anomalias congênitas na criança. O tabagismo materno está associado ao baixo peso neonatal. O uso materno de etanol,  em  um  contexto  de  alcoolismo  crônico,  é  conhecido  por  causar  anomalias  fetais.  Alguns  agentes  podem provocar  aborto  precoce.  Sarampo  e  outros  agentes  infecciosos  causam  malformações  congênitas.  Outros  agentes, como a radiação, podem causar defeitos cromossômicos e genéticos e produzir distúrbios de desenvolvimento.

Período de vulnerabilidade O desenvolvimento do embrião pode sofrer perturbações mais facilmente durante o período em que estão ocorrendo a diferenciação e o desenvolvimento dos órgãos. Este intervalo de tempo, que é muitas vezes chamado de período de organogênese, se estende do 15o ao 60o dia após a concepção. Influências ambientais durante as duas primeiras semanas  após  a  fertilização  podem  interferir  com  a  implantação  e  resultar  em  aborto  ou  reabsorção  precoce  dos produtos  da  concepção.  Cada  órgão  tem  um  período  crítico  durante  o  qual  é  altamente  suscetível  a  perturbações ambientais4  (Figura  7.12).  Muitas  vezes,  o  efeito  é  expresso  em  nível  bioquímico,  pouco  antes  do  início  do desenvolvimento  dos  órgãos.  O  mesmo  agente  pode  afetar  diferentes  sistemas  orgânicos  em  desenvolvimento simultâneo.

Agentes teratogênicos Um agente teratogênico é um agente químico, físico ou biológico que produz alterações durante o desenvolvimento embrionário  ou  fetal.  Uma  doença  ou  alteração  no  estado  metabólico  da  mãe  também  é  capaz  de  afetar  o desenvolvimento do embrião ou feto. Teoricamente, agentes teratogênicos podem causar os defeitos de nascimento de três maneiras: 1. Por exposição direta da gestante e do embrião ou feto ao agente 2. Por  exposição  da  mulher  que  está  prestes  a  engravidar  a  um  agente  que  tenha  uma  taxa  de  depuração  lenta (clearance), de tal maneira que uma dose teratogênica é retida durante o início da gestação 3. Como  resultado  de  efeitos  mutagênicos  causados  por  um  agente  ambiental  que  ocorreu  antes  da  gestação, provocando danos permanentes às células reprodutivas da mulher (ou homem). Para  facilitar  a  abordagem,  os  agentes  teratogênicos  foram  divididos  em  três  grupos:  radiação;  drogas  ilícitas  e substâncias  químicas;  e  agentes  infecciosos.  O  Quadro  7.1  lista  agentes  comumente  identificados  em  cada  um desses grupos.

Figura  7.12  •  Sensibilidade  de  órgãos  específicos  para  agentes  teratogênicos  em  períodos  críticos  da embriogênese. A exposição a influências adversas na pré­implantação e fases iniciais de desenvolvimento (extrema esquerda)  conduz  à  morte  pré­natal.  Os  períodos  de  sensibilidade  máxima  para  agentes  teratogênicos  (barras horizontais)  variam  para  os  diferentes  sistemas  orgânicos,  mas,  em  geral,  ficam  limitados  às  primeiras  8  semanas de gestação. (Extraída de Rubin R., Strayer D. S. (Eds.) (2012). Rubin’s pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 216). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Quadro 7.1

Agentes teratogênicos*

Radiação Drogas ilícitas e substâncias químicas

Álcool

Anticoagulantes



Varfarina

Antibióticos



Quinolonas



Tetraciclina

Anticonvulsivantes

Anti-hipertensivos



Inibidores da ECA, bloqueadores dos receptores da angiotensina II

Antipsicóticos



Lítio

*Não inclusiva.



Medicamentos contra o câncer Aminopterina



Metotrexato



6-mercaptopurina Isotretinoína Talidomida



Agentes infecciosos Vírus Citomegalovírus



Herpes-vírus simples



Sarampo (rubéola)



Caxumba



Vírus varicela-zóster (catapora) Fatores não virais



Sí䏳馜lis



Toxoplasmose

Radiação Altas  doses  de  radiação  ionizante  têm  efeito  teratogênico  e  mutagênico  e  a  capacidade  de  efetuar  alterações hereditárias no material genético. Especificamente, tem sido demonstrado que níveis excessivos de radiação causam microcefalia, malformações ósseas e retardo mental. Não existem evidências de que níveis diagnósticos de radiação (p.  ex.,  provenientes  de  uma  radiografia  de  tórax)  provoquem  anomalias  congênitas.  Além  disso,  sempre  que possível, são tomadas todas as medidas para proteger o feto. Em situações em que um exame é necessário para a saúde  da  mulher,  os  benefícios  provenientes  da  realização  de  um  diagnóstico  por  imagem  adequado  superam  os potenciais riscos teóricos para o feto. Foi demonstrado que a administração de doses terapêuticas de iodo radioativo (131I), durante a 13a semana de gestação, momento em que a tireoide do feto começa a concentrar iodo, interfere no desenvolvimento da tireoide.

Produtos químicos e fármacos Produtos  químicos  ambientais  e  medicamentos  podem  atravessar  a  placenta  e  causar  danos  ao  desenvolvimento embrionário e fetal. Estima­se que apenas 2 a 3% dos defeitos de desenvolvimento têm comprovadamente origem em um fármaco ou origem ambiental. Alguns dos agentes teratogênicos ambientais mais bem documentados são os mercuriais orgânicos, que causam déficits neurológicos e cegueira. Certas fontes de água e alguns peixes podem ser

contaminados por mercúrio. Os mecanismos precisos pelos quais produtos químicos e medicamentos exercem seus efeitos  teratogênicos  são  em  grande  parte  desconhecidos.  Eles  são  capazes  de  produzir  efeitos  citotóxicos  (que matam as células), antimetabólicos ou efeitos inibidores do crescimento do feto ou embrião em desenvolvimento. Os  medicamentos  estão  no  topo  da  lista  de  teratógenos  químicos,  provavelmente  porque  são  utilizados  com regularidade em doses elevadas. Muitas substâncias conseguem atravessar a placenta e expor o feto tanto a efeitos farmacológicos quanto a efeitos teratogênicos. Os fatores que afetam a transferência placentária de uma determinada substância e seu efeito sobre o feto incluem a taxa com a qual o fármaco cruza a placenta, a duração da exposição e a  fase  de  desenvolvimento  da  placenta  e  do  feto  no  momento  da  exposição.26  Fármacos  lipossolúveis  tendem  a atravessar  a  placenta  mais  rapidamente  e  entrar  na  circulação  fetal.  O  peso  molecular  de  uma  substância  também influencia a taxa e a quantidade de fármaco que é transferida através da placenta. Substâncias com peso molecular menor que 500 podem atravessar a placenta facilmente, dependendo da solubilidade lipídica e do grau de ionização; aquelas  com  peso  molecular  entre  500  e  1.000  atravessam  a  placenta  com  maior  dificuldade;  e  aquelas  com  peso molecular superior a 1.000 atravessam muito pouco.26 Vários medicamentos têm sido considerados teratogênicos. No entanto, talvez o mais conhecido desses fármacos seja  a  talidomida,  que  foi  demonstrado  dar  origem  a  uma  série  de  malformações,  incluindo  focomelia  (i.  e., encurtamento  dos  membros,  que  ficam  com  aparência  semelhante  aos  de  uma  foca)  dos  quatro  membros.  Outras substâncias  conhecidas  por  causar  anomalias  fetais  são  os  antimetabólitos  utilizados  no  tratamento  do  câncer,  o anticoagulante  varfarina,  diversos  medicamentos  anticonvulsivantes,  o  álcool  etílico  e  a  cocaína.  Algumas substâncias  afetam  uma  única  estrutura  em  desenvolvimento;  por  exemplo,  a  propiltiouracila  pode  prejudicar  o desenvolvimento da tireoide e a tetraciclina pode interferir na fase de mineralização no desenvolvimento dos dentes. Mais  recentemente,  a  vitamina  A  e  seus  derivados  (os  retinoides)  têm  sido  alvo  de  preocupação  devido  ao  seu potencial  teratogênico.  A  preocupação  com  os  efeitos  teratogênicos  de  derivados  da  vitamina  A  surgiu  com  a introdução da substância antiacne isotretinoína. Em  1983,  a  Food  and  Drug Administration  estabeleceu  um  sistema  de  classificação  de  substâncias,  de  acordo com  a  probabilidade  de  risco  para  o  feto.  Segundo  esse  sistema,  as  substâncias  são  classificadas  em  cinco categorias:  A,  B,  C,  D  e  X.  Substâncias  que  pertencem  à  categoria  A  são  as  menos  perigosas,  aumentando  a probabilidade de risco gradativamente nas categorias B, C e D. As substâncias da categoria X são contraindicadas durante a gravidez devido a sua comprovada teratogenicidade.26 A lei não exige a classificação de substâncias que estavam em uso antes de 1983. Como  muitas  substâncias  são  suspeitas  de  causar  anormalidades  fetais,  e  mesmo  aquelas  que  anteriormente  se acreditava  serem  de  uso  seguro  atualmente  têm  sido  consideradas  de  maneira  mais  crítica,  recomenda­se  que mulheres  em  idade  fértil  evitem  o  uso  desnecessário  de  medicamentos.  Isso  vale  tanto  para  não  gestantes  quanto para gestantes, pois muitos defeitos de desenvolvimento ocorrem no início da gestação. Como aconteceu com o uso da  talidomida,  o  dano  para  o  embrião  pode  ocorrer  antes  que  a  gravidez  seja  suspeita  ou  confirmada.  Uma substância que constantemente é usada de modo abusivo e que pode ter efeitos deletérios sobre o feto é o etanol. Síndrome alcoólica fetal. O termo síndrome alcoólica fetal (SAF) se refere a um grupo de anomalias fetais físicas, comportamentais e cognitivas que ocorrem secundariamente à ingestão de álcool durante a gestação.31,32 Estima­se que aproximadamente de 0,5 a 2,0 casos por 100 nascidos vivos tenham SAF.33 O álcool, que é lipossolúvel e tem um  peso  molecular  entre  600  e  1.000,  atravessa  livremente  a  barreira  placentária. As  concentrações  de  álcool  no feto são pelo menos tão elevadas como na mãe. Ao contrário de outros teratógenos, os efeitos nocivos do álcool não se restringem ao período sensível do início da gravidez, mas se estendem durante toda a gestação. O álcool tem efeitos muito diversos sobre o desenvolvimento fetal, variando de pequenas anormalidades até SAF. Pode  haver  retardo  do  crescimento  pré­natal  ou  pós­natal;  envolvimento  do  SNC,  incluindo  anormalidades neurológicas,  atraso  no  desenvolvimento,  disfunção  comportamental,  deficiência  intelectual  e  malformações cranianas e cerebrais; e um conjunto específico de características faciais que incluem fissuras palpebrais pequenas (olhos  abertos),  borda  vermelha  do  lábio  superior  fina  e  terço  médio  da  face  e  philtrum (i. e.,  sulco  no  meio  do lábio  superior)  achatados  e  alongados34–36  (Figura  7.13).  As  características  faciais  de  SAF  podem  não  ser  tão aparentes no recém­nascido, mas se tornam mais proeminentes à medida que a criança se desenvolve. Conforme a criança vai crescendo e entra na idade adulta, as características faciais se tornam mais sutis, tornando o diagnóstico de  SAF  em  pessoas  mais  velhas  difícil.  Cada  um  desses  defeitos  pode  variar  em  termos  de  gravidade,

provavelmente  refletindo  o  momento  do  consumo  de  etanol  em  relação  ao  período  de  desenvolvimento  fetal,  a quantidade de álcool consumida e as influências hereditárias e ambientais. Os critérios para diagnóstico de SAF requerem a observação documentada de três dos seguintes achados: 1. Três  anomalias  faciais  (philtrum  indistinto,  borda  vermelha  do  lábio  superior  fina  e  fissuras  palpebrais pequenas) 2. Déficits de crescimento (altura ou peso pré­natal ou pós­natal, ou ambos, abaixo do percentil 10) 3. Anormalidades  do  SNC  (p.  ex.,  perímetro  cefálico  abaixo  do  percentil  10,  déficits  cognitivos  ou  intelectuais globais, atraso na função motora, problemas de atenção ou hiperatividade). A  quantidade  de  álcool  possível  de  ser  consumida  com  segurança  durante  a  gestação  é  desconhecida.  Mesmo pequenas  quantidades  de  álcool  consumidas  durante  períodos  críticos  do  desenvolvimento  fetal  podem  ter  ação teratogênica.  Por  exemplo,  se  o  álcool  é  consumido  durante  o  período  de  organogênese,  pode  resultar  em  uma variedade de defeitos esqueléticos e orgânicos. Se o álcool é consumido no final da gestação, fase em que o cérebro está  em  rápido  desenvolvimento,  pode  haver  transtornos  cognitivos  e  comportamentais  na  ausência  de  alterações físicas.  O  consumo  crônico  de  álcool  durante  a  gestação  pode  originar  diversos  efeitos,  que  variam  de anormalidades  físicas  ao  retardo  do  crescimento  e  comprometimento  funcional  do  SNC.  Evidências  sugerem  que concentrações  elevadas  de  álcool  de  curta  duração,  como  as  que  ocorrem  com  o  consumo  excessivo  de  álcool, podem  ser  particularmente  significativas,  com  as  anormalidades  sendo  únicas  para  o  período  de  exposição.33 Devido  ao  possível  efeito  sobre  o  feto,  recomenda­se  que  as  mulheres  se  abstenham  completamente  de  álcool durante a gestação.

Figura 7.13 • Características clínicas da SAF.

Conceitos fundamentais

Agentes teratogênicos



Agentes teratogênicos, como radiação, produtos químicos e medicamentos, e organismos infecciosos são agentes que produzem anomalias no embrião em

desenvolvimento



A

fase

de

desenvolvimento

do

embrião

determina

a

suscetibilidade

aos

teratógenos.

O

período

durante

o

qual

o

embrião o

teratogênicos é o tempo em que ocorrem rápida diferenciação e desenvolvimento de órgãos e tecidos, geralmente do 15

é

mais

suscetível

a

agentes

o

ao 60

dia após a concepção

Agentes infecciosos Muitos microrganismos são capazes de atravessar a placenta e entrar na circulação fetal, muitas vezes produzindo malformações  múltiplas. A  sigla  TORCH  significa  toxoplasmose, outros, rubéola, citomegalovírus  e  herpes,  que são os agentes mais frequentemente implicados como causa de anomalias fetais.4 Outros agentes incluem a infecção pelo  vírus  da  varicela­zóster,  listeriose,  leptospirose,  infecção  pelo  vírus  Epstein­Barr,  tuberculose  e  sífilis.4 Tem sido sugerido que se adicione à lista o vírus da imunodeficiência humana (HIV) e o da parvovirose humana (B19). O  teste  de  triagem  para TORCH  examina  o  plasma  do  lactente  para  verificar  se  há  anticorpos  para  esses  agentes. No entanto, a titulação de anticorpos séricos contra agentes TORCH na mãe e no recém­nascido geralmente não é diagnóstica e a causa exata da doença muitas vezes permanece incerta. Os relatos indicam que as infecções por agentes TORCH acontecem em 1 a 5% dos recém­nascidos e estão entre as principais causas de morbidade e mortalidade neonatais.4 As manifestações clínicas e patológicas mais comuns incluem  atraso  no  crescimento  e  anormalidades  cerebrais  (microcefalia,  hidrocefalia),  olhos,  ouvidos,  fígado, sistema hematopoético (anemia, trombocitopenia), pulmões (pneumonite) e coração (miocardite, doenças cardíacas congênitas).4  Entretanto,  essas  manifestações  variam  entre  os  recém­nascidos  sintomáticos,  e  apenas  alguns apresentam anormalidades multissistêmicas. A  toxoplasmose  é  uma  infecção  causada  pelo  protozoário  Toxoplasma  gondii,  que  pode  ser  prejudicial  para  a gestante e para o feto.37 O gato doméstico pode ser portador do microrganismo, excretando os protozoários em suas fezes. Sugere­se que as gestantes devam evitar o contato com as fezes do gato da família. A introdução da vacina contra a rubéola praticamente eliminou a síndrome da rubéola congênita nos países mais desenvolvidos. Contudo, a rubéola  ainda  é  endêmica  em  muitos  países  em  desenvolvimento,  onde  é  a  principal  causa  evitável  de  deficiência auditiva, cegueira e desenvolvimento neurológico comprometido. A epidemiologia da infecção por citomegalovírus é em grande parte desconhecida. Alguns recém­nascidos são gravemente afetados ao nascimento e outros, embora apresentem  evidências  da  infecção,  não  demonstram  sintomas.  Em  alguns  recém­nascidos  assintomáticos,  o  dano cerebral vai se tornando evidente ao longo dos anos. Existem também evidências de que algumas crianças contraem a  infecção  durante  o  primeiro  ano  de  vida,  e  em  algumas  delas  a  infecção  resulta  em  atraso  1  ano  ou  dois  mais tarde. A infecção pelo herpes­vírus simples do tipo 2 é considerada uma infecção genital e geralmente é transmitida pelo  contato  sexual. A  criança  adquire  essa  infecção  no  útero  ou  na  passagem  pelo  canal  vaginal  no  momento  do parto.

Deficiência de ácido fólico Embora  a  maior  parte  dos  defeitos  congênitos  esteja  relacionada  com  a  exposição  a  um  agente  teratogênico,  a deficiência de nutrientes e vitaminas também pode ser um fator contribuinte. A deficiência de ácido fólico tem sido implicada  no  surgimento  de  defeitos  do  tubo  neural  (DTN)  (p.  ex.,  anencefalia,  espinha  bífida,  encefalocele). Estudos  têm  demonstrado  uma  redução  significativa  nos  defeitos  do  tubo  neural  quando  mulheres  em  idade  fértil recebem  suplementação  de  ácido  fólico  a  longo  prazo.38  Portanto,  recomenda­se  que  todas  as  mulheres  em  idade fértil recebam 400 μg (0,4 mg) de ácido fólico diariamente e só depois tentem engravidar. No caso de mulheres com risco  aumentado  para  DTN,  incluindo  aquelas  que  já  tiveram  uma  gestação  afetada  e  outras  que  tomam anticonvulsivantes específicos, a recomendação é de 4 mg/dia de ácido fólico.39

Resumo

Agente teratogênico é aquele que produz anormalidades durante a vida embrionária ou fetal. O início da gestação (15  a  60  dias  após  a  concepção)  é  o  período  em  que  os  agentes  ambientais  apresentam  maior  capacidade  de produzir  seus  efeitos  deletérios  para  o  embrião  em  desenvolvimento.  Diversos  agentes  ambientais  podem  ser prejudiciais  ao  feto,  incluindo  radiação,  medicamentos  e  produtos  químicos,  e  agentes  infecciosos.  SAF  é  um

risco  para  recém­nascidos  de  mulheres  que  consomem  álcool  regularmente  durante  a  gestação.  Como  muitas substâncias têm potencial para causar anomalias fetais, muitas vezes já na fase inicial da gestação, recomenda­se que  mulheres  em  idade  fértil  evitem  o  uso  desnecessário  de  medicamentos.  A  sigla  TORCH  significa toxoplasmose,  outros,  rubéola,  citomegalovírus  e  herpes,  que  são  os  agentes  infecciosos  mais  frequentemente implicados em anomalias fetais. Também tem sido demonstrado que a deficiência de ácido fólico pode contribuir para o surgimento de DTN.

Diagnóstico e aconselhamento

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Descrever o processo de avaliação genética

Descrever os métodos utilizados para se chegar a um diagnóstico pré-natal, incluindo ultrassonogra䏳馜a, amniocentese, biopsia de vilosidade

coriônica, biopsia percutânea de sangue do cordão umbilical e métodos laboratoriais para determinar a composição bioquímica e genética do

feto

O nascimento de uma criança deficiente é um acontecimento traumático na vida de qualquer casal. Em geral, duas questões  devem  ser  resolvidas. A  primeira  diz  respeito  ao  atendimento  imediato  e  futuro  da  criança  afetada,  e  a segunda,  à  possibilidade  de  que  futuros  filhos  dessa  família  venham  a  apresentar  um  defeito  semelhante.  A avaliação  e  o  aconselhamento  genéticos  podem  ajudar  a  definir  se  o  defeito  foi  herdado  e  qual  é  o  risco  de recorrência.  O  diagnóstico  pré­natal  proporciona  um  meio  de  determinar  se  o  feto  tem  certos  tipos  de anormalidades. É importante que os pais estejam cientes das potenciais complicações relacionadas com a aquisição de informações adicionais a partir desses testes genéticos invasivos.

Avaliação genética Um aconselhamento genético eficaz envolve o diagnóstico preciso e a comunicação dos resultados e dos riscos de recorrência para os pais e outros familiares que precisem dessas informações. O aconselhamento pode ser fornecido após o nascimento de uma criança afetada, ou pode ser oferecido a pessoas com risco de os filhos apresentarem o defeito  (irmãos  de  pessoas  com  defeitos  congênitos).  Uma  equipe  de  aconselhamento  capacitada  pode  ajudar  a família a entender o problema, além de fornecer suporte à decisão de ter mais filhos. A avaliação de risco genético e prognóstico normalmente é dirigida por um geneticista clínico, muitas vezes com a  ajuda  de  especialistas  clínicos  e  de  exames  laboratoriais.  Deve  ser  incluído  um  histórico  familiar  detalhado (linhagem), histórico da gestação e o relato detalhado do parto e do estado de saúde e desenvolvimento pós­natal. É necessário  um  exame  físico  cuidadoso  da  criança  afetada  e  frequentemente  dos  pais  e  irmãos.  A  realização  de exames  laboratoriais,  incluindo  análise  cromossômica  e  estudos  bioquímicos,  por  vezes  precede  o  diagnóstico definitivo.

Rastreamento e diagnóstico pré­natais O objetivo do rastreamento e do diagnóstico pré­natais não é apenas detectar anomalias fetais, mas também aliviar a ansiedade e dar assistência à família para se preparar para a chegada de uma criança com uma deficiência específica. O  rastreamento  pré­natal  não  pode  ser  empregado  para  descartar  todas  as  possíveis  anomalias  fetais.  Deve  ser limitado  a  determinar  se  o  feto  tem  (ou  é  provável  que  tenha)  certas  condições  indicadas  pela  idade  materna, histórico familiar ou fatores de risco bem definidos. Existem vários métodos capazes de ajudar no diagnóstico de um feto em relação a doenças genéticas, incluindo ultrassonografia,  testes  de  triagem  do  soro  materno  (sangue),  amniocentese,  biopsia  de  vilosidade  coriônica  e biopsia percutânea de sangue do cordão umbilical (Figura 7.14). O diagnóstico pré­natal também pode fornecer as informações necessárias para a prescrição de um tratamento pré­natal para o feto. Por exemplo, se o diagnóstico de hiperplasia  adrenal  congênita  é  estabelecido,  a  mãe  pode  ser  tratada  com  hormônios  do  córtex  suprarrenal  para evitar a masculinização do feto feminino.

Ultrassonografia A ultrassonografia é um método diagnóstico não invasivo que utiliza o reflexo de ondas sonoras de alta frequência para visualização de estruturas de tecidos moles. Desde a sua introdução em 1958, este método tem sido utilizado durante  a  gestação  para  determinar  o  número  de  fetos,  tamanho  e  posição  fetal,  o  volume  de  líquido  amniótico  e localização  da  placenta.  Também  é  possível  avaliar  a  movimentação  do  feto,  movimentos  respiratórios  e  padrão cardíaco.  Existem  também  evidências  de  que  a  ultrassonografia  precoce  (i. e.,  antes  de  14  semanas)  pode  indicar com precisão a idade gestacional. Aparelhos  de  alta  resolução  com  imagens  em  tempo  real  têm  aprimorado  a  capacidade  dos  escâneres  de ultrassonografia  para  detectar  anomalias  congênitas.  A  ultrassonografia  possibilita  o  diagnóstico  intrauterino  de defeitos cardíacos, hidrocefalia, espinha bífida, defeitos na face, defeitos cardíacos congênitos, hérnia diafragmática congênita,  doenças  do  sistema  digestório,  anomalias  esqueléticas  e  vários  outros  defeitos.  A  ultrassonografia tridimensional  (3D)  se  tornou  útil  para  avaliar  melhor  o  perfil  facial  e  defeitos  da  parede  abdominal.  Pode  ser realizado  um  ecocardiograma  fetal  para  o  acompanhamento  de  eventuais  anomalias  cardíacas.  Pode  ser  realizada uma  ressonância  magnética  fetal  para  investigar  melhor  anomalias  esqueléticas,  neurológicas  e  outras.  O diagnóstico  intrauterino  de  anomalias  congênitas  possibilita  um  melhor  acompanhamento  e  planejamento  nas especialidades adequadas, parto prematuro para a correção precoce, seleção de cesariana para reduzir uma lesão fetal e, em alguns casos, a terapia intrauterina.

Figura 7.14 • Métodos de triagem pré­natal.

Marcadores do soro materno Os exames com o sangue materno começaram a ser realizados no início da década de 1980 com o teste para medir os  níveis  séricos  de  α­fetoproteína  (AFP).  Desde  então,  uma  série  de  fatores  séricos  têm  sido  pesquisados  como exames de triagem para anomalias fetais. Os exames maternos atuais favorecem o rastreamento de primeiro trimestre para todas as mulheres entre 11 e 13 semanas  de  gestação,  combinando  a  translucência  nucal  observada  na  ultrassonografia  com  os  níveis  de  PAPP­A, níveis de hCG e idade materna para determinar o risco de trissomias do 21, do 13 e do 18. PAPP­A, que é secretada pela  placenta,  demonstrou  desempenhar  um  papel  importante  na  promoção  do  processo  de  diferenciação  e proliferação celular em vários sistemas orgânicos. Em gestações complicadas, a concentração de PAPP­A aumenta com  a  idade  gestacional  até  o  termo.  Níveis  reduzidos  de  PAPP­A  no  primeiro  trimestre  (entre  10  e  13  semanas) demonstraram  estar  associados  à  síndrome  de  Down.  Quando  empregados  juntamente  com  outros  critérios,  como idade  materna,  β­hCG  livre  e  medida  ecográfica  da  translucência  nucal,  os  níveis  séricos  de  PAPP­A  conseguem detectar de 85 a 95% das gestações afetadas, com uma taxa de resultados falso­positivos de aproximadamente 5%. Os níveis de AFP no soro materno podem ser medidos novamente no segundo trimestre para avaliar se há DTN, embora  no  caso  de  gestantes  com  acesso  à  ultrassonografia  de  qualidade,  uma  ultrassonografia  nível  II  para visualização anatômica da coluna vertebral possa excluir mais de 99% dos defeitos da coluna vertebral. No caso de gestantes que se apresentam para a triagem de primeiro trimestre tarde demais, deve ser realizado o teste  quádruplo  para  medir  os  níveis  de AFP,  hCG,  inibina A  e  estriol  não  conjugado  e  rastrear  trissomia  e  DTN entre a 15a e a 22a semana de gestação. O uso da ultrassonografia para verificar a idade fetal pode reduzir o número de testes falsopositivos com esse método de rastreamento. A AFP é uma importante proteína do plasma fetal e tem uma estrutura semelhante à albumina encontrada na vida pós­natal. AFP é produzida inicialmente pelo saco vitelino, sistema digestório e fígado. Os níveis plasmáticos fetais de  AFP  alcançam  o  pico  aproximadamente  entre  a  10 a  e  a  13a  semana  de  gestação  e  diminuem  até  o  terceiro trimestre,  quando  os  níveis  mostram  novo  pico.  Os  níveis  materno  e  amniótico  de AFP  se  mostram  elevados  em gestações  em  que  o  feto  apresenta  DTN  (anencefalia  e  espinha  bífida  aberta)  ou  algumas  outras  malformações, como  defeito  da  parede  abdominal  anterior  em  que  o  tegumento  fetal  não  está  intacto.  Embora  DTN  estejam associados a níveis elevados de AFP, níveis reduzidos da proteína têm sido associados à síndrome de Down. Uma  glicoproteína  complexa,  hCG,  é  produzida  exclusivamente  pela  camada  externa  do  trofoblasto  logo  após  a implantação na parede uterina. Seus níveis aumentam rapidamente nas primeiras 8 semanas de gestação, diminuem progressivamente até a 20a semana e depois permanecem estáveis. O único marcador sérico materno que produz a taxa  mais  alta  de  detecção  de  síndrome  de  Down  é  um  nível  elevado  de  hCG. A  inibina A,  que  é  secretada  pelo corpo lúteo e unidade fetoplacentária, também é um marcador sérico materno para síndrome de Down fetal. O estriol não conjugado é produzido pela placenta a partir de precursores fornecidos pelas glândulas suprarrenais e pelo fígado fetal. Seu nível aumenta de modo constante durante toda a gestação até um nível mais elevado do que é  normalmente  produzido  pelo  fígado.  Os  níveis  de  estriol  não  conjugado  se  apresentam  reduzidos  em  casos  de síndrome de Down e trissomia do 18.

Conceitos fundamentais

Diagnóstico e aconselhamento



Ultrassonogra䏳馜a,

triagem

de

primeiro

trimestre,

teste

quádruplo

de

rastreamento,

amniocentese,

coleta

de

amostra

de

vilosidade

coriônica

e

biopsia

percutânea de sangue do cordão umbilical (BPSCU) são procedimentos importantes que viabilizam o diagnóstico e o tratamento pré-natais

Amniocentese A  amniocentese  é  um  procedimento  diagnóstico  invasivo  que  envolve  a  retirada  de  uma  amostra  de  líquido amniótico  do  útero  grávido,  geralmente  usando  uma  abordagem  transabdominal  (Figura 7.14).  O  procedimento  é útil para mulheres com risco elevado verificado durante o teste quádruplo na triagem de primeiro trimestre, achados anormais na ultrassonografia fetal, ou pais que são portadores ou têm forte histórico familiar de doença hereditária.

A  ultrassonografia  é  empregada  para  obter  informações  adicionais  e  para  orientar  a  punção  com  a  agulha  de amniocentese. É feito um estudo do líquido amniótico e das células do feto. A amniocentese pode ser realizada em ambulatório durante a 15a semana. Para a análise cromossômica, é feita a cultura das células fetais e o resultado fica disponível em 10 a 14 dias. Além do diagnóstico pré­natal, a amniocentese também pode ser realizada durante todo o  período  de  gestação,  conforme  a  necessidade  de  testes.  Em  casos  de  suspeita  de  corioamnionite,  pode  ser  feita uma amniocentese para avaliar a existência de infecção no líquido amniótico. A maturidade pulmonar fetal pode ser avaliada  por  amniocentese,  pela  medida  da  relação  lecitina/esfingomielina  (L/E)  e  pela  existência  de  fosfatidil glicerol para ajudar no planejamento do parto em alguns casos.

Biopsia de vilosidade coriônica A  biopsia  de  vilosidade  coriônica  é  um  procedimento  diagnóstico  invasivo  para  obtenção  do  tecido  utilizado  para estudos  de  cromossomos  fetais,  análise  de  DNA  e  estudos  bioquímicos.  A  amostra  de  vilosidade  coriônica geralmente é coletada após 10 semanas de gestação.58 Não é recomendada a realização do teste antes de 10 semanas devido ao perigo de defeitos de redução de membros no feto. As vilosidades coriônicas são o local em que ocorre a troca de nutrientes entre o sangue materno e o embrião – o saco coriônico envolve o saco amniótico e o feto, e as vilosidades são os vasos sanguíneos primitivos que se desenvolvem na placenta. O procedimento pode ser realizado utilizando  uma  abordagem  transabdominal  ou  transcervical  (ver  Figura  7.14).  O  tecido  fetal  não  precisa  ser cultivado  e  a  análise  dos  cromossomos  do  feto  pode  ser  disponibilizada  em  24  h. A  análise  de  DNA  e  os  testes bioquímicos podem ser concluídos no intervalo de 1 a 2 semanas.40

Biopsia percutânea de sangue do cordão umbilical É  um  procedimento  diagnóstico  invasivo  que  envolve  a  inserção  transcutânea  de  uma  agulha  através  da  parede uterina  e  na  artéria  umbilical. A  biopsia  percutânea  de  sangue  do  cordão  umbilical  (BPSCU)  deve  ser  guiada  por ultrassonografia  e  pode  ser  feita  a  qualquer  momento  depois  da  16a  semana  de  gestação.  É  utilizada  para  o diagnóstico  pré­natal  de  hemoglobinopatias,  doenças  de  coagulação,  doenças  metabólicas  e  citogenéticas  e imunodeficiências.  Infecções  fetais,  como  rubéola  e  toxoplasmose,  podem  ser  detectadas  pela  medição  dos anticorpos  imunoglobulina  M  ou  diretamente  por  hemocultura.  Os  resultados  de  estudos  citogenéticos  geralmente estão  disponíveis  em  um  intervalo  de  48  a  72  h.  Como  esse  procedimento  acarreta  um  risco  maior  de  perda gestacional  em  comparação  com  a  amniocentese,  é  reservado,  em  geral,  para  situações  em  que  é  necessária  uma análise  citogenética  rápida,  ou  em  que  a  informação  diagnóstica  não  pode  ser  obtida  por  outros  métodos.  No processo de realização de BPSCU para avaliação de anemia fetal, pode ser administrada ao feto uma transfusão de sangue, conforme a necessidade.

Análises citogenética e bioquímica Na amniocentese e na biopsia de vilosidade coriônica são coletadas amostras de células possíveis de ser usadas para análises citogenéticas e de DNA. As análises bioquímicas podem ser empregadas para detectar níveis anormais de AFP e alteração de produtos bioquímicos no sangue materno e em amostras de líquido amniótico e do sangue fetal. Os  exames  citogenéticos  são  utilizados  na  cariotipagem  fetal  para  determinar  a  composição  cromossômica  do feto.  São  feitos  para  detectar  anormalidades  no  número  e  na  estrutura  dos  cromossomos. A  cariotipagem  também revela o sexo do feto. Isso pode ser útil quando um defeito hereditário é conhecido por afetar apenas um dos sexos. A  análise  de  DNA  é  feita  em  células  extraídas  do  líquido  amniótico,  vilosidades  coriônicas  ou  sangue  fetal  a partir de uma biopsia percutânea de sangue do cordão umbilical para detectar defeitos genéticos, como erros inatos de  metabolismo.  É  possível  o  problema  ser  detectado  pela  demonstração  direta  do  defeito  molecular  ou  pelos métodos  que  quebram  o  DNA  em  fragmentos  a  ser  estudados,  com  o  propósito  de  determinar  a  existência  de  um gene anormal. A demonstração direta do defeito molecular é realizada por cultura de células do líquido amniótico e por  medição  das  enzimas  que  as  células  cultivadas  produzem.  Muitas  enzimas  são  expressas  nas  vilosidades coriônicas.  Isso  viabiliza  um  diagnóstico  pré­natal  precoce,  porque  as  células  não  precisam  ser  cultivadas  antes. Estudos  de  DNA  são  usados  para  detectar  defeitos  genéticos  que  causam  erros  inatos  do  metabolismo,  como  a doença de Tay­Sachs, doença de armazenamento de glicogênio e hipercolesterolemia familiar. É possível estabelecer um diagnóstico pré­natal para mais de 70 erros inatos do metabolismo.

A última novidade no diagnóstico fetal envolve a procura de DNA do feto no sangue materno. Algumas empresas privadas e muitas instituições de pesquisa estão estudando a eficácia de procurar DNA fetal para a determinação do sexo e outros testes genéticos. São necessárias mais pesquisas antes que este exame possa ser oferecido a todas as mulheres.

Resumo

Diagnóstico e aconselhamento genético pré­natais são feitos com o objetivo de determinar o risco do nascimento de uma criança com doença genética ou cromossômica. Frequentemente, envolvem a necessidade de um histórico familiar detalhado (linhagem), o exame de todos os membros da família afetados e testes de laboratório, incluindo análise cromossômica e estudos bioquímicos. Geralmente são feitos por um conselheiro genético e uma equipe de profissionais  de  saúde  especialmente  treinada. A  triagem  e  o  diagnóstico  pré­natais  são  utilizados  para  detectar anomalias fetais. A ultrassonografia é empregada para geração de imagens anatômicas do feto. É utilizada para a determinação  do  tamanho  e  posição  fetal  e  para  verificação  da  existência  de  anomalias  estruturais. A  triagem  do soro materno é usada para identificar gestações com risco aumentado para resultados adversos, como síndrome de Down e DTN. A amniocentese e a biopsia de vilosidades coriônicas podem ser utilizadas para obter amostras para estudos citogenéticos e bioquímicos.

Exercícios de revisão

1.

2.

Uma mulher de 23 anos de idade com anemia falciforme e seu marido querem ter um 䏳馜lho, mas temem que a criança nasça com a doença.

A.

Qual é o genótipo da mãe em termos do gene falciforme? Ela é heterozigota ou homozigota?

B.

Se o marido não for portador do gene falciforme, qual é a probabilidade de a criança ter a doença ou ser portadora do traço falciforme?

Um casal tem uma criança que nasceu com uma doença cardíaca congênita.

A.

Você consideraria o defeito resultado de um traço de único gene ou poligênico?

B.

Será que esses pais apresentam maior risco de ter outra criança com um defeito cardíaco ou teriam risco igual de ter um 䏳馜lho com um

defeito em outro sistema orgânico, como fenda palatina?

3.

Um casal foi informado de que seu 䏳馜lho recém-nascido tem as características de síndrome de Down e é sugerida a realização de estudos

genéticos.

A.

É veri䏳馜cado que a criança tem trissomia do 21. Use a Figura 7.8, que descreve os eventos ocorridos durante a meiose, para explicar a

origem do terceiro cromossomo.

B.

4.

Se fosse veri䏳馜cado que a criança tinha o cromossomo robertsoniano, como você explicaria a origem do cromossomo anormal?

Um menino de 8 anos de idade foi diagnosticado com miopatia mitocondrial. Suas principais queixas são fraqueza muscular e intolerância à

prática de exercícios. A mãe relata sintomas semelhantes, mas em um grau muito menor.

A.

Explique a causa dos sintomas do menino.

B.

Doenças mitocondriais seguem um padrão não mendeliano de herança. Explique. De䏳馜na os termos homoplasmia e heteroplasmia em

relação à diversidade de envolvimento do tecido e aos sintomas em pessoas com doenças mitocondriais.

5.

Uma mulher de 26 anos está planejando engravidar.

A.

Que

informações

você

daria

a

ela

sobre

os

efeitos

da

exposição

do

feto

a

medicamentos

e

outras

substâncias?

O

estágio

de

desenvolvimento fetal está associado ao aumento do risco?

B.

Qual é a justi䏳馜cativa para assegurar que ela tenha uma ingestão adequada de ácido fólico antes da concepção?

C.

Ela e o marido têm um gato. Quais precauções devem ser tomadas nos cuidados com o animal?

Referências bibliográficas 1. Center  for  Disease  Control  and  Prevention.  (2010).  Birth  defects  and  congenital  anomalies.  [Online].  Available: http://www.cdc.gov/nchs/fastats/bdefects.htm. Accessed November 27, 2011. 2. Hall  J.  E.  (2011).  Guyton  and  Hall  textbook  of  medical  physiology  (12th  ed.).  Philadelphia,  PA:  Lippincott  Williams  & Wilkins. 3. Nussbaum R. L., McInnes R. R., Willard H. F. (2007).  Thompson & Thompson genetics in medicine  (7th  ed.,  pp.  115–146, 382–387, 443– 458, 485–490). Philadelphia, PA: Elsevier Saunders.

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________________ a N.R.T.: No Brasil, os óbitos por malformação congênita aumentaram de 4,0 em 1980 para 6,7 por mil nascidos vivos (NV) em 1990, chegando a 11,4 por mil NV em 2000. Em 2004, já representavam a segunda causa de óbito infantil no país. Fonte: Gomes M.  R.  R.,  Costa  J.  S.  D.  da.  Mortalidade  infantil  e  as  malformações  congênitas  no  Município  de  Pelotas,  RS,  Brasil:  estudo ecológico no período 1996­2008. Epidemiol Serv Saúde [on­line]. mar. 2012, 21(1) [citado 03 Setembro 2014], 119­128. Disponível em: . bN.T.: No Brasil, a triagem neonatal para fenilcetonúria é obrigatória, garantida por lei. É conhecida como “teste do pezinho”, e

avalia simultaneamente o hipotireoidismo congênito. c N.R.T.: No Brasil, a legislação vigente só autoriza o aborto em caso de a gestação colocar em risco a vida da gestante ou ser resultante  de  violência  sexual  e  de  fetos  anencéfalos.  Fontes:  http://www.saudeesustentabilidade.org.br/index.php/saiba­em­ quais­circunstancias­o­aborto­e­legal/  e  http://www.conjur.com.br/2013­mai­13/leia­acordao­stf­autoriza­interrupcaogravidez­ anencefalo, respectivamente.

Câncer  é  a  segunda  principal  causa  de  morte  nos  EUA.a  Para  o  ano  de  2011,  havia  uma  estimativa  de  1.596.670 indivíduos diagnosticados com câncer nos EUA e 5.671.950 mortos pela doença.1 Estes números não incluem câncer in  situ  ou  carcinoma  basocelular  e  câncer  de  pele  espinocelular.1  Aproximadamente  11,7  milhões  de  americanos vivos  em  2007  tinham  um  histórico  de  câncer.1  A  tendência  de  sobrevivência  ao  câncer  mostra  que  as  taxas  de sobrevida relativa de 5 anos têm melhorado desde o início dos anos de 1990.1 Embora a taxa de mortalidade tenha sido reduzida, o número de mortes por câncer aumentou devido ao envelhecimento e à expansão da população. O câncer não é uma única doença. Trata­se de uma condição com possível origem em quase qualquer órgão, sendo o câncer de pele o tipo mais comum nos EUA. Excluindo­se o câncer de pele, a próstata em homens e a mama em mulheres  são  os  locais  mais  comuns  para  o  desenvolvimento  de  câncer.  A  capacidade  de  cura  do  câncer  varia consideravelmente e depende do tipo de câncer e da extensão da doença no momento do diagnóstico. Certos tipos de câncer,  como  doença  de  Hodgkin,  câncer  testicular  e  osteossarcoma,  que  há  apenas  algumas  décadas  apresentavam prognóstico desfavorável, atualmente em muitos casos podem ser curados. No entanto, o câncer de pulmão, que é a principal  causa  de  morte  em  homens  e  mulheres  nos  EUA,1  é  resistente  à  terapia,  e  apesar  de  ter  sido  alcançado algum progresso no tratamento, as taxas de mortalidade permanecem elevadas. Este capítulo está dividido em seis seções: • Conceitos de diferenciação e crescimento celulares

• Características de neoplasias benignas e malignas • Etiologia do câncer • Manifestações clínicas • Rastreamento, diagnóstico e tratamento • Câncer infantil.

Conceitos de diferenciação e crescimento celulares

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



De䎇梻nir neoplasia e explicar de que maneira o crescimento neoplásico difere de alterações adaptativas normalmente observadas em casos de atro䎇梻a, hipertro䎇梻a e

hiperplasia



Descrever as fases do ciclo celular

O  câncer  é  uma  doença  que  resulta  de  alterações  nos  processos  de  diferenciação  e  crescimento  celulares.  O processo  resultante  é  chamado  de  neoplasia,  que  significa  crescimento  novo.  Ao  contrário  de  alterações  no crescimento do tecido ocorridas em processos como hipertrofia e hiperplasia, o crescimento de uma neoplasia tende

a  ser  sem  coordenação  e  relativamente  autônomo,  no  sentido  em  que  carece  de  controle  regulador  normal  para  o crescimento e a divisão celulares. A  renovação  e  a  reparação  do  tecido  normal  envolvem  dois  componentes:  proliferação  e  diferenciação  celular. Proliferação,  ou  processo  de  divisão  celular,  é  um  processo  adaptativo  para  o  crescimento  de  novas  células  que substituirão células envelhecidas ou quando é necessária a formação de células adicionais.2 Diferenciação descreve o mecanismo pelo qual as células se tornam cada vez mais especializadas a cada divisão mitótica.2 A apoptose é uma forma de morte celular programada, que elimina células senescentes, células com DNA (ácido desoxirribonucleico) danificado ou células indesejadas.2

Ciclo celular O ciclo celular é uma sequência ordenada de eventos que ocorrem à medida que uma célula duplica o seu conteúdo e se divide (Figura 8.1). Durante o ciclo celular a informação genética é duplicada, e os cromossomos duplicados são devidamente alinhados para distribuição entre duas células­filhas geneticamente idênticas.

Figura  8.1  •  Ciclo  celular.  Ilustração  das  quatro  etapas  do  ciclo  celular,  começando  com  G1  e  prosseguindo  até  M. São mostradas a primeira fase de crescimento (G1), a fase de síntese de DNA (S), a segunda fase de crescimento (G2)  e  a  mitose  (M).  (Extraída  de  McConnell  T.  H.,  Hull  K.  L.  (2011).  Human  form  human  function:  Essentials  of anatomy & physiology (p. 77, Fig. 3.10). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

O ciclo celular é dividido em quatro fases, conhecidas como G1, S, G2 e M. A  fase 1 (G1, de gap 1, em inglês) vem  depois  da  fase  pós­mitótica,  quando  a  síntese  de  DNA  é  interrompida  e  se  inicia  a  síntese  de  RNA  (ácido

ribonucleico)  e  proteínas,  quando  começa  o  crescimento  celular.2  Durante  a  fase  S  (síntese),  ocorre  a  síntese  de DNA,  quando  se  formam  dois  conjuntos  separados  de  cromossomos,  um  para  cada  célula­filha.  A  fase  2  (G2) representa a fase pré­mitótica e é semelhante a G1, no sentido em que interrompe a síntese de DNA, porém mantém a  síntese  de  RNA  e  de  proteínas. As  fases  G 1,  S  e  G2  são  chamadas  de  interfase. A  fase M  (mitose)  é  a  fase  de divisão  nuclear,  ou  mitose  e  divisão  do  citoplasma.  Células  continuamente  em  divisão,  como  o  epitélio  escamoso estratificado da pele, mantêm ininterrupto o ciclo de divisão mitótica. Quando as condições ambientais são adversas, como  pode  acontecer  por  indisponibilidade  de  nutriente  ou  fator  de  crescimento,  ou  quando  são  altamente especializadas, as células podem deixar o ciclo celular, tornando­se mitoticamente quiescentes ou permanecer em um estado  de  repouso  conhecido  como  G0.  As  células  em  G0  podem  tornar  a  entrar  no  ciclo  celular  em  resposta  à existência de nutrientes extracelulares, fatores de crescimento, hormônios e outros sinais, como perda sanguínea ou lesão  tecidual  que  dispara  o  mecanismo  de  crescimento  celular.3  Células  altamente  especializadas  e  diferenciadas, como os neurônios, podem permanecer indefinidamente em G0. Dentro  do  ciclo  celular,  podem  ser  efetuadas  pausas,  se  eventos  específicos  de  cada  fase  do  ciclo  celular  não tiverem  sido  completados.  Por  exemplo,  a  mitose  é  impedida  até  que  o  DNA  seja  replicado  adequadamente. Além disso, a separação dos cromossomos na mitose é adiada até que todas as fibras do fuso se liguem aos cromossomos. Estas  são  oportunidades  para  verificar  a  precisão  do  processo  de  replicação  do  DNA.  Esses  pontos  de  controle  de danos  ao  DNA  possibilitam  a  identificação  de  defeitos  e  os  reparos,  garantindo  que  cada  célula­filha  receba  um conjunto completo de informação genética, idêntico ao da célula­mãe.2,3 As ciclinas são um grupo de proteínas que controlam a entrada e a progressão das células mediante o ciclo celular. As ciclinas se conectam a proteínas chamadas quinases dependentes da ciclina (CDK). As quinases são enzimas que fosforilam proteínas. As CDK fosforilam proteínas­alvo específicas e são expressas de modo contínuo ao longo do ciclo  celular,  mas  em  uma  forma  inativa,  enquanto  as  ciclinas  são  sintetizadas  durante  fases  específicas  do  ciclo celular e, em seguida, degradadas pela via da ubiquitinação assim que sua tarefa é completada.4 Diferentes arranjos de  ciclinas  e  CDK  estão  associados  a  cada  uma  das  fases  do  ciclo  celular  (Figura 8.2).  Por  exemplo,  ciclina  B  e CDK1  controlam  a  transição  de  G2  para  M.  Quando  a  célula  passa  para  G2,  a  ciclina  B  é  sintetizada  e  se  liga  a CDK1. O complexo ciclina B­CDK1, em seguida, dirige os eventos que levam à mitose, incluindo a replicação do DNA e a montagem do fuso mitótico. Embora cada uma das fases do ciclo celular seja cuidadosamente controlada, a transição de G2 para M é considerada um dos pontos mais importantes de controle do ciclo celular. Além da síntese e degradação das ciclinas, os complexos de ciclina­CDK são regulados pela ligação de inibidores de CDK (CKI). Os CKI  são  particularmente  importantes  na  regulação  de  pontos  de  controle  do  ciclo  celular  durante  os  quais  são reparados erros na replicação do DNA.4,5 A manipulação de ciclinas, CDK e CKI é a base para o desenvolvimento de novas formas de terapia medicamentosa possíveis de serem utilizadas no tratamento do câncer.6

Figura  8.2  •  Regulação  do  ciclo  celular. As  células  são  acionadas  para  ir  à  fase  G 1  a  partir  de  G0  por  fatores  de crescimento  e  citocinas  mediante  a  ativação  de  um  proto­oncogene.  Um  momento  importante  no  movimento  das células  da  fase  G1  para  a  fase  S  é  o  ponto  de  restrição  R.  Um  importante  evento  regulador  neste  processo  é  a

fosforilação  de  RB  por  CDK,  que  provoca  a  liberação  do  ativador  de  transcrição  E2F.  CDK  são  suprimidas  por  CKI que são reguladas por p53. Proteínas de supressão tumoral bloqueiam a progressão do ciclo celular durante a fase G1. (Extraída de Rubin R., Strayer D. S. (Eds.) (2012). Rubin’s pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 170). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Proliferação celular Proliferação  celular  é  o  processo  de  aumento  no  número  de  células  por  divisão  mitótica.  Em  tecidos  normais,  a proliferação celular é regulada de modo que o número de células em divisão ativa é equivalente ao número de células mortas  ou  perdidas.  Nos  seres  humanos,  existem  duas  grandes  categorias  de  células:  os  gametas  e  as  células somáticas. Os gametas (óvulo e espermatozoide) são células haploides, com apenas um conjunto de cromossomos de um dos pais, e são projetados especificamente para a fusão sexual. Após a fusão, é formada uma célula  diploide contendo os dois conjuntos de cromossomos. Esta é a célula somática, que passa a formar o resto do organismo. Em  termos  de  proliferação  celular,  os  200  diferentes  tipos  de  células  que  compõem  o  organismo  podem  ser divididos em três grandes grupos: • Neurônios e células da musculatura esquelética e do músculo cardíaco, que são bem diferenciados e raramente se dividem e se reproduzem

• Células progenitoras ou mães, que continuam a se dividir e se reproduzir, como as células do sangue, da pele e do fígado • Células­tronco indiferenciadas, que podem ser acionadas para entrar no ciclo celular e na produção de um grande número de células progenitoras se necessário.2 As taxas de reprodução celular variam muito. Os leucócitos e as células que revestem o sistema digestório vivem vários dias e devem ser substituídos constantemente. Na maior parte dos tecidos, a taxa de reprodução de células é grandemente  aumentada  quando  o  tecido  é  danificado  ou  quando  ocorre  perda  tecidual.  Um  sangramento,  por exemplo, estimula a reprodução das células formadoras de sangue encontradas na medula óssea. Em alguns tipos de tecido,  o  programa  genético  de  replicação  celular  normal  é  suprimido,  mas  pode  ser  reativado  em  determinadas condições. O fígado, por exemplo, tem uma extensa capacidade de regeneração sob certas condições.

Conceitos fundamentais

Proliferação e crescimento celulares



O crescimento e o reparo de tecidos envolvem proliferação, diferenciação e apoptose celulares



Apoptose é uma forma de morte celular programada que elimina células senescentes e alguns tipos de células dani䎇梻cadas (p. ex., células com DNA dani䎇梻cado ou

com lesão induzida por peróxido de hidrogênio)

Compreenda

O ciclo celular

Uma célula se reproduz realizando uma sequência ordenada de eventos denominada ciclo celular. O ciclo celular é dividido em quatro fases de

duração variável que inclui (1) a fase de síntese (S) e mitose (M), que são separadas por (2) duas fases (G1 e G ). Ocorre também (3) uma fase 2

de inatividade (G ), durante a qual a célula pode deixar o ciclo celular. Movimento através de cada uma dessas fases é mediado em (4) postos 0

de controle especí䎇梻cos, que são controlados por enzimas e proteínas especí䎇梻cas chamadas ciclinas.

Síntese e mitose Síntese (S) e mitose (M) representam as duas fases principais do ciclo celular. A fase S, que tem cerca de 10 a 12 h de duração, é o período de

síntese de DNA e replicação dos cromossomos. A fase M, que geralmente dura menos de 1 h, envolve a formação do fuso mitótico e a divisão da

célula com a formação de duas células-䎇梻lhas.

Fases G1 e G2 Como a maioria das células necessita de tempo para crescer e dobrar sua massa de proteínas e organelas, fases adicionais (G, gap) são inseridas

no ciclo celular. G

1

é a fase durante a qual a célula começa a se preparar para a replicação do DNA e a mitose por meio de síntese de proteínas e do

aumento no número de organelas e elementos do citoesqueleto. G

2

é a fase pré-mitótica. Durante esta fase, as enzimas e outras proteínas

necessárias para a divisão celular são sintetizadas e movidas para os seus locais apropriados.

Fase G0 G

0

é a fase após a mitose, durante a qual a célula pode deixar o ciclo celular e permanecer em um estado de inatividade ou reentrar no ciclo

celular em outro momento. Células lábeis, como as células do sangue e as que revestem o sistema digestório, não entram na fase G , mas 0

continuam no ciclo. Células estáveis, como os hepatócitos, entram na fase G

0

após a mitose, mas podem reentrar no ciclo celular quando

estimulados pela perda de outras células. Células permanentes, como os neurônios que se tornam terminalmente diferenciadas após a mitose,

deixam o ciclo celular e não são mais capazes de renovação celular.

Pontos de controle e ciclinas Na maioria das células, existem diversos pontos de controle do ciclo celular, quando o ciclo pode ser detido se eventos anteriores não foram

concluídos. Por exemplo, o ponto de controle G /S monitora danos ao DNA cromossômico por exposição à radiação ou agentes químicos, e o 1

ponto de controle G /M impede que a célula entre em mitose se a replicação do DNA não está completa. 2

As ciclinas são uma família de proteínas que controlam a entrada e a progressão das células mediante o ciclo celular. Elas funcionam ativando

proteínas chamadas CDK. Diferentes combinações de ciclinas e CDK estão associadas a cada uma das fases do ciclo celular. Além da síntese e

degradação das ciclinas, os complexos ciclina-CDK são regulados pela ligação de CKI. Os inibidores de CDK são particularmente importantes na

regulação dos pontos de controle do ciclo celular, durante os quais erros na replicação do DNA podem ser reparados.

Diferenciação celular Diferenciação celular é o processo pelo qual células em proliferação se tornam progressivamente tipos celulares mais especializados.  Este  processo  resulta  em  uma  célula  totalmente  diferenciada,  adulta,  que  tem  um  conjunto  de características  estruturais,  funcionais  e  tempo  de  vida  específicos.  Por  exemplo,  a  hemácia  é  uma  célula terminalmente  diferenciada  que  foi  programada  para  se  transformar  em  um  disco  côncavo,  que  funciona  como  um veículo para o transporte de oxigênio e vive cerca de 3 meses. Os diversos tipos de células do organismo se originam de uma única célula, o óvulo fertilizado ou ovo. À medida que  as  células  embrionárias  aumentam  em  número,  envolvem­se  em  um  processo  coordenado  de  diferenciação necessário  para  o  desenvolvimento  de  todos  os  órgãos  do  corpo.  O  processo  de  diferenciação  é  regulado  por  uma combinação de processos internos, envolvendo a expressão de genes específicos e estímulos externos fornecidos por

células  vizinhas,  matriz  extracelular,  exposição  a  substâncias  na  circulação  materna  e  fatores  de  crescimento, citocinas, oxigênio e nutrientes. O  que  torna  as  células  de  um  órgão  diferentes  das  células  de  outro  órgão  são  os  genes  específicos  que  são expressos e o padrão específico de expressão gênica. Embora todas as células tenham o mesmo conjunto de genes, apenas um pequeno número é expresso na vida pós­natal. Quando células, como as do embrião em desenvolvimento, se  diferenciam  e  dão  origem  a  células  diferenciadas  de  um  tipo  de  tecido  particular,  os  genes  apropriados  são mantidos em um estado ativo, enquanto o restante permanece inativo. Normalmente, a taxa de reprodução de células e o processo de diferenciação celular são controlados com precisão na vida pré­natal e pós­natal, de modo que ambos os mecanismos são interrompidos assim que são formados a quantidade e os tipos de células adequados. O  processo  de  diferenciação  ocorre  em  etapas  ordenadas.  Seguindo  o  progresso  de  cada  etapa,  o  aumento  na especialização  é  trocado  por  uma  perda  na  capacidade  de  desenvolver  características  celulares  diferentes  e  tipos diferentes  de  células.  À  medida  que  a  célula  vai  se  tornando  cada  vez  mais  especializada,  os  estímulos  que  são capazes de induzir a mitose ficam mais limitados. Os neurônios, que são células altamente especializadas, perdem a capacidade  de  se  dividir  e  se  reproduzir  quando  o  desenvolvimento  do  sistema  nervoso  está  completo.  Mais importante  ainda,  existem  muito  poucas  células  precursoras  remanescentes  para  orientar  sua  substituição.  No entanto, uma quantidade apropriada desse tipo de células é gerada no embrião de modo que a perda de determinada porcentagem de células não afeta a população total de células e suas funções específicas. Em  alguns  tecidos,  como  a  pele  e  a  mucosa  que  reveste  o  sistema  digestório,  um  grau  elevado  de  renovação celular é mantido ao longo da vida. Mesmo nessas populações de células que se renovam continuamente, as células mais especializadas são incapazes de divisão. Estas populações de células dependem de progenitores ou células­mãe da  mesma  linhagem  que  ainda  não  tenham  se  diferenciado  ao  ponto  de  perder  a  capacidade  de  se  dividir.  Estas células  são  diferenciadas  o  suficiente  de  modo  que  as  células­filhas  sejam  limitadas  à  mesma  linhagem  de  células, mas  não  o  suficiente  para  evitar  a  possibilidade  de  proliferação  ativa.  No  entanto,  suas  propriedades  de  renovação celular são restringidas por fatores de crescimento necessários para que ocorra a divisão celular. Outro  tipo  de  células,  chamadas  células­tronco,  permanece  incompletamente  diferenciado  ao  longo  da  vida. As células  estaminais  são  células  de  reserva  que  permanecem  em  repouso  até  que  exista  a  necessidade  de  reposição celular,  caso  em  que  se  dividem,  produzindo  outras  células  estaminais  e  células  capazes  de  realizar  as  funções  de uma  célula  diferenciada.  Quando  uma  célula­tronco  se  divide,  uma  célula­filha  retém  as  características  das  células estaminais e a outra se torna uma célula progenitora, que passa pelo processo que resulta na diferenciação terminal (Figura 8.3).  A  progênie  de  cada  célula  progenitora  segue  programas  genéticos  mais  restritos,  com  as  células  de diferenciação  passando  por  várias  divisões  mitóticas  durante  o  processo  de  transformar­se  em  um  tipo  maduro  de célula  e  com  cada  geração  de  células  tornando­se  mais  especializada.  Desta  maneira,  uma  única  célula­tronco  pode dar  origem  a  muitas  células  necessárias  para  a  reparação  normal  de  tecidos  ou  produção  de  células  do  sangue. Quando  as  células  que  se  dividem  se  tornam  totalmente  diferenciadas,  a  taxa  de  divisão  mitótica  é  reduzida.  No sistema  imunológico,  por  exemplo,  com  o  estímulo  adequado,  os  linfócitos  B  se  tornam  progressivamente  mais diferenciados, à medida que passam por sucessivas divisões mitóticas, até se tornarem células plasmáticas maduras, que já não podem se dividir, mas que são capazes de secretar grandes quantidades de anticorpos. As células­tronco têm duas propriedades importantes: autorrenovação e potência. Autorrenovação significa que as células  estaminais  podem  sofrer  numerosas  divisões  mitóticas,  mantendo  seu  estado  indiferenciado.2,7  O  termo potência é utilizado para definir o potencial de diferenciação das células estaminais. Células­tronco totipotentes são aquelas produzidas por fertilização do óvulo. As primeiras células produzidas após a fertilização são totipotentes e podem  se  diferenciar  em  células  embrionárias  e  extraembrionárias.  As  células­tronco  totipotentes  dão  origem  a células­tronco  pluripotentes,  possíveis  de  se  diferenciarem  em  três  camadas  germinativas  do  embrião.  Células­ tronco multipotentes são, por exemplo, as células estaminais hematopoéticas, que dão origem a apenas alguns tipos de células. Finalmente, as células­tronco unipotentes produzem apenas um tipo celular, mas mantêm a propriedade de autorrenovação. É  praticada  a  classificação  das  células­tronco  em  duas  categorias  básicas:  células­tronco  embrionárias  e  células­ tronco  adultas  (às  vezes  chamadas  de  células­tronco  somáticas).2,7  Células­tronco  embrionárias  são  células pluripotentes derivadas da massa celular interna do blastocisto do embrião. Dão origem às três camadas de células germinativas embrionárias. Com o desenvolvimento, o embrião forma células­tronco germinativas para reprodução e células­tronco somáticas para organogênese. Tanto as células­tronco germinativas quanto as células­tronco somáticas

mantêm  a  capacidade  de  autorrenovação.  As  células­tronco  adultas  estão  localizadas  em  microambientes especializados,  que  diferem  uns  dos  outros  dependendo  do  tipo  de  tecido.  Essas  células­tronco  têm  um  papel importante na homeostase, pois contribuem para a regeneração tecidual e a reposição de células perdidas por morte celular.8

Figura 8.3 • Mecanismo de substituição celular mediado por células­tronco. A divisão de uma célula­tronco com um potencial  ilimitado  para  proliferação  resulta  em  uma  célula­filha,  que  mantém  as  características  de  uma  célula­ tronco,  e  uma  segunda  célula­filha,  que  se  diferencia  em  células  progenitoras  ou  células­mães,  com  potencial limitado para diferenciação e proliferação. À medida que as células­filhas da célula progenitora proliferam, tornam­se mais diferenciadas até alcançarem um estágio em que estão totalmente diferenciadas.

Foi  identificado  um  papel  importante  de  células­tronco  na  patogênese  do  câncer,  assunto  que  continua  a  ser pesquisado.7–11  São  identificadas  células­tronco  tumorais  (chamadas  de  células iniciadoras de tumor  [TIC,  tumor­ initiating  cells])  no  câncer  de  mama,  próstata,  leucemia  mieloide  aguda  (LMA)  e  outros  tipos  de  câncer.12  Para manter  suas  propriedades  de  autorrenovação,  essas  células­tronco  expressam  inibidores  do  ciclo  celular.  Existe também forte suporte experimental para a ideia de que, em determinados tipos de câncer, as células­tronco tumorais são  o  alvo  inicial  da  transformação  maligna.12  Se  confirmada,  a  identificação  dessas  descobertas  pode  ter implicações  importantes  no  tratamento  do  câncer.  Por  exemplo,  os  medicamentos  podem  ser  direcionados  para eliminar células em proliferação.

Resumo

O termo neoplasia se refere a massa anormal de tecido em que o crescimento excede e é descoordenado em relação aos  tecidos  normais.  Ao  contrário  de  processos  adaptativos  celulares  normais,  como  hipertrofia  e  hiperplasia, neoplasias  não  obedecem  às  leis  de  crescimento  celular  normal.  Neoplasias  não  têm  nenhum  propósito  útil,  não ocorrem em resposta a um estímulo adequado e continuam a crescer à custa do hospedeiro. O processo de crescimento e divisão celular é chamado de ciclo celular. Está dividido em quatro fases: G1, que é a fase de pós­mitótica, quando ocorre a síntese de proteínas e o crescimento celular; S, que é a fase durante a qual ocorre a síntese de DNA, dando origem a dois conjuntos separados de cromossomos; G2, que é a fase pré­mitótica, durante a qual a síntese de RNA e de proteínas continua; e M, que é a fase de mitose ou divisão celular. A fase G 0

é um período de descanso ou fase de repouso na qual a célula não se divide. A entrada e a progressão ao longo das diferentes fases do ciclo celular são controladas por ciclinas, CDK e inibidores de CDK. O processo normal de renovação e de reparo de tecidos envolve proliferação, diferenciação e apoptose da célula. Proliferação,  ou  processo  de  divisão  celular,  é  um  mecanismo  adaptativo  inerente  para  a  substituição  quando células  velhas  morrem  ou  é  necessário  adicionar  novas  células  ao  tecido.  Diferenciação  é  o  processo  de especialização pelo qual novas células adquirem a estrutura e função das células que substituem. Apoptose é uma forma  de  morte  celular  programada,  que  elimina  células  senescentes,  células  com  DNA  danificado  ou  células indesejadas.  As  células  do  organismo  podem  ser  divididas  em  dois  grandes  grupos:  neurônios  e  células  da musculatura esquelética e músculo cardíaco, que são bem diferenciadas e raramente se dividem ou se reproduzem; e células progenitoras ou célulasmães, que continuam a se dividir e se reproduzir, como células do sangue, células da pele e células do fígado. Uma terceira categoria de células são as células­tronco, que permanecem em repouso até que haja a necessidade de reposição celular, caso em que se dividem, produzindo outras células estaminais e células que podem executar as  funções  de  células  diferenciadas.  As  células­tronco  têm  duas  propriedades  importantes:  autorrenovação  e potência.  Autorrenovação  significa  que  as  células  estaminais  podem  sofrer  numerosas  divisões  mitóticas, mantendo  seu  estado  indiferenciado.  O  termo  potência  é  empregado  para  definir  o  potencial  de  diferenciação  das células­tronco. Existem duas categorias principais de células­tronco. Células­tronco embrionárias, que são células pluripotentes,  derivadas  da  massa  celular  interna  do  blastocisto  do  embrião.  Células­tronco  adultas  residem  em microambientes  específicos  e  têm  papéis  importantes  na  homeostase  por  contribuírem  com  a  regeneração  dos tecidos e reposição de células perdidas para a apoptose. Células­tronco tumorais foram identificadas no câncer de mama, próstata, LMA e outros tipos de câncer.

Características de neoplasias benignas e malignas

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Citar as propriedades de diferenciação celular para o desenvolvimento de um clone de células de câncer e o comportamento da neoplasia



Descrever a via de disseminação hematológica de uma célula de câncer metastático



Empregar os conceitos de fração de crescimento e tempo de duplicação para explicar o crescimento do tecido canceroso

Os órgãos do corpo são compostos por dois tipos de tecido: parênquima e estroma ou tecido de suporte. As  células do parênquima  representam  os  componentes  funcionais  de  um  órgão. As  células  do  parênquima  de  uma  neoplasia determinam seu comportamento e são o componente para o qual a neoplasia é nomeada. O tecido de suporte inclui a matriz  extracelular  e  o  tecido  conjuntivo  que  circunda  as  células  do  parênquima.  Os  vasos  linfáticos  e  sanguíneos fornecem alimentação e suporte para as células do parênquima.

Terminologia Tradicionalmente,  por  definição,  neoplasia  é  uma  tumefação  que  pode  ser  causada  por  uma  série  de  condições, incluindo inflamação e traumatismo. Além disso, o termo tem sido utilizado para definir massa de células que surge devido a um crescimento excessivo. Neoplasias geralmente são classificadas como benignas ou malignas. Neoplasias que contêm células bem diferenciadas agrupadas em conjunto em uma massa única são consideradas benignas. Essas neoplasias geralmente não causam a morte, a menos que sua localização ou seu tamanho interfira nas funções vitais. Neoplasias malignas, ao contrário, são menos diferenciadas e têm a capacidade de se desprender entrar no sistema circulatório ou linfático e formar neoplasias malignas secundárias em outros locais no organismo. As neoplasias geralmente recebem o nome por adição do sufixo ­oma ao tipo de tecido parenquimatoso a partir do qual  se  origina  o  crescimento.2  Desse  modo,  uma  neoplasia  benigna  do  tecido  epitelial  glandular  é  chamada  de adenoma,  e  uma  neoplasia  benigna  do  tecido  ósseo  é  nomeada  de  osteoma.  O  termo  carcinoma  é  empregado  para designar  uma  neoplasia  maligna  com  origem  no  tecido  epitelial.  No  caso  de  uma  neoplasia  maligna  do  tecido epitelial  glandular,  o  termo  empregado  é  adenocarcinoma.  Neoplasias  malignas  de  origem  mesenquimal  são chamadas  sarcomas  (p.  ex.,  osteossarcoma).  Papilomas  são  projeções  digitiformes,  benignas  e  de  tamanho

microscópico ou macroscópico, que crescem em qualquer superfície. Um pólipo é um crescimento de tecido que se projeta a partir de uma superfície mucosa, como a do intestino. Embora o termo geralmente indique uma neoplasia benigna, algumas neoplasias malignas também podem surgir como pólipos.2 Pólipos adenomatosos são considerados precursores  de  adenocarcinomas  do  cólon.  Oncologia  é  o  estudo  de  neoplasias  e  de  seu  tratamento. A  Tabela  8.1 fornece uma lista com os nomes de neoplasias benignas e malignas, separadas de acordo com o tipo de tecido. Tabela 8.1

Nomenclatura de neoplasias benignas e malignas de acordo com o tipo de tecido.

Tipo de tecido

Neoplasia benigna

Neoplasia maligna

Super䎇梻cial

Papiloma

Carcinoma espinocelular

Glandular

Adenoma

Adenocarcinoma

Fibroso

Fibroma

Fibrossarcoma

Adiposo

Lipoma

Lipossarcoma

Cartilagem

Condroma

Condrossarcoma

Ossos

Osteoma

Osteossarcoma

Vasos sanguíneos

Hemangioma

Hemangiossarcoma

Vasos linfáticos

Linfangioma

Linfangiossarcoma

Tecido linfático

 

Linfossarcoma

Liso

Liomioma

Liomiossarcoma

Estriado

Rabdomioma

Rabdomiossarcoma

Células nervosas

Neuroma

Neuroblastoma

Tecido glial

Glioma

Glioblastoma, astrocitoma, meduloblastoma,

Epitelial

Conjuntivo

Muscular

Tecido neural

oligodendroglioma

Bainhas nervosas

Neurilemoma

Sarcoma neurilemal

Meninges

Meningioma

Sarcoma meníngeo

Granulocítico

 

Leucemia mieloide

Eritrocítico

 

Leucemia eritrocítica

Células do plasma

 

Mieloma múltiplo

Linfocítico

 

Leucemia linfocítica ou linfoma

Monocítico

 

Leucemia monocítica

Vasos sanguíneos

Hemangioma

Hemangiossarcoma

Vasos linfáticos

Linfangioma

Linfangiossarcoma

Hematológico

Tecido endotelial

Neoplasias benignas e malignas geralmente podem ser distinguidas por: • Características celulares

• Taxa de crescimento

• Modo de crescimento • Capacidade de invadir e formar metástases em outras partes do organismo • Potencial para causar a morte. As características de neoplasias benignas e malignas são apresentadas resumidamente na Tabela 8.2.

Neoplasias benignas As  neoplasias  benignas  são  compostas  de  células  bem  diferenciadas  que  se  assemelham  às  células  dos  tecidos  de origem  e  se  caracterizam  por  crescimento  lento  e  progressivo,  que  pode  paralisar  ou  regredir.12  Por  motivos desconhecidos,  as  neoplasias  benignas  perderam  a  capacidade  de  suprimir  o  programa  genético  de  proliferação celular, mas mantiveram o programa normal de diferenciação celular. Elas crescem por expansão e permanecem no local  de  origem,  sem  a  capacidade  de  se  infiltrar,  invadir  ou  criar  metástases  para  locais  distantes.  Como  se expandem  lentamente,  desenvolvem  uma  borda  de  tecido  conjuntivo  comprimido  denominada  cápsula  fibrosa.2  A cápsula é responsável pela linha nítida de demarcação entre a neoplasia benigna e os tecidos adjacentes, um fator que facilita sua remoção cirúrgica. Tabela 8.2

Características de neoplasias benignas e malignas.

Características

Benignas

Malignas

Características celulares

Células bem diferenciadas, que se

Células indiferenciadas, com anaplasia e estrutura atípica, que muitas

assemelham a células do tecido de origem

Taxa de crescimento

Geralmente lenta e progressiva; pode

paralisar ou regredir

Modo de crescimento

Crescimento por expansão, sem invadir os

tecidos circundantes; geralmente

vezes têm pouca semelhança com as células do tecido de origem

Variável e depende do nível de diferenciação; quanto mais

indiferenciadas as células, mais rápida é a taxa de crescimento

Crescimento por invasão, envia prolongamentos que in䎇梻ltram os

tecidos circundantes

encapsulado

Metástase

Não se disseminam por metástase

Obtêm acesso aos vasos sanguíneos e linfáticos para se disseminarem

para outras áreas do corpo

Geralmente, neoplasias benignas são uma ameaça muito menor à saúde e ao bem­estar do que neoplasias malignas e  não  causam  morte,  a  menos  que  venham  a  interferir  nas  funções  vitais,  devido  à  sua  localização  anatômica.  Por exemplo,  uma  neoplasia  benigna  que  cresce  na  cavidade  craniana  acaba  provocando  morte  por  compressão  das estruturas  cerebrais.  Neoplasias  benignas  também  podem  causar  distúrbios  na  função  de  estruturas  adjacentes  ou distantes, por meio de pressão sobre os tecidos, vasos sanguíneos ou nervos. Algumas neoplasias benignas também são conhecidas por sua capacidade de causar alterações na função orgânica devido à produção anormal de hormônios.

Conceitos fundamentais

Neoplasias benignas e malignas



Uma neoplasia, seja ela benigna ou maligna, representa um novo crescimento



Neoplasias benignas são tumores bem diferenciados, que se assemelham aos tecidos de origem, mas que perderam a capacidade de controlar a proliferação

celular. Crescem por expansão, são envoltos por uma cápsula 䎇梻brosa e não causam a morte, a menos que sua localização inter䎇梻ra em funções orgânicas vitais



Neoplasias malignas são tumores com menor nível de diferenciação, que perderam a capacidade de controlar tanto a proliferação quanto a diferenciação celular.

Elas crescem de modo desordenado e descontrolado e invadem os tecidos circundantes; têm células que se soltam e migram para locais distantes para formar

metástases e, inevitavelmente, causam sofrimento e morte, a menos que seu crescimento possa ser controlado pelo tratamento

Neoplasias malignas Neoplasias  malignas,  que  invadem  e  destroem  o  tecido  circundante  e  se  propagam  para  outras  partes  do  corpo, tendem  a  crescer  rapidamente  e  se  disseminar;  têm  potencial  para  causar  a  morte.  Devido  à  sua  rápida  taxa  de

crescimento,  as  neoplasias  malignas  podem  comprimir  vasos  sanguíneos  e  comprometer  o  suprimento  sanguíneo, causando  isquemia  e  lesão  tecidual.  Algumas  doenças  malignas  podem  secretar  hormônios  ou  citocinas,  liberar enzimas  e  toxinas  ou  induzir  uma  resposta  inflamatória  prejudicial  ao  tecido  normal,  tanto  quanto  a  própria neoplasia.  Diversas  condições  malignas  secretam  fator  de  crescimento  endotelial  vascular  (VEGF,  vascular endothelial  growth  factor),  que  aumenta  o  suprimento  sanguíneo  para  a  neoplasia  e  facilita  um  crescimento  mais rápido.2  Existem  dois  tipos  de  VEGF.  VEGF­1  é  usado  no  desenvolvimento  embrionário,  mas  também  pode  ser encontrado em alguns tipos de metástases cancerígenas. VEGF­2 é o mais importante entre os receptores associados a angiogênese patológica e linfangiogênese com neoplasias.13 Existem  duas  categorias  de  neoplasias  malignas:  neoplasias  sólidas  e  cânceres  hematológicos.  As  neoplasias sólidas inicialmente se mantêm confinadas a um tecido ou órgão específico. À medida que progride o crescimento da neoplasia  sólida  primária,  as  células  se  separam  da  massa  neoplásica  original,  invadem  o  tecido  circundante  e penetram nos sistemas de vasos sanguíneos e linfáticos para se disseminarem para locais distantes, em um processo denominado metástase (Figura 8.4). O câncer hematológico envolve células normalmente encontradas no sangue e na linfa, tornando­os condições disseminadas desde o início (Figura 8.5). Carcinoma  in  situ  é  uma  lesão  pré­invasiva  localizada  (Figura  8.6).  Como  exemplo,  nos  casos  de  carcinoma ductal in situ da mama, as células ainda não atravessaram a membrana basal. Dependendo de sua localização, lesões in situ geralmente podem ser removidas cirurgicamente, ou tratadas, de modo que a probabilidade de recorrência é pequena. Por exemplo, o carcinoma in situ do colo do útero é essencialmente 100% curável.

Figura  8.4  •  Câncer  metastático.  O  mesentério  associado  a  uma  parte  do  intestino  delgado  mostra  pequenos nódulos de carcinoma metastático do ovário. (Extraída de Rubin R., Strayer D. S. (Eds.) (2012). Rubin’s  pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 166). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Figura 8.5 • Disseminação hematogênica do câncer. Neoplasia maligna (ao fundo) está associada ao tecido adiposo e  penetrou  uma  veia.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.)  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 167). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Figura  8.6  •  Carcinoma  in  situ.  O  colo  do  útero  apresenta  células  neoplásicas  escamosas  que  ocupam  todo  o epitélio, embora confinadas à mucosa pela membrana basal intacta subjacente. (Extraída de Rubin R., Strayer D. S. (Eds.)  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  164).  Philadelphia,  PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Características de células cancerígenas As células cancerígenas têm duas características principais: proliferação rápida e anormal e perda de diferenciação. A perda  da  capacidade  de  diferenciação  significa  que  não  apresentam  as  características  e  propriedades  normais  de células diferenciadas e, por conseguinte, são mais semelhantes às células embrionárias. O  termo  anaplasia  descreve  a  perda  da  capacidade  de  diferenciação  celular  do  tecido  canceroso.2  Células cancerígenas  indiferenciadas  são  marcadas  por  uma  série  de  alterações  morfológicas.  Tanto  a  célula  quanto  seu núcleo  apresentam  variações  de  tamanho  e  forma,  uma  condição  denominada  pleomorfismo.  O  núcleo  das  células tem  tamanho  variável  e  formato  incomum;  a  cromatina  é  grosseira  e  agregada,  e  os  nucléolos  costumam  ter  um tamanho  consideravelmente  maior  que  o  normal  (Figura  8.7  A).  Frequentemente,  o  núcleo  contém  um  número anormal de cromossomos (aneuploidia). Neoplasias indiferenciadas geralmente exibem um número maior de células em mitose, devido a uma taxa de proliferação elevada. Exibem também figuras mitóticas atípicas, muitas vezes com a  produção  de  fusos  tripolares,  tetrapolares  ou  multipolares  (Figura  8.7  B).  Células  cancerígenas  altamente anaplásicas,  qualquer  que  seja  seu  tecido  de  origem,  começam  a  se  parecer  mais  com  células  indiferenciadas  ou embrionárias  do  que  com  as  células  de  seu  tecido  de  origem.  Alguns  tipos  de  câncer  apresentam  apenas  ligeira anaplasia, enquanto outros exibem anaplasia marcante. A classificação citológica/ histológica de neoplasias se baseia

no grau de diferenciação e no número de células em proliferação. Quanto mais uma célula neoplásica se assemelha a células de tecidos normais comparáveis, tanto morfológica quanto funcionalmente, menor o grau. Desse modo, em uma escala que varia do grau I ao IV, neoplasias de grau I mostram células muito diferenciadas, e de grau IV, pouco diferenciadas, exibindo anaplasia marcante.2

Figura  8.7  •  Características  anaplásicas  de  neoplasias  malignas.  A.  As  células  deste  carcinoma  anaplásico  são altamente  pleomórficas  (ou  seja,  variam  em  tamanho  e  formato).  Os  núcleos  são  hipercromáticos  e  grandes  em relação ao citoplasma. Existem células tumorais gigantes e multinucleadas (setas). B. A célula maligna em metáfase exibe  uma  figura  de  mitose  anormal.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.)  (2012).  Rubin’s  pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 162). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

As  características  de  proliferação  e  diferenciação  alteradas  estão  associadas  a  uma  série  de  outras  alterações  nas características  e  funções  das  células,  que  distinguem  células  cancerígenas  de  suas  homólogas  normalmente diferenciadas. Essas alterações estão listadas na Tabela 8.3.

Instabilidade genética. A maioria das células cancerígenas exibe uma característica chamada  instabilidade genética –  frequentemente  considerada  uma  indicação  de  câncer.  O  conceito  surgiu  após  a  constatação  de  que  mutações  não corrigidas  em  células  normais  são  raras,  devido  aos  inúmeros  mecanismos  celulares  capazes  de  impedi­las.  Para explicar a alta frequência de mutações em células cancerígenas, acredita­se que essas células tenham um “fenótipo de mutação”  com  instabilidade  genética,  que  contribui  para  o  desenvolvimento  e  a  progressão  do  câncer.2  As características  da  instabilidade  genética  incluem  aneuploidia,  em  que  o  número  de  cromossomos  aumenta  ou diminui;  instabilidade  intracromossômica,  que  inclui  inserções,  exclusões  e  amplificações;  instabilidade  de microssatélites, que envolve pequenas sequências repetitivas de DNA; e mutações pontuais. Tabela 8.3

Comparação entre as características de uma célula normal e de uma célula cancerosa.

Características

Célula normal

Célula cancerosa

Crescimento

Regular

Irregular

Diferenciação

Alta

Baixa

Estabilidade genética

Estável

Instável

Dependência de fator de crescimento

Dependente

Independente

Dependência da densidade

Alta

Baixa

Adesividade entre as células

Alta

Baixa

Dependência de ancoragem

Alta

Baixa

Comunicação entre as células

Alta

Baixa

Vida útil da célula

Limitada

Ilimitada

Expressão do antígeno

Não há

Pode haver

Produção de substâncias (p. ex., proteases, hormônios)

Normal

Anormal

Composição e arranjo do citoesqueleto

Normal

Anormal

Independência do fator de crescimento. Outra característica de células cancerígenas é a capacidade de proliferação, mesmo  na  ausência  de  fatores  de  crescimento.  Essa  característica  é  frequentemente  observada  quando  células cancerígenas  são  propagadas  em  culturas  de  células  –  a  adição  de  soro,  que  é  rico  em  fatores  de  crescimento,  é desnecessária  para  a  proliferação  do  câncer.  Células  normais  mantidas  em  cultura  morrem  com  frequência  sem adição de soro ou de fator de crescimento. Em alguns casos, isso acontece porque as células cancerígenas podem se dividir  rapidamente  sem  que  o  fator  de  crescimento  se  ligue  ao  seu  receptor.  Células  de  câncer  de  mama  que  não expressam  receptores  de  estrogênio  são  um  exemplo.  Tais  células  cancerígenas  crescem  mesmo  na  ausência  de estrogênio,  que  normalmente  é  o  estímulo  para  o  crescimento  de  células  epiteliais  dos  ductos  mamários. Algumas células  cancerígenas  podem  produzir  seus  próprios  fatores  de  crescimento  e  secretá­los  para  o  meio  de  cultura, enquanto outras têm receptores ou proteínas de sinalização anormais que podem ativar inadequadamente as vias de sinalização de crescimento celular. Inibição  celular  dependente  de  densidade.  Células  cancerígenas  muitas  vezes  perdem  a  inibição  celular dependente  da  densidade,  que  é  a  interrupção  do  crescimento  depois  que  as  células  alcançam  uma  densidade específica.  Isso,  às  vezes,  é  chamado  de  inibição  por  contato  porque  frequentemente  as  células  param  de  crescer quando entram em contato umas com as outras. Na cicatrização de feridas, a inibição por contato faz o crescimento de tecido ser interrompido no ponto em que as bordas da ferida se juntam. Entretanto, células cancerígenas tendem a crescer  desenfreadamente,  sem  considerar  o  tecido  adjacente.  Possíveis  explicações  para  que  células  cancerígenas percam  a  capacidade  de  inibição  por  contato  dependente  de  densidade  incluem  a  independência  do  fator  de crescimento, mecanismos oxidativos14,15 e alterações nas interações entre as vias de sinalização para adesão celular e crescimento (p. ex., receptores superficiais de integrinas, proteínas quinases ativadas por mitógenos [MAP, mitogen­ activated protein] e fosforilação de quinase de adesão focal [FAK, focal adhesion kinase]).14,16 Coesividade e adesividade celulares. A tendência reduzida das células de câncer para permanecerem unidas ( i. e.,

perda  de  coesividade  e  adesividade)  torna  possível  o  desprendimento  de  células  da  superfície  da  neoplasia;  essas células aparecem nos líquidos corporais ou secreções circundantes e podem ser detectadas pela utilização de métodos citológicos.  Caderinas  são  moléculas  de  adesão  que  ligam  uma  célula  a  outras  células  adjacentes.  No  meio extracelular, as caderinas de uma célula se ligam a caderinas de células adjacentes, formando a ligação de uma célula com  a  outra.  No  meio  intracelular,  as  caderinas  se  unem  ao  citoesqueleto  de  actina,  por  meio  de  intermediários  de proteínas, incluindo as cateninas. Alguns propõem que o complexo caderina­catenina­actina, agindo juntamente com outras proteínas, esteja envolvido com os processos de migração celular, apoptose e regulação do ciclo celular. Em alguns tipos de câncer, a molécula de adesão celular E­caderina parece desempenhar um papel importante na ausência de coesividade das células cancerígenas e na maior tendência para as células cancerígenas de se soltarem e migrarem para  os  tecidos  circundantes.  A  quantidade  de  E­caderina  é  reduzida  na  superfície  celular,  enquanto  sua  parceira proteína β­catenina se acumula no interior das células cancerígenas e se associa à proteína de ligação ao citoesqueleto de actina, actinina­4. Postula­se que a interação resultante entre β­catenina e actinina­4 na ausência de E­caderina é o “interruptor”  que  desliga  a  adesão  celular  de  células  cancerígenas  e  ativa  a  motilidade  dessas  células  e  outros mecanismos que facilitam a invasão e a metástase.17 Dependência  de  ancoragem.  As  células  cancerígenas  também  diferem  de  suas  homólogas  normais  por  terem independência  de  ancoragem.  Células  epiteliais  normais  devem  estar  ancoradas  em  células  vizinhas  ou  na  matriz extracelular  subjacente  para  que  possam  viver  e  crescer.  Se  uma  célula  normal  se  separa,  frequentemente  sofre  um tipo  de  apoptose  conhecido  como  anoiquia,  o  termo  de  origem  grega  para  “sem­teto”.  Células  epiteliais  normais devem  estar  conectadas  a  outras  células  ou  à  matriz  extracelular  para  que  possam  permanecer  vivas.  Células cancerígenas, no entanto, frequentemente permanecem viáveis e se multiplicam sem as conexões normais com outras células  ou  com  a  matriz  extracelular.  As  células  cancerígenas  conseguem  com  frequência  sobreviver  em microambientes  diferentes  dos  de  células  normais.  Embora  o  processo  de  independência  de  ancoragem  seja complexo e ainda não esteja totalmente esclarecido, estudos recentes têm mostrado progressos na compreensão dos genes, vias e mecanismos envolvidos.18 Comunicação entre as células. Outra característica das células cancerígenas é a comunicação defeituosa entre uma célula  e  outra,  uma  condição  que  por  sua  vez  contribui  para  outras  características  das  células  cancerígenas.  O comprometimento  da  comunicação  celular  interfere  na  formação  de  conexões  intercelulares  e  na  capacidade  de resposta aos sinais derivados da membrana. Por exemplo, existem relatos, para alguns tipos de câncer, de alterações nas  proteínas  das  máculas  comunicantes,  que  viabilizam  a  continuidade  citoplasmática  e  a  comunicação  entre  as células.19 Tempo de vida. Células cancerígenas diferem das células normais por serem imortais, com um tempo de vida útil ilimitado.  Se  células  normais,  não  cancerígenas,  são  coletadas  do  organismo  e  mantidas  em  cultura,  a  maioria  se divide  um  número  limitado  de  vezes,  normalmente  cerca  de  50  duplicações  da  população,  torna­se  senescente  e interrompe  o  processo  de  divisão.  Ao  contrário  do  período  de  vida  limitado  de  células  normais,  as  células cancerígenas se partem em um número infinito de vezes e, por conseguinte, alcançam a imortalidade. Os telômeros são  sequências  de  nucleotídios  curtas  e  repetitivas  nas  extremidades  periféricas  dos  braços  cromossômicos.  Os telômeros  encurtam  a  cada  divisão  celular.  Quando  o  comprimento  alcança  determinado  limite,  os  cromossomos  já não são mais capazes de replicação, e a divisão celular deixa de ocorrer. A maioria das células cancerígenas mantém altos  níveis  de  telomerase,  uma  enzima  que  impede  o  encurtamento  dos  telômeros.  Isso  impede  que  os  telômeros envelheçam e alcancem o nível crítico de tamanho associado à senescência replicativa da célula. Expressão  do  antígeno.  Células  cancerígenas  também  expressam  diversas  moléculas  de  superfície  celular  ou antígenos,  que  são  imunologicamente  identificadas  como  estranhas.  Os  genes  de  uma  célula  codificam  esses antígenos teciduais. Muitas células cancerígenas transformadas revertem para padrões embrionários de expressão do gene e produzem antígenos imunologicamente distintos dos antígenos que são expressos por células do tecido muito diferenciado  a  partir  do  qual  se  originou  o  câncer.  Alguns  cânceres  expressam  antígenos  fetais  que  não  são produzidos  por  células  comparáveis  no  adulto.  Antígenos  neoplásicos  podem  ser  clinicamente  úteis  como marcadores para indicar a existência, recorrência ou crescimento progressivo de um câncer. Produção  de  enzimas,  hormônios  e  outras  substâncias.  Células  cancerígenas  podem  produzir  substâncias  que células  normais  do  tecido  de  origem  não  produzem  ou  secretam  em  quantidades  menores.  Podem  também  secretar

enzimas  de  degradação  que  viabilizam  invasão  e  metástase.  Células  cancerígenas  também  podem  assumir  a  síntese de hormônios ou a produção e secreção de substâncias pró­coagulantes que afetam os mecanismos de coagulação. Alterações  do  citoesqueleto.  Por  fim,  as  células  cancerígenas  podem  apresentar  alterações  e  anormalidades  no citoesqueleto.  Isso  pode  envolver  o  surgimento  de  tipos  de  filamento  intermediário  anormal  ou  alterações  em filamentos  de  actina  e  microtúbulos,  que  facilitam  invasão  e  metástase.  O  papel  da  actina,  dos  microtúbulos  e  de suas proteínas reguladoras continua a ser o foco de muitas pesquisas relacionadas com o câncer.

Invasão e metástase Ao  contrário  de  neoplasias  benignas,  que  crescem  por  expansão  e  geralmente  são  envolvidas  por  uma  cápsula,  o câncer  se  dissemina  por  invasão  direta  e  extensão,  semeadura  de  células  cancerígenas  em  cavidades  orgânicas  e metástase  através  de  vasos  sanguíneos  ou  linfáticos.  A  palavra  câncer  deriva  da  palavra  latina  que  significa “caranguejo”, porque a doença cresce e se espalha enviando projeções para os tecidos circundantes como se fossem as patas de um caranguejo. A maioria dos cânceres sintetiza e secreta enzimas que degradam proteínas e contribuem para infiltração, invasão e penetração nos tecidos circundantes. A falta de uma linha de demarcação nítida que separe o  câncer  do  tecido  circundante  torna  a  remoção  cirúrgica  completa  de  uma  neoplasia  maligna  mais  difícil  do  que  a retirada de neoplasias benignas. Muitas vezes o cirurgião precisa extirpar porções de tecido aparentemente normal, pois fazem fronteira com a neoplasia para que o patologista possa estabelecer as margens livres de câncer em torno da neoplasia removida e garantir que o tecido restante seja livre de câncer. A  semeadura  de  células  cancerígenas  em  cavidades  orgânicas  ocorre  quando  uma  neoplasia  lança  células  nesses espaços  ocos.  Na  maioria  das  vezes,  dá­se  o  envolvimento  da  cavidade  peritoneal,  mas  outros  espaços,  como  a cavidade pleural, cavidade pericardial e espaços articulares também podem ser comprometidos. A semeadura para a cavidade peritoneal é particularmente comum em casos de câncer de ovário. De modo similar ao que se verifica na cultura de tecidos, as neoplasias nestes locais crescem em massas e estão associadas ao acúmulo de líquido (p. ex., ascite, derrame pleural).2 A  semeadura  de  um  câncer  em  outras  áreas  do  corpo  frequentemente  é  resultado  de  uma complicação  pós­operatória,  depois  da  remoção  da  neoplasia.  O  termo  metástase  é  empregado  para  descrever  o desenvolvimento  de  uma  neoplasia  secundária,  em  uma  região  distante  da  neoplasia  primária.2,13  Como  neoplasias metastáticas  retêm  com  frequência  muitas  características  da  neoplasia  primária  da  qual  se  originaram,  por  vezes  é possível  determinar  o  local  primário  da  neoplasia  a  partir  das  características  celulares  da  neoplasia  metastática. Algumas  neoplasias  tendem  a  apresentar  metástase  no  início  de  seu  desenvolvimento,  enquanto  outras  não apresentam metástase até mais tarde no curso da doença. Ocasionalmente, uma neoplasia metastática será encontrada muito antes que a neoplasia primária se torne clinicamente detectável. As neoplasias malignas do rim, por exemplo, podem  permanecer  totalmente  indetectáveis  e  assintomáticas  até  que  uma  lesão  metastática  seja  encontrada  no pulmão. A  metástase  ocorre  através  dos  canais  linfáticos  (disseminação  linfática)  e  vasos  sanguíneos  (disseminação hematogênica).2  Em  muitos  tipos  de  câncer,  a  primeira  evidência  de  doença  disseminada  é  a  existência  de  células neoplásicas nos linfonodos que drenam a área da neoplasia. Quando a metástase ocorre através dos vasos linfáticos, as  células  neoplásicas  se  alojam  inicialmente  no  primeiro  linfonodo  que  recebe  a  drenagem  da  área  da  neoplasia. Depois de instaladas nesse linfonodo, as células podem morrer devido à falta de um ambiente adequado, crescer e se transformar em uma massa discernível ou permanecer dormentes, por motivos desconhecidos. Quando sobrevivem e crescem, as células cancerígenas podem se disseminar a partir de linfonodos mais distantes para o ducto torácico e, desse modo, ter acesso à vasculatura. O termo linfonodo sentinela é empregado para descrever o primeiro linfonodo que recebe a drenagem da neoplasia primária.2  Como  a  metástase  inicial  no  câncer  de  mama  é  quase  sempre  linfática,  a  disseminação  linfática  e, portanto,  a  expansão  da  doença  pode  ser  determinada  por  meio  do  mapeamento  linfático  e  da  biopsia  do  linfonodo sentinela. Isso é feito pela injeção de um marcador radioativo e/ou corante azul na neoplasia para determinar qual é o primeiro  linfonodo  no  percurso  de  drenagem  linfática  do  câncer.  Uma  vez  identificado  o  linfonodo  sentinela,  ele  é examinado  para  determinar  se  há  ou  não  células  cancerígenas.  O  procedimento  também  é  utilizado  para  mapear  a propagação  de  melanoma  e  outros  tipos  de  câncer  que  têm  disseminação  metastática  inicial  através  do  sistema linfático. Nos  casos  em  que  ocorre  disseminação  hematológica,  as  células  cancerígenas  transmitidas  pelo  sangue  podem

entrar no fluxo venoso que drena o local da neoplasia primária. As células cancerígenas também podem penetrar os vasos sanguíneos associados à neoplasia que se infiltram nela ou são encontrados em sua periferia. Antes de entrar na  circulação  geral,  o  sangue  venoso  proveniente  do  sistema  digestório,  pâncreas  e  baço  é  encaminhado  através  da veia  porta  para  o  fígado.  Portanto,  o  fígado  é  um  local  comum  para  metástase  de  cânceres  que  se  originam  nesses órgãos.  Embora  o  local  de  propagação  hematológica  geralmente  esteja  relacionado  com  a  drenagem  vascular  da neoplasia  primária,  algumas  neoplasias  desenvolvem  metástases  para  áreas  distantes  e  independentes.  Uma explicação  para  esse  tipo  de  ocorrência  é  que  células  de  diferentes  neoplasias  tendem  a  apresentar  metástase  para órgãos­alvo específicos, que proporcionam microambientes adequados por conterem substâncias como citocinas ou fatores de crescimento, necessárias à sua sobrevivência.2 Por exemplo, a transferrina, uma substância promotora do crescimento,  que  é  isolada  de  tecido  pulmonar,  estimula  o  crescimento  de  células  malignas  que  tipicamente  fazem metástase  para  os  pulmões.  Outros  órgãos  considerados  locais  preferenciais  para  metástases  contêm  citocinas  e fatores de crescimento específicos, além de outras características microambientais que facilitam a sobrevivência e o crescimento da neoplasia metastática. A  natureza  seletiva  da  disseminação  hematológica  indica  que  a  metástase  é  um  processo  finamente  orquestrado, que  inclui  várias  etapas  e  apenas  um  pequeno  clone  de  células  selecionadas  de  câncer  tem  a  combinação  certa  de produtos  genéticos  para  executar  todos  os  passos  necessários  para  o  estabelecimento  de  uma  neoplasia  secundária. Para formar metástases, uma célula neoplásica deve ser capaz de se separar da neoplasia primária, invadir a matriz extracelular  circundante,  ter  acesso  a  um  vaso  sanguíneo,  sobreviver  à  sua  passagem  pela  corrente  sanguínea  e emergir em um local favorável, invadir o tecido circundante, começar a crescer e estabelecer suprimento sanguíneo (Figura  8.8).  No  entanto,  também  existem  evidências  crescentes  do  papel  significativo  do  ecossistema  da  célula cancerosa  –  que  inclui,  mas  não  se  resume  à  matriz  extracelular,  às  células  neurais,  aos  leucócitos,  às  células endoteliais, aos adipócitos, aos fibroblastos e aos macrófagos – em possibilitar que células cancerígenas estabeleçam locais de metástase2 (Figura 8.9).

Figura 8.8 • Mecanismos de metástase neoplásica. Etapas pelas quais uma neoplasia maligna penetra a membrana basal  e  invade  o  ambiente  extracelular.  Primeiramente,  a  neoplasia  adquire  a  capacidade  de  se  ligar  aos componentes  da  matriz  extracelular.  Diversas  moléculas  de  adesão  fazem  a  mediação  dessa  ligação.  Em  seguida, são  liberadas  enzimas  proteolíticas  das  células  neoplásicas,  e  a  matriz  extracelular  sofre  degradação.  O  câncer invasor  se  move  através  do  meio  extracelular  e,  em  seguida,  penetra  nos  vasos  sanguíneos  e  linfáticos  pelos mesmos  mecanismos.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.).  (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 193). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Um número considerável de evidências indica que células neoplásicas capazes de metástase secretam enzimas que degradam a matriz extracelular circundante, o que lhes possibilita passar rapidamente pela matriz degradada e ganhar acesso  a  um  vaso  sanguíneo.20  Uma  vez  na  circulação,  as  células  neoplásicas  ficam  vulneráveis  à  destruição  por células  hospedeiras  imunes. Algumas  células  neoplásicas  conseguem  obter  proteção  contra  as  células  hospedeiras

antineoplásicas por agregação e aderência a componentes do sangue circulante, principalmente plaquetas, para formar êmbolos  neoplásicos. As  células  neoplásicas  que  conseguem  sobreviver  ao  trajeto  na  circulação  devem  ser  capazes de  interromper  sua  passagem  aderindo­se  à  parede  do  vaso.  As  células  neoplásicas  expressam  vários  fatores  de ligação da superfície celular, como receptores de laminina que facilitam sua fixação à laminina na membrana basal. Depois de fixadas, as células neoplásicas secretam enzimas proteolíticas, como a colagenase tipo IV, que degradam a membrana basal e facilitam sua migração através da membrana capilar até a área intersticial, em que posteriormente estabelecem o crescimento de uma neoplasia secundária. Uma  vez  no  local  do  tecido  distante,  o  processo  de  desenvolvimento  da  neoplasia  metastática  depende  do estabelecimento de vasos sanguíneos e fatores de crescimento específicos que promovem a proliferação das células neoplásicas.  Essas  células,  bem  como  as  outras  células  nesse  microambiente,  secretam  fatores  que  possibilitam  o desenvolvimento  de  novos  vasos  sanguíneos  no  interior  da  neoplasia,  um  processo  denominado  angiogênese.2  A existência de fatores de crescimento estimuladores ou inibidores se correlaciona com o padrão específico do local de metástase.

Crescimento neoplásico Depois  que  as  células  têm  um  suprimento  de  sangue  adequado,  a  taxa  de  crescimento  tecidual  em  tecido  normal  e canceroso depende de três fatores: 1. Do número de células que se dividem ou que se deslocam ativamente ao longo do ciclo celular 2. Da duração do ciclo celular 3. Do número de células perdidas em relação ao número de novas células sendo produzidas. Uma  das  razões  pelas  quais  neoplasias  cancerosas  frequentemente  parecem  crescer  tão  rapidamente  está relacionada com o tamanho do pool celular que participa ativamente do ciclo celular. Vem sendo demonstrado que a duração do ciclo celular das células do tecido canceroso não é necessariamente menor do que o de células normais. O que  acontece  é  que  células  cancerígenas  não  morrem  dentro  do  cronograma  estabelecido  e  fatores  de  crescimento impedem que deixem o ciclo celular e entrem na fase G0. Desse modo, uma porcentagem maior de células permanece ativamente no ciclo, mais do que ocorre no tecido normal. A  relação  entre  células  em  divisão  e  células  em  repouso  de  uma  massa  de  tecido  é  chamada  de  fração  de crescimento.  O  tempo  de  duplicação  é  o  período  necessário  para  que  a  massa  total  de  células  de  uma  neoplasia dobre. À medida que aumenta a fração de crescimento, diminui o tempo de duplicação. Quando os tecidos normais alcançam seu tamanho adulto, é alcançado um equilíbrio entre o nascimento e morte de células. Entretanto, as células cancerígenas  continuam  a  se  dividir  até  que  limitações  no  suprimento  sanguíneo  e  no  fornecimento  de  nutrientes venham a inibir seu crescimento. Quando isso acontece, o tempo de duplicação das células cancerígenas diminui. Se o  crescimento  da  neoplasia  é  representado  em  função  do  tempo  em  uma  escala  semilogarítmica,  a  taxa  de crescimento  inicial  é  exponencial  e,  em  seguida,  tende  a  diminuir  ou  se  manter  ao  longo  do  tempo.  Essa caracterização do crescimento neoplásico é denominada modelo de Gompertzian e é usada para estudar os efeitos de medicamentos em células neoplásicas.2

Figura  8.9  •  Ecossistema  de  células  cancerígenas.  As  novas  células  cancerígenas  interagem  com  células  não malignas em seu ambiente. (Extraída de Rubin R., Strayer D. S. (Eds.). (2012). Rubin’s pathology: Clinicopathologic foundations of medicine (6th ed., p. 194). Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.)

Com a utilização de métodos radiográficos convencionais, uma neoplasia normalmente não é detectável até que se duplique 30 vezes e contenha mais de 1 bilhão de células (109). Neste ponto, mede aproximadamente 1 cm. Métodos para identificação de neoplasias de menor tamanho estão sendo pesquisados. Em alguns casos, a ultrassonografia e a ressonância  magnética  (RM)  possibilitam  a  detecção  de  neoplasias  com  menos  de  1  cm.  Após  35  duplicações,  a massa contém mais de 1 trilhão de células (1012), número suficiente para matar o hospedeiro.

Resumo

Neoplasias podem ser benignas ou malignas. Neoplasias benignas e malignas diferem em termos de características das  células,  modo  de  crescimento,  taxa  de  crescimento,  potencial  para  formação  de  metástase,  capacidade  de produzir  efeitos  generalizados,  tendência  a  causar  destruição  tecidual  e  capacidade  de  causar  a  morte.  O crescimento  de  uma  neoplasia  benigna  é  restrito  ao  local  de  origem,  e  este  crescimento  geralmente  não  causa  a morte, a não ser quando interfere nas funções vitais. As neoplasias malignas crescem de modo descontrolado, em que falta organização normal, espalham­se para áreas distantes no organismo e provocam a morte, a não ser quando o  crescimento  ou  a  metástase  neoplásica  sejam  inibidos  ou  interrompidos  por  meio  de  tratamento.  Existem  dois tipos  básicos  de  câncer:  neoplasias  sólidas  e  neoplasias  hematológicas.  Nas  neoplasias  sólidas,  inicialmente  a neoplasia  primária  permanece  confinada  a  um  órgão  ou  tecido  específico,  enquanto  nos  casos  de  neoplasia hematológica a disseminação ocorre desde o início. O câncer é um distúrbio de proliferação e diferenciação celulares. O termo anaplasia  é  usado  para  descrever  a perda de diferenciação celular no tecido canceroso. Células cancerígenas indiferenciadas são caracterizadas por uma série  de  alterações  morfológicas,  incluindo  variações  no  tamanho  e  na  forma,  uma  condição  denominada pleomorfismo. As características de proliferação e de diferenciação alteradas estão associadas a uma série de outras

mudanças  nas  características  e  no  funcionamento  celular,  incluindo  instabilidade  genética;  independência  do  fator de  crescimento,  perda  da  inibição  dependente  de  densidade,  coesividade  e  adesividade,  e  dependência  de ancoragem;  falhas  na  comunicação  entre  células;  tempo  de  vida  indeterminado  (imortalidade);  expressão  de antígenos teciduais alterados; secreção anormal de enzimas de degradação que viabilizam invasão e metástase, ou produção ectópica de hormônios; e características anormais do citoesqueleto. A  propagação  do  câncer  ocorre  por  três  vias:  invasão  direta  e  extensão;  semeadura  de  células  cancerígenas  em cavidades  orgânicas  e  metástase  através  de  vasos  sanguíneos  ou  linfáticos.  Apenas  uma  pequena  proporção  do clone de células cancerígenas é capaz de metástase. Para formar metástases, uma célula neoplásica deve ser capaz de  se  soltar  da  neoplasia  primária;  invadir  a  matriz  extracelular  circundante;  ter  acesso  a  um  vaso  sanguíneo; sobreviver  ao  trajeto  na  corrente  sanguínea  e  emergir  em  um  local  favorável;  invadir  o  tecido  circundante  e começar a crescer. A taxa de crescimento do tecido canceroso depende da relação entre células em divisão e células em  repouso  (fração  de  crescimento)  e  do  tempo  necessário  para  que  todas  as  células  da  neoplasia  se  dupliquem (tempo de duplicação). Geralmente, uma neoplasia é indetectável até que ocorram 30 duplicações e contenha mais de 1 bilhão de células.

Etiologia do câncer

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever os vários tipos de genes associados ao câncer e as vias celulares e moleculares associadas ao câncer



Descrever os eventos genéticos e fatores epigenéticos importantes na tumorigênese



Descrever a importância das células-tronco neoplásicas, da angiogênese e do microambiente celular no crescimento do câncer e na formação de

metástase

As causas do câncer são variadas e complexas. A causalidade deve ser discutida em termos de: 1. Mecanismos  genéticos  e  moleculares  envolvidos  e  que  caracterizam  a  transformação  de  células  normais  em células cancerígenas 2. Fatores externos e mais contextualizados, como idade, hereditariedade e agentes ambientais, que contribuem para o desenvolvimento e a progressão do câncer. Juntos, os dois mecanismos contribuem para a rede causal multidimensional por intermédio da qual os cânceres se desenvolvem e progridem ao longo do tempo.

Bases genética e molecular do câncer Acredita­se que a patogênese molecular da maioria dos cânceres se origine a partir de um dano genético ou mutação, com  as  consequentes  alterações  na  fisiologia  celular  que  transformam  uma  célula  com  funcionamento  normal  em uma célula cancerosa. Fatores epigenéticos que envolvem o silenciamento de um gene ou mais genes também podem estar  envolvidos  na  patogênese  molecular  do  câncer.  Nos  últimos  anos,  foi  identificado  um  papel  importante  para células­tronco neoplásicas na patogênese do câncer, aspecto que continua a ser pesquisado. Enfim, o microambiente celular,  que  envolve  vários  tipos  de  células,  o  meio  complexo  de  citocinas  e  fatores  de  crescimento,  assim  como  a matriz  extracelular  atualmente  são  reconhecidos  como  contribuintes  importantes  para  o  desenvolvimento,  o crescimento e a progressão do câncer.

Genes associados ao câncer A  maioria  dos  genes  associados  ao  câncer  pode  ser  classificada  em  duas  grandes  categorias,  com  base  no  fato  de uma hiperatividade ou hipoatividade de um gene aumentar o risco de câncer. A categoria associada à hiperatividade do  gene  envolve  proto­oncogenes,  que  são  genes  normais  que  se  tornam  oncogenes  causadores  de  câncer  quando sofrem  mutação.  Os  proto­oncogenes  codificam  proteínas  celulares  normais,  como  fatores  de  crescimento, receptores  de  fator  de  crescimento,  moléculas  de  sinalização  de  fator  de  crescimento  e  fatores  de  transcrição  que promovem o crescimento celular ou incrementam a sinalização dependente de fator de crescimento. Por exemplo, o

proto­oncogene  C­Myc  está  relacionado  com  o  carcinoma  oral  espinocelular.  O  aumento  na  atividade  do  proto­ oncogene  é  influenciado  pela  dieta,  consequentemente  isso  leva  à  promoção  de  uma  dieta  equilibrada  para  tentar diminuir a atividade do proto­oncogene.21,22 A  categoria  associada  à  hipoatividade  do  gene  inclui  os  genes  supressores  de  neoplasia,  que,  por  serem  menos ativos,  criam  um  ambiente  que  promove  o  desenvolvimento  do  câncer.  Genes  supressores  de  neoplasia  incluem  o gene do retinoblastoma (RB), que normalmente impede a divisão celular, e o gene TP53, que normalmente se torna ativo  em  células  com  DNA  danificado  para  iniciar  apoptose. 2,23 A  perda  de  atividade  de  RB  pode  acelerar  o  ciclo celular  e  conduzir  a  um  aumento  da  proliferação  celular,24  enquanto  a  inatividade  de  TP53  pode  aumentar  a sobrevivência  de  células  com  DNA  danificado.  O  gene  TP53  tornou­se  um  indicador  confiável  do  prognóstico. 23 Existem  diversos  eventos  genéticos  capazes  de  levar  à  formação  de  oncogene  ou  à  perda  de  função  do  gene supressor de neoplasia. Eventos genéticos que conduzem à formação ou à ativação do oncogene. Existe uma série de eventos genéticos que criam ou ativam oncogenes. Um evento comum é uma mutação pontual na qual ocorre a mudança de uma única base  do  nucleotídio,  devido  a  uma  inserção,  deleção  ou  substituição.  Um  exemplo  de  oncogene  causado  por mutações  pontuais  é  o  oncogene  ras,  que  foi  encontrado  em  muitos  tipos  de  câncer.  Os  membros  da  família  do proto­oncogene ras são proteínas de retransmissão de sinal importantes, que transmitem sinais de crescimento para o núcleo. Desse modo, a ativação do oncogene ras pode aumentar a proliferação celular. Tradicionalmente,  as  translocações  cromossômicas  têm  sido  associadas  a  determinados  tipos  de  câncer,  como linfoma de Burkitt e leucemia mieloide crônica (LMC). No linfoma de Burkitt, o proto­oncogene myc, que codifica uma  proteína  de  sinalização  de  crescimento,  é  translocado  de  sua  posição  normal  no  cromossomo  8  para  o cromossomo 142,3 (Figura 8.10 C). O resultado da translocação em LMC é o aparecimento do chamado cromossomo Filadélfia,  envolvendo  os  cromossomos  9  e  22,  e  a  formação  de  uma  proteína  de  fusão  anormal,  uma  proteína oncogênica híbrida (bcr–abl), que promove a proliferação celular (Figura 8.10 A e B ). A biotecnologia e a genômica estão  possibilitando  a  identificação  de  translocações  de  genes  e  maior  compreensão  de  como  essas  translocações, ainda que no mesmo cromossomo, contribuem para a tumorigênese pela criação de proteínas de fusão anormais que promovem a proliferação celular. Outro evento genético comum em casos de câncer é a amplificação do gene. Várias cópias de determinados genes pode  levar  a  uma  hiperexpressão,  com  níveis  maiores  que  o  normal  de  proteínas  que  incrementam  a  proliferação celular.  Por  exemplo,  o  gene  do  receptor  tipo  2  do  fator  de  crescimento  epidérmico  humano  (HER­2/neu)  está amplificado  em  muitos  casos  de  câncer  de  mama;  sua  existência  indica  um  tumor  agressivo,  com  um  prognóstico desfavorável.25 Um dos agentes utilizados no tratamento de câncer de mama por hiperexpressão de HER­2/neu é o trastuzumabe, um anticorpo monoclonal que se liga seletivamente a HER­2, inibindo assim a proliferação de células neoplásicas com hiperexpressão de HER­2. Eventos genéticos que conduzem à perda de função do gene supressor de neoplasia. Os genes supressores de neoplasia inibem a proliferação de células neoplásicas. Quando esse tipo de gene é inativado, um sinal genético que normalmente inibe a proliferação celular é removido, dando início ao crescimento desordenado. Foram encontrados vários  genes  supressores  de  neoplasias,  relacionados  com  diferentes  tipos  de  câncer.2  Deve  despertar  interesse particular o gene TP53, localizado no braço curto do cromossomo 17, que codifica a proteína p53. Mutações no gene TP53 têm sido associadas ao câncer de pulmão, mama e cólon.23 O gene TP53 também parece iniciar apoptose em células neoplásicas danificadas por radioterapia e quimioterapia. Embora  geralmente  uma  única  mutação  desempenhe  o  papel  principal  na  ativação  do  oncogene,  podem  ser necessários para o mau funcionamento de genes supressores de neoplasia “dois eventos” (two hits) que contribuem para  a  perda  total  da  função,  como  sugerido  pela  hipótese  carcinogênica  dos  “dois  eventos”2  (Figura  8.11).  O primeiro evento pode ser uma mutação pontual em um dos alelos de um cromossomo particular; mais tarde, ocorre um  segundo  evento,  que  envolve  o  outro  alelo  do  gene.  Nos  casos  hereditários,  o  primeiro  evento  é  herdado  do progenitor  afetado  e,  portanto,  consta  em  todas  as  células  somáticas  do  organismo.  Em  casos  de  RB,  o  segundo evento acontece em uma das muitas células da retina (que já carregam o gene mutante). Em casos esporádicos (não herdados),  dão­se  as  duas  mutações  (eventos)  em  uma  única  célula  somática,  cuja  descendência  formará  o  câncer. Em  indivíduos  portadores  de  uma  mutação  herdada,  como  o  alelo  mutante  RB,  todas  as  células  somáticas  são perfeitamente  normais,  exceto  pelo  aumento  do  risco  de  desenvolvimento  de  câncer.  Esse  indivíduo  é  considerado

heterozigoto  para  o  locus  do  gene.  O  câncer  se  desenvolve  quando  o  indivíduo  se  torna  homozigoto  para  o  alelo mutante, uma condição chamada de perda de heterozigotia, que confere um prognóstico desfavorável.2 Por exemplo, sabe­se que ocorre perda de heterozigotia em casos de câncer hereditário, em que um gene mutante é herdado de um dos pais, e em outras condições (p. ex., exposição à radiação) que tornam o indivíduo mais suscetível ao câncer.

Figura  8.10  •  Ativação  do  oncogene  por  translocação  cromossômica.  A.  Leucemia  mieloide  crônica.  Ocorre translocação  recíproca  nas  quebras  das  extremidades  dos  braços  longos  dos  cromossomos  9  e  22.  Isso  resulta  no cromossomo  Filadélfia  (Ph1),  que  contém  um  novo  gene  de  fusão  que  codifica  uma  proteína  oncogênica  híbrida (bcr–abl),  provavelmente  envolvida  na  patogênese  da  leucemia  mieloide  crônica.  B. Cariótipos de um paciente com LMC mostrando os resultados de translocações recíprocas entre os cromossomos 9 e 22. O cromossomo Filadélfia é reconhecido por um cromossomo 22 menor do que o normal (22q–). Um cromossomo 9 (9q+) é maior do que o seu par normal. C. Linfoma de Burkitt. Quebras cromossômicas envolvem os braços longos dos cromossomos 8 e 14. O gene  c­myc  do  cromossomo  8  é  translocado  para  uma  região  no  cromossomo  14,  adjacente  ao  gene  que  codifica para  a  região  constante  da  cadeia  pesada  da  imunoglobulina  (CH).  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.). (2012).  Rubin’s  pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  174).  Philadelphia,  PA:  Lippincott Williams & Wilkins.)

Figura 8.11 • A origem dos “dois eventos” (two­hit) do RB. A. Uma criança com uma forma hereditária de RB  nasce com uma mutação na linhagem germinativa em um alelo do gene RB localizado no braço longo do cromossomo 13. Uma  segunda  mutação  somática  na  retina  conduz  à  inativação  do  alelo  RB  de  funcionamento  normal  e  ao desenvolvimento  subsequente  de  RB.  B.  Em  casos  esporádicos  (não  herdados)  de  RB,  a  criança  nasce  com  dois alelos normais RB.  São  necessárias  duas  mutações  somáticas  independentes  para  inativar  a  função  do  gene  RB  e tornar  possível  o  surgimento  do  clone  neoplásico.  (Extraída  de  Rubin  R.,  Strayer  D.  S.  (Eds.).  (2012).  Rubin’s pathology:  Clinicopathologic  foundations  of  medicine  (6th  ed.,  p.  178).  Philadelphia,  PA:  Lippincott  Williams  & Wilkins.)

Mecanismos epigenéticos Além  dos  mecanismos  que  abrangem  alterações  estruturais  no  DNA  e  nos  cromossomos,  há  mecanismos moleculares e celulares, denominados mecanismos epigenéticos, que envolvem alterações nos padrões de expressão de  genes,  sem  alteração  no  DNA.  Os  mecanismos  epigenéticos  podem  “silenciar”  certos  genes,  como  genes supressores de neoplasia, de modo que, mesmo que o gene exista, ele não seja expresso, deixando de produzir uma proteína  supressora  de  câncer.  Um  destes  mecanismos  de  silenciamento  epigenético  é  a  metilação  da  região promotora do gene, que impede uma mudança de transcrição e provoca a inatividade do gene. Genes silenciados por hipermetilação  podem  ser  herdados,  e  o  silenciamento  epigenético  de  genes  poderia  ser  o  primeiro  evento  na hipótese  de  dois  eventos  descrita  anteriormente.22  Os  mecanismos  epigenéticos  que  alteram  a  expressão  de  genes associados ao câncer ainda estão sendo pesquisados. Os dois agentes de hipometilação disponíveis para o tratamento da síndrome mielodisplásica (SMD) e da leucemia mieloide aguda (LMA) são azacitidina e decitabina.2

Vias molecular e celular Existem  inúmeros  mecanismos  moleculares  e  celulares  com  uma  infinidade  de  vias  e  genes  associados  conhecidos ou suspeitos por facilitar o desenvolvimento do câncer. Genes que aumentam a suscetibilidade ao câncer ou facilitam seu  desenvolvimento  incluem  falhas  nos  mecanismos  de  reparo  do  DNA,  nas  vias  de  sinalização  do  fator  de crescimento, evasão de apoptose, impedimento da senescência celular, desenvolvimento de angiogênese sustentada e metástase e invasão. Além disso, ocorre o envolvimento de mutações genéticas associadas, que viabilizam a invasão e sobrevivência em tecidos vizinhos, bem como a evasão da detecção e ataque imunológicos. Defeitos  no  reparo  do  DNA.  Mecanismos  genéticos  que  regulam  a  reparação  de  DNA  danificado  têm  sido implicados  no  processo  de  oncogênese  (Figura  8.12).  Os  genes  de  reparo  de  DNA  afetam  a  proliferação  e  a sobrevivência celulares indiretamente, por meio de sua capacidade de reparar danos em proto­oncogenes, genes que

influenciam  a  apoptose  e  genes  supressores  de  neoplasia.2  Danos  genéticos  podem  ser  causados  pela  ação  de produtos químicos, radiação ou vírus, ou podem ser herdados na linhagem germinativa. Significativamente, verifica­ se que a aquisição de uma mutação de um único gene não é suficiente para transformar células normais em células cancerígenas. Em vez disso, a transformação cancerosa parece exigir a ativação de vários genes mutantes de maneira independente. Defeitos nas vias de sinalização do fator de crescimento. Um modo relativamente comum mediante o qual células cancerígenas adquirem crescimento autônomo são mutações em genes que controlam as vias de sinalização do fator de  crescimento.  Essas  vias  de  sinalização  conectam  receptores  do  fator  de  crescimento  aos  seus  alvos  nucleares.2 Em condições normais, a proliferação das células envolve a ligação de um fator de crescimento ao seu receptor na membrana celular, a ativação do receptor do fator de crescimento sobre a superfície interna da membrana celular, a transferência  do  sinal  através  do  citosol  até  o  núcleo  por  proteínas  de  transdução  de  sinais  que  funcionam  como mensageiros secundários, a indução e ativação de fatores de regulação que iniciam a transcrição de DNA e a entrada da  célula  no  ciclo  celular  (Figura 8.13).  Muitas  das  proteínas  envolvidas  nas  vias  de  sinalização  que  controlam  a ação  de  fatores  de  crescimento  exercem  seus  efeitos  por  meio  de  quinases,  enzimas  que  fosforilam  proteínas.  Em certos  tipos  de  câncer,  como  LMC,  ocorre  uma  mutação  no  proto­oncogene  que  controla  a  atividade  da tirosinoquinase, provocando a desorganização do crescimento e da proliferação celulares.

Figura  8.12  •  Fluxograma  representando  os  estágios  de  desenvolvimento  de  uma  neoplasia  maligna  resultante  da exposição a um agente oncogênico que danifica o DNA. Quando há genes de reparação de DNA (seta vermelha),  o DNA é restaurado e não acontece a mutação genética.

Evasão da apoptose. Mecanismos defeituosos da apoptose têm um papel importante no desenvolvimento do câncer. A falha na apoptose normal de células cancerígenas pode ser o resultado de vários problemas. Pode haver alteração de sinalização da sobrevivência celular, ativação excessiva de proteínas ras, mutações no gene TP53, infrarregulação dos receptores de morte celular (p. ex., TRAIL), estabilização da mitocôndria, inativação de proteínas pró­apoptose (p. ex., metilação de caspase­8), hiperatividade do fator kappa B nuclear (NF­κB), produção de proteínas de choque térmico,  ou  falha  nas  células  do  sistema  imunológico  que  induzem  a  morte  celular.26  Em  muitos  casos  de  câncer, foram encontradas alterações nas vias apoptóticas e antiapoptóticas, em genes e proteínas. Um exemplo são os níveis elevados da proteína antiapoptótica Bcl­2 que ocorre secundariamente à translocação cromossômica em determinados linfomas  de  células  B.  A  membrana  mitocondrial  é  um  regulador  fundamental  para  o  equilíbrio  entre  morte  e sobrevivência celular. As proteínas da família Bcl­2 estão localizadas na membrana mitocondrial interna e são pró­ apoptóticas  ou  antiapoptóticas.  Como  a  apoptose  é  considerada  uma  resposta  celular  normal  a  danos  no  DNA,  a perda  de  vias  apoptóticas  normais  pode  contribuir  para  o  desenvolvimento  de  câncer,  tornando  possível  a

sobrevivência de células com DNA danificado.

Figura  8.13  •  Via  dos  genes  de  regulação  do  crescimento  e  replicação  celulares.  A  estimulação  de  uma  célula normal  por  um  fator  de  crescimento  resulta  na  ativação  do  receptor  do  fator  de  crescimento  e  de  proteínas  de sinalização,  que  transmitem  o  sinal  de  promoção  do  crescimento  para  o  núcleo,  onde  ocorre  a  modulação  da transcrição  de  genes  e  a  progressão  por  meio  do  ciclo  celular.  Muitas  dessas  proteínas  sinalizadoras  exercem  seus efeitos por enzimas denominadas quinases, que fosforilam proteínas. MAP, proteína ativada por mitógeno.

Evasão da senescência celular.  Outra  resposta  celular  normal  para  danos  no  DNA  é  a  senescência  celular.  Como declarado  anteriormente,  as  células  cancerígenas  se  caracterizam  pela  imortalidade  devido  a  níveis  elevados  de telomerase,  que  impede  o  envelhecimento  e  a  senescência  celulares. Altos  níveis  de  telomerase  e  a  prevenção  do encurtamento  dos  telômeros  também  podem  contribuir  para  o  desenvolvimento  e  a  progressão  de  câncer,  porque  a senescência é considerada uma resposta normal ao dano no DNA de células, bem como um mecanismo supressor de neoplasia, e, em sistemas­modelo, telômeros curtos limitam o crescimento do câncer.27,28 Desenvolvimento  de  angiogênese  sustentada.  Mesmo  com  todas  as  anormalidades  genéticas  mencionadas,  as neoplasias  não  podem  crescer  a  menos  que  ocorra  angiogênese,  para  fornecer  os  vasos  sanguíneos  necessários  à sobrevivência. A angiogênese é necessária não apenas para manter o crescimento da neoplasia, mas também para a formação  de  metástase.  A  base  molecular  para  o  interruptor  angiogênico  é  desconhecida,  mas  parece  envolver aumento  da  produção  de  fatores  angiogênicos  ou  perda  de  inibidores  angiogênicos.  O  gene  TP53  normal  parece inibir  a  angiogênese  por  induzir  a  síntese  de  uma  molécula  antiangiogênica  chamada  trombospondina­1.2  Com inativação  por  mutação  de  ambos  os  alelos  do  gene  TP53  (como  ocorre  em  muitos  cânceres),  os  níveis  de

trombospondina­1  caem  vertiginosamente,  pendendo  o  equilíbrio  em  favor  de  fatores  angiogênicos. A  angiogênese também  é  influenciada  por  hipoxia  e  liberação  de  proteases  envolvidas  na  regulação  do  equilíbrio  entre  fatores angiogênicos  e  antiangiogênicos.  Devido  ao  papel  fundamental  do  fator  angiogênico  no  crescimento  neoplásico,  o fármaco  bevacizumabe,  um  anticorpo  monoclonal,  foi  aprovado  para  o  tratamento  de  carcinoma  metastático colorretal  e  de  células  renais,  câncer  de  pulmão  de  células  não  pequenas  e  certos  tipos  de  neoplasias  cerebrais.2 A terapia  antiangiogênese  tem  mostrado  ações  antineoplásicas  sinérgicas  quando  combinada  com  as  formas convencionais de quimioterapia para o tratamento desse tipo de câncer. E também está sendo pesquisada sua eficácia para outros tipos de câncer. Além  disso,  a  terapia  antiangiogênese  pode  ter  ações  mais  amplas.  Por  exemplo,  atualmente  se  acredita  que células  cancerígenas  representem  uma  população  heterogênea  que  inclui  uma  população  de  células­tronco neoplásicas,  caracterizada  por  quiescência  mitótica  e  maior  capacidade  de  sobrevivência  à  ação  de  agentes quimioterápicos;  isso  torna  as  células­tronco  neoplásicas  particularmente  difíceis  de  tratar.  As  células­tronco neoplásicas podem estar localizadas próximas aos vasos sanguíneos, em que recebem sinais para autorrenovação. Invasão  e  metástase.  Em  suma,  é  conhecido  o  envolvimento  de  vários  genes  e  vias  moleculares  e  celulares  na invasão  e  formação  de  metástases.  Há  evidências  de  que  células  cancerígenas  com  propriedades  invasivas  são  na verdade  membros  da  população  de  células­tronco  neoplásicas,  anteriormente  discutidas.  Essa  evidência  sugere  que programas genéticos funcionando normalmente em células­tronco durante o desenvolvimento embrionário podem se tornar ativos em células­tronco neoplásicas, possibilitando que se soltem, atravessem as barreiras teciduais, escapem da  morte  por  anoiquia  e  colonizem  novos  tecidos.29  O  proto­oncogene  MET,  que  é  expresso  tanto  em  células estaminais quanto em células cancerígenas, é um regulador­chave do crescimento invasivo. Resultados de pesquisas sugerem  que  condições  adversas,  como  hipoxia  tecidual,  comumente  encontrada  em  neoplasias  cancerosas, desencadeiam esse comportamento invasivo por ativação do receptor tirosinoquinase do MET.

Importância do microambiente Tradicionalmente, a biologia molecular e celular do câncer tem focalizado o próprio câncer. Mais recentemente, tem sido descrito o papel importante do microambiente no desenvolvimento do câncer e de metástases. O microambiente celular do câncer consiste em vários tipos de células, incluindo macrófagos, fibroblastos, células endoteliais e uma variedade  de  células  imunológicas  e  inflamatórias;  matriz  extracelular;  e  substâncias  de  sinalização  primária,  como citocinas, quimiocinas e hormônios. Por exemplo, a sinalização da citocina para produção do fator de transformação de  crescimento  b  (TGF­β)  é  conhecida  por  ter  um  papel  importante  na  via  celular,  conduzindo  à  formação  ou supressão  de  células  de  câncer.30  A  capacidade  do  TGF­b  para  fazer  o  câncer  progredir  e  formar  metástase,  no entanto,  depende  do  microambiente  de  vários  tipos  de  células  e  cross­talk  de  sinais  entre  os  tipos  de  células.  Em alguns  casos,  o  fenótipo  de  uma  célula  cancerosa  pode  realmente  se  normalizar  quando  é  removido  do microambiente neoplásico e colocado em um ambiente normal, e vice­versa. Enfim, as etapas essenciais necessárias para  o  crescimento  de  neoplasias  e  metástases,  como  a  angiogênese  e  a  sobrevivência  da  neoplasia  metastática, dependem do microambiente.

Carcinogênese A  hipótese  é  de  que  o  processo  pelo  qual  agentes  carcinogênicos  (causadores  de  câncer)  transformam  células normais  em  células  cancerígenas  seja  um  mecanismo  de  várias  etapas,  que  pode  ser  dividido  em  três  estágios: iniciação, promoção e progressão (Figura 8.14). Iniciação é a primeira etapa e descreve a exposição das células a um agente  carcinogênico,  fazendo­as  vulneráveis  à  transformação  cancerígena.2  Os  agentes  carcinogênicos  podem  ser químicos,  físicos  e  biológicos  ou  produzir  alterações  irreversíveis  no  genoma  de  uma  célula,  previamente  normal. Como os efeitos dos agentes iniciadores são irreversíveis, várias doses divididas podem alcançar os mesmos efeitos de  uma  única  exposição  à  mesma  dose  total  ou  a  pequenas  quantidades  de  substâncias  altamente  cancerígenas. As células mais sensíveis a alterações mutagênicas são aquelas que estão em síntese ativa de DNA. Promoção é a segunda etapa, que viabiliza o crescimento exponencial de células, desencadeado por vários fatores de  crescimento  e  químicos.2 A  promoção  é  reversível  se  a  substância  promotora  for  removida.  Células  que  foram iniciadas  de  maneira  irreversível  podem  ser  promovidas,  mesmo  após  longos  períodos  de  latência.  O  período  de latência  varia  com  o  tipo  de  agente,  dose  e  características  das  células­alvo.  Muitos  carcinógenos  químicos  são

chamados de carcinógenos completos, porque podem iniciar e promover a transformação neoplásica. Progressão é a última etapa do processo e se manifesta quando as células neoplásicas adquirem alterações fenotípicas malignas que promovem invasão, competência metastática, tendência de crescimento autônomo e maior instabilidade do cariótipo.

Figura 8.14 • Processos de iniciação, promoção e progressão na evolução clonal de neoplasias malignas. A iniciação envolve  a  exposição  das  células  a  doses  determinadas  de  um  agente  cancerígeno;  a  promoção  é  o  crescimento desregulado  e  acelerado  das  células  transformadas;  e  a  progressão  é  a  aquisição  de  características  malignas  pelas células neoplásicas.

Fatores do hospedeiro e do ambiente Como o câncer não é uma única doença, é razoável supor que não tenha uma causa única. O mais provável é que o câncer  ocorra  devido  a  interações  entre  diversos  fatores  de  risco  ou  à  exposição  repetida  a  um  agente  cancerígeno específico. Entre os fatores de risco tradicionalmente associados ao câncer estão hereditariedade, fatores hormonais, mecanismos  imunológicos  e  agentes  ambientais,  como  produtos  químicos,  radiação  e  vírus  causadores  de  câncer. Mais recentemente, tem havido interesse na obesidade como fator de risco para o desenvolvimento de câncer. Tem sido  relatada  uma  associação  forte  e  consistente  entre  obesidade  e  mortalidade  por  todos  os  tipos  de  câncer  em homens  e  mulheres.31  Pessoas  obesas  tendem  a  produzir  maiores  quantidades  de  androgênios,  e  uma  parte  é convertida para a forma ativa do estrogênio no tecido adiposo, causando um estado funcional de hiperestrogenismo.

Devido à associação entre o uso de estrogênio na pós­menopausa e o câncer de mama e do endométrio, a relação é mais forte entre mulheres do que entre homens.31

Hereditariedade Vem  sendo  observada  uma  predisposição  hereditária  para  cerca  de  50  tipos  de  câncer  em  famílias.  O  câncer  de mama, por exemplo, ocorre mais frequentemente em mulheres cujas avós, mães, tias ou irmãs também tiveram uma neoplasia maligna de mama. A predisposição genética para o desenvolvimento de câncer tem sido documentada para diversas  lesões  cancerígenas  e  pré­cancerígenas  que  acompanham  padrões  de  herança  mendeliana.  Foram identificados dois genes supressores de neoplasia, chamados BRCA1 (carcinoma de mama 1) e BRCA2 (carcinoma de  mama  2)  em  casos  de  suscetibilidade  genética  ao  câncer  de  mama  e  de  ovário.2  Portadoras  de  uma  mutação BRCA apresentam risco de 80% (se viverem até 85 anos de idade) para o desenvolvimento de câncer de mama. O risco de desenvolver câncer de ovário é de 10 a 20% para portadoras de mutações no gene BRCA2 e de 40 a 60% para mutações em BRCA1.2  Esses  genes  também  têm  sido  associados  a  um  risco  maior  para  o  câncer  de  próstata, pâncreas, cólon e outros cânceres. Vários  tipos  de  câncer  exibem  um  padrão  de  hereditariedade  autossômico  dominante,  que  aumenta consideravelmente  o  risco  de  desenvolvimento  de  uma  neoplasia.2  A  mutação  herdada  geralmente  é  pontual  e acontece em um único alelo de um gene supressor de neoplasia. As pessoas que herdam o gene mutante nascem com uma  cópia  normal  e  uma  cópia  mutante  do  gene.32,33  Para  que  o  câncer  se  desenvolva,  o  gene  normal  deve  ser inativado,  geralmente  por  meio  de  uma  mutação  somática.  O  retinoblastoma,  uma  neoplasia  rara  da  retina  que  se desenvolve  na  infância,  é  um  exemplo  de  câncer  que  segue  um  padrão  de  hereditariedade  autossômico  dominante. Aproximadamente 1/3 dos casos de RB são herdados, e portadores do gene supressor de neoplasia RB mutante têm um  risco  significativamente  maior  para  o  desenvolvimento  de  RB,  geralmente  com  envolvimento  bilateral.32–34  A polipose adenomatosa familiar do cólon também segue um padrão de herança autossômica dominante. Essa condição é  causada  pela  mutação  de  outro  gene  supressor  de  neoplasia,  o  gene  APC.9  Pessoas  que  herdam  esse  gene desenvolvem centenas de pólipos adenomatosos e uma porcentagem pode se tornar cancerosa.35

Hormônios Hormônios  têm  recebido  considerável  atenção  de  pesquisadores  no  que  diz  respeito  ao  câncer  de  mama,  ovário  e endométrio  em  mulheres,  e  de  próstata  e  testículos  em  homens.  Embora  a  relação  entre  os  hormônios  e  o desenvolvimento do câncer não seja clara, tem sido sugerido que pode estar associado à capacidade dos hormônios para acionar a divisão celular de um fenótipo maligno. Devido a evidências de que hormônios endógenos afetam o risco  destes  tipos  de  câncer,  existe  uma  preocupação  em  relação  aos  efeitos  sobre  o  risco  de  desenvolvimento  de câncer pela administração dos mesmos hormônios, ou hormônios relacionados, para fins terapêuticos.

Mecanismos imunológicos Há  evidências  substanciais  da  participação  do  sistema  imunológico  na  resistência  contra  a  progressão  e  a disseminação  do  câncer.  O  conceito  central,  conhecido  como  hipótese  da  vigilância  imunológica,  proposto  pela primeira  vez  em  1909,  postula  que  o  sistema  imunológico  desempenha  um  papel  central  na  resistência  contra  o desenvolvimento  de  neoplasias.2,33  Além  das  interações  do  câncer  com  o  hospedeiro  como  mecanismo  de desenvolvimento  da  doença,  mecanismos  imunológicos  proporcionam  um  meio  para  detecção,  classificação  e prognóstico de cânceres e se apresentam como um método potencial de tratamento. Imunoterapia é uma modalidade de tratamento do câncer concebida para aumentar a resposta imunológica do indivíduo, para aumentar a possibilidade de destruição da neoplasia. Alguns  apontam  que  o  desenvolvimento  de  câncer  pode  estar  associado  à  deterioração  ou  ao  declínio  da capacidade  de  vigilância  do  sistema  imunológico.  Por  exemplo,  foi  observado  um  aumento  na  incidência  de  câncer em  indivíduos  com  condições  que  resultam  em  imunodeficiência  e  nos  receptores  de  transplantes  de  órgãos  que estão fazendo uso de medicação imunossupressora. A incidência de câncer também é maior em adultos mais velhos, nos quais é sabido que ocorre uma diminuição da atividade imunológica. A associação entre sarcoma de Kaposi e a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) enfatiza ainda mais o papel do sistema imunológico na prevenção da proliferação de células malignas. Há  demonstrações  de  que  a  maioria  das  células  neoplásicas  tem  configurações  moleculares  possíveis  de  ser

especificamente  reconhecidas  por  células  T  do  sistema  imunológico  ou  por  anticorpos  que,  portanto,  são denominados antígenos neoplásicos.  Os  antígenos  neoplásicos  mais  relevantes  se  enquadram  em  duas  categorias: únicos,  antígenos  neoplásicos  específicos  encontrados  apenas  em  células  da  neoplasia,  e  associados  a  neoplasias, encontrados em células neoplásicas e células normais. Praticamente  todos  os  componentes  do  sistema  imunológico  têm  o  potencial  para  erradicar  células  cancerígenas, incluindo  linfócitos T,  linfócitos  B  e  anticorpos,  macrófagos  e  células  citotóxicas  naturais  (NK,  natural killer).  A resposta  das  células T  é,  sem  dúvida,  uma  das  mais  importantes  do  hospedeiro  para  o  controle  do  crescimento  de células  neoplásicas  antigênicas.  As  células  T  são  responsáveis  pela  morte  direta  das  células  neoplásicas  e  pela ativação de outros componentes do sistema imunológico. A imunidade para células cancerígenas reflete a função de dois subconjuntos de células T: células T auxiliares CD4 + e células T citotóxicas CD8+. A descoberta de anticorpos que reagem às neoplasias no plasma de pessoas com câncer fornece suporte ao papel das células B como membros da equipa de vigilância imunológica. Os anticorpos podem destruir as células cancerígenas por meio de mecanismos mediados  por  complemento  ou  pela  citotoxicidade  celular  dependente  de  anticorpos,  em  que  o  anticorpo  conecta  a célula neoplásica a outra célula efetora, como as células NK, que realmente matam a célula cancerosa. As células NK não  requerem  o  reconhecimento  do  antígeno  e  podem  causar  a  lise  de  uma  gama  de  células­alvo.  A  atividade citotóxica  das  células  NK  pode  ser  incrementada  pelas  citocinas  interleucina  (IL)­2  e  interferona,  e  a  sua  atividade pode  ser  amplificada  pela  resposta  das  células  T  do  sistema  imunológico.  Os  macrófagos  são  importantes  na imunidade neoplásica como células apresentadoras de antígeno para iniciar a resposta imunológica e células efetoras potenciais para participar na lise das células neoplásicas.

Carcinógenos químicos Um  carginógeno  é  um  agente  capaz  de  causar  câncer.  O  papel  dos  agentes  ambientais  como  causa  de  câncer  foi observado pela primeira vez em 1775, quando foi identificada uma alta incidência de câncer escrotal em limpadores de chaminés, e isso foi associado à possibilidade de exposição à fuligem de carvão das chaminés.2 Nos dois séculos seguintes, foi demonstrado que muitos produtos químicos transformavam células no laboratório e eram cancerígenos para animais (Quadro 8.1).  Esses  agentes  incluem  tanto  produtos  naturais  (p.  ex.,  aflatoxina  B1)  quanto  artificiais (p. ex., cloreto de vinil). Carcinógenos químicos são divididos em dois grupos: agentes de reação direta, que não necessitam de ativação no organismo para se tornarem cancerígenos, e agentes de reação indireta, chamados pró­carcinogênicos ou iniciadores, que  se  tornam  ativos  somente  após  uma  conversão  metabólica.  Os  iniciadores  de  ação  direta  e  indireta  formam espécies altamente reativas (i. e., eletrófilos e radicais livres) que se ligam a resíduos nucleofílicos no DNA, RNA ou nas proteínas celulares. A ação dessas espécies reativas tende a causar mutação celular ou alterações na síntese de enzimas e proteínas estruturais, de um modo que altera a replicação celular e interfere nos controles reguladores. O potencial  carcinogênico  de  alguns  produtos  químicos  é  aumentado  por  agentes  chamados  promotores,  que, isoladamente, têm pouca ou nenhuma capacidade de causar câncer. Acredita­se que os promotores exercem seu efeito alterando  a  expressão  do  material  genético  de  uma  célula,  aumentando  a  síntese  de  DNA,  incrementando  a amplificação do gene (número de cópias do gene) e alterando a comunicação intercelular.

Quadro 8.1

Agentes químicos e ambientais comprovadamente carcinogênicos em seres humanos

Hidrocarbonetos policíclicos

Fuligem, alcatrão e óleos

Fumaça de cigarro

Agentes industriais

Anilina e corantes azo

Compostos de arsênio

Amianto

ß-naftilamina

Benzeno

Benzo[a]pireno

Tetracloreto de carbono

Inseticidas, fungicidas

Compostos de níquel e cromo

Bifenilos policlorados

Cloreto de vinila

Alimentos e fármacos

Alimentos defumados

Nitrosaminas

A䎍먯atoxina B1

Dietilestilbestrol

Medicamentos antineoplásicos (p. ex., agentes alquilantes, ciclofosfamida, clorambucila, nitrosoureia)

A  exposição  a  diversos  agentes  cancerígenos  químicos  está  associada  a  fatores  de  risco  associados  ao  estilo  de vida, como tabagismo, tipo de dieta e consumo de bebidas alcoólicas. A fumaça do cigarro contém tanto substâncias pró­carcinogênicas  quanto  promotoras.  Está  diretamente  associada  ao  desenvolvimento  de  câncer  de  pulmão  e  de laringe  e  também  tem  sido  associada  a  vários  outros  tipos  de  câncer.  Mascar  tabaco  aumenta  o  risco  de  câncer  na cavidade  oral  e  esôfago.  Estima­se  que  30%  das  mortes  por  câncer  e  87%  das  mortes  por  câncer  de  pulmão  nos EUAb estejam relacionados com o consumo de tabaco.36 Não é só o fumante que se coloca em risco, outras pessoas passivamente  expostas  à  fumaça  do  cigarro  também. A  cada  ano,  cerca  de  3.400  adultos  não  fumantes  morrem  de câncer  de  pulmão,  como  resultado  da  inalação  passiva  de  tabaco  ambiental.36  A  fumaça  ambiental  do  tabaco  foi classificada como carcinogênico “grupo A”, com base no sistema de classificação da Agência de Proteção Ambiental dos EUA. Há também uma forte evidência de que certos elementos da dieta contêm produtos químicos que contribuem para o risco de desenvolvimento de câncer. Muitos agentes cancerígenos dietéticos existem naturalmente nos vegetais (p. ex.,  aflatoxinas)  ou  são  utilizados  na  preservação  de  alimentos.37  Por  exemplo,  o  benzo[a]pireno  e  outros hidrocarbonetos policíclicos são convertidos em carcinógenos quando os alimentos são fritos em gordura reutilizada várias  vezes.  Entre  os  mais  potentes  agentes  pró­cancerígenos  destacam­se  os  hidrocarbonetos  aromáticos policíclicos. Essas substâncias despertam particular interesse porque são produzidas a partir de gorduras animais no processo de preparação de carnes com o uso de carvão vegetal e se encontram em produtos defumados. Também são produzidas na combustão do tabaco e encontradas no fumo do cigarro. O câncer de cólon tem sido associado a alta ingestão de carne vermelha gorda e baixa ingestão de fibras alimentares. Acredita­se que uma dieta com alto teor de gordura  seja  cancerígena,  porque  aumenta  o  fluxo  de  ácidos  biliares  primários,  que  são  convertidos  em  ácidos biliares  secundários  quando  há  bactérias  anaeróbicas  do  cólon,  produzindo  agentes  cancerígenos.  Estudos identificaram que a obesidade aliada a pouca atividade física aumenta o risco de câncer de cólon.31 O consumo de álcool está associado a diversos tipos de câncer; os mecanismos causais são muito complexos. O primeiro  e  mais  tóxico  metabólito  do  etanol  é  o  acetaldeído,  que  pode  provocar  mutações  pontuais  em  algumas células.2  Além  disso,  o  etanol  pode  alterar  a  metilação  do  DNA  e  interferir  no  metabolismo  de  retinoides, importantes  para  os  mecanismos  antioxidantes.  O  efeito  cancerígeno  do  fumo  do  cigarro  pode  ser  reforçado  pelo consumo concomitante de álcool; pessoas que fumam e bebem quantidades consideráveis de álcool estão sob maior risco de desenvolvimento de câncer de cavidade oral, laringe e esôfago. Os  efeitos  dos  agentes  carcinogênicos  geralmente  são  dose­dependentes;  quanto  maior  a  dose  ou  o  tempo  de exposição,  maior  é  o  risco  de  desenvolvimento  de  câncer. Alguns  agentes  químicos  carcinógenos  podem  agir  em conjunto com outras influências cancerígenas, como vírus ou radiação, para induzir neoplasia. Geralmente, existe um período de latência, que varia de 5 a 30 anos após a exposição ao carcinógeno químico, para o desenvolvimento de câncer.  Isso  é  lamentável,  porque  muitas  pessoas  foram  expostas  ao  agente  e  seus  efeitos  cancerígenos  antes  do reconhecimento  desse  tipo  de  associação.  Isso  ocorreu,  por  exemplo,  com  o  uso  de  dietilestilbestrol,  amplamente utilizado  nos  EUA  a  partir  de  meados  dos  anos  de  1940­1970  para  prevenção  de  aborto.  Mas  somente  no  final  da década  de  1960  foram  encontrados  muitos  casos  de  adenose  vaginal  e  adenocarcinoma  em  mulheres  jovens  como resultado da exposição uterina ao dietilestilbestrol.38

Radiação Os efeitos da radiação ionizante na carcinogênese têm sido bem documentados em sobreviventes da bomba atômica, em  pessoas  com  diagnóstico  de  exposição  e  em  trabalhadores  da  indústria,  cientistas  e  médicos  por  exposição ocupacional.  Epiteliomas  cutâneos  malignos  e  leucemia  eram  significativamente  elevados  nessas  populações.  Entre 1950 e 1970, a taxa de mortalidade apenas por leucemia nos grupos com maior exposição entre os sobreviventes da bomba atômica lançada sobre Hiroshima e Nagasaki foi de 147 por 100.000 pessoas, 30 vezes a taxa esperada.39 O  tipo  de  câncer  desenvolvido  dependia  da  dose  de  radiação,  sexo  e  idade  em  que  ocorreu  a  exposição.  Por exemplo, aproximadamente 25 a 30 anos depois da exposição de corpo inteiro ou tronco, foi verificado um aumento da  incidência  de  leucemia  e  câncer  de  mama,  pulmão,  estômago,  tireoide,  glândulas  salivares,  sistema  digestório  e tecidos linfoides. O período de tempo entre a exposição e o surgimento de câncer está relacionado com a idade. Por exemplo, crianças expostas à radiação ionizante no útero apresentam maior risco de desenvolvimento de leucemias e neoplasias da infância, particularmente no período de 2 a 3 anos após o nascimento. Esse período de latência para a leucemia  se  estende  até  5  a  10  anos  se  a  criança  foi  exposta  após  o  nascimento  e  20  anos  para  certos  tipos  de neoplasias sólidas.40 Outro exemplo é o período de latência para desenvolvimento de câncer de tireoide em lactentes e crianças pequenas que receberam radiação na área da cabeça e pescoço para diminuir o tamanho das amígdalas ou timo, que pode chegar a 35 anos após a exposição. A  associação  entre  a  luz  solar  e  o  desenvolvimento  de  câncer  de  pele  tem  sido  relatada  há  mais  de  100  anos. A radiação ultravioleta consiste em raios de energia relativamente baixa, que não penetram profundamente na pele. As evidências que sustentam o papel da radiação ultravioleta como causadora de câncer de pele incluem o fato de que se desenvolve principalmente em áreas da pele com maior exposição à luz solar (p. ex., cabeça e pescoço, braços, mãos e  pernas);  maior  incidência  em  pessoas  de  pele  clara,  que  não  têm  pigmento  melanina  suficiente  para  filtrar  a  luz ultravioleta;  e  o  fato  de  que  a  intensidade  da  exposição  aos  raios  ultravioleta  está  diretamente  relacionada  com  a incidência  de  câncer  de  pele,  como  evidenciado  por  taxas  mais  elevadas  verificadas  na  Austráliac  e  no  sudoeste americano.40  Alguns  estudos  também  sugerem  que  uma  intensa  exposição  à  luz  solar  episódica,  especialmente durante  a  infância,  tem  maior  associação  ao  desenvolvimento  de  melanoma  do  que  uma  exposição  prolongada  de baixa  intensidade.  Tal  como  acontece  com  outras  substâncias  cancerígenas,  os  efeitos  da  radiação  ultravioleta,  em geral, são aditivos, e existe um intervalo entre o tempo de exposição e a detecção do câncer.

Vírus oncogênicos Um  vírus  oncogênico  é  aquele  que  pode  induzir  o  desenvolvimento  de  câncer.  Suspeita­se  há  algum  tempo  que  os vírus  desempenham  um  papel  importante  no  desenvolvimento  de  determinados  tipos  de  câncer,  particularmente leucemia e linfoma. O interesse no campo da oncologia viral, especialmente em populações humanas, cresceu com a descoberta da transcriptase reversa e o desenvolvimento de tecnologia de DNA recombinante e, mais recentemente, com a descoberta de oncogenes e genes supressores de neoplasia. Os  vírus,  que  são  pequenas  partículas  que  contêm  material  genético  (DNA  ou  RNA),  se  inserem  na  célula hospedeira e incorporam seu DNA cromossômico, controlando o funcionamento celular com a finalidade de produzir proteínas virais. Um grande número de vírus de DNA e RNA (retrovírus) tem demonstrado potencial oncogênico em animais. No entanto, apenas alguns vírus têm sido associados ao câncer em seres humanos. Foram  identificados  quatro  vírus  de  DNA  em  cânceres  humanos:  papilomavírus  humano  (HPV),  vírus  Epstein­ Barr (EBV), vírus da hepatite B (HBV) e herpes­vírus humano tipo 8 (HHV­8),2 que causa sarcoma de Kaposi em indivíduos com AIDS. Existem mais de 60 tipos geneticamente diferentes de HPV. Alguns tipos (tipos 1, 2, 4 e 7) causam  papilomas  benignos  (verrugas).  Tipos  de  HPV  também  têm  sido  implicados  no  desenvolvimento  de carcinoma  espinocelular  do  colo  do  útero  e  região  anogenital.  Os  tipos  de  HPV  16  e  18,  que  são  considerados  os mais  relacionados  com  o  câncer  do  colo  do  útero  e,  com  menos  frequência,  os  tipos  de  HPV  31,  33,  35  e  51  são encontrados em aproximadamente 85% dos carcinomas espinocelulares do colo do útero e considerados precursores presumidos (i. e., displasia cervical grave e carcinoma in situ).2 Duas vacinas para proteger contra os tipos de HPV específicos já estão disponíveis para as mulheres e homens jovens. EBV  é  um  membro  da  família  do  herpes­vírus.  Ele  tem  sido  implicado  na  patogênese  de  quatro  tipos  de  câncer humano:  linfoma  de  Burkitt;  carcinoma  de  nasofaringe;  linfomas  de  células  B  em  pacientes  imunossuprimidos, como  indivíduos  com  AIDS;  e  alguns  casos  de  linfoma  de  Hodgkin.  O  linfoma  de  Burkitt  é  uma  neoplasia  de linfócitos B, que é endêmica em determinadas regiões da África Oriental e ocorre esporadicamente em outras áreas

em  todo  o  mundo.  Em  pessoas  com  a  função  imunológica  normal,  a  proliferação  de  células  B  causada  por  EBV pode  ser  facilmente  controlada,  e  a  pessoa  se  torna  assintomática  ou  experimenta  um  episódio  autolimitado  de mononucleose infecciosa. Em regiões do mundo onde o linfoma de Burkitt é endêmico, a manifestação concomitante de  malária  ou  outras  infecções  causam  comprometimento  da  função  imunológica,  possibilitando  a  proliferação sustentada  de  linfócitos  B.  A  incidência  de  câncer  de  nasofaringe  é  alta  em  algumas  regiões  da  China, particularmente no sul, e na população cantonesa em Cingapura. Pode ser observado um risco maior de linfomas de células  B  em  pessoas  com  sistema  imunológico  suprimido  por  medicamentos,  como  receptores  de  órgãos transplantados. HBV  é  o  agente  etiológico  no  desenvolvimento  de  hepatite  B,  cirrose  e  carcinoma  hepatocelular.  Foi  verificada uma  correlação  significativa  entre  taxas  elevadas  de  carcinoma  hepatocelular  em  todo  o  mundo  e  prevalência  de portadores  de  HBV.2  Outros  fatores  etiológicos  também  podem  contribuir  para  o  desenvolvimento  de  câncer  de fígado. O mecanismo preciso pelo qual o HBV induz o câncer hepatocelular não foi determinado, embora tenha sido sugerido que possa resultar de danos prolongados induzidos por HBV e regeneração. Ainda  que  existam  diversos  retrovírus  (vírus  de  RNA)  que  causem  câncer  em  animais,  o  único  retrovírus conhecido por causar câncer em humanos é o vírus linfotrópico de células T humanas do tipo 1 (HTLV­1). O HTLV­ 1 está associado a uma forma de leucemia de células T, que é endêmica em algumas regiões no Japão e encontrada esporadicamente em outras áreas do mundo.41 Semelhantes ao vírus da imunodeficiência humana (HIV), responsável pela AIDS,  o  HTLV­1  é  atraído  por  células T  CD4+,  e  este  subconjunto  de  células T  é,  portanto,  o  principal  alvo para a transformação cancerosa. A contaminação requer a transmissão de células T infectadas por meio de relações sexuais, sangue ou leite materno infectado.

Resumo

As  causas  do  câncer  são  extremamente  complexas  e  podem  ser  consideradas  de  duas  perspectivas:  (1)  origens  e mecanismos moleculares e celulares e (2) fatores causais externos e contextuais, incluindo idade, hereditariedade e agentes  ambientais  que  influenciam  a  manifestação  e  o  desenvolvimento.  Na  maioria  dos  casos,  a  patogênese molecular  do  câncer  é  considerada  originária  de  danos  ou  mutação  genética,  que  alteram  a  fisiologia  da  célula  e transformam uma célula de normal em cancerosa. No entanto, a complexidade das causas e patogênese do câncer está  se  tornando  cada  vez  mais  evidente  à  medida  que  são  conhecidos  os  papéis  dos  mecanismos  epigenéticos, células­tronco neoplásicas e microambiente na tumorigênese. Os  tipos  de  genes  envolvidos  no  câncer  são  numerosos,  sendo  duas  categorias  principais:  os  proto­oncogenes, que  controlam  o  crescimento  e  a  replicação  celular;  e  os  genes  supressores  de  neoplasia,  que  são  os  genes reguladores  de  inibição  de  crescimento.  Entre  os  mecanismos  genéticos  e  moleculares  que  aumentam  a suscetibilidade  ao  câncer  ou  facilitam  o  desenvolvimento  estão  os  defeitos  nos  mecanismos  de  reparo  do  DNA, defeitos  nas  vias  de  sinalização  do  fator  de  crescimento,  evasão  da  apoptose,  desenvolvimento  sustentado  da angiogênese e invasão e metástase. Como o câncer não é uma doença única, é provável que ocorra a interação de vários  fatores  no  nível  celular  e  molecular  para  transformar  células  normais  em  células  cancerígenas.  Danos genéticos e epigenéticos podem ser o resultado de interações de vários fatores de risco ou da exposição repetida a uma  única  substância  cancerígena.  Entre  os  fatores  de  risco  associados  ao  câncer  estão  hereditariedade,  fatores hormonais, mecanismos imunológicos e agentes ambientais, como produtos químicos, radiação e vírus causadores de câncer.

Manifestações clínicas

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Caracterizar os mecanismos envolvidos na anorexia e caquexia, fadiga e transtornos do sono, anemia e trombose venosa que acomete pessoas com câncer

De䎇梻nir o termo síndrome paraneoplásica e explicar sua patogênese e manifestações

Provavelmente, não existe uma única função orgânica que não seja afetada pela manifestação de câncer. Como as

células  neoplásicas  substituem  o  parênquima  de  funcionamento  normal,  as  manifestações  iniciais  geralmente refletem o local primário de envolvimento. Por exemplo, inicialmente o câncer do pulmão produz comprometimento da função respiratória; à medida que a neoplasia cresce e se dissemina em metástase, outras estruturas são afetadas. O  câncer  também  produz  manifestações  genéricas,  como  fadiga,  anorexia  e  caquexia,  anemia,  diminuição  da resistência às infecções e sintomas não relacionados com o local da neoplasia (síndromes paraneoplásicas). Muitas destas  manifestações  são  agravadas  pelos  efeitos  colaterais  dos  métodos  utilizados  no  tratamento  da  doença.  Em seus estágios finais, o câncer muitas vezes causa dor. A dor é um dos aspectos mais temidos do câncer e deve ser uma das principais preocupações no tratamento de pessoas com câncer incurável.

Integridade do tecido O  câncer  afeta  a  integridade  do  tecido.  À  medida  que  o  câncer  cresce,  comprime  e  erode  os  vasos  sanguíneos, causando  ulceração  e  necrose,  juntamente  com  sangramento  e  às  vezes  hemorragia.  Um  dos  primeiros  sinais  de alerta  do  câncer  colorretal  é  sangue  nas  fezes. As  células  cancerígenas  podem  também  produzir  enzimas  e  toxinas metabólicas prejudiciais aos tecidos circundantes. Em geral, o tecido danificado por um crescimento canceroso não cicatriza  normalmente.  Pelo  contrário,  a  área  danificada  persiste  e  muitas  vezes  continua  a  crescer;  uma  ferida  que não cicatriza é outro sinal de alerta do câncer. O câncer não respeita limites anatômicos; à medida que cresce, invade e comprime estruturas adjacentes. O câncer abdominal, por exemplo, pode comprimir as vísceras e causar obstrução intestinal. O desenvolvimento de derrames ou líquido no espaço pleural, pericárdico ou peritoneal muitas vezes é o primeiro sinal  de  algumas  neoplasias.2  O  envolvimento  direto  da  superfície  serosa  parece  ser  o  fator  desencadeante  mais importante,  embora  muitos  outros  mecanismos,  como  obstrução  da  drenagem  linfática,  também  possam  colaborar. Relata­se  que  quase  50%  dos  derrames  não  diagnosticados  em  pessoas  com  câncer  não  conhecido  devem­se  à malignidade.  Câncer  de  pulmão,  câncer  de  mama  e  linfomas  representam  aproximadamente  75%  dos  derrames pleurais malignos.2,42 A maioria dos indivíduos com derrame pleural é sintomática, apresentando dor no peito, falta de  ar  e  tosse.  Mais  do  que  qualquer  outra  neoplasia  maligna,  o  câncer  de  ovário  está  associado  ao  acúmulo  de líquido  na  cavidade  peritoneal.  Desconforto  abdominal,  inchaço  e  sensação  de  peso  e  aumento  da  circunferência abdominal, que refletem derrame peritoneal ou ascite, falta de ar e dificuldade para respirar, são sintomas comuns de câncer de ovário.42

Manifestações sistêmicas Muitas  manifestações  clínicas  de  câncer,  incluindo  anorexia  e  caquexia,  fadiga,  transtornos  do  sono  e  anemia,  não estão  diretamente  relacionadas  com  a  existência  de  uma  massa  neoplásica,  mas  com  as  alterações  nas  vias metabólicas  e  citocinas  circulantes  e  outros  mediadores.  Embora  as  pesquisas  tenham  produzido  insights surpreendentes  sobre  as  causas  e  a  cura  do  câncer,  ainda  existe  muito  a  ser  feito  em  relação  à  gestão  dos  efeitos colaterais associados à doença.2

Anorexia e caquexia Muitos  tipos  de  câncer  estão  associados  a  perda  de  peso,  de  gordura  corporal  e  de  tecido  muscular,  acompanhadas por profunda fraqueza, anorexia e anemia. Essa síndrome muitas vezes é chamada de síndrome da anorexia­caquexia do  câncer.43  É  uma  manifestação  comum  na  maioria  de  casos  de  neoplasias  sólidas,  com  exceção  do  câncer  de mama.  Estima­se  que  é  uma  causa  significativa  de  morbidade  e  mortalidade  em  80%  das  pessoas  com  câncer avançado e é responsável pela morte em até 20% dos casos.44 A condição é mais comum em crianças e idosos e se torna mais pronunciada à medida que a doença progride. Pessoas com caquexia do câncer também respondem menos à quimioterapia e estão mais propensas a efeitos colaterais tóxicos. Embora anorexia, redução da ingestão de alimentos e alterações do paladar sejam comuns em pessoas com câncer, e  muitas  vezes  são  acentuadas  pelos  métodos  de  tratamento,  a  extensão  da  perda  de  peso  e  perda  de  proteínas  não pode ser explicada apenas em termos de redução na ingestão de alimentos. Em contraste com a inanição resultante da falta  de  ingestão  de  alimentos,  na  qual  o  peso  é  preferencialmente  perdido  dos  compartimentos  de  gordura,  na caquexia a perda é proveniente tanto de compartimentos de gordura quanto de musculatura esquelética.43 Além disso, a  perda  de  proteínas  advinda  da  inanição  é  dividida  igualmente  entre  músculo  esquelético  e  proteínas  viscerais,

enquanto, na caquexia, as proteínas viscerais são relativamente bem preservadas. Assim, acontece perda de massa de fígado com a inanição, mas aumento de massa em pessoas com caquexia, devido à reciclagem hepática de nutrientes e  à  resposta  de  fase  aguda.  Por  último,  e  mais  importante,  a  perda  de  peso  que  ocorre  com  a  inanição  geralmente pode ser revertida por realimentação, enquanto a suplementação nutricional oral ou parenteral não reverte a caquexia. Os  mecanismos  da  caquexia  do  câncer  parecem  ser  inerentes  a  um  estado  hipermetabólico  e  a  um  metabolismo alterado  de  nutrientes  específico  do  estado  de  existência  de  neoplasia.  As  neoplasias  tendem  a  consumir  grandes quantidades  de  glicose,  com  consequente  aumento  na  formação  de  lactato,  uma  vez  que  os  níveis  de  oxigênio  da neoplasia  são  muito  baixos  para  suportar  o  ciclo  do  ácido  cítrico  e  a  fosforilação  oxidativa  mitocondrial.  O  lactato que  é  produzido  circula  até  o  fígado,  onde  é  novamente  convertido  em  glicose.  A  produção  de  glicose (gliconeogênese)  a  partir  de  lactato  utiliza  trifosfato  de  adenosina  (ATP)  e  é  muito  ineficiente,  contribuindo  para  o estado  hipermetabólico  de  pessoas  com  caquexia.  Outro  mecanismo  para  o  maior  gasto  energético  é  o  aumento  da expressão  de  proteínas  mitocondriais  desacopladas,  que  catalisam  o  desacoplamento  no  processo  de  fosforilação oxidativa,  de  modo  que  a  energia  é  perdida  na  forma  de  calor.  Também  têm  sido  relatadas  anormalidades  no metabolismo  de  gordura  e  proteínas.  Durante  a  inanição  em  pessoas  sem  câncer,  as  cetonas  derivadas  da  gordura substituem  a  glicose  normalmente  utilizada  pelo  cérebro,  levando  à  diminuição  da  gliconeogênese  a  partir  de aminoácidos,  com  conservação  da  massa  muscular,  enquanto  em  pessoas  com  caquexia  do  câncer,  os  aminoácidos não são preservados e ocorre uma depleção da massa corporal magra, uma condição que se acredita contribuir para a redução do tempo de vida. Embora  os  mecanismos  da  síndrome  da  anorexia­caquexia  do  câncer  não  estejam  totalmente  entendidos, provavelmente são multifatoriais, resultantes de uma resposta inflamatória persistente em conjunto com a produção de citocinas específicas e fatores catabólicos da neoplasia. A síndrome mostra semelhanças com a resposta de fase aguda observada com lesão de tecidos, infecção ou inflamação, em que a síntese de proteínas pelo fígado muda de síntese  de  albumina  para  síntese  de  proteínas  de  fase  aguda,  como  a  proteína  C  reativa,  o  fibrinogênio  e  a  a1 antitripsina.  Sabe­se  que  a  resposta  de  fase  aguda  é  ativada  por  citocinas,  como  o  fator  a  de  necrose  neoplásica (TNF­  e  IL­1  e  IL­6;  isso  sugere  que  também  devem  colaborar  na  caquexia  do  câncer.45  Foram  observados  níveis séricos  elevados  dessas  citocinas  em  pessoas  com  câncer,  e  esses  níveis  parecem  estar  relacionados  com  a progressão da neoplasia. O TNF­α, secretado principalmente por macrófagos em resposta ao crescimento de células neoplásicas ou infecção por bactéria gram­negativa, foi a primeira citocina identificada associada a caquexia e perda de  peso.  Ele  provoca  anorexia  por  supressão  do  centro  de  saciedade  no  hipotálamo  e  aumento  da  síntese  da lipoproteína  lipase,  uma  enzima  que  facilita  a  liberação  de  ácidos  graxos  das  lipoproteínas  para  que  possam  ser utilizados  pelos  tecidos.  IL­1  e  IL­6  compartilham  diversas  características  de  TNF­α  em  termos  de  capacidade  de incitar caquexia.

Fadiga e transtornos do sono Transtornos do sono e fadiga são dois dos efeitos colaterais mais frequentes em indivíduos com câncer.46 A fadiga relacionada  com  o  câncer  se  caracteriza  por  sensação  de  cansaço,  fraqueza  e  falta  de  energia,  diferente  do  cansaço normalmente experimentado por pessoas saudáveis, na medida em que não é aliviada pelo repouso ou sono. Ocorre como consequência do próprio câncer e como efeito colateral do tratamento. A fadiga relacionada com o câncer pode ser  um  sintoma  precoce  de  doença  maligna  e  tem  sido  relatada  por  mais  de  um  terço  das  pessoas  no  momento  do diagnóstico.46 Além disso, é um sintoma que pode permanecer por meses ou mesmo anos após o tratamento. A  causa  da  fadiga  relacionada  com  o  câncer  é  desconhecida,  mas  provavelmente  é  multifatorial  e  envolve  a desregulação de vários sistemas fisiológicos, bioquímicos e psicológicos inter­relacionados. Os mecanismos básicos de  fadiga  foram  classificados  em  dois  componentes:  central  e  periférico.47  A  fadiga  periférica,  que  ocorre  nas junções  neuromusculares  e  musculatura,  resulta  da  incapacidade  do  aparelho  neuromuscular  periférico  de desempenhar uma tarefa em resposta à estimulação central. Os mecanismos implicados na fadiga periférica incluem a  falta  de ATP  e  a  formação  de  subprodutos  metabólicos,  como  o  ácido  láctico. A  fadiga  central  surge  no  sistema nervoso  central  (SNC)  e  é  frequentemente  descrita  como  uma  dificuldade  em  iniciar  ou  manter  atividades voluntárias. Uma das hipóteses propostas para explicar a fadiga relacionada com o câncer é que o câncer e os seus tratamentos  resultam  na  desregulação  dos  níveis  ou  função  da  serotonina  no  cérebro  (5­hidroxitriptamina  [5­HT]). Existem  evidências  de  que  as  citocinas  pró­inflamatórias,  como  TNF­α,  podem  influenciar  o  metabolismo  de  5­ HT.47

Embora os transtornos do sono e a fadiga relacionados com o câncer sejam condições distintas, estão intimamente associados  em  termos  de  prevalência  e  sintomas.48  Pessoas  com  câncer  relatam  má  qualidade  do  sono,  problemas para iniciar e manter o sono, sono insuficiente, despertar noturno e sono agitado. Tal como acontece com a fadiga, os  fatores  precipitantes  incluem  o  diagnóstico  de  câncer,  tipo  e  estágio  da  doença,  dor  e  efeitos  colaterais  do tratamento  (p.  ex.,  náuseas,  vômitos).  Uma  vez  iniciada,  a  insônia  frequentemente  se  autoperpetua  devido  à tendência  natural  para  compensar  a  perda  de  sono  por  meio  de  cochilos,  dormir  mais  cedo  e  levantar  mais  tarde. Também  pode  ser  que  a  fadiga  que  ocorre  relacionada  com  o  câncer  ou  a  terapia  anticâncer  possa,  na  verdade, induzir o indivíduo a estender suas oportunidades de sono, tornando­se um fator que contribui para a manutenção da insônia.  Também  foram  observadas  correlações  entre  fadiga  e  sintomas  diurnos  de  problemas  do  sono,  como sonolência diurna e cochilos.

Anemia Anemia  é  comum  em  pessoas  com  diferentes  tipos  de  cânceres.  Pode  estar  relacionada  com  perda  de  sangue, hemólise, comprometimento da produção de hemácias ou pode ser efeito do tratamento.2 Por exemplo, a medicação usada  no  tratamento  do  câncer  é  citotóxica  e  pode  reduzir  a  produção  de  hemácias.  Além  disso,  existem  muitos mecanismos  pelos  quais  a  produção  de  hemácias  pode  ser  prejudicada  em  pessoas  com  neoplasias  malignas, incluindo  deficiências  nutricionais,  insuficiência  da  medula  óssea  e  embotamento  da  resposta  da  eritropoetina  à hipoxia.  As  citocinas  inflamatórias  geradas  em  resposta  às  neoplasias  diminuem  a  produção  de  eritropoetina, resultando na diminuição da produção de hemácias. A anemia relacionada com o câncer está associada à redução da eficácia do tratamento, ao aumento da mortalidade, ao  aumento  das  necessidades  de  transfusão  e  à  redução  do  desempenho,  assim  como  da  qualidade  de  vida.  A hipoxia,  uma  característica  de  neoplasias  sólidas  avançadas,  tem  sido  reconhecida  como  um  fator  crítico  na promoção de resistência da neoplasia à radioterapia e a determinados agentes quimioterápicos. A anemia grave pode retardar  a  realização  de  intervenções  cirúrgicas  quando  requer  transfusões  pré­operatórias.  Do  mesmo  modo,  os baixos  níveis  de  hemoglobina,  antes  ou  durante  a  quimioterapia,  podem  exigir  redução  da  dose  ou  atrasos  na administração,  resultando  na  diminuição  da  eficácia  global  do  tratamento.  A  anemia  relacionada  com  o  câncer frequentemente é tratada com eritropoetina humana recombinante.

Síndromes paraneoplásicas Além de sinais e sintomas nos locais primário e metastático, o câncer pode produzir manifestações em áreas que não são  diretamente  afetadas  pela  doença.  Esse  tipo  de  manifestação  recebe  o  nome  coletivo  de  síndromes paraneoplásicas.2 Algumas dessas manifestações são causadas pela produção de hormônios por células cancerígenas e  outras  são  provenientes  da  elaboração  de  fatores  na  circulação  que  produzem  síndromes  hematopoéticas, neurológicas e dermatológicas (Tabela 8.4). Essas síndromes estão mais frequentemente associadas a neoplasias do pulmão, mama e hematológicas.2 Uma  variedade  de  hormônios  peptídicos  é  produzida  tanto  por  neoplasias  benignas  quanto  malignas.  Embora normalmente não expressas, as vias bioquímicas para síntese e liberação de hormônios peptídicos (p. ex., hormônio antidiurético [ADH], adrenocorticotrófico [ACTH] e paratormônio [PTH]) são encontradas na maioria das células.49 Desse  modo,  as  três  síndromes  endócrinas  mais  comumente  associadas  ao  câncer  são  síndrome  de  secreção inapropriada de ADH, síndrome de Cushing devido à produção ectópica de ACTH e hipercalcemia. 2 A hipercalcemia ligada  à  malignidade  não  parece  estar  relacionada  com  PTH,  mas  com  uma  proteína  relacionada  com  PTH  que compartilha  diversas  ações  biológicas  com  o  paratormônio.2  A  hipercalcemia  também  pode  ser  causada  por  um câncer como mieloma múltiplo ou metástases ósseas de outros tipos de câncer. Algumas  síndromes  paraneoplásicas  estão  ligadas  à  produção  de  mediadores  que  provocam  complicações hematológicas.2 Por exemplo, diversos tipos de câncer podem produzir fatores pró­coagulação que contribuem para o  aumento  do  risco  de  trombose  venosa  e  endocardite  trombótica  não  bacteriana.  Algumas  vezes,  eventos trombóticos  inexplicáveis  são  a  primeira  indicação  de  uma  neoplasia  maligna  não  diagnosticada. A  relação  precisa entre  distúrbios  de  coagulação  e  câncer  ainda  é  desconhecida.  Várias  doenças  malignas,  como  adenocarcinomas produtores de mucina, liberam tromboplastina e outras substâncias que ativam o sistema de coagulação. Transtornos  neurológicos  paraneoplásicos  sintomáticos  são  relativamente  raros,  com  exceção  da  síndrome

miastênica  de  Lambert­Eaton,  que  afeta  cerca  de  3%  das  pessoas  com  câncer  de  pulmão  de  pequenas  células,  e miastenia  gravis,  que  acomete  cerca  de  15%  das  pessoas  com  timoma.50  A  síndrome  de  Lambert­Eaton,  ou miastenia gravis  reversa,  é  observada  quase  que  exclusivamente  no  câncer  de  pulmão  de  pequenas  células.  Produz fraqueza  muscular  nos  membros,  em  vez  da  fraqueza  muscular  inicial  bulbar  e  ocular  observada  com  a  miastenia gravis.  Acredita­se  que  a  origem  dos  transtornos  neurológicos  paraneoplásicos  tenha  mediação  imunológica. 50  A resposta  imunológica  alterada  é  iniciada  pela  produção  de  antígenos  onconeurais  (p.  ex.,  antígenos  normalmente expressos  no  sistema  nervoso)  por  células  cancerígenas.  O  sistema  imunológico,  por  sua  vez,  reconhece  os antígenos onconeurais como estranhos e prepara uma resposta imunológica. Em muitos casos, o ataque do sistema imunológico  controla  o  crescimento  do  câncer.  Os  anticorpos  e  as  células  T  citotóxicas  não  são  suficientes  para causar o transtorno neurológico, a menos que atravessem a barreira hematencefálica e reajam com os neurônios que expressam o antígeno onconeural.50 Tabela 8.4

Síndromes paraneoplásicas mais comuns.

Tipo de síndrome

Tipo de neoplasia associada

Mecanismo proposto

Síndrome de secreção inapropriada de ADH

Câncer de pulmão de pequenas células, outros

Produção e liberação de ADH pela neoplasia

Síndrome de Cushing – ACTH

Câncer de pulmão de pequenas células, câncer carcinoide dos

Produção e liberação de ACTH pela neoplasia

Endócrina

brônquios

Hipercalcemia humoral

Câncer espinocelular do pulmão, cabeça, pescoço, ovário

Produção e liberação de fator polipeptídico

intimamente relacionado com PTH

Hematológica

Trombose venosa

Câncer de pâncreas e de pulmão, a maioria dos cânceres

Produção de fatores pró-coagulação

sólidos

Endocardite trombolítica não bacteriana e

Cânceres avançados

 

Câncer de pulmão de pequenas células

Produção autoimune de anticorpos contra

anemia da malignidade

Neurológica

Síndrome de Eaton-Lambert

estruturas da placa motora

Miastenia gravis

Timoma

Autoimune gerando transmissão neuronal

anormal

Dermatológica

Síndromes cutâneas

Carcinoma gástrico e outros

Possivelmente causada pela produção de

fatores de crescimento (epidérmicos) pelas

células neoplásicas

Acantose nigricans

Cânceres

Às vezes ocorrem antes do câncer

Pên䎇梻go

 

 

Ictiose

 

 

Paget extramamária

 

Danos ao glomérulo renal

Câncer renal

 

Renal

Síndrome nefrótica

ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; ADH, hormônio antidiurético; PTH, paratormônio.

Uma  grande  variedade  de  síndromes  cutâneas  está  associada  a  processos  malignos  e  pode  preceder,  ser concomitante ou acompanhar a descoberta do câncer. Entre as doenças dermatológicas paraneoplásicas destaca­se a

acantose  nigricans,  caracterizada  por  hiperqueratose  pigmentada  constituída  por  lesões  simétricas,  verrugosas  e papilares  que  ocorrem  nas  dobras  da  pele,  em  particular  na  região  das  axilas  e  períneo.2 As  lesões  geralmente  são simétricas e podem ser acompanhadas de prurido. A condição está atrelada, em geral, a adenocarcinomas do sistema digestório,  particularmente  carcinoma  gástrico,  mas  pode  estar  associada  a  uma  variedade  de  adenocarcinomas, incluindo de pulmão, mama, ovário e até mesmo câncer hematológico. A patogênese dessas lesões é incerta. As  síndromes  paraneoplásicas  podem  ser  a  primeira  indicação  de  que  uma  pessoa  tem  câncer  e  deve  ser considerada como tal.51 Elas também podem representar problemas clínicos significativos, ser potencialmente letais em  pessoas  com  câncer,  mimetizar  uma  doença  metastática  e  confundir  o  tratamento.  Os  métodos  de  diagnóstico devem se concentrar tanto em identificar a causa da doença quanto em localizar a neoplasia maligna responsável. O tratamento de síndromes paraneoplásicas envolve o tratamento concomitante do câncer subjacente e a supressão do mediador que causa a síndrome.

Resumo

Provavelmente,  não  existe  uma  única  função  orgânica  que  não  seja  afetada  por  um  câncer.  Como  as  células neoplásicas  substituem  o  parênquima  de  funcionamento  normal,  as  manifestações  iniciais  de  câncer  geralmente refletem  o  local  primário  de  envolvimento.  O  câncer  comprime  os  vasos  sanguíneos,  obstrui  o  fluxo  da  linfa, rompe  a  integridade  dos  tecidos,  invade  cavidades  serosas  e  comprime  órgãos  viscerais.  Isso  pode  originar  o desenvolvimento de derrames (líquido) pleural, pericárdio ou peritoneal e manifestações genéricas, como anorexia e caquexia, fadiga e transtornos do sono, e anemia. Também pode produzir síndromes paraneoplásicas que surgem pela  capacidade  do  câncer  de  secretar  hormônios  e  outros  mediadores  químicos  que  produzem  síndromes endócrinas,  hematopoéticas,  neurológicas  e  dermatológicas.  Muitas  manifestações  são  agravadas  pelos  efeitos colaterais dos métodos utilizados no tratamento da doença.

Rastreamento, diagnóstico e tratamento

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Explicar o mecanismo pelo qual a radiação exerce seus efeitos bené䎇梻cos no tratamento do câncer

Diferenciar a ação de agentes quimioterápicos que interagem direta ou indiretamente com o DNA de fármacos quimioterápicos especí䎇梻cos e

inespecí䎇梻cos para o ciclo celular



Descrever os três mecanismos pelos quais a bioterapia exerce seus efeitos

Rastreamento O  rastreamento  representa  uma  medida  de  prevenção  secundária  para  o  reconhecimento  precoce  do  câncer  em  uma população  assintomática.2  O  rastreamento  pode  ser  feito  por  meio  de  observação  (p.  ex.,  pele,  boca,  genitália externa), palpação (p. ex., mama, tireoide, reto e ânus, próstata, linfonodos), exames e procedimentos laboratoriais (p.  ex.,  Papanicolaou,  colonoscopia,  mamografia).  É  necessária  a  realização  de  testes  capazes  de  detectar especificamente  o  câncer  nos  estágios  iniciais  ou  processos  pré­malignos,  que  sejam  custo­efetivos  e  que  resultem em desfechos terapêuticos melhores.2 Para a maioria dos cânceres, o estágio na apresentação está relacionado com a possibilidade de cura, com relatos de taxas mais altas quando a neoplasia é pequena e sem evidência de metástase. Certas neoplasias, no entanto, tendem a formar metástase precocemente, mesmo a partir de uma pequena neoplasia primária. Para outros tipos de câncer, como o câncer de pâncreas, não existem métodos de rastreamento. Métodos de rastreamento mais sensíveis, como marcadores tumorais, estão sendo desenvolvidos para isso. O câncer de pulmão é a principal causa de morte por câncer, no entanto não existem diretrizes padronizadas de rastreamento.52 O médico deve determinar se, em casos específicos envolvendo determinados fatores de risco, é necessária a realização regular de radiografias e TC de tórax.52 Cânceres  cujas  modalidades  atuais  de  rastreamento  ou  detecção  precoce  conduziram  à  melhora  nos  resultados incluem o de mama (mamografia); colo do útero (Papanicolaou); cólon e reto (toque retal, exame de sangue oculto

nas  fezes  e  colonoscopia);  próstata  (teste  do  antígeno  prostático  específico  [PSA]  e  US  transretal)  e  melanoma maligno (autoexame). Embora não tão claramente definido, recomenda­se o rastreamento de outros tipos de câncer, como de tireoide, testículos, ovários, linfonodos e cavidade oral no momento dos exames periódicos de saúde.

Métodos diagnósticos Os métodos utilizados no diagnóstico e estadiamento do câncer são determinados em grande parte pela localização e pelo tipo de câncer suspeito. Diversos procedimentos são empregados no diagnóstico do câncer, incluindo exames de sangue para marcadores tumorais, estudos citológicos e biopsia de tecido, endoscopia, US, radiografias, RM, TC e tomografia por emissão de pósitrons (PET).

Marcadores tumorais Marcadores  tumorais  são  antígenos  expressos  na  superfície  de  células  neoplásicas  ou  substâncias  liberadas  de células  normais,  em  resposta  à  existência  de  neoplasia.2,49  Algumas  substâncias,  como  hormônios  e  enzimas normalmente  produzidas  pelo  tecido  envolvido,  mostram  hiperexpressão  como  resultado  do  câncer.  Outros marcadores de neoplasia, como proteínas oncofetais, são produzidos durante o desenvolvimento fetal e induzidos a reaparecer  pela  existência  de  neoplasias  benignas  e  malignas.  Marcadores  tumorais  são  usados  para  rastreamento, estabelecimento  de  prognóstico,  monitoramento  da  terapia  e  detecção  de  recidiva.  A  Tabela  8.5  identifica  alguns marcadores tumorais, sua origem e os tipos de câncer associados a eles. Tabela 8.5

Marcadores tumorais.

Marcador

Fonte

Câncer associado

Saco vitelino fetal e estruturas gastrintestinais no início da

Cânceres primários de fígado; câncer de

Antígenos

AFP

vida fetal

CA 15-3

Proteína do tecido mamário

células germinativas do testículo

Marcador tumoral para o rastreamento dos

cânceres de mama, fígado e pulmão

CA 27.29

Proteína do tecido mamário

Recorrência do câncer de mama e metástase

CEA

Tecidos embrionários no intestino, pâncreas, fígado e nas

Câncer colorretal e câncer de pâncreas,

mamas

pulmão e estômago

Hormônios

hCG

Hormônio normalmente produzido pela placenta

Tumores trofoblásticos gestacionais; câncer de

células germinativas de testículo

Calcitocina

Hormônio produzido por células parafoliculares da tireoide

Câncer de tireoide

Catecolaminas (epinefrina, norepinefrina) e

Hormônios produzidos por células croma䎇梻ns da glândula

Feocromocitoma e neoplasias relacionadas

metabólitos

suprarrenal

Proteínas especí䎇梻cas

 

 

 

Imunoglobulina monoclonal

Imunoglobulina anormal produzida por células neoplásicas

Mieloma múltiplo

PSA

Produzido pelas células epiteliais que revestem os ácinos e

Câncer de próstata

ductos da próstata

Mucinas e outras glicoproteínas

CA-125

Produzido por células de Müller do ovário

Câncer de ovário

CA 19-9

Produzido pelo epitélio do sistema digestório

Câncer de pâncreas, cólon

Cluster de diferenciação

  Antígenos CD

Encontrados nos leucócitos

Usados para determinar o tipo e o nível de

diferenciação de leucócitos envolvidos em

diferentes tipos de leucemia e de linfoma

Os marcadores séricos que se mostraram mais úteis na prática clínica são gonadotrofina coriônica humana (hCG), CA­  125,  PSA,  a­fetoproteína  (AFP),  antígeno  carcinoembrionário  (CEA)  e  antígenos  CD  de  células  do  sangue.2 Um  hormônio  normalmente  produzido  pela  placenta,  o  hCG,  é  utilizado  como  marcador  para  o  diagnóstico, prescrição  de  tratamento  e  acompanhamento  da  doença  em  mulheres  com  alto  risco  para  tumor  trofoblástico gestacional.  PSA  é  utilizado  como  marcador  no  câncer  da  próstata  e  CA­125  como  marcador  de  câncer  do  ovário. Marcadores para leucemia e linfomas são reunidos no chamado grupo de antígenos de diferenciação (CD, cluster of differentiation). Os antígenos CD ajudam a fazer a distinção entre linfócitos T e B, monócitos, granulócitos e células NK e variantes imaturas dessas células.2. Alguns  cânceres  expressam  antígenos  fetais  que  normalmente  aparecem  apenas  durante  o  desenvolvimento embrionário.2 As  duas  substâncias  que  se  mostraram  mais  úteis  como  marcadores  tumorais  foram AFP  e  CEA. A AFP é sintetizada pelo fígado fetal, saco vitelino e sistema digestório, sendo a principal proteína plasmática do feto. São encontrados níveis elevados em pessoas com câncer hepático primário e também têm sido observados em alguns cânceres dos testículos, ovário, pâncreas e estômago. O CEA é normalmente produzido pelo tecido embrionário no intestino,  pâncreas  e  fígado,  sendo  confeccionado  por  diferentes  tipos  de  câncer.  Dependendo  do  nível  plasmático considerado elevado, os níveis de CEA são altos em aproximadamente 60 a 90% dos casos de carcinoma colorretal, de 50 a 80% dos casos de câncer do pâncreas e de 25 a 50% dos tumores gástricos e da mama.2 Como acontece com a  maioria  dos  outros  marcadores  tumorais,  níveis  elevados  de  CEA  e AFP  podem  ser  encontrados  com  condições não  cancerígenas,  e  níveis  elevados  de  ambos  dependem  do  tamanho  do  tumor,  de  modo  que  nenhum  deles  é  útil como exame de rastreamento precoce de câncer. Como  ferramentas  de  diagnóstico,  os  marcadores  tumorais  têm  limitações.  Quase  todos  os  marcadores  podem apresentar  níveis  elevados  em  condições  benignas,  e  a  maior  parte  não  mostra  elevação  nas  fases  iniciais  do processo maligno. Assim, marcadores tumorais têm valor limitado como exames de rastreamento. Além disso, não são suficientemente específicos para diagnosticar um processo maligno, mas, uma vez diagnosticado um associado a níveis  elevados  de  um  marcador  tumoral,  esse  marcador  pode  ser  utilizado  para  avaliar  a  resposta  ao  tratamento. Exemplos de marcadores tumorais que auxiliam na avaliação da resposta ao tratamento e de recorrência do câncer de mama  são  CA  15­3  e  CA  27­29,  ambos  encontrados  no  tecido  mamário. 3  Níveis  extremamente  elevados  de  um marcador tumoral podem indicar prognóstico desfavorável ou a necessidade de tratamento mais agressivo. Talvez o maior valor dos marcadores tumorais resida no monitoramento da terapia de indivíduos com câncer generalizado. O nível  da  maior  parte  dos  marcadores  tumorais  tende  a  diminuir  com  o  sucesso  do  tratamento  e  aumentar  com  a disseminação da neoplasia ou recidiva.

Métodos citológicos e histológicos Exames  histológicos  e  citológicos  são  métodos  laboratoriais  utilizados  para  examinar  células  e  tecidos.  Várias abordagens  de  amostragem  estão  disponíveis,  incluindo  esfregaços  citológicos,  biopsia  de  tecido  e  aspiração  com agulha fina.2 Exame  de  Papanicolaou.  O  exame  de  Papanicolaou  é  um  método  citológico  utilizado  para  a  detecção  de  células cancerígenas.  É  o  exame  microscópico  de  um  esfregaço  adequadamente  preparado  por  um  patologista  com  o propósito de detectar células anormais. A utilidade do Papanicolaou baseia­se no fato de que as células cancerígenas não  têm  as  propriedades  de  coesão  e  as  junções  intercelulares  características  do  tecido  normal.  Sem  essas características, as células cancerígenas tendem a esfoliar e se misturar com secreções que cercam o crescimento da neoplasia. Embora o exame de Papanicolaou seja amplamente utilizado como teste de rastreamento para o câncer de colo do útero, pode ser realizado para outras secreções orgânicas, incluindo a drenagem do mamilo, lavagens anais, líquido pleural ou peritoneal e lavagens gástricas. Biopsia de tecido. A biopsia de tecido, que é de fundamental importância no diagnóstico correto e na histologia do câncer,  envolve  a  remoção  de  uma  amostra  de  tecido  para  estudo  microscópico. As  biopsias  podem  ser  obtidas  de

diversas  maneiras,  incluindo  biopsia  com  agulha  de  aspiração,  métodos  endoscópicos,  como  broncoscopia  ou cistoscopia,  que  envolvem  a  passagem  de  um  endoscópio  através  de  um  orifício  até  a  estrutura  envolvida,  ou métodos  laparoscópicos.  Em  alguns  casos,  é  feita  uma  incisão  cirúrgica,  de  onde  são  obtidas  amostras  de  biopsia. Biopsias de excisão são aquelas em que toda a neoplasia é removida. Geralmente são neoplasias pequenas, sólidas e massas palpáveis. Se a neoplasia for muito grande para ser completamente removida, pode ser extirpada uma parte do tecido da massa para análise. A preservação adequada da amostra inclui imersão rápida em uma solução fixadora, como  formalina,  com  preservação  de  uma  parte  da  amostra  em  um  fixador  especial  para  análise  por  microscopia eletrônica, ou refrigeração imediata para possibilitar a análise adequada de hormônios, receptores e outros tipos de moléculas. O congelamento pode ser feito para determinar a natureza de uma lesão de massa ou avaliar as margens de uma neoplasia extirpada, para assegurar que toda a neoplasia tenha sido removida.2 Aspiração por agulha fina é outra abordagem amplamente utilizada. O procedimento envolve a aspiração de células e  líquido  com  uma  agulha  de  pequeno  calibre.  O  método  é  utilizado  com  mais  frequência  na  avaliação  de  lesões facilmente palpáveis em locais como tireoide, mama e linfonodos. Modernas técnicas de imagem têm viabilizado a extensão do método a estruturas mais profundas, como linfonodos pélvicos e pâncreas. Imuno­histoquímica. A imuno­histoquímica envolve o uso de anticorpos para facilitar a identificação de produtos ou marcadores de superfície celular.2 Por exemplo, certos carcinomas anaplásicos, linfomas malignos, melanomas e sarcomas  têm  aspecto  muito  semelhante  ao  microscópio,  mas  devem  ser  identificados  com  precisão  porque  o tratamento e prognóstico são bastante diferentes. Anticorpos contra filamentos intermediários provaram ser úteis em casos  assim,  porque  células  neoplásicas  muitas  vezes  contêm  filamentos  intermediários,  característicos  dos  seus tecidos de origem.2 A imuno­histoquímica também pode ser usada para determinar o local de origem de neoplasias metastáticas. Muitas pessoas com câncer apresentam metástase. Em casos em que a origem da metástase é obscura, a  detecção  imunoquímica  de  antígenos  específicos  de  tecidos  ou  órgãos  pode  ajudar  a  identificar  a  origem  da neoplasia. A imuno­histoquímica também pode ser utilizada para detectar moléculas com significado prognóstico ou terapêutico.  Por  exemplo,  a  detecção  de  receptores  de  estrógeno  em  células  de  câncer  de  mama  tem  importância prognóstica e terapêutica, porque essas neoplasias respondem à terapia antiestrogênica. Tecnologia  de  microarrays.  A  tecnologia  de  microarrays  [ou  microarranjos]  usa  “chips  genéticos”  possíveis  de executarem simultaneamente ensaios em miniatura para detectar e quantificar a expressão de um grande número de genes.2 A  vantagem  da  tecnologia  de  microarrays  é  a  capacidade  de  analisar  um  grande  número  de  alterações  nas células  cancerígenas  para  determinar  padrões  gerais  de  comportamento  que  não  podiam  ser  avaliados  por  meios convencionais.  Existem  matrizes  de  DNA  comercialmente  disponíveis  para  auxiliar  na  tomada  de  decisões  clínicas sobre o tratamento do câncer de mama. Além de identificar o tipo de neoplasia, os  microarrays são utilizados para prever  o  prognóstico  e  a  resposta  terapêutica,  examinando  alterações  na  neoplasia  após  a  terapia  e  classificando neoplasias hereditárias.2

Estadiamento e classificação de neoplasias Os  dois  métodos  básicos  para  a  classificação  do  câncer  são  a  graduação,  de  acordo  com  as  características histológicas  ou  celulares  da  neoplasia,  e  o  estadiamento,  de  acordo  com  a  propagação  clínica  da  doença.  Os  dois métodos são usados para determinar o curso da doença e auxiliar na seleção de um plano de tratamento ou de manejo adequados. A classificação de neoplasias envolve o exame microscópico das células cancerígenas para determinar o nível de diferenciação e o número de mitoses. Cânceres são classificados como de grau I, II, III e IV com o aumento da  anaplasia  ou  a  falta  de  diferenciação.  O  estadiamento  dos  cânceres  usa  métodos  para  determinar  a  extensão  e propagação da doença. Procedimentos cirúrgicos podem ser empregados para determinar o tamanho da neoplasia e o comprometimento de linfonodos. O  estadiamento  clínico  do  câncer  é  destinado  a  grupos  populacionais,  de  acordo  com  a  extensão  da  doença.  Ele ajuda  a  determinar  a  escolha  do  tratamento  para  indivíduos  específicos,  estimando  o  prognóstico  e  comparando  os resultados de diferentes regimes de tratamento. O sistema TNM do American Joint Committee on Cancer (AJCC) é o mais empregado.53 Esse sistema, brevemente descrito no Quadro 8.2, classifica a doença em estágios usando três componentes tumorais: • T representa a extensão e distribuição do tumor primário

• N refere­se ao envolvimento dos linfonodos regionais

• M descreve a extensão do envolvimento metastático. O  tempo  é  indicado  como  estadiamento  clinicodiagnóstico  (cTNM),  estadiamento  pós­cirúrgico anatomopatológico  (pTNM),  estadiamento  cirúrgico­avaliativo  (sTNM),  estadiamento  para  retratamento  (rTNM)  e estadiamento após necropsia (aTNM).53

Quadro 8.2

Sistema de classi䎇梻cação TNM

T (Tumor)

Tx

O tumor não pode ser adequadamente avaliado

T0

Não há evidência de tumor primário

Tis

Carcinoma in situ

T1 a T4

Aumento progressivo no tamanho ou extensão do tumor

N (Linfonodos)

Nx

Os linfonodos regionais não podem ser avaliados

N0

Nenhuma evidência de metástase em linfonodos regionais

N1 a 3

Comprometimento crescente dos linfonodos regionais

M (Metástase)

Mx

Não pode ser avaliada

M0

Inexistência de metástase a distância

M1

Existência de metástase a distância, especi䎇梻car local

Tratamento do câncer Os objetivos dos métodos de tratamento do câncer se dividem em três categorias: curativos, de controle e paliativos. As modalidades mais comuns são cirurgia, radioterapia, quimioterapia, terapia hormonal e bioterapia. O tratamento do  câncer  envolve  o  uso  de  um  programa  cuidadosamente  planejado,  que  combine  os  benefícios  de  diferentes modalidades de tratamento com o conhecimento de uma equipe interdisciplinar de especialistas, incluindo médicos, cirurgiões e radiologistas especializados em oncologia; enfermeiros; farmacêuticos e uma variada equipe auxiliar.

Cirurgia Cirurgia é o tratamento mais antigo para o câncer e, até recentemente, o único que poderia curar pessoas com câncer. Atualmente,  procedimentos  cirúrgicos  são  utilizados  para  diagnóstico,  estadiamento,  remoção  da  neoplasia  e  como paliativos  (alívio  dos  sintomas)  quando  a  cura  não  pode  ser  alcançada.  O  tipo  de  cirurgia  é  determinado  pela extensão da doença, localização e estruturas envolvidas, taxa de crescimento da neoplasia e potencial invasivo, risco cirúrgico  e  qualidade  de  vida  do  paciente  após  o  procedimento.  Frequentemente,  a  cirurgia  é  o  primeiro  tratamento para  casos  de  neoplasias  sólidas.  Se  a  neoplasia  é  pequena  e  com  margens  bem  definidas,  muitas  vezes  pode  ser totalmente  removida.  No  entanto,  se  a  neoplasia  é  grande  ou  envolve  tecidos  vitais,  a  remoção  cirúrgica  pode  ser difícil, se não impossível. A  cirurgia  fornece  várias  abordagens  para  o  tratamento  do  câncer.  Por  exemplo,  pode  ser  o  tratamento  curativo primário para cânceres local ou regionalmente contidos, sem metástases, ou que não tenham invadido órgãos vitais. É empregada também como um componente de terapia adjuvante, em combinação com quimioterapia ou radioterapia, em  outros  tipos  de  câncer.  Técnicas  cirúrgicas  também  podem  ser  usadas  para  controlar  emergências  oncológicas,

como hemorragia gastrintestinal. Outra abordagem inclui o uso de técnicas cirúrgicas para a profilaxia de câncer em famílias  com  alto  risco  geneticamente  confirmado  para  o  desenvolvimento  de  câncer.  Por  exemplo,  a  realização  de uma colectomia total com colostomia pode ser sugerida para uma pessoa com polipose adenomatosa familiar, devido ao maior risco de desenvolvimento de câncer antes de 40 anos de idade. As  técnicas  cirúrgicas  têm  se  expandido  para  incluir  a  criocirurgia,  quimiocirurgia,  cirurgia  a  laser  e  cirurgia laparoscópica. Criocirurgia envolve a instilação de nitrogênio líquido na neoplasia através de uma sonda. É utilizada no tratamento de câncer do fígado e da próstata. Quimiocirurgia é empregada para câncer de pele. Envolve o uso de uma pasta corrosiva em combinação com múltiplos cortes a frio, para garantir a remoção completa da neoplasia. A cirurgia a laser utiliza um feixe de laser para a ressecção da neoplasia. É empregada de modo eficaz em cirurgias da retina  e  das  cordas  vocais.  A  cirurgia  laparoscópica  envolve  a  realização  de  cirurgia  abdominal  através  de  duas pequenas incisões, uma para visualizar o interior da cavidade e outra para a inserção de instrumentos cirúrgicos. A  cooperação  entre  centros  de  tratamento  de  câncer  em  todo  o  mundo  ajudou  a  padronizar  e  aprimorar  os procedimentos cirúrgicos, determinar que tipo de câncer deve ser tratado por intervenção cirúrgica e estabelecer em que  ordem  as  modalidades  de  tratamento  cirúrgico  e  não  cirúrgico  devem  ser  utilizadas.  Também  foi  dada  grande ênfase  ao  desenvolvimento  de  técnicas  cirúrgicas  que  preservam  a  imagem  e  forma  corporais  sem  comprometer  a função  essencial.  Cirurgias  com  preservação  de  nervos  e  tecidos  são  o  principal  método  utilizado,  sempre  que possível, mesmo que a remoção completa da neoplasia seja o objetivo final.

Radioterapia A  radioterapia  é  um  dos  métodos  mais  utilizados  no  tratamento  do  câncer. 2  Pode  ser  empregada  como  método primário  ou  como  tratamento  adjuvante  além  de  cirurgia,  quimioterapia,  ou  ambas.  Também  pode  ser  utilizada  no tratamento paliativo, para reduzir sintomas, como dor óssea resultante de metástases em indivíduos com câncer em estágio  avançado. A  radiação  é  usada  para  tratar  emergências  oncológicas,  como  síndrome  da  veia  cava  superior, compressão da medula espinal ou obstrução brônquica. A  radioterapia  utiliza  partículas  ou  ondas  de  alta  energia  para  destruir  ou  danificar  as  células  cancerígenas.  A absorção  de  energia  radioativa  pelos  tecidos  conduz  à  ionização  das  moléculas  ou  à  criação  de  radicais  livres.  A radiação também pode produzir efeitos indiretamente, por interação com água (que representa aproximadamente 80% do  volume  celular),  para  produção  de  radicais  livres,  que  danificam  as  estruturas  celulares.  A  radiação  pode interromper o processo do ciclo celular, matar as células ou danificar seu DNA.2 A radiação deve produzir quebras na fita dupla do DNA para matar uma célula, devido à alta capacidade da célula para reparar quebras de fita simples. Os  efeitos  terapêuticos  da  radioterapia  derivam  do  fato  de  que  as  células  de  uma  neoplasia  maligna  proliferam rapidamente  e  têm  pouca  diferenciação,  apresentando  maior  probabilidade  de  serem  danificadas  do  que  células  do tecido normal, que proliferam mais lentamente. Em certa medida, no entanto, a radiação é prejudicial para todas as células  que  proliferam  rapidamente,  incluindo  as  da  medula  óssea  e  do  revestimento  da  mucosa  do  sistema digestório.  O  tecido  normal  geralmente  é  capaz  de  se  recuperar  dos  danos  da  radiação  mais  prontamente  do  que  o tecido canceroso. Além de seus efeitos letais, a radiação também produz lesões subletais. A recuperação dos efeitos de  doses  subletais  de  radiação  ocorre  no  intervalo  entre  a  primeira  dose  e  as  subsequentes.2,54  Por  isso,  grandes doses totais de radiação podem ser toleradas quando divididas em várias doses fracionadas.54 A  dose  de  radiação  escolhida  para  o  tratamento  de  um  câncer  em  particular  é  determinada  por  fatores  como radiossensibilidade  do  tipo  de  neoplasia,  tamanho  da  neoplasia  e,  mais  importante,  a  tolerância  dos  tecidos circundantes.2,54 O termo radiossensibilidade descreve as propriedades inerentes de uma neoplasia que determinam sua capacidade de resposta à radiação. Ela é muito variável entre os diferentes tipos de câncer e acredita­se que varia em função de sua posição no ciclo celular. Cânceres de crescimento rápido têm células que tipicamente apresentam maior  radiossensibilidade  que  cânceres  de  crescimento  lento. A  combinação  de  fármacos  citotóxicos  selecionados com  radiação  demonstrou  efeito  radiossensibilizador  em  células  neoplásicas  pela  alteração  da  distribuição  do  ciclo celular,  aumentando  o  dano  e  diminuindo  a  reparação  ao  DNA.  Radiossensibilizadores  incluem  5­fluoruracila, capecitabina, paclitaxel, gencitabina e cisplatina.55 Resposta à radiação  descreve  a  maneira  pela  qual  uma  neoplasia  radiossensível  responde  à  irradiação.  Um  dos principais  determinantes  da  capacidade  de  resposta  à  radiação  é  a  oxigenação  da  neoplasia,  pois  o  oxigênio  é  uma rica  fonte  de  radicais  livres,  que  se  formam  e  destroem  componentes  celulares  essenciais  durante  a  irradiação.54 Muitas  neoplasias  de  crescimento  rápido  superam  a  capacidade  de  seu  suprimento  sanguíneo  e  ficam  privadas  de

oxigênio.  As  células  hipóxicas  dessas  neoplasias  são  mais  resistentes  à  radiação  do  que  células  normais  ou neoplásicas  muito  oxigenadas.  É  importante  o  emprego  de  métodos  para  assegurar  a  oferta  de  oxigênio  adequada, como níveis apropriados de hemoglobina. As  curvas  de  dose­resposta,  que  expressam  o  grau  de  lesão  tecidual  letal  em  relação  à  dose  de  radiação,  são determinadas  pelo  número  de  células  que  sobrevivem  a  doses  fracionadas  de  radiação.  A  utilização  de  doses fracionadas mais frequentes aumenta a probabilidade de que as células cancerígenas se dividam e estejam no período vulnerável  do  ciclo  celular  durante  a  administração  da  radiação.  Esse  tipo  de  dosagem  também  dá  tempo  para  que tecidos  normais  reparem  os  danos  causados  pela  radiação.  Um  importante  foco  de  pesquisa  tem  sido  a  busca  de medicamentos para reduzir os efeitos biológicos da radiação sobre o tecido normal. Esses medicamentos, conhecidos como radioprotetores,  preferencialmente  deveriam  proteger  as  células  normais  dos  efeitos  citotóxicos  da  radiação. Um fármaco, amifostina, foi considerado como uma possibilidade para redução dos efeitos da radiação, impactando a sobrevivência, mas isso não foi comprovado em um estudo com indivíduos com câncer pélvico, de pulmão, cabeça e  pescoço.56  Portanto,  embora  tenha  havido  algum  progresso  promissor,  os  radioprotetores  precisam  ser  mais pesquisados. Administração.  A  radiação  terapêutica  pode  ser  distribuída  por  uma  de  três  maneiras:  por  feixe  externo  ou teleterapia, com feixes gerados a distância e dirigidos à neoplasia; braquiterapia, em que uma fonte radioativa selada é  colocada  próxima  ou  diretamente  no  local  da  neoplasia;  e  terapia  sistêmica,  quando  radioisótopos  são administrados  por  via  oral  ou  injetados  no  local  da  neoplasia.2  A  radiação  a  partir  de  qualquer  fonte  diminui  de intensidade  como  uma  função  do  quadrado  da  distância  em  relação  à  fonte.  A  teleterapia,  que  é  a  forma  mais comumente  utilizada  de  radioterapia,  mantém  a  intensidade  sobre  um  grande  volume  de  tecido  aumentando  a distância entre fonte e superfície. Na braquiterapia, a distância entre fonte e superfície é pequena, portanto o volume de tratamento efetivo é pequeno. O  feixe  de  radiação  externa  é  mais  frequentemente  utilizado  com  um  acelerador  linear  ou  uma  máquina  de cobalto­60.2 O acelerador linear deve ser o aparelho preferencial devido à sua versatilidade e precisão na distribuição da dose, bem como a velocidade de administração do tratamento. Aceleradores lineares produzem radiação ionizante por  meio  de  um  processo  no  qual  os  elétrons  são  acelerados  a  uma  velocidade  muito  alta,  atingem  um  alvo  e produzem raios X de alta energia (fótons). O acelerador linear pode variar o nível de energia de radiação oferecida, de  modo  a  atingir  diferentes  espessuras.  São  usadas  várias  abordagens  de  modificação  de  feixe  para  definir  e  dar forma  ao  feixe,  aumentando  os  danos  da  radiação  no  local  da  neoplasia  e  preservando  os  tecidos  normais circundantes.  O  paciente  é  equipado  com  um  molde  de  plástico  ou  gesso  para  manter  o  corpo  imóvel,  enquanto feixes  de  radiação  são  enviados  de  várias  direções.  Radioterapia  de  intensidade  modulada  (IMRT)  e  radioterapia conformacional  tridimensional  (3D  CRT)  são  formas  avançadas  de  radioterapia  externa.  Como  acontece  com  3D CRT, técnicas de imagem computadorizadas são utilizadas para calcular as doses mais eficazes e as combinações de tratamento. Esse mapeamento preciso da neoplasia possibilita o fornecimento de feixes de radiação em conformidade com  os  contornos  da  neoplasia,  diminuindo  a  dose  e,  consequentemente,  a  toxicidade  ao  tecido  normal  adjacente. Devido à precisão do método, é ainda mais importante que a pessoa permaneça no lugar certo e perfeitamente imóvel durante  o  tratamento.  Isso  geralmente  exige  a  fabricação  de  um  molde  especial  antes  do  tratamento,  para  manter  o corpo posicionado. A  braquiterapia  envolve  a  inserção  de  fontes  radioativas  seladas  em  uma  cavidade  orgânica  (intracavitária)  ou diretamente  em  tecidos  do  corpo  (intersticial).  Braquiterapia  significa  “terapia  curta”,  indicando  que  o  efeito  da radiação está limitado a zonas próximas da fonte de radiação.56 A braquiterapia pode ser subdividida em dois tipos: com dose elevada de radiação (HDR) e com dose baixa de radiação (LDR), de acordo com a velocidade de liberação da radiação. HDR usa uma única fonte altamente radioativa, ligada a um cabo e acoplada em uma máquina robótica denominada afterloader  remoto  de  HDR.  Quando  o  tratamento  é  administrado,  a  fonte  de  radiação  é  empurrada  a partir  do  afterloader  remoto  através  de  um  tubo  até  uma  área  próxima  ao  local  da  neoplasia.  Máquinas  com afterloading  remoto  tornam  possível  inserir  um  material  radioativo  (p.  ex.,  césio­137,  irídio­192)  na  área  da neoplasia durante um intervalo de tempo específico e removê­la, enquanto a equipe de oncologia está fora da sala de tratamento. Isso minimiza a exposição à radiação do pessoal e diminui o tempo de tratamento, viabilizando o uso de fontes  radioativas  de  dose  intermediária  e  alta  dose.56  Por  outro  lado,  a  fonte  de  radiação  para  braquiterapia  LDR pode ser colocada em dispositivos de cateter ou em fontes de radiação seladas (p. ex., contas, sementes) e inserida

diretamente  na  área  a  ser  tratada  ou  próximo  a  ela.  A  terapia  com  LDR  pode  ser  temporária  ou  permanente. Braquiterapia  com  LDR  temporária  pode  ser  realizada  como  um  procedimento  hospitalar,  com  aplicadores  de radiação  e  fontes  mantidas  no  paciente  por  alguns  dias.  Materiais  radioativos  com  meia­vida  relativamente  curta, como  iodo­125  ou  paládio­103,  são  comumente  encapsulados  e  utilizados  em  implantes  permanentes  (p.  ex., implantes de sementes utilizadas no tratamento do câncer de próstata). Fontes de radiação internas não seladas são injetadas por via intravenosa ou administradas por via oral. O iodo­ 131,  administrado  oralmente,  é  utilizado  no  tratamento  do  câncer  de  tireoide.  Radiocirurgia  estereotáxica  é  um método  para  destruição  de  neoplasias  cerebrais  e  metástases  cerebrais  pela  liberação  de  uma  única  dose  elevada  de radiação através de feixes estreitos estereotaxicamente dirigidos. Radiocirurgia com faca gama (gamma knife) torna possível a aplicação de radiação focalizada para metástase cerebral limitada e está associada a menores complicações a longo prazo, como disfunção cognitiva, em comparação com a irradiação do cérebro inteiro. Efeitos adversos.  Infelizmente,  a  radioterapia  afeta  negativamente  o  tecido  normal  que  prolifera  rapidamente  e  é semelhante  às  células  malignas.  Durante  o  tratamento  com  radiação,  os  danos  a  células  normais  podem  produzir efeitos  adversos.  Tecidos  localizados  na  área  de  tratamento  são  mais  frequentemente  afetados,  geralmente  pele, mucosa  do  sistema  digestório  e  medula  óssea. Anorexia,  náuseas,  vômitos  e  diarreia  são  comuns  com  irradiação abdominal  e  pélvica.  Esses  sintomas  geralmente  podem  ser  controlados  com  medicação  e  medidas  dietéticas.  O principal efeito sistêmico é a fadiga. A maioria desses efeitos secundários é temporária e reversível. A  radiação  também  pode  provocar  supressão  da  medula  óssea,  principalmente  quando  administrada  na  medula óssea em áreas do esqueleto. Subsequentemente, a contagem sanguínea total é afetada, resultando na redução inicial do  número  de  leucócitos,  seguida  por  uma  diminuição  dos  trombócitos  (plaquetas)  e,  por  fim,  das  hemácias.  Isso predispõe  a  pessoa  a  infecção,  hemorragia  e  anemia,  respectivamente.  Hemogramas  frequentes  são  realizados durante a radioterapia para monitorar a função da medula óssea. O  feixe  de  radiação  externa  tem  de  primeiro  penetrar  na  pele  e,  dependendo  da  dose  total  e  do  tipo  de  radiação utilizada,  podem  se  desenvolver  reações  cutâneas.  Com  doses  moderadas  de  radiação,  o  cabelo  começa  a  cair espontaneamente ou quando penteado, depois de 10 a 14 dias. Com doses maiores, se desenvolve um eritema (muito parecido com queimadura solar), que pode escurecer a pele, e em doses mais elevadas podem aparecer manchas de descamação  seca  ou  úmida.  Felizmente,  o  epitélio  é  renovado  após  a  interrupção  do  tratamento.  Pode  acontecer mucosite ou descamação das mucosas oral e faríngea, que por vezes pode ser grave, como efeito colateral previsível em pessoas que recebem irradiação na área da cabeça e pescoço. Dor e dificuldades para comer e beber podem afetar negativamente o estado nutricional do indivíduo. É possível que a irradiação da região pélvica cause impotência ou disfunção erétil, bem como irritação, secura e descarga vaginal, dispareunia e, como efeito tardio, estenose vaginal.

Quimioterapia A  quimioterapia  tem  evoluído  como  uma  das  principais  modalidades  para  o  tratamento  sistêmico  do  câncer.  Ao contrário  da  cirurgia  e  radioterapia,  a  quimioterapia  é  um  tratamento  sistêmico,  que  contribui  para  que  os medicamentos  alcancem  o  local  da  neoplasia  e  outras  áreas  distantes. Agentes  quimioterápicos  podem  ser  a  forma primária  de  tratamento  ou  podem  ser  usados  como  parte  de  um  plano  de  tratamento  multimodal.  É  o  principal tratamento  para  a  maioria  dos  cânceres  hematológicos  e  algumas  neoplasias  sólidas,  incluindo  coriocarcinoma, câncer testicular, leucemias aguda e crônica, linfoma não Hodgkin e Hodgkin e mieloma múltiplo. Em pessoas com doença disseminada generalizada, atualmente a quimioterapia age apenas como cuidado paliativo, não curativo. Os  quimioterápicos  para  o  tratamento  do  câncer  exercem  seus  efeitos  por  meio  de  vários  mecanismos.  No  nível celular, exercem sua ação letal por processos que impedem o crescimento e a replicação das células. A quimioterapia mata as células cancerígenas por interromper a síntese de DNA, RNA e proteínas, influenciar a produção de enzimas e  impedir  de  maneira  genérica  a  mitose  celular.2  Em  condições  ideais,  a  medicação  anticâncer  deveria  erradicar células  cancerígenas  sem  danificar  os  tecidos  normais.  Embora  em  processo  de  desenvolvimento,  os  agentes anticâncer disponíveis não estão livres de efeitos tóxicos. Para  a  maioria  dos  agentes  quimioterápicos,  a  relação  entre  a  sobrevivência  de  células  neoplásicas  e  a  dose  é exponencial, com o número de células sobreviventes proporcional à dose do fármaco, e o número de células em risco de  exposição  proporcional  à  ação  destrutiva.  A  quimioterapia  é  mais  eficiente  no  tratamento  de  neoplasias  com fração alta de crescimento, devido à sua capacidade de matar rapidamente células em processo de divisão.

Um  dos  principais  problemas  na  quimioterapia  do  câncer  é  o  desenvolvimento  de  resistência  celular. Experimentalmente,  a  resistência  aos  medicamentos  pode  ser  altamente  específica  para  um  único  agente  e, geralmente,  é  baseada  em  alterações  genéticas  em  determinada  célula  neoplásica.  Em  outros  casos,  sobrevém  um fenômeno de multirresistência, abrangendo fármacos com diferentes estruturas. Esse tipo de resistência muitas vezes envolve o aumento da expressão de genes transportadores transmembranares, envolvidos no efluxo dos fármacos. Agentes quimioterápicos comumente são classificados de acordo com o local e mecanismo de ação. Medicamentos com  estrutura  e  efeitos  semelhantes  sobre  a  função  celular  geralmente  são  agrupados,  e  também  apresentam  perfis semelhantes  de  efeitos  secundários.  Agentes  com  interação  direta  e  indireta  com  o  DNA  são  duas  das  grandes categorias de quimioterápicos.2  Outros  agentes  sistêmicos  incluem  agentes  direcionados  a  hormônios  e  moléculas. Os  quimioterápicos  também  podem  ser  classificados  como  específicos  ou  inespecíficos  para  o  ciclo  celular.  Os fármacos são considerados específicos para o ciclo celular se exercem sua ação durante uma fase específica do ciclo celular. Por exemplo, o metotrexato, um antimetabólito, age interferindo na síntese de DNA e, portanto, interrompe a fase S do ciclo celular. Os medicamentos são considerados inespecíficos se exercem seus efeitos em todas as fases do  ciclo  celular.  Os  agentes  de  alquilação  são  inespecíficos  para  o  ciclo  celular  e  agem  rompendo  o  DNA  tanto quando  as  células  estão  no  estado  de  repouso  quanto  quando  estão  em  divisão.  Como  os  quimioterápicos  têm mecanismos  de  ação  diferentes,  muitas  vezes  são  combinados  agentes  inespecíficos  e  específicos  para  o  ciclo  no tratamento do câncer. Agentes  de  interação  direta  com  o  DNA.  Agentes  que  interagem  diretamente  com  o  DNA  incluem  agentes alquilantes, antibióticos antineoplásicos e inibidores da topoisomerase. Como classe, os agentes alquilantes exercem seus efeitos citotóxicos transferindo seu grupo alquil para diversos componentes celulares.57 A alquilação do DNA no núcleo da célula é provavelmente a principal interação a causar morte celular. Os agentes alquilantes têm efeitos vesicantes diretos e podem danificar os tecidos no local de administração, bem como produzir toxicidade sistêmica. A  toxicidade  geralmente  está  relacionada  com  a  dose  e  ocorre  principalmente  em  tecidos  de  proliferação  rápida, como medula óssea, sistema digestório e tecidos de reprodução. Os  antibióticos  antineoplásicos  são  substâncias  produzidas  por  bactérias  que  na  natureza  parecem  oferecer proteção  contra  microrganismos  hostis.  Como  classe,  ligam­se  diretamente  ao  DNA  e,  frequentemente,  sofrem reações de transferência de elétrons para gerar radicais livres nas proximidades da molécula de DNA, resultando em danos  na  forma  de  quebras  simples  ou  cross­links.  Todos  os  antibióticos  antineoplásicos  em  uso  clínico  são originalmente  isolados  a  partir  de  um  micróbio  do  solo,  Streptomyces.57  Entre  eles  estão  as  antraciclinas, dactinomicina,  bleomicina  e  mitomicina.  As  antraciclinas  (p.  ex.,  doxorrubicina  e  daunorrubicina)  estão  entre  as substâncias citotóxicas mais utilizadas no tratamento do câncer.57 A principal toxicidade limitante da dose de todas as  antraciclinas  é  a  cardiotoxicidade  e  mielossupressão,  com  neutropenia  mais  comumente  observada  que trombocitopenia.  Podem  ocorrer  duas  formas  de  cardiotoxicidade:  aguda  e  crônica.  A  forma  aguda  acontece  nos primeiros  2  a  3  dias  de  tratamento  e  se  apresenta  com  arritmia,  distúrbios  de  condução,  outras  alterações eletrocardiográficas,  pericardite  e  miocardite.57  Essa  forma  é  geralmente  transitória  e  na  maioria  dos  casos assintomática. A forma crônica de cardiotoxicidade resulta em miocardiopatia dilatada dose­dependente. Os esforços para  minimizar  o  perfil  de  toxicidade  dos  antibióticos  antineoplásicos  têm  resultado  no  desenvolvimento  de compostos  análogos  (p.  ex.,  idarrubicina,  epirrubicina).  Tem  sido  usada  tecnologia  de  lipossoma  com  dois antibióticos  antineoplásicos  (doxorrubicina  e  daunorrubicina)  para  desenvolver  quimioterápicos  encapsulados  por lipossomas revestidos. Os  inibidores  da  DNA  topoisomerase  bloqueiam  a  divisão  celular,  interferindo  na  ação  das  enzimas topoisomerase que quebram e rejuntam ligações fosfodiéster nas fitas de DNA para impedir que elas se embaracem durante  a  separação  e  desenrolem  da  dupla­hélice.57 A  topoisomerase  I  produz  quebras  de  fita  simples  ( nicks)  e  a topoisomerase II produz quebras das fitas duplas. As epipodofilotoxinas (etoposido e teniposido) são inibidores de topoisomerase  II  que  bloqueiam  a  divisão  celular  do  final  de  S  à  fase  G2  do  ciclo  celular.  As  camptotecinas (topotecana,  irinotecano)  inibem  a  ação  da  topoisomerase  I,  enzima  responsável  pelo  corte  e  rejunção  de  cadeias simples de DNA. A inibição dessa enzima interfere na nova selagem das quebras e danifica o DNA. Agentes  de  interação  indireta  com  o  DNA.  Os  agentes  de  interação  indireta  com  o  DNA  incluem  os antimetabólitos e os inibidores do fuso mitótico. Os antimetabólitos (antagonistas do ácido fólico e antagonistas de purina e pirimidina) interrompem as vias bioquímicas relacionadas com nucleotídios e síntese de ácido nucleico. Os

antimetabólitos  podem  causar  danos  ao  DNA  indiretamente  por  meio  de  incorporação  errada  no  DNA,  tempo anormal da síntese de DNA ou funcionamento anormal das enzimas biossintéticas purina e pirimidina.57 Eles tendem a transmitir o maior efeito durante a fase S do ciclo celular. Devido à especificidade com a fase S, os antimetabólitos têm se mostrado mais eficazes quando administrados como infusão prolongada. Os efeitos colaterais mais comuns incluem estomatite, diarreia e mielossupressão. Os  alcaloides  vegetais,  incluindo  os  alcaloides  da  vinca  e  taxanos,  são  fármacos  que  afetam  as  estruturas necessárias  para  a  formação  de  microtúbulos  do  citoesqueleto  e  o  fuso  mitótico.57  Embora  cada  grupo  de medicamentos afete os microtúbulos, seu mecanismo de ação é diferente. Os alcaloides da vinca (p. ex., vimblastina, vincristina)  inibem  a  polimerização  da  tubulina,  o  que  afeta  a  montagem  dos  microtúbulos.  Este  efeito  inibitório resulta  na  interrupção  da  mitose  na  metáfase,  parando  o  processo  de  divisão,  que  então  conduz  à  morte  celular. Vimblastina é um vesicante potente com o qual se deve ter cautela na administração. A toxicidade inclui  náuseas e vômitos,  supressão  da  medula  óssea  e  alopecia. Apesar  das  semelhanças  no  mecanismo  de  ação,  a  vincristina  tem um  espectro  diferente  de  ações  e  toxicidades  em  relação  à  vimblastina.  A  principal  toxicidade  dose­limitante  é  a neurotoxicidade,  geralmente  expressa  como  uma  neuropatia  sensorial  periférica,  embora  tenha  sido  observada disfunção  do  sistema  nervoso  autônomo  (p.  ex.,  hipotensão  ortostática,  problemas  no  esfíncter,  íleo  paralítico), paralisia  dos  nervos  cranianos,  ataxia,  convulsões  e  coma.  Os  taxanos  (p.  ex.,  paclitaxel,  docetaxel)  diferem  dos alcaloides da vinca porque estabilizam os microtúbulos contra a despolimerização. Os microtúbulos estabilizados são incapazes  de  sofrer  as  mudanças  normais  necessárias  para  a  conclusão  do  ciclo  celular.  Esses  fármacos  são administrados  por  via  intravenosa,  e  requerem  a  utilização  de  um  veículo  que  pode  causar  reações  de hipersensibilidade. Além das reações de hipersensibilidade, o perfil de efeitos secundários inclui mielossupressão e neurotoxicidade periférica, em forma de dormência do tipo luva e meia (glove­and­stocking) e parestesia. Quimioterapia combinada. Foi constatado que a quimioterapia combinada é mais eficaz do que o tratamento com um  único  medicamento.  A  quimioterapia  combinada  cria  um  ambiente  mais  hostil  para  o  crescimento  de  células neoplásicas  por  meio  de  concentrações  mais  elevadas  de  medicamentos  e  impede  o  desenvolvimento  de  clones resistentes das células cancerígenas. Com esse método, são empregados vários fármacos com diferentes mecanismos de ação, vias metabólicas, tempos de manifestação da ação e recuperação, efeitos colaterais e tempo de aparecimento de  efeitos  secundários.  Medicamentos  utilizados  em  combinação  devem  ser  eficazes  individualmente  contra  a neoplasia e podem ter sinergia com os outros. As vias de administração e os horários das doses são cuidadosamente pensados  para  assegurar  a  entrega  otimizada  das  formas  ativas  dos  medicamentos  durante  a  fase  sensível  do  ciclo celular. Administração.  Muitos  medicamentos  empregados  na  quimioterapia  do  câncer  são  administrados  por  via intravenosa. Dispositivos de acesso venoso (VAD, venous access devices) muitas vezes são implantados em pessoas com acesso venoso precário e naquelas que necessitam de terapia intravenosa frequente ou contínua. Um VAD pode ser utilizado para a administração domiciliar de quimioterápicos, coleta de sangue e administração de componentes sanguíneos. Tais sistemas acessam a circulação venosa através de um cateter exteriorizado ou um cateter implantado com ports de acesso. Em alguns casos, os fármacos são administrados por infusão contínua, utilizando uma bomba de infusão, que possibilita à pessoa permanecer em casa e manter suas atividades rotineiras. Efeitos adversos. A  quimioterapia  é  administrada  com  base  no  mecanismo  de  resposta  à  dose  ( i. e.,  quanto  mais substância é administrada, maior será o número de células cancerígenas mortas). Fármacos quimioterápicos afetam células neoplásicas e células de tecido normal de proliferação rápida. O nadir (i. e., o ponto mais baixo) é o ponto de toxicidade  máxima  para  determinado  efeito  adverso  de  um  fármaco  e  é  estabelecido  de  acordo  com  o  tempo necessário para chegar a esse ponto. Como muitos efeitos tóxicos dos medicamentos quimioterápicos persistem por algum  tempo  depois  que  a  administração  é  interrompida,  os  tempos  de  nadir  e  as  taxas  de  recuperação  são  guias úteis  para  avaliar  os  efeitos  do  tratamento. Alguns  efeitos  colaterais  aparecem  imediatamente  ou  após  alguns  dias (agudos), alguns dentro de semanas (intermediários) e outros, meses ou anos após a administração da quimioterapia (longo prazo). A maioria dos medicamentos quimioterápicos causa pancitopenia devido à supressão da medula óssea, resultando em  neutropenia  (que  causa  infecções),  anemia  (que  causa  fadiga)  e  trombocitopenia  (que  aumenta  o  risco  de sangramento). A disponibilidade de fatores de crescimento hematopoéticos (p. ex., fator estimulador de colônias de granulócitos  [G­CSF]  e  IL­11,  uma  citocina  que  estimula  a  produção  de  plaquetas)  encurtou  o  período  de

mielossupressão,  reduzindo  a  necessidade  de  hospitalização  por  infecção  e  hemorragia.  O  fator  de  crescimento epoetina a, uma forma da proteína eritropoetina fabricada pelos rins para auxiliar na produção de hemácias, é usado com  uma  população  selecionada.  Essa  substância  tem  sido  analisada  desde  2004,  quando  se  descobriu  que  poderia promover  a  progressão  da  neoplasia  e  reduzir  a  sobrevivência.  O  risco­benefício  de  epoetina  precisa  ser cuidadosamente ponderado antes de o medicamento ser administrado para anemia induzida por quimioterapia.58 Anorexia, náuseas e vômitos são problemas comumente associados à quimioterapia contra o câncer.2 A gravidade dos vômitos está relacionada com o potencial emético da substância em particular. Esses sintomas podem ocorrer em minutos  ou  horas  após  a  administração  e  acredita­se  que  é  a  estimulação  da  zona  de  gatilho  quimiorreceptora  do bulbo que inicia os vômitos. A zona de gatilho quimiorreceptora reage aos níveis de produtos químicos que circulam no  sangue.  Os  sintomas  agudos  geralmente  desaparecem  em  24  a  48  h  e  muitas  vezes  podem  ser  aliviados  por antieméticos. As abordagens farmacológicas para evitar náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia melhoraram muito  ao  longo  das  últimas  décadas.  Os  antagonistas  dos  receptores  de  serotonina  (5­HT3)  (p.  ex.,  ondansetrona, granisetrona,  dolasetrona,  palonosetrona)  facilitam  o  uso  de  medicamentos  quimioterápicos  altamente  eméticos  por reduzir  com  maior  eficiência  náuseas  e  vômitos  induzidos  por  esses  fármacos.  Esses  antieméticos  são  eficazes quando administrados tanto por via oral quanto intravenosa. Alopecia  ou  queda  de  cabelo  resulta  do  comprometimento  na  proliferação  dos  folículos  pilosos  e  é  um  efeito colateral de uma série de medicamentos contra o câncer. Geralmente é temporária, e o cabelo tende a voltar a crescer quando o tratamento é interrompido. As estruturas de proliferação rápida do sistema reprodutivo são especialmente sensíveis à ação de medicamentos contra o câncer. As mulheres podem sofrer alterações no fluxo menstrual ou ter amenorreia.  Os  homens  podem  ter  redução  na  contagem  de  esperma  (oligospermia)  ou  ausência  de  esperma (azoospermia). Também podem ocorrer efeitos teratogênicos ou mutagênicos. Agentes quimioterápicos são tóxicos para todas as células. O potencial mutagênico, carcinogênico e teratogênico dessas substâncias tem encontrado forte suporte tanto em estudos em animais quanto em seres humanos. Devido a esses  riscos  potenciais,  são  necessários  cuidados  especiais  ao  manusear  ou  administrar  esses  medicamentos.  As substâncias,  seus  frascos  e  equipamento  de  administração  exigem  descarte  especial  como  resíduos  perigosos.  A Occupational Safety and Health Administration (OSHA), a Oncology Nursing Society (ONS) e a American Society of Hospitals Pharmacists (ASHP) criaram diretrizes para a administração segura de quimioterápicos. Estudos epidemiológicos têm mostrado aumento do risco para o desenvolvimento de segunda malignidade, como leucemia aguda após utilização a longo prazo de agentes alquilantes. Acredita­se que essa segunda malignidade seja o  resultado  de  alterações  celulares  diretamente  produzidas  pela  substância  ou  pela  supressão  da  resposta imunológica.

Terapia hormonal A  terapia  hormonal  consiste  na  administração  de  medicamentos  destinados  a  perturbar  o  ambiente  hormonal  de células  cancerígenas.  A  ação  dos  hormônios  e  anti­hormônios  depende  da  existência  de  receptores  tumorais específicos.  Entre  os  tumores  conhecidos  por  responder  à  manipulação  hormonal  estão  os  de  mama,  próstata  e endométrio. Além  destes,  outros  tipos  de  câncer,  como  o  sarcoma  de  Kaposi  e  o  câncer  dos  rins,  fígado,  ovário  e pâncreas, podem ser tratados com terapia hormonal. A teoria por trás da maioria dos tratamentos de câncer à base de hormônios é privar as células cancerígenas dos sinais hormonais que poderiam estimulá­las a se dividir. As  opções  terapêuticas  para  alterar  o  ambiente  hormonal  na  mulher  com  câncer  de  mama  ou  no  homem  com câncer de próstata incluem medidas cirúrgicas e farmacológicas. A cirurgia envolve a remoção do órgão responsável pela  produção  do  hormônio  que  estimula  o  tecido­alvo  (p.  ex.,  ooforectomia  em  mulheres  e  orquiectomia  em homens).  Métodos  farmacológicos  se  concentram  em  reduzir  os  níveis  circulantes  de  hormônios  ou  alterar  os receptores hormonais de modo que não respondam ao hormônio. A  supressão  farmacológica  dos  níveis  hormonais  circulantes  pode  ser  efetuada  por  meio  de  dessensibilização hipofisária,  como  acontece  com  a  administração  de  andrógenos,  ou  pela  administração  de  análogos  do  hormônio liberador  de  gonadotrofinas  (GnRH)  que  atuam  no  nível  do  hipotálamo  para  inibir  a  produção  e  liberação  de gonadotrofina.  Outra  classe  de  substâncias,  os  inibidores  da  aromatase,  é  usada  para  tratar  algumas  formas  de câncer de mama em estágio inicial. Estas substâncias atuam interrompendo os processos bioquímicos que convertem o andrógeno suprarrenal androstenediona em estrona.59 A aromatização de um precursor androgênico em estrogênio ocorre na gordura corporal. Como o estrogênio promove o crescimento do câncer de mama, a síntese de estrogênio

no tecido adiposo pode ser um fator importante para o crescimento do câncer de mama durante a pós­menopausa. A  função  do  receptor  hormonal  pode  ser  alterada  pela  administração  de  doses  farmacológicas  de  hormônios exógenos  que  atuam  provocando  diminuição  nos  receptores  hormonais  ou  pelas  substâncias  anti­hormônio (antiestrogênios [tamoxifeno, fulvestrant] e antiandrogênios [flutamida, bicalutamida, nilutamida]), que se ligam aos receptores  hormonais,  tornando­os  inacessíveis  à  estimulação  hormonal.  Inicialmente,  as  pessoas  costumam responder  favoravelmente  ao  tratamento;  no  final,  porém,  o  câncer  se  torna  resistente  à  manipulação  hormonal  e devem ser buscadas outras abordagens para controlar a doença.

Bioterapia A bioterapia envolve a utilização de imunoterapia e modificadores da resposta biológica como um meio de alterar a resposta imunitária do indivíduo ao câncer.57 Os principais mecanismos pelos quais a bioterapia exerce seus efeitos são modificações na resposta do hospedeiro ou na biologia da célula neoplásica. Imunoterapia. As  técnicas  de  imunoterapia  incluem  imunoterapia  ativa  e  passiva  ou  adotiva.  Imunoterapia  ativa envolve  tratamentos  inespecíficos,  como  o  bacilo  Calmette­Guérin  (BCG).  BCG  é  uma  cepa  atenuada  da  bactéria que  causa  a  tuberculose  bovina. Age  como  um  estimulante  não  específico  do  sistema  imunológico  e  é  instilado  na bexiga como um meio para o tratamento do câncer superficial da bexiga. Imunoterapia passiva ou adotiva envolve a transferência de células imunológicas cultivadas em um hospedeiro portador de neoplasia. Os primeiros esforços da pesquisa  com  imunoterapia  adotiva  envolvem  a  transferência  de  células  NK  ou  de  linfócitos  T  sensibilizados, combinada com citocinas, para o hospedeiro portador de neoplasia, na tentativa de aumentar a resposta imunológica do  hospedeiro.  No  entanto,  ensaios  clínicos  randomizados  não  demonstraram  qualquer  benefício  com  a  adição  do componente  celular,  além  do  benefício  das  citocinas  isoladamente.  Outras  pesquisas  têm  focalizado  a  utilização  de células dendríticas apresentadoras de antígenos como veículos de entrega para antígenos neoplásicos. Modificadores da resposta biológica. Os modificadores da resposta biológica podem ser agrupados em três tipos: citocinas, que incluem interferonas e IL; anticorpos monoclonais (MoAb); e fatores de crescimento hematopoéticos. Alguns  agentes,  como  as  interferonas,  têm  mais  de  uma  função  biológica,  incluindo  ações  antivirais, imunomoduladoras  e  antiproliferativas.  Interferonas  são  polipeptídios  endógenos  sintetizados  por  algumas  células em resposta a diversos estímulos celulares ou virais. Os três principais tipos de interferonas são a, b e g, cada grupo diferindo  em  termos  dos  receptores  de  superfície  celular.2,57  As  interferonas  parecem  inibir  a  replicação  viral  e também podem estar envolvidas na inibição da síntese de proteínas da neoplasia e no prolongamento do ciclo celular, aumentando a porcentagem de células na fase G0. As interferonas estimulam as células assassinas e o linfócito T. A interferona­g foi aprovada para o tratamento da tricoleucemia, sarcoma de Kaposi relacionado com a AIDS e LMC e como terapia adjuvante para pessoas com alto risco de recorrência de melanoma.57 Interleucinas (IL) são citocinas que afetam a comunicação entre as células ligando­se a receptores nas membranas da  superfície  celular  de  células­alvo.  Das  18  IL  conhecidas,  a  mais  estudada  tem  sido  a  IL­2.  Um  recombinante humano  IL­2  (IL­2r,  aldesleucina)  foi  aprovado  pela  FDA  e  está  sendo  utilizado  no  tratamento  de  células  renais metastáticas e melanoma.57 Anticorpos  monoclonais  são  altamente  específicos  (p.  ex.,  IgG,  que  é  a  imunoglobulina  mais  comumente utilizada)  e  derivados  de  clones  celulares.2,57  Cientistas  desenvolveram  métodos  para  produção  de  grandes quantidades  de  MoAb  específicos  para  células  neoplásicas.  Para  que  um  Moab  tenha  atividade  terapêutica  como modalidade  de  tratamento  do  câncer,  deve  haver  um  antígeno­alvo  específico  apenas  em  células  cancerígenas.  Os MoAb  agem  interferindo  com  alvos  ligados  à  membrana  celular,  bloqueando  ligantes­receptores,  modulação imunológica, citotoxicidade mediada por complemento e citotoxicidade celular relacionada com anticorpo.60

Terapia­alvo A terapia­alvo oncológica usa substâncias que atacam seletivamente as células malignas sem causar danos a células normais.2,57 Ela se concentra em moléculas alteradas e vias de sinalização que possibilitam às células cancerígenas crescerem e se disseminarem de modo descontrolado. A primeira terapia­alvo usava os MoAb. Outras  terapias  específicas  incluem  pequenas  moléculas  que  bloqueiam  enzimas  específicas  e  fatores  de crescimento  envolvidos  no  crescimento  de  células  cancerígenas. As  tirosinoquinases  são  componentes  intrínsecos das vias de sinalização dos fatores de crescimento envolvidos na proliferação de linfócitos e outros tipos de células.

O  mesilato  de  imatinibe  é  um  inibidor  da  proteína  tirosinoquinase  indicado  no  tratamento  de  leucemia  mieloide crônica. A via de sinalização do receptor do fator de crescimento epidérmico tem sido proposta como alvo para um medicamento anticâncer. A angiogênese tem sido continuamente explorada para terapia­alvo oncológica. 57 Um agente antiangiogênico,  o  bevacizumabe,  tem  como  alvo  o  bloqueio  do  fator  de  crescimento  endotelial  vascular,  que  é liberado por muitos tipos de câncer para estimular a proliferação de novos vasos sanguíneos. Foi aprovado em 2004 para câncer metastático de cólon e câncer de células não pequenas.3 Descobriu­se que a combinação de bevacizumabe e  quimioterapia  aumenta  respostas  objetivas,  tempo  médio  de  progressão  e  tempo  de  sobrevida  de  pessoas  com câncer colorretal metastático, em comparação com a quimioterapia isoladamente.61 Outra classe de fármacos, as substâncias indutoras de apoptose, faz as células cancerígenas entrarem em processo de  apoptose  por  interferir  em  proteínas  envolvidas.  Em  2008,  a  FDA  aprovou  o  bortezomibe  como  tratamento  de primeira  linha  para  casos  de  mieloma  múltiplo.62  Essa  substância  provoca  a  morte  de  células  cancerígenas  por bloquear enzimas conhecidas como proteassomas, que ajudam a regular a função e o crescimento celular.

Resumo

Os  métodos  utilizados  para  o  diagnóstico  de  câncer  variam  de  acordo  com  o  tipo  de  neoplasia  e  sua  localização. Como muitos tipos de câncer são curáveis, são importantes o diagnóstico precoce e as práticas de saúde destinadas a  promover  a  detecção  da  doença  nos  estágios  iniciais.  Estudos  histológicos  são  realizados  em  laboratório, utilizando  células  ou  amostras  de  tecido.  Existem  dois  métodos  básicos  de  classificação  de  neoplasias:  a classificação  de  acordo  com  as  características  histológicas  ou  teciduais  e  o  estadiamento  clínico  de  acordo  com  a propagação  da  doença.  O  sistema  TNM  para  o  estadiamento  clínico  do  câncer  leva  em  conta  o  tamanho  da neoplasia, o comprometimento de linfonodos e a metástase. Planos de tratamento que utilizam mais de um tipo de terapia, muitas vezes em combinação, estão oferecendo a cura  para  uma  série  de  tipos  de  câncer,  que  há  algumas  décadas  tinham  prognóstico  desfavorável,  e  estão aumentando  a  expectativa  de  vida  em  relação  a  outros  tipos  de  câncer.  Os  procedimentos  cirúrgicos  são  mais precisos  e  menos  invasivos,  preservando  a  função  do  órgão  e  resultando  em  melhor  qualidade  de  vida. Equipamentos  de  radiação  recentes  e  novas  técnicas  viabilizam  a  destruição  mais  controlada  das  células cancerígenas, preservando tecidos normais. A quimioterapia tem evoluído como uma das principais modalidades de tratamento  sistêmico  para  o  câncer. Ao  contrário  da  cirurgia  e  da  radioterapia,  a  quimioterapia  é  um  tratamento sistêmico,  que  possibilita  que  os  fármacos  alcancem  o  local  da  neoplasia,  bem  como  outros  locais  distantes. As principais  classes  de  quimioterápicos  são  os  agentes  de  interação  direta  com  o  DNA  (agentes  alquilantes, antibióticos  antineoplásicos  e  inibidores  da  topoisomerase)  e  agentes  de  interação  indireta  com  o  DNA (antimetabólitos  e  inibidores  do  fuso  mitótico).  Os  agentes  quimioterápicos  oncológicos  também  podem  ser classificados como específicos para o ciclo celular ou não específicos para o ciclo celular, dependendo do fato de exercerem  sua  ação  durante  uma  fase  específica  desse  ciclo.  Outros  agentes  sistêmicos  incluem  agentes­alvo hormonais e moleculares que bloqueiam as enzimas específicas e fatores de crescimento envolvidos na proliferação de células cancerígenas.

Câncer infantil

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Citar os tipos mais comuns de câncer que afetam lactentes, crianças e adolescentes



Descrever de que modo os cânceres que afetam crianças são diferentes dos que afetam adultos



Discutir possíveis efeitos a longo prazo da radioterapia e da quimioterapia em adultos sobreviventes de câncer infantil

O  câncer  infantil  é  relativamente  raro,  representando  cerca  de  1%  de  todas  as  neoplasias  malignas  nos  EUA.63 Embora raro, o câncer continua sendo a segunda causa de morte entre crianças de 1 a 14 anos de idade nos EUA.63 Em 2011, nos EUA,d 11.210 crianças foram diagnosticadas com câncer e 1.320 morreram da doença.63 Os tipos de câncer ocorridos com mais frequência na infância incluem leucemia, linfoma não Hodgkin e Hodgkin e câncer ósseo

(osteossarcoma e sarcoma de Ewing). A taxa de sobrevida global para crianças é de 80%.64

Incidência e tipos O  espectro  do  câncer  infantil  difere  significativamente  dos  que  afetam  adultos.  Embora  a  maioria  dos  cânceres  de adultos  seja  de  origem  epitelial  (p.  ex.,  de  pulmão,  de  mama,  colorretal),  os  cânceres  infantis  diferem  por envolverem geralmente sistema hematopoético, sistema nervoso, tecidos moles, ossos e rins.64 Durante  o  primeiro  ano  de  vida,  neoplasias  embrionárias,  como  neoplasia  de  Wilms,  retinoblastoma  e neuroblastoma,  estão  entre  os  tipos  mais  comuns.  Neoplasias  embrionárias,  juntamente  com  leucemia  aguda, linfoma  não  Hodgkin  e  gliomas,  têm  um  pico  de  incidência  em  crianças  de  2  a  5  anos  de  idade.  À  medida  que crescem,  especialmente  depois  que  ultrapassam  a  puberdade,  aumenta  a  incidência  de  neoplasias  malignas  ósseas, linfoma  de  Hodgkin,  neoplasias  de  células  germinativas  gonadais  (carcinoma  testicular  e  de  ovário)  e  vários carcinomas, como câncer de tireoide e melanoma maligno.

Neoplasias embrionárias Diversas  neoplasias  do  1o  ano  de  vida  e  da  primeira  infância  têm  origem  embrionária;  isso  significa  que  exibem características de organogênese semelhantes às do desenvolvimento embrionário. Devido a essas características, tais neoplasias  são  frequentemente  designadas  com  o  sufixo  blastoma  (p.  ex.,  nefroblastoma  [neoplasia  de  Wilms], retinoblastoma, neuroblastoma).2 Neoplasia de Wilms e neuroblastoma são particularmente ilustrativos desse tipo de neoplasia da infância. Neuroblastomas.  Surgem  do  tecido  da  crista  neural  primordial  no  sistema  nervoso  simpático  e  na  medula suprarrenal.65  São  a  segunda  neoplasia  maligna  sólida  mais  comum  na  infância,  depois  das  neoplasias  cerebrais. Cerca de 40% dos neuroblastomas surgem na glândula suprarrenal, com o restante ocorrendo em qualquer lugar ao longo  da  cadeia  simpática,  mais  comumente  na  região  paravertebral  do  abdome  e  do  mediastino  posterior.  As neoplasias  podem  surgir  em  muitos  outros  locais,  incluindo  pelve,  pescoço  e  cérebro.  As  manifestações  clínicas variam de acordo com o local principal e a função neuroendócrina da neoplasia. Em crianças menores de 2 anos de idade,  o  neuroblastoma  geralmente  se  apresenta  com  grandes  massas  abdominais,  febre  e  provável  perda  de  peso. Dor  óssea  sugere  doença  metastática.  Cerca  de  90%  das  neoplasias,  independentemente  da  localização,  secretam catecolaminas,  que  é  uma  característica  importante  para  o  diagnóstico  (altos  níveis  sanguíneos  de  catecolaminas  e altos níveis na urina de metabólitos de catecolaminas).65,66 Infelizmente,  um  neuroblastoma  é  também  uma  neoplasia  extremamente  maligna,  particularmente  em  crianças com  doença  avançada.66,67  Embora  a  taxa  de  sobrevida  em  5  anos  tenha  melhorado,  o  neuroblastoma  continua  a representar aproximadamente 15% das mortes por câncer na infância. Lactentes tendem a ter prognóstico melhor do que  crianças  mais  velhas.64  Quase  todas  as  crianças  com  neuroblastoma  são  diagnosticadas  antes  dos  5  anos  de idade, e quanto mais jovem no momento do diagnóstico, melhor é o prognóstico.68

Biologia do câncer infantil Do  mesmo  modo  que  nos  casos  de  câncer  de  adultos,  provavelmente  não  existe  uma  causa  única  para  o  câncer infantil.  Apesar  de  uma  série  de  condições  genéticas  estarem  associadas  ao  câncer  infantil,  essas  condições  são relativamente  raras,  sugerindo  uma  interação  entre  suscetibilidade  genética  e  exposições  ambientais.  Há  algumas condições  hereditárias  que  aumentam  a  suscetibilidade  na  infância  e  até  mesmo  câncer  de  adulto.  Um  exemplo  é  a síndrome  de  Down,  que  na  verdade  aumenta  o  risco  de  leucemia  linfoblástica  aguda  (LLA)  e  leucemia  mieloide aguda (LMA).2,69 Embora  constitua  apenas  uma  pequena  porcentagem  do  câncer  infantil,  a  biologia  de  diversas  dessas  neoplasias ilustra vários aspectos biológicos importantes de uma neoplasia, como a teoria de dois eventos de genes supressores neoplásicos  recessivos  (p.  ex.,  mutação  do  gene  RB  em  RB);  defeitos  no  reparo  do  DNA;  e  semelhanças histológicas  entre  organogênese  e  oncogênese.  Síndromes  associadas  a  defeitos  na  reparação  do  DNA  incluem xeroderma  pigmentosa,  em  que  há  risco  aumentado  de  câncer  de  pele,  devido  a  defeitos  na  reparação  do  DNA danificado  pela  luz  ultravioleta.  O  desenvolvimento  do  câncer  infantil  também  tem  sido  associado  ao  imprinting genômico.  A  inativação  é  determinada  pelo  fato  de  o  gene  ser  herdado  da  mãe  ou  do  pai.  Por  exemplo,  o  alelo materno  para  o  fator  de  crescimento­2  (IGF­2)  semelhante  à  insulina  normalmente  é  inativado  (imprinted).  Em

algumas  neoplasias  de  Wilms,  a  perda  de  imprinting  (reexpressão  do  alelo  materno)  pode  ser  demonstrada  pela superexpressão da proteína IGF­2, que é um fator de crescimento embrionário.70

Diagnóstico e tratamento Como  a  maioria  dos  casos  de  câncer  infantil  é  curável,  a  detecção  precoce  é  fundamental.  Além  disso,  existem vários tipos de câncer para os quais uma terapia menor é indicada do que para estágios mais avançados da doença. Na  verdade,  a  detecção  precoce  muitas  vezes  minimiza  a  quantidade  e  a  duração  do  tratamento  necessário  para  a cura,  portanto  pode  não  só  aumentar  o  potencial  de  cura,  mas  preservar  a  criança  de  um  tratamento  intensivo  ou prolongado. Infelizmente, não há sinais de alerta precoce ou exames de rastreamento para o câncer infantil. Febre prolongada, linfadenopatia  persistente,  perda  de  peso  inexplicada,  massas  crescentes  (especialmente  em  associação  à  perda  de peso)  e  anormalidades  no  funcionamento  do  SNC  devem  ser  considerados  sinais  de  alerta  de  câncer  em  crianças. Como  esses  sinais  e  sintomas  do  câncer  muitas  vezes  são  semelhantes  aos  de  doenças  comuns  na  infância,  é  fácil um diagnóstico de câncer nos estágios iniciais passar despercebido. O diagnóstico de câncer infantil envolve muitos dos mesmos métodos utilizados nos casos de adultos. Em geral, o exame  histopatológico  é  uma  parte  essencial  do  processo  de  diagnóstico.  O  estadiamento  preciso  da  doença  é especialmente  essencial  em  casos  de  câncer  infantil,  em  que  os  benefícios  potenciais  do  tratamento  devem  ser cuidadosamente ponderados contra potenciais efeitos a longo prazo. O  tratamento  do  câncer  infantil  é  complexo,  intenso,  prolongado  e  está  em  constante  evolução.  Geralmente envolve terapias multidisciplinares e multimodais adequadas, bem como a avaliação de recorrência e efeitos tardios da doença e das terapias utilizadas no tratamento. Duas  modalidades  são  frequentemente  utilizadas  no  tratamento  do  câncer  infantil,  com  a  quimioterapia  sendo  a mais  amplamente  empregada,  seguida,  por  ordem  de  utilização,  de  cirurgia,  radioterapia  e  terapia  com  agentes biológicos.  A  quimioterapia  é  mais  utilizada  no  tratamento  de  crianças  com  câncer  do  que  em  adultos,  porque crianças  toleram  melhor  os  efeitos  adversos  agudos  e,  em  geral,  as  neoplasias  pediátricas  são  mais  sensíveis  à quimioterapia do que cânceres do adulto.70 Com  o  aprimoramento  dos  métodos  de  tratamento,  o  número  de  crianças  que  sobrevivem  ao  câncer  infantil  é crescente. Como resultado do tratamento, quase 80% das crianças e adolescentes com diagnóstico de câncer tornam­ se  sobreviventes  a  longo  prazo.63  Infelizmente,  a  terapia  é  capaz  de  produzir  sequelas  tardias,  como  crescimento prejudicado,  disfunção  neurológica,  disfunção  hormonal,  miocardiopatia,  fibrose  pulmonar  e  risco  de  segunda neoplasia. Assim,  um  dos  desafios  crescentes  é  a  prestação  de  cuidados  de  saúde  adequados  aos  sobreviventes  do câncer que se manifesta na infância e na adolescência.71

Radioterapia A  radioterapia  apresenta  o  risco  de  efeitos  a  longo  prazo  para  os  sobreviventes  de  câncer  na  infância.  Os  efeitos tardios  da  radioterapia  são  influenciados  pelos  órgãos  e  tecidos  incluídos  na  região  do  tratamento,  pelo  tipo  de radiação  administrada,  pela  dose  diária  fracionada  e  pela  radiação  acumulada  e  a  idade  em  que  foi  administrado  o tratamento.  Existe  um  risco  maior  para  o  desenvolvimento  de  melanoma,  carcinoma  espinocelular  e  carcinoma basocelular.  Alterações  musculoesqueléticas  também  são  comuns  após  a  radioterapia.  Mesmo  com  os  métodos atuais, os sobreviventes podem ter alterações que causam dor e alteração no funcionamento musculoesquelético. A radioterapia craniana (CRT) tem sido usada para tratar neoplasias cerebrais, LLA, neoplasias de tecidos moles da cabeça e pescoço e RB. O efeito tardio mais comum da radiação com dosagem entre moderada e alta de todo o cérebro é redução da função intelectual.72 Sobreviventes de neoplasia cerebral tratados em uma idade mais jovem são particularmente  suscetíveis.  A  radiação  craniana  também  está  associada  a  distúrbios  neuroendócrinos, particularmente  deficiência  de  hormônio  do  crescimento.  Assim,  crianças  que  chegam  à  idade  adulta  após  CRT podem  ter  estatura  física  reduzida.  Quanto  menor  a  idade  e  maior  a  dose  de  radiação,  maior  o  desvio  no  padrão normal  de  crescimento.  A  deficiência  do  hormônio  do  crescimento  em  adultos  está  associada  a  aumento  da prevalência  de  dislipidemia,  resistência  à  insulina  e  mortalidade  por  causas  cardiovasculares.  Doses  moderadas  de CRT também estão associadas à obesidade, principalmente em pacientes do sexo feminino. 72 Durante muitos anos, a radiação do cérebro inteiro ou CRT foi o principal método de prevenção de recidiva no SNC de crianças com LLA.

O reconhecimento de disfunção cognitiva associada a CRT tem levado ao emprego de outros métodos para profilaxia do SNC.72 A  radiação  de  tórax  e  campo  manto  (linfonodos  na  área  do  pescoço,  subclavicular,  axilar  e  no  mediastino)  é frequentemente utilizada no tratamento de linfomas de Hodgkin e não Hodgkin e metástases do pulmão. Esse campo expõe  à  radiação  ionizante  o  tecido  em  desenvolvimento  de  mama,  coração  e  pulmões.  Sobreviventes  do  sexo feminino  tratadas  com  esse  tipo  de  radiação  enfrentam  risco  significativo  para  o  desenvolvimento  de  câncer  de mama.72  Grande  parte  do  coração  é  exposta  em  campos  de  radiação  no  tórax  e  manto,  resultando  em  doença prematura subsequente na artéria coronária, em valvas e no pericárdio. A exposição dos pulmões à radioterapia pode originar  redução  da  função  pulmonar.  Doenças  da  tireoide,  principalmente  o  hipotireoidismo,  são  comuns  após radiação no manto ou pescoço. Sobreviventes  de  câncer  infantil  tratados  com  radiação  abdominal  ou  pélvica  também  estão  em  risco  para  uma variedade  de  problemas  de  saúde  tardios  envolvendo  sistema  digestório,  fígado,  baço,  rins  e  estruturas  do  trato geniturinário, incluindo as gônadas.72 As complicações do sistema digestório incluem inflamação crônica da mucosa, o que interfere na absorção e digestão de nutrientes. Lesões renais crônicas de radiação podem interferir na função glomerular  ou  tubular;  e  a  fibrose  por  radiação  da  pelve  afeta  adversamente  a  capacidade  e  o  funcionamento  da bexiga.  Os  efeitos  adversos  da  radiação  sobre  a  função  das  gônadas  variam  de  acordo  com  idade,  sexo  e  dose cumulativa.  Atraso  na  maturação  sexual  em  meninos  e  meninas  pode  resultar  da  irradiação  das  gônadas.  Em meninos,  a  produção  de  esperma  é  reduzida  de  maneira  dose­dependente.  Em  meninas,  a  radiação  no  abdome,  na pelve  e  na  coluna  vertebral  é  associada  ao  maior  risco  de  falência  ovariana,  especialmente  se  os  ovários  estão  no campo de tratamento.

Quimioterapia A  quimioterapia  também  apresenta  o  risco  de  efeitos  a  longo  prazo  para  os  sobreviventes  de  câncer  infantil.  Os possíveis  efeitos  tardios  de  agentes  alquilantes  incluem  lesão  das  gônadas  dose­dependente  (hipogonadismo, infertilidade  e  menopausa  precoce).72  A  terapia  com  agentes  alquilantes  também  tem  sido  aliada  a  condições secundárias e dose­dependentes de leucemia mieloide aguda, fibrose pulmonar, doença renal e distúrbios da bexiga. O uso de antraciclinas, incluindo doxorrubicina e daunorrubicina, amplamente empregadas no tratamento de câncer infantil,  pode  resultar  em  miocardiopatia  e  eventual  insuficiência  cardíaca  congestiva.72  Os  efeitos  tardios  da cisplatina  e  carboplatina,  alquilantes  não  clássicos  mais  utilizados,  são  nefrotoxicidade,  ototoxicidade  e neurotoxicidade.  Embora  a  quimioterapia  de  combinação  aumente  a  eficácia  do  tratamento,  também  pode  estar associada ao risco maior de efeitos secundários, em casos em que os agentes têm espectro semelhante de toxicidade. A  quimioterapia  de  combinação  intratecal  para  evitar  recidiva  de  LLA  no  SNC,  que  é  um  santuário  para  células LLA, é conhecida por causar prejuízo cognitivo significativo e persistente em muitas crianças.

Resumo

Embora  a  maioria  dos  cânceres  de  adultos  tenha  origem  nas  células  epiteliais,  a  maioria  dos  cânceres  infantis geralmente  envolve  sistema  hematopoético,  sistema  nervoso  ou  tecido  conjuntivo.  Formas  hereditárias  de  câncer tendem  a  ter  idade  de  manifestação  mais  precoce,  maior  frequência  de  lesões  multifocais  em  um  único  órgão  e envolvimento bilateral de órgãos pares ou múltiplas neoplasias primárias. O diagnóstico precoce do câncer infantil muitas  vezes  deixa  de  ser  feito  porque  os  sinais  e  sintomas  mimetizam  os  de  outras  doenças  da  infância.  Com  o aprimoramento  nos  métodos  de  tratamento,  o  número  de  crianças  que  sobrevivem  ao  câncer  infantil  continua  a aumentar. À medida que essas crianças se aproximam da idade adulta, existe uma preocupação de que a terapia que salvou  suas  vidas  na  infância  possa  produzir  efeitos  tardios,  como  crescimento  prejudicado,  disfunção  cognitiva, disfunção hormonal, miocardiopatia, fibrose pulmonar e risco de segunda neoplasia maligna.

Exercícios de revisão

1.

Uma mulher de 30 anos de idade teve sangramento menstrual intenso e lhe disseram que tem uma neoplasia uterina chamada liomioma. Ela

está preocupada com a possibilidade de ter câncer.

2.

A.

Qual é a diferença entre liomioma e liomiossarcoma?

B.

Como você explicaria a diferença a ela?

Entre

as

características

das

células

cancerígenas

estão

falta

de

diferenciação

celular,

comprometimento

da

adesão

celular

e

perda

da

dependência de ancoragem.

A.

Explique como cada uma dessas características contribui para a utilidade do Papanicolaou como exame de rastreamento para o câncer do

colo do útero.

3.

Um menino de 12 anos de idade com osteossarcoma está sendo atendido em uma clínica oncológica pediátrica. Seu histórico médico revela

que seu pai foi tratado com sucesso para RB ainda criança.

A.

Relacione a genética do gene RB com a hipótese dos “dois eventos” para o desenvolvimento de osteossarcoma no 䎇梻lho de um homem com

RB.

4.

Um homem de 48 anos de idade se apresenta para uma consulta com queixa de fraqueza nas pernas. É fumante inveterado e tem tido tosse

produtiva por anos. Exames diagnósticos posteriores revelaram que tem câncer de pulmão de pequenas células com metástase cerebral. O

plano de tratamento proposto inclui quimioterapia e radioterapia.

A.

Qual é a provável causa da fraqueza nas pernas? Isso está relacionado com o câncer de pulmão?

B.

Relacione o histórico de tabagismo desse homem com o desenvolvimento de câncer de pulmão.

C.

Explique o mecanismo de metástase do câncer.

D.

Explique os mecanismos pelos quais a quimioterapia e a radioterapia são capazes de destruir as células cancerígenas, tendo efeito menor

ou nulo sobre células normais.

5.

Uma jovem de 17 anos de idade foi entrevistada pelo orientador escolar por causa de problemas para se manter em dia com suas atribuições

nos cursos de matemática e ciências. Ela contou ao orientador que teve leucemia quando tinha 2 anos de idade e recebeu radioterapia

craniana. Ela con䎇梻dencia que sempre teve mais problemas com a aprendizagem do que seus colegas de classe e acha que pode ser devido à

radiação. Ela também diz que é mais baixa do que seus colegas e isso a tem incomodado.

A.

Explique a relação entre CRT e redução da função cognitiva e baixa estatura.

B.

Que outros problemas neuroendócrinos essa moça pode apresentar como resultado da radioterapia?

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________________ a N.R.T.: No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, o câncer é a segunda causa de mortalidade. Em 2011, foram registradas mais de 184 mil mortes por câncer no país, e há uma estimativa de quase 600 mil casos novos para 2014. Fonte: http://www.inca.gov.br/. bN.R.T.: 

No  Brasil,  segundo  o  INCA,  o  tabagismo  é  responsável  por  200  mil  mortes  por  ano.  Fonte: http://www.inca.gov.br/tabagismo/frameset.asp?item=atento&link=doencas.htm. c N.R.T.:  Segundo  o  INCA,  o  câncer  de  pele  é  o  mais  frequente  no  Brasil  e  corresponde  a  25%  de  todos  os  tumores  malignos registrados  no  país.  O  melanoma  representa  apenas  4%  do  total  de  câncer  de  pele.  Fonte: http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/pele_melanoma/definicao. dN.R.T.: Segundo o INCA, no Brasil o câncer já representa a primeira causa de morte por doença entre crianças e adolescentes de

1 a 19 anos, para todas as regiões. Fonte: http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/infantil.

Iona  Smith,  38  anos,  se  apresenta  com  eritema  malar  (em  asa  de  borboleta),  desconforto  articular  generalizado, fadiga e intensa fotossensibilidade. Ela foi examinada para lúpus eritematoso sistêmico (LES). Iona afirma que tem apresentado  esses  sintomas  de  maneira  intermitente  durante  aproximadamente  9  meses  e  que  está  sob  estresse considerável.  Sua  família  (os  pais,  a  irmã,  dois  irmãos  e  a  avó)  foi  morta  em  um  acidente  de  automóvel  há aproximadamente  1  ano,  quando  viajavam  para  sua  casa  para  comemorar  o  Natal.  Ela  e  seu  marido  têm  um  filho com  síndrome  de  Asperger,  condição  que  faz  parte  do  espectro  autista,  e  recentemente  seu  marido  ficou

desempregado. Como não tem plano de saúde, Iona protelou a visita ao médico. Durante a investigação clínica, ela declarou que não tem histórico familiar ou pessoal de LES. O  médico  pede  alguns  exames  de  sangue  e  agenda  uma  consulta  de  retorno  em  3  semanas.  O  exame  de  sangue indica  contagem  elevada  de  leucócitos  e  linfócitos,  diminuição  na  contagem  de  plaquetas  e  anemia  hemolítica.  O teste sorológico identifica três autoanticorpos na amostra de sangue de Iona altamente indicativos de LES: anticorpo anti­Smith,  anticoagulante  lúpico  e  anticorpo  antinuclear  (ANA).  Ela  também  tem  quantidades  significativas  de proteína na urina (duas vezes mais), indicando que já está sofrendo de certo grau de doença renal. Seus sintomas e resultados clínicos levam ao diagnóstico de LES. O caso de Iona é discutido com maiores detalhes nos Capítulos 9 e 11.

O estresse tem se tornado um tema cada vez mais discutido no mundo de hoje. O conceito é amplamente debatido nas  áreas  de  saúde  e  também  é  abordado  em  áreas  como  economia,  ciências  políticas,  negócios  e  educação.  Na imprensa em geral, a resposta fisiológica ao estresse frequentemente é apontada como fator contribuinte para vários estados físicos e mentais individuais e problemas sociais. Aproximadamente 25% dos norte­americanos percebem seu nível de estresse como elevado, o que reflete uma pontuação de 8 a 10 em uma escala de 10 pontos. Cinquenta por cento dos norte­americanos percebem seus níveis de estresse como moderados, indicando uma pontuação de 4 a 7 na escala de 10 pontos.1 Os 25% restantes não são contabilizados quanto à sua percepção em relação ao estresse, pois sentem que não é continuamente alto, moderado ou baixo. Os fatores atuais de estresse incluem o terrorismo, o pagamento de contas, a manutenção da saúde, a manutenção do emprego e a economia.

Iona tem convivido com eventos extremamente estressantes, incluindo a morte de vários membros de sua família, possivelmente

alguma culpa pelo fato de que eles estavam viajando para sua casa para passar o feriado, e por precisar lidar com seu lho,

portador da síndrome de Asperger. Agora, ela também acumulou o estresse do desemprego do marido. Iona terá de adquirir

habilidades para o controle do estresse e recursos para ajudá-la com o lho e com a própria saúde. Ela deve ser encaminhada a

um psicólogo e a um assistente social que serão capazes de auxiliá-la na administração do estresse. Caso contrário, esse estresse adicional em sua

vida fará exacerbará sua doença.

Em 1910, quando Sir William Osler elaborou suas Lumleian Lectures sobre angina pectoris (angina de peito), ele descreveu a relação entre estresse e tensão (stress and strain) quanto a essa condição física.2 Aproximadamente 15 anos depois, Walter Cannon, conhecido por seu trabalho em fisiologia, começou a usar a palavra estresse  (stress) em relação aos seus experimentos de laboratório sobre a resposta de “luta ou fuga” (fight­or­flight). Parece possível que  o  termo  tenha  surgido  a  partir  de  seu  trabalho  sobre  as  características  de  homeostase  dos  organismos  vivos  e sua tendência à resiliência quando influenciados por uma “força externa”.3 Mais ou menos na mesma época, Hans Selye,  que  se  tornou  conhecido  por  suas  pesquisas  e  publicações  sobre  o  estresse,  começou  a  empregar  o  termo estresse  de  um  modo  muito  especial,  para  descrever  um  conjunto  orquestrado  de  respostas  orgânicas  a  qualquer forma de estímulo nocivo.4 O  conteúdo  deste  capítulo  foi  organizado  em  três  seções:  homeostase,  resposta  e  adaptação  ao  estresse  e distúrbios da resposta ao estresse.

Homeostase

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:





Descrever o conceito de homeostase

Descrever os componentes de um sistema de controle, incluindo o funcionamento de um sistema de feedback negativo

Os  conceitos  de  estresse  e  adaptação  têm  sua  origem  na  complexidade  do  corpo  humano  e  nas  interações  das células  do  corpo  com  seus  vários  sistemas  orgânicos.  Essas  interações  requerem  que  seja  mantido  um  nível  de homeostase ou constância durante as diversas alterações ocorridas nos ambientes interno e externo. Ao efetivar um estado  de  constância,  a  homeostase  demanda  sistemas  de  controle  de  feedback  que  regulam  a  função  celular  e integram o funcionamento dos diferentes sistemas orgânicos.

Constância do ambiente interno O ambiente em que vivem as células do corpo não é o externo em torno do organismo, mas sim o líquido localizado capaz de envolver cada célula. Claude Bernard, um fisiologista do século 19, foi o primeiro a descrever claramente a  importância  fundamental  de  um  ambiente  interno  estável,  que  ele  chamou  de  milieu  intérieur.5  Bernard reconheceu  que  os  líquidos  corporais  que  cercam  as  células  (líquidos  extracelulares)  e  os  diferentes  sistemas orgânicos fornecem os meios de troca entre o ambiente externo e o interno. É nesse ambiente interno que as células recebem  a  nutrição  e  é  nesse  líquido  que  secretam  seus  resíduos.  Mesmo  o  conteúdo  do  sistema  digestório  e  dos pulmões não se torna parte do ambiente interno até que tenha sido absorvido no líquido extracelular. Um organismo multicelular  é  capaz  de  sobreviver  somente  enquanto  a  composição  do  ambiente  interno  é  compatível  com  as necessidades de sobrevivência das células individualmente. Por exemplo, mesmo uma pequena alteração no pH dos líquidos orgânicos pode perturbar os processos metabólicos de células individuais. O  conceito  de  ambiente  interno  estável  foi  apoiado  por  Walter  B.  Cannon,  que  propôs  que  esse  tipo  de estabilidade,  chamada  por  ele  de  homeostase,  era  alcançado  por  meio  de  um  sistema  de  processos  fisiológicos cuidadosamente  coordenados  opondo­se  a  mudanças.6  Cannon  destacou  que  tais  processos  eram  em  grande  parte automáticos e enfatizou que a homeostase envolve resistência a distúrbios internos e externos. Em seu livro Wisdow of the Body, publicado em 1939, Cannon apresentou quatro proposições experimentais para descrever as características gerais da homeostase.6 Com o conjunto de proposições, Cannon enfatizou que quando um fator é conhecido por alterar a homeostase em determinado sentido, é razoável esperar que existam mecanismos com  o  efeito  contrário.  Na  regulação  homeostática  da  glicemia,  por  exemplo,  é  de  se  esperar  que  haja  tanto mecanismos  para  aumentar  quanto  para  diminuir  esses  níveis.  Enquanto  o  mecanismo  de  resposta  ao  distúrbio inicial  tiver  condições  de  recuperar  a  homeostase,  podem  ser  mantidos  a  integridade  do  organismo  e  o  estado  de normalidade.

Sistemas de controle A capacidade do organismo para funcionar e manter a homeostase em condições de mudança nos ambientes interno e externo depende de milhares de sistemas de controle que regulam a função fisiológica do corpo. Um sistema de controle  homeostático  é  constituído  por  um  conjunto  de  componentes  interligados,  que  funcionam  de  modo  a manter um parâmetro orgânico físico ou químico relativamente constante. Os sistemas de controle orgânico regulam a função celular, controlam os processos vitais e integram o funcionamento dos diferentes sistemas orgânicos. Os pesquisadores têm manifestado interesse recente pelos sistemas de controle neuroendócrino que influenciam o comportamento. Mensageiros bioquímicos no cérebro humano servem para controlar a atividade nervosa, regular o fluxo  de  informações  e,  por  fim,  influenciar  o  comportamento.1  Esses  sistemas  de  controle  fazem  a  mediação  de reações  físicas,  emocionais  e  comportamentais  ao  estresse,  que,  em  conjunto,  são  denominadas  resposta  ao estresse. Assim como qualquer sistema de controle, cada resposta ao estresse envolve um sensor para detectar a mudança, um  integrador  para  processar  todos  os  dados  recebidos  e  compará­los  com  o  “normal”  e  efetores  para  tentar reverter  a  mudança.  Por  exemplo,  os  olhos  (sensor)  de  uma  pessoa  que  está  fazendo  uma  caminhada  veem  uma cobra  (estressor).  Seu  córtex  cerebral  (integrador)  determina  que  a  cobra  é  uma  ameaça  e  ativa  o  coração,  os músculos respiratórios e muitos outros órgãos (efetores) para ajudá­lo a escapar.

Estressores  mais  complexos  requerem  sistemas  de  controle  mais  complexos,  e  algumas  vezes  a  resposta  ao estresse  não  consegue  restaurar  o  equilíbrio  e  a  homeostase.  Por  exemplo,  experiências  físicas  e  psicológicas negativas  durante  o  período  pré­natal  e  a  infância  podem  afetar  a  saúde  do  adulto.7  É  possível  o  impacto  se manifestar  décadas  mais  tarde  como  problemas  de  saúde  mental,  câncer  e  até  mesmo  enfraquecimento  dos  ossos. Por  conseguinte,  é  importante  identificar  as  experiências  iniciais  negativas  e  tratá­las,  não  apenas  para  manter  o estado de saúde da criança, mas também a saúde futura do adulto.8 Além  disso,  é  prudente  que  as  pessoas  tentem  criar  uma  sensação  de  equilíbrio  interior,  a  fim  de  melhorar  os circuitos neurais; por exemplo, mantendo um diário de reflexão sobre suas interações com os outros, especialmente com  aqueles  que  normalmente  lhes  causam  estresse,  e  descrevendo  de  que  maneira,  pela  aplicação  de  novos métodos de comunicação, tanto ao falar quanto ao responder a essas pessoas, é possível criar uma imagem menos estressante  de  suas  interações  diárias  com  um  grupo  específico.  Isso  pode  proporcionar  alguns  benefícios fisiológicos.9  Ao  tentar  seguir  esse  conselho,  o  cérebro  trabalhará  para  se  reorganizar  de  modo  a  lidar  com experiências  futuras,  alterando  o  córtex  pré­frontal  e  reestruturando  suas  vias  neurais.9  Esse  aumento  da neuroplasticidade do cérebro melhorará o equilíbrio emocional, a flexibilidade, as funções imunológica e cardíaca e aumentará  a  capacidade  de  empatia.8  Os  resultados  de  pesquisas  sugerem  também  trabalhar  com  as  pessoas  na tentativa de relembrar suas experiências passadas e dedicar algum tempo a imaginar cenários futuros possíveis, de modo que possam estar mais preparadas para administrar futuras experiências estressantes.10

Estas pesquisas validam a necessidade de Iona de se encontrar com um psicólogo e um assistente social que possam ajudá-la no

controle do estresse e possivelmente na identicação de determinada experiência passada que necessite ser trabalhada. O

trabalho com esses prossionais pode dar suporte ao cérebro para se reorganizar a lidar de modo mais ecaz com seu lho

autista, bem como a administrar seu tempo para um descanso adequado para si mesma.

Conceitos fundamentais

Homeostase



Homeostase é a manutenção proposital de um ambiente interno estável por meio de processos siológicos coordenados que se opõem à mudança



Os sistemas de controle siológicos que se opõem à mudança operam por mecanismos de feedback negativo e consistem em um sensor, que detecta a

alteração, um integrador/comparador, que processa e compara os dados recebidos em relação a um set point, e um sistema efetor, que retorna a função para a

faixa de normalidade determinada pelo set point

Sistemas de feedback A maioria dos sistemas de controle do corpo humano opera por mecanismos de  feedback negativo, que funcionam de  modo  semelhante  ao  termostato  de  um  sistema  de  aquecimento.  Quando  a  função  ou  o  valor  monitorado  cai abaixo do set point do sistema, o mecanismo de feedback faz a função ou o valor se elevar. Quando a função ou o valor aumenta acima do set point, o mecanismo de feedback diminui (Figura 9.1). Por exemplo, no mecanismo de feedback  negativo  que  controla  a  glicemia,  um  aumento  no  nível  de  glicose  estimula  um  aumento  da  liberação  de insulina,  e  isso  melhora  a  remoção  de  glicose  do  sangue.  Quando  a  glicose  é  absorvida  pelas  células  e  os  níveis sanguíneos caem, a secreção de insulina é inibida e o glucagon e outros mecanismos contrarregulatórios estimulam a  liberação  de  glicose  do  fígado,  assim  os  níveis  de  glicose  no  sangue  retornam  ao  normal.  O  mesmo  vale  para todos  os  hormônios  endócrinos  ligados  à  hipófise  para  o  seu  hormônio  estimulante  e  ao  hipotálamo  para  o  seu hormônio  de  liberação.  Por  exemplo,  quando  os  níveis  de  tiroxina  (T4)  na  tireoide  estão  baixos,  isso  aciona  a hipófise para aumentar os níveis do hormônio tireoestimulante (TSH), que, em seguida, aumenta com o propósito de elevar a secreção de T4 pela tireoide. A razão pela qual a maioria dos sistemas de controle fisiológico funciona sob mecanismos de  feedback negativo, em vez de sob mecanismos de feedback positivo, é que um mecanismo de feedback positivo provoca instabilidade ao invés de estabilidade em um sistema. Isso resulta em um ciclo no qual o estímulo inicial produz mais do mesmo.

Por exemplo, em um sistema de feedback positivo, a exposição a um aumento da temperatura ambiente provoca a ação de mecanismos compensatórios destinados a aumentar, em vez de diminuir, a temperatura corporal.

Resumo

Adaptações  fisiológica  e  psicológica  envolvem  a  capacidade  de  manter  a  constância  do  ambiente  interno (homeostase) e o comportamento em face de uma gama de alterações tanto no ambiente interno quanto no externo. Isso concerne à ação de sistemas de controle e de feedback negativo, que regulam a função celular, controlam os processos vitais, regulam o comportamento e integram o funcionamento dos diferentes sistemas orgânicos.

Estresse e adaptação

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Citar a denição de estresse proposta por Selye



Explicar as interações dos componentes do sistema nervoso na mediação da resposta ao estresse



Descrever as respostas ao estresse dos sistemas nervoso autônomo, endócrino, imunológico e musculoesquelético

Figura 9.1 • Ilustração de mecanismos de controle de feedback negativo utilizando como exemplo a glicemia.

O  maior  enfoque  na  promoção  da  saúde  tem  aumentado  o  interesse  no  papel  do  estresse  e  da  resposta biocomportamental ao estresse no desenvolvimento de estados patológicos. O estresse pode contribuir diretamente para  a  produção  ou  exacerbação  de  uma  doença  ou  para  o  desenvolvimento  de  comportamentos  como  tabagismo, excesso de alimentação e uso abusivo de substâncias psicoativas, o que aumenta o risco de doenças.10

Resposta ao estresse No  início  da  década  de  1930,  o  renomado  endocrinologista  Hans  Selye  foi  o  primeiro  a  descrever  um  grupo  de alterações  anatômicas  específicas  que  ocorreram  em  ratos  expostos  a  diferentes  estímulos  experimentais.  Ele chegou  à  compreensão  de  que  essas  mudanças  eram  manifestações  de  tentativas  do  corpo  de  se  adaptar  aos estímulos. Selye descreveu o estresse como “estado que se manifesta por uma síndrome orgânica específica, que se

desenvolve  em  resposta  a  qualquer  estímulo  que  cause  intensa  demanda  sistêmica”.11 Ainda  jovem  e  estudante  de medicina,  Selye  percebeu  que  pacientes  com  condições  patológicas  diferentes  apresentavam  muitos  sinais  e sintomas  em  comum.  Ele  observou  que  “se  um  homem  sofre  perda  de  sangue,  doença  infecciosa  ou  câncer avançado, perde o apetite, a força muscular e a ambição de realizar qualquer coisa. Geralmente, o paciente também perde  peso  e  até  sua  expressão  facial  revela  que  está  doente”.12  Selye  se  refere  a  isso  como  “síndrome  de  apenas estar doente”. No  início  de  carreira  como  cientista  experimental,  Selye  observou  o  aparecimento  de  hipertrofia  suprarrenal, atrofia do timo e úlceras gástricas nos ratos que estava usando em suas pesquisas. Essas mesmas três alterações se desenvolviam  em  resposta  a  diferentes,  ou  inespecíficos,  desafios  experimentais.  Ele  presumiu  que  o  eixo hipotálamo­hipófise­suprarrenal  (HHS)  desempenhava  um  papel  fundamental  no  desenvolvimento  dessa  resposta. Para  Selye,  a  resposta  ao  estresse  era  um  processo  que  possibilitava  aos  ratos  resistirem  ao  desafio  experimental utilizando  a  função  do  sistema  mais  capaz  de  responder.  Ele  chamou  a  resposta  de  síndrome  adaptativa  geral (SAG): geral porque o efeito era uma reação sistêmica geral; adaptativa porque a resposta se dava em reação a um estressor; e síndrome porque as manifestações físicas eram coordenadas e dependentes umas das outras.11 De acordo com Selye, a SAG envolve três fases: fase de alerta, fase de resistência e fase de exaustão. A fase de alerta  se  caracteriza  por  estimulação  generalizada  do  sistema  nervoso  simpático  e  do  eixo  HHS,  resultando  na liberação  de  catecolaminas  e  cortisol.  Durante  a  fase  de  resistência,  o  corpo  seleciona  os  canais  mais  eficazes  e econômicos  de  defesa,  e  os  altos  níveis  de  cortisol,  característicos  da  primeira  fase,  caem  porque  não  são  mais necessários.  Se  o  estressor  é  mantido  ou  supera  a  capacidade  do  organismo  de  se  defender,  segue­se  a  fase  de exaustão, durante a qual ocorre esgotamento dos recursos e surgem sinais de “desgaste” ou dano sistêmico.13 Selye defendia que muitas doenças, como diversos transtornos emocionais, cefaleia levemente irritante, insônia, desconforto gástrico, úlceras gástricas e duodenais, certos tipos de doença reumática e doenças cardiovasculares e renais,  parecem  se  manifestar  ou  ser  incentivadas  pelo  “próprio  corpo  por  defeito  nas  reações  adaptativas  aos agentes potencialmente danosos”.12

Com um diagnóstico recente de LES, Iona está manifestando a última fase da resposta ao estresse. Ela certamente esgotou muitos

recursos

de

seu

corpo

e

está

apresentando “desgaste” e

dano

sistêmico,

como

a

doença

renal

e

algum

tipo

de

distúrbio

in셯茳amatório articular.

Os  acontecimentos  ou  agentes  ambientais  responsáveis  por  dar  início  à  resposta  ao  estresse  foram  chamados estressores.  De  acordo  com  Selye,  os  estressores  podem  ser  endógenos,  fornecidos  pelo  próprio  organismo,  ou exógenos, fornecidos pelo ambiente exterior ao corpo.12 Para explicar a resposta ao estresse, Selye propôs que dois fatores determinam a natureza das respostas: as propriedades do estressor e o condicionamento da pessoa que está sendo  estressada.  Selye  salientou  que  nem  todo  tipo  de  estresse  é  prejudicial;  portanto,  ele  cunhou  os  termos eustresse e distresse.13  Ele  sugeriu  que  períodos  leves,  breves  e  controláveis  de  estresse  poderiam  ser  percebidos como estímulos positivos ao crescimento e desenvolvimento emocional e intelectual do indivíduo. São as situações graves,  prolongadas  e  descontroladas  de  distresse  psicológico  e  físico  que  causam  problemas  de  saúde.12  Por exemplo, a alegria de se tornar pai ou mãe e a tristeza de perder os pais são experiências completamente diferentes, mas seu efeito estressor, a demanda inespecífica de ajuste a uma nova situação, pode ser similar. Fica  cada  vez  mais  evidente  que  a  resposta  fisiológica  ao  estresse  é  muito  mais  complicada  do  que  aquela  que pode  ser  explicada  totalmente  por  um  mecanismo  clássico  de  estímulo  e  resposta.  Estressores  tendem  a  produzir respostas diferentes em pessoas diferentes ou na mesma pessoa em momentos diferentes, indicando a influência da capacidade de adaptação do indivíduo, o que Selye denominou fatores condicionantes. Esses fatores condicionantes podem ser internos (p. ex., predisposição genética, idade, sexo) ou externos (p. ex., exposição a agentes ambientais, vivências,  fatores  da  dieta,  nível  de  suporte  social).12  O  risco  relativo  para  o  desenvolvimento  de  um  processo patológico relacionado com o estresse parece, pelo menos parcialmente, dependente desses fatores. Richard  Lazarus,  psicólogo  muito  respeitado  que  dedicou  sua  carreira  ao  estudo  do  estresse  e  das  emoções, considera  que  “significados  e  valores  estão  no  centro  da  vida  humana  e  representam  a  essência  do  estresse,  da emoção  e  da  adaptação”.14  Existem  evidências  de  que  o  eixo  hipotálamo­hipófise­suprarrenal,  o  eixo

suprarrenocortical, o sistema hormonal suprarrenomedular e o sistema nervoso simpático são ativados de maneira diferente, dependendo do tipo e da intensidade do estressor.15

Iona tem dois fatores condicionantes internos para LES, como o fato de pertencer ao sexo feminino e estar em seus trinta e tantos

anos. Ela também tem fatores condicionantes externos, como as experiências de vida e o nível de suporte social. Com tantos

fatores de estresse em sua vida, ela está mais vulnerável para que a resposta ao estresse não dê certo.

Respostas neuroendócrinas As  manifestações  da  resposta  ao  estresse  são  fortemente  influenciadas  pelos  sistemas  nervoso  e  endócrino.  Os sistemas  neuroendócrinos  integram  os  sinais  recebidos  das  vias  neurossensoriais  e  de  mediadores  transportados pela  corrente  sanguínea. Além  disso,  o  sistema  imunológico  tanto  pode  afetar  quanto  ser  afetado  pela  resposta  ao estresse.  A  Tabela  9.1  resume  a  ação  dos  hormônios  envolvidos  nas  respostas  neuroendócrinas  ao  estresse.  Os resultados da liberação coordenada desses neuro­hormônios incluem mobilização de energia, aumento do foco e da conscientização,  intensificação  do  fluxo  sanguíneo  cerebral  e  da  utilização  de  glicose,  maior  funcionamento cardiovascular  e  respiratório,  redistribuição  do  fluxo  sanguíneo  para  o  cérebro  e  os  músculos,  modulação  da resposta imune, inibição da função reprodutiva e diminuição do apetite.15 A  resposta  ao  estresse  é  um  sistema  fisiológico  normal  e  coordenado  destinado  a  aumentar  a  probabilidade  de sobrevivência, mas também projetado para ser um ativador agudo de resposta, quando isso é necessário para trazer o  corpo  de  volta  a  um  estado  estável  e  desligado  quando  o  desafio  à  homeostase  diminui.  Portanto,  em circunstâncias  normais,  as  respostas  neurais  e  os  hormônios  liberados  durante  a  resposta  não  permanecem  por tempo suficiente para causar danos aos tecidos vitais. Desde o início da década de 1980, o termo alostase tem sido utilizado por alguns pesquisadores para descrever as mudanças fisiológicas nos sistemas neuroendócrino, autônomo e  imunológico  em  resposta  a  desafios  reais  ou  percebidos  à  homeostase.  A  persistência  ou  acúmulo  dessas alterações  alostáticas  (p.  ex.,  imunossupressão,  ativação  do  sistema  nervoso  simpático  e  sistema  renina­ angiotensina­aldosterona)  foi  denominada  carga alostática,  e  esse  conceito  tem  sido  usado  para  medir  os  efeitos cumulativos do estresse sobre os seres humanos.16 Tabela 9.1

Hormônios envolvidos nas respostas neuroendócrinas ao estresse.

Hormônios associados à resposta ao

Origem do hormônio

Efeitos 〼‾siológicos

Locus ceruleus (LC), medula suprarrenal

Produz diminuição na liberação de insulina e aumento na

estresse

Catecolaminas (norepinefrina [NE],

epinefrina)

liberação de glucagon, que resulta em aumento da

glicogenólise, gliconeogênese, lipólise, proteólise e

diminuição da absorção de glicose por tecidos periféricos;

aumento da frequência e da contratilidade cardíacas e

contração da musculatura lisa dos vasos; e relaxamento da

musculatura lisa dos brônquios

Fator liberador de corticotrona (CRF)

Hipotálamo

Estimula a secreção de hormônio adrenocorticotróco (ACTH)

pela adeno-hipóse e o aumento da atividade dos

neurônios do LC

Hormônio adrenocorticotróco (ACTH)

Adeno-hipóse

Estimula a síntese e a liberação de cortisol

Hormônios glicocorticoides (p. ex., cortisol)

Córtex suprarrenal

Potencializa as ações da epinefrina e do glucagon; inibe a

liberação e/ou ações dos hormônios reprodutivos e

hormônio tireoestimulante (TSH); e produz diminuição de

células imunológicas e mediadores in셯茳amatórios

Hormônios mineralocorticoides (p. ex.,

Córtex suprarrenal

Aumenta a absorção de sódio pelos rins

Hipotálamo, neuro-hipóse

Aumenta a absorção de água pelos rins; produz constrição dos

aldosterona)

Hormônio antidiurético (ADH, vasopressina)

vasos sanguíneos; e estimula a liberação de ACTH

A integração dos componentes da resposta ao estresse, que ocorre no nível do sistema nervoso central (SNC), é complexa  e  não  completamente  compreendida.  Baseia­se  na  comunicação  ao  longo  das  vias  neuronais  do  córtex cerebral, do sistema límbico, do tálamo, do hipotálamo, da hipófise e do sistema de ativação reticular (SAR; Figura 9.2). O córtex cerebral está envolvido com a vigilância, a cognição e a atenção focalizada, e o sistema límbico, com os componentes emocionais (p. ex., medo, excitação, fúria, raiva) da resposta ao estresse. O tálamo funciona como centro  de  retransmissão  e  é  importante  no  recebimento,  na  triagem  e  na  distribuição  de  estímulos  sensoriais.  O hipotálamo coordena as respostas do sistema nervoso autônomo (SNA) e do sistema endócrino. O SAR modula o estado de alerta mental, a atividade do SNA e o tônus da musculatura esquelética, empregando os dados de outras estruturas  neurais. A  tensão  musculoesquelética  durante  a  resposta  ao  estresse  reflete  o  aumento  da  atividade  do SAR  e  sua  influência  sobre  os  circuitos  reflexos  que  controlam  o  tônus  muscular.  Para  aumentar  a  complexidade desse  sistema,  existe  o  fato  de  que  os  circuitos  cerebrais  individuais  participantes  da  mediação  da  resposta  ao estresse interagem e regulam a atividade uns dos outros. Por exemplo, existem conexões recíprocas entre neurônios do  hipotálamo  que  iniciam  a  emissão  do  fator  liberador  de  corticotrofina  (CRF)  e  neurônios  do  locus  ceruleus (LC),  associada  à  liberação  de  norepinefrina  (NE).  Deste  modo,  a  norepinefrina  estimula  a  secreção  do  CRF,  e  o CRF estimula a liberação de NE.16 Locus  ceruleus.  É  uma  área  do  tronco  encefálico,  componente  neural  fundamental  para  o  desencadeamento  da resposta neuroendócrina ao estresse.16 O locus ceruleus (LC) é densamente povoado por neurônios que produzem NE; acredita­se que seja o local de integração central para a resposta do SNA a estímulos de estresse (Figura 9.3). O sistema LC­NE tem vias aferentes para o hipotálamo, o sistema límbico, o hipocampo e o córtex cerebral. O sistema LC­NE confere uma vantagem adaptativa durante uma situação estressante. A manifestação do sistema nervoso  simpático  à  reação  de  estresse  tem  sido  chamada  de  resposta  de  luta  ou  fuga.  Esta  é  a  mais  rápida  das respostas  ao  estresse  e  representava  uma  resposta  básica  de  sobrevivência  para  nossos  ancestrais  primitivos, quando  confrontados  com  os  perigos  da  vida  selvagem  e  seus  habitantes.  O  aumento  da  atividade  simpática  no cérebro eleva a capacidade de atenção e excitação e, portanto, provavelmente intensifica a memória. As frequências cardíaca  e  respiratória  se  elevam,  as  mãos  e  os  pés  se  tornam  úmidos,  as  pupilas  se  dilatam,  a  boca  fica  seca  e  a atividade do sistema digestório diminui. Fator  liberador  de  corticotrofina.  É  um  componente  endócrino  fundamental  da  resposta  neuroendócrina  ao estresse  (ver  Figura 9.3).  O  CRF  é  um  hormônio  peptídico  pequeno  encontrado  tanto  no  hipotálamo  quanto  em estruturas  extra­hipotalâmicas,  como  o  sistema  límbico  e  o  tronco  encefálico.  É,  ao  mesmo  tempo,  importante regulador do sistema endócrino da hipófise e da atividade suprarrenal e neurotransmissor envolvido na atividade do SNA, do metabolismo e do comportamento.16 Os receptores para o CRF estão distribuídos por todo o cérebro, bem como  em  muitos  locais  periféricos.  O  CRF  hipotalâmico  induz  a  secreção  do  hormônio  adrenocorticotrófico (ACTH) pela glândula adeno­hipófise. O ACTH, por sua vez, estimula a glândula suprarrenal a sintetizar e secretar hormônios glicocorticoides (p. ex., cortisol). Os hormônios glicocorticoides têm uma série de efeitos fisiológicos diretos ou indiretos que fazem mediação da resposta  ao  estresse,  aumentam  a  ação  de  outros  hormônios  do  estresse  ou  suprimem  outros  componentes  do sistema  de  estresse.  Com  relação  a  isso,  o  cortisol  atua  não  apenas  como  mediador  da  resposta  ao  estresse,  mas como  inibidor,  para  que  não  ocorra  a  sobreativação  dessa  resposta.16  O  cortisol  mantém  os  níveis  sanguíneos  de glicose por antagonizar os efeitos da insulina e aumenta o efeito das catecolaminas no sistema cardiovascular. Ele também suprime a atividade dos osteoblastos, a hematopoese, a síntese de proteínas e colágeno e respostas imunes. Todas essas funções protegem o organismo contra os efeitos de um estressor e concentram energias para recuperar o equilíbrio em face de um desafio agudo à homeostase.

Figura 9.2 • Vias neuroendócrinas e respostas fisiológicas ao estresse. ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; CRF, fator liberador de corticotrofina.

Figura  9.3  •  Regulação  pelo  sistema  neuroendócrino­imunológico  da  resposta  ao  estresse.  ACTH,  hormônio adrenocorticotrófico; CRF, fator liberador de corticotrofina.

Angiotensina  II.  A  estimulação  do  sistema  nervoso  simpático  também  ativa  na  periferia  o  sistema  renina­ angiotensina­aldosterona (SRAA), que medeia o aumento no tônus vascular periférico e a retenção de sódio e água pelos rins. Essas mudanças contribuem para as alterações fisiológicas ocorridas com a resposta ao estresse, que, se prolongadas,  podem  contribuir  para  o  desenvolvimento  de  alterações  patológicas. A  angiotensina  II,  que  pode  ser entregue perifericamente ou produzida localmente, também tem efeitos sobre o SNC; os receptores de angiotensina II tipo 1 (AT1) estão amplamente distribuídos no hipotálamo e no LC. Por meio desses receptores, a angiotensina II aumenta a formação e a liberação de CRF, contribui para a liberação do ACTH pela hipófise, aumenta a liberação induzida pelo estresse de vasopressina pela neuro­hipófise e estimula a liberação de NE pelo LC.16 Outros hormônios. Uma grande variedade de outros hormônios, incluindo hormônio do crescimento, hormônio da tireoide  e  hormônios  reprodutivos,  também  responde  a  situações  estressantes.  Os  sistemas  responsáveis  pela reprodução,  pelo  crescimento  e  pela  imunidade  estão  diretamente  vinculados  ao  sistema  de  estresse,  e  os  efeitos hormonais da resposta ao estresse influenciam profundamente esses sistemas. Embora os níveis de hormônio do crescimento inicialmente se mostrem elevados na manifestação de estresse, a existência prolongada de cortisol leva à supressão do hormônio do crescimento, do fator de crescimento semelhante à insulina 1 (IGF­1, insulin­like growth factor) e de outros fatores de crescimento, exercendo efeito cronicamente inibidor sobre o crescimento. Além disso, o CRF aumenta diretamente os níveis de somatostatina, que, por sua vez, inibe  a  secreção  do  hormônio  do  crescimento.  Embora  a  conexão  seja  especulativa,  os  efeitos  do  estresse  sobre  o hormônio  do  crescimento  podem  fornecer  um  dos  elos  fundamentais  para  a  compreensão  sobre  o  déficit  de crescimento em crianças. A  secreção  de  cortisol  induzida  pelo  estresse  também  está  associada  a  diminuição  nos  níveis  do  hormônio tireoestimulante e inibição da conversão de tiroxina (T4) em tri­iodotironina (T3), que é biologicamente mais ativa,

nos tecidos periféricos. Ambas as alterações podem funcionar como meio para conservar energia em momentos de estresse. O hormônio antidiurético (ADH) liberado pela neuro­hipófise também está envolvido na resposta ao estresse, em particular no estresse hipotensor ou estresse resultante da perda de volume de líquido. O ADH, também conhecido como vasopressina,  aumenta  a  retenção  de  água  pelos  rins  e  produz  vasoconstrição. Além  disso,  a  vasopressina sintetizada nos neurônios parvocelulares do hipotálamo e transportada para a adeno­hipófise parece ter sinergia com a capacidade do CRF para estimular a liberação de ACTH. O  neurotransmissor  serotonina,  ou  5­hidroxitriptamina  (5­HT),  também  desempenha  papel  importante  na resposta  ao  estresse  mediante  neurônios  que  inervam  o  hipotálamo,  a  amígdala  e  outras  estruturas  límbicas.  A administração  de  agonistas  dos  receptores  5­HT  em  animais  de  laboratório  demonstrou  aumentar  a  secreção  de vários hormônios de estresse. Outros hormônios que possivelmente colaboram para a resposta ao estresse incluem o peptídio intestinal vasoativo (VIP), o neuropeptídio Y, a colecistocinina (CCK) e a substância P. O CRF também influencia a liberação ou não liberação de hormônios reprodutivos. Septicemia e traumatismo grave podem induzir anovulação e amenorreia em mulheres e redução da espermatogênese e dos níveis de testosterona em homens.

Resposta imune A  principal  característica  da  resposta  ao  estresse,  como  primeiramente  descrita  por  Selye,  são  as  interações endócrino­imunes  (i.  e.,  aumento  da  produção  de  corticosteroides  e  atrofia  do  timo)  conhecidas  por  suprimir  a resposta imunológica. Em conjunto, esses dois componentes do sistema de estresse, por meio do sistema endócrino e  das  vias  de  neurotransmissores,  produzem  as  alterações  físicas  e  comportamentais  destinadas  a  adaptar  o organismo ao estresse agudo. Grande parte da literatura sobre o estresse e a resposta imune enfoca o papel causal do  estresse  em  doenças  relacionadas  com  o  sistema  imunológico.  Também  tem  sido  sugerido  que  pode  ocorrer  o inverso,  ou  seja,  manifestações  emocionais  e  psicológicas  da  resposta  ao  estresse  podem  ser  um  reflexo  de alterações  no  sistema  nervoso  central,  resultante  da  resposta  imune  (ver  Figura  9.3).  Células  do  sistema imunológico, como monócitos e linfócitos, podem penetrar a barreira hematencefálica e passar a residir no cérebro, onde secretam mensageiros químicos chamados citocinas, capazes de influenciar a resposta ao estresse. O  mecanismo  exato  pelo  qual  o  estresse  produz  seu  efeito  sobre  a  resposta  imune  é  desconhecido,  e provavelmente  varia  de  pessoa  para  pessoa,  dependendo  de  fatores  genéticos  e  ambientais.  Os  argumentos  mais significativos  para  a  interação  dos  sistemas  neuroendócrino  e  imunológico  derivam  de  evidências  de  que  os sistemas imunológico e neuroendócrino compartilham vias de sinalização comum (ou seja, moléculas mensageiras e receptores),  pelas  quais  os  hormônios  e  os  neuropeptídios  podem  alterar  a  função  das  células  do  sistema imunológico,  e  que  o  sistema  imunológico  e  seus  mediadores  podem  modular  a  função  neuroendócrina.16 Receptores  para  uma  série  de  hormônios  controlados  pelo  SNC  e  neuromediadores  supostamente  têm  sido encontrados  em  linfócitos.  Entre  esses  estão  receptores  de  glicocorticoides,  insulina,  testosterona,  prolactina, catecolaminas,  estrogênios,  acetilcolina  e  hormônio  do  crescimento,  sugerindo  que  esses  hormônios  e neuromediadores  influenciam  a  função  dos  linfócitos.  Por  exemplo,  o  cortisol  é  conhecido  por  suprimir  a  função imunitária, e doses farmacológicas de cortisol são utilizadas clinicamente para suprimir a resposta imune. Observa­ se  que  o  eixo  HPS  é  ativado  por  citocinas,  tais  como  interleucina­1,  interleucina­6  e  fator  de  necrose  tumoral, liberadas por células do sistema imunológico.

Nas

pessoas

com

LES

existe

aumento

de

linfócitos,

e

estes

podem

migrar

para

o

cérebro,

onde

secretam

citocinas,

que

desencadeiam um processo in셯茳amatório. Além disso, o sistema imunológico pode ser modulado para reconhecer as próprias

células como antígenos e destruí-las. Isso pode ser observado na doença autoimune, LES (diagnóstico de Iona).

A  segunda  rota  possível  para  a  regulação  neuroendócrina  da  função  imunológica  é  pelo  sistema  nervoso simpático  e  a  liberação  de  catecolaminas.  Linfonodos,  timo  e  baço  têm  fibras  nervosas  do  SNA.  O  CRF  atuando centralmente  ativa  o  SNA  por  meio  de  vias  descendentes  multissinápticas  e  a  epinefrina  circulante  atua sinergicamente com o CRF e o cortisol para inibir a função do sistema imunológico. Não é apenas a quantidade de expressão imune que é alterada pelo estresse, mas também a qualidade da resposta.

Hormônios  de  estresse  estimulam  de  maneira  diferenciada  a  proliferação  de  subtipos  de  linfócitos  T  auxiliares. Como  esses  subtipos  de  células  T  auxiliares  secretam  citocinas  diferentes,  eles  estimulam  diferentes  aspectos  da resposta imune. Um subtipo tende a estimular os linfócitos T e a resposta imunomediada por células, enquanto um segundo tipo tende a ativar os linfócitos B e a resposta imune com mediação humoral.16

Conceitos fundamentais

Estresse e adaptação



Estresse é um estado que se manifesta por sintomas que surgem pela ativação coordenada dos sistemas neuroendócrino e imunológico, que Selye chamou de

síndrome de adaptação geral



Hormônios e neurotransmissores (catecolaminas e cortisol) liberados durante a resposta ao estresse funcionam para alertar o indivíduo sobre uma ameaça ou

desao à homeostase, para aumentar a atividade cardiovascular e metabólica, a m de controlar o estressor e concentrar a energia do corpo pela supressão da

atividade de outros sistemas, que não são imediatamente necessários



A capacidade de adaptação é in셯茳uenciada por aprendizagem prévia, reserva siológica, tempo, herança genética, idade, estados de saúde e nutricional, ciclos

sono-vigília e fatores psicossociais

Enfrentamento e adaptação ao estresse A  capacidade  de  se  adaptar  a  uma  variedade  de  ambientes  e  estressores  não  é  específica  de  seres  humanos.  De acordo com René Dubos (microbiologista conhecido por seu estudo sobre as respostas humanas ao ambiente total), a  “adaptabilidade  é  encontrada  ao  longo  da  vida  e  talvez  seja  o  único  atributo  que  distingue  mais  claramente  o mundo  da  vida  do  mundo  da  matéria  inanimada.”17  Organismos  vivos,  não  importa  o  quão  primitivos,  não  se submetem  passivamente  ao  impacto  das  forças  ambientais.  Eles  tentam  responder  de  modo  adaptativo,  cada  um  à sua maneira única e mais adequada. Quanto mais alto está localizado na escala evolutiva, maior será seu repertório de  mecanismos  adaptativos  e  sua  capacidade  para  selecionar  e  limitar  os  aspectos  do  meio  ambiente  ao  qual responde.  Os  mecanismos  mais  completamente  evoluídos  são  as  respostas  sociais,  por  intermédio  das  quais pessoas  ou  grupos  modificam  seus  ambientes,  seus  hábitos  ou  ambos  para  alcançar  um  modo  de  vida  mais adequado às suas necessidades.

Adaptação Devido  a  um  sistema  nervoso  e  intelecto  altamente  desenvolvidos,  os  seres  humanos  geralmente  têm  mecanismos alternativos  de  adaptação  e  capacidade  para  controlar  vários  aspectos  do  seu  ambiente.  O  ar­condicionado  e  o aquecimento central limitam a necessidade de se adaptar a alterações bruscas de temperatura no meio ambiente. A disponibilidade  de  agentes  antissépticos,  imunizações  e  antibióticos  elimina  a  necessidade  de  resposta  a  agentes infecciosos comuns. Ao mesmo tempo, a tecnologia moderna cria desafios de adaptação e fornece novas fontes de estresse,  como  poluição  sonora  e  atmosférica,  aumento  da  exposição  a  substâncias  químicas  nocivas  e  alterações nos ritmos biológicos impostas pelo trabalho em turnos e por viagens internacionais. É de particular interesse observar as diferenças na resposta do organismo a eventos que ameaçam a integridade do ambiente fisiológico e àqueles que ameaçam a integridade do ambiente social do indivíduo. Muitas respostas do organismo a distúrbios fisiológicos são controladas momento a momento por mecanismos de feedback que limitam sua  aplicação  e  seu  tempo  de  ação.  Por  exemplo,  o  aumento  mediado  por  barorreflexo  na  frequência  cardíaca ocorrido  quando  uma  pessoa  se  movimenta  de  uma  posição  reclinada  até  ficar  de  pé  é  quase  instantâneo  e desaparece em segundos. Além disso, a resposta a distúrbios fisiológicos que ameaçam a integridade do ambiente interno é específica para a ameaça envolvida; o organismo, em geral, não aumenta a temperatura corporal quando é necessária uma elevação da frequência cardíaca. Em contraste, a resposta a perturbações psicológicas não é regulada com  o  mesmo  grau  de  especificidade  e  controle  de  feedback.  Ao  contrário,  o  efeito  pode  ser  inadequado  e sustentado.

Fatores que afetam a capacidade de adaptação Adaptação implica que um indivíduo consiga criar novo equilíbrio entre o estressor e a capacidade de lidar com ele.

Os meios utilizados para alcançar esse equilíbrio são chamados de estratégias de enfrentamento ou mecanismos de enfrentamento (coping).  Mecanismos  de  enfrentamento  são  respostas  emocionais  e  comportamentais  empregadas para  gerenciar  ameaças  à  nossa  homeostase  fisiológica  e  psicológica.  De  acordo  com  Lázaro,  a  maneira  como enfrentamos eventos estressantes depende de como percebemos e interpretamos tais eventos.18 O evento é percebido como  ameaça  de  dano  ou  perda?  É  percebido  como  desafio,  e  não  como  ameaça?  Reserva  fisiológica,  tempo, genética,  idade,  estado  de  saúde,  estado  nutricional,  ciclos  sono­vigília,  “resistência”  (hardiness)a  e  fatores psicossociais influenciam a avaliação de uma pessoa a um estressor e os mecanismos de enfrentamento utilizados para se adaptar à nova situação (Figura 9.4). Reserva  fisiológica  e  anatômica.  Um  atleta  treinado  é  capaz  de  aumentar  o  débito  cardíaco  de  seis  a  sete  vezes durante  a  prática  de  exercícios.  A  margem  de  segurança  para  a  adaptação  da  maioria  dos  sistemas  orgânicos  é consideravelmente maior do que a necessária para as atividades cotidianas. As hemácias transportam mais oxigênio do que os tecidos são capazes de utilizar, o fígado e os adipócitos armazenam nutrientes em excesso, e os tecidos ósseos  reservam  mais  cálcio  do  que  o  necessário  para  o  funcionamento  neuromuscular  regular. A  capacidade  dos sistemas  orgânicos  de  aumentar  sua  função  pela  necessidade  de  se  adaptar  é  conhecida  como  reserva fisiológica. Muitos  órgãos,  como  pulmões,  rins  e  glândulas  suprarrenais,  também  entram  em  sintonia  para  fornecer  a  reserva anatômica.  Os  dois  órgãos  não  são  necessários  para  assegurar  a  existência  e  a  manutenção  contínuas  do  ambiente interno.  Muitas  pessoas  apresentam  função  orgânica  normal  com  apenas  um  pulmão  ou  um  rim.  Em  casos  de doença renal, por exemplo, os sinais de insuficiência não acontecem até que aproximadamente 80% dos néfrons em funcionamento tenham sido destruídos. Tempo.  A  adaptação  é  mais  eficiente  quando  as  alterações  ocorrem  gradualmente,  em  vez  de  subitamente.  É possível, por exemplo, perder um litro ou mais de sangue por um sangramento gastrintestinal crônico no período de 1 semana sem manifestar sinais de choque. No entanto, uma hemorragia súbita, que provoca rápida perda da mesma quantidade de sangue, pode causar hipotensão e choque.

Figura 9.4 • Fatores que afetam a adaptação.

Genética. A adaptação é ainda mais afetada pela disponibilidade de respostas adaptativas e flexibilidade na escolha da resposta mais adequada e econômica. Quanto maior for o número de respostas disponíveis, mais efetiva será a capacidade de adaptação. A genética pode garantir que sistemas essenciais para a adaptação funcionem adequadamente. Mesmo um gene de efeitos  deletérios  pode  ser  adaptativo  em  determinados  ambientes.  Na  África,  o  gene  para  a  anemia  falciforme persiste em algumas populações, pois fornece certa resistência à infecção pelo parasita que causa a malária. Idade.  A  capacidade  de  adaptação  é  menor  nos  dois  extremos  da  vida.  É  prejudicada  pela  imaturidade  de  um lactente tanto quanto pela diminuição da reserva funcional que se dá com o envelhecimento. Por exemplo, o lactente tem dificuldade de concentração de urina devido à imaturidade das estruturas renais, portanto é menos capaz do que um adulto de lidar com a diminuição na ingestão de água ou com perdas exageradas de água. Situação semelhante acontece com os idosos, devido a alterações na função renal relacionadas com a idade. Sexo.  Na  última  década,  principalmente  porque  as  mulheres  foram  incluídas  na  ciência  básica  e  na  investigação clínica, foram encontradas diferenças entre os sexos em relação às funções cardiovascular, respiratória, endócrina, renal e neurofisiológica, e foi aventada a hipótese de que os hormônios sexuais sejam a base para essas diferenças biológicas.  Os  avanços  tecnológicos  no  campo  da  biologia  celular  e  molecular  deixam  claro,  no  entanto,  que existem  diferenças  fundamentais  na  localização  e  regulação  de  genes  individuais  entre  os  genomas  masculino  e feminino. Essas diferenças têm implicações na prevenção, no diagnóstico e no tratamento de doenças e implicações específicas  relacionadas  com  nossa  compreensão  sobre  as  diferenças  na  resposta  aos  estressores  em  função  do sexo. Devido  à  natureza  das  diferenças  em  função  do  sexo,  não  chega  a  ser  surpreendente  que  existam  diferenças  na resposta  ao  estresse  fisiológico  tanto  no  eixo  HPS  quanto  no  SNA.  Mulheres  na  pré­menopausa  tendem  a apresentar menor ativação do sistema nervoso simpático do que os homens em resposta a estressores. Diferenças na ativação  da  resposta  ao  estresse  com  base  no  sexo  podem  explicar  parcialmente  as  diferenças  de  suscetibilidade  a doenças  em  que  a  resposta  ao  estresse  pode  desempenhar  papel  causal.  Esses  resultados  de  pesquisas  não  são definitivos, mas são intrigantes e podem servir como trampolim para investigações futuras. Estado de saúde. O estado da saúde física e mental determina as reservas fisiológicas e psicológicas e é um forte determinante da capacidade de adaptação. Por exemplo, pessoas com doenças cardíacas têm menor capacidade para se  adaptar  ao  tipo  de  estresse  que  exige  respostas  cardiovasculares.  Frequentemente,  o  estresse  emocional  grave produz  perturbações  na  função  fisiológica  e  limita  a  capacidade  de  fazer  escolhas  adequadas  relacionadas  com  as necessidades de adaptação a longo prazo. Aqueles que já trabalharam com pessoas com doenças agudas sabem que a vontade de viver, muitas vezes, tem influência profunda sobre a sobrevivência em casos potencialmente fatais. Estado nutricional. Existem entre 50 e 60 nutrientes essenciais, incluindo minerais, lipídios, determinados ácidos graxos, vitaminas e aminoácidos específicos. A deficiência ou o excesso de qualquer desses nutrientes pode alterar o  estado  de  saúde  de  uma  pessoa  e  prejudicar  a  capacidade  de  adaptação.  É  bem  conhecida  a  importância  da alimentação para a função enzimática, a resposta imune e o processo de cicatrização de feridas. Se for considerado o mundo todo, a desnutrição pode ser uma das causas mais comuns de imunodeficiência. Entre os problemas associados a excessos na dieta estão a obesidade e o uso abusivo de álcool. A obesidade é um problema  comum.  Predispõe  o  indivíduo  a  inúmeros  problemas  de  saúde,  incluindo  aterosclerose  e  hipertensão arterial.  O  etanol  geralmente  é  usado  em  excesso.  Ele  afeta  de  maneira  grave  a  função  cerebral  e,  com  o  uso prolongado, pode prejudicar gravemente a função do fígado, do cérebro e de outras estruturas vitais. Ciclos sono­vigília. O sono é considerado uma função reparadora, durante o qual a energia é restaurada e os tecidos são regenerados.19  Ocorre  de  maneira  cíclica,  alternando­se  com  períodos  de  vigília  e  maior  utilização  de  energia. Os  ritmos  biológicos  desempenham  papel  importante  na  adaptação  ao  estresse,  no  desenvolvimento  de  processos patológicos  e  na  resposta  ao  tratamento.  Diversos  ritmos,  como  descanso  e  atividade,  trabalho  e  lazer,  comer  e beber, oscilam com frequência semelhante à do ciclo solar claro­escuro de 24 h. O termo circadiano, do latim circa (“por volta de”) e dies (“dia”), é empregado para descrever esses ritmos diários de 24 h. Já  foi  demonstrado  que  transtornos  do  sono  e  alterações  no  ciclo  sono­vigília  alteram  a  função  imunológica,  o

padrão circadiano normal de secreção hormonal e o funcionamento físico e psicológico.19,20 As duas manifestações mais  comuns  de  alteração  no  ciclo  sono­vigília  são  insônia  e  privação  de  sono  ou  maior  sonolência.  Em  alguns indivíduos,  o  estresse  pode  produzir  transtornos  do  sono;  em  outros,  esses  transtornos  podem  levar  a  estresse. Estresse  agudo  e  perturbações  ambientais,  perda  de  um  ente  querido,  recuperação  de  cirurgia  e  dor  são  causas comuns de insônia transitória e a curto prazo. Viagens aéreas e jet lag constituem causas adicionais de alteração do ciclo sono­vigília, assim como o trabalho em turnos. Resistência.  Estudos  feitos  por  psicólogos  sociais  têm  se  concentrado  nas  reações  emocionais  dos  indivíduos  em situações  de  estresse  e  seus  mecanismos  de  enfrentamento  para  determinar  as  características  que  ajudam  algumas pessoas a permanecer saudáveis, apesar de serem desafiadas por altos níveis de estresse. Por exemplo, o conceito de  resistência  (hardiness,  personalidade  resistente)  descreve  uma  personalidade  que  tipicamente  inclui  senso  de controle  sobre  o  ambiente,  sensação  de  ter  um  propósito  na  vida  e  capacidade  de  encarar  os  estressores  como desafio,  e  não  como  ameaça.21  Muitos  estudos  realizados  por  enfermeiros  e  psicólogos  sociais  sugerem  que  a resistência ao estresse (hardiness) está relacionada com os desfechos positivos para a saúde.22 Fatores psicossociais. Vários estudos têm relacionado fatores sociais e eventos da vida com doenças. O interesse científico  no  meio  social  como  causa  de  estresse  foi  gradualmente  ampliado  para  incluir  o  ambiente  social  como recurso que modula a relação entre estresse e saúde. Presumivelmente, pessoas com condições de mobilizar fortes recursos  de  suporte  em  suas  relações  sociais  são  mais  capazes  de  suportar  os  efeitos  negativos  do  estresse  sobre sua saúde. Relações  estreitas  com  outras  pessoas  podem  envolver  efeitos  positivos;  também  têm  potencial  de  conflito  e podem, em algumas situações, deixar a pessoa menos capaz de lidar com os estressores da vida.

Resumo

A resposta ao estresse envolve a ativação de diversos sistemas fisiológicos (sistema nervoso simpático, eixo HPS e  sistema  imunológico)  que  trabalham  de  maneira  coordenada  para  proteger  o  organismo  contra  os  danos provocados pelas demandas intensas feitas a ele. Selye chamou essa resposta de síndrome de adaptação geral. A resposta ao estresse é dividida em três estágios: estágio de alarme, com a ativação do sistema nervoso simpático e do eixo HPS; estágio de resistência, durante o qual o organismo seleciona as defesas mais eficazes; e estágio de exaustão, durante o qual os recursos fisiológicos estão esgotados e aparecem os sinais de dano sistêmico. A ativação e o controle da resposta ao estresse são mediados por esforços combinados dos sistemas nervoso e endócrino.  Os  sistemas  neuroendócrinos  integram  os  sinais  recebidos  ao  longo  das  vias  neurossensoriais  e  de mediadores transportados pela corrente sanguínea. Além disso, o sistema imunológico tanto afeta quanto é afetado pela resposta ao estresse. A  adaptação  é  afetada  por  inúmeros  fatores,  incluindo  experiência  e  aprendizagem  anterior,  rapidez  com  que ocorre  a  necessidade  de  adaptação,  herança  genética  e  idade,  estado  de  saúde,  nutrição,  ciclos  sono­vigília, hardiness e fatores psicossociais.

Transtornos da resposta ao estresse

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Descrever os efeitos siológicos e psicológicos de uma resposta ao estresse crônico



Descrever as características do transtorno de estresse pós-traumático



Listar quatro métodos não farmacológicos para o tratamento do estresse

Em  sua  maior  parte,  entende­se  que  a  resposta  ao  estresse  deve  ser  aguda  e  por  tempo  limitado.  A  natureza limitada  pelo  tempo  do  processo  torna  vantajosos  os  efeitos  catabólicos  e  imunossupressores  que  o  acompanham. Acredita­se que a cronicidade da resposta é que seja prejudicial à saúde física e mental. Os  estressores  podem  assumir  uma  série  de  padrões  em  relação  ao  tempo  de  duração.  Eles  podem  ser

classificados como limitados e agudos, crônicos e intermitentes, ou crônicos e sustentados. Um estressor limitado agudo é aquele que se manifesta por um curto período de tempo e não se repete. Um estressor crônico intermitente é  aquele  ao  qual  o  indivíduo  é  cronicamente  exposto. A  frequência  ou  cronicidade  das  circunstâncias  com  que  o organismo é convidado a responder muitas vezes determina a disponibilidade e eficiência das respostas ao estresse. A  resposta  do  sistema  imunológico,  por  exemplo,  é  mais  rápida  e  eficiente  durante  a  segunda  exposição  a  um agente  patogênico  do  que  é  à  primeira  exposição.  No  entanto,  a  exposição  crônica  a  um  estressor  pode  causar  a fadiga do sistema e prejudicar sua eficácia.

Efeitos do estresse agudo Reações  de  estresse  agudo  são  aquelas  associadas  ao  SNA  e  à  resposta  de  luta  ou  fuga.  As  manifestações  de resposta  ao  estresse  –  cefaleia  latejante,  pele  úmida  e  fria  e  torcicolo  –  são  parte  da  resposta  ao  estresse  agudo. Centralmente, existe a facilitação das vias neurais que medeiam o estado de excitação, alerta, vigilância, cognição e atenção  concentrada,  bem  como  a  agressividade  adequada.  A  resposta  ao  estresse  agudo  pode  resultar  tanto  de eventos  psicológica  quanto  fisiologicamente  ameaçadores.  Em  situações  de  traumatismo  potencialmente  fatais, essas respostas agudas podem ser o salva­vidas, pelo fato de desviarem o sangue de funções menos essenciais para funções  orgânicas  essenciais.  O  aumento  do  estado  de  vigilância  e  do  funcionamento  cognitivo  possibilitam  o processamento rápido de informações e a chegada a uma solução mais adequada para a situação ameaçadora. No entanto, para pessoas com habilidades de enfrentamento limitadas, seja devido a sua saúde física ou mental, a resposta  ao  estresse  agudo  pode  ser  prejudicial  (Tabela  9.2).  Isso  se  aplica  a  indivíduos  com  doença  cardíaca preexistente,  em  que  os  comportamentos  simpáticos  avassaladores  associados  à  resposta  ao  estresse  podem conduzir  a  arritmias.  Para  pessoas  com  outros  problemas  crônicos  de  saúde,  como  enxaqueca,  o  estresse  agudo pode  precipitar  recorrência.  Em  pessoas  saudáveis,  a  resposta  ao  estresse  agudo  pode  redirecionar  a  atenção  para comportamentos  que  promovam  a  saúde,  como  o  cuidado  de  fazer  as  refeições  de  maneira  adequada  e  dormir  o suficiente. Para aqueles com problemas de saúde, a resposta pode interromper a adesão a regimes de medicação e programas  de  exercícios.  Em  algumas  situações,  o  estado  de  excitação  aguda,  na  verdade,  pode  ser  fatal, imobilizando  fisicamente  a  pessoa  quando  se  movimentar  seria  a  maneira  de  evitar  uma  catástrofe  (p.  ex., desviando­se de um carro em alta velocidade).

Efeitos do estresse crônico A resposta ao estresse é projetada para ser uma resposta aguda autolimitada, na qual a ativação do SNA e do eixo HPS  possa  ser  controlada  por  feedback  negativo.  Como  acontece  com  todos  os  sistemas  de  feedback  negativo, podem ocorrer alterações fisiopatológicas no sistema de resposta ao estresse. A função pode ser alterada de várias maneiras,  inclusive  quando  um  componente  do  sistema  falha;  quando  as  conexões  neurais  e  hormonais  entre  os componentes do sistema são disfuncionais; e quando o estímulo inicial para a ativação do sistema é prolongado ou de tal magnitude que supera a capacidade do sistema para responder de maneira adequada. Nesses casos, o sistema pode se tornar hiperativo ou hipoativo. Tabela 9.2

Possíveis problemas de saúde induzidos por estresse.

• Transtornos de humor

• Ansiedade

• Depressão

• Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT)

• Transtornos alimentares

• Transtornos do sono

• Diabetes tipo 2

• Hipertensão arterial

• Infecção

• Exacerbação de doenças autoimunes

• Problemas gastrintestinais

• Dor

• Obesidade

• Eczema

• Câncer

• Aterosclerose

• Enxaqueca

  A  cronicidade  e  ativação  excessiva  da  resposta  ao  estresse  podem  advir  de  doenças  crônicas,  bem  como contribuir para o desenvolvimento de problemas de saúde a longo prazo. A ativação da resposta ao estresse crônico é  uma  importante  questão  de  saúde  pública,  tanto  em  termos  de  saúde  quanto  de  uma  perspectiva  de  custo.  O estresse  está  vinculado  a  uma  miríade  de  problemas  de  saúde,  como  doenças  dos  sistemas  cardiovascular, digestório,  imunológico  e  neurológico,  bem  como  depressão,  alcoolismo  crônico  e  uso  de  drogas  ilícitas, transtornos alimentares, acidentes e suicídio.

Transtorno de estresse pós­traumático O transtorno de estresse pós­traumático (TEPT) é um distúrbio observado com frequência. É caracterizado por uma resposta grave ao estresse, secundária a um traumatismo anterior. A pessoa pode se lembrar do evento traumático, ou  pode  ocorrer  TEPT  sem  nenhuma  lembrança  da  experiência  estressante  anterior.  O  TEPT  que  se  manifesta  6 meses  após  o  acontecimento  traumático  é  chamado  TEPT  de  manifestação  tardia. 22  O  TEPT  era  anteriormente denominado fadiga de batalha ou choque pós­guerra, porque foi caracterizado pela primeira vez em soldados que voltavam  do  combate.  Embora  a  guerra  ainda  seja  uma  causa  significativa  de  TEPT,  outros  grandes  eventos catastróficos, como desastres naturais relacionados com o clima (furacões, terremotos e inundações), acidentes de avião,  bombardeios  terroristas  e  estupro  ou  maus­tratos,  também  podem  resultar  no  desenvolvimento  da  doença. Pessoas  expostas  a  eventos  traumáticos  também  estão  sob  risco  de  desenvolver  depressão  maior,  transtorno  do pânico,  transtorno  de  ansiedade  generalizada  e  uso  abusivo  de  substâncias.22  Podem  também  apresentar  sintomas físicos e doenças (p. ex., hipertensão, asma e síndromes de dor crônica). O  TEPT  se  caracteriza  por  uma  constelação  de  sintomas  experimentados  como  estados  de  intrusão,  evasão  e hipervigilância.  Intrusão  se  refere  a  flashbacks  durante  as  horas  de  vigília  ou  pesadelos  nos  quais  o  evento traumático passado é revivido, muitas vezes em detalhes vívidos e assustadores. Evasão se refere à insensibilidade emocional  que  acompanha  esse  transtorno  e  atrapalha  as  relações  pessoais  significativas.  Como  o  indivíduo  com TEPT não tem sido capaz de resolver os sentimentos dolorosos associados ao trauma, a depressão geralmente faz parte do quadro clínico. A culpa do sobrevivente também pode ser um produto de situações traumáticas nas quais a pessoa  sobrevive  ao  desastre,  mas  seus  entes  queridos  perecem.  Hipervigilância  se  refere  a  maior  irritabilidade, dificuldade  de  concentração,  reflexo  de  sobressalto  exagerado  e  forte  vigilância  e  preocupação  com  a  segurança. Além  disso,  as  pessoas  com  TEPT  comumente  sofrem  problemas  de  memória,  transtornos  do  sono  e  ansiedade excessiva. Para que seja estabelecido um diagnóstico de TEPT, a pessoa deve ter vivenciado, testemunhado ou confrontado um  evento  traumático  que  tenha  causado  nela  uma  reação  envolvendo  horror  e  medo.  A  tríade  de  sintomas  de intrusão,  evasão  e  hipervigilância  que  caracterizam  o  TEPT  deve  coexistir  por  pelo  menos  1  mês,  e  o  transtorno deve ter causado sofrimento clinicamente significativo.22 Embora a fisiopatologia do TEPT não seja completamente compreendida,  a  revelação  de  alterações  fisiológicas  relacionadas  com  o  transtorno  tem  lançado  luz  sobre  por  que algumas pessoas se recuperam da doença, enquanto outras não. Postula­se ultimamente que os sintomas intrusivos de TEPT podem surgir pela ativação exagerada do sistema nervoso simpático em resposta ao evento traumático. Foi demonstrado  que  pessoas  com TEPT  crônico  apresentam  níveis  elevados  de  norepinefrina  e  aumento  na  atividade de receptores α2­adrenérgicos. Estudos  neuroanatômicos  recentes  identificaram  alterações  em  duas  estruturas  cerebrais  (a  amígdala  e  o hipocampo).  Tomografia  por  emissão  de  pósitrons  e  ressonância  magnética  funcional  mostraram  aumento  da reatividade  da  amígdala  e  do  hipocampo  e  diminuição  da  reatividade  das  áreas  anteriores  do  giro  cingulado  e orbitofrontais. Essas áreas do cérebro estão envolvidas com as respostas de medo. O hipocampo também funciona em  processos  de  memória.  Diferenças  na  função  do  hipocampo  e  em  processos  de  memória  sugerem  uma  base neuroanatômica para os intensos problemas sofridos por pessoas diagnosticadas com TEPT. Indivíduos com TEPT

apresentam  diminuição  dos  níveis  de  cortisol,  aumento  da  sensibilidade  dos  receptores  de  cortisol  e  reforço  da inibição por feedback negativo da liberação de cortisol no teste de supressão com dexametasona. A dexametasona é um  glicocorticoide  sintético  que  mimetiza  os  efeitos  do  cortisol  e  inibe  a  ação  direta  do  CRF  e  do  ACTH.  A hipersupressão do cortisol, observada com o teste de dexametasona, sugere que pessoas com TEPT não apresentam a  resposta  ao  estresse  clássica,  como  descrita  por  Selye.  Como  essa  hipersupressão  não  foi  descrita  em  outros transtornos psiquiátricos, pode servir como marcador relativamente específico para TEPT. Pouco  se  sabe  sobre  os  fatores  de  risco  que  predispõem  ao  desenvolvimento  de TEPT. As  estatísticas  indicam que mais pesquisas são necessárias para determinar esses fatores como meio de detectar os indivíduos que precisam de  medidas  terapêuticas  intensivas  após  experimentar  um  evento  que  envolva  de  risco  de  morte.  Também  é necessária uma investigação para definir os mecanismos pelos quais a doença se desenvolve, de modo que possa ser evitada ou, se isso não for possível, que possam ser desenvolvidos métodos de tratamento para reduzir seus efeitos violentos tanto sobre as pessoas afetadas quanto sobre seus familiares.23 Os profissionais de saúde precisam estar cientes de que indivíduos com sintomas de depressão, ansiedade e uso abusivo  de  álcool  ou  drogas  ilícitas  podem,  na  verdade,  sofrer  de  TEPT.  O  histórico  do  paciente  deve  incluir questões relativas a violência, grande perda ou eventos traumáticos. Analisar ou conversar sobre o evento traumático no momento em que acontece, muitas vezes, é uma ferramenta terapêutica  eficaz.  Frequentemente,  existem  equipes  de  intervenção  em  crise  entre  os  primeiros  profissionais  que atendem  as  necessidades  emocionais  de  quem  é  resgatado  em  eventos  catastróficos.  Algumas  pessoas  podem precisar  de  terapia  de  grupo  ou  acompanhamento  individual  contínuo.  Muitas  vezes,  o  emprego  de  farmacoterapia concomitante, com agentes antidepressivos e ansiolíticos, é útil e auxilia o indivíduo a participar mais plenamente da terapia. Mais importante, a pessoa com TEPT não deve ser responsabilizada pela doença ou entender que isso é evidência da  chamada  falha  de  caráter.  Não  é  incomum  que  indivíduos  com  esse  transtorno  escutem  coisas  como  “você  tem que  superar”  ou  “siga  em  frente,  porque  outros  já  passaram  por  isso  e  superaram”.  Existem  inúmeras  evidências que  sugerem  haver  uma  base  biológica  para  as  diferenças  individuais  na  resposta  a  acontecimentos  traumáticos,  e essas diferenças devem ser levadas em conta no tratamento.

Tratamento e pesquisa dos transtornos de estresse As alterações bioquímicas no sistema de resposta ao estresse de pessoas que sofreram algum tipo de maus­tratos na infância,  de  maneira  que  não  são  capazes  de  responder  efetivamente  aos  estressores  no  futuro,  são  chamadas  de resposta  ao  estresse  traumático.24  Evidências  apontam  que  a  intervenção  precoce  pode  ajudar  o  indivíduo  na adaptação  a  mecanismos  novos  e  efetivos  de  enfrentamento,  de  modo  que  no  futuro  ele  seja  capaz  de  administrar melhor  o  estresse.24  Além  disso,  um  estudo  realizado  com  cuidadores  de  um  cônjuge  ou  membro  da  família demonstra  que  aqueles  que  relataram  níveis  mais  elevados  de  estresse  do  cuidador  também  tinham  autopercepção pior  de  sua  saúde.  Quando  foram  feitas  intervenções  precoces  para  gerenciar  os  níveis  de  estresse  desses cuidadores, foi observada a percepção de comportamentos menos negativos autoidentificados.25 Vários estudos têm dado  suporte  ao  emprego  de  intervenções  precoces  para  ajudar  no  gerenciamento  do  estresse.  De  fato,  existe  um estudo  que  descreve  como  o  desenvolvimento  da  resiliência  foi  conduzido  com  enfermeiros  do  setor  de  oncologia para  diminuir  a  síndrome  de  burnout  (síndrome  de  esgotamento  ocupacional).  Os  resultados  do  estudo  indicaram que o programa foi bem­sucedido e foi recomendada sua aplicação a todos os profissionais de enfermagem.26

Tratamento O  tratamento  do  estresse  deve  ser  dirigido  para  ajudar  as  pessoas  a  evitar  comportamentos  de  enfrentamento  que impõem  riscos  à  sua  saúde  e  proporcionar  a  esses  indivíduos  estratégias  alternativas  para  reduzir  o  estresse. Pessoas  que  se  sentem  sobrecarregadas  pelas  inúmeras  pressões  da  vida  a  que  vêm  sendo  expostas  podem  usar alguns  métodos,  como  o  estabelecimento  propositivo  de  prioridades  e  a  resolução  de  problemas.  Outros  métodos não  farmacológicos  utilizados  para  reduzir  o  estresse  são  técnicas  de  relaxamento,  terapia  de  imagens  mentais (imagery), musicoterapia, massagem e biofeedback. Relaxamento.  Práticas  para  evocação  de  uma  resposta  de  relaxamento  são  muito  numerosas.  São  encontradas  em praticamente todas as culturas, e é creditada a elas a diminuição generalizada na atividade do sistema simpático e na

tensão imposta ao sistema musculoesquelético. O  relaxamento  muscular  progressivo  é  um  método  de  aliviar  a  tensão.  Esta  pode  ser  definida  fisiologicamente como a contração inadequada de fibras musculares. O relaxamento muscular progressivo, que tem sido modificado por  diversos  terapeutas,  consiste  na  contração  e  relaxamento  sistemáticos  dos  principais  grupos  musculares.2  À medida que a pessoa aprende a relaxar, os vários grupos musculares são combinados. Ao final, a pessoa aprende a relaxar grupos musculares individuais sem a necessidade de primeiro contraí­los. Terapia de imagens mentais. A terapia de imagens mentais ( imagery) é uma opção para alcançar o relaxamento. Um dos métodos é a visualização de uma cena: a pessoa é convidada a se sentar, fechar os olhos e se concentrar em uma  cena  narrada  pelo  terapeuta.  Sempre  que  possível,  os  cinco  sentidos  devem  estar  envolvidos. A  pessoa  tenta visualizar,  sentir,  ouvir,  cheirar  e  provar  os  aspectos  envolvidos  na  experiência  visual.  Outros  tipos  dessa  terapia envolvem  imaginar  a  aparência  de  cada  um  dos  principais  grupos  musculares  e  como  eles  se  sentem  durante  um estado de tensão e de relaxamento. Musicoterapia.  A  musicoterapia  é  utilizada  tanto  por  seus  efeitos  fisiológicos  quanto  psicológicos.  Trata­se  de ouvir  peças  musicais  selecionadas  como  maneira  de  amenizar  a  ansiedade  ou  o  estresse,  diminuir  o  nível  de  dor, reduzir  sentimentos  de  solidão  e  isolamento,  amortecer  ruídos  e  facilitar  a  expressão  das  emoções.  Geralmente,  a música  é  selecionada  de  acordo  com  a  preferência  musical  do  indivíduo  e  as  experiências  musicais  passadas associadas  a  ela.  Dependendo  do  cenário,  podem  ser  utilizados  fones  de  ouvido  para  filtrar  outros  ruídos  que possam  causar  distração.  Ouvir  música  do  rádio  ou  da  televisão  não  é  apropriado  na  musicoterapia  devido  à incapacidade de se controlar a seleção de peças musicais que deverão ser tocadas, as interrupções que ocorrem (p. ex., anúncios e comerciais), além da qualidade inferior da recepção. Biofeedback.  É  uma  técnica  na  qual  o  indivíduo  aprende  a  controlar  as  funções  fisiológicas.  Envolve  o monitoramento  eletrônico  de  uma  ou  mais  respostas  fisiológicas  ao  estresse,  com  feedback  imediato  da  resposta específica à pessoa em tratamento.

Pesquisa A  pesquisa  sobre  o  estresse  tem  se  concentrado  em  relatos  pessoais  de  situações  estressantes  e  nas  respostas fisiológicas ao estresse. Uma série de formulários de entrevista e outros instrumentos por escrito estão disponíveis para fazer a aferição das respostas individuais ao estresse e dos mecanismos de enfrentamento em adultos. A  medição  de  sinais  vitais,  níveis  de  ACTH,  glicocorticoides  (cortisol)  e  glicose,  além  de  contagens imunológicas, fazem parte dos estudos nas pesquisas atuais sobre o estresse. Foram  selecionados  indivíduos  criticamente  enfermos  e  outros  em  ventilação  artificial  para  que  ouvissem,  ou não, uma música enquanto eram observados seus sinais vitais e níveis de sedação (Escala de Sedação de Ramsay). Todos  foram  medicados  com  o  mesmo  sedativo,  e  a  dosagem  foi  calculada  de  acordo  com  o  peso  de  cada  um.  O grupo  experimental  (aqueles  que  ouviram  música)  apresentou  níveis  mais  altos  de  sedação,  como  evidenciado  por escores de Ramsay superiores aos do grupo­controle, porém não foram observadas diferenças nos sinais vitais.27 A manutenção de níveis mais altos de sedação na Escala de Sedação de Ramsay foi considerada um resultado positivo para a prevenção do estresse.27  Um  estudo  realizado  com  mulheres  porto­riquenhas  que  vivem  nos  EUA  mostrou que  muitas  estavam  sob  estresse,  como  evidenciado  pelo  aumento  das  frequências  respiratória,  cardíaca  e  da pressão  arterial.28  Verificou­se  que  essas  mulheres  tinham  uma  chance  significativamente  maior  de  desenvolver doenças  cardiovasculares,  artrite,  obesidade  abdominal,  hipertensão  arterial  e  diabetes  melito  no  futuro.28 Evidências  de  outro  estudo  mostram  que  mulheres  equatorianas  com  altos  níveis  de  estresse  estão  desenvolvendo LES, doença autoimune que provoca inflamação sistêmica.29 Pesquisas  que  tentam  estabelecer  ligação  entre  a  resposta  ao  estresse  e  processos  patológicos  precisam  ser interpretadas  com  cautela,  devido  à  influência  que  as  diferenças  individuais  têm  na  maneira  como  as  pessoas reagem  ao  estresse.  Nem  todo  mundo  que  passa  por  eventos  estressantes  na  vida  desenvolve  uma  doença.  A evidência  de  ligação  entre  o  sistema  de  resposta  ao  estresse  e  o  desenvolvimento  de  uma  doença  em  pessoas suscetíveis  é  atraente,  mas  não  conclusiva.  Nenhum  estudo  foi  capaz  de  estabelecer  uma  relação  direta  de  causa  e efeito  entre  a  resposta  ao  estresse  e  a  ocorrência  de  doença.  Por  exemplo,  um  transtorno  depressivo  está frequentemente  associado  ao  aumento  nos  níveis  plasmáticos  de  cortisol  e  nas  concentrações  de  CRF  no  líquido

cerebroespinal. A questão que se coloca é se esse aumento do cortisol plasmático deve ser considerado como causa ou efeito do estado depressivo. Embora os profissionais de saúde continuem a questionar o papel dos estressores e as  habilidades  de  enfrentamento  na  patogênese  de  estados  patológicos,  devemos  resistir  à  tentação  de  sugerir  que qualquer doença é o resultado de estresse excessivo ou de habilidades de enfrentamento precárias.

Resumo

O  estresse  em  si  não  é  negativo  nem  prejudicial  à  saúde. A  resposta  ao  estresse  é  projetada  para  ser  limitada  e protetora, mas situações que provocam a ativação prolongada da resposta devido à ação de estressores intensos ou crônicos podem ser prejudiciais à saúde. O TEPT é um exemplo de ativação da resposta ao estresse crônico, como resultado  de  uma  experiência  traumática  grave.  Neste  transtorno,  a  memória  do  evento  traumático  parece  ser reforçada. Flashbacks do evento são acompanhados de intensa ativação do sistema neuroendócrino. O tratamento do estresse deve ser destinado a ajudar as pessoas a evitar comportamentos de enfrentamento que podem  afetar  negativamente  sua  saúde  e  proporcionar  outras  maneiras  para  redução  do  estresse.  Métodos  não farmacológicos utilizados no tratamento do estresse incluem técnicas de relaxamento, terapia de imagens mentais, musicoterapia, técnicas de massagem e biofeedback. A  pesquisa  sobre  estresse  tem  se  concentrado  em  relatos  pessoais  da  situação  de  estresse  e  suas  respostas fisiológicas a ele. Uma série de formulários de entrevista e outros instrumentos por escrito estão disponíveis para medir  as  respostas  individuais  a  estressores  agudos  e  crônicos.  Os  métodos  utilizados  para  o  estudo  das manifestações  fisiológicas  da  resposta  ao  estresse  incluem  registro  eletrocardiográfico  da  frequência  cardíaca, aferição  da  pressão  arterial,  medição  eletrodermal  da  resistência  cutânea  associada  à  sudorese  e  análises bioquímicas de níveis hormonais.

Exercícios de revisão

1.

Uma estudante universitária de 21 anos de idade percebe que frequentemente se desenvolvem “aftas” durante a semana estressante de

realização das provas nais.

A.

Qual é a associação entre estresse e sistema imunológico?

B.

Uma de suas colegas sugere que ela ouça música ou tente exercícios de relaxamento como uma maneira de amenizar o estresse. Explique

como essas intervenções podem funcionar no alívio do estresse.

2.

Uma mulher de 75 anos de idade com insuciência cardíaca congestiva se queixa de que sua condição piora quando se preocupa e se sente

sob estresse.

A.

Relacione os efeitos do estresse no controle neuroendócrino da função cardiovascular e sua possível relação com o agravamento da

insuciência cardíaca congestiva nessa mulher.

B.

Ela conta a você que passou por situações de estresse muito piores quando era mais jovem, e nunca teve qualquer problema. Como você

explica isso?

3.

Uma mulher de 30 anos resgatada de um prédio que desabou tem tido pesadelos em que se recorda do evento, sentido ansiedade excessiva e

perda de apetite e temido sair de casa porque acha que algo de ruim pode acontecer.

A.

Considerando seu histórico e sintomas, qual é o diagnóstico provável?

B.

De que maneira ela pode ser tratada?

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________________ a N.T.:  Hardiness:  predisposição  que  possibilita  que  o  indivíduo  aceite  os  desafios  e  as  mudanças  da  vida  com  bom  humor  e resiliência.

A temperatura do corpo, em determinado ponto no tempo, representa o equilíbrio entre o ganho e a perda de calor. O  calor  é  gerado  nos  tecidos  internos  do  corpo,  transferidos  para  a  superfície  da  pele  pelo  sangue  e  liberado  no meio  ambiente.  A  temperatura  corporal  sobe  durante  a  febre  devido  a  alterações  mediadas  por  receptores  de citocinas e receptores toll­like no set point (ponto de ajuste) do centro regulador da temperatura no hipotálamo. A temperatura corporal sobe em casos de hipertermia devido a produção excessiva de calor, dissipação inadequada de calor ou falha nos mecanismos de termorregulação. A temperatura do corpo cai durante a hipotermia por causa da exposição  ao  frio.  Este  capítulo  está  organizado  em  três  seções:  regulação  da  temperatura  corporal,  aumento  da temperatura corporal (febre e hipertermia) e diminuição da temperatura corporal (hipotermia).

Controle da temperatura corporal

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Diferenciar entre temperatura corporal interna e temperatura da pele



Identicar as diferenças entre os métodos utilizados para medir a temperatura do corpo



Denir os termos condução, radiação, convecção e evaporação e relacioná-los com os mecanismos de ganho e de perda de calor corporal

A  maioria  dos  processos  bioquímicos  orgânicos  é  afetada  por  mudanças  de  temperatura.  Os  processos metabólicos  se  aceleram  ou  desaceleram,  dependendo  do  fato  de  a  temperatura  corporal  aumentar  ou  diminuir. A temperatura corporal central (i. e., intracraniana, intratorácica e intra­abdominal) normalmente se mantém em uma faixa  entre  36,0  e  37,5°C.1  Dentro  dessa  faixa,  podem  existir  diferenças  individuais.  Por  exemplo,  a  temperatura central da maioria das mulheres aumenta aproximadamente entre 0,5 e 1,0°C durante o período depois da ovulação em seu ciclo menstrual.1 São observadas também variações ao longo do dia. A temperatura central interna alcança o ponto mais alto no final da tarde e à noite, e o ponto mais baixo nas primeiras horas da manhã (Figura 10.1). Na verdade, a temperatura corporal geralmente é mais baixa entre 3 e 6 h e mais alta durante o final da tarde, entre 15 e 18 h.1 A temperatura do corpo reflete a diferença entre a produção e a perda de calor e varia com a prática de exercícios físicos e por extremos de temperatura ambiente. Por exemplo, o exercício pode aumentar em dez vezes a produção de  calor  metabólico.1  Felizmente,  respostas  de  termorregulação  como  a  sudorese,  simultaneamente,  aumentam  a perda de calor e, assim, impedem que a temperatura do corpo se eleve a níveis perigosamente altos. Tremores, por outro lado, aumentam a produção de calor metabólico. Essa resposta de termorregulação pode compensar o aumento da perda de calor resultante das condições ambientais de frio. Adequadamente protegido e hidratado, o organismo pode  funcionar  em  condições  ambientais  que  variam  de  –50  a  50°C.  A  incapacidade  de  administrar  de  maneira

correta a produção e/ou perda de calor tem consequências devastadoras. Por exemplo, podem se formar cristais de gelo em tecidos expostos a temperaturas ambientes muito baixas e umidade. No outro extremo, temperaturas muito altas (45°C) causam coagulação e/ou agregação das proteínas. Como será posteriormente discutido neste capítulo, mudanças sistêmicas muito menores na temperatura corporal podem ser igualmente violentas, resultando em danos aos tecidos, falência de órgãos, coma e até morte.2

Figura 10.1 • Variações normais da temperatura corporal ao longo do dia.

Conceitos fundamentais

Termorregulação



A temperatura corporal é um re셯茳exo do equilíbrio entre o ganho e a perda de calor pelo corpo. Processos metabólicos produzem calor que deve ser dissipado



O hipotálamo é o centro de controle térmico para o organismo, recebe informações de termorreceptores periféricos e centrais e compara essa informação com

seu set point para temperatura



Um aumento na temperatura corporal interna pode ser conseguido por vasoconstrição e calafrios; uma diminuição da temperatura, por vasodilatação e

transpiração

A maior parte do calor do corpo é produzida por tecidos centrais profundos (i. e., músculos e vísceras), isolados do  meio  ambiente  e  protegidos  contra  a  perda  de  calor  por  uma  camada  externa  de  tecido  subcutâneo  e  pela  pele (Figura  10.2).  A  espessura  do  revestimento  depende  do  fluxo  sanguíneo.  Em  um  ambiente  quente,  o  fluxo sanguíneo  aumenta  e  a  espessura  da  camada  externa  se  reduz,  possibilitando  maior  dissipação  de  calor.  Em  um ambiente  frio,  ocorre  constrição  dos  vasos  que  fornecem  o  fluxo  sanguíneo  para  a  pele  e  tecidos  subjacentes, incluindo  os  de  membros  e  músculos  mais  superficiais  do  pescoço  e  do  tronco.  Isso  aumenta  a  espessura  do invólucro  e  ajuda  a  minimizar  a  perda  de  calor  central  do  organismo. A  camada  de  gordura  subcutânea  contribui para  o  isolamento  do  invólucro  exterior  devido  à  sua  espessura  e  porque  sua  eficiência  na  condução  de  calor  é  de apenas um terço daquela de outros tecidos.

Figura  10.2  •  Controle  de  perda  de  calor.  O  calor  do  corpo  é  produzido  nos  tecidos  centrais  mais  profundos  do corpo,  que  são  isolados  pelos  tecidos  subcutâneos  e  pela  pele  para  proteger  contra  a  perda  de  calor.  Durante  a vasodilatação, o sangue em circulação transporta calor para a superfície cutânea para se dissipar no meio ambiente. A  vasoconstrição  reduz  o  transporte  de  calor  do  interior  do  corpo  para  a  superfície  da  pele,  e  a  vasodilatação aumenta.

A  temperatura  é  diferente  nas  diversas  partes  do  corpo,  e  a  temperatura  interna  é  mais  alta  que  a  da  superfície cutânea.  Em  geral,  a  temperatura  retal  é  usada  como  medida  de  temperatura  interna  e  é  considerada  como  o parâmetro mais preciso.3 Normalmente varia entre 37,3 e 37,6°C. A temperatura interna também pode ser obtida a partir do esôfago, com a utilização de um termômetro flexível; a partir de um cateter inserido na artéria pulmonar, usado  para  a  medição  do  débito  cardíaco  por  termodiluição;  ou  a  partir  de  um  cateter  urinário  com  um  sensor térmico, que mede a temperatura da urina na bexiga. Devido à sua localização, as temperaturas da artéria pulmonar e do esôfago refletem aproximadamente as temperaturas do coração e dos órgãos torácicos. A medição obtida por inserção de um cateter na artéria pulmonar é a preferida quando a temperatura do corpo está mudando rapidamente e precisa  ser  acompanhada  de  modo  confiável  em  um  indivíduo  gravemente  enfermo  no  ambiente  de  cuidados intensivos. A temperatura oral, medida por via sublingual, costuma ser mais baixa entre 0,2 e 0,51°C do que a temperatura retal.  No  entanto,  geralmente  acompanha  de  perto  alterações  da  temperatura  central. A  temperatura  axilar  também pode  ser  utilizada  para  uma  estimativa  da  temperatura  interna.  No  entanto,  a  região  da  fossa  axilar  deve  ser pressionada durante um longo período (de 5 a 10 min, com um termômetro de vidro), porque este método requer o acúmulo de uma quantidade considerável de calor, antes que a temperatura final seja alcançada. A  termometria  auditiva  utiliza  um  sensor  de  infravermelhos  para  medir  o  fluxo  de  calor  a  partir  da  membrana timpânica  e  do  meato  acústico.4  É  popular  em  todos  os  ambientes  de  cuidados  de  saúde  devido  a  facilidade  e velocidade de medição, aceitabilidade dos indivíduos e economia no tempo necessário para medição da temperatura. No  entanto,  há  um  debate  contínuo  sobre  a  precisão  desse  método.5,6  Existem  evidências  de  que  a  termometria

auditiva  pode  prever  temperaturas  retais  em  idosos  com  temperatura  normal  e  febris.4 Além  disso,  estudos  com crianças demonstram poucas evidências de que a idade e o sexo da criança, bem como a temperatura ambiente ou a umidade, tenham impacto sobre a confiabilidade da temperatura timpânica.5 Chupetas  com  termômetro  e  faixas  térmicas  para  medir  a  temperatura  em  pacientes  pediátricos  também  têm levantado  preocupações  sobre  sua  precisão  e  são  utilizadas  com  mais  frequência  para  monitorar  tendências,  em oposição a medidas absolutas. Tanto  a  temperatura  interna  do  corpo  quanto  a  temperatura  da  pele  são  detectadas  e  integradas  por  regiões  de termorregulação  no  hipotálamo  (particularmente,  a  área  pré­óptica  anterior  do  hipotálamo)  e  outras  estruturas cerebrais  (ou  seja,  tálamo  e  córtex  cerebral).  Canais  iônicos  sensíveis  à  temperatura,  identificados  como  um subconjunto  da  família  dos  termo­TRP  (transient  receptor  potential),  existentes  em  neurônios  sensoriais periféricos  e  centrais  são  ativados  por  estímulos  inócuos  (mornos  e  em  temperatura  ambiente  ou  um  pouco  mais frios)  e  nocivos  (quentes  e  frios).6  Os  sinais  periféricos  relacionados  com  a  temperatura  são  iniciados  por mudanças no potencial de membrana local, transmitidas para o cérebro por gânglios da raiz dorsal.6 O set point do centro termorregulador do hipotálamo é adequado, de modo que a temperatura interna do corpo seja regulada dentro da faixa de normalidade entre 36,0 e 37,5°C. Quando a temperatura corporal começa a se elevar acima do set point, o hipotálamo envia um sinal ao sistema nervoso central e ao periférico para iniciar comportamentos de dissipação de  calor.  Da  mesma  maneira,  quando  a  temperatura  cai  abaixo  do  set  point,  os  sinais  do  hipotálamo  provocam comportamentos  fisiológicos  que  aumentam  a  conservação  e  a  produção  de  calor. A  temperatura  central  acima  de 41°C ou abaixo de 34°C geralmente significa que a capacidade do organismo de termorregulação foi comprometida. As respostas orgânicas que produzem, conservam e dissipam calor estão descritas na Tabela 10.1. Um traumatismo da  medula  espinal  que  cause  ruptura  no  nível  de  T6  ou  acima  pode  comprometer  seriamente  a  capacidade  de regulação  da  temperatura,  pois  os  centros  de  termorregulação  no  hipotálamo  não  são  mais  capazes  de  controlar  o fluxo sanguíneo cutâneo e a sudorese. Além  dos  mecanismos  de  termorregulação  reflexos  e  automáticos,  os  seres  humanos  se  envolvem voluntariamente em comportamentos que ajudam a regular a temperatura do corpo, com base na sensação consciente de  estar  muito  quente  ou  muito  frio.  Esses  comportamentos  incluem  a  escolha  da  vestimenta  e  a  regulação  da temperatura  ambiente  por  intermédio  de  sistemas  de  aquecimento  ou  ar­condicionado.  Posições  corporais  que mantenham  as  extremidades  próximas  ao  corpo  evitam  a  perda  de  calor  e,  em  geral,  são  assumidas  com  o  clima frio.

Mecanismos de produção de calor O metabolismo é a principal fonte de produção de calor corporal ou termogênese. Muitos fatores influenciam a taxa metabólica, incluindo: • Taxa metabólica de cada célula

• Qualquer  fator  que  seja  capaz  de  aumentar  a  taxa  metabólica  basal  (TMB),  como  a  produzida  por  atividade muscular • Metabolismo adicional causado por hormônios, como tiroxina, hormônio do crescimento ou testosterona • Qualquer metabolismo adicional causado pela estimulação do sistema nervoso simpático sobre as células • Metabolismo adicional causado pelo aumento da atividade química celular • Efeito termogênico da digestão, da absorção ou do armazenamento dos alimentos.3 Ocorre  aumento  de  0,55°C  na  temperatura  corporal  para  cada  aumento  de  7%  no  metabolismo.  Os neurotransmissores  simpáticos,  epinefrina  e  norepinefrina,  liberados  quando  é  necessário  elevar  a  temperatura  do corpo,  atuam  ao  nível  celular  para  deslocar  o  metabolismo  orgânico  para  a  produção  de  calor,  em  vez  de  para  a produção  de  energia.  Esse  pode  ser  um  dos  motivos  pelos  quais  a  febre  tende  a  produzir  sensação  de  fraqueza  e fadiga. O hormônio da tireoide aumenta o metabolismo celular, mas essa resposta geralmente requer várias semanas para alcançar eficácia máxima. Ações involuntárias, como o desenvolvimento de tremores e o bater dos dentes, podem produzir aumento de três a  cinco  vezes  na  temperatura  corporal.  Os  tremores  são  iniciados  por  impulsos  do  hipotálamo.  Embora  o  tremor seja  uma  tentativa  de  diminuir  a  temperatura  do  corpo,  ele  na  verdade  aumenta,  assim  como  também  eleva  o

consumo de oxigênio em cerca de 40%.7 A  primeira  alteração  muscular  ocorrida  com  os  tremores  é  um  aumento  geral  do  tônus  muscular,  seguido  de tremor  rítmico  oscilante  envolvendo  reflexo  de  nível  espinal  que  controla  o  tônus  muscular.8  O  esforço  físico aumenta a temperatura corporal. Os músculos convertem em calor, em vez de em trabalho mecânico, a maior parte da  energia  existente  nos  combustíveis  que  consomem.  Com  a  prática  de  exercícios  extenuantes,  mais  do  que  três quartos do aumento do metabolismo resultante de atividade muscular aparece como calor no interior do organismo, e o restante surge como trabalho mecânico. Tabela 10.1 Respostas de ganho e perda de calor usadas no controle da temperatura corporal. Ganho de calor

 

Perda de calor

 

Resposta corporal

Mecanismo de ação

Resposta corporal

Mecanismo de ação

Vasoconstrição dos vasos

Limita o 셯茳uxo sanguíneo para o interior do

Dilatação dos vasos

Fornecimento de sangue contendo o calor do

sanguíneos superciais

Contração dos músculos

corpo, com a pele e os tecidos subcutâneos

sanguíneos superciais

interior do corpo para a periferia, onde é

atuando como isolamento para evitar

dissipado através de radiação, condução e

perdas de calor no interior do corpo

convecção

Reduz a perda de calor na superfície cutânea

Sudorese

Aumenta a perda de calor por evaporação

Reduz a área para a perda de calor

 

 

Tremores

Aumenta a produção de calor pelos músculos

 

 

Aumento da produção de

Aumenta a produção de calor associada ao

 

 

 

 

pilomotores que

circundam os pelos da

pele

Adoção da posição encolhida,

com as extremidades

mantidas junto ao corpo

epinefrina

Aumento da produção de

hormônio da tireoide

metabolismo

Mecanismo a longo prazo que aumenta o

metabolismo e a produção de calor

Mecanismos de perda de calor A  maior  parte  das  perdas  de  calor  do  corpo  se  dá  na  superfície  cutânea,  à  medida  que  o  calor  do  sangue  se  move para  a  pele  e,  dela,  para  o  meio  ambiente.  Existem  inúmeras  anastomoses  arteriovenosas  (AV)  sob  a  superfície cutânea,  que  possibilitam  ao  sangue  se  mover  diretamente  do  sistema  arterial  ao  sistema  venoso.3  Essas anastomoses  são  muito  parecidas  com  radiadores  de  um  sistema  de  aquecimento.  Quando  as  derivações  estão abertas,  o  calor  do  corpo  é  dissipado  livremente  para  o  meio  ambiente  e  a  pele;  quando  as  derivações  estão fechadas,  o  calor  é  retido  no  corpo.  O  fluxo  de  sangue  nas  anastomoses  arteriovenosas  é  controlado  quase exclusivamente  pelo  sistema  nervoso  simpático,  em  resposta  a  alterações  na  temperatura  interior  e  na  temperatura ambiente. A contração dos  músculos pilomotores da pele, que levanta os pelos e produz arrepios, também ajuda na conservação de calor, reduzindo a área de superfície disponível para a perda de calor. O calor é perdido por meio de radiação, condução e convecção a partir da superfície da pele; por evaporação pelo suor e de perspiração insensível; pela exalação de ar antes aquecido e umidificado; e pelo calor perdido por meio da urina  e  das  fezes.  Dentre  esses  mecanismos,  apenas  as  perdas  térmicas  ocorridas  na  superfície  da  pele  estão diretamente sob o controle do hipotálamo.

Radiação Radiação é a transferência de calor pelo ar ou pelo vácuo. O calor do sol é transportado por radiação. A perda de calor por radiação varia de acordo com a temperatura do meio ambiente. A temperatura ambiente tem de ser inferior à  do  corpo  para  que  possa  ocorrer  a  perda  de  calor.  Se  uma  pessoa  se  encontra  nua  e  sentada  em  uma  sala  com temperatura normal, aproximadamente 60% do calor corporal tipicamente são dissipados por radiação.3

Condução Condução  é  a  transferência  direta  de  calor  de  uma  molécula  para  outra.  O  sangue  carrega,  ou  conduz,  o  calor  do interior do corpo até a superfície da pele. Normalmente, apenas uma pequena quantidade de calor corporal é perdida por  condução  até  uma  superfície  mais  fria.  Cobertores  ou  colchões  de  resfriamento  usados  para  reduzir  a  febre dependem  de  condução  de  calor  da  pele  para  a  superfície  fria  do  colchão.  O  calor  também  pode  ser  conduzido  no sentido oposto, do ambiente externo para a superfície do corpo. Por exemplo, a temperatura do corpo pode subir um pouco depois de um banho quente. A  água  tem  calor  específico  muitas  vezes  maior  do  que  o  ar;  por  conseguinte,  ela  absorve  uma  quantidade  de calor muito maior do que o ar. A perda de calor corporal pode ser excessiva e potencialmente fatal em situações de imersão em água gelada ou por exposição ao frio com roupas molhadas. A  condução  do  calor  para  a  superfície  corporal  é  influenciada  pelo  volume  de  sangue.  Em  climas  quentes,  o organismo  faz  a  compensação  aumentando  o  volume  sanguíneo,  como  meio  de  dissipação  de  calor.  A  leve tumefação dos tornozelos em períodos de clima quente fornece uma evidência da expansão do volume de sangue. A exposição ao frio produz diurese a frio e redução no volume sanguíneo, como meio de controlar a transferência de calor para a superfície corporal.9

Convecção Convecção se refere à transferência de calor mediante a circulação de correntes de ar. Normalmente, uma camada de ar  quente  tende  a  permanecer  próxima  à  superfície  do  corpo.  A  convecção  provoca  a  remoção  contínua  dessa camada  de  ar  quente  e  a  substituição  pelo  ar  do  meio  ambiente.  O  fator  “ventos  frios”,  que  muitas  vezes  está incluído no boletim meteorológico, combina o efeito de convecção devido ao vento com a temperatura do ar parado.

Evaporação Evaporação  envolve  a  utilização  de  calor  do  corpo  para  converter  a  água  na  pele  em  vapor  d’água. A  água  que  se difunde  através  da  pele  independentemente  da  transpiração  é  chamada  de  perspiração  insensível.  As  perdas  por perspiração  insensível  são  maiores  em  ambientes  secos. A  sudorese  ocorre  através  das  glândulas  sudoríferas  e  é controlada pelo sistema nervoso simpático. É mediada por acetilcolina. Isso é diferente de outras funções mediadas pelo sistema nervoso simpático, em que as catecolaminas funcionam como neuromediadores. O impacto disto é que as  substâncias  anticolinérgicas,  como  a  atropina,  podem  interferir  na  perda  de  calor  por  meio  da  interrupção  da transpiração. Perdas  de  calor  por  evaporação  envolvem  a  transpiração  e  a  perspiração  insensível,  sendo  perdida  0,58  caloria para cada grama de água evaporado.3 Enquanto a temperatura do corpo é mais alta do que a temperatura ambiente, o calor  é  perdido  por  radiação.  No  entanto,  quando  a  temperatura  do  meio  ambiente  se  torna  maior  do  que  a temperatura da pele, a evaporação é o único modo que o corpo tem de liberar o calor. Qualquer condição que impeça a perda de calor por evaporação faz a temperatura do corpo se elevar.

Resumo

A temperatura corporal central normalmente é mantida na faixa entre 36,0 e 37,5°C. Tanto a temperatura interna do  corpo  quanto  a  temperatura  da  pele  são  detectadas  e  integradas  por  áreas  de  termorregulação  localizadas  no hipotálamo  e  em  outras  estruturas  cerebrais,  que  funcionam  de  modo  a  modificar  a  produção  e  a  perda  de  calor como  meio  de  regular  a  temperatura  corporal.  Processos  metabólicos  dentro  das  estruturas  mais  profundas  do organismo (i. e., músculos e vísceras) produzem a maior parte do calor gerado pelo corpo. Neurotransmissores do sistema nervoso simpático (epinefrina e norepinefrina) e o hormônio da tireoide atuam no nível celular para alterar o  metabolismo  orgânico  para  produção  de  calor,  enquanto  tremor  e  bater  dos  dentes  usam  o  calor  liberado  por movimentos  musculares  involuntários  para  aumentar  a  temperatura  corporal. A  maior  parte  das  perdas  de  calor corporal ocorre na superfície da pele, à medida que o calor se move do sangue através da pele e daí para o meio ambiente. O calor é perdido através de radiação, condução, convecção e evaporação por meio da perspiração e da transpiração. A  contração  dos  músculos  pilomotores  da  pele  ajuda  na  conservação  de  calor,  reduzindo  a  área  de superfície disponível para a perda de calor.

Aumento da temperatura corporal

Depois de concluir esta seção, o leitor deverá ser capaz de:



Caracterizar a siologia da febre



Diferenciar os mecanismos siológicos envolvidos na febre e na hipertermia



Comparar os mecanismos de hipertermia maligna e a síndrome neuroléptica maligna

Tanto  a  febre  quanto  a  hipertermia  descrevem  condições  em  que  a  temperatura  do  corpo  está  acima  da  faixa  de normalidade. A febre se deve a um deslocamento acima do set point de regulação térmica do centro termorregulador do hipotálamo. Isso contrasta com a hipertermia, na qual o set point permanece inalterado, mas os mecanismos que controlam a temperatura do corpo são ineficazes para manter a temperatura dentro da faixa de normalidade durante situações em que a produção ultrapassa a capacidade do corpo de dissipar o calor.

Febre Febre, ou pirexia, descreve uma elevação da temperatura corporal causada por um deslocamento acima do set point de regulação térmica do centro termorregulador do hipotálamo. A temperatura é uma das respostas fisiológicas que mais frequentemente precisam ser monitoradas durante processos patológicos.

Conceitos fundamentais

Febre



Febre é uma elevação da temperatura corporal que resulta de aumento induzido por citocinas no set point do centro termorregulador localizado no hipotálamo



A febre é uma resposta inespecíca mediada por pirógenos endógenos liberados pelas células do hospedeiro como reação a distúrbios infecciosos ou não

infecciosos

Mecanismos Muitas  proteínas,  produtos  de  degradação  de  proteínas  e  outras  substâncias  liberadas  pela  membrana  celular  de bactérias  podem  causar  mudanças  de  elevação  no  set point. A  febre  desaparece  quando  a  condição  que  causou  a elevação  do  set  point  é  removida.  Febres  reguladas  pelo  hipotálamo  normalmente  não  apresentam  temperaturas acima  de  41°C,  o  que  sugere  um  mecanismo  termorregulador  interno  de  segurança.  Temperaturas  acima  desse ponto  geralmente  resultam  de  atividades  sobrepostas,  como  convulsões,  estados  de  hipertermia  ou comprometimento direto do centro de controle de temperatura. Pirógenos são substâncias exógenas ou endógenas que produzem febre. Pirógenos exógenos têm origem fora do corpo  e  incluem  substâncias  como  produtos  bacterianos,  toxinas  bacterianas  ou  de  microrganismos  inteiros.  Os pirógenos  exógenos  induzem  as  células  do  hospedeiro  a  produzir  mediadores  produtores  de  febre,  chamados pirógenos endógenos. Quando bactérias ou produtos de degradação de bactérias são encontrados no sangue ou nos tecidos,  as  células  do  sistema  imunológico  os  englobam  por  fagocitose.  Essas  células  de  fagocitose  digerem  os produtos  bacterianos  e,  em  seguida,  liberam  para  a  corrente  sanguínea  citocinas  pirogênicas,  principalmente interleucina­1 (IL­1), interleucina­6 (IL­6) e fator a de necrose tumoral (TNF­α), para que sejam transportadas até o hipotálamo, onde exercem sua ação.3 Essas citocinas induzem a prostaglandina E2 (PGE2), que é um metabólito do ácido araquidônico (ácido graxo existente na membrana celular). A hipótese é de que quando a interleucina (IL­ 1B)  interage  com  as  células  endoteliais  da  barreira  hematencefálica  em  capilares  do  órgão  vasculoso  da  lâmina terminal (OVLT), que se localiza no terceiro ventrículo acima do quiasma óptico, ocorre a liberação de PGE2 para o hipotálamo.1 Neste ponto, PGE2 se liga aos receptores no hipotálamo para induzir o aumento do set point termorregulador por intermédio  do  segundo  mensageiro  adenosina  monofosfato  cíclico  (cAMP).  Em  resposta  à  elevação  em  seu  set

point  termorregulador,  o  hipotálamo  inicia  os  tremores  e  a  vasoconstrição  que  elevam  a  temperatura  central  do corpo para o novo set point, e a febre se estabelece. Embora o papel central da PGE2 na elevação do set point do centro termorregulador do hipotálamo e na produção da febre não seja questionado, pesquisas sugerem que a resposta febril à invasão de bactérias gram­negativas e seus produtos (principalmente lipopolissacarídios endotóxicos) seja mediada por PGE2.1 Além  de  atuar  na  produção  de  febre,  os  pirógenos  endógenos  fazem  a  mediação  de  inúmeras  respostas.  Por exemplo, IL­1 e TNF­α são mediadores inflamatórios que produzem outros sinais de inflamação, como leucocitose, anorexia e mal­estar. Muitas doenças não infecciosas, como infarto do miocárdio, embolia pulmonar e neoplasias, produzem febre. Nessas condições, células lesionadas ou anormais incitam a produção de pirógenos endógenos. Por exemplo,  traumatismos  e  procedimentos  cirúrgicos  podem  estar  associados  a  uma  febre  de  até  3  dias.  Algumas células malignas, como as de leucemia e doença de Hodgkin, secretam mediadores químicos que funcionam como pirógenos endógenos. A  febre  com  origem  no  sistema  nervoso  central  muitas  vezes  é  denominada  febre  neurogênica.  Geralmente  é ocasionada por danos ao hipotálamo causados por traumatismo do sistema nervoso central, hemorragia intracerebral ou  aumento  da  pressão  intracraniana.  A  febre  neurogênica  se  caracteriza  por  temperaturas  elevadas  resistentes  à terapia antipirética e não está associada à transpiração.

Propósito O  propósito  da  febre  não  é  completamente  compreendido.  No  entanto,  de  um  ponto  de  vista  puramente  prático,  a febre é um indicador importante do estado de saúde. Para muitos, ela sinaliza a existência de uma infecção e pode legitimar  a  necessidade  de  tratamento  médico.  Há  pouca  pesquisa  para  dar  suporte  à  crença  de  que  a  febre  seja prejudicial,  a  menos  que  a  temperatura  ultrapasse  40°C.  No  entanto,  estudos  com  animais  demonstraram  clara vantagem  de  sobrevivência  em  membros  infectados  com  febre,  em  comparação  com  os  animais  incapazes  de produzir febre. Também tem sido demonstrado que pequenas elevações de temperatura, como as que ocorrem com estados  febris,  melhoraram  a  função  imunológica  pela  proliferação  de  linfócitos  T. 3  Muitos  agentes  microbianos que  causam  infecção  se  desenvolvem  melhor  na  temperatura  corporal  normal,  e  seu  crescimento  é  inibido  por temperaturas na faixa considerada como febre. No entanto, a existência de febre é negativa em muitas situações, como nos casos de idosos portadores de doença cardíaca ou pulmonar, porque aumenta a demanda de oxigênio. Para cada elevação de 1°C na temperatura, a TMB se eleva 7% e provoca aumento do trabalho cardíaco. A febre também pode produzir confusão mental, taquicardia e taquipneia.  Pode  ocorrer  dano  celular  quando  as  temperaturas  se  elevam  acima  de  42,2°C,  e  isto  pode,  em  última instância, causar acidose, hipoxia e hiperpotassemia, condições potencialmente fatais.9

Padrões Os padrões de mudança de temperatura em pessoas com febre são variáveis. Além disso, a variação diurna média na temperatura gera aumento de pico no final da tarde ou início da noite.2 Esses padrões podem ser descritos como intermitentes,  remitentes,  sustentados  ou  recorrentes  (Figura  10.3).  Febre  intermitente  é  aquela  em  que  a temperatura  retorna  ao  normal  pelo  menos  uma  vez  a  cada  24  h.  Na  febre remitente,  a  temperatura  não  volta  ao normal e varia em alguns graus para cima ou para baixo. Na febre sustentada ou contínua, a temperatura se mantém acima do normal, com variações mínimas (geralmente  10.000 dáltons), como proteínas, polissacarídios, lipídios e ácidos  nucleicos  livres.  Os  antígenos  são  reconhecidos  por  receptores  específicos  encontrados  na  superfície  dos linfócitos e por anticorpos ou imunoglobulinas  secretados  em  resposta  ao  antígeno.  Os  antígenos  podem  tomar  a forma  de  qualquer  substância  estranha,  como  bactérias,  fungos,  vírus,  protozoários,  parasitos  e  agentes  não microbianos, assim como pólen de plantas, veneno de insetos e órgãos transplantados.

Compreenda

Sistema complemento

O sistema complemento fornece um dos principais mecanismos efetores tanto da imunidade humoral quanto da inata. O sistema consiste em

um grupo de proteínas (proteínas do complemento C1-C9) normalmente encontradas no plasma na forma inativa. A ativação do sistema

complemento é um processo altamente regulado envolvendo a quebra sequencial das proteínas do complemento para produzir uma cascata

de produtos de clivagem capazes de atividade enzimática proteolítica. Isto possibilita uma ampli䌧뺊cação porque cada molécula ativada em

uma etapa do processo pode produzir diversas moléculas de enzimas ativadas na etapa seguinte. A ativação do complemento é inibida por

proteínas em células hospedeiras normais; assim, sua ação 䌧뺊ca limitada aos micróbios e outros antígenos que não apresentam estas proteínas

inibidoras.

As reações do sistema complemento podem ser divididas em três fases: (1) fase inicial de ativação; (2) fase inicial da resposta in䌲Ꮯamatória

e (3) fase tardia de ataque à membrana.

Fase inicial de ativação Existem três vias para o reconhecimento de micróbios e a ativação do sistema complemento: (1) via alternativa, que é ativada na superfície de

células microbianas na ausência do anticorpo e é um componente da imunidade inata; (2) via clássica, que é ativada por determinados tipos de

anticorpos ligados ao antígeno e faz parte da imunidade humoral e (3) via da lectina, que é ativada por uma lectina plasmática que se liga à

manose nas células de micróbios e ativa a via clássica do sistema na ausência do anticorpo.

Fase inicial da resposta inflamatória O componente principal do sistema complemento para as três vias é a ativação da proteína C3 do complemento e sua clivagem enzimática em

um fragmento maior conhecido como C3b e um fragmento menor conhecido como C3a O fragmento menor 3a estimula a in䌲Ꮯamação, atuando

como quimioatrator para neutró䌧뺊los. O fragmento maior 3b se liga ao micróbio e age como opsonina para a fagocitose. Ele também funciona

como enzima para clivar a proteína C5 em dois componentes: um fragmento C5a, que produz vasodilatação e aumento da permeabilidade

vascular, e um fragmento C5b, que conduz à fase tardia da resposta de ataque à membrana.

Fase tardia de ataque à membrana Na resposta de fase tardia, C3b se liga a outras proteínas do complemento para formar uma enzima que cliva C5, produzindo os fragmentos C5a

e C5b. O fragmento C5a estimula o in䌲Ꮯuxo de neutró䌧뺊los e a fase vascular da in䌲Ꮯamação aguda. O fragmento C5b, que permanece ligado ao

micróbio, inicia a formação de um complexo de proteínas do complemento C6, C7, C8 e C9 para formar um complexo proteico de ataque à

membrana, ou poro, que possibilita a entrada de líquidos e íons, que provocam a lise celular.

Os antígenos têm locais imunologicamente ativos denominados determinantes antigênicos ou epítopos. Estes são componentes  distintos  e  menores  do  antígeno  com  formato  molecular  original  que  pode  ser  reconhecido  por  um receptor  Ig  específico  e  se  ligar  a  ele;  são  encontrados  na  superfície  de  linfócitos  ou  em  um  local  de  ligação  ao antígeno  de  um  anticorpo  secretado  (Figura  13.4).  Não  é  incomum  que  um  único  antígeno  tenha  vários determinantes  antigênicos  e,  portanto,  seja  capaz  de  estimular  linfócitos  T  e  B  diferentes.  Por  exemplo,  as diferentes proteínas que formam o vírus da gripe podem funcionar como antígenos específicos (antígeno A, B, C, H e N), cada um contendo vários determinantes antigênicos. São encontradas centenas de determinantes antigênicos em estruturas como a parede celular bacteriana.

Figura  13.4  •  Múltiplos  epítopos  em  um  complexo  antigênico  sendo  reconhecidos  por  seus  respectivos  anticorpos (A, B, C).

Moléculas  de  baixo  peso  molecular  (
Fisiopatologia Porth 9Ed.1

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