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IMPERFEITO ANDRESSA FÉLIX Copyright © 2020 ANDRESSA FÉLIX Capa: E.S DESIGN Diagramação: Thainá Brandão – Monte Casillas Design Editorial Revisão: Edna Pacheco 1.
Romance Contemporâneo 2.
Literatura Brasileira
Edição digital. Criado no Brasil. 1ª edição / 2020. Esta obra segue as Regras ao Novo Acordo Ortográfico REGISTRADA E PATENTEADA NO REGISTRO DE OBRAS ________________________ Todos os direitos reservados Está é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos, são produtos de imaginação do autor. Qualquer semelhança com nomes datas e acontecimentos reais é mera coincidência. São proibidos o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios — tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da autora. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido pela lei nº 9.610./98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
“Do sofrimento emergiram os espíritos mais fortes, as personalidades mais sólidas estão marcadas com cicatrizes”. Khalil Gibran
Quando se cresce no meio do desamor, do descaso, tendo que ser responsável não só por você, mas também pela vida de alguém faz você amadurecer a força. E foi isso o que aconteceu... Mãe omissa, sem coração e tão má quanto o monstro com o qual era casada. Uma mãe que vê o filho ser espancado, tocado e ainda achar graça, não deveria ser chamada de mãe. Não me arrependo de nada pelo que passei, porque isso manteve a pessoa que eu mais amo no mundo salva. Foi pela minha irmã que me mantive são, seu amor me manteve em pé mesmo querendo morrer várias vezes. E eu passaria por tudo novamente só para mantê-la segura. Quem me vê de fora, acha que eu sou perfeito por ter uma família linda e unida, por trabalhar no que eu amo, por ser inteligente. Eu sorrio e até
mesmo brinco com aqueles que me são próximos, porém, eles estão longe, muito longe da verdade. Eu sou uma farsa. Sou um homem imperfeito que aperfeiçoou ao longo dos anos a arte de esconder as coisas através de um sorriso. São poucos que realmente me conhecem, que sabem quem eu sou e o que eu carrego dentro de mim. Tudo o que eu queria era poder esquecer, entretanto o meu passado me assombra todos os dias e isso é desgastante. Todos me desejam boa sorte, alegria e que eu seja feliz. Eu só desejo ser diferente, seguir em frente, ter uma vida em paz... uma vida tranquila... uma vida minha. Uma Vida para chamar de minha. Meu nome? Júlio César D'Ávila Reed e, essa é a minha história.
Dez anos antes... Meus pais saíram em lua de mel, eu e minha irmã e eu ficamos na fazenda e segunda nós vamos para a casa da tia Baby, pois Maria vai para a escola e eu para a faculdade. Minha vida mudou muito desde que fui salvo do pesadelo no qual vivia. Não que o que vivi não me assombre, porque isso acontece todos os dias ao adormecer e é algo com que eu tenho que lidar pelo resto da vida. A diferença é que hoje tenho uma base familiar maravilhosa e sei que vão estar ao meu lado todos os dias da minha vida, principalmente meu pai. O senhor Gael D’Ávila, mais conhecido como Ursão, é o meu porto seguro, minha bússola em meio ao naufrágio dos meus pesadelos. Ele é o único que sabe tudo o que passei e quem eu deixo que me veja no meu pior momento, quando estou frágil e querendo morrer. Eu sei o que é carregar essa carga e, posso imaginar o que ele deve ter sentido quando eu, enfim, desabafei anos de abusos para ele.
Meu pai se fez de forte na minha frente e eu agradeço por isso, mas pude ver em seus olhos o mesmo que sinto dentro de mim. Devastação, dor e muito sofrimento, tudo isso por mim. Jamais na minha vida imaginei ter pessoas me protegendo e sentindo a dor que eu sinto, mas agora eu tenho e não somente uma pessoa e sim uma família inteira. Os Reed me adotaram no momento em que entrei em sua casa, abraçaram um estranho e juraram me proteger e cuidar de mim a qualquer custo e eles cumprem isso todos os dias. Quando minha mãe foi atropelada por aquele maluco, foi a primeira vez que rezei e fiz um pedido a Deus, depois de anos sem acreditar Nele. Já no sequestro e, diante da possibilidade de perdê-la, eu clamei mais uma vez a Ele, implorando para não fosse tirada de mim a única mãe que eu tinha e que me amava com todas as forças. Desde então, sempre rezo na hora de dormir, não para pedir alguma coisa ou para que os monstros da minha cabeça sejam afastados. Não! Eu rezo para agradecer tudo de bom que acontece na minha vida. Quando eu peço algo nunca é para mim e sim para as pessoas que me rodeiam. Peço pelos meus pais, avós, tios, pelas crianças e, ultimamente, tenho pedido muito pela dona Cidinha, uma mulher maravilhosa que sofre com uma doença maldita e que eu sei que logo irá nos abandonar deixando um rastro de dor e saudades. Mas como ela mesma me diz: A vida é um ciclo onde nascemos, crescemos e morremos, por isso temos que viver a vida como se fosse o último dia de nossas vidas. Que devemos gozar de cada coisa que o mundo nos oferece, e jamais devemos deixar o passado nublar o nosso futuro.
Eu levarei essas palavras comigo para sempre, mesmo que demore um pouco para colocar em prática. Um barulho chama a minha atenção para a porta e quando ela se abre, vejo a Luna entrando no meu quarto arrastando seu cobertor de fadinha e seu travesseiro. — Vou dormi aqui com você Juju. —Ela diz e sobe na minha cama, preparando o seu cantinho. — Meu Ursão falou que eu tenho que cuida de você e da minha Malia. — Ele pediu, não é? —Pergunto e ela sorri. — Lógico que pediu, eu sou a cuidadora de amô sabia? Eu cuidei da minha mamãe, do meu vovô Dodô e cuido da minha Malia. Você tá com fome Juju? Eu to com muitão de fome da vida toda. — Acho que estou, vamos até a cozinha ver se ainda tem bolo? — É muito ursinho da minha tia pincesa mesmo! Vamos logo, mas vai te que me dá o creminho de cobertura do seu bolo, ok? — Muito ok da vida toda! Vamos para a cozinha, entretanto, antes dou uma olhada na minha ursinha e vejo que ela está completamente apagada. Meu vô Will está na sala assistindo televisão e sorri quando nos vê correndo para cozinha. A casa está no mais absoluto silencio que só é quebrado com a falação da fadinha. Depois de comer o bendito bolo, eu a levo para escovar os dentes e nos acomodamos na cama. Coloco a música com o barulho das ondas, uma técnica que a minha psicóloga ensinou para que eu consiga pegar no sono. Luna fica quietinha e quando penso que ela dormindo, a loirinha se vira para mim e segura meu rosto. — Juju, um pipinho da tisteza já tá indo embora, mas ainda
falta um montão. Maisi o meu amigão falou que você vai ser muitão feliz da vida toda e o meu amigão não mente. — Acho meio impossível isso loirinha, essa tristeza faz parte de mim. — Não faz não, ai, ai, ai, que não pode ser obtuso não, Papai do Céu não gosta disso. Vai ser feliz sim porque euzinha, de excelência, vou ajudar! Nem tenho estutula nessa vida com esse ursinho da minha tia. —Ela diz batendo na testa e vejo que o drama do tio vidinha está passando para ela. — Tudo bem fadinha sem estrutura, agora vamos dormir que amanhã você tem muita coisa para aprontar. — Tá, maisi tem que reza para o Papai do Céu Juju. —Ela fala me olhando feio. — Você coloca a mãozinha assim para rezar e pedir obrigadinho para Ele. Eu vou te ensinar, ok? Tem que ser muito ok da vida toda. — Tudo bem, você começa e depois eu agradeço. —Falo cruzando as mãos como ela acabou de mostrar. — Oi Papai do Céu, ta com saudade de euzinha? Eu to com muitão de saudade do meu amigão obtuso. O meu Juju ta aqui comigo, vou dormir com ele porque euzinha tenho que cuidar dele para o meu Ursão. Sabia que um pipinho de tisteza dele já foi embora? Maisi ainda tem um montão e não pode ter, não é? Então pode cuidando dele e da minha Malia também. A minha família é feliz, todo mundo ama todo mundo, eu ganhei meu cavalinho, é uma menina e tem até lacinho rosa, sabia? O Valentin o pestinha da minha mãe, ela que disse isso e nem sei por que, ele é tão pinceso da minha vidinha. Acho que a minha mamãe tá ficando doidinha viu, nem tem estutula essa dona mamãe. —Ela começa a falar e eu rio baixinho.
— Olha que bonitinho, o meu Juju ta rindo e é a coisinha maisi linda da vida toda! Ele nem é maisi obtuso, só um pipinho ele é! Agora reza para o Papai do Céu Juju! —Ela pede e senta olhando para mim. — Ok. Pai nosso que estás no céu, santificado seja o vosso nome... — Tá errado Juju! Tem que conversar com ele ursinho. Ele é nosso amigo sabia, ele gosta de fofocar, então fofoca logo senão ele fica tiste. — Eu não sei fazer isso Luna. — Sabe sim, vai logo que eu to ficando com soninho e você tem que fazer carinho no meu cabelinho de solzinho. Sabia que o Igor ama o meu cabelinho? Ele disse que é o maisi lindo da vida toda. Me ama muitão esse Igor né? — Deixa só o seu pai escutar isso! —Falo rindo. — Agora deita aqui ao meu lado, vou fazer carinho no seu cabelo enquanto converso com o seu amigão. — Tá. —Ela se acomoda ao meu lado, puxa o cobertor sobre o corpo e deita de lado enquanto acaricio seus cabelos. — Oi amigão da fadinha, tudo bem? Quero agradecer por todas as coisas boas que estão acontecendo na minha vida. Obrigado por essa família maravilhosa que o Senhor me deu e por colocar essa menininha faladeira na vida da minha irmã. Não tenho nada para pedir para mim, mas peço que o Senhor cuide e abençoe todas as pessoas que amo e principalmente que proteja essas duas meninas lindas que eu amo muito. Amém. — Tão lindinho esse ursinho da minha tia. —Luna diz sonolenta. — Pede um amô para ele Juju, Ele vai te dar porque você é
um menino bonzinho. Eu pedi para o papai Noel um amor para você, eu e a minha Malia pedimos, sabia? Aí ele vai conversar com o Papai do Céu, igual Ele fez com o meu papai e o meu vidinha é meu duas vezes. — Eu não preciso de um amor, loirinha, estou bem só tendo vocês na minha vida. Isso já me basta e sou feliz. — Pecisa sim! Olha amigão, tem que dá um amô para o meu Juju, para ele ficar feliz da vida toda. Um amô bem lindo, uma que gosta de dá risada e bincar de boneca e que goste de rosa, porque é muito chique gostar de rosa sabia? Ela tem que amar muitão o meu Juju, igual a minha mãe ama o meu vidinha e depois que o amô chegar você pode dá um monte de filhinhos para eles. Aí o meu Juju vai ser muitão feliz com a vida dele. Amém! Ponto ursinho, eu já pedi um amô para você. — Ok! Agora, vamos dormir; loirinha faladeira. — Vamos ursinho obtuso do meu ursão. — Boa noite fadinha. — Boa noite Juju. Você vai ser muitão feliz da vida toda, aquedita? Vai tê um amô bem colorido, vai ama muitão e seu olhinho vai bilhar muito de felicidade. Mas não pode ser obtuso de excelência, tem que ama muito a sua vida ok? — Muito ok da vida toda, agora dorme. — Amo você Juju. —Ela diz quase dormindo. — Também amo você fadinha. Não acredito que um dia serei capaz de encontrar uma pessoa que me ame do jeito que eu sou, com todas as minhas imperfeições, mas quem sabe o amigão da Luna não escute o seu pedido e eu passe a amar a vida? E, se não acontecer, seguirei existindo apenas para
cuidar da minha família, pois isso já e satisfaz e muito.
Olho para o meu apartamento e vejo todas as pessoas, que amo, reunidas a minha volta. Hoje é meu aniversário e lógico que a minha mãe, não deixaria passar batido. Até agora ainda acho engraçado chamá-la de mãe. A diferença de idade entre nós é muito pouca, oito ou nove anos, eu acho. Mas ela fez questão de ser chamada assim logo depois que os papéis de adoção ficaram prontos, porém só consegui mesmo depois que quase a perdi. Quando eu poderia imaginar que uma menina tão nova, na flor da idade, assumiria uma responsabilidade tão grande? Nunca me passou pela cabeça que eu estaria sendo adotado junto com a minha irmãzinha. No início, ao nos conhecemos, foi difícil aceitar que eu não precisava mais me preocupar com a Maria. Que tínhamos pessoas que cuidariam de nós, que nos protegeriam. Demorei a entender, na verdade só fui entender realmente, quando a Yza me viu lavando as roupas da minha irmã e as minhas, nas mãos. Ela
surtou, chorou, disse que eu a odiava e que não a queria como mãe. Lógico que depois descobri que, o que ela fez foi um teatro, para me fazer sentir em casa, entretanto, no início, eu realmente fiquei preocupado, já que o marido dela era enorme e tinha a cara de bravo. Nós conversamos e eu tentei explicar o que estava fazendo. Eu não queria que eles deixassem de amar a minha menina só porque ela dava trabalho. Não queria que eles se cansassem e nos mandassem embora, ou para um abrigo. Então eu cuidava das coisas da minha irmã, fazia comida, lavava a louça e com o dinheirinho que eu ganhava para ajudar o Tavinho, eu comprava as coisas para a Maria. Eu não sabia ser diferente, pois eu sempre cuidei dela. Depois o Gael, que agora é meu pai, me explicou que eu e Maria éramos um pacote só e que o amor deles não era só para Maria, mas para mim também. E foi depois de uma conversa de horas, após ver que realmente eles diziam a verdade, eu passei a acreditar e me permitir ser mais tranquilo em relação a minha irmã. Otávio e o Roberto, me salvaram do monstro e da vida que eu vivia, mas os meus pais? Eles me salvaram de inúmeras maneiras, me salvaram do inferno que eu vivia dentro da minha cabeça. Gael me deu muito mais que uma casa, cama quente e comida boa. Ele e a minha mãe me deram uma nova vida, me colocaram no caminho certo e me ajudaram a conviver com o monstro dentro da minha cabeça. — Ei garoto, aqui. — Meu pai me entrega uma cerveja. — Vamos comemorar o seu aniversário bebendo uma cerveja juntos. Desculpe, eu sei que você não gosta de comemorar o seu aniversário, mas a sua mãe é impossível quando coloca uma coisa na cabeça. — Eu não ligo pai, sei que ela faz com boa intenção. Depois de dez
anos aprendemos a aceitar o que a dona Yza Reed quer. —Falo rindo e tomo um gole da minha cerveja. — Realmente, ou nós aprendemos ou aprendemos. Não dá para ser diferente, ou ela tornará as nossas vidas um inferno. Agora me diz; como estão as coisas no trabalho? —Ele pergunta. Se ele tivesse me perguntado isso a uma semana atrás, eu diria que estava tudo bem, entretanto, depois que um tornado apareceu, meus dias tranquilos se transformaram em pesadelos. — Estava tudo tranquilo até uns dias atrás, porém o Otávio contratou a porra da menina mais irritante do mundo. Ela fala mais que a boca, vive sorrindo e feliz. Até mesmo de manhã cedo. Agora me diz; quem acorda feliz às sete horas da manhã? Pai, a mulher dá bom dia até para as moscas na sala! A garota é insuportável e fez sua missão na terra, me fazer rir. Diz ela que sou muito fechado, e que morrerei antes dos trinta ou quebrarei alguns dentes. Ela parece a Luna quando era pequena, emenda um assunto no outro e ri das suas próprias piadas. É uma bola de energia fumegante e tem a mania de colocar apelido em todos, até mesmo em mim. Rabugento! De onde ela tirou isso? Essa garota desperta o meu pior lado e me deixa confuso de tantas maneiras. —Hum... Interessante. E o que ela faz lá? É arquiteta também? — Deus me livre, aquela lá não é capaz de construir nada pai, é mais atrapalhada que tudo! Ela é decoradora, e o Tavinho achou uma boa ideia contratá-la! Aposto que ela deve ter insistido a vida toda, como dizia a fadinha. Mas vamos mudar de assunto, por falar em fadinha, onde ela e a Maria estão? —Pergunto mudando de assunto. — Elas foram buscar o bolo na delicatessen aqui da rua. — Sozinhas? —Pergunto já começando a ficar nervoso. Essas duas são as meninas mais lindas que existem. Maria vai fazer
dezesseis anos e a Luna quatorze. Vivem cheias de sorrisinhos e segredinhos pelos cantos. Uma vez um projeto de idiota veio pedi-la em namoro, quase levando o meu pai ao infarto de tão nervoso que ele ficou. — Lógico que não! Seu tio Don foi com elas. Agora com esse negócio de abrigo de cães da Luna, elas estão se achando adultas! Não sei o que aquele Douglas estava pensando. —Meu pai diz bravo. Sim... O Douglas é literalmente da família, casou com a minha vó Marta há oito anos, mas meu pai sempre irá implicar com ele. Desde que casou, a sua antiga casa estava fechada. Ele a comprou logo depois que se recuperou do acidente e começou a namorar a vovó e, há exatamente cinco meses, deu a casa para que a Luna pudesse montar o abrigo de animais e mais para frente sua clínica veterinária. Se ela não mudar de ideia né! Lógico que é tudo supervisionado por todos da família, e isso atrai muitos meninos metido a besta que dizem quererem ajudar. De repente uma confusão acontece na porta, e Luna entra vermelha de raiva com um Valentin igualmente irritado. Meu tio Don e a minha Maria entram na sala rindo. Valentin vai diretamente para perto do pai, e planta os dois pés separados e cruza os braços fazendo cara de mau. — O que foi filhão? Porque está nervoso? —Meu tio Dylan pergunta. — Não dá não pai! Acho que você precisa trancar a Luna no orfanato. —Valentin diz bravo. — O quê? Que história é essa Valentin Reed? —Tia Baby exclama revoltada. — É culpa sua mamãe! Fica comprando essas roupas curtas e agora todos os meninos ficam mexendo com ela. Cadê meu tio Gael? —Valentin pergunta olhando pela sala até achar o meu pai. Todos olham o menino atravessar a sala e ficar frente a frente com o meu pai.
— O que foi dessa vez Valentin? —Meu pai pergunta todo calmo. — Eu bati no menino que foi beijar a minha Maria, então eu te ajudei e o senhor tem que me tirar da cadeia! Eu bati nele e chutei o amigo dele que estava mexendo no cabelo da minha irmã. Eu não posso ir preso não, sabe? Se eu for, quem vai tomar conta delas? O Vicente é um banana, não bate em ninguém! —Valentin diz bravo. — Beijou a Maria? Maria Júlia Reed pode vir aqui agora e me explicar direitinho essa merda! —Meu pai grita pela minha irmã, que está se escondendo atrás da mamãe. — Ursão... —Minha irmã tenta falar, mas o meu pai a corta. — Quem tentou beijar você? Que intimidade é essa? —Papai quase grita tamanha sua raiva. — Paizinho... é mentira do Valentin! O Rick estava me cumprimentando com um beijo no rosto. —Ela diz, baixinho e eu a puxo para o meu colo. — Ursinha, o que já falamos sobre isso? Nada de meninos, de beijos e abraços. — Mas ele é meu amigo Júlio, amigos se cumprimentam assim. O Valentin é um fofoqueiro. —Está de castigo até os trinta anos, sem celular, sem passeio no Shopping, sem internet e sem mesada! —Meu pai diz bravo. — Será que não tem um homem normal nessa família? Ela não vai ficar de castigo Gael D'Ávila. Ela não fez nada demais! Pelo amor de Deus, a menina tem quinze anos e é normal ela ter amizade com meninos. —Minha vó Belle entra na briga. — Belle... — Belle nada! Isso já está ficando ridículo, quer transformar a menina em uma carola sendo que ela não é! E você Valentin, sabia que é feio fazer
fofoca? — Não é fofoca não vó! Eu estava relatando o acontecimento, estava passando informações para o meu tio. É assim que os homens têm que fazer. —Valentin diz sério e tudo o que eu quero é rir. Meu avô Will e meu tio Don acalmam os ânimos de todos. Tia Katrisca pega o Valentin pela orelha e fala um monte, tio Dylan tenta remediar, mas sem sucesso. Minha mãe chama o meu pai para ajudá-la em alguma coisa e ficámos Maria e eu sentados no sofá. — Ursinha... — Não Juju, eu não fiz nada demais. Eu sei que sou nova para namorar e nem gosto dos meninos da minha sala. Eles são muito novos e muito bobos. Rick é apenas meu amigo, assim como os outros meninos, só isso. — Mesmo assim, você é muito linda e os meninos ficam doidinhos. Tem que estudar, se formar e só então pensar em namorar. — Isso se chama hipocrisia, você sabia? Eu vou fazer dezesseis anos, todas as meninas da minha idade já namoram. Mas você e o papai me tratam como bebê e, eu não sou! Vocês agem como se eu fosse casar, fugir com alguém. Os meninos são muito novos para o meu gosto, só falam besteira. — A senhorita está tentando dizer que gosta de meninos mais velhos, Maria Júlia Reed? —Pergunto preocupado e ela revira os olhos. — Você é um saco, não é? Não tenho estrutura de mentalidade não! Sabia que você tem outras irmãs? Vai encher o saco delas vai! —Ela diz revoltada e sai do meu colo. — Quando vocês vão parar de tratar as meninas como bebês? — Vicente pergunta sentando ao meu lado. — O Valentin é um idiota possessivo, elas não estavam fazendo nada demais. E eu não sou um banana, só gosto de deixá-las quietas com as coisas delas. Lógico que se alguém as
machucar ou magoar eu irei me meter, mas fora isso fico na minha. Vicente é tão diferente do irmão, não apenas na aparência, mas no jeito também. Vicente ama ler, jogar videogame ou ouvir música. Já Valentin não consegue ficar parado um minuto, nem dormindo ele é tranquilo. Ainda mais se a Dominique estiver por perto. — Acho que você é um velho que possuiu o corpo de um menino! — Me aproximo do seu rosto e arregalo seus olhos com meus dedos. — Ei ancião! Saia desse corpo que não te pertence. — Você é tão infantil! —Ele diz rindo. — E você é maduro demais para o meu gosto. Onde está a sua sombra? Se a Mini é a parceira de crime do Valentin, a Olívia é à sombra do Vicente. Não existe um lugar que os dois estejam que não estão grudados. — A Olí fez o tio Tavinho ir buscar o controle dela. Nós vamos fazer uma maratona de games hoje, quer jogar? — Hoje não dá pouca sombra. Amanhã tenho compromisso cedo, mas que tal no sábado? — Pode ser. Agora vou ali salvar meu pai de um surto e a Luna do convento. —Ele diz rindo e vai socorrer a irmã. Fico olhando todos interagirem, cada um com a sua loucura. Quando todos se reúnem é uma bagunça total, todos falam ao mesmo tempo, meu pai e o tio Dylan fazem seus dramas básicos. Lila e Otávio se provocam o dia todo e minha vó Belle protagoniza as melhores bagunças e loucuras. Eu amo essa família e sou grato por tudo o que eles fizeram por mim. Meu celular apita e eu vou ver quem me mandou mensagem. Feliz aniversário rabugento. Beijos Vida! Essa menina é desconcertante! — Quem foi que deixou esse olhar em seu rosto? —Minha mãe
pergunta sentando ao meu lado. — A nova decoradora. Ela lembra a você, maluca e não consegue parar de falar. A missão dela é me enlouquecer e, ainda tem um problema sério com o meu sorriso. —Ah, você está falando da Vida. Ouvi dizer que ela é linda, o que você me diz? —Ela pergunta curiosa. — Ela realmente é linda...quando está calada, ou seja, nunca! Ela me enlouquece, as vezes tenho que me trancar na minha sala. Isso dona Yza, é desconcertante. Nunca ninguém me fez sentir assim, perdido e com raiva ao mesmo tempo. —Hum... Interessante. Você não quer voltar para casa? Sinto falta dos meus bebês em casa. —Ela diz mudando de assunto. — Mãe... — Eu sei, eu sei, eu sei. Não custa nada tentar. Você é um chato! Porque tinha que ser tão certinho? Fui colocar suas roupas para lavar e não tinha uma cueca suja, isso é revoltante. Até a geladeira está abastecida. Eu moro sozinho há quatro anos e ela ainda não se acostumou. Meu avô me deu um apartamento e ela ajudou a decorar, mas ainda assim não aceita que já sou um adulto. Ela chorou uma semana quando me mudei e até dormiu aqui no primeiro mês. — O que posso dizer? Sou um menino crescido e muito responsável. Desencana mãe, semana que vem eu deixo umas roupas para você lavar, OK? Cantamos parabéns, comemos bolo e depois pedimos pizza. Amo estar rodeado da minha família, entretanto quando eles vão embora tenho o silêncio que tanto amo e, junto com o silêncio vem o vazio e é dele que não gosto. Tomo um banho e me deito, respondo algumas mensagens dos colegas de trabalho que me mandaram felicitações, ligo a TV, coloco em uma
série e logo adormeço. Mas como sempre, meu sono não dura muito já que meus pesadelos aparecem. Mesmo que aquele monstro tenha morrido há anos, ele ainda permanece vivo na minha cabeça. Têm coisas que nunca contei para ninguém, quer dizer, só uma pessoa sabe e carrega comigo o peso do meu passado. Pretendo levar comigo para o caixão quando morrer. Esse homem fodeu a minha vida, me tirou toda e qualquer dignidade. Se não consigo seguir a vida e, ser um homem normal é graças aquele desgraçado. Levanto da cama pingando de suor e corro para o banheiro. Ligo o chuveiro no máximo e com a esponja de banho e tento lavar toda a sujeira que o pesadelo trouxe de volta. Eu só queria que essa merda parasse! Só queria ser um cara normal, mas graças a ele não posso. Já sai com algumas mulheres na época da faculdade, já beijei minha cota de bocas, mas nunca consegui namorar, nunca consegui dormir com uma mulher na mesma cama e nem cheguei perto de fazer sexo. Antes que perguntem, eu não sou virgem a muito tempo e perdi da pior forma possível. Esse é mais um segredo que levarei comigo para o túmulo. Me troco, pego uma muda de roupa para ir trabalhar e vou para a casa dos meus pais. De vez em quando faço isso quando não consigo dormir sozinho e a solidão se torna demais, vou para a casa dos meus pais e durmo no meu antigo quarto. Quando chego, tento não fazer barulho ao entrar. Deixo minhas chaves no aparador e vou para o meu quarto. Mamãe sempre deixa minha cama feita, ela sabe que a qualquer momento posso vir para dormir. Largo a mochila aos pés da cama e me deito. Em poucos minutos adormeço e só acordo com o dia claro. Se minha irmã não entra no quarto, eu poderia muito bem me atrasar para o trabalho. — Bom dia Juju! —Maria diz se acomodando na cama ao meu lado.
— Bom dia meu amor. Você tem aula hoje? — Sim, mas só depois das dez. Aula de educação física. E depois tenho consulta no oftalmologista, estou tendo dificuldades para enxergar de longe. — Então vai se arrumar que eu te levarei para escola hoje. — Adoro quando você me leva! Não gosto muito quando o papai me leva, as meninas ficam loucas. Falam que ele é lindo, que é forte e que gostariam de ver ele sem camisa! Eca. —Ela faz uma careta e eu acabo rindo. — Não deixa a mamãe ouvir isso, ou é bem capaz dela deixar suas amigas carecas. — E eu não sei! —Ela me beija e sai correndo se arrumar. Eu me levanto, tomo um banho e me arrumo para ir trabalhar. Quando saio do quarto, já consigo ouvir a loucura da dona Yza. — Nana, tem aquela torrada que o Júlio gosta? Tem! Ai que bom, vou fazer o ovo mexido que ele ama. Gael vai apressar a Gaia ou ela vai chegar atrasada de novo. E eu juro que se me ligarem mais uma vez da escola, eu vou colocar essa menina no colégio interno. — Mãe! —Ouço a minha irmã protestar. — Ah já está pronta? Que bom. Seu pai já viu sua cara hoje? Não, então eu acho melhor você lavar esse rosto. Eu juro por Deus, você ainda vai acabar matando meu marido menina! —Minha mãe diz. — Oi Juju! A mamãe está surtada hoje, então nada de dizer que não vai tomar café. —Gaia passa por mim e me beija antes de ir lavar o rosto. — Acho que vou te levar para escola também, quero saber por que você está indo para a escola, toda pintada. — Não começa Júlio D’Ávila! —Ela resmunga. — Já não basta meu pai, agora o mini urso. Entro na sala e meu pai está sentado vendo televisão.
— Bom dia! — Bom dia filho, por que não me surpreendo por te ver em casa hoje? —Ele pergunta curioso. — Noite difícil, não quis ficar sozinho. — Quer conversar? —Ele pergunta. É isso que eu gosto nele. Meu pai não me pressiona para contar, ele sempre me pergunta se eu quero. Ele é o único que sabe de tudo o que aconteceu, e quando eu digo tudo é TUDO mesmo. — É a mesma coisa de sempre. Nada que o senhor deva se preocupar. Não vai trabalhar hoje? — Não, Alicia tem médico hoje e sua mãe tem uma reunião importante. Depois a Maria tem oftalmo, então meu dia é todo delas. — Que horas é o médico da Maria? Falei para ela que poderia levá-la. — Depois do almoço. — Então eu pego ela na escola, almoçamos fora e eu a levo. Não tenho nada importante hoje, então minha tarde é livre. — Tudo bem, ela vai gostar de passar um tempo com você. — O café está pronto! —Minha mãe grita. — Acho melhor a gente ir, ou ela vai surtar. Me fez sair cedo para comprar as coisas que você gosta. Acho que vou passar uma temporada com você, só para ver se tenho o mesmo tratamento VIP. Sentamos todos à mesa, e a bagunça me conforta. Senti saudades disso, as vezes é ruim morar sozinho, perco toda a diversão. As meninas estão crescendo muito rápido, daqui apouco cada uma seguirá sua vida e, elas não vão querer mais saber do irmão. É... Estou me tornando um dramático. Acho que deve ser mal de família.
No relógio marca três e vinte dois da madrugada... Gritos, muitos gritos. Gritos aterrorizantes, gritos de pavor e ouço a voz dela clamando por misericórdia. Tiros, muitos tiros e então o silêncio. Os gritos foram silenciados pelos disparos de uma arma de fogo, talvez duas, não sei dizer ao certo. Minha vontade é de gritar, mas nada sai da minha boca. O medo me paralisa tanto, que chego a desconfiar se estou respirando realmente. Ouço passos e sinto que estão vindo atrás de mim. Eu vou morrer sem ao menos saber o motivo! Meu Deus, não deixe que me machuquem. Proteja a minha família. Quando faltava pouco para chegarem onde eu estava escondida, os passos param e então escuto duas vozes. — Tem certeza que a garota não está aqui? —A voz de homem pergunta. — Ela não vem para casa em dias de semana, pois divide o
apartamento com uma colega da faculdade. Ela só vem aos finais de semana. —Uma mulher diz e eu reconheço sua voz. É a secretária da minha mãe. — Realmente, só tinha a puta da Juíza, o corno do marido e os dois filhos. Não podemos deixar pistas, entendeu? — É claro que eu entendi! Quem te arrumou esse serviço? Acha que foi fácil olhar para cara daquela mulher todos os dia, sabendo que ela poderia foder com a vida da minha família? O serviço está feito, vamos fazer uma geral e ir embora daqui. Na certa o barulho, dos tiros, chamou a atenção de algum vizinho. —A mulher diz nervosa. Horas depois eu crio coragem e levanto do chão e entrei na casa. Tudo estava revirado, os corpos dos meus pais estavam na sala, o rosto da minha mãe estava virado para o corredor. Perdi meu chão naquela hora! Não tive coragem de ir aos quartos, não conseguia ver os corpos dos meus irmãos. Um grito forte sai rasgando minha garganta. Dor, medo, solidão, revolta, ódio! Tudo acaba saindo no grito. — SOCORRO! —Grito deixando o todo o sofrimento sair rasgando tudo. Acordo com a garganta irritada de tanto gritar. Quase todas as noites são assim. Já se passou sete anos e ainda tenho o mesmo pesadelo. Fiz acompanhamento psicológico, tomei medicação, mas nada faz com que eu durma direito. Minha vida, o meu mundo acabou naquela noite. Não existe nada capaz de aplacar o sofrimento que aquela noite me causou. Perdi tudo o que mais amava, do dia para a noite, tudo ruiu quando me vi sozinha. Não era para eu estar em casa naquele dia, só aconteceu porque meu irmão caçula estava doente e carente da minha presença. Não era para eu ter levantado da cama naquela noite, mas como meu
irmão tinha que tomar o remédio, eu fui buscar água e, tendo derramado água no chão, me dirigi até a área de serviço buscar um pano para secar a lambança e foi isso o que me salvou. Foi por ser desastrada, que hoje eu estou viva. Milagre ou maldição? Olho para o relógio e são exatamente três e vinte duas da manhã. O mesmo horário sempre. Como eu já sei que não vou consegui dormir, vou para o banheiro e encho a banheira. Jogo uns sais de banho e olho, hipnotizada, para as bolhas que vão se formando. Coloco um mantra no celular, tiro meu pijama e entro na banheira. Fecho meu olhos e deixo meu corpo relaxar aos poucos. Pratico a respiração da YOGA e deixo minha mente absorver a paz que o mantra tenta passar. O corpo relaxa, mas a mente continua trabalhando a todo vapor. Minha vida virou de cabeça para baixo. Polícia, testemunhos, ameaças, processos, audiências, enfim... foi um verdadeiro inferno, dias de pesadelos que cheguei a desejar que tivesse morrido junto com eles. Uma rede de televisão foi processada por mostrar imagens dos corpos dos meus irmãos, e meu advogado conseguiu uma indenização de mais de um milhão de reais. Tive todo suporte jurídico, amigos e colegas da minha mãe ficaram ao meu lado a cada audiência e fizeram questão que todos os culpados pagassem pelo crime. Demorou dois longos anos, mas todos os culpados foram presos. Meu padrinho, um amigo de infância do meu pai, fez questão de que cada um dos bandidos pagasse pelo crime. Não sei como consegui aguentar tudo sem cair. Não sei de onde veio tanta força, mas eu consegui! Sabe o que é engraçado em situações extremas como essa que eu passei? É na hora do sufoco que conhecemos quem são as pessoas que estão ao nosso redor. Meus familiares me viraram as costas, ninguém queria ficar com uma
menina "jurada de morte" em sua casa. Meus amigos se afastaram, minha colega de quarto foi embora, até o meu namorado me deixou. Não vou dizer que não machucou, porque machucou e muito. Me vi sozinha, com apenas dezenove anos de idade. Eu fui fraca... Durante um ano ou mais da minha vida fiz muita merda, tranquei a faculdade, mudei de cidade e passei a beber diariamente. Usei drogas, comecei com a mais simples só para mascarar a minha dor e quando vi estava na pior de todas. Esse foi o jeito de esquecer tudo o que me causava aquela aflição desmedida, quando estava bêbada e drogada não sentia nada, não revivia em minha mente o que aconteceu. Não me sentia culpada por ter sobrevivido. Não precisava trabalhar, já que herdei o dinheiro dos meus pais, o seguro de vida deles e o ganhei o dinheiro do processo contra a o canal famoso de televisão. Eu estava sozinha, em uma cidade estranha, sem amigos, sem família, me escondendo das únicas pessoas que tinha e que se importavam comigo. Meu padrinho e meu tio Sony. Você tem noção de como o ser humano é sujo? Do que eles são capazes de fazer por dinheiro? Pois eu tenho, quando familiares souberam que a "jurada para morrer" tinha herdado vários milhões, até me interditar eles quiseram. Alegaram que eu não era capaz de cuidar de mim mesma, que tinha ficado louca por presenciar a morte dos meus pais. Isso me deu tanto nojo que fugi e me joguei de cabeça no espiral de destruição e foi um sonho que me vez enxergar a merda que eu estava fazendo da minha vida. Nesse sonho, meu irmãozinho pedia para eu reagir, para eu reencontrar o meu caminho. Levi disse que minha história não era aquela, que era tudo uma fase, mas que eu estava entrando num caminho sem volta e era preciso acordar. Não tinha amigos, as pessoas que me rodeavam só
queriam o que eu podia lhes proporcionar, bebidas, baladas e drogas ilimitadas. Então eu acordei! Joguei todas as bebidas fora, busquei ajuda para seguir em frente, me manter limpa e viva novamente. Viva, porque durante um ano me vi perdida, sentindo pena de mim mesma, me amaldiçoando quando Deus tinha me dado uma nova chance. Uma enfermeira me falou, que tudo na vida é provação, que Deus não me deixaria na terra à toa. Que eu tinha um propósito e foi nisso que me apeguei. Se eu tinha um propósito a seguir, então precisava lutar por isso, lutar por merecer. Voltei para a faculdade, me formei em designer de interiores e sigo minha vida sempre com um sorriso no rosto. Eu me reinventei e não me escondo do meu passado. Não. Eu apenas aprendi a lidar com ele e com todo o remorso que existe dentro de mim. Não perco mais meu tempo cultivando raiva, mágoa, nem remoendo o porquê de estar viva. A vida é um sopro, hoje você está bem e amanhã pode não estar. Eu escolhi viver, escolhi me jogar no mar de possibilidades e hoje eu estou em Campinas, uma cidade no interior de São Paulo, onde as pessoas são atenciosas e caridosas. Aonde você vai, no mercadinho e as pessoas te dão bom dia no caminho. Comprei uma casinha numa vila, é mais um condomínio fechado, mas que mais parece uma vila. Há as vizinhas fofoqueiras, o vizinho rabugento e que é um amor, o vizinho que se acha o dono da rua e as senhoras que amam entupir os outros com comidas. Quase todos os dias desde que cheguei, recebo um bolo, uma torta ou um doce caseiro. Sorrio ao me lembrar disso. Saio do banho, visto um roupão e vou para a sala. Ligo a teve e pego minhas coisas para terminar um projeto de uma cliente. Eu trabalho na VALVERDE CONTRUÇÕES há duas semanas, Otávio é um chefe
maravilhoso e sua esposa é um amor. Ele viu um dos meus projetos e me ofereceu um emprego, mas eu teria que me mudar para Campinas. Disse que era algo que os seus clientes já vinham pedindo a algum tempo. Ele viu meus outros trabalhos e ficou empolgado, ouso dizer que ele foi até insistente. Eu agradeci tanto, mais tanto, que estava até se tornando chato. Sou grata porque não é todo mundo que dá uma oportunidade para alguém sem experiência e que acabou de se formar, eu fazia pequenos trabalhos, mas nada do porte da VALVERDE; porém ele me deu uma chance única e eu farei de tudo para agradar a todos e realizar um ótimo trabalho. Lá também o conheci... Júlio D'Ávila. O homem é um deus grego, corpo perfeito, rosto lindo e os olhos... Os olhos foi o que mais me chamou a atenção. Eles escondem uma tristeza tão grande, tão profunda, que todos os dias me pego pensando nele. O cara não dá um sorriso! Isso é inadmissível, um homem daquele porte deve ter um sorriso destruidor. É até um pecado esconder. Eu o chamo de rabugento, porque ele vive de cara fechada e quando estou perto ele vive resmungando. Eu me senti atraída por ele quase que imediatamente, mas só eu senti isso, porque ele não suporta nem ficar perto de mim. Minha missão na terra é fazer esse homem sorrir, não existe nada no mundo que possa arrancar a felicidade de dentro de nós. Olhe o meu caso, passei por uma tragédia, lógico que me perdi no caminho, entretanto hoje estou aqui e amo viver. Acredita que ele se trancou na sala dele, só para não falar comigo? Achei um absurdo! Sou tão legal, alto astral, divertida, conto as melhores piadas e sei as melhores cantadas. Todos na empresa gostam de mim, menos o rabugento. As horas passam e eu preparo um café da manhã completo, com direito a bacon e tudo. Amo comer, amo, porcarias, e que se dane a minha bunda!
Me arrumo para ir trabalhar, pego minha bolsa, a pastas com o projeto e minha enorme e muito rosa brilhante caneca de café e vou para o carro. Passo na padaria e pego alguns pãezinhos de canela para comer no escritório. Vejo uma tortinha de limão e logo me lembrei do rabugento e sua cara feia de quem chupa limão azedo, peço para que a balconista embrulhe uma e, depois de pagar vou para o escritório. Assim que estaciono o carro, vejo a senhora Valverde estacionar com sua filha Olívia. — Bom dia senhora Valverde! Olá Olívia. — Senhora é a puta que pariu! Já te falei para me chamar de Lila, Vida! Bom dia meu bem, amei a sua caneca. —Lila diz sorrindo. — Seu nome é muito diferente, você gosta dele? —Olívia pergunta. — Como não gostar da vida? Ela é linda. —As duas sorriem e entramos na empresa. — Bom dia Lurdinha! — Bom dia menina, como sempre de bom humor. Vamos ver se irá permanecer assim pelo restante do dia. —Ela diz sorrindo. — Agora fiquei curiosa, bom dia Lurdinha. —Lila a cumprimenta também. — Bom dia Lila, oi Olí veio enlouquecer seu pai mais um pouco? — Vim passar o dia com ele, minha mãe tem algumas coisas para fazer e hoje não tenho aula. —Olivia diz. — OK! Vida, o Otávio pediu para você ir direto para a sala dele. — Tudo bem, vou apenas deixar as coisas na cozinha. Trouxe aqueles pães de canela que você adora. — Pode deixar que eu levo os pães, meu bem. Vai lá que ele quer falar com você. Entrego a sacola da padaria para ela e levo a tortinha comigo. Assim que entro no corredor, vejo muita movimentação e quando chego perto da
minha sala, posso ver que a bagunça é lá. Passo direto e vou para a sala do Otávio, antes que eu possa bater uma voz chama a minha atenção. — A coloque na sala do Roberto! Coloca-a no banheiro se for preciso, mas não na minha sala! —Júlio diz bravo. — O que você tem contra a menina? Ela é um amor de pessoa, é alegre, educada e também gosta de ajudar os outros. Me dê um motivo plausível e eu a coloco em outro lugar. — Otávio rebate sério. Bato na porta e Júlio a abre. — Bom dia! A Lurdinha disse que queria me ver. — Bom dia Vida, eu tenho algumas coisas para dizer a vocês dois. — Ele diz sério e indica a cadeira para que eu me sente. — Sua sala está passando por uma reforma, eu já queria fazer isso a algum tempo, mas sempre deixei para depois. Você vai lidar diretamente com os clientes e sua sala precisa estar de acordo com o seu cargo, então você ficará uns dias na sala do Júlio se não tiver nenhum problema. — Por mim não tem problema, mas se o rabugen... quer dizer, se o Júlio tiver eu posso trabalhar na sala de reuniões ou até mesmo de casa. Você tem algum problema com esse arranjo, Júlio? —Pergunto na maior cara de pau. Ele me fuzila com os olhos antes de responder. — Não vejo problema nenhum, desde que você faça o seu trabalho e me deixe fazer o meu! —Ele diz sério. Babaca! Gostoso, mas um perfeito babaca. — Então se os dois estão de acordo, no máximo em uma ou duas semanas você terá sua sala Vida. Pode decorar do seu jeito, ali é o seu lugar. Agora a segunda coisa. —Ele para e pega alguns papéis e entrega para mim e para o Júlio. — A dona daquele prédio que reformamos há uns três meses me procurou. Ela tem um pequeno resort no litoral e quer fazer algumas
mudanças. É um lugar chique, e ela quer tudo do bom e do melhor. Seus clientes são ricos e ela quer oferecer o melhor e isso, só nós poderemos dar a ela. Júlio você fará a planta, mudará o que achar que deve, use sua criatividade o projeto é seu. E Vida, você vai ficar encarregada da decoração, a dona quer fazer uma reunião com vocês no início da semana que vem e mostrará o que ela deseja. Vocês dois terão que fazer uma viagem juntos até o resort, daqui a uma semana mais ou menos. Cada um tem um projeto, mas que acaba se transformando em um só, pois o trabalho de um vai influenciar o trabalho do outro. Alguma dúvida? — Não! Posso ir? —Júlio pergunta com cara feia. — Lógico! Qualquer dúvida é só me chamar. — Otávio diz sorrindo para ele. — Espere Júlio! Eu sempre trago doces para a Lurdinha e os meninos, então trouxe um doce para você também. Achei a sua cara e decidir trazer. — Pego o pequeno pacote e entrego para ele. — O que é isso? —Ele pergunta curioso. — Uma torta de limão! Azedo como você... Quer dizer que o limão é azedo... Não! Quero dizer eu me lembrei de você por causa do limão azedo. Também não é isso! Ai Jesus, é só um doce. Espero que goste. Júlio me olha sério, depois se vira para o Otávio e lança um olhar maldoso e sai da sala batendo a porta. —Oh meu Deus! Eu e minha boca. Por que toda vez que ele está perto, eu me perco e falo merda? —Pergunto a mim mesma e afundo na cadeira emburrada. A sala ficou no maior silêncio depois da saída do rabugento, mas então Otávio explode em uma gargalhada alta. Eu levanto a cabeça e olho, horrorizada para ele. — Vida, Vida, eu nunca acertei tanto na escolha de uma funcionária.
Acho que teremos dias interessantes a partir de hoje, já estou até ansioso. — Ele diz empolgado. — Você sabe que ele me odeia, não sabe? Eu nunca fiz nada para ele, mas esse homem me odeia. Eu sou feia? Fedida? Tenho bafo? Não entendo! — Ele não te odeia menina, você só o tira da zona de conforto. Ele não é de socializar a não ser com a família. Ele não está acostumado a todo dia ser afrontado por uma bola de energia chamada Vida. A mãe dele é assim como você, mas é a mãe dele. Júlio não se abre muito para pessoas de fora de sua família. — Otávio tenta me explicar, mas a Lila e a Olí entram na sala e eu não posso perguntar mais coisas. — Que bicho mordeu o Júlio? Ele passou por nós sem falar nada, e entrou na sala dele batendo a porta. —Lila pergunta. — Não aconteceu nada bruxinha. Ele só está estranhando uma dada mudança interior. Depois vou te explicar tudo. — Bem, se me dão licença vou começar a trabalhar. Otávio eu vou ficar na sala de reuniões hoje, Deus me livre entrar naquela sala, é bem capaz dele me jogar janela abaixo. Amanhã sairá no jornal; Decoradora morre após ser jogada da janela. Seu corpo foi arremessado a vinte metros de altura. Isso será um marketing ruim para a empresa. Otávio só sabe gargalhar e Lila e a filha o acompanham. — Ela sabe que estamos no térreo? Vida você sabe, não é? —Olí pergunta. — Claro que sei! Só quis fazer um sensacionalismo da notícia, para ficar mais impactante. Agora eu vou embora! Tchau mundo. Saio e vou direto para a sala de reuniões. Passo pela sala dele e o vejo andando de um lado para o outro, enquanto passa as mãos pelo cabelo. Ele parece meio surtado, meio louco. Ele levanta o rosto e olha na minha direção. Eu nunca vi um olhar tão expressivo assim. Há tanto calor, tanta intensidade
que sinto um calafrio percorrer meu corpo. Meu rosto esquenta, eu abaixo a cabeça e corro para a sala de reuniões. Meu coração bate tão acelerado que estou começando a achar que vou enfartar. Passo na cozinha e abasteço minha caneca de café, pego alguns pãezinhos e vou para a sala de reuniões. Antes de me jogar de cabeça no trabalho, passo na minha sala para pegar minhas coisas, mas a sala está vazia. — Senhor Jesus, eu sou uma boa menina. Como todas as minhas verduras, OK, quando eu as faço eu como. Faço caridade, ajudo os velhinhos, visito abrigos e asilos. Por favor, não deixe que o Otávio tenha mandado minhas coisas para a sala do Rabugento. —Faço uma oração. — Falou alguma coisa, senhorita Vida? —Um dos meninos pergunta. — Nada não meu bem, é que sou uma pessoa muito religiosa e estava pedindo a Deus, para abençoar o meu dia de trabalho. —Minto na cara de pau mesmo. — Entendi, achei que estava falando do Rabugento. Ele diz rindo e eu saio correndo da sala. Vou direto para a sala do Otávio, já sabendo o que ele vai me dizer, porém como uma boba iludida que está louca para evitar o lobo mau, insisto em me fazer de idiota. Bato na porta e ouço Otávio mandar entrar. — Desculpa atrapalhar esse momento maravilhoso e familiar, mas gostaria de saber onde minhas coisas estão. Tenho que revisar dois arquivos e, minha sala está vazia. Por favor, por favor, por favor, não diga que está na... — Mandei colocar tudo na sala do Júlio, Vida. Eu mesmo guardei todos os seus arquivos e separei por ordem de trabalho. —Ele diz sorrindo. — Você me odeia, é isso? Me manda embora logo de uma vez, não precisava dessa tortura toda. Eu juro que entenderia de boa mesmo. —Faço um drama básico, que só faz com que ele ria ainda mais. — Olívia meu amor,
gostaria de me ajudar a pegar alguns arquivos? Sim, estou usando uma criança! Me processe por isso. — Trabalho infantil? —Olívia pergunta debochada. — Claro, mas só aceito mediante pagamento. Estou querendo um jogo novo, meu pai pode dar o dinheiro e você me levar. — Jogo! Compro dois se você quiser. Tem controle? Luvas cor de rosa? Compro também! —Digo desesperada. — Já chega Vida. Vá ajudá-la menina mercenária. —Lila se intromete. — Negócios mamãe, nós estamos fazendo negócios. Vamos Vida, não ouça a minha mãe. Olívia sai da sala e eu a sigo. Estou sendo infantil? Estou, mas não quero ficar com esse homem, sozinha hoje. Não depois daquele olhar! As paredes da sala dele são de vidro e posso vê-lo sentado em sua mesa, roendo a tampa da caneta enquanto olha compenetrado para o computador. É ser muito safada, se eu dissesse que gostaria de ser a tampa daquela caneta? A forma que ele morde a tampa me deixa arrepiada, quando eu chegar na minha casa terei um excelente material de apoio para usar na minha banheira. Credo! Imaginação é tudo na vida! Não! Mas posso pensar. Ninguém precisa saber que eu o usarei para me dar alguns orgasmos incríveis. Taí., vou até colocar o nome Rabugento no meu vibrador. Já até imagino a cena. Isso, me fode Rabugento! Mais forte, isso assim! —Júlio, a Vida quer te dizer uma coisa. —Olívia diz me tirando do meu devaneio e se escondendo atrás de mim.
— O que você quer falar garota? —Ele diz com aquela voz séria. — Eu não vou ter fantasias com você! —Falo a primeira coisa que vem na minha cabeça. — NÃO! Quero dizer, preciso pegar algumas coisas minhas que estão na sua sala. Posso pegar? — Pode. — Jura? Eu pego mesmo. — Do que você está falando sua louca? — Do que estou falando? Do que você está falando? Eu vou... Pegar os meus arquivos, Olí você me ajuda? Olí? —Olho para os lados e a garota sumiu. Traidora! Acho a caixa de arquivos que o Otávio separou e me encaminho para a porta. Quando estou para sair, ele me chama. — Vida? — Oi. —Respondo sem me virar. — Gostei de saber que não vai fantasiar sobre mim. Vai saber o que essa sua mente louca pode fazer. —Ele diz sarcástico e isso me irrita. — Agora estou na dúvida, Rabugento. Acho que na minha imaginação, você poderia ser muito mais agradável e me dar orgasmos arrebatadores. —Falo e viro minha cabeça na sua direção e jogo um sorriso quando o vejo de boca aberta. — Tenha um ótimo dia de trabalho, senhor D'Ávila. Fecho a porta sem olhar para trás, mas isso não me impossibilita de ouvir algo sendo quebrado. Vida 1 X 0 Júlio!
Eu não posso acreditar que o Otávio está fazendo isso comigo! Ele sabe que evito o máximo que outras pessoas invadam o meu espaço pessoal, as únicas pessoas que permito isso são as da minha família. E agora ele está me obrigando a dividir o meu santuário, a minha sala, com aquela maluca! Eu não consigo trabalhar com outras pessoas, sou antissocial e essa garota... Ela mal chegou e já não a suporto. Não sei, mas ela desperta coisas que nunca senti antes, é como se fossemos dois fios desencapados que quando se tocam dão curto-circuito. Não sei o que acontece comigo quando estou perto dela, gosto do som do seu riso, mas ao mesmo tempo não gosto. Sei lá, é estranho. Eu sou estranho. Ela é linda, vive cantando, parece aquelas crianças quando tomam uma overdose de açúcar. Ela me lembra muito a Luna, quando era criança, fala pelos cotovelos e quando não falamos o que ela quer, coloca apelidos nos outros. Eu me lembro de quando conheci a loirinha e ela me chamou por um longo tempo de obtuso. E a Vida, logo no segundo dia me chamou de
rabugento. Aquela colorida! Se eu sou o Rabugento, ela é a Penélope Charmosa. Aquela do desenho da corrida maluca, toda colorida, cheia de maquiagens e sorriso perfeito colado no rosto. INSUPORTÁVEL! E aquela história de fantasiar comigo? De onde ela tirou isso? Deus me livre fazer parte do sonho daquela mulher, vai saber o que tem nos sonhos dela. Deve ser cheio de ursinhos carinhosos, nuvem de algodão doce e casa de pirulitos. Aff! Foco no meu serviço e agradeço a Deus que ela não apareceu mais. Aviso ao Otávio que vou sair e que não volto mais hoje. — Otávio eu vou visitar duas obras e depois estou tirando o resto do dia de folga. — Aviso e, ele sorri. — Você nunca fez isso antes, o que mudou? — Ele pergunta debochado. — Não que seja da sua conta, mas vou levar a minha irmã no oftalmologista. E vou passar o restante do dia com ela, então você só me verá segunda-feira se eu não me demitir antes. Eu ainda estou analisando isso. — E o drama do seu pai e do seu tio te pegou de vez! Não se esqueça que esse final de semana é seu como babá, então levarei a Olí na sua casa amanhã à tarde. —Ele diz rindo. — Agora é sério, o que a Vida te fez para você odiá-la tanto assim? — Nada, eu só não gosto dela. Aquela garota me irrita, sinto calafrios toda vez que ela se aproxima de mim. Fico desconfortável e sem fala quando ela está perto. Você não acha que ela é muito colorida? — Ela é muito bonita, não é? —Ele pergunta e eu concordo. — Ela é linda, não posso negar. — Sua voz é tão calma, não acha? — Sim, parece que ela está cantando.
— Seu perfume é gostoso também, não acha? — Sim, uma delícia. Ela entra no ambiente e o cheiro dela fica impregnado no ar. — Você se sente atraído por ela, não é? — Muito, ela é lin.... O que? — Pergunto assustado e ele gargalha alto. — Essa irritação toda é desejo, Júlio. Você se sente atraído por ela e como nunca sentiu isso antes, procura coisas para descrever o que está sentindo. É normal se sentir assim, eu mesmo vivia em pé de guerra com a Lila e você sabe disso. Ela te deixa desconfortável, porque te tira da sua zona de conforto. — Otávio diz todo orgulhoso de suas palavras. — Já acabou, Sigmund Freud? Então até segunda, e não se dê ao trabalho de aparecer na minha casa sábado! Manda a Lila levar a Olí. —Saio da sua sala e bato a porta com força e escuto sua risada. Idiota! Pego minhas coisa e saio da construtora sem me despedir de ninguém. Otávio só pode estar possuído, nada mais explica aquela porcaria que ele disse! De onde ele tirou aquela merda que me sinto atraído pela Vida? A garota me irrita de todas as maneiras. Ok, a garota é linda, tem um sorriso incrível e um cheiro maravilhoso, mas é só isso. Eu não penso nela toda hora, só algumas vezes. Eu odeio a sua voz, mas a sua risada parece música. Ok; estou surtando! Nesse exato momento meu telefone toca e é o meu pai. — Ei pai. — Hum... Está tudo bem? Parece nervoso. — Ainda dá tempo de mudar de profissão? Não estou tão velho assim, para entrar para a faculdade não é? —Velho? Mudar de profissão? Agora estou ficando preocupado. — Pode parar de fingir, pai. Eu sei que o Otávio te ligou para
fofocarem. Não posso falar agora, estou chegando à obra. Coloca umas cervejas para gelar, mais tarde conversamos. — Eu quero participar dessa conversa também! — Minha mãe grita de fundo. — Tchau malucos. Visito as duas obras, vejo tudo o que está faltando e o que está errado. Converso com o encarregado da obra e mostro algumas coisas que vi de errado, e passo pelo projeto de paisagismo. Com tudo resolvido, vou diretamente para a escola da minha irmã. Estaciono em frente à escola e fico esperando ela sair, vejo alguns alunos saírem e todos muito animados. Reparo no agarramento dos meninos com as meninas, sorrisinhos e principalmente a roupas dessas meninas. Mas quase tive um enfarto quando vejo a minha irmã, a ursinha do meu pai vestida daquele jeito. Quando um abusadinho chega para abraçá-la, saio do carro e grito seu nome. — Maria Júlia! —Eu grito o seu nome e, quando me vê, ela dá tchau para todos e vem correndo até onde estou. — Ei ursinho! — Que porra de roupa é essa? O papai te viu saindo de casa? Quer dizer, eu me lembro muito bem que você saiu de casa, usando uma merda de uniforme! Ela ri da minha crise de irmão mais velho e faz uma pose. — Para de ser exagerado, Júlio César! E é lógico que não iria sair para almoçar com você de uniforme. Gostou da minha bota? Foi à mamãe quem comprou semana passada. —Ela diz animada. — E onde está a calça? Eu espero de coração, pela minha saúde mental, que você esteja usando um short embaixo dessa merda! — Não que seja da sua conta, mas estou sim. Agora vamos almoçar logo ou ficaremos aqui até amanhã?
— Pé no saco! Ainda dá tempo de te mandar para uma escolar militar garota. Vamos! Paramos em um restaurante perto do consultório, ela escolhe só porcaria para comer e depois que terminamos, vamos para a sua consulta. O oftalmologista diz que ela tem astigmatismo e vai precisar usar óculos, de início é somente para descanso, mas conforme for passando teremos que mudar. Alega ser hereditário e eu acredito, pois há alguns anos fiz uma pequena cirurgia para corrigir e ela só poderá fazer quando for maior de idade. Saímos do consultório e ela vai toda animada, porque diz que usar óculos é chique. Vamos ver se ela vai pensar assim daqui a alguns anos. — Quer ir ao shopping? Podemos convidar a mamãe para ir ver algumas armações, e podemos comer um pedaço de bolo. O que você acha? — Maravilha! Assim ela me ajuda a escolher óculos top! Vamos. Fomos para o shopping e, durante o caminho ela vai mexendo no celular, enquanto conversa comigo sobre tudo a respeito da escola. Minha mãe responde uma mensagem dizendo que vai nos esperar em frente a ótica. Deixamos o carro no estacionamento e subimos pelo elevador, com ela pendurada nas minhas costas. Encontramos minha mãe conversando com o segurança e quando ela nos vê faz uma festa enorme, como se não nos visse há anos. — Olha meus dois ursinhos lindos! Como foi no consultório? — Minha mãe pergunta depois de nos abraçar. Entramos na ótica e enquanto a Maria vai olhando as armações, eu vou explicando o que o médico falou. Passamos meia hora escolhendo a armação perfeita para Maria e, não sei quem é mais doida. Minha irmã ou minha mãe! Não tenho estrutura para sair com essas duas não. Depois nós vamos para a praça de alimentação, eu peço um bolo de chocolate branco e
um café e vou para a mesa. — Então filho como andam as coisas no serviço? Alguma coisa nova ou contrato novo? —Minha mãe pergunta curiosa, não sabe nem disfarçar. — Quando vocês se tornaram uma rede de fofocas? Vocês devem ter um grupo com o nome; "Fofocas do dia". Mãe, isso é feio. — Você está bem arredio, Júlio. —Maria diz. — Arredio? Onde você aprendeu isso? Você sabe o que significa? — Pergunto rindo. — Minha palavra do dia ué. Arredio quer dizer; uma pessoa esquiva, que se afasta de aglomerações, festas, amigos, que gosta de viver sozinho. Tem muitas outras palavras que dizem quase a mesma coisa, como; afastado, apartadiço, apartado, arredado, desviado, esgueiriço, esquivo, fugitivo, separado. Durante a semana tenho que usar todas essas palavras. —Ela diz toda inteligente. — E eu era o nerd da família! —Falo rindo. — Vai precisar de alguma coisa para o final de semana? Posso passar no mercado e abastecer a dispensa. —Minha mãe pergunta. — Não, estou de folga o restante do dia e vou fazer isso. As meninas vão vim esse final de semana? Gaia e Alicia são duas coisinhas bem, cricris. Gaia ama bagunça, adora um furdunço e é uma das parceiras de crime do Valentin junto com a Mini. Alicia gosta mais de ler, de jogos e faz parte da turma do Vicente junto com a Olí. — A Gaia com certeza, mas a Alicia tem uma competição de matemática semana que vem e quer ficar estudando. Mas nos encontramos no domingo na fazenda. — Ok; vou ligar para o tio Don e ver se as meninas vão querer vir também. A Luna é certeza e a Maria também. Então depois que eu souber
quantos deles vão vir, posso fazer a lista. — Quem é aquela ali com a Olí? —Maria pergunta, olhando atrás de mim. — Não sei, mas já tenho ranço! Olha o sorriso daquela diaba e o corpo? Aqueles sapatos são de matar, nossa to com uma inveja aqui hein, boa, porém é inveja. —Minha mãe diz e eu já até sei de quem ela está falando. — Mãe, olha que bolsa maravilhosa! E os cabelos? Será que posso fazer luzes daquela cor? — Maria pergunta e eu bato minha cabeça na mesa. Não seja ela, não seja ela, não seja ela. — Olí! —Maria grita. — Elas estão chegando. — Que merda! A garota é ainda mais bonita de frente. — Minha mãe diz ciumenta. Que merda!
Vida Martins Depois do imprevisto de mais cedo, me joguei no trabalho e deixei para pensar no Rabugento mais tarde. Sério, esse homem mexe comigo de um jeito inexplicável. Não consigo aceitar que ele seja tão fechado, tão mal humorado. O que mais me chamou a atenção foram os seus olhos, tão tristes, como se a luz da alegria estivesse desligada. Otávio disse que ele é outra pessoa quando está com a família e eu gostaria de ser uma mosquinha, só para vê-lo sorrindo e se divertindo. Vamos falar sério agora, um homão lindo daquele, ser tão sério é um crime. Já imagino a potência desse homem na cama! Sou safada, confesso que já imaginei algumas cenas e vou te dizer. É coisa de outro mundo. Imagina esse homem na cama? Deve ser uma loucura total, aquelas mãos,
aquela barba... Credo! — Queria ser uma mosquinha, só para saber o que tanto você pensa! —Olívia diz e eu acabo me assustando. Eu estava tão perdida nos meus pensamentos impuros, que não vi essa menina entrar na sala. Ela está sentada em uma poltrona, me olhando seriamente. — Quer me matar do coração, Olívia? Quando você entrou? — Já tem uns vinte minutos, porém você estava tão compenetrada que acabou não percebendo. Me diz, no que você tanto pensa? — Ela pergunta sorrindo. — Pensamentos proibidos para menores de dezoito anos. Mudando de assunto, o que você veio fazer aqui? — Estou com fome e você falou que iria me levar para almoçar e comprar um jogo novo que eu vi. E você me ofereceu um controle novo, par de luvas cor de rosa, entretanto não sou muito fã dessa cor. Poderia ser preto com roxo, ou um vermelho sangue. — Você é cara de pau, dona Olívia! Me deixou sozinha com o Rabugento e agora está aqui me subornando? — Eu te prometi pegar a suas coisas e foi o que fiz, lógico que não iria ficar e presenciar a troca de farpas entre vocês dois. Eu sou criança, pelo amor de Deus! Já não basta o agarramento dos meus pais. — Quantos anos você tem? Parece uma velha falando. — Acabei de fazer nove anos a alguns meses. E sobre ser velha, já ouvi isso algumas vezes, o meu primo também é como eu. Mas deixa de enrolar e vamos logo. Ela levanta, pega sua mochila fashion e me espera na porta. Eu rio baixinho e arrumo minhas coisas, depois vou avisar ao Otávio que estamos saindo e ele autoriza. Vamos de carro até o shopping e ela vai me contando
tudo sobre sua família. A garota é uma nerd de primeira, ama quadrinhos, jogos de vídeo games, escalar e uma coisa que eu notei é que ele fala muito no nome do Vicente e Valentin. Conta histórias do que já aprontou e diz também que esse é o final de semana na casa do Rabugento. Pelo menos duas vezes por mês, eles vão para a casa do Júlio e passam o final de semana lá. Pelo visto ele é a pessoa preferida da criançada. Ela conta sobre a mãe e o pai do Júlio e das irmãs dele também. Quando chegamos ao shopping, ela segura a minha mão e me leva na loja que ela sempre compra seus jogos. — Ei Olí, estava me perguntando quando você iria aparecer. A sua sombra passou aqui ontem, mas o jogo só chegou hoje de manhã. — Um rapaz diz sorrindo. — Esse Vicente é um mau caráter, nem me avisou que iria vir aqui. Ele queria pegar o jogo primeiro só para ganhar de mim! Olívia me lembra muito o meu irmão, ele amava jogos e quanto mais difícil melhor era. Ele também amava LEGO, construir coisas, mas os jogos eram os seus preferidos. Enquanto Olívia conversa sobre o novo jogo, eu vou dando uma olhada nas coisas da loja. Vejo uns bonecos pop dos vingadores e já logo me apaixono, pego um de cada e vou colocando no balcão. Eu amo esses bonecos e os vingadores são os meus favoritos. Amo a capitã Marvel e o Thor. Olívia olha para mim surpresa, e eu só mexo os ombros em resposta. — Tem algum controle novo? Já estou enjoada do meu. Jogar online é tenso e quase quebrei o meu e meu pai disse que não vai comprar outro. Eu pedi para o meu avô e meu pai o proibiu de me dar, então liguei para o meu outro avô, o do Rio, lembra dele? Ele vai trocar toda a minha aparelhagem! — Aparelhagem? Não é só um videogame? — Pergunto curiosa. — Vida; preciso te ensinar como jogamos. Serei seu mestre Yoda e te
guiarei no caminho sem volta no mundo cibernético. — Ela diz fazendo uma pose. — Você também gosta de Star Wars? Quer ser minha melhor amiga? — Não sei; você gosta de Harry Potter? — Ela me pergunta séria. — Eu amo aquele bruxinho! — Livro o filme? — Ela pergunta. — Mil vezes o livro. — Essa é a minha garota! Vida, você está em fase de experiência para o cargo de melhor amiga. Olívia escolhe um controle novo, e eu compro uma luva rosa choque para ela, mesmo ela não sendo fã da cor. Pago pelos presentes dela e os meus bonecos e vamos comer um hambúrguer. Já estávamos com as bandejas na mão, quando ouvimos alguém chamar a Olívia. — Olha e minha prima Maria, o seu Rabugento também está com ela. Vamos lá, vou te apresenta a ela. — E aquela outra garota? É namorada do Rabugento, quer dizer do Júlio? Ela é linda, que porcaria! —Está com ciúmes, Vida? — Ela pergunta e solta um risinho. Ciúmes? Eu? Lógico que não! Mas ele está todo, sorrisinhos para ela, enquanto eu que sou um amor, tenho que aturar o seu mal humor e suas patadas. Nem conheço, mas já nutro um ódio eterno por ela. E o que me dá mais raiva é que a bicha é linda, tem até um piercing no nariz! Vou colocar um também! — Olá a todos! Oi Rabugento, não sabia que você ia vir para o shopping. — Olívia diz rindo. — Maria, essa é minha nova amiga e ela trabalha na construtora do meu pai. Vida, essa é a minha prima Maria irmã do seu Rabugento. —Olí! Até você com esse apelido? Está vendo garota, isso é tudo
culpa sua. — Júlio diz nervoso e se levanta. — Seu rabugento? — A garota, Maria, pergunta me olhando séria. — Oi? Eu nem abri a minha boca, não tenho culpa se o seu mal humor te transforma em uma pessoa rabugenta. — Falo e ficamos cara a cara. — Eu não sou Rabugento, só não gosto de você. Não sou obrigado a ficar rindo até para as moscas, assim como você faz sua colorida! — Agora deu! Vai reclamar das cores da minha roupa? Não tenho culpa se você não gosta, na realidade você é o único que diz isso. Os outros amam as minhas roupas e vivem me elogiando. Eles gostam até do meu perfume, amam conversar comigo. Então o problema não sou eu e sim você! Esse homem me irrita num grau, que quero dar dez tapas na cara dele e encher de beijo ao mesmo tempo. INSUPORTÁVEL! — Quem está te elogiando? Quem é que fica te cheirando? Isso é assédio sexual! Vamos Vida, quero saber o nome desses idiotas e quero agora! — Ele fala revoltado. —Para que? Eu hein! Além de rabugento você é surtado. — Surtado da vida toda! —As meninas gritam e caem na risada. — Cala a boca vocês! Desembucha Vida, ou vou ligar para o Otávio agora e falar isso para ele. Assédio é crime e se tem alguém fazendo isso, será mandado embora, não queremos isso na VALVERDE. — Júlio diz sério. — Você está com ciúmes, Rabugento? Ah que bonitinho você me quer, você deseja o meu corpinho, você quer me amar. Você já ama, só não sabe ainda. — Falo rindo da cara de espanto que ele faz. — Vai comprar pipoca, ursinha. Estou gostando dessa discussão, está parecendo àquelas novelas mexicanas. Será que vai acabar em beijo? Porque a tensão sexual entre eles está exalando tanto que se riscar um fósforo explode tudo. — A mulher diz animada. — E você, vai deixar o seu namorado falar assim com outra mulher?
Ele está com ciúmes de outra mulher e você fica ai, rindo? O povo dessa cidade é estranho demais. Ela levanta da mesa e para na minha frente. A mulher é linda, tem o corpo maravilhoso. Ai que raiva do caralho! — Qual é o seu nome, meu bem? — Ela pergunta sorridente. — Vida Martins. Olha moça, acho melhor você dar atenção para o rabugento do seu namorado, parece que ele vai enfartar a qualquer momento. — Prazer, Vida. Nome lindo por sinal. Eu me chamo Yza Reed, ou melhor dizendo, Yza D'Ávila Reed. Mãe do Rabugento, o enfartado de Taubaté. — Ela diz rindo. É o que? — Mãe? Mas... O que... Como assim? Eu to louca ou ela disse que é mãe do Júlio?
Mãe? Esse escândalo de mulher é mãe do Júlio? Impossível isso Brasil, essa mulher não tem uma ruga na cara. Seu corpo é maravilhoso, ela tem um sorriso matador, ela deve ter o que? Trinta anos? — Olha senhora D'Ávila, eu é....acho melhor eu ir embora. Desculpa qualquer coisa viu. Vamos embora Olí! — Imagina! Você vai ficar aqui e tomar um café comigo. O enfartado de Taubaté já estava indo embora, não é mesmo ursinho? — Ela diz para o Júlio e ele a fuzila com os olhos. — Não estava não e pare de me chamar de ursinho na frente de estranhos! — Júlio diz nervoso. — Ei seu grosso, não fale assim com a sua mãe. Que coisa feia! E outra, ela te chama do que quiser, mas posso concordar que ursinho não combina com você. Do jeito que é mal humorado, está mais para Rabugento mesmo.
— Nunca pensei nisso, acredita? Ele parece um urso rabugento mesmo! — Yza diz e as meninas caem na risada. — Quer saber? Não tenho estrutura para aguentar duas malucas de uma vez, fique aí mãe traidora! Só para você saber, meu pai é o preferido. — Ele diz e vai embora puto de raiva. Vamos combinar que a imagem dele indo só não é melhor que a frente. — Desculpa dona Yza, não quis acabar com o lanche de vocês. Eu só vim passear um pouco com a Olívia, nunca imaginei que iria encontrá-lo aqui. — Não tem com o que se preocupar, vamos, sente-se. Adoraria conhecer um pouco mais de você. —Ela diz sorrindo toda simpática e vou confessar que já gostei dela. —Yaya, esses dois vivem brigando. Meu pai ainda colocou os dois para dividirem a mesma sala, o seu ursinho fez um drama que parecia o tio vidinha. — Olívia diz. — Mas o meu irmão é um amor de pessoa, nunca fica zangado. O que você fez para ele te tratar assim? — A adolescente chamada Maria pergunta me fuzilando com os olhos. E temos uma irmã ciumenta aqui Brasil! — Maria, não é? — Pergunto e ela confirma. — Eu acho que ele não gosta muito de mim, por que sou o oposto dele. Seu irmão vive de cara fechada, de mal humor. Já eu sou alegre, bem humorada e amo fazer amizades. Como você acabou de presenciar, ele não gosta nem das minhas roupas! O que tem de errado com as minhas roupas, elas são tão lindas. — Não há nada de errado com as suas roupas, querida. Como você disse a diferença entre vocês é gritante. Júlio sempre foi mais na dele, não gosta de conversar e não tem muitos amigos. Ele é mais de ficar em casa, ler
um livro ou jogar com as crianças. —Yza explica, mas mesmo assim me sinto mal por ele não gostar de mim. — Eu também não tenho amigos aqui, a não ser a Olí, que agora é minha melhor amiga. Não é Olí? — Sim, mas lembre-se que você está em fase de experiência. — Ela diz rindo. — Maria, a Vida é legal viu e muito maluca. Fala sozinha, ri sozinha e fala as maiores besteiras quando está nervosa. Olívia e Maria terminam de comer e vão comprar sorvete e eu fico com a mãe do Rabugento. —Há quanto tempo você mudou para Campinas? — Vai fazer um mês que me mudei. Assim que o Otávio me ofereceu o emprego, eu arrumei minhas coisas e vim. Fiquei em um hotel até achar uma casa que me agradasse, mas na construtora eu trabalho há quase duas semanas. — Então nem teve tempo de conhecer a cidade e muito menos de fazer amigos. O que você vai fazer amanhã à noite? — Ela pergunta séria. — Pedir uma pizza, tomar um vinho vendo alguma série. Esses são os meus programas para os finais de semana. Faz alguns anos que não saio ou vou para uma balada, não que eu tenha medo ou algo parecido. Se eu tivesse amigos eu até iria, amo sair para dançar! — Não vai mais, nós vamos sair juntas. Conheço um barzinho legal, tem karaokê, eu e minhas cunhadas vamos quase sempre. Me fala seu número, vou te adicionar no grupo das meninas e vamos marcar aonde vamos nos encontrar. — Ela é uma bola de energia e não parou de falar nem para respirar. Eu passo meu número para ela e logo meu celular apita, quando vejo, vários olhinhos começam a aparecer. Então Yza me apresenta e diz que sou a mais nova parceira do grupo e que vamos sair todas amanhã. Eu fico olhando
de boca aberta para ela, completamente sem reação. Nunca no mundo eu seria capaz de sair com ela! E se eu beber demais, passar vergonha e ela me odiar? Aí eu posso dar adeus ao cargo de nora preferida. Oi? Nora? De onde eu tiro essas merdas? — Agora que tudo está organizado, quero respostas. — Ela diz séria. — O que está acontecendo entre você e meu filho? Porque o que eu presenciei foi puro tesão reprimido. Minha cara vai ao chão! — Por enquanto nada, senhora D'Ávila. Eu acho seu filho lindo, lindo é pouco, ele é um gato. Nunca fiz nada para ele me odiar assim, quer dizer, eu o chamo de Rabugento e eu o chamo assim por que ele vive de mal humor. — Vou ser sincera para você, Vida. Eu nunca vi meu filho reagir a alguém assim, eu fiquei impressionada e espantada. Ele mostrou um lado que nunca vi, totalmente transtornado, com ciúmes. Só sei que... —Que o corpo estremece, as pernas desobedecem. Inconscientemente a gente lança, as mãozinhas então embalançam. Quando passa eu vou atrás, só sei que o Ara Ketu é bom demais. — Cantarolo na minha cabeça e só me dou conta que saiu alto, quando a Yza começa a rir. E mais uma vez estou passando vergonha na frente dos outros. Juro por Deus que gostaria que um buraco se abrisse e me sugasse para dentro dele, me privando de passar mais uma vergonha. A psicóloga que cuidou de mim anos atrás, me ensinou uma técnica para quando eu ficasse muito nervosa ou ansiosa com algo. Ela mandava que eu cantasse alto qualquer música que me deixasse feliz e se eu tivesse audiência, cantaria na minha cabeça. Isso me ajudou muito em todos esses anos, principalmente nas audiências e na reabilitação. Só que muitas vezes passo uma vergonha como agora. — Você é maravilhosa, Vida. Um sopro de ar fresco em dia de verão.
Não se envergonhe meu bem, você é muito espontânea e eu gosto disso. — Mil desculpas, Yza. Minha antiga psicóloga mandava que eu cantasse quando estava nervosa, e eu jurava que estava fazendo isso na minha cabeça. Agora a senhora deve estar me achando uma doida e não vai mais me querer perto do seu filho. — Desabafo cobrindo meu rosto com as mãos. — E você quer ficar perto dele, não é? — Ela pergunta baixinho. —Às vezes sim. Ele me parece tão triste, que tudo o que quero é que ele sorria. Mas ele parece me odiar e disse para não fantasiar com ele, mas poxa vida, eu ia dar o nome de rabugento para o meu vibrador em sua homena... — Bato na minha boca na mesma hora, e olho assustada para ela. — Eu... eu... vou embora, até nunca mais dona Yza! Pego minha sacola, as coisa da Olívia e saio correndo, mas não sem escutar as gargalhadas da Yza. Corro até onde Olívia está e a arrasto comigo para o estacionamento, como se mil demônios estivessem me perseguindo. Assim que entro no carro, bato minha cabeça no volante e me xingo mentalmente. — O que aconteceu, Vida? — Pergunte para o seu pai na segunda-feira se eu apareci para trabalhar, se ele disser que não é por que eu me joguei do pé de alface e morri. — Falo baixinho e ela ri. — Você falou merda para a minha tia, não foi? O seu Rabugento vai ficar louco, por que você é igualzinha à minha tia Yza. — Ele não é meu Rabugento, Olívia! Então pare de ficar falando isso. — Ainda... Ainda... Depois de hoje, aí que ele não vai ser mesmo. Eu e minha boca grande!
Saio do mercado carregado de sacolas, comprei de tudo, desde cereal até barras de chocolate. Confesso que exagerei dessa vez, normalmente faço com que eles comam bem, mas hoje estou um pouco transtornado e comprei muita porcaria. O que essa mulher tem que me deixa desse jeito? Quando ela falou que os outros a acham, bonita e gostam do seu perfume, me deixou completamente louco a ponto de bater em alguém. Não sei explicar essa reação, pois nunca senti nada parecido na vida e acho que é isso que está me deixando assim. Eu acho... Eu acho que não a odeio como eu pensava antes. Mas se não é ódio, então que merda é essa? Vê-la com a minha mãe, é como olhar para irmãs gêmeas separadas no parto. Não na aparência, mas no gênio alegre, só que a Vida, fala muito mais merda que a minha mãe. Aquela garota é completamente sem filtro e aposto que as duas agora são melhores amigas. Podem imaginar o estrago que essas duas podem fazer no mundo? Não sei como meu pai ainda está vivo, os cabelos brancos que ele tem são por causa das maluquices da minha mãe. Chego ao meu apartamento e guardo todas as coisas em seus devidos lugares, os refrigerantes e o suco de soja da Gaia na geladeira. Sim, Gaia é contra refrigerante, diz que seu corpo é um templo e ela o respeita. Mas não larga um pacote de Doritos quando vê um. Sorvete de morango para a fadinha, de uva para a ursinha e chocolate para o restante da quadrilha. Coloco minha cerveja no freezer e vou organizar o quarto da bagunça. Troco os lençóis das camas, ajeito os colchões reservas e os Puff. Depois vou até meu quarto tomar um banho rápido. Visto uma calça de moletom e vou
pra cozinha, faço um lanche, me sento na sala e coloco em um canal de obras. Termino o meu lanche e vou pegar uma cerveja, na segunda latinha minha campainha toca e quando abro me arrependo amargamente. Meu pai, Roberto, Otávio, Dylan, Donatello, Douglas e meu avô Will. Cada um com um engradado de cerveja nas mãos. — Se Maomé não vai a montanha, a montanha vem a Maomé. — Meu pai diz entrando no apartamento e indo direto para a cozinha. Todos entram e se dirigem até a geladeira, guardar as cervejas que trouxeram e aproveitando e pegando uma gelada. Espero todos se acomodarem e só então me sento e olho para eles. — O que estão fazendo aqui? — Você disse que precisava conversar, mas depois do seu encontro com a sua mãe, que devo dizer chegou em casa andando nas nuvens, você me mandou uma mensagem e disse que não queria mais conversar. — Meu pai responde. — Otávio disse que está tendo problemas com outra funcionária, gostaria de falar sobre isso? — Tio Don pergunta. — Otávio deveria ficar calado! Desde quando se tornou um fofoqueiro? —Pergunto a ele irritado. — Como diz o Valentin, não estou fazendo fofoca. Estou mantendo seu pai e o restante da família, informados. Eu ainda não entendi por que tanta raiva da garota, ela nunca fez nada contra você. — Otávio indaga e todos me olham curiosos. — Que saco! Eu só não gosto dela, qual é a novidade? Eu não gosto de ninguém, por que estão tão surpresos? Ela é....ela é....irritante, colorida e feliz demais. Quem é feliz as sete da manhã? — Mas ela é uma gata, não é? — Otávio fala, tentando fazer o mesmo joguinho de mais cedo.
—Óh não, você não vai fazer isso de novo. Eu nunca disse que ela era feia, só disse que ela é irritante. Não gosto dela e pronto. Aceitem isso e fim desse clube do bolinha, ridículo. — Você gosta dela! —Meu vô diz animado. — É claro que gosta, ele nunca agiu assim antes. Esse antagonismo todo é desejo reprimido. — O que? Não! — Ah é sim. Sua mãe me contou a crise de ciúmes que você teve, quando a Vida disse que os outros funcionários achavam que ela era linda. Qual é o problema em assumir que você se sente atraído por ela? — Meu pai pergunta. Eu me levanto irritado e vou até a cozinha pegar outra cerveja. Quando volto, todos me olham curiosos e só meu tio Dylan fala. — Esse medo é pelo que aconteceu no seu passado, é isso Júlio? Você nunca se interessou por uma mulher antes, por isso não sabe lidar com o que está acontecendo na sua cabeça. Ficar inseguro é normal, mas deixar o seu passado lidar com o seu presente é como deixar que ele ganhe. —Tio Dylan diz sério. — Como você se sentiria se outro homem a chamasse para sair? — Douglas pergunta dessa vez. Aliviado, seria a palavra certa a ser dita. Mas não é assim que me sinto. — Com raiva. — E por que a raiva? — Roberto pergunta. — Por que a empresa não é lugar de namoro? — Pergunto e ele nega com a cabeça. — Ela é louca, quando abre a boca só sai besteira. Ela nem me conhece e já colocou apelidos em mim. E ela é muito colorida, vive sorrindo para todo mundo e beija todo mundo.
— E você queria que ela sorrisse só para você e beijasse só você? — Meu pai pergunta. — É! Quer dizer Não. Que merda vocês são? Conselheiros amorosos? Eu não quero nada com ela, não quero uma namorada, não quero casar, muito menos ter filhos. Eu estou bem sozinho e quero ficar assim. — Falar com ele é como falar com as paredes. Isso tudo é medo, Júlio Cesar D'Ávila. Você está com medo, porque sabe que com ela as coisas vão além da barreira que você ergueu. Estar com ela envolve intimidade, carinho, toque, sexo, mas você está com medo. Você diz que não quer, mas também não gosta de saber que outro pode tê-la e isso está te deixando maluco. — Otávio diz bravo e vai até a cozinha. Agora estou muito mais confuso do que me sentia antes. Eu sei que eles podem estar certos, mas ainda sim estou confuso. Otávio volta e entrega uma cerveja para cada um e volta a se sentar. — Vamos nos acalmar e tentar agir como adultos, para assim poder ajudar o meu neto. Para vocês é fácil incentivar, porque nunca passaram pelo o que ele passou. — Meu avô diz e todos abaixam a cabeça, enquanto eu confirmo com a minha. — Mas também você não pode deixar o passado te tirar uma coisa que pode te fazer bem, Júlio. Se essa garota mexe tanto com você, é sinal que ela é especial. Você tem duas possibilidades, a primeira; você pode afugentá-la e continuar a viver essa vida solitária, porém segura. Segunda, você pode se deixar levar e descobrir coisas novas e talvez curar algumas marcas que existem dentro de você. A escolha é sua. — Escuta filho, nós viemos aqui para conversar e tentar entender o que está acontecendo. Não queremos te pressionar a fazer nada, só queremos te impulsionar a algo novo. Mas tudo só depende de você, entendeu? — Meu pai diz. — Você está mexido porque essa garota te tira da sua zona de conforto, você diz que ela te irrita pois não sabe dar outro nome ao que está
sentindo. Se você se sentir desconfortável para falar na frente deles, tenho certeza que eles não se importam de ir embora. — Não precisam ir embora. Eu só não sei descrever o que sinto. — Como ela é? — Meu tio Dylan pergunta e eu sorrio levemente. — Linda, tio. Uma bola de energia, parece a Luna quando era criança. Fala pelos cotovelos, vive alegre, ajuda todo mundo, conversa com todos inclusive com quem não deveria. Sua voz é doce, mas tem um gênio do cão e fala tanta merda que eu duvido que tenha algum filtro entre a mente e a boca. Ela adora discutir comigo e é até engraçado vê-la irritada. Eu fico puto porque ela me chama de rabugento e porque sorri para todos menos para mim. — Isso porque você não deixa ela se aproximar de você. Ela acha que você a odeia e já até pediu para eu mandá-la embora, ou deixá-la trabalhar de casa. — Otávio informa. — Mas eu não a odeio, só não gosto de dividir meu espaço pessoal. Jamais iria querer que você a mandasse embora, você me conhece Otávio! — Eu achava que te conhecia, Júlio. Eu não conheço essa versão pós Vida Martins, você ficou um garoto irritado, mal humorado e respondão. — Eu só não sei agir quando ela está por perto! Eu tento ser educado com ela quando me aproximo, mas ela para de rir e me chama de rabugento. O problema não sou eu e sim ela! — Então eu acho que vocês vão acabar se matando nas próximas semanas, já que ela estará na sua sala e tem a viagem até o litoral na próxima semana. E não, não aceito a sua demissão, muito menos que mude de profissão. Acho que tudo o que você precisa, é passar algum tempo com ela e ver a menina maravilhosa que ela é. — Eu também concordo com o Otávio. E mesmo que isso não leve a nada, você tem que aprender a conviver com ela dentro da construtora e fora
dela também. — Meu pai diz. — Fora dela? O que o senhor quer dizer com isso? Porque eu teria que lidar com ela fora do trabalho? — Porque ela se tornou a pessoa favorita da sua mãe. Desde que ela chegou do shopping, só sabe falar dessa tal Vida. — Ele me responde. Eu jogo minha cabeça no encosto do sofá e bebo minha cerveja em um gole só. — Também tem mais. — Tio Dylan diz. — O que? — Amanhã sua mãe está saindo para a noite das meninas e você sabe, não é? Haverá bebidas, karaokê, merdas sendo ditas principalmente se a sua avó Belle estiver envolvida. E não tenha dúvidas, ela estará. — Meu pai diz e isso não é novidade, já que elas se reúnem pelo menos uma vez por mês. — Qual é o problema? Elas sempre fazem isso. — Sim, mas agora elas têm mais uma integrante. O clone da sua mãe, pelo que a Lila me informou. Sua Vida está entrando para o grupinho das malucas. Amanhã será o batismo dela. — Donatello diz rindo e todos acompanham. — Jesus amado! O que poderia ser pior? — Eu posso responder essa pergunta, meu querido e amado filho. — Meu pai diz depois que falo alto o meu pensamento. — O karaokê é só o esquenta, sua mãe a está levando para a balada e, usando as palavras da diaba da sua mãe, elas só saem da balada quando acenderem as luzes. Mas que caralho de vida!
O que eu fiz da minha vida? Eu passei minha vergonha no débito, sem parcelar nem nada. Como que eu falo para uma mãe, que daria o apelido do filho dela para o meu vibrador? Não sei onde enfiar a minha cara, juro que estou cogitando a ideia de me esconder e falar que estou com alguma doença contagiosa; tipo catapora, sarampo, sei lá, vou pesquisar no Google! Agora a mulher me colocou no grupo das amigas, todas tias do Rabugento e pelo visto ele é o queridinho. Senhor amado! Eu acordei hoje e havia duzentas mensagens, mais de cento e cinquenta com meu nome marcado. A mais louca de todas é uma tal de Belle Reed, senhor essa mulher fala tanta loucura que tenho certeza de que deve ter fugido de algum hospício. Yza, que se intitulou minha sogra, já me ligou cinco vezes para confirmar que vou estar no karaokê ou ela vai mandar a polícia vir me buscar. Gente! Tudo o que eu queria agora era estar deitada no meu sofá,
escolhendo algum filme e me entupindo de pipoca. Mas não, eu estou escolhendo uma roupa para ir na merda do karaokê dos infernos. Estou com a adrenalina a mil hoje, já faxinei a minha casa inteira, fiz feira, fui no mercado, fiz até pudim para a minha vizinha e ainda assim estou no auge da ansiedade. Opto por um jeans de lavagem clara, um top e uma jaqueta de couro. Escolho um salto alto preto e faço uma maquiagem básica. Visto a calça e os sapatos e me olho no espelho, gostando de como minha bunda ficou perfeita nesse jeans, mas logo me bate a ansiedade e me jogo na poltrona, desistindo de ir para essa merda de encontro. Como se pudesse ler meus pensamentos, meu celular toca e vejo que é a Yza me ligando. Finjo uma voz de doente e atendo. — Alô? — Atendo e finjo uma tosse. — Nora querida, se você fosse atriz iria passar fome. Já está arrumada? —Yza pergunta. — Sabe o que é dona Yza, não estou me sentindo muito bem. Acho melhor deixar esse programa para outro dia, tipo nunca. — Espero você na minha casa daqui a vinte minutos, mandei meu endereço por mensagem e Vida? É vinte minutos ou irei com a polícia na sua casa! — Ela diz e desliga na minha cara. Me arrumo rapidamente, pego minha identidade o cartão de crédito e minhas chaves, celular e soco tudo dentro da bolsa e saio de casa. Coloco o endereço no GPS e sigo o meu caminho, percebendo que ela mora dez minutos da minha casa. Paro em frente ao portão do condomínio, o porteiro confere minha identidade e o número da casa na qual vou. Depois que ele confere tudo me deixa ir e eu paro em frente à casa dela. Fico alguns minutos dentro do carro, tentando acalmar meus ânimos, mas um infeliz resolve me assustar.
— Você pretende ficar aí dentro a noite toda ou vai entrar? — Uma voz grossa e rouca pergunta me assustando. — Puta que pariu mil e quinhentas vezes! Você quer me matar homem de Deus? Não sabe que a maioria dos enfartos são causados por que a pressão sobe rapidamente? O senhor poderia se tornar um assassino. Jesus do céu, tenha pena dessa alma que ainda tem muito, o que viver. Não vá para a luz Vida Martins, não vá para luz! Eu só paro de falar, quando ouço uma gargalhada alta. Só então eu reparo no ser humano que está com as mãos no teto do carro e outra na minha janela. Olho para os seus dedos tatuados e vou subindo pelo braço, também cheio de tatuagens até que vejo um rosto com uma barba serrada e um sorriso de menino. O cara é simplesmente um espetáculo, tipo a oitava maravilha do mundo e muito, muito grande e forte. Esse homem pode me quebrar ao meio com um único braço. — Tenho que concordar com a minha mulher, você é muito engraçada, garota. —Ele diz e estica o braço arrancando as chaves do contato e depois abre a porta para que eu saia. Eu pego minha bolsa e recito um mantra na minha cabeça, para tentar me acalmar. Saio do carro e quero voltar rapidamente, perto desse homem eu me sinto uma formiga. — Moço, você usa bomba? Porque um braço desses não pode ser só academia não. Quanto você tem de altura? Você já tentou levantar um carro? Eu tenho certeza que o senhor consegue. Eu... Eu falo demais quando estou nervosa moço, me perdoa tá? É que... Uma mulher louca que mora nessa casa e que é mãe do cara lindo que trabalha comigo, lindo e chato por sinal. Você não quer ouvir né? Deixa pra lá. Eu quando estou nervosa, não consigo ficar calada. Vou embolando um assunto no outro, uma hora estou falando de cores e quando vou ver já
estou falando de absorvente. Sou muito aleatória quando estou nervosa. — É claro que quero ouvir, desculpa nem me apresentei. Sou Gael e você? —Ele se apresenta. — Gael... É nome de anjo sabia? Mas você não parece um anjo, não. Está mais para ajudante de Lúcifer. — Solto e tampo minha boca. — Desculpe Gael. Eu me chamo Vida, prazer em conhecê-lo. — O prazer é meu, você me lembra muito a minha sobrinha mais velha. Fala pelos cotovelos, mas continua a falar sobre o cara lindo e chato. — Ele é um mal educado, isso sim! Olha Gael, eu até gostaria de continuar essa conversa sabe. Mas a louca da mãe desse cara está me esperando, ela cismou que vai me apresentar a cidade com as amigas dela. Eu não sei como vai ser; se de cara eu já não sou muito certa da cabeça, imagina eu bêbada. Como diz a dona Hermínia, "vai dar merda ai hein". Por um acaso você não sabe nenhuma desculpa boa ai não, né? Eu tentei falar que estava doente, mas não colou. — Desculpas? Doente? — Ele pergunta rindo e encosta no meu carro e cruza os braços enormes. — Sim, pesquisei doenças contagiosas no Google sabe, mas ele me indicava operação de baço, transplante de rins. Acho que o Google não gosta muito de mentiras. Foi um prazer falar com você Gael! — Me despeço e vou até a porta e toco a campainha. Mas antes que alguém possa atender, ele abre a porta para mim. — É... Gael, você mora aqui? — Sim. — Ele diz rindo. — Por favor, por favor, não me diga que você é.... — Vejo que já conheceu o meu marido! Gael, essa é a garota que te falei. Vida esse é meu marido Gael e pai do seu Rabugento. Entre, quer um esquenta antes de sairmos?
— Adoraria uma dose de cianeto se tiver. Assim eu morro e paro de passar vergonha! Olha senhor, me desculpa viu. — Não precisa Vida. — Ele diz e olha para a esposa e cruza os braços. — A sua futura nora já chegou e você ainda não se arrumou Sweet? Depois que ele fala que reparo nela. Ué, para mim ela está maravilhosa, eu estou me sentindo mal vestida! Yza está usando um short jeans preto, um top rosa choque e saltos altíssimos. Seu cabelo está preso em um rabo de cavalo frouxo e uma maquiagem arrasadora. — Não começa Ursão, mas ainda está faltando a blusa de cima. —Ela diz e corre até o sofá e veste uma blusa toda vazada, que não tampou nada. Eu solto uma risadinha baixa e ele me olha feio. — A senhorita também esqueceu a camiseta no carro? Não vai passar frio, pegar uma gripe? Se quiser posse te emprestar uma camiseta, com certeza vai cobrir tudo. — Ele pergunta sério. — Eu hein, sua mulher é a outra maluca ali, me deixa fora dessa. O apelido combina com você, já que é imenso feito um urso. — Vamos norinha, o Uber já está nos esperando. As meninas vão nos encontrar no bar. Tchau Ursão, me espere acordado que hoje eu vou te usar. Ela vai se despedir dele e, eu vou esperar do lado de fora. Credo, esses dois devem pegar fogo tamanha a intensidade. Logo ela sai e me enfia dentro do carro e passa o endereço para o motorista. — Você vai amar as meninas. Katrisca é mulher do meu irmão mais velho Dylan, Hanna é mulher do meu outro irmão Donatello. A Lila é minha irmã e, casada com Otávio, seu patrão. Minha mãe é a Belle, essa sim você vai amar, ela é maluca assim como você. — Você quer dizer que aquela Belle, a do grupo que estava mandando fotos de homens pelados era a sua mãe? Jura? Essa Belle passou o dia todo mandando fotos de homens pelados, gifs
safados, paus de todos os tamanhos. Eu achando que era uma amiga, até uma irmã, mas nunca imaginaria que se tratava da avó do Júlio. — Essa mesma! Minha mãe é doida, mas é maravilhosa. Você vai se dar muito bem com ela, porque assim como você ela não tem filtro. — Misericórdia! Chegamos ao barzinho rapidamente e, ao sair do carro vejo a Lila com três mulheres lindas ao lado. Todas muito bem vestidas. Lila está com um vestido jeans totalmente grudado no corpo, com um decote generoso e um salto plataforma. A outra, Katrisca, está com um short preto cintura alta, uma regata preta com letras douradas e uma sandália de salto alto. Hanna está usando um macacão soltinho, mas com um decote matador e um salto maravilhoso. A outra, Belle, essa está um arraso. Quem olha não diz que essa mulher é mãe, quem dirá avó. Ela usa uma calça de couro preto fosco, botas de salto creme e um camisetão também creme, mas que vai até a cintura e apenas preso por uma fivela nas costas, deixando a parte detrás totalmente aberta. Yza me apresenta a todas e essa Belle gruda no meu anjo. A mulher não me soltou um minuto sequer, quis saber tudo de mim, de onde eu vinha, o que eu fazia, só parou quando perguntou da minha família e eu disse que era órfã. Começamos bebendo Chopp, elas fizeram perguntas sobre o que eu achava do Júlio. Elas foram espertas, a cada rodada de Chopp elas faziam uma pergunta diferente. Lila é a única que não está bebendo e eu olho para ela que me manda ficar calada. Eu acho que elas estão querendo me juntar com o Rabugento. Sei lá, tive essa impressão. Fui ficando alegrinha e quando eu vi, estava no palco cantando Valerie da Emy Winehouse. Eu já contei pra vocês que quando eu bebo, me transformo na Madonna? Pois é, e com direito a coreografia e tudo,
graças a Deus eu sei falar em inglês ou a vergonha era maior. Elas se empolgam também e escolhem músicas para cantar. Foi divertido para cacete. Hanna é a mais calma de todas, ela e a Katrisca, apesar dessa ser meio, maluquinha, também. As mais loucas são a Belle e a Yza, está bem explicado de quem ela puxou todas as loucuras. Elas decidem ir para a boate e aí que tudo desandou. Belle conseguiu sabe-se lá Deus como, uma mesa na área VIP. Entramos ao som de The Book Isonthetable do Alok e já comecei a dançar da porta de entrada. Tudo piorou quando a garçonete chegou uma garrafa de José Cuervo série ouro. O que? Eu amo tequila! A moça distribuiu os copinhos de dose, deixou o saleiro e o pratinho com pedaços de limão. Minha boca encheu de água, parecia que eu tinha andado o deserto a pé e acabado de avistar água. Depois da quarta dose eu já não sabia mais meu nome, os gatinhos chegavam até mim e eu fazia a americana que não entendia nada do que eles falavam. Dancei com vários, mas a diversão mesmo era dançar com as garotas. Quando eu vi, a primeira garrafa de tequila já tinha ido embora e a garçonete trazia a segunda. Agora pensa você, cinco anos sem ir numa balada, sem chapar a cara, minha dignidade? Perdi na décima dose do Zé, o Cuervo, conhece? Começa a tocar Dua Lipa e Katrisca me pede para ensinar os passos que estou fazendo para ela. Aí fodeu, depois da cachaça, nós viramos dançarinas do Faustão, com direito a jogada de perna para cima e tudo. Era cada jogada de cabelo, que você não sabia se era a Joelma do CALIPSO ou as DRAG QUEEN batendo cabelo. Dignidade? Nem vi! — Não olha agora, mas o seu Rabugento acabou de entrar. — Lila avisa e eu olho para onde ela está apontando. — Mas que merda! Quem falou para o Gael onde estávamos? —Belle
pergunta revoltada. — Deus me livre, mas esse homem é tão lindo, que se eu sentasse nele nunca mais ia levantar na vida. Iria tatuar seu pau no meu útero. —Solto e a Belle e a Katrisca que estavam bebendo, cospem tudo na hora e caem na gargalhada.
As crianças estão jogando videogame, Maria e Luna estão fazendo as unhas no quarto. E eu estou inquieto, olhando toda hora para o relógio. Onde será que as malucas foram? Será que já estão bêbadas? Imagina, se a Vida sem beber já é louca, quem dirá bêbada. Tenho até medo de imaginar. Olho novamente o relógio e já são meia noite. E se alguém chegar agarrando ela depois de ver que ela está bêbada? E se ninguém notar que ela está sendo agarrada? Mas que merda! — O que você tem Juju? — Luna pergunta. — Nada loirinha; só estressado. — Mentira, ele está assim porque a namoradinha dele foi para balada com a minha mãe. — Maria diz ciumenta. — Eu não tenho namorada ursinha. Deixa de bobeira. Já pintaram as unhas? Que tal um sorvete? — De uva? — Maria pergunta emburrada. — O seu preferido, lógico que não poderia faltar. —Eu falo e ela sorri. — Os pestinhas querem sorvete? Todos dizem que sim e eu vou até a cozinha. Hoje não veio a tropa toda, só a Olí, Vicente, Valentin, Gaia, Luna e Maria. Lou e Alexia viajaram
com o Roberto e a Luz, Mini e Joy estão com o João, Alicia foi estudar na casa de uma amiguinha. Eu pego os sorvetes na geladeira, as taças no armário. Vou servindo tudo nas taças e Maria e Luna vão entregando para as outras crianças. Depois elas voltam e sentam no balcão. — Por que você está com ciúmes do Juju, Maria? Você não quer que ele arrume uma namorada? — Luna pergunta e eu me encosto, na pia para ouvir a resposta. — Ele é meu irmão ué, você também tem ciúmes dos seus; fadinha! — Mas eles são crianças, Maria. O Júlio já é adulto, você quer que ele seja sozinho para sempre? Eu acho que é muito egoísmo amiga, lembra que não pode ser possessiva. —Luna diz séria. — Você gosta dela? Daquela tal de Vida? Ela é bem bonita, se você quiser namorar a Vida, eu deixo, mas não pode me esquecer ok? — Muito OK da vida toda! — Luna e eu falamos ao mesmo tempo. — Eu não tenho namorada, Maria. Mas eu juro que se eu arrumar uma, você será a primeira a saber. Vida é muito linda mesmo, mas eu não sei de nada por enquanto, tá? Independentemente de ter namorada ou não, eu nunca vou me esquecer de você ursinha. Você é meu amor todinho no mundo. — Reunião de família com declaração de amor e eu não fui convidada! Que merda é essa aqui em Filhote de Gael D'Ávila? — Gaia entra na cozinha e me olha feio. — Eu também te amo tampinha, mas a Maria é mais possessiva que você. — Essa daí é o papai todinha, credo. Liberdade irmã, ser livre é divino! Deixa o ursinho namorar garota, um a menos pegando no nosso pé. Quando eu for adulta, vou ter uns três namorados quero nem saber de nada.
— Ela diz rindo. — Como é que é, Gaia? Vou falar para o papai sobre essa conversa, viu mocinha? Nem saiu das fraldas e já está falando de namorado? Vai brincar com as suas bonecas garota! Ainda dá tempo de te enfiar em uma escola militar. — Nem começa, nenhuma escola militar vai me aceitar Júlio. E pode contar para o Ursão, ele já sabe mesmo, por que você acha que eu estou de castigo? E outra coisa vocês não vão nem saber disso. — Ela diz debochada. Essa menina é foda! — Gaia, você vai fazer o papai ter um enfarto. — Maria diz rindo. — Vou nada, ele é saudável demais para isso. Se ele não enfartou com as loucuras da dona Yza, não vai ser comigo que ele vai enfartar. — Ela diz e sai andando. — Acho que um internato fora do Brasil é o melhor. Essa garota está ficando sem noção, se com essa idade já está assim, imagina quando for maior de idade? Voltamos para a sala e quando é meia noite e meia a campainha toca. Quando vou atender, vejo meu pai todo arrumado junto com os meus tios, Otávio e meu avô. Douglas e minha avó Marta também estão com eles. — Vai se arrumar, vamos ver o que aquelas malucas estão aprontando. Dodô e minha mãe vão ficar com as crianças até voltarmos. — Meu pai diz sério. Nem reclamo, corro para o meu quarto e me troco rapidamente, pego minha carteira e volto para a sala. Nem dou tchau direito para as crianças e sigo meu pai para o carro. Nos dividimos em três carros, eu e meu pai num, Dylan e Otávio noutro e meu avô e Donatello no último. Chegamos em frente à boate uma hora da manhã em ponto. Saímos todos dos carros e nos reunimos na entrada.
— Vamos só vigiar, se virmos algo de anormal aí nós aparecemos. — Meu pai diz. Entramos todos juntos e rodamos até encontrar as malucas, que estão em uma mesa na área VIP. Só as vejo bebendo e dançando, meu pai pede uma garrafa de uísque e ficamos só observando o movimento. Alguns filhos da puta agarram a Vida pela cintura e minha vontade é de subir e socar a cara deles, mas logo ela se livra deles e eu me acalmo. — Sua Vida é realmente linda, Júlio. E tem um gingado legal, que merda é aquela que ela está fazendo? — Dylan pergunta. — Eu não sei, mas a Belle ficou fazendo passinhos o dia inteiro em frente à televisão. —Meu vô diz rindo. Elas bebem muito e a cada hora ficam mais animadas. Vida já estava sem jaqueta, com a porra da barriga de fora. Meu pai também reclama que minha mãe tirou a camiseta e agora estava usando um top muito rosa. Minha avó Belle, parece estar se dando bem com a Vida, elas estão cochichando uma com a outra sem parar desde que chegamos. Vejo quando a garçonete aparece uma hora depois, com outra garrafa de bebidas para elas. — Essas filhas da puta estão bebendo tequila! — Meu tio Don diz bravo. — Você viu isso daqui tio? — Não vi a garrafa, mas posso ver a Hanna balançando o que parece ser um saleiro e chupando o que deve ser limão, por isso a careta. — Donatello diz e todos nós passamos a prestar atenção. Nenhum deles é normal, todos sem exceção, são altamente ciumentos e possessivos. Uma hora depois, vou pegar uma água no bar e quando volto minha vó Belle e minha mãe estão na nossa rodinha. Depois de uma bronca daquelas, nós a acompanhamos até a mesa que elas estão e eu não vejo a
Vida em lugar nenhum. Vou até a Lila perguntar sobre ela. — Lila, onde está a maluca? — Fui no banheiro com ela, mas ela ficou, disse que ia retocar a maquiagem. —Lila responde. Espero mais alguns minutos e nada dela aparecer. Disfarço e vou atrás dela, o banheiro feminino tem uma pequena fila e eu peço para uma delas ver se a Vida está lá dentro. — Não tem ninguém lá não, só tem duas portas e as pessoas já saíram e outras entraram. Mas ali naquela porta é uma salinha, a maioria das meninas vai lá para recuperar o fôlego. — A mulher diz e eu vou até lá. Assim que abro a porta e entro, dou de cara com a maluca sentada no chão. Me aproximo dela e me ajoelho ao seu lado. — Ei Vida, você está bem? — Você me achou rabugento! Estava me escondendo de você. — Se escondendo de mim? Por quê? — Porque você é gostoso e não gosta de mim. Eu não queria sair com a sua mãe, mas ela não aceita não como resposta! Mas eu juro que vou bloquear ela ou mudar de número, assim você não vai ter mais um motivo para me odiar. — Ela diz com a fala arrastada. — Vamos sair do chão? Vou buscar uma água gelada para você, me espera aqui ok? — Ok. Saio da sala e vou até o bar e compro uma água gelada e volto para ela. Vida lavou o rosto e acabou borrando a maquiagem. E garota é linda, nem precisa de uma merda dessas. Ela está encostada na parede olhando para o teto, mas quando ouve a porta fechando ela dirige seu olhar para mim. — Aqui a água. Está se sentindo melhor?
— Obrigado. Não estava passando mal, estava me escondendo de você Rabugento. É preciso de muito mais do que eu bebi para me deixar mal. Ela abre a garrafinha e bebe metade da água, vou até a pia e pego algumas folhas de papel e começo a limpar o canto dos seus olhos que estão borrados. Ela respira fundo quando eu me aproximo e meus olhos vão para sua boca. Ela está mordendo seu lábio inferior e só de olhar me dá vontade de ser eu a morder. Sem me segurar, levo meu polegar até sua boca e faço com que ela solte e quando ela faz isso eu fico alisando onde está a marca dos seus dentes. — Por que você me odeia Júlio? Nunca te fiz nada, sempre te tratei bem, não entendo. —Ela pergunta baixinho, levanta seu rosto e me olha nos fundos dos meus olhos. — De onde você tirou isso? Eu não te odeio Vida. Só não sou sociável. —Falo aproximando minha boca da dela. — Mas você não gosta de mim. Sempre me olha feio, resmunga quando estou perto e sempre é grosso comigo. — Ela diz lambendo os lábios. — Por que você não sorri para mim, como você sorri para os outros? Eu gosto de vê-la sorrindo, de ouvir sua risada, mas sempre que eu chego perto você fecha a cara e para de rir. — Falo quase encostando minha boca na dela, sua respiração toca meu lábios e se eu lamber os meus, minha língua toca a sua boca. — Eu paro porque acho que você não gosta; você é sempre tão sério e calado. — Ela sussurra. Quando vou beijá-la, minha mãe entra na sala e nós nos separamos. — Ei! Nós já estamos indo... O que está acontecendo aqui? Não me diz que eu atrapalhei? Eu sou uma empata foda! Não posso acreditar nisso meu Brasil! Podem voltar ao que estavam fazendo meus lindos, nós podemos esperar para ir embora. —Minha mãe diz rapidamente e sai correndo.
Ela é foda! — É... Acho melhor a gente sair. Ela pode achar que estávamos namorando ou sei lá o que, ela é muito louca e não quero que ela pense besteira. Já me chama de nora, imagina se pensar que nós... — Ela diz desenfreada e toda tímida. —Vida? — Oi. — Fica caladinha, ok? Já percebi que você fala demais quando está nervosa. — Digo rindo e pego sua mão e a puxo para fora. Ela vai pôr todo o caminho calada e, quando encontramos o pessoal, todos nos olham com sorrisinhos maliciosos. — Ela não estava se sentindo bem, então levei uma garrafinha de água para ela. —Hum, sei... está melhor minha linda? Parece até mais corada. — Minha vó pergunta. — Estou sim, foi só um mal-estar. Vocês já vão embora? — Vida pergunta. — Sim, a conta já foi paga. —Minha mãe avisa. Nós saímos da boate e vamos até o estacionamento. Minha mãe e minha avó vão de braços dados com a Vida e eu não sei quem segura quem das três. Dona Belle se despede de todas e avisa sobre o almoço amanhã, ela abraça Vida, apertado e diz algo em seu ouvido fazendo-a arregalar os olhos. — Espero você na minha casa amanhã, Vida Martins. Mais tarde eu te ligo e passo o endereço, ficarei muito triste se não for. — Vovó ataca novamente! — Eu... Eu... Olha Belle, vou ser sincera com você. Eu amei conhecer todas vocês, mas não posso aceitar o convite por que... — Ela vai sim vovó, eu mesmo vou levá-la.
— O que? — Vida pergunta quase gritando. — Tchau para todos, vamos pai. Empurro Vida até o carro do meu pai. Vida e minha mãe vão sentadas na parte de trás. Eu me acomodo ao lado do meu pai, quando já estávamos chegando na casa do meu pai para pegar o carro dela, vejo que tanto ela quanto minha mãe estavam desmaiadas. — Você sabe onde ela mora filho? — Não, o senhor pode nos levar para o meu apartamento? Amanhã venho com ela pegar o carro. A vovó deve estar doida para ir embora, então é mais fácil irmos para lá. — Ok. Ele nos leva para a minha casa e me ajuda a tirá-la do carro, me entregando sua bolsa. O porteiro logo me ajuda, abrindo a porta e chamando o elevador. Quando chego no meu andar, minha vó já nos esperava na porta e me ajuda a levar a Vida para o meu quarto. Eu a coloco na cama e saio para minha vó trocar a roupa dela. Depois que ela termina, a levo e o Dodô até a porta e me despeço deles. Vou olhar todas as crianças, que dormem feito uns anjos. Só assim para eles darem sossego. Tomo um banho no quarto de hóspedes, visto uma bermuda que peguei na lavanderia e vou dar uma última olhada naquela maluca. Quando abro a porta, ela está tentando se levantar. — Ei, aonde você vai? — Preciso ir ao banheiro urgente! Eu a levo até o banheiro, ela se ajoelha no vaso e vomita tudo o que tem no estômago. Eu seguro seus cabelos e espero terminar, depois eu pego Vida no colo e a sento na pia, ajudando-a a escovar os dentes e volto para o quarto, colocando-a na cama, levantando-me para buscar um remédio. Pego
dois comprimidos de ADVIL e um copo de água e a faço tomar. Ela se deita novamente e eu me viro para sair do quarto. — Você pode ficar um pouco comigo? Me sinto tão sozinha, eu juro que fico quietinha. Só até eu dormi, por favor. Não sei, porém, senti uma dorzinha ao ouvi-la dizer isso. Sento ao seu lado e encosto minhas costas na cabeceira e estico minhas pernas. Ela encosta seu corpo perto do meu e respira fundo fechando os olhos, mas depois os abre e procura a minha mão, segurando apertado. Fico olhando ela pegar no sono, me perguntando por que ela disse que se sente sozinha. Várias coisas passam pela minha cabeça, até que o sono chega e eu me entrego a ele.
Acordo sentindo um peso quente em meu peito, a sensação não é ruim e sim reconfortante. E então esse peso se mexe e suspira, se acomodando ainda mais em meu corpo. Poderia achar estranho, se eu não soubesse de quem é esse peso e principalmente a quem pertence o cheiro que me rodeia. Meus braços estão rodeando seu corpo, enquanto sua cabeça repousa abaixo do meu queixo e bem em cima do meu coração. Nunca dormir abraçado com ninguém, nem mesmo com a Maria, que muitas vezes dormiu comigo. Sempre foi cada um no seu canto, no máximo segurando a sua mão. Nunca fui aconchegar-me, mas eu serei um filho da puta se eu não estiver gostando dessa sensação. Estava dormindo do meu lado apenas segurando sua mão, já que foi ela mesma que agarrou a minha fortemente e não soltou, garantindo que eu não a deixasse. De repente ela começou a choramingar várias vezes e eu a puxei para os meus braços, fazendo com que ela suspirasse e voltasse a dormir em paz.
Enfim eu crio coragem e abro meus olhos, só então percebo que já clareou e olho para o relógio e vejo que já são dez horas da manhã. Olho para o rosto dela e vejo o quanto ela é linda dormindo e principalmente em silêncio. Tiro alguns fios de cabelo de seu rosto e, ela se mexe, esfregando seu nariz no meu peito. Vida parece uma gatinha se esfregando para só então se aconchegar. Respiro fundo, sentindo o seu perfume mais uma vez e só então me levanto lentamente, a acomodando no travesseiro. Ando pelo meu quarto, que sempre foi o meu santuário e pego uma cueca, calça jeans e vou para o banheiro. Tomo um banho quente e revigorante, tentando clarear um pouco a minha mente para tentar entender essa mistura de sensações novas que estão dentro de mim. Saio do banho e me olho no espelho, vendo o mesmo Júlio que vi ontem e anteontem, e mês passado e nos outros meses anteriores. Mas ainda assim estou me sentindo diferente, não sei dizer bem ao certo o que é; só sei que alguma coisa mudou. Visto a cueca e me enrolo na toalha e saio para dar uma espiada nela, que ainda se encontra desmaiada e tomando conta da cama inteira. Sorrio ao ver a cena na minha frente, e constato o quanto ela é folgada e espaçosa. Vida puxou o meu travesseiro e está abraçada a ele. Ontem minha avó a ajudou a trocar de roupa e colocou um casaco meu que estava em cima da cama. Eu sempre ouvi meu pai falando que amava ver minha mãe usando suas camisas, mas eu nunca entendi a graça disso. Não até agora. Vê-la usando o meu casaco, saber que sua pele suave está em contato com uma roupa minha, me faz sentir protetor, possessivo, como se isso fosse a coisa certa. Como se ela tivesse nascido para fazer isso. Confuso não é? Para você ver como está a minha cabeça. Volto para o banheiro, escovo os dentes, dou uma aparada na minha
barba e só então visto a calça. Quando abro a porta lentamente, vejo que ela está acordada e abraçada com o travesseiro e cheirando ele. Eu me encosto ao batente da porta e seguro o riso ao ver ela fazendo mais uma das suas esquisitices. De olhos fechados ela abre um enorme sorriso e se joga para trás. Antes que eu pudesse avisar, ela já tinha caído, dando meio que uma cambalhota e levando as cobertas com ela, se transformando em uma bagunça imensa. — Mas que merda que eu fiz! —Ela exclama brava, achando que estava sozinha. Sem conseguir me conter, acabo gargalhando alto, mal me aguentando em minhas pernas. A garota é completamente louca, sem um pingo de noção do perigo ou das suas loucuras. Eu me levanto e me apoio na porta do banheiro, segurando o riso no exato momento que ela dá um pulo e fica em pé me olhando de boca aberta, mas acaba se embolando nas cobertas e caindo de cara na cama. — Ok! Fica ai paradinha ou vai acabar se matando. E ela faz exatamente o que pedi e eu vou até ela, tirando as cobertas que estavam emboladas em suas pernas. Assim que fica livre, ela se senta na cama e me olha com os olhos arregalados. — Você deu risada! Isso é muito injusto, sabia? Eu quase quebrei o meu pescoço só para fazê-lo rir e eu não conseguir ver! Que desgraça de coberta dos infernos. — Ela diz brava e eu acabo sorrindo do jeitinho dela. — Eu sabia! — Sabia do que, menina maluca? —Pergunto enquanto vou até a cômoda pegar uma camisa. — Seu sorriso, eu sabia que ele era lindo. Você deveria rir mais, Rabugento, mesmo que de mal humor você seja lindo. Mas sorrindo é bem
mais. — Não é sempre que isso acontece, Vida. Não é nada contra a sua pessoa, é de mim mesmo. — Então temos que trabalhar para mudar isso! Um sorriso não pode ser negado, muito menos desperdiçado. É... Você sabe onde estão as minhas roupas? Não posso ir buscar meu carro vestindo só um casaco, mesmo que ele seja lindo, macio e cheiroso. —Ela diz cheirando o casaco. — Hum, obrigado? —Falo e ela me olha sem entender. — O elogio pelo casaco, ele é meu e o cheiro é o meu perfume. Minha avó o colocou em você ontem à noite. — Me mate senhor! —Ela diz olhando para o teto. — Posso usar o seu banheiro? Aceno que sim e entrego sua calça jeans, não sei aonde minha avó deixou o resto das roupas dela. Vida pega a calça e corre para o banheiro. Eu fico rindo sozinho das loucuras dessa garota. Eu posso ouvi-la falando sozinha, dizendo que iria roubar o meu casaco e nunca mais ia devolver. E que iria roubar o meu perfume também, porque era gostoso como eu. Eu deito na cama e finjo não ouvir seu monólogo dentro do banheiro. Levanto da cama e começo a arrumar e dobrar os cobertores, ajeitar os travesseiros e, dez minutos depois ela abre a porta do banheiro e posso sentir o cheiro do meu perfume exalar no ar. Eu cruzo os braços e seguro o riso, porque ela me olha como se fosse a menina mais inocente do mundo. — É... Oi, tudo bom? Bom dia Júlio, eu usei uma escova de dente que estava na embalagem em cima da pia. Depois eu compro outra e devolvo tudo bem? — Eu deixei lá para você usar, Vida. Você vai embora usando o meu casaco? Eu achei a sua jaqueta e o top que estava usando. — Cutuco só para ver o que ela iria falar.
— Ai que bom! Eu amo essa jaqueta. Mas posso te devolver o casaco depois? Estou morrendo de frio, acho que estou ficando doente. — Será isso mesmo? —Pergunto caminhando em sua direção. — Eu tenho a imunidade baixa e vivo ficando com febre... To... Toda semana na realidade. — Ela diz gaguejando e começa a andar para trás até bater as costas na parede. — Hum... agora fiquei preocupado, deixe-me ver se você está com febre. Encosto meu corpo ao dela e coloco minha mão na sua testa, fingindo medir a sua temperatura. Escorrego minha mão pelo seu rosto até alcançar o seu pescoço e vejo ela prender a respiração. —Está quente mesmo. — Praticamente pegando fogo. —Ela diz baixinho. — Só não sei se é a sua pele que está quente pela febre, ou se é a minha mão que está quente. Quando a Maria era bebê, minha vizinha me ensinou a ver de outro jeito se ela estava com febre ou não. Quer saber como? — Como? — Ela me mandava tocar com os lábios, porque eles são sensíveis a temperaturas altas. Deixa-me ver se ainda sei fazer. — Falo baixinho e toco sua testa com os meus lábios. A graça acabou faz tempo, desde que a toquei minutos atrás. Deslizo meus lábios por sua testa, desço pelo seu rosto até a sua orelha. Aproveito e cheiro um pouco mais de sua pele, mas só sinto o meu cheiro nela. Passo minha boca por todo o seu pescoço, fazendo com que ela gema baixinho. Ouvi-la gemer assim toda manhosa, provoca coisas abaixo da minha cintura. — Eu estou tão quente, que parece que um vulcão está dentro de mim. —Ela diz baixinho. — Isso é muito preocupante, Vida. Tão quente assim? —Pergunto
com a boca quase colada a dela e a diabinha lambe os lábios, tocando minha boca com a sua língua. — Bom dia Juju! A vovó ligou e....Eita! Desculpa aí. — Luna diz e sai correndo. —Ah qual é universo, tá de sacanagem? —Vida diz alto revoltada. — Vamos menina revoltada, as crianças já estão acordadas. Vamos tomar café. É... O universo tá jogando contra esse beijo.
Vida Martins Eu acordei em uma cama diferente, um quarto diferente e nunca dormir tão bem na minha vida. Sento na cama e agarro o travesseiro macio e cheiroso, ele tem o cheiro do Rabugento. Olho em volta e reparo no quarto, bem decorado e masculino também. A cama está uma bagunça, lençóis, edredons, tudo revirado. Vejo na mesinha um porta-retratos com a foto da Maria e da Yza no colo do Júlio, todos os três sorrindo felizes. Ele tem o sorriso tão perfeito, pena que não sorri todos os dias, mas eu fiz uma promessa a mim mesma; fazê-lo sorrir pelo menos três vezes por dia, tipo remédio controlado. Acabo rindo de mim mesma e cheiro mais um pouco o travesseiro. Hoje estou me sentindo tão bem, descansada, como a muito tempo não sentia. Fecho os olhos e sorrio brindando o fato de estar viva. Me jogo para trás e nem percebo que estava na beirada da cama e acabo me estabacando no chão, levando todos os cobertores comigo. Nesse momento escuto um som lindo, uma gargalhada contagiante que me faz sorrir, mesmo tendo pagado um mico. Me levanto do chão com um pulo e vejo ele parar de rir e me olhar todo sério, mas posso ver que ele está segurando a risada.
Ele realmente é lindo! Olha esse corpo. E essas tatuagens? Ele tem tatuagens nos pés, me inclino para ver e acabo caindo de cara na cama. Seria cômico se não fosse trágico! Eu não sei ser normal gente, principalmente quando esse homem está envolvido. Ele ajuda a me livrar das cobertas safadas que me derrubaram e, entramos em um diálogo meio doido sobre seu sorriso, que realmente é um espetáculo. Isso eu já desconfiava, um homem lindo assim só poderia ter o sorriso perfeito. Então as coisas começaram a ficar estranhas depois que saí do banheiro, o assunto começou sobre o casaco dele que estou vestindo e que não vou devolver, já até dei umas borrifadas de perfume, recarregando o casaco com o cheiro dele. De repente estamos falando de febre, temperatura, vulcão. Juro que não sei como chegamos a isso, só sei que estou me sentindo quente; muito quente, principalmente depois que suas mãos me tocaram e, quando ele percorreu meu pescoço com a sua boca, foi como se uma descarga elétrica atingisse meu corpo me fazendo gemer baixinho. Certas partes do meu corpo começaram a pulsar ao senti-lo me tocar, nossas bocas ficaram a milímetros de distância e quando lambi meus lábios, minha língua chegou a tocar rapidamente sua boca pecaminosa, entretanto Deus com o seu humor negro, mais uma vez interrompeu o beijo que tanto desejo e que está de rosca para sair. Uma menina linda entrou no quarto falando descontroladamente, fazendo com que o Júlio se afastasse de mim. Assim que ela sai correndo, eu começo a amaldiçoar mentalmente, mas como sempre, algumas coisas saem em voz alta. —Ah qual é universo, tá de sacanagem? Júlio solta uma risadinha baixa, pega sua carteira e me estende a mão. — Vamos menina revoltada, as crianças já estão acordadas. Vamos
tomar café. —Ele diz e, quando seguro sua mão, sai me puxando porta afora. Entramos na sala e vejo várias crianças lindas. Dois meninos lindos, sendo que um deles tem os olhos mais perfeitos que já vi; é como olhar o céu em dia de verão. O outro também é lindo, tem os olhos esverdeados e intensos. Uma menina linda está sentada do lado da Olívia, vestindo uma camiseta o escrito "Abusadamente". Ela me lembra muito a Yza, até o sorriso é idêntico. Também vejo Maria e a menina loira, aquela que atrapalhou o beijo que eu ia ganhar. — Bom dia pivetada, essa é a Vida. Uma amiga minha que trabalha na construtora, ela é decoradora. — Júlio me apresenta. — Aquele ali de boné é o Valentin, o outro é o Vicente e a Loirinha é a Luna eles são filhos da Katrisca. A Olívia você já conheceu, e aquela mocinha ali é a Gaia, minha irmã e a Maria você já conheceu também. — Oi pessoal. — Todos me cumprimentam menos Maria que está me fuzilando com os olhos e; só então eu vejo que o Júlio ainda está segurando a minha mão. Lentamente eu tento soltar, mas ele segura mais apertado e me olha confuso. Ele me puxa para a cozinha e me coloca sentada em um banco no balcão. Eu não falo nada, fico só olhando surpresa, pois ele me pegou e me colocou onde ele queria. Júlio mexe numa máquina de café e em poucos minutos o cheiro do líquido divino preenche o ar. As crianças vão entrando na cozinha e se acomodam ao meu lado, Maria e a Luna vão até a geladeira e começam a tirar várias coisas de dentro dela. — Então você é a namorada do meu irmão? Aquela que está deixando a Maria, muito possessiva da vida toda? — Gaia pergunta séria. — Eu... é....eu sou só uma amiga, ontem eu saí com a sua mãe e bebi um pouco demais e acabei dormindo no carro. Então seu irmão me trouxe
para a casa dele, mas eu já estou indo embora. — Agora dormir na mesma cama tem outro nome? Porque vocês estavam bem agarrados, eu mesmo vi. — Dessa vez é o Valentin que pergunta todo debochado. — Podem parar com isso? — Júlio ralha com eles. — Mas eu vi mesmo, fui lá avisar que a vovó Belle estava no telefone e queria falar com você, aí eu vi vocês dormindo agarradinho e falei para ela, a velha é doida mesmo, acredita que ela me mandou tirar uma foto de vocês dormindo? —Ele responde ao Júlio. — E você não tirou, não é? — Lógico... Que tirei né! Ninguém diz não para a minha vó Belle. Ela é louca, Vida. Louquinha de pedra. — Ele diz e eu escondo meu rosto já prevendo as piadinhas que ela vai soltar. Rabugento me entrega uma enorme caneca de café e eu agradeço baixinho. Vejo as meninas mais velhas prepararem sanduíches para todo mundo, as duas tem uma sintonia incrível e eu fico admirando. Maria levanta o rosto e me olha, eu sorrio, porém ela me ignora. O que será que eu fiz? Será que ela é rabugenta igual ao irmão? A campainha toca e Olívia corre para atender. — Tio ursão! Me solta, Yaya manda ele me colocar no chão. — Olívia diz gargalhando. — Se vira dinamite! — Ouço Yza responder. — Bom dia pessoal. Bom dia Vida dormiu bem? Esse sorrisinho debochado dela, só me diz que a Belle mostrou a foto para ela. Gael entra na cozinha e eu fico bestificada com a beleza desse homem. Não é que eu me sinta atraída por ele, porque não estou, mas eu não sou cega Brasil. O homem é um gigante belíssimo, forte, todo tatuado e com cara de
mau. Ele é tipicamente o mocinho motoqueiro dos livros que eu leio. Ele se veste tipo um garotão, bermuda jeans, regata e havaianas. Ele e Yza fazem um casal babado, os dois são lindos que chega a ser falta de educação. — Pare de babar no meu pai! — Júlio grunhi no meu ouvido. — Isso foi um grunhido? Tipo assim, você rosnou? —Pergunto surpresa. — Pare de babar! —Ele diz bravo. — Quer café pai? — Quero. —Gael responde e até a voz desse homem é linda. — Deus é mais! — Vida, minha nora preferida. Acho melhor você tomar cuidado ou o meu ursinho vai ter uma síncope de tanto ciúmes. —Yza diz rindo. —O que? —Pergunto sem entender. — Mas eu não estou fazendo nada, Yza. Juro juradinho. Só estava admirando o quanto seu marido é bonito... Não! Não é isso, mas é que ele é grande né e têm todas essas tatuagens lindas, mas eu juro que olhei sem malícia viu. Ele é bonito, muito bonito, mas o Rabugento é mais. Ok; vou embora, foi bom ver vocês, mas vou me jogar do pé abóbora. Levanto da mesa e começo a sair da cozinha, mas sou pega pela cintura, levantada no ar e colocada no banco novamente. — Senta sua bunda maluca aí e pare de babar no meu pai cacete! — Ele diz baixinho. — Olha aqui, Rabugento, pare de ficar me carregando assim porque não sou nenhum saco de batata, nem peso para isso eu tenho. E você não manda em mim, cadê o direito de ir e vir? Cadê o livre árbitro? Eu hein, nem me beijou e já quer sentar no comando do meu carrinho, sai daí viu! Yza e Gael gargalham e eu me calo, já passei vergonha para uma vida inteira com essa família. — Eu trouxe seu carro, Vida. Ele precisa passar por uma revisão, está
fazendo uns barulhos estranhos. Você trocou o óleo dele quando? —Gael pergunta. — É o que? Meu carro é novo, Gael. Eles não deveriam ter trocado esse óleo não? Vou olhar o manual dele, onde fica esse óleo? Todos ficam em silêncio, mas depois começam a gargalhar alto. Yza cuspiu o seu café no balcão inteiro, Gael corre para socorrer a esposa. — Essa garota é de verdade? —Vicente pergunta sério. — Por que você perguntou isso? Eu sou decoradora, não entendo de carro, Vicente. Vai fazer seis meses que comprei esse carro. Aonde eu vejo isso? — Vou levar na oficina para você, amanhã passo na construtora e eu pego as chaves. Vou levar na oficina onde levo os meus carros. — Gael diz. — Não precisa pai, amanhã eu ligo na oficina e peço para irem buscar o carro dela de manhã. —Júlio diz sério. — Nem um, nem outro! É só me passar o número e eu mesmo ligo e me informo. — Eu vou fazer isso e pronto! Agora, você quer o lanche das meninas ou ovos mexidos? —Ah Rabugento dos infernos! Ele sempre foi assim? INSUPORTÁVEL! —NÃO! —Todos dizem ao mesmo tempo. — Então Colorida, vai querer o que? Vale à pena dizer que quero matá-lo? Porque eu quero!
Eu vou vomitar! Sério, Meu Brasil Brasileiro, meu mulato inzoneiro. Vou cantar-te nos meus versos Brasil. Meu Brasil samba que dá Bamboleio, que faz ginga. O Brasil do meu amor, Terra de nosso Senhor! Preciso de ajuda psicológica, tipo uma camisa de força. Isso já ajudava muito. Eu tentei gente, juro que tentei, mas aqui estou eu, numa fazenda incrível, em um almoço de família digna da capa da revista Caras. Não tem uma unha feia sequer nesse povo! Estou me sentindo a Cinderela, sabe? Toda molambenta, descabelada, até uma espinha nasceu na minha bochecha. Eu não queria vir, arrumei inúmeros pretextos, até um cachorro eu inventei. Só me fodi, porque agora vou ter que arrumar um cachorro, eu que não vou sair como mentirosa. Mesmo sendo! Yza pura sacanagem D'Ávila, até roupa para mim essa mulher trouxe. Será que ninguém viu que essa amizade vai dar merda? Eu não sou certa das ideias, sou estranha, esquisita, faço merda para caralho, não tenho filtro e ela
não fica atrás não! Yza é descompensada com força, uma amizade entre nós duas é receita certa para o desastre, mas alguém me escuta? NÃO! Também não quero reclamação quando der merda, só digo isso. Todos me receberam muito bem, me fizeram sentir em casa. Conheci o resto da quadrilha mirim e a Lou e a peixinha são as minhas preferidas, essa tem a todos enrolada no dedo mindinho. Valentin é tipo o pestinha versão repaginada, entretanto quem mais me chamou a atenção foi a Maria. Ela foi a única que não falou comigo, não chegou perto de mim e me olha de rabo de olho. Eu tenho certeza que ela está com ciúmes do irmão, pois reparei que eles são muito ligados um no outro, não que com as outras irmãs seja diferente, mas eles têm uma cumplicidade gigantesca. Me lembra muito Levi e eu. Minha ligação com ele era muito mais forte que com o outro. Acho que por ele ser mais como eu, alto astral, diabinho, Valentin faz com que eu me lembre dele quando solta aquele sorriso de lado. Nem preciso dizer que paguei mico, não é? Gente, eu não sirvo para estar no meio de muitas pessoas, eu falo muita merda. Conheci os homens da família Reed. Dylan, Donatello e Willians. Gente eu juro que não sou safada, quer dizer às vezes eu sou, mas nunca com homem casado. Quando a Yza me empurrou porta adentro, eu travei no meio da sala quando eu vi esse trio. — É sério isso! Qual é Divino Espírito Santo, agora você virou João Cléber? Caí em um teste de fidelidade? E aquele ditado: desta água não beberei era só por falar mesmo? Porque eu mergulhava e até me afogava! — Como sempre, mais uma vez, novamente eu falo em voz alta. A gargalhada tomou conta de todo o lugar e tudo o que eu queria era voltar para os testículos do meu pai e ficar lá para sempre! — Gente, essa é a Vida do Júlio, quer dizer, do Rabugento. —Olívia diz acabando com a minha dignidade.
Vida do Júlio? Bem que eu queria viu, mas o universo não colabora! Todos foram um amor, me trataram com muito carinho e isso fez com que eu sentisse ainda mais a falta da minha família. A tarde cai, todos estão reunidos tomando um vinho e conversando depois do almoço. As crianças estão assistindo televisão, Luna está no colo do Rabugento mostrando alguma coisa no celular. Eu peço licença para ir ao banheiro e quando saio, vejo a Maria sentada sozinha na cozinha comendo um enorme pedaço de bolo. Quando ela escuta os meus passos, levanta o rosto e me olha feio. — Ei Maria. — Oi. — Ela diz seca e eu resolvo insistir em fazer amizade com ela. — Você não foi muito com a minha cara, não é mesmo? Posso te perguntar o porquê? — Não sei. Você gosta do meu irmão, tipo para namorar? — Ela pergunta séria e eu penso muito antes de responder. — Uau, essa está difícil de responder. — Falo rindo nervosa. — Eu achei o seu irmão o homem mais lindo que vi, assim que eu o conheci na construtora. Quantos anos você tem? — Vou fazer dezesseis. — Ok. Não vou mentir e dizer que não me sinto atraída pelo seu irmão, mas eu não sei nada sobre ele ainda. Ele é meio rabugento, mal humorado e muitas vezes grosseiro comigo. Mas sabe o que mais me chamou a atenção nele? Seus olhos. — Por que os olhos? — Porque eles são tão tristes, sem aquele brilho de felicidade sabe. Não sei o que aconteceu e nem sei se eu estou certa de que é tristeza. Não aceitei o fato dele me tratar mal, não sei lidar com isso, porque eu trato todo mundo bem, sou simpática e amiga, vivo alegre e feliz. Porque eu aprendi
que a vida é um sopro e muito preciosa para ser desperdiçada sendo rabugenta. — Falo sincera e ela me olha séria. — Nenhuma vida é igual à outra, sabe? Cada pessoa tem a sua história, suas marcas, seus medos. Talvez você leve a vida assim, porque não teve nenhum problema ou passou por coisas tristes. — Ela diz me olhando nos olhos. Eu sorrio fracamente. Se ela soubesse da missa um terço. — Um dia Maria, eu vou te contar como foi a minha vida, aí você vai entender por que sou assim. Não te conto agora, pois não é o momento, entretanto o que posso te dizer sem te dar muito spoiler, é que foram os meus traumas e o meu passado que me transformaram no que sou hoje. Eu sou sozinha, Maria e aprendi a ser feliz com o que eu tenho, mesmo que às vezes doa ser feliz e estar viva. Espero que possamos ser amigas, independentemente de gostar do Rabugento ou não. — Falo, levantando do banco e indo para o quintal. — Vida? — Oi. — Também gostaria de ser sua amiga. —Ela diz sorrindo. — Na minha cabeça nós já somos, era só questão de tempo para você descobrir. Saio para o quintal e vejo toda a família do Júlio reunida, se fosse há alguns minutos atrás eu estaria rindo da bagunça, mas agora a saudade e a tristeza bateram e, tudo o que quero é ficar sozinha. Preciso ficar sozinha. Pego o meu celular e peço um UBER pelo aplicativo, chega à mensagem que em dez minutos o carro já vai estar aqui. Enrolo um pouco para me despedir, pego minha bolsa e vou até a Belle e a Yza. — Ei norinha, tudo bem? —Yza pergunta preocupada e tudo o que quero fazer é chorar.
Meu celular apita, mostrando que o carro já está chegando. — Eu gostaria de agradecer por terem me recebido, pelo carinho e principalmente pela atenção. Estou com um começo de enxaqueca e não quero estragar o restante do dia de vocês, por isso pedi um UBER e ele já chegou. Só vim me despedir e agradecer pela hospitalidade. Yza e Belle me olham, como se estivesse me analisando. Quando a Yza vai rebater, Belle a segura e vem me abraçar. — Não sei o que está passando nessa sua cabecinha, mas saiba que se quiser conversar ou somente chorar, me liga que eu te dou colo. —Belle diz baixinho em meu ouvido e eu mordo meus lábios com força. — Obrigado, Belle. Você pode dar tchau para todos? — Claro meu bem, vai em paz e se cuida. Yza me abraça apertado e eu saio correndo assim que elas somem de vista. Entro no carro e passo meu endereço, quando chego em casa, pago a corrida e me tranco dentro do quarto. Arranco minhas roupas e vou direto para o banheiro, não sem antes agarrar o porta-retratos com a foto da minha família. Ligo a torneira para encher a banheira e sem esperar, entro e me sento curvada agarrada a foto da minha família, deixando o choro sair com força total. Sinto falta deles todos os dias da minha droga de vida, fico pensando no significado de somente eu ter sobrevivido. É muito ruim ser sozinha, não ter o colo da minha mãe, os conselhos do meu pai ou a farra com os meus irmãos. Nossos finais de semana de bagunça, nossas viagens e até mesmo as nossas brigas, sinto falta de tudo isso. Só que hoje, depois de ter presenciado a união e o amor da família da Yza, da minha pequena conversa com a Maria, essa saudade só aumentou. — Mamãe eu sinto tanta, mas tanta saudade. Hoje esse sentimento de solidão está mais forte que nunca. É quase uma dor física.
Só por hoje, vou deixar essa dor doer. Só por hoje, vou me deixar sofrer. E amanhã será um novo dia, um novo começo e então guardarei essa dor e seguirei sorrindo.
Estou completamente perdido. Não sei o que aconteceu, não sei por que ela não atende o telefone e não está vindo trabalhar. Não acredito na desculpa de que ela está doente, se fosse isso, ela aceitaria os cuidados que o Otávio ofereceu. Me sinto perdido, pois dois dias atrás tudo estava bem. Achei que estávamos nos entendendo, que ela tinha gostado da minha família. Todos gostaram dela, do seu bom humor, da sua conversa. Será que aconteceu alguma coisa ou alguém falou algo que ela não gostou? Minha cabeça vai pirar de tanto pensar nisso. Dois dias, ela não aparece para trabalhar há dois dias! Não consigo prestar atenção em nada, alguma coisa me diz que algo está errado. — Júlio? — Otávio chama a minha atenção pela décima vez só hoje. — Desculpa Otávio, o que você disse? — O que está acontecendo? Nunca te vi assim antes, avoado, perdido. Quer conversar? — Você notou alguma coisa estranha no domingo? Viu se alguém falou alguma coisa para Vida? Sei lá, uma piada sem graça ou a ofendeu de algum modo? — Se você está fazendo essas perguntas; então, não conhece sua família. Nós jamais iríamos ofender ou magoar alguém, principalmente uma menina especial como a Vida. Por que você acha isso? — Eu mandei mensagem, liguei, mas ela não me retornou ou me
atendeu. Eu não acredito que ela esteja doente, a maluca trabalhou com o joelho ralado a tarde toda, depois que caiu na obra. Não sei, mas eu acho que tem alguma coisa errada. — Ela acabou de ligar, era isso que eu estava falando e você não me ouviu. Ela disse que ainda está mal e que não vai vir amanhã, perguntou se eu poderia mandar um office-boy com as coisas dela, para ela trabalhar de casa. —Ele diz sério. — Eu levo, vou descobrir que merda está acontecendo. Você sabe onde ela mora? — Sei, ela mora naquela vila perto da casa da sua mãe. Aquela vila bonitinha, que estávamos falando outro dia, porém vou pegar o endereço nos arquivos de funcionários e as coisas dela para você poder levar. Ele sai enquanto desligo o computador, guardo minhas coisas na mochila, pego meu celular, as chaves; deixo a minha sala e vou até a sala do Tavinho. Eu estou agoniado, não sei dizer o porquê, mas estou inquieto demais. Não consigo esperar o Otávio e vou atrás dele na sala de reuniões e encontro ele colocando as bagunça dela na pasta. —Eita que você está ansioso! Calma, menino ela não está morrendo não. — Cala boca idiota! —Tomo a pasta das mãos dele e saio andando. — Oh idiota dois, não está esquecendo nada não? — O que? — O endereço idiota! Como você vai chegar até ela sem isso? —Ele diz balançando um pedaço de papel que eu pego rapidamente. — Me lembra o porquê a Lila ainda é casada com você? Acho que preciso colocar uma luz na cabeça dela. —Saio andando e deixo o idiota rindo sozinho. — Porque sou bom de cama moleque! Ela separa de mim, mas não
larga meu corpo. Eu acabo rindo das merdas que ele diz. Sério, eles são dois palhaços só por Deus. Ligo o som e vou em direção a casa da Colorida, passo pela casa dos meus pais e vejo que a maluca mora perto da maluca Master, mais conhecida como minha mãe. Estaciono meu carro em frente à entrada da vila, pego minhas coisas e saio. Uma senhora me olha insistentemente, e eu sorrio para ela. — Boa noite, a senhora poderia me informar onde a Vida Martins mora? — E quem seria o senhor? Olha, a menina pode não ter família, mas aqui todo mundo gosta dela. —A senhorinha diz desconfiada. — Nós trabalhamos juntos e vim trazer algumas coisas para ela trabalhar de casa. — A sim, tudo bem. Ela mora no número 322. É a única casa que tem um tapete rosa choque na entrada. — Obrigado e tenha uma boa noite. Vou procurando até que encontro o bendito tapete rosa. É tão chamativo, que fico imaginando como deve ser olhar para ele durante o dia. Aperto a campainha e aguardo alguns segundos. Ela abre falando sem parar e nem ao menos olha para saber quem é. — Mimi, eu já falei que não estou com fome, para de me entupir de comida. Desse jeito minha bunda não vai caber no meu jeans. — Oi? — Rabugento! —Ela exclama surpresa e se atrapalha com as pernas, caindo de bunda no chão. — Jesus amado! —Vou até ela e a ajudo a levantar do chão. — Só pode ser brincadeira garota! Eu a levanto e reparo em seu rosto. Vida está abatida, com olheiras
monstruosas e os olhos inchados e vermelhos. Ela está vestindo o meu casaco, meias cor de rosa nos pés e seu cabelo está preso em um coque bagunçado. — O que você veio fazer aqui? —Ela pergunta séria. — Quero saber o que está acontecendo, por que você não foi trabalhar nesses dias. E não venha dizer que está doente, mesmo que pareça, eu sei que não está. — Você quer dizer que eu estou feia? E eu estou me sentindo doente sim. Fico olhando para ela e sei que ela está mentindo. Vida está escondendo alguma coisa e eu vou descobrir o que é. — Você comeu hoje? Quando foi a última vez que você conseguiu dormir? —Falo me aproximando dela. — Não sinto fome, Júlio. E estou sem dormir a dois dias, a última vez que dormi foi na sua casa. —Ela responde, parecendo uma menininha quando o pai briga. Vejo tanta vulnerabilidade nela, como se ela estivesse perdida, sozinha e isso mexe comigo, mexe tanto que me surpreende. Me aproximo dela e toco seu rosto delicadamente, ela fecha os olhos e suspira. Quando abre os olhos novamente, eles estão cheios de lágrimas e, uma cai pelo seu rosto e eu a capturo com meus dedos. — O que você tem Vida? Por que tanta tristeza? — Saudades, Júlio, solidão, cansaço, me sinto infeliz entende? Às vezes não consigo ser cem por cento feliz, normal e eu sou humana, não é? Eu a entendo muito bem, só não consigo aceitar que ela se sinta assim. Essa garota é luz, positividade, alegria e vê-la assim tão triste, me deixa perdido. Me faz querer fazê-la rir, fazê-la feliz. Me aproximo mais dela, puxando seu corpo contra o meu. Aproximo minha boca da dela, dividindo
nossas respirações. — Posso te fazer uma pergunta? —Ela diz baixinho de olhos fechados. — Pergunta logo Colorida! —Falo e minha boca esbarra na dela. — Você vai me beijar, Rabugento? —Ela pergunta me fazendo sorrir. Não tem mais como fugir e esconder essa atração que nós dois estamos sentindo. É como se uma energia me puxasse para ela, como se fosse inevitável. Grudo minha boca na dela, dando pequenos beijos, como se testando o terreno para saber se é seguro. Ela toca o meu peito e eu mordo seu lábio inferior, fazendo com que ela solte um suspiro dando a abertura que eu precisava. Ela aperta minha camisa e eu a seguro pelo pescoço e mergulho em sua boca, tocando sua língua com a minha. No primeiro contato mais íntimo com ela, foi como se milhares de raios atravessassem meu corpo me causando arrepios dos pés à cabeça. Minha mão mergulha em seu cabelo e a outra circula sua cintura fina, colando seu corpo ainda mais ao meu. Ela rodeia meu pescoço com seus braços e aprofunda ainda mais o beijo. Não tem desespero, não tem pressa, é mais como se estivéssemos apreciando uma sobremesa lentamente com medo de acabar. Nada me pareceu tão bom e tão certo como esse beijo. A sensação de ter seu corpo colado ao meu, sua boca na minha, é a melhor sensação do mundo. Já beijei algumas garotas, mas nada foi igual. Nós separamos nossas bocas em busca de ar e ela me abraça apertado. Sinto seu corpo tremer assim como o meu. Escondo meu rosto em seu pescoço e me perco mais um pouco no seu cheiro, deixo pequenos beijos em seu pescoço até chegar ao seu ouvido. — Não gosto de vê-la triste, Vida. Você foi feita para a felicidade, rir,
vestir cores berrantes e dar bom dia para as moscas. Você não combina com a tristeza, então não vista o que não te pertence ok? — Você gosta de mim, não é Rabugento? Um pouquinho, mas eu sei que gosta. — Só um pipinho, como diz a Luna. Está tudo bem? — Ainda não, mas eu sei que vai ficar. Você pode me beijar mais um pouco? Tipo a noite toda? —Ela diz com um olhar pidão. — Só se você comer alguma coisa. — Nossa você ouviu esse barulho? É a minha barriga roncando! Estou morrendo de fome, comeria um boi de tanta fome. — Ela diz na cara de pau. — Então se troca que vou te levar para comer fora. — Mas vamos poder beijar, não é? Você prometeu, não pode voltar atrás por q.... — Eu a calo com outro beijo e ela amolece em meus braços. — Vá se trocar Colorida e, eu prometo que você vai ganhar muitos beijos. — Glória Deus! —Ela grita para o teto. — Aonde vamos? Eu comeria um hambúrguer com muito queijo, ou uma coxinha enorme ou duas. Podemos comer porcaria? — Vai se trocar Colorida! — Você é muito mandão, credo! Ela diz e sai correndo por um corredor, esse movimento rápido acaba mostrando sua calcinha e eu fecho meus olhos. Renda! Renda preta! Ela está usando a porra de uma calcinha preta de renda!
O relógio está marcando oito e dez da noite, quase todos estão reunidos na sala de jantar, só estamos esperando o Donatello chegar. A campainha toca e Lila corre para atender. — Foi mal, acabei me enrolando no escritório. —Donatello diz se desculpando e senta ao lado da Hanna. — Bem, vamos começar operação cupido! —Belle diz maquiavélica. — Otávio, o que sabemos até agora? — Bem, as coisas andam bem diferente do que o de costume. Temos brigas, birras, ciúmes e hoje teve um episódio de saudades e preocupação. É bem engraçado ver os dois interagindo, porque o Júlio é todo sério e compenetrado. Já a Vida é tipo aquelas maluca beleza? Paz e amor? Ela vive no mundinho colorido dela, sorri das próprias piadas. Ela é o avesso do nosso menino. — Uma das maiores interessadas nesse assunto, é você Yza. O que
achou da menina? —Belle pergunta. — Eu também sou um dos principais interessados, quero que meu filho seja feliz. — Gael retruca. — Vai cagar no mato, Gael! — Belle ralha com ele e todos nós rimos. — Eu amei essa menina, ela tem uma luz tão incrível. Ela é totalmente sem filtro, maluca, alegre e bebe feito um opala com o carburador furado. Já a quero como nora! —Yza diz sorrindo. — Eu também gostei dela. Ela é tão leve e feliz que é impossível ficar triste ao seu lado. Eu super apoio se o Júlio quiser namorar a Vida. Fora que a menina é linda e sabe dançar como ninguém. —Katrisca diz rindo. — Eu também apoio, acho que ela vai fazer muito bem para o Juju. —Hanna da sua opinião. — Ela é meio maluquinha, mas o que é isso perto da Yza e da Belle? Ela é contagiante, fala desesperadamente quando está nervosa, e na maioria das vezes só sai merda. Acho que meu filho precisa da leveza da Vida. — Gael diz sério e leva um tapa da Yza. Dylan e Donatello concordam com o Gael e começam a relembrar as merdas que a Vida soltou na fazenda. Virou uma bagunça, porque todo mundo começou a falar junto e a Belle chama a atenção de todos. — Silêncio seus idiotas! Eu também amei conhecer essa menina, ela tem uma pureza tão grande que me fez lembrar da Luna, quando pequena. Mas não gostei do seu olhar dela quando saiu correndo domingo, tinha tanta tristeza, tanto sofrimento. O que você sabe sobre ela, Otávio? — Belle pergunta séria. —Não muito, ela tem vinte e seis anos, não tem família nenhuma e não pensou duas vezes antes de se mudar para cá, quando ofereci o emprego para ela. Assim que a conheci, me encantei por ela, pelo seu bom humor e pelo seu trabalho. Mas quando ela me disse seu nome, alguma coisa em mim
me disse que ela era perfeita para o Júlio. — Ela é perfeita gente! Alegre, feliz, maluca, vive contando piadas sem graça, mas que fazem todos rirem só pelas suas gargalhadas. Ela é o oposto do Júlio e combina perfeitamente com ele. Vida, tudo o que o nosso menino precisa. Ele tem tudo gente, é lindo, inteligente, trabalhador, mas parou no tempo. Um menino da idade dele era para gostar da vida, do mundo, ter vários amigos, mas ele é tão sério, tão recluso. E a Vida conseguiu em poucas semanas o que nós não conseguimos em anos; quebrar a casca dele e trazê-lo a superfície. Eu vi mais sentimentos nele em uma semana, do que em dez anos e isso é maravilhoso. —Minha linda e gostosa esposa diz séria. — Eu concordo com a Lila. Eu nunca vi meu filho tão mexido por alguém, como ele está por essa menina. Ela está tirando ele da zona de conforto, ele não sabe o que está sentindo, está confuso, com medo. Está atraído por ela e só o pouco que ele me contou, a coisa é séria e intensa. — Gael diz e olha para Yza. — Já se nota a diferença nele, só pelas dúvidas que ele tem. Ele não sabia que se sentia atraído por ela, não sabe diferenciar o desejo que está sentindo e acaba confundindo as emoções. —Will diz sério. — Ele nunca brigou com ninguém, nunca foi rebelde, sempre foi simpático e educado. Com a Vida, entretanto, as coisas mudaram. Ele achava que não gostava dela, mas ele se sente atraído. Sabe quando éramos crianças e implicávamos com a menina mais bonita da escola? Tipo eu posso maltratar, mas você não pode? Ele age assim, ele briga, rosna, mas quando alguém chega perto dela ele surta. Ele fica vigiando quem fala com ela, para quem ela sorri e vai até a minha sala fofocar que os funcionários não estão trabalhando. Vocês têm noção disso? — Bem filho do Ursão mesmo! Eu percebi o ciúmes dele no dia que a conheci no shopping. Ela disse que só ele não gostava dela, da roupa dela e
do perfume dela, esse menino só faltou ter um treco gente. Queria que ela falasse quem eram as pessoas e que isso era assédio sexual! Eu sei que ele é ciumento, Maria, Luna e eu que o diga, mas nós somos sua família então é meio que, normal. Mas vê-lo agir assim com outra mulher, puta que pariu! É sério gente, os dois são quentes. —Yza conta animada. — E os apelidos? Rabugento e Colorida? Ela é afrontosa viu! Não se deixa intimidar tão fácil não! Essa é das minhas, já amo essa garota. — Katrisca diz rindo quando o Dylan a morde. — Eu não a vi desde domingo, ela ligou e disse que estava doente e não poderia trabalhar. Dois dias sem ela aparecer e esse menino estava perdido, parecia cachorrinho abandonado. Todo caído, triste e pensativo. Ele estava realmente preocupado com ela, pensando em inúmeras possibilidades para ela não atender seus telefonemas e suas mensagens. — Desde domingo? Doente? Por que você não falou isso antes, cacete!? —Yza pergunta preocupada. — Calma gente! — A menina é sozinha, não tem ninguém para cuidar dela aqui. Você não pensou nisso? —Lila diz brava me fuzilando com seus olhos de gata. — Eu não achei que era sério, ela disse que era uma enxaqueca e que já estava medicada. Mas não conseguia sair de casa por estar grogue de remédio. — Idiota! —As mulheres dizem ao mesmo tempo. — Ela deu essa desculpa no domingo, não acreditei muito nisso, mas não quis ser intrometida. —Belle diz pensativa. — Seria a primeira vez na vida! —Will diz rindo e Belle ataca uma caneta nele. — O nosso sapo foi socorrer a mocinha em perigo. Ela pediu para mandar um office-boy com as coisas dela, assim ela poderia trabalhar de
casa. Júlio se voluntariou e devo dizer que ele saiu correndo da construtora. — Não entendo, ela estava bem, conversando e se divertindo. Aí do nada, ela aparece abatida, com cara de choro e foi embora praticamente correndo. Não faz sentido! —Belle diz séria. — Acho que a culpa é minha. —Maria fala entrando na sala. — Sua filha? Por que diz isso? —Gael pergunta puxando ela para o seu colo. — Eu não a tratei bem, olhava feio para ela, mas estava com medo dela roubar o Júlio de mim e ele não me dar mais atenção. —Ela diz chorando. — Meu amor, seu irmão é louco por você e jamais se esqueceria da ursinha dele. Mas ele precisa viver, precisa encontrar alguém que o faça feliz, que o faça rir. —Yza diz fazendo carinho nos cabelos da filha. — Ela disse que gosta dele, que acha ele lindo, mas que ele foi grosso e a tratou mal. Por isso o apelido de rabugento. Ela disse que o que mais chamou a atenção dela foram os olhos tristes do Juju, disse que podia enxergar muito sofrimento neles. Eu... eu falei que ela era feliz, porque nunca tinha passado por nenhum problema, por não ter nenhum trauma. —Maria diz e no final começa a soluçar de tanto chorar. — Não chora ursinha, você só estava defendendo o seu irmão, só estava com ciúmes. Ela te tratou mal? —Gael pergunta sério. — Não papai, ela nem ficou brava. Ela disse que um dia me contaria a sua história e que foram os seus traumas que a fizeram agir do jeito que ela age. Ela disse que era sozinha pai, que as vezes doía ser sozinha e estar viva. Ela disse isso sorrindo, mas eu vi que ela ficou triste. Mesmo eu a tratando mal, ela disse que queria ser minha amiga. Eu quero que o meu Juju namore com ela, porque assim nenhum dos dois seria sozinho, não é? Gael vendo o desespero da filha a pegou no colo e a levou para o
quintal. Todos nós ficamos em silêncio por longos minutos. — Preciso de uma bebida forte! —Belle diz em voz alta. Lila levanta e pega uma garrafa de uísque e vários copos, servindo uma dose generosa para todos nós. — Não gostei das palavras da Vida. Sei lá, mostra uma depressão disfarçada. Agora eu fiquei preocupada gente. Eu sei do que estou falando! —Donatello diz e Belle olha séria para ele. — Precisamos descobrir mais sobre essa menina, não sei se é certo investigar a vida dela. Ou fazemos isso ou tentamos fazer com que ela se abra conosco. Tem muita gente que parece feliz, mas por dentro está sendo engolidas pela depressão. Um sorriso pode esconder muita coisa. —Hanna diz séria. —Vocês têm noção do que isso pode causar no Júlio? Estou pensando como mãe aqui e; não levem para o lado errado o que vou dizer. Se ele quiser entrar em um relacionamento com ela, não vou poder fazer nada a não ser ajudar. Mas o Júlio tem toda uma carga traumática, o que irá acontecer se ela também tiver? Duas pessoas sofridas? Estava bom demais para ser verdade. —Yza diz e se serve de mais uma dose da bebida. — Eu escutei tudo calada, mas devo dizer que vocês são todos fodidos! Fazer reunião para falar da vida dos outros? Vocês estão no jardim de infância? Viraram o que? O Cebolinha com seus planos para pegar o coelhinho da Mônica? Vão à merda todos vocês! —Luz diz brava e todos se encolhem. — Vamos supor que ela carregue uma bagagem pesada, mas olha a força que essa menina tem! Ela vive sorrindo, alegre, divertida, ama ajudar os outros, não importa o que ela passou ou o trauma que ela tem, ela está VIVA e amando isso. — Não falei por mal, tia... — E se ela for o que o Júlio precisa? E se o Júlio for o que ela
precisa? E se juntos, eles superarem todos os traumas e viverem felizes? Vocês mesmos estavam aí falando o quão bem ela estava fazendo para ele e agora você Yza, está na dúvida? Desde quando nossa família deixou de ajudar alguém, de lutar por alguém? Todos vocês passaram por várias merdas e ninguém virou as costas, não me faça sentir vergonha dessa família agora! —Luz diz muito brava e sai da sala. — Ei não eu falei por mal, gente, só fiquei preocupada com o meu filho, no que isso pode causar aos gatilhos dele. Ele tem quase trinta anos, mas ainda é um menino por dentro. Ele não lida nem com os seus traumas, quiçá com os dos outros. Vida é uma menina linda, amei conhecer ela e é lógico que jamais viraria as costas para ela. Só estou preocupada. —Yza fala emocionada. — Isso não te faz uma pessoa ruim, filha. Te faz humana, só mostra a mãe que você se tornou. Mas a Luz está certa meu amor; nunca abandonamos ninguém, nunca deixamos de lutar pela Katrisca, pela Lila, pelo seu irmão e não será agora que vamos fazer isso. Pense positivo ok? E o Júlio ajudar a Vida, talvez faça com que ele supere os próprios demônios. —Belle diz pensativa. —Yza você disse sobre duas pessoas sofridas, não é? Porém está vendo só o lado ruim, talvez o lado quebrado de um, encaixe perfeitamente no lado do outro. Nós sempre estaremos aqui pelo Júlio, é isso que uma família faz. É isso que a nossa família faz. Ela disse que é sozinha, contudo agora ela tem a todos nós, têm todas vocês. Ela só precisa enxergar isso e quem melhor do que vocês, mulheres incríveis, determinadas, e pé no saco? — Dylan diz para a irmã. — Não vamos investigar ninguém! Vamos fazê-la confiar em nós, e enxergar que não está mais sozinha. Meu sexto sentido diz que essa menina é do bem e eu confio no meu sexto sentido. Se ela está fazendo bem ao meu
neto, então nós vamos fazer bem a ela. Will? —Belle diz e chama a atenção do marido. — E lá vamos nós ficando mais pobre! O que? Vai construir um quarto para ela na fazenda? Do jeito que seus filhos fazem filhos, vamos ter que construir um anexo. O que você quer Belle Reed? —Will diz debochado. — Não vou construir um quarto, porque meu neto já tem o dele. Mas tenho que redecorar e, eu conheço uma decoradora incrível. Mas não era para isso que eu queria o seu cartão, vamos sair às compras. Tenho uma amizade para conquistar e o que é melhor do que sair para fazer compras? —Belle diz contente. Katrisca olha para Dylan, que entrega o cartão. Hanna nem precisa pedir, Donatello já entregou o dele logo. Lila me olha séria e eu sorrio para ela. — Você tem dinheiro meu amor, é uma empresária de sucesso e fez uma boa poupança fazendo campanha para aquela traíra do caralho, que atende pelo nome de Yza Reed. Você acha que ela me escutou? Lógico que não, a minha Bruxinha levanta e vai até onde deixei a minha mochila e pega a minha carteira. Ela retira não só um cartão, mas sim dois e o dinheiro que estava lá dentro, guardando dentro do sutiã. — Isso aí meninas! Mostrem quem manda. —Belle diz rindo alto. — Compras amanhã à tarde e Otávio? Já sabe que sua funcionária será sequestrada. — Eu não mando em merda nenhuma mesmo! Mas se mandasse não iria proibir, gosto muito daquela menina. — Treinou bem ele em Lila! —Yza diz rindo e eu a fuzilo com os olhos. Menina mau caráter!
— Aprendi com a melhor! —Lila responde e cai na gargalhada quando olho feio para ela. Bem... Se a Vida se sentia sozinha, agora não vai mais.
É normal estar encantada com uma pessoa em menos de cinco dias? Porque eu estou mega encantada pelo Rabugento! Sim, eu ainda o chamo de rabugento mesmo sabendo que sua risada é a mais linda que já ouvi; que ele me encanta a cada dia que sorri para mim. E vou confessar viu, o sorriso desse homem acaba com o resto de juízo que eu tenho. Toda vez que ele dá aquele sorrisinho de lado, sinto uma vontade de sentar nele e só levantar no dia de são nunca! Ele é lindo demais, tem uma conversa maravilhosa, envolvente e um excelente humor. Quando ele apareceu na minha casa há dois dias, juro por Deus que nunca imaginaria que logo ele se preocuparia comigo, mas ele estava! E o melhor, me beijou apaixonadamente. E que beijo meu Brasil brasileiro! Ele tem pegada minhas senhoras, E QUE PEGADA! Mas ele também é muito respeitador, mãos no pescoço ou aquela pegada nos cabelos, no máximo mãozinha na cintura. Eu acho que ele pensa que sou virgem, ou uma moça de família. Logo eu que já fiz várias
loucuras, isso as que eu me lembro viu, porque ainda têm aquelas que eu não me recordo por causa da neblina das drogas e cachaça. Se eu colocar no papel dá para escrever um mini roteiro de filme pornô. Brincadeirinha... Ok, um pouquinho disso é verdade. Não me julguem, é muito normal gostar de sexo. Principalmente depois que você aprende a conhecer o próprio corpo. Naquele dia ele me levou para comer um lanche, me deixou escolher o lugar e me olhou espantado com a quantidade de coisas que pedi para comer. Isso me fez gargalhar alto, fazendo com que ele abrisse um sorriso lindo. Falou que foi adotado com dezesseis anos, que Gael e a Yza adotaram ele e a Maria E que os dois são irmãos. Fiquei emocionada com a grandeza dessa atitude, não é todo mundo que adotaria um jovem, que acabou de entrar na adolescência. Ele me contou como foi crescer em uma família louca. Disse que todos os receberam de braços abertos e, desde o primeiro dia, os trataram como da família. Achei lindo e se já gostava da família, agora, então meu carinho e minha gratidão serão eternas. Saímos para andar, depois ele me levou a um parque e me empurrou no balanço. Foi a primeira vez que realmente me diverti, após a morte da minha família. A primeira vez que estava feliz sem procurar ajuda artificial. Eu me senti bem comigo mesma, sabe aquela risada de fazer a barriga doer, foi assim no nosso passeio. Parecíamos um casal de adolescente gente! Roubando beijos um do outro, andando de mãos dadas e, tomamos sorvete. Mas quando chegamos em casa, a tristeza começou a bater, o medo de ficar sozinha novamente e, ele percebeu isso. Júlio fez uma coisa que há muito tempo ninguém fazia; cuidou de mim. Ele me empurrou em direção ao banheiro, fez com que eu trocasse de roupa e me colocou na cama. Deitou ao meu lado e ficou abraçado comigo
até eu dormir. Acordei com um bilhete dele. “Ei colorida, bom dia! Não quis te acordar, por isso peguei sua chave reserva e na construtora eu te devolvo. Só para saber, dormi muito bem essa noite apesar do seu ronco”. Ass.: Júlio D'Ávila. Cretino, porém, gostoso! Só de pirraça não fui trabalhar. Mandei mensagem para o meu querido patrão, disse que estava melhor, contudo só iria trabalha no dia seguinte. Pedi desculpas e confirmei que estaria na reunião com a cliente do resort no litoral. Ele me perguntou se eu estava bem, se dormir bem, mas pude ouvir um resmungo por atrás da voz do Otávio e entendi o motivo das perguntas. Acordei no mesmo horário de sempre. 3:22 horas da manhã, porém dessa vez não fiquei tão mal, foquei no meu passeio com o Júlio e não pensei no que aconteceu com a minha família. Quando amanheceu, tomei um banho demorado, cuidei de cada parte do meu corpinho. Passei um creme maravilhoso, escolhi a dedo minha lingerie e meu vestido. Um azul maravilhoso, alegre e que reflete o meu estado de espírito. Arrumei minhas coisas e fui trabalhar, passei na padaria comprei meu pãozinho de canela e uma tortinha de limão para o Rabugento. Pena que ele não veio trabalhar de manhã, pois teve que ir visitar umas obras. Conclusão? Comi a torta, não podemos desperdiçar alimentos. Principalmente um doce maravilhoso! — Bom dia dona Vida! —Otávio me cumprimenta ao entrar na sala de reuniões. — Bom dia, senhor Valverde. — Por que você não está na sala do Rabugento? Eu coloquei uma mesa lá para você e eu a quero lá, além disso, a moça da limpeza quer dar
uma geral aqui antes da reunião. —Ele diz sério, mas seus olhos brilham de diversão. — Mas... Mas... Otávio! Pare de chamar o Júlio assim é feio sabia? E outra, eu não vou entrar lá, não quero invadir a sala de ninguém. — Você vai sim, eu estou mandando! — Credo! Sou o que agora, escrava? Isso é abuso de poder, você sabia disso? A Lei 4898/65 diz que, o que o senhor está fazendo é abuso de autoridade, já que está atentando contra a minha liberdade de locomoção e está usando do abuso de poder para tirar vantagens de situações que lhe favoreçam ou que favoreçam alguém com interesse comum. No caso eu! Você quer que eu seja expulsa a ponta pés pelo Rabugento, isso é uma falta grave e pode te causar problemas sérios, como eu processando você, senhor Otávio cupido fajuto Valverde! — Olha que linda ela, achei que tinha contratado uma decoradora e não uma advogada. Acho que o Gael vai gostar disso, só um minuto. — Otávio diz debochado e, pega o celular para ligar para alguém. — O que você está fazendo? —Pergunto curiosa. — Só um minuto, Vida. —Ele pede e, logo uma voz grossa surge pelo, viva voz, do aparelho. — Ei Gael, você não vai acreditar. Eu achava que a Vida era decoradora, mas depois dela aplicar um código penal no meu rabo há poucos segundos, acho que ela é advogada. Eu olho para ele horrorizada, e vou escorregando da cadeira até cair de bunda no chão. — Uma nora advogada? Nenhum dos meus filhos pretende seguir a minha profissão, descobrir isso é incrível. Já quero discutir sobre leis com ela. —Gael responde rindo. Eu virei a piada dessa família louca.
— Pois é, falou sobre abuso de poder, abuso de autoridade, lei 4898/65 e blábláblá. Juro que fiquei com medo. — Já gostei dela! — OK, ok, ok, eu vou para sala do Rabugento! —Falo saindo debaixo da mesa, não sem antes bater a cabeça nela. — Agora ele é Rabugento ou só você pode chamar o Júlio assim? — Otávio pergunta e respondo achando que o Gael tinha desligado. — Arrume um apelido para ele, esse só eu posso usar. Apesar de descobrir que a risada dele é maravilhosa, você já viu como os dentes dele são perfeitos? Jesus amado. —Falo e ouço a risada do Gael. Olho chocada; para o Otávio e saio correndo da sala. Entro na sala do Júlio e respiro fundo sentindo seu cheiro. Gostoso! Sento-me na mesa que está no canto, coloco meu celular para tocar e volto a cuidar do projeto de outra cliente. Estou perdida nas paletas de cores e escutando Boyce Avenue que amo de paixão. Como a minha cliente estava marcada para depois do almoço, resolvi sair para almoçar mais cedo. Fui de carro para procurar um restaurante que me chamasse a atenção, pois toda semana procuro um restaurante diferente, já provei italiano, japonês e agora encontrei um de comida mineira. Estaciono e entro no restaurante, um lugar lindo, bem decorado e com um cheiro incrível. Eu amo comer, duas coisas que me chamam a atenção é o cheiro e a aparência da comida. Entro, sento e espero alguém vir me atender, o que acontece rapidamente. — Bom dia, sou a Silvana e vou te atender hoje. A senhora já sabe o que vai pedir ou quer dar uma olhadinha no cardápio? —A atendente diz toda alegre. — O que você me sugere?
— Eu adoro feijão tropeiro, mas frango com quiabo é divino. Aliás tudo aqui é gostoso. —Ela diz sincera. — Hum, acho que hoje vou de feijão tropeiro e amanhã eu experimento o frango. E quero uma Coca-Cola com gelo e limão, por favor. Ela sai para buscar o meu pedido e, enquanto isso; dou uma olhada nas minhas mensagens. Desde domingo que não entro no grupo das meninas, na realidade liguei meu telefone hoje cedo. O grupo está cheio de mensagens, várias me marcando. Todas preocupadas com o meu sumiço e isso até me emociona. Sou carente de atenção, carinho, colo, tudo o que eu tinha dos meus pais e hoje eu perdi. Respondo que estou bem, invento que peguei uma virose e por isso não mexi no telefone. Belle me pergunta se estou melhor e se consegui ir trabalhar. Digito que sim e me despeço delas quando meu almoço chega. E que comida Jesus! Juro que se eu não soubesse que passaria mal, pediria outro prato. Puta que pariu que delícia. Depois que termino, chamo a atendente e peço a conta e ela me traz um copinho com doce de leite mineiro, cortesia do restaurante. Nunca mais como em outro lugar na vida! Comida perfeita, atendimento incrível, mas o doce me ganhou. Enquanto aprecio o doce, meu celular apita. “Onde você está colorida?” Júlio me manda uma mensagem. “Não fui trabalhar hoje. Estou doente, quer vim cuidar de mim?” Sorrio ao imaginar a cara dele. “Mentirosa, minha sala está impregnada com o seu perfume. É sério, você foi almoçar?” “Sim, mas daqui apouco estou aí. E você, já almoçou?”
“Não, pensei em te levar para almoçar em algum lugar, mas como você já foi vou comer alguma coisa. Vê se não se atrasa, aquela cliente é chata pra caralho. Tchau.” Eu sorrio com a despedida seca. Pago minha conta e volto para a construtora só para poder olhar para aquele homem. Rabugento, Rabugento, o que você está fazendo comigo?
O que essa mulher tem que me deixa assim, ansioso por vê-la, sentir seu cheiro, seu toque. Já estava me sentindo estranho, mas depois de alguns beijos a ânsia de estar perto dela aumentou. Tirando as pessoas da minha família, ela foi a primeira pessoa que gostei de estar perto. Ela me faz sentir diferente, como se eu fosse uma pessoa normal. Com ela é como se não fosse estranho, imperfeito. Vida me faz sentir bem, me faz sorrir, como se meu passado fodido não existisse. Eu já beijei algumas garotas quando estava na faculdade, mas foi meio que robótico, nunca senti nada, porém com ela... foi diferente. Sabe quando você toma um choque? Foi assim que me senti. Vários arrepios pelo corpo, uma vontade louca de sentir seu corpo contra ao meu, de sentir suas mãos no meu corpo. Quando ela beijou o meu pescoço, senti como se fosse entrar em combustão. Nunca senti nada igual, eu já li a respeito e meu pai conversou comigo sobre tesão, desejo, sexo, mas sabe quando você nunca se viu fazendo isso? Era assim que me sentia, até ela aparecer. Meu corpo reagiu exatamente do jeito que me pai falou quando eu era mais novo, uma vontade louca de tirar a sua roupa, de ver de perto seu corpo, sentir seus seios em minhas mãos, ver aquela maldita calcinha de perto. Essa porra dominou os
meus pensamentos. Renda preta, minha mais nova obsessão! Nós saímos juntos, fomos comer um lanche, até passeamos num parquinho. Essa garota é doida, parecia uma criança de cinco anos de idade quando viu o balanço. Andamos de mãos dadas, tomamos sorvetes e a beijei inúmeras vezes. Sua boca é uma tentação, impossível ficar perto dela sem querer beijá-la. Quando a levei para casa, estava disposto a deixá-la e ir embora, mas aquele olhar triste voltou e eu me vi não querendo me afastar dela. Então entrei, mandei que se trocasse, deitei em sua cama e a abracei até que ela adormecesse. Pela segunda vez nesses dez anos, eu dormi sem ter nenhum pesadelo e nessas duas vezes, ela estava em meus braços. Quando acordei, já eram seis horas da manhã, então me levantei e a deixei dormindo lindamente. Escrevi um bilhete e fui para a minha casa me arrumar para mais um dia. Estava animado e ansioso para vê-la, mas a filha da mãe ligou e disse que não viria trabalhar. Essa mulher me transformou num maluco em poucos dias, fui de um Júlio bem-humorado para um Júlio insuportável e reclamão. Sabe quando eu fui assim. Nunca! É essa mulher, ela está me deixando maluco. Para ajudar, ela não me atendeu o dia todo e nem respondeu as minhas mensagens. Mal dormi à noite, tentando entender o que eu fiz para ela me dar esse tratamento de silêncio. Cochilei só para acordar com um pesadelo fodido! Acordei no dia seguinte e me determinei a esquecer e ignorar a Vida. Não vou ficar correndo atrás de ninguém, não preciso de inconstância na minha vida. Ela já é fodida demais, para que eu arrumar mais problemas. Fui até a construtora bem cedinho, peguei alguns projetos e fui visitar as minhas obras. Passei a manhã inteira fora e só voltei na hora do almoço; quando entrei na minha sala o cheiro dela estava impregnado e eu falhei na
minha determinação de ficar longe. Passei o dia todo pensando em seu sorriso, no som da sua voz, mas me mantive firme, até sentir o seu perfume e, quando dei por mim já estava mandando mensagem para ela, inventando sobre levá-la para almoçar. Eu sou um idiota. Vou até uma lanchonete ao lado da construtora, Peço um suco de laranja e um sanduíche natural. Estou entretido falando com a Alicia, quando um assobio chama a minha atenção. Olho para a janela e vejo um lindo tornado azul passando e três babacas mexendo com ela. Eu me engasgo com um pedaço de sanduíche, quando a vejo andar e a cada passo suas pernas ficam amostra. Levanto correndo e vou até o caixa pagar a conta e saio apressado para a rua e olho na direção que ela passou, mas acho que ela entrou na construtora. Respiro fundo para não bater no filho da puta que a chamou de gostosa e sigo para o trabalho. Paro um tempo na recepção, não querendo parecer tão ansioso em vê-la. Só que a maluca não está na minha sala, então vou atrás dela muito puto da vida toda. Eu a encontro na sala de reuniões separando as coisas para apresentar para a nossa cliente em comum. — Ei Rabugento, onde estão as suas cois... Ela para de falar quando me aproximo e seguro seus cabelos e a beijo. Assim que minha boca toca a sua, foi como se tudo voltasse ao normal. Ela deixa os papéis em suas mãos caírem no chão, e me agarra pelo pescoço aprofundando o beijo. E caralho! As coisas saem um pouco do controle, eu enrolo meus braços em sua cintura e a levanto em meus braços e caminho até a primeira parede que encontro. Ela rodeia minha cintura com suas pernas, roçando sua intimidade em mim. Ela começa a mexer seu corpo para cima e para baixo e minhas
mãos seguram sua bunda, ajudando em seus movimentos. Meu pau está explodindo com toda essa fricção e ela separa a sua boca da minha e joga sua cabeça para trás, gemendo roucamente e me deixando ainda mais alucinado. Não sei merda nenhuma do que estou fazendo, estou apenas seguindo meu instinto e me deixando levar pelas sensações que isso me provoca. — Com licença dona Vida... ai Jesus, me perdoem! — Zezinha diz e sai correndo. A moça da limpeza nos interrompe, e eu largo a Vida assim que escuto sua voz. Se eu não sou rápido, a Colorida quase se esborrachava no chão. — Uau! Podemos nos trancar no banheiro e continuar com isso? — Ela pergunta com uma carinha pidona. —Porra, nós acabamos de ser pegos em flagrante e você quer continuar com isso? Eu... eu... olha, me perdoa por isso, sei que passei dos limites. Para falar a verdade, não sei o que deu em mim. Prometo que não vai mais acontecer. — Oi? Tá de graça? Júlio D'Ávila, não me faça te bater, está me ouvindo! Eu gostei e quero fazer isso de novo. Então cala a boquinha se não for me beijar de novo. Isso é normal, e não me diga que nunca fez isso antes! Agora estou muito puta de verdade e nem trouxe outra calcinha para trocar, mas vou ter que dar um jeito! — Ela diz brava e entra no banheiro. Que merda eu fiz? Saio da sala de reuniões e vou até a minha sala e pego o material para apresentar para a cliente. Quando volto, vejo Otávio conversando com a Zezinha e quando ele me vê, para de falar imediatamente. Eu ignoro seu risinho debochado e entro na sala de reuniões e conecto o notebook ao telão da sala, onde passarei os slides. A cliente chega, Dona Maura. Uma mulher de cinquenta e dois anos e
que herdou do finado marido o resort que está querendo modernizar. Nós nos sentamos e, enquanto ela fala, eu vou anotando tudo e pontuando as coisas mais urgentes. — Quero uma mudança radical, gostaria de atrair ainda mais hospedes e isso requer se modernizar, não é mesmo? Dinheiro não é problema, mas faço questão que seja tudo de primeira. É uma praia afastada, recebemos uma boa clientela, mas quero mais. Você é jovem Júlio, sabe o que os jovens procuram, quero que use isso. —Maura diz animada. — Eu trabalhei com a planta e as fotos que a senhora deixou, mas só vou ter certeza mesmo quando eu olhar de perto. Como a senhora quer atingir um grupo mais jovem e eles podem ser muito barulhentos às vezes, desenhei uns bangalôs um pouco mais afastados do prédio principal. Lógico que também desenhei alguns maiores, para famílias que queiram privacidade. Nessa planta, a senhora terá dez bangalôs de um quarto e sala, e mais seis bangalôs maiores, para famílias, de dois e três quartos. Refiz o layout do SPA, acrescentei sauna, mais duas salas de massagem e um ofurô. A senhora disse que queria oferecer mais opções de relaxamento para os hóspedes, então acrescentei mais três salas. —Vou explicando para ela, que se inclina em minha direção ficando muito perto de mim. — Eu amei isso! Você além de lindo e muito talentoso, Júlio. Você malha? —Maura pergunta apertando meu braço. — Malha sim, na academia e em casa, não é querido? —Vida diz sorrindo para mim. — Oh, vocês estão juntos? —Maura pergunta curiosa. — Estamos casados a três anos e temos um menino de cinco anos, engravidei antes de casar. Então já sabe, academia na rua e correria em casa. Esse menino me deixa louca. — Vida diz e eu fico pasmo com a cara de pau, ela não fica nem vermelha com a mentira!
— Que lindos! Amei saber disso. Menina, com esse corpinho ninguém diz que já é mãe. Parabéns. —Maura fala sincera. — Obrigado querida! Mas vamos voltar ao trabalho. O que acha de um bar com música ao vivo? Isso vai fazer os jovens amarem e não vão precisar sair do Resort atrás de divertimento. —Vida diz séria e entra no meio entre eu e a cliente. Ela está com ciúmes? Porque já vi minhas tias com ciúmes, e elas agem assim. Já minha mãe manda a mulher sair fora que meu pai já tem dona. — Amei a ideia, podemos fazer isso Júlio? Poderia ser depois da área da piscina, assim ligaria o prédio principal e os bangalôs. —Maura pede. — Claro que sim, mas para isso tenho que ver o lugar. — Perfeito! Assim você vê direitinho e até lá posso ter mais alguma ideia. Agora você menina, tem alguma ideia do que fazer? — Como disse senhora, posso começar a trabalhar no prédio principal e nas outras áreas do resort que não serão mexidas. Acho que como o resort fica na praia, as cores ideais seriam cores claras e relaxantes. Branco, azul, palha, até mesmo dourado. Podemos separar os quartos por cores e, ainda aposto em intermediar entre cores claras e cores quentes; porém a senhora é quem escolhe a paleta, como o Júlio disse, também preciso ver o local, a cidade e trabalhar em torno disso. —Vida diz toda profissional. Conversamos mais um pouco, marcamos de estar no resort no domingo à noite, já que ela terá que viajar a negócios na quarta de manhã. Assim teremos tempo de olhar todo o lugar, ter uma ideia melhor do que ela quer e assim poderemos dar início ao trabalho. Ela concorda com tudo e depois se despede e vai embora. Vida começa a guardar as suas coisas com certa brutalidade e eu fico apenas olhando. — Colorida? —Chamo, mas ela me ignora. — Vida?
— O que? — Por que está brava? — Por quê? Por quê? Nada não Júlio D'Ávila, não tem nada demais em você me dar uns pega e dizer que nunca mais irá fazer isso e depois, deixa aquela velhadia te apalpar. Vergonha na cara não tem, né não? Aí depois vem surtar comigo, dizendo que estou sofrendo assédio sexual! E o que essa mulher fez é o que? Carinho pro neném dormir? Me poupe, Rabugento. — E o que eu tenho a ver com isso? Fica com raiva dela, eu não te fiz nada. Ela não me responde, se inclina para pegar uma pasta que caiu no chão e eu olho para sua bunda onde o vestido cola. Olho intrigado, porque não mostra marca nenhuma. — Colorida? — Fala Rabugento! —Ela responde ainda mais brava, pegando suas coisas e indo até a porta. — Cadê a sua calcinha? Eu... eu sei que estava usando uma, mas agora... é... agora eu não vi a marquinha dela. Cadê? — Está na minha bolsa, tive que tirar depois daquele, pega sinistro, que você me deu. Tchau Rabugento. —Ela diz isso como se fosse a coisa mais normal do mundo. Sem calcinha? Ela está sem calcinha? Em que mundo essa garota vive? Onde eu vejo se ela fugiu de algum sanatório? Melhor ainda! Alguém tem o número de algum manicômio? Porque tenho certeza que ela é doida e está me deixando doido também. Ou eu me interno ou interno ela!
Eu convivo com mulheres loucas há dez anos, minha mãe, minha avó, a Lila; as mais normais são a tia Baby e a tia Hanna. Mas nada me preparou para lidar com essa Colorida do caralho. Quem arranca a calcinha e guarda na bolsa e age como se fosse normal? Tento me acalmar ou realmente vou acabar em um manicômio. Guardo o projeto que fiz, arrumo a mesa de reuniões e só então saio para ir diretamente pra minha sala. Essa garota não é normal não, em poucos dias virei uma bagunça dos infernos, só penso nessa mulher. Quando fecho a porta da sala, vejo uma movimentação na recepção e vou até lá ver. Vovó, tia Baby, Tia Hanna, Lila e minha mãe estão conversando com o Otávio. — Mãe? — Ursinho! Estava com saudades meu amor, que carinha é essa? —
Ela pergunta me abraçando. — Acho que estou tendo um princípio de enfarto. —Falo e ela arregala os olhos, preocupada. — O que você está sentindo, Ursinho? Quer ir ao médico? — Um suador, batimentos cardíacos acelerado, fraqueza. Mas eu já estou melhorando mãe, o que a senhora veio fazer aqui? — Ele estava em uma reunião, Yza. Puro drama isso sim! —Otávio diz rindo. — Cala boca idiota! — É isso mesmo, Júlio? Ou devo contar o que aconteceu antes da reunião começar? —Otávio pergunta debochado. — Seu filho da... — O que aconteceu? —Todas perguntam ao mesmo tempo. —NADA! Mãe, o que vocês vieram fazer aqui? — Estou pronta! —Vida diz entrando na recepção toda animada. — Pronta? — Sim, sua mãe me convidou para fazer compras com as meninas, não é legal? Eu só fui ao shopping no dia em que levei a Olívia, mas nem consegui ver todas as lojas. —Ela diz alegremente. —Você não vai não! —Será que a maluca esqueceu que está sem calcinha? — Oi? Não entendi, acho que ouvi errado. Pode repetir? —Ela pergunta confusa e eu me aproximo dela e me abaixo até meu rosto estar na sua altura. — Você não vai, só sairá daqui direto para a sua casa! Fui claro, Colorida? —Pergunto e ela gargalha alto. — Tão fofinho esse Rabugento! —Ela diz olhando sem graça para todas as mulheres, que estão assistindo nosso embate. — Eu vou aonde eu
quiser, quando eu quiser, a hora que eu quiser. Você é gostoso, beija para caralho, tem um pega sinistro, mas não manda em mim! — Me escuta, Vida... — Não quero também não! Quer saber? Não vou para merda nenhuma. Obrigada a todas por pensarem em mim, mas estou indo para casa. Começo de enxaqueca. —Ela diz e vira as costas para ir embora. Posso ver que ela está com raiva, mas também está magoada com o que eu falei. Olho para a minha mãe e ela está me olhando feio, todas elas estão. — Merda! Vem aqui. —Puxo-a e saio arrastando até a primeira porta que encontro. Empurro-a para dentro e encosto ela contra a parede. — Pode me soltar por obséquio? Eu já falei que não vou para lugar nenhum com elas, pode ficar tranquilo Júlio. Vou para a minha casa e assistir um filme com a dona Mimi. —Ela diz e tenta se soltar do meu aperto. — Olha para mim, Vida. —Peço e espero ela levantar o rosto. — Não era isso que eu queria que pensasse, fico muito feliz que você é minha família estejam se dando bem. É legal que você tenha amigas; mesmo que elas sejam um pouquinho mais velhas. Só que você esqueceu um detalhe. — O que? —Ela pergunta confusa. — É...você... você está sem calcinha! Pronto falei. Você não pode sair assim na rua. — O que é que tem? É normal isso, Rabugento. Toda mulher faz isso uma vez ou outra. — Não é não, e não gostaria que você saísse assim. Pode bater um vento e levantar o seu vestido, e....e....você sabe o que! — Você está com ciúmes? É isso Rabugento, você está com ciúmes? —Ela pergunta sorrindo e enrola seus braços em meu pescoço. — Não. Quer dizer, não sei. Só não quero que você saia sem calcinha,
por favor? — Vai dorme comigo hoje? — Não sei, amanhã tenho que estar cedo em Limeira. —Traz suas coisas para minha casa, assim amanhã você não tem que acordar muito cedo. Por favor! Prometo passar em casa e trocar de roupa, antes de ir às compras. — Você vai mesmo? —Pergunto e ela balança a cabeça. — Tudo bem, vou pegar umas coisas e vou te esperar na casa da minha mãe e de lá vamos para a sua casa. — Lindo! Agora me dá um beijinho escondido. —Ela pede e é impossível não rir da carinha que ela faz. — Você é impossível! —Falo e a beijo rapidamente. — Eu sei, mas você me ama, só não descobriu ainda. Agora vamos sair ou a coisa vai ficar feia aqui. —Ela diz rindo e abre a porta. A cena que se desenrola é inacreditável! Assim que a Vida abre a porta, uma montanha de gente cai no chão. Minha mãe, minha avó, Otávio e Hanna, caem um por cima do outro. Lila e Katrisca se encostam na parede atrás e escorregam até sentarem no chão de tanto rirem. — Mas que merda é essa? — Ursinho! Sai de cima de mim Otávio! —Minha mãe grita revoltada. — Nós estávamos indo chamar vocês, bebezinho. —Yza, eu sinto te informar, mas seu filho não tem nada de inho nele. —Porra! Quer colocar a merda de um filtro na sua boca, Colorida, do caralho. Sério, qual é o problema dessa garota? — Você tem a boca muito suja, Bebezinho. —Ela diz rindo. — Podemos ir? Mas antes tenho que passar em casa para colocar uma calcinha.
— O QUE? —Todos gritam formando um coro. — Eu desisto de vocês estão parecendo um bando de malucos fofoqueiros. E você Colorida, não tinha necessidade de falar o que você iria fazer na sua casa. — Filho, porque ela está sem.... — Não pergunte mãe, nem termine de perguntar. — OK; vamos mulheres loucas? —A mais louca diz. — Vocês me seguem até a minha casa, será rápido só vou trocar de... de roupa e colocar um sapato confortável. Fico assistindo todas irem embora, minha mãe entra no carro com a Vida, minha avó e Lila em um carro, Hanna e Katrisca em outro. Só Deus sabe as merdas que elas vão fazer no shopping. Olho feio para o Otávio e vou pegar minhas coisas na sala e vou para a minha casa. —Te vejo mais tarde, Rabugento. —Otávio grita para mim e eu mostro o dedo para ele. Vou para a minha casa, largo minhas coisas no sofá da sala. Vou para o meu quarto, tiro minha roupa, ficando somente de cueca. Tiro a roupa de cama também, que por conta do pesadelo da noite passada está impregnada de suor. Uma coisa interessante sobre dormir com a Vida, é que nas duas vezes que dormimos juntos eu não tive pesadelos. É um sinal ou coincidência? Não sei ainda, mas é interessante. Levo tudo para a lavanderia e arrumo meu quarto, depois tomo um banho e vou assistir algum programa. Meu pai me manda uma mensagem, me chamando para ir jantar lá. Me apronto, arrumo minhas coisas para dormir na casa da Colorida e vou para casa dos meus pais. Mal abri a porta e já posso escutar a guerra que está acontecendo, Gaia, Alicia, Alexia e Lou estão brigando. Olívia está sentada com seu tablet e seu imenso fone de ouvido, completamente alheia a tudo o que está acontecendo.
— O que está acontecendo aqui? — Juju! —Lou e Alexia vêm correndo para os meus braços. — Ei princesinhas, o que estão fazendo? — A Gaia é má, Juju. — Lou fala, nervosa. — Isso! Ela brigou com a Alicia, falou palavrão e pisou no meu brinquedo. —Alexia diz com os olhos cheios de lágrimas. — Não chora Bambi, vou brigar com ela, Ok? Onde está a Maria? — Ela subiu para tomar banho, mas ela estava aqui brincando e a Gaia esperou ela subir e veio brigar com a gente. —Lou diz cruzando os braços. — Vão lá dizer para o Ursão que eu cheguei, eu vou conversar com o monstrinho creck-creck. Coloco as duas no chão e vou ver o que a monstrinho está fazendo. Primeiro vou falar com a Alicia, minha irmã é uma bonequinha e quase nunca dá problemas. Ela é a nerd da casa, adora ler e estudar, não dá trabalho nenhum. Agora Gaia é foda, parece que tem formiga na bunda. Desaforada, respondona, abusada e vive entrando em confusão. — Ei princesinha! —Falo entrando no quarto da Alicia. — Oi Ju. Estava com saudades, você está namorando? —Ela pergunta se sentando na cama e eu me deito ao lado dela. — Eu vim aqui, mas você tinha ido dormir na casa de uma amiguinha, para fazer o trabalho da escola. E não, eu não estou namorando. Por que seu rosto esta arranhado? —Pergunto, analisando de perto o machucado. — É... é ... não foi nada! Mas me conta por que a mamãe acha que você está namorando? —Ela tenta desconversar. — Foi a Gaia que te bateu? Não quero mentiras, Alicia. —Falo sério e ela suspira alto. — Foi, mas acho que foi sem querer. Ela queria o meu tablet
emprestado, mas eu estava lendo um livro nele para a Lou e a Alexia, a Maria que baixou ele. Ela queria o tablet naquela hora que eu estava usando, eu ia emprestar só que depois, porém ela veio tomar da minha mão quando eu disse não, e acabou puxando meu cabelo e arranhando meu rosto. —Ela diz toda tristinha. Gaia está passando dos limites, minha mãe já deixou de castigo, já deu uns tapas, já cortou tudo e ela só melhora um pouco. Gaia nunca tinha batido na Alicia, as duas têm gênios diferentes, mas uma protege a outra. — Ela já te bateu antes? Não minta para mim Alicia, ela bateu em você ou nas meninas? — Não Juju, essa é a primeira vez. Juro, juradinho de mindinho. — Ok, vai até o papai e pede para ele passar alguma coisa nesse arranhão, eu vou conversar com ela. Agora ela vai ver como eu lido, com isso. —Beijo sua testa e, ela vai correndo atrás do meu pai. Eu entro no quarto da Gaia sem bater, ela dá um pulo assustada, mas não fala nada quando olha para mim. — Foi sem querer, eu juro. —Ela diz se desculpando. Não falo nada, pego o cesto de roupas que está vazio e saio fazendo à limpa. Notebook, tablet, celular, maquiagem, caixinha bluetooth, fones, cabo da televisão. Vou pegando tudo o que ela gosta, Gaia vê tudo e fica quietinha. Olho de rabo de olho e vejo seus olhos cheios de lágrimas. Coloco o cesto no corredor e pego um Puff e coloco na sua frente e me sento. — Só vou te falar uma vez, Gaia e quero que você preste bem atenção, nós somos uma família, nós cuidamos um do outro. Não quero saber se você tem um gênio difícil, se é nervosinha ou se está estressada. Nós nunca batemos em ninguém, muito menos em uma irmã. Você viu o rosto da Alicia? Que porra você estava pensando, Gaia? — Não sei.
— Não sabe? Então tá, você está de castigo até segunda ordem. Estou confiscando todas as suas coisas, é de casa para a escola e da escola para casa. Nada de televisão, nada de videogames, nada de dormir na amiguinha. Depois da escola, você vai lá para construtora e ficará comigo, não adianta chorar para o papai, porque dessa vez você passou todos os limites e quando a mamãe souber se prepara viu porque vai ficar feio. Estamos entendidos? — Sim, Juju. — Bom, agora vai pedir desculpa para a Alicia e olha bem para o que você fez no rosto dela. Ela levanta da cama, me beija e vai atrás da irmã. Elas nunca brigaram assim, uma provoca a outra, mas não ao ponto de machucar. Amo minhas irmãs, mas têm horas que meus pais ficam perdidos, então eu entro e as coloco nos lugares certos. Gaia está ficando muito livre, tendo ideias adiantadas para a sua idade. Agora que já resolvi tudo, vou falar com o meu pai. Papo de Homem para Homem.
Sério, essas mulheres são loucas. Fomos até a minha casa, troquei de roupa rapidamente, peguei outra bolsa e transferi tudo o que eu iria usar, voltando para a sala onde todas me esperavam. — Vida, sua casa é linda e aquele jardim lá atrás? O Will ficaria com inveja. Mas não encontrei o seu cachorro. —Belle diz. — Eu não tenho cachorro, não sei nem cuidar de mim, quem diria de um animal. Às vezes eu até penso nisso, mas desisto por que não sei cuidar, vai que o bichinho morre por minha culpa.
— Mas você disse que tinha. —Yza diz me olhando fixamente. — Menti ué! Dá um desconto, eu não queria passar tanta vergonha, mas não adiantou muito, não é? — Você é um sopro de ar fresco, Vida. Não te julgamos por ser assim, ao contrário, amamos seu jeitinho livre, doidinho, isso que encantou meu neto e a todos nós. — Belle diz. — Me conte mais sobre esse "encantou meu neto". É verdade que rolou uns beijos e uns pega sinistros, ele dormiu comigo a noite toda há dois dias, porém encanto, encanto, ainda não vi. Só quando vejo todas me olhando com os olhos arregalados e em completo silêncio, que reparei que mais uma vez falei demais. — Dormiu a noite toda? Tipo toda mesmo? Sem nenhum problema? —Yza pergunta enfaticamente. — É, sim? Por quê? — Nada demais, é que o Júlio tem um sono muito agitado e é difícil ele dormir à noite toda. Por isso a nossa surpresa meu bem. —Yza diz carinhosa. — Uma pergunta que não quer calar. Por que você estava sem calcinha? —Lila pergunta. — Porque eu não fui trabalhar ontem, e quando ele me viu me deu um pega sinistro com direito até parede e....Ah que caralho! Vocês não podem fazer esses tipos de perguntas para mim, é injusto porque sabem que não controlo a minha boca. Isso é sujo viu! — Qual é a graça de não tirar vantagem sobre isso? —Hanna pergunta rindo. — Eu achei que você era a mais quietinha, Hanna. Estou profundamente magoada agora. Podemos ir, antes que eu fale mais alguma merda? — Sim, nós vamos no carro com a minha mãe, depois vamos para
minha casa comer alguma coisa. —Yza diz animada. Vamos ao shopping e as malucas fazem a festa, eu também me jogo porque amo compras. Mas não fazia tanto porque não gosto de ir às compras, sozinha. No dia que fui com a Olívia, me diverti muito, mas ela não tem paciência para entrar nas lojas. A coisa que mais amo é comprar são sapatos e lingerie. Amo calcinhas de seda e de renda, camisolas chiques e até aquelas infantis de bichinhos. Amo salto alto e tênis, sou muito contraditória nesse quesito. Quando entramos numa loja de sapatos, meus olhos caíram num par de botas que foi amor à primeira vista. Eu me agarrei a ela, como um náufrago em um bote salva-vidas, escolho mais dois pares, duas bolsas e um chinelo dos MINIONS. Vou para o caixa e a Katrisca vem atrás com sua remessa, mas entre eles tem sapatos para Luna, Valentin e Vicente e até mesmo para o Dylan. Isso me lembra a minha mãe, quando saíamos para o nosso dia de meninas e ela lembrava sempre do meu pai e meus irmãos. Pago tudo no débito e ela me olha surpresa, já que a conta não foi barata. Mas não digo nada, espero uma pergunta dela que nunca veio. Passamos em uma loja chique de lingerie, aí minhas amigas, a coisa ficou séria. Já pensando no futuro, escolho as mais variadas calcinhas, camisolas, e até mesmo algumas bem sexys. Belle me mostra a parte de produtos eróticos e eu fico animada. Parece que estou em um mercado e saio pegando de tudo um pouco, as meninas também atacam e todas nós rimos da nossa animação. Depois de um longo tempo, vamos para a praça de alimentação e pedimos uma torre de Chopp e uma porção de batatas. — Eu estou morta, mas amei aquele vestido que comprei. Ficou perfeito e já quero uma nova balada para estreia meu modelito. —Lila diz
animada. — Vamos marcar! Só que dessa vez vamos todos juntos. Já foi difícil sair sem os homens da primeira vez, tenho certeza de que não terá uma segunda. —Yza diz. — Acho legal, mas porque os homens não podem ir? Eles parecem legais e se comportaram quando foram atrás de vocês. Eu não sei quando vou poder ir, domingo viajo para o Litoral a trabalho. Inicialmente apenas uns dias, só para olhar o lugar, tirar medida e ver a cidade ao redor. — Interessante... você vai sozinha? —Yza pergunta como quem não quer nada. — Não, Júlio e eu estamos trabalhando nesse projeto. Vamos viajar domingo, ele vai olhar o terreno e decidir com a velhadia o que pode ser feito ou não. —Velhadia? O que seria isso? —Katrisca pergunta. — A cliente safada! Ain Júlio, você além de lindo é um grande profissional. Nossa seus braços são fortes, você malha? Velha assanhada e, ele é um safado que ficou cheio de sorrisinhos para ela! — Alguém está com ciúmes aqui. —Hanna diz rindo. — Não é ciúmes não, é indignação mesmo. A falta de profissionalismo dela foi imensa. E se ele fosse casado? As pessoas têm que tomar um chá de semancol. — Para mim isso parece ciúmes e para vocês? —Hanna pergunta. Essas mulheres só escutam o que elas querem. Não é ciúmes, mas poxa, eu sou tão amorzinho, educada, bondosa e ele me tratava super mal. Agora aquela velhadia cheia de Botox, até nos lábios de baixo, ele tratou com sorrisinho? Injusto isso! —Ciúmes, certeza! —Todas dizem ao mesmo tempo. Vamos todas para a casa da Yza e quando estamos estacionando, vejo
o Rabugento saindo com um cesto e caminhando até o seu carro. Ele coloca no porta-malas e antes de fechar olha para nós. — Isso são as coisas da Gaia, filho? — São. Eu cheguei em casa e estava a maior gritaria, mas ela quando ouviu minha voz correu para o quarto. Fui falar com a Alicia e ela estava com o rosto vermelho e um arranhão enorme. Gaia bateu nela porque a Alicia não quis emprestar o tablet a ela. Bater mãe é inadmissível. Peguei até as maquiagens dela dessa vez e, ela vai trabalhar comigo todos os dias depois da escola. —Júlio diz sério. — Não sei mais o que fazer com essa menina, juro que o Gael vai acabar internando ela. Agora bater já é demais, vou ter uma conversa séria com ela. —Yza diz chateada. Ouvir isso me faz lembrar, de mim mesma, teve uma época na minha infância que tudo me irritava e nada me agradava. Então meu pai me levou a uma feira sobre profissões e, então me encantei com decoração. E amo isso até hoje, amo deixar as coisas bonitas, procurar peças únicas, acho que a Gaia precisa disso. Encontrar algo que goste e focar nisso. Júlio está estranho, não me olha nos olhos, como se estivesse me evitando. Entramos e eu ajudo a Yza levar suas compras para o quarto dela. Depois voltamos para a sala e o Júlio nos leva até o quintal, onde Dylan, Otávio, Donatello e Will estão. Gael está em frente a uma churrasqueira, vestindo um avental com um corpo de mulher usando biquíni. Isso é muito engraçado. Comprimento a todos e me sento em uma mesa de madeira enorme. Otávio olha na minha direção e joga um sorrisinho cafajeste. — Lila, como você aguenta o Otávio? —Pergunto curiosa. — Até hoje me faço a mesma pergunta, Vida. Acho que é porque ele é bom de cama. —Ela diz rindo. — Eca! Menos tia Lila. —Maria diz e se senta ao meu lado. — Oi
Vida. — Oi Maria, tudo bem? — Tudo sim, queria te pedir desculpas por aquele dia na fazenda. Pode me desculpar? —Maria pergunta baixinho. — Não tenho nada para desculpar meu amor, você só estava com ciúmes do seu irmão e isso é normal. Eu também morria de ciúmes dos meus, ficava louca quando alguma menina ligava para eles em casa. — Então Gael, você não está precisando de ajuda no escritório? Porque a Vida entende muito de leis, acho que ela poderia te ajudar. —Otávio solta. — É verdade, Vida? Pelo que o Tavinho me contou, você recitou uma lei certinho, por que o idiota foi olhar no Google para ver se estava certa. — Gael diz rindo. — Não acredito nisso, Otávio! E respondendo Gael, entendo um pouco sim, mas nunca estudei direito. Em casa havia vários livros sobre leis e meus pais debatiam muito sobre isso. — Eles eram advogados? —Donatello pergunta interessado. — Meu pai era advogado criminalista, mas dava aula de direito na faculdade local e a minha mãe era Juíza. Então todos os dias eles conversavam sobre alguma coisa, algum caso interessante. Então acabei ouvindo e lendo sobre isso, não se mora na mesma casa que uma juíza e um advogado e não aprende um pouco sobre Direito. Então, Otávio Valverde, acho bom você parar de exercer sua autoridade abusiva ou posso te processar. — Juíza? Como se chama a sua mãe? Talvez eu a conheça ou já ouvi falar. —Gael pergunta interessado. — Pode ser, mas eles não eram de São Paulo. Morávamos no Rio de Janeiro, na realidade mudamos para o Rio quando eu tinha cinco anos. Antes morávamos em Porto Alegre. O nome do Meu pai era Walter Martins e da
minha mãe era Tayene Sabino Rizzo Martins, mas na área jurídica era Tayene Rizzo. Ela usava seu nome de solteira no trabalho. — Rizzo? Eu já ouvi esse sobrenome antes, mas não me recordo onde. —Gael diz. — Eu também já ouvi falar, mas não me lembro. —Donatello diz também. — Pode ser, há alguns anos ela presidiu um julgamento aqui no interior de São Paulo, mas agora não me recordo o nome da cidade, eu me lembro porque meu pai levou meus irmãos e eu a um parque aquático perto dessa cidade. A polícia achava que foi por causa desse julgamento, que mataram a minha família. Eles prenderam muita gente grande, lavagem de dinheiro, sonegação e muitas outras coisas. A secretária da minha mãe estava envolvida, já que parentes dela eram da quadrilha. Pensar nisso me faz lembrar, de uma coisa. Preciso falar com o meu padrinho e dizer que mudei para Campinas, ou ele vai ficar preocupado.
Depois que a Gaia foi pedir desculpa para a Alicia, eu vou atrás do meu pai. Deixo o cesto na lavanderia, pego uma cerveja e o encontro no quintal. Ele está na área onde fica a churrasqueira, Lou e Alexia passam por mim correndo e vão ver desenho. Sento na cadeira e vejo meu pai acender o fogo para começar a assar a carne. — Qual o tamanho do estrago? —Ele pergunta sem me olhar. — Sem eletrônicos, sem televisão, sem maquiagem, sem dormir nas
amiguinhas e vai para a construtora comigo todos os dias. Pai, ela arranhou o rosto da Alicia, isso não pode acontecer. Ela tem que aprender que nem tudo é no tempo que ela quer. Hoje pode ser sem querer, mas amanhã não. — Não tem cinco dias que ela saiu do castigo! Sua mãe deu uns tapas nela, tirou celular, tablet, tudo. —Ele diz exasperado. — Mas acontece senhor Gael, que basta ela chegar toda chorosa e o senhor alivia. Pai, eu não tenho que te ensinar nada sobre criação, o senhor fez um ótimo trabalho com todos nós, só que a Gaia é muito para frente. Ela conversa coisa que a Maria nem sonha. Não sei se é amizade, se é a escola ou falta do que fazer, mas tem que dar uma controlada maior nela. E se ela faz isso com a Alexia? Com a Lou? Elas são bebês, pai. — A culpa é da sua mãe, quem mandou ela só me dar meninas? Não consigo ser carrasco, bater é fora de questão, porém dessa vez não vou me meter, ela vai ficar de castigo, vai trabalhar com você e não vai adiantar chorar. Vou até a escola dela e conversarei com a professora dela. Alguma coisa deve estar acontecendo e eu vou descobrir o que é. — Vou falar com ela também, sondar para descobrir o que está acontecendo. Se a briga fosse com a Maria ou até mesmo com a Alexia, eu entenderia pai. A Maria é mais velha, gosta de mandar. A Alexia é a caçula, mexe nas coisas dela. Mas a Alicia é a melhor amiga dela, as duas são grudadas, não entendo essa revolta toda. — Ela quer chamar a atenção. A Alicia tem as coisas dela, grupo de leitura, ajuda na biblioteca da escola. Alicia sempre está envolvida em alguma coisa, já a Gaia não. Nada que a nós a coloquemos ela se adapta. Reclama de tudo, acho que ela passa muito tempo ociosa. Mas vamos mudar isso. Não quero nem ver quando sua mãe chegar. — Quem está vindo jantar? —Pergunto curioso pela quantidade de coisas que ele está fazendo.
— Seus tios, seus avós, as meninas. — Então é melhor conversar com o senhor agora. É... — Desembucha garoto! —Ele diz rindo e vem se sentar ao meu lado. Eu entrego uma cerveja para ele e fico pensando no que falar. — O senhor sabe que não sou mais virgem, não é? — Gostaria de não lembrar, filho. Queria que você não lembrasse também. —Ele diz baixinho. — Mas é como se eu fosse, não é? Nunca transei com uma mulher, nunca senti desejo por ninguém, muito menos por uma mulher. Já beijei algumas, eu te contei lembra? — Claro que lembro Júlio. Lembro tudo o que diz respeito a você. Mas que tal parar de rodeios e ir direto ao assunto? — Vida e eu nos beijamos! Pai... foi tudo completamente diferente das outras vezes. Eu não queria parar de beijá-la. Queria sentir seu corpo, sua pele na minha. Ver como ela é sem roupa. — Opa, opa, opa! Vamos com calma na sinceridade filho. —Meu pai diz rindo. — E você está com medo, é isso? Júlio, isso se chama desejo e é normal. Essa garota te abala de várias maneiras, você está descobrindo coisas novas. — Eu dormi com ela. — Falo e ele cospe a cerveja longe. — O que? — Ele pergunta assustado. — Pelo amor pai, eu dormir de dormir mesmo. —Falo rindo. — Dormi duas vezes com ela, a noite toda. Sem pesadelo nenhum. Dormi como anjo. — Jura? — Sim. A primeira foi no dia da balada e na outra foi dois dias atrás. Ela não queria ficar sozinha e eu também não queria ficar sozinho. Ela me faz bem pai, mesmo morrendo de medo eu quero continuar com isso.
— Mas. Sei que tem um, mas aí. — Sim, tem. E se eu não conseguir seguir adiante? Ela parece que tem experiência no que diz respeito ao sexo. Eu senti vontade pai, pela primeira vez eu quis continuar. — E por que não continuou? —Ele pergunta interessado. — Porque estávamos na sala de reunião! A Zezinha nos pegou no maior agarramento. Pelo amor de Deus pai! Essa garota tira o pior de mim. —Levanto e vou pegar outra cerveja e o deixo rindo. — Na sala de reuniões? Nem sua mãe doida do jeito que é. Essa menina é doida mesmo. — Pior que nem foi ela, pai. Eu que cheguei agarrando a menina. EU! Olha o grau de insanidade que essa menina me deixou. — Júlio, isso é normal. Você está vivenciando coisas, que deveria ter vivido na adolescência. Sensações que um homem descobre com quinze ou dezesseis anos, você está sentindo agora. Tipo uma adolescência tardia, entende? Você está descobrindo o seu corpo, como ele reage no momento de desejo. Excitação, é.... Hum... O amiguinho lá reagindo. Entendeu? — Entendi! Eu vou dormir com ela hoje, foi o trato que fizemos. — Trato? Me explique isso. — Porra! Digamos que foi uma troca. Não me faça te falar que tipo de troca, pai. —Eu imploro já arrependido de ter tocado no assunto. — A qual é! Começou agora termina. —Ele diz curioso. — Eu não entendi direito o que ela quis dizer. Vou usar as palavras dela... É difícil isso meu Deus! Ela disse que demos uns pega sinistros e por isso ela teve que tirar a calcinha. —Eu paro de falar quando meu pai tem um ataque de risos. — Pai! Para de rir, o senhor não está ajudando. Ela ficou sem calcinha a reunião toda e ia ao shopping sem calcinha. Agora me diz quem faz isso?
Fico uns bons minutos olhando meu pai se matar de rir, mas confesso que até eu quero rir depois de analisar a situação. — Ok; me deixa respirar. —Ele diz e volta a rir novamente. — Certo o que você não entendeu? — Não entendi um monte de coisas, aliás, desde que essa garota apareceu que eu não sei de mais nada. Mas o que está me perturbando é saber o porquê ela tirou a porra da calcinha! — Vamos lá, Jesus é foda ser pai. —Ele diz envergonhado. — Homem quando está excitado, o....o pau fica duro. Você sentiu isso, nesse pega sinistro? — Sim. — Queria que sua mãe estivesse aqui, ou a sua avó Belle. —Ele diz rindo. — O homem fica de pau duro e a mulher fica molhada. A sua namorada ficou excitada, por isso ela tirou a calcinha. Entendeu? — Deixa eu ver se entendi. Ela retirou a calcinha porque estava molhada? Ela se excitou e molhou, mas por que teve que ficar sem? — Júlio, parece que eu estou falando com aquele menino inocente de dezesseis anos. Você já ficou com as calças molhadas, isso incomodou não foi? — Sim... Ah agora eu entendi! Ok; chega desse assunto. Muita vergonha. — Só mais uma coisa. —Ele diz levantando. Eu me levanto também e ele fica na minha frente, segura meu ombro e olha nos meus olhos. — O que? —Pergunto confuso. — Esses pegas sinistros de vocês vão evoluir e, vocês vão querer dar um passo adiante. Vai ter uma hora que você vai precisar conversar com ela. Se você quiser tentar algo com ela filho, terá que se abrir e deixá-la entrar.
— Não consigo! Eu... e se ela... não pai, não consigo. Prefiro ficar sozinho, não posso contar tanta sujeira. As coisas estão indo bem, ela está me fazendo bem. Como eu conto essa merda para uma menina como ela. E se depois ela virar as costas, se ela não aceitar e for embora? Não é mais fácil terminar isso agora? — Eu vou embora! Pede desculpa para a mamãe, pede para o Tavinho levar a Vida embora. Amanhã eu ligo. — Júlio! —Meu pai grita, mas continuo andando. Pego o cesto com as coisas da Gaia e vou para o carro, porém justamente quando eu estou saindo, Vida e minha mãe estacionam. Minha mãe percebe a minha cara e desconversa falando sobre as coisas da Gaia. Conto o que aconteceu e falo que ela está de castigo. Vida fica calada e me olha confusa, por perceber que a estou ignorando. Todos chegam ao mesmo tempo, e os homens entram na frente e Vida ajuda a minha mãe entrar com as compras. Me pergunto onde estão as coisas dela, já que ela veio no carro da minha mãe. Lila me olha curiosa e responde a pergunta que fiz mentalmente. — Passamos na casa da Vida antes e deixamos suas coisas lá. —Lila diz e espera todos entrar e me para no caminho. — O que está acontecendo? — Não sei do que você está falando. — Sabe sim, você está com aquele mesmo olhar de quando a Yza e o Gael te acharam na construtora. Parece um cervo assustado, louco para fugir. Me diz, se abre Júlio. — Ela pergunta séria. — Só estou cansado, nada mais que isso. Vamos entrar? Ela fica me olhando por alguns segundos e depois me deixa passar. Vejo minha mãe e a Vida entrando na sala e as levo até o quintal, onde todos já estão sentados e bebendo. Vida senta-se a mesa com os meus tios e meu
pai me olha seriamente e aliviado por não ter ido embora. Otávio começa a perturbar a Vida e eu fico de canto olhando, mas doido para fugir e ir embora. E é o que acontece minutos depois. Saio sem ninguém perceber e volto para o vazio da minha casa. Não consigo!
Eu sou uma boba, não é mesmo? Eu sabia que alguma coisa estava errada, quando cheguei e ele nem olhou para mim. Achei que era por todos estarem reunidos e ele estava com vergonha de alguém falar alguma coisa sobre o que aconteceu mais cedo. Mas depois de entrar na conversa do Otavio, falar sobre meus pais eu acabei me distraindo e quando dei por mim ele tinha sumido. Eu queria sumir, porque quando o Dylan perguntou do Júlio e a Gaia disse que ele tinha ido embora, todos me olharam com pena. Engoli meu orgulho ferido, continuei conversando como se nada tivesse acontecido e quando foi ficando tarde, pedi um UBER para ir embora. Eu odeio que sintam pena de mim, não aceitei quando perdi a minha família e não será por causa de homem que vou aceitar. — O papo está bom, mas amanhã tenho um cliente logo cedo. Obrigado pelo jantar incrível, Gael. Meninas, obrigado pelo dia de meninas, podem me chamar sempre que quiserem; mas o carro que chamei está aí na porta, então é isso. Obrigado pela noite incrível. —Falo e pego minha bolsa. — Você está fugindo? – Maria me pergunta baixinho. — Jamais meu amor, só que já esta tarde e amanhã tenho que acordar cedo. — Mas você está triste, eu posso ver. —Maria insiste.
— Todos nós temos algumas tristezas guardadas, não é mesmo? Mas nada que um banho gostoso e uma noite bem dormida não resolva. — Eu vou te levar, Vida. —Gael diz, tirando o avental. — Obrigado Gael, mas o carro já está na porta me esperando. Abraço as meninas, Yza me olha séria, mas não diz nada. Sorrio lindamente, como se estivesse feliz. Isso eu sei fazer, foi o que mais aprendi ao longo desses sete anos. Me despeço de todos e vou embora. Entro no carro e vou conversando com o motorista até chegar na minha casa. Pago ele e entro em casa, mal Fechei a porta e saio arrancando a roupa e vou direto para o banheiro. Não sei dizer se estou triste ou com raiva, do que aconteceu. Na realidade estou bem confusa, saí da construtora com tudo combinado. Ele falou que me esperaria na casa dos pais dele e depois viríamos para a minha casa. Sei que pedi para ele dormir comigo, mas aceitaria de boa se ele tivesse dito que não. Eu sou carente, gosto de atenção, mas entendo quando dizem não. Eu gostei de dormir com ele, em seus braços dormir tranquila e sem o pesadelo de sempre às 3:22 horas da manhã. Ele não precisava ter fugido, se escondendo como se me devesse satisfação. Gosto de transparência, de sinceridade. Não dá não deu, ponto final, vida que segue. Visto um pijama e vou buscar do meu fone de ouvido e me aconchego na minha cama. Caço na minha playlist com músicas antigas, tipo flashback. Escolho Celine Dion e passo a mexer nas minhas redes sociais. Vejo fotos de antigos "amigos", alguns conhecidos da faculdade e então acho uma foto do meu padrinho. Curto e ele, em menos de cinco minutos me chama. Está viva carinho? Estava ficando preocupado. Eu sorrio com sua preocupação. Só não fui morar com ele depois que
meus pais faleceram, porque ele é o investigador de casos especiais. Oie padrinho, estou bem sim. Estava corrida, trabalho novo, mudança, mas agora tudo está perfeito. Ele manda uma carinha pensativa. Mudança de novo, Vida? Virou cigana agora? Espero que esteja no país pelo menos. Estou no Rio, mas me ofereceram um emprego no interior de São Paulo. Acho que vou aceitar. Interior? Interessante... O senhor não combina com o interior, tio. E suas farras? Suas gatinhas? Meu pai vivia zoando meu tio o chamando de putanheiro de Copacabana. Meu tio é um gato, mas não vale o pão que come. Acho que está na hora de sossegar, cansei dessa vida noturna, de viajar de um lado para outro. Estive nessa cidade anos atrás, bem antes de seus pais falecerem. Lembra o parque aquático? A cidade fica bem perto. Tenho um grande amigo lá, fizemos faculdade juntos e eu o ajudei com uns problemas. Mas me fale de você, aonde você anda carinho? Sorrio com o apelido que meu pai me chamava. Estou em Campinas, tio. Trabalho como decoradora em uma construtora. Aliás, estou viajando para o litoral esse fim de semana. Um trabalho no resort. Estou te ligando agora! Cinco minutos, foi esse o tempo que ele demorou, para ligar. — Oi Padrinho! — Carinho, o que você foi fazer em Campinas? —Ele pergunta preocupado. — Eu recebi uma boa proposta de emprego, a oportunidade de me afastar de tudo e todos. Estou bem tio, de verdade.
— Eu recebi uma proposta para assumir uma das delegacias de Campinas. Eu trabalhei em dois casos aí, anos atrás e meu antigo chefe me recomendou. Acho que assumo em uma ou duas semanas. —Ele explica e fico feliz por essa notícia. — Vai virar delegado? Vai ficar sentado atrás de uma mesa? Não posso acreditar, tio! Meu pai deve estar tirando sarro do senhor. — Bem capaz mesmo, aquele sacana faria isso com certeza. Ainda tenho que olhar casa, um lugar nem perto, mas também nem tão longe. Meu amigo ficou de olhar alguma coisa, falou sobre um apartamento, mas gosto mais de casa. — Vem e fica comigo, vou amar ter o senhor aqui. O bom é que terei companhia e o senhor comida fresquinha. Por favor, padrinho! — Não sei Carinho. Você tem sua liberdade e eu tenho a minha. — Por favor! Só até o senhor encontrar uma casa legal. Posso até olhar alguma coisa aqui na Vila do Chaves. Estou com saudades e carente de atenção, por favor, tio. — Continua chata! —Ele diz rindo. — Quando você vai para o litoral? — Domingo à noite, mas devo estar de volta na quarta à noite. Só vou para ver o lugar, olhar ao redor e verificar o que a dona quer. — Então eu vou na quinta-feira, me manda o endereço certinho. Devo chegar à tardezinha. — Eu amo o senhor! Melhor tio do mundo. Ficamos conversando mais alguns minutos, conto tudo o que faço na cidade. Como são os meus vizinhos e o meu trabalho. Antes de desligar ele pergunta o nome da construtora. — Carinho, como é o nome da construtora onde você trabalha? — CONSTRUTORA VALVERDE.
— Sério! Interessante. Agora vai dormir meu bem; amanhã nos falamos mais. Fica bem, ok? — O senhor também. Obrigado padrinho, estou ansiosa para ver o senhor. — Eu também carinho, eu também. Fica com Deus meu amor. Nós nos despedimos e eu volto a escutar Celine Dion e acabo adormecendo. Não escuto nada, apago até as 3:22 horas da manhã como sempre. Faço todo o meu ritual da madrugada, banho de banheira, uma taça de vinho e uma série na televisão. Reviso minha agenda para mais tarde e resolvo passar o dia fora, visitando os meus clientes. Desmarco uma reunião na construtora e remarco em um restaurante no centro da cidade. Invento uma desculpa qualquer e quando a cliente me responde aceitando, já eram sete da manhã. Resolvo ligar para o Otávio e avisar sobre os meus compromissos. — Alô, Vida? Não vai me dizer que está doente novamente? —Ele pergunta sério. — Eu doente? Sou um touro vendendo saúde, ou seria uma vaca? Não sei, agora estou indecisa. Mas não liguei para isso. — Então o que a senhorita quer logo cedo? —Ele pergunta brincalhão. — Você vai precisar de mim na construtora? Tenho algumas visitas agendadas e uma reunião a tarde. — Essa reunião não era na construtora, Vida? O que mudou? E outra, que visitas são essas? — Recebi um e-mail da cliente, ela está com o tempo apertado e vai estar pelo centro e me perguntou se teria problema. Eu não vi nada demais em aceitar, fiz mal? —Jogo uma mentira e rezo para colar. — Não, tudo bem.
— E as visitas são normais, estou adiantando porque semana que vem vou estar no litoral, mas se precisar posso ir para a construtora sem problema nenhum. — Não, tudo bem. Se eu precisar ligarei para você. — Tudo bem então, agora eu vou começar a trabalhar. Até amanhã Otávio. —Falo rapidamente e desligo. Ufa! Pego minhas coisas, guardo minha agenda e o notebook na bolsa, agarro as chaves do carro e saio de casa. Assim que entro no carro, meu celular começa a tocar. Rabugento ligando. Não, hoje não. Tudo o que eu quero é paz. Saio com o carro, coloco Dua Lipa para tocar e vou dançando e cantarolando por todo o caminho. — Bom dia mundo! Bom dia, Dia! Bom dia Vida! — Grito, animada. Xô baixo astral! A vida é linda, não tem espaço para tristeza.
Sabe quando você faz uma coisa e se arrepende, minutos depois? No momento que saí da casa dos meus pais e entrei no carro, o arrependimento bateu intenso. Não queria ter feito isso, foi mais forte que eu. Só de imaginar a possibilidade de contar um terço da minha vida para ela, me deixa doente de medo. Odeio falar sobre isso, odeio que o meu pai saiba, imagine contar para a Vida? Não sei o que estou fazendo, fui estuprado quando era criança, fui obrigado a transar com outros homens, mas sou virgem com uma mulher. Só de cogitar essa possibilidade me deixa doente, tão doente que tenho que parar o carro para vomitar. Queria ser normal, poder namorar e seguir em frente com ela. Sem medo de surtar com alguma coisa, de sair correndo como eu fiz agora. Faz anos que não me sinto assim, sujo, impuro, capaz de sujar qualquer coisa que eu toque. Ela é linda demais, pura demais, não quero ter que olhar o horror, a
repulsa, o nojo, estampado em seu rosto. Como contar uma coisa dessa magnitude, para uma pessoa tão pura quanto a Vida? Mal nos conhecemos, foram apenas uns beijos, mas ela conseguiu o que jamais sonhei. Atiçar a vontade de tentar. Ela despertou a ânsia do desconhecido, a vontade de mergulhar de cabeça nesse turbilhão. Descobri que o que sinto é normal, que mesmo depois de tudo, eu ainda sou capaz de sentir desejo e, desejar estar com outra pessoa é incrível e ao mesmo tempo amedrontador. Logo eu que sempre achei que ficaria sozinho, que nunca teria um alguém para chamar de minha. Mas ela apareceu e desde então é tudo o que quero tudo o que penso tudo o que desejo. Eu engoli a vergonha e fui conversar com o meu pai. Eu entendi o que ele me explicou, as sensações que estava sentindo, porém quando ele tocou no assunto proibido, foi como se tivesse tirado o meu chão. Não quero perder o que estou descobrindo com ela, é como se eu vivesse pela primeira vez na vida, depois de toda aquela merda. Sim, eu realmente parei no tempo, foquei nos estudos, me tornei arquiteto. Depois veio o nascimento das minhas irmãs, os cuidados com elas. Maria na escola. Não fui um adolescente normal, não tive amigos, namorada e nem vivi nas baladas. Meu foco era estudar, ser alguém e mostrar aos meus pais que eles podiam se orgulhar de ter me dado uma segunda chance na vida. Chego em casa, ligo todas as luzes e abro uma cerveja. Meu celular toca sem parar, desde que deixei a casa dos meus pais. Não olhei para saber quem era meu medo era ver que era ela quem estava ligando e cair em tentação e atender. Ou ir até ela e pedir perdão por tê-la ignorado, por ter fugido como o covarde que eu sou. A angústia é tanta que me deixa sem ar. Agarro o celular e jogo contra parede, revoltado por ser tão podre, por ser anormal! Depois de anos de tratamento e de terapia, eu ainda não consegui
esquecer o que aconteceu. Meus pesadelos melhoraram, mas eu ainda os tenho, só que com menos intensidade. Sempre fui estranho, sempre na minha, enquanto os outros colegas de classe se reuniam, iam para as festas, eu preferia ficar em casa. Fui para uma festa na época da faculdade e foi nela que dei meu primeiro beijo. Dei não, a garota que me beijou. Sou tão ridículo, que quando cheguei em casa a primeira coisa que eu fiz foi contar para o meu pai e para o Otávio. Parecia que eles sabiam o que aconteceria, todos estavam esperando eu chegar para saber o como tinha sido. Eu ainda continuo sendo ridículo, aonde é normal, um homem de vinte e seis anos não saber sobre sexo? Esse sou eu! Eu entendo de ser abusado, de apanhar, de ser surrado e de muitas outras coisas que eu gostaria de esquecer. Tudo o que estou sentindo é novo. A vontade de estar junto, o desejo de vê-la sorrir, gostar de beijar, a curiosidade em ir além, a reação do meu corpo quando ela está perto. Tudo isso é novo, pode até parecer infantil, mas eu preferi me fechar para tudo o que dizia respeito a sexo, até ela surgir no meu caminho. E eu quero isso! Quero tentar, quero dormir com ela, sentir seu corpo, ouvir seus suspiros enquanto ela dorme. Eu preciso tentar pelo menos, alguma coisa me diz que preciso tentar. Não durmo, ando o apartamento inteiro como um tigre enjaulado. Arrumei tudo, tirei pó de tudo, coloquei a roupa para lavar. Cinco horas da manhã e eu estou sentado no meio da sala, tentando arrumar a merda do celular que ataquei na parede. Mas como previsto, perca de tempo, joguei com tanta força que a tela trincou toda. Preciso falar com ela! Eu tenho um aparelho antigo, mas quem disse que eu consigo achar! Tirei todas as roupas do guarda-roupa, tirei todas as caixas e não acho o
maldito celular. E então me lembro do celular da Gaia, corro até a garagem e pego o cesto que com as coisas dela. É o fim da picada, usar o celular da minha irmã, detalhe, ROSA; entretanto, para minha tristeza, o celular está bloqueado. O desespero começa a bater e eu até cogito a ideia de ligar na casa dos meus pais para perguntar a senha, mas desisto porque teria que responder um monte de perguntas. Continuo com a minha andança pela casa, tomo banho, preparou um café forte e nada do tempo passar. Eu só senti essa angustia uma vez só, quando minha mãe foi sequestrada pelo maldito doente que queria matá-la. Aquele foi um dos piores dias da minha vida, as horas não passavam, mil ideias surgiam na cabeça. A possibilidade do meu pai e a polícia chegarem tarde demais, foi tudo um verdadeiro inferno. E foi por pouco que não perdi a minha mãe, mas graças a Deus e a sua coragem, ela sobreviveu. Quando o relógio marca seis e meia da manhã, não resisto e ligo para a casa dos meus pais. Quem atende é a Nina, a ajudante da minha mãe. — Nina, não fala o meu nome. —Peço rapidamente. — Não gosto disso! Estão todos preocupados com você menino. — Ela diz brava. — Eu sei, meu celular quebrou a tarde eu apareço aí. Escuta a Gaia já acordou? — Sim, está na cozinha tomando uma vitamina. Quer falar com ela? — Por favor. Aguardo alguns segundos até a minha irmã atender. — Alô? —Ela atende. — Gaia, sou eu. Qual é a senha do seu celular? — Por quê? Não tem nada demais nele, Júlio. Só jogos e conversas com as minhas amigas. Quando eu chegar na construtora posso te mostrar. — Ela diz assustada.
Aí tem! — Não vou mexer nas suas coisas, só preciso usar o seu celular. O meu quebrou e só vou poder comprar outro mais tarde. Olha o que o desespero faz! Ela me passa a senha e quando escuto a voz do meu pai, agradeço e desligo rapidamente. Desbloqueio o celular, coloco o meu chip e envio uma mensagem para a Colorida. Ei eu sei que deve estar com raiva, mas quero me desculpar. Ela não responde, e eu mando outra. Por favor, Colorida, eu posso explicar o porquê de ter ido embora. Espero mais um pouco e nada. Então uso o aplicativo da minha irmã, me seguro para não ver as conversas dela, mas prometi que não iria ver e não vou. Vida é o Júlio. Teria como você responder as minhas mensagens? Vida Martins, você vai trabalhar? Fala comigo! Eu perdi as contas de quantas mensagens eu mandei, mas ela não respondeu nenhuma. Sete horas da manhã, arrumo minhas coisas e sigo para a construtora. Paro na merda da padaria, compro os malditos pães de canela que ela ama, até escolho uma torta de limão. Tudo para fazê-la falar comigo. Cheguei cedo à construtora, mas fico esperando-a na recepção enquanto tento ligar para ela. Otávio chega primeiro que ela e me olha preocupado. — Bom dia moleque! Está esperando alguém? —Ele pergunta me olhando com curiosidade. — Faz tempo que você não me chama de moleque e justamente hoje você solta isso. —Falo rindo sem graça. — Vamos até a minha sala, Júlio. — Depois, estou esperando a Vida. Preciso falar com ela um assunto sério.
— Ela não virá hoje. —Otávio diz e sai andando para a sala dele. — Por quê? Ela está doente de novo? — Pergunto indo atrás dele. — Fiz a mesma pergunta e ela respondeu que não. Disse que adiantou as visitas que ela teria que fazer semana que vem aos clientes. E também teria uma reunião com uma cliente que está com o tempo corrido, achei bem estranho. — Mas isso leva o dia inteiro? —Pergunto, sentindo uma bola afundar no estômago. — Eu não questionei, não depois de ter visto a cara dela ontem. Ela tentou esconder que ficou magoada, depois que a sua irmã disse que você tinha ido embora. O que aconteceu amigão? Moleque, amigão, era assim que ele se referia a mim quando era mais novo. Sinto falta disso às vezes. Respiro fundo e resolvo conversar com ele, afinal eu o tenho como um segundo pai. — Eu conversei com o meu pai ontem, ele me explicou algumas coisas sobre o que eu estava sentindo e que não vem ao caso agora. — Também não irei perguntar, nunca pergunto Júlio. Sempre gostei de você tomar a iniciativa, sei como isso é importante pra você. — Ele me pediu para ser sincero com ela, contar o que aconteceu no meu passado. Assim ela poderia entender a minha insegurança. — Concordo com o seu pai, Júlio. Para ela saber lidar com você, a Vida tem que saber sobre o seu passado. Se você pretende seguir adiante, ela tem que estar preparada para saber como agir com você. — Você não sabe de tudo, mas deve fazer uma ideia do que aconteceu. Você viu de perto, você presenciou o que me acontecia, você me salvou daquele inferno, Otávio. Me diz como que eu conto uma merda dessas para uma menina igual a Vida? É tanta sujeira, que sinto repulsa de mim mesmo.
Eu começo a andar pela sala tentando me acalmar. Vou contando cada item que tem aqui dentro, cada piso, cada detalhe das persianas. Tudo isso para me manter calmo. Otávio fica calado, esperando que eu me acalme. É engraçado como ele e o meu pai, me entendem, os dois não me pressionam a nada. É tudo no meu tempo, sem me apressar para falar o que eu não quero. Só quando me sento que ele volta a falar. — Você acha que é fácil te dar esse conselho, Júlio? Acha que esqueci o que eu presenciei? Não é fedelho! Mas eu sei que isso vai te fazer bem. Eu posso ver nos seus olhos o quanto você quer essa garota. É repentino? Talvez seja para quem não conhece você. Para quem sabe da sua história esse momento demorou muito. Por que você acha que estamos todos animados com esse futuro romance? Não é para encher o teu saco ou te envergonhar. É por que esperamos dez anos por esse momento. — Não sei o que fazer Tavinho. Pela primeira vez na vida, eu não sei como agir, o que falar. Quando eu era menino, eu sabia que tinha que manter a Maria segura, quando encontrei vocês, sabia que tinha que dar o meu melhor. Cuidei da Maria e da Luna, ouvi conselhos de todos, fui um bom filho, bom aluno. Sempre ajudei no que pude. — E tudo o que eu e seus familiares queríamos, era que você fosse feliz, Júlio. Que esquecesse o seu passado e pudesse ser um menino normal. Não que nós não nos orgulhemos de você ou do que você conquistou. Não precisava ter feito nada garoto, só ter sido você mesmo. Sabe por que estamos tão ansiosos por esse lance entre você e a Vida? É que em duas semanas que ela chegou, vimos mais de você do que em dez anos. — Não entendo. — Você sempre foi um bom menino, sempre prestativo, carinhoso com as crianças, sempre responsável, estudioso, bom filho, bom neto, bom sobrinho. Mas a Vida trouxe para "vida" entende? Você se tornou instável,
ciumento, possessivo, dramático, faz merda, xinga, resmunga. Tudo o que você nunca foi antes! Você reparou que está se abrindo muito mais agora do que nos dez anos que se passaram? É como se você estivesse vivenciando a adolescência só agora, isso é maravilhoso. Você está vivo amigão, está realmente vivendo. Ele está certo, eu sempre fui certinho demais, previsível demais. Minha mãe sempre brigou comigo porque não agia como os outros adolescentes; nunca dei PT, tive uma discussão com meus pais ou fiz birra. Sempre fui adulto demais, mesmo quando era criança. — O que eu faço? — O que seu pai te aconselhou. —Ele responde e quando vou argumentar ele continua a falar. — Não precisa dizer tudo agora, até porque é coisa para caralho e que abala qualquer emocional, mas pode dizer que você não teve uma infância boa, que passou por coisas muito ruins. Pode contar sem entrar em detalhes agora e quando estiver mais seguro, você pode começar a entrar mais profundamente no assunto. — Não sei... — Esse jogo só quem pode jogar é você, garoto. Torcida você já tem, só precisa chutar a bola. Se ficar parado, pode perder a maior chance da sua vida. Se decidir jogar, poderá sair como campeão. A decisão é sua. — Como eu faço isso? Ela está me evitando, Tavinho. Não responde as minhas mensagens, não atende minhas ligações. Não sei o que fazer. — Vou te ajudar, mas tem um preço! —Ele diz sorrindo cinicamente. — O quê? — Babá da Lou e da Olí por dez dias. Quero levar a Lila para viajar, tipo uma lua de mel. — Fechado! —Repondo rapidamente. Otávio pega seu celular e começa a mexer e então coloca no ouvido.
— Maura querida, tudo bem? Comigo está tudo perfeito. Gostaria de te pedir um favor importantíssimo. —Ele fala e escuta a resposta. — Meu sobrinho Júlio, precisa de um tempinho a sós com a garota dele. Problemas no paraíso querida, sabe como é. Eu fico olhando abismado para ele. Filho da puta! — Casados? Filho de cinco anos? Sim! Sabe como é; eles são novos, foram pais cedo demais, então tudo fica meio que sobrecarregado. Pensei que, como eles estão de viagem marcada para domingo, para vistoriar o resort, pensei em adiantar as coisas. Mas para isso preciso de um favorzinho seu. Eu o deixo bolando seu plano maligno e vou para a minha sala. Graças a Deus, não tenho nada que precise da minha atenção ou eu estaria fodido. Sento na minha mesa e tento ligar para ela novamente, mas como das outras vezes, cai na caixa postal. Você poderia muito bem me responder, não é? Custa mandar notícia ou mandar eu me foder? Vamos lá, Colorida! Você não é uma pessoa ruim. Nada de resposta. Se eu te disser que sou burro e que me arrependi assim que saí da casa dos meus pais, você acredita? Nada! — Parece um cachorrinho que caiu da mudança! —Otávio entra na sala falando. — Quantas mensagens você já mandou para ela? — Perdi as contas! Ela é muito rancorosa, sabia disso? — Mulheres, Júlio. Mulheres! Vai aprendendo, pelo visto essa daí é osso duro de roer. Vamos ver se ela me atende. —Otávio diz e liga para ela conectando ao viva voz do celular. — Ei senhor Valverde, acabei de chegar na minha segunda visita.
Alguma coisa importante? —Ela atende falando apressadamente. — Sim, senhorita Martins. Pode me conceder dois minutos de atenção? — Só um minuto. —Ela pede e ouço de fundo ela falando com alguém. — Pronto Otávio, pode falar. — Obrigado senhorita. Então, surgiu um imprevisto. A Maura ligou e perguntou se vocês não podem ir mais cedo, ela disse que aconteceu um problema e ela não queria adiar a visita. — É... eu... acho que não tem problema. Para quando? — Hoje, no final da tarde. Vou ligar para o Júlio e pedir para ele levar o carro para uma revisão básica. São quatro horas de viagem, nada muito puxado. — O Júlio também vai? —Ela pergunta surpresa. — Lógico ou você esqueceu que ele é o arquiteto do projeto? — Claro que não esqueci! Achei que iria só eu, já que vou começar o trabalho primeiro. — Achou errado gata; esteja pronta as quatro horas da tarde, o Júlio odeia esperar. Qualquer coisa me liga. Bom dia Vida. —Otávio diz e desliga em seguida. — Vamos viajar hoje? — Sim, senhor que casou e não me convidou. Que decepção, o que será que a nossa família dirá quando souber que além de casar, você ainda teve um filho? Ai, ai, ai, o que a dona Yza Reed vai falar sobre isso? — Você fica calado, ou vou contar para a Lila o seu podre! Essa história foi a Vida que inventou, então, se mantenha calado. Sabia que isso iria vir à tona. — Quando você se tornou um traíra, manipulador? — Aprendi com o melhor, senhor Valverde.
— Bem, está tudo programado. Com essa história de casamento, ela vai reservar a suíte para os dois. Vai calhar perfeitamente, porque como vocês são "casados", não tem como pedir quartos separados. Aí amigão é só correr para o abraço. —Otávio diz animado. — Você sabe que tenho pesadelos, não sabe? — Mas pelo o que ouvi por aí, você não teve pesadelos quando dormiu com ela. —Ele diz sorrindo. — Essa rede de fofocas está foda! Vocês não têm vida própria não? — O único que tem uma "Vida" interessante é você, meu caro amigo. — Idiota! —Falo pegando minha mochila para ir pra casa. — Não vai trabalhar não? Virou casa da mãe Joana essa merda? — Vai me mandar embora? Logo eu, o seu herdeiro? —Falo debochado. — Vou pedir o carro do meu pai emprestado. — Qual, a picape? — Claro, se estou indo a trabalho, tenho que levar as minhas coisas, não? — Inteligente você, aprendeu certinho. Vou direto pra casa dos meus pais, o foda vai ser explicar as coisas, mas isso nem é o que me preocupa e sim a minha conversa com a Vida. Vou treinando o caminho todo sobre o que eu vou falar. Tenho mais ou menos cinco horas e quarenta e dois minutos, para descobrir como abordar esse assunto, entretanto se eu quero alguma coisa com ela, terei que falar. Só espero que ela me entenda.
Vou te contar viu! Acho que Deus só pode estar de sacanagem comigo. Eu aqui, firme e forte ignorando o Rabugento, mas doidinha para falar com ele e o que o Todo Poderoso faz? Isso mesmo, Ele vem e me dá uma rasteira do caralho. O que aquela velhadia do cacete tinha que adiantar a visita? Agora ficarei quatro horas presa dentro de um carro com aquele homem, como eu vou ignorar aquele ser gostoso da minha vida? — E mais uma vez o Senhor me fodeu, hein Todo Poderoso; Oh! Grande Criador do céu e da terra! Maneira aí né, daqui apouco nem consigo sentar direito. —Falo olhando para o céu. — Falou comigo senhorita Martins? —O marido da minha cliente pergunta. — Não! Estava orando para Deus abençoar o meu dia de trabalho. É Vida Martins, uma hora essa desculpa não vai colar.
— Muito difícil de ver alguém tão jovem como você, tão religiosa. — Ele diz admirado e eu quero sumir de tanta vergonha. Vou para o inferno, mas pensando bem se o diabo for igual ao Lúcifer da série, eu iria de bom grado e tomando cerveja quente de canudinho. Ando pela casa com o marido da minha cliente e ele elogia cada canto que foi mudado. Eles amaram as cores, os móveis, tapetes, texturas, tudo ficou realmente lindo. Fico meia hora conversando com eles e depois vou para o meu último compromisso do dia. A reunião é rápida, ela me entregou algumas fotos, mostro a paleta de cores e dou a minha opinião. Pegarei o apartamento vazio, todas as paredes brancas, então será como colorir uma tela. — Vida, eu sei que você está corrida, agradeço por ter me encaixado na sua agenda e saiba que não tenho tanta pressa assim. Só me mudarei definitivamente daqui há quatro meses, você acha que já estará pronto? —Ela pergunta ansiosa. — Eu te encaixei justamente porque sei que dará tempo, não terei muito trabalho pois o apartamento estará vazio e totalmente branco. Vai ser como brincar de colorir e eu amo isso! Dar vida a uma casa, dar cor a ela é magnífico. — Você ama o que faz, não é mesmo? Quando eu me mudar de vez, adoraria sair com você, tomar uma bebida e te conhecer melhor. —Ela diz animada. — Eu adoraria Aline, mas só para deixar meio que avisada, não me entenda mal pelo amor do Jesus. Eu gosto de homem, tipo homem mesmo. — Falo sem graça e ela solta uma risada alta. — Você é maravilhosa! Não se preocupe, Vida. Eu também amo um homem viril, aquele com pegada bruta. Só quero fazer uma amiga mesmo, já que deixarei tudo para trás. —Ela diz rindo.
— Ufa que susto! Já somos amigas então, só não me pede desconto porque aí enfraquece a amizade. Agora eu vou embora, tenho que preparar o meu psicológico para viajar com o homem que está me fodendo! — O que? —Ela pergunta assustada, engasgando com a risada. — Mente poluída; já gostei de você. Me fodendo psicologicamente, Aline! Parece que Lúcifer terá mais uma companhia, mas já falo que o colo é meu! Tchau Aline! —Me despeço e a deixo rindo sozinha. Eu hein, só atraio gente doida credo. Vou para a minha casa, preparando o meu psicológico para viajar com o Júlio. Fazer voto de silêncio não eu vou conseguir; falo mais que a minha boca. Talvez eu coloque uma fita adesiva! É uma opção. Ou em vez de gloss eu passe DIPIRONA, assim quando abrir minha boca o gosto ruim bater, eu me cale para todo o sempre. DIPIRONA não é de Deus não, oh coisa ruim credo. Mas é uma opção viável. Estaciono o meu carro, pego minhas coisas e vou em direção a minha casa. — Ei menina linda, chegou cedo! Ia fazer panquecas para você jantar. —Dona Mimi diz animada. — Mimi meu amor, hoje não vou jantar. Tenho uma viajem de negócios, mas quando voltar vou querer comer essas panquecas. Dona Mimi é uma senhorinha de sessenta e dois anos, mas muito independente e bem resolvida. Viúva e mãe de dois filhos ingratos! Ódio que eu tenho desses meninos. Ela é um amor, carinhosa, tem boa conversa e bem safadinha viu. — Vai viajar sozinha? Quer ajuda com as malas? —Ela pergunta. — Vamos entrar Mimi, assim eu faço um café e você me ajuda a fazer uma mala pequena. Sou uma negação para essas coisas. Entramos e eu largo minhas coisas no sofá e escuto os resmungos da Mimi, me chamando de atrapalhada e bagunceira. Coloco a cafeteira para
funcionar e a levo até meu quarto. Mimi é aquela avó cuidadosa, que se preocupa com tudo e que ama ajudar. — Eu vou com outro funcionário, essa viagem era para ser domingo, mas a cliente pediu para adiantar. Agora imagina Mimi, um resort, final de semana e com esse sol? Aposto que terá hospedes e vai ser aquela chatice só. — É aquele menino bonito que veio aqui outro dia? —Ela pergunta curiosa enquanto vai dobrando as roupas que vou pegando. — Esse cretino mesmo. Ele vai vir me buscar daqui apouco. — Então leva umas roupas mais sexys! Assim você captura aquele homem lindo. Cadê as calcinhas? Pega umas ousadas, nada daquelas cuecas que você usa, parece calcinha de vovó carola. — Mimi! A senhora anda muito saidinha viu. — Estou velha e não morta. Onde ficam as suas calcinhas? Eu mesma vou escolher. Onde já se viu! Uma mulher linda como você, sozinha. Se eu tivesse a sua idade minha filha, estaria fazendo era fila na porta dessa casa. — Muita informação Mimi. Eu não vou levar calcinha sexy nenhuma, não quero seduzir ninguém, muito menos esse Rabugento. —Falo e pego várias cuecas femininas e coloco na mala. Vou ao banheiro e pego meus produtos de beleza, minha bolsinha de maquiagem. Separo dois tênis, uma sandália e um chinelo de dedo. Vou até a cozinha e sirvo duas canecas de café, uma com adoçante para Mimi e outra com meio quilo de açúcar para mim. Volto para o quarto e minha mala já está quase toda arrumada. — Mimi você é um anjo! Como fez essa mágica? Até meus sapatos você encaixou! — Eu já fui aeromoça quando era mais nova, então eu tinha que fazer as malas rapidamente quando era escalada. A gente aprende depois de anos de profissão. Agora vai tomar um banho bem gostoso, se arrumar bem linda e
passar aquelas maquiagens magníficas. — Obrigado Mimi, vou fazer isso mesmo. Me despeço dela e vou tomar um banho bem quente. Eu passei o dia todo ignorando meu telefone, perdi as contas de quantas ligações o Júlio me fez. Fora os SMS que ele me mandou e mensagens no aplicativo que nem abri hoje, só via pela barra de notificação. Eu estou chateada sim, mas não foi por ele ter ido embora. Pode ter aparecido alguma coisa urgente, sei lá, mas foram os olhares que a família dele me deu. Fui para a casa dos pais dele porque ele me pediu, poderia muito bem ter ficado em casa quando parei para deixar as minhas coisas. Ele poderia ter me ligado ou mandado uma mensagem se explicando, mas ele não fez isso. Só veio me ligar de manhã cedo. Acho sim que ele me devia uma explicação por ter me deixado lá sem avisar, assim não teria sido pega de surpresa quando a irmã dele deu a notícia; porém isso é passado. Agora vou agir como uma amiga de trabalho; vou controlar a minha boca e falar sobre o essencial. Termino o meu banho, coloco uma jardineira preta, uma camiseta rosa e um tênis no pé. Penteio o meu cabelo, faço uma maquiagem básica, para esconder as minhas olheiras e levo minha mala para a sala. Fecho todas as janelas, desligo o gás, coloco água nas minhas flores. Depois vou para sala ficar esperando o senhor D'Ávila chegar. Dez minutos depois recebo uma mensagem dele. Ei, Colorida, eu estou aqui na frente. Quer ajuda com a bagagem? Por que ele tem que ser assim? Não tem como ficar com raiva desse santo! Não respondo, pego a minha mala, minha bolsa com todas as coisas que vou precisar, fecho a casa e vou até ele. Júlio está me esperando em frente a uma picape cabine dupla monstruosa preta, ele abre a porta para vir me ajudar com a mala. — Por que não me respondeu? Eu teria ido te ajudar com a mala! —
Ele diz chateado. Caguei! — Eu acho que sou capaz de carregar uma mala de rodinhas, Júlio. Mas obrigado pela intenção. Ele pega a minha mala e coloca no banco de trás, eu abro a porta e fico pensando em como vou escalar essa merda para poder entrar. — Precisa de ajuda para subir? —Ele pergunta tentando esconder o riso. — Você fez de propósito, não é? Sabia muito bem que não ia conseguir subir nessa merda, aliás, quem dirige uma coisa monstruosa dessas? Sua é que não é! — É do meu pai e não, não fiz de propósito. Só queria um carro seguro para dirigir na estrada. Vem, vou te ajudar. —Ele diz e me pega pela cintura e me coloca sentada no banco. Enquanto ele dá a volta nesse monstrengo, eu coloco o cinto, pego meus fones de ouvido e coloco uma música para escutar. Assim que ele entra, sinto que ele olha para mim, mas prefiro ignorar. Ele liga o carro e sai da minha porta e iniciamos nossa viajem. Ele está lindo, bermuda jeans, camiseta polo e um tênis no pé. Ele dirige com toda a atenção e eu finjo que estou mexendo no celular. Estamos os dois, no mais absoluto silêncio e até me assusto quando meu telefone começa a tocar. Eu como sempre, me atrapalho toda. Tiro o fone e atendo a ligação. — Alô? Alô? —Atendo e ninguém responde. — Só falta essa merda ter quebrado! Conecto a ligação ao viva voz do celular, e a voz do meu padrinho ecoa pelo carro. — Carinho? Carinho está me ouvindo? —Ele diz preocupado. — Estou no viva voz, acho que essa merda quebrou. —Eu respondo e
ele começa a rir. — Você estava usando o fone mais uma vez, Vida? — Estava por quê? — Você sempre faz a mesma coisa, Carinho. Tirou o fone para atender. —Ele diz rindo. — Você é tão atrapalhada, Vida. O que vou fazer com você? Júlio resmunga alguma coisa, mas nem dou atenção. Desconecto e retiro os fones. — Já resolvi o problema, Padrinho. — Escuta, vou chegar mais cedo do que o previsto. Tem algum problema? — Lógico que não, mas eu não estarei em casa. A cliente pediu para adiantar a visita e estou indo agora para... espera padrinho. Para onde estamos indo mesmo Júlio? Ele me olha feio, mas responde a contragosto. — Para um resort em São Sebastião. Maresias para ser mais exato. — Maresias, padrinho, mas vou ligar para a dona Mimi e avisar que o senhor está vindo. Ela tem uma chave reserva já que vivo esquecendo a minha. Aliás, todos os vizinhos têm, mas vou ligar para a Mimi. Quando o senhor vai chegar? — O que já falamos sobre essa merda, Vida? Isso é perigoso meu amor, e se sua casa for arrombada ou se alguém entra e leva alguma coisa? — Lá só mora gente de idade, quem me roubaria? Meu tio ficou paranoico depois que tentaram assaltar a minha casa anos atrás, a sorte foi que havia câmeras e descobriram que foi um primo. — Não interessa Vida! Sei que está muito longe de todos, que eles não sabem onde você está, mas essa gente por dinheiro é capaz de vender a mãe na zona. Quando você voltar nós teremos uma conversinha mocinha. Eu
chegarei amanhã à noite, mas acho melhor ficar em um hotel até você voltar. — Não! Vou ligar para Mimi, ela vai ficar te esperando. Vou enviar uma mensagem com o número dela, assim o senhor avisa o horário certinho. — Ok, juízo nessa viajem e se esse tal de Júlio se meter a besta, eu mato ele e dou para os cachorros comerem. — O senhor nem tem cachorro! — Falo rindo. — Mero detalhe. Se comporte Carinho e me ligue quando chegar lá. —Ele se despede e desliga. Ligo para Mimi e aviso que meu tio vai pegar a chave e ela me pede uma foto dele. Essa Mimi é fogo! O carro está no mais completo silêncio e até me assusto quando o Júlio fala. — Quem é esse aí? Não minta dizendo que é seu padrinho. —Ele diz bravo. — Eu posso ser tudo, Júlio. Mas uma coisa que eu não sou é mentirosa, posso inventar desculpas, porém jamais menti para você. — Desculpa, entretanto, um padrinho não fala assim, cheio de apelidos. — Ele me conhece desde quando eu nasci. Ele era melhor amigo dos meus pais e ele usa o apelido que meu pai me chamava. Não tem nada demais. — Ele vai ficar na sua casa? — Sim. — E depois que você voltar, ele ainda vai ficar lá? —Ele pergunta todo sério. — Vai. Ele está procurando uma casa, vai mudar para Campinas e assumir uma das delegacias. — Entendi. Então você não vai mais precisar, de companhia para dormir, não é?
— Eu mal durmo Júlio. — Então somos dois. Você vai me ouvir agora? — Se for sobre trabalho sim, ouço o que você quiser. Mas se for sobre ontem, não quero ouvir nada. — Só me deixa explicar, por favor. —Ele pede baixinho. Eu estou magoada, porém não gosto de vê-lo triste. Isso mexe demais comigo, acho que ele deve ter tristeza demais, visto o que eu vejo em seu olhar. — Eu fiquei magoada ontem, Júlio. Não foi por você ter ido embora, mas por todos os seus familiares me olharem com pena, quando a sua irmã disse na frente de todos que você tinha ido embora. Você poderia ter me mandado uma mensagem dizendo que aconteceu um imprevisto. Ou até mesmo que mudou de ideia, você não era obrigado a dormir na minha casa. — Eu sou um idiota, Vida. Tenho algumas coisas para contar, mas não me sinto preparado agora. Só posso te dizer que me arrependi de ter ido embora, assim que entrei no carro. Você me apavora Colorida, não quero estragar as coisas com você. Estragar as coisas comigo? Então é sinal que ele acha que temos algumas coisas? Jesus, amado, será que eu deveria ter ouvido a Mimi ter pegado umas roupas mais sexys? Droga! — Por que estragaria? Estamos nos conhecendo, Rabugento. E é normal fazermos coisas erradas, eu só queria que tivesse falado comigo. Eu juro que entenderia. Eu sou carente, às vezes gosto de carinho e atenção, mas eu sei respeitar quando não dá. Eu gosto de estar com você, gostei de dormir em seus braços, eu dormi melhor em dois dias com você do que em sete anos. — Eu também dormi melhor com você em dois dias, do que em dez anos da minha vida. Não gostei da sensação de ter te magoado, não gostei de não poder te ver hoje, de você ter ignorado todas as minhas ligações e as
minhas mensagens. Eu nunca me senti assim antes, tudo isso é novo. — Você nunca namorou? —Pergunto curiosa. — Tem muitas coisas que quero conversar com você, mas não agora e não dentro do carro. — Tudo bem. — Estamos bem? —Ele pergunta inseguro e tudo que quero é me arrastar para o seu colo e enchê-lo de beijos. — Estamos bem, Rabugento. —Respondo e ele sorri de lado. Eu já falei que esse sorrisinho dele mexe comigo? — Bem para ganhar um beijo? Rio parecendo uma adolescente apaixonada, eu me inclino e beijo seu rosto. — Prontinho. — Não vale! —Ele diz indignado, me fazendo gargalhar alto. Ele vai o caminho todo segurando minha mão, só largando para mudar a marcha e depois segura novamente. Fizemos duas paradas, uma para eu ir ao banheiro e outra para o Júlio comer alguma coisa. Conversamos sobre sua família, ele me conta sobre um psicopata que quase matou a Yza e eu fiquei horrorizada. É tão linda a forma que ele fala dos pais, o amor dá para ser sentido de longe. O jeitinho carinhoso que ele fala das irmãs, principalmente da Maria. Ele adora as crianças da família, fala com muito carinho da Lila e do Otávio. Aprendi em poucas horas que esse homem tem o coração enorme e que ama como ninguém. Ele é carinhoso, fiel, bom filho, bom neto, um ótimo irmão, um excelente sobrinho. Ele tem tanto amor dentro de si, mas parece que ele não enxerga isso. Pelo menos é o que eu acho. O GPS avisa que a poucos metros à frente, pegaríamos trânsito
intenso, Júlio ficou tenso e pediu para eu pesquisar na internet o que aconteceu. — Um caminhão tombou na pista, não foi nada grave, mas eles estão limpando, por isso há congestionamento. — Entendi, será que eles vão liberar logo? Não gosto de ficar parado no trânsito. Ainda bem que peguei o carro do meu pai. — Calma, daqui apouco começa a andar. Li que estão limpando, então não deve demorar. Ele para, atrás de outro carro e fica atento ao redor. Ele está uma pilha de nervos, então mexo no som do carro e coloco em uma música calma. Ele me olha curioso e eu sorrio toda angelical. — Por que está sorrindo assim? Não gostei, só para deixar registrado. Esse sorriso é igual ao da minha mãe, quando ela vai aprontar ou já aprontou. — Credo! Sua mãe é muito doida, tipo doida de hospício mesmo. Sua avó nem se fala. — Falo tirando o cinto de segurança. — Por que tirou o cinto? Daqui a pouco tudo começa a andar e você pode se machucar se eu precisar frear. — Vai demorar um pouquinho. —Falo soltando o seu cinto também. — Sabe, podemos namorar um pouquinho, fazer as pazes... — Mas você já me perdoou, porque quer fazer as pazes? Esse homem existe? Por que estou achando que ele é fruto da minha imaginação. Não sei dizer se ele está falando sério ou se está fingindo toda essa inocência. — Você me pediu um beijo, não quer mais? Então tud... Antes que eu possa terminar de falar, ele me puxa para os seus braços e me beija. Acabo rindo do seu ímpeto, eu estou sentada de lado no seu colo e ele ri também e encosta sua testa na minha. — Senti falta de ouvir seu riso hoje. Por que não respondeu as minhas
mensagens? —Ele pergunta tirando o arco do meu cabelo. — Estava brava. Por que você não me mandou mensagem antes? — Porque quebrei meu celular quando o joguei na parede. Se você olhar as mensagens no aplicativo, verá que mandei do telefone da Gaia. — Não quero mais falar sobre isso, vamos namorar? Já deu uns amasso no carro? — Não, nem sei que merda é essa. — Vou te ensinar! — Acho que vai ter que me ensinar depois, Colorida. A fila está andando. —Ele diz rindo. —Merda! Mas quando parar de vou te dar uns pega sinistros, ok? — Muito ok da vida toda! —Ele diz e acaba caindo na risada. — Desculpe Vida. É que a Luna quando era pequena, vivia falando isso. Então todos nós pegamos isso dela. Dou um beijo nele e volto ao meu lugar. Para o meu azar, o trânsito não parou novamente, andava lentamente, mas não parou mais. Universo, Universo, para de jogar contra!
Chegamos ao resort com uma hora e meia de atraso. Eu estou cansado, com fome, doido por um banho e dormir. Vida também está muito abatida, já tem um tempinho que ela vem bocejando. Nós dois não dormimos nada pelo visto. Eu a ajudo a descer do carro, pego as nossas malas e entramos no saguão de entrada. Assim que chegamos à recepção, Dona Maura aparece e vem toda feliz falar com a gente. — Meu casal lindo! Que bom que conseguiram vir hoje, me perdoem por mudar a data, mas algumas coisas aconteceram e preciso viajar antes do previsto. —Maura diz e abraça a Vida, depois vem me abraçar. — Meu bem, poderia pegar as chaves da suíte principal? — Suíte principal? —Vida pergunta e me olha assustada. — Claro que sim! O melhor para esse casal lindo espero que tenham conseguido alguém para ficar com o filho de vocês.
— Não tem... — Meus pais ficaram com ele, mas não se preocupe ele está maravilhosamente bem. Meus pais amam o neto, não é Vida? — Corto-a antes que entregue a mentira. — Sim, claro. — Aqui estão às chaves, podem pedir o que quiserem pelo telefone ou ir ao restaurante. Imagino que devem estar cansados, fiquei sabendo do acidente. — Obrigado Maura, estamos extremamente cansados. Amanhã nos falamos melhor, pode nos encontrar no café da manhã? — Com toda a certeza, Júlio. Bom descanso para vocês. —Maura diz, e depois de se despedir ela vai embora. — Nós não podemos ficar no mesmo quarto! —Vida diz nervosa. — Você quem disse que somos casados, agora aguenta. Vamos lá Colorida, estou cansado, com fome e doido por um banho. —Juntos? — Juntos o que? — Nós vamos tomar banho juntos? —Ela pergunta esperançosa e isso me faz rir. — Não, ainda não. Nós temos que conversar, lembra? — Tudo bem, mas vamos dormir juntos, não é? Nada de sofá ou tapete, somos casados e dormimos na mesma cama! —Ela diz e sai puxando a mala dela. Maluca! Saio rindo atrás dela, se ela soubesse que tudo isso é armação, qual seria sua reação? Era para eu estar nervoso, com medo, mas me sinto diferente. Me sinto preparado para começar a contar um pouco sobre mim, não tudo, mas
algumas coisas importantes. Sigo a maluca até a nossa suíte e eu pego as chaves da sua mão, abro a porta e a deixo entrar. O quarto é incrível, bem arejado e uma cama imensa. É bom, porque a Vida é espaçosa para cacete. —Olha, vou te falar uma coisa viu Rabugento. O quarto é grande, mas tem um monte de defeitos. Olha esses rodapés! Tudo descascando, cantinhos embolorados, parede meio amarelada. Para quem disse que é um resort chique, está faltando dindin nessa bagaça aqui. —Vida diz olhando o quarto. — Pelo amor de Deus Colorida! Você acabou de entrar, como pode ter visto tudo isso? Para mim o quarto é incrível, a cama enorme, janelas, varanda, um banheiro. — Homens! Se eu fosse alérgica, amanhã eu nem acordaria. Estaria mortinha da silva sauro. Vou pegar a minha paleta de cores e você vai ver que essa parede está amarelada. — Ela diz e pega a bolsa dela e antes que ela jogue tudo na cama eu tomo da mão dela. — Vai tomar um banho Colorida, vou pedir alguma coisa para comermos. Eu estou cansado, você também e isso não é hora de trabalhar. — Você é muito mandão, Rabugento! Eu só vou por que quero dormir, você trouxe blusa de frio? —Ela pergunta mexendo em sua mala. — Sim senhora, por quê? — Me empresta? Eu não trouxe e estou com frio. Pensei que estaria calor e me fodi, está com cara de que vai chover. Vou até a minha mala, pego um casaco de moletom e entrego a ela. Vida leva o casaco ao nariz e respira fundo. Depois pega as suas coisas e entra no banheiro. Como eu sei que ela ama porcarias, peço uma pizza de frango com catupiry e refrigerante. Enquanto espero ela sair do banheiro,
envio uma mensagem para a minha mãe que ficou preocupada. Mãe, chegamos agora. Tudo está bem, teve apenas um acidente na estrada e por isso nos atrasamos. Assim que envio ela me responde. Amém Ursinho, se cuida aí OK? Seu pai está dizendo para você ligar para ele, amanhã de manhã. O que vocês estão aprontando? Sorrio da sua curiosidade. Nada mãe, ele só está preocupado com o carro. Agora vou comer alguma coisa, amanhã a gente se fala. Envio beijos, retorno seus emotions e desligo o celular. Pelo que eu entendi do plano, dona Maura vai sumir e só vai aparecer na segunda de manhã. Vida sai do banho, vestida com meu casaco, um short larguinho cheio de corações, senta na cama e veste uma meia rosa. — Eu pedi pizza e refrigerante, devem entregar daqui apouco. Vou só tomar uma ducha rápida. Pego minhas coisas e me tranco no banheiro. Sou bem rápido, é mais para tirar a poeira da viajem e me refrescar. Passo um pouco do perfume que ela gosta e saio do banheiro. Vida está sentada no meio da cama segurando o controle remoto, procurando alguma coisa para assistir. Batem na porta e vou atender, era o nosso lanche. — Estava morrendo de fome! Você quer assistir alguma coisa especial? —Ela pergunta animada. — Não, fique à vontade. Nós comemos em silêncio, só falando algumas coisas a respeito do filme que ela escolheu com o Will Smith. Depois que terminamos de comer e escovar os dentes, ela desliga a televisão e senta na cama com as pernas cruzadas. — Você ainda quer conversar? —Ela pergunta assim que me sento
em sua frente. — Se eu disser que sim, estarei mentindo. Mas eu preciso, só peço que me entenda e que me deixe falar. — Estou com medo, pode me abraçar? Sinto que vou precisar disso. Eu vou, não é? —Ela pergunta baixinho. Eu sorrio tristemente e abro os braços para ela, que se aconchega e senta no meio das minhas pernas, com as costas grudadas no meu peito. Eu a abraço e, ela fica mexendo nos meus dedos, contornando as tatuagens do meu braço. — Eu não tive uma infância perfeita, eu era sozinho e mal via a minha mãe. Em casa sempre foi um entra e sai de gente, muita droga e muita bebida. Todo dia minha mãe trazia um homem diferente para casa e eu me trancava no quarto, com medo da bagunça e das pessoas mal encaradas. Minha mãe preferia gastar o dinheiro com drogas a comprar comida. —Paro de falar e respiro fundo antes de continuar. — Eu aprendi a me virar cedo, fazia questão de ir para a escola porque lá eu sabia que tinha pelo menos uma refeição. Roupas eu conseguia na igreja do bairro. — Não tinha ninguém que pudesse te ajudar? —Ela pergunta baixinho, distraída mexendo nas minhas tatuagens. — Ninguém se importava, Colorida. — Respondo. — Eu sempre adorei aprender, era muito inteligente para a minha idade. Uma professora viu isso e me ajudou, fiz cadastro na biblioteca e cada dia lia dois livros diferentes e a cada vez, um livro mais difícil. Estudar era a única maneira de fugir do que acontecia em casa. Então quando minha mãe engravidou. — Maria? — Sim, da minha Maria. Quando ela nasceu, foi um dia lindo de sol e ela era tão linda. Eu fiquei tão feliz, porque eu tinha uma irmã e não era mais sozinho. Achei que a minha mãe se tornaria uma pessoa melhor, mas não foi
isso que aconteceu. Com dez anos, eu passei a ser responsável por mim e por ela. Eu dava banho, mamadeira, trocava fralda, fazia dormir. Eu me tornei pai aos dez anos, tem noção de como foi a minha infância? — Eu nem conheço, mas já odeio essa mulher. — Ela não vale à pena, Colorida. Eu passei por muita coisa, passei fome, passei frio, apanhei muito. Isso não é nem a ponta do iceberg do que foi a minha infância. Com onze anos comecei a trabalhar, fazia pequenas coisas, empacotava compras nos mercados, ajuda os meninos na feira, tudo para dar as coisas para a Maria. Eu passei por muita coisa Vida, muitas coisas ruins que ajudaram a moldar o homem que sou hoje. Eu gostaria de conseguir te contar tudo, mas agora eu não sou capaz. — E eu te respeito, Júlio. Sempre estarei aqui quando quiser conversar. Nem tudo no mundo é bonito ou perfeito, mas está tudo bem. Sabe o que aprendi nesses últimos sete anos? Que o imperfeito também tem sua perfeição, também tem sua beleza. Imperfeito... que ironia ela escolher justamente essa palavra, que me descreve perfeitamente. — Não sei se concordo com isso. Muitas vezes na adolescência, me senti sujo, indigno, imperfeito. Como eu te contei, fui adotado com dezesseis anos e a Maria com seis. Só que existe muita coisa por trás dessa adoção. Quem me salvou do inferno foi o Otávio e o Roberto, eles me acolheram, protegeram, ajudaram a procurar a minha irmã que sumiu. Na realidade ela fugiu quando o meu padrasto a vendeu para sanar uma dívida. — Meu Deus! —Ela diz em voz alta e se vira e me abraça apertado. — Eu sinto muito, muito, muito. — Sente muito por quê? Você não foi à culpada, Colorida. — Não sei, só sinto muito por tudo o que você e sua irmã tiveram que passar.
Não sei como ela conseguiu, mas ela está sentada em meu colo de frente para mim. Uma perna em cada lado e seus braços rodeando o meu pescoço. — Não vou mentir e dizer que foi fácil, foram anos de pesadelos, de sofrimento, anos vendo uma mulher que deveria me proteger fazer tão pouco caso do que me acontecia. Otávio me salvou Vida. Mas os meus pais? Eles me deram uma nova vida, um novo caminho a seguir. Eles acharam a Maria, primeiro, eles não, a Luna e o fofoqueiro dela. É como se estivesse em nosso destino sabe? Yza e Gael, não descansaram um só minuto até me encontrarem e eu estava o tempo todo perto da minha irmã e não sabia. Eu sou grato por tudo o que eles fizeram pela minha irmã, agradeço a Deus todos os dias por essa família maluca ter nos adotado. Eu dei muito trabalho no início, muita preocupação, mas eles não me abandonaram um só minuto. Meu pai carrega meus traumas até hoje, ele é o único que sabe de tudo, nos mínimos detalhes. Ela fica em silêncio enquanto me abraça apertado. Eu achei que mesmo não contando tudo, ela me trataria diferente. Mas não, aqui está ela me abraçando e tentando passar um pouco da sua força para mim. — Eu estou te contando essas coisas, para você entender o porquê eu sou assim. Porque tudo é novo e me comporto diferente de muitos homens da minha idade. Quando o assunto é o meu trabalho ou a minha família, eu sei lidar, sei o que fazer, porém quando se trata da parte emocional, em lidar com outras pessoas que não sejam da família, eu me atrapalho todo. Eu nunca namorei, nunca fui de baladas, eu fui a poucas festas na faculdade que dá para contar nos dedos de uma mão. — Você está tentando dizer que é virgem? —Ela pergunta baixinho. Esse era o meu grande medo. Como vou explicar para ela que eu nunca transei com uma mulher, mas também não sou virgem?
— Lembra que no começo dessa conversa, eu te disse que tinha coisas que eu não estava pronto para dizer? Isso faz parte. — Tudo bem. — O que posso dizer é, que nunca senti o que estou sentindo por você. Esse desejo intenso, essa vontade de estar perto, a ânsia para ouvir sua voz, seu riso. Nunca senti isso antes. Eu me fechei para tudo que dizia respeito ao sexo, nunca me interessei pelo assunto, não dei ouvidos às explicações do meu pai. Não, até você surgir. Por Deus! Falei mais sobre sexo com meu pai nesses dias, do que em dez anos da minha vida. — Seu pai deve achar que estou desvirtuando você. —Ela diz rindo baixinho. — Mas você é a culpada! E ele está adorando essa vergonha que estou passando. Isso porque minha mãe não sabe dessas conversas ou a coisa seria pior. — Pior? Como assim? — Eu disse que não fui um adolescente normal, então não dei trabalho nenhum. Nada de namoradas, nada de chegar em casa bêbado, nada de pedir para viajar com os amigos. Isso deixava minha mãe possessa. Dona Yza é um caso à parte, mas não pediria por uma mãe diferente. — Me desculpa, mas sua mãe é doida! — Claro, uma doida reconhece outra doida. —Falo rindo e ela me olha encantada. — Seu sorriso é tão bonito, sempre desconfiei disso. —Ela diz, olhando hipnotizada para a minha boca. — Não tenho muitos motivos para sorrir, Vida. A maioria dos meus risos é quando estou com a minha família, mas mesmo assim são poucos. Amo minha família, amo minhas irmãs e meus primos, porém não sou muito de rir, lógico que aprendi a me aperfeiçoar para sorrir nas horas que
estamos reunidos. Poucos risos são espontâneos. — Pois agora é vou te fazer uma promessa! Eu, Vida Martins, prometo te dar um motivo para sorrir todos os dias. Eu levo as minhas promessas muito a sério, senhor Rabugento. — Mesmo sem querer, você, Colorida, me fez rir mais do que já ri uma vida inteira. E me fez passar raiva também. — Estou esgotada, tanto fisicamente quanto emocionalmente. Você pode me abraçar até eu dormir? E ficar grudado em mim? — Com toda a certeza. Ajeito nós dois na cama; ligo o ar-condicionado e nos cubro. Vida deita sua cabeça em meu peito, joga as pernas em cima da minha e gruda sua mão em meu cabelo. Já percebi que ela adora dormir grudada em mim, é bem capaz de acordar e ela estar com o corpo todo sobre o meu. — Rabugento? — Oi Colorida. — Eu sou paciente, nós vamos no passinho de tartaruga, ok? Só não esconda nada de mim, mesmo que queira ficar longe, apenas me diga que precisa de espaço. Pode ser? —Ela diz sonolenta. — Assim será; só peço um pouco de paciência comigo. Ela não responde e quando olho para ela, vejo que já adormeceu. Sorrio e tiro alguns fios soltos do seu rosto. Será que essa é a minha chance de seguir em frente? Será que com ela vou me permitir viver? Várias perguntas passam pela minha cabeça, mas como não tenho as respostas certas, acabo adormecendo. Acordo algumas horas depois, com um pesadelo completamente diferente, porém mexeu muito comigo. Me solto dos braços dela e me levanto. Vou ao banheiro, lavo meu rosto e ando pelo quarto, tentando clarear a cabeça. Saio para a varanda e me sento em uma cadeira contemplando a
noite. O sonho foi diferente dessa vez, nada ligado aos abusos que sofri. Nele, a Vida ia embora ao saber tudo o que aconteceu. Ela me olhava com nojo, com repúdio, não conseguia aceitar o fato de eu ter sido estuprado, de ter sido obrigado a transar com outro homem. O jeito que ela me olhava me fez sentir imundo, como se eu fosse podre. Respiro fundo, tentando controlar a ânsia de vômito. Meu corpo inteiro treme, arrepios pelo corpo e uma vontade enorme de sumir. O que essa garota tem que me deixa assim? Por que logo ela teve que me despertar da inércia? Não sei quanto tempo eu fico na varanda, perdido em tantas questões que rodeiam minha mente. Mas um grito aterrorizante me desperta, o grito dela. Um pedido de socorro que me gelou a alma. Corro até o quarto e ela está se debatendo na cama, as cobertas estão emaranhadas em seu corpo, sua testa está coberta de suor e assim que me sento ela desperta. — Não! —Ela grita em desespero. — Ei, eu estou aqui não... —Antes que eu possa terminar, ela pula em meus braços e me abraça apertado. — Você está aqui, você está aqui. —Ela diz chorando. Não é um choro qualquer, é de desespero, de medo. Seu grito era repleto de uma dor, agonizante. Eu sei, porque já acordei muitas noites assim, acordava com o meu próprio grito. — Não chora menina, eu estou aqui. Xiu... Já passou, Vida. Foi apenas um sonho ruim. — Não foi apenas um sonho, não foi. Era real, Júlio. Tudo foi real. Dói tanto, eles me tiraram tudo, tudo o que eu tinha de mais valioso no mundo. Uma parte de mim que jamais terei de volta. —Ela diz chorando. — Não é real, Colorida. Foi apenas um pesadelo, parece que essa noite não conseguimos salvar um ao outro, não é mesmo?
— Não, você tem que entender que foi real. Você não é o único com segredos, com medo. Eu também tenho os meus, não chega aos pés do que você deve ter passado na vida, mesmo assim me dói todos os dias. — Você está me deixando preocupado, não consigo vê-la nessa aflição toda. Não consigo vê-la triste e chorando. É como se não fosse certo. — Eu vivo um martírio há sete anos, Júlio. Essa Vida alegre, risonha, é uma mentira. Tudo em mim é falso, você não é o único que finge as coisas. Eu também, claro que nem sempre é falso, só quando a solidão bate e a vontade de sumir aparece. — Nada em você é falso, você é a pessoa mais incrível que já conheci. Lembra que eu te disse que a tristeza não combina com você? Isso é a mais pura verdade. — É difícil acreditar nisso, quando você é a única pessoa da sua família a sobreviver depois de uma chacina. Esse é o peso que eu carrego há sete anos, Júlio. Eu fui a única que sobrevivi, depois que meus pais e meus irmãos foram mortos. — O que? —Pergunto completamente surpreso e assustado. — Isso mesmo que você ouviu. Minha família foi assassinada e eu só estou viva por causa de um maldito pano de chão! —Ela diz chorando e levanta do meu colo. Eu estou completamente sem fala. É inacreditável que uma menina como ela, alegre, alto astral, amorosa, carregue um trauma desse porte.
Sabe quando acende uma luz de emergência na sua cabeça, com direito a sirene e tudo? É assim que me senti, quando o Rabugento começou a contar sobre sua vida. Não sou boba, muito menos burra, posso até estar enganada, mas alguma coisa me diz que ele foi abusado na infância. Por que acho isso? Ele mesmo sem querer deixou várias pistas. Ainda mais quando ele disse que não quis saber nada sobre sexo. Queira Deus que eu esteja errada. Por favor Deus, por favor, que eu esteja enganada. Que ele não tenha passado por nada do que está passando pela minha mente perturbada. O que ele me contou e, o que estou imaginando, não mudou nada do que estou sentindo por ele. Ao contrário, quero me aproximar ainda mais dele, quero fazê-lo sorrir, esquecer o passado e focar no futuro. Mesmo que não permaneçamos juntos, se eu puder sarar ao menos metade das feridas dele, já estarei realizada. A vida é uma montanha russa, não podemos perder tempo com o que nos machuca. Às vezes tenho que
seguir meus próprios conselhos, mas falar é mais fácil que fazer. Eu adormeço em seus braços instantaneamente. Estar envolvida em seus braços, rodeada do seu cheiro, me faz sentir bem e leve, mas alguma coisa mudou, o pesadelo voltou com força total e, dessa vez foi diferente. Tudo acontecia exatamente como sempre, os gritos, os tiros, as vozes, os corpos dos meus pais estirados em uma poça de sangue; porém depois do meu grito de socorro, Júlio aparece na porta. Eu olhava para ele chorando, pedindo, por favor, que não me deixasse sozinha. — Por favor, não me deixe também. Por favor, não quero ficar sozinha. — Sinto muito, mas não posso ficar. Ele virou as costas, mas não sem antes me olhar friamente. Eu fiquei sozinha, ajoelhada na poça de sangue dos meus pais, gritando e implorando para ele voltar, para não me abandonar também; entretanto tudo foi em vão, mesmo implorando para ele ficar, ele me deixou. Eu acordei gritando e ele estava ali, bem na minha frente me olhando preocupado. Eu me joguei em seus braços, apertando meu corpo contra o dele, como se quisesse entrar dentro dele e ficar quietinha e escondida, assim eu nunca mais ficaria sozinha. Ele me olha preocupado, pede para que eu pare de chorar, que a tristeza não combina comigo, que tudo não passou de um sonho ruim. Como eu queria que isso fosse verdade, como eu queria não ter que contar uma coisa tão feia para ele; contudo se eu quero a confiança dele, preciso mostrar que eu confio nele também. Então, eu tento contar e, ele me olha com os olhos arregalados, não acreditando em minhas palavras. — O que? —Ele pergunta assustado. — Isso mesmo que você ouviu. Minha família foi assassinada e eu só estou viva por causa de um maldito pano de chão!
Me levanto do seu colo e começo a andar pelo quarto, como se estivesse procurando alguma coisa, mas sem saber o que. — Vida? —Ele me chama baixinho. — Ei, olha para mim. Ele também levanta e me puxa para os seus braços. Ficamos calados por um longo tempo. Ele me deixa chorar em seu peito, enquanto mexe nos meus cabelos para tentar me acalmar. Ele me puxa para o sofá, senta e me puxa para o seu colo. — Eu estava no meu primeiro ano na faculdade, dividia um apartamento com uma amiga e só ia para casa aos finais de semana, mas o meu irmãozinho, seu nome era Levi, ligou. Ele sempre foi muito grudado comigo, Levi sempre foi o meu xodó, por ser exatamente como eu, livre, alegre, doidinho. Ele me ligou todo manhoso, disse que estava doente e eu era a sua cura. Lembro da minha mãe brigando com ele, que isso era chantagem emocional e, que eu precisava estudar. Mesmo assim eu fui ele era o meu bebê entende? Não podia negar nada a ele. — Eu sei muito bem como é isso, até hoje sou assim com a Maria. Não que eu não ame minhas irmãs, porque sou louco por elas, mas a Maria é metade de mim, mais ainda até. —Ele diz secando as minhas lágrimas. — Eu nem fui de carro, tamanha era a minha preocupação. Peguei todos de surpresa quando cheguei, meu pai riu do meu desespero, meu irmão do meio, Leon fez cara feia e me chamou de boba e minha mãe balançou a cabeça e sorriu. Eu fiz sopa para ele, dei os remédios, assisti anime com ele na sua cama. Todos foram dormir em seus quartos, mas eu dormi com o Levi. Meu celular despertou no horário do remédio dele, 3:10 horas da manhã. Eu me levantei, fui até a cozinha pegar o remédio e a água. — Não precisa contar linda. Isso faz mal para você. —Ele diz baixinho. — Eu quero contar para você. —Falo sorrindo fracamente. — Estava
com sede e enchi um copo para mim, mas acabei derrubando o copo no chão. Então fui até a lavanderia, do lado de fora para pegar um pano de chão. Foi então que os gritos começaram. Duas vozes diferentes e a do meu pai, aí aconteceram os tiros, minha mãe começou a gritar e pedir misericórdia. Eu travei no lugar, fui tão covarde que me escondi ao lado da máquina de lavar e um armário de limpeza. Foram muitos tiros e depois o silêncio, eles olharam todos os lugares em busca de algum sobrevivente. Só não me encontraram por milagre, porque eles chegaram muito perto de onde eu estava. — Jesus! — O homem perguntou por mim e a mulher disse que eu estava na faculdade. Eles sabiam tudo sobre a minha família, cada passo que a gente dava, horários de tudo. Depois de um tempo eles foram embora, mas eu não consegui sair do lugar. Eu sabia a hora exata que os meus pais foram mortos, onde eu estava escondida podia ver o micro-ondas, lá marcava 3:22 horas da manhã. Esse horário ficou gravado na minha cabeça. Ele fica em silêncio e olha para o relógio que fica ao lado da cama. Eu sigo seus olhos e vejo que já são três e quarenta. — Meu Deus! Você... — Todos os dias, no mesmo horário que meus pais morreram, eu desperto do pesadelo às 3:22 horas da manhã. Isso acontece há sete anos. —Merda! —Ele xinga baixinho e me abraça apertado. — Você quer continuar a falar? Nós podemos assistir um filme, escutar música. Já sei! Você pode me ensinar a dar uns pega sinistros, que tal? Eu rio baixinho, mas não me sinto animada. — Não vai rolar safadinho. Pelo menos não hoje. — Quer continuar a falar? —Faço que sim. — Então vamos lá. — A voz que eu escutei era da secretária da minha mãe. Quando consegui me mexer, entrei em casa e vi os corpos dos meus pais. Era tanto
sangue, Júlio, tanto. Eu liguei para a polícia e em seguida para o meu padrinho. Ele chegou primeiro que a polícia, ele usava um shorts de basquete apenas. Veio direto de casa, tinha acabado de chegar depois de uma noitada. Tudo passou como um borrão, a polícia científica veio analisar a cena do crime, tive que dar o meu depoimento várias vezes. Eu não consegui ver os corpos dos meus irmãos, não tive coragem. Meu padrinho cuidou de tudo, me levou para a casa dele, a sua parceira ajudou a me dar banho, conversou comigo. — Seu padrinho é policial? — Sim, investigador. Ele trabalha em casos difíceis, como sequestro, quadrilhas, assassinatos em série. Ele me disse o nome, mas agora não me recordo. Quando eu falei que sabia quem matou meus pais foi um Deus nos acuda. Fui levada para bem longe, fiquei escondida porque era a única testemunha. Ninguém quis me acolher, meus parentes viraram as costas, meus amigos sumiram, até um namorado da época sumiu. Meus parentes disseram que não ficariam com uma jurada de morte. Eu me vi sozinha do dia para a noite, as pessoas me tratavam como se eu tivesse a peste negra e isso doeu tanto. — E o seu padrinho? — Ele não podia ficar comigo. Ele estava correndo atrás das pessoas envolvidas na chacina. Eu fiquei com a mãe da parceira dele, só eles sabiam onde eu estava. Demorou um ano para meu padrinho construir o caso, mas ele pegou todos, até a secretária da minha mãe. Ela era filha e irmã de um dos donos da quadrilha criminosa, que lidava com todos os tipos de merda. Minha mãe era a Juíza que estava presidindo o caso, ela descobriu muitas coisas sujas e ia colocar todos na cadeia com a maior pena. Ela vinha trabalhando nesse caso a dois anos pelo que eu entendi, foi um caso que envolveu muita gente; várias organizações criminosas. Por isso, a Leda se
infiltrou e virou secretária pessoal da minha mãe. Ela destruiu muitas provas, roubou vários arquivos e eles arquitetaram de matar a minha família. Meu padrinho disse que minha mãe sofreu um pequeno atentado, mas ela não desistiu do processo. — Agora você está segura? — Sim, jamais colocaria ninguém em risco. Viajei muito, me afundei durante um ano inteiro. Fiz muita merda, Júlio. Você não tem noção, mas depois recuperei a razão e agora estou aqui. Livre e limpa há quase cinco anos. — E seus parentes? Eles não te acolheram quando tudo isso acabou? — Com certeza eles queriam depois disso! Mas não era por mim e sim pelo dinheiro que herdei. Seguro de vida dos meus pais, processo contra uma emissora de televisão, dinheiro do estado e a pensão. Eles queriam colocar a mão nisso, não cuidar de mim. — Malditos! Ainda bem que você teve um dinheiro para reconstruir a sua vida, não passou necessidade, se formou e agora tem um trabalho digno e que te rende um dinheiro legal. —Ele diz e eu solto uma risadinha. — O que? Falei besteira? Você passou necessidade, Vida? Juro que se você me disser que passou, vou pessoalmente dar uma surra em cada um deles. — Não passei, pode sossegar o rabo Rambo! Eu ri pela sua indignação e preocupação, se eu passei fome. Júlio, não foi pouco dinheiro. Só do processo foi um milhão de reais, fora o seguro de vida dos meus pais que foi de quatro milhões e a indenização também foi boa. A pensão também é um bom dinheiro. Solto tudo e ele me olha assustado. — Por que você trabalha? — Para não enlouquecer. Não vou ser hipócrita e dizer que nunca
mexi nesse dinheiro. Faço eu doações todos os meses, ajudo uma ONG que cuida de dependentes químicos, ajudo uma igreja de onde eu morava. Só uso poucas vezes, gasto mais o meu dinheiro. Não tem como não pensar que só tenho esse dinheiro, por causa da morte dos meus pais. Então eu tento sempre fazer o bem, entende? — Você é uma mulher extraordinária, como pode se achar uma farsa? Vida, mesmo com toda essa tragédia, você seguiu em frente. Pode ter fraquejado algumas vezes, mas está de pé, tenta ser feliz, consegue sorrir mesmo estando destruída. Tem noção do orgulho que estou sentindo de você, da mulher que você é? Orgulho da mulher que você se transformou depois dessa perda tão difícil. Você não é uma farsa, Colorida. Você é uma das mulheres mais verdadeiras que eu já conheci! — Você não vai continuar a pensar assim, depois que eu contar todas as merdas que eu já fiz. Mas isso é história para outro dia. — Nada do que você me contar, vai me fazer mudar de ideia. Nem se me disser que já correu pelada na rua, que já dançou nua em cima do balcão ou se tem vídeo seu; pelada por aí. Nada vai me fazer mudar de opinião. — Graças a Deus, porque eu já fiz tudo isso aí. —Falo e saio correndo e pulo na cama. — O que! É mentira, não é? —Ele diz vermelho. — Até queria que fosse, mas não é. Rabugento, Rabugento, você está bem safadinho. Reparou que todas as opções que você citou, eu estou sem roupa em todas? Ele me olha sério, mas aos poucos seu sorriso vai se abrindo até que ele me mostra um sorrisão enorme. — Vida, Vida, quer ser minha professora? Obrigado Deus!
Nada me preparou para descobrir o que a Vida passou. Tem noção, do quão, maravilhosa essa garota é! Ela viu os pais mortos, sabia que os irmãos estavam mortos, os parentes viraram as costas, até o bosta do namorado se foi. Tudo isso quando ela estava vulnerável, precisando de todo o suporte e esses filhos das putas viraram as costas para ela. Mesmo com tudo isso, ela se transformou em uma mulher fenomenal. Uma que sorri para a vida; vive alegremente e, mesmo sofrendo se preocupa com os outros. Olhando ela dormir, penso que o que eu passei não chega aos pés do que ela passou. Eu sofri, mas não perdi a pessoa que eu mais amava, eu ainda tinha a Maria ao meu lado. Ela já não, Vida perdeu os pais, perdeu os irmãos, pessoas lhe viraram as costas. Enquanto eu me fechei, ela se abriu para o mundo, se permitiu viver coisas novas, conhecer outras pessoas, fez amizades. Eu vivi para a minha família, para os estudos, não fiz amizades, não me permiti viver. Para mim a minha família bastava, até porque nada me interessava além do trabalho. Não tinha nenhuma novidade, eu não sou uma pessoa interessante. Acho que estou começando a ver os meus problemas por outra perspectiva, onde os meus tormentos não são tão importantes assim. O que passei foi grave, muito grave, mas o que ela passou? Acho que eu no lugar dela eu teria desistido de tudo, não gosto nem de imaginar se eu tivesse perdido a minha irmã na época ou se a Yza tivesse morrido naquele sequestro. Minha família me acha forte, mas perto da Vida, essa força se
transforma em um grão de areia. Ela se mexe na cama e me chama pelo maldito apelido. — Rabugento? — Oi colorida. — Você não pode fugir, amanhã vamos dar uns amasso no trabalho. —Ela diz de olhos fechados e eu rio baixinho. — OK safadinha. Fecho os meus olhos e tento dormir mais um pouco. — Acorda, Rabugento, nós estamos atrasados. —Vida diz me empurrando. — Atrasados para o que Colorida? Só vamos trabalhar segunda-feira, você pode voltar a dormir, por favor? — Oi? Como assim? Aquela velhadia não disse que precisava da gente aqui? Júlio acorda! —Ela diz irritada e eu me sento. —Pronto! O que foi cacete? Você é muito chata quando acorda! — E você é um grosso e Rabugento! Não quero mais falar também, que saco. —Ela diz toda bravinha e vai em direção a porta. Eu estou louco, eu sei, mas corro atrás dela e a pego nos braços, jogando-a em cima da cama. Ela tenta escapar, mas eu subo em cima dela e seguro suas mãos. — Bom dia para a senhorita! —Olho para o relógio e vejo que são dez horas da manhã. — Colorida, porque você me acordou tão cedo? — Porque estamos atrasados para o encontro com a velhadia, ou eu achava que estávamos. O que você quis dizer quando disse que só vamos trabalhar segunda? —Ela pergunta tentando se soltar. — Você não queria me atender, não foi trabalhar só para me evitar e o Tavinho teve essa ideia. E já logo te aviso que a Maura, falou sobre o nosso casamento e do nosso filho, então já sabe que vai ter zoação, não é? Porque o
Otávio virou uma fofoqueira do caralho. — Deixa-me ver se eu entendi. —Ela diz séria. — O Otávio, com o seu consentimento, bolou esse plano só para você poder falar comigo? Você me trouxe para um resort super chique, só porque eu não queria atender a sua ligação? — É exatamente isso. Você ficou brava? — Você é inacreditável, Júlio D'Ávila! Então estamos de folga até segunda-feira? Mas espera, a velhadia topou? — Pare de chamar ela assim, Colorida. Ela foi super gente boa, não está cobrando nada pela nossa estadia e até inventou um sumiço para justificar a sua ausência. — Continuo não gostando dela e ponto final. —Ela diz seria e levanta a cabeça para me dar um beijo rápido. — Você vai voltar a dormir, Rabugento? — Sim, senhorita Colorida. Eu ainda estou morrendo de sono. —Falo beijando sua boca e deixo ela levantar. — Ótimo! Vou tomar um banho, dorme bastante Júlio, mais tarde começam as nossas aulas, de pegas sinistros. —Ela diz sorrindo. Me ajeito melhor na cama e fico vendo ela mexer na mala. Assim que ela consegue tudo o que quer, joga um sorriso atentado para mim e entra no banheiro. Eu coloco um travesseiro no rosto e tento voltar a dormir, na certa ela vai pedir alguma coisa para comer e depois que eu acordar, nós vamos dar um passeio pela cidade. Acabo cochilando e só acordo quando sinto seus lábios nos meus. — Vou tomar café no restaurante e depois vou dar um mergulho na piscina. —Ela diz baixinho e, eu só concordo com a cabeça. Ela se afasta e vai em direção a porta. Eu levanto a cabeça para olhála e quase engulo a língua. Vida Martins, está usando um biquíni preto
cavado, muito, muito pequeno e por cima ela veste uma saída de praia toda rendada que não cobre porra nenhuma. — É... hum... Colorida? Pode me esperar um pouco, acho que estou com fome. —Falo levantando da cama. — OK; espero você no restaurante! —Ela diz e me joga um beijo. — Filha da mãe! —Xingo alto e só escuto sua gargalhada do corredor. E eu achando que tudo seria fácil, mas não, ela vai não vai facilitar a minha vida um só minutos. E ainda sai mostrando o corpo para o hotel inteiro! Que merda de biquíni era aquele? O da Alexia é maior que o dela.
Se eu tinha alguma dúvida que essa mulher quer me enlouquecer, agora não tenho mais. Só escovei meus dentes, lavei o rosto, vesti uma bermuda qualquer, uma regata e saí correndo com o chinelo nas mãos. Assim que abri a porta, a bonita estava sentada no corredor me esperando e o melhor, usando um short. — Bom dia Rabugento, pelo visto deve estar morrendo de fome, não é? Você se trocou rapidinho. —Ela diz rindo. — Muita fome, você não imagina. Hum... de onde esse short surgiu? —Pergunto curioso, já que ela não estava levando nenhuma bolsa. — Dobradinho embaixo do meu braço. —Ela diz com um sorriso enorme no rosto e me estende as mãos para que eu a ajude a levantar. — Maluca! Vamos até o restaurante, onde somos os únicos tomando café. Vida pega de tudo um pouco, enquanto eu pego uma xícara de café e um croissant de queijo e presunto.
— Estava pensando, o que você acha de irmos até a praia? Eu estou dizendo por mim, se eu ficar aqui vou querer começar a trabalhar. Já vi algumas coisas erradas, olha os pés dessas cadeiras! Tudo lascado, estofados gastos. Estou me coçando para começar a listar tudo. Acabo rindo, porque eu também já vi muita coisa errada. — Podemos sim, depois do café vou pegar a carteira e vamos dar uma volta. E é isso que fazemos. Ela troca o short por um vestido e, pega uma bolsinha. Pegamos informações na recepção e saímos para explorar o lugar. Assim que chegamos na praia, Vida se transforma em uma criança cheia de açúcar. Ao colocarmos os pés na areia, ela tira o vestido, larga o chinelo e a bolsa e sai correndo pela areia. — Anda Rabugento, se solta! —Ela diz gargalhando. — Espera maluca! —Peço. Pego nossas coisas, enrolo no vestido dela na minha camisa. Vou até um senhor que está sorrindo vendo as loucuras da Colorida e peço para ele dar uma olhadinha. — Pode deixar aqui menino, vá aproveitar a alegria contagiante da sua menina. Não são todas as pessoas com uma alegria assim, aproveite rapaz. —Ele diz sorrindo. — E o que farei. Obrigado. Saio correndo e a pego nos braços, jogando seu corpo por cima do meu ombro, fazendo com que ela gargalhe alto. Entro no mar e a jogo longe, rindo das gargalhadas dela. Sabe quando eu ri assim? Nunca! — Você quer me matar! Agora você vai ver. —Ela diz e vem para cima de mim. A maluca gruda seus braços em meu pescoço, suas pernas em minha cintura e tenta me afundar na água. Parecemos duas crianças brincando na
água, nossas gargalhadas são altas, daquelas de fazer a barriga doer. Vida desiste de me afogar e corre para a areia. Eu corro atrás dela e grudo meu corpo no dela. — Te peguei! — Pegou mesmo. E agora, você vai fazer o que? Olho para ela e sorrio. Aproximo minha boca da dela, dando pequenos beijos estalados. Ela acaba perdendo a paciência e me beija avidamente. Puxo seu corpo contra o meu e agarro seu cabelo com um pouco mais de força, aprofundando ainda mais o beijo. — Rabugento? —Ela diz com a sua boca colada a minha. — Hum. — Essas suas pegadas não podem ser em público. —Ela diz rindo baixinho. — A culpa é sua. Você me deixa sem noção. — Bem percebi depois de sentir essa coisa me cutucando. Filtro! Ela precisa de filtro. — Vamos dar uma olhada naquelas lojinhas? O tempo está fechando, estou achando que vai chover. — Chuva? Amo! Chuva, eu e você trancados no quarto. Bora Pedrão manda um dilúvio! —Ela grita olhando para o céu me fazendo rir. Pegamos as nossas coisas com o senhor e depois de agradecer a ele vamos embora. Olhamos duas lojinhas, Vida compra um monte de bugigangas e só depois vamos embora. Assim que entramos no hotel, uma chuva torrencial começa a cair. Ela me olha diabolicamente e sai andando na minha frente. Eu tento juro que tento não olhar para a sua bunda, mas foi impossível, não do jeito que ela está andando. Chegamos ao nosso quarto e espero ela ir tomar banho primeiro. Vida coloca sua mala na cama e começa a tirar suas roupas para fora. A mala se
desequilibra e cai no chão, espalhando todas suas roupas. Eu não sei como, mas acabo ficando com a parte de recolher as suas calcinhas. Fico parado, olhando admirado, são vários modelos, várias cores e tamanhos. A única coisa que todas têm em comum é que não passam de um pedacinho de pano! — Ai Jesus amado! —Ela grita vermelha de vergonha e pega todas das minhas mãos. Ela joga tudo dentro da mala, com todas as suas outras peças de roupas e fecha a mala e senta em cima. — Todas, todas são pequenas. Um pedacinho de pano! Como isso cobre suas ... suas partes importantes? Íntimas? Por que todas têm renda? — Eu amo calcinhas de renda, elas são minha paixão, mas juro Rabugento, eu não queria trazê-las. Eu separei as calcinhas mais confortáveis, calcinhas boxer. Isso é coisa da Mimi! Ah velha safada, essa me paga. — Vida diz envergonhada. Eu sorrio. Se ela soubesse a minha fixação com as suas calcinhas, garanto que essa Colorida maluca não estaria com essa vergonha. — Posso te contar um segredo? — Sempre, você pode me contar qualquer coisa, Júlio. — Aquele dia na sua casa, quando você foi se trocar para a irmos comer. Lembra? — Sim. — Você correu para o quarto se trocar, mas quando fez isso, o meu casaco, aquele que você roubou de mim, subiu mostrando um pouco sua calcinha. Depois disso, essa imagem não saiu da minha cabeça. Ela sorri cinicamente e morde seu lábio inferior. — Jura? E qual era o modelo? —Ela pergunta e começa a mexer na mala. — Não sei. Era preta, de renda. Essa calcinha se tornou a minha
obsessão, todos os dias eu penso nisso até quando não deveria pensar. — Rabugento, Rabugento, você está me saindo melhor que a encomenda. Acho melhor você tomar banho primeiro, eu tive uma ideia para a nossa primeira aula. —Ela diz e me empurra para o banheiro. — Espera um pouco, maluca, tenho que pegar as minhas roupas. Ela gargalha e me deixa pegar minhas coisas. Pego uma bermuda, uma cueca e vou para o banho. Sabe quando uma criança ganha um presente na noite de natal, mas só pode abrir no dia seguinte? Sou eu nesse momento! Estou ansioso, para essa tal primeira aula e o que ela vai aprontar. Só de imaginar algumas coisas, meu corpo começa a dar sinal de vida. Coisa que até uns dias atrás me deixava desconfortável, hoje me anima de um jeito inexplicável. O desejo descomunal que sinto por essa mulher, me deixa sem saber como agir e ao mesmo tempo faz com que eu queira experimentar todas as possibilidades. Eu prometi ao meu pai que iria me permitir viver e sentir. Estou com medo, não sei como agirei na hora, mas mesmo assim vou me jogar e que se fodam as consequências. Ela foi à única mulher que me fez sentir dessa forma, que me despertou desejos que até semana passada estavam adormecidos. Meu pai ... meu pai é o meu melhor amigo, meu parceiro e com ele posso falar de qualquer coisa. Ele com toda a paciência, como se eu tivesse dezesseis anos novamente, explicou tudo o que antes eu nunca quis saber. Até a vergonha de me mostrar como usava um preservativo, ele me fez passar. Tem noção, um homem de vinte e seis anos nas costas, tomar aulas de como usar um preservativo, como se fosse um pré-adolescente de doze anos. Não sei quem ficou com mais vergonha, meu pai ou eu. Sorte que a minha mãe não estava perto, ou a vergonha seria maior.
Caralho! Até como tocar o corpo de uma mulher, ele me ensinou. Falou para não ficar afoito, ficar calmo. Na hora eu achei muito tranquilo, mas agora, a poucos minutos do tal pega sinistro, estou nervoso para cacete. Saio do banho e ela está sentada no chão, com a testa encostada nos joelhos. — Colorida? — Eu! Aleluia senhor, pensei que iria morar no banheiro. O que o senhor ficou fazendo lá dentro? —Ela pergunta curiosa. — Estava tomando banho, o que mais estaria fazendo lá? — Posso ver! —Ela diz olhando para o meio das minhas pernas. — E respondendo a sua pergunta, há muitas coisas que você pode fazer. Essa vai ser sua segunda lição. Ela diz rindo baixinho e entra no banheiro. Eu ligo a televisão e me sento com as costas encostadas na cabeceira. Será que é errado ficar ansioso com a próxima lição? Não sei, só sei que quando ela sai do banheiro só faltei engolir a língua!
De onde esse homem saiu! Nem nos livros de romance que amo ler, eu vi algo tão puro assim. Lógico que existe as mocinhas puras, virgens, que precisam ser protegidas. Mas os mocinhos sempre são determinados, objetivos, seguros e de com um sentimento de posse delicioso; porém o Júlio ultrapassa todos os paradigmas. Ele é um homem delicioso em todos os sentidos. É inteligente, divertido, mal-humorado e, ao mesmo tempo esconde um humor incrível. Ele é dono do amor mais puro do mundo, a forma como ele trata as irmãs, as tias, avós e a mãe, é única. A camaradagem e a cumplicidade que ele tem com o
pai é inexplicável. A inocência dele me encanta, a maneira como ele se abriu para mim, sem medo, receio ou vergonha do que eu poderia pensar é incrível. A timidez, que esconde uma pitada de safadeza, ou a curiosidade como a da minha calcinha é ímpar. Isso é único e tenho até medo que minha loucura acabe contaminando essa pureza. Não posso ir com muita sede ao pote, com ânsia, mesmo que isso seja o que eu mais queira. Se eu chegar com toda a minha impulsividade, é certeza que ele fugirá de mim para o resto da vida. Júlio tem uma coisa que desperta o melhor e o pior de mim, ele me encanta, me faz sentir falta do seu cheiro, da sua voz, dos seus escassos sorrisos. Sabe aquela sensação de que teve que rodar o mundo para encontrar a melhor coisa da sua vida? É assim que eu me sinto. Ele completa cada pedacinho de mim que estava vazio. O desejo de abraçar esse homem, de cuidar e não deixar que nada mais o machuque é gigantesca. Eu sei que não será fácil, que vamos ter muitos embates, ainda mais que eu percebi que ele é ciumento. Tomo um banho caprichado, passo um creme no corpo todo e olho para a calcinha que escolhi. Renda... quem diria que o meu Rabugento iria gostar de renda! Esse homem é uma caixinha de surpresa, que eu faço questão de abrir e brincar. Coloco um camisetão, visto uma calcinha parecida com a que ele descreveu e caminho lentamente parando a sua frente. Subo em cima da cama, monto em seu colo e inclino meu corpo até encostar meus seios em seu peito, minha boca pairando sobre a sua e estico meu braço e pego uma rosa vermelha. Seus olhos estão cravados em mim e no que estou fazendo, sua respiração começa a ficar mais pesada e seus olhos param em minha boca e acompanham minha língua, quando molho meus lábios. Passeio a rosa pelo seu rosto, sua boca, seu peito desnudo e sua
respiração se torna ofegante. Afasto meu corpo do dele, minhas mãos param na barra do camisetão que estou vestindo e olho em seus olhos que estão vidrados em mim. Lentamente vou levantando a blusa e só paro quando minha parte debaixo fica descoberta. Seus olhos passeiam pela minha barriga até parar na minha calcinha, ele respira fundo e, segura a respiração. — Era assim, Rabugento? —Pergunto olhando seu rosto. — Foi com uma calcinha como essa, que você se tornou obsessivo? Ele respira fundo e, solta lentamente. Júlio esfrega o seu rosto resignado. — Você quer me matar? —Ele diz seriamente. — Prometo que será uma morte deliciosa. Agora me diz o que você imaginou fazer? Ou o que você quer fazer comigo agora? —Pergunto subindo pelo seu corpo e me sentando em seu colo novamente. — Vida... o....o que você está fazendo? — Te dando uns pega sinistros ou começando isso. Agora me diz o que você quer fazer? — Não sei... a professora não é você? —Ele pergunta perdido. Sorrio do que ele fala. Júlio está parecendo um menino assustado, sem saber como agir ou o que fazer. Então resolvo deixar as coisas mais leves e encosto minha boca na sua. O beijo começa lento, uma exploração mútua, cada um em busca do que necessita. Mesmo demonstrando certa timidez, Júlio tem um extinto próprio de liderança e toma o comando do beijo. Ele domina minha boca, me devora com ânsia, como se dependesse dos meus beijos para sobreviver. Sua mão se embrenha em meus cabelos em um aperto forte, a outra mão enrosca em minha cintura, levando meu corpo mais próximo do dele. Essa mudança de posição deixa minha boceta em cima do seu membro duro e
inconscientemente balanço meu quadril, criando um atrito prazeroso. Impossível conter o gemido de satisfação, esse movimento despertou uma fagulha de fogo por todo o meu corpo. Júlio também sente e afasta sua boca da minha, gemendo baixinho. — Faz isso novamente. —Ele pede com a voz rouca de desejo. Eu apoio minha mão em seu ombro e faço o movimento novamente. Nós dois gememos ao mesmo tempo, perdidos na sensação. Júlio me beija novamente, mas dessa vez com uma fome absurda. Seu aperto nos meus cabelos fica mais forte, seus dedos cravam em minha cintura e eu tenho a certeza que ficarei com marcas amanhã. Nós nos afastamos ofegantes, um olhando para o outro, seus olhos refletindo o mais puro desejo assim como os meus. Sinto como se uma chama tivesse sido acesa dentro de mim e só ele fosse capaz de apagar esse fogo. — Isso foi... — Incrível! Nunca senti isso antes. —Ele diz baixinho. — Isso, incrível é a palavra certa. Agora quero que você fique quietinho, depois você repete o que eu fizer em você. Pode ser? — Tudo bem. — Ele responde, mas posso sentir certo receio em sua voz. Seguro seu rosto e olho no fundo dos seus olhos, para ele ver que o que falo a verdade. — Nunca Júlio, eu quero que você entenda ok? Eu nunca vou machucar você ou fazer alguma coisa que você não queira. Basta uma palavra e eu paro a nossa brincadeira, entendeu? — Ok. Beijo sua boca delicadamente e depois mordo seu lábio inferior fazendo com que ele prenda a respiração. Passo para o seu pescoço, onde beijo e deixo um rastro de pequenas mordidas. Intencionalmente mexo meus
quadris levemente, roçando meu corpo no dele. Júlio joga sua cabeça para trás, perdido no desejo que está sentindo e deixando o caminho livre para mim. Continuo a minha exploração, beijo o seu pescoço, mordo um pouquinho mais forte sua orelha e chupo a pele embaixo da sua orelha. Ele geme um pouco mais alto e impulsiona seu quadril para cima, causando um atrito maior entre nossas intimidades. — Isso Júlio, se chama chupão. Dependendo do jeito que é feito, deixa uma marca que sai em alguns dias, porém não se preocupe, hoje ficou marca nenhuma. Ele só balança a cabeça e suas mãos escorregam da minha cintura, caindo na minha bunda. Rapidamente ele volta s mãos para a minha cintura. — Desculpa. —Ele diz envergonhado. — Não precisa se desculpar, Rabugento. Meu corpo é seu para tocar, para explorar. —Falo em seu ouvido e coloco suas mãos em minha bunda novamente. De início, somente seus dedos se mexem para cima e para baixo, como se tivesse sentindo a textura da minha calcinha. Eu o beijo apaixonadamente e aos poucos ele vai se animando, apertando minha bunda levemente. Volto a explorar seu corpo, beijando seu peito até chegar a sua barriga. Passo minha língua pelos seus mamilos, e deixo pequenas mordidas leves por todo o caminho. — Vida... — Ele geme baixinho. Não ultrapasso o limite da sua bermuda, mas posso ver o quão duro ele está. Eu também estou molhada, louca para senti-lo dentro de mim. Volto a me sentar em seu colo e seguro seu rosto, fazendo com que ele abra os olhos para mim.
— O que você quer Júlio? — Quero sentir seu corpo no meu. Você pode tirar a sua camisa? — Ele pede envergonhado e eu sorrio. — Se você pedir para eu correr pelada pela rua, pode ter certeza que farei. —Eu mal terminei de falar e esse homem quase surta. Ele puxa meus cabelos até que minha boca encosta na sua. — Não vai acontecer! Pare de falar em andar pelada por aí, ficar nua ou andar somente de biquíni pelo hotel. Isso não vai acontecer ninguém vai ver você sem roupa, Colorida! Somente eu posso fazer isso. —Ele diz bravo. — Puta que pariu! Imagina essa raiva toda na hora da transa! Promete que quando chegarmos nessa fase, vamos ter uma transa épica de quebrar tudo? Quero tapa na bunda, puxão de cabelo, você me xingando! Só não podemos transar na minha casa ou acordaremos a vila inteira. Promete? Nunca mais te peço nadinha na vida toda. — Maluca! Nada de xingos, acho que não ficarei confortável. — Até lá você estará! Agora voltando a nossa lição...—Falo e arranco a camiseta de uma vez, ficando com os meus seios descobertos. Júlio me encara com os olhos arregalados, sem saber se olha para o meu rosto ou para os meus seios. Pego suas mãos e as coloco em meus seios e aperto. O gemido foi automático, Júlio pode ser inocente para algumas coisas e perspicaz para outras. Assim que solto suas mãos, ele mesmo age por conta própria e acaricia meus mamilos com o polegar. Ele aprende muito rápido, porque bastou um movimento dos seus dedos para que eu gemesse novamente e ele pegou isso como um sinal. Rebolo lentamente e ele se inclina e beija meu pescoço, exatamente do jeitinho que fiz com ele. As coisas se tornam ainda mais intensas e agimos agora por puro instinto. Aumento meus movimentos quando ele curioso leva sua boca até
meus seios, de início foram pequenos beijos, mas a curiosidade dele ganha e ele chupa meu seio direito, fazendo exatamente o que fiz com ele. Seu aperto em meu corpo se torna mais forte, nossos gemidos, um pouco mais alto. Meu orgasmo se aproxima, enquanto sua boca se torna mais voraz em meus seios. Perdemos a noção do tempo, do lugar, do mundo! Puxo sua boca para a minha e o beijo enlouquecidamente. — Vida... o que... Vida! —Ele chama meu nome baixinho, repetidas vezes. — Deixe vir, Rabugento. Está tão gostoso... Hum... Júlio! Nós nos perdemos um no outro com loucura. Júlio se torna uma máquina guiada pelo desejo, ele beija a minha boca, meu pescoço, meus seios, tudo ao mesmo tempo, perdido no desejo que está sentindo. Me esfrego nele com mais ímpeto e levo nós dois ao orgasmo mais intenso que já tive, sem transar realmente. Júlio me abraça apertado, escondendo seu rosto em meu pescoço e se deixa levar pelo orgasmo me levando com ele. Ficamos um bom tendo tentando normalizar as nossas respirações. Meu corpo e o dele estão cobertos de suor, minha calcinha já era de tão molhada que está. — Ei Rabugento, você pode olhar para mim? Está tudo bem? — Pergunto, mas ele fica em silêncio. — Júlio? Por favor, olha para mim. Só falto implorar e nada! Meus olhos começam a arder, uma vontade insana de chorar. Eu estraguei tudo gente! — Júlio? Fala comigo, por favor. — Só um segundo Colorida. Quando ele me responde, um alívio enorme me domina e eu me deixo relaxar em seus braços. Graças a Deus! Ele levanta seu rosto do meu pescoço e me olha curioso.
— O que foi? — Pensei que tinha ido muito longe, eu... eu fiquei com medo quando você não respondeu. — Ei, pare um pouco e respire Colorida. —Ele diz alisando o meu rosto. — Eu estou bem, estava apenas sentindo o que você acabou de me proporcionar. Obrigado Vida Martins. — Obrigado? —Pergunto confusa. — Sim, isso mesmo que você ouviu. Pela primeira vez na vida, eu senti prazer em uma coisa que me aterrorizava. Eu gostei de cada segundo do que fizemos aqui, claro que agora está meio desconfortável lá embaixo, meio pegajoso. —Ele diz rindo. — Eu nunca senti isso antes, Vida. Esse prazer gigantesco, esse desejo louco. Para mim, sexo sempre foi dor, sempre foi sujo. Obrigado por me dar isso. Ai está! Mais uma pista. — Sexo a seco, essa foi sua primeira lição Rabugento. Ainda temos muitas outras; pronta para mais uma? — Eu estou agora não sei você. Não depois de ver o que fiz. —Ele diz com um sorriso convencido nos lábios. — O que? — Eu deixei um... como é mesmo o nome que você falou? —Ele pergunta e olha para o teto. — Sim! Eu deixei um chupão em você. Deixei a minha marca, isso quer dizer que agora você é minha, Vida Martins. Olho para ele surpresa, não pelas palavras em si, quer dizer, isso também, mas pelo sentimento de posse que ele demonstra ao dizer isso. Eu sou dele? Como isso funciona? Como assim cacete do meu Brasil?
Nunca achei que um dia me sentiria à vontade com qualquer coisa relacionado ao sexo, mas ela conseguiu mudar isso. Eu estou completamente encantado com tudo o que ela fez. Sentir seus seios desnudos em meu peito, poder tocá-los, foi surreal. Seus gemidos em meus ouvidos, sua boca em meu corpo, tudo foi delicioso. Eu nunca senti nada parecido. Para mim o sexo sempre foi uma coisa suja, humilhante e que me causava dor. Vida me mostrou, entretanto, que tudo poderia ser diferente, que eu poderia tentar as coisas sem medo e que jamais me machucaria. E acreditei em suas palavras, sei que ela jamais faria algo contra a minha vontade. Ninguém mais faria nada contra a minha vontade! Sabe quando você fica maravilhado com algo ou alguma coisa? Sou eu depois do nosso sexo a seco, como ela mesma disse. Estou completamente deslumbrado, como se ela fosse sei lá, o santo graal do pecado. Me sinto
livre, como nunca me senti antes. Depois da primeira lição, tomamos outro banho e fomos dar uma volta no hotel, tomar um drink, comer alguma coisa. — Colorida, me fala um pouco desse seu padrinho? — Ele é como um segundo pai para mim. Meu pai e ele cresceram juntos, eram melhores amigos mesmo. Aí meu pai se apaixonou pela minha mãe e ela entrou para a turma. Eles se tornaram inseparáveis e quando minha mãe engravidou nada mais justo do que ele ter sido convidado como padrinho. Ele é um gato, vive rodeado das mais belas mulheres, ele agia como um adolescente, mas depois da morte dos meus pais ele sossegou. — Ela diz saudosa. — Gato, não é? — De tudo o que falei você só gravou o gato? —Ela diz rindo. — Ele realmente é lindo, nem parece que tem quarenta e três anos. Você é muito ciumento, Rabugento! — Nunca fui não com outras pessoas. Morro de ciúmes da Maria e da Luna, minha mãe também. Mas com você é diferente, não sei explicar. — Tenta. — Quero tudo seu para mim. Sorrisos, gargalhadas, raiva, suas loucuras. Não sei descrever isso, só sei que é mais forte que eu. Quando você me disse que dormir comigo ao seu lado afasta os pesadelos, me fez sentir importante. E é a mais pura verdade. Me senti no céu ao saber disso, que eu sou o único capaz de afastar seus sonhos ruins, assim como ela capaz de afastar o meu também. — Possessivo gosto disso. — Ela diz sorrindo. — Eu sou extremamente ciumenta, queria arrancar cada unha e cada dedo daquela velhadia só por ela ter tocado em você.
— Mas você ficou com raiva de mim. Não entendi direito, Vida. Eu não encorajei a Maura, não gosto que as pessoas me toquem. Toques estranhos fazem com que eu me sinta mal, sujo, entende? — O meu também? — Não! Você é diferente Colorida. Quando você não me toca ou não fala comigo, me sinto perdido, como se alguma faltasse em mim. — Se você não parar de falar essas coisas, posso cair do barranco de amor por você. Já estou meio que apaixonada, acho que foi amor à primeira vista. Mesmo você sendo um grosso. — Você falando assim, parece que me amar é uma coisa ruim. É isso? —Pergunto confuso. — De maneira nenhuma, Júlio. Acho que amar você é a maior dádiva que possa existir. Existem pessoas que foram feitas para o amor e você é um delas, Rabugento. — Por que você acha isso? — Porque amar você é tão fácil. Você é um homem incrível Júlio D'Ávila, bondoso, generoso, bem-humorado quando quer, um irmão maravilhoso. O difícil é você deixar alguém entrar para ver isso, aquela que conseguir será a mulher mais sortuda do mundo. — E você não quer ser essa mulher, não é? Sei que sou difícil... — Não disse isso, Júlio. Uma coisa que a morte dos meus pais me ensinou, é que sou uma lutadora. Posso não conseguir te conquistar senhor D'Ávila, mas morrerei tentando. Não sou de desistir fácil, a cada obstáculo que você jogar no meu caminho, eu irei escalar cada um deles. Até eu chegar ao topo e fincar a minha bandeira. Eu sorrio, porque eu sei o quanto ela é obstinada e irritante. Eu nunca quis nada na vida, como eu quero essa mulher e isso é surpreendente. Quero saber cada detalhe da sua vida, quero ser o que ela precisa. Ao seu lado me
sinto vivo pela primeira vez na vida. — E o que estaria escrito nessa bandeira? — Esse homem pertence à Vida! —Ela diz rindo. — Justo, já que deixei minha marca de posse em você. Essa marca é a minha bandeira, dona Colorida. — E o que diz essa bandeira? —Ela pergunta e se inclina na mesa, aproximando seu rosto do meu. — Essa Vida é minha, cada pedacinho dela. Por isso, acho melhor você sentar antes que mostre o que é meu, para o povo da mesa aí atrás de você! — Jesus me abane isso foi quente. Tão quente, que eu transaria com você aqui! —Ela diz se abanando. — Você precisa de filtro! E modos também, Vida Martins. Senta pelo amor de Deus, garota doida! — Ok, ok, acalme essa bunda possessiva! —Ela diz sentando-se. — Sabia que você é muito estressado? Cuidado, sua pressão pode subir e correr o risco de um derrame cerebral. — Engraçadinha. — Vamos mudar de assunto, Rabugento. Você não está com calor? — Ela pergunta se abanando. — Não, acabamos de tomar banho. Será que você está ficando doente? — Não! Mas acho que você está ficando, acho melhor você tomar um banho. Vai se sentir refrescado. —Ela me olha cheia de malícia. — Eu me sinto bem, Colorida. Lógico que está abafado, mesmo chovendo ainda está calor. — Homem de Deus! Estou te dando pistas, estou quase contratando um daquelas placas neons! Banheira, espuma, você e eu e sua segunda lição
dos pega sinistros da Vida. —Ela diz bufando, vermelha de vergonha. — Por que não falou diretamente isso? Se você queria começar a segunda lição, por que não falou? Às vezes eu não te entendo, Colorida. Você é tão... — Irritante? — Isso também, mas eu ia dizer confusa. Muito, muito confusa. — Meu caro Rabugento, a vida é confusa. —Ela diz gargalhando alto. — Tenho que concordar e agora nós vamos tomar esse banho. Fiquei ansioso. — No final dessas aulas de safadeza, vou ter criado um monstrinho transante. —Ela diz alto. — Filtro cacete! —Falo levantando da mesa. — Que rabugento credo! Saio arrastando a maluca até o nosso quarto e ela vai rindo e pulando por todo o caminho. Só tendo uma paciência infinita para aguentar as loucuras dessa mulher. Assim que chegamos ao quarto, ela vai direto para o banheiro encher a banheira e fico escutando ela falando sozinha. Acabo rindo sozinho, acho que ri mais em uma semana do que em uma vida inteira. — Vida Martins, esse homem é gostoso? É sim senhora. Esse homem tem um corpo incrível e lambível? Tem sim senhora. Quer tatuar o pau dele no seu útero? Queremos, não vamos mentir. Mas tudo com calma ou vai perder esse neném. —Ela fala sozinha no banheiro. Neném? Tatuar meu pau no seu útero? Queria saber como funcionaria isso dentro da sua mente maluca. Sério, não tenho estrutura para isso não! — O banho do neném está pronto! —Ela sai do banheiro gritando. — Neném é demais, Colorida!
— Ok, seu banho está pronto Ursinho. — Vou matar a minha mãe! —Falo me levantando da cama e tiro a camisa. — É... Hum ... você vai tomar banho pelado, Júlio? Tipo, sem roupas? —Ela pergunta surpresa. — E não se toma banho assim? — Sim, mas... você sabe que vou estar na banheira também? Nós dois lá dentro e tudo. — Lógico que sei Colorida. — Vamos tentar novamente. Você sabe que vamos tomar banho juntos, dar uns pegas sinistros e mesmo assim você vai entrar pelado? — Vou, por quê? Você não vai? —Tá difícil Deus! —Ela diz olhando para o teto. — Não me responsabilizo se eu escorregar e cair sentada em alguma coisa dura, eu tentei Deus. O senhor é a prova de que eu tentei! Vamos. Ela sai pisando duro para dentro do banheiro e eu fico sem entender o porquê da revolta. — Já estou pelada, Rabugento! —Ela avisa. Ela está pelada! Nada demais, não é? Todo mundo toma banho pelado, é normal. Ela está pelada caralho!
É foda! Eu tentei juro que tentei fazê-lo perceber que nós dois estaríamos juntos na banheira. Ele me ouviu? NÃO! Ele disse que era normal, mas não é não porra!
Estragou todos os meus planos, tenho que bolar outra lição. Não vou poder sentar em seu colo ou o meu útero vai reclamar aquele pau como dele, aí fodeu, nunca mais iria sair de cima. Engraçado o que um pouco de confiança não faz com as pessoas. Até ontem, vamos dizer assim, Júlio tinha vergonha de quase tudo. Mas agora? Agora a vergonha foi para casa do caralho, porque o infeliz entra no banheiro e faz um stripper. Cadê a timidez desse homem? Ele olha sério para a minha cara surpresa e vai abrindo o maldito sorrisinho de lado. Sabe qual é? Aquele sorriso tipo cafajeste, que sabe as coisas impuras que está passando pela sua cabeça. Estilo Channing Tatum no filme que ele era stripper! Homem gostoso da porra é esse Tatum. Ele tira a bermuda, ficando apenas com uma cueca boxer preta. Eu deveria ter um pingo de vergonha e desviar o rosto ou olhar para baixo. Mas eu sou uma cara de pau, uma desavergonhada, porque eu olho quase babando. O diabinho e o anjinho duelando na minha cabeça. — Pare de olhar Vida Martins! —O anjinho diz bravo. — Para nada não, o que é bonito é para ser admirado e esse homem é um espetáculo! —O diabinho diz rindo. Para não ter briga entre o céu e o inferno, eu cubro meus olhos e deixo uma pequena fresta. O que? Eu sou humana cheia de pecados! Escuto a risada do senhor ex-timidez, mas só abro os olhos quando ele entra na banheira e senta do outro lado. — Pronto Colorida, pode abrir os olhos. Sua moral está segura agora. —Ele diz rindo. — Meu amor, minha moral já foi para o lixo faz tempo. Estou cuidando da sua moral mesmo.
— Entendi..., mas essas lições não são para tirar a minha, vamos dizer timidez? Você está pelada? — Estou te ensinando às coisas boas da vida, transar é uma delas. — Entendi. E quando vamos transar? —Ele pergunta curioso. — Deus meu! Júlio meu amor, lindinho da Vida, não me faça essa pergunta. Vamos devagar, ok? — Muito ok da vida toda. Qual é a nossa próxima lição? Você está sem calcinha? Eu já vi seus seios. —Ele pergunta na cara de pau mesmo. Esse homem quer me matar, só pode ser isso. — Você falou que para tomar banho, tinha que ser pelado, não é? Então respondendo a sua pergunta, sim Júlio D'Ávila, eu estou pelada. — Posso ver? —Ele pergunta inocente. — Você já se tocou Júlio? —Pergunto mudando o foco de mim para ele. — Não. — Não sente vontade? — Nunca senti. — Quer se tocar agora? — Não. — Posso te tocar? —Pergunto curiosa e ele me olha sério e o vejo engolir em seco. — Não sei... — Olhos em mim; Rabugento. —Chamo a sua atenção, preciso que ele foque em mim. — Você quer que eu te toque? — Muito. Ele diz baixinho, se estivesse tocando alguma música, eu seria incapaz de ouvi-lo. Respiro fundo e puxo suas pernas para baixo, esticando ela para que eu possa subir em seu colo. Sento em suas coxas, bem distante
do seu membro. Me inclino para beijá-lo e ele tenta me puxar para mais perto dele. — Não Rabugento. Se eu me aproximar, vamos acabar fazendo o que você não está preparado para fazer. — Quero sentir você. —Ele diz confuso. — Depois, agora quero tocar em você. Hoje isso é só sobre você, ok? — Ok. Eu o beijo mais uma vez e levo suas mãos para os meus seios. Só precisei dar a dica e ele assumiu o comando. Passo minhas mãos pelo seu peitoral e sua barriga, depois volto até seu peito e passo minhas unhas levemente por todo o lugar. Ele respira fundo e continua a me beijar, só que agora com mais ímpeto. Desço minha mão até alcançar seu membro rígido. Assim que o toco pela primeira vez, Júlio segura a minha mão fortemente. — Não! — Ei! Abra os olhos, Júlio. Sou eu, sua Colorida. Está vendo? —Peço baixinho e ele abre os olhos. Tento não deixar minha mente trabalhar nas merdas que ele possa ter passado, mas é quase impossível fazer isso. Sinto um aperto no peito quando vejo tanto medo em seu olhar. — Por favor, Colorida. — Eu nunca vou machucar você, Júlio. Vamos mudar essa lembrança ruim por uma boa? Vamos mudar essa sensação ruim, por uma nova feita por nós dois? — Eu... tenho medo. É sujo, Vida. Doeu demais. —Ele diz baixinho e eu sinto as lágrimas que estava segurando rolarem pelo meu rosto. — Vamos limpar? A partir de hoje, tudo o que fizermos será considerada uma limpeza. Você diz que doeu; então eu serei a cura. Me deixa tentar meu amor?
Ele me puxa para os seus braços, afundando seu rosto em meu pescoço. Seu corpo inteiro treme e suas lágrimas molham meu ombro. Cada gota quente que cai dos seus olhos é como se fossem lâminas afiadas em meu coração. Aqui e agora, não é mais o homem que está e sim o menino que sofreu tanto no passado. Eu só o abraço forte, tentando consolá-lo com o meu carinho. Aos poucos ele vai se acalmando e começa a beijar meu ombro, pescoço, até alcançar minha boca. Nós nos beijamos com tanto carinho, minhas lágrimas e as dele se misturando no beijo. Aos poucos o beijo calmo vai ganhando intensidade, o desejo vai tomando conta e ele próprio segura a minha mão, levando até seu membro. — Não Júlio. —Falo tentando afastar a minha mão. Mas ele mantém um aperto firme e minha mão. Ele segura meus cabelos com a outra mão, mantendo minha boca grudada na dele. — Sim, minha Colorida. Você pode me curar? —Ele pede e nessas palavras, eu não vejo o meu Rabugento e sim um menino. Engulo em seco e o beijo com tudo o que tenho dentro de mim. Passo através do meu beijo, todas as coisas boas que sinto por ele. Começo a acariciar seu membro, subindo e descendo a minha mão por todo o seu comprimento. A cada movimento, ele suspira e geme baixinho. Passo meu polegar por toda a sua glande, arrancando mais gemidos dele. — Quero tocar em você, me ensina? Quero te dar prazer também. — Ele diz beijando e mordendo meu pescoço. — Pode me tocar aonde quiser e como quiser, mas hoje é tudo para você. Aumento minhas investidas nele, fazendo minha mão subir e descer mais rapidamente. Júlio segura meus seios com força, me fazendo gemer baixinho. Ele aperta e brinca com os meus mamilos, assim como ele fez mais
cedo. Só que agora ele está mais afoito, mais desesperado. Ele leva meu seio esquerdo à boca, sugando com sofreguidão e deixando pequenas mordidas. — Eu... eu estou sentindo a mesma coisa da primeira vez. —Ele sussurra em meu ouvido me arrepiando inteira. — Então faça como a primeira vez e deixe ir. Goza para mim Júlio. Ele esconde seu rosto em meu pescoço novamente e quando seu corpo começa a convulsionar mostrando que seu orgasmo está chegando Júlio me morde e suga a minha pele. Com certeza terei outro chupão. — Vida... —Ele clama meu nome em êxtase. Júlio goza em minhas mãos e geme chamando meu nome várias vezes. Ficamos; um bom tempo, calados eu não me importei de não gozar. Poderia ter arrumado um jeito de me divertir na nossa pegação, mas hoje era só para ele. Principalmente depois de tudo o que aconteceu. Júlio está se abrindo para mim dia após dia, isso é tudo o que quero. — Colorida? —Júlio me chama com o rosto ainda escondido em meu pescoço. — Oi. — Vamos dormir na banheira? — Não, ou amanhã iremos parecer uvas passas. Você está com sono, não é? — Sim, parece que todas as minhas energias foram sugadas. Eu ainda não vi você pelada, Colorida. — Você cismou comigo pelada, não é? —Falo rindo. — Você me viu pelado, nada mais justo. Atendendo ao pedido do meu menino curioso, levanto do seu colo e fico em pé na banheira. Júlio me olha com os olhos arregalados, como se pudessem pular para fora do seu rosto perfeito. Puxo uma toalha e me seco, pego outra e entrego para ele que levanta da banheira e enrola ela em sua
cintura. Obrigado minha santinha da safadagem. Vou para o quarto pegar um camisetão e ele vem atrás de mim e puxa a toalha do meu corpo, me deixando boquiaberta. — Júlio! — Por que está se escondendo? Eu já vi seu corpo, ele é lindo e não quero que você coloque roupa para dormir. —Ele diz sério. — Não quer? — Eu quero sentir seu corpo no meu. Jesus amado! Dormir pelada com esse homem a noite toda! Minha deusinha da safadagem, por favor não me deixe cair em tentação, como acordar sentada no pau dele. Amém.
Acordo praticamente em cima do Júlio, minhas pernas enroscadas em sua cintura e meu braço rodeando seu peitoral. Uma coisa cutuca minha coxa e é aí que eu desperto de vez. Senhor da glória, deusinha da safadagem, é muita coisa para uma mortal cheia de pecados como eu aguentar. Sem conseguir me conter, levanto o edredom lentamente para dar uma espiada no meu objeto de desejo e, minhas senhoras; quase caio da cama! É pau, é pedra, é o fim do caminho. É um resto de toco, é um pouco sozinho. É um caco de vidro, é a vida, é o sol. É à noite, é a morte, é um laço, é o anzol Minha boceta fica igual às águas de março, toda alagada! Agora me diz, se eu correr o bicho pega e se eu ficar o bicho come. E parece que quanto mais eu olho, mais o negócio endurece e o foda é que não consigo parar de olhar. Minhas mãos coçam, minha boca enche de água, fora
a descarada lá embaixo que não parou um minuto de piscar. — O que tanto você olha, Colorida? Parece que está estudando um sapo para aula de dissecação em biologia; confesso que estou ficando com medo de você. —Júlio diz rindo. —Caralho! Você não pode assustar uma pessoa distraída Rabugento, eu poderia cair mortinha aqui com um aneurisma cerebral. Onde já se viu, assustar alguém assim, isso é inadmissível. Ele cai na gargalhada e me puxa até que meu corpo esteja em cima do seu. Sem pensar no que estou fazendo, acomodo minhas pernas uma e cada lado do seu corpo, ficando com a descarada em cima do membro dele. Agora me dou conta o quanto isso será difícil para mim, é muita tentação para uma pessoa só. — Hum... Júlio, assim fica difícil a situação. —Falo quase chorando de desespero. — Por que difícil? Eu estou achando muito gostoso. —Ele diz com a voz rouca, carregada de desejo. — Estamos indo lentamente, esqueceu? — Não esqueci, só quis testar uma teoria que está na minha cabeça desde a noite passada. Eu gostei muito do nosso sexo a seco, se foi prazeroso com nós dois usando roupa, fiquei imaginando como seria se estivéssemos nus. —Ele responde baixinho e com suas mãos em minha cintura, começa a balançar meu corpo contra o dele. Eu tento segurar o gemido, mas ele acaba escapando. Está tão gostoso, que eu ficaria assim o dia inteiro, mas tenho que ser forte. Júlio está empolgado com as descobertas do próprio corpo, do desejo, do gozar pela primeira vez e gostar disso. Mas eu sinto dentro de mim que ele não está pronto para o ato principal. — Júlio, nós temos que parar. —Falo tentando me afastar, mas ele me
segura no lugar e se senta comigo em seu colo. — Só me diz o porquê de estar com medo? Não entendo, Vida. É foda quando ele me olha com esses olhos cheios de medo, meu coração dói tanto. — Meu medo não é por mim e sim por você, Júlio. Você acha que eu não estou doida para senti-lo dentro de mim, de sentir você gozar por mim? Eu só penso nisso desde que te conheci, Rabugento. Mas ainda é cedo, quero que você confie em mim, que não tenha medo. E ficar assim com você, pele a pele se torna foda demais. —Falo escondendo meu rosto em seu pescoço. Ele se mexe, para poder me abraçar melhor e acaba fazendo com que o seu membro se encaixe na minha entrada. Nós dois paramos de respirar na mesma hora e ele geme baixinho ao sentir o nosso contato. — Tão quente... —Ele geme em meu ouvido. — Júlio... — É tão diferente, Colorida. —Ele diz baixinho e instintivamente impulsiona seu corpo, adentrando em mim um pouquinho. Eu quero pará-lo mesmo amando a sensação, mesmo que seja ele quem esteja tomando a iniciativa, eu sei que ele vai surtar em algum momento. Ele carrega coisas demais dentro de si, para agir assim por instinto, ele vai acabar se cobrando e nós dois sofreremos as consequências. Eu sei que ainda é muito cedo para estar sentindo o que estou, mas é impossível não me apaixonar por esse homem, principalmente depois de saber do peso que ele carrega dentro de si. Estou definitivamente caindo de amores por esse homem e eu sei que tenho noventa por cento de sair machucada dessa história. — Júlio, nós não podemos, ainda não. — Só quero poder senti-la, não me tire isso. —Ele implora. Mesmo sabendo que eu vou me foder depois, acabo aceitando o seu
pedido. Peço para que ele fique parado e desço meu corpo, aceitando todo o seu comprimento dentro de mim. Assim que minha bunda bate em suas coxas, ele segura a respiração e joga a cabeça para trás. Seus braços me apertam fortemente contra ele, suas mãos cravadas em minha cintura, tudo isso faz com que meu corpo queime de puro desejo. Nunca me senti assim antes, mesmo tendo experiência no sexo, essa é a primeira vez que sinto a crueza do desejo, uma intensidade avassaladora. Por puro instinto, começo a mexer meu corpo para cima e para baixo, arrancando suspiros e gemidos dele. Júlio se agarra ao meu corpo, como se eu fosse um bote salva vidas, sua boca viaja pelo meu rosto, pescoço, ombros, sem saber ao certo em que ponto tocar primeiro. Seguro seu rosto em minhas mãos e trago sua boca até a minha e ele me beija com sofreguidão. Tudo se torna um borrão, Júlio se entrega a todas as sensações do momento, ele não segura nada. Seus gemidos, seus suspiros, seus beijos, tudo demonstra o que ele está sentindo. Suas mãos me tocam em vários lugares, sinto suas unhas arranhando minhas costas, sua boca me mordendo e sugando minha pele. A cada movimento que eu faço, ele se torna ainda mais afoito e eu também me sinto perdida, é como se fosse a minha primeira vez também. É tudo tão forte e intenso que perdemos a noção de tudo. Nossos beijos se tornam mais faminto, minhas unhas cravam em seus ombros, minha boca deixa marcas aonde toca. — Vida... — Eu estou aqui, olhos em mim Júlio. —Peço com firmeza e ele me olha. Seus olhos são a coisa mais linda que já vi! Há tanta fome, tanto desejo, um deslumbramento absurdo. O encantamento com que ele me olha, traz lágrimas aos meus olhos que eu não consigo segurar.
— Com quem você está Júlio? — Com você. —Ele diz ofegante. — Quem sou eu? —Pergunto e ele fecha os olhos. — Olhos em mim! Quem sou eu, Rabugento? — Vida. Você, a minha Colorida. —Ele diz com lágrimas em seus olhos. — Sim, sua colorida Júlio. — Minha... Meus movimentos se tornam erráticos, nossos corpos suados deslizam no mesmo ritmo. Júlio puxa meus cabelos e gruda sua boca na minha, me beijando apaixonadamente e segundos depois se entrega ao êxtase. Olhar esse homem gozar, não se compara em nada ao que eu imaginei ou presenciei mais cedo, é tão lindo a forma com que ele se entrega para mim, que sempre me lembrarei desse dia. Pela primeira vez na vida, choro ao alcançar o orgasmo. Choro porque foi um dos momentos mais lindo que já vivi; a forma que ele abriu mão dos seus medos e enfrentou suas inseguranças em relação ao sexo, vai valer a pena todos os transtornos que vierem a seguir. Choramos agarrados um ao outro, sentindo a intensidade de tudo o que acabou de acontecer. A emoção foi tanta que me senti drenada e acabo adormecendo, só para acordar, horas mais tarde, sozinha. Acabo sorrindo tristemente ao constatar que eu estava certa a todo tempo. Olho para o relógio de cabeceira e vejo que já passou das três horas da tarde. Me levanto da cama e meus olhos automaticamente vão para onde nossas malas estavam e vejo que só a minha ficou. Fico triste, é impossível não ficar depois de toda a emoção que passei com ele, mas sei que nada disso é minha culpa. Seus medos ganharam a melhor, mas não deixa de machucar mesmo sabendo disso.
Tomo um banho rápido, me troco pego minha bolsa e vou andar pela cidade. Antes de sair do hotel, peço para mandarem uma camareira trocar as roupas de cama e se possível, que eles arrumem outro quarto para mim. Não sinto fome, então compro uma água de coco e vou até uma farmácia comprar uma pílula do dia seguinte. Eu nunca transei sem camisinha, mesmo estando alta de tanta droga, ainda sim fazia questão de usar uma e, além disso, tomo minha injeção de contraceptivo todos os meses fielmente, porém devido a situação, não quero correr o risco de acontecer uma gravidez não desejada. Ando pela cidade, visito algumas lojinhas, como um sanduíche no finalzinho da tarde e só depois volto para o hotel. Assim que entro na recepção, vejo a velhadia no balcão conversando com o gerente. Me aproximo dela que quando me vê abre um sorriso toda simpática. — Boa noite meu bem, como está sendo sua estadia no meu resort? Espero que esteja sendo muito bem atendida, fiz questão de avisar todos os empregados para atenderem vocês muito bem. —Ela diz alegre. — O atendimento é impecável, Maura. O lugar é incrível e tem um ótimo potencial, fazendo todas as mudanças que você deseja esse lugar vai ser um arraso. — Fico extremamente feliz por ouvir isso, minha querida. Onde está o seu marido? Confesso que estou ansiosa parra saber sobre as mudanças. — Infelizmente o Júlio, teve um pequeno problema em outra obra e isso exigiu a sua presença imediata, mas creio eu que ele volte antes da sua viajem, Maura; contudo, enquanto isso, nós podemos trabalhar em alguma coisa juntas, o que acha? — Nossa, espero que não tenha sido nada grave. Por que você não foi junto? Poderia voltar com ele sem problema nenhum. —Ela diz sincera. — Imagina, quis ficar e adiantar o trabalho, assim não atrasaria os
meus outros clientes. Que tal tomarmos um café e conversamos um pouco do que vi nesses dois dias? — Maravilhoso! Vamos até o restaurante, vou pedir para eles preparem um lanche tardio para nós. —Ela diz animada e me puxa para o restaurante. Assim é melhor, prefiro me ocupar com o trabalho, do que ficar no quarto pensando merda. Nós nos sentamos em uma mesa afastada e vou pontuando tudo o que vi de errado no restaurante, Maura pede para um funcionário papel e caneta e eu começo fazendo uma lista do que precisa ser feito. O tempo passa voando e quando vejo já são quase dez horas da noite, me despeço dela e combinamos de nos encontrar para o café da manhã. Assim que passo pela recepção o gerente me chama e diz que me colocou em outro quarto como eu havia pedido e que minhas coisas já foram transferidas para lá. Pego a nova chave e vou para o meu quarto, assim que entro vou direto tomar banho. Não olhei o celular e para ser sincera, não sinto um pingo de vontade agora. Visto um pijama e me deito na cama, mas antes agarro os meus fones de ouvido e me cubro até a cabeça. No meu casulo seguro, escolho a playlist do Queen e coloco no último volume, abafando qualquer pensamento do que aconteceu. Acordo no meu horário de sempre, gritando mais do que o normal. Levanto com a roupa pingando de suor, tomo novamente um banho, me troco e vou dar uma volta na piscina onde me sento para apreciar o dia amanhecer. Não me lembro com o que sonhei, mas isso me abalou mais do que o normal. Quando o dia amanhece, vou para o restaurante e sou a primeira hospede a chegar me sirvo com uma xícara de café e fico esperando a Maura aparecer. Assim que ela chega, tomamos café juntas e munida com minha prancheta e minha paleta de cores, andamos pelo hotel marcando todas as
coisas que ela quer mudar e todas as minhas sugestões. No fim do nosso tour, ficou acertado de eu mandar as fotos dos móveis para ela aprovar e mais uma visita depois que o Júlio fizer a nova planta, assim ficarei sabendo no que terei que mexer depois disso. — Maura, como já resolvemos quase tudo da minha parte, vou embora hoje mesmo e darei início as minhas pesquisas de preço para não ultrapassar o nosso orçamento. Manterei você atualizada de tudo o que eu fizer e mandarei um e-mail sobre os móveis que eu escolher. Gosto de atualizar todos os clientes dos meus passos, assim nós evitamos que aconteça algum erro. — Pensei que você esperaria o Júlio voltar, mas tudo bem, aposto que deve estar morrendo e saudades do seu menino. —Ela diz sorrindo — Você não sabe o quanto, Maura; mas vamos nos falando no decorrer da semana. Me despeço dela e vou para o quarto arrumar as minhas coisas. Graças a Deus, não mexi em nada quando mudei de quarto ontem à noite, então arrumo tudo rapidamente, me troco e peço um carro para me levar até Campinas. Vai sair caro, mas não estou ligando muito não, tudo o que quero é chegar em casa. Saí do resort uma e meia da tarde e o carro estaciona na minha porta às seis horas e assim que saio, vejo o eu padrinho chegando de o que parecer ser, uma corrida. — Tio! — Grito e ele para imediatamente. — Carinho meu! —Ele diz sorrindo e me segura quando me jogo em seus braços. — Que bom que o senhor está aqui, tinha até me esquecido. — O que você tem? Andou chorando? —Ele pergunta preocupado. — Preciso de colo e carinho. —Respondo quase chorando.
— Agora eu estou aqui Carinho meu, tudo vai ficar bem. Ele me abraça e vai comigo até o carro e espera eu pagar, não sem antes arrumar uma briga porque ele queria fazer isso. Com a minha mala na mão, nós entramos em casa e no seu colo, deixo toda a minha tristeza sair em forma de lágrimas. — Chore mi amore, coloque para fora tudo o que está te angustiando. Amanhã é um novo dia, agora eu estou aqui e cuidarei de você, vamos assistir Bambi e Cento e um Dálmatas como fazíamos quando era pequena. — Com pipoca e achocolatado? — Com tudo o que você tem direito, Carinho. Sim, amanhã será um novo dia.
— Beba isso garoto! —Meu padrasto diz, me obrigando a tomar um remédio. — O que é isso? Não estou doente. — Isso vai fazê-lo se sentir bem, hoje teremos a visita de uns amigos meus e você vai receber cada um. Ou eu posso pegar a sua filhinha e mostrar aos meus amigos, o que acha? —Ele diz com um olhar mal no rosto. — Não! Eu bebo, eu bebo, mas deixa a minha irmã em paz. Bebo o comprimido que ele me entregou, junto com um pouco de água. Seja o que Deus quiser. Vinte minutos depois, sinto uma sensação estranha no meu corpo, uma dor nas minhas partes baixas, uma sensação de ardência. Não sei explicar ao certo, só sei que não gosto nada disso. Aos poucos os amigos do meu padrasto vão chegando, todos muito bem vestidos e com uma boa aparência. Não consigo imaginar o porco do meu padrasto tendo amigos
assim. Muita bebida é servida, muita fumaça e, o cheiro horrível daquele cigarro se espalha pelos cômodos da casa. Graças a Deus a minha Maria está dormindo dentro do esconderijo que arrumei. — Olha quem está pronto para começar a brincadeira! —Meu padrasto diz gargalhando. — Bom, faça as honras da casa meu amigo. —Um dos homens diz, sua voz causando um calafrio em meu corpo. De repente meu padrasto me agarra pela gola da camisa e me puxa para mais perto dele. Um cheiro podre sai da sua boca, me causando ânsia de vômito. Ele arranca minha camiseta e outro homem ajuda a arrancar a minha bermuda e cueca, me deixando nu na frente de todos. Meu Deus, não permita que o que estou imaginando aconteça. Mas mais uma vez, o Deus todo poderoso fecha os olhos para o calvário que minha vida se transformou. Um dos homens me obriga a beber um líquido amargo e depois disso meu corpo relaxa, mas o medo se torna insuportável. A dor começa, e no segundo monstro eu não sinto mais nada. Não havia grito e choro que parassem esses monstros, que se divertiam a cada lágrima que eu derramava. — Seja um bom garoto ou a próxima a sentir isso será aquela menininha que está trancada no quarto! —Meu padrasto diz e logo em seguida me acerta um soco no rosto. Tudo por ela! Depois de alguns golpes, não consigo focar em mais nada. Só consigo sentir as mãos imundas pelo meu corpo e uma delas começa a manipular meu membro. Sem conseguir me conter, acabo vomitando no chão tudo o que eu tinha no estômago. Três biscoitos que comi mais cedo, juntamente com um
copo de água com açúcar e a bebida que o homem me deu. Sinto uma coisa quente no meu pau, mas não consigo distinguir o que é. Só ouço as risadas de escárnio e a palavra "viadinho", ser dita várias vezes. — Sabia que você gostava da fruta João! Toda vez que uma das bocetas chegava perto, você fazia cara de nojo. Você gosta de pau! —A gargalhada do meu padrasto toma conta de todo a sala, ultrapassando a música que está tocando. — Cala boca Adriano ou quer que eu conte seus podres para todos? —Um homem diz bravo. — Me ajude a colocá-lo sentado. Sinto meu corpo ser movido e de repente um aperto forte no meu membro me faz gritar de dor. — NÃO! PARE POR FAVOR. DÓI, ISSO DÓI! —Consigo gritar quando a dor se torna demais. — Cala a boca! Eu sei que você está gostando. —Uma voz diz e, um tapa atinge meu rosto. — Fode a bunda dele Júlio, eu sei que você está gostando. Você adora ter sua bunda preenchida, nada mais justo do que você fazer o mesmo pelo João. Vocês dois são iguais, dois "viadinhos" A cada balanço a dor se torna ainda mais intensa, o aperto me causa uma agonia que não sei explicar. —Não! Me sento na cama, assustado com a veracidade do meu pesadelo. Meu corpo pingando de suor, uma tremedeira imensa, um embrulho no estômago. Tento me levantar da cama, mas uma perna me mantém preso a ela e quando olho para o lado ela está lá. Tão linda... Tão pura... E eu estou manchando ela com a minha
podridão. Tiro suas pernas de cima de mim com toda a delicadeza e escorregou da cama, caindo de joelhos no chão, incapaz de ficar em pé. Uma urgência me bate e tento ir o mais depressa para o banheiro, quase não dando tempo de levantar a tampa do vaso. Coloco tudo para fora, em um choro convulsivo. Estou tão cansado de tudo isso! Quero ser um homem normal, quero ficar com ela, mas meus monstros jamais deixarão isso acontecer. Uma dor me acomete, diferente de tudo o que já senti antes. Eu mal a encontrei e vou perdê-la, nunca tive nada só meu e pela primeira vez eu ganho um presente do mundo, mas sou incapaz de ficar com ela. Fui tão longe, foi tão perfeito e pela primeira vez tive a esperança de que tudo ficaria bem, porém acreditei rápido demais e agora estou sofrendo por aquilo que nunca poderei ter. Decidido a dar um fim nisso, tomo um banho rápido, me troco, arrumo minhas malas para partir. Sento na beirada da cama, querendo guardar essa imagem na minha cabeça. Tão linda, tão perfeita... merece alguém melhor que eu, alguém tão limpo quanto ela. Sem marcas, sem uma carga pesada, que possa ser capaz de cuidar dela como ela merece. Eu não sou esse alguém e saber disso está acabando comigo. Pego o meu celular e tiro uma foto para guardar comigo. Envio uma mensagem para ela e só depois vou embora. Passo na recepção e peço que mandem a conta do quarto para o escritório. Dirijo para Campinas, mas um pedaço de mim ficou com ela. O pedaço que implora por salvação, o pedaço que quer ser aceito, limpo e digno dela. Não presto atenção em nada, na realidade nem sei como cheguei em casa sem sofrer nenhum acidente. Horas depois chego e nem tiro a bagagem do carro, entro direto no prédio sem nem cumprimentar o porteiro. Me tranco em casa e vou direto para o chuveiro. Sento de roupa e tudo embaixo da água pelando.
Por que Deus não me ouviu? Por que ele permitiu que toda aquela imundice fosse feita comigo? Por que ninguém me salvou? Eu seria um homem completamente diferente do que sou hoje. Seria um homem normal, sem medo de viver. Eu tentei, juro que tentei, mas esse monstro que mora em mim jamais irá permitir isso. Sempre lembrarei de toda a sujeira, de cada dor que me foi causada, de cada surra, de cada coisa que me obrigavam a fazer. Por que não me mataram? Teria preferido mil vezes morrer a carregar toda essa merda. Não queria a perfeição, jamais quis isso. Só queria ser normal! Mas não, Deus com sua gloriosa generosidade, preferiu me moldar em mil e uma maneiras de Imperfeição. E eu terei que conviver com isso, seguindo o caminho sozinho sendo apenas acompanhado pelas vozes dos monstros que me transformaram no que sou um hoje. Um completo Imperfeito...
— Gaia D'Ávila, juro por Deus que vou perder a minha paciência com você e não será bonito, você está me ouvindo! Essa garota veio ao mundo para foder o meu juízo. Ela simplesmente é uma mistura da mãe e da avó, impetuosa, audaciosa e prepotente. Sinto falta de quando ela era o meu bebê, que sorria e que amava ficar grudada comigo. Mas agora ela está entrando na pré-adolescência e fez como meta na vida me enlouquecer. — Pai, eu não fiz nada! Aquela diretora fica te ligando a toa, deixa só a minha mãe ficar sabendo que ela baba no senhor. Ah dona Yza vai destruir aquela escola. —Ela diz brava. Meus filhos são tudo para mim, mato e morro por eles, mas confesso
que a Gaia me desgasta para caralho. Respiro fundo e me sento na mesinha, de frente para ela. — Conversa comigo pirralha, o que está acontecendo? Estou cansado das suas confusões filha. Sua mãe já brigou; seu irmão já te colocou de castigo, me ajuda a te ajudar Gaia. Está ficando difícil, ainda mais agora que você bateu em dois colegas da escola. — Pai, o senhor sempre nos ensinou que não devemos ser ruins. Que temos que respeitar a todos, independentemente de raça, crença e opiniões, não é? Eu nunca vou ficar calada e sem fazer nada, quando meu melhor amigo é agredido fisicamente e verbalmente! E aí que ele é gay? Ninguém tem nada a ver com isso pai, ninguém vai mexer com ele, magoá-lo e achar que está tudo bem. Aquela diretora é uma homofóbica do caralho! Eu odeio ela pai; odeio aquela escola hipócrita, que prega uma merda de igualdade sendo que é tudo fachada. — Ela diz revoltada e acaba caindo no choro. — O Vitinho é gay e está sofrendo preconceito, é isso? — Pergunto e ela diz que sim com a cabeça. — Por que você não me contou? Ou para a sua mãe e irmão? Nós estamos aqui para tudo filha, além de ser seu pai eu sou seu amigo. Ocorrerão coisas que você por ser novinha não vai conseguir resolver, mas eu ou sua mãe e até mesmo o Júlio, nós faremos o que for preciso para ajudá-la. Você precisa se abrir minha princesinha Fiona. E pare de falar palavrão garota, a pimenta ainda está no mesmo lugar de sempre! — É foda pai... é fogo, desculpa. Ele sofre em casa, seus pais idiotas não aceitam que ele seja homossexual. Deram o prazo de um mês para ele sair de casa. Pai! Ele tem dez anos vai fazer onze, tem noção disso? Eles vão colocar o Vitinho na rua, nenhum parente quer um gay em casa! Olha o absurdo disso pai! Em pleno século vinte um esses escrotos preconceituosos terão coragem de um caralho desse! Não posso ficar sem ele pai, meu amigo só tem a mim e eu não posso deixar de ajudar.
— Então vai lavar esse rosto, trocar de roupa e vamos buscá-lo. Se esses malditos não o querem, aqui tem quem queira. —Yza diz entrando na sala feito um furacão. — Sweet... — Se vira excelência, mexe os pauzinhos, chantageia alguém, eu ainda tenho as fotos do Josafá! Naquela casa esse menino não fica. Onde já se viu isso? E você garota se esconder mais alguma coisa eu mesma vou te mandar para uma escola militar na Alemanha. Quando penso que nada mais me surpreende nessa mulher, ela vem e me prova ao contrário. Meu telefone toca e vejo que é o Otávio. — Fala cara. — O Júlio apareceu ai? —Ele pergunta preocupado. — Não, ele não está no litoral? — Deveria estar, mas a Maura me ligou preocupada. Disse que a Vida contou que o Júlio teve um problema ontem em uma obra e que teve que ir embora. Ela ficou preocupada, porque a Vida estava abatida. Eu ligo para esse garoto, mas só dá caixa postal. Gael, alguma coisa deu errado. — Já ligou para ela? Meu filho está passando por tantas coisas novas, tantos sentimentos jamais sentidos, é óbvio que ele fugiria. Júlio e Maria têm sérios problemas de inferioridade, mais o Júlio do que minha Ursinha. — Caixa postal. Maura disse que ela acabou de sair de lá, fez o trabalho dela em menos de um dia e pediu um carro para ir embora. Deu merda, minha preocupação é com os dois. —Otávio diz nervoso de preocupação. — Calma eu preciso de um favor. Eu iria acompanha a Yza e a Gaia até a casa do amiguinho dela, mas preciso que você faça isso. Não posso
deixar a Yza solta, se é que me entende. — O Vitinho? Olí, estava me contando algumas coisas interessantes. Chego aí em cinco minutos. —Ele diz e desliga. Com apenas um olhar, minha mulher conseguiu entender a situação. Ela pede para Gaia ir se arrumar e assim que ela sai, minha mulher caminha até onde estou e se senta no meu colo. — Nosso menino está confuso, não é? —Ela pergunta séria. — Algo aconteceu, ele abandonou a Vida no resort sozinha. A cliente acabou de ligar para o Tavinho. — Vai buscar o meu Ursinho, Gael. —Ela diz e meu telefone toca novamente. — Oi Ursinha, já quer vir embora? — Pai, meu irmão. Não sei o que é, sinto uma tristeza tão grande. Ele está aí? Liguei, mas ele não atende e a Luna também está preocupada. —Ela diz chorando. — Ele está bem amor, ele foi para o litoral a trabalho. Vou tentar falar com ele e te ligo, quer que a sua mãe vá te buscar? — Sim, por favor. — Tudo bem, daqui a pouco ela chega aí. Me despeço e desligo. — A coisa foi séria mesmo! A Maria e a Luna; também estão preocupadas. Vou atrás dele. Pego as chaves do carro e dirijo até seu apartamento. Sinto um alívio imenso quando vejo seu carro estacionado na porta. Paro meu carro e vou até o dele e vejo que a chave está no contato e a mala no banco de trás. Só isso me diz que ele está transtornado, Júlio é cuidadoso quando o assunto é segurança. Ele infernizou e inferniza a família inteira com isso. Pego suas coisas, tranco o carro e entro no prédio.
Assim que abro a porta do apartamento, um silêncio absoluto me recebe. Deixo a mala no sofá e vou procurar o meu garoto. Os quartos estão vazios, olho o escritório, cozinha e o encontro na área de serviço. — Ei garoto! —Tento chamar sua atenção, mas é em vão. Ele está perdido em seus pensamentos, então me sento ao lado dele e abraço seu ombro. Ficamos quietos por um longo tempo, até que ele quebra o silêncio e tira o meu chão. — Por que Deus deixou que fizessem tudo aquilo comigo, papai? Por que Ele não impediu isso, por que não me salvou? —Ele diz e sua voz está vazia, sem nenhum sentimento. Isso acaba comigo todas às vezes. Eu também faço essas mesmas perguntas, todas as vezes que ele entra em crise e pelo visto essa é uma das grandes. — Não sei filho, quer me contar por que você veio embora? — Por que ela teve que aparecer pai? Até ela chegar, eu nunca senti falta de nada, nunca almejei nada. Minha vida estava perfeita, mas então ela chegou e entrou no meu mundo cinza e clareou tudo com suas cores e me mostrou tudo o que eu poderia ter; coisas que eu quero, mas nunca poderei ter. Porra! Tem noção de como ouvir isso fode um pai? Queria tanto que ele seguisse em frente, que enterrasse todos os monstros em sua cabeça, que pudesse enxergar o potencial imenso que ele tem. — Por que você acha que não poderá tê-la? Você pode tudo filho, mas tem que deixar tudo para trás. — Ela faz com que eu me sinta inteiro; desperta sensações intensas, desejos que jamais poderia imaginar ter. Ela me mostrou que o sexo não é feio, que não causa dor, que pode ser gostoso e que é bonito. Nada do que eu já senti pai. Ela tentou me parar, parecia que ela sabia o que iria acontecer.
Mas eu quis mais, estava perdido no que ela me fez sentir, quis seguir em frente e ela aceitou. — Vocês transaram, é isso que está me dizendo? —Pergunto surpreso. — Ontem. Ela me ensinou o sexo a seco e pela primeira vez, não me senti sujo ao gozar. Mais tarde ela me ensinou que o toque de outra pessoa não doía e mais uma vez eu gozei e senti prazer nisso. Eu a vi nua e pai, ela é a coisa mais linda que já vi na vida. Tão perfeita, tão delicada. Eu a quis como nunca quis nada na vida! —Ele diz chorando. — Pedi para dormimos nus, queria sentir seu corpo junto ao meu, queria cada pedacinho colado em mim. Puta que pariu! Júlio me fode com essa sinceridade crua dele. — E o que deu errado? Machucou é isso? — Não! —Ele nega enfático. — Ela foi tudo o que jamais imaginei pai. Ela me guiou por esse caminho desconhecido, teve paciência, me ensinou a tocá-la. Ela me deixou maluco, um fogo me consumia a cada toque, a cada beijo. Eu a quero tanto pai, quero que ela seja minha, mas não posso tê-la. A conexão entre nós dois, meu corpo encaixado no dela, tudo foi perfeito. Senti-la me apertando, sentir seu calor, tudo foi incrível. Mas então eu dormi, nós dormimos conectados ainda... Já sei aonde isso vai dar. Pesadelos. Quando ele dá um passo à frente, essa merda vem e o puxa para trás. — Você teve um pesadelo, não é? —Pergunto mesmo sabendo a resposta e ele sorri tristemente. — O senhor me conhece como ninguém. É incrível que eu não sinta medo de te falar as coisas para o senhor. —Ele diz tristemente. — Sonhei quando fui drogado e obrigado a transar com um homem, no mesmo dia que fui estuprado por vários. Lembro do gosto da bebida, do
cheiro da maconha pela sala, das risadas de escárnio, deles me chamando de "viadinho". Ele para de falar, respirando fundo tentando esquecer a cena. O maior arrependimento que tenho na vida é de não ter matado aquele homem com as minhas próprias mãos. Alguém chegou antes de mim, mesmo que eu desconfie quem foi que mandou ou até fez isso, ainda assim eu queria ter tido esse privilégio. — Nós já conversamos sobre isso, filho. Nada do que aconteceu foi sua culpa e sim daqueles malditos. Você não é o que eles te chamaram, você é um homem incrível e que merece viver. O destino colocou essa garota no seu caminho, olha como você progrediu Júlio! Sua vida nunca foi normal, porque você nunca se permitiu viver. Eu vi mais vida em você em uma semana do que em dez anos convivendo com você. — Como o senhor pode achar que é normal eu tocá-la, quando a tanta sujeira em mim? Ela é a coisa mais pura que já vi pai, como posso contaminar ela com a minha podridão? Ela perdeu tudo pai, teve a família assassinada, foi à única sobrevivente. Como posso sequer pensar em jogar as minhas merdas, quando ela tem tanta coisa em sua vida? Como posso ousar arrancar a pureza dela, quando foi à única coisa que restou a ela? Eu me abri com ela, não tudo entende? E quando ela me contou sua história, me senti tão pequeno. Ela perdeu tudo, quando eu ganhei vocês. — Não trate o que você viveu com tanta insignificância filho. São situações diferentes, ela perdeu os pais de maneira trágica e sinto muito por isso. Mas você perdeu sua inocência, foi abusado por anos, se tornou pai aos dez anos, não viveu nada e eu não vou ficar sentado aqui vendo você tratar isso como não fosse nada. Vocês dois sofreram, mas se encontraram. Um pode ajudar o outro. —Falo um pouco ríspido, mas não aceitarei que ele faça isso.
Assassinados! Senhor da glória. — Ela tem pesadelos todos os dias pai, no mesmo horário em que sua família foi morta. O senhor a conheceu. Podia ter imaginado que aquela coisinha radiante carregaria tanta dor? E mesmo assim, mesmo com toda a sua perda ela é capaz de sorrir, de amar a vida, eu me sinto um lixo perto dela. Sabia que quando dormimos juntos, nenhum de nós tem pesadelos? Ela acalma os meus monstros e eu os dela. — E mesmo sabendo disso, você foi capaz de abandoná-la? Ela abriu mão dos traumas dela para abraçar os seus traumas, Júlio. Você diz que a quer; que ela é maravilhosa, mas deixou-a sozinha. Já imaginou como ela deve estar se sentindo? — Papai... — Não! Agora você vai me ouvir calado. Eu sempre estive do seu lado, sempre tentei te guiar, sempre ouvi seus temores e principalmente, sempre torci para que você esquecesse todas as merdas que você passou e seguir em frente. Não tenho dimensão certa das suas dores filho, sei que o que aconteceu machucou e te marcou a ponto de você ter medo de seguir em frente. Mas não vou passar a mão na sua cabeça quando fizer merda. Você errou ao fugir em vez de conversar, fugir nem sempre é o melhor a se fazer, Júlio. — Pai... — Você diz que a quer como sua como nunca quis nada na vida inteira, mas na primeira oportunidade você foge, pois está deixando o seu passado comandar o seu destino. Eu vi isso acontecer por dez anos, me metia quando via que você estava se perdendo, porém mesmo assim eu deixei você se esconder do mundo e ficar no seu mundinho seguro, isso porque nada te puxava dele e esse foi o meu erro. Então uma garota colorida chegou e eu vi o meu filho surgir para vida; vi uma personalidade forte dar as caras e nunca
me senti tão feliz. Pensei; chegou à hora. Nunca me senti tão importante como quando você veio me pedir conselhos, ali eu tive a certeza que tudo ficaria bem, que você iria enterrar seu passado. Fiquei no céu dos pais, quando você me contou sobre a viagem, senti tanto orgulho de você, Júlio. — Mas agora você não se sente mais orgulhoso, não é? — Não, mas não pelo o que você está pensando, Júlio. E sim por você, mesmo sabendo da história dela, ainda assim a deixou para trás sem uma explicação. Essa menina não tem ninguém na vida, mas encontrou você. Ela é um exemplo de superação, de generosidade, sabe como eu sei disso? Porque mesmo depois de perder tudo, ela ainda é capaz de sorrir; ela ainda se entregou a um homem com uma carga como a sua e o deseja; ela abriu mão de tudo, para guiar um menino por um caminho desconhecido. Estou descontente com a sua atitude de fugir e deixar para trás o seu arco-íris, a cor que conseguiu contagiar o seu "cinza". — Eu errei ao fugir. Eu já fiz isso antes e ela ficou um dia inteiro sem falar comigo. E agora, o que eu faço? —Ele me pergunta perdido. — Se preparar para implorar. Mesmo ela sabendo que não fez por mal, ainda sim a machucou. Imagina se depois de uma transa, você acordasse e ela tivesse ido embora sem uma satisfação? Primeiro de tudo filho, voltar para a terapia. Você tem que começar a entender tudo o que está sentindo de novo na sua vida. Segundo decidir o que você quer. Se for escolhê-la terá que enterrar seu passado e mostrar para ele que quem ganhou foi você. Quando seguimos em frente com a vida, os monstros perdem a força que eles têm sobre nós. Se você decidir que não consegue, então tem que abrir mão dela e deixar que outro faça o que você não pode. — Outro não! Outro nunca, pai. Ela é minha, eu a marquei como minha, coloquei minha bandeira nela. Ela é minha colorida, pai. Só minha. Sorrio com a ênfase que ele diz MINHA. Temos aqui um homem que
vai ultrapassar todos no quesito posse. — Você diz que ela é sua, mas ela sabe disso? —Jogo a sementinha do mal. — A partir do momento que você foi embora, deu o direito a ela de seguir em frente sozinha ou com outro homem. Atitudes valem mais do que palavras, filho. Você disse que ela é sua, mas a deixou para trás. — Quis protegê-la! — Mas ela sabe disso? Eis a pergunta de um milhão de dólares. — Falo sorrindo. — Não está me ajudando pai! —Ele diz nervoso. — Não vou facilitar as coisas garoto, você errou feio e não vou adoçar a pílula para você, mas não vou mesmo. A minha obrigação de pai é mostrar que você errou e não passar a mão pela sua cabeça, como eu fiz por dez anos. A mamata acabou Júlio D'Ávila, ou você acorda para vida ou ficará sem a Vida. — Trocadilho infame, senhor Gael D'Ávila. Vou implorar, vou até rastejar pelo perdão dela, mas nunca irei deixar que outro tenha o que é meu. E só não sabia que essas palavras seriam tão verdadeiras.
Só nos damos conta do quanto estamos sozinhas, quando uma pessoa importante aparece e tudo em sua volta muda de sentindo. Eu amo meu padrinho, fui criada com ele ao redor, ele me levava para a escola, na aula de dança, íamos ao cinema ou assistíamos filme em casa mesmo. Meu pai morria de ciúmes, falava que bastava meu tio chegar que eu não ligava para mais ninguém. Quando ele vinha para passar o final de semana ou um feriado, era uma festa só. Meus pais esqueciam o trabalho e nos divertíamos para valer. Ele sempre foi meu melhor amigo, meu salvador nas horas que metia o pé pelas mãos. Ele diz que fui eu a causa dos seus cabelos brancos. Ele ficou e manteve as lembranças da nossa família. — Terceiro balde de achocolatado, e duas bacias de pipoca com essa meleca, agora é hora de conversarmos, Carinho. —Ele diz sério. — Ok; vamos lá. Por onde devo começar?
— Pelo início, amore mio! — Estou apaixonada! Amor à primeira vista tio. Caí igual jaca madura de amor por esse homem. — Uau, é muito amor isso hein! E o que a fez chorar daquele jeito? Se ele te machucou, vou dar uma surra nele e sumir com o corpo. —Ele diz sério. — É complicado, tio. Ele tem uma carga pesada, traumas de um passado repleto de abusos. Ele não me contou tudo, acho que me contou o mínimo. —Falo tentando explicar sem contar uma história que não é minha. — Ele tem vinte e seis anos, mas um completo menino. Ele é muito inteligente, o melhor arquiteto que já conheci. Ele é um filho maravilhoso, um irmão formidável, sua família inteira é louca por ele. Desabafo e, meu tio sorri balançando a cabeça e se levanta. Ele caminha até a minha estante, abre a última gaveta e tira uma garrafa de Absinto de dentro. Nem me preocupo em perguntar como ele sabia, esse homem me conhece e me viu nos meus piores dias. — Carinho, está na hora de mudar seus esconderijos, ou melhor, está na hora de você largar essa válvula de escape. Nós já conversamos sobre isso, não foi? — Não se preocupa, não fiz uso dessa garrafa. Na realidade quase não bebi mais, só a uns dias atrás que fui para a balada com umas amigas, mas foi diversão, eu juro! O senhor sabe que o álcool nunca foi o problema. — Eu sei mi amore, mas ele é uma válvula de escape, não se engane. Agora vamos lá, já me abasteci e quero ouvir sobre esse homem incrível. — Ele diz sério. — Eu o conheci no meu primeiro dia na construtora. O Otávio estava me mostrando a construtora, minha sala, me apresentando os outros funcionários. E então ele apareceu... Ele é tão lindo tio, não sorriu para mim,
apenas resmungou quando tocou a minha mão e depois saiu apressado. — Sorrio ao me lembrar da cena. — Ele me chamou a atenção pelos seus olhos. Uma sombra de tristeza sabe? Sem o brilho da vida, sem alegria e isso me tocou. — Tão minha principessa. É lógico que se apaixonaria por um homem com uma carga pesada. Carinho, você sempre gostou mais daqueles que tinham alguma dificuldade. Lembra dos cachorrinhos que você pegava pela rua? E os gatinhos que abandonavam na porta do seu apartamento? E a bombom, lembra dela? A única cachorra do abrigo que não tinha uma perna. —Ele diz sorrindo. — E era a única que tinha uma alegria contagiante! Ela era linda, sinto saudades dela. — Sim. Você sempre gostou dos mais difíceis, você dava-lhes vida. Devolvia a alegria deles. Você é só amor, Vida e me orgulho tanto de você. — Sua tristeza me chamou, mas tinha algo mais. Eu queria ver um sorriso dele, queria ver seus olhos brilhando de felicidade. Queria que ele demonstrasse alguma coisa diferente da tristeza que ele carregava! Ele foi grosso, ignorante, resmungão. Eu o apelidei de Rabugento, vivia deixando escapar um monte de merda! Passei tanta vergonha. Ele gargalha alto quando eu conto das merdas que falei. — Minha menina sem filtro. — Ele é tão inocente. A atração entre nós é quase palpável, é desconcertante demais, acho que por isso falo tanta merda. Conheci sua mãe! Tio, essa mulher é mais louca que o Coringa e a mãe dela? Senhor da glória, a família toda é doida. O pai dele é um armário rabiscado, sabe aqueles armários de escola nos filmes americanos? Eu falei sobre o Rabugento para ele e nem me dei conta que ele era o pai. Eu chamei a mulher dele de louca! Ele é do tamanho do tio Sony, só que com tatuagens.
— Tatuagens? Interessante. —Ele diz misterioso. — Nos beijamos, dormimos juntos na casa dele, mas sem safadagem! Sou anjo, juro juradinho. —Desconverso porque esse homem é ciumento que só. — Pela primeira vez em sete anos não tive pesadelos, dormir maravilhosamente bem. Quase nos beijamos duas vezes, uma a mãe dele atrapalhou e a outra foi a prima. Vou te contar tio, o universo é sacana viu, toda hora atrapalhando o beijo! — Sem detalhes garota! Foca no principal ou sairei daqui direto para matá-lo. — Acalma a sua pistola! Credo tio, você é meu amigo e amigos ouvem as coisas. —Falo, magoada. — Eu sou seu amigo e não seu confidente, então me poupe dos detalhes ou esqueceu o que fiz com o seu primeiro namorado? —Tá, tá, tá! Nós nos beijamos, aleluia amém! Não vou te contar o restante, mas ainda fiquei intacta, só para saber. Ele tem problemas, falta de confiança, medo, muita coisa. Ele pisou na bola comigo e eu o ignorei o dia todo, sabe o que o maluco fez? Antecipou uma viagem para o resort, só para falar comigo. Quarto juntos, sem cama separada. Eu sofro tio, sofro para caralho. — E nessa viajem deu merda? — Nós conversamos, ele me contou um pouco da sua infância, ele criou sua irmã. Sua mãe é uma vadia, ainda bem que ela está morta. Mas ele deu a entender que sofreu abusos e isso me cortou o coração. Eu cheguei à conclusão que foram abusos sexuais. — E por que você chegou a essa conclusão? — O medo dele em relação ao sexo, a intimidade. Não quero contar os detalhes. Ele não entende de sexo, nunca tocou uma mulher, nunca se tocou. Vê-lo sentindo prazer pela primeira vez foi mágico. Disse que seria
sua professora, mas queria ir lentamente. Mas então hoje cedo deu merda, dormimos pelados e aconteceu o ato. Se é que me entende. Dormimos e quando acordei, ele tinha ido embora. — E? — Eu entendo os seus medos, lembra do caso que a minha mãe trabalhou? Aquele de abuso sexual, o pai que estuprou o filho por anos? É foda tio, não quero pensar no que aconteceu a ele, já sofro só de imaginar. Me machucou ele ter ido embora, quando ele me prometeu que não fugiria mais. Por que ele não conversou comigo? Eu entenderia que foi demais, aliás, eu sabia que ia dar merda, mas não imaginei que ele fosse embora. Agora eu estou aqui, triste e morrendo de saudades dele. Só queria saber se ele está bem. Ficamos em silêncio por vários minutos, ele me olhando com aquela sobrancelha arqueada, que eu odeio por que não sei fazer. — Minha vez de falar, ok? — Sim. — Depois de anos trabalhando em muitos casos feios, aprendi que certos tipos de acontecimentos marcam muito e às vezes são irreversíveis. Para uma mulher ser estuprada marca, destrói a autoestima, o medo permanece encruado sobre a pele. Agora para um homem é foda também, vou falar por mim, meu ponto de vista de quem está vendo de fora ok? Ser molestado quando se é criança causa um trauma grandioso, acaba com a infância, mexe com a adolescência, mas fode ainda mais quando ele se torna adulto. As vítimas de abusos, tanto homens quanto mulheres se sentem sujos, acham que a culpa é deles, que poderia ter feito algo para evitar. — E... — Deixa eu falar, Carinho. —Ele me corta e continua. — O estuprador coloca a culpa na roupa da mulher, um short curto, um top
decotado. Mas e uma criança? A fralda suja é uma desculpa? Ou andar sem blusa ou de cueca? O abusador crava a culpa no abusado. É difícil princesa, tudo o que podemos fazer é impulsionar para que essa pessoa siga em frente. Eu sei que o que você está sentindo é verdadeiro, posso ver nos seus olhos apaixonados quando fala dele. Mas não é desculpando seus erros, que você vai fazer com que ele perceba o que pode perder. — Mas não consigo, ele já sofreu tanto! Não quero ser mais um motivo de sofrimento. Tudo o que quero e me agarrar a ele e curar todas as duas feridas. —Principessa... Você também sofreu meu amor, se perdeu por um tempo, mas se reergueu e hoje é esse rompante de alegria. Não estou dizendo que você deva largar mão dele, se ele se abriu com você é por que confia e é isso que você tem que usar a seu favor. Homem é tudo igual, independente de trauma ou não. Você tem que se impor ou sairá machucada e então terei que matá-lo. — Não vai não. Eu nem sei se ele vai querer me ver. — Ele vai, pode escrever o que eu digo. Se ele não fizer isso, perderá a melhor coisa do mundo. A Vida! — Bobo! —Falo rindo depois de horas chorando. — Ainda não sei o nome do seu Rabugento. —Meu tio pergunta curioso. — Muito meu mesmo! Ele se chama Júlio. Júlio D'Ávila. —Respondo e ele engasga. — Caralho! Os Reed, porque não pensei nisso antes? Já estava desconfiado, mas só agora caiu a ficha. Tinha que ser logo nessa família de loucos para você se enfiar, Vida Martins? — Você conhece? — Longa história meu amor. Mas se o seu Rabugento for quem eu
estou pensando, se prepara que a luta é foda. O Júlio que conheci já era um espertinho e ciumento, imagina agora dez anos depois? Ele vai vir atrás, acredita em mim. Ficamos conversando por horas, só fomos dormir às quatro horas da manhã. Mais um dia sem pesadelo, mas não foi do jeito que eu queria. Me troco antes de deitar e visto o casaco dele que ainda tem seu cheiro. Meu padrinho me acordou às dez da manhã para correr e tomar café na rua. Encontramos a dona Mimi regando suas rosas e ela me joga uma piscada. Velha assanhada. Vamos dirigimos até o parque imenso que eu nunca vi antes, mas meu tio já conhecia. — E o tio Sony? Estou morrendo de saudades. — depois que paramos correndo. Eu estou jogada na grama com meio palmo de língua para fora e meu tio fica pulando em volta. — Ele estava infiltrado, mas sua missão deve acabar em duas semanas. Ele disse que está cansado, quer se aposentar e montar uma firma de segurança. Contei para ele que iria assumir uma das delegacias daqui e que você estava morando aqui também. Se prepara, pois ele vai arrancar seu couro. — Não estou com saudades mais. Espero que não seja aqui na cidade, que ele vai abrir essa firma. Não pode tio, não vou aguentar vocês dois no meu pé! Eu vou me foder grandão! Sony é irmão adotivo do meu padrinho e protetor ao ponto de sufocar a gente. Eu como era a única menina tomei no rabo, ele só faltou colocar um GPS em mim. — Olha que delícia, a família toda reunida! Imagina principessa, Sony, eu e o seu Rabugento juntos? — Alegria, alegria.
Ele ri da minha crise existencial, depois me joga pelos seus ombros e me leva para tomar café da manhã. Passamos no mercado e compramos algumas coisas que ele gosta de comer, tipo granola, gergelim e um monte de merda fitness. Comprou folhas para fazer suco detox para mim, frutas, legumes, e mais folhas. Eu dirijo até em casa quando estaciono, ele pega as sacolas e sai na frente e eu pulo em suas costas, como eu fazia quando era criança. — Carinho, você está magrinha, mas pesa que só a porra! — Nunca na vida! Sua obrigação e me carregar; ninguém mandou fazer uma sedentária correr por horas. — Foram trinta minutos e você parou pelo menos umas dez vezes. Já sabe o que seu pai faria, não é? — Deus! Ele me levaria para correr na praia, na areia fofa ainda por cima. Depois me trancaria na academia de casa e só Deus na causa. — É... Principessa, aquele ali sentado, me olhando como se fosse me matar é o seu Rabugento? —Meu tio pergunta sério. — O próprio! Deixa eu descer tio. — Não, e não me chama de tio na frente dele, vamos fazer uma pegadinha. —Ele diz diabólico. — Padrinho... — Não! Vamos testar, mais tarde tenho que sair e fazer uma visita a um amigo de longa data. Júlio está sentado no banco que fica grudado na parede da minha casa. Assim que me aproximo, ele sorri cínico, como se não acreditasse no que estava vendo. Nós nos aproximamos e ele se levanta; seus olhos grudados nas mãos do meu tio que estão segurando minhas coxas. — Que palhaçada é essa, Vida Martins? —Ele pergunta bravo, sem
desgrudar os olhos do meu tio. Meu padrinho me deixa descer das suas costas e se apresenta para o Rabugento. — Oi, prazer me chamo Salomão, amigo íntimo da Vida. —Meu padrinho me fode, se apresentando pelo sobrenome. — Íntimo? Íntimo vai ficar a minha mão na sua cara se você não tirar as mãos do que é meu! —Júlio diz sério. Dele? Engraçado, ele não pensou assim quando me deixou para trás. — Salomão, esse é meu amigo do trabalho, Júlio. Ele é arquiteto da construtora na qual trabalho. Júlio, esse é meu amigo Salomão. —Apresento os dois, mantendo a farsa do meu tio. — Aqui estão às chaves, preciso conversar com o Júlio. — Prazer em conhecê-lo, Júlio. —Meu tio diz debochado e espero ele entrar para fuzilar o Rabugento do caralho. — O que foi isso? —Pergunto brava. — O único que tem que ficar indignado aqui sou eu. Que porra você está fazendo? —Ele pergunta se aproximando de mim. — Onde está a minha marca? Ele pergunta, procurando pelo chupão que cobri com base. — Sério isso? Qual é o seu problema? —Pergunto exausta e olha que não tem cinco minutos que ele chegou. — Muito sério aquela marca diz que você é minha. Por que deixou outro homem te tocar? Por que esse filho da puta está lá dentro da sua casa? Que caralho! —Ele diz nervoso. Ele anda de um lado para o outro, só faltando arrancar os cabelos. Ele está muito puto da vida, de longe posso ver suas mãos tremendo. E aqui temos uma crise de ciúme em andamento. — Sua? Você não pensou assim quando me deixou sozinha em um
quarto de hotel, sem me falar nada. Acho que você tem uma concepção diferente de mim quando se trata de posse, Júlio. Eu cuido do que é meu, sinto medo de perder o que me pertence. Eu jamais iria embora e deixaria o que considero como meu para trás! — Eu errei, me perdoa, posso explicar só me escuta. —Ele diz nervoso. — Não Júlio, eu te ouvi da primeira vez e você me prometeu que não me deixaria sozinha novamente. Prometeu conversar comigo, desabafar. Me senti uma porcaria quando acordei e vi que tinha ido embora. Doeu, mesmo sabendo dos seus motivos. Eu entendi o seu motivo para ir embora Júlio, mas me magoou pela forma que você se foi. Pedi para conversar comigo quando quisesse um tempo, mas mesmo assim você me deixou para trás, sem se importar como eu voltaria para casa. — Só me escuta Colorida, por favor. — Dessa vez não quero escutar. Da primeira vez Júlio, abri mão do meu orgulho e te ouvi. Mas dessa vez não quero, não que seja definitiva essa decisão, mas o agora é que importa. — Não faz isso, Colorida. —Ele pede baixinho e mesmo que esteja doendo, decido manter a minha palavra. — Eu gosto de você, Júlio. Muito. Mas eu me amo mais e no momento estou me preservando. Eu entendo que você carrega muita coisa, mas estava aberta a abraçar você e ajudar a carregar algumas e sumir com outras; porém eu também tenho as minhas bagagens e abri mão delas por você. —Falo, sentindo um pedaço de mim se partir. Ele me puxa para os seus braços, embrenhando seus dedos em meus cabelos. Ele aproxima seu rosto do meu, deslizando a ponta do seu nariz pelo meu rosto. Sua boca a míseros centímetros da minha, sua respiração tocando minha pele.
— Eu sei que te magoei Colorida. Sei que fui egoísta e que só pensei em mim e na minha dor, mas eu juro que foi sem pensar. Não foi nada com o que aconteceu entre nós dois, amei cada segundo do que vivemos. Pela primeira vez na vida me senti uma pessoa normal, sentir seu copo no meu, você me apertando, ouvir seus gemidos, tudo isso foi a coisa mais importante que me aconteceu. —Ele diz baixinho, sua boca roçando a minha. — Só para, por favor. —Falo com a voz embargada. — Não posso, não quando você é a única capaz de fazer com que eu me sinta vivo. Não fugi de você, fugi por você e é isso que quero te explicar. Tudo o que nunca quis era te magoar, você me trouxe tanta coisa boa e não quero perder isso. Não quero perder você. — Eu não preciso que você fuja para me proteger, se eu me joguei nisso que estávamos tendo, era porque estava pronta para aguentar tudo. Sei que o que tínhamos não era um relacionamento, que ainda estava no início, nos conhecendo, mas eu queria você, Júlio. Você por inteiro e não apenas a metade. Eu, mesmo com medo me joguei nesse espiral de sentimentos, mesmo correndo o risco de sair machucada e olha! Isso aconteceu. Não posso me jogar de cabeça e perder, já perdi muito na vida e não sei se sou capaz disso. Acabo soltando tudo o que estava sentindo. Não é armação minha ou o plano maluco do meu tio, sou simplesmente eu. Não posso amar esse homem e acabar perdendo-o. Estar apaixonada e, sofrer depois não mata ninguém, não morri quando mais queria e não será por uma paixão que vou morrer. Como dizem amores vem e vão. Pena não acreditar nisso. Esse homem me fodeu! Ele me puxa contra o seu corpo e me beija apaixonadamente. É impossível resistir a esse homem, não quando tudo o que mais quero é grudar nele para sempre.
— Não fale no passado, Vida. Ouvi-la dizer era, estava, tínhamos tudo no passado machuca. Eu sei que errei feio, você tem todo o direito de me chutar para longe. Só te peço para não fazer isso. Por favor Vida, por favor. — Não sei... Estou confusa. Você me desestabiliza me confunde me consome. Preciso pensar ok? — Pensar? Tudo bem, isso eu posso aceitar. Eu quero você e vou fazer de tudo até conseguir. Quando estiver pronta, vou te contar o que aconteceu para me fazer ir embora. Não é uma desculpa só para ter você de volta, é só para entender o que me fez fugir. — Sem pressão, ok? — Isso eu não posso prometer. Eu nunca quis nada no mundo como quero você. Quero que você seja minha, só minha. Quero ser seu, quero ser a pessoa que vai te abraçar quando tiver pesadelos, quero estar lá quando se sentir sozinha. Eu, Vida e mais ninguém. Então, manda aquele idiota ir embora e não tocar nunca mais em você. — Júlio... — Não! Estou falando sério, você é a minha Colorida. Lembra da bandeira? Não gosto de ver ninguém com a mão no que me pertence, ele não vai gostar do que eu vou fazer. Por que ele está na sua casa? — Ele é.... ele é meu amigo, Júlio. Veio me visitar e vai ficar uns dias comigo. Para que eu fui falar isso? O homem endoidou, surtou de vez. — Não vai ficar porra nenhuma! Tem hotéis, pousadas, aqui ele não fica. Ele pode ser seu amigo, mas é homem. Se ele ficar na sua casa, você fica na minha. — Ei menina bonita, o lanche está pronto! —Meu padrinho grita da porta usando apenas uma bermuda.
— Ele está sem camisa! —Júlio pergunta. Aonde eu fui me meter!
Isso só pode ser sacanagem! O cara está na casa de uma mulher solteira, e praticamente nu. Sinto meu corpo vibrar de raiva, olho para a Colorida e ela está pálida e com os olhos arregalados. — Quão, íntimos vocês são? Porque para mim, isso é intimidade demais para o meu gosto. Ser amigo é uma coisa, andar pelado é outra completamente diferente. — Acho que pelado é um exagero, Salomão está apenas sem camisa, Júlio. Nós nos conhecemos desde que eu era criança, acho que isso diz que temos muita intimidade. —Ela diz nervosa. Olho para ela seriamente, tentando acalmar esse bicho possessivo e ciumento que se apossou de mim. Ela está nervosa, posso ver em seus gestos inquietos, a forma como suas pálpebras tremem, o modo que ela morde os lábios.
Quando ela falou sobre nós no passado, senti um medo inexplicável. Não quero perdê-la e abrir mão do que estou descobrindo e sentindo. Eu errei sim, jamais deveria ter ido embora daquela maneira. Deveria ter conversado com ela, contado o que realmente aconteceu, mas como contar algo tão podre para alguém como ela? Meu pai me fez enxergar que se eu continuar fugindo, perderei uma coisa muito importante. Ela. — Vamos para a minha casa? Lá podemos conversar, não precisa rolar nada, vou respeitar o seu tempo como me pediu. Mas não me peça para ir embora e te deixar aqui com esse idiota! — Não posso ir para a sua casa, Júlio. Ele veio de longe para me visitar, não posso sair e deixá-lo aqui só por que está com ciúmes! Essa garota quer me matar, não é possível. Como eu vou dormir sabendo que ela está no mesmo lugar que o idiota peladão? — Seu padrinho não era para ter chegado? — Meu padrinho? É... Não... Ele não pode vir! É isso. Ele ligou e disse que só virá semana que vem. —Ela gagueja várias vezes antes de responder. — Por que você está nervosa? Tem alguma coisa acontecendo? Você tem alguma coisa com esse idiota? Ele... Ele é o seu ex? — O que? Não! Que droga de vida da porra. —Ela diz nervosa e começa a andar de um lado para o outro. — Júlio ele... — Vida! O lanche está esfriando, linda. —Salomão diz. Esse cara deve estar querendo morrer, só isso explica essa merda. Viro e caminho em sua direção, mas sou parado pela Colorida que se coloca na minha frente. — Não senhor! Pode parando com essa merda agora, Júlio D'Ávila! — Então vamos para a minha casa. Não vou sair e deixar você aqui com ele.
— Não vou, já disse droga! Vai para casa, Júlio. Amanhã nós conversamos ok? Olho sério para ela, minha vontade é de jogá-la nos meus ombros e levá-la para bem longe desse homem. Não sei o que essa mulher tem, mas ela me transforma em um homem totalmente primitivo e isso está me enlouquecendo. Respiro fundo, várias vezes, tentando me acalmar antes que eu faça uma merda maior. — Você não vai vir comigo, é isso? Vai ficar na sua casa com esse homem praticamente pelado? — Não vou com você e não é por causa dele e sabe muito bem disso. Preciso pensar você diz que me quer, mas me afasta na primeira oportunidade. Você está aqui exigindo que eu vá com você, entretanto, e se você tiver uma crise e me largar lá sozinha? Você precisa pensar em você, Júlio, cuidar de você ou não estará apenas se machucando, como machucando todos, a sua volta. Inclusive a mim e eu não quero isso. —Ela diz toda cabisbaixa. Puxo-a para os meus braços e faço com que ela me olhe nos olhos. — Você sempre foi sincera comigo, Vida. E quero que seja agora, ok? — Ok. — Você não me quer mais? Não vai me dar mais uma chance? — Como posso não te querer, Júlio? Eu o quis no instante que coloquei os olhos em você. Nenhum homem me chamou tanto a atenção, quanto você. Nenhum homem despertou em mim, o que você me desperta. Assim como você, eu nunca quis tanto que alguém me pertencesse, como quero que você me pertença, mas isso não depende só de mim, Júlio. Você precisa pertencer a si mesmo, para depois pertencer a alguém. — Eu vou procurar ajuda, não só por que meu pai me pediu, mas por você. Por nós. Eu quero tanto você, Colorida. Quero e vou atrás de ajuda,
porém preciso de você comigo. — Eu sempre vou estar com você. Você sabe onde moro, sabe o meu número e trabalhamos juntos. É impossível fugir de você, senhor D'Ávila. — Ela diz sorrindo. — Eu sei, mas quero mais. Quero que você seja minha. Sei que está magoada e me arrependo muito, mas não te deixarei em paz, Vida Martins. Eu vou embora, mas voltarei. Você é minha e eu cuido do que é meu. Ela sorri lindamente e puxa meu rosto e me beija. Aquele medo que estava correndo em minhas veias deu uma diminuída e eu a abraço ainda mais apertado. Ela é a primeira a se afastar e me olha seriamente. — Não sou uma pessoa fácil, você pisou na bola e tem que arcar com as consequências. Você me quer? — Muito. — Então terá que lutar por mim. Quero ser conquistada, quero ser cuidada, gosto de carinho, de atenção, quero saber que você estará comigo. Como diz a Anastácia Steel do filme Cinquenta Tons de Cinza, quero coração e flores. Você pode me dar isso? Sorrio para ela, mas não um sorriso qualquer. Sorrio amplamente, já bolando um plano na minha cabeça. Não sou romântico, nunca precisei ser na verdade, contudo conheço não um, mas quatro homens incríveis que entendem de amor. Acho que é hora de um clube do bolinha. — Me aguarde Colorida, vou te surpreender. —Beijo sua boca rapidamente e vou para o meu carro. — Júlio, volta aqui! O que você vai fazer? Júlio! ——Ela me grita e minha resposta é uma gargalhada. Ela até tenta correr atrás de mim, mas me tranco no carro e sorrio do desespero dela. Dou um tchau e coloco o carro em movimento. Ligo para o meu pai e conecto ao viva voz do celular.
— Júlio? —Ele atende preocupado. — Está tudo bem pai, mas preciso de ajuda. O senhor pode pedir a ajuda dos fofoqueiros da família? Preciso de conselhos amorosos. —Meu pai gargalha alto quando peço. — Vem para casa garoto, seus tios estão em aqui. —Ele diz rindo. — Estou chegando, fala para a minha mãe que vou precisar dela também. — Ok garoto. Desligo e vou todo o caminho pensando no que tenho que fazer, mas antes passo na minha casa e faço uma mala. Se ela está pensando que a deixarei sozinha com o idiota, está muito enganada! Ela quer que eu lute por ela? Então começarei hoje, vou marcar meu território e se esse idiota acha que vai conseguir alguma coisa está muito enganado! Ela é minha, posso não ter o sangue dos Reed, mas aprendi muito com todos eles. Eu cuido do que é meu e, ela é minha e ela vai descobrir isso. Eu sou um D'Ávila Reed, isso quer dizer que o sentimento de posse vem em dobro.
Eu e minha boca grande! Jamais imaginaria que o Rabugento, estaria na minha porta me esperando. Juro que achei que ele iria sumir e que passaria dias sem vê-lo; porém ele me surpreendeu ao vir atrás de mim e isso mexeu muito comigo. Agora me diz, como que eu continuo meu plano de dar um gelo nele? Assim que ele me pediu perdão, minha vontade era pular em seus braços e nunca mais largar esse homem. Eu sei que ele me quer, pude ver em seu olhar o medo de me perder, mas tenho que pensar em mim também, eu já perdi
demais na vida e sei que se o perder vou me ferrar. Não é só ele quem precisa de mim, eu preciso dele também. Da sua intensidade, dos seus carinhos, da sua inocência. Quero poder curar cada ferida que ele carrega e quero muito que ele preencha o vazio que sinto dentro de mim. Vejo o carro se afastando até sumir da minha vista e só então me viro para dar de cara com o meu padrinho encostado no batente da porta, vestindo a porcaria de uma camiseta. — Que merda tio! Porque o senhor tinha que aparecer sem camisa? Tem noção do drama que foi segurar aquele homem? — Ele bem que mereceu quem mandou magoar o meu Carinho? Você viu o jeito que ele me olhou? Mi amore, você está tão lascada, ele é pior que o Sony. —Meu padrinho diz rindo. — Ele é lindo, não é? —Falo suspirando e me jogo no sofá. — Ele disse que fugiu por mim, que não foi nada do que fizemos juntos. — Já gosto dele, ele contou porque fugiu? —Meu tio pergunta. — Não quis ouvir, fiz errado, não é? Quis dar um gelo nele, mas nunca gostei de magoar ninguém, o senhor sabe disso. Doeu em dobro por vê-lo triste, ele já carrega tanta coisa, não quero ser mais um problema para ele. — Eu sei meu amor, mas isso é um jeito de fazer com que ele acorde para o mundo. Ele passou por muita coisa e graças a Deus, ele encontrou a família certa, mas mesmo lutando para ele melhorar, ainda sim o deixaram no mundinho seguro dele. O que esse garoto precisava era alguém que o tirasse do seu lugar seguro. — Você o conhece, não é? Eu vi no seu olhar o reconhecimento quando viu o Júlio. Mas ele não te reconheceu, por quê? — Ele é um nerd, muito inteligente para umas coisas e muito
desligado para outras. Eu ajudei o Gael há dez anos, não vou te contar no que foi isso ele vai te contar. Ele não me reconheceu, porque eu estava barbudo, com dreads no cabelo e alguns músculos a mais. Tinha acabado de sair de uma missão, lembra que sumi uns meses? — Lembro! O senhor chegou em casa parecendo o Bob Marley, com aqueles dreads. O Lelê até chorou assustado. —Falo rindo. — Sim, quando Gael me ligou não pensei em nada, só peguei umas roupas e vim para Campinas. Sony e Vivian também vieram depois. Estou muito diferente agora, nem pareço ter quarenta anos. —Ele diz rindo. —Você tem quarenta e três anos tio! Então é por isso que ele não lembra você está muito diferente hoje. Ele pediu para eu ir para casa dele, foi muito insistente. Principalmente depois do seu teatrinho! Meu padrinho é diabólico demais. — Eu duvido que ele não bata aqui a noite. Ele é igualzinho ao pai, Gael é um poço de ciúmes e o Júlio está indo para o mesmo caminho. — Ele não virá não, eu disse que quero ser conquistada. Quero coração e flores, igual à Anastácia do filme Cinquenta Tons. Quero ser cuidada e ter alguém que se preocupe comigo. — Essa Anastácia, é aquela do chicote? —Ele pergunta e eu confirmo. — Tanto filme, Vida! Tanto filme e, você foi se lembrar, logo o do chicote! Você é louca e se ele aparecer aqui com chicotes, plugs, algemas e o caralho a quatro? — Se acontecer isso, eu vou fazer bom uso. —Falo rindo. — Vida! — Estou brincando, credo. Ele não vai fazer isso, Júlio é inocente e nem deve saber que filme é esse. Meu tio é tão dramático, agora imagina ele e o tio Sony juntos? Esses
dois e meu pai eram conhecidos como "trio parada dura". Minha mãe sempre reclamava, mesmo o tio Sony sendo um pouco mais novo, ele era o pior o trio. Minha mãe sempre falou que não existia uma mulher, capaz de domar o tio Sony, mas penso ao contrário, ele será difícil, mas quando a mulher certa aparecer vai virar um cordeirinho. Agora senti saudades dele. — Quando o tio Sony chega? — Ele ficou de ligar amanhã, para me dar notícias. Vou dar uma olhada pela cidade atrás de prédios, para ele montar a empresa. Amanhã sairei cedo, tenho algumas coisas para resolver. Por falar nisso, aquela velha assanhada da dona Mimi, disse que tem uma casa aqui na vila, que vai entrar a venda. Ela ficou de me passar o número do dono. — Não a chame de velha, assanhada tudo bem, mas velha não! Mimi é um amor, tão prestativa. —Falo rindo. —Oh sim, muito prestativa. Ela me ofereceu ajuda para tomar banho! —Ele diz revoltado. Ele vai tomar banho e eu vou para o meu quarto. Separo um livro, deito na minha cama e fico confortável. L. A Cassey é maravilhosa, uma das minhas autoras favoritas. Conta a história dos irmãos Slater, cinco irmãos que são os mais gostosos e perigosos mocinhos que já li. Estava perdida na cena do livro onde, Dominic chama Bronagh de bunda gorda, quando meu celular apita dentro da mala. A curiosidade ganha a luta contra o gostoso Dominic, saio da cama e vou em busca do maldito celular. Mais de trinta ligações não atendidas do Júlio, três delas de minutos atrás e vinte e quatro do dia que ele me deixou no resort. As três outras são do Otávio, mas nem penso em retornar. Vou ver as mensagens e o grupo das meninas está pegando fogo, entro só para ver o teor da conversa. Yza está doida me marcando toda hora. Yza— Vida Martins, quem é o peladão na sua casa?
Lila— Peladão? Quero nudes! Katrisca— Deixa só o Tavinho ver essa pouca vergonha! Kkkk Yza— @Vida cadê você? Meu ursinho está aprontando, se prepara que esse é pior do que todos os homens da família juntos. Essas mulheres são doidas, Lila é foda. O Otávio deve passar cada uma nas mãos dessa mulher, mas bem que ele merece. Resolvo responder. — Oi meninas, desculpa o sumiço, mas não estava muito sociável e não mexo no celular há dias. Yza— Soube por alto e, tanto Gael quanto eu; achamos a atitude do meu filho horrível. Se, serve de consolo, você é a única mulher que mexeu com ele. Belle— Esse menino precisa sair desse mundinho seguro dele, a vida é cheia de possibilidades, tanto boas quanto más e ele tem que saber lidar com isso. Muito do que está acontecendo é culpa nossa, nunca discutimos o que realmente aconteceu, não queríamos fazê-lo lembrar do passado, achávamos que estávamos fazendo o melhor, mas está aí a resposta. @Vida não dá mole para ele não! No final da mensagem da Belle, estou rindo. — Eu fiquei muito magoada, não vou mentir. Ele me contou algumas coisas e outras eu deduzi, com o que ele foi soltando sem perceber. Eu o entendo meninas, mas eu abri mão dos meus medos para abraçar o dele e acabei me ferrando. Lila— Precisamos de uma noite de meninas, que tal amanhã? Nada muito exagerado, só um vinho e petiscos. Yza— Estou dentro, pode ser na minha casa, colocarei o Gael para fora. Belle— Também topo. Katrisca— Eu também, Dylan tem me consumido com a ideia de mais
um filho! Hanna— Não li tudo, mas apoio é só dizer a hora. Kkkk Essas mulheres são maravilhosas! — Por mim tudo bem; estou precisando conversar e rir um pouco. Combinamos de nos encontrar amanhã às seis horas da tarde, na casa da Yza. Me despeço das meninas e volto para o meu livro, já estava em mais da metade quando meu tio me chamou. — Carinho, pedi pizza e já deve estar chegando. —Ele diz da porta do meu quarto. — Ok! Levanto, vou ao banheiro e depois para a sala. Meu tio já tinha preparado a mesa, só faltava à pizza. Ele escolheu até um filme de ação para assistirmos juntos. Às nove horas em ponto a campainha toca e corro para atender. — Júlio? — O próprio. —Ele fala e entra em casa carregando uma mala. — O que você está fazendo aqui? Que mala é essa? Não pode ser o que estou pensando! — Conhece o ditado: se Maomé não vai À montanha, a montanha vem a Maomé? Você não quis ir para a minha casa, então eu vim para a sua. Sozinha com o idiota você não fica. Ouço uma gargalhada alta e olho para a cozinha e vejo meu tio rindo, segurando a barriga. IDIOTA! — Não vai não! —Falo brava. — Quem vai me impedir? O idiota ali? Com licença, vou colocar a minha mala no seu quarto. —Júlio diz sério e vai empurrando sua mala para o meu quarto. — Eu deveria ter apostado um dinheiro! —Meu tio diz rindo. —
Tenho que confessar que gosto desse menino. — Vai à merda tio! Não posso acreditar nisso, eu joguei pedra na cruz, sambei na tábua da santa ceia, bebi no cálice sagrado. Só isso justifica essa provação. Júlio e tio Roger na mesma casa? É de enfiar o dedo no cu e rasgar. Será que peço para as meninas uma bebida mais forte do que vinho? Sim, porque com certeza eu vou precisar.
Trinta e seis anos, quase trinta e sete, cinco filhos e prestes a me tornar sogra! Amo todos os meus filhos, cada um tem uma importância significativa na minha vida. Dizem que toda mãe, sempre tem um filho favorito, mas no meu caso tenho dois. Júlio e Maria, não que o meu amor por eles seja maior que pela Gaia, Alicia e meu toquinho Alexia, porém a ligação que eu tenho com eles é maior que tudo, a força do meu amor por eles ultrapassa qualquer coisa. Foi um amor instantâneo, nascido e enraizado no meu coração. Minha ursinha linda é tão carinhosa, meiga, amiga. Já o meu Ursinho, esse é meu pedregulho, amo esse garoto, mas me dá um trabalho da porra. Controlador ao máximo, minimalista, sempre de olho em tudo o que eu e as meninas fazemos. Júlio foi e é de extrema ajuda, na criação das meninas. Ele é um irmãozão urso, ama as meninas, paparica, é o maior puxa
saco delas, mas quando tem que brigar ele também briga para valer, como foi no caso da Gaia. Essa menina só pela misericórdia, meu clone em tudo, muito avançada para a idade dela e isso deixa meu Ursão maluco da vida toda. Ela sempre foi rebelde, mas nunca foi agressiva com ninguém, então quando o Júlio disse que ela tinha batido na Alicia, me pegou de surpresa. Conheço todos os meus filhos, sei a mania de cada um. Gaia e Alicia por serem gêmeas, sempre tiveram uma cumplicidade única, mesmo tendo personalidades diferentes. Gaia é extrovertida, já Alicia é tímida. Uma sempre acobertou a outra e para Gaia bater nela alguma coisa tinha. E hoje ficamos sabendo o motivo. Estou no carro, indo para a casa do amiguinho da minha filha. Vitinho é um menino lindo, branquinho, olhos claros, baixinho e muito magro. Ele tem dez anos, dois anos mais velho que a Gaia, mas são da mesma sala. Ele é meigo, educado, muito tímido, só a Gaia consegue arrancar gargalhadas dele. — Desde quando você sabe da história do seu amigo? —Pergunto curiosa. — Desde que o conheci, mamãe. Ele sempre foi muito triste, calado, com medo de tudo e de todos. Por isso quis ser amiga dele, todo mundo tem que ter um melhor amigo, não é? —Ela responde séria. — Isso mesmo. — Os pais dele que mandavam que ele não falasse muito ou todo mundo iria saber que ele era uma bichinha. Isso me dá tanta raiva mãe! Eles foram chamados na diretoria no mês passado, o Tinho entrou em uma briga, na realidade ele apanhou de uns meninos na educação física e o professor viu e não fez nada. Só se meteu por que eu escutei os gritos e corri quando Tinho gritou por mim. Lembra que eu fiquei suspensa por brigar? Foi por causa disso.
— Então por que você não me contou isso? Preferiu ficar de castigo a contar a verdade! — Mãe, eu sou encrenqueira, jura que a senhora iria acreditar em mim? Toda a semana chega bilhete de reclamação. — Você é foda, Gaia. —Falo revoltada e Otávio que está dirigindo cai na risada. — Mas eu sei que você não mente, esconde as coisas como agora, porém nunca mentiu. — No dia que machuquei a Lícia, eu estava de castigo e queria o tablet para fazer uma pesquisa sobre abandono de incapaz. O Tinho me ligou chorando, perguntando aonde ele iria morar já que todos os dias os pais falavam que iam colocá-lo na rua. Isso dá cadeia, não dá? — Cadeia brava princesinha. —Tavinho diz sério. — Eles não podem agir assim, só porque o filho é gay. Ele é um menino ainda, está formando o caráter, opções sexuais. Dizer que o filho é viado é um absurdo sem tamanho, ele está na fase de autoconhecimento, formando opiniões e gostos, e é normal se sentir confuso nessa idade. — Não tio, o Tinho é muito gay mesmo. Ele diz que meninas dão alergia, só a Lícia, a Olí e eu é que podemos abraçá-lo. —Ela diz rindo. — Ok; não sabemos o que vai acontecer agora. Não podemos chegar metendo banca e tirando o garoto de lá, temos que usar a cabeça. Esse povo não conhece quem é o seu pai, mas juro que vão conhecer! Meu marido mudou em muitos sentidos, como tamanho. Gael está um monstro de tão grande e musculoso que ele está. Temperamento não mudou muita coisa, mas ele está mais maleável e depois que as meninas nasceram virou uma manteiga derretida. O que não mudou foi sua sede de justiça, ele continua fazendo o seu trabalho defendendo crianças indefesas de pais filhos da puta. Não posso dizer que o Vitinho virá morar comigo, eu quero muito,
mas isso não depende de nós. Chegamos na casa do amiguinho da Gaia e eu peço para ela me esperar no carro. Otávio me acompanha até a porta e eu toco a companhia. Logo um garoto de uns dezessete, dezoito anos atende. — Pois não? — Oi, sua mãe e o seu pai estão em casa? —Pergunto enquanto ele me seca dos pés à cabeça. — Olhos aqui em cima; moleque! — Desculpe. —Ele diz envergonhado. — Eles estão sim, quer entrar? — Sim, obrigado. Ele nos leva até uma sala bem simples, nela tem dois sofás um pouco gastos, um quadro da Santa ceia que toma uma parede inteira e no canto um altar. Pelo visto eles são religiosos. — Olá, eu sou Emanuel e essa é minha esposa Lucrécia. A senhora queria falar conosco? Sente-se por gentileza. —O homem diz todo educado. Só de olhar, já descobri que ele é o tipo de homem que ama uma mulher submissa. Deu para notar pela postura da tal Lucrécia; um passo atrás dele, cabeça baixa e mãos cruzadas atrás do corpo. Eles são humildes, já deu para notar, mas o filho mais velho se veste muito bem, eles também, só o mais novo que usa roupas velhas. A escola das meninas é particular, e sei que o Vitor é bolsista porque ele mesmo falou. A madrinha trabalha na escola ou algo parecido. — Meu nome é Yza Reed e esse é meu cunhado, Otávio Valverde. Minhas filhas são da mesma classe que o seu filho mais novo... Nem termino de falar, por que o senhor Emanuel já levantou do sofá gritando pelo filho enquanto retirava um cinto de couro da calça. — João Vitor! Filhote do satanás vem aqui agora! —Ele grita coisas
odiosas que jamais deveriam ser dita para uma criança. — Senhor... — Calma senhora, eu não admito que um filho meu maltrate alguém, mas esse endemoniado saiu diferente de nós, essa peste bubônica! Infeliz das costas ocas. Ele diz e solta nomes horríveis, que juro que fiquei com medo. Não é um "filho da puta", são nomes de doenças, chamando pelo nome do tinhoso. É horrível. Vitor chega na sala completamente branco, posso ver seu corpo tremendo de medo. — O... o... Pois não senhor? —Ele diz com a voz trêmula. — Essa senhora veio aqui reclamar de você, seu infeliz. Bateu nas meninas, por que quer ser como elas, enviado do inimigo? Deus tenha misericórdia da sua alma suja. —Ele grita e levanta o cinto para bater no menino. — Chega! —Grito chamando a atenção de todos e seguro o cinto. — O senhor nem me ouviu e já saiu tirando conclusões precipitadas. Eu não vim reclamar dele e sim pedir um favor. Estou horrorizada com tudo o que aconteceu diante dos meus olhos. E o que mais me revolta, é a mãe não ter feito nada para impedir. — Favor? —Emanuel pergunta. — Sim. Nós vamos passar o feriado na fazenda dos meus pais e gostaria de poder levar o João Vitor. Ele é muito amigo das minhas filhas e sobrinhas, e elas perguntaram se nós poderíamos levá-lo. —Falo a primeira mentira que vem na minha cabeça. — Fazenda? Você é rica? —O menino mais velho pergunta; surpreso. — Não, eu trabalho muito garoto. Meus pais têm uma fazenda fora da cidade. —Respondo o infame garoto. — Não sabia que o João tinha amigos na escola, ela está dizendo a
verdade João? —Emanuel pergunta e eu tenho que segurar meu gênio para não responde e falar uns desaforos. — Sim senhor, eu sou da mesma sala da Gaia e da Alicia. —Interessante... Mas ele não pode ir, sabe como é, somos simples, não temos luxo. João não tem roupa para essas coisas. Passamos por muitas necessidades. —Ele diz fazendo cara de pobre coitado. Filho da puta fingido, passando necessidade e usando ouro? Eu reconheço uma joia e sei do que estou falando. Sapato Italiano, roupa de grife, tanto ele quando a esposa e o filho mais velho. —Somos simples também, não gostamos de extravagância. Ele pode ir com a roupa do corpo mesmo, lá tem muitas roupas dos meus sobrinhos. Só preciso de um documento, caso aconteça algum acidente. — Deus não seria tão misericordioso assim! —Ele diz baixinho. Eu fecho minhas mãos e dou um passo em sua direção, mas Otávio me para. Vitinho está olhando para o chão, completamente envergonhado. — Por favor, prometemos cuidar do seu filho. Lá terá minhas sobrinhas, filhas, sobrinhos e todos os nossos parentes. —Otávio diz sério. —Tudo bem, Lucrécia, pegue a certidão desse pequeno infeliz. — Emanuel diz e a esposa sai da sala. — Não vai agradecer à senhora Reed? Mostre que tem educação pelo menos. — Obrigado senhora Reed. —Vitinho diz baixinho. — Aqui está senhora. —Lucrécia me entrega uma certidão rasgada. — Obrigado senhor Emanuel. Prometo que o trarei de volta. —Não tenha pressa. —Ele diz com um sorriso maldoso. Ele vai ter o que é dele, isso eu faço questão. Vitinho sai comigo, com a roupa do corpo e descalço. Assim que ele avista a Gaia no carro, seu sorriso aparece e eu caio de amores por ele. Os
monstros dos pais dele nos olham pela janela, aposto que eles estão indo investigar para tentar descobrir quem eu sou. Otávio abre a porta para o Vitinho entrar e ele abraça minha filha, começando a chorar. — Acabou Tinho, nada mais vai te machucar. Minha mãe e meu Ursão vão cuidar de tudo agora. Quer ser meu irmão? —Gaia pergunta chorando. Minha filha... Doida, mas de coração tão puro. — Tavinho, pode me levar no shopping? Prometo que será rápido preciso pegar umas coisas para o Vitinho. — Nem precisa pedir, faço questão de pagar por tudo. Não esquenta a cabeça menino, agora nada mais vai te machucar. —Otávio diz sorrindo levemente. Aposto que ele está se lembrando de quando encontrou o meu ursinho. Otávio é um segundo pai para o Júlio. — Antes de vocês chegarem, minha mãe estava arrumando minha mochila. Eles iriam me colocar na rua hoje, meu irmão me disse que eles vão embora para Minas. Eles iriam me deixar na rua e sumir no mundo, as coisas deles já estavam quase todas arrumadas, meu pai roubou o dinheiro da igreja e está fugindo. Eu escutei a conversa dele com a minha mãe. —Vitinho diz baixinho. — Que eles vão para o inferno! Agora você me tem e toda a minha família, nós cuidamos um do outro. Esse é o lema da nossa família, agora é o seu lema também. Eu cuido de você e você cuida de mim Tinho. —Gaia diz decidida. Depois de pegar seu número de roupa, isso graças a minha filha. Corro até a primeira loja que encontro e compro um pouco de tudo, bermudas, regatas, camisetas, cuecas, pijamas, um tênis e um chinelo. Depois, com mais calma eu o trago para escolher tudo o que vai precisar.
Passo na farmácia e compro produtos de higiene também. Vitor se emociona quando vê tudo o que comprei e me agradece a cada peça de roupa que a Gaia tira das sacolas. Chegamos em casa e minha filha o puxa para o quarto dela, gritando pela Alicia. Otávio me acompanha até a cozinha e pega duas cervejas na geladeira e joga uma para mim. — Não teve como não me lembrar do Júlio quando era mais novo. As roupas rasgadas, maior que ele, o semblante triste, tudo me lembrou dele. — Otávio diz triste. — Graças a Deus, o menino não passou pelas mesmas coisas que o Júlio. Tudo isso ficou para trás, no momento em que ele saiu daquela casa. — Agora o nosso menino está enfrentando um duelo com ele mesmo. Eu sabia que essa garota era perfeita para ele. Vi mais vida nele em semanas do que em dez anos, Yza. As dúvidas e curiosidades dele são tão genuínas, que quem não conhece pensa que é um absurdo. —Ele diz matando a latinha de cerveja e indo buscar outra. — Sabe Tavinho, tenho me perguntado muito nesses dias, se todo o cuidado que tivemos foi o certo. Não o obrigamos a olhar para o mundo além da sua bolha. Não o obrigamos a lutar com os seus monstros. Estou me sentindo muito culpada, ele não está apenas sofrendo, mas fazendo aquela menina maravilhosa sofrer também. — Não se sinta culpada, Yza. Foi mais fácil lutar somente quando ele tinha as crises. Preferimos não causar mais dor da que ele já sentia, nós erramos querendo acertar. Mas ainda dá tempo, olha como ele evoluiu! Ele pode não saber, mas está se apaixonando pela Colorida dele. — Meu medo é que ele machuque essa menina. Não sei sobre o passado dela, mas sei que ela carrega alguma coisa pesada. — Ela perdeu os pais. —Gael diz entrando na cozinha.
Ele está abatido, com cara de quem chorou bastante. Nada mexe mais com o Gael, do que o nosso ursinho. Acho que por ser o único que sabe realmente tudo o que aconteceu com o Júlio, meu marido carrega um grande peso, só eu sei o quanto ele sofreu com esse segredo e nunca o dividiu com ninguém. —Puta que pariu, é muita coisa para uma menina tão nova. Ela tem o que? Vinte cinco, vinte seis anos, mais ou menos. —Otávio diz. — O pior não é só isso. Toda a sua família foi assassinada, mãe, pai, e dois irmãos. Ela estava na casa e por um acidente ou obra de Deus, ela foi poupada. —Gael diz triste. Jesus, amado, é barra pesada passar por tudo isso e não surtar. Se fosse eu no lugar dela, posso jurar que não estaria viva se tivesse perdido minha família. — Não tenho palavras. —Falo sentindo um aperto no peito. — Sim, também me senti assim. Ele veio comigo e subiu para o quarto dele, está perdido, cheguei lá o carro estava com as chaves no contato, mala no banco de trás. —Gael conta. — Mas o que aconteceu? —Otávio pergunta; preocupado. — Eles foram além... — Além do que? Eles brigaram? —Pergunto sem entender e só me dou conta quando o Gael levanta uma sobrancelha. — Jura? Caralho da vida toda! Puta que pariu. Sabe quanto tempo eu esperei por isso? Para ver o meu ursinho dando esse passo tão importante? Dez anos do caralho. — Sim e logo em seguida ele teve um pesadelo pesado. Acordou como em toda crise, se sentindo sujo, imperfeito, indigno. Ele a deixou no resort sem ter como voltar! — Gael diz bravo. — Você não brigou com ele, não é?
— Lógico que briguei Yza. Não vou passar a mão na cabeça dele, não quando ele está errado. Nunca fiz isso e não será agora que vou fazer. Ele diz que a quer que ela seja dele, a Colorida dele. Entende que essa menina também é fodida? A Vida abriu mão dos medos dela, Yza, para abraçar os do nosso filho e ele não pensou nisso. Ela não tem ninguém por ela, se sente sozinha, tem noção do que ela deve estar sentindo? E você não quer que eu brigue! Ele foi moleque e isso eu não aceito, ele pisou na bola duas vezes, a primeira quando a deixou aqui e fugiu e agora isso. —Ele diz bravo e eu encolho alguns centímetros. — Isso foi mesmo errado, Yza. Tenho que concordar com o Gael, ele só foi nessa viagem para se entender com ela. Ele ainda não se deu conta, mas está apaixonado por ela. —Otávio diz sério. — Eu sei, nunca interferi quando o Gael brigava com ele. Sei que ele errou, mas gente olha como o meu filho está se sentindo! Ele já carrega tanta coisa, está descobrindo tanta coisa é impossível não errar. Tudo é novo para ele; sensações, sentimentos, o corpo. Ele é um garoto no corpo de um homem. — Meu pai está certo, mãe. —Júlio diz entrando na cozinha e vindo me abraçar. — Não posso me esconder pelo que aconteceu no meu passado. Até quando vou deixar isso governar a minha vida? — Eu sei ursinho. —Falo alisando seu rosto perfeito. — Ela abriu mão dos problemas dela por mim. Eu não contei tudo o que aconteceu, nem sei se serei capaz, mas ela me quis mesmo assim. Eu insisti pelo que aconteceu entre nós, ela não queria porque sabia que não estava preparado. Não posso mais deixar o passado me atrapalhar mamãe. Se eu deixar, perderei a melhor coisa que aconteceu na vida. Ela mãe, depois de vocês, a Vida é a melhor coisa que aconteceu comigo. Não posso perdê-la,
entende? —Ele diz emocionado. — Não vai perder meu amor. Nós vamos ajudá-lo, você terá a sua vidinha. Sabe o que lembrei agora? Da Luna dizendo que você teria uma vidinha só sua, assim como ela tinha a dela que era o Dylan. Lembra? Olha como essa fadinha é especial! Ela disse tantas coisas no decorrer dos anos, principalmente quando ela entrou nas nossas vidas. Luna sempre falava do amigão fofoqueiro, dizia coisas que realmente aconteceram. Uma delas foi a minha Maria a tal prima grande que eu iria dar a ela. Outra foi quando ela teria um monte de primas princesas e olha agora. Maria, Gaia, Alicia, Alexia, Mini, Joy, Olívia, Louise. Isso porque fechamos a fábrica ou ela teria muito mais se dependesse desses homens fodedores. —Muito espertinha essa fadinha! —Júlio diz rindo. — Lembra quando ela disse que iria me fazer acreditar no Papai do Céu? E como ela me infernizou com isso? Quando ela dormia aqui ou a gente estava na fazenda, ela me obrigava toda a noite a rezar para o amigão dela. — Mas olha aí mais uma profecia do amigo fofoqueiro dela. Uma Vida apareceu para você! —Meu pai diz rindo. — Sim, só tenho que descobrir como ficar de bem com a Vida. — Júlio diz sério. — Agora começa a primeira aula dos homens dessa família! —Otávio diz rindo. — Primeira regra, aprender a rastejar por perdão. — E eu a irei ensinar a minha nora, como tirar proveito disso! —Falo rindo. — Mãe, de que lado você está? Tem que ficar do meu e convencer a maluca a me perdoar. Vou comprar um cachorro para ela! É isso. — E quem disse que se eu ficar do lado dela, eu não vou, ajudar
você? Meu amor, nada que vem fácil tem graça. Ele me olha feio e vai para o lado do pai que está rindo do que falei. O que? Ele tem que aprender as coisas, principalmente que nada vem fácil depois de fazer uma merda. Isso vai ensiná-lo a não pisar mais na bola... Vida, Vida, Vida, que seja do jeito que for. Já amo essa menina, só pelo bem que ela está fazendo ao meu Ursinho. Meu bebê transou!
Sério que ela não acreditou, quando disse que ela era minha e eu cuido do que é meu? Eu jamais a deixaria sozinha com aquele idiota descamisado. Lógico que estou aqui, indo contra a todos os conselhos que me foram dados. Minha própria mãe disse que iria ajudar a minha Colorida a me fazer rastejar por perdão, agora me diz; que mãe é essa? Só a minha mesmo, doida, descompensada e que quer me ver fodido! Coloco minha mala na cama e começo a tirar as roupas de dentro, arrumando espaço entre as coisas dela. Sou até abusado e coloco minhas cuecas na gaveta de calcinha dela! Sorrio olhando as nossas coisas misturadas. — Júlio... O que você está fazendo? —Ela entra no quarto e para quando me vê mexendo em suas coisas. — Estou desfazendo a minha mala, o que você achou que eu estava fazendo?
— Sei lá, de repente você é um stalker e está olhando as minhas calcinhas. Você bem tem uma fixação pelas minhas calcinhas de renda! — Porque eu ficaria stalkeando suas calcinhas, sendo que posso ver você usando? Aliás, isso é muito mais chamativo do que vê-las numa gaveta. — Júlio, você não pode ficar aqui! Muito menos dormir no meu quarto. Por favor, não torne isso mais difícil do que já é para mim! — Posso dormir no corredor, em frente à sua porta. —Falo sorrindo. Quero rir da cara que ela faz, mas luto bravamente para segurar ou ela é capaz de me matar. — Louco! Isso o que você é Júlio D'Ávila. Vou tomar um banho! — Ela diz indo para o banheiro e batendo a porta. — Inferno! Ela ficou brava! Saio do quarto cantarolando e vou enfrentar o nudista de quinta. Ele está sentado no sofá, com uma latinha de cerveja nas mãos e os pés apoiado na mesinha. Paro ao lado do sofá e presto atenção na fisionomia dele. Olhando o perfil dele, parece que o conheço de algum lugar. Sou bom em gravar a fisionomia das pessoas e se eu acho que o vi, então pode ter certeza que isso aconteceu. Não sei, talvez o formato do rosto ou a sobrancelha, talvez o desenho da boca. E descubro de onde, quando ele vira o rosto e sorri em minha direção. — Está ficando velho e enferrujado, Júlio. Demorou demais, já se lembrou? —Ele pergunta. Me sento ao seu lado rindo baixinho. Puta que pariu, depois de dez anos esse cara apareceu. — O que você está fazendo aqui, Roger? Como você conheceu a Vida? Meu pai sabe que você está na cidade? — Continua curioso! Vamos lá; vou assumir uns dos distritos da cidade, exatamente o que o Ruan trabalhava anos atrás. Vida é minha
afilhada, eu e seus pais éramos amigos. E ainda não tive o prazer de falar com o seu pai. Fiquei consolando a minha principessa, porque um babaca a magoou. —Roger diz sério. — Sabe que só agora me liguei que o nome que você se apresentou, era o seu sobrenome? —Falo rindo. — Eu sabia que você iria descobrir. Pena que foi agora, eu iria te atazanar por fazer minha menina chorar. — Fiz merda, mas não foi por maldade. Você sabe tudo o que passei ou tem noção do que aconteceu. Estou me adaptando a essa nova vida, Roger. Me adaptando a Vida, você sabe que ela não é fácil. Mas juro que nunca mais vou pisar na bola. — Eu te entendo, sei que não é fácil, porém pensa pelo lado dela, essa menina já sofreu demais e ainda sofre. Ela ficou sozinha, os parentes dela são uns lixos, só queriam saber do dinheiro. Ela teve que ficar escondida por meses, o medo de que alguém pudesse estar atrás dela era enorme. Eu fiquei sem ver a minha afilhada por meses Júlio, ela estava sofrendo, estava traumatizada e sozinha. Quando fui pedir abrigo para o tio dela, ele disse na minha cara que não iria ficar com uma pessoa jurada de morte. —Roger diz sério. — Ela me contou por alto. — Essa menina perdeu tudo o que tinha. Foi criada como a princesinha pelo Walter, nunca vi um homem comemorar tanto o nascimento de um filho como ele. Eles eram unidos, felizes e do dia para a noite ela se viu sozinha. Sozinha literalmente, porque eu não pude ficar ao seu lado, o Sony não pode ficar ao seu lado, todos nós estávamos atrás de quem matou os nossos amigos. Tinha que dar isso a minha menina. Estou te falando isso por entender tudo o que você sofreu Júlio, mas também sei pelo o que aquela menina passou. Se for para brincar, para fazê-la sofrer, é melhor você ir
embora agora. Eu a levo embora dessa cidade, começaremos uma vida longe daqui. —Ele diz sério. — Não! Ela fica aqui comigo. Eu entendo a sua preocupação com ela, mas eu cuidarei dela a partir de agora. Ela é minha e eu cuido do que é meu. Não fugi do resort por medo, foi para não a manchar com o meu passado, entretanto, não posso fugir para sempre, tenho que escolher entre os meus monstros e ela e a minha escolha é a Colorida. — Sou suspeito para falar, mas essa é a melhor escolha que você poderia fazer. Juntos vocês vão longe. — Viraram amigos agora!? —Vida entra e para na nossa frente com as mãos na cintura. — Estamos colocando a conversa em dia, afinal foram quase dez anos sem nos vermos. E a senhora está de castigo! Disse que seu padrinho não viria mais. Que feio Colorida, mentindo na cara dura. — O que meu padrinho tem a ver com isso? —Ela pergunta se fazendo de desentendida. — Amore mio, ele já me reconheceu. Sabia que era questão de tempo, Júlio tem uma memória fotográfica. Agora vou deixar o casal aí e vou esquentar as pizzas. —Roger diz e vai para a cozinha. Vida olha confusa em sua direção até vê-lo sumir, depois ela me olha e quando me levanto do sofá ela dá um passo para trás. — Aonde você vai Colorida? — Eu? É... eu... eu vou tomar banho! —Ela diz nervosa. — Você acabou de tomar banho, Vida. — Então... é.... vou cuidar... vou cuidar do meu cachorro! —Ela diz e tenta sair correndo, mas eu agarro sua cintura. — Então onde ele está que nunca vi? —Pergunto querendo rir. Até Alexia mente melhor que ela.
— Ele é tímido, não gosta de gente. Ele não gosta nem de mim, para falar a verdade. —Ela diz rapidamente. — Talvez ele goste de mim, aonde ele dorme? Deixa ver se consigo fazer amizade com ele. — Não! Aí que saco viu, eu devo ter roubado a manjedoura onde nasceu Jesus! Só isso justifica esse karma que estou carregando. Eu não resisto e caio na gargalhada. Ela é muito louca, é cada coisa que sai dessa cabecinha. Ela me olha e sorri lindamente para mim. — Esse riso é tão lindo..., mas não estou boa com você não, Júlio! — Por que não me chama mais de Rabugento, Colorida? Você falou que eu era o seu Rabugento, mas só me chama de Júlio. — Está sentindo falta do apelido, Júlio? —Ela pergunta e sorri diabolicamente. — Que pena, não é? Antes você odiava e agora está sentindo falta. Só te chamo pelo apelido novamente, quando você fizer por merecer. Agora vamos comer! Ela diz e sai andando na minha frente. Se ela já está escorregadia agora, imagina se ela se juntar com a minha mãe! Estarei muito fodido da vida toda. Mas eu sei o que vou fazer. Um filhotinho de cachorro, quem não gosta de filhotes?
Preciso beber! Nunca pensei que a vontade de beber voltaria novamente, só que por razões completamente diferentes. Antes eu bebia para aplacar a dor da solidão, agora eu quero beber ou matarei um.
Júlio se lembrou do meu tio, alguma coisa com a memória fotográfica do Rabugento. Agora são melhores amigos para sempre, deixa só o tio Sony chegar. Esse sim ficará do meu lado e contra esses dois idiotas, mas a amizade do Júlio vai até o meu tio deixar de usar camisa. A briga quase chegou às vias de fato, hoje cedo, quando fui avisar meu tio que estava indo trabalhar. — Tio eu estou indo trabalhar. Qualquer coisa; estou no celular, às chaves reservas estão pendurada na entrada. — Tudo bem principessa. Vou dar umas voltas hoje, que tal almoçar comigo? —Tio Roger responde. — Mas que merda Roger! Coloca a bosta de uma camisa. Qual a necessidade de andar pelado pela casa? —Júlio entra possesso no quarto. — Deixa de ser louco garoto! Estou no meu quarto e não andando pela casa. E ela é minha afilhada, jamais eu olharia com malícia para ela ou ela para mim. Eu vi essa menina nascer idiota! —Meu tio diz bravo. — Não interessa cacete! Não se anda sem camisa na casa da mulher dos outros. —Júlio diz serrando os punhos, como se fosse bater em alguém. — Minha afilhada é solteira até onde eu sei. Por um acaso você casou; Amore mio? —Meu tio diz debochado. — Quer saber! Cansei dessa merda. Adeus! Saio do quarto, pego minhas coisas e corro para o carro. Preciso arrumar um jeito de tirar o Júlio da minha casa ou uma merda vai acabar acontecendo. Meu tio é um amor, calmo até quando não roubam a sua paz. Ele e o tio Sony, são um poço de ciúmes, eles assustaram um namoradinho meu, trancaram ele no quarto e mostraram a coleção de armas que eles tinham. Conclusão? Nunca mais vi o garoto na vida! Ele pode conhecer o Júlio e sua família, pode até mesmo gostar muito deles, mas não mais do que gosta de mim.
Ele pode achar que o Júlio é o homem certo para mim, mas antes vai fazer o Júlio suar um pouquinho. Começando a agir com que mais irrita o Rabugento; andando sem camisa. Não que antes ele não fizesse, meu tio anda até de cueca em casa quando está de ressaca. Aí você me pergunta; Vida, você nunca quis tirar uma casquinha? E eu respondo; Você é louca? Eca que nojo! Meu tio é um gato, lindo e malha muito, mas o vejo como um pai mesmo. Vocês são safadas, credo! Satanás está esperando vocês suas impuras. Chego à construtora em tempo recorde, não parei em lugar nenhum, nem para comprar meus pãezinhos de canela que tanto amo. Conclusão? Mau humor na certa. Pior que não tenho nem uma balinha, um bombom na minha bolsa. — Bom dia, senhorita Vida Martins. —Otávio me cumprimenta. — Bom dia, senhor Valverde. Precisa de mim para algo importante? — Por enquanto não. Está tudo bem? —Ele pergunta interessado. — Se você puder arrancar seu sobrinho da minha casa, me ajudaria muito. Mas como você não vai fazer isso, vou para minha sala. Passar bem! —Uh, alguém está nervosinha. Só para avisar, sua sala ainda está interditada, então sua sala é a mesma que a do meu sobrinho. —Ele diz rindo e isso me enfurece! — Pelos cachos de Salomão! Isso virou um pesadelo, só pode. Eu devo ter dançado na boquinha da garrafa no Santo Sepulcro. Que inferno, Otávio! Tá construindo o que naquela sala? A tumba da Cleópatra? Quer saber? Caguei! Vou para a sala de reuniões e me trancarei lá. É o apocalipse, só pode! Isso é o diabo agindo, é um complô para derrubar a Casa Branca, no caso a casa branca é a minha paciência. Hoje não estou boa, estou com fome, irritada e sem um pingo de paciência. Não sei lidar com essa disputa de mijo, de quem é mais ciumento e possessivo.
Quanto será que está uma passagem para a Tailândia? Vou pesquisar essa bosta. Me tranco na sala de reuniões, fecho todas as persianas, ligo meu computador e começo a trabalhar. Não atendo ninguém que bate na porta, Júlio César D'Ávila, bateu, ameaçou derrubar a porta, mas depois desistiu. Yza me mandou uma mensagem dizendo o horário do encontro das meninas, e eu confirmo que estarei lá, mas só aceitei depois que ela me prometeu que o filho não apareceria. Não me julguem, estou louca pelo Rabugento, mas não posso cair nas garras dele tão cedo. Eu não tive pesadelos essa noite, mas só descobri isso depois que o vi saindo de fininho do meu quarto quando meu celular despertou. O agradeci, mentalmente, mas agradeci. Estou sendo turrona? Sim, mas é o meu psicológico e, meu coração que estão envolvidos. Então prefiro resguardar, evitar sofrimentos futuros. Só saio da sala de reuniões para almoçar sozinha, porque meu tio teve um compromisso, e fui visitar um cliente. Depois corri para casa, tomei um banho, coloquei uma roupa confortável e saio de casa antes da minha sombra chegar. Passo numa padaria e compro vários tira gostos para levar. Quando chego à casa da Yza, Gael é quem abre a porta para mim. — Olá fugitiva. —Ele me cumprimenta. — Se você me delatar para aquele infame, juro por Deus que furo os seus pneus e grafito seu carro! — Está me ameaçando, menina? —Ele diz segurando o riso. — Eu não ameaço você pode ser grande, mas não é dois não. Quer seu filho morto? Então conte que eu estou aqui! Porque é isso que vai acontecer se ele vier atrás de mim. Seu filho está me deixando louca! Eu estou muito estressada tipo, maníaca mesmo. Eu odeio ver as pessoas tristes, e toda vez que o Júlio me pede desculpas e me olha com
aqueles olhos de cachorrinho, me sinto a pior pessoa do mundo. — Imagino, ainda mais agora com o Roger na jogada, não é? Seu padrinho almoçou comigo hoje. Mundo pequeno. Ou será o destino? É uma coisa a se pensar. —Ele diz rindo. — Preciso de uma bebida urgente, você não tem noção do quanto eu preciso. Estou quase chorando, sou capaz de ajoelhar no chão e implorar por álcool. Estou aceitando até álcool de posto! — Vamos, vou pegar um vinho. A Yza está na cozinha preparando um lanche. —Ele diz me guiando até sua imensa cozinha. — Poderia ser algo mais forte? Eu trouxe umas coisas também, quer dizer, para o lanche. Gael tira o seu filho da minha casa? — Respira Vida, você vai acabar tendo um treco. Você se parece muito com a Luna, quando tinha quatro anos. Ela fazia uma mistura de assuntos, que ficávamos doidos. — Nora linda! —Yza me cumprimenta feliz. — Gael manda que ela pare com isso? Só até eu beber meia garrafa de pinga, whisky, pode até ser um velho barreiro. Qualquer coisa com o teor de álcool altíssimo! Ele olha assustado para minha cara e cai na risada. — Vem meu amor, come alguma coisa e depois você pode afogar suas mágoas. —Yza diz me abraçando. — Melhor sogra de todas, quer ser minha sogra? Eu espero você fazer um filho novo. Por que o mais velho eu vou matar se ele não sair da minha casa. Sentamos em uma mesa no quintal, vários pufes espalhados e muita comida mesmo. Frios, pãezinhos, patês, salgadinhos fritos e é neles que me agarro. Logo as outras meninas chegam e a farra começa. Uma menininha linda chega correndo e se pendura em uma cadeira ao meu lado.
— Oi, eu sou a Alexia e você? —Ela se apresenta fazendo caras e bocas. Ela é linda e a cara do pai, mas tem muitos traços da Yza também. — Oi Alexia, meu nome é Vida. Você é muito linda. — Eu sei, meu pai diz isso todos os dias. Ele é apaixonadinho por mim, sabia? Meu irmão também me ama muito, ele diz que sou a preferida dele. Mas não deixa a Maria saber, ok? Ela é muito possessiva com o Juju, mas ela me ama também. — Problema de autoestima você nunca terá! —Falo rindo. — Sabe... A Gaia falou que você é namorada do meu Juju, a Olí também disse. —Ela diz sabida. — Mas, só pode namorar o meu Juju, se levar eu e a Lou para dormir na sua casa. Impossível não rir do jeitinho autoritário que ela fala. Chantagista essa garotinha, tinha que ser filha da Yza mesmo. — Sério? — Muito sério da vida toda. Tem que ter chocolate, maquiagem e música. A minha Lou ama música, ela é minha melhor amiga sabia? Você tem que ser amiga dela ou ela morre de ciúmes. — E onde está a sua Lou? — Com o tio Tavinho, estamos de castigo. Não podemos brincar juntas por uma semana, acredita? Meu vovô disse que é abuso de poder, mas eu sou criança e não posso processar eles. —Ela diz séria. — O que vocês aprontaram? —Pergunto rindo. Ela é uma criança deliciosa, dá vontade de levá-la para a minha casa e nunca mais devolver. — Nada, eu tenho cara de quem apronta? Só queria fazer um desenho ué! E a minha Lou ajudou, o problema é que foi nos papéis do meu pai e na parede do meu quarto. Mas o quarto é meu, não é? Muito sem estrutura esse
papai. Não consigo responder, só sei rir. Acho que a bebida já está me afetando. Ela sai correndo e gritando para o pai, que eu a convidei para dormir na minha casa e que ele teria que tirar ela do castigo. — Alexia é terrível, não se deixe enganar por essa fala mansa e carinha de boneca. Quando ela se junta com a Lou, viram dois monstrinhos da tasmânia. —Lila diz sentando ao meu lado. — Então norinha, quem era o cara pelado na sua casa? —Yza pergunta me entregando uma taça de vinho. — Meu padrinho. Acho que você conhece ele. Roger Salomão, ele disse que ajudou o Gael há alguns anos atrás. — Não acredito! — E o destino ataca novamente. —Katrisca diz rindo. Essa já está bêbada, deitada de cabeça para baixo no enorme Puff. Hanna está se comportando hoje e por incrível que pareça Belle também. Essa só me olha, como se estivesse me analisando. — Ele era o melhor amigo dos meus pais, cresceram juntos e tudo. Tanto ele quanto o Sony. Ele vai assumir uma das delegacias da cidade e está se mudando, enquanto não encontra uma casa ele está ficando comigo. — E o Júlio não o reconheceu? —Belle pergunta curiosa. — De início não, meu tio disse que ele ainda estava com a aparência da sua última missão. Por isso o Júlio não reconheceu, mas ontem à noite o Rabugento lembrou. — Então não podemos usar ele como arma, para causar ciúmes no meu filho. —Yza diz pensativa. Ela é doida. — Não sei, ele quase bateu no meu tio porque ele estava sem camisa na minha frente.
— Podemos usar isso ao nosso favor, mas temos que arrumar outra pessoa para ajudar. —Lila diz pensativa. — Eu quero é que vocês tirem o Júlio da minha casa, isso sim. Não fiquem bolando planos maléficos, isso vai magoar o Rabugento e eu não quero isso. Só preciso ser forte para não cair nos braços dele. Não gosto de magoar ninguém, mesmo que essa pessoa tenha me magoado, como foi o caso do resort. — Por isso vamos te ajudar, eu não sei pelo o que você passou, mas sei o que meu filho sofreu. Mas está na hora dele deixar os monstros para trás, e eu quero ajudar. Ele gosta de você, Vida. Você é a sua Colorida, a que trouxe vida para o mundinho cinza dele. Ele pode não saber o quer, mas sabe o que não quer. —Yza diz séria. — E o que ele não quer? — Ele não quer te perder, menina boba. Pode ser difícil, mas prometo que meu filho vale a pena. — Eu sei que ele vale muito à pena, posso ver isso apenas olhando em seus olhos. Mas e se ele me magoar novamente? E se do nada ele me deixar, como fez das outras vezes? — Temos que trabalhar esse seu medo, Vida. Quer nos contar de onde ele vem? —Belle pergunta séria. Será que eu devo contar? E se depois elas não me quiserem perto do Rabugento, será que conseguirei me afastar? Se elas pensarem como a minha família pensou, que sou uma jurada de morte, o que isso vai me causar?
O que eu tenho a perder? As amizades mais loucas que já tive e um boy lindo, que quero só para mim. — Eu vou contar Belle, mesmo correndo o risco de ser vista como a peste negra. —Falo séria ou tento por causa da quantidade de bebida que tomei. — Minha família, mãe, pai, e meus dois irmãos foram assassinados há sete anos. Alguma coisa relacionada a um caso que minha mãe estava trabalhando. Sua secretária e um parceiro invadiram a minha casa, matando meu pai primeiro, depois minha mãe e meus dois irmãos que dormiam em seus quartos. Eu só não morri também, por azar ou obra do destino, ser desastrada me salvou. O silêncio que se seguiu foi apavorante, nenhuma delas me olhavam. Todas estavam olhando para o chão, para as mãos, mas nunca para mim. Parece que a minha intuição estava certa, levanto para ir buscar da minha bolsa e ir embora daqui, quando uma voz gélida me para no lugar. — Sente-se. —Belle diz sem me dirigir o olhar. — Termine de contar.
E seus parentes? Seus amigos? Eles te ajudaram? Sorrio tristemente dessa pergunta. Nessa hora, não apareceu ninguém, mas foi só receber a herança que choveu gente solicita, prestativa, querendo me ajudar a superar a dor. Conto como foi esperar por horas, até ter a coragem de ver o que tinha acontecido. Como foi ver meus pais mortos e que não tive coragem de ver os meus irmãos. Contei que tive que ficar escondida por meses, longe de tudo e de todos que eu conhecia. — Meu padrinho não podia ficar comigo, ele e o tio Sony, tinham que investigar e achar os assassinos. Eu tive que ficar escondida, porque sabia quem foi à pessoa que matou ou ajudou a matar minha família. Meu padrinho até conversou com alguns parentes, mas eles não queriam correr o risco com uma pessoa jurada de morte. —Continuo a falar e nenhuma delas diz uma palavra. — Mas isso mudou quando, eu herdei o seguro de vida dos meus pais, indenização do Estado, uma pensão boa. Não estou falando de mixaria, estou falando de milhões. Meus pais eram ricos e tudo ficou para mim, a única herdeira viva. Eles lutavam entre si, para ver quem ficaria responsável por mim. Até de incapaz eles me rotularam, disseram que estava muito abalada e, tentaram usar isso para conseguir colocar as mãos no dinheiro. — E você, como ficou no meio disso tudo? —Yza pergunta com a voz embargada. — Não lembro. Tudo o que sentia era uma dor imensa, um sentimento de solidão enorme que me engolia dia a dia. Meus tios acharam os assassinos, era uma quadrilha que minha mãe estava julgando alguns dos integrantes. Assim que tudo se resolveu eu pirei. Viajei para longe de onde eu morava, comecei a beber, usei drogas pesadas, me envolvi com gente errada, não me orgulho das coisas que fiz. Só estava tentando aplacar o que me machucava, o
que me tirava o sono e ainda tira. Todos os dias eu tenho pesadelos do dia em que eles foram mortos. Eu queria morrer, mas nada do que eu fazia ajudava a conseguir isso. — Como você conseguiu sair desse espiral de destruição? —Katrisca pergunta soluçando. — Meu irmãozinho. Ele conseguiu o que os meus tios lutaram por meses. Em um sonho, meu irmão dizia que aquilo não era para mim, que eu precisava reagir e acordar, que o que eu estava fazendo, estava fazendo todos sofrerem. No dia seguinte eu mudei de cidade, me internei em uma clínica e estou limpa desde então. Voltei para a faculdade, me formei, ajudei em ONGs, fiz doações, prometi a mim mesma que seria uma pessoa melhor. Que faria jus ao nome que meus pais me deram. — É daí que vem o seu medo de ser abandonada. Medo de ficar sozinha. —Belle diz séria. — Acho que sim. Já perdi demais, entende? Tenho os meus tios, mas não posso grudar neles, Roger e Sony dariam a vida por mim, mas eles têm a vida deles, o trabalho deles. Eu sou a carência em pessoa, justamente por não ter isso há sete anos. Amo atenção, amo carinho e vi no Júlio a mesma coisa, a mesma tristeza. Acho que foi isso que mais chamou a minha atenção, sua tristeza. Ele mexe comigo de um jeito impressionante, desde o primeiro dia que o vi. Abri mão dos meus medos, para cuidar dos dele e mesmo assim não fui o suficiente, ele ainda fugiu de mim. Yza vem sentar ao meu lado e me abraça forte. Só me dei conta que estava chorando, quando ela disse que eu poderia chorar à vontade. — Agora você não está mais sozinha, Vida. Você tem uma nova família, jamais iremos ocupar o lugar daquela que você perdeu, mas ajudaremos você a cada passo que der. Independentemente de você ficar com o meu neto ou não, você sempre terá nós. Eu falo por todas, nós somos a sua
família. —Belle diz emocionada. — Todas nós tivemos nossos momentos difíceis. Eu perdi meus pais e um acidente de carro, sofri em um relacionamento abusivo, minha filha sofreu por causa disso. Fui sequestrada, agredida, humilhada e foi essa família que me salvou e que me amou. — Katrisca diz chorando. — Bem vinda à nossa família! — Eu namorei o Donatello quando era mais nova, aos vinte e um anos. Trabalhava para ajudar a minha mãe que sofria uma doença degenerativa. Uma mulher apareceu e nós nos separamos e, somente voltamos a ficar juntos quatro anos depois. O Donatello cuidou da minha mãe durante todos esses anos separados, tive uma gravidez nas trompas que só foi descoberta tarde demais. Eu quase morri, a ex do Don me ameaçou, ameaçou os meus pais. Ela tentou me matar, mas não conseguiu, graças a essa família. Perdi a minha mãe há alguns anos e foi essa família que me ajudou. Ela não só me acolheu como acolheu os meus pais e fizeram dos últimos anos de vida da minha mãe, os melhores. —Hanna diz emocionada e vem me abraçar. — Bem vinda à nossa família meu amor. — Eu não tinha ninguém na vida, meu pai tinha sumido no mundo, minha mãe era um monstro, eu fugi de casa com dezessete anos. Conheci uma menina linda de olhos azuis e um coração tão lindo quanto o seu, Vida. Ela me deu a sua amizade, deu o meu pãozinho de mel e quando ela encontrou o amor, me trouxe para ser parte dessa família. Eles fizeram por mim o que ninguém tinha feito desde os meus cinco anos de idade. Eles me amaram, lutaram por mim, encontraram o meu pai e me ajudaram a acabar com a minha mãe. Se há uma coisa que essa família tem de sobra, é amor, carinho, palavras certas nas horas certas. Eles vão lutar as suas batalhas e de uma coisa eu te prometo, com eles você nunca mais será sozinha. —Lila diz séria e vem me abraçar também. —Bem vinda à família, Colorida do
Rabugento. — Eu sou uma mulher muito sortuda, Vida. Sou a caçula, cresci no meio de muito amor e ciúmes, também eu tenho um pai incrível e irmãos formidáveis. Amo todos eles com tudo o que tenho, mas a minha maior inspiração e orgulho se chama Belle Reed. Essa mulher não mede esforços para proteger os filhos, muito menos aqueles que ela considera como seus, como essas meninas que estão aqui. Eu sempre fui louca, sempre aprontei, mas aí conheci o meu Ursão, encontrei a minha Maria e tempos depois o meu Ursinho. Eles me transformaram em outra mulher, amadureci muito e aprendi muito também. Apareceu um psicopata no meu caminho, fui seguida, precisei de seguranças vinte e quatro hora, mas mesmo assim ele me achou. Apanhei muito, fiquei muito machucada, entretanto a minha família me salvou, junto com seus tios. Mas aquela mulher ali, ela que garantiu que eu dormisse em paz. Foi com ela que aprendi que família não é aquela na qual nascemos, e sim aquela que criamos. Eu sempre amei a minha família, mas hoje? Hoje eu me orgulho no que ela se transformou. —Yza diz e segura meu rosto, limpando a minhas lágrimas. —Bem vinda a essa família louca, mas que ama como ninguém. — Mãe, por que a minha Colorida está chorando? —Júlio entra no quintal e briga com a mãe. — Eu já ouvi algo parecido anos atrás, mas o nome era Baby e não colorida. —Belle diz rindo. — Posso furar os pneus do carro do seu marido? Trocar o shampoo por água oxigenada volume quarenta? Álcool no lugar da loção de barbear? —Falo baixinho para Yza que gargalha alto. — Pode, eu até te ajudo. Mas por que essa revolta toda com o Ursão? —Ela pergunta rindo. — Eu pedi para ele não contar para o Júlio, que eu estava aqui, mas
ele não ouviu. — Por que você está chorando, Colorida? Minha mãe brigou com você ou a minha avó? —Júlio pergunta me puxando dos braços da mãe, para os dele e me abraça apertado. — Me respeita garoto! Vou usar a fala da minha mãe de anos atrás, nessa mesma cena. Se chove é culpa da Yza, a Colorida chora é culpa da Yza, acabou o leite é culpa da Yza. Vai cagar no mato Júlio César. —Yza diz brava. — Estou chorando porque você está me deixando louca! Você fica tão lindo preocupado, mas não gosto desses olhar não. Eu estou bem, é só conversa de meninas, nada demais. — Vamos beber! —Belle diz animada. — Vaza Júlio D'Ávila! Aqui é só meninas. —Lila diz rindo. — Não vou não, se ela fica eu também fico! — Eu devo cobrado pedágio da via sacra, só isso justifica eu ter que aturar esse homem! Júlio César D'Ávila Reed, se você não sair daqui eu juro que vou te matar! — Vamos filho, deixa as mulheres se divertirem. Aprenda a segunda lição, as mulheres dessa família sempre têm razão. —Gael diz rindo e sai puxando o Rabugento. — Agora a coisa vai ficar boa! Vida, hoje você entrará para essa família com chave de ouro! —Belle diz animada. —Yza, vai buscar a nossa queridinha. Arriba! Sorrio amplamente, no final tudo deu certo e ganhei não só amigas, como uma família louca e divertida. Já posso dizer que estou apaixonada?
Meu dia foi um inferno, começando que tive que dormir no sofá, mas coloquei meu celular para despertar às três da manhã e fui deitar com ela, só levantei quando o aparelho dela despertou. Então voltei para o sofá e esperei ela levantar para tomar banho. Ela não teve pesadelos, graças a Deus, nem eu tive. Aliás, o último pesadelo que tive foi no resort e depois não sonhei mais com o meu passado. Preparei um café e enquanto ela estava se arrumando, tomei uma xícara. Roger entrou na cozinha logo que o café ficou pronto, nem bom dia deu e foi se servir de uma xícara também. Ele só me cumprimentou depois do segundo gole de café. — Bom dia Júlio. — Bom dia Roger, será que você não tem uma camisa, não? Posso te emprestar um se quiser, — Não acha que é muito cedo para crises de ciúmes? Qual é? Não ofereço riscos para você. A garota é minha afilhada, eu a vi nascer, troquei suas fraldas, eu a levei para tomar o seu primeiro sorvete. A levei para conhecer a Disneylândia, eu comprei seu primeiro absorvente. Ela é uma filha para mim, então vai atazanar outro caralho! — Ok, mas isso não te impede de usar uma camiseta, não é mesmo? Você ia gostar de ver o seu irmão, andando sem camisa na frente da sua garota? —Pergunto e ele se cala. —Então se coloca no meu lugar e vai vestir a porra de uma camisa! — Você é pior que o seu pai! Ok, você fez um ponto. Eu vou para o meu quarto. Tenha um bom dia idiota. —Ele diz e sai da cozinha. Bem, parece que ele entendeu o meu ponto de vista. Eu preciso fazer
com que ela aceite ficar na minha casa, pelo bem da minha saúde mental. Agora como eu farei isso? Me sirvo de mais uma xícara de café e fico imaginando ela tomando banho. Eu me lembro de cada detalhe do seu corpo, quando tomamos banho juntos, ainda consigo escutar seus gemidos em meu ouvido. Daria tudo para estar no banho com ela, sentir seu corpo molhado escorregando pelo meu. Eu sei que não estou pronto ainda, mas meu corpo está, tenho provas concretas disso nesse momento, mas minha cabeça ainda não. — Bom dia, no que estava pensando? Tinha um olhar engraçado em seu rosto. —Vida pergunta entrando na cozinha. — Bom dia Colorida. Estava pensando em você tomando banho, em como eu queria estar lá com você. —Falo sinceramente. — Menos Júlio, bem menos sinceridade cacete! São sete horas da manhã, não preciso voltar para tomar outro banho! Agora vai logo se arrumar ou chegará atrasado. —Ela diz brava. — Tomar outro banho.... Ah agora eu já sei, meu pai me explicou. É igual ao problema da calcinha, não é? —Pergunto só de sacanagem mesmo. — Banho agora! —Ela grita brava. — Podemos namorar só um pipinho? Uns beijinhos apenas; não está com saudades? Eu estou. — Um, dois, três, quatro, cinco, seis... —Antes de ela terminar de contar, saio correndo para o quarto dela. Tomo um banho rápido, me visto, pego minhas coisas e saio em busca dela só para encontrá-la no quarto do filho da puta sem camisa! Foi uma grande confusão, ela saiu feito uma louca e me deixou para trás. Eu tentei correr atrás dela, mas quando cheguei à porta ela já estava saindo com o carro. —Porra!
— Cara, para com esse ciúme idiota ou vai acabar perdendo-a. Ser possessivo tem as suas vantagens, pergunta para o seu pai. Mas ciúmes se não souber dosar, estraga a relação e vocês ainda estão começando. Não estrague isso, eu não ofereço riscos para você. Pense em mim como o pai dela, assim vai conseguir parar com essa porra! —Roger diz bravo e entra no quarto batendo a porta. Como se fosse fácil fazer essa merda! Já tenho tanto na minha cabeça para aprender. Porra! Vou para o trabalho, só para descobrir que ela está trancada na sala de reuniões e o chilique que ela deu com o Otávio, quando ela chegou à construtora. Tive que visitar duas obras e acabei não a vendo mais, quando retornei, ela já tinha ido embora. Então lá fui eu, correndo atrás da desmiolada, só para descobrir que ela não estava em casa. Roger foi quem atendeu a porta e me contou que ela tinha saído antes dele chegar. Tomei um banho, preparei um lanche e fiquei conversando com ele por um bom tempo, até meu pai me ligar e dizer que a fugitiva estava na casa dele. Agora estou aqui, olhando pela janela da cozinha e vendo as maluquices que ela e as meninas estão fazendo. — Por que ela estava chorando? —Pergunto para mim mesmo, mas meu pai me responde. — Ela não era a única, filho, as outras também estavam chorando. — Mas por quê? Doeu vê-la chorando, não sei explicar o porquê isso está me perturbando tanto. — Talvez ela tenha contado sobre a família dela, ou desabafando tudo o que aconteceu entre vocês na viajem. São inúmeras possibilidades filho. Almocei com o Roger hoje.
— Esse idiota! Vou acabar dando uns bons murros na cara de pau dele. — Ele se divertiu contando da cena de ciúmes que você protagonizou. Nem quando ele disse que era padrinho dela, você sossegou, ainda assim continuou implicando com ele. — Pai, o senhor também não ia gostar disso. Qual a necessidade dele, de ficar andando pelado pela casa dela? — Júlio, ele é padrinho dela pelo amor de Deus! —Meu diz bravo. — Ele me contou uma coisa interessante. — O que? — A mãe da Vida, era a Juíza que condenou a mãe da Lila, anos atrás. — Sério? — Sim e tem mais. —Ele diz sério. — A quadrilha que matou a mãe da sua Colorida, faz parte ou é sócia da quadrilha que a mãe da Lila financiava na época. Saber disso foi como receber um soco no estômago. Será que isso é possível? E se a mãe da Lila tiver alguma coisa a ver com a morte dos pais dela? Será que a minha Colorida, ainda vai querer alguma coisa comigo? Vai querer trabalhar na Valverde? — Pai... Não... — Respira filhão! —Meu pai diz e segura meus ombros, fazendo com que eu olhe para ele. — Eu perguntei para o Roger se existia a possibilidade de uma ligação entre a Agnes e a Mãe da Vida. Ele me disse que não, então não fique pensando merda. Ele ficou de conversar com a Vida e explicar. — Mas e se... — Não existe um "mas" nessa história, está me ouvindo? Foi uma infeliz coincidência, só isso. Roger e Sony, só descobriram isso porque
cavaram fundo ou nunca ligariam um nome ao outro. A quadrilha que matou a mãe dela era parceira em alguns negócios da quadrilha que foi ligada a Agnes, só isso. O caso que a Tayene, mãe da Vida, estava trabalhando era sobre tráfico humano, contrabando de armas e tráfico de drogas. Tinha muita gente importante envolvida, ela já vinha recebendo ameaças para largar o caso e deu o azar da secretaria está envolvida intimamente com algumas pessoas da quadrilha. — Tem certeza, pai? Não posso perder ela, entende? Ela é a cor do meu mundo todo e se ela não entender? — Ela vai, ela não largaria o Rabugento dela para trás. Roger vai conversar com ela, só para desencargo de consciência. Ela sabe tudo o que houve com os pais; Roger e Sony fizeram questão de contar cada passo que foi dado na investigação. Então fica tranquilo, ok? — Vou tentar. — Isso é melhor do que nada. —Ele diz rindo. —Juju! —Alexia entra correndo na cozinha e estende os braços para mim. — Você é tão esquisito, sabia? Eu sou sua irmã bebê, sua preferida, e nem foi me dar um beijinho. Papai, pode ponhar o seu filho de castigo. — Sim senhorita, ele está muito obtuso. — O que é obtuso? —Ela pergunta e eu sorrio, lembrando de quando eu expliquei para a Luna. — Obtuso quer dizer, uma pessoa sem noção. A Luna quando era pequena, chamava todos nós de obtuso da vida toda. Por que éramos ciumentos demais. — Era não, ainda é! Nem tenho estrutura com esse papai não viu, toda hora fica chorando que ninguém ama ele, só porque eu vou na casa do tio Tavinho. Muito ciumento esse papai, Juju. — Possessivo da vida toda! —Falo rindo.
—Agora me diz o que tem feito ultimamente? — Ficando de castigo ué! Mas sabia que vou dormir na casa da sua namorada? Ela me convidou, eu e a minha Lou. Vai ter chocolate, maquiagem e música, porque a minha Lou ama dançar. Vai ser uma festa do pijama quer ir? Posso pedir para ela te convidar, você quer? — Minha namorada? Gostei disso, mas não diz nada não, ok? Quando chegar o dia da festa, você me avisa e eu apareço de surpresa e ainda vou levar uma coisa bem gostosa. — Isca de peixe com ketchup? Pizza de franguinho? Batata frita? Alexia ama comer porcarias, a única coisa quase saudável são as iscas de peixe. Ela ama peixe, por ela comeria todos os dias. — Posso levar tudo isso. Será nosso segredo, não pode contar para ninguém. — Nem para a minha Lou? — Para Lou, pode. Mas só para ela, ok? —Muito ok da vida toda! Juju, o que sua namorada está fazendo? — Alexia pergunta olhando pela janela. A louca da minha Colorida está em pé no trampolim da piscina, com um copo de cachaça nas mãos, fazendo passinhos da música que está tocando. —Puta que pariu! Pai desliga a merda da música e vai acabar com essa festa do caralho. —Juju! —Alexia grita e me olha feio. — Você me deve tudo isso de notinha amarelinha. Ela diz me mostrando cinco dedos. — Cem reais! Desde quando você virou mercenária? — A Luna falou que a minha latinha de palavrão estava muito vazia, então ela me mostrou a notinha que eu tenho que pedir. —Ela explica e
quando começo a dizer não com a cabeça ela solta. — Você quer que eu guarde segredo da sua namorada? Filha da mãe chantagista! Acabei de achar uma ajudante. Alexis será a minha arma secreta, junto com o filhotinho. Mas a ajudante cara da porra!
Não sei quem é mais louca, Vida por estar para lá de bêbada e querendo pular na piscina ou minha mãe que está apoiando suas palhaçadas. — Vamos lá novinha, mergulha igual a uma sereia. —Minha mãe incentiva aplaudindo. Meu pai corre para o som e o desliga fazendo com que todas reclamem. Minha avó e a tia Baby se jogam na piscina, Lila só observa. — Desce daí Vida Martins! — Você não manda em mim, Rabugento! Acho que quero ir para uma balada e escorregar no pau. —Ela diz completamente bêbada e o grito foi unânime. — O que? —Minha mãe e as outras meninas, até mesmo meu pai, gritam. — No pau do pole dance, credo suas mentes pervertidas. —Ela diz rindo. Eu subo as escadinhas sem tirar os olhos dela, mas ela é tão
desastrada que acaba se desequilibrando e cai com tudo na água de copo nas mãos. Preciso falar para o meu pai, proibir a entrada de bebidas em casa. — Você está bem, Vida? —Meu pai pergunta preocupado. — Não, entrou água no meu copo! Que desperdício de Gim. Você poderia me fazer outra bebida dessas, James? —Ela pergunta rindo. — James? —Meu pai pergunta segurando o riso. — Sim! Todo mordomo chique nos filmes se chamam James, porém você seria mandado embora, James tatuado. —Ah é? E por que eu seria despedido? —Porque está pegando a patroa! —Ela responde e cai na gargalhada. — Tira ela da piscina, Júlio. Leva-a para tomar um banho e a coloque na cama. Ela já bebeu bastante, já desabafou e colocou para fora muita coisa. Eu vou falar para o Otávio, que ela não vai trabalhar amanhã, então cuide da sua menina. —Lila diz sorrindo. — Você não bebeu não, né? Você sabe que bebidas alcoólicas prejudicam... — Eu não bebi seu controlador de uma figa! —Ela diz rindo. — Vida; vamos tirar essas roupas molhadas, tomar um banho quente e dormir. — Você quer me ver pelada, não é? Tão safado esse Rabugento. Mas não! Tomarei banho, sozinha e na minha casa e você vai ficar na sua ou na casa do James. — Vida! Sai dessa piscina agora. — Credo, ninguém tem paciência comigo. —Ela lá diz fazendo um bico engraçado. Eu a ajudo a sair da piscina, pego um roupão que meu pai me entregou e a enrolo. — Vamos, vou cuidar de você.
— Promete? — Sim, coisinha chata. Meu pai ri e vai ajudar a minha avó e a tia Baby a sair da piscina. Eu subo com ela para o meu quarto e a levo direto para o banheiro. Acho que a água gelada cortou um pouco o efeito da bebida e ela pede para tomar banho, sozinha. Pego uma cueca samba canção e uma camiseta e deixo na bancada do banheiro. Assim que percebo que ela está bem, desço para ajudar meu pai com a bagunça. É incrível a quantidade de garrafas que elas secaram somente as que eu contei foram cinco garrafas de vinho, uma de tequila e quatro de rum. Agora não me pergunte o que elas fizeram com o rum. Lavo os copos de liquidificador, taças de vinhos, copos de drinks. Minha mãe também ajuda a arrumar tudo e os meninos começam a chegar para pegar suas mulheres. Tia Baby faz uma confusão, levando todos a gargalhar da cena. Hanna é mais tranquila ao ir embora, ela me abraça e diz que amou a minha Colorida. Otávio está sério, mal fala e Lila olha preocupada, mas não diz nada. Todos vão embora e, ficamos apenas meus pais e minha avó. Subo rapidinho para ver como a Colorida está e a encontro, desmaiada, na minha cama. Eu a arrumo direito e a cubro com o cobertor. Ela é linda, maluca, mas totalmente linda. Desço para comer alguma coisa e conversar com a minha mãe. Encontro todos sentados na cozinha, inclusive a chantagista mirim que já deveria estar na cama a muito tempo. — Por que a senhorita está acordada ainda? — Porque não estou com sono ué! E estou esperando as minhas notinhas amarelinhas, senhor Juju. —Alexia diz atrevida. — Notinhas do que pimentinha? —Minha mãe pergunta curiosa. — Seu ursinho falou tudo isso aqui de palavrão! —Ela diz mostrando
cinco dedinhos. — E ele agora tem que me dar cinco notinhas amarelinhas, a Luna falou que tem que ser as amarelas. — Júlio! — Desculpe mãe, nem pensei nisso. — Não briga com o meu Juju, você não sabe que sou a preferida dele? Ele não vai falar mais, não é Juju ursinho da mamãe? Eu sou a peixinha da minha mãe e você é o ursinho. Essa menina é fogo. Ela é tão sorrateira e escorregadia, só ela pode brigar Alexia não aceita que ninguém brigue comigo. Nem mesmo a minha mãe. — Você é uma chantagista mirim! Vai dormir peixinha, amanhã de manhã eu te dou as notinhas amarelas. Ela beija todo mundo e corre para o seu quarto. Alexia é a mais independente das meninas, toma banho, sozinha, come sozinha, penteia seus cabelos e escolhe suas roupas. Não importa como ela se veste, ninguém escolhe suas roupas. — A Vida contou sobre sua família, Gael estava nos contando sobre a mãe dela. Muita coincidência, você não acha? —Minha mãe diz. — Também fiquei sabendo hoje, confesso que fiquei com medo, mas o meu pai me explicou. — Vou ser sincera, Júlio. Essa menina passou por muita coisa, está sozinha, é carente e morre de medo do abandono. Eu amo você meu neto, mas se você não estiver seguro do que quer aconselho a deixá-la em paz. — Dona Belle diz decidida. — Eu sei de tudo isso vó, prometi ao meu pai e a mim, mesmo procurar ajuda. Eu a quero muito, não sei nominar o que sinto por ela, só sei que é muito forte. Eu vou cuidar de mim, para poder cuidar dela. Ela merece me ter por inteiro e é isso que vou dar a ela.
— É assim que se fala! Ela vai te trazer para a vida, vai te mostrar o que é viver livre. Nós amamos você, mas não conseguimos te tirar da bolha que você criou e ela está conseguindo isso. —Minha mãe diz emocionada. — Mãe... Nada do que me aconteceu foi sua culpa, você me deu o que eu nunca tive, amor, carinho, um lar e sou grato por isso. Eu preferi me fechar nessa bolha, porque nela estava seguro e não machucava ninguém com o meu passado. Me tranquei pensando em mim, mas em vocês também. Meu avô chegou para buscar a dona Belle, meu pai foi olhar as meninas, Maria dormiu na casa da Luna já que só terá aula semana que vem. Agora temos um integrante novo na família, Vitinho amigo da Gaia. Ele é um menino incrível, inteligente e extremamente educado. Seus pais são uns idiotas e meu pai já está mexendo os pauzinhos para obter a guarda dele. Acompanho minha mãe até o quarto e com um abraço apertado, ela vai dormir e eu vou para o meu quarto. Tomo um banho rápido e me deito ao seu lado e assim que ela sente meu corpo, ela escorrega para mais perto de mim e me abraça. — Rabugento... —Ela me chama em seu sono. — Oi Colorida. —Respondo alisando seu rosto com os dedos. Mas ela não responde só me abraça mais apertado e continua dormindo. — Vou cuidar de você, eu prometo Vida. Amanhã eu começo a minha terapia novamente. Tudo para poder cuidar dela, para fazê-la minha.
Acordo com uma leve dor de cabeça e sem saber onde eu estou. Não gosto nada dessa sensação de estar em lugar desconhecido, me lembra várias
coisas não muito legais. Sinto dois braços me rodeando e sorrio. Rabugento. Como senti falta de dormir grudada nele, de sentir seu corpo aquecendo o meu. Ontem à noite foi muito especial para mim, me senti acolhida como parte da família. Elas me ouviram e não me julgaram pelas merdas que eu fiz, ao contrário, me abraçaram e me acolheram. Essas mulheres são maravilhosas, cada uma com uma história surpreendente. Katrisca perdeu os pais assim como eu e ainda sofreu nas mãos de um doente mental, pior ainda foi um bebê passar por toda essa situação. Hanna... carinha de princesa, mas lutadora, uma verdadeira guerreira. Não deve ter sido fácil passar por tudo o que ela passou, ainda mais tendo o agravante da doença da mãe. Lila... quem vê esse mulherão tão decidido, jamais imaginaria tudo o que ela passou. O que me doeu mais, foi saber que existem muitas como a Lila pelo mundo. Yza, dona do coração mais gigante que já conheci. Tão nova, mas que abraçou duas crianças como se fossem suas e quem a conhece sabe que ela não faz diferença entre os filhos. Eu ouso até dizer que o Júlio é o preferido dela. Agora a Belle? Ela não me contou nada sobre ela, não sei explicar direito, mas tenho a sensação que a história dela deve ser foda. Eu quero ser; um pouquinho, como elas e deixar o medo para trás e me jogar no que estou sentindo pelo Júlio. Ele disse que vai se cuidar por mim, então nada mais justo que do que me cuidar por ele. Não posso cobrar atitudes dele, sendo que não sou totalmente verdadeira com ele. Mesmo gostando, tenho medo de não dar certo, medo que ele me deixe e ninguém deve viver assim. Eu aprendi que a vida é um sopro e que devo viver intensamente e fazer o que eu gosto. Rir até a barriga doer, chorar até alagar a casa e, principalmente a amar sem medo de ser feliz. Eu mereço isso, o Rabugento
merece isso, basta irmos devagar que com certeza chegaremos longe. — Acho que é muito cedo ainda, para ficar pensando tanto. —Ele diz no meu ouvido e eu sorrio. — Bom dia Rabugento. — Bom dia Colorida, dormiu bem? — Eu sempre durmo bem nos seus braços, Júlio. — Eu também durmo melhor quando você está nos meus braços. O que vai fazer hoje, já que está de folga? Lila disse que iria falar para o Otávio te dar folga hoje. Parece que você conquistou a todas as mulheres da família. —Ele diz sorrindo. — Eu gosto delas. Confesso que fiquei com muito medo de contar a minha história e elas não entenderem e pedirem para eu me afastar de você; porém elas me abraçaram, contaram um pouco de suas histórias e falaram que faço parte da família. Eu me senti acolhida como há muito tempo não me sentia. — Essa família é maravilhosa, eles me abraçaram e cuidaram de mim. Eu me sentia satisfeito por eles terem acolhido a minha irmã, jamais passou pela minha cabeça que eles iriam abraçar um menino de dezesseis anos. Normalmente crianças acima de oito anos, são difíceis de serem adotados, imagine um adolescente? Não só meus pais me quiseram como a família inteira. —Ele diz olhando em meus olhos. — Cada um deles foi e é importante para mim; meus tios lutaram por mim, minhas tias me amaram e ainda lutam. — Eles são excepcionais, fortes e caridosos. Eles exalam amor por todos os poros. Mesmo com as merdas que eu contei e não é todo mundo que aceita, elas choraram por mim e isso não vou poder pagar nunca. — Eu amo esse povo doido, faço qualquer coisa por eles. A minha gratidão será eterna, apenas por salvarem a minha Maria. Eles deram a ela o
que eu nunca pude dar, segurança. Acho lindo o jeitinho possessivo que ele fala da irmã. Você sente o amor dele por ela, apenas ouvindo suas palavras de afeto. — Não fale assim, aposto que você fez o impossível para mantê-la segura. Não é à toa que ela morre de ciúmes de você! — Ela é a melhor parte de mim, sou capaz de abrir mão de tudo por ela. Minha mãe uma vez me disse que o Gael era o segundo pai da Maria porque eu era o primeiro. Eu cuidei dela desde que chegou do hospital, dei banho, fiz mamadeira porque a minha mãe não dava peito. Primeiro sorriso foi meu, primeiro nome foi o meu, primeiros passinhos foram para os meus braços. Entende por que ela é tão importante para mim? Sorrio para ele e me inclino deixando um beijo delicado em seus lábios. Esse homem é incrível, pena que ele não enxerga isso. — Lógico que eu entendo meu amor, ela também sabe do seu valor e aposto que sabe tudo o que você fez por ela. Ele beija a minha testa e se levanta da cama, sentando na beirada. Seu corpo está tenso, ele esfrega o rosto com as mãos e respira fundo. — Ela não sabe de tudo e é assim que eu prefiro. Ela não precisa saber das merdas que eu passei para mantê-la salva. —Ele diz baixinho, como se estivesse falando sozinho. — Sabe onde minhas roupas estão Júlio? —Pergunto para mudar o assunto. — Minha mãe colocou na máquina. Mas você pode vestir uma roupa minha, desde que me devolva. Você roubou meu casaco e nunca mais devolveu. —Ele diz rindo. — Que casaco? Eu hein, como se eu fosse capaz de pegar alguma coisa de alguém. Pode me emprestar uma bermuda? Eu coloco um cinto e ficará perfeita.
— É só pegar no guarda roupa, fique à vontade Colorida. Levanto da cama, justamente quando a porta se abre e Alexia entra, puxando uma Maria sonolenta. — Viu Ma! O seu ursinho dormiu agarradinho com a namorada dele. Que feio Juju, nem contou para a sua Maria que tava namorando. —Alexia diz com as mãozinhas na cintura. — Tinha formigas na sua cama? —Júlio pergunta e a pega no colo. — Lógico que não, que pergunta! Eu não dormi mesmo, meu pai tá muito bravo. O que eu posso fazer se não tavu com sono? —ALEXIA REED! —Ouço Gael gritar pela filha. — Seu pai ficou doido já! Irmã linda, não pode contar para o seu Ursão que eu te acordei ou ele não vai deixar eu dormi na casa da namorada do Juju. —Alexia diz segurando as mãozinhas em forma de oração. — Alexia o papai vai te colocar de castigo. Você está demais! — Maria diz rindo e a pega do colo do irmão. — Bom dia Júlio, bom dia Vida, vou levar essa levada para tomar café. — Bom dia Maria. — Se ela é namorada do nosso Juju, ela é nossa irmã, Maria? — Quase, ela se torna nossa cunhada. —Maria diz rindo. — Nome feio né? Você quer dormir na casa da nossa cunhada? Vai ter maquiagem, porcaria e música. O nosso Juju não vai, porque ele não come porcaria. —Ela diz e pisca para o irmão. — É... Mas eu não convidei ninguém! —Falo rindo. — Ué, eu me convidei e pronto. Não é legal? Você quer namorar o meu irmão? Então eu vou dormir na sua casa e pronto. — Alex... Oi gente, bom dia. Desculpa a gritaria, mas essa menina está me deixando louco. —Gael diz encostado no batente da porta. — Eu nada, quem faz isso é a Gaia. Oh menininha fogo essa Gaia!
Tem que dar um jeito nessa sua filha aí viu, minha mãe falou que o senhor vai ficar velho. — A cara nem queima! Vai tomar um banho agora Alexia Reed; não estou brincando garota, você vai apanhar nessa sua bundinha espevitada. — Gael diz cruzando os braços. — Papai... Minha mãe falou para o senhor não ameaçar, porque suas filhas ficam sem vergonha. —Alexia rebate cada coisa que o pai fala. — Eu queria um menino, só um menino! Mas vieram três meninas, uma mais doida que a outra. — Talvez se fosse um menino, ele seria pior Gael. — Não liga não namorada, meu papai não vive sem as meninas dele. Ele faz show todos os dias, não é ursinha do papai? — Banho! —Gael grita e ela se solta dos braços da Maria e corre porta a fora. — Ela está virada mesmo? —Júlio pergunta. — Está, coloquei-a trezentas vezes na cama, andei pela casa com ela no colo, cantei, dancei e nada dela dormir. Tudo porque ela iria dormir na casa da Vida, e por causa das notas amarelas. — Eu juro que não falei nada, ela que começou com essa história, mas como tem feriado, posso levá-la para dormir lá em casa. — Falamos sobre isso no café, a Yza já está arrumando tudo. Ursinha, banho porque hoje tem prova no cursinho de inglês. —Gael diz e sai do quarto. — Já vou papai! —Maria diz rindo e vem me abraçar. — Amei que você aceitou namorar o meu irmão. — Mas eu não... — Sim, ela é minha namorada. Você gostou ursinha? —Júlio pergunta depois de me cortar.
— Júlio! — Eu amei, agora vou deixar vocês dois decidirem se são ou não namorados. —Maria diz e sai rindo. Júlio fecha a porta e se encosta, cruzando os braços e me olhando seriamente. — Então namorada, o que você vai fazer hoje? — Não sou sua namorada! — É sim, então vamos encerrar esse assunto. Vai fazer o que hoje? — Estou a um fio de te matar! Eu vou para a minha casa, arrumarei as suas coisas e você passa lá mais tarde para pegar. Depois vou curtir minha folga, sair para fazer compras e vou, no salão de beleza. — Eu vou até sua casa depois que sair do trabalho, tomarei um banho no seu banheiro, depois me trocarei no seu quarto e sairemos para comer alguma coisa. Depois voltaremos e dormirei com você agarrada em mim. Esse será o meu dia. — Mas não vai mesmo! Júlio... — Hoje será a minha volta para a terapia, eu vou, na hora do almoço. —Ele solta e vem andando em minha direção. — Terapia? — Sim, eu não falei que vou cuidar de você? Então para isso acontecer, tenho que começar cuidando de mim. Eu não vou mais te magoar, não vou mais deixar você para trás. — Podemos comer comida italiana? —Falo sorrindo. Ele vai se cuidar; vai para a terapia para cuidar de mim! — Podemos namorada. — Não sou sua namorada! — Ainda... você é, só prefere se enganar. Agora vamos tomar café da manhã.
— Você é irritante! — E você é teimosa, minha linda e colorida namorada. Agora fodeu, cismou com isso. Não sei se brigo ou se dou um caminhão de doces para a Alexia.
Quem diria que minha vida mudaria tanto desde o dia que fugi daqueles homens? Meus pais acham que esqueci tudo o que vivi, mas eu só parei de pensar e falar sobre isso. Antes eu só tinha meu irmão para cuidar de mim, pouca comida e as vezes só uma bolacha. Meu irmão trabalhava todos os dias para cuidar de mim, mas hoje a minha vida é completamente diferente. As nossas vidas são diferentes. Graças a Deus e a minha fadinha, hoje meu irmão e eu temos uma família maravilhosa, que nos ama acima de tudo. Nunca mais senti fome, medo ou fiquei sozinha. Hoje minha única preocupação são os estudos e minhas irmãs. E claro, uma loirinha faladeira que é minha alma gêmea, minha irmã de coração e alma. — Você está muito pensativa, Maria. No que está pensando? Se for ciúmes do Juju, já falo que nem tenho estrutura nessa vida! —Luna diz se jogando ao meu lado na cama.
— Não sinto mais ciúmes da Vida. Ela é um amor de pessoa, parece que tem uma história triste. Você vai gostar dela, todos gostam. Estava pensando na minha vida, sobre tudo o que passei. Pensando em você, como sempre! — Tão fofinha essa minha Maria! Vou te encher de beijos, Peri. —A doidinha diz e pula em cima de mim, me enchendo de Beijos. — Luna! —Falo gargalhando. — Você é o meu amor da vida toda Maria! Não pense coisas tristes não, o que passou, passou e não volta mais. Hoje nós somos felizes, temos uma família linda e louca e vamos viajar o mundo e conhecer vários boys. Nem adianta que o meu vidinha não me engana mais, tão sem estrutura esse papai. Nós crescemos sim, mas ela nunca deixou de ser a menininha cheia de luz e com um vocabulário próprio. Todos da família já acostumaram com suas loucuras e acabamos repetindo sempre alguma coisa que ela gostava e, ainda gosta de dizer. — Você esqueceu o Igor? — Não, mas ele me esqueceu, não é? Então vou me esquecer dele também. Mas vamos falar do Juju! — Meu irmão está diferente, não sei dizer o que. Ele anda sorrindo muito mais agora, do que sorria antes. Está mais leve, entende? — Ursinha, mesmo ele tendo todos nós para cuidar e o enlouquecer, nosso Juju precisava de alguém para cuidar dele. Precisava de um amor igual ao dos meus pais, do tio Ursão e da tia princesa, do anjinho e da espertinha. O da minha Lila é amor doido, você sabe né? Aqueles dois só Jesus! — Você acha que ele não tem amor? Que ele sente que não é amado? Só de pensar nessa possibilidade, meu coração dói muito. Eu amo os meus pais, amo as minhas irmãs, porém o meu amor pelo Júlio é maior que o
mundo. Ele foi o primeiro pai que conheci e o primeiro a me amar. — Não bobinha! Aí Maria, às vezes você é tão obtusa viu. Ele precisa de um amor só dele, amor de família é diferente do amor de uma namorada. Ele precisa de alguém que cuide dele, assim como ele cuida de todas nós. — A Vida parece gostar muito do meu irmão. Os olhos dela brilham quando o olha. Ela ficou muito triste, quando ele foi embora e a deixou na minha casa sozinha. — Esse Juju é muito sem estrutura viu! Demorei uma vida toda para fazê-lo acreditar em Deus, esse seu irmão é fod... fogo! Mais lembra que o fofoqueiro disse que ele ia dar trabalho? Acho que foi isso aí, de namorar. — Os dois são engraçados, o Júlio a chama de Colorida, porque ela vive rindo e ama roupas de cores vibrantes. Vida o chama de Rabugento, porque ele vive resmungando e ele sente ciúmes dela. Você viu naquele dia na casa dele? Ela ficou olhando para o Ursão, babando e o Júlio ficou doido! Foi engraçado ver meu irmão sentindo ciúmes, principalmente quando não sou eu o alvo. Eu sofro com o meu pai e ele juntos! Como se eu quisesse namorar alguém. Eu até beijei dois meninos, mas não foi nada como nos filmes, então preferir ficar na minha. Meu celular toca, e a Luna estica o braço para pegar e faz careta quando vê que é o meu pai. Ela atende e conecta, ao viva voz, do celular. — Oi Ursão! —Falamos juntas e caímos na gargalhada. Meu pai é muito protetor da vida toda. — Oi minha Maria! Oi fadinha do tio vidinha! Luna, você vai me dar aquele batom rosinha? —Alexia diz e posso ouvir meu pai falar não ao fundo. — Ei peixinha linda, vou te dar o batom rosa e aquele roxinho, mas me diz, não era para a senhorita estar dormindo? —Luna fala para a minha irmã.
— Não consigo dormir. Já tomei banho, lavei meu cabelo e meu pai penteou, tomei chazinho de água suja. Sabe qual é? Meu pai diz que é de camila, mas nem tem gosto. — É camomila Alexia, camomila! Agora dá boa noite para a sua irmã e vamos dormir que já passou da sua hora. —Meu pai diz exasperado. — Calma Ursão! —Alexia diz e ouço som de beijos estalados. — Maria, você nem sabe! Sabe? Eu vou dormir na casa da namorada do nosso Juju! Muito legal, não é? Namorada? Evoluiu tanto assim? — Namorada, peixinha? — É! Como é o nome dela papai? — O nome dela é Vida. —Meu pai responde. — Isso, LUNA! Agora o meu irmão tem uma vidinha igual você tem. Ursinha do meu pai, eu vou aí te buscar tá? Sabia que o seu Juju tem uma namorada? Ele tá dormindo garradinho com ela lá no quarto dele! Eu vi viu, abri a porta um pouquinho só, mas o meu pai nem deixou eu ver de pertinho. — Eu não vou buscar ninguém não, Alexia Reed! Já está tarde e a senhorita tem que dormir. —Meu pai briga com ela, mas eu já me levanto da cama e começo a guardar minhas coisas, porque já sei o que vem a seguir. Ela consegue tudo o que quer do meu pai. — Então eu não durmo! To com saudades da minha ursinha papai, busca ela por favor? Ela sabe fazer eu dormir, canta musiquinha linda, Maria vem dormir com sua neném? —Alexia diz chorando, mas sei muito bem que é encenação. — Não chora peixinha, papai busca a nossa ursinha. Vamos colocar um casaco e avisar a sua mãe, mas promete que vai parar de chorar. — Já parei, viu! Maria vou buscar você com o meu ursão é rapidinho tá? Luna, depois a minha irmã fica com você tá? Agora ela vai cuidar da
neném dela. Mas eu te amo fadinha da Maria. —Alexia diz sem sinal do choro, ela nem esperou a resposta da Luna é desligou o celular. — Um chorinho! Bastou um chorinho e ele faz o que ela quer. Inacreditável Brasil!—Luna diz rindo. — Como se tivesse sido diferente com você fadinha, só a tática que era diferente. Você pedia um irmão e logo em seguida você pedia um animal e ganhava! —Falo rindo. Não é à toa que ela abriu um abrigo para animais. O Dodô, avô da Luna, quando casou com a minha avó Marta e foi morar com ela, sua casa ficou fechada por um tempinho. No aniversário de quatorze anos da Luna nesse ano, ele deu a casa para ela abrir o abrigo de animais e mais para frente sua clínica veterinária. — E deu certo, não é? Tenho até um viveiro! Por falar nisso mocinha, fala para o Juju que essa semana ele tem que ir ao abrigo, é a vez dele de nos pajear. — Que falatório é esse? —Tio Dylan entra pegando a gente no flagra. — Meu pai está vindo me buscar. — Aconteceu alguma coisa? —Ele pergunta preocupado. — Meu irmão tá namorando! —Grito, animada e meu tio sorri. — Ele conseguiu? Menino esperto. — Não sei, quem contou foi a Alexia. Disse que ele estava dormindo agarrado com a Vida, lá no quarto dele na casa dos meus pais. — Sim, as meninas fizeram um clube da Luluzinha lá na sua casa. Sua tia Baby está desmaiada de tanto que bebeu. —Ele diz rindo. Um tempo depois meu pai chega para me buscar, com uma Alexia bem acordada na sua cadeirinha, mais falante que nunca. Então vamos para casa, ansiosa para ver esses dois.
Impossível não se apaixonar pela Alexia, não só por ela como por todas as meninas da família D'Ávila. O café da manhã foi uma bagunça e pude constatar que quem manda na casa são as meninas, Gael pode ser grande, alto e ter cara de mau, mas é uma manteiga derretida quando se trata das meninas. Agora estou aqui, no shopping rodando de loja em loja procurando coisas para a noite das meninas. Sim, meninas! Nove meninas; Maria, Luna, Alexia, Gaia, Alicia, Olívia, Lou, Dominique e Joy. Como isso aconteceu? Alexia ligou para Lou, que contou para Olívia, que ligou para Gaia e o rolo estava formado. Até o mais novo integrante da família vai vir, Vitinho é um amor de menino. Foi o único menino autorizado a estar presente, também se ele não viesse a Gaia faria a terceira guerra mundial. Estou tentando manter a minha mente hiperativa ocupada, para não pensar no Rabugento, terapia e o fato de ele dizer que sou sua namorada. Júlio me mandou mensagem o dia inteiro, perguntando se estou bem, se me alimentei e se meu tio estava sem camisa. Nessa mesma sequência que acabei de falar. Ele vai me deixar maluca e a cada hora que passa, sua insistência em dizer que sou dele aumenta. Compro tudo o que você possa imaginar esmalte, acetona, algodão colorido, glitter, maquiagens, bolha de sabão, óculos malucos, até bastão de LED eu comprei! Perguntei no grupo a numeração das meninas e comprei pijama de unicórnio para todas, até uma samba canção de unicórnio para o Vitinho. Você deve estar se perguntando; será essa noite a festa? Lógico que
não, será depois de amanhã, mas preciso estar preparada e outra, precisava ocupar a minha mente. Meu tio está enrolado com a parte burocrática da delegacia, então ele já deixou avisado que passará o dia todo na rua. Eu até iria trabalhar na parte da tarde, mas hoje eu não tenho cliente nenhum e posso dar andamento nos meus projetos de casa mesmo. Melhor eu não abusar ou o Otávio me manda embora! Chego em casa e tenho que fazer duas viagens até o carro, só assim consigo pegar tudo. Comprei muitos travesseiros, colchões infláveis, almofadas. Agora tenho que escolher os petiscos, espero que nenhuma dessas meninas tenha alergia. Envio mensagem no grupo e pergunto só a Yza que diz que a Gaia não toma refrigerante de resto elas comem de tudo. — O que você está aprontando menina? —Dona Mimi pergunta parada na porta da minha casa. — Vou fazer uma festa do pijama com as minhas novas amiguinhas. E a senhora, o que tem feito? — Nada demais, vou dar a minha caminhada todas as manhãs, cuido das minhas rosas, e fico esperando aquele espetáculo que você chama de padrinho, sair para correr. Olhá-lo todos os dias de manhã faz meu dia muito mais bonito. —Ela diz rindo. — Toda safadinha! — O que é bonito tem que ser admirado menina, mas deixando o seu lindo e maravilhoso padrinho de lado, me diz como anda aquele outro menino lindo? — Estamos tentando caminhar. Ele com os problemas dele e eu os meus. — Aceita um conselho de uma jovem velha? —Mimi pergunta. — Acho que esse conselho será profundo, isso precisa de um café! Vamos para a cozinha e enquanto preparo o café, Mimi arruma as
xícaras e alguns biscoitos que ela mesma fez e me deu dias atrás. Depois de tudo pronto, nos sentamos à mesa e depois de alguns goles de café, ela começa a falar. — Todos nós carregamos bagagens do passado e isso é normal meu bem, entretanto, o que não podemos deixar é que isso mude quem somos essencialmente. Eu não sei o que o seu menino passou, mas sei o que você viveu. Você precisa desabafar o que está preso dentro de você, precisa parar de se culpar por aquilo que aconteceu. — Ele carrega muita coisa, não sei de tudo, mas faço uma ideia. Ele se tranca, não desabafa e quando as coisas ficam difíceis a primeira reação dele é fugir. Isso desperta muitas coisas em mim, sentimentos ruins, uma sensação de abandono, um medo. — É isso que você tem que cuidar meu amor. Sei que esse medo de abandono é maior que você, não é fácil se ver sozinha, muito menos perder a família do jeito que você perdeu. Eu te falei quando me contou a sua história, que você é uma fortaleza e ainda sigo com a mesma opinião. Você até pode ter se perdido meu bem, mas se achou e se transformou nessa mulher maravilhosa. Seus pais devem se orgulhar muito de você. —Mimi diz emocionada. — Eu decidi procurar uma psicóloga, Mimi. Não posso ficar com medo sempre e eu estou me cagando, completamente amedrontada. Se agora no início já me sinto caindo de amores por ele, imagina como será quando eu terminar de cair? Eu estou fodida! — Isso é o mais importante! Estar bem fodida é primordial. —Ela diz rindo, mas logo fica séria. — Sem brincadeira, o amor dá trabalho menina, mas quando vale a pena é divino. Não há nada melhor do que amar e ser amada, você vale à pena e esse menino também. — Me lasca na vida mesmo, me faz chorar mesmo! Já não basta tudo
o que chorei ontem, agora vem você. Eu já nem tenho mais prega de tanto tomar no c.... — Vida Martins! —Meu tio grita bem na hora que ia falar cu. — Nem vem padrinho, sou maior de idade e posso falar palavrão. Eu hein, vem me regrar não. — Ah é? —Ele diz sério e vai até o armário de temperos e pega um pote enorme de pimenta que não existia antes. — De onde isso saiu! —Falo ficando de pé imediatamente e corro para trás da cadeira da Mimi. — Você pode ter a idade que for se falar palavrão na minha frente vai comer pimenta sim. Agora senta! —Ele diz bravo. — Se fodeu! —Mimi diz rindo. — Zio... scuza. —Peço desculpa em italiano, isso sempre amolece o coração dele. — Senta! Não pensa que vai me amolecer. —Ele diz pegando uma colher. Nós temos essas brigas desde a minha adolescência, toda vez que falava palavrão ele vinha com a pimenta. — Sento, mas só se for uma pequena. Eu nem cheguei a falar o palavrão. — Pelo que posso ver vocês já tiveram essa briguinha antes. —Mimi diz rindo. — Deixa a menina em paz, ela não ia falar nada do que já não tenha ouvido antes. Depois da Mimi muito insistir, meu tio desiste da ideia da pimenta. Logo depois ela vai embora e meu tio vai tomar um banho. Deito no sofá e acabo cochilando, quando acordo já está escuro. Acabo tomando um susto quando vejo meu tio sentado na minha frente, me olhando seriamente.
— Credo tio! Agora deu para vigiar até o meu sono? — Precisamos conversar mi Amore. — Se for desgraça eu passo! Não aguento mais merda nenhuma, é sério tio. — Mas disso não tem como fugir, principessa. —Ele diz resignado. — Lembra daquela viagem que sua mãe veio a trabalho e vocês foram para o parque aquático? — Lógico que lembro, foi a última viagem que fizemos todos juntos. Mas por que o senhor está lembrando isso? Não estou gostando nada disso. — Sua mãe foi convidada a presidir uma audiência, lembra? Envolvia; a Federal, vários delitos, até tráfico humano. A mulher que estava sendo julgada era mãe da Lila, tia do seu Rabugento. — Nossa que coincidência! — Muita, mas não para nisso. Através dessa mulher, muita coisa foi descoberta. Muita gente poderosa estava envolvida, uma organização criminosa foi descoberta e uma coisa foi puxando outra. Então num outro caso chegou às mãos da sua mãe, e eram associados com o caso da mãe da Lila. —Ele diz sem desviar os olhos dos meus. — O senhor está dizendo que... Não tio! Isso é....isso é loucura. É muita coincidência, não é? Seja sincero tio, a mãe da Lila está envolvida na morte dos meus pais? É isso que o senhor está tentando me dizer? Não pode ser verdade! Não quero é não posso acreditar nisso. — Respira principessa! —Ele diz ajoelhando na minha frente. — Olha para mim meu amor, isso não tem nada haver. Só me escuta ok? — Eu não quero que isso seja verdade, eu ganhei tantas amigas aqui, a Lila é uma delas. E eu tenho o Júlio, ele começou na terapia hoje tio, só para poder ficar comigo, cuidar de mim.
— Vida! — Ele diz alto. — Você não vai perder ninguém, ele ainda vai cuidar de você, ela ainda vai ser sua amiga. A mãe da Lila, não tem ligação com a morte da sua família meu amor. Foi apenas coincidência, sua mãe julgou o caso dela alguns anos antes. —Meu padrinho diz e eu volto a respirar de novo. — Agnes, mãe da Lila, financiava essa organização criminosa e as pessoas que mataram seus pais eram sócios dessa organização. Coincidência principessa, apenas isso. — Tem certeza tio? — Não chore mi Amore, eu tenho certeza e tenho como provar. Vamos pensar positivo? Quem sabe isso não estava escrito em algum lugar no universo? Talvez Campinas e esse povo louco, estavam destinados em seu caminho. — Pode ser não é? O destino adora pregar peças. —Falo tentando ser positiva. — Não encha essa cabecinha louca de caraminholas, Vida. Só te contei isso, porque o Gael ligou o nome da sua mãe com a juíza que julgou a mãe da Lila. Apenas isso, ok? O Rabugento ainda é seu, ainda vai cuidar de você e se ele vacilar, mato e ele! Tudo vai ficar bem, eu prometo. Não posso perder mais ninguém, não sem me perder também. — Eu quero o tio Sony, liga para ele? —Pergunto e ele sorri carinhosamente. — Eu ligo, mas tem que parar de chorar Carinho, ou o Sony vai chutar a minha bunda. —Ele diz secando minhas lágrimas que teimam em cair. Ele manda uma mensagem e minutos depois seu telefone toca. Meu padrinho sorri quando vê quem está ligando e me entrega o aparelho. — Tio Sony! —Atendo chorando.
— O que está fazendo a minha borboleta chorar? Se for esse idiota, vou chutar a bunda feia dele. —Ele diz preocupado. — Vem me ver? Estou com saudades, muitas saudades. Preciso de você aqui também. — Eu vou minha borboleta linda, agora pare de chorar. Toma um banho gostoso, o Roger vai comprar um pote de sorvete sonho de valsa e assistir “Uma linda mulher” com você. — Mas ele não chora, não tem graça. Vamos assistir A culpa é das estrelas? —Pergunto e meu padrinho ri baixinho. Já me sinto um pouquinho melhor, só sinto necessidade de ganhar carinho daqueles que gostam de mim. Da minha família. — Dá um chute nesse idiota aí por mim! —Ele diz irritado. — E a senhorita quer me foder, não é? Esse filme não borboleta, podemos assistir até aquele que o cara vira alma penada, menos esse das estrelas. — Maricas! —Meu padrinho diz rindo. — Tio! — Pare de puxar o saco desse idiota, ele está longe e eu estou aqui, então você tem que me amar. —Ele diz e toma o celular da minha mão. — Vá tomar banho mocinha, eu vou comprar o seu sorvete. Grito um tchau para o meu tio e vou para o meu quarto. Antes de entrar no banho, dou uma olhada nas minhas mensagens e vejo uma do Rabugento. Júlio — Está tudo bem aí? Senti sua falta no trabalho hoje. Eu sorrio da sua mensagem. Fora essa, tem várias com olhinhos porque não respondi rapidamente. Estou bem ou estava. Também estou com saudades, vem me ver? Meu maior medo era que esse assunto sobre a mãe da Lila, acabasse nos afastando. Não me vejo mais vivendo longe dele ou das meninas, só
preciso entender tudo o que foi dito e como todos vão se sentir quando souberem disso. Só não quero sair perdendo, meu tio disse que posso ficar despreocupada, que um caso não tem nada a ver com o outro e eu acredito nele. Só preciso fazer o meu medo entender.
Chego em casa do trabalho morto de cansaço, tanto fisicamente quanto emocionalmente. Hoje foi a minha volta à psicóloga e não foi nada fácil, mas eu prometi ao meu pai e a mim mesmo. Está mais que na hora de deixar tudo para trás, abraçar as oportunidades que a vida está me dando novamente. Abraçar a minha Colorida Vida. Por falar nela, passei o dia todo preocupado com ela, cheguei a ser insistente de tantas mensagens que mandei hoje. Desde a conversa com o meu pai sobre a mãe da Lila, estou sentindo um aperto no peito. E se ela achar que a Agnes tem algo com a morte de sua família e quiser ir embora? Eu não deixarei! Otávio estava abatido hoje, ele contou para a Lila o mesmo que meu pai me contou. Agora ela está se sentindo culpada e até mesmo cogitando a ideia de visitar a mãe na cadeia, para tirar tudo a limpo. Otávio diz que comeu um dobrado para fazer com que a esposa ficasse calma, Lila quer conversar com a Vida e com o Roger e Otávio me pediu para providenciar
isso. Mas não sei se é a coisa certa a fazer, sei que o Tavinho está preocupado com a mulher dele, porém eu estou preocupado com o emocional da minha. Não farei nada que machuque a Colorida, ela já sofreu demais. Prometi para a Vida que iria levá-la para jantar fora hoje, um restaurante italiano foi o que ela pediu e é o que farei. Tomo um banho demorado, me troco e olho o celular para ver se ela me respondeu. Vejo sua mensagem e fico preocupado imediatamente. Colorida — Estou bem ou estava. Também estou com saudades, vem me ver? Isso me deixa nervoso, porque ela não está bem? O que aconteceu? Passo a mão nas chaves do carro e saio em disparado para sua casa. Ela pediu para ir vê-la, esqueceu completamente do nosso jantar. Chego a casa dela em poucos minutos, mal estacionei e já estava fora do carro batendo em sua porta. Roger atende completamente sério e apenas de ver seu rosto, já sei que deu merda. — Onde ela está? O que aconteceu? —Pergunto e entro na sala olhando ao redor. — Calma; garoto ela está bem. Está deitada no quarto, mas antes de ir queria conversar com você. —Roger diz sério e eu me sento ao sofá e espero ele começar a falar. — Como você deve estar sabendo, a juíza que condenou a mãe da Lila, é mãe da sua Colorida. Eu achei melhor contar para a Vida, antes que ela ficasse sabendo por alguém. — E como ela reagiu? Ela ainda está aqui, então isso quer dizer que é bom, não é? Eu não deixarei que a leve para longe, Roger. Eu a farei entender que não tem nada haver uma coisa com a outra, meu pai me disse que os casos não têm ligação alguma, meu pai vai me ajudar a conversar com ela. Vou ligar para ele, é isso, ele vai vir aqui agora!
Ela não pode me deixar, não agora, nem nunca! — Calma; Júlio! Ela não vai embora, ela não acha que os dois casos estão ligados, eu contei tudo para ela. Meu irmão está chegando e juntos vamos cuidar dela, minha afilhada ficou com medo de perder as amigas que fez, perder o contato com a sua família e principalmente de perder você. Você é mais importante para ela do que imagina Júlio. Vida tem um sério problema de perdas e no caso dela é até justificável, o maior medo dela é perder tudo o que ela está construindo com você. —Roger diz sério. — Ela não vai me perder muito menos perder a minha família. Minha mãe é louca por ela, minhas tias a adoram e minha avó nem preciso falar, não é? Lila está mal, se achando culpada pelo o que aconteceu com os pais da Colorida. Por ela, teria vindo aqui pedir perdão para a Vida. — Sua família é incrível, Júlio. Era tudo o que a minha menina precisava, aquela menina cresceu em meio a muito amor e atenção. Hoje ela é carente de tudo isso. O que você pode achar besteira, para ela pode ser de extrema importância. Agora vai lá ver a sua Colorida e se consegue fazê-la comer alguma coisa, vou deixar vocês dois sozinhos, tenho que resolver algumas coisas. Depois que ele sai, eu respiro fundo e vou ver a minha Colorida. Conversando com a minha psicóloga hoje, ela me fez ver o quanto eu estou diferente, pois estou mais relaxado que antes e aberto para falar sobre o que tanto me machucava. Que pela primeira vez em dez anos, eu quis tratar os meus traumas, por mim e principalmente por ela. Chego aporta do seu quarto, testo a maçaneta e, percebendo que não está trancada, abro lentamente. Parece que estou entrando em uma câmara frigorífica de tão gelado que o quarto está. Vejo que ela deitada no meio da cama, toda encolhida e enrolada em meio a vários cobertores. Tiro os meus sapatos e deito ao seu lado, ficando cara a cara com o seu rosto molhado
pelas lágrimas e isso me dói. Saber que ela está sofrendo e chorando, me deixa, devastado. Aliso seu rosto com as costas da mão, tiro alguns fios de cabelo do seu rosto e, ela abre os olhos. — Você veio... — Você pediu e eu vim não que eu já não viesse antes. Acho que você se esqueceu que iríamos jantar fora hoje. Por que você estava chorando? — Meu padrinho me contou sobre minha mãe e a mãe da Lila. Ele me explicou tudo direitinho, falou que me mostraria tudo só para eu possa entender que os casos não têm ligação. Mas eu senti um medo tão grande, como se mais uma vez o mundo estivesse tirando minha família de mim. — Ela diz e começa a chorar. — Sem choro Vida, ninguém vai tirar nada de você. As meninas ainda continuam te adorando e sendo suas amigas e eu ainda estou aqui completamente encantado por você e pode ter certeza que daqui você não sai. Ela me abraça apertado e eu a deixo chorar, porque sei que é um choro de alívio. Acho que não serei apenas eu que terei que frequentar uma psicóloga, ela também vai precisar. Acho que nós dois nos completamos, ela preenche coisas em mim que nunca achei que fosse capaz e eu preencho nela o que lhe falta. — Eu babei em você. —Ela diz alisando minha camiseta. — Como você pode ser tão perfeito? Como pode ter o dom de me tranquilizar, de me acalmar, quando dentro de mim está acontecendo uma tempestade? — Mesmo sendo diferentes, nós somos muito parecidos. Temos opiniões diferentes, mas com um significado grandioso. Eu me acho imperfeito, porém aos seus olhos eu sou a perfeição. Eu te acho perfeita, entretanto, você não se acha assim. Mas sabe o que eu acho? Acho que somos dois imperfeitos e que somente juntos encontramos a perfeição. Eu te
completo, assim como você me completa Colorida. — Quando eu olho para você, vejo tanto amor emanando de você, mas vejo tanto medo também. Assim como tem em mim, mas nossos medos são diferentes, Júlio. Eu tenho medo de amar e perder, mas você tem medo de não ser amado pelo que você é, pelo que você guarda dentro de ti. Só preciso que você me deixe entrar... — Tão bobinha essa Colorida! —Falo e sorrio me lembrando da Luna. — Você já entrou e nem se deu conta, está tudo meio bagunçado aqui dentro, mas prometo que se você me ajudar a arrumar, esse poderá ser seu lar para sempre. Acho que essa é a mais pura verdade. Sou uma completa bagunça, tem muita coisa dentro de mim que não vale à pena deixar guardado. É mais fácil jogar fora e abrir espaço para coisas novas, do que continuar vendo a felicidade do lado de fora. Em apenas uma sessão, a psicóloga me fez enxergar que dentro de mim tem espaço suficiente para eu ser feliz e que só dependia de mim mesmo para isso acontecer. O mundo, o universo ou o destino, seja lá o nome que se dê, não colocaria essa mulher sem motivo no meu caminho. Ela não seria a única mulher a chamar a minha atenção à toa. Como diz meu pai, ela nasceu para ser minha. — Não fala isso se a intenção for fugir. Se eu entrar, nem os caça fantasmas vão me tirar daí, Júlio! Eu sou espaçosa, tomo conta de todo o lugar, vou querer decorar cada canto com cores berrantes, fazer festas, encher de coisas bobas e felizes, essa sou eu. Então não me ofereça morada se for para ter regras para morar aí. —Ela diz nervosa e pula da cama. Sorrio... Maluca! Eu me sento na cama e fico olhando ela andar de um lado para o outro. — Podemos fazer um contrato de locação, o que acha? —Pergunto e
ela para de andar na hora e pula na cama e senta no meu colo. — Não sou mulher de alugar nada, Júlio César D'Ávila. Gosto de coisas próprias, definitivas, sem correr o risco de receber uma ordem de despejo. —Ela diz séria, segurando o meu rosto. Ele levou essa analogia de "morada" a sério demais, até ordem de despejo essa garota arrumou. — Então vamos fazer um contrato de compra e venda o que acha? — Pergunto entrando na loucura dela. — Como seria a forma de pagamento? —Ela pergunta sorrindo lindamente, mas seus olhos estão cheios de lágrimas não derramadas. — É bem caro Colorida, muito caro. —Falo sorrindo e beijo seus lábios rapidamente. — Muitos beijos, muito carinho, muita paciência, e ser completamente minha. Só pode sorrir para mim, só pode colorir a minha vida. — Temos um homem possessivo aqui Brasil! —Ela diz rindo. — Sabe... sou uma mulher muito rica de coisas boas, tipo milionária mesmo. Esse preço está salgadinho, mas aceito pagar e ainda dou um bônus para anexar algumas exigências que vou pensar depois. Agora vou te dar um adiantamento! Ela pula no meu colo e me empurra até que eu esteja deitado e me beija. Sorrio me sentindo leve pela primeira vez na vida, parece que o buraco que tinha dentro de mim, está começando a fechar. Não será do dia para a noite eu sei, mas só de saber que está se fechando me sinto aliviado. Nosso encontro era para acontecer, o que mais explicaria isso?
Meu! Pelo menos foi isso que ele deixou explícito, mas se não for caguei! É meu e ponto final e ele que não se meta a besta não, ou a Colorida vai mostrar umas coisinhas para ele. Depois da nossa conversa maluca, ele me convenceu a sair para comer alguma coisa. Nós jantamos em um restaurante italiano, assim como tinha pedido mais cedo. Depois saímos para andar de mãos dadas, como dois adolescentes. Júlio é uma pessoa ciumenta, olhava feio para qualquer homem que me olhava por mais de três segundos. Implicou com o tamanho do meu vestido e olha que ele vai até o meu joelho, muito sem noção esse Rabugento. Fala da atenção que eu chamo, mas das mocreias que babam em cima dele ele não fala nada. Se olhar matasse, meia dúzia de piranha estaria mortinha. E essa é o motivo da nossa discussão agora. — Se ela olhar para cá e der mais um sorrisinho, juro que mato ela! — Para de loucura Colorida, não é para mim que ela está olhando. — Ele diz rindo e toma mais uma colherada do seu sorvete. — Então ela é médium? Porque só estamos nós dois aqui, ela e as amigas dela. Se não é para você que ela está babando, só pode ser um espírito bem gostoso. — Você está de TPM? Porque a minha mãe fica assim, quando está naqueles dias. Meu pai diz que é falta de sexo. Então me diz, Colorida, qual dos dois está te afligindo?—Ele pergunta na cara dura, me deixando completamente mortificada. Não respondo simplesmente me levanto e pego minha cestinha de sorvete e vou em direção a porta. Ele, esperto que só vem atrás, também teve um excelente professor, Gael D'Ávila. As mulheres fazem um coral desanimado e eu sinto meu sangue
fervendo. Começo a andar em direção a mesa delas e dizer umas verdades, Júlio me pega nos braços e me joga no ombro, até que gostei viu, porque minha cestinha de sorvete voou caindo bem na mesa das vadias. Ele me tira da sorveteira rapidamente e eu vou me debatendo até ele me colocar no chão. Assim que vou gritar com ele o infame me joga na parede e me chama de lagartixa e me beija alucinadamente. Tirando a parte da lagartixa o resto é tudo verdade. Esse homem não apenas me beija, não, isso é para os meros mortais. Júlio me consome, me domina, me possuí. Com apenas um beijo, ele me faz querer arrancar as roupas e me pendurar nele, como um bicho preguiça num galho. Alguém passa e assoviando, só isso quebra a neblina da luxúria que se apossa de nós dois. Nós nos afastamos ofegantes e conto até três mentalmente, para ver o medo e a vontade de fugir nos olhos dele. Mas quando olho para cima, em seu rosto está estampado um sorriso mais cafajeste que já vi na vida. — Por que está sorrindo, Rabugento? — Não sei, tantas coisas. Como o fato que você é linda, doida, ciumenta e muito, muito minha! —Ele diz sorrindo. Mas não um sorriso qualquer, o melhor sorriso de todos; aquele que brilha nos olhos. — Vamos, vamos para casa dormir de conchinha. Quero te mostrar tudo o que eu comprei para a festa do pijama com as meninas. —Falo alegre, porque de tudo o que ele falou só consegui gravar o minha. — Eu ainda acho que você é doida, a peixinha e a Lou, já dão trabalho. Imagina a tropa toda! Mas não tem problema, eu venho te ajudar a controla as meninas. —Ele diz decidido. Coitado, se achou o Capitão Nascimento agora! — Não senhor, é noite das meninas e do Vitinho. Ele foi o único convidado e você não foi. Eu vou cuidar dessas crianças, já comprei tudo o
que precisaremos. Assim que chegamos em casa, vamos para o meu quarto e pego o que comprei para a festa. Júlio olha tudo horrorizado, seus olhos estão arregalados, sua boca está aberta de espanto. — Você é doida? —Ele exclama assustado. — Colorida, isso é um exagero do caralho, é apenas uma noite. O que você vai fazer com tudo isso depois? — Guardar ué! Vou guardar para a próxima festa do pijama, só vou ter que comprar as coisas do próximo tema. A Alexia e a Lou, gostam de unicórnios e como a festa é delas eu comprei tudo desse tema. Depois eu vejo com as outras meninas. — Próxima! Você acha que vai sair viva dessa? Tão bobinha essa Colorida. Por que não posso participar? —Ele pergunta confuso. — Porque não! Por que você não sai com os seus amigos ou vai beber com o seu pai? — Não tenho amigos e não quero beber! Quero ficar com você, é crime isso? —Ele diz com uma carinha de pidão, que eu quase falo que ele pode vim na festinha. — Muito carente gente! —Falo rindo e pego mais coisas na sacola para ele ver. — Olha que linda essa cueca samba canção que comprei para o Vitinho. — Unicórnio? Aonde você achou uma cueca de unicórnio, Colorida? —Comprei pijamas de unicórnio para todas as meninas, porque ele seria diferente? Eu hein, vai que eu não compro e ele se sinta deixado de lado? Eu comprei em uma loja no shopping, tem tantas coisas legais e com temas infantis! — Entendi... então eu não poderei ir nessa festa?
— Não! Deixa de ser insistente. Parece que não vive sem mim. Pensa em mim, chore por mim, liga para mim e não, não liga para ela. Se ligar é um homem mortoooooo. —Improviso uma música e ele cai na risada. — Maluca! Só digo que não vou dormir sozinho e ponto final. —Ele diz sério e vai para o banheiro. Ah, mas vai dormir sim! Guardo as coisas, arrumo minha cama e fico esperando o senhor "eu não vou dormir sozinho". Imagina a casa cheia de crianças e eu indo dormir grudada nesse homem! Ainda mais com a Maria vindo. Ela já não gosta muito de mim, vai que ela faça alguma coisa enquanto eu durmo, sei lá, tipo cortar o meu cabelo. Credo! Não, melhor ele não vir na festa mesmo.
Não dá! Já pedi, já implorei, fiz papel de idiota rejeitado e mesmo assim ela não me deixou participar da festinha. A maluca até falou sobre a Maria a deixando careca! Como se a minha ursinha fosse capaz disso. Estou na casa dos meus pais, depois de um dia estressante no trabalho e de ser praticamente ignorado o dia todo por aquela Colorida sem coração. As meninas correm de um lado para o outro se arrumando, agora me diz, quem se arruma para dormir? Minha mãe está rindo da correria e principalmente da minha cara de derrota e inveja. — Ursinho, desfaz essa carinha de cachorro que caiu da mudança. É apenas uma noite, amanhã você pode ir buscar as meninas e tomar café da manhã com a sua Vida. — Minha mãe diz e se joga no meu colo. — Você pode dormir comigo, assistir irmãos a obra, eu até deixo você reformar alguma coisa aqui em casa. — Só não entendo o porquê eu não posso ir! Essa Colorida é, muito,
sem coração da vida toda. — Tão dramático! —Ela diz rindo. — Ela está com medo filho, a Ursinha é ciumenta demais e a Alicia também. Ela quer conquistar suas irmãs, mostrar que ela não vai tirar você delas. Eu também queria ir, mas seu pai não deixou, diz ele que vai me levar em um jantar romântico. — Pronto! Agora vou ficar sozinho. A campainha toca e minha mãe levanta para atender. Luna entra toda faceira e logo atrás entra a tia Baby, meu tio Dylan e os meninos emburrados. Luna vem correndo me beijar se jogando em meu colo. — Você tá muitão sumido da vida toda, senhor Ursinho. Não ama mais a sua loirinha? Não pode ser obtuso não Júlio César, só porque está namorando pensa que pode sumir é? — Eu não sumi loirinha tagarela, estou trabalhando muito. Agora me diz uma coisa, porque os pestinhas estão emburrados? — Os pestinhas estão aqui e ouvindo tudo! —Valentin diz bravo. — Nós podemos responder Júlio. A culpa é da sua namorada! — Vicente diz igualmente bravo. — Vocês dois, parem de chiliques. —Tia Baby diz e vem me dar um beijo. — Oi meu amor, como você está? — Estou bem tia e a senhora? Vai vir uma priminha aí? —Pergunto e acabo rindo da careta que tio Dylan faz. — Ilusão do seu tio! — Agora me digam, porque a culpa é da Vida por vocês estarem mal humorados? — Por que ela vai fazer uma festa do pijama e não nos convidou! Isso é injusto sabia? Nós somos crianças também e queremos participar. — Valentin diz nervoso.
— Eu também estou chateado, vai ter muito doce! —Falo emburrado e todos acabam rindo. — Já sei! Vem, vamos bolar um plano maligno. Tia Baby, eu estou sequestrando os meninos ok? Vamos dar uma volta no shopping, tomar um sorvete e vamos para a minha casa depois. — Aí eu vi vantagem! É disso que o Brasil gosta, vamos Júlio, vamos ter umas horas de meninos. —Valentin diz pulando animado. Pego minhas chaves e os meninos me seguem até o carro, Vicente todo sério vai mexendo no celular. Já Valentin está animado e não para de falar. — Qual é o plano primo? Vamos até a casa da sua namorada e jogar ovo podre na porta dela? Recolher coco de cachorro e deixar no tapete dela? —Valentin e sua mente perversa começam a trabalhar animadamente. — Não! De onde você tira essas ideias? — Do YOU TUBE, Júlio. Tem um canal que ensina a fazer trolagens, meu irmão é viciado nisso. —Vicente diz rindo, sem tirar os olhos do celular. — Vicente, você está falando com a Olí? Não conta nada ou vai estragar o nosso plano. — E qual seria esse plano? —Os dois perguntam juntos. — Vamos participar da festa ué! Vamos comprar o pijama com o tema da festa, então vocês fazem cara de cachorrinhos fofinhos e ela vai deixar a gente entrar. Sei que é errado usar duas crianças, mas não tenho vergonha. Eu falei que não iria dormir sozinho e eu não mudei de opinião quanto a isso. Não acho justo que por causa de uma festinha boba, ela me exclua assim. Estou sendo infantil, ridículo, mas não quero ficar longe dela. Ela não dorme bem sem mim e eu não durmo bem sem ela, sem o cheiro dela. Isso é um fato que ela tem que entender! Chegamos ao shopping e me surpreendo com a quantidade de gente
zanzando pelos corredores. Vou direto para a loja que ela falou, os meninos começam a olhar as camisetas de super-heróis, até eu gostei de uma do homem de ferro. Mas estou em uma missão é caminho até uma atendente. — Olá, boa noite, será que você poderia me ajudar? —Pergunto educadamente e ela me olha de cima a baixo antes de responder. — Claro! Do que você precisa? — Minha namorada comprou uma samba canção de unicórnio dias atrás, gostaria saber se ainda tem e até que tamanho. — Temos sim, normalmente as mulheres compram para elas mesmas. Homens não gostam muito de unicórnio, não é? —Ela diz toda sorridente. — Entendi você poderia me mostrar? — Claro. Ela me leva até um balcão e eu puxo os meninos pela camiseta, assim que o Valentin vê o que a vendedora está mostrando, começa a reclamar. — Para quem é isso aí? É para as meninas, né? Porque se for para nós, sinto te informar primo, mas não usaremos! — Quer ir na festa? —Pergunto e ele balança a cabeça. — Então você vai usar sim, escolhe mais alguma coisa e pronto. O que um homem não faz para agradar a namorada! Escolho três cuecas, samba canção, iguais, só que de tamanhos diferentes. Vicente escolhe uma camisa do bruxinho que ele é fã, Valentin escolhe uma do capitão América e eu a do homem de ferro. Depois de tudo pago saímos do shopping e vamos para o meu apartamento. Envio uma mensagem para o meu pai e pergunto se as meninas já foram para a casa da Colorida, ele responde que sim. — Bora tomar um banho e colocar o pijama. Depois vamos direto para a festa do pijama, mas se lembrem de fazer cara de coitados. Eles vão para o banho e eu me sento no sofá para esperar, enquanto
isso envio uma mensagem para a Colorida, mas ela não me responde. Não tem problema, já, já ela vai ter uma surpresa. Festa do pijama; aí vou eu!
— Não tio, está tudo torto. Vai mais para a direita. Não! Para a minha direita. Homens, não fazem nada certo. — Porque o idiota do seu namorado não está aqui te ajudando? E você me respeita mocinha! —Meu tio pergunta nervoso. — Se eu pedisse ajuda para ele, Júlio nunca mais sairia daqui. O senhor não viu o drama que ele fez? Logo no café da manhã, Júlio começou com os dramas querendo dormir aqui em casa e me ajudar com as meninas. — Ele é muito dramático né? E muito possessivo também. Mas ele disse uma coisa verdadeira, você não tem pesadelos quando dormem juntos. — E é verdade mesmo tio, nem eu e nem ele temos pesadelos e isso aconteceu desde a primeira vez que dormimos juntos. — É... realmente o destino de vocês estavam traçados. Fico feliz por isso principessa, você merece toda a felicidade do mundo e ele também. — Obrigado tio, fico tão feliz por isso e por você achar que é a coisa certa. Agora puxa só um pouquinho para a esquerda e estará perfeito. — Garota chata! Estamos arrumando a mesinha onde colocarei os doces, já está tudo arrumado, a entrada da casa está enfeitada, os colchões estão nos seus lugares. Os salgados e os docinhos já chegaram, já enchi os potes com doces e quando as meninas chegarem, eu vou encher os potes de batatas. Assim que meu tio faz o que pedi, eu começo a colocar os enfeites na mesa e depois de
terminar, analiso para ver se está tudo perfeito. — Não me peça para mover essa mesa novamente! Essa porra é feita do que, aço? —Tio Roger reclama, tadinho, me ajudou a montar quase tudo. — É mármore tio, o senhor não viu? —Falo rindo das suas caretas. — Tem mais alguma coisa para pendurar? Eu quero tomar um banho, tenho um encontro mais tarde. — Encontro com quem hein, posso saber quem é a vítima ou as vítimas? — É uma só a conheci depois que a gatinha bateu no meu carro. — Ele diz e solta um sorriso cafajeste. — Coitadinha dela! Pode ir tio, só vou arrumar as almofadas na cama improvisada. — Você é maluca para fazer tudo isso, só para dormirem depois. Você sempre foi exagerada menina, mas agora passou dos limites. — É nada, vai ser divertido. Ele beija a minha testa e vai para o seu quarto se preparar para uma noite de devassidão. Meu tio é um galinha de carteira registrada, ele não namora nunca se envolveu com alguém emocionalmente, não vejo a hora da mulher certa aparecer e derrubar as paredes que ele construiu. Volto aos meus afazeres, arrumo as almofadas e os travesseiros em seus lugares, confiro se a tenda está presa firmemente. Depois me afasto e olho apaixonada. Quero dormir aqui todos os dias! Vou até a entrada e vejo se os saquinhos surpresas, que contém os pijamas estão certinhos. Espalho mais um pouco de marshmallow colorido pela mesa, ajeito as plaquinhas que fiz meu tio fazer muito a contragosto. E depois de mais uma olhadinha, vejo que tudo está perfeito e vou para o meu quarto tomar banho. Comprei um conjunto cheio de pequenos unicórnios, comprei presilha que tem cabelos coloridos, fica parecendo que fiz mexas
coloridas. Tirei o esmalte da unha para poder pintar mais tarde, eu comprei vários esmaltes coloridos e brilhos, estrelinhas para enfeitar a unha. Eu sei que é demais, mas foi impossível me conter. Eu queria comprar unicórnios de pelúcia, mas a loja não tinha a quantidade que eu queria. Tomo um banho, me troco, arrumo o meu cabelo com duas, Maria Chiquinha e coloquei os apliques coloridos. Calço minhas pantufas lindas e vou para a cozinha. Logo meu tio aparece exalando um perfume gostoso e um sorriso safado na cara. — Já estou indo, Carinho. Qualquer coisa é só me ligar que eu venho correndo. — Ele diz me abraçando e beijando minha testa. — Pode ir tranquilo tio, vai dar tudo certo. — Tão positiva! Vamos ver como você se sai, com a casa cheia de crianças. Tchau e me liga se precisar que eu te salve. Mostro a língua para ele que sai rindo das minhas caretas. Sento no sofá e volto a pensar no Rabugento. Lembro da nossa conversa maluca, sobre minha nova residência. Seu coração. Juro que cheguei a pensar que não daria em nada, que ele continuaria se escondendo, mas não, ele me surpreendeu quando disse que passaria por um psicólogo, que cuidaria dele para assim poder cuidar de mim. Acho que se isso não é uma prova de amor, de que ele realmente me quer, não sei mais o que seria. Em contrapartida, eu também tenho que procurar por ajuda, preciso me libertar desse medo de perder as pessoas. Eu mereço amar e ser amada sem reservas nenhuma, mas para me jogar nesse sentimento que só esse homem desperta, preciso me cuidar. A campainha toca e eu corro para atender, antes dou uma última olhada para ver se tudo está perfeito. Arrumo a mesa da entrada, endireito a plaquinha e sorrio para tudo o que eu fiz. Abro a porta e vejo a tropa esperando.
— Boa noite! —Todas dizem juntas. — Boa noite namorada do Juju! —Alexia e Lou dizem juntas me fazendo rir. — Boa noite meninas, sejam muito bem vindas a nossa festa do pijama. Podem entrar e espero que gostem de tudo. — Oi norinha! Vamos às apresentações da minha quadrilha, Maria você já conhece, Alicia minha princesinha, Gaia a terrorista e a raspinha do tacho Alexia e meu mini príncipe Vitinho. Luna, filha da Katrisca e do meu irmão Dylan. Mini e Joy, filhas da Hanna e do Don. Olivia e Lou, filhas da Lila e do Otávio. Não se deixe enganar pelas carinhas de anjos, elas são uns verdadeiros demônios, principalmente se estiveram reunidas. —Yza diz rindo e fazendo caretas para as meninas. — Podem entrar na mesinha de entrada tem várias sacolas com o nome de cada uma, espero que gostem. Podem se trocar no meu quarto, terceira porta a direita. Elas saem correndo e só escuto os gritos das menores, falando que tudo é lindo, que tem balão. Sorrio pelo jeito eu agradei a todas. — Obrigado por convidar as meninas, elas ficaram meio enciumadas, porque só as bebês foram convidadas. Se elas se tornarem demais é só me ligar que venho buscá-las. E aproveitando que estou aqui, você está sendo intimada a passar o final de semana prolongado na fazenda dos meus pais. Vamos amanhã depois do almoço, se você recusar é bem capaz da minha mãe vir te buscar. — Obrigado pelo convite, amanhã de manhã te dou a resposta. Como você já sabe, meu padrinho está morando comigo e não quero deixá-lo sozinho. Vou falar com ele e depois te respondo. — Aceito isso, agora me deixa ir. Meu Ursão está me esperando para uma noite de romance! —Yza diz animada me abraça e sai correndo para o
carro. Assim que fecho a porta, Alexia e a Lou aparecem vestida com os seus pijamas e segurando os apliques coloridos. — Querermos um penteado igual ao seu, pode fazer, por favor? — Alexia pergunta balançando o aplique. — Claro que faço! Vamos lá, na sala. Me sento na cama improvisada e a Lou é a primeira a ser penteada. Aos poucos as outras meninas vão aparecendo e se acomodando nos colchões, todas vestindo os seus pijamas de unicórnio e o Vitinho com sua samba canção e uma regata branca. Todos estão lindos! — O que iremos assistir ou fazer? —Gaia pergunta curiosa. — Bem, separei vários canais de música e reservei muitos filmes. Ali naquela caixa grande rosa, tem maquiagens, esmaltes e várias outras coisas. Luna assim que ouviu a palavra maquiagem, correu e se agarrou na caixa. Maria ajuda a prima a trazer a caixa para o colchão e todas vão ver o que tem dentro. Mostro onde está o controle da televisão e Olivia, coloca em um canal de música pop e começa a dançar pela sala. Eu termino o penteado da Lou e começo a fazer na Alexia. — Namorada, o Juju ficou bem triste porque você não deixou ele vim. Tadinho do meu irmãozão, só queria brincar de maquiagem também. — Alexia diz fazendo bico e depois cai na risada. —— Hoje não, a festa do pijama é só das meninas. Outro dia ele brinca de maquiagem. Faço penteado em todas as meninas e depois cada uma pega uma maquiagem e esmaltes e começam a brincar. Olivia me puxa para dançar com ela e vira uma festa só. Percebo que o Vitinho está sentado quietinho, enquanto a Gaia está pintando a unha. Eu me aproximo e me sento ao seu lado.
— O que foi meu bem, não está se divertindo? —Pergunto preocupada. Yza me contou por alto a história dele, Gael está correndo atrás da papelada para adotá-lo. Os pais são uns filhos da puta, ladrões e que fugiram e largaram o menino sozinho. Graças a Deus, a Yza inventou uma desculpa e o buscou em casa. Os pais iriam colocá-lo na rua só por ele ser gay ou achar que é. Nessa idade é tudo confuso, principalmente se a criação for uma merda aí que fode tudo mesmo. Ele parece ser um menino tão bonzinho, alegre e muito amigo das meninas, não entendo como existem pais capazes de algo tão cruel. Yza me contou a forma que o pai dele o tratou na frente dela, a diferença das roupas deles para as que o Vitinho usava. — Nada, a festa está linda e eu amei o presente que você me deu. Só queria ser menina, assim poderia brincar com elas, pintar as unhas sem parecer estranho. Não quero que deixem de gostar de mim por que sou diferente, meus pais tinham vergonha de mim e me mandaram embora de casa por causa disso. —Ele diz baixinho, sobre o olhar atento da amiga Gaia. — Você não precisa ser o que você não é, meu amor. Aqui estão todas as suas amigas e eu também quero ser uma delas. Seus pais que são errados e não você Vitinho, a obrigação de um pai é amar o filho, cuidar e proteger ele. O que os seus pais fizeram foi errado, você tem apenas dez anos e não tem culpa por se sentir diferente dos outros. As pessoas têm que gostar da gente do jeitinho que somos; nunca devemos mudar por ninguém. A vida é difícil, muitas pedras aparecerão no seu caminho, mas você será forte e resistirá a tudo! Você tem uma nova família, amigas incríveis e terá a mim. Sempre que quiser conversar, pode me procurar ou me ligar. Vou ser tipo sua fada madrinha. Você quer? — Sabe; eu nunca tive pessoas que se preocupassem comigo, que me
fizesse um carinho ou me desse um abraço. Eu encontrei isso na Gaia, e agora com a família dela. Para os meus pais, eu era um peso morto, um pecador, tudo por me sentir diferente, mas eu não tenho culpa de ser assim, de não gostar de fazer as mesmas coisas que eles. São poucos dias, mas nunca me senti tão bem como agora, depois que os pais da Gaia me acolheram. Nunca tive roupas novas, sapatos novos ou comida boa, lá em casa eu comia o que sobrava. Primeiro meus pais e irmão comiam e o que sobrava era meu e quase nunca sobrava. Obrigado por me oferecer a sua amizade e por querer ser minha fada madrinha. — Ele diz sério demais para um menino tão novo. — Eu sempre vou estar com você, sempre vou cuidar de você. Não deixe que o que seus pais te fizeram machucar seu coração. Deus é grandioso e lá na frente eles pagarão por tudo isso. Você é novo, está na fase de descobrir as coisas e aprender sobre tudo, hoje você se sente diferente, mas amanhã tudo se encaixará nos seus devidos lugares. Sabe o que aprendi? Que o diferente ou o imperfeito nem sempre é uma coisa ruim. Agora vamos animar, que cor você mais gosta? — Preto e azul às vezes rosa Pink. — Ok! Me levanto e pego um esmalte rosa e outro preto, volto a me sentar ao seu lado e pego sua mãozinha trêmula e coloco no meu colo. Pingo uma gota do esmalte preto e outra gota de rosa, com a ajuda de um palito começo fazendo uma mistura, mesclando as duas cores e ficou lindo. — Você pode pintar assim ou assim. —Falo e mostro as alternativas em outro dedo. Passo uma camada de esmalte preto, uma camada de rosa em outra de preto. Com a ponta do palito, vou fazendo riscos e deixo com a aparência de terra rachada.
— Eu quero também! —Luna e Maria gritam e só então percebo que as meninas se aproximaram. — Faço em todas é só escolher a cor. Elas saem correndo e eu termino de pintar as unhas dele, que sorri de orelha a orelha. Assim que termino, ele corre para se olhar no espelho. — Obrigado pelo que você fez pelo Tinho. Ele já foi muito maltratado por se sentir diferente, mas eu o farei entender que ele é especial do jeitinho dele. Obrigado Vida. —Gaia diz emocionada. — Não precisa agradecer meu amor, é o que as fadas madrinhas fazem. Eu te ajudarei a cuidar dele e mostraremos ao seu Tinho que ser diferente nem sempre é ruim. Pinto as unhas de todas e depois vou pegar os salgadinhos na cozinha. Assim que estou chegando à sala com a travessa, a campainha toca e eu mudo de direção e vou atender. Abro a porta e fico de boca aberta, Júlio, Valentin e Vicente, estão na minha porta vestidos com samba canção igual à que comprei para o Vitinho. A carinha que os dois pequenos estão fazendo me deixa derretidas. — Oi Colorida. —Júlio diz sorrindo. — O... o que você veio fazer aqui, Rabugento? — A culpa é nossa, nós estávamos tristes porque você não nos convidou. Eu falei com o meu primo, que você não gostava da gente e ele disse que eu entendi errado. —Valentin é o primeiro a responder. — Isso mesmo. Nós achamos que você não gostava da gente e por isso não nos convidou, mas o meu primão disse que tinha sido um engano, olha! Ele até comprou pijamas com o tema da festa. —Vicente diz animado e me dá um sorriso enorme. —É claro que eu gosto de vocês, é que a festa era para as meninas porque só tem coisas que meninas gostam; maquiagem, esmalte, penteados.
Não tem nada de meninos e por isso não chamei vocês. Mas podem entrar, tem muitas coisas gostosas. Vocês me perdoam? Jamais imaginei que ficariam tristes ou que pensariam isso. Só de ouvi-los falar me deu uma tristeza. Jamais imaginária que eles iriam pensar isso! — Obrigado prima! —Valentin diz sorrindo, piscando um olho e eu me apaixono por ele. Eles entram correndo e as meninas fazem um coro animado. Júlio entra e eu fecho a porta e olho para o sorriso cafajeste em sua cara linda. — Você fez isso de propósito, não é? — Minha cara e linda namorada Colorida, no amor e na guerra vale tudo. —Ele diz e me beija rapidamente e rouba um salgadinho e sai andando na minha frente. —Juju! Vem, eu e a minha Lou vamos maquiar você. A Lou passa a maquiagem e eu faço um penteado lindo de viver! —Alexia diz animada e acaba me dando uma ideia. — Ótima ideia Alexia! Eu também vou ajudar, enquanto vocês fazem isso, eu vou pintar as unhas dele. —Falo diabolicamente e o vejo engolir em seco. Vou pintar as unhas do Rabugento, com muito, mais muito glitter. E darei a maquiagem cheia de brilhos para a Lou maquiar ele. Vou usar a mesmas palavras que ele usou. No amor e na guerra vale tudo, meu caro e lindo namorado Rabugento!
Maquiagem com brilho ok. Esmalte com glitter e coração ok. Gel com glitter rosa ok Júlio, Valentim e Vicente, devem estar amaldiçoando até a última geração dos Reed! Bem feito, não mandei usar meu coração mole para fazer chantagem emocional. Olivia tem um grande poder de persuasão sobre Vicente e, o mesmo contou o plano maligno que o Rabugento e Valentim armaram. Tudo bem que o delator fez parte da armação, mas ganhou um ponto quando entregou os primos. Foi engraçado ver a cara dos meninos, quando as meninas se reuniram para nos vingar desses infames. — Acho que não tem necessidade de usar maquiagem, não é meninos? —Júlio diz tentando fugir do seu castigo, mas as duas mascotes não deixam. — Ah não Juju, tem que brincar com a gente! Nós somos suas
meninas bebês, não é? — Lou diz sorrindo apaixonada e eu tenho que segurar o riso. — Mas nós somos homens, Lou! Você vai fazer isso com o seu Tintim? Eu não sou mais seu príncipe? —Valentim diz, tentando usar o amor das meninas por ele. Tenho que dar meu braço a torcer, esse menino quando crescer vai ser o terror da mulherada. Sua piscadinha, junto com seu sorriso de lado, será sua marca registrada e coitada da mulher que aparecer no caminho desse garoto. Valentim Reed; deixará um rastro de corações partidos. — Nem vem que não cola, você sabia muito bem que era uma festa de meninas e mesmo assim quis vir. Como diz meu vô, deitou na cama agora aguenta Valentim Reed! —Mini, filha da Hanna diz cheia de marra. Depois de muitos protestos por parte dos meninos, acabamos vencendo eles pelo cansaço. Mini, Joy, Gaia e Luna, ficam com Valentim e Maria, Olivia, Alicia e Vitinho, ficam om Vicente. Já eu, Alexia e Lou ficamos com o Rabugento. Ele até tenta usar aquele olhar de cachorrinho arrependido, mas endureço meu coração e sigo com o plano diabólico. Júlio é o que mais vai se ferrar nessa história, quem mandou usar as crianças contra mim! Corro até meu quarto e pego meu estojo de maquiagens profissionais e um óleo corporal cheio de brilho, essa maquiagem é muito boa. Amanhã quando ele chegar na fazenda, ainda terá brilho em seu corpo, principalmente na unha! Sabe aquele esmalte de glitter da Avon, sim aquele que não sai nem com um vidro de removedor? Bem, é esse que usarei no Rabugento, ele vai aprender de um jeito bem brilhante a não armar contra mim. — Lou, trouxe uma coisa bem legal para você usar no seu primo. Olha que linda essas cores de maquiagens? Pode usar todas as cores se quiser. Alexia meu amorzinho, Olha esse gel e esse óleo que eu achei! O
óleo, você pode usar para fazer uma massagem no seu irmão, igual no SPA. Olha que cheiro gostoso de tutifruti, seu irmão vai ficar muito cheiroso. — Falo, animada, enquanto Júlio me fuzila com o olhar. — Muito linda essa namorada! Eu achei um monte de elastiquinho colorido, vou fazer um penteado muito maravilhoso! Não se preocupa Juju, você vai ficar muito lindo para a sua namorada. — Você não acha que é brilho demais, Vida? Como vou fazer para tirar tudo isso? — É só usar demaquilante, Júlio. Sai rapidinho e também, nada que água e sabão não tire. —Maria diz rindo e pisca para mim. Foi uma bagunça só, as meninas capricharam na maquiagem dos dois menores, enquanto eu e as mascotes enchemos o Júlio de glitter. Enquanto estávamos perdidas nos divertindo maquiando os meninos, Gaia ia à forra tirando várias fotos e mandando no grupo da família. Meu celular começou a apitar igual doido foi quando eu vi o que a terrorista fez. Dylan ficou revoltado, mas ele foi o único, o restante se divertiu muito e até pediram para fazer uma transmissão ao vivo. Essa família é muito doida, Hanna e Lila começam a fazer montagem com as fotos e enviar, deixando o pai dos meninos malucos. Quando Gaia vira o celular para o Júlio, o povo vai à loucura. Além de estar brilhando, sua cara está carregada de maquiagem de todas as cores, seus cabelos com vários elásticos coloridos. Os meninos acabaram entrando na brincadeira e todos se divertiram. Eles se juntaram as meninas e começaram a dançar as músicas que a Olivia colocava. Eu me encosto na pilastra para observar eles brincando e se divertindo, presto ainda mais atenção no Vitinho e vejo a diferença de quando ele chegou e agora. Ele está feliz, brincando sem medo do que vão pensar e o incrível é a
forma que o Valentim e o Vicente o tratam, não existe um pingo de preconceito e é justamente nessa idade que essas coisas começam. Isso só demonstra que o preconceito não nasce com a gente e sim é ensinado, os Reed estão fazendo um ótimo trabalho na criação dessas crianças, é lindo de ver e chega a emocionar. — Você é uma garota má, Colorida! —Júlio diz me abraçando por trás. — Sou nada, se eu fosse teria colocado você e os meninos para correr, assim que o Vicente contou o plano de vocês. Que feio Rabugento, usando duas crianças para conseguir o que quer. Ele está muito engraçado, todo cheio de brilho, até batom a Alexia passou. Ela lambuzou o irmão de óleo de corpo, de gel, Júlio está parecendo vômito de fada encantada, se é que existe isso. — Depois de tudo o que você me fez passar, eu bem estou merecendo um beijinho que não ganhei até agora. As crianças estão distraídas, vamos esquentar uns salgados para eles e fugimos um pouquinho. O que acha? Já perceberam como esse homem está mais cara de pau? Todo saidinho, cheio de segundas intenções, se com uma sessão de terapia ele já está assim, imagina quando estiver na décima! Será sexo em tudo o que é canto. Aleluia irmãs. — Não posso, vai borrar a sua maquiagem divina que a Lou fez. — Falo rindo e ele morde meu ombro e me puxa para o corredor. Júlio não tem um pingo de paciência, não sabe brincar! Ele está com a mania de me jogar na parede e foi isso o que ele acabou de fazer. Júlio me beija com vontade, como se não me beijasse há séculos e isso é uma tortura para alguém como eu, sedenta por um carinho mais ousado, se é que me entende. — Olha que bonitinho, o Juju namorando a vidinha dele! —Alexia
diz e vários risinhos surgem junto com o dela. — Viu Luna, meu irmão também tem uma vidinha só dele. —Alexia! Deixa de ser estraga prazeres. —Maria diz e puxa a irmã para a sala. — Me solta! Credo nem pode achar bonitinho o meu irmãozão namorando. Quando eu escutei que você beijou o Elton, eu também achei lindinho, eu não vi e nem contei. Mas a Luna viu e ainda disse que ele era lindo, eu não acho não, ele fala cuspindo. —Alexia solta e, o corpo do Júlio fica tenso na mesma hora. — Como é.... — Crianças, eu e o Júlio vamos esquentar os salgadinhos, também tem mini pizza. O que vocês vão querer? —Pergunto e empurro o Rabugento modo Hulk para a cozinha. As crianças gritam mini pizza e salgadinhos ao mesmo tempo. Bom... pelo menos manterei o Júlio ocupado. Eita homem ciumento! Dou uma última olhada para as meninas e vejo Luna levando a Alexia pela mão, mas Maria me olha preocupada. — Vá não se preocupe que vou domar a fera, mas depois é bom você conversar com ele ok? — Obrigado Vida. Amanhã vou ter que conversar com ele e meu pai e se ele estiver mais manso já ajuda. —Ela diz com um sorriso sem graça. Quando entro na cozinha, Júlio está com o telefone na orelha e aposto que é ligando para o pai. Tomo o celular das suas mãos e corro para o outro lado do balcão, o Rabugento me fuzila com os olhos, entretanto, ele está tão engraçado que acabo rindo. — Me devolve o telefone, Colorida! Não estou achando graça nenhuma. Ela está achando que vai passar batido, mas não vai não, vou contar para o meu pai.
— Você se acalmaria se ganhasse um beijinho? —Pergunto e ele me olha feio. — Ok, dois beijinhos e um cafuné? — Não, você pode, por favor, me devolver o celular, Vida. — Não devolvo, o que você vai fazer é feio. Ela é sua irmã, mas é uma adolescente também, é normal ela beijar, namorar, se interessar por garotos. Pelo amor de Deus, a Maria tem dezesseis anos Júlio! Sua mãe disse que ela é uma menina maravilhosa, tira boas notas, ajuda com as irmãs, qual é o problema? — Ela não tem idade para namorar! O mundo é feio, Vida, e se algum engraçadinho fizer mal a ela? E se eu não estiver perto? E se for tarde demais? —Ele diz super preocupado e então eu começo a entendê-lo. Dou a volta na bancada e fico na sua frente, estendo o celular para ele que pega com as mãos tremendo. Levo minhas mãos ao seu rosto e faço um carinho, ele respira fundo e deita seu rosto na palma da minha mão. — Nada vai acontecer com a Maria, querido. Você sempre estará lá para protegê-la, para zelar por ela e botar para correr qualquer engraçadinho que se meter a besta. Você não é mais um menino indefeso Júlio, agora é um homem forte e capaz de tudo para proteger quem você ama. —Falo e ele me olha assustado. — Não é difícil ligar as coisas, mas esse não é o momento certo para falar sobre isso. — Você não entende... ela é uma menina ainda, não tem que pensar em nada que não seja os estudos. — Ela é uma menina linda de dezesseis anos, está passando por aquela fase curiosa, está se descobrindo mulher, o próprio corpo e, isso acontece com todas as meninas, Júlio. Ela entende o que é certo ou errado, sabe até aonde pode chegar ou não, Maria foi criada por pessoas maravilhosas, você ajudou na criação dela e, ainda ajuda, como ela poderia ser diferente?
— Continuo não gostando e ainda vou contar para o meu pai e isso vai sair muito caro para você, Colorida. —Ele diz e me abraça apertado. — Mesmo não gostando, obrigado por ter ficado ao lado dela, isso diz muito sobre quem você é. Só tenho medo que alguém a machuque, que tire proveito dela. Não sei do que seria capaz de fazer se isso acontecesse, eu... eu... — Não vamos imaginar o pior, Rabugento. Agora que você já se acalmou, vai ganhar um beijinho em forma de pagamento. — Nem vem, isso merece muitos beijos! Eu já falei que ele anda impossível?
Eu tenho purpurina até dentro do ouvido! Minha barba brilha quando alguma luz bate, meus cabelos ainda estão duros de tanto gel que a Alexia colocou e minhas unhas! Eu gastei dois tubos de removedor e ainda tem brilho embaixo delas. A maquiagem eu consegui retirar, mas também gastei o tal do demaquilante caríssimo, palavras dela e não minha, que a Colorida tinha, mas também, bem feito quem mandou ela dar ideia para a minha irmãzinha? Valentim e Vicente estão me olhando com muita raiva e pode ter certeza que o senhor pestinha está bolando um plano maligno para se vingar de mim. A filha de uma boa mãe da Gaia filmou e tirou fotos e postou no grupo da família, aí já sabe né? A zoação será infinita, ainda mais quando eu chegar à fazenda todo cheio de glitter. Mas valeu a pena, pelo menos dormir com a minha namorada, tudo bem que a peixinha dormiu o meio. Agora estamos indo para a casa dos meus pais e, isso aconteceu somente depois que o Roger chegou da gandaia e a Vida conversou com ele. Ela não queria ir e deixá-lo sozinho, mas ele logo disse que tinha
planos com a nova gatinha dele e a Colorida ficou morrendo de ciúmes. Tivemos que dividir as crianças no meu carro e no da Colorida, para minha mãe foi fácil já que ela tem um DOBLÔ de doze lugares, quem mandou ter tantos filhos e sobrinhos! Comigo vieram Vicente, Luna, Olivia, Joy, Alicia e a Lou. Com a Vida estão, Maria, Gaia, Valentim, Mini, Vitinho e a Alexia. Ficou apertado, mas coube todo mundo, ainda bem que a casa dos meus pais não fica muito longe. —Juju, você sabe que meu irmão vai se vingar, não é? Aquele garoto é o maior obtuso que tem nessa família toda. Ele adora aprontar com os outros, mas quando é com ele as coisas mudam de figura. —Luna diz rindo e Vicente a manda ficar quieta. — Mas não foi culpa minha, eu não sabia que a Vida iria aprontar aquilo. Ela é a culpada e não eu! — Muito maduro colocar a culpa na menina que nem está aqui para se defender, que feio Júlio Cesar! —Olivia diz rindo e joga um papel na minha cabeça. — Ela é a sua Colorida, garoto você tem que defender ela do demônio da tasmânia. — E quem disse que não vou defendê-la? Vocês são umas intrometidas. — Não pode brigar Juju, somos suas nenéns. —Lou diz defendendo a irmã. — Desculpa meu amor, mas só você e a peixinha são minhas nenéns agora, as outras são tudo obtusas. Chegamos à casa dos meus pais e sabe aquelas cenas dos desenhos animados, onde sai um monte de gente do fusca do palhaço? Foi bem assim que pareceu quando abrimos as portas dos carros. Meu pai ouve a algazarra e vem abrir a porta, quando Alexia voa para os braços dele.
— Primeiro beijo é meu que sou neném do papai! Ficou com saudades Ursão da minha mamãe? Agora eu já cheguei e você pode ficar doidinho de D'Ávila. Minha Lou também veio e nem pode falar que estou de castigo viu. —Alexia desembesta a falar e meu pai olha todo apaixonado para a raspinha do tacho. — Olá minha peixinha linda, deixou o papai dormir sozinho. Oi criançada, dormiram bem? E meninos, vocês ficaram uma graça maquiados. —Meu pai tira sarro, fazendo os meninos fumaçarem de raiva. As crianças entram correndo e eu seguro a mão da Colorida e a puxo para entrar em casa. — Será que o Dylan vai querer me matar? Já estou querendo desistir de ir para a fazenda, acho que entre o Valentim e o Dylan, minha morte está decretada. —Vida fala e finge estar com medo. — Vai nada, eu te defendo, Colorida. A tia Baby não vai deixar ele te matar, ela gostou muito de você. Minha mãe nos recebe cheia de energia, pelo visto a noite foi boa e eles conseguiram se divertir. Eles sempre arrumam um jeitinho de saírem juntos ou com os meus tios e, quando é assim, as crianças ficam comigo ou vão para a fazenda. — Bom dia meu casal da vida toda! Júlio, você é igualzinho ao seu pai, enquanto não se enfiou na casa da Vida, não sossegou o rabo. Achei bem feito viu, ela deveria ter descolorido o seu cabelo, só assim você iria aprender. — Mãe! A senhora tem que ficar do meu lado, ela é uma sem coração que me ignorou o dia todo ontem. Cadê aquele amor pelo seu ursinho? Cadê aquela felicidade por que estou namorando? Pai eu tenho uma coisa para te contar, aposto que minha mãe já sabe! — O que? —Meu pai pergunta curioso e minha mãe vem correndo e
pula no meu colo, ela é tão doida que quase derruba a Colorida. — Você cala a sua boca, Júlio Cesar ou eu vou até sua casa e confisco todos os seus papéis e lápis, vai ficar de castigo por um mês sem desenhar! Vocês têm que parar com essa merda, minha filha já tem idade o suficiente e acho bom você ficar quieto garoto, ou te coloco de castigo pior do que ficar sem papel. —Minha mãe diz baixinho em meu ouvido e eu sorrio para a sua ameaça. — E o que a senhora acha que seria pior? — Você está me desafiando, Júlio Cesar D'Ávila Reed? —Ela diz em tom de ameaça, tentando me colocar medo. Eu sei que minha mãe é doida, mas ela nunca cumpriu quando me ameaçava de tirar os meus desenhos. — Vamos lá mamãe, a senhora nunca cumpri com suas ameaças. Tirar meus papéis não adianta mais. Falo rindo e olho para o meu pai que está desesperado fazendo mímica com os braços. — Mal jogada garoto, já não falei para você não desafiar a sua mãe? — Crianças! Todo mundo para o carro, meninas as mochilas de vocês estão no carro do papai. O restante da quadrilha, suas mães vão levar as coisas de vocês para a fazenda! 1,2,3... vamos, vamos, vamos. —Minha mãe começa a gritar ordens e antes de me soltar, sorri diabolicamente. Esse sorriso me dá até um calafrio na espinha e isso só piora, quando ela olha para a Vida e depois para mim. Dona Yza Reed pisca os olhos faceiros para o meu pai, que só balança a cabeça e me olha com pena. — Seja lá o que você queria me contar, não valerá à pena o que sua mãe vai aprontar. Meus pêsames filhão, você acabou de cutucar a onça com vara curta. Agora aguenta o rojão. —Meu pai diz rindo e me dá três tapas nas costas.
— É... Colorida, o que acha da gente ficar por aqui mesmo? — Pergunto me borrando de medo do que minha mãe vai fazer. — Ah não, nós vamos para a fazenda sim senhor. Não ligue para ele norinha linda, você vai amar passar o feriado com a gente. Ainda mais depois que eu contar da viagem que estou querendo fazer e claro, que pretendo te levar. Sabe quando você começa a querer voltar no tempo? Sou eu nesse momento, minha mãe acabou de descobrir que os papéis e lápis não são mais o meu ponto fraco. Dona Yza D'Ávila Reed, acabou de achar um ponto mais fraco ainda. Vida Martins, mais conhecida como minha Colorida. — Viagem, jura? Eu amo viajar, nem sei para onde é, mas já estou dentro. Puta que pariu mil e quinhentas vezes, eu estou muito fodido da vida toda!
Minha mãe só pode estar de palhaçada! Um final de semana todo em um SPA em Sorocaba e se não bastasse levar as mulheres da família, ela ainda quer arrastar a Colorida. E você acha que a Vida achou ruim? Lógico que não, a maluca está agora sentada com a minha avó, falando sobre um cassino em Buenos Aires e meu avô está me olhando feio como se eu fosse o culpado. — Não me olhe assim vovô, a culpa disso tudo é da sua filha. E vocês que estão aí rindo, vou só esperar a notícia se espalhar e suas esposas virem dizendo que vão também! Na mesma hora a risadinha acabou e meu pai foi tirar a minha mãe de perto da minha namorada. Essas duas juntas; não vai dar certo, é muita maluquice para duas pessoas só. Vejo o exato momento em que minha avó levanta do lado da Vida e minha tia Lila caminha até ela. Eu começo a levantar, mas Otávio me segura, me impedindo de ir até minha namorada.
— Sossega seu rabo garoto, você acha que a Lila vai fazer o que? Expulsar sua namorada daqui? —Otávio diz com a cara fechada. — Não é nada disso idiota, só fico preocupado com as duas. Não é um assunto fácil para a Colorida falar da família dela, muito menos para a Lila falar da Agnes. E sem contar que a sua mulher não pode passar nervoso, pois se você se esqueceu, ela está grávida. Eles agem como se eu quisesse colocar a Vida numa redoma de vidro e ficar com ela só para mim, mas só quero protegê-la para que não sofra com as coisas do passado. — Senta Júlio! —Meu pai diz sério. — O que o Tavinho está tentando dizer, é que você precisa deixar as duas conversarem em paz, sua tia ficou muito sentida e se sentindo culpada por tudo o que aconteceu com os pais da sua namorada. Sei que você se preocupa com ela, que quer proteger sua Colorida, mas acho que essa conversa fará muito bem a ela. Então senta e pega uma cerveja e sossega esse rabo possessivo! — Até agora, meu neto está dando de dez a zero em vocês meninos, no que diz respeito a ser possessivo e protetor. —Minha avó diz rindo e bagunça meu cabelo. — Deixa a sua menina conversar, meu amor, nenhum de nós faria mal a ela, principalmente por saber o que você sente por ela e tudo o que ela está fazendo a você. Ela está segura conosco amor. — Eu sei vovó, mas às vezes acabo esquecendo. Me perdoa ok? — Muito ok da vida toda! —Meus tios falam juntos. — Vamos Rabugento, vamos jogar bola com as crianças. —Meu tio Dylan diz. E passo a próxima hora jogando com as crianças, Valentim é ardiloso e toda hora chutava as minhas canelas. Eu amo os finais de semana com a minha família, amo quando todo mundo se reúne na fazenda e nos esquecemos do mundo lá fora. Fazemos fogueira, montamos barracas e
dormimos a luz da lua. Mini e Valentim contam estórias de terror, Olivia liga a caixinha e dança pelo quintal, os mais velhos ficam namorando e olhando a bagunça das crianças. Essa é a primeira vez que passarei o final de semana acompanhado e confesso que está sendo incrível. Deito na grama morto de tanto correr atrás das pestinhas, mas não fico sozinho por muito tempo. Vida se deita ao meu lado e fica olhando para o céu. — Está tudo bem? —Pergunto preocupado e olho para o seu rosto. Ficamos nos olhando por longos minutos, ela toda séria e eu logo começo a ficar preocupado. — Pare de se preocupar, Júlio. Eu estou bem, realmente bem. Acho que precisava dessa conversa com a Lila, estava me sentindo insegura a respeito de como ela iria me tratar. Aprendi a gostar muito dela e não queria perder a sua amizade. Nós não temos culpa de nada, nem eu e nem ela, muito menos a mãe dela, entende? — Impossível não me preocupar, Colorida. Tudo o que faço na vida, desde que te conheci é me preocupar com você, em como está se sentindo, se comeu, se teve pesadelos. Ela sorri e beija meus lábios delicadamente, mas muito rápido para o meu gosto. — É, só eu sei quanto amor eu guardei, sem saber que era só pra você. É, só tinha de ser com você, havia de ser pra você, senão era mais uma dor, senão não seria o amor, aquele que a gente não vê. O amor chegou para dar o que ninguém deu pra você. O amor que chegou para dar o que ninguém deu pra você. É você que é feito de azul, me deixa morar nesse azul, me deixa encontrar a paz, você que é bonito demais. Se ao menos pudesse saber, que eu sempre fui só de você, você sempre foi só de mim.
Ela canta uma música que nunca ouvi antes e tudo isso olhando nos meus olhos. Quando ela termina e abre o maior sorriso do mundo, o meu sorriso, eu me sinto completo, como só ela é capaz de me fazer sentir. — Quem canta essa música? — Elis Regina, minha mãe era apaixonada por MPB e quando ela estava em casa só tocava isso. Elis, Tom Jobim, Cazuza. O que? Achou que eu só conhecia música fuleira? Vida também é cultura; Rabugento. —Ela diz gargalhando alto e eu fico feito um idiota, sorrindo como um bobo apaixonado. Apaixonado? Será? — Você já se apaixonou antes? —Pergunto e ela me olha espantada. — Por um homem? Acho que não, antes dos meus pais morrerem eu namorava um idiota, mas não era apaixonada. Não como os livros contam ou como era o casamento dos meus pais. Mas por que a pergunta? — Eu acho que estou me apaixonando por você. — Você acha? Como diz a Luna, tão bobinho esse Rabugento! Eu tenho certeza que você me ama Rabugento, como não amar uma coisinha linda e colorida como eu? Sou apaixonante e por isso você não vive sem mim. —Ela diz rindo, me rouba um beijo e sai correndo antes que eu a agarre. Sim, como não amar uma coisinha linda e colorida como ela? IMPOSSÍVEL. Me levanto e vou atrás da minha Colorida e a encontro correndo atrás da peixinha. Sento no Puff enorme que tem no quintal e fico olhando elas correndo de um lado para o outro. Fico perdido rindo da cena que só noto que alguém se aproxima, quando deita ao meu lado. Minha Maria... — Sabe que a senhorita está encrencada, não é?
— Deixa de ser chato, foi só um beijinho e roubado, mas eu vou contar para o meu pai e não você, senhor intrometido! Agora vamos falar da sua Colorida. Sorrio, a cada dia que passa, Maria fica mais marrenta. — O que você quer saber? — Você está feliz, não é? Seus olhos brilham você sorri mais, não está tão mandão. Eu gosto de te ver assim, você é a pessoa mais importante da minha vida e só quero te ver feliz. ——Ela diz emocionada, com os olhos cheios de lágrimas. — Ei! O que foi ursinha, por que está chorando? Você sempre será a pessoa mais importante da minha vida, não há nada no mundo que eu não faça por você Maria. — Não sei por que estou chorando, só senti vontade de dizer que eu te amo. Sei que não falo isso sempre, que estou crescendo, mas eu sempre vou amar você meu pedacinho possessivo. Estou feliz que a Vida é sua namorada, ela é doidinha, mas para namorar você tem que ser! — Ela é doida mesmo, não é? Ela está me fazendo bem, aos poucos estou me sentindo uma pessoa normal, inteiro. — E eu a amo por isso, mas tem uma coisa. — O que? — Você não é normal Ursinho da mamãe, você é um pé no saco isso sim! —Ela diz rindo e sai correndo e eu vou atrás. —PAI! ME SALVA. —Ela grita pelo meu pai, como sempre faz quando me provoca. Meu pai só balança a cabeça em negação e abre os braços para agarrar minha irmã, que pula em seu colo rindo. — O que você aprontou Ursinha? — Nadinha, só disse a verdade. O senhor mesmo diz que é feio
mentir. —Ela diz gargalhando alto. — Não Juju! Pai me protege. São momentos assim que me sinto um menino normal, mesmo já estando velho, volto a ser um menino que dezesseis anos. Um que eu deveria ter sido e não pude.
— Onde você está me levando, Rabugento? Já escureceu os meninos montaram barracas e sacos de dormir para as crianças, fizeram fogueira e tudo. Realmente essas crianças têm uma família incrível. Assamos milho, fizemos pipoca, Belle fez vinho quente e pediu pizza para todos. — Vamos dar um passeio, deixa de ser curiosa. — Impossível não ser curiosa, você está com a cara do lobo mau quando foi atrás da Chapeuzinho Vermelho. Só que você não quer os doces da vovó! Lobo safado. Quando ele disse que estava se apaixonando por mim, eu quase tive um treco. Pensei que meu coração sairia pela boca de tanto que batia acelerado. Ele acha apenas, mas eu tenho certeza e não é só ele não viu! Eu também estou completamente apaixonada por ele. Cansei de fugir, cansei de esconder, ninguém ganha nada fugindo da vida e do destino. Se for para me foder que seja com categoria, né não? Entramos por uma trilha que leva até a beira do rio e ele me leva até um enorme tronco, mas quando vou sentar o infame me puxa para o seu colo. Esse homem quer meu corpinho, como sei? Por que tem algo duro cutucando minha bunda. Algo muito, muito duro. Eu tento me controlar, juro por Deus que eu tento, mas a minha força
de vontade é bem, mas bem pequena e acabo dando uma leve rebolada. — Vida... — O que? Ninguém mandou me puxar para sentar nesse tronco duro! Estou tentando ficar confortável. — Eu te puxei para sentar no meu colo, justamente pelo tronco ser muito duro e estar gelado. —Ele diz rindo. Lindo demais! — Sei em compensação me senta em outro tronco duro e quente! Júlio Cesar, você está ficando tão descarado. — O que posso fazer, a culpa é sua. Ficamos em silencio por alguns minutos, só admirando a quietude do lugar. A fazenda é enorme e muito bem cuidada. Há vários animais, tem até mesmo uma vaca e ela ainda dá leite! Meu sonho é tirar leite da vaca e amanhã vou fazer isso com a Luna, já que ela é a dona de todos os bichos. — É tudo tão lindo aqui, as crianças amam vir aos finais de semana né? — Desde sempre os finais de semana são aqui e é sempre essa bagunça. Mesmo quando era somente a Luna, Maria e eu, essas duas corriam isso tudo, então as crianças foram nascendo, crescendo e se tornou essa loucura. — Mas você ama essa loucura, você parecia um menino jogando bola com as crianças. É gostoso te ver sorrir, gargalhar, parece até outra pessoa. — Ela fala alisando meu rosto e cabelo. — Eu amo esse lugar e essa família. Aqui me sinto livre, não sei explicar direito. Não tive muitos motivos para sorrir Vida, só aprendi a sorrir quando essa família me adotou, quando vi que aqui eu estaria seguro... foi difícil Colorida. —Xiu! Não vamos falar de coisas tristes. Vamos falar sobre você ser
doidinho por mim, sobre não viver sem minha pessoa linda e colorida. Não quero estragar a nossa noite, não quero que ele pense no passado, que relembre tudo de ruim que aconteceu. — Quero tentar de novo. —Ele diz decidido e eu fico sem entender. — Tentar de novo? Mas tentar o q.... —E só então entendo o que ele quis dizer, levanto rapidamente do seu colo e me distancio um pouco dele. — Oh não, não, não e não! Ainda não Júlio; não estou preparada para passar por tudo de novo. — Só me escuta tá? Júlio levanta e vem em minha direção, eu até tento me afastar, mas ele consegue me impedir. — Não me pede isso, por favor. Vamos esperar, temos todo tempo do mundo, deixa você passar por mais umas sessões com a psicóloga, então voltamos nesse assunto. — Vai me escutar? —Eu fico quieta com o coração na garganta, mas o deixo falar. — Eu não fugi do que aconteceu entre nós, Colorida. Eu nunca me senti tão bem quanto me senti ao estar dentro de você. Não foi isso que me deixou com medo e sim o que sonhei, fugi porque estava me sentindo sujo e não queria te contaminar. Ele vai me contar! Puta que pariu. Ele me puxa pelas mãos e se senta no chão com as costas encostadas no tronco e me senta em seu colo. Suas mãos tremem, sua respiração está ofegante e eu começo a ficar com medo. — Não estou preparado para te contar tudo, nem dizer em detalhes, nem sei se um dia serei capaz disso. Você deve estranhar porque um homem de vinte e seis anos, nunca tinha transado ou não entendia de sexo, mas foram escolhas que eu fiz. Achava que o sexo era uma coisa suja e eu já tinha muita
sujeira para carregar, mas o que ajudou foi nunca ter me interessado em alguém, não até você aparecer. — Júlio... — Fui abusado pelo meu padrasto quando tinha onze anos, minha mãe tinha acabado de morrer. Isso durou anos, até meus dezesseis anos para ser mais exato. Entende a minha aversão ao sexo? Eu fui estuprado, forçado a transar com outros homens a mando dele, eu fui estuprado pelos seus amigos em troca de dinheiro, ele me vendia como uma prostituta, em meus pesadelos eu ainda escuto eles me chamarem de “viadinho”. A cada palavra que sai da sua boca, um pedaço dentro de mim se quebra mais um pouco. Consigo notar vergonha na sua voz, como se ele fosse culpado por tudo o que sofreu e ele não é! Ele tem que entender que foi vítima, não importa o que tenham falado, ELE FOI VÍTIMA! E só de pensar nesses homens a minha vontade é de matar a todos com as minhas próprias mãos. — Olha para mim meu amor. —Peço e ele me olha e é impossível segurar as lágrimas. — Você entende que foi uma vítima? Nada disso foi sua culpa ok? Você é um homem lindo e me sinto muito honrada de ser a mulher que conseguiu despertar o seu desejo. Não importa o que você passou tudo o que eu quero é você, o meu Rabugento ciumento, o homem por quem eu estou completamente apaixonada. — Não é toda vez que me sinto sujo, há dias que estou mais tranquilo, mas em outros os pesadelos vêm com força total e eu só penso merda. Como aquele dia no hotel, não teve nada a ver com você e sim comigo, em como sou errado para você. Só que não consigo mais me afastar, preciso de você como preciso de ar para respirar. Como se eu fosse capaz de me afastar dele, não agora, nem nunca. Me levanto do seu colo e estendo minha mão para ele.
— Vamos? — Para onde? Você não vai embora, não é? — Nunca, mas precisamos ir. — Ir para onde? — Ele pergunta confuso, mas se levanta e segura minha mão. — Vamos para o quarto, vou te provar que você não é sujo. Nem que eu passe o resto dos meus dias fazendo isso, mas eu vou te mostrar que não existe sujeira nenhuma em você! — O que você vai fazer? Dá para andar devagar, está escuro! — Vou fazer amor com você, senhor Júlio Cesar D'Ávila Rabugento! Vou amar cada pedacinho do seu corpo e se você reclamar, eu arrumo um jeito de te amarrar! Fim da linha senhor Rabugento, estou tomando o que me pertence. Acabou a graça!
Uma coisa é imaginar, outra bem diferente é ouvir a confirmação de um pesadelo horrível. Desde a primeira vez que nos envolvemos, quando vi o medo no seu olhar, por vê-lo sem entender as reações que eu provocava em seu corpo, eu sabia que algo muito grave tinha acontecido, porém ter a certeza que ele foi abusado por vários homens e, obrigado fazer coisas horríveis, me deixa totalmente perdida e machucada por dentro. Um menino Deus! Apenas um menino e tudo o que ele queria era ser salvo e ninguém fez isso, não até ser tarde demais. E hoje ele paga um preço muito caro por isso, ele se culpa porra, coisa que ele nunca deveria fazer. Júlio precisa entender de uma vez por todas que ele foi a VÍTIMA! Preciso chorar, preciso colocar para fora o que ele me disse, seu segredo age em mim como um veneno de uma cobra perigosa, me corroendo e deixando rastros de ódio dentro de mim. Prometi a ele e a mim mesma que iria provar de uma vez por todas
que ele não é sujo, nesse momento meu medo foi para o espaço e tudo o que importa é ele, meu Rabugento lindo. O futuro foi colocado em meu caminho, essa dádiva foi dada a mim e eu farei por merecer. Hoje ele vai entender que é meu e que nada será capaz de me afastar dele, nenhum segredo obscuro é capaz de ofuscar o que sinto por esse homem. Saio puxando-o pela mão e, ele vem calado como um menino obediente. Dou a volta na casa, não querendo que ninguém atrapalhe os meus planos. Entramos na casa no mais absoluto silêncio e vamos em direção ao seu quarto e, assim que entramos tranco a porta com a chave, aguardando alguns minutos e tentando me acalmar, fazendo força para não chorar. — Vida? — Só um minuto, ok? Você pode pegar o meu celular, por favor? Ele respira fundo e faz o que eu pedi. Júlio me envolve com seus braços e me entrega o celular, depois esconde seu rosto na curva do meu pescoço e me respira, como se meu cheiro pudesse acalmar seu coração. Ficamos assim por longos minutos, ele agarrado em mim e eu com as mãos e a cabeça apoiada na porta do quarto. — Preciso que você se sente na cama, você pode fazer isso por mim? Assim que ele se senta, eu entro na galeria do meu celular e escolho uma música perfeita para esse momento. Caminho em sua direção e deixo o celular do seu lado e me coloco entre suas pernas separadas, coloco minhas mãos em seu rosto e o levanto até que ele olhe para mim. Há tanto medo em seu olhar que é quase impossível de não me emocionar. Aliso seu rosto e sorrio para ele e beijo seus lábios delicadamente. Desço minhas mãos até alcançar o seu casaco e vou tirando lentamente, sem deixar de olhar em seus olhos um só minuto. Me ajoelho e começo a tirar seus sapatos e ele tenta me impedir, mas
com apenas um olhar, ele se cala e permanece me olhando. Tiro seus sapatos e meias e jogo longe, depois começo a desabotoas sua calça e ele levanta um pouco facilitando meu trabalho, o deixo somente de cueca e peço para se deitar no meio da cama e sou atendida prontamente. Tiro minha roupa, ficando apenas de calcinha e sutiã, seus olhos devoram meu corpo, cada pequeno pedaço dele e, meu corpo se acende. Com o celular nas mãos, subo na cama e me posiciono entre suas pernas. Aperto o play e, a música começa a tocar, enchendo o quarto com o som de Zayn e Sia. Essa música diz tanto sobre nós, tanto sobre o que eu quero ser para ele. E vou fazê-lo acreditar nisso, custe o que custar. Me inclino sobre seu corpo e beijo seus lábios, demonstrando tudo o que sinto por ele. Júlio me agarra e me puxa até que me vejo sentada em seu colo, suas mãos se encaixam na minha nuca e ele me consome com sua boca. Mas não deixo as coisas irem por esse lado, tomo o poder em minhas mãos e volto a conduzir a sedução. Separo nossas bocas e vou beijando seu pescoço, embaixo de sua orelha e ouço quando ele geme baixinho. — Quem sou eu? Quem está te tocando Júlio? —Falo baixinho em seu ouvido. — Vida, você está me tocando Colorida. —Ele responde igualmente baixinho e me aperta ainda mais contra seu corpo. — Isso, sua Vida. Sua Colorida e de mais ninguém. Eu que estou te tocando, eu que vou amar cada pedacinho de você, eu Júlio, sou eu que vou afastar todos os seus monstros. Continuo minha exploração por todo seu corpo, beijo cada pedacinho do seu tórax, cada marquinha que ele tem, cada pinta que ele possui. Sua respiração vai se tornando mais ofegante conforme vou chegando perto de sua cintura, seu agarre em meus cabelos se torna mais forte e confesso que está doendo um pouco, mas nada que não dê para suportar. Ele
solta meus cabelos e se agarra nas cobertas quando começo a tirar a sua cueca e geme um pouco mais alto. — Vida... — Sua, meu amor. Só sua. Seguro seu membro intumescido em minhas mãos e começo um vai e vem lentamente e arrancando suspiros e gemidos do meu Rabugento. Uma pequena gota perolada aparece e eu a recolho com a ponta da minha língua, mas não consigo me contentar só com isso e o levo em minha boca enquanto brinco com os seus testículos. Faço tudo lentamente, mesmo que isso esteja nos matando, sinto minha calcinha umedecer de desejo, minha boceta pulsa querendo senti-lo dentro de mim. — Eu não vou aguentar... — Não precisa Rabugento, só deixe ir e eu ainda estarei aqui para te segurar. Eu o chupo como se o seu pau fosse uma casquinha de sorvete de chocolate, meu sabor preferido ou era, até ele aparecer. Júlio começa a movimentar seus quadris, buscando o alivio para a sua agonia, suas mãos voltam para os meus cabelos e o deixo comandar meus movimentos. Subo minhas mãos e arranho seu peito, tiro seu pau da minha boca e passo minha língua por todo seu comprimento e dou um pouco mais de atenção a sua glande e foi aí que ele se perdeu. — Porra, porra, porra! —Ele grita enquanto goza na minha boca. Sem esperar, ele me puxa para cima do seu corpo e me abraça apertado, escondendo seu rosto em meu pescoço. Seu corpo inteiro treme, seu coração bate acelerado e sua pele está com uma leve camada de suor. Aos poucos ele vai se acalmando, mas ainda me mantém presa em seus braços. Depois de muito tentar, eu consigo me soltar e me sentar, ele também se senta e ficamos com o rosto pertinho um do outro, ele gruda sua testa na
minha e, suas mãos alisam meu rosto. — Quero tanto você Colorida, acho que querer não é bem a palavra certa. Eu preciso de você, do seu sorriso, da sua risada, das suas loucuras. Parece que só comecei a viver depois que você entrou na minha vida. — E eu estou aqui Rabugento, vou ficar até você me mandar embora e ainda assim vou ficar por perto. — Então vai ficar para sempre, eu nunca vou deixar você ir Vida Martins. Quero amar você, quero tocar seu corpo como tocou o meu, me ensina? — Amanhã, hoje quem vai amar sou eu. Ainda não acabou e pelo visto você também pensa assim. Ele está bem animadinho embaixo de mim e com um sorriso safado, rebolo em seu membro e ele joga a cabeça para trás, gemendo baixinho. Júlio aprende rápido e sem me dar tempo, ele rasga meu sutiã e o joga longe, o efeito desse ato foi como se tivesse atacado gasolina em minhas veias. Ele me beija brutalmente, com direito a chupadas e mordidas, suas mãos seguram meus seios e seus dedos brincam com meus mamilos rígidos. Dessa vez me deixo dominar e gemo com a sensação da sua boca em meu corpo, ele desce para o meu pescoço e tenho certeza que amanhã estarei cheia de chupão e vermelha por causa da sua barba. Eu movimento meus quadris, roçando minha boceta molhada em seu membro duro, Júlio se torna insano e rola nossos corpos até ficar em cima de mim. — Só me guia agora e vou deixar o instinto me guiar preciso de você, Colorida. Preciso sentir você me apertar como daquela vez. —Ele diz com sua voz rouca e pressiona seu membro em mim, me fazendo gemer baixinho. Começo a me contorcer para tirar a calcinha, mas ele não tem paciência de esperar e a rasga também. Esse homem já está assim agora, imagina quando pegar o ritmo... QUERO! Eu o coloco na minha entrada e só
precisei fazer isso, o resto ele mesmo se encarregou de fazer. Ele entra com tudo dentro de mim e eu grito seu nome. Não era para ser assim! Era para eu estar no controle, mas nesse momento quem me domina é ele e, eu só me deixo levar pelas sensações. — Tão minha... tão perfeita e tão minha. —Ele diz em meu ouvido e me beija. Me perco em seus lábios, minhas mãos escorregam pelas suas costas e arranho ela levemente. Júlio começa a se mexer, de início timidamente, ele entra e sai lentamente e levanta seu corpo para ver nossos corpos unidos. Seus olhos paralisam, admirando a cena que se desenrola, ele entra lentamente e sai do mesmo jeito e isso vai me enlouquecendo, empurro seu corpo na cama e volto a encaixá-lo na minha entrada e vou descendo lentamente. Ele se senta também e suas mãos agarram meu cabelo e puxa até que minha boca esteja ao seu alcance, nosso beijo é intenso, voraz, como se nada do que estamos fazendo fosse capaz de aplacar esse fogo que está nos consumindo. Esqueço minha intenção de amar lentamente e começo a me movimentar com mais ímpeto, somos dois loucos, ele me possui e eu o possuo, ele me beija, me morde, puxa meus cabelos. Minhas unhas cravam em suas costas, nossos gemidos por mais baixo que estejam ainda enchem o quarto. Aumento meus movimentos, nos levando à beira do abismo, minhas pernas tremem, minha respiração vai ficando ainda mais difícil, nossos corpos suados deslizam um no outro. Nós estamos sincronizados, eu levanto e ele se afasta, eu me abaixo e ele impulsiona para dentro de mim. — Eu vou... vou gozar de novo. Você está me apertando tão gostoso, chega a doer, mas é tão gostoso. —Ele diz e morde meu queixo e desce para chupar meus seios.
E bastou uma pequena mordida em meus mamilos e meu orgasmo chega arrasando tudo. Eu me descontrolo e mordo seu ombro e em poucos segundos ele me acompanha. Sinto meu coração bater e pulsar em meu ouvido, meu corpo treme e pinga de suor. Júlio não está diferente de mim, sua respiração ofegante vira música em meus ouvidos, suas mãos alisam minhas costas e ele beija meu pescoço e roça sua barba em mim. Ficamos um bom tempo agarrados um ao outro, só então levanto meu rosto e olho para ele. Seus cabelos suados grudam em sua testa úmida, seus olhos brilham; cheio de desejo e então ele sorri para mim. E se antes eu achei que tinha perdido só um pedaço do meu coração, agora eu tenho certeza que ele é completamente do Júlio. Quero ver esse sorriso lindo todos os dias; quero ser o motivo desse sorriso relaxado e feliz. — Eu amo você Rabugento, nada de paixão, nada de achar estar apaixonada. Se antes eu achava que estava caindo de amores por você, hoje eu vejo que cheguei ao fundo do buraco e mergulhei de cabeça no mar de amor. —Confesso olhando em seus olhos. — Tão bobinha essa Colorida. É lógico que você me ama! Como não amar um Rabugento lindo como eu? —Ele diz a mesma coisa que disse para ele. — Se amor é o que estou sentindo agora e venho sentindo há algum tempo, como não conseguir ficar longe de você; sentir falta do seu sorriso minutos depois de tê-lo visto; ou querer viver grudado em você, então eu também te amo. Se os sintomas de estar amando são: ciúmes descabidos, não conseguir viver sem seu cheiro, sem seu sorriso, sem seu corpo grudado ao meu, então Vida Martins eu amo você. Se amor é sentir o coração acelerado quando te vejo ou apertado quando você está triste ou, ainda, calmo, toda vez que você está em meus braços, então eu amo você loucamente.
Essa é a melhor declaração de amor que já ouvi, nem as declarações dos mocinhos dos meus romances, chegam aos pés dessa declaração. Sem me conter, caio em um choro convulsivo e me agarro a ele novamente e escondo meu rosto em seu pescoço. — Por que você está chorando meu amor? Meu amor... Eu sou o amor dele! Como não chorar diante de algo tão grandioso, com esse homem dizendo que me ama? Não vou mentir e dizer que nunca imaginei isso, porque sou romântica e sempre quis um amor só meu, mas achei que esse dia iria demorar muito e olha o que acabou de acontecer! Ele me ama, ele se abriu pra mim! Meu só meu. — Você não tem noção de como essa declaração é importante para mim e principalmente para você. Meu amor e, meu orgulho de você não tem dimensão, Júlio. — Não entendo... Por que é tão importante? Por que você está chorando assim? —Ele pergunta perdido. — É importante porque você conseguiu meu amor. Você está livre, Júlio. Seu passado não tem mais poder sobre você, essa declaração quebrou qualquer corrente que te prendia. Hoje você é um homem completo, você tem uma família incrível, um trabalho que é importante para você, e você ama e é amado. Você está livre! Ele me olha emocionado e me abraça apertado, só agora se dando conta do imenso passo que deu. O último passo para se tornar um homem livre. Livre dos monstros que o prendiam durante anos. Não sou inocente a ponto de acreditar que tudo vai ficar bem agora, mas depois disso o caminho será mais fácil de ser traçado. Passamos o restante da noite perdidos um no outro, Júlio só cai adormecido quando o dia está clareando, porém eu não consigo dormir pensando em tudo o que acabou de acontecer essa noite. Não só pela conexão que acabou de rolar entre nós
dois, mas pela grandiosidade o ato em si. Júlio não sabe como essa noite foi importante para mim e, principalmente para ele. Um homem que nunca deixou ninguém chegar perto, um menino que se trancou em sua bolha segura e que jamais tinha se permitido sentir, que me escolheu entre tantas pessoas para ser o seu amor. Eu dei a ele a chave para se livrar de vez de todos os seus monstros e ele me deu um amor para ser meu, um lugar para sempre voltar; seus braços. Depois de hoje eu sei que jamais serei sozinha, nunca mais sozinha.