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Ardente Rendição Charlotte Lamb
Ardente Rendição Charlotte Lamb Título Original: Hot Surrender 1999
Uma paixão inegável... Zara ficou indignada com o atrevimento de Connel Hillier. Ele fora intrometido, exigente, e entrara em sua casa sem ser convidado! Outras mulheres podiam até se derreter em sorrisos diante de todo aquele charme, mas não ela. De fato, a quem estava tentando enganar? Connel parecia reunir todo o charme que um homem era capaz de ter, e Zara não podia negar a atração que existia entre ambos, por mais que tentasse. Não conseguia nem mesmo lidar com a presença dele, tamanha era a intensidade de suas emoções. Connel parecia sempre conseguir o que desejava... E, no seu caso, ele desejava uma ardente rendição!
CAPÍTULO I Na maioria das vezes, Zara gostava de dirigir para casa depois de um árduo dia de trabalho. Isso lhe dava a chance de se desligar um pouco da tensão causada pelos seus afazeres. Conhecia tão bem o caminho que não precisava prestar atenção, podendo deixar sua mente livre para relaxar. Era comum ter idéias brilhantes enquanto dirigia. Mas, naquela noite, estava cansada demais. Seu rosto parecia pálido, em contraste com seus volumosos cabelos avermelhados. Se alguém a encarasse, precisaria prestar atenção para enxergar o verde-esmeralda de seus olhos, pois a sonolência estava mantendo suas pálpebras quase semicerradas. Levantara às cinco horas da madrugada e às seis da manhã já estava na locação. Servira-se de uma dose de café preto em um daqueles tradicionais copinhos plásticos e conversara com Will, o cameraman, a respeito da cena que iriam filmar. Ele resmungara de maneira exagerada, quando vira o céu ficar avermelhado, logo ao amanhecer, dizendo:
— Eu sabia! Olhe para este céu. Como dizem os marinheiros: "Alvorada
de fogo, perigo à vista!" O tempo estava tão úmido, ontem, que pude sentir que havia uma tempestade a caminho.
Como sempre, Will estava certo a respeito do clima. Como se tivesse um instinto animal, sempre conseguia farejar com antecedência se iria chover. Por isso, Zara decidira trabalhar mais do que o normal, estendendo o expediente o máximo possível, para o caso de não poderem filmar as externas no dia seguinte. Trabalharam até depois das sete horas da noite, quando uma chuva pesada começou a cair.
— Jante comigo hoje, sim? — convidara Will, com um brilho de súplica nos olhos azuis. Zara soltara um suspiro, desejando que ele parasse de insistir em se aproximar. Gostava muito dele, mas não da maneira que o cameraman gostaria.
— Jantaremos todos juntos — anunciara ela, em tom diplomático,
pedindo ao pessoal da cozinha para arrumar uma refeição quente para a equipe. Will lhe lançara um olhar de reprovação quando toda a equipe se acomodara no grande trailer, que servia de base local de trabalho naquela locação, e também de dormitório para ele, que nunca se separava de suas preciosas câmaras. Will era um homem alto, forte, com músculos bem desenvolvidos e um rosto anguloso. Tinha o hábito de dizer que as lentes eram fêmeas que não aceitavam rivais, e que ele não se casara por esse motivo. Ocasionalmente, tinha um caso com uma ou outra garota com quem trabalhava em um filme, mas seus relacionamentos nunca duravam muito tempo. As namoradas se cansavam de estar sempre em segundo lugar com relação ao trabalho dele.
Zara esperava que, depois de rejeitar vários convites, pudesse fazê-lo desistir sem comprometer o bom relacionamento profissional que haviam construído. Estava convencida de que Will não estava realmente interessado nela, mas apenas tentando obter sucesso onde outros haviam falhado. A reputação de "garota difícil" a transformara em um cobiçado troféu para todos os conquistadores que se aproximavam. Mas aquilo já a estava cansando. O pessoal da cozinha providenciara comida mexicana para todos. De fato, o alimento perfeito para uma noite chuvosa. A equipe atacara a refeição com voracidade, mas Zara não comera nada, devido a sua dieta. Por isso estava tão faminta no caminho para casa. Bastou pensar em comida para que seu estômago roncasse. O que havia em sua despensa que pudesse ser preparado em poucos minutos e não tivesse calorias demais? Sopa? Ovos? Ao olhar para o painel iluminado do carro, verificou que eram quase onze horas da noite. O que era mais vital? Alimento ou sono? Na verdade, estava precisando das duas coisas, e com urgência. Diminuiu a velocidade ao chegar no cruzamento que dava acesso à rua onde morava. Soltando um bocejo, parou o veículo para que outros dois carros passassem em alta velocidade pela outra via. De súbito, um homem surgiu ao lado de sua janela, como que saído do nada, em meio à noite escura e chuvosa. Deus, de onde viera aquele desconhecido? Por um instante, pensou se tratar de uma miragem, criada por sua mente exausta. Porém, ele se inclinou e levou à mão à maçaneta, tentando abrir a porta. Com seus trinta e dois anos de idade, Zara era considerada uma mulher forte e muito capaz, mas, naquele momento, sentiu uma onda de pânico. Estava acostumada a ter uma posição de autoridade e a não cultivar muitos medos, exceto claro, com relação a aranhas e a atrasos de cronograma, seus dois maiores pesadelos. Talvez por estar muito cansada, deixou-se dominar um momento pelo pânico, antes de se lembrar de que as portas do veículo haviam sido trancadas de maneira automática, quando fora dada a partida no motor. O desconhecido tamborilou os dedos no vidro e disse algo, mas só era possível ver a boca dele se movendo, enquanto a chuva intensa fazia um ruído incômodo ao bater contra a capota do carro. Pressionando um botão no painel da porta, Zara abaixou o vidro apenas um pouquinho.
— O que você quer? — indagou ela. próxima?
— Meu carro quebrou. Pode me dar uma carona até a oficina mais
A voz dele era grave e estava um pouco rouca, como se estivesse resfriado. Os cabelos negros estavam parcialmente escondidos pelo capuz da
jaqueta pesada, assim como a barba escura, que lhe escondia a maior parte do rosto. Na verdade, parecia mais provável se tratar de um nômade do que alguém que possuía um carro. Zara o fitou com atenção, tentando enxergar melhor em meio àquela chuva torrencial. A calça jeans dele estava enlameada e parecia muito velha. Mesmo que seu instinto não a houvesse alertado para não confiar nele, jamais iria considerar a possibilidade de dar aquela carona. Uma mulher dirigindo sozinha no meio da noite teria de ser louca para fazer tal coisa. Já ouvira histórias horríveis e não desejava protagonizar uma delas.
— A oficina mais próxima fecha às nove horas da noite — respondeu
ela. — Há um telefone público em frente à igreja, no final da rua. Pode ligar para uma empresa de táxi de lá. Os olhos negros pareciam insistir em fitar os dela. A voz dele quebrou o curto silêncio que se seguiu por um instante.
— Não pode me deixar nesta chuva. Já estou todo ensopado e gelado!
Estive na cabina telefônica, mas o aparelho foi vandalizado. Quando vinha nessa direção, passei por um bar, há cerca de dois quilômetros. Não iria tomar muito do seu tempo se me levasse até lá.
— Vou pegar meu telefone celular e chamar um táxi para você — disse
Zara, relutante.
Abrindo a bolsa, que ela costumava deixar no banco do passageiro, tateou a infinidade de objetos que sempre levava consigo para o trabalho. Então tirou o telefone e mostrou a ele. Naquele momento, o vento jogou uma lufada de água mo rosto do desconhecido, fazendo-o tossir e estremecer ainda mais antes de dizer:
— Peça que mandem alguém logo, antes que eu pegue uma pneumonia! Ao digitar sua senha pessoal, Zara descobriu que a bateria do aparelho precisava ser recarregada.
— Sinto muito, mas acabei de descobrir que não está funcionando —
disse ela, virando o aparelho na direção ele, para mostrar que não estava mentindo. — Não o usei desde hoje cedo, mas a bateria se descarrega mesmo quando não o uso. Ao ver a água escorrer pelo rosto dele como se fossem lágrimas, Zara sentiu uma onda de simpatia. Imaginou-se naquela mesma situação, considerando como seria horrível se aquilo acontecesse com ela. Se houvesse se deparado com uma mulher, ali na chuva, não hesitaria em dar uma carona, mas não se arriscaria a fazê-lo por um desconhecido.
— Ouça, vou chamar um táxi para você assim que eu entrar em casa —
prometeu. — Espere aqui, sim? Logo chegará um carro para buscá-lo.
Ele se apoiou na porta, inclinando-se sobre o carro e ficando em uma posição que pareceu um tanto ameaçadora.
— Como saberei se manterá sua palavra? — perguntou a ela. A paciência de Zara começou a se esgotar. Estava cansada, com sono e sua cabeça havia começado a doer. Queria ir para casa, tomar um banho e dormir.
— Terá de confiar em mim. Agora saia do caminho ou irei colocar o
carro em movimento com você agarrado à porta. E não pense que não o farei!
— Oh, estou certo de que é bem capaz disso! — resmungou ele, ainda na
mesma posição. — Mas já pensou como isso repercutiria na imprensa?
Zara tinha certeza de que aquele desconhecido era inteligente o bastante para não tentar se manter agarrado quando o carro entrasse em movimento mas, para o caso de estar enganada, apertou outra vez o botão que fechava o vidro. Pisando com firmeza no acelerador, atravessou depressa o cruzamento. Pelo retrovisor, pôde vê-lo ficando para trás, sob a chuva torrencial. Calculou que ele tivesse quase um metro e noventa. Tivera a chance de notar que ele tinha ombros largos e fortes. O jeans molhado se grudara às pernas esguias, revelando músculos bem desenvolvidos. Foi impossível negar quanto ele era sexy, mesmo em meio àquela circunstância adversa. Conhecia mulheres que ficariam enlouquecidas de desejo por alguém com aquele porte físico. Com certeza, mulheres a quem faltava bom senso, o que não era o seu caso. Contudo, ele lhe lembrara alguém. Se não estivesse tão cansada, até tentaria se lembrar. Em menos de um minuto, chegou à sua casa, meio oculta pelas árvores do jardim e localizada entre grandes terrenos. Preferira morar em Ivydene por causa do ambiente pacífico e da maravilhosa vista dos campos e dos jardins cheios de árvores, que lhe davam a impressão de estar em um ambiente desabitado. Na verdade, havia muitas outras casas escondidas pela vegetação, mas ela não tinha vizinhos próximos nem via as luzes de suas janelas. Naquela noite, porém, preferiria poder vê-los e ser vista. O inesperado encontro que tivera minutos antes abatera levemente sua costumeira autoconfiança. Estacionou o carro sob a extensão do alpendre lateral, bem ao lado da entrada da varanda. Tirou as botas e as deixou encostadas à parede do lado de fora, antes de abrir a porta. Entrou apenas de meias em casa. Acendeu então as luzes da sala e ficou parada em silêncio por um instante. Exceto pelo tique-taque do antigo relógio de parede e pelo som da chuva que continuava a cair, não havia nenhum ruído na casa. Já estava morando ali havia três anos. Quando comprara aquele sobrado de três quartos, as condições do lugar estavam péssimas. Havia se passado mais de um ano que o lugar ficara desocupado
e ninguém cuidara das goteiras que haviam surgido, nem das janelas que os garotos da região haviam quebrado. Zara não pudera arcar com o custo da reforma completa junto à empreiteira, pagando apenas pelo conserto do telhado e das janelas. Porém, trabalhara sozinha em cada momento livre que tivera, trocando papéis de parede, lixando e pintando o teto, trocando as cortinas e tapetes, além de outras coisas. Os cômodos tinham elegantes lareiras com grades de ferro, o que tornava cada ambiente muito aconchegante. Na verdade, dava a sensação de se estar mesmo em uma casa de campo. Indo apenas de meias até a cozinha, escolheu uma sopa instantânea e a colocou no forno de microondas. Em seguida, fatiou um pedaço de pão, antes de colocá-lo na torradeira. Enquanto esperava, caminhou até a sala e acionou a secretária-eletrônica. Foi impossível não sorrir quando a voz de sua irmã preencheu o ambiente:
— Oi, sou eu. Não se esqueça do churrasco de sábado, está bem?
Chegue às seis horas da tarde. Pode trazer alguém, se quiser. Como era mesmo o nome de seu último namorado? Oh, e traga uma garrafa de alguma bebida: limonada, vinho ou qualquer outra coisa. Ao fundo, um som agudo e desafinado acompanhou o ruído de uma pancada e de algo se quebrando.
— Cante mais baixo, querida — disse Sasha, no tom indulgente que
sempre usava com a pequena Flora.
Aquele som horroroso era mesmo um canto? Soltando um suspiro, Zara ligou a lareira elétrica, iluminando a madeira artificial com um tom avermelhado. O aquecimento central da casa se ligava todo dias às seis horas da tarde, mas em uma noite úmida como aquela isso não bastava. O calor extra seria muito bem-vindo, sem contar o prazer de ter a impressão de estar diante de chamas verdadeiras.
— Zara, tenho uma novidade maravilhosa para lhe contar. Decidi... —
Sasha se interrompeu de repente, mudando de tom: — Não faça isso com o gato! Os miados de protesto do animal competiram em potência com a suposta cantoria de Flora.
— Preciso desligar — disse Sasha, apressada. — Flora está tentando
puxar o gato pelas barras do chiqueirinho. Zara, não ouse se esquecer e não se atrase! Vejo você no sábado. Até mais. Depois do bip seguinte, outra voz tomou o lugar da primeira.
— Zara, por favor, preciso vê-la. Tenho certeza de que podemos
acertar isso de alguma maneira.
Ela apertou o botão para saltar até a próxima mensagem, pois não queria ouvir aquela voz chorosa. Fora divertido sair com Larry por algumas semanas, mas isso havia sido tudo o que aqueles encontros significaram para ela. Diversão descompromissada. Como se tratava de um homem gentil, pareceu-lhe
justo sugerir que parassem de se encontrar no instante em que ele começara a querer levar o relacionamento a sério. Fora melhor fazer isso logo, antes que as emoções saíssem de controle. No passado, Zara hesitara algumas vezes e deixara certos relacionamentos durarem demais. Nunca quisera magoar ninguém, mas também não estava disposta a ir para a cama com alguém a quem não amasse. O problema era que Larry não estava aceitando o fim do relacionamento que, na verdade, nem chegara a existir. Desde que lhe dissera que não queria mais vê-lo, recebera ligações várias vezes por dia, assim como cartas bastante embaraçosas. De fato, aquela situação estava se tornando preocupante. Sabia que não era a primeira mulher na vida dele. Na verdade, sabia tudo a respeito das ex-namoradas de Larry, pois ele fizera questão de lhe contar tudo sobre cada uma delas, apesar de ela haver pedido que ele não fizesse isso. Gostara dele a princípio, porque o achara divertido. Mas, ao descobrir aquela obsessão por relacionamentos passados, ela começara a se afastar. Quando namorava, nunca falava a respeito de um antigo namorado. Além disso, não gostava de reviver o passado, preferindo deixá-lo no esquecimento. No entanto, quando dissera algo nesse tom para Larry, vira-o sorrir, triunfante, e alegar que ela estava com ciúme. Então declarara que ela não precisaria se sentir de tal maneira, já que nenhuma outra garota fora tão importante na vida dele. Segundo as palavras de Larry, ela era a pessoa que ele procurara ao longo de toda a vida. Por fim, alegou que preferiria morrer a perdê-la. Foi naquele momento que Zara decidiu dizer adeus. Aquilo estava ficando sério demais para ela. Era uma pena não haver decifrado a personalidade de Larry antes, do contrário, jamais teria aceitado seus convites para sair. Contudo, estava ciente de que Larry era obcecado consigo mesmo, embora estivesse focalizando seu distúrbio sobre ela, naquele momento. E isso era um pouco assustador. Mas ninguém podia mudar o passado. De qualquer maneira, a questão principal era: como persuadi-lo a deixá-la em paz? Soltando um suspiro, ajeitou um cacho dos cabelos avermelhados que lhe caíra sobre os olhos. Escreveria uma carta formal e impessoal para ele no dia seguinte. Se isso não resolvesse, seria obrigada a pedir que seu advogado lidasse com o problema. Esse tipo de processo poderia dar trabalho, mas se fosse a única solução para recuperar sua paz, teria de apelar. A chamada seguinte na secretária-eletrônica era de outro homem, que falava em um tom de reclamação, mas muito diferente do anterior. tomando...
— Zara, estou muito preocupado com o rumo que as despesas estão — Qual a novidade nisso? — perguntou ela, com sarcasmo, enquanto
voltava para a cozinha e se servia da sopa.
Enquanto ouvia Philip Cross discorrer sobre os gastos do filme, teve tempo de se ajeitar na poltrona da sala, em frente à lareira artificial, com o prato sobre uma bandeja.
— Tente fazer apenas onde for possível, Zara. O custo desta produção
está ficando alto demais. Estou lhe enviando um fax com sugestões de cortes de despesas. Tente reduzir o custo do transporte, sim? Ligue-me depois, para dizer o que tem em mente. Quando o aparelho silenciou, ela o olhou por alguns segundos, fazendo uma careta antes de resmungar:
— Seu sovina! Volte para seu cofre forte e vá contar moedinhas. Vou
lhe dizer o que penso, mas não creio que vá gostar de ouvir.
Tentando esquecer o sermão que ouvira de seu superior na produtora, tomou satisfeita a sopa de tomate. Quando terminou, fitou longamente a madeira artificial da lareira e então se levantou. Se demorasse ali, dormiria sentada e acordaria com torcicolo na manhã seguinte. De pé, espreguiçou-se e pensou no dia cheio que tivera, encerrado com um momento de grande tensão, quando aquele desconhecido barbado... Oh, não!, pensou. Estava em casa havia meia hora e se esquecera dele por completo! Correu então para o telefone e chamou o serviço de táxi, contando a história para a atendente, a fim de deixar claro o que ocorrera. Mesmo que ele já tivesse partido, dera-lhe sua palavra e não poderia deixar de fazê-lo. Aliviada, colocou tudo o que sujara na lava louça e subiu para o quarto. Trabalhara até a exaustão e precisava de um bom banho quente para tentar relaxar, senão nem dormiria direito. Essa era sempre a melhor parte de se chegar em casa à noite. Dirigir aquela produção estava sendo tão maravilhoso quanto cansativo. Conseguia o melhor de todos, quer fossem atores, iluminadores, operadores ou quaisquer dos outros elementos da equipe, mas o preço estava sendo seu completo cansaço. Ao sair do banho, lembrou-se de que precisava fazer algumas anotações no roteiro, com relação às idéias que tivera para a filmagem do dia seguinte. Foi até o andar de baixo para pegá-lo em sua bolsa, ouvindo então um ruído vindo do lado de fora da casa. Ficando estática, identificou o som de alguém andando pela varanda. Inúmeros pensamentos lhe ocorreram naquele momento. De olhos arregalados, avaliou a bandeja de bronze que deixara sobre a pia. Era pesada o bastante para colocar qualquer um para dormir por alguns minutos, se batesse com força na cabeça da "vítima". Posicionando-se atrás da porta, conteve o fôlego e ficou imóvel. Então viu a maçaneta girar em silêncio e uma silhueta surgir pela passagem que se abrira. Era a hora da verdade. Com um movimento ágil, abaixou a pesada peça de bronze direto sobre a cabeça do intruso.
Entretanto, seu reflexo no espelho que ficava de frente para a entrada deve tê-la denunciado, pois a pessoa se esquivou bem a tempo, virando-se e agarrando a bandeja. Em seguida, arremessou-a para o outro lado da sala, fazendo um barulho estrondoso. Zara o reconheceu no instante seguinte, sentindo um calafrio percorrer-lhe o corpo. Alto, ombros largos, cabelos negros e barba cerrada. Era o desconhecido que tentara invadir seu carro!
— Não tente nada! — gritou ela, tentando alcançar uma cadeira com a
qual pudesse ameaçá-lo. — Tive aulas de defesa pessoal.
— Se acha que estou interessado em você, está se superestimando! —
falou ele, com um olhar de ironia que a fez sentir o rosto esquentar. escudo.
Mas Zara se manteve calma, segurando a cadeira entre eles, como um
— O que está querendo? Como chegou até aqui? — Andando. E estou mais ensopado do que nunca, graças a você. — Por que a culpa seria minha? Não fui eu que fiz chover. — Mas prometeu chamar um táxi para mim! — E foi o que fiz. Está evidente que você não esperou tempo suficiente
— declarou ela, admitindo então a verdade, diante daquele olhar intenso. — Certo, está bem. Esqueci de ligar quando cheguei aqui, mas, assim que me lembrei, fiz a ligação. Chamei a empresa de táxi que costumo usar, e pedi que o buscassem.
— Então, por que eles não chegaram? — Como posso saber? A minha parte foi feita. Ligue para eles e
verifique! O telefone fica na sala. — Zara apontou para o cômodo principal. — E o número está anotado na folha ao lado. Fique à vontade.
— Pretendo ficar, mesmo — falou ele, em um tom sinistro, sorrindo. — O que quer dizer com isso? — Estou ensopado, gelado, cansado e faminto. Depois de fazer uma
longa caminhada sob essa tempestade, não pretendo ficar por aí com a roupa molhada, esperando um táxi. O que preciso agora é de um banho quente, de roupas secas e de algum alimento. Como não manteve sua palavra em mandar o táxi assim que chegasse, está em débito comigo e vai ter de me dar o que estou precisando.
— Ouça. Sinto se esqueci seu táxi, mas não sou responsável por seus
problemas. Não fiz seu carro se quebrar nem provoquei a chuva. Pare de me culpar por tudo! E como foi que conseguiu me seguir até em casa, afinal de contas? Por acaso sabia meu endereço? Zara o viu pestanejar, antes que uma expressão evasiva se formasse no rosto atraente. O que significava aquele olhar? De repente, teve a impressão de
que ele a conhecia e sabia onde ela morava. O que estava acontecendo? Quem era aquele desconhecido?
— Por acaso é algum de meus vizinhos? Embora ela conhecesse pelo menos de vista a maioria das pessoas de sua rua, poderia se tratar de alguém de uma casa mais distante. Se o tivesse visto antes, iria se lembrar. Lançando um olhar mais atencioso na direção dele, teve a sensação de que o vira antes. Mas onde? Por que sua mente não estava colaborando? Só o que sabia era que aquele rosto lhe era familiar. Londres.
— Não — falou ele, dando de ombros. — Tenho um apartamento em
Isso não explicava como fora possível encontrar a casa dela, então Zara falou, em tom objetivo:
— Ainda não me disse como chegou aqui nem como entrou na casa! O olhar que recebeu dele foi hostil.
— Esperei sob aquela chuva torrencial por vinte minutos, antes de
concluir que você não chamara o táxi para mim. Vim até a esquina onde a vi entrar, imaginando se haveria alguma casa com as luzes acesas na rua. Pretendia pedir para usar o telefone de alguma delas, caso encontrasse alguém acordado. A única com as janelas iluminadas era essa aqui, então me aproximei. Reconheci o carro assim que cheguei mais perto. Bati à porta três ou quatro vezes, sem obter resposta. Zara concluiu que ele devia ter batido durante seu banho. Com o som da água e com o boxe fechado, seria mesmo impossível ouvi-lo.
— E? — Então descobri que a porta estava destrancada. — Mentira! Eu sempre a tranco! — Mas não o fez desta vez. Não estava trancada. Vá verificar — desafiou ele, encarando-a com firmeza. Embora não se lembrasse se havia ou não trancado a porta, Zara não pretendia admitir isso diante dele. Mas, observando aquele rosto cansado e o estado geral de suas roupas encharcadas, sentiu-se solidária e disse:
— É claro que posso lhe dar algum alimento e uma bebida quente, mas
não tenho nenhuma roupa masculina no meu guarda-roupa. Seria tolice tomar banho e depois sair na chuva outra vez. Vou ligar para a empresa de táxi e preparar-lhe algo para comer, enquanto você espera a chegada do carro. O que acha?
— Hal está certo. Você tem mesmo muito sangue-frio! Ao ouvir aquilo, Zara arregalou os olhos.
— Hal?
— Meu primo, Hal Thaxford. Zara conteve o fôlego. Foi como se alguém houvesse lhe jogado um balde de água fria.
— Você é primo dele? Ela o fitou com atenção e compreendeu por que o achara tão familiar. Ambos possuíam um porte físico muito parecido e havia traços muitos semelhantes em seus rostos, além de compartilharem do mesmo sorriso sensual que levara Hal Thaxford a ser considerado um dos atores de televisão mais aclamados entre as mulheres britânicas. Contudo, ela própria tinha uma péssima opinião a respeito da capacidade de Hal em interpretar. Ele era o tipo de galã que usava seus atrativos como distração, já que não sabia atuar. Para sorte dele, as fãs ficavam atônitas quando o viam sorrir na "telinha". Se era famoso, e ganhava muito dinheiro, para que um farsante como ele iria aprender a interpretar de verdade, afinal?
— Você também é ator? — Não — desdenhou ele. — Não sou. Não estou envolvido com filmes,
mas conheço bem o mundo espalhafatoso em que vive. Hal me fala muito sobre isso, e me contou tudo a seu respeito. O olhar dele a fitou em uma lenta sondagem, avaliando o corpo sob o pijama de algodão, que moldava com perfeição os seios fartos e eretos, assim como a cintura fina e os quadris arredondados. Zara enrubesceu ao sentir uma mistura de desejo e de descaso na expressão dele. Bem, Hal não gostava mesmo dela e o sentimento era mútuo. Mas o que ele poderia ter dito ao primo para fazê-lo olhá-la daquela maneira? Como se ela houvesse feito a pergunta em voz alta, a resposta veio em seguida, em um tom acusador:
— Sei tudo a respeito da maneira como você manipula e brinca com os
homens, flertando com eles, para fazê-los se apaixonar, e então os descartando com frieza, quando se cansa deles. Achei as histórias de Hal um pouco exageradas na época. Vi algumas fotografias suas na casa dele e achei que alguém com olhos como os seus jamais seria assim tão cruel. Mas agora que a conheço, vejo que me enganei e que meu primo estava certo. Aquilo a abateu tanto que demorou um pouco para Zara perceber que ele havia caminhado até a sala e que estava olhando para o telefone. Então o seguiu.
— O que está fazendo? — indagou ela, vendo-o arrancar da tomada o fio do aparelho. — Coloque isso de volta! Virando-se depressa, ele a segurou pelo braço.
— Venha comigo. Afirmando as pernas, Zara se recusou a sair do lugar.
— Solte-me e saia já da minha casa! — Não tenho tempo para discutir com você — falou ele, segurando-a
pela cintura com um dos braços e a levantando como se fosse uma criança.
Perdendo o fôlego por um momento, ela tossiu antes de esbravejar:
— Coloque-me no chão! Solte-me já! O que pensa que está fazendo? Ignorando-a, ele a girou e a colocou sobre o ombro, deixando a cabeça dela virada para baixo e de frente para suas costas. Pressionando os joelhos dela contra o peito, impediu-a de chutá-lo.
— Vou levá-la para cima. Ao ouvi-lo dizer isso, enquanto era carregada através da sala, Zara estremeceu de pânico. Ou seria de desejo?
CAPÍTULO II Quando chegaram ao andar de cima, Zara começou a se recuperar do choque inicial e voltou a pensar com mais clareza. Sim, ele era muito mais alto do que ela, isso sem falar do porte atlético e musculoso, mas sua auto-estima exigia que ela não se entregasse sem lutar. Conforme foi carregada para dentro do quarto, respirou fundo e exigiu:
— Solte-me! Para sua surpresa, ele a soltou. Só que na cama. Aquilo a deixou sem fôlego por um instante, mas antes que pudesse ser impedida, rolou para o lado e agarrou o objeto mais pesado que tinha por perto. Era uma estatueta de metal, que ganhara pela direção do melhor documentário de televisão da temporada, alguns anos antes. Aquele fora seu primeiro prêmio oficial e ela sentia muito orgulho dele. Mesmo depois de conquistar muitos outros depois disso, nenhum lhe proporcionara tanta felicidade. Mesmo naquela situação, segurando o objeto como se fosse um taco para ameaçar seu agressor, sua mente ainda lhe mostrava lembranças da alegria que aquele prêmio lhe trouxera.
— Não pense que não usarei isso! É bronze maciço, banhado a ouro! É
muito pesado. Se eu o acertar com isto, garanto que vai se machucar. Fique longe de mim, senão virará um mero alvo. Não se aproxime nem mais um passo! Sem responder, ele se voltou para a porta e começou a andar. Entretanto, não foi para sair, segundo Zara logo descobriu. Ficou ainda mais apreensiva ao ver a porta ser trancada e a chave ser colocada no bolso do jeans molhado. Agarrando a estatueta com mais força, ela bradou:
— Estou falando sério! Fique longe de mim ou se arrependerá! Ele atravessou o quarto com calma, fazendo-a conter o fôlego. No entanto, ele não se dirigiu à cama, mas ao banheiro. Quando o viu entrar e se trancar lá dentro, foi impossível não ficar boquiaberta. Um instante depois, ouviu o chuveiro ser aberto e o som de água escorrendo. Então escutou-o cantarolando uma música muito familiar, da qual ela não lembrava o nome. Sentindo-se ridícula por estar de pé naquele canto do quarto, ameaçando o vazio com sua estatueta suspensa no ar, Zara soltou um suspiro e colocou o prêmio de volta no lugar. Apressou-se então em se vestir outra vez, colocando a calça jeans desbotada que deixava sempre à mão, para usar enquanto fazia trabalhos caseiros, e a blusa de lã que pegara emprestado de um dos rapazes com quem saíra. Esquecera-se de devolvê-la quando o dispensara.
Jimmy era muito parecido com a blusa cinza que esquecera. Olhos acinzentados, magro demais, cabelos castanhos, cheios de mechas grisalhas, e uma expressão triste no rosto. Parecia difícil acreditar que tivesse começado a sair com ele no passado. Zara tinha vinte anos na época, e ele quarenta, o dobro de sua idade. Era o diretor de documentários de um canal de televisão e aquele emprego a deixou muito impressionada, levando-a a aceitar um dos convites dele para que jantassem juntos. Depois disso, Jimmy começou a persegui-la por todos os lugares, sempre ficando por perto e se fazendo notar, como um fantasma insistente. Às vezes conseguia convencê-la a irem ao teatro ou a passearem à beira-mar para ver o pôrdo-sol. Mas apenas até o dia em que Zara percebera que acabaria se defrontando com um pedido de casamento, se não tomasse logo uma atitude. Quando disse com firmeza para que ele se afastasse, ouvira-o lamentar e declarar que ela havia destruído seus sentimentos. Seis meses depois, Jimmy se casara com uma moça chamada Fifi, que ele conhecera durante um feriado em Paris, segundo lhe contaram. Nos últimos tempos, ouvira dizer que já estavam com três filhos e que ele havia se aposentado da televisão. Estava criando porcos em uma fazenda da Normandia. mente.
— Danny Boy! — murmurou ela, quando o nome da canção lhe veio à
Aliás, aquele desconhecido estava cantando de uma maneira bastante descontraída enquanto tomava banho. Não se tratava de nenhum profissional, claro, mas era agradável ouvi-lo cantar. Ela sempre adorara aquela velha canção irlandesa. Era estranho que não a houvesse reconhecido de imediato. chuveiro.
De repente, percebeu que a música cessara, assim como o som do
O que ele estaria fazendo naquele momento? Obviamente estava se enxugando, concluiu. Isso levou sua imaginação a trabalhar muito depressa, cogitando a respeito da aparência daquele corpo másculo. Ao se descobrir soltando um suspiro, fez uma careta de autocensura. "Pare de pensar nessas coisas!", pensou. "Está querendo encrenca?" Ouviu então o boxe ser aberto, para então ver a maçaneta da porta girar antes de a mesma se abrir. Ele saiu de lá trajando um robe atoalhado preto, que mal chegava até seus joelhos. Era o robe de banho dela, que costumava ficar pendurado no banheiro. O corpo dele era tão maior que o seu que as abas mal se encontravam no meio. Se não fosse o nó apertado que ele dera na faixa, com certeza o traje não cobriria nada. No entanto, não pôde negar que a visão era engraçada.
De fato, quase riu, mas logo percebeu que ele completamente estava nu sob o tecido. Oh, Deus, aquilo era demais para ela. Ele era muito sensual. Tê-lo ali, seminu e trancado em seu quarto, era perturbador, mas o que a incomodava mesmo era o que estava sentindo dentro de si.
— Vista a roupa agora mesmo! — ordenou a ele. O olhar que recebeu a fez enrijecer as costas.
— Está brincando? As peças estão molhadas e geladas. Tem certeza de
que não há nenhuma roupa masculina por aqui? Seus namorados nunca esqueceram sequer uma muda de roupas?
— Já disse que não! — Aposto que você é do tipo que joga as coisas deles fora assim que os dispensa — falou ele, em tom jocoso. Aquilo a magoou. Oh, Hal Thaxford mal sabia o que o esperava. Que tipo de boato estaria aquele canastrão inventando a seu respeito?
— Ouça bem, Sr... Qual é seu nome? — Hillier. Connel Hillier — falou ele, por sobre o ombro, enquanto
perambulava pelo aposento, abrindo portas e gavetas do guarda-roupa.
Nome incomum. Connel. Zara gostou tanto que teve de se conter para não pronunciá-lo em voz alta.
— Ouça, Sr. Hillier... — interrompeu-se, ao se dar conta do que estava
acontecendo. — O que pensa que está fazendo? Não tem o direito de mexer nas coisas do meu quarto! E não há razão para procurar algo, já que não irá encontrar nada aí. — Aproximando-se, fechou uma gaveta com um estrondo. — Eu mandei parar!
Connel se virou e a encarou, segurando um par de meias esportivas, do tipo que se usa em jogos de futebol. Ela sempre usava aquele tipo de meias quando o tempo estava frio ou úmido, pois costumava usar botas e não gostava de passar frio nas pernas.
— Que tamanho é isso? Bem, não importa. O tecido é bastante flexível
e creio que conseguirei vesti-las.
Sentando-se na cama, começou a calçar as meias. Zara virou o rosto para o outro lado, pois se flagrou de olhos arregalados, sequiosa por ver mais daquelas pernas. Um instante depois, viu-o ficar de pé, já com as meias.
— Assim está melhor — disse Connel. — Meus pés estavam congelando.
Espero que tenha pelo menos boa comida em casa. Estou faminto. Vamos descer e preparar alguma coisa. A animada declaração dele a deixou sem fala, o que era muito raro de acontecer. A primeira vista, desconfiara dele. Naquele momento, porém, sentia
vontade de esganá-lo a cada palavra que ouvia. Quando conseguiu coordenar os pensamentos com mais clareza, bradou:
— Escute aqui, "Sr. Rolo Compressor", pare de me empurrar de um lado
para o outro da casa, como se eu fosse uma boneca!
— Rolos compressores achatam as pessoas em vez de empurrá-las,
minha cara.
— Então é isso o que quer fazer comigo? Ignorando-a, Connel entrou no banheiro e pegou suas roupas, que estavam dobradas e empilhadas com esmero. Sem se alterar, pegou a chave que estava no bolso da calça jeans molhada e abriu a porta do quarto. Sem olhar para trás para ver se ela o estava seguindo, desapareceu rumo à escada. Quando descobriu que a chave havia sido deixada na porta, Zara considerou a possibilidade de se trancar no quarto, mas logo a descartou. Seria pior ainda deixá-lo solto na casa, livre para fazer o que bem quisesse. Inconformada, seguiu-o escada abaixo. Se pelo menos o celular não precisasse de carga! Quando chegou à cozinha, viu-o na área de serviço adjacente, colocando as roupas na máquina de lavar. Ele mal se virou ao ouvi-la se aproximar, limitando-se apenas a olhá-la por sobre o ombro e a encará-la por um instante.
— Onde guarda o sabão? Zara quase disse "eu faço isso para você", mas se refreou a tempo. "Programação feminina!", pensou, indignada. Aquele tipo de comportamento era ensinado desde a infância para as garotas. Afinal, por que deveria se oferecer? O correto era deixá-lo cuidar da lavagem sozinho.
— No armário, acima da máquina. Ao responder, recebeu um olhar de censura por parte dele. Ficou evidente que Connel esperava que ela se oferecesse para fazer aquilo. Os homens, em geral, sempre esperam que as mulheres os sirvam. Essa parecia ser a programação masculina básica. Se tivesse um filho algum dia, ela iria cuidar para não deixá-lo ver as mulheres como escravas nem como brinquedos em potencial. O som da máquina de lavar roupas parecia acompanhar o ritmo pulsante de seu pensamento. Quando voltou a prestar atenção em Connel, viu-o em frente à geladeira, pegando embalagens e olhando as instruções do modo de preparo. ela.
— Há uma grande variedade de sopas prontas nessas caixinhas — disse
Connel estava lendo a embalagem de uma canja e deu de ombros, antes de responder:
— Estou faminto demais para tomar apenas sopa, mas isso aqui me
parece bom. Vou usar seu microondas e preparar este ensopado. Vai querer um pouco também? Só de pensar em comer àquela hora da madrugada Zara fez uma careta.
— Não, obrigada. Prefiro não ingerir alimentos pesados tarde da noite e, além disso, já tomei minha sopa. Ouça, posso chamar-lhe um táxi agora? Pode comer enquanto espera. Ele colocou o ensopado no forno de microondas e digitou os números no teclado. O prato interno começou a girar.
— Precisarei de minhas roupas antes de partir. Vi que você tem uma
secadora de centrifugação. Assim que a lavagem acabar, colocarei minhas roupas ali. Tentando não parecer ansiosa demais, Zara respondeu:
— Mas isso pode demorar horas, e você não ficará aqui depois de
acabar seu jantar. Quero chamar um táxi para levá-lo.
Connel a ignorou, voltando a abrir os armários para pegar outras coisas. Pouco depois, ele olhou para o pote de pó de café e fez uma careta, murmurando:
— Não é dos melhores, mas acho que vai servir. Aquilo a levou a sentir um calor tomar-lhe a face.
— Oh, lamento se meu café não atende as suas exigências. Vou me
certificar de ter uma qualidade especial da próxima vez que invadir minha casa. O sarcasmo não pareceu afetá-lo, pois ele continuou mexendo com a cafeteira, sem se alterar.
— Gosto de torrar e de moer meu próprio café, usando aqueles antigos
moedores franceses, de madeira — falou Connel, com naturalidade. — Essa é a melhor maneira de se obter aquele aroma delicioso. Isso sem falar das cafeteiras italianas, que não usam filtro... Mas, pelo menos você tem pó empacotado e uma boa cafeteira elétrica. Café instantâneo, por outro lado, seria uma tortura para mim.
— Pois eu acho que o pó pronto e a cafeteira elétrica já dão trabalho
demais — disse Zara, com uma ponta de ressentimento. — Assim como o forno de microondas e a secadora centrífuga, tudo o que poupa tempo é importante e valioso na minha vida. Sou uma mulher de carreira, não uma dona-de-casa. Ele lhe deu um sorriso sardônico, enquanto preenchia o compartimento de água da cafeteira.
— Percebi que não há leite na geladeira. Está fazendo dieta, por acaso?
Ora, pois eu não estou! Mas posso me virar com café preto mesmo. Espero que tenha pelo menos um pouco de açúcar.
— Sr. Hillier, não o convidei para entrar na minha casa. Portanto, pare
de criticar a maneira como vivo! — bradou Zara, já perdendo a paciência. — Está no
armário de cima à esquerda. — Olhou então o relógio. — Ouça. Estou exausta. Tive um dia muito difícil e preciso ir dormir antes de ir trabalhar, daqui a pouco. Poderia fazer a gentileza de comer sua refeição e partir? Tenho certeza de que o motorista do táxi não se importará com o que estiver vestindo. Então algo lhe ocorreu, levando-a a se levantar e a correr para a sala. Ao voltar, trazia consigo um grande macacão marrom de piloto de corrida, que comprara na Austrália havia dois anos.
— Você poderia vestir isso! — anunciou. — Ninguém iria saber se há
outra roupa por baixo ou não.
Afastando-se do fogão, onde preparava um acompanhamento para o ensopado, Connel se aproximou dela e pegou o macacão, colocando-o diante de si. Verificou que, com os zíperes de ajuste abertos, o traje serviria até mesmo nele.
— Obrigado. Pelo menos você tem bom gosto para roupas. Vou tomá-lo
emprestado, mas ainda quero vestir minhas próprias roupas por baixo.
— Posso enviá-las para você amanhã. — Não — respondeu Connel, voltando até o forno, que sinalizara o final
do cozimento. — Pretendo esperar que minhas roupas sequem.
Zara já estava ficando desesperada para se desvencilhar dele. Elevando o tom de voz, franziu o cenho ao dizer:
— Esta é minha casa e quero que vá embora! Ele abriu o ensopado e inalou o aroma de maneira profunda, não se afetando com as palavras dela.
— Hum... Está delicioso. Colocando o ensopado em um prato, ajeitou o arroz e os pedaços de frango de maneira apetitosa antes de se sentar e de começar a comer.
— Poderia servir o café? — indagou ele. — De que morreu sua última escrava? — De prazer — respondeu Connel, lançando um olhar insinuante na
direção dela.
O senso de humor de Zara era muito maior do que qualquer irritação que ela pudesse sentir. Não foi possível conter o riso, embora preferisse tê-lo feito. Connel sorriu, antes de dizer:
— Então você é humana? — Muito humana. E, no momento, exausta — confessou, servindo café
em duas canecas.
Precisava de um pouco daquela bebida quente, já que ficara evidente que não se livraria dele com facilidade. Não poderia ir se deitar deixando-o sozinho em sua casa.
— Quantas horas você trabalhou hoje? — Levantei às cinco horas da manhã e cheguei no trabalho às seis — informou Zara, colocando as canecas na mesa e se sentando em frente a ele. — Está com os olhos vermelhos. Bem, pelo menos a cor combina com
seus cabelos.
Enrubescida, ela respondeu em tom irônico:
— Oh, muitíssimo obrigada. Isso me faz sentir realmente glamourosa. — Seu jeans é bem antigo, não? Mas, em você, parece ser a última
moda. Não sei bem como isso é possível. Talvez, por ser linda, tudo lhe caia bem. Até mesmo olhos vermelhos! E eu devo ser o milionésimo homem a lhe dizer isso. Acho que mereço um prêmio por tal façanha. Levantando-se um pouco e se inclinando para a frente, Connel beijou-a com rapidez e suavidade. Um mero roçar de lábios. Antes que pudesse reagir, Zara o viu se afastar e voltar a comer calmamente. Percebeu que estava trêmula ao soltar o fôlego, e ficou furiosa consigo mesma. Qualquer um pensaria que ela jamais havia sido beijada antes! Aquele arremedo de beijo não durara sequer dois segundos! Se não fosse o calor dos lábios dele sobre os seus, poderia até pensar que imaginara aquilo. Esfregando a boca com o dorso da mão, fez uma careta.
— Você toma mais liberdades do que qualquer pessoa que já conheci.
Por acaso trabalha na imprensa? Apenas repórteres são assim tão ousados. Connel riu.
— Nada disso. Sou um explorador. Ela hesitou, pensando ter ouvido mal.
— O quê? — Um explorador — repetiu ele, terminando a refeição e empurrando o
prato para o lado. — Acabei de chegar da América do Sul. Estive mapeando as montanhas que se estendem desde a Terra do Fogo até a Venezuela. Aqueles colossos se estendem por mais de seis mil quilômetros, e há grandes extensões com altitudes acima dos cinco mil metros. Fiquei um ano inteiro por lá, escalando, filmando e fazendo esboços. Boquiaberta, Zara perguntou:
— Sozinho? Mais um vez, Connel sorriu.
— Felizmente, não. Estava com uma expedição internacional.
Somávamos cerca de duas dúzias de especialistas europeus: fotógrafos, cientistas, geólogos, biólogos e até dois médicos. Mas todos ali eram alpinistas, inclusive eu. Isso foi essencial. Naquelas montanhas, é preciso saber o que se está fazendo e deve-se poder confiar que quem o está acompanhando também sabe e é confiável. Todas as vidas envolvidas dependem disso. Levantando-se, ele se espreguiçou e foi até a lavadora de roupas. Abrindo a tampa, observou o conteúdo e mexeu nos controles.
— Vou adiantar para o ciclo de enxágüe, para que possa colocar as
roupas logo na secadora.
— Você não é casado, é? — indagou Zara, arqueando as sobrancelhas. — Não — respondeu ele, encarando-a com ar cínico. — Não me diga que tem algo contrário a se envolver com homens casados... Hal não falou nada a respeito disso. — Hal não me conhece tão bem quanto pensa! Na verdade, não sabe nada sobre mim. Nós nunca fomos o que se poderia chamar de "amigos", — O que isso significa? Por "amigos" você quer dizer "amantes"? — Não! Só quero dizer o que a palavra realmente significa, ora! Hal e eu
apenas trabalhamos juntos...
— E ele nunca lhe deu uma "cantada"? O tom dele ecoava incredulidade, o que não a surpreendeu, considerando-se que Hal Thaxford tinha o hábito de tentar se aproximar de toda e qualquer mulher bonita que conhecia.
— Claro que sim — respondeu Zara, com frieza. — E foi rejeitado? — Sem hesitação. Sem margem a mal-entendidos. Disse-lhe que não estava interessada, mas ele não aceitou meu "não" como resposta até que o esbofeteei. Seu primo não é muito inteligente, como já deve saber, nem é um bom ator. É egocêntrico demais para o meu gosto. Considera-se uma verdadeira imagem da perfeição. Não tem a menor idéia de que não passa de um mero "atorzinho de segunda classe". Quando entendeu que eu não estava apenas me fazendo de difícil, mas que não tinha a menor intenção de me envolver com ele, começou a ficar malhumorado. — Hum... — murmurou Connel, fitando-a com ceticismo. — A versão de
Hal é bem diferente da sua. Na verdade, ele disse que você foi quem se aproximou dele e que foi rejeitada, ficando muito magoada. Zara deu de ombros, nem um pouco surpresa.
— Sinta-se livre para decidir em quem prefere acreditar, pois não faz
a menor diferença para mim. De qualquer maneira, também não tenho intenção de
me envolver com você, Sr. Hillier. Só perguntei se era casado porque me pareceu óbvio que sabe cuidar de si mesmo, já que lidou bem com a máquina de lavar e que preparou sua própria comida. Se fosse casado, sua esposa é quem teria prática em fazer essas coisas.
— Hoje em dia, quase nenhum homem sabe cuidar de si mesmo, quer
seja casado ou não.
— Alguns sabem! A maior parte não vê razão para se incomodar em
aprender, já que as esposas cuidam de tudo.
—Talvez. Mas meu irmão, por exemplo, é tão capaz de preparar um jantar decente quanto a esposa. Cherry é uma executiva de alto escalão que sempre chega tarde em casa, então Declan tem de cuidar de si mesmo e da casa, enquanto ela está ocupada. — Eles não têm filhos, certo? — Não. Cherry está em plena ascensão na carreira e não pretende
engravidar nos próximos anos. Mas, estando com apenas vinte e seis anos, ainda tem muito tempo pela frente.
— E seu irmão está feliz com isso? — Bem, ele quer ter filhos algum dia, sim, mas não está com pressa. Os
dois se casaram há pouco tempo. Na verdade, a vida social deles é bastante intensa. Quando não estão trabalhando, são convidados para jantares e outras atividades noturnas. Só chegam em casa antes da meia-noite, quando estão livres e se eles mesmos estiverem oferecendo uma festa. Zara ouvia com atenção, mas suas pálpebras pareciam mais pesadas do que nunca. Era impossível não bocejar de maneira repetida. Só lhe restava cobrir a boca com a mão. Levantando-se para mexer na máquina de lavar que completara o ciclo, Connel continuou falando sobre o irmão.
— De qualquer maneira, Declan ainda não está pronto para a
paternidade. Ainda é muito apegado à vida social. Às vezes, eu me pergunto porque os dois decidiram se casar. Ambos são tão independentes e ocupados, tão envolvidos em suas próprias vidas que parecem mais colegas de alojamento do que um casal. Mas quem sabe o que acontece em um relacionamento? Muitas vezes... O murmúrio grave e agradável daquela voz sensual foi se tornando parte do ruído de fundo na mente de Zara. Era como um soporífico. Embora estivesse tentando manter-se atenta, era impossível manter os olhos abertos. Sua cabeça estava tão pesada que seu pescoço cedeu lentamente à gravidade, levando-a a encostar a testa nos braços que cruzara sobre a mesa. Não soube ao certo quando foi que adormeceu.
A próxima percepção que teve foi a da luz atravessando suas pálpebras e lhe irritando os olhos ainda fechados. Espreguiçando-se, esticou os braços, antes de deduzir que se tratava da luz do sol. Que horas seriam? Estava acostumada a acordar ainda de madrugada, pois a filmagem começava com a alvorada. Devia ter perdido a hora! Virando a cabeça para o lado, verificou que eram oito horas da manhã. Oito horas da manhã?! Aturdida, sentou-se na cama. Por que o despertador não tocara? Era impossível ignorar aquele relógio escandaloso e insistente. Foi então que a lembrança do que lhe ocorrera na noite anterior fluiu de uma só vez em sua memória, parando de registrar imagens em um ponto indefinido da madrugada. Lembrara-se de estar conversando com Connel na cozinha, até que tudo se apagara. Como chegara até o quarto? Uma onda de pânico a dominou. O que acontecera depois de haver adormecido? Na noite anterior, estava de jeans e blusa de lã. Levantando o lençol para se olhar, enrubesceu de imediato. Estava apenas de sutiã e calcinha!
— Oh, meu Deus — murmurou. Ele devia tê-la carregado até o quarto e a despido. E depois? O que acontecera depois? Seria melhor nem pensar nisso. Jogando as cobertas para o lado, colocou um roupão e foi até o corredor, prestando atenção aos ruídos. Onde estaria Connel? Os únicos sons que ouvia eram os de sempre. Nada diferente. Verificou cada cômodo e constatou que tudo estava no lugar, incluindo seus equipamentos de som e de vídeo. A cozinha estava impecável, como ela sempre a deixava. Nem sinal de roupas na secadora centrífuga. Ele devia ter esperado pela secagem completa antes de partir. O carro! Correndo para a janela, viu-o estacionado no lugar de sempre. Se não fosse pelo telefone desconectado da tomada, poderia até pensar que imaginara tudo aquilo, ou que fora um sonho. Colocando o conector no lugar, correu escada acima e começou a se arrumar, seguindo sua rotina habitual. Contudo, não prestou muita atenção em nada, agindo como um autômato. Só conseguia pensar no que poderia ter acontecido na noite anterior. Depois de carregá-la para o quarto, o que Connel teria feito? Se tivessem feito amor, era evidente que ela teria acordado. Fora carregada e despida, mas não se lembrava de nada... Ao pensar em tal possibilidade, ficou desorientada.
Olhou para o café em sua xícara e mal conseguiu bebê-lo. Na verdade, estava até enjoada. Tentando se concentrar nos planos de trabalho que fizera para aquele dia, sorveu a bebida quente. Mas como poderia manter o foco mental, quando uma lembrança vaga lhe atormentava, como uma espécie de sonho vago? A sensação de mãos quentes que a tocaram, em uma carícia... Soltando um gemido de desgosto, interrompeu o rumo dos pensamentos. No momento em que o telefone tocou, deu um sobressalto. Foi sorte haver acabado de beber o café, ou teria manchado a roupa.
— Alô? — atendeu com voz trêmula. Não poderia ser ele. Por que Connel iria telefonar, afinal? Contudo, algo lhe dizia que ainda o veria de novo.
— Zara? É você? A voz do outro lado da linha lhe era familiar, o que a fez relaxar. Era Bárbara, sua eficiente assistente de direção. Normalmente era muito mais madura e segura de si do que a maioria das moças de vinte e poucos anos, mas parecia um pouco insegura naquele momento.
— Sim, claro que sou eu. Por quê? — Você me pareceu um tanto sem fôlego a princípio. Por acaso a
acordei? Esqueceu-se de que pediu que todos começassem mais cedo, às cinco e meia da manhã? Ou perdeu a hora?
— Sim, desculpe-me, meu despertador não tocou — explicou Zara,
preferindo revelar apenas parte da verdade. — Estou de saída, Bárbara. Will já começou a trabalhar... Depois de orientar sua assistente e de desligar o telefone, trancou a casa e se pôs a caminho da locação de filmagem. Precisava deixar para trás a lembrança daquela noite fatídica. Não poderia ficar pensando naquilo. Nada deveria distraí-la da direção do filme que estava produzindo. Com um pouco de sorte, jamais veria Connel Hillier outra vez.
CAPÍTULO III No sábado seguinte, Zara tirou folga. Não era raro trabalhar sete dias por semana, mas seu contrato dizia que um dia era livre. O sindicato dos artistas não deixaria que seus membros não tivessem nenhum dia de folga, mas isso não se aplicava bem a diretores, que poderiam trabalhar em qualquer lugar onde estivessem. Alguns atores, porém, faziam questão de esquecer até o nome da produção em que se encontravam, até voltar para a frente das câmeras, na segunda-feira. Na manhã de sábado, Zara se levantou perto das onze horas, tomou um generoso desjejum, enquanto ouvia o noticiário da estação local de rádio e pensava nas estranhas ligações que vinham surgindo em sua secretária-eletrônica. Alguém telefonara duas vezes sem nada dizer. Seria Larry outra vez? Em silêncio, rogou para que não fosse. Ele estava se tornando um incômodo cada vez maior. Sua irmã deixara outro recado na sexta-feira, lembrando-a do churrasco e pedindo que levasse vinho tinto, se possível. Depois de arrumar a cozinha e o quarto, Zara foi ao cabeleireiro e então almoçou em um restaurante local. Já eram duas e meia da tarde quando chegou ao supermercado para fazer as compras da semana. Ao voltar para casa, ajeitou os suprimentos nos devidos lugares e se recostou em sua poltrona predileta, para cochilar um pouco. Sábado era seu dia predileto, principalmente aqueles em que podia ficar tranqüila para se dedicar a si mesma e a casa. Levou um grande susto quando o telefone a acordou. Foi trazida de volta de um sonho que estava deixando seus nervos à flor da pele. Respirando de maneira profunda, espreguiçou-se e foi até o quarto. Entrou no chuveiro. Um bom banho iria deixá-la pronta para o churrasco na casa de sua irmã. Vestiu seu traje predileto: um conjunto leve de calça e blazer verdejade, acompanhado por uma blusa de seda cor de bronze, que combinava com o bracelete celta que comprara em uma loja de antigüidades. Eram quase seis e meia quando chegou à casa da irmã. A festa já estava animada, apinhada de crianças. Seus sobrinhos correram para recebê-la, corados e agitados.
— Um balão aterrissou na churrasqueira! — exclamou o mais velho. — Papai ficou maluco! — completou o menor. — Precisava vê-lo gritando, tia! — Sim, que pulo ele deu! Enquanto os garotos se entreolhavam e gargalhavam, Zara os encarou com ar desconfiado.
— Será que não foram vocês dois que jogaram o balão na
churrasqueira? inocente.
— Nós? — indagou o mais velho, Félix, de sete anos, com seu melhor ar
Os olhos dele lembravam os de seu pai. Podia-se até imaginar como o garoto ficaria quando crescesse. Seria alto, moreno, com porte elegante e muito atraente.
— A bola apenas se soltou de uma árvore — falou Charlie, com seus
tenros seis anos de idade.
Mas o rubor em sua face e o tom de riso em sua voz o denunciaram. Ele ainda não havia perdido o jeito de bebê. Seu corpo ainda não estava bem definido, mas mesmo assim seguia Félix onde quer que este fosse, tropeçando, caindo e se machucando com freqüência. Quase não era parecido com o pai. Na verdade, Zara via sua própria irmã refletida nele. A ternura, a bondade e a sensibilidade de Sasha pareciam ter se reproduzido no menino. Ninguém se preocupava com Félix, pois era óbvio que se tratava de um garoto forte e seguro. Charlie, por outro lado, era mais frágil.
— Oh, aí está você. Eu disse seis horas em ponto, está lembrada? —
Sasha lhe deu um abraço rápido. — Você parece vestida para uma festa em um restaurante famoso. Por acaso comprou esse traje em Paris, quando esteve lá no mês passado?
— Não, foi em Londres, e já faz um ano que o tenho! Desculpe-me pelo
atraso. Tive de fazer uma porção de coisas hoje. Ei, aqui está minha contribuição para o bar. Zara entregou as duas garrafas de vinho italiano que levara consigo.
— Oh, mas que maravilha! Isso foi adorável, irmãzinha. Obrigada. Isso
nos fará lembrar de nossa viagem à Itália. Vocês adoraram, não é mesmo, meninos? de vinho!
— Sim! — concordou Charlie, com os olhos brilhando. — Bebi um monte — Você apenas molhou os lábios no copo de seu pai, pensando que era
seu suco de uva, mocinho! — corrigiu Sasha, sorrindo de maneira indulgente. — E, se bem me lembro, achou horrível.
— Não foi tanto assim — argumentou Félix. — Tinha uma piscina lá,
onde ensinei Flora a nadar.
— A flutuar — disse a mãe dele. — Ela ficou uma gracinha, montada
naquela bóia em formato de pato. Por acaso já lhe mostrei as fotos, Zara? danadinha?
— Ainda não. Mal posso esperar para vê-las. Aliás, onde está a
arbusto.
— Ali... — disseram os garotos, em coro, apontando para baixo de um
Sobre um pequeno cobertor que forrava; o chão, Flora dormia de maneira profunda, alheia a qualquer ruído. Vestindo um macacão cor-de-rosa, segurava uma rosquinha em uma mão enquanto chupava o polegar da outra.
— Ela não é adorável? — indagou Sasha, com os olhos brilhando de
orgulho materno.
— Sim, é. Melhor ainda quando está dormindo. É quando a vejo
acordada, andando por aí, que começo a ficar apavorada — falou Zara.
— Eu também — concordou Charlie. — Ela sempre quer brincar conosco — reclamou Félix. — Mas é pequena demais para nos acompanhar sem cair. Quando chora, nós é que levamos a culpa!
— Vocês são os mais velhos e devem cuidar de sua irmãzinha — repreendeu a mãe deles. Da churrasqueira, Mark gritou:
— Venham me ajudar, meninos! — Temos de ser os garçons — resmungou Félix. — Levar comida para as
pessoas é cansativo.
— Podem ir agora mesmo — mandou a mãe deles, observando-os
caminhar com má vontade.
— E então? Quais são as boas-novas que tinha para me contar? —
indagou Zara, arqueando as sobrancelhas.
— Adivinhe por que estou tão feliz... Vou começar meu próprio negócio! — Fazendo o quê? — Lidando com fotografia, sua boba! Arrendei uma loja na Abbot
Street. Mas ainda vai demorar cerca dois meses para reformarmos o lugar. Abrirei antes do Natal. Vou me especializar em fotos de crianças e em criações de época.
— Como assim? — Ora, aquelas fotografias que parecem ser antigas, com trajes de um ou dois séculos atrás. Oh, além disso, faremos aquelas fotos super produzidas. Há mulheres que sonham em parecer modelos de capa de revista, então nós faremos a produção. Martha cuidará dos cabelos e da maquiagem. Ajeitarei as roupas falsas e tirarei as fotos. Formaremos uma parceria. Sabe como sou boa em fazer as ruguinhas desaparecerem quando tiro fotografias, não?
— Você vai ganhar milhões — falou Zara, rindo. — Pode rir. Sei que não precisa de nenhuma ajuda nessa área, mas a
maioria das mulheres precisa! Lembre-se que eu mesma precisei, um ano atrás. Tanto que fiz aquela plástica.
— Mas não precisa de nada agora. Está maravilhosa. Estarei torcendo
para que seu negócio seja um grande sucesso. Mark aceitou bem a idéia?
— Deu todo apoio. Na verdade, entrou com metade do dinheiro. Ele insistiu em fazê-lo. Disse que minha idéia foi sensacional e que queria me financiar. Como eu o acho bastante perspicaz, considerei o entusiasmo dele muito importante. — Impressionante — murmurou Zara. — Às vezes seu marido me surpreende. Se bem que todos os homens são capazes de surpreender. Só que alguns não sabem agradar. — Falando em "homens", onde está o seu? — indagou Sasha. — Quem? — Quem quer que seja seu namorado no momento, ora. Eu lhe disse
para trazer um acompanhante.
— Não estou saindo com ninguém no momento. Ando muito ocupada para
me preocupar com uma vida social.
— O que aconteceu com... Como é mesmo o nome dele? Larry? Não, não,
era Harry? Foi o último que conheci.
— Descobri que ele era meio, hum... Esquisito. Então decidi acabar com
tudo, antes que ficasse complicado.
Soltando um suspiro de reprovação, Sasha a encarou com uma das sobrancelhas arqueadas.
— Zara, se continuar dispensando homens dessa maneira, vai acabar se
tornando uma solteirona solitária!
— Já ouvi isso uma centena de vezes! Por quanto tempo ainda
precisarei repetir que não sou solitária? Hoje em dia, uma mulher não precisa se casar para desfrutar a vida. Tenho uma carreira que é muito mais importante para mim do que qualquer homem com quem saí. Ganho bastante dinheiro e me divirto muito, além de amar o que faço. É claro que gosto de companhia masculina, mas não preciso dela para me sentir completa.
— Um dia vai querer ter filhos, Zara. Não deixe para muito depois. — Bem, isso é um caso para se pensar. Mas depois de acompanhar o crescimento de seus filhos, acho que posso me contentar em criar um gato. — Não acredito que esteja falando sério. — Por que não? Flora, em particular, já me deu mais trabalho do que
pensei que um bebê pudesse dar. Acho que não vou chorar de tristeza se não tiver minhas próprias crianças, apesar de não descartar de todo a idéia. Além disso, gatos dão menos trabalho, e pelo menos tomam banho sozinhos — brincou Zara. — Agora abra logo uma dessas garrafas de vinho e me sirva um pouco para que eu possa ir pegar comida com Mark. Estou sentindo o aroma do tempero e isso está me deixando faminta.
Quando se aproximou da churrasqueira, com um copo de vinho tinto na mão, seus cabelos avermelhados balançaram ao vento fresco do cair da tarde, realçados pelo verde-jade de seu traje. Quando a viu, Mark arqueou as sobrancelhas com cinismo, daquela maneira que a fazia cerrar os dentes.
— Nenhum homem esta noite, Zara? — indagou ele. Ela estudou a grelha da churrasqueira com ar irônico.
— Por acaso há algum no ponto para consumo? — Bem que ouvi falar que você "jantava" homens, mas nunca pensei que
fosse verdade! — falou Mark, com calculado sarcasmo. — Mas sinto muito. Só temos espetinhos de frango, lingüiça, e salsichas com bacon.
— Então vou me virar com frango mesmo. E também quero algumas cebolas assadas, de preferência as que ainda não ficaram carbonizadas.
— Ei, não critique meu jeito de cozinhar — protestou ele, enquanto
atendia ao pedido dela.
A antipatia entre eles era natural e recíproca. Um não aprovava nada em relação ao outro. Zara sempre se perguntava por que Sasha se casara com aquele homem autoritário e dominador. Se bem que precisava admitir que era raro encontrar alguém tão atraente como Mark. Era uma pena que sua irmã houvesse se deixado levar pela aparência quando se apaixonara. Havia um ano desde os dois passaram por uma séria crise no casamento. Quase se divorciaram, mas conseguiram resolver os problemas. Na verdade, nunca pareceram tão felizes como ficaram desde então. A vida deles mudara muito depois que Mark trocara de emprego. Sasha dizia que seu marido estava adorando o novo trabalho e que tinha mais tempo para ficar com a família. Além disso, como engenheiro civil encarregado de supervisionar todas as obras de uma nova construtora, ele podia passar grande parte do dia fora do escritório, o que o deixava bem-humorado.
—Sirva-se de salada — sugeriu ele, entregando a ela o prato com
frango e cebolas assadas.
Conforme se virou, depois de se servir, Zara colidiu com um homem que estava atrás dela, murmurando um pedido de desculpas de maneira automática, embora a culpa pela colisão houvesse sido dele, por estar tão perto.
— Oh, sinto muito. Agressivo.
— Tudo bem. Estou me acostumando com seu jeito, digamos...
Aquela voz grave a fez parar e olhar para cima, surpresa. Por um ou dois segundos, ela o fitou com curiosidade, para então reconhecer Connel, já sem barba e com os cabelos cortados e bem penteados. Ele estava com uma ótima aparência e parecia exalar beleza e masculinidade por todos os poros.
— O que está fazendo aqui? — indagou Zara, verificando que ele
também estava com roupas bastante refinadas para a ocasião.
— Fui eu quem o convidou — interveio Mark. — Por acaso vocês dois já se conhecem? Isso nunca me ocorreu... — Não — negou Zara. — Sim — garantiu Connel. Mark olhou de um para o outro, com uma expressão curiosa.
— Qual dos dois estaria mentindo? — Quem mais poderia ser? — questionou Connel, sorrindo. — Não tenho
o hábito de inventar histórias, como você bem sabe.
— Nós não nos conhecemos! — bradou Zara. — Apenas nos
encontramos. Uma única vez, aliás, o que foi mais do que suficiente para mim. Afinal de contas, como é que ficou conhecendo este... Indivíduo, Mark? Pensei que ele houvesse ficado fora do país, fazendo explorações, por anos e anos.
— Ele é meu chefe — respondeu-lhe o cunhado, boquiaberto. — Seu chefe?! Não pode ser! Ele me disse que era um explorador! —
Zara se virou para encarar Connel. — Você mentiu para mim.
— De jeito nenhum. Passei o último ano naquela expedição
internacional, na América do Sul. Mas também sou o diretor-presidente da uma empresa de engenharia civil. Tirei um período de licença enquanto meu pai cuidava dos negócios para mim.
— Mas disse que morava em Londres... — Tenho um apartamento em Londres, que herdei de uma tia e ainda
não consegui vender. Às vezes me hospedo lá, que era de onde eu estava vindo no começo da semana. Zara lançou um olhar de suspeita na direção do cunhado, que a fitava com ar de divertimento. O que ele teria dito? Talvez Hal Thaxford não houvesse sido a única fonte de informações de Connel.
— Falarei com você depois, Mark — afirmou ela, em um tom ameaçador,
virando-se e saindo à procura de Sasha.
Encontrou-a ao lado de Martha Adams, a vizinha e futura sócia de sua irmã. Depois de entrar na conversa, esperou que o assunto se esgotasse para então perguntar:
— Desde quando conhece Connel Hillier, irmãzinha? — Na verdade não o conheço. Só sei que é o dono da empresa onde
Mark está trabalhando — respondeu Sasha, assumindo um ar de curiosidade. — Já o conhece? Não me lembro de ter falado dele. Não me diga que é seu novo namorado... Isso seria impressionante!
— Não é nada disso! Só o encontrei uma vez e não foi uma experiência
lá muito agradável. Lembra-se daquela tempestade que ocorreu no começo da semana?
Enquanto comia, Zara contou em detalhes o que acontecera naquela noite. Sasha e Martha ouviram cada palavra, fazendo perguntas ocasionais.
— Então ele invadiu sua casa! — disse Martha, ao final da história. — Deve ter sido um choque para ele encontrá-la aqui esta noite —
Sasha supôs.
— Que nada! Ele nem titubeou ao falar comigo. Na verdade, agiu como
se fôssemos velhos amigos e até fez piadinha do meu embaraço diante dele. Sasha pareceu ficar desconcertada.
— O problema, Zara, é que Mark gosta muito desse novo emprego. É claro que ele não poderá mandar o próprio chefe embora de nossa casa. — Mandar quem embora? — indagou o próprio Mark, aproximando-se. — Connel Hillier! — respondeu Sasha, nervosa. — Sei que o considera
uma ótima pessoa, mas espere só até ouvir o que ele fez com minha irmã. Conte a ele, Zara.
Naquele momento, Connel se aproximou do grupo, com um copo de vinho na mão, olhando-os com ar divertido.
— Isso, Zara, conte-nos — provocou ele. — Mas que ousadia a sua a de vir aqui e falar assim, depois do que me
fez! — esbravejou ela, cerrando os punhos.
— Ainda estou esperando para ouvir o que, exatamente, ele fez —
disse Mark, levando um pedaço de frango à boca, sem demonstrar a menor preocupação.
Ruborizada por causa do ar de zombaria de Connel, Zara declarou:
— Ele invadiu minha casa! — Apenas entrei, depois de bater à porta e de tocar a campainha por
um longo tempo. Além disso, a fechadura estava destrancada. Zara passou a encará-lo.
— Você me carregou à força, escada acima, e me trancou no meu
próprio quarto!
Mark soltou um assobio longo e alto.
— Tenho de concordar que isso foi muita ousadia, Connel. Não conheço
muitos homens que teriam coragem para assumir tal risco.
Outros convidados se aproximaram, parecendo curiosos com o que ouviam, mas Connel não demonstrou estar afetado pela cena que causara. Em um tom casual, disse apenas:
— Fui forçado a agir de maneira radical quando a vi se comportar como
se não fosse racional. Do contrário, eu jamais teria feito o que fiz. Você queria que eu saísse, naquela chuva, sendo que foi por sua culpa que eu fiquei ensopado daquele jeito. Por acaso contou isso a sua irmã? Mencionou o tempo que me deixou esperando, na tempestade, por um táxi que nem sequer enviou?
— Mas eu liguei e pedi que enviassem um! — Uma hora depois! — Meia hora, talvez. — confessou Zara. — Enquanto isso, fiquei lá, mais ensopado a cada minuto. Poderia ter
apanhado pneumonia! Precisava tirar aquelas roupas encharcadas o mais depressa possível e tomar um banho quente. Era uma questão de sobrevivência. Ele olhou com ar de vítima para Sasha, que já o estava fitando com ar solidário. Zara sempre achara sua irmã uma grande tola, pois ficava sempre com pena das pessoas mesmo sem saber o que as colocava em situações difíceis. Por isso, qualquer um conseguia enganá-la. Então Connel acrescentou:
— E cozinhei meu próprio jantar. A irmã de Zara a encarou com ar de reprovação, dizendo:
— Oh, Zara, você deveria ter feito pelo menos isso para ele! Antes que pudesse responder, ela foi interrompida por um longo suspiro de Connel, que continuou:
— E lavei as roupas que estava usando por minha própria conta. Não
pedi que fizesse nada para mim, pedi? Além disso, quando adormeceu à mesa, enquanto eu jantava, ainda me dei ao trab...
— Ora, cale-se! — gritou Zara, já que preferira não contar aquela
parte da história para Martha e para a irmã.
— Ela dormiu? — indagou Mark, com um brilho malicioso no olhar. — Bem na minha frente, à mesa. — E o que você fez? — Sou um cavalheiro, ora — declarou Connel. — Que opção me restava,
senão carregá-la para cima?
— Sim, claro — concordou o outro, com ar solene. — O que fez, então? Antes que ele pudesse responder, Zara ficou de pé.
— Quero falar com você! — disse ela, estreitando o olhar. Enquanto se
afastava, seguida por ele, pôde ouvir a risada debochada de seu cunhado.
— Aonde está me levando? — indagou Connel, aproximando-se mais. — Algum lugar mais privado? Que tal sua casa? De preferência seu quarto, talvez? Gostei de estar lá. Foi muito excitante. Aquela altura, já estavam fora do alcance da vista dos outros convidados. Os ciprestes que Mark plantara na borda do jardim estavam servindo de escudo para eles. Então ela o encarou e falou com frieza:
— O que contou, exatamente, a meu cunhado? — Ele só sabe o que acabamos de lhe contar. — Nesse caso, por que aquelas risadas todas? — Creio que Mark a achou engraçada. Quem não acharia? Deixe-me
dar-lhe uma pista. Se não quer que as pessoas fiquem curiosas, não as faça suspeitar que está tentando esconder algo. Aquilo a deixou imóvel de fúria.
— O que eu poderia estar escondendo? — Diga-me você. — Não faço idéia. Mas creio que você saiba. — Não, não sei mesmo — respondeu ele, sorrindo. — O que está
supondo que eu deveria saber, afinal?
— Ora, pare de brincar com as palavras! Não estou interessada em
participar de suas brincadeiras.
— Não gosta de jogos, Zara? O tom de voz dele era sedutor e envolvente. Foi preciso se concentrar para não se deixar levar.
— Não. E pare de mudar de assunto. — Mas não estou mudando. Do que estávamos falando, afinal? — Do que você fez depois que eu adormeci. — Como eu disse a Mark, não tive outra alternativa, senão levá-la para sua cama.
— Não contou a ele que tirou minhas roupas? O sorriso dele transbordou de satisfação enquanto fitou-a de alto a baixo, como se estivesse revivendo um momento de agradável nostalgia.
— Disso eu não me esqueci. Garanto. — Oh. Era o que Zara temia.
— Notei que não mencionou isso para sua irmã — prosseguiu Connel. Ela não conseguiu dizer nada. Um nó se formou em sua garganta.
— Está encabulada a respeito disso? — indagou ele. — Não pensei que
se importasse por um homem tê-la despido.
— Ora, v-você! N-n-não tem o direito! — gaguejou ela. — Bem — murmurou Connel, demonstrando um tom equilibrado e ponderado. — Eu não poderia deixá-la dormir vestida, não é? Ela engoliu em seco, antes de prosseguir.
— E então, o que aconteceu? — Do que está falando? roupas...
— Sabe muito bem do que estou falando! Depois que tirou minhas — Oh. Você devia estar tendo um sonho adorável. — Sonho?
Zara tivera mesmo um sonho. Mas como ele poderia saber? A menos que não houvesse sido apenas fruto de seu subconsciente, e que houvesse mesmo um par de mãos quentes e fortes a acariciá-la de maneira eletrizante. Se pelo menos tivesse certeza... Era a dúvida que a deixava arrasada. Fitando-a com atenção, ele sussurrou:
— Parece que está se lembrando agora. despir? intimidade.
— Pare de fazer insinuações e fale de uma vez. O que fez depois de me Connel se aproximou, fitando-a com um ar ambíguo de desafio e
— O que se lembra de haver sonhado que eu fiz? — O que o faz pensar que apareceu no meu sonho? Tocando-a no rosto, Connel a acariciou. Aqueles dedos firmes e quentes eram os mesmos de seu sonho. E essa certeza a deixou à beira do estado de choque.
— Se ainda não apareci, garanto que ainda vai acontecer, Zara. Ao ouvi-lo murmurar aquelas palavras sensuais, ela afastou a mão dele com um tapa.
— Não me toque! tom suave.
— Já o fiz, minha cara. E farei outras vezes — prometeu Connel, em — Nem pensar!
— Oh, sim. Vou tocá-la de novo, Zara. Ela sabia que estava sendo provocada de maneira deliberada, mas havia outra coisa muito mais preocupante em andamento. Seu corpo estava ardendo de desejo. Já tinha experiência suficiente para saber que o desejava. Aos trinta e dois anos de idade, sabia identificar aquelas ondas de calor que se espalhavam em seu corpo. Pior ainda fora ouvir a respiração dele se tornar tão errática quanto a sua. Enquanto sustentavam o olhar um do outro, seus corpos pareciam estar se comunicando. Sem nenhuma troca de palavra, ambos souberam o que se passava. Jamais sentira um desejo tão forte por alguém. Como era possível que um instinto físico, tão básico e primitivo fosse capaz de fazer a lógica desaparecer? Depois do que acontecera, ele era a última pessoa do mundo por quem ela deveria se interessar! De repente, enquanto se encaravam, o rosto de Connel se aproximou e os lábios de Zara se entreabriram para receber os dele, ao mesmo tempo em que seus olhos se fecharam. Então pequenas mãos agarraram a coxa dela, fazendo-a pular de susto. Voltando a ficar alerta, olhou para baixo, em choque.
— Oh, é aquela pequena demolidora — ralhou Connel, quando ambos
identificaram Flora, fitando-os com os olhos brilhantes e o rostinho corado. Ainda agarrada à perna de Zara, a menina começou a falar:
— O que vocês estão fazendo, tia? Brincando? Não gostei deste jogo. Vamos brincar de esconde-esconde. Todos nós. Quero brincar de esconde-esconde! Agora! — Três é uma multidão — falou Connel, com secura, afastando-se. — Vou conversar um pouco com o pai dela. Cuide bem de sua sobrinha, sim? — Covarde — acusou Zara, sentindo-se encurralada ao ouvi-lo soltar
uma risada sonora.
Depois de brincar com a garota por dez minutos, levou-a para sua irmã. Sasha.
— Aqui está sua preciosidade — murmurou ela, entregando Flora para A menina abraçou a mãe e disse:
— A titia estava brincando com o tio Connel e não quer brincar comigo. Martha e Sasha viraram as cabeças simultaneamente na direção de Zara, que se defendeu:
— Mas brinquei de esconde-esconde com ela por uma eternidade! Sasha sorriu.
— Ela está enjoadinha porque já passou da hora de dormir.
— Eu a coloco na cama — ofereceu-se Martha, afastando-se com a
menina no colo.
— Acho que também está tarde para mim. Já vou indo, irmãzinha — falou Zara, tentando escapar do olhar curioso de Sasha, quando as duas ficaram sozinhas. Mas não adiantou. — O que é que você e Connel estavam fazendo enquanto desapareceram? O que está acontecendo, afinal? — Nós discutimos... — O que Flora estava querendo dizer quando falou que estavam
"brincando"?
— Quem sabe? — Que tipo de brincadeira? — insistiu Sasha. — Pergunte a Flora. Foi ela quem disse, afinal. Preciso ir agora. A festa
foi ótima. Até mais ver, querida.
— Deixe Connel em paz — falou sua irmã, fazendo-a se virar para
encará-la. — Sei o que acontece aos homens que você dispensa. Eles podem se tornar mesquinhos. Não quero que Mark perca o emprego por sua causa. outra vez!
— Não tenho a menor intenção de chegar perto do chefe de seu marido Dizendo isso, saiu dali o mais depressa possível.
Típico, pensou Zara. Connel se aproximara, forçara uma "cantada", apesar de seus protestos, e sua própria irmã estava achando que fora ela quem tentara seduzi-lo! Depois de manobrar o carro para fora da vaga, colocou-se a caminho de casa. Estava a menos de dez minutos de seu destino quando ouviu um estrondo e sentiu o volante dar uma guinada para o lado. Assustada, diminuiu a velocidade, mas o carro começou a derrapar para o lado pela avenida, fazendo o ruído típico de um pneu estourado. Freando com violência, tentou recuperar o controle do carro, mas não conseguiu pará-lo nem desviá-lo do fosso de concreto no final da rua. Por sorte, havia um morro coberto de grama do outro lado do fosso e não uma parede de pedras ou de tijolos. A frente do carro colidiu com força e o capo se enrugou como se fosse papel alumínio. Zara foi arremessada com violência contra o airbag, que inflou de repente, de dentro do volante. desmaiar.
"Graças a Deus alguém inventou o airbag", pensou ela, antes de
CAPÍTULO IV — Zara? Pode me ouvir? Zara, acorde. A voz era familiar e ela se mexeu, fazendo uma careta quando o movimento lhe causou dor. Alguém, perto dela, soltou um suspiro aliviado.
— Graças a Deus. Pensei que você não voltaria a si. — Vá embora — disse Zara, sem abrir os olhos, sentindo o travesseiro
sob seu rosto ceder um pouco, como se estivesse ondulando.
Por que havia alguém em seu quarto? Quem poderia ser? Aquela voz não lhe era estranha, mas um desagradável torpor a impedia de pensar com clareza. Era difícil até mesmo tentar pensar em associar nomes as suas lembranças.
— Acorde! — Estou com muito sono. Vá embora e me deixe em paz. gasolina.
— Fique acordada. Você precisa sair daí. Estou sentindo cheiro de
A voz era autoritária e foi com certo ressentimento que Zara ouviu aquelas palavras.
— Cale-se — ralhou ela, em um fraco murmúrio, tentando se entregar à
escuridão do sono.
— Não volte a dormir. Zara, ouça com atenção, está bem? As portas estão emperradas. Consegue alcançar o fecho do cinto de segurança? O pára-brisa está quebrado e posso retirá-la facilmente pela frente se conseguir se livrar do cinto. — Cinto de segurança? Quem estaria dizendo aquela asneira? Não havia tal tipo de acessório em sua cama. Com um esforço extremo, abriu seus relutantes olhos e descobriu que o travesseiro sobre o qual estava aninhada era um enorme airbag inflado. Endireitando-se no assento, gemeu alto por causa da dor que sentiu nas costelas e no pescoço.
— O que aconteceu? — indagou, confusa, sem conseguir ver nada além
de pedaços de vidro no banco lateral e em parte do painel.
Estava escuro e parecia haver uma espécie de névoa em seus olhos. Não reconheceu de imediato o vulto que se encontrava sobre o capo, bem diante dela, em meio às sombras. Além disso, uma fumaça acinzentada, com cheiro de fios queimados, parecia vir da frente do carro.
— Eu bati o carro! — Não se importe com isso agora. Chega de conversa. Saia já daí, Zara!
Sentindo uma onda de desespero, ela começou a procurar o fecho do cinto de segurança.
— Isto não quer abrir! Estou presa! — Acalme-se. Pare um segundo e respire de maneira profunda. Não
entre em pânico, está bem? estava.
— Não estou em pânico! — esbravejou ela, admitindo para si mesma que
Seguindo as instruções, puxou o fôlego e soltou o ar devagar, antes de tentar outra vez. Sua mente pareceu clarear um pouco, mas a névoa continuava em sua visão. Dessa vez, entretanto, ouviu o ruído característico do fecho do cinto de segurança e conseguiu se libertar.
— Agora, venha! O vulto à sua frente desapareceu. Não. Na verdade, apenas se afastou. Ao mesmo tempo em que ouviu aquilo, viu um par de mãos surgir diante dela, tentando alcançar as suas. O airbag esvaziou de vez e então ela conseguiu se inclinar para a frente e ver o rosto de seu salvador, iluminado por um feixe de luz que parecia passar sobre o carro.
— Você! Mas seria possível que não tivesse reconhecido a voz e o jeito de Connel todo o tempo? Sua mente só estava se recusando a aceitar algo em que ela não queria acreditar. Os lábios dele se curvaram em um sorriso.
— Quem pensou que fosse? Bem, isso não importa. Venha logo, pois não
há tempo a perder. Precisa sair logo daí.
Zara segurou-lhe as mãos e gemeu por causa da dor que sentiu ao ser tocada. O vidro devia tê-la ferido bastante e, com certeza, havia cacos nos cortes. Conforme se mexeu, sentiu dores da cabeça aos pés. Então foi puxada com firmeza e erguida para fora do veículo, pelo vão do pára-brisa. Foi impossível não gemer em voz alta. No instante seguinte, estava sobre o ombro dele, sua cabeça balançando de maneira errática conforme Connel corria para longe do veículo fumacento e rumava para seu próprio carro, cujos faróis estavam acesos, iluminado o morro pouco acima do ponto de impacto. Pouco depois, ela foi acomodada no assento do passageiro e viu o cinto de segurança ser colocado nela com grande agilidade. A porta se fechou e, em menos de um segundo, Connel assumia a posição do motorista. Com uma manobra hábil e um tanto brusca, afastou-se dali em alta velocidade. Abismada com tudo aquilo, Zara não teve tempo para se ressentir pelo modo como estava sendo tratada. Na verdade, surpreendeu-se por ainda estar viva
quando conseguiu focalizar a vista em seu próprio carro e ver o estado em que ficara. Jamais sofrerá um acidente antes. Recebera até mesmo um desconto especial da companhia de seguros, além do bônus usual, por jamais ter usado a apólice, desde seu primeiro veículo. Depois da saída rápida, Connel parou o carro em uma esquina próxima, na mesma avenida pela qual Zara viera.
— O que pensa que está fazendo? — indagou ela, olhando-o com
suspeita. — Por que parou?
Connel a ignorou, mantendo a atenção no retrovisor lateral, estreitando o olhar e inclinando a cabeça para o lado enquanto observava algo. Virando-se para trás, Zara viu que a fumaça que saía de seu carro, ao longe, aumentara muito em quantidade. Então houve uma forte explosão. O veículo batido foi envolvido pelas chamas e o clarão a levou a cobrir o rosto. No mesmo instante, ouviu-o soltar um assobio longo e baixo.
— Eu sabia! Saímos dali bem a tempo! — Aquele... Meu Deus! Aquele era meu carro? — sussurrou ela,
sentindo-se trêmula enquanto se endireitava e via o interior do veículo ser iluminado pelas chamas altas, atrás deles. Enquanto isso, Connel retirou um telefone celular de dentro do painel que separava os bancos e começou a falar com alguém. Contudo, era impossível prestar atenção no que era dito, pois ela estava ocupada demais pensando em quão perto da morte acabara de estar.
— Você está bem? no suporte.
Ainda boquiaberta, Zara virou-se para o lado e o viu colocar o telefone
— O quê? — Como se sente? — indagou Connel, em tom paciente. — Como acha que me sinto? — murmurou Zara. — Acabei de destruir
meu carro, estou dolorida da cabeça aos pés e quase morri! Como é que você se sentiria no meu lugar?
Connel aproximou a mão de seu rosto e afastou uma mecha de cabelos que estava lhe encobrindo um dos olhos. Então pegou um cobertor que estava no banco de trás e a cobriu do pescoço para baixo.
— Está bem, fique calma. Acabei de ligar para a polícia e de informar
sobre o acidente. Os bombeiros logo estarão aqui, mas o sargento me autorizou a levá-la para o hospital antes mesmo da chegada deles. Falarão com você depois, após o atendimento médico.
— Não quero ir para o hospital. Não estou muito ferida — protestou
Zara, com a voz trêmula. — Só quero ir para casa e me deitar na minha cama. No mesmo tom calmo e confortante de antes, ele respondeu:
— Antes precisa se submeter a uma sessão de radiografias. Você
estava desmaiada quando cheguei e deu trabalho para acordá-la. Como saí, logo depois de você, alcancei-a logo após o acidente. Já que não ficou muito tempo inconsciente, acredito que não seja nada sério. Mas, para o caso de haver uma concussão, é melhor ser examinada por um médico. Além disso, é óbvio que está em choque e que precisa de medicação.
— Estou ótima! Leve-me para casa, sim? Connel a encarou com seriedade e então colocou o carro em movimento.
— Olhe-se no espelho. Está pálida como uma boneca de porcelana. Já
liguei o aquecedor do carro e coloquei o ar quente no máximo. Daqui a pouco a temperatura vai subir e você vai se sentir melhor.
Fechando os olhos, Zara soltou o fôlego de maneira exasperada. Por que tinha de ser logo ele a resgatá-la? A última pessoa do mundo a quem ela gostaria de dever a vida! Além disso, sentia-se estranha, como se não estivesse completamente ali. Seria apenas choque ou haveria mesmo uma concussão? Apesar de ter noção de que estava quente a sua volta, sentia tanto frio que seus dentes estavam batendo. Saíram da área do campo e chegaram depressa à cidade. Estava ficando cada vez mais difícil abrir os olhos, então Zara os manteve fechados. Não os abriu nem mesmo quando o carro parou, fazendo-o apenas quando ouviu a porta ser aberta ao seu lado. Depois de ajudá-la a abrir o cinto de segurança, Connel a apoiou para que ficasse de pé. Mas as pernas de Zara não a sustentaram. Ele a ergueu nos braços e a carregou para a recepção da ala de emergência. Com a cabeça aninhada junto àquele peito másculo e protetor, deixou que suas pálpebras se fechassem outra vez, sentindo sua lucidez ir e vir, naquela mescla do perfume de Connel misturado aos cheiros de remédio do hospital. As duas horas seguintes se passaram em uma grande confusão de correrias e de esperas. Foi examinada, radiografada e reexaminada da cabeça aos pés. Então o jovem e, aparentemente, exausto médico lhe sorriu com ar profissional, na sala de observação.
— Os cortes e hematomas não são problemas sérios e logo cicatrizarão.
Em poucos dias, nem se lembrará deles. Não creio que haja uma concussão, nem achamos sinais de ferimentos internos ou de fraturas nas radiografias. Não precisamos mantê-la aqui pelo restante da noite em observação, mas, se tiver dor de cabeça ou problemas de visão, precisará voltar imediatamente. Fui claro?
— Sim, mas... O médico a interrompeu, prosseguindo:
— Ótimo. Esses seriam sintomas de que é possível haver algum
problema sério que os exames não detectaram. Quando chegar em casa, vá direto para a cama. Tome as pílulas que estamos lhe receitando e fique em absoluto repouso por alguns dias. Ainda está em choque, mas não me parece nada sério. Creio que seu amigo possa cuidar de você, não é mesmo? Amigo? De quem ele poderia estar falando? A quem teriam informado a respeito do acidente? Sem saber ao certo do que se tratava, ela ficou em silêncio e balançou a cabeça afirmativamente.
— Muito bem. Vou lhe dar uma injeção — disse o homem, fazendo-a se
sobressaltar ao espetá-la com a agulha. — Doeu? Sinto muito — concluiu ele, em um tom bem-humorado.
— Você precisa voltar para a faculdade e ter mais algumas aulas
práticas — murmurou Zara, fazendo-o rir como se estivesse brincando. Mas não estava.
Quando foi conduzida para fora da sala de observação, ela descobriu quem era o "amigo" de quem o médico falara. Connel estava sentado no banco em frente à porta, lendo um jornal.
— Está tudo bem? — indagou ele, levantando-se. — Consegui encontrar
uma cadeira de rodas. Você não é pesada, mas carregá-la o tempo todo, de um lado para outro, está acabando com minha força. O jovem médico riu.
— Posso andar. Não sou inválida — ralhou Zara. — Sente-se — disseram ambos os homens, em uníssono, segurando-a
um de cada lado e colocando-a na cadeira de rodas.
Nem mesmo o orgulho pessoal de Zara a deixou oferecer resistência, pois seria um grande fiasco tentar enfrentar aqueles dois gigantes. Depois de Connel cobri-la com aquele mesmo cobertor grosso outra vez, viu-o se afastar um pouco e falar com o médico em um tom tão baixo que foi impossível escutar. Não que ela se importasse. Estava com tanto sono que seria capaz de adormecer ali mesmo, sentada. Quando Connel se despediu do médico, voltou a se aproximar e começou a conduzir a cadeira de rodas pelos corredores do hospital. O passar constante e compassado de corredores e de portas foi dando a Zara uma sensação irreal, levando-a a ficar em dúvida se aquilo era realidade ou sonho. Então a escuridão retornou. A próxima visão que teve foi a do teto de seu próprio quarto, enquanto estava sendo deitada na cama. Confusa, encarou-o por um momento até compreender o que estava acontecendo. Em seguida, fez uma careta e disse, em tom sonolento:
— O que pensa que está fazendo?
— Vou despi-la e colocá-la para dormir — informou Connel, com
tranqüilidade, desabotoando-lhe a blusa. — E como já fiz isso antes, não faça nenhum escândalo. Não pretendo transformar isso em uma cena, portanto, contenha-se. Zara empurrou as mãos dele.
— Posso muito bem... — Não, não pode. Mas está conseguindo ficar consciente. Apenas
relaxe e finja que não está acontecendo nada. Acabarei em um instante — falou ele, abrindo-lhe a calça e puxando-a para baixo. — Receio que esse traje jamais volte a ser o que era, mesmo depois de limpo. Está todo furado por cacos de vidro. um suspiro.
Lançando um olhar para a peça que ele segurava estendida, Zara soltou
— Tem razão. E custou uma fortuna! — Isso não é tão importante, concorda? Afinal, você está viva. Agora
diga-me onde está seu pijama, ou qualquer outra coisa que use para dormir. Algo ainda a estava incomodando muito mais do que aquilo.
— Esqueça isso. Dormirei assim mesmo. Como foi que conseguiu abrir a
porta da frente? Nem tente me dizer que a deixei destrancada desta vez, pois não é esse o caso.
— Achei a chave na sua bolsa, é claro — respondeu Connel, com
naturalidade, enquanto a acomodava na cama com o mesmo cuidado que teria com uma boneca de fina porcelana.
— Mas... o edredom.
— Sim? — murmurou ele, sorrindo enquanto a cobria com o lençol e com — Você não tinha o direito de mexer na minha bolsa! — O que esperava que eu fizesse? Que ficasse sentado com você, no
carro, a noite toda? Não aja como criança. Use essa mente brilhante que Deus lhe deu e agora me diga se há algo que eu possa lhe trazer. Leite? Água? Uma xícara de chocolate quente ou talvez um pouco de chá?
— Não, obrigada — resmungou Zara. A resposta dele a desarmara. Aliás, isso não era nenhuma novidade. De que maneira iria confrontar alguém com uma mente tão perspicaz? Se não fosse pela aparência física, jamais acreditaria que se tratava de um primo de Hal Thaxford. Depois de a luz ser apagada, ela ficou sozinha, pensando nas surpresas que ainda estariam por vir. Estava quase adormecendo quando o escutou entrando no quarto outra vez, pé ante pé.
— O que quer aqui? — indagou, pronta para lutar se ele tentasse se
deitar em sua cama.
— Desculpe-me se a acordei. Tentei não fazer barulho, mas acho que não consegui. Estava lá embaixo e me ocorreu, de repente, que você poderia sentir sede no meio da noite, então trouxe um jarro com água e um copo — falou Connel, colocando-os sobre a mesinha-de-cabeceira. — Aí estão. Precisa de algo mais? — Não. cedo.
— Está bem. Oh, sim, telefonei para sua irmã e ela virá aqui amanhã — Não deveria ter ligado! Sasha já tem uma agenda muito cheia. Além
disso, trará Flora consigo, o que me deixará maluca.
— Ela insistiu. Na verdade, queria vir hoje mesmo, mas eu disse que não
precisava porque iria ficar aqui durante toda a noite. Você precisa de companhia até que o risco de concussão tenha passado, mas terei de ir trabalhar amanhã. muito bem.
— Por acaso pedi que ficasse? Não preciso se ninguém. Posso me cuidar
— Não no estado em que se encontra. Agora fique quieta e tente dormir. Se precisar de mim, estarei no quarto ao lado. Encontrei este sininho de bronze em sua sala. Toque-o para me chamar. Foi possível ouvir o suave tilintar do sino, conforme ele foi colocado com suavidade sobre a já lotada mesinha-de-cabeceira. Antes que pudesse protestar, Zara ficou sozinha outra vez. Sentia-se muito cansada para fazer qualquer coisa. Então piscou os olhos de maneira demorada e sentiu uma estranha leveza no corpo, como se estivesse flutuando. A próxima visão que teve foi a da luz do sol matinal invadindo seu quarto. Um delicioso aroma de café. Café! Era disso que estava precisando! Com um esforço extremo, conseguiu se sentar. Apesar das dores no corpo, a cabeça não estava mais lhe dando a sensação de estar rodopiando. Sua visão também não fora afetada, pois pôde ver muito bem quando Connel passou pela porta do quarto. Aquela visão a surpreendeu. Recém-barbeado e com outra roupa, parecia pronto para uma reunião de negócios. Estava muito atraente. Como era possível? Teria ele o hábito de levar um guarda-roupa portátil no porta-malas do carro? Ele parou de repente, encarando-a com ar surpreso.
— Oh, você já estava acordada! Por que não me chamou? Eu teria trazido seu desjejum mais cedo. — Acabei de acordar. Connel colocou no colo dela a bandeja que trazia nas mãos.
— Aqui está. Suco de laranja, café, ovos cozidos e torradas. Ou será
que prefere cereais com leite?
— Não, isso está ótimo — murmurou Zara, ainda rouca, observando-o abrir as cortinas para deixar o sol de outono entrar. Então, percebendo que estava apenas de roupas íntimas, ela puxou o lençol até o pescoço, cobrindo-se. Aquilo o fez rir alto.
— Por que fez isso, Zara? Deixe de tolice. Está tentando me convencer
de que você, entre todas as pessoas, é tímida? bandeja.
De cabeça baixa, com a face quente de embaraço, ela fitou apenas a
— Foi muita gentileza sua trazer o desjejum para mim. Não estou acostumada a isso. Connel arqueou as sobrancelhas.
— Ninguém jamais a serviu na cama? Não me surpreende que seus
relacionamentos não tenham durado. Acho que vem saindo com os homens errados. Ela o ignorou, tentando manter-se calma ao mudar de assunto.
— Espero que tenha dormido bem. — Sim, com certeza. E você? — Muito bem, obrigada. — Como se sente esta manhã? — Vejamos... Minhas costas doem, assim como o pescoço e os cortes.
Mas estou aliviada. Meu raciocínio melhorou e não tenho nenhum sintoma preocupante. Nem dor de cabeça, nem problemas de visão.
— Isso é ótimo. Você parece mesmo melhor — murmurou ele, com ar de
bom humor, fitando a silhueta dela sob o lençol. — Pelo que consigo ver, claro.
— Sei que pensa ser muito engraçado, mas não estou disposta a
suportar suas brincadeiras! Não estou com tanto bom humor assim. Pare de fazer piadinhas a respeito de eu estar vestindo apenas roupas íntimas. A expressão dele foi de jocosa inocência ao dizer:
— Por acaso mencionei isso em algum momento? Creio que seja você
mesma a única obcecada com seus próprios trajes. Ou, talvez, com a falta deles.
— Mas foi você quem ficou me olhando, sem piscar — acusou ela. — Desculpe-me — respondeu Connel. — Eu fiz isso? Bem, sou um
homem bastante ativo, não um monge celibatário. Como esperava que eu reagisse ao ver alguém tão linda e sensual, seminua? O mínimo que eu poderia fazer seria olhála, não?
ela.
— Ora, pois tente se conter daqui para a frente, sim? — esbravejou
Mas isso não a impediu de aceitar o elogio implícito. Então Connel a achava linda e sensual? Sentiu uma onda de calor pelo corpo. Quando o viu se virar para sair, não conseguiu deixar de olhá-lo, de maneira intensa, atraída por aquele corpo másculo e também muito sexy. A mera presença dele era suficiente para deixá-la sem fôlego. Nem mesmo na adolescência conhecera alguém que a afetasse tanto. Ainda bem que não gostava dele, ou estaria em apuros. Ou será que gostava? Era impossível negar que ele tinha muito charme. Era gentil e interessado, além de muito dedicado. Sabia cuidar de si mesmo e de qualquer um que precisasse de ajuda. Zara aprovava todas essas qualidades. Quem não aprovaria? Mas, ainda assim, era difícil suportar alguém tão autoritário por perto. De súbito, foi flagrada fitando-o, pois Connel se virou de repente ao chegar à porta. Arqueando uma sobrancelha, ele sorriu com ironia antes de dizer:
— Vou deixá-la sozinha agora, para que aproveite seu desjejum em paz.
Depois, trate de descansar. Precisa ficar na cama hoje, quer se sinta bem ou não, e lembre-se de tomar os remédios que o médico receitou. Sua irmã só deverá chegar em torno das dez horas, porque precisa levar os garotos para a escola e Flora para o maternal. Assim que o ouviu descer a escada, Zara colocou a bandeja de lado e foi ao banheiro. Depois de se refrescar, lavar o rosto, escovar os dentes e colocar um robe de algodão, voltou para a cama e tomou o desjejum. Satisfeita, colocou a bandeja na cômoda e se recostou nos travesseiros, fitando o céu azul. Seria um belo dia ensolarado. Perfeito para filmar. Depois de tanta chuva, bem que precisava de um clima como aquele para colocar a agenda em dia. Foi então que soltou um gemido de pânico. O filme!
— Oh, não... — murmurou, levantando o corpo. Era a segunda vez que perdia a hora naquela semana. A equipe iria começar a perder o ritmo e o respeito pelo seu trabalho. Levantando-se, começou a procurar a bolsa para pegar o telefone celular. Precisava ligar imediatamente, contar o que acontecera e... E... Não poderia se arriscar a perder mais tempo. O cronograma já estava atrasado, o que era um desastre para o orçamento. Precisava ir trabalhar, mesmo se sentindo como se houvesse sido surrada. Cambaleando, foi até o guarda-roupa e pegou uma calça jeans, uma camiseta, uma blusa de lã e uma jaqueta avermelhada que combinava com seus cabelos.
— O que pensa que está fazendo? — indagou Connel, antes mesmo de
entrar de vez no quarto e se aproximar, retirando as roupas das mãos dela. — Nem pense em se vestir para sair. Volte para a cama.
— Preciso ir trabalhar! Eu deveria ter chegado lá há duas horas. A
equipe deve estar esperando. Sempre começamos com o raiar do sol. Estou surpresa que ninguém tenha telefonado para perguntar o que aconteceu comigo.
— Sua assistente ligou há uma hora. Contei a respeito do acidente e
expliquei que você precisaria se ausentar por alguns dias. Agora volte para a cama.
— Você fez o quê? Não tinha o direito de dizer isso! Como ousa
interferir assim nos meus assuntos? Não posso me dar ao luxo de perder um dia sequer de filmagem. A companhia vai acabar me substituindo por outro diretor. E em caráter permanente!
— Não por causa de um dia ou dois. Isso já é paranóia! Todos esperarão seu retorno, se souberem que não se trata de nada demorado. Você não pode ir trabalhar, Zara. Pode ser perigoso. Ainda há o risco de uma concussão não manifestada, além de ser óbvio que está com muitas dores e em choque. Conformese com o fato de que precisa repousar. Seu médico sabia o que estava fazendo quando a mandou ficar em absoluto repouso. Lembre-se de que o acidente foi tão grave que você teve sorte em sair viva. — Você não conhece o mercado cinematográfico. E não sou paranóica!
Apenas conheço bem as pessoas do meu meio profissional. O que mais enfurece os produtores são os atrasos de cronograma. Um mero dia de filmagem significa um prejuízo imenso. Garanto que já estão até procurando alguém para me substituir. Ela se inclinou para pegar as roupas que ele colocara na cadeira ao lado, mas Connel foi mais rápido, levantando-a no colo e colocando-a na cama, apesar de seus protestos. Inclinando-se sobre Zara, ele segurou-a pelos ombros.
— Não adianta tentar me enfrentar, minha cara. Pelo menos uma vez,
faça o que estão lhe pedindo e obedeça ao seu médico. do quarto.
Um som vindo da direção da porta fez os dois olharem para aquele lado
Sasha estava lá, de pé, fitando-os com os olhos arregalados e a boca entreaberta.
— O que está acontecendo aqui? Zara? Você está bem? — Não, não estou — gritou ela, debatendo-se. — Tire esse bruto de cima de mim! Expulse-o da minha casa! Sasha lançou um olhar inseguro para Connel. Afinal, ele era o patrão de seu marido, o que tornava a situação ainda mais complicada. Connel soltou Zara e se endireitou.
— Encontrei-a tentando se vestir para ir trabalhar! Ela não pode sair
da cama, Sasha. Ainda há risco de concussão. Faça-a ficar deitada.
— Saia da minha casa! — bradou Zara. — Vou chamar um médico para cuidar dela — falou ele, com calma,
dirigindo-se à irmã dela.
— Você não vai fazer nada disso! Desapareça daqui e nunca mais volte,
está ouvindo? Não quero vê-lo outra vez na minha frente! Ele riu, deixando-a ainda mais furiosa.
— Pare de tentar se enganar — falou ele, inclinando-se outra vez e a
beijando com voracidade, fazendo-a estremecer. — Até mais tarde. Sasha, não a deixe se vestir nem sair. Connel saiu, deixando-as sozinhas. Zara se virou para a irmã, que continuou a encará-la com o mesmo ar de choque.
— O que está acontecendo entre vocês? Sentindo o rosto arder, Zara se moveu de maneira inquieta na cama.
— Nada. Nada mesmo. Não suporto o jeito dele! — Tem certeza? — questionou Sasha, em tom de dúvida. — Como assim, "se eu tenho certeza"? Nunca gostei de homens
autoritários!
— Se alguém me perguntasse se ele era o seu tipo, eu diria que não,
pois ambos são muito parecidos. Mas tive a impressão de que essa não foi a primeira vez que se beijaram. O que está acontecendo, Zara?
CAPÍTULO V A manhã prosseguiu bem devagar. Depois de se recusar a levar a pergunta da irmã a sério, Zara ficou deitada no quarto, ouvindo Sasha trabalhar no andar de baixo, limpando a casa e fazendo algo na cozinha. Às onze horas, ela levou para cima uma bandeja com café e biscoitos ainda quentes, recém-saídos do forno. Sentando-se ao pé da cama, sorriu com simpatia.
— A casa está limpinha. Não precisa se preocupar em fazer nada. Zara lançou um olhar ressentido em resposta.
— Minha última preocupação no momento é com o estado em que minha
casa se encontra. Estou ansiosa por causa do filme. Você não quer que eu perca o emprego, quer? Se eu não for trabalhar, é isso que vai acontecer. Será que pode me entender?
— Oh, pelo amor de Deus, Zara. Esqueceu do acidente que sofreu há poucas horas? Você quase morreu! — Mas estou viva. — Sim. Toda ferida e com suspeita de concussão. Além disso, o choque
pode demorar dias para passar. irônia.
— Oh, obrigada, suas palavras são reconfortantes — disse Zara, com
— Não deixarei que saia dessa cama. Não pense que pode me comover ou me enrolar. Trate de beber seu café e de comer os biscoitos de nata. — Eu nunca como biscoitos desse tipo. Engordam muito — falou ela,
bebericando da caneca que Sasha lhe entregou. — Ei, prefiro meu café puro. Todo esse leite só serve para aumentar as calorias!
— Estou apenas fortalecendo seu sistema imunológico. E trate de
comer os biscoitos. Está precisando de algo que lhe dê forças. Fui eu mesma que os fiz, pensando em você. Estão cheios de ingredientes de alta energia.
— Cheio de calorias e açúcar, não é? Olhando com suspeita para o biscoito, Zara se conformou com a idéia de que teria de comer pelo menos um deles, senão Sasha ficaria com aquela expressão magoada pelo resto do dia.
— Coma os biscoitos! — insistiu ela. — Tirana — falou Zara, em tom infantil, comendo lentamente três
biscoitinhos. — Delicioso... Você continua sendo uma ótima cozinheira, irmãzinha. Mas, por favor, leve o restante deles para seus filhos. Não posso comer mais nenhum.
— Só se me contar o que está acontecendo entre você e Connel. — Eu já disse que não há nada para contar. Aliás, diga-me uma coisa:
como é que seu marido o suporta?
— Mark o admira muito. Diz que seu novo patrão é honesto, prestativo
e pronto para ouvir as opiniões de todos em qualquer situação. Todos os empregados gostam dele — disse Sasha, assumindo uma postura muito mais interessada. — Além disso, ele não deixou nada fora do lugar aqui na casa. Não apenas lavou a louça depois do desjejum, como arrumou a cozinha e o quarto que está usando.
Zara sentiu a pulsação acelerar. Por que sua irmã teria usado o tempo presente? Connel havia partido, não havia?
— O que quer dizer com "está usando'? Não seria "usou"? Ele não faz parte da decoração, como você bem sabe... tensa.
O sorriso e o olhar intenso que recebeu de sua irmã a deixaram mais
— Mas ele voltará hoje à noite. — Não voltará, não! O que a levou pensar que isso aconteceria? Sasha ficou séria.
— As palavras dele mesmo, ora. Ouça, Zara, não posso ficar aqui a noite
toda. Tenho de voltar para cuidar das crianças e de Mark, mas é necessário que alguém fique aqui com você, para o caso de haver alguma complicação noturna. Depois de um acidente como o seu, todo tipo de reação pode acontecer. Então, quando ele disse que ficaria com o turno da noite, fiquei muito agradecida. Pensei que não haveria objeção de sua parte.
— Por que não me perguntou? — Ora, foi Connel quem cuidou de você na noite passada e, pelo que vi,
isso não a incomodou em nada. Deduzi que não faria mal aceitar a oferta dele. — Sasha assumiu um ar preocupado. — Posso dar um jeito de desocupar o quarto de uma das crianças e levá-la para minha casa... Percebendo que estava causando um transtorno para a irmã, Zara assumiu um tom mais brando e flexível.
— Não se incomode, querida. Muito obrigada. Acho que já está fazendo
demais por mim. Isso sem falar que prefiro ficar em minha própria casa. Se for necessário conviver com Connel por mais algumas horas, eu o farei. — Ela fingiu um bocejo. — Mas agora estou com sono outra vez. Não sei por que, já que dormi muitas horas.
— Deve ser efeito daqueles remédios que o médico lhe deu — deduziu Sasha, levando a bandeja consigo ao rumar para a porta. — Preciso dar uma saída para pegar Flora e levá-la para casa. Martha vai pegar os garotos e tomar conta de todos no período da tarde. Quando voltar, trarei seu almoço.
— Obrigada — murmurou Zara, fechando os olhos ao se reclinar. Dez minutos depois, ouviu sua irmã fechar a casa e sair. Quando o ruído do carro dela desapareceu ao longe, saiu da cama. Sem perder tempo, telefonou para a empresa de táxi e então começou a se vestir. Sabia que iria deixar Sasha furiosa, mas não podia correr o risco de perder um dia de trabalho. Não demorou muito para que estivesse na locadora de automóveis onde alugara carros algumas vezes, quando o seu próprio precisara de manutenção. Dirigindo o sedan azul, chegou à locação de filmagem bem na hora do almoço, pois esta ficava a uma hora de viagem de sua casa. A maioria dos atores estava em seus aposentos, comendo a refeição que a equipe da cozinha lhes fornecia. Alguns membros da equipe pareciam já haver terminado e estavam andando pelo cenário, enquanto outros almoçavam em uma mesa improvisada. Todos se viraram para olhar quando ela saiu do carro. Uma onda de murmúrios quebrou o momentâneo silêncio. Will se aproximou, sorrindo, observando as evidências do acidente.
— Ora veja só, não há nada de errado com você! — disse ele em tom de
brincadeira, abraçando-a com, todo cuidado. — E pensar que até lhe mandei flores, pensando que era algo grave!
— Foi muita gentileza sua, Will — agradeceu Zara, soltando-se dele
sem demonstrar quanta dor sentira naquele instante. — Quem está dirigindo? O cameraman fez uma careta.
— A produtora está procurando um substituto, mas no momento estou
cuidando de tudo, baseado em sua agenda de serviço, seu roteiro de filmagem e suas anotações. Perguntei se eu poderia fazê-lo e eles concordaram, na esperança de vê-la retornar em um dia ou dois... Acabamos de filmar a cena quarenta e cinco... Ele descreveu o que haviam feito e a encarou com ar inseguro, como se não soubesse qual seria a reação dela. Só voltou a relaxar quando a viu sorrir com aprovação.
— Ótimo. Não sei por que me dei ao trabalho de sair de meu repouso e
vir até aqui. É óbvio que você pode cuidar de tudo sozinho.
— Não diga tolices — respondeu Will, de imediato. — Você falou sextafeira a respeito das cenas de hoje, então eu e os atores sabíamos o que deveríamos fazer. Apenas seguimos suas instruções. Suas reuniões de final de expediente nos deixam muito bem preparados. Aliás, foi o que falei a Ben Green.
— E o que o nosso "todo-poderoso" chefe disse? — Disse que está ciente de sua eficiência e que deveríamos seguir seu
roteiro para o dia, enquanto ele pensava em alguém para substituí-la, caso demorasse a retornar ao trabalho.
— Oh — murmurou Zara, soltando um suspiro. — Acho que você salvou
meu emprego. Obrigada, Will. Vou pegar um sanduíche para mim e já irei encontrá-
lo no cenário da última cena. Quero ver como ficou a preparação para a próxima etapa. Conforme se virou e começou a andar, viu Bárbara se aproximar. O sorriso vivaz de satisfação de sua assistente deixou claro quanto era benquista. Foi possível perceber quando o olhar dela se tornou preocupado, assim que as poucas marcas do acidente se tornaram visíveis pela proximidade.
— Pensei que você nem viesse hoje. O homem que atendeu o telefone
em sua casa essa manhã disse que você precisaria repousar vários dias para se recuperar. Pelo que me contou da violência da batida, parece que teve muita sorte por sair viva e com apenas alguns ferimentos.
— Sim, tive muita sorte mesmo. Chegando à lanchonete móvel, Zara pediu um lanche e começou a comêlo enquanto voltava a andar pelo set. Bárbara a acompanhou em silêncio por alguns passos, antes de voltar a se manifestar.
— Ele me pareceu estar falando sério. Quem era, afinal? Zara franziu o cenho.
— Do que você está falando? — De quem atendeu o telefone na sua casa. Não era seu cunhado, era? — Não, não era Mark — respondeu ela, com secura. Os olhos brilhantes de sua assistente a fitaram com expectativa.
— Namorado novo? É bonito? Foi a impressão que tive. — Como é que alguém pode parecer bonito ao telefone? — A voz dele é muito sensual! Zara conteve o fôlego. Era verdade. A voz de Connel era grave e tinha um tom aveludado que parecia acariciá-la a cada vez que a ouvia. Era o timbre mais sexy que já ouvira em toda sua vida. mim?
— Nem notei — mentiu, mudando de assunto. — Há algum recado para — Só um importante, do pessoal que cuida do elenco. Lee Williams não
fará o papel do policial. Parece que foi internado com uma crise de apendicite e terá de ser operado. Substituíram-no por Hal Thaxford.
— O quê?! Está brincando comigo? Bárbara fez uma expressão de triunfo. produção.
— Ah! Eu sabia que você não iria gostar. Bem que avisei o pessoal da Fazendo uma careta, Zara balançou a cabeça negativamente.
— Não gostar? Isso é pouco! Jenny sabe muito bem que não suporto
trabalhar com o "Pinóquio". O que ela pensa que está fazendo, afinal? Tenho certeza que poderiam ter contratado alguém melhor para o papel.
— Pelo que me informaram quando reclamei, não havia mais ninguém
com tanto tempo disponível na agenda. Quer que eu ligue para lá e que coloque Jenny na linha para conversarem?
— Não tenho tempo para isso agora. Vamos para o cenário principal.
Mostre-me a programação de nosso cronograma de produção da...
O sol já estava se pondo quando pararam de filmar. Fizeram a habitual reunião do fim de dia, na qual eram passadas as cenas para o dia seguinte, a fim de que os atores preparassem o texto e a equipe se organizasse com relação aos equipamentos. As costelas de Zara doíam a cada fôlego. Foi preciso muita força de vontade para não demonstrar o que sentia e manter a equipe motivada até o final. Will se aproximou enquanto ela se dirigia ao carro para partir.
— Tem certeza de que está bem o suficiente para dirigir? Você está
pálida demais.
— É só cansaço. Preciso apenas dormir. Obrigada pela preocupação. — Vá com cuidado, sim? ontem.
— Claro. Não quero sofrer outro acidente. Acho que já abusei da sorte,
Mantendo-se atenta ao longo de todo o caminho, Zara chegou em segurança, embora estivesse se sentindo mais exausta do que nunca. Era como se houvesse lutado durante horas com um profissional de artes marciais. Só de pensar em ir trabalhar no dia seguinte, sentiu-se desanimada. Não admitiria isso para ninguém, mas sabia que deveria ter ficado em repouso, na cama. Não estava mesmo em condições de sair de casa. Conformada com a idéia de que seu trabalho não poderia esperar, estacionou o carro na garagem, ao lado da entrada lateral da casa, apagando os faróis. Quando saiu do veículo alugado, teve uma sensação estranha, como se estivesse sendo observada. Não havia casas ao alcance da vista e as luzes da rua estavam apagadas naquela noite, o que era incomum. As estrelas e a lua estavam encobertas pelas nuvens, tornando a noite ainda mais escura. Devia ser isso. Seus nervos ainda estavam abalados pelo choque. Era impossível que tivesse mesmo ouvido uma respiração abafada junto às árvores. Devia ser apenas o vento. Não havia ninguém ali. Sua imaginação estava lhe pregando peças. Todavia, trancou o carro o mais depressa que pôde e já estava com a chave na mão quando se aproximou da porta, com passos rápidos. Assim que deu um
passo casa adentro, ouviu um ruído nas folhas atrás de si, seguido pelo som abafado de algo se movendo na grama. Eram passos rápidos, como os de alguém que corria. Antes que pudesse se virar, alguém se jogou contra ela, arremessando-a para dentro e fazendo-a cair no chão, sobre o tapete. Sentindo-se tonta e com dores, ficou estática por um momento, tentando recuperar o fôlego. Connel tinha ido longe demais! Como ousava atropelála daquela maneira? Quando começou a se movimentar, tentando ficar de pé, mãos fortes a levantaram e seu rosto foi erguido.
— O que pensa que está fazendo? Mal acabou de perguntar, em um tom furioso, quando foi sufocada por um beijo agressivo. Não importava a força que fizesse, não conseguia se desvencilhar dele. Aquelas mãos a estavam tocando de maneira assustadora, tentando abrir caminho sob sua blusa enquanto ele a deitava outra vez no chão, usando seu peso para prendê-la. Esse não era Connel! Já conhecia bem o perfume e o toque daquelas mãos firmes e sensuais. Quem poderia ser, então? E, quem quer que fosse, o que pretendia fazer com ela? O medo a fez ficar paralisada. Um tremor a dominou, enquanto o suor frio começou a brotar de seus poros. A sensação de ter um nó na garganta dificultou até mesmo que engolisse em seco. Então o pânico a dominou.
CAPÍTULO VI Vinda do jardim, uma lufada de ar frio entrou pela porta aberta e fez Zara sentir ainda mais frio, mas de maneira diferente, fazendo-a voltar a pensar com clareza. Certa vez, fizera um curso de defesa pessoal, preparando-se para filmar um documentário sobre o assunto. Fizera um ensaio para uma situação semelhante àquela. O que o instrutor havia mesmo ensinado? fazer.
Tentando afastar o pânico da mente, lembrou-se do que precisava
Afastando a cabeça para trás o máximo possível, levou as mãos ao rosto dele, enfiando os polegares em ambos os olhos, ao mesmo tempo em que ergueu o joelho com toda força, atingindo-o bem entre as pernas. atingida.
Ele soltou um gemido de agonia e se afastou, levando as mãos à parte
— Sua desgraçada! Isso dói! — Saia de cima de mim! — gritou ela, cerrando os punhos e esmurrando
o rosto dele.
Esperneando, tentou atingi-lo mais uma vez, mas seus sapatos saíram voando no processo, diminuindo seu poder de ataque. Ouvindo-o xingá-la sem parar enquanto tentava segurá-la, Zara reconheceu aquela voz.
— Larry! Ele parou de falar, ficou paralisado alguns segundos e então soltou um gemido de desgosto.
— Seu... Seu idiota! — bradou ela. — Saia de cima de mim! Nunca tivera medo dele antes. Apenas ficara preocupada com o comportamento obsessivo que ele demonstrara a respeito do passado, que parecia ser de sua natureza. Furiosa, empurrou-o para trás.
— Zara, ouça, eu não queria machucá-la. Apenas queria... Precisava tocá-la e abraçá-la. Eu te amo. Você sabe que amo. — Se essa é a sua idéia de amor, nem imagino o que é odiar para você!
— esbravejou ela. — Agora quer se levantar?
Em silêncio, Larry se levantou e a liberou. Assim que ficou de pé, Zara se apressou até o interruptor e acendeu as luzes, pestanejando por causa da claridade. Ao encará-lo, viu-o abaixar o rosto fazendo uma careta. Havia marcas de unhadas em sua face e escorria sangue se uma de suas narinas.
— Maldição — murmurou ele.
— Como pôde fazer uma coisa dessas? O que pretendia fazer comigo?
Ia me estuprar? Talvez até me matar?
Ao falar aquilo, um calafrio percorreu-lhe o corpo. Antes de ela conseguir reagir, ele estava conseguindo o que queria. Só então compreendeu como era horrível ser atacada daquela maneira. O medo era um inimigo tão forte quanto qualquer estuprador. Se houvesse se deixado dominar pelo terror, não conseguiria enfrentar a ambos.
— Não — murmurou Larry. — Eu não teria lhe feito mal. Zara, eu te
amo. Jamais a machucaria.
— Oh, isso é amor? — indagou ela, indignada. — Por isso me jogou no
chão e quase me matou de susto? Mas que conceito estranho de amor!
— Eu ligava todos os dias e nunca era atendido! Fiquei desesperado. — E então me atacou? Achou mesmo que podia fazer isso e sair
impune? Depois de todos aqueles telefonemas ameaçadores, a polícia iria chegar até você sem nenhum esforço. Você seria o suspeito mais óbvio e, por mais que mentisse, um mero exame de DNA poderia identificá-lo em um estalar de dedos! Iria passar anos e anos na prisão, junto com gente muito perigosa.
— Você fez com que eu me apaixonasse e depois me descartou como se
eu fosse lixo! — protestou ele, com um ar petulante e infantil.
— Não fiz nada disso! Ninguém pode forçar outra pessoa a amar. E se
realmente se importasse comigo, não estaria aqui, agora, nesta situação. Jamais acharia uma justificativa para me machucar.
— Mas você me magoou! — Talvez seu orgulho tenha sido ferido, mas não creio que eu o tenha
magoado. Você não é obcecado por mim, apenas por si mesmo. Larry pareceu ter sido atingido outra vez.
— Como pode ser tão cruel? Se a ataquei, foi merecido. Sabe muito
bem que te amo e ainda assim me trata como a um vira-lata.
Ele estava com o rosto avermelhado e os olhos arregalados, respirando de maneira errática. De repente, avançou sobre ela com as mãos estendidas, agarrando-a pela garganta, pegando-a desprevenida outra vez. Engasgada e com um zumbido no ouvido, Zara tentou se livrar dele, mas Larry estava em uma espécie de frenesi furioso. Aquelas mãos eram muito mais fortes do que ela imaginara. Parecia impossível afastá-las de seu pescoço. Sua visão começara a nublar e sua consciência a se esvair quando, sem mais nem menos, ele a soltou. Ao ser liberada, cambaleou para trás e bateu com as costas na parede, tossindo e engasgando enquanto tentava se recuperar. Sentia uma dor aguda na garganta quando tentava respirar.
Embora ainda não estivesse enxergando direito, pôde ver um vulto que não estava lá antes. Outro homem, que parecia estar puxando Larry para trás. Mesmo naquela situação, reconheceu Connel sem demora, antes de ouvi-lo falar:
— Você está bem? — Vou sobreviver — sussurrou, quase sem voz. — Sorte sua eu ter chegado a tempo! Vou chamar a polícia. — Espere... — murmurou ela, tocando-lhe o braço e recebendo um
franzir de cenho em resposta. — Onde está Larry? Ele partiu?
— Você o conhece? — Sim. Ao ouvi-la responder, Connel fez uma careta. Olhou então para o lado, insinuando para que ela fizesse o mesmo. Ao se virar naquela direção, viu Larry caído ao lado da escada, imóvel, de olhos fechados e com a boca entreaberta.
— Não faça essa expressão de horror. Eu apenas o nocauteei. — Tem certeza? — Se parar de falar um instante, poderá ouvi-lo respirar — disse
Connel, em um tom agressivo que não a estava agradando. Seguiu-se um momento de silêncio.
— A respiração dele está estranha. Parece água fervendo em uma
chaleira. Com quanta força o acertou? — questionou Zara. Antes de responder, ele fez outra careta.
— Entrei aqui e o encontrei tentando matá-la. Quando o puxei para
trás, ele se virou contra mim, então esmurrei-o no queixo. Usei apenas força suficiente para colocá-lo fora de ação sem muito alarde. Agora, se acabou com sua inquisição, vou ligar para a polícia.
— Não! incrédulo.
Já a caminho do telefone, Connel parou e se virou, fitando-a com ar
— O que quer dizer com "não"? Esse homem acabou de tentar estrangulá-la! É um elemento perigoso. Se não chamar a polícia, ele tentará de novo e você poderá não ter tanta sorte. Se eu não tivesse aparecido naquele exato momento, teria sido fatal. queixo.
Larry voltou a si, gemendo enquanto tentava se sentar e massageava o
— O que aconteceu? — indagou ele, estreitando o olhar ao encará-los. — Oh... Foi ele quem me acertou?
— Sim, fui eu. E acertarei de novo, se tentar alguma "gracinha" —
ameaçou Connel.
— Sinto como se um caminhão houvesse me atropelado. Vou processálo! Poderia ter me matado, acertando com tanta força! — Pode contar isso à polícia quando eles chegarem. — Polícia? — indagou Larry, alarmado, soltando o queixo e se virando
para Zara, lançando um olhar de reprovação. — Como pôde chamar a polícia, sabendo que eu nunca a teria machucado? Eu te amo. Sabe que amo. Será que já não me torturou o suficiente? Não basta ter me feito amá-la e depois me descartado, recusando-se a me ver? Você me deixa maluco e depois chama a polícia? Pelo visto, quer mesmo me destruir. Não ficará satisfeita enquanto não me vir na prisão, desempregado e humilhado! Foi a vez de Zara fazer uma careta, antes de responder:
— Oh, vá embora, Larry. Ninguém chamou a polícia. Ainda. Mas se
voltar a se aproximar de mim outra vez, não hesitarei em fazê-lo. Nada mais de ligações nem de cartas ameaçadoras, está bem? E jamais, jamais volte aqui, a menos que queira ir parar na cadeia.
— Zara, não seja tão cruel! — reclamou o perturbado homem,
aproximando-se dela com os braços abertos. — Perdoe-me. Por favor. Eu te amo... Ela o fitou de alto a baixo, com ar de escárnio.
— Não, não ama, ou jamais teria tentado me estrangular. Ninguém
tenta ferir alguém a quem ame de verdade. Você só gosta de si mesmo.
— Mas eu não consigo deixar de pensar em você, querida. Não consigo
nem mesmo dormir. Dê-me apenas mais uma chance, sim? Isso não é pedir muito, é? Connel já estava impaciente quando interveio.
— Agora chega, rapaz. Você a ouviu. Tome seu rumo e nunca mais volte,
ou terá de se entender comigo. outra vez.
Larry o encarou de maneira desafiadora, virando-se então para Zara
— Foi por causa dele que me descartou? Suspeitei que deveria estar
acontecendo algo assim. Tinha de haver alguém. Há sempre outro homem na sua vida, não é?
— Não é... — começou ela, sendo interrompida. — Você logo vai descobrir com quem está se relacionando — disse
Larry, dirigindo-se a Connel. — Chegou sua vez de passar pelo processo de tortura. Só não se apegue demais, pois, quando estiver apaixonado, ela irá descartá-lo da maneira mais cruel que conseguir imaginar. Zara endireitou as costas, indignada com a acusação. Nunca agira com crueldade. Nada daquilo era verdade.
Os olhos de Connel se voltaram para ela por um momento, antes de voltarem a perscrutar o agressor.
— Já teve sua chance de falar. Agora vamos indo — disse ele, levando
Larry pelo colarinho e o colocando para fora, fechando a porta em seguida.
Trêmula, Zara cambaleou até a cozinha e se sentou. Não pretendia completar o vexame com um desmaio, mesmo que houvesse justificativa para tanto. Connel a seguiu até lá e, sem nada dizer, começou a preparar um chá. Então, enquanto pegava duas canecas, disse por sobre o ombro:
— Sabe, estava começando a acreditar que Hal se enganara a seu
respeito, mas ficou óbvio que não é esse o caso. Você arrasou esse idiota que acabei de expulsar daqui. Estou até arrependido de tê-lo acertado com tanta força.
— Vá embora! — gritou ela, lutando contra as lágrimas que a acusação
injusta lhe trouxera aos olhos. — Saia de minha casa agora mesmo e não volte mais!
— Qual é o problema, Zara? Tem medo da verdade? — Isso não é "verdade" coisíssima nenhuma! Se saio com alguém e
concluo que não quero que se torne um relacionamento sério, o que devo fazer? Casar-me com ele, mesmo que não o ame? Por acaso nunca saiu com uma mulher e depois concluiu que era a pessoa errada para você? Se você pode fazê-lo, por que não eu? Não tenho o direito de mudar de idéia? Sem nada dizer, Connel apenas a fitou. Aquele olhar intenso e perscrutador a estava deixando ainda mais incomodada. Então, em um tom mais brando, ela prosseguiu:
— Gostei de Larry a princípio, mas quando ele começou a me contar
intermináveis histórias a respeito de suas antigas namoradas, notei algo de errado. Quando pedia que parasse de fazer aquilo, ele dizia que eu não precisava ter ciúme. Mas não era esse o caso. Certa vez encontramos uma delas no teatro e ficou claro que aquilo não me incomodou, o que o deixou magoado. Ele queria me deixar enciumada.
— De certo modo, era um modo de saber se você se importava ou não com ele, não acha? — Suponho que sim — admitiu ela. — Mas só serviu para deixar claro
para mim que não adiantaria continuar saindo com ele. Aquilo estava me dando nos nervos. Pior ainda, Larry queria que eu contasse os detalhes sobre os namorados que tive antes de sair com ele, mas não concordei em fazê-lo. Onde já se viu tamanha falta de respeito? Quando um relacionamento acabou, acabou. Não é justo falar de alguém pelas costas.
— Com isso eu concordo. Odiaria passar por tal situação. — Posso imaginar. Eu também não gostaria que um ex-namorado
começasse a falar sobre mim em seu encontro seguinte. Mas Larry estava
determinado a me obrigar a contar as coisas mais íntimas da minha vida. Tornou-se obsessivo. Precisei terminar tudo, mas então começaram os telefonemas e as cartas ameaçadoras. Nunca pensei que ele fosse louco o bastante para fazer o que acabou de fazer. Connel colocou uma xícara de chá na frente dela.
— Ainda bem que cheguei na hora exata. Só Deus sabe até onde ele
teria chegado. Agora esqueça-o. Já comeu alguma coisa? — Houve uma pausa. — Creio que não. Por que faz isso? Quer ficar doente? Quando sua irmã me telefonou contando sobre sua fuga, só não fui buscá-la porque não pudemos descobrir onde era o local da filmagem.
— Ainda bem! Não seria nada agradável ser agarrada e arrastada à
força para fora da locação, bem na frente de minha equipe e do elenco.
— Como pôde se arriscar a ir trabalhar logo depois do acidente? — Eu não queria que meu filme fosse passado para outro diretor. Será
que não entende...
Zara se interrompeu quando ele se inclinou sobre a mesa, ficando com o rosto a poucos centímetros do dela para murmurar em tom grave e ameaçador:
— É você quem não está entendendo. Sua vida estava em perigo! Se não
começar a usar o bom senso, este pode se tornar seu último filme.
— Eu estou bem! E pare de invadir meu espaço pessoal. Os olhos dele brilharam de modo diferente, mas Connel não recuou nem mesmo um milímetro.
— Estou invadindo? — sussurrou ele, em tom grave, quase rouco,
fazendo-a sentir um nó na garganta.
— Pare de me ameaçar! Primeiro Larry e agora você. O que há de
errado com os homens, ultimamente?
— Não sei quanto a Larry, mas não há nada de errado comigo. Só estou
tentando fazê-la ouvir o bom senso. — Connel aproximou a mão e a tocou delicadamente com a ponta dos dedos, afastando-lhe os cabelos da face. — Você é muito teimosa, Zara. Está sendo sua pior inimiga. Engolindo em seco, ela se viu obrigada a concordar com ele. Era mesmo uma idiota. Aquela voz grave e o roçar daqueles dedos a estavam levando a sentirse vulnerável, como se fosse desmaiar a qualquer instante. Estava cada vez mais difícil desviar a atenção daqueles lábios sensuais e convidativos. Não se lembrava de desejar tanto ser beijada. Um instante depois, Connel prosseguiu:
— Sua pele está fria. Beba seu chá enquanto preparo algo para
comermos. Também não jantei. O que há no refrigerador?
— Não deve haver muita coisa.
Connel abriu a porta no mesmo instante.
— Nossa. Seu padrão de "muito" é bem interessante. — Essa comida toda não estava aí — ela explicou. — Sasha deve ter
feito compras para mim antes de retornar, depois do almoço. Não cheguei a ver nada disso.
— Aliás, ela está furiosa com você — avisou ele. — Imagino. Telefonarei para Sasha amanhã. Mas deixe-me ajudá-lo.
Não precisa fazer tudo sozinho.
Virando-se de lado, Zara começou a se levantar enquanto falava, mas ele se aproximou depressa e a segurou pelos ombros, voltando-a a ajeitá-la no assento. relaxe.
— Fique quietinha aí. Eu cozinho. Apenas fique perto do aquecedor e Zara não protestou, sentindo-se trêmula devido à presença dele.
— Hum... Vou esquentar uma sopa pronta para você. O que prefere?
Tomate ou aspargos com brócolis?
— Tomate está ótimo, obrigada. Ela bebericou mais do chá, observando-o circular pela cozinha. Estava começando a parecer que Connel pertencia a sua casa. Aquela familiaridade era perigosa, assim como o hábito de tê-lo por perto. Se não tomasse cuidado, iria começar a sentir falta dele quando estivesse sozinha. Pouco depois, havia um prato de sopa e algumas torradas diante dela. Enquanto ela tomava a sopa, Connel continuou preparando o prato principal: peixe com batatas.
— Está deliciosa. Não vai tomar um pouco? — indagou Zara, já mais aquecida e fortalecida. — Não, obrigado. Prefiro esperar o peixe ficar pronto. Não demorará
nada. Dez minutos, no máximo. Ei, não deixe sua sopa esfriar.
Zara concluiu que aquilo deveria ser como estar casada. Ele dava ordens, como se tivesse o direito de dirigir sua vida. Precisava tomar alguma providência com relação a isso, mas não estava com ânimo para discutir. O restante do jantar foi tão bom quanto a sopa, exceto pelo fato de que Connel colocara comida demais em seu prato. Mas o peixe havia ficado excelente.
— Bem, acho melhor não tomar café hoje — aconselhou ele. — O
próximo passo é se recolher. Você já está quase dormindo em pé. Cuidado para não dormir no chuveiro.
— Depois de ajudá-lo a arrumar a cozinha estarei bem mais desperta.
— Não precisa. Não gastarei nem cinco minutos para arrumar tudo.
Agora suba. Ou será que prefere que eu a carregue e a dispa outra vez? Ela enrubesceu de imediato.
— Claro que não! Ao ficar de pé, bateu o joelho na mesa, o que a levou a soltar um gemido e a precisar se curvar para massageá-lo.
— O que aconteceu? — indagou Connel, aproximando-se e segurando-a
de lado, pela cintura.
— Nada. Estou bem. Engolindo em seco, Zara tentou se afastar dele, sem nenhum resultado. De fato, sua reação apenas o fez rir, exibindo um brilho especial no olhar. mesma?
— Por que está em pânico? Está com medo do quê? De mim ou de si — Não estou com medo de nada — refutou ela, surpresa por estar tão
distante de seu autocontrole convencional.
— Tem certeza? — murmurou Connel, roçando os lábios junto à curva
sensível do pescoço dela. reagir.
Zara respirou de maneira trêmula e profunda, antes de conseguir
— Não! — bradou ela, afastando a cabeça para o lado e o empurrando,
sem nenhum resultado visível. — Não quero que me beije.
— Não mesmo, Zara? Sem conseguir encontrar forças suficientes para reagir, ela deixou que seus lábios se encontrassem. Na verdade, agarrou-se à camisa dele e retribuiu o beijo com uma paixão que nem sabia existir dentro de si. A cada instante sentia-se menos apta a pensar. Uma sensação de rodopio a envolveu e aquele abraço pareceu capaz de fazê-la flutuar. Suas pernas amoleceram e uma escuridão terna afagou sua mente cansada. A partir daquele momento, não conseguiu mais se manter consciente. Teve apenas a impressão de ser erguida no ar e então sentiu que estava deitada. Quando conseguiu reabrir os olhos, estava em seu quarto, sobre a cama, com o rosto de Connel acima do seu.
— O que aconteceu? — Você desmaiou. — Mas eu nunca desmaiei em toda minha vida! — Bem, há uma primeira vez para tudo.
— Oh. Deixe a louça lá embaixo como está. Lavarei tudo amanhã.
Obrigada por ser tão gentil, cozinhando e tudo mais. Foi adorável. Mas prefiro que vá embora agora e que me deixe sozinha. Connel a olhou com um brilho de divertimento no olhar.
— Está com medo de que eu me deite aí também? — Não! Quer dizer... — Ora, não se preocupe. Quando eu fizer amor com você, quero que
esteja bem acordada e atenta a tudo o que eu estiver fazendo.
— O que está pensando? Não iremos fazer amor, nem agora nem nunca! O sorriso dele a fez conter o fôlego.
— Oh, vamos sim, Zara. Com certeza. — Vá embora — sussurrou ela, em tom de urgência. — Tem certeza de que conseguirá se despir sozinha? Já estou
bastante acostumado a fazê-lo por você...
O tom insinuante a fez sentir vontade de gritar.
— Quer sair, por favor? — Se precisar de mim, por qualquer motivo, estarei lá embaixo pela
próxima meia hora. Basta chamar.
Zara esperou ouvi-lo chegar ao pé da escada para então se levantar depressa e trancar a porta do quarto. Só então foi para o banho. Depois de arrumar a cama, ajustou o relógio e adormeceu assim que colocou a cabeça no travesseiro. Parecia haver se passado apenas meia hora quando o despertador tocou. Ainda sonolenta, levantou-se e tomou outro banho, tentando ficar desperta o suficiente para ir trabalhar. Quando acabou de se vestir e abriu a porta, verificou que não havia ruído algum na casa. bacon.
Apenas ao chegar no meio da escada foi que sentiu o aroma de ovos com
Apressando-se, ficou boquiaberta ao chegar na cozinha. Connel estava sentado à mesa, tomando o desjejum e lendo uma revista.
— Bom dia, Zara. Parece que você já está vestida para entrar em ação.
Se pensa que vai trabalhar, pode esquecer. O médico mandou que repousasse e é isso o que vai fazer hoje.
— Não me dê ordens! Quantas vezes preciso explicar que não posso
faltar? Oh, e bom dia para você também. Além do mais, precisa admitir que já estou muito bem. Connel a observou com cuidado.
— Sim, você parece mesmo melhor, mas ainda acho que está se
arriscando à toa. Além disso, não posso impedi-la de ir trabalhar. Preciso ir para o escritório e sua irmã não chegará aqui antes das dez horas. De qualquer maneira, isso a deixará sozinha para fazer o que bem entender. Vou telefonar para Sasha e dizer para que não venha. Mas, pelo menos, alimente-se direito. Sente-se e tome o desjejum que preparei. Vendo que ele estava pronto para uma longa discussão, Zara optou por quebrar a rotina e comer algo mais sólido. Connel voltou a se sentar na cadeira oposta e continuou de onde parará.
— Fale-me a respeito do filme — sugeriu ele. — Quem está nele? Depois de relatar alguns nomes, ela contou que Hal havia acabado de ser integrado ao elenco. Depois da curta conversa, ambos se levantaram, ao terminarem de comer.
— Preciso mesmo ir andando. Já estou atrasada para a alvorada e não
posso perder mais nada. Já basta ter faltado na manhã de ontem.
— Ponha um agasalho mais quente. Acabei de ouvir a previsão do tempo
pelo rádio e o clima vai esfriar.
Enquanto colocava o casaco, Zara desejou para que ele parasse de lhe dar ordens.
— Adeus — falou ela. — Até mais — respondeu Connel, corrigindo-a, enquanto a observava
abrir a porta do carro alugado.
Ele ficou parado à porta, vendo-a manobrar o carro até a rua e acenou quando a viu se afastar. Zara respondeu ao aceno. Era como estar casada, despedindo-se do marido antes de ir para o trabalho. Na verdade, nunca vivera com um homem. Seus relacionamentos nunca foram profundos nem duradouros o suficiente para isso. Com um aperto no coração, admitiu para si mesma que gostara da experiência. Estava apreciando ter Connel por perto todo o tempo, cuidando dela, preocupando-se e tudo mais. Mesmo que a presença dele fosse também um desafio. Connel estava assumindo um papel que nenhum homem jamais tivera em sua vida. Deus, o que iria fazer a respeito?
CAPÍTULO VII Zara telefonou para a irmã em um intervalo de cena, depois de gravarem a primeira seqüência da manhã. Demorou um pouco para Sasha atender, mas assim que ela reconheceu quem era, começou a esbravejar.
— Oh, é você? Mas que audácia a sua, telefonar para cá depois da fuga
sorrateira de ontem! Sabia que me deixou muitíssimo preocupada? Como teve coragem de desaparecer sem deixar sequer um bilhete?
— Desculpe-me, mas... — Passei o dia todo tentando conter minha imaginação, que criou desfechos horríveis para as situações que me ocorreram. Quase chorei quando pensei na possibilidade de você desmaiar enquanto dirigia em alta velocidade pela estrada, sofrendo outro acidente e então... Foi horrível! Eu não sabia se chamava a polícia para relatar seu desaparecimento, então pedi a Mark que perguntasse ao chefe dele se ele sabia de seu paradeiro. — Sim, Connel me falou. Sasha, você não deveria ter feito isso. Não
quero que ele tenha a impressão de que possui alguma autoridade sobre mim!
— Do que está falando? Que autoridade? Eu só perguntei se ele sabia
de seu paradeiro.
— Não lhe pareceu óbvio que eu tivesse vindo para o trabalho? Estava com medo de perder meu filme. — Ninguém iria demiti-la por se afastar devido a um acidente tão grave
— bradou Sasha.
Uma risada de desdém antecedeu a resposta.
— Você não conhece nada do mercado cinematográfico. — Se as pessoas aí são tão inflexíveis, fico feliz em estar fora. Aliás, nem sei por que você insiste em trabalhar nisso! — Porque adoro fazer filmes, ora. Por que acha que estou tão
preocupada em manter meu emprego?
— Isso nem se compara à preocupação que me deu ao desaparecer sem me avisar! Como acha que me senti? Se tivesse um pouquinho só de interesse em não preocupar sua irmã, teria me avisado ao chegar aí! Zara soltou um suspiro, admitindo que a acusação era justa.
— Sim, eu sei. Lamento ter transtornado você, minha irmã. Desculpe-
me. Estou tão acostumada a morar sozinha que nem pensei em deixar um bilhete. Além disso, já estou bem melhor.
— Oh, sim. O Sr. Hillier me avisou sobre sua teimosia em ir trabalhar
hoje, outra vez. Como pode se arriscar tanto assim? Depois daquele acidente, deveria ter ficado na cama, quietinha, por alguns dias.
Assumindo um tom apressado, Zara começou a falar de modo a não dar chance para réplica:
— Estão precisando de mim, Sasha. Preciso ir. Desculpe-me por tê-la
preocupado tanto. Um beijinho. Tchau!
Desligando o aparelho sem esperar resposta, soltou um suspiro aliviado. Não gostava de discutir com a irmã. Sasha era sua única família e as duas sempre haviam sido ótimas amigas, mesmo que não concordassem em tudo. Como com relação a homens, por exemplo. Zara jamais conseguira compreender como Sasha fora capaz de optar por não investigar a fundo quando Mark parecera estar tendo um caso com uma colega de trabalho. O casamento deles entrara em crise, mas, de alguma forma, eles se entenderam e passaram a se dar ainda melhor do que antes. Mark jurara que não a havia traído, mas que a moça despertara seu interesse porque estava se sentindo desprezado. Admitindo que estava mesmo dando atenção demais apenas às crianças e o deixando em segundo plano, Sasha o perdoara sem hesitar e passara a se dedicar ainda mais a ele, certa de que não fora realmente traída e de que aquela intrusa desaparecera de suas vidas, casando-se com outro homem. Talvez fosse verdade, mas Mark magoara muito a esposa. Zara jamais esqueceria isso e sempre o olharia com desconfiança, mesmo que sua irmã tivesse certeza de que aquilo não mais se repetiria. O amor que Sasha sentia por ele parecia ser capaz de fazê-la enxergar apenas parte da realidade. Soltando um suspiro, concluiu que não valia a pena perder o bom senso em troca de amor. Jamais se deixaria apanhar por aquela armadilha. Nunca perdera o rumo, por causa de homem nenhum, nem tinha a intenção de deixar que uma paixão tomasse conta de sua vida, como Sasha o fizera. Quando chegou em casa, naquela noite, estava completamente exausta, mesmo não tendo trabalhado até tarde. Estava acostumada a muito mais horas de filmagem, mas estava evidente que ainda não se recuperara do choque. Deixara a locação de filmagem assim que o sol se pôs, já com a última cena guardada na lata. Conseguira colocar o cronograma em ordem, o que diminuía muito a pressão. Tivera tempo até mesmo de fazer sua habitual reunião do final de expediente, programando a filmagem do dia seguinte. No momento em que entrou com o carro na garagem, ao lado da casa, seus nervos estavam à flor da pele. Deixou os faróis do veículo acesos e perscrutou o jardim com atenção, procurando sinais de alguma presença. Esperou um pouco, antes de destravar a porta do carro, ouvindo os ruídos do ambiente. Parecia estar tudo seguro e deserto. Ao sair do veículo, correu para a porta da casa com a chave na mão, abrindo-a depressa é a trancando atrás de si ao entrar. Depois de ouvir o solitário tique-taque do enorme relógio da sala por alguns segundos, suspirou aliviada.
Enquanto ouvia os recados em sua secretária eletrônica, tirou o casaco e foi até a cozinha preparar o jantar. Um dos recados era de Sasha, informando-a de que ela e Mark haviam sido convidados para uma festa na casa de Connel, sábado, e querendo saber se ela também iria comparecer, pois estava lhe oferecendo uma carona. Não pretendia ir a festa alguma. Se fosse, alimentaria a já criativa imaginação de Sasha com respeito a coisas que não existiam. arrepio.
A voz grave e urgente que ouviu em seguida lhe provocou um leve
— Zara, preciso ir a Londres com urgência, então não a verei esta noite. Ligue para sua irmã e peça a ela que lhe faça companhia, caso sinta algum mal-estar. Se aquele homem voltar a aparecer, não abra a porta e chame a polícia no mesmo instante. — Connel fez uma pausa, abaixando a voz a um tom ainda mais sensual e íntimo. — Boa noite, Zara. Até mais. Quando a gravação terminou, ela já sentia as pernas trêmulas. O que estava acontecendo? Já não era mais uma adolescente sonhadora. Por que estava desapontada por saber que não o veria naquela noite? Já morava sozinha havia muito tempo. Estava acostumada a cuidar de si mesma e a não' precisar de ninguém. O restante da semana passou muito devagar. Zara não recebeu nenhuma notícia de Connel, mas Sasha foi visitá-la todas as noites, repreendendo-a por estar se cansando demais no trabalho e por não estar cumprindo as ordens do médico.
— Pare de se preocupar comigo, sim? — pediu, em uma das noites. —
Estou ótima. Vá para casa cuidar de seus filhos, que são crianças. Esqueceu que já sou bem grandinha?
— Sua ingrata! — acusou Sasha, em tom de brincadeira. — Vamos
mudar de assunto, então. Você ainda não respondeu se vai mesmo à festa do Sr. Hillier.
— Eu nem mesmo fui convidada — respondeu ela, tentando parecer o
mais indiferente possível.
Sua irmã pareceu se surpreender.
— Que estranho. Ele deve ter esquecido de lhe falar a respeito, pois
nos disse que você estaria lá. Deve estar contando com sua presença. desejos!
— Isso seria mesmo típico dele, assumir que todos atendam seus — Devo telefonar para ele, lembrando-o de que ainda não a convidou? Franzindo o cenho, Zara ficou de pé.
— Nem ouse!
Sasha sorriu com malícia.
— Seu problema é esse radicalismo, irmãzinha. Tenho certeza de que o Sr. Hillier pretendia convidá-la. Esse chamado urgente para comparecer na filial de Londres deve tê-lo deixado atordoado. Tenho certeza de que nem sequer está se lembrando da festa. — Nesse caso, talvez até a cancele. — Não. A secretária dele vai lembrá-lo, pois há uma reunião aqui na
cidade, no final da tarde de sexta-feira. Mark também vai participar. Aliás, o patrão dele o fez prometer que me mandaria aqui para ver como você estava, todos os dias.
— Oh, então é isso? — disse Zara, em tom de jocosa indignação. — E eu
que pensei que sua presença aqui fosse uma demonstração de amor...
— Ora, sua boba, é claro que eu viria visitá-la todos os dias depois do
acidente, mesmo sem o pedido do patrão de Mark. Só estou contando para que saiba que o Sr. Hillier está preocupado com você.
— E daí? No que me interessariam as preocupações dele? Sasha fez uma careta de desgosto ao se levantar e ir até a porta. Soltou então um suspiro ao colocar o casaco que pendurara ali ao lado, ao chegar.
— Bem, o tempo está ficando ruim e preciso cuidar das crianças. Acho que vou embora. Tchau, irmãzinha. Cuide-se. — Até mais, querida. Pode ficar tranqüila. Zara observou o carro de sua irmã desaparecer ao longe e então subiu para o quarto, a fim de tomar um banho. Sasha estava tendo outra de suas crises de casamenteira. Dessa vez Connel era o candidato eleito por ela. Por que as pessoas casadas demonstravam a invariável mania de querer ver todo mundo diante de um altar dizendo "sim"? Bem, não importava quão boas fossem as intenções de sua irmã, pois ela não pretendia colaborar. De jeito nenhum! Jamais tivera a intenção de se casar. Não tinha nada contra a idéia, mas sua carreira sempre fora mais importante do que qualquer namorado. Se bem que Connel não era seu namorado, e também não poderia ser comparado a outros homens. Se fosse honesta consigo mesma, admitiria que sentira falta dele desde o dia em que ele partira para Londres. Connel era uma ótima companhia. Tanto que conseguia fazê-la rir, o que era bastante raro naqueles últimos tempos. Isso sem contar que ele também era muito sensual. Até demais. "Pare com isso!", repreendeu-se, em pensamento. Tentando se concentrar na programação de trabalho do dia seguinte, tratou de tomar um banho e de ir se deitar. Trabalhou ainda uma hora, fazendo anotações no roteiro antes de adormecer.
Entretanto, Connel voltou a surgir em seus sonhos, como vinha acontecendo todas as noites. Na sexta feira, o cansaço já a havia drenado por completo. Ao vê-la tão abatida, Will olhou a agenda de trabalho e sugeriu que ela fosse para casa na hora do almoço, pois só restavam cenas simples para aquela tarde, que ele mesmo poderia dirigir. exausto.
— Tem certeza que pode fazer isso por mim? — indagou Zara, em tom — Claro. Você precisa descansar. Vá para casa e durma um pouco, sim? — Oh, obrigada. Não gosto de deixar a filmagem no meio do dia, mas
estou quase fora de ação. Vou falar com Bárbara e instruí-la a respeito das providências necessárias para que você precise apenas pensar no acabamento da imagem.
— Perfeito. Mas vá logo para seu refúgio. E dirija com cuidado. — Claro. Até mais... Dez minutos depois, estava a caminho de casa. Parecia estranho percorrer aquele trajeto de dia, com o sol brilhando no meio do céu. A paisagem característica de outono estava mais do que demarcada. Folhas secas por todos os lados, muito vento e nenhuma nuvem no céu. Depois de tomar um banho rápido, ao chegar em casa, colocou apenas um mini-robe atoalhado que mal chegava a seus quadris e se deitou na cama para descansar. Pareceu haver se passado apenas alguns minutos quando um som irritante a acordou. Levando a mão até o despertador, desligou o alarme. Para sua surpresa, aquilo não funcionou. Quando abriu os olhos, viu que estava em plena escuridão. O mostrador luminoso indicava que eram nove horas da noite. Dormira mais de seis horas! O ruído era a campainha da porta. Quem poderia ser àquela hora? Sasha tinha cópia das chaves. Levantando-se, olhou pela janela do quarto. Não conseguia ver nenhum carro, por causa da escuridão. Outro dia em que as luzes da rua estavam apagadas. Seria Larry outra vez? Ao abrir a janela para colocar a cabeça para fora, o ruído das roldanas deve ter chamado a atenção de quem quer que fosse, pois pôde ouvir o som de passos se aproximando, logo abaixo. O luar iluminou o rosto de Connel, atribuindo-lhe um ar ainda mais misterioso. Aquela visão a fez sentir um nó no estômago e uma moleza nas pernas. Tentando se controlar, Zara se apoiou no batente da janela.
— Você está nua? — indagou ele, fazendo-a voltar à realidade no
mesmo instante.
— Claro que não! — "Quase não", corrigiu-se ela em pensamento,
fechando o decote do mini-robe, ao mesmo tempo em que sentia o ar frio em suas nádegas que ficaram descobertas ao se inclinar para frente. — Eu... Eu estava deitada. O que está fazendo aqui a esta hora?
— Acabei de voltar de Londres e vim direto para cá, para saber como
você estava.
— Estava ótima, até você me acordar! — Sinto muito. Pensei que estivesse acordada, pois as luzes de sua
cozinha ainda estão acesas.
— É mesmo? Não acendi as luzes aí embaixo. Talvez Sasha tenha vindo
me visitar e esteja esperando eu acordar.
Ao falar, Zara se virou para descer e ele a chamou em tom urgente.
— Espere. Não desça. Pode haver ladrões na casa. Se fosse sua irmã, o carro dela estaria por perto. Não há nada aqui. Pode ser seu ex-namorado também, e já sabemos que ele é violento. Jogue-me sua chave para que eu possa entrar e lidar com quem quer que seja. Zara hesitou, mas o bom senso a obrigou a seguir as instruções dele, já que era a melhor opção que tinha, enquanto Connel abria a porta, ela vestiu uma calça jeans e uma blusa de lã. Passou a escova nos cabelos de maneira apressada e já estava na plataforma do lance intermediário da escada quando se encontrou com ele, já subindo. baixo.
— Aonde estava indo? — indagou ela, enquanto era observada de alto a — Verificar os quartos de cima, já que não havia ninguém lá embaixo. —
Connel a encarou. —Você se vestiu...
Ignorando o comentário, mas ficando enrubescida, ela falou:
— Como posso saber se havia mesmo alguma luz acesa lá embaixo antes
de você entrar na casa? Já que não as vi, preciso acreditar em sua palavra. Como cheguei em casa de dia, não acendi nenhuma luz.
— Há um bilhete de sua irmã na cozinha, dizendo que esteve aqui em
torno das seis da tarde, mas que a encontrou dormindo e preferiu não acordá-la. Agora deixe-me passar para que eu possa verificar se não há nenhum intruso aí em cima. Não há nenhum problema nisso, há? Zara ficou de lado e se recostou na parede para deixá-lo passar. Conforme Connel se juntou a ela na pequena plataforma, seus corpos quase se tocaram. De repente, tornou-se ciente de que sua própria pulsação acelerara. Tinha a impressão de que havia pequenos tambores ecoando seu ritmo cardíaco em seus ouvidos. Sem coragem de encará-lo, apenas fitou aquele corpo másculo diante do seu.
Mas ele não fez a menor menção de continuar subindo. Na verdade, aproximou-se ainda mais e se inclinou em sua direção, apoiando uma mão de cada lado de sua cabeça, junto à parede. Seus movimentos eram vagarosos, como se estivesse em câmara lenta, dando bastante tempo para uma fuga. Mas foi impossível sair dali. Zara estava paralisada, encantada por aquela presença sedutora. Pôde sentir um refrescante hálito de menta ao ouvi-lo perguntar:
— Sentiu minha falta? O fôlego lhe faltou por um instante. Esforçando-se para respirar, ela se recusou a se render àquela onda de desejo misturado com o pânico que tentava dominá-la.
— Estive ocupada demais para sentir falta de qualquer coisa. Você
esteve fora? Foi a algum lugar interessante?
Connel colocou o indicador sob o queixo dela e a fez encará-lo. Os olhos dele pareciam sorrir da mesma maneira que os lábios sensuais.
— Às vezes tenho a nítida impressão de que estou entrando em uma
zona de guerra. Toda vez que me aproximo, você se fecha e começa a atacar.
— Neste caso, é melhor manter distância, certo? — sussurrou Zara,
tentando não se deixar hipnotizar por aqueles olhos negros.
— Hum... Imagino que, a despeito do que o médico disse, você trabalhou
todos os dias. Mark me falou que a esposa dele andava preocupada com sua falta de repouso — dizendo isso ele se aproximou ainda mais, fazendo com que seus corpos quase se tocassem.
— Já disse que estou ótima. Afinal, você vai ou não vai subir? Se não
for, deixe-me passar. Quero chegar à cozinha para preparar um lanche para mim. peito.
— Sabe o que quero? — indagou Connel, fazendo-a sentir um aperto no — Não.
Ao falar, ela se abaixou e escapou de por entre os braços dele, começando a descer a escada. Mas perdeu o equilíbrio no segundo degrau. Ia caindo para o lado, mas foi agarrada por ele, que a segurou pela cintura. Instintivamente, Zara se agarrou nele para tentar recuperar o equilíbrio, ficando trêmula ao pensar que poderia estar caída ao pé da escada naquele momento.
— Você é a pessoa mais propensa a acidentes que já conheci —
murmurou Connel, movendo os lábios junto ao lóbulo da orelha dela, provocando-lhe um delicioso arrepio.
Todo seu corpo começou a reagir de maneira instintiva quando ele começou a mordiscar-lhe o pescoço em uma carícia provocante. Aquela gentileza sedutora a assustou ainda mais.
— Pare com isso! Ao esbravejar, afastou a cabeça, mas de nada adiantou. Na verdade, apenas expôs mais área do pescoço às carícias dele. Os beijos foram descendo até seus ombros e seguindo até seu colo. Zara segurou o rosto dele entre as mãos.
— Não! — pediu, fitando aquelas pupilas dilatadas e, sabendo que as
suas deviam estar tão denunciadoras quanto as dele. — Não.
— Sim — murmurou Connel, cobrindo os lábios dela com os dele. Foi impossível resistir. Um turbilhão de calor e de prazer se apoderaram do corpo de Zara, levando-a a não apenas corresponder ao beijo, mas também a se agarrar àquele corpo sexy como se desejasse se fundir a ele. Não podia mais evitar os gemidos de satisfação que sua garganta emitia. Era impossível conter suas mãos, que insistiam em acariciá-lo de maneira quase desesperada. Seria aquela voz rouca a sua própria, murmurando o nome dele repetidas vezes? Dizendo "sim" sem parar e pedindo para que ele não parasse? Parecia tudo tão irreal... Demorou um pouco para perceber que, em meio aos beijos, passara a ser carregada no colo. Só teve certeza do que acontecera quando entraram no quarto. Como chegara até ali sem perceber? Com certeza não havia desmaiado dessa vez, pois estava mais desperta do que nunca. A perspectiva do que estava por acontecer a fez retomar o controle e começar a tentar se desvencilhar dele. Surpreso, Connel a colocou de pé no chão, ao lado da cama. os quadris.
Encarando-o com intensidade, Zara cerrou os punhos e os apoiou contra
— Não sou assim tão fácil, Sr. Hillier. Saia da minha casa agora mesmo! — O que a fez mudar de idéia? — Vá embora, por favor. — Mas você disse "sim", há um instante... — Eu não! — bradou ela. — Mas é claro que disse. Não apenas uma vez, mas várias. — Ouça, estou cansada desta discussão. Poderia, por favor, sair daqui? — Ainda não. Quero que admita como estava se sentindo segundos atrás. Você sabe muito bem que me deu "sinal verde". — Ora, eu posso mudar de idéia quando quiser!
Os lábios dele se curvaram em um triste sorriso irônico.
— Bem, pelo menos está admitindo algo. Sei que me disse que tendia a mudar de idéia com relação aos homens, mas não imaginei nada tão rápido. Em um instante parecia uma fornalha de desejo, e logo em seguida está agindo feito um felino selvagem. Por que, Zara? O que a levou a mudar de idéia? Após um momento de hesitação, decidiu ser completamente sincera.
— Você foi muito rápido. Nós mal nos conhecemos e eu não durmo com
desconhecidos. Posso até sair com muitos rapazes, mas quase nunca durmo com alguém. Hoje em dia é muito arriscado. Tenho medo de pegar AIDS ou outra doença sexualmente transmissível. Nunca fui para a cama com alguém logo no primeiro encontro, nem no segundo, nem no terceiro! Nunca gostei de promiscuidade, mesmo antes de ter noção dos perigos. Acho que é preciso haver total confiança no seu parceiro antes de arriscar minha vida e meus sentimentos. Ainda não o conheço tão bem assim, conheço? Connel a fitou por um instante, com seriedade e uma expressão indecifrável. Apenas a respiração errática denunciava que ele estava alterado.
— Certo, já entendi. Na verdade, é assim que penso também. Também
não sou promíscuo, pelas mesmas razões que você.
— Ainda assim, acabou de tentar me levar para a cama! Como posso
acreditar no que acabou de dizer se seus atos o contradizem? Ele fez uma careta.
— Sim, admito que agi como um tolo. Você me tirou do controle, Zara.
Faz alguma idéia de como estava sendo sedutora enquanto me beijava? De repente, agarrou-se a mim e começou a gemer de maneira tão sensual... Não foi à toa que a trouxe até aqui. De fato, ela ainda estava tomada pelo desejo. Apenas a vontade consciente mantinha seu instinto sob controle.
— Chega, por favor. Não quero mais falar a respeito disso. Quero
apenas que saia da minha casa e me deixe em paz — pediu Zara, indo até a cômoda e pegando o telefone celular de sua bolsa. — Estou chamando a polícia neste instante. Você tem dez segundos para sair daqui. Por um instante, ela teve a impressão de que Connel ficaria ali e a desafiaria. Mas, depois de lhe dar um olhar demorado e intenso, ele se virou e saiu sem nada dizer. Depois de ouvir a porta da frente ser fechada com um estrondo, observou o carro dele desaparecer em alta velocidade pela rua. Só então se entregou às lágrimas. Estivera muito perto de se render e ainda o desejava muito. Contudo, mandara-o embora no último instante. Mas, se agira por livre opção, em um ato racional, por que estava chorando e se sentindo arrasada? Por que o sentimento de culpa?
Hillier.
Precisava descobrir com urgência o que estava sentindo por Connel
CAPÍTULO VIII Na manhã seguinte, Zara demorou mais do que o normal para sair da cama, sentindo um prazer imenso em poder descansar. Depois do desjejum, foi às compras e almoçou fora. Quando retornou para casa, começou a guardar os mantimentos enquanto ouvia os recados na secretária eletrônica.
— Olá, Zara... Ao ouvir a voz de Connel, teve uma reação tão abrupta que deixou cair a caixa de ovos, sujando o chão da cozinha. sujeira.
— Oh, maldição! — praguejou, abaixando-se e começando a recolher a
— Sinto muito pela noite passada. Podemos começar de novo? Vou dar uma festa essa tarde. Mark e Sasha virão e eu ficaria contente se viesse com eles. Venha mesmo, por favor. A voz dele desapareceu e ela se viu recostada contra a parede, de olhos fechados, respirando de maneira errática. Deveria ir? Não. Conseguiria resistir à vontade de vê-lo? Não. Quinze minutos depois, o telefone voltou a tocar.
— Você irá ou não à festa hoje? O tom impaciente de Sasha a levou a fazer uma careta.
— Acho que sim — respondeu, com certa relutância. — Ei, anime-se! Estamos falando de uma festa, não de uma endoscopia!
Poderia pelo menos tentar reagir a isso como alguém que pretende se divertir? Ao ouvir aquilo, Zara soltou um suspiro.
— Sinto muito se estou indiferente, mas estava concentrada em
elaborar uma cena... com ironia.
— Trabalhando? Por que será não estou surpresa? — ralhou sua irmã, — O que devo vestir? — desconversou Zara. — Mark me disse que devo usar algo sofisticado. Ou seja, nada de
jeans hoje à noite. Parece-me que alguns clientes importantes estarão presentes e o Sr. Hillier quer impressioná-los. São pessoas muito ricas e estarão trajando as melhores grifes da Europa. Então, trate de se produzir para não embaraçar meu marido diante do patrão dele, está bem?
— Oh, isso me parece um tanto maçante... — Ora, não será diferente de suas festas de cinema. Passaremos para
pegá-la às sete e quinze, está bem?
Depois de desligar, Zara se sentou em sua poltrona predileta para continuar trabalhando, mas não conseguiu mais se concentrar. Nunca pensara a respeito do modo como Connel vivia e estava curiosa. Como seria a casa dele? Precisava admitir para si mesma que tinha interesse em tudo que dizia respeito a ele. Mas, no momento, precisava preparar aquela cena e programar a agenda da semana. Já eram seis horas da tarde quando subiu para se arrumar. Começou tomando um banho demorado para se livrar da tensão que se tornara mais intensa a cada hora, ao longo da tarde. Então colocou roupas íntimas de seda preta, pois decidira usar um vestido pink que comprara para participar de uma entrega de prêmios de cinema. Sem mangas e bastante decotado, deixava suas costas completamente expostas. Seria ousado demais para uma festa particular? Quando comprara o traje, tinha em mente que precisaria chamar a atenção das pessoas, já que estaria mostrando uma imagem pública. A saia curta, um pouco acima dos joelhos, contribuía muito para que os homens não apenas dessem uma segunda olhada, mas também uma terceira e uma quarta. O tecido aderia ao corpo como uma segunda pele, explorando suas curvas tão bem torneadas. Deveria colocar algo menos ousado? Ao olhar do relógio, fez uma careta. Era tarde demais para qualquer mudança. Se não se maquiasse logo, Mark e Sasha chegariam antes que estivesse pronta. Já eram quase sete horas. Como suspeitara, eles foram pontuais. Ao ouvir o carro deles se aproximar, olhou-se uma última vez no espelho e revirou os olhos diante do que encontrou. Estaria produzida demais? Bem, sua irmã lhe dissera que era para caprichar... Pegando a bolsa preta, aveludada, e o casaco também preto, que acompanhava o vestido, desceu a escada. Abriu a porta ao mesmo tempo em que a campainha soou. Houve então uma longa pausa em silêncio, até que seu cunhado deu um assobio longo e baixo, arqueando as sobrancelhas.
— Esse vestido é... — murmurou Sasha, hesitando e recobrando o
fôlego. — Nunca o vi antes. Comprou-o para esta noite? Tenho certeza de que colocará o Sr. Hillier de joelhos.
— De quatro! — completou Mark, com sarcasmo. — Não me vesti para agradar Connel — retrucou Zara. — O vestido
nem mesmo é novo. Comprei-o para um evento de premiação, na França, há quase um ano. Só o coloquei hoje porque você mesma pediu para que eu me vestisse com sofisticação, irmãzinha.
— Oh, acho que me lembro da entrega do prêmio... — murmurou Sasha,
estreitando o olhar. — Você estava sentada quando mostraram sua equipe na televisão, então não percebi que era tão...
— Tão o quê? — exigiu Zara. — O que há de errado com o vestido? — Nadinha — falou Mark, sorrindo com malícia ao olhá-la de alto a
baixo. — É delicioso. Precisará de uma guarda pessoal para manter os homens afastados ao longo de toda a noite.
— Quer que eu arranje um traje parecido com este para mim também,
querido? — indagou Sasha, com irônica frieza.
— De jeito nenhum — respondeu ele, franzindo o cenho. — Você é
minha esposa. Não quero que outros homens fiquem olhando o tempo todo para você. Se você se vestir assim, terei problemas a noite toda. Sasha olhou para a irmã e disse:
— Entendeu o que acabei de dizer? — Só entendi que seu marido tem dois padrões distintos, um para você
e outro para as outras mulheres. No seu lugar, eu não ficaria nada feliz com isso. Mas nós vamos ou não para essa "festa"?
Dizendo isso, Zara apagou as luzes, fechou a porta e seguiu altiva para o carro deles, ouvindo a irmã falar:
— Pois entendi outra coisa. Eu também não gostaria nada que outras
mulheres ficassem olhando para Mark.
— Ciúme é uma infantilidade — respondeu Zara, ao entrar no veículo. — Oh, sim, claro. E você não ficaria com ciúme se visse seu homem com outra mulher... — Não mesmo. Apenas o dispensaria e iria embora, sem olhar para trás. — Mas é isso o que você sempre faz, de uma forma ou de outra! — Se vocês duas não pararem de brigar, não aproveitarão a festa —
ralhou Mark, colocando o cinto de segurança ao ocupar o assento do motorista.
Só então Zara se lembrou do que acontecera no casamento deles pouco tempo antes. Não deveria ter dito nada daquilo. Quando não estivessem na presença dele, pediria desculpas a Sasha. Ficando em silêncio, acomodou-se no banco de trás e observou a paisagem que circundava os dez quilômetros que separavam sua casa do vilarejo de Rookby. Transitaram por uma via secundária por cinco minutos antes de chegarem aos portões de uma grande propriedade, tão bem cercada e arborizada que era impossível ver algum sinal de civilização, além da sinuosa pista asfaltada e bem iluminada que seguia terreno adentro. Árvores bem tratadas ladeavam o caminho, entremeadas por flores coloridas e vivazes. Depois de algumas curvas, avistaram a imensa casa de três andares, construída na parte mais alta da propriedade. Em frente, uma grande fonte
luminosa, de muito bom gosto e decorada de maneira artística, demarcava o centro do pátio que se transformara em um estacionamento. As muitas vagas estavam praticamente ocupadas, o que significava que quase todos haviam chegado.
— Esta casa é enorme — murmurou Sasha, quando estacionaram. — Mais ou menos — respondeu Mark, olhando para a casa com ar
crítico. — Seis quartos, todos com banheiro, várias salas dedicadas, uma grande biblioteca e mais algumas coisinhas. E uma sólida construção do período georgiano, mais ou menos da década de 1760. Pelas fotos que vi, o lugar estava arrasado quando Connel o comprou. Demorou uns três anos para recuperá-lo e reformá-lo. Parece que ele contratou uma decoradora famosa para mudar o interior, de modo a torná-lo aconchegante. Sasha soltou um suspiro, com ar sonhador.
— Eu adoraria morar em um lugar como este. — Assim como eu, querida — respondeu Mark, arqueando as
sobrancelhas. — Mas receio que nossa renda não seja suficiente para tanto luxo. Nesse caso, a menos que se divorcie de mim e se case com meu patrão, creio que jamais realizará esse desejo.
— Vou pensar a respeito — falou ela, rindo. — Para ter uma casa como
esta, o Sr. Hillier deve ser muito rico mesmo.
— Muito — disse Mark, olhando por sobre o ombro, na direção de Zara.
— Você está muito calada. Começou a ver Connel sob um novo aspecto?
— Estava pensando no trabalho que deve dar para cuidar de um lugar
como esse. Todos esses quartos para limpar! Ele riu ao ouvir aquilo.
— Além da governanta, há uma cozinheira e algumas faxineiras
diaristas prestando serviços variados ao longo da semana. Isso sem falar do jardineiro. Enquanto caminhavam rumo à entrada, Zara respondeu:
— Uma eventual esposa gastaria horas por dia só para cuidar de todos
esses empregados!
O cunhado lhe lançou outro olhar irônico.
— Está disposta a não se deixar impressionar, não é? Para não discutir, ela ficou em silêncio. Teve então a oportunidade de pensar a respeito do que acabara de descobrir. A princípio, vira Connel sob a mesma luz que observava seus colegas de trabalho e outros amigos. Não estava preparada para o que estava vendo naquela propriedade. Depois de vê-lo cozinhar para ela e limpar sua cozinha, como poderia imaginar que se tratava de alguém tão rico?
Ele não fazia tais coisas em sua própria casa, pois tinha muitos empregados. Na verdade, o mundo dele era muito diferente do seu. Aquilo a deixou triste. Assim que foram conduzidos por uma empregada uniformizada até o salão principal, foram servidos por um garçom que oferecia vinho e champanhe. Olhando ao redor, Zara percebeu que não conhecia ninguém entre os presentes. Começou a conversar com sua irmã a respeito da impecável decoração da mansão, enquanto Mark se afastava para cumprimentar clientes e colegas de trabalho. Aproveitando a oportunidade, pediu desculpas pelo que dissera antes. Estavam falando sobre a beleza do jardim adjacente ao salão quando ela avistou Connel, no outro extremo do ambiente, em roupas formais. A bela visão fez com que seu coração começasse a bater mais forte. Então seu olhar se desviou para a deslumbrante loira que conversava com ele, cujos olhos azuis pareciam sorrir enquanto ela falava.
— Quem é aquela mulher com quem Connel está conversando? —
indagou, tentando parecer indiferente.
— Não faço idéia — respondeu Sasha. — É muito bonita, não? "Bonita" não era o termo apropriado. "Arrasadora" se aproximava mais de uma descrição adequada. Aquela mulher estava atraindo a atenção da maioria dos homens presentes. Alta e esguia, com a pele bronzeada realçando os cabelos dourados e trajando uma túnica branca no melhor estilo das deusas gregas, agia como se fosse uma rainha acompanhando seu rei. Na verdade, a loira olhava para Connel com grande intimidade, como se houvesse algo entre eles.
— Será que trabalha para ele? — sugeriu. Pelo modo como trocavam sorrisos, poderiam ser até amantes. O mero pensamento a levou a sentir um imenso mal-estar. Connel jamais dissera algo a respeito de sua vida pessoal. Como nada fora citado, parecera-lhe seguro deduzir que ele estivesse disponível.
— Aquela é Bianca Green — falou Mark, com ar de divertimento, ao se
aproximar e ouvir a sugestão. — É a decoradora que ajeitou o interior da casa. Parece que você tem uma concorrente, Zara.
— Não tenho o hábito de competir por homens — desdenhou ela,
acrescentando assim que percebeu o que dissera: — E não estou interessada em Connel Hillier. ciúme.
— É mesmo? Engraçado, tive a impressão de ver uma manifestação de — Pois está enganado. — Estou? — insistiu Mark, quase rindo. — Com certeza!
— Ora, ora. Mas, pelo visto, Bianca está muito interessada nele. Ela é
inteligente e ambiciosa, mas não é fácil ganhar dinheiro na área dela. Está sempre precisando de patrocínio. É claro que nada a impede de querer namorá-lo também. Apaixonar-se por um milionário capaz de patrociná-la não faria nada mal à carreira dela. Zara tinha certeza de que a loira devia estar pensando o mesmo que seu cunhado. Embora fosse linda, o olhar dela parecia frio e calculista. Uma oportunista tentando conseguir seu lugar ao sol, de preferência com caviar e champanhe servidos à sombra... Contudo, não pretendia dizer nada daquilo a Mark, ou seria motivo de mais piadas. Por sorte, avistou Hal Thaxford perambulando pelo jardim ao lado de uma jovem.
— Oh, vejam. É Hal, um dos atores que entrará no meu filme essa
semana. Vou falar com ele um instante a respeito das próximas cenas. Com licença. Quando ele a viu se aproximar, fez uma expressão preocupada e pareceu pouco a vontade ao cumprimentá-la.
— Olá, Zara. — Desculpe-me pela interrupção, Hal, mas quero lhe falar a respeito de
algumas cenas — disse ela, voltando-se para a moça que o acompanhava e que a fitou com ódio no olhar. — Você se importaria de nos dar alguns minutos em particular?
— Cherie, esta é Zara. Ela estará me dirigindo na semana que vem —
explicou ele, fazendo parecer que faria o papel principal e não um secundário. — Zara, esta é Cherie Lewin, estudante de teatro.
Depois de uma superficial e pouco amistosa troca de palavras, Zara se afastou, acompanhada por ele. Assumindo um tom profissional, comentou duas das cenas que Hal faria, mas não conseguiu deixar de admirar a beleza daquele jardim externo que ladeava a casa. A seleção de roseiras parecia haver sido feita de maneira programada, para se obter flores ao longo de todo ano. Em pleno outono, um quarto delas estava florindo.
— Este lugar é lindo, não acha? — indagou ela. — Sim. Meu primo disse que algumas das plantas são da época da
construção da mansão. É o cenário ideal para uma cena romântica.
— Hum. Você acabou de me dar uma idéia genial. Será que poderíamos
filmar aqui? Há uma cena sua que ficaria perfeita nesse ambiente.
— Sim, entre eu e Lindsay! — animou-se Hal. — Estas roseiras seriam o fundo ideal. — Seria perfeito. Eu poderia beijar a mão dela quando chegássemos
perto daquele banco. Isso sempre impressiona minhas fãs.
Zara revirou os olhos. Ele era transparente demais. Como era possível que as mulheres acreditassem na péssima interpretação dele? Infelizmente a beleza conseguia, em alguns momentos, substituir o talento.
— Acha que pode persuadir seu primo a ceder esse lugar para a
filmagem? Talvez ainda hoje. Arranjos precisarão ser feitos para trazer a locação para cá a tempo de gravar tudo no prazo que temos para as cenas a céu aberto. Quando formos para o estúdio, podemos dar adeus às externas.
— Verei o que posso fazer. Esteja certa de que darei o melhor de mim,
pois adorarei atuar aqui.
De súbito, o salto do sapato de Zara ficou preso em um vão entre as placas de mármore que delineavam a área de caminhada do jardim, fazendo-a cambalear e perder, o equilíbrio. Com um movimento rápido, Hal a segurou pela cintura e a puxou para junto de si, abraçando-a para afirmá-la. Antes que pudesse se desvencilhar do contato, ouviu um voz grave vinda de trás deles.
— Estão ensaiando? — indagou Connel, em tom gélido. — Ou esta é uma
cena romântica verdadeira?
CAPÍTULO IX Ambos se viraram ao mesmo tempo e Zara se endireitou depressa, pois já estava afastando Hal antes mesmo de ouvir a voz de Connel. Hal a soltou e sorriu assim que reconheceu o primo.
— Oh, olá, Connel. Estávamos falando de você. — É mesmo? — disse ele, com ironia, olhando com intensidade na
direção de Zara, como se procurasse alguma evidência de que havia algo mais em andamento ali. — Engraçado, tive a impressão de que não estavam falando nada nos últimos instantes. Na verdade, quando topei com vocês, pareceu-me que era outra coisa que acontecia aqui. Hal pareceu lisonjeado, sorrindo como um idiota diante daquela inaceitável situação. Zara sentiu vontade de esbofeteá-lo. Aquilo era um insulto! Seria possível que Connel acreditasse que ela estivesse flertando com aquele idiota, mesmo depois de tudo o que contara sobre o que havia acontecido?
— Você quase acertou na primeira suposição — ralhou ela, com frieza.
— Estávamos falando a respeito de trabalho.
— Mas é claro que sim. Como pude pensar outra coisa, em se tratando
de você? Como se estar aqui fora, ao luar... — Connel assumiu um ar cínico ao fitá-la de alto a baixo —... Com esse vestido, pudesse levar duas pessoas a falar de outra coisa que não trabalho!
— Pois é a absoluta verdade. Eu tive uma idéia para uma cena que Hal
gravará na próxima semana. Deixarei que ele mesmo explique, pois não quero nem preciso me submeter a isso. Com licença! Afastando-se antes que pudesse ser impedida, Zara voltou para junto de Sasha. Tentando não pensar no que acabara de acontecer, esforçou-se para se engajar na conversa que a irmã começou, a respeito da preparação de sua nova empresa, mas mesmo assim a meia hora seguinte pareceu a mais longa de sua vida. A certa altura, sentiu uma presença atrás de si e notou os olhos de Sasha se desviando para o lado e para o alto. A expressão dela mudou de imediato, surgindo-lhe um sorriso nos lábios.
— Olá, Sr. Hillier! Mas que festa adorável. Sua casa é maravilhosa.
Ainda há pouco comentei com Zara que eu adoraria ter um refúgio como esse. É tudo tão sereno e calmo.
— Sua irmã não parece concordar — falou Connel, em tom jocoso,
aproximando tanto os lábios do rosto de Zara que deu a impressão de que a beijaria, mas apenas disse: — Quero falar com você. Poderia nos dar licença um minuto, Sasha? Sua irmã e eu temos negócios a discutir.
— Sim, claro — respondeu Sasha, sua expressão revelando um misto de
surpresa e de curiosidade.
Só então Zara imaginou que Hal poderia ter falado a respeito do uso do jardim e que poderia ser aquele o assunto. Esforçando-se para se manter tranqüila enquanto era conduzida pela mão firme que a segurava pelo cotovelo, agarrou-se à idéia de que tratariam apenas de um assunto profissional. Contudo, ao redor, as pessoas faziam um burburinho diferente. Estavam falando deles. Meio constrangida e evitando encarar os outros convidados, sentiuse aliviada quando se aproximaram de uma porta que parecia ser o destino que ele tinha em mente. Porém, antes de chegarem lá, foram interceptados pela loiríssima decoradora, que entrou na frente deles parando diante da porta enquanto lançava um olhar crítico para Zara, medindo-a de alto a baixo ao falar:
— Problemas, Connel? Surgiram penetras na festa, ou algo do gênero? Ele teve de parar, pois o caminho ficou bloqueado. Embora o tom dela fosse o de um insulto, a reação dele foi amenizar o momento de tensão soltando uma risada contida, como se tivesse se tratado apenas de uma piada de gosto duvidoso.
— Não creio que vocês duas se conheçam — murmurou Connel. —
Bianca, esta é Zara Collins. Lembra-se de Mark? É a cunhada dele. É provável que já tenha assistido a alguns dos filmes que ela dirigiu, ou talvez a um dos vários documentários que ela fez para a televisão. Bianca deu de ombros de maneira charmosa, mas sem demonstrar o menor interesse.
— Acho que nunca ouvi falar. Não sou fã de cinema e não tenho tempo
para assistir televisão.
Acostumada àquele tipo de resposta por parte das pessoas que tentavam humilhá-la, Zara fez o que sempre fazia naquele tipo de situação, soltando uma risada de divertimento para deixar claro que achara tal atitude infantil. A loira não gostou nada do deboche, fitando-a com um olhar gélido. Na guerra não declarada entre ambas, acabara de perder uma batalha e estava ciente disso. Virando-se para Connel, forjou seu sorriso mais adorável.
— Querido, eu poderia ter um momento em particular com você antes
de ir embora? Já estou de saída e ainda tenho algo a lhe dizer. É importante. secura:
Houve uma pausa momentânea antes de ele responder, com certa
— Claro. Dê-me licença um instante, sim, Zara? Nós conversaremos
daqui a pouco. Não saia daí.
Quem ele estava pensando que era para lhe dar ordens? Uma de suas empregadas? O tom autoritário a encorajou a fazer o contrário.
Voltando para junto da irmã, procurou parecer indiferente ao que acabara de acontecer. Assim que a alcançou, disse:
— Preciso ir embora, Sasha. Vou chamar um táxi. Não quero arruinar
sua noite fazendo-a deixar a festa.
— Nós a trouxemos, então seremos nós que a levaremos de volta. Só preciso encontrar Mark, que foi conversar com alguns clientes. Espere aqui que já estarei de volta. Ela se misturou à multidão no mesmo instante, mas Zara não esperou. O emprego de seu cunhado dependia da satisfação de Connel e não seria justo fazê-lo se arriscar por causa dela. Perto da porta da saída, encontrou a mesma serviçal que os recebera na entrada.
— Poderia trazer meu casaco, por favor? Se puder me arranjar o
número de telefone de alguma empresa local de táxi, ficarei muito grata. um carro?
— A companhia Star é a melhor da região, senhorita. Quer que eu peça — Sim, obrigada. Peça para que me peguem em frente ao portão, sim?
Uma pequena caminhada sob o ar fresco da noite me fará bem.
Ao sair da casa, começou a andar o mais depressa possível, mesmo com os sapatos de salto muito alto e fino. Não poderia correr, caso precisasse, e temia que Connel descobrisse a respeito de sua saída e viesse atrás dela. Depois de alguns minutos por aquele caminho sinuoso e bem asfaltado, Zara ouviu um veículo se aproximar, mas foi difícil definir de onde ele vinha. Da casa ou da rua? Quando viu a luz dos faróis surgindo entre as árvores por onde acabara de passar, imaginou se Sasha teria encontrado Mark e o convencido a sair atrás dela. Contudo, assim que o carro entrou no alcance da vista, ela reconheceu de imediato o modelo esporte e a cor vermelha. Enquanto parava a seu lado, o vidro do lado do passageiro se abriu em um movimento automático. Inclinando-se para o lado, Connel aproximou o rosto da abertura.
— Entre. — Vá embora! — Não seja tola, Zara. — Estou esperando um táxi. — Eu cancelei o chamado. Olhando pela janela aberta, a expressão dela demonstrou pura indignação ao encará-lo.
— Você fez o quê? Como ousa? Não tinha o direito de interferir.
dentro!
— Entre logo, ou terei de sair daqui, pegá-la no colo e colocá-la aqui
Zara começou a se afastar, acelerando o passo ao máximo rumo à saída. O carro entrou em movimento e emparelhou ao seu lado. Connel soltou uma risada debochada antes de falar:
— O que vai fazer agora? Caminhar até sua casa? — Cale-se! — bradou ela, quase saindo do sério. Aquela situação estava
mesmo ridícula. Estava agindo como uma colegial insegura e, para completar, sentiu lágrimas inundando-lhe os olhos no instante seguinte, quando viu o carro acelerar e se afastar. Ele estava indo embora e a deixando para trás. Por que as lágrimas, então? Não era aquilo o que queria que acontecesse? Um momento depois, viu o veículo parar logo adiante, de maneira abrupta. Connel saiu de seu interior e começou a voltar, aproximando-se como um grande felino selvagem, o olhar ardente capaz de mantê-la paralisada. Quando a alcançou, ergueu-a nos braços e a beijou com avidez, provocando um branco em sua mente. Zara sentiu como se todo seu corpo houvesse sido tomado por uma espécie de eletricidade. Um estranho clarão e um ruído parecido ao motor de um veículo antecederam o instante em que ele afastou o rosto. Enquanto era carregada até o carro dele, compreendeu que aquele barulho fora a passagem de alguns convidados pela via de acesso, que estavam deixando a festa. Por sorte não vira o rosto de ninguém, ou ficaria desconcertada.
— Coloque o cinto de segurança — mandou Connel, depois de colocá-la
no assento do passageiro e de dar a volta, ocupando a lugar do motorista.
Ao vê-la lutar com o fecho do dispositivo sem conseguir engatá-lo, ele se inclinou para ajudá-la. Seus corpos ficaram próximos e foi impossível deixar de fitar aqueles lábios másculos e convidativos. Zara pensou que seria beijada outra vez e entreabriu os lábios de maneira convidativa, ouvindo-o então murmurar, entre duas tomadas de fôlego de sua errática respiração:
— Não ainda. Não aqui. Ainda trêmula, ela só parou de encará-lo quando o veículo acelerou.
— Por favor, não corra. — Claro. Ainda está assustada por causa do acidente? — Um pouco. — Com o tempo isso passa. Já comprou outro carro? — Ainda não tive tempo. Estou usando um alugado.
A conversa prosseguiu de maneira tranqüila e eles trocaram sorrisos. Era difícil para Zara se manter no controle quando o via sorrir daquela maneira sensual. Sentia-se tão envolvida que daria tudo para ter uma noite com ele. Apenas uma hora de intimidade já bastaria. Estava lutando contra pensamentos muito ousados quando percebeu que Connel estava estacionando em frente a sua casa.
— Oh... Chegamos... — Sim — murmurou ele, com a voz grave e mais sensual do que nunca. — Sua chave está aí? — Sim. Assim que ela a tirou da bolsa, Connel a pegou e saiu do carro, caminhando para a porta antes mesmo de Zara acabar de desembarcar. "Não o convide para entrar!", alertou sua mente racional, sabendo o que aconteceria se ele entrasse. Ciente de que era seu corpo que estava no controle àquela noite, Zara viu a luz da varanda se acender e cobriu os olhos ofuscados, percebendo pouco depois que já era tarde para convidá-lo para entrar, uma vez que ele a esperava com a porta aberta, dentro do saguão interno.
— Entre logo — falou Connel, com impaciência, ao vê-la parada do lado
de fora, fitando-o.
— Não. Não posso. Não vou dormir com você — ela conseguiu dizer,
apesar do desejo imenso que sentia.
Ele não pareceu surpreso nem decepcionado. Apenas se aproximou, sem nada dizer, tomando-a nos braços e a levando para dentro. Depois de fechar a porta com um leve chute, subiu a escada carregando-a no colo. A mente de Zara era um verdadeiro campo de batalha. Aquela era a atitude que desejava que ele tivesse, pois queria tê-lo em sua cama mais do que tudo que já quisera na vida. Mas seria loucura. Tinha de pará-lo naquele mesmo instante.
— Se tentar me obrigar a ir para a cama com você, irei combatê-lo com
todas as minhas forças! tenso.
— Não vou obrigá-la a nada, Zara — disse ele, em um tom grave e — Também não vai me seduzir!
dela.
A essa altura, já estavam no quarto. Connel levou os lábios ao pescoço
— Zara, Zara... Eu a desejo mais do que tudo. — Mas não pode me ter — falou ela, ciente de que não conseguiria
parecer determinada, apesar da intenção inicial.
Aqueles beijos estavam provocando tremores de prazer por todo seu corpo. Sentia-se vulnerável e incapaz de resistir. Os lábios quentes alcançaram seu colo, fazendo-a gemer. Quando arqueou as costas para trás, em um movimento involuntário, percebeu que estava sendo deitada na cama. O que se seguiu foi ardente e caloroso. De alguma maneira, ambos foram ficando mais despidos a cada instante. Qualquer traço de resistência desapareceu da mente de Zara. Seria inútil negar aquele momento a ambos. De repente, estavam nus, de frente um para o outro, observando-se mutuamente. A pausa durou apenas dois ou três segundos, mas era como se tivesse havido tempo suficiente para se verem nos mínimos detalhes. Soltando um gemido de prazer, Zara se recostou nos travesseiros, semicerrando os olhos de maneira sensual e convidativa. Connel não precisou de um convite mais explícito para começar a acariciá-la de maneira cada vez mais íntima e intensa. Quando não estavam mais suportando a expectativa, seus corpos se uniram por completo. A perfeição daquela reunião parecia inacreditável. Para Zara, aquela era como a primeira vez. Na verdade, nunca sentira amor antes e estava descobrindo porque aquilo se chamava também de "fazer amor" e não apenas "sexo". Seus corpos se moviam de maneira frenética, como se o mundo fosse acabar no instante seguinte. Ainda assim, cada carícia era cuidadosa e cada segundo fazia parte de um ritmo perfeito. Nunca imaginara que fosse possível sentir tamanho prazer. Quando chegaram ao ápice do momento de amor, ela já não sabia mais onde seu corpo terminava e onde começava o dele. Estremecendo e se deixando levar pelos deliciosos espasmos que a dominavam, murmurou palavras das quais jamais se lembraria. Seu corpo se arqueou com espontaneidade como se tivesse vontade própria. Os gemidos de Connel se uniram aos seus, revelando que haviam alcançado em uníssono a mais alta nota daquela sinfonia prazerosa. O corpo pesado de Connel a envolveu com tamanha suavidade que parecia incrível acreditar se tratar de alguém tão alto e másculo. Ele nem parecia ter peso ao se deitar sobre ela. Depois de alguns minutos, já com a respiração mais calma e com um sorriso de satisfação, ele rolou para o lado puxando-a de frente para si. Abraçou-a com um dos braços enquanto acariciava-lhe os seios com a mão livre.
— Estava mesmo falando sério? — indagou Connel, em um sussurro. — A respeito de quê? — perguntou Zara, incapaz de pensar com clareza naquele momento. de novo...
— Não se incomode. Pode murmurar o que quiser enquanto nos amamos
Notando que ele estava excitado novamente, o desejo a dominou outra vez e eles voltaram a se amar de maneira ainda mais intensa, até que o cansaço os fez sucumbir e a levou a adormecer nos braços dele.
CAPÍTULO X Zara acordou assustada e, por alguns segundos, sentiu-se desorientada. Bocejando, observou a escuridão do quarto e notou que o relógio não estava despertando. O que a acordara? Eram pouco mais de onze horas da noite. Recostando-se outra vez para voltar a dormir, ouviu o motor de um carro ser ligado, logo abaixo de sua janela. Só então a lembrança do que acabara de acontecer lhe veio à mente. Junto veio também uma sensação de choque. Aquele era Connel indo embora. Levantando-se, foi até a janela e observou o veículo se afastar pela rua. Com a testa apoiada contra o vidro frio, respirou de maneira profunda e sentiu uma lágrima solitária escorrer-lhe pelo rosto, refletindo a dor e a solidão que sentia. Por que ele estava partindo? Para onde estava indo? Depois de fazerem amor de maneira tão apaixonada, Connel saíra da cama e se vestira de maneira furtiva, indo embora sem dar satisfação. Dentro de sua mente, uma voz ecoava em tom cínico: "Ora, ele conseguiu o que queria. Por que iria ficar por perto?". De repente, ocorreu-lhe que poderia haver um bilhete no andar de baixo. Tomada por uma fagulha de esperança, vestiu um roupão sobre o corpo nu e desceu a escada. Mas não encontrou nada. Nenhum recado. Sabendo que não conseguiria dormir mais naquela noite, começou a pensar em tudo o que acontecera e foi preparar um café. Talvez a opinião inicial dele, formada a partir do que Hal Thaxford dissera, o tivesse levado a fazer tudo aquilo. Mas não podia se deixar destruir. Enquanto sorvia a bebida quente e forte, sentou-se em frente à lareira artificial e ficou observando as chamas falsas. Nunca as considerara tão frias antes. Mas jamais amara antes. Teria de esperar pelo próximo passo que Connel viesse a dar. Não poderia tomar iniciativa alguma, ou perderia até mesmo seu orgulho pessoal. Já bastava haver entregado seu coração. Antes de amanhecer, já havia tomado banho, vestido um traje bastante profissional e saído para o trabalho. Chegou à locação de filmagem meia hora antes da alvorada. Estava tensa, pois passara a noite em claro e bebera café demais. Will e os outros logo perceberam como estava seu humor naquela manhã. Todos a olhavam como coelhos assustados antes de correrem para obedecê-la, diante das explosões que se tornaram suas ordens. Por sorte, tinha muito o que fazer naquela manhã e não haveria tempo para ficar pensando em sua vida particular.
Enquanto almoçava na companhia do cameraman, avistou Hal Thaxford se aproximando ao longe. Um nó se formou em seu estômago. Teria Connel lhe contado a respeito da noite que passaram juntos? Como iria lidar com isso se ele começasse a contar o ocorrido a todos da equipe? Sentiu-se desconfortável quando viu o "arremedo de ator" chegando mais e mais perto a cada passo. Não estava disposta a encará-lo. Não ainda.
— Olá. A voz dele a levou a sentir um arrepio. Seria aquele o tom de alguém que sabia demais? Forjando um sorriso, levantou o rosto na direção dele.
— Oi, Hal — respondeu ela, com alívio. Aquele rosto não escondia nada. Era óbvio que Connel não havia lhe contado nada. Se fosse um ator de verdade, e não apenas alguém que vencera apenas pela aparência, Zara ficaria preocupada. Mas não era o caso.
— Bem — falou ele, desconcertado, pois jamais fora recebido por ela
com um sorriso. — Vim para lhe falar que conversei com meu primo e ele concordou em nos deixar gravar no jardim das roseiras, desde que preparemos um contrato legal, garantindo que não haverá nenhum dano ou despesa para ele. Ela havia se esquecido por completo a respeito daquilo e, depois da noite anterior, não estava certa de que queria seguir adiante com a idéia.
— Vou falar com a companhia a respeito do contrato. Obrigada, Hal.
Isso foi de grande ajuda.
— Não há de quê, foi um prazer. E, bem, quando é que pretende
começar a gravar minhas cenas?
Zara gesticulou na direção de Will.
— Pergunte ao mestre das câmeras. — Mais para o final da tarde — sugeriu o outro homem, que já estava
acabando de comer.
Hal soltou um suspiro e então balançou a cabeça afirmativamente.
— Está bem. Acho que vou me juntar ao resto do elenco no carteado. Ela ignorou aquele comentário e ficou em silêncio ao vê-lo fazer uma careta e se afastar. Era suposto que a diretora não soubesse nada a respeito de os atores jogarem cartas enquanto estavam esperando para gravar, pois a companhia cinematográfica queria que eles arrumassem algo útil para fazer durante o período de expediente. Quando voltaram a ficar sozinhos, Will a olhou com espanto.
— Do que estavam falando, afinal? Sem encará-lo, Zara tentou parecer o mais indiferente possível.
— Oh, foi apenas uma idéia que me ocorreu ontem à noite. Hal e eu
estávamos em uma festa, na casa do primo dele...
— Como é? Vocês dois foram a uma festa juntos? Eu vinha desconfiando que seu comportamento estava diferente, como se estivesse apaixonada e contrariada, mas não posso acreditar que seja por Hal Thaxford, o "fantoche". Não creio que possa ser tão tola. — Isso não foi engraçado, Will — disse ela, fazendo uma careta. —
Sabe muito bem o que penso a respeito dele e garanto que isso não mudou. Apenas aconteceu de nós dois estarmos na mesma festa e de conversarmos, só isso. rir.
— É mesmo? — indagou o grandalhão, com ar desconfiando, fazendo-a — Claro! Fui na companhia da minha irmã e de meu cunhado, que
trabalha para o primo de Hal.
Por que estava dando tantas explicações? O que Will tinha a ver com sua vida pessoal?
— Sei, sei. E que jardim é esse? Então conversaram a respeito do cenário das roseiras e da cena de Hal com Lindsay por algum tempo. Ao final do almoço eles voltaram ao trabalho, gravando e resolvendo problemas sem parar, até o pôr-do-sol. Algum tempo depois de escurecer, quando voltou para casa, Zara ouviu o recado de sua irmã em sua secretária eletrônica.
— Bem, o que foi que aconteceu, irmãzinha? Por que saiu às pressas
daquela maneira? Mark ficou furioso. Fomos nós que a levamos e era a casa do patrão dele. Foi um insulto para Connel, e a última coisa que queríamos era que você o irritasse. Telefone-me assim que puder, pois quero saber todos os detalhes! "Não nessa vida", pensou Zara. Jamais contaria o que acontecera na noite anterior. O recado seguinte era de Philip Cross, com mais uma de suas intermináveis reclamações a respeito do orçamento do filme estar além do limite calculado. Quando a mensagem dele terminou, havia conseguido acabar de esquentar o jantar. Estava colocando os talheres à mesa quando a voz de Connel irrompeu pelo ambiente, fazendo-a estremecer da cabeça aos pés.
— Preciso ir para o exterior — disse ele, em um tom impessoal, como se
estivesse falando com alguém de sua equipe. — Não faço idéia de quando estarei de volta. — Houve uma pausa. — Até mais. Quando a máquina parou de funcionar, Zara precisou se sentar antes que suas pernas cedessem sobre seu peso.
Aquela não era a maneira como amantes deveriam se tratar. Não houvera nenhum indício de paixão ou de intimidade. Depois da maneira que ele partira, aquilo não deveria tê-la surpreendido. Contudo, estava descobrindo que as pessoas apaixonadas não se atinham muito à lógica, o que era preocupante. Como lidaria com o futuro? Estava magoada e frustrada. Não poderia ficar ali e se entregar à tristeza. Levantando-se, pois perdera o apetite, arrumou a cozinha e foi tomar um banho. Já na cama, trabalhou até a exaustão na elaboração das cenas que gravaria no dia seguinte, deixando-se então levar pelo cansaço e dormindo algumas horas. Ao acordar, estava chorando. O travesseiro estava encharcado de lágrimas, o que indicava que chorara dormindo. Jamais acreditara que fosse possível sofrer de verdade por amar alguém e não ser correspondida, mas o destino estava lhe provando o contrário. Durante aquela semana, mergulhou no trabalho com todas suas forças, tentando esquecer seus sentimentos. Não teve nenhuma notícia de Connel, mas os advogados dele e os da companhia haviam chegado a um acordo quanto à gravação da cena no jardim das roseiras. Não precisariam pagar nada, desde que nada fosse quebrado. O humor de Zara ficou pior ainda quando foram à mansão para filmar. Todos estavam estranhando seu comportamento e, se não fosse o bom e longo relacionamento que existia entre eles, toda a equipe a teria abandonado. No sábado seguinte, foi almoçar com a família de Sasha. Ficou sabendo então que Connel fora para a Argentina, onde estavam montando uma nova filial e comprando algumas empresas. Mark achava que ele ficaria lá por muitos meses. Quando ficou sozinha com sua irmã, soube que Bianca Green estava assediando Connel todo o tempo antes da viagem. Na opinião de Sasha, a viagem fora um pretexto para ele se afastar da insistente caçadora de dotes. Isso significava um afastamento longo e duradouro. Com tristeza, Zara voltou para casa no final da tarde, chegando lá ao cair da noite. Estacionou o carro na garagem, como sempre, andando devagar até a porta. Foi então que ouviu um ruído atrás de si, como se alguém se aproximasse pela grama. Seria Larry outra vez? Sem se virar para não perder tempo, tentou destrancar a porta, apenas descobrindo que estava usando a chave errada ao ouvir:
— Sou eu, Zara. Incrédula, ela se virou e o encarou, boquiaberta. Mal pôde acreditar quando o viu se aproximar, saindo das sombras. As batidas de seu coração pareciam tão intensas e rápidas que pareciam ecoar por todo seu corpo.
— Você voltou.
Sua própria voz soou calma e estável, o que a surpreendeu. Ninguém notaria a turbulência, o que se passava em seu interior, nem saberia sobre suas pernas trêmulas ou sobre o desejo que ardia em seu corpo.
— Onde esteve? Faz mais de duas horas que estou aqui, esperando.
Sábado é seu dia de folga, então pensei que a encontraria em casa.
— Fui almoçar com Mark e Sasha. Estavam conversando como se fossem apenas conhecidos. Seria apenas isso que ela significava na vida dele? Mais uma conhecida?
— Mas que droga. Pensei em ligar para lá, mas não queria falar a
respeito de trabalho e não sabia se você havia lhes contado sobre nós.
— Nós? — repetiu ela, estremecendo quando ò vento frio os envolveu. Connel a fitou e observou-lhe a palidez.
— Está esfriando muito aqui fora. Vamos para dentro ou você não
pretende me convidar para entrar essa noite?
Lágrimas começaram a marejar os olhos de Zara.
— Vá embora, Connel. Estou cansada demais para lidar com você. — Por que está chorando? — Não estou! voz.
— Posso ver as lágrimas em seus olhos e ouvir o tom choroso de sua — Vá embora — repetiu Zara, virando-se e tentando abrir a porta sem
sucesso, pois não conseguia acertar a chave na abertura, graças ao tremor que a dominava.
Afastando-a com delicadeza para o lado, ele pegou a chave das mãos dela e abriu a fechadura. Ela tentou entrar depressa, deixando-o de fora, mas foi impossível. Seguindo-a de perto, Connel parou do lado de dentro e fechou a porta atrás de si, surpreendendo-a ao acender a luz.
— Ouça, estou cansada. Quero que vá embora! — pediu Zara, cobrindo os olhos para protegê-los da luz. Ignorando-a, Connel entrou pela sala e foi até o controle do sistema de aquecimento, aumentando a temperatura. Então foi até a cozinha e começou a fazer algo. Pelo ruído, parecia estar enchendo uma chaleira com água. Ciente de que não iria se livrar dele com facilidade, Zara retirou o casaco que tinha sobre os ombros e foi até a cozinha.
— Pensei que estivesse na Argentina. — E estava. Mas agora estou aqui.
Zara pôde ver que ele pretendia fazer chá.
— Sasha disse ter ouvido rumores de que sua estadia lá seria longa. Talvez permanente. — É mesmo? Sua irmã tem uma imaginação fértil, não? Viajei apenas
para acertar um contrato milionário. Vou comprar uma empresa de construção civil e transformá-la em uma filial.
— Então ela não está assim tão errada, está? Precisará estar presente
a maior parte do tempo para começar a operar em outro país.
— Não necessariamente — argumentou Connel, com tranqüilidade. —
Vou delegar isso a Mark, que é competente e fala espanhol com fluência. Zara hesitou.
— Mark? Mas e quanto a Sasha e às crianças? Eles têm uma vida aqui na Inglaterra... — Ei, ei. Calma. Esse é um assunto para eles resolverem, certo? Tenho
a impressão de que sua irmã e seu cunhado podem conversar a respeito disso sem nossa interferência. Se Mark preferir ficar, arranjarei outra pessoa. Não se intrometa, sim?
— Mas que audácia! Você vive querendo me dizer o que fazer. Por que
não aceita seu próprio conselho e vai cuidar de sua vida? Vá embora e me deixe em paz! Ele se aproximou e a segurou pelos ombros.
— Não — respondeu Connel, fitando-a de maneira direta. — Você não
vai me descartar, Zara. Não deixarei que isso aconteça.
Aproximando o rosto, tomou os lábios dela nos seus em um beijo apaixonado. Segundos depois, ela enlaçou os braços ao redor do pescoço dele, ficando na ponta dos pés para alcançá-lo melhor. Não conseguia esconder o desejo que sentia. Ele estava murmurando algo junto aos lábios dela. Demorou um pouco para ela entender, mas Zara conseguiu definir o que era.
— Eu te amo, querida. Eu te amo. Começando a chorar ao ouvir aquilo, ela apenas soltou um gemido. Aquilo o fez afastar o rosto e franzir o cenho com uma expressão intensa e arrependida.
— Eu sabia que não deveria ter dito isso — murmurou Connel. — Tinha certeza de que seria um erro deixá-la saber a respeito de meus sentimentos. Não pude evitar, Zara. Mas já vou avisando que é melhor nem pensar em me descartar sem mais nem menos. Com lágrimas escorrendo pelo rosto, ela se recostou nele, acariciandolha a nuca e sentindo aqueles cabelos fartos entre seus dedos.
por você?
— Eu também te amo, seu bobo. Será que não percebeu que sou louca
Connel soltou um suspiro aliviado e a beijou outra vez, com paixão. Seus lábios e seus corpos se uniram com tamanha intensidade e por tanto tempo que, a certa altura, eles tiveram a impressão de estarem se tornando um só ser. Quando parou de beijá-la, Connel a fitou com intensidade, mas seu sorriso trazia ainda um traço de ansiedade.
— Zara, meu amor, case-se comigo. Mesmo sentindo sua cabeça rodopiar como um redemoinho, Zara não hesitou em responder:
— Sim! Sim, querido. Sim... Outro beijo selou aquela promessa de amor eterno, afastando para longe uma imagem que ocorreu a Zara: a da expressão de sua irmã quando ficasse sabendo que seus filhos ganhariam um tio...
FIM
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