Elogios a série #1 de vendas do N ew York Times, Rastro de Sangue
“Um mistério maravilhoso, mas um tanto horripilante… Uma reviravolta inesperada que fez valer a espera. Um indispensável." — School Library Journal (*resenha de estreia*) “Há diversos suspeitos e pistas enganadoras, bem como tensões crescentes… Um mistério teatral e intenso." — Kirkus Reviews “Maniscalco criou uma protagonista séria, perspicaz e idealizadora em Audrey Rose, cuja coragem irá torná-la querida aos leitores que procuram um suspense histórico envolvente. Inúmeras distrações e uma pitada de romance envolvem essa história horripilante, mas cativante.” — Publisher’s Weekly “Audrey Rose é uma jovem mulher ansiosa para usar seu cérebro e desafiar as regras da Sociedade… Esse mistério faz homenagem a clássicos como Sherlock Holmes, de Doyle, e Frankestein, de Mary Shelley, e irá satisfazer os leitores que buscam por um mistério histórico, uma heroína astuta, e um pouco de romance.” — School Library Connection “Audrey Rose é uma feminista engenhosa e astuta, que se recusa a se sujeitar às regras de gênero da era Vitoriana. Essa paisagem gótica e sombria é povoada com personagens diversificados e voláteis que irão manter os leitores cativados. Um mistério envolvente com uma heroína fascinante, e o toque certo de romance.” — Kirkus Reviews “Cada frase desse romance destila degeneração. Os espaços e as performances do Circo Luz do Luar são exuberantes, embora perigosos; lindos, mas assustadores. É fácil de entender como Audrey Rose se encanta
tanto com o Circo e seus artistas, porque, enquanto leitores, somos colocados sob o mesmo feitiço… Magistralmente elaborado." — Hypable “Audrey Rose Wadsworth prefere calças a vestidos de baile, autópsias ao chá da tarde, e bisturis à agulhas de tricô…. A visão de Maniscalco das invenções científicas na recente era industrial serve como uma ótima primeira incursão aos clássicos vitorianos.” — Booklist
Becoming the Dark Prince Kerri Maniscalco
Copyright
Os personagens e eventos neste livro são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, é coincidência e não intencional por parte do autor. Copyright © 2019 by Kerri Maniscalco Cover © 2019 Hachette Book Group, Inc. Cover design by Liam Donnelly Cover artwork by Shutterstock and Wild Textures O Hachette Book Group apoia o direito de livre expressão e o valor do direito autoral. O propósito do direito autoral é encorajar escritores e artistas a produzirem os trabalhos criativos que enriquecem nossa cultura. A reprodução, o upload e a distribuição desse livro sem permissão é um roubo da propriedade intelectual do autor. Se você gostaria de permissão para usar o material deste livro (para outros motivos além de resenhas) por favor contate
[email protected]. Obrigada por apoiar os direitos do autor. JIMMY Patterson Books / Little, Brown and Company Hachette Book Group 1290 Avenue of the Americas, New York, NY 10104 JimmyPatterson.org twitter.com/Jimmy_Books facebook.com/JimmyPattersonBooks First ebook edition: July 2019 JIMMY Patterson Books is an imprint of Little, Brown and Company, a division of Hachette Book Group, Inc. The Little, Brown name and logo are trademarks of Hachette Book Group, Inc. The JIMMY Patterson Books® name and logo are trademarks of JBP Business, LLC. The publisher is not responsible for websites (or their content) that are not owned by the publisher. The Hachette Speakers Bureau provides a wide range of authors for speaking events. To find out more, go to hachettespeakersbureau.com or call (866) 376- 6591.
Photographs courtesy of Shutterstock. ISBN 978-0-316-42870-5 E3-20190702-JV-NF-ORI
Sumário
Capa Elogios à série #1 de vendas do New York Times, Rastro de Sangue Página de Título Copyright Epígrafe Antes Um Dois Três Quatro Cinco Seis Sete Oito Nove Sobre o autor JIMMY Patterson Books for Young Adult Readers Novidades
“O Príncipe das Trevas é um cavalheiro.” — Rei Lear, Ato 3, Cena 4 William Shakespeare
ANTES Cabine do Thomas RMS Etruria[1] 4 de Janeiro de 1889 A chuva tamborilava seus dedos contra a escotilha da minha cabine, a meio caminho de me enlouquecer completamente enquanto eu tentava — e falhava — contar cada gota. O ritmo amaldiçoado era demais para acompanhar. Me virei de lado, empurrando meu travesseiro para debaixo de minha cabeça, e encarei a tempestade furiosa do lado de fora. O céu ainda era do preto azulado perigoso da noite e provavelmente permaneceria dessa forma mesmo horas após o amanhecer. Ou talvez o clima me surpreendesse, tal como outros acontecimentos recentes. Lá fora, as cordas rilhavam; o som era como o de fantasmas abrindo portas. O RMS Etruria me inquietava. Ou talvez fosse o turbilhão de emoções revolvendo fundo dentro de mim que me deixava desconfortável. O ciúmes era um amante desprezível de se ter. Ela parecia crescer sempre que eu pensava no sorriso malicioso que Mefistoféles ostentava como outra máscara perto de Wadsworth. Ele era particularmente insuportável depois das performances noturnas do Circo. Pior ainda, os passageiros pareciam encantados com a enganação. Como se tomar o nome e a persona de um demônio de uma lenda fosse algo a ser aplaudido. Como se encobrir sua identidade com máscaras tolas tanto no palco quanto fora dele fosse um mistério com o qual se deleitar. Eu odiava suas risadas fáceis e suas roupas brilhantes, reluzindo como estrelas no céu da noite. Eu odiava suas barganhas egoístas e a percepção de que tudo era um jogo. Eu realmente odiava quão arduamente ele tentava seduzir a garota que eu adorava. Bem na minha frente. Mas, acima de tudo, eu odiava a terrível fera que as ações de Mefisto despertava em mim. Em parte porque, devido à linhagem Drácula de minha mãe, e parte porque isso parecia regozijá-lo, meu pai me chamava de monstro. Ele dizia isso com tanta frequência que era quase fácil de acreditar. Especialmente assim que tomei fascínio pelo estudo dos mortos. Quem, senão uma criatura desprezível, escolheria um destino tão sombrio? A
corroída preocupação misturada ao desconcertante conhecimento de meus ancestrais romenos era suficiente para plantar as sementes do medo — de que, espreitando em algum lugar abaixo do meu exterior frio, uma fera aguardava, esperando devorar o cavalheiro que eu fingia ser. Ponderei se eu odiava Mefistoféles por causa do intenso desejo de soltar o monstro sob minha pele. Passei uma mão pelo cabelo, despreocupado que os fios despontavam caoticamente agora. Aversão própria à parte, o mestre de cerimônias não era bom o suficiente para Audrey Rose Wadsworth. Não que eu tivesse qualquer direito a oferecer tal opinião. Eu ainda não acreditava que Wadsworth queria o pavão pomposo que era o mestre de cerimônias, e, sinceramente, seus esforços para ganhá-la deveriam ser divertidos. O que me fez pensar na agonia de… algo… ainda crescendo em mim com o pensamento. Eu deduzi tão logo que, qualquer fosse o vínculo entre eles — ao menos da parte dela — havia nascido de uma barganha. Eu apenas ainda não resolvera por completo o mistério do que ele oferecera que era importante o suficiente a ponto dela omitir partes da verdade. Wadsworth era uma força incontível enquanto investigava um crime, mas havia algo mais a incentivando. Algo pessoal. Espioná-los me daria os detalhes necessários, mas eu não conseguia tolerar a ideia de espionar a pessoa que eu amava como um depravado. Eu havia prometido que ela seria sempre livre para escolher seu próprio caminho, e me recusava a agir de outro modo por causa dele. Garras imaginárias arranhavam meus sentidos, provocando-me a agir. Maldição. Eu precisava de ajuda. Eu estava permitindo que pensamentos desse tolo — que nomeara a si próprio em homenagem a um demônio barganhador de um mito de Fausto, e tão obviamente adotara a mesma p ersona obscura nos palcos — penetrassem em mim como vermes. Escrever a minha irmã, Daciana, por auxílio no assunto seria prudente, mas a carta não poderia ser enviada do mar, e eu não teria uma resposta até que chegássemos em Nova Iorque, de qualquer maneira. Eu mesmo precisaria esclarecer essas emoções. Suspirei e esfreguei uma mão pelo meu cabelo de novo. De todos os quebra-cabeças complexos que o mundo oferecia, quem haveria de imaginar que minhas emoções seriam o maior desafio da minha vida? O temporal cessou abruptamente sua investida, chamando minha atenção para o silêncio imediato. Era um descanso do clima que eu não podia resistir. Olhei para o relógio. O amanhecer ainda estava a algumas horas
distante, porém eu devia ter refletido sobre o mestre de cerimônias do Circo Luz do Luar mais do que eu esperava. O filho do diabo que ele era. Pulei da cama e rapidamente me vesti. Eu precisava de ar. Se as nuvens se separassem, talvez eu desse sorte e visse as estrelas. Desejei uma estadia agradável com duas das minhas constelações preferidas — a Ursa Menor e o Cisne. Eu não esperava ninguém acordado tão cedo — ou tão tarde, dependendo da perspectiva —, especialmente com a ameaça de outra tempestade se aproximando. Eu deveria saber melhor do que aplicar essa noção a Audrey Rose. Nada tão trivial quanto o clima a manteria enjaulada, não quando ela tinha uma meta a alcançar, e o assassinato de uma jovem a resolver. Eu sabia que a disposição teatral dos corpos para descoberta a enfurecia. Qualquer um com um pingo de compaixão desprezaria a referência extravagante às cartas de tarot que o assassino usara. Mas, Audrey Rose sentia tão profundamente que a necessidade de acertar todas as injustiças a consumia. Era visível no fogo de seus olhos verde-mar, duas brasas gêmeas que pareciam prometer vingança por todos aqueles que haviam sido terrivelmente injustiçados, tanto em vida quanto em morte. Eu lutei contra um sorriso. Era uma das qualidades que eu mais amava nela. Eu— Repentinamente, parei de andar conforme ela e sua prima se aproximavam da outra extremidade do convés, sem dúvida em direção à cabine compartilhada. Ela parecia relaxada, alegre. Seu braço estava enlaçado no de Liza, seus sorrisos contagiosos enquanto riam alto demais, e prontamente silenciaram-se antes de caírem novamente na risada. Eu parei, considerando dar meia-volta antes que elas me avistassem, quando minha atenção se fixou em suas roupas. As meias escuras rendadas mostravam suas pernas, e o corpete vermelho e preto decotado era respingado com o número certo de lantejoulas para atrair estrategicamente o olhar para suas curvas. Eu engoli em seco e praguejei sob minha respiração. Ela estava vestida como uma das artistas do Circo da Luz do Luar, e era um sonho. E eu estava encarando como um tolo apaixonado. Ouvi a voz de Daciana na minha cabeça, ralhando comigo por ficar boquiaberto com algo tão mundano quanto roupas. Com grande esforço, me forcei a pensar claro e logicamente. E certamente parar de olhar a seda delineando o formato de seus quadris. — Oh, Sr. Cresswell!
Liza as apressou, encurtando a distância. O rosto de Audrey Rose demonstrava choque quando ela olhou para cima e me viu. Eu estudei sua expressão atentamente, animado ao ver que eu era uma surpresa bem-vinda. Preocupei-me que ela talvez pensasse que eu intencionalmente estivesse passando por sua cabine para checá-la. Na verdade, não percebi que estava indo nessa direção. Estive deveras consumido pelos meus próprios pensamentos. Liza alternou o olhar entre nós e mordeu o lábio, tentando evitar um sorriso enquanto se separava da prima e corria até a porta. Ela soltou um bocejo exagerado, não enganando ninguém com sua atuação e fingindo cansaço. — Estou tão exausta — disse para ninguém em particular, — estarei aqui, dormindo profundamente. Ela piscou para Audrey Rose e deslizou para dentro, deixando-nos a sós. Algo curioso aconteceu com a minha pulsação — ela disparou. Medo e desejo me percorreram. Uma mistura confusa a qual eu precisaria analisar depois, quando estivesse sozinho. Por ora, eu precisava lembrar como respirar e agir como o cavalheiro que eu tentava me convencer que era. — Cresswell. — Ela balançou para frente, estreitando os olhos. — É realmente você? Eu lancei um dos meus olhares mais charmosos. — Não se preocupe, Wadsworth. Às vezes também não consigo acreditar que eu sou real. Seu olhar se moveu para meus lábios e parou ali. Uma expressão próxima de desejo passou por seu rosto. Era o mesmo olhar que ela me dera quando nos beijamos em sua cabina algumas noites atrás. Eu recordei o calor de seu corpo, a sensação de sua pele macia, o sabor dela… Eu respirei fundo e me concentrei em resolver equações matemáticas. Pensei em numeradores e denominadores. Conjurei raízes quadradas. Qualquer coisa, qualquer coisa para me impedir de notar meus batimentos cardíacos acelerados e o jeito que ela me deixava nervoso e excitado ao mesmo tempo. E então ela lambeu os lábios devagar — como se tivesse deduzido a febre me atravessando, destruindo minha intenção de libertá-la. Foi necessária toda a minha força de vontade para me manter a uma distância decente. Uma palavra ou súplica dela era tudo que precisaria. Era mais do que luxúria. Mais do que uma necessidade física. Eu reverenciava cada parte dela. Se ela me pedisse, eu libertaria cada um dos meus desejos, dando-lhe prazer de um modo que a deixaria muito ciente do quanto eu a estimava.
Uma vez que isso acontecesse, não haveria como negar a profundidade dos meus sentimentos. Quão completo e loucamente eu a amava. Um fato mais sólido e tangível do que qualquer outro na história do mundo. Eu transformei minha expressão em uma máscara de gelo, escondendo as chamas ardentes e furiosas atrás. Eu queria que ela me escolhesse sem ser influenciada por meus sentimentos. — Thomas? — Ela perguntou, seu foco teimosamente fixo em minha boca. — Sim? — Minha voz saiu um pouco áspera, e eu limpei minha garganta. Eu estava começando a achar difícil pensar, respirar. Eu contemplei o olhar em seus olhos — no qual ela parecia mentalmente passar seus dedos pelo meu cabelo, gentilmente afastando minha cabeça para trás, me possuindo divertidamente. Eu— Mil novecentos e setenta e dois divididos por sete... — Thomas, você está bem? Você parece um pouco pálido. — Ela não estava ciente disso, mas quando ela dava sua atenção a algo, a força era arrebatadora. — Por que você está se esgueirando tão cedo? Para me salvar dos meus demônios. Para me libertar da jaula do meu quarto e dos medos que ameaçam ser minha destruição. Para sentir as pontadas formigantes da neve no meu rosto e esquecer que não há uma cura para a minha condição. Seu olhar era uma carícia palpável enquanto ela lentamente o desviava para baixo, acendendo uma profunda necessidade masculina que assustou até a mim. — Não estou esgueirando, estou perambulando, Wadsworth. — Eu dei um sorriso preguiçoso. Era um esforço manter meu tom casual, me impedir de aliviar seu desejo igual. Embora, a julgar pelo desejo crescente em sua expressão e o jeito que ela movia seu corpo em minha direção, talvez ela tivesse atiçado essas chamas sozinha. — Por que v ocê está se esgueirando? Eu iria provocá-la mais, perguntando se ela estava voltando de um encontro noturno, e senti um chute invisível violento no estômago. Me amaldiçoei por pensar na atrocidade e forcei minha mandíbula a permanecer fechada, para que não fizesse de mim um tolo ainda maior. De todos os momentos para imaginar o mestre de cerimônias com os braços em torno dela… — Você está divagando. — Seus olhos espertos se estreitaram novamente, concentrando-se na minha expressão. — Você descobriu uma pista? Houve outro assassinato? Eu balancei minha cabeça, sem confiar em mim mesmo para falar. Imagens dela enrolada em outra pessoa, seus cabelos derramando como um segredo sobre o peito dele ainda me atormentavam. Eu mantive meu olhar
em seu rosto, me recusando a mirar sua fantasia. E a extensão de pele que revelava. Apesar dos meus melhores esforços, quando uma rajada de vento atravessou o convés, eu olhei. Eu só queria ver se ela estava com frio e precisava do meu casaco, mas seu corpete estava tão apertado que o inchaço de seus seios roubou meus sentidos. Eu queria rasgar as cordas e o espartilho e passar minha… Novecentos e noventa e oito mil dividido por vinte e seis eram trinta e oito mil, trezentos e oitenta e quatro e— Como se minha mente tivesse conjurado um balde de água gelada imaginária para jogar sobre mim, eu subitamente ponderei quem havia a ajudado a vestir a fantasia. Ciúme se contorceu dentro de mim, arrebatando todo o meu bom senso e toda a decência. Eu expirei lentamente, minha respiração enrolando-se em espirais de fumaça. Eu imaginei que parecia como o dragão ao qual meus ancestrais haviam se dado o nome. O pensamento arrancou a tolice de mim. Eu não era um monstro cuspidor de fogo, nem jamais seria. Eu precisava focar nela, não nas minhas inseguranças. Eu precisava confiar nela, mesmo quando não entendia qual era seu objetivo. Se eu conseguia fazê-lo em nosso espaço de trabalho, não havia razão para que eu não conseguisse deixar de ser um tolo ciumento agora. Ela se aproximou. — Você está bem? Eu ainda estava lutando contra a vontade de caçar o mestre de cerimônias e jogá-lo no mar, esforçando-me para superar minhas inseguranças para que eu pudesse ter o tipo de relação romântica construída na totalidade que eu ansiava, tentando solucionar uma série de assassinatos horripilantes, e tentando me impedir de me tornar o monstro o qual meu pai me convencia que eu era ao libertar a garota que eu amava. No momento, aquela garota estava tornando a última parte extremamente difícil, quanto mais ela parecia querer envolver seus braços em torno de mim. Eu ansiava por tocá-la. Primeiro sua mente, depois seu coração e, por fim, seu corpo. Eu desejava possuir cada centímetro do espaço entre nós e preenchê-lo com cada emoção que eu havia suprimido ou ignorado. Eu queria desnudar minha alma só para ela, e então fazer o mesmo com as minhas roupas, dando-lhe tudo de mim. Cicatrizes e todo o resto. — Thomas? — Ela perguntou de novo, franzindo a sobrancelha em preocupação. — Você está bem? Eu ergui um ombro. — Nunca estive melhor.
Ela estremeceu, e eu sabia que não era minha mentira óbvia que a afetou. Eu tirei meu casaco e o coloquei sobre seus ombros, as juntas dos meus dedos acidentalmente raspando no topo de seus seios ao abotoar um botão em seu peito. O contato enviou chamas ardentes pelo meu corpo, tão rápido quanto um relâmpago. Ela prendeu a respiração e voltou sua atenção para cima. Aconteceu tão rápido que eu não tive tempo de afastar o desejo do meu rosto. Dei um passo para trás conforme uma mescla invernal de chuva e neve começou a cair. Ela se moveu comigo, uma caçadora avistando sua presa. O problema era que eu queria ser pego mais do que eu queria correr. — Eu pensei em você hoje, — ela murmurou, me prendendo com um olhar que prometia todos os tipos de coisas lindamente perversas. — Eu bebi absinto e dancei sozinha. Não se preocupe, — ela balançou para frente, e eu fiquei imóvel enquanto ela colocava as mãos no meu peito e lentamente, cuidadosamente, as movia para repousarem sobre meu coração, — não foi inapropriado. Estou salvando essa honra para você. Lembra-se? Eu teria que estar morto para esquecer quando eu comentara, não muito tempo atrás, sobre beber vinho e dançar inadequadamente juntos. Inspirei devagar, tentando formar um pensamento coerente, uma tarefa se provando particularmente complicada. Sentimentos conflitantes lutavam por supremacia. Aquela inveja persistente, pura e fervorosa ao imaginá-la dançando com outra pessoa, superada apenas por uma satisfação avassaladora de que ela estivera pensando em mim. Eu odiava o ciúmes, — fazia sentir-me monstruoso e descontrolado. Ela merecia melhor. Eu também. Nosso cortejo não era oficial ainda; contudo, eu não acreditava no direito de dá-lo a outro. Era terrivelmente antiquado. Eu preferiria que ela me escolhesse. — Eu fechei meus olhos e imaginei estar dançando com você, — Audrey Rose disse. Seu olhar verde era hipnotizante conforme ela me puxava para perto, levantando sua cabeça. — Tornava mais fácil… atuar. Eu não acho que seja muito boa nisso. O palco não é lugar para mim. Mas, eu queria tentar. Eu pensei que poderia ajudar essas mulheres. Peças perdidas finalmente fizeram sentido. Ela não estava ficando atraída pelo mestre de cerimônias; ela estava fazendo parecer que sim. Esperança ressurgiu e então quebrou-se contra a costa da minha insegurança. Eu deixei de lado. Ela estava aqui, chegando mais perto, encarando minha boca como se fosse uma obra de arte que ela adoraria estudar. Eu teria que ser um tolo para arruinar tudo ao permitir que a dúvida se instalasse. — Talvez você devesse parar de atuar e aproveitar-se de mim agora.
Ela ergueu uma sobrancelha, fingindo surpresa, mas o rubor agradável em sua pele entregou seus verdadeiros sentimentos. — Atrevido. Eu estendi minha mão, um sorriso genuíno se contraindo em meus lábios. — Minha cara Wadsworth, eu estava falando sobre dançar comigo. No que v ocê estava pensando? — Em beijar você. Eu abri minha boca, um comentário sarcástico na ponta da língua, e então se enfraqueceu. Eu não estava esperando tamanha honestidade bruta. Essa era uma artimanha que eu usava. Seu sorriso era devagar e satisfeito enquanto eu piscava estupidamente. Ela queria me surpreender, e sabia como atingir seu objetivo. Eu não pude evitar senão despencar sob seu feitiço. Ela tocou meus lábios com a ponta dos dedos, o olhar obscurecendo. — Você irá? Meus batimentos cardíacos aceleraram. Eu não queria nada mais do que capturar sua boca com a minha, beijar a incerteza que vagueava nas profundezas do meu coração, dar a ela o carinho que ela merecia. Conforme eu me inclinava para dar a ela tudo pelo qual ela havia pedido, eu farejei o menor indício de álcool. No último momento, eu mudei de ideia. Quando eu beijasse Audrey Rose, eu queria ter certeza de que ela verdadeiramente desejava que eu o fizesse. Intencionalmente enganando-a, eu a puxei para perto de mim, e nós dançamos — perto demais e ainda assim, não perto o suficiente —, enquanto flocos de neve caíam. Nós valsamos pelo convés até que seus olhos se fecharam, e eu a levantei em meus braços e carreguei-a até sua cabine. Coloquei ela debaixo das cobertas e pressionei meus lábios em sua testa. De alguma forma, nossa noite dançando sob as estrelas e neve era mais significativa do que compartilhar sua cama. — Boa noite, Audrey Rose. Ela provavelmente não se lembraria disso pela manhã, mas eu esperava que ela achasse que foi um sonho maravilhoso. Uma memória a qual um dia eu pintaria para que pudesse olhar para trás, distante no futuro e ser preenchido com a mesma sensação de afeto e paz. Em vez de ficar distraído com ciúmes e barganhas que não importavam no final das contas, eu desejava estar prestando mais atenção no pesadelo que estava prestes a se desdobrar.
No curto espaço de quatro dias, ela estaria em meus braços, sangrando. E eu finalmente me tornaria o príncipe das trevas que meu pai sabia que eu seria, me lançando sobre todos.
Palco clássico com fumaça
UM Salão de Jantar RMS Etruria 8 de Janeiro de 1889 Sangue respingava sobre minhas mãos em jorros quentes e ritmados. Por um momento prolongado, eu fiquei inerte, e então meu mundo se reduziu à uma equação. Estéril. Familiar. Calmo. O oposto exato dos meus arredores. O caos reinava no palco, e eu estava semiconsciente de um confronto acontecendo atrás de nós. Jian, o poderoso Cavaleiro de Espadas, se juntara a Mefisto para prender Andreas no chão, mas o cartomante assassino não estava se rendendo tão facilmente. Eu observava enquanto cada um dos artistas do Circo Luz do Luar lutava com ele, libertando tanto sua raiva quanto sua mágoa no homem que havia sacrificado a trupe para executar sua vingança. Uma cólera sombria e efervescente surgiu. Eu nunca havia sido particularmente violento, escolhendo usar meus talentos para deduzir o impossível a fim de acabar com a violência, mas parte de mim queria se juntar à briga e lançar um ataque feroz no homem que investira uma faca em Audrey Rose. Eu também queria vingar cada uma das mulheres inocentes cujas vidas ele roubara — tudo em nome da morte de sua noiva. Eu fitei a faca na perna de Audrey Rose, imaginando como seria cortar a garganta dele com ela. Eu nunca desejei ter o sangue de alguém em minhas mãos antes, mas, agarrando-me à garota que eu amava, seu sangue vital derramando em mim e no chão, eu rezei pela chance de devolver o favor a ele, dez vezes mais. Eu iria estripá-lo enquanto ele ainda respirava e alimentá-lo com suas entranhas. Jack, o Estripador estremeceria com a minha crueldade, a brutalidade com que eu o abriria e estriparia. Andreas conseguiu dar um soco no estômago de Mefisto antes que Jian o dominasse. Ele estava tão perto que eu quase podia agarrá-lo… mas então Audrey Rose soltou um suspiro quieto e engasgado. Eu me voltei para ela. Eu precisava focar. Eu firmei meu maxilar e examinei a ferida. Havia sangue demais, uma indicação de que sua artéria femoral havia sido atingida. Eu não podia arriscar remover a lâmina até que o fluxo de sangue parasse. A faca era provavelmente a única coisa impedindo que ela sangrasse até a morte.
Com isso, um tremor rápido e repentino invadiu meu peito. Pânico. Minha mente se transformou em uma arma estéril e apática. Se eu pensasse na garota deitada sob mim, seus olhos perdendo o foco lentamente, eu seria consumido pelo medo. Se eu permitisse o terror em meu coração, poderia muito bem assinar sua sentença de morte. Logicamente, eu sabia disso; emocionalmente, eu estava falhando. — Wadsworth, — eu disse, forçando uma calma em meu tom que eu mesmo não sentia, — fique aqui. Fique comigo. Ela lutou para olhar para mim, seus olhos reluzindo com um brilho forte. Quando ela finalmente focou no meu rosto, sua expressão se tornou pacífica. Eu queria abrir meu corpo e dar a ela tudo que ela precisava para sobreviver, mesmo se significasse sacrificar meu próprio sangue. — Eu não estou… indo… a lugar nenhum.” Ao longe, eu estava ciente do público correndo de seus lugares e vozes gritando. Mulheres chorando. Um desarranjo de saltos e botas nos chãos de mármore. Portas batendo contra as paredes conforme os passageiros entravam no corredor. Eu apertei minha mandíbula tão forte que escutei um estalo agudo. Olhei de relance para cima enquanto Anishaa, a cuspidora de fogo, jogava uma corda para Mefisto, e Houdini usava seus talentos para prender Andreas. Distrações. — Thomas… — a voz de Wadsworth era fraca. Muito fraca. Uma estranha e violenta onda de emoções ressurgiu, ameaçando me engolir. — Não me deixe. Como se isso fosse possível. — Jamais. Lágrimas caíram sobre ela. Eu estava atônito demais para considerar que eu estava chorando. Ela estava fria. Sangue manchava meus dedos. Eu precisava estancar o sangramento logo, ou ela morreria diante de mim. Seus olhos se fecharam. Por um segundo seu peito parou de subir. Tudo dentro de mim virou gelo. Memórias da perda da minha mãe, observando a vida abandonar suas uma vez brilhantes feições, me acometeram. Eu era muito jovem, muito inexperiente para salvá-la então. Eu não deixaria que a Morte injustamente roubasse alguém que eu amava novamente. Gentilmente, eu coloquei a mão no rosto de Wadsworth. Sem resposta. Meu coração ainda devia estar funcionando, porque eu tive a certeza de sentí-lo partir ao meio. Eu bati em seu rosto de novo, e de novo, e seus olhos nem mesmo piscaram. — Audrey Rose! — Gritei. — Olhe para mim! Eu arranquei minha gravada e apertei sobre sua ferida como um torniquete, com cuidado para não movimentar a faca. Eu tinha que reduzir o
fluxo até que ela fosse levada à enfermaria, e que eu pudesse remover a lâmina em segurança. Se eu continuasse repetindo o que precisava ser feito, talvez eu permanecesse calmo. — Audrey Rose! — Minha voz era feroz. Ela não respondia. A morte era iminente, mas eu batalharia até que me levasse primeiro. — Mefisto! — Gritei, sobressaltando o mestre de cerimônias de onde ele estava, sobre um então dominado Andreas. Ele correu até o meu lado, sua pele marrom clara parecendo pálida atrás de sua máscara. — Chame o Dr. Wadsworth. Agora! Apesar de todos seus defeitos, ele não hesitou. Ele desviou dos passageiros, empurrando e acenando até desaparecer no corredor. Eu desviei para os outros artistas que haviam se juntado em um círculo protetor. Jian e Sebastián guardavam Andreas. Anishaa e Cassie — a trapezista que tinha tentado derrubar um saco de resina em Andreas antes que ele pudesse atacar — caíram de joelhos ao nosso lado. Elas se preocupavam com ela. No tempo que eu estive cozinhando em insegurança, Audrey Rose fizera conexões genuínas enquanto tentava solucionar o mistério. Eu engoli o nó repentino subindo em minha garganta. — Eu preciso de antisséptico, — eu disse. — E uma agulha e linha. Panos limpos e uma vasilha de água morna. Se não pudermos encontrar álcool, o fogo servirá para esterilizar a lâmina. — Anishaa piscou para afastar as lágrimas, e então ela e Cassie reviraram o salão de jantar em busca dos suprimentos. Eu precisaria fazer a cirurgia agora. Aqui. O tempo estava quase acabando. — Fique comigo, Wadsworth. — Eu apertei a mão dela. — Eu seguirei você para além da morte e a arrastarei de volta, se for preciso. — Aqui! — Anishaa correu até parar e me entregou uma agulha e fio. Cassie estava um momento atrás, com um jarro de água e uma garrafa de álcool que ela devia ter furtado das cozinhas. Eu havia me esquecido de que ainda estávamos em um salão de jantar. Eu não entendia como elas tinham se movido tão rápido para adquirir os itens. Medo e amor eram motivadores poderosos. —Eu preciso de fogo, — eu disse, virando para Cassie. — Aqui, coloque o máximo de pressão possível na ferida. — Eu me recusava a deixar meu aperto afrouxar até que Cassie tivesse suas mãos firmemente no lugar. Para o crédito dela, ela nem sequer piscou para o sangue jorrando por entre seus dedos. Seu maxilar estava rígido, seu olhar, determinado. Ela faria o que fosse preciso, independente de quão assustador fosse. — Anishaa, quando eu remover a lâmina, preciso que você jogue álcool na ferida e me dê a agulha e a linha. O Dr. Wadsworth vai chegar logo, e ele assumirá. — Eu
olhei para cima. — Todos sabemos como proceder? Assim que eu tirar a lâmina, será um inferno. — Cassie sacudiu seu olhar para cima. — Já não estamos no inferno? — Verdade o suficiente. — Eu respirei fundo, me firmando. — Um. Dois. Tr- — Thomas. — O Dr. Wadsworth apareceu na minha frente, seu rosto severo. — Permita-me. Parte de mim não confiava nele, não confiava em ninguém com a tarefa impossível. O que era absurdo. Ele havia me ensinado tudo que eu sabia sobre cirurgia. Eu me afastei, esperando por instruções. — Segure a perna dela pelo tornozelo e pela parte superior da coxa, — ele ordenou. Eu fiz como foi dito, tomando o lugar de Cassie. Alguém se moveu ao meu lado e segurou seus tornozelos. Eu foquei em aplicar pressão o suficiente em sua coxa sem machucá-la. O doutor cuidadosamente puxou a faca, assegurando-se de removê-la na mesma direção em que havia entrado. Ele queria causar o mínimo de dano na retirada. O Dr. Wadsworth e eu tínhamos feito muitos treinos em recolocar membros e dedos graças ao nosso trabalho secreto, mas dar pontos em uma artéria se mostraria complicado, até para ele. Se ele errasse, ela poderia sangrar internamente. A lâmina escorregou livre e o sangue jorrou, respingando em meu rosto. O sangue não pulsava em intervalos iguais, indicando que os batimentos delas estavam desacelerando. — Anishaa! — Eu gritei. Sem hesitar, a artista despejou o álcool na ferida, e Cassie lhe entregou um pano úmido. — Umedeça a ferida com água agora! O sangue empoçava rápido demais para que víssemos com clareza. Uma mão pousou no meu ombro, mas eu me recusei a desviar o olhar de minha tarefa. Eu tinha que segurar sua perna firme o suficiente para estancar o sangramento, eu tinha que— — Thomas. — A voz calma do Dr. Wadsworth, porém, era um comando. Eu parei para fitá-lo. — Você pode soltar a perna dela agora. Coloque a haste cauterizadora nas chamas. Eu não queria deixá-la. Parte de mim sentia que se eu deixasse, Audrey Rose escorregaria para sempre de meu aperto. Mas, discutir destruiria a garota que eu amava. Eu balancei minha cabeça em consentimento e me apressei para fazer como havia sido instruído. O doutor tinha muito mais experiência com veias e artérias. Se alguém pudesse salvá-la, seria ele.
As coisas se moviam em um borrão de precisão entremeado com pânico. Eu seguia instruções mecanicamente, alheio a qualquer coisa que não a voz do doutor. Não havia nada além de ciência e determinação agora. Eventualmente, o caos tanto no salão quanto no chão à minha frente se igualaram. O Dr. Wadsworth vociferou para alguém me ajudar a segurar a perna dela firmemente enquanto ele levava a haste até o membro. Eu dificilmente notei quem havia vindo em assistência. O sangue abruptamente cessou. Era como uma torneira sendo fechada. O par de mãos que ajudaram a segurá-la desapareceu. Depois de adicionar mais antisséptico no interior da ferida, o Dr. Wadsworth habilmente costurou a pele junta, acenando para eu aplicar uma pequena quantidade de de adstringente assim que ele terminasse a tarefa. Mefisto surgiu na vista. Seus braços estavam cruzados e sua expressão estava cuidadosamente controlada, mas ele não podia esconder o puxão de sua jugular conforme olhava para Audrey Rose. Eu via o que ele estava tentando esconder — o sangue em suas mãos. Era ele quem havia me ajudado a segurá-la. Por alguma razão, apesar de quão duro ele lutou para chegar ao doutor, aquilo fazia eu querer avançar nele. Ele não tinha direito de se preocupar com alguém que ele tentara ganhar através de um jogo de manipulação. Ele e suas barganhas amaldiçoadas e sua agenda secreta. Eu poderia estrangulá-lo ali mesmo. — O que foi agora? — Ele perguntou, seu tom destituído da provocação habitual. O Dr. Wadsworth empurrou seus óculos no nariz, deixando uma mancha carmesim em seu rosto. Ele respirou fundo, sua expressão abatida e gasta. — Agora nós esperamos e observamos. — Eu parei de imaginar todas as maneiras que eu estrangularia Mefisto com as correntes de Houdini, focando em vez disso na palidez que se agarrava a Audrey Rose como um fantasma indesejado. Julgando pela extensa poça carmesim em torno dela, se ela sobrevivesse pela noite, seria um bendito milagre. Conforme eu me levantava, minhas chances de me tornar um assassino em série — um papel do qual quase todos em Londres já me acusavam — eram muito maiores do que ela abrir os olhos novamente. Naquele momento, se eu queria reconhecer isso ou não, eu entendia, um pouco, como Andreas havia planejado e executado sua vingança. Se Audrey Rose morresse… seria necessário pouco esforço para libertar a besta dentro de mim.
Tendas vaudeville clássicas
DOIS Enfermaria RMS Etruria 9 de Janeiro de 1889 Quase vinte horas sem dormir depois, sons da equipe do navio preparando para atracar quebraram o ritmo dos pensamentos entrando e saindo do meu cérebro enquanto eu sentava vigilante na enfermaria. Várias horas atrás, eu havia exaurido cada medo e agora passava para assuntos triviais. Eu imaginei as tendas que o Circo Luz do Luar tinha montado nos deques de passeio — o que parecia momentos atrás em vez de dois dias — sendo rapidamente desmontadas para um novo público. Uma nova cidade. Nós havíamos finalmente chegado a Nova Iorque, e não conseguia reunir um único grama de excitação. Eu havia sonhado de visitar essa cidade desde que podia me lembrar, deslumbrado pelas promessas de me tornar alguém novo. Reinventar-me. Perseguir sonhos que poderiam parecer estranhos para outros, mas que eram inteiramente possíveis na América. Às vezes, parecia que ninguém mais queria deixar seu passado para trás tanto quanto eu. Nova Iorque era o lugar perfeito para me transformar em quem eu desejasse. Eu não precisava ser o príncipe das trevas que meu pai me acusava de ser, nem estava preso na imagem do estranho, insensível jovem que havia perdido a mãe cedo demais. Aqui, na América, eu podia ser simplesmente Thomas Cresswell. No momento, pensando nas ruas movimentadas e infinitas possibilidades, Nova Iorque possuía pequeno apelo. Qual bem havia em correr do destino quando ele balançava de volta e o acertava na mandíbula, não importava o quê? Eu invejava minha irmã em alguns aspectos. Sua associação com a Ordem do Dragão — um antigo grupo de nobres cavalheiros que procuravam proteger a ordem e seu país de invasores, e cujo nome nosso ancestral Vlad Dracula tomara para si — permitia-lhe a mesma liberdade que eu buscava. Recusando a oferta de me juntar às suas fileiras secretas pode ter sido uma decisão precipitada. Uma da qual eu ainda não conseguia me arrepender. Eu parei de pensar e foquei no aqui e agora. Eu sentava em uma cadeira que alguém havia puxado para perto da cama em algum momento da noite. Ou o professor ou a Liza. Uma eternidade relembrando os fatos mais obscuros, perdida no meu pânico por observar Wadsworth. Nada mais
importava nas primeiras horas. Nada senão desejar que seu corpo se remendasse sozinho, fazendo todos os tipos de promessas para Deus para ela se recuperar. Eu encarei ela com a mesma intensidade agora, observando o suave subir e descer do seu peito. Não era muito, mas ela sobreviveria à noite. Eu entrelacei meus dedos aos dela, engolindo em seco. Sua pele era um tom mais escuro do que o de um cadáver e quase tão frio quanto. Uma lenta e consistente batida vibrou em meu peito. Insistente. Brava. Temerosa. Ela podia nunca acordar, e tudo por me salvar. — Sua corajosa e tola alma. — Eu lutei contra o ardor em meus olhos. — Você devia ter deixado a faca me atingir. — Se ela morresse… Eu juro que eu pegaria a faca que Andreas usara e a enfiaria em seu coração amaldiçoado. — E depois que você o esfaquear, então o quê? — O Dr. Wadsworth perguntou, sua voz áspera. Eu me refreei de me sobressaltar. Eu não havia notado que ele estava parado no quarto. Eu também não havia percebido que dissera a última parte em voz alta. Eu desviei minha atenção para ele, e ele balançou a cabeça. — Você honraria o sacrifício dela sendo trancafiado que nem um cachorro? Você acha que isso a deixaria feliz? Eu não achei que você fosse tão tolo, garoto. — Ela não está morrendo, — eu quase rosnei para ele. Eu não sabia o que estava emergindo de mim, — mas, o monstro que eu havia tentado destruir se fortaleceu, procurando alguém para atacar. Eu contei os segundos tiquetaqueando no relógio, usando a distração para me acalmar. Um momento depois, eu falei, mais suave, — ela não pode morrer. O Dr. Wadsworth caminhou para a beirada da cama, sua expressão afável. — Um dia todos iremos morrer, Thomas. É um destino comum que compartilhamos. Cada um de nós. Eu enrolei meus dedos em punhos. — É um destino que todos devemos compartilhar aos dezessete anos, Professor? Um lampejo de azul-gelo chamou minha atenção. Liza deslizou para dentro do quarto, sua face solene. — Eu ouvi vozes altas e… — Seu olhar disparou para sua prima e sua garganta subiu e desceu conforme ela engolia seu luto. — Você precisa tomar um pouco de ar fresco, Sr. Cresswell? Você não saiu em — Eu a lancei o que eu pensei ser um olhar incrédulo, mas deve ter sido mais feroz. Ela ergueu as mãos. — Era somente uma sugestão. Ela andou para os pés da cama, assistindo atentamente conforme o Dr. Wadsworth checava o pulso de Audrey Rose. Eu havia feito aquilo alguns
momentos antes deles entrarem — ainda estava muito devagar. O doutor tocou seu bigode, um hábito distraído que indicava que ele estava perdido em pensamentos. Eu não precisava usar nenhuma habilidade de raciocínio dedutivo para saber que ele estava preocupado. Além da fratura na perna, Audrey Rose tinha perdido uma quantidade significativa de sangue. Eu me sentei de volta na cadeira. Eu imaginava que eu parecia prestes a pular através do quarto e ferir qualquer intruso indesejado e tentei relaxar. Eu fixei meu olhar na mão ilesa de Liza e ergui minhas sobrancelhas. Com tudo que tinha acontecido no palco durante o finale, eu havia me esquecido da ameaça que Wadsworth tinha recebido. A carta, acompanhada de uma lembrança terrível, era mais uma ilusão lançada pelo artista do Circo Luz do Luar. Outro truque sem sentido e enganador. — Eu não achava que era o seu dedo, — eu disse. — Estava começando a mostrar sinais de rigidez cadavérica. Você não tinha desaparecido tempo o suficiente para isso acontecer. — Que dedo? — Ela franziu o cenho. — Eu não tenho a menor noção do que você quer dizer. Enquanto o Dr. Wadsworth continuava sua inspeção médica, eu rapidamente contei para Liza do dedo cortado que havia sido usado para atrair Audrey Rose. Eu metodicamente expliquei o bilhete, a ameaça, e como havia sido projetada para nos desestabilizar em submissão. Quando eu terminei, ela recostou contra a moldura da porta e levou uma mão à testa. — Pobre Audrey Rose, — ela finalmente disse, parecendo um pouco indisposta. — Eu não consigo imaginar o que ela passou. De quem você imagina que era o dedo? Eu dei de ombros, minha atenção se dispersando para a cama. A respiração de Audrey Rose engasgou antes de suavizar novamente. Eu quase me lancei ao seu lado, mas me segurei. — Outro corpo foi encontrado na área de carga durante o finale. Está faltando um braço inteiro, então é lógico pensar que partes dele foram usadas. Na verdade, eu— — Thomas, — o Dr. Wadsworth avisou. — Basta. Você teve algum sucesso em aplicar o tônico em Audrey Rose? — Mínimo. — Eu me curvei para frente e esfreguei minha testa. — Talvez alguns conta-gotas cheios. — Se ela não se mover logo, teremos que considerar... Eu contei até cem, meu foco convergido para aquela única tarefa. Eu não queria ouvir nada mais, e, eventualmente, eu fui deixado sozinho com a metade moribunda da minha alma.
— Eu admito que, se ela acordar, essa vigília pode pesar a seu favor. Você ao menos dormiu? — Eu olhei para cima bruscamente, ainda me sentindo muito feroz para tolerar qualquer um, ainda mais esse tolo imprudente. — Você é um ser humano desprezível. O mestre de cerimônias ergueu as sobrancelhas. — Você soa como meu pai e meu irmão. Por que, exatamente, eu sou tão terrível, agora? — Você ainda está tentando manipulá-la enquanto ela se agarra à vida. Tudo com o que você se importa é coletar prêmios. Malditos fogos do inferno, você não se importa com o que e la quer. — É mesmo? — Ele bufou. — Eu vim aqui para ver como vocês dois estavam, e isso é uma manipulação. — Ele balançou a cabeça. — Se é assim que você gostaria de ver, eu estou no jogo. Me diga, como é o velho ditado? ‘Ganhando a mão dela’. Ou ‘ganhando afeto dela’ ou… Você é um sujeito inteligente. Você consegue ver um padrão aqui. — O termo operativo que você usou é ‘velho’. Ganhar é um modo arcaico de se ver o amor. O coração dela não é uma rodada barata de cartas. O amor não é um jogo. É uma escolha. Um sorriso vagaroso se espalhou por seu rosto. — Cuidado, agora, Sr. Cresswell. Sua inexperiência está aparecendo. As mulheres gostam de serem perseguidas. Isso as excita. — Eu não vou argumentar sobre algo tão ridículo aqui, agora. — Eu estiquei minha mão, acariciando uma mecha úmida de cabelo do rosto dela. — Se você realmente a ama, ou tem afeto por ela, por que não tentar ser honesto? — Eu voltei minha atenção para ele. — Eu lhe direi por que. Porque você teme que ninguém amará o homem por trás da máscara. Então você recorre a trapaças e ilusões. Você exerce manipulações e chama isso de romance. Fazer com que alguém caia com você nos lençóis não é nada para se gabar. É você quem é terrivelmente inexperiente com cortejo e amor. Por que você não iria querer alguém que entenda o verdadeiro você? Ele firmou o maxilar, olhar firme. — O que o faz pensar que ela não conhece o verdadeiro eu? Eu bufei então, não me dignando a responder. Ele esperou mais de uma semana para confessá-la seu verdadeiro nome. Eu não poderia me imaginar me escondendo do mundo mais literal e figurativamente. — De todos os modos, conquiste-a se você sente real afeto, — eu disse. — Mas, faça isso como um homem digno de receber seu amor. Sem artimanhas. Sem ilusões. Livre-se de suas mentiras e seja vulnerável. E se você não pode fazê-lo? Você não a merece.
Ele pareceu considerar minhas palavras. Algo que eu não esperava cruzou suas feições — arrependimento. — Você deve se considerar muito corajoso. Devo encontrar um cavalo branco brilhante para você cavalgar? Eu lhe dei um olhar frio. — Isso não é um conto de fadas. Eu não sou um cavaleiro protetor, ou algum príncipe moralmente íntegro. — Se você se proclamasse um ou outro, eu saberia de algo, com certeza. — E o que seria? — Que você é um vilão e um mentiroso. Tal qual eu. Nós ficamos em silêncio após aquilo. Ele se moveu para o outro lado da cama, olhando para ela. Era difícil decifrar a nova expressão em seu rosto. Eu não sabia se ele estava, de fato, arrependido de suas ações, ou se ele se arrependia de não as esconder melhor. — Você nunca se cansa de ser tão admirável? — Ele perguntou. — É um modo tão tedioso de viver. Correndo por aí, salvando donzelas em perigo. — Se você acha que a parte admirável é fácil, ou vem naturalmente, você é mais ingênuo do que eu pensei, — eu disse, em um raro momento de verdade para com ele. — Eu luto contra meu egoísmo inerente porque eu a amo. Eu quero ser melhor não somente para ela, mas também para mim mesmo. Eu quero ser o tipo de homem que ganha a confiança e o amor dela, e então luta para manter-se evoluindo em uma pessoa ainda melhor. Mefisto me encarou como se eu tivesse acabado de destravar um dos segredos mais estimados do universo. Ele limpou sua expressão não muito depois, como se ele não pretendesse expôr tanta vulnerabilidade, mas eu vi mesmo assim. Talvez ele ficasse melhor, agora que sabia melhor. Audrey Rose se mexeu, e o restante da luta esvaiu-se de mim. Mefisto não importava. Sua tentativa de cortejá-la não importava. Ele não era nada comparado às distâncias que eu iria apenas para vê-la segura e feliz. — E ela dificilmente precisa de um cavaleiro para salvá-la. Ela é mais provável de aparecer e salvá-lo, e então bater em você por ser um idiota, — eu disse, enfim olhando para cima. Mas, o mestre de cerimônias havia desaparecido mais uma vez.
Mãos de um prisioneiro
TRÊS Enfermaria RMS Etruria 9 de Janeiro de 1889 — Thomas. — Sim, Dr. Wadsworth? — Eu não tirei minha atenção de Audrey Rose. Sua respiração estava ficando cada vez mais uniforme. A última vez que eu chequei o seu pulso, quatro mil, trezentos e setenta e oito segundos atrás, também apresentou melhoras. Ela estava lutando de volta. — Você é requisitado para falar com Andreas, — ele disse. Antes que eu pudesse argumentar, ele continuou, — Liza está esperando no corredor, e ficará com Audrey Rose enquanto estivermos fora. — Eu... — Eu queria ser a primeira pessoa que ela veria ao acordar, mas era um desejo egoísta. Eu precisava ajudar a interrogar o homem responsável pelas brutais matanças que estivemos investigando. E pelo quase assassinato de Wadsworth. Eu pressionei um beijo casto em sua mão e então segui o doutor em direção ao corredor. Meus músculos doíam. Eu percebi que não havia me movido por horas. Nós viajamos para dentro do navio, para além das salas que continham os caixotes do Circo, mais fundo ainda do que a sala de máquinas. Nós passamos por membros da equipe que rolavam carrinhos de bagagem pelo corredor, de onde seriam indubitavelmente enviados para hotéis e casas ricas. Quando chegamos à prisão, eu esperei que fosse algum tipo semelhante à uma masmorra suja. Mas, na verdade, era uma pequena cela com barras e um cântaro de água e um copo, uma cama pequena, um balde para dejetos, e um decente travesseiro e cobertor. Andreas se esparramou na cama, sem a máscara do Circo. Ele apoiou sua cabeça loira em uma mão pálida e nos olhou quando entramos no espaço. — E então? — Ele perguntando, soando entediado. Aparentemente, não éramos tão divertidos para um assassino. — O que querem agora? Eu cruzei meus braços para evitar alcançar através das barras e estrangulá-lo. — Conte-me sobre o corpo no caixote. — Ele deu de ombros e caiu de volta na cama.
— O que tem ele? Eu não te disse por que exatamente eu escolhi essas vítimas? Ou você estava muito ocupado chorando sobre a sua mulher morta para se lembrar dos detalhes? Eu bati nas barras, o metal retinindo. O Dr. Wadsworth tocou meu braço, mas eu o afastei. Eu respirei fundo, afastando minha raiva. Eu não o deixaria me abalar. De novo. — Eu me lembro de que você é um covarde. Você foi vítima de circunstâncias infelizes, e em vez de levar seu luto ao tribunal, você decidiu matar e mutilar mulheres inocentes. Você não teve coragem para lutar contra os homens que você julgava culpados pela morte de sua noiva. — Eu sorri conforme ele deslizava para fora da cama, sua face se avermelhando em um tom doentio, e seus punhos se cerrando. — Acredito que isso cubra a maior parte. Agora, responda a minha pergunta. O corpo no caixote era diferente. Explique como você executou aquela vítima. Ele caminhou para o jarro e se serviu de um copo de água, zombando de mim o tempo inteiro. Eu sorri de volta. Não era eu que estava preso em uma jaula. E ele deveria desejar não ter a má sorte de cruzar o meu caminho enquanto ele não estivesse em segurança atrás das barras. — Eu a cortei, assim como as outras. — E o caixote? — Eu perguntei, o observando atentamente. Ele estava mentindo. Estranho que ele ocultasse a verdade, quando ele estava sendo tão orgulhoso em compartilhá-la mais cedo. — Por que depositar o corpo dela lá? Ele encarou a água, sem encontrar meu olhar. Outro sinal de desonestidade. Eu havia interrogado múltiplos homens culpados, e quase todos tinham dificuldade de manter o olhar. — Eu iria… — Ele esfregou a mão pelo rosto. — Eu não sei. Eu não me lembro de fazer aquilo, mas se tem um corpo, eu devo tê-lo feito. — Por que você roubou os pedaços de tecido dos quartos? — Perguntei, estreitando meus olhos. Seu olhar recaiu para a esquerda antes de responder. Outra mentira. — Eu não roubei. — Mentira, — eu disse, satisfeito quando ele fez uma careta para mim. — Por que pegá-los? Eles tinham significado para você? — Não, — ele disse, admitindo a verdade, por fim. Ele suspirou. — Eles não significavam nada. Eu apenas… peguei eles. Eu gostava de como eles pareciam. Eu—Eu queria fazer um traje com eles para o show. Ele se lançou em uma história sobre pequenos roubos na Bavária, e como isso foi o catalisador para que ele se juntasse ao Circo Luz do Luar. Eu o examinei à procura de algum de seus hábitos de quando ele mentia. Ele
não mostrou sinais deles. Quando ele terminou, eu apontei com o queixo para o Dr. Wadsworth. Se ele não tivesse mais questões, eu havia terminado. Andreas não matara a pessoa encontrada no caixote, o que significava que tínhamos um problema maior em mãos. Nós estávamos subindo as escadas para o andar superior quando eu finalmente falei. — Há um segundo assassino neste navio, Professor. E seu método é— — Não. — Seu tom não admitia mais argumentos. — Eu já conversei com o capitão, e ele se recusa a admitir a possibilidade. Eu mencionei o fato para a polícia, e eles pareciam mais entretidos do que preocupados. Inspirei profundamente conforme nós chegamos ao andar superior do navio e continuamos pelo corredor sombrio. Eu não estava surpreso — ninguém queria acreditar que outro Jack, o Estripador, era possível. Especialmente na cidade deles, e no despertar de outra tragédia indescritível. Ao virarmos a esquina, passando pela câmara que guardava os caixotes do Circo Luz do Luar, Mefisto surgiu no corredor e gesticulou para mim. Que maravilha. Outra oportunidade para cometer um homicídio antes do dia acabar. O Dr. Wadsworth parou, alternando o olhar entre mim e o mestre de cerimônias, silenciosamente urgindo para que eu agisse como um cavalheiro apropriado, e não acabasse em uma cela ao lado de Andreas. Era o pedido mais cruel que ele já havia feito, mas eu inclinei minha cabeça, em concordância. — Eu estive pensando na nossa conversa, — Mefisto disso, cruzando seus braços assim que o doutor estava longe o suficiente para não escutar. O traje dele naquele dia era uma cor escura de berinjela, com franjas prateadas. Era horrível. — Eu… É possível que eu tenha deturpado a situação um pouco. — Eu o encarei até ele suspirar. — Eu normalmente sou consumido por fazer barganhas, e desempenhar um papel para as pessoas, Eu... — ele exalou, e mesmo com sua estúpida máscara, eu vi a verdadeira pessoa por trás dos artifícios e jogos. — Eu nunca deveria ter feito aquela barganha com ela, sabendo que ela estava apaixonada por você. Eu deveria ter sido decente e a ajudado de qualquer forma, sem amarras. Era mais do que eu esperava. À contragosto, eu o respeitava um pouco mais. — Quais, exatamente, foram os termos que você ofereceu? — Eu a ensinaria truques de mão, e garantiria acesso aos artistas, para que ela pudesse descobrir se o assassino era ou não um dos meus. — Ele estendeu uma mão, e roçou as unhas no peito. — Eu também posso ter
adoçado a proposta ao prometer separar a Liza e o Houdini. Outra manipulação deplorável, mas eu a justifiquei pelo bem maior que iria fazer. A Liza precisava voltar para casa e para sua família; essa vida do Circo não é para ela. Por mais que eu respeite o Houdini, eu não queria vê-la jogar sua vida fora. — E, em troca, você ganhou o quê, exatamente? Acesso a Audrey Rose? — Eu estreitei meus olhos, analisando-o rapidamente. — Ah, você verdadeiramente queria que ela resolvesse o mistério, não queria? Ele me deu um sorriso preguiçoso. — Eu queria, é claro. E não machucava que eu desesperadamente queria beijá-la. Eu me comportei mal. Eu não repetirei aquele ato novamente. — Ele ficou ereto, e balançou dois bilhetes do nada. — Para você e a Srta. Wadsworth. Caso vocês decidam algum dia visitar o show novamente, por favor, o façam sem cobranças. Eu prometo, sem assassinatos, sem barganhas desagradáveis. Eu ofereço somente amizade de agora em diante. Para ambos. Eu peguei os bilhetes e os enfiei no meu casaco. — A Audrey Rose ainda está… — Eu não consegui me fazer falar. — Você irá esperar e dizer adeus? Ele tirou a máscara e a jogou para dentro do quarto. Sem ela, ele parecia muito próximo da minha própria idade. Talvez alguns meses mais velho. Eu ponderei sobre o caminho que sua vida havia tomado, os problemas que ele deve ter enfrentado para perder seu senso moral enquanto ainda jovem. Ele e eu não éramos tão diferentes. Talvez pudéssemos ser cordiais um dia. Ele certamente parecia tão solitário quanto eu havia sido. — Eu acho que é melhor se você transmitir meus cumprimentos a ela, — ele disse, finalmente encontrando meu olhar. — Se serve de alguma coisa, eu sinto muito por qualquer mágoa que eu causei a você, Sr. Cresswell. Embora seu discurso precise de melhorias, — falou, seu sorriso se assentando de volta no lugar, — eu aprecio sua sinceridade. Se você necessitar da minha ajuda no futuro, gostaria de oferecê-la.
QUATRO Enfermaria RMS Etruria 9 de Janeiro de 1889 Em um momento eu estava perdido em pensamentos desoladores, me culpando pelo que havia acontecido com Audrey Rose, e no seguinte, suas pálpebras estavam tremeluzindo. Levou um momento para que ela abrisse seus olhos totalmente, e ela soltou um som assustado quando eu me inclinei sobre a cama e peguei a sua mão. Sua expressão se iluminou tanto quanto podia, e então, rapidamente se dissipou conforme seu olhar vagava sobre mim. Eu sabia como eu estava. Olhos avermelhados. Cabelo bagunçado. Expressão selvagem. Tinham sido as vinte e quatro horas mais longas de minha vida. — Eu pensei… — Eu segurei sua mão como se a força disso fosse mantê-la ali, naquele quarto e naquele mundo, pela eternidade. — Eu pensei que havia te perdido para sempre, Wadsworth. No que diabos você estava pensando? Ela juntou as sobrancelhas, aparentemente se esforçando para se lembrar dos eventos do último dia e meio. — O que aconteceu? Você quase se matou por mim. Você levou uma facada no fêmur. Você quase arrancou meu coração do meu peito enquanto você estava morrendo. Eu respirei fundo. — Além de você correr para me salvar da morte certa? Levar uma facada precariamente perto da sua artéria femoral? — Eu balancei a cabeça, me recompondo. Agora não era hora de ficar chateado com atos tolos. Eu fixei meu maxilar. — A lâmina entrou tão profundamente que acertou o osso, Audrey Rose. O seu tio foi capaz de removê-la enquanto eu e Mefistoféles a segurávamos, mas não podemos ter certeza do quanto do osso foi fraturado. Até agora, não acreditamos que esteja estilhaçado. Ela recuou. Eu cerrei meus dentes, adivinhando que a dor dela havia reaparecido com a menção. Minha mãe comumente reclamava de dores e pontadas, e sua expressão era semelhante. Eu daria qualquer coisa para tirá-la dela, para voltar no tempo e pará-la de ser minha heroína às suas custas. — Parece que todos estiveram ocupados, — ela disse, tentando aliviar o clima. — Que dia é hoje?
— Você ficou apagada por apenas uma noite. Nós chegamos ao porto em Nova Iorque. — Eu queria dizer mais. Contar a ela o quão desesperadamente fora de controle eu me senti, como minhas emoções quase roubaram todo senso de razão e lógica, mas em vez disso, eu me concentrei em desenhar pequenos círculos em sua mão. O movimento me acalmou quase tanto quanto pareceu acalmá-la. — Andreas confessou tudo. Ela ficou quieta por um momento. — Até mesmo o corpo encontrado no caixote? Eu assenti. — Ele explicou por que aquela vítima era diferente das demais? Eu foquei na manga do seu robe, enrolando o tecido em seus pulsos. Talvez fosse a hora errada para discutir assuntos estressantes. Ela havia acabado de acordar depois de vinte e quatro horas inconsciente. Eu era verdadeiramente um tolo que não sabia nada sobre as pessoas. — Thomas? — Ela perguntou, sua voz suave. — Eu estou bem. Você não precisa me tratar como se eu fosse feita de porcelana agora. Como se ela não fosse a pessoa mais corajosa ou forte que eu conhecia. — Não é você, — eu disse, suspirando. Nunca era a hora certa para discutir assassínio, mas Audrey Rose podia lidar com o que eu diria em seguida. Mesmo que eu não estivesse totalmente pronto. — Quando nós perguntamos ao Andreas sobre aquele crime, ele alegou não ter conhecimento dele. Ele estava na prisão até os detetive-inspetores virem buscá-lo. Eles não têm certeza de onde ele será julgado ainda, já que a maioria dos crimes ocorreu no mar. Talvez precisemos voltar à Inglaterra. Ela me encarou como se não conseguisse entender totalmente a complicação. Embora, talvez ela estivesse começando a perceber surgir o mesmo padrão que eu estava vendo. — Mas, por que ele não teria confessado pelo— — Eu e o seu tio acreditamos que é possível que tenha havido um segundo assassino à bordo, — eu disse, expondo o fato com rápida precisão. Às vezes, um corte preciso era o mais gentil. — Os passageiros já começaram a desembarcar, e se o Andreas não cometeu aquele assassinato, então— — Então nós acabamos de entregar um assassino inspirado no Estripador para a América. Seus olhos se arregalaram conforme a compreensão se assentava. Nenhum de nós falou. Eu podia somente imaginar os pensamentos passando por sua mente, os medos. As memórias acerca de seu irmão, das quais ela tentava tanto escapar.
Eu tinha passado boa parte das últimas horas tentando encontrar outro cenário possível, mas falhei. Na verdade, quanto mais eu contemplava as cenas dos crimes, quanto mais eu me concentrava nos detalhes, mais claro ficava que era precisamente o que havia acontecido. Eu tinha poucas dúvidas de que um Estripador Americano estava perambulando pelas ruas de Nova Iorque naquele exato momento. — Por enquanto, — eu falei, — vamos esperar estarmos errados, e que Andreas estava simplesmente se sentindo pouco cooperativo. Wadsworth saiu de seu devaneio e encontrou meu olhar. Ela sabia que era uma mentira, mas não insistiu no assunto. Talvez nós dois quiséssemos ficar perdidos no faz de conta que o Circo Luz do Luar havia trazido para nossas vidas. Ao menos, por enquanto. — Foi ele quem roubou o tecido? — Ela perguntou. — Ou foi um crime não relacionado? — Ele admitiu o roubo, aparentemente ele é um ladrãozinho quando não está matando por vingança. É um hábito antigo que ele trouxe consigo da Bavária. Ele costumava roubar roupas das pessoas para quem ele lia a sorte. Uma mulher reconheceu uma peça de roupa desaparecida e denunciou para a polícia, por isso ele foi embora e se juntou ao Circo. — Falando nisso… O que aconteceu com o Circo Luz do Luar? — Ela hesitou por um instante. — Como estão Mefistoféles e Houdini? — Ambos se despediram de você. — Eu estava impressionado com quão calma minha voz soava, embora meu coração fosse outro caso. Eu mantive minha expressão neutra, conforme eu a analisava por sinais de decepção. Eu acreditava que Mefisto deveria ser mandado para o outro lado do continente até que ele lidasse com seus problemas, mas se ela estivesse triste por sua ausência… — Mefisto manda suas desculpas, e dois bilhetes para a próxima apresentação, de graça. — Seu sorriso era difícil de decifrar. — Ele e Houdini disseram que não iríamos querer perder o que eles estão fazendo, vai ser— — Espetacular? — Ela completou, aquele mesmo olhar sarcástico em seu rosto. Eu não tinha ideia se ela estava mascarando alguma tristeza, ou se ela estava realmente bem com a rápida partida do mestre de cerimônias, mas eu ri, de qualquer maneira. — Para o bem deles, eu espero que sim. Eles precisam encontrar algo para abafar os múltiplos assassinatos cometidos pelo famoso cartomante. Embora, conhecendo Mefisto, sei que ele encontrará um jeito de trabalhar com isso. A infâmia atrai a maioria. Todos somos fascinados pelo macabro. Deve ser nossas sombrias e perturbadoras almas humanas.
— Estou feliz que tenha acabado, — ela disse. — Eu sinceramente espero que as famílias estejam em paz. Eu assenti, mas ela estava perdida em seus pensamentos privados, me levando a pensar novamente o quanto ela poderia ter desejado escolher um caminho diferente para si mesma. — Liza! — Ela se impulsionou para frente, estremecendo, e então caiu para trás, tirando-me de minhas preocupações. — Onde ela está? Ela está bem? Por favor, por favor me diga que ela está viva. Eu não posso aguentar isso. Eu fiz menção para ela se inclinar para frente e ajeitei os travesseiros para apoiá-la melhor. Eu gentilmente a empurrei de volta, não encontrando resistência conforme ela deitava contra eles. Um pouco da tensão diminuiu as linhas de rugas em volta de sua boca. — Ela está bem. Andreas a drogou e a acorrentou em sua cabine. Mas, ela está se recuperando. Muito mais rápido do que você. Ela soltou a respiração, afundando ainda mais contra os travesseiros. — Não estou preocupada comigo. Claro que ela não estava. Ela nunca se preocupava consigo mesma. Eu contei até vinte. — Mas, eu estou. Tem algo mais que você deveria saber… sobre o seu ferimento. — Eu preferiria ser largado sobre brasas quentes do que dar as notícias. Eu encarei minhas mãos inúteis. Eu estivera atado e incapaz de bloquear a maldita faca. — Você será capaz de andar, embora seja possível que manque permanentemente. Não há como determinar como vai se curar. E eu temia que fosse lembrá-la permanentemente da terrível decisão que ela havia tomado. Uma súbita e avassaladora culpa emergiu em mim. Eu a sufoquei. O ar parecia ter engrossado. Eu puxei meu colarinho, tentando aliviar o medo que continuava enfiando suas garras em minha garganta. Talvez ela sempre associasse minha presença à sua ferida. Talvez a mera visão de mim fosse perturbadora. Minha vida começou e terminou nos poucos batimentos até ela responder. Ela sorriu timidamente. — O amor não sai barato, — ela disse. — Mas, o custo vale a pena. Eu pulei do meu assento, incapaz de manter minhas emoções sob controle, e soltei suas mãos. Se eu não saísse agora, eu apenas tornaria isso mais difícil. O amor não deveria nunca custar algo a alguém. Deveria ser uma troca gratuita. O que havia acontecido — ela quase se destruiu por mim. Eu não valia tudo isso. — Você deve descansar agora. — Eu não conseguia encontrar seu olhar verde e inquisidor, embora eu os tenha sentindo em mim como um
golpe físico. — O seu tio estará aqui em breve para discutir os preparativos da viagem. E eu sei que Liza tem pisoteado do lado de fora, também. Eu me movi rapidamente pelo quarto, antes que eu perdesse a coragem de fazê-lo. — Thomas… — Ela falou, a voz suave e magoada. — O que- — Descanse, Wadsworth. Eu irei retornar logo. Eu peguei meu chapéu e sobretudo, precisando ficar lá fora com o vento frio limpando meus pensamentos. Foi preciso toda a minha força de vontade, mas eu consegui sair do quarto sem voltar atrás. Ela precisava se livrar de mim — eu era como uma toxina vagarosa, a corrompendo lentamente com o tempo. Ir embora era a ação mais altruísta que eu já havia feito, e eu me senti miserável.
Punho de dragão
CINCO Convés superior da primeira classe RMS Etruria 9 de Janeiro de 1889 Eu agarrei o corrimão, ignorando a pontada da temperatura quase congelante do metal, e me concentrei em contar cada passageiro que desembarcava. Eu havia contado até cinquenta e dois antes de olhar de relance para Audrey Rose. Sua atenção estava teimosamente fixada na multidão abaixo, o músculo em sua mandíbula tão tenso quanto sua postura. Eu queria envolvê-la em meus braços e me pressionar contra ela, inalando seu perfume floral e beijando-a até que ela retornasse daquele lugar frio e distante para o qual ela havia se retirado. Mas, eu queria que ela escolhesse seu caminho — Mefisto ou eu — sem interferência. Mesmo que isso me matasse. Ela prendeu a respiração, e a minha decisão de lhe dar espaço se dissolveu. — Eu estarei com você em breve, Wadsworth. Você nem perceberá que eu estou longe. Eu me mantive parado, esperando para ela negar. Chamar-me de tolo. Exigir que eu ficasse. Ela não o fez. Em vez, — É isso? É tudo que você tem a dizer? — O fato é que sou necessário aqui, em Nova Iorque, como o representante do seu tio. — Eu respirei fundo e me forcei a continuar encarando os passageiros. Eu precisava deixá-los ir. — Eu me juntarei a você assim que puder. Com o canto do olho, eu vi uma lágrima rolar em sua bochecha. Minha decisão vacilou. Furiosamente, ela a limpou, deixando-me para adivinhar suas emoções exatas. — Você não deveria dizer algo como ‘Eu sentirei sua falta terrivelmente, Wadsworth. As próximas semanas serão uma tortura lenta, estou certo disso.’ Ou alguma outra esperteza do Cresswell? A batalha que eu vinha lutando cessou. Eu a encarei, tentando meu melhor para manter minhas emoções sob controle. — Claro que irei sentir sua falta. Será como se meu coração estivesse sendo cirurgicamente arrancado de meu peito contra a minha vontade. —
Eu respirei fundo novamente. — Eu preferiria ser apunhalado com todas as espadas no arsenal de Jian. Mas, isso é o melhor para o caso. Se eu repetisse isso o suficiente, eu talvez acreditasse logo. A expressão esperançosa em seu rosto desapareceu. Eu não estava certo se a imagem de uma lâmina tão cedo após seu ferimento ou a menção do caso a irritara. — Então eu te desejo bem, Sr. Cresswell. — Sua voz era cortante. A agudeza cortou meu coração dolorido. — Você está certo. Ficar chateada é bobagem quando nos encontraremos de novo em breve. Eu queria alcançá-la. Puxá-la para os meus braços e lutar por seu amor. Mas, fazer isso seria ir de encontro a tudo que eu prometi a ela antes. Eu não a manipularia de qualquer maneira. Uma sensação estranha se assentou em meu centro, porém, atingindo minha consciência. Algo não estava parecendo certo — eu não conseguia escapar da preocupação de que eu havia perdido algo importante. Eu hesitei, repassando os últimos momentos em minha mente, tentando decifrar cada nuance de sua expressão, cada mudança de tom. Eu tinha que estar deixando algo passar— — Sr. Cresswell? — Um detetive educadamente limpou a garganta, destruindo o restante do nosso tempo juntos. Eu não conseguia evitar, senão sentir que eu estava perto de desvendar algo importante e escondi minha irritação. Eu desviei meu olhar de Audrey Rose e o afirmei. — Nós estamos colocando os corpos em terra, agora. Requisitamos sua presença a caminho do hospital. Parte de mim queria dizer a ele para prosseguir sem mim. Eu precisava de mais um momento para resolver isso. Exceto que eu não estava certo de que outro momento teria importância. Eu não conseguia me forçar a perguntar a Audrey Rose se ela desejava prosseguir com um cortejo com Mefistoféles. E eu não pensava que outros sessenta segundos me ajudariam a resolver o enigma de seu humor sombrio. O policial educadamente esperou. Eu assenti, o movimento parecendo mecânico enquanto minha mente girava em outras direções. — Claro, — eu me ouvi concordar. — Estou ao seu dispôr. O detetive sorriu para Audrey Rose e desapareceu pela porta novamente. Eu não conseguia me forçar a desviar o olhar. Eu não queria ser confrontado com a realidade de nossa situação. Eu estava em território perigoso — um pequeno indício de desapontá-la, e eu nunca seria capaz de continuar indo embora. Eu desliguei todas as emoções, congelando aquele
calor ardente em meu núcleo. Não seria eu quem dificultaria as coisas para ela. Ela tinha todo o direito de escolher seu próprio caminho. E eu tinha todo o direito de me fechar e me proteger da mágoa. — Adeus, senhorita Wadsworth. — Eu senti minha compostura quebrar, junto com meu coração. — Foi um absoluto prazer. Até nos encontrarmos novamente. Eu precisava me mover rapidamente, mas eu não conseguia me forçar a agir. Havia um senso avassalador de injustiça, mas eu não tinha ideia se era o monstro dentro de mim, irado por perder esta batalha. Eu abaixei a ponta do chapéu, desesperado para roubar mais um segundo, e então obriguei minhas pernas a se moverem. Eu não sabia pelo que eu esperava — talvez que ela chorasse e me xingasse ou bloqueasse meu caminho. Que ela me dissesse que eu era um tolo e então me beijaria até ambos recuperarmos nossos sentidos. Eu percebi que minha hesitação era esperança. Esperança de que ela fosse fazer qualquer uma dessas coisas. Mas, ela não fez. Eu desafiei um último olhar para ela conforme eu passava. Ela assentiu, lábios franzidos. Não haveria declarações devastadoras de amor. Ela estava me deixando ir. A realidade colidiu em mim, e eu lutei contra uma agitação crescente em meu estômago. Eu me movi para frente de novo, parando no batente da porta. Meus dedos tamborilavam um ritmo picado familiar. Um, dois, três, um, dois, três. Egoísmo. Essa era parte do monstro me zombando. Eu não me sujeitaria àquele monstro. Não por ela, não por ninguém. Eu me forcei em direção ao corredor e corri as escadas abaixo, meu pulso batendo no ritmo em que meus sapatos acertavam os degraus. Se eu corresse rápido o suficiente, talvez eu descobrisse a fórmula para escapar de um coração partido. Eu cheguei até às docas antes de perceber o quão tolo eu era. O amor era nobre. Mas, era também um guerreiro. Não desistia e fugia. Não se rendia para um cretino pomposo em trajes de lantejoula e morais decadentes. Eu seria o pior tipo de parceiro se eu não lutasse contra alguém assim. Dizer a Wadsworth o quanto eu a amava não era, de modo algum, egoísta. Pelo contrário. O oficial acenou com uma mão na frente do meu rosto. — A delegacia fica logo- — Eu tenho um assunto urgente para tratar, — eu disse, nem um pouco arrependido por interrompê-lo. — Eu te encontrarei no necrotério em duas horas. Em vez de esperar por uma respostas, eu praticamente corri em torno do quarteirão, movendo-me tão rapidamente quanto as ruas lotadas
permitiam. Carruagens retumbando sobre os paralelepípedos, mulheres usando boinas, e homens vestindo ternos elegantes passavam. Eu rapidamente examinei as lojas, lembrando que Lorde Crenshaw mencionara uma loja nessa vizinhança que fazia algo do qual eu precisava. Três portas para baixo, eu encontrei. Raising Cane[2]. Um estranho trocadilho bíblico, porém inteligente. Um sino tocou acima quando eu abri a porta. Um homem tão enrugado quanto a madeira a qual ele talhava me olhou de cima a baixo. — Em que posso ajudar? Eu olhei em volta do pequeno recinto. Bengalas com punhos modelados em formato de serpentes, águias, grandes animais como leões e elefantes — e uma deslumbrante rosa de ébano. Eu a tirei da prateleira e me dirigi ao velho senhor. — Eu preciso de uma bengala personalizada como essa. Eu gostaria de um punho de cabeça de dragão. Em madeira de jacarandá, se for possível. O homem assentiu e pegou em mãos um caderno esfarrapado, tirando um lápis de trás de sua orelha. — Qual a sua altura? Eu juntei minhas sobrancelhas. — Um pouco mais de cento e oitenta e seis centímetros. O homem revirou os olhos. — Em inglês, garoto. Eu não me incomodei em apontar que eu estava dando a medida inglesa. Eu fiz um breve cálculo. — Seis pés e uma polegada. Mas, a bengala não é para mim, — eu acrescentei, abaixando minha mão para a medida correta. — É para alguém que tem cerca de — eu mentalmente fiz a conversão — cinco pés e cinco polegadas. — Ok. — O homem aquiesceu. — Sua mulher? Eu abri a boca, pronto para lançar uma prédica de razões pelas quais aquela frase era ofensiva, mas suspirei. — Minha parceira. Ela foi ferida em uma luta de facas. Ele parecia estranhamente impressionado conforme ele voltava para o bloco de notas. Enquanto ele fazia anotações, eu perambulei pelo recinto, inspecionando o artesanato de suas bengalas. Todas eram lindas. Ele tossiu e me chamou de volta. — O que acha disso? Ele virou o bloco de notas, me mostrando um breve rascunho do projeto. Era quase perfeito.
— Posso? — Perguntei, apontando para o lápis. Ele balançou a cabeça e me entregou. Enrolei o corpo do dragão na parte superior da bengala. Então, adicionei dois rubis no lugar dos olhos. Minha homenagem ao meu dragão preferido em nossa casa romena — Henri. Eu rabisquei uma lâmina estilo estilete no outro oposto, e então virei o caderno de volta. — Você consegue confeccionar de modo que apertando o olho de rubi, uma lâmina escondida seja liberada? Ele franziu o cenho, considerando. — Ela estará entrando em outra luta de facas? Eu pensei a respeito durante uma fração de segundo. — Tudo é possível. — Eu sorri ironicamente. — Você consegue fazer? — Claro que consigo, garoto. — Ele pareceu levemente insultado. — Mas, Roma não foi construída em um dia. Me dê uma ou duas semanas. Eu paguei pela bengala de punho de flor e deixei um depósito e um endereço para entrega da customizada. O jacarandá era um tributo a minha mãe, e o dragão, um reconhecimento a minha ascendência Drácula. Eu esperava que Audrey Rose não se importasse em portar um símbolo da minha família — porque eu sinceramente esperava que ela concordasse em se tornar parte dela. Meu trabalho completo, eu saí da loja e corri de volta para o Etruria, esperando não estar atrasado demais para dizer à garota que eu amava o quanto ela significava para mim.
SEIS Convés superior da primeira classe RMS Etruria 9 de Janeiro de 1889 — Mas, e se ele estiver indo embora por causa do acidente? — A voz de Audrey Rose soava tão frágil. Foi preciso uma grande quantidade de esforço para me segurar conforme eu me aproximava por trás dela. Como ela podia temer aquilo? Eu engoli o nó em minha garganta, e Liza finalmente me notou por cima do ombro da prima. Seus olhos se arregalaram levemente. Eu levei um dedo aos meus lábios, esperando que ela não revelasse minha presença ainda. — E se ele— — Com licença, — Liza disse, indicando para o extremo oposto do navio. — Eu acho que vi a Sra. Harvey acenando de lá. Eu devo ir até ela imediatamente. Eu sufoquei minha risada. Liza era muitas coisas, mas uma atriz não era seu melhor talento. — Sério? — Audrey Rose esfregou seu rosto e, mesmo sem ver sua expressão, eu podia imaginar o quão irritada ela estava. Parte de mim queria abraçá-la, e a outra parte queria rir. Naquele exato momento, ela se virou, a irritação proeminente em suas expressões, até que seu olhar encontrou o meu. Ela piscou, como se incerta de que eu era real, e então lentamente balançou a cabeça para a figura da prima em retirada. Uma lágrima rolou por sua face. Seguida de outra. Qualquer piada com a qual eu a deslumbraria me abandonou enquanto eu tentava solucionar a causa de suas lágrimas. Era difícil decifrar se ela estava satisfeita, ou brava com a minha chegada súbita. — Cresswell. — Seu queixo se ergueu, e meu maléfico coração vibrou. — Eu achei que você tivesse negócios a tratar. Seu tom estava misturado com uma raiva a qual eu não antecipara. — Eu tinha. Você vê, eu acabei por perguntar ao Lorde Crenshaw onde ele havia mandado fazer tão linda bengala, quando eu e seu tio conduzimos nosso interrogatório final. Imagine a minha surpresa quando ele disse que a comprara aqui, em Nova Iorque. Há uma loja no final do quarteirão, na verdade. — A distância entre nós era insuportável. Eu dei um passo mais para perto enquanto apontava para a rua. — Acredito que esta rosa supere àquela que o Mefistoféles tentou de dar.
— Eu… — ela juntou as sobrancelhas, claramente impressionada com meu charme e inteligência. — O quê? Talvez nem tão impressionada, ainda. Eu joguei a bengala para cima e a peguei com a outra mão, graciosamente me abaixando em um joelho conforme eu oferecia o presente, e minhas desculpas. Eu a examinei cuidadosamente conforme ela encarava a bengala. Ela piscou, e duas vezes já eram demais, e engoliu em seco. Ou ela havia amado, ou eu a havia lembrado de seu ferimento e a chateado. O ar subitamente ficou denso demais para respirar. Eu lutei para manter o medo longe do meu rosto. — Thomas, é— Se ela dissesse que havia odiado, eu poderia me jogar ao mar por ser tão tolo. — Quase tão bonito quanto eu? Sua risada era calorosa e imediata, e a expressão eufórica em seu rosto acalmou meus nervos. — De fato. Eu pensei sobre as duas últimas horas. Os últimos dez dias. Nós precisaríamos ser honestos com nossos corações de agora em diante. Sem mais muralhas. — Nosso trabalho sempre será importante para cada um de nós. Mas, você tem meu coração por completo, Wadsworth. Não importa o quê. O único jeito de ser tirado é na morte. E mesmo então, eu lutarei com cada pedaço de mim para manter seu amor próximo. Agora e para todo o sempre. Ela estendeu a mão lentamente, e então passou os dedos pelo meu cabelo. Nada jamais foi tão bom. Eu quase me inclinei em direção ao seu toque, lutando em uma batalha perdida conforme eu fechava meus olhos. — Sabe o quê? Eu acredito que esta seja a rosa mais preciosa que eu já recebi. — Meu truque de mágica foi bastante impressionante, também. Você acha que o Mefistoféles me aceitará? Eu poderia praticar. Na verdade, nós deveríamos performar um ato juntos. — Eu ofereci um braço, e nós começamos a caminhar pelo convés superior, com sorte em direção a um futuro juntos. Eu me segurei a ela, e prestei atenção em como nos movíamos. Eu não queria machucá-la mais ainda só porque eu estava sendo egocêntrico. — O que você acha dos ‘Incríveis Cressworth’? Tem uma sonoridade agradável. — ‘Cressworth’? Você realmente combinou os nossos nomes? E por que o seu vem primeiro? — Ela parou, tempo o suficiente para me dar um sorriso provocante. Uma fagulha se acendeu em meu núcleo, e eu fui subitamente arrebatado pela sensação. Amor profundo, inquebrável. — Eu
acho que a parte mais incrível da nossa performance seria não fazer o público cair no sono com a sua inteligência. — Mulher diabólica. Qual nome você sugere? — Hmm. Eu suponho que temos tempo o bastante para descobrir isso. — Mmm. Falando nisso, eu estive pensando. — Sempre uma coisa preocupante. — De fato. — Eu não mais conseguia me impedir de puxá-la para perto, esperançoso de nunca nos separarmos. — Nós nos espreitamos em becos de Londres, exploramos labirintos de castelos cheios de aranha, sobrevivemos a um circo mortal… — Eu me aproximei o suficiente para nossos lábios se tocarem, se ela os quisesse. Eu rezava para que ela quisesse. — Talvez agora nós pudéssemos tentar uma das minhas sugestões. Posso oferecer— — Apenas me beije, Cresswell. Eu lhe dei um sorriso lento, antes de juntar minha boca à dela. Eu queria que fosse doce, para simbolizar amor e perdão, mas ela tinha outras ideias, as quais eu estava mais do que feliz em satisfazer. Ela agarrou minha lapela com sua mão vazia, me puxando para perto. Seus lábios se abriram levemente, convidando a minha língua a acariciar a dela. Eu compeli, testando-a completamente, sendo arrebatado pela sensação dela, parecendo calorosa e radiante e viva sob o meu toque.
SETE Sala de estar Quinta Avenida, cidade de Nova Iorque 13 de Janeiro de 1889 Os raios solares se espalhavam pelo tapete turco na sala de estar de Lady Everleigh, como uma garrafa de conhaque tombada. Seu calor me esquentou tanto quanto o álcool era conhecido por fazê-lo. Wadsworth e eu estávamos ambos engajados em uma tarde de leitura. Foram quatro dias de ócio na casa de sua avó, e não havia como ficar farto de passar o tempo com ela, fazendo as coisas mais mundanas. Ela estava consumida por algum jornal científico de engenharia, e eu estava aproveitando um dos primeiros romances de um dos meus autores favoritos. A única coisa que estava faltando era o afago de um animal de estimação. Eu preferia gatos, mas cães eram agradáveis, também. Eu não tinha certeza se era possível ficar mais contente, mas— — Nós precisamos discutir o Mefistoféles. E lá se foi o meu dia. Cinco palavras as quais eu gostaria de eliminar para sempre do mundo. Eu forjei um sorriso preguiçoso, e abaixei o meu livro. Eu podia ser racional e civilizado, especialmente depois da trégua que o mestre de cerimônias havia oferecido antes de partir. Eu estava quase certo disso. — Tudo bem. Eu vou primeiro. — Ela parecia hesitante com o meu tom entusiasmado, mas assentiu. Meu sorriso aumentou. — Se você pensa que há um universo no qual eu não fantasiei sobre as mil maneiras diferentes, nas quais eu gostaria de testar meus bisturis nele, eu acredito que você não me conheça, Wadsworth. Eu nunca antes desejei tanto derramar sangue do que quando eu vi o que ele tentou fazer com você. Pronto. — Eu suspirei alto. — Eu me sinto muito melhor. Eu percebi que minhas mãos estavam fechadas em punhos, e me concentrei em estabilizar minhas emoções. Eu respirei fundo, e rolei meus ombros para trás. Quando olhei para ela novamente, esperei ver medo. Eu havia estilhaçado uma parede que estivera construindo por quase uma década, e agora todas as minhas partes horrendas estavam expostas. Eu fiquei desconcertado de ver a ternura em suas feições. Podia muito bem revelar a besta por completo, agora. Ela tinha o direito de me ver no meu pior, e então escolher se deseja partir, ou não.
— Eu posso apenas imaginar o doce sabor de satisfação que isso traria, destruir o que tentou me destruir. Todo dia eu luto para manter esse monstro enjaulado. Seria muito mais fácil sucumbir a esses desejos e matar todos que me aborreceram. Eu esperei para que ela fugisse do cômodo, agarrasse sua bengala e me batesse enquanto gritava sobre um homem insano sentado na sala de estar de sua avó. Ela permaneceu estóica, sua expressão, pensativa. Definitivamente, não era a expressão que eu esperava. — Já que estamos sendo sinceros, há algo… — Sua voz se desfez enquanto girava o anel de sua mãe. Eu imediatamente comecei a resolver equações em minha cabeça, esperando me distrair do que ela estava prestes a dizer. Ela respirou fundo e encontrou meu olhar. — Ayden me beijou. Na noite em que nós discutimos. Foi apenas por um segundo, e eu me afastei, mas… — Ela encarou suas mãos. — Se é de algum conforto, eu pensei em bater nele. Os números em minha cabeça cessaram, e então se estilhaçaram. O quarto ficou assustadoramente silencioso, exceto pelas constantes batidas do meu coração. Eu não estava surpreso que ele tivesse tentado tomar vantagem dela. Nem estava bravo com ela. Eu estava furioso que ele havia propositalmente esperado até que ela estivesse o mais vulnerável para se lançar em seu coração. Era a ação de um covarde. Eu tranquei minha mandíbula para me manter de dizer a coisa errada. Quando ela olhou para cima, enrijeceu. — Diga algo, por favor. Eu respirei fundo. Eu queria aliviar a situação, mas nós precisaríamos ter uma discussão verdadeira, cedo ou tarde. — Ele é uma pessoa terrível. — Eu dei um meio sorriso, satisfeito por estar sendo tão educado. Wadsworth franziu o cenho. — Ele tomou vantagem de sua inexperiência. Ele forjou uma situação onde ele poderia se inserir no papel de consolador e herói, tudo isso enquanto criava o caos que a colocou naquele caminho. Eu não estou brava com você, Wadsworth. Mas, eu adoraria bater em Mefisto com uma bengala por ser tão canalha, mesmo que ele tenha feito as pazes comigo. Ela me estudou cuidadosamente, seu olhar frio e afiado como uma lâmina. — O que você quer, Thomas? — Ela perguntou, erguendo o queixo. — Sem provocações ou esquivos. Diga-me o que você verdadeiramente quer. Sua pergunta me surpreendeu, e eu respondi sem me segurar. — Eu quero você. Eu quero lhe dar prazer, tanto mental quanto fisicamente, todos os dias e todas as noites pelo resto de nossas vidas. Eu
quero ser a razão pela qual você sorri. — Eu observei, satisfeito, enquanto um leve rubor subiu por seu pescoço. Ela desejava aquilo, também, pelo visto. — Eu quero passar horas e anos de minha vida descobrindo jeitos de fazê-la feliz. Eu quero que você sinta a mesma coisa por mim. Não porque eu demande isso de você, mas porque cada pedaço seu me deseja. Eu quero que nossa paixão incendeie o mundo ao nosso redor, invejando até mesmo as estrelas. Ela não parecia estar respirando. Eu me preocupei que eu havia ido longe demais, quando ela respondeu baixinho. — Há algo mais? E quando à raiva? Você acha que podemos superar meus erros? Eu considerei minhas emoções com precisão. Era hora de me despir. — Eu odeio que haja uma chance de que você goste de outra pessoa. Eu nunca detestei tanto algo em minha total existência, mas eu me recuso a me tornar o monstro que meu pai acredita que eu seja. Eu nunca irei me impor sobre você, mesmo que uma besta selvagem e descontrolada dentro de mim implore por uma chance de destruir qualquer um ou qualquer coisa que possa roubá-la. — Eu não sou um item para ser roubada, Thomas. — Verdade. Mas, eu nunca conheci o ciúmes até que eu fui introduzido a ele a bordo do Etruria. Eu quero negar, fingir que eu sou algum tipo de máquina perfeita e insensível que não se importa, mas essa é uma mentira terrível. Eu me importava. Eu me importava tanto que eu queria socar uma parede, por mais insensato e idiota que fosse. Eu considerei empurrar aquele tolo pomposo do mestre de cerimônias do convés, sabendo que ficaria regozijado com seu afogamento. Daria-me um prazer incomparável só de imaginar seu desaparecimento. Você não faz ideia da força que é necessária para manter aquela besta dentro, lembrar-me de que esse não é o tipo de pessoa que eu quero ser. Nem agora, nem nunca. Eu não me tornarei um monstro por você. O tipo de amor que eu desejo não é cruel, ou possessivo. Não espere que eu aja dessa maneira. Eu nunca irei implorar, ou usar táticas subversivas para conquistar seu coração. Eu o irei merecer, porque você deseja me dá-lo por sua própria vontade, ou eu não o terei de modo algum. Eu nunca a irei manipular. Ninguém deveria. E se eles o fizerem? Não são dignos do seu tempo. — É isso o que você pensa? — Ela perguntou, sua voz mortalmente baixa. — Que eu me permiti ser manipulada? Você sequer parou para considerar que eu sabia exatamente quais tipos de jogos ele estava jogando? Que eu tentei entrar no jogo, mesmo quando ele escrevia as regras? — Seu olhar poderia ter congelado o Atlântico. — Eu não sou perfeita, Cresswell.
Não, ela não era. Mas, tampouco eu o era. Ou, qualquer um no mundo. Mas, ela era perfeita para mim. Era isso que eu diria, se ela não tivesse continuado seu discurso emocionado. — Eu cometo erros. Eu sei que tipo de pessoa você é, e eu sabia do primeiro momento que eu o conheci, quem Mefistoféles era. Sim, eu ainda podia imaginar ser amiga dele, mesmo depois dele ter tentado manipular a situação. Eu não acredito em odiar alguém porque eles fizeram más escolhas. Talvez eu seja ingênua, mas eu sempre espero que o melhor vença em alguém. Talvez um dia isso mude, mas por ora? Eu gostaria de acreditar que a redenção seja possível, mesmo que isso me faça a maior tola. Eu estiquei uma mão, inutilmente. — Audrey Rose, eu não queria— — Se você e eu iremos continuar juntos, nós precisamos fazê-lo sabendo que somos imperfeitos. Eu o machucarei, Thomas. Espero que nunca da mesma forma de novo, mas sem dúvida chegará um dia em que eu realmente bagunçarei as coisas. E eu quero você de todos os jeitos em que você me quer, seu tolo. Eu o quero tanto que me leva a total… — Sua atenção se fixou em meus lábios, sua mente parecendo perdida, enquanto ela lutava contra o desejo que eu via em seu olhar, — …distração. Seu foco permaneceu em minha boca, e qualquer coleira com a qual eu havia conseguido me domar escorregou. Aproximei-me e a puxei para mim, tomando cuidado com seu ferimento. Eu não queria brigar sobre pessoas que não importavam. De qualquer forma, estava feliz que ela tinha experiência para se afastar. Agora, eu sabia com certeza que ela havia me escolhido. Não porque eu era a única opção, mas porque ela verdadeiramente m eq ueria. Eu pensei sobre a bengala de dragão que eu havia encomendado, a razão pela qual eu queria presenteá-la com aquele símbolo em particular. E ainda assim… Não parecia o tempo certo para falar sobre o assunto. Haveria tempo o suficiente para outras discussões sérias. Por ora... Eu rocei meu polegar sobre seu lábio inferior, memorizando o formato de sua boca. Eu podia olhar para a curva de seu lábio superior por horas, mesmerizado pelo feitiço que lançava sobre mim. Deslizei minha mão ao longo de sua mandíbula e seus olhos se fecharam, um som de contentamento escapando. Meu pulso rugiu como um rio furioso em resposta, mas eu me contive. Eu escorreguei minha mão em seu cabelo, angulando seu rosto em direção ao meu, saboreando cada falha em sua respiração, cada palpitar do meu coração. Parecia que havíamos esperado um milênio para chegar aqui. E eu perecia na leve provocação antes de nosso beijo. Eu rocei meus lábios nos
dela, uma, duas vezes. Cada roçar ganhando um pouco mais de pressão. Eu me movi, antes que nossas bocas fizessem aquele contato final, beijando o canto de seus lábios, sua bochecha, ao longo de seu queixo. Eu desenhei círculos lentos na lateral de seu corpete e ela arqueou ao meu toque, me incentivando a descer. Eu queria deslizar meus dedos ao longo da sedosidade de suas meias, sentir as camadas de suas saias escovar a minha pele enquanto eu explorava seu corpo do modo que ela parecia implorar para eu fazer. Eu levei minha boca de volta para a dela e a beijei, lenta e lascivamente, saboreando a sensação dela. Ela respondeu com um suspiro, um pedido. — Thomas. Por favor. Eu quase me desfiz. Nosso beijo se aprofundou. Minha língua varreu sua boca, provocando, suavemente. Ela gemeu, e me puxou parcialmente para cima dela, derrubando os livros do canapé. Eu não pude evitar que uma risada nervosa escapasse. — Calma, Wadsworth. Eu iria querer me tomar, também, mas se não formos cuidadosos, iremos alertar toda a criadagem. — Eu não ligo, — ela disse, lançando um sorriso maléfico. Ela enrolou seus braços em torno de meu pescoço e me trouxe para perto. Dessa vez, passando suas mãos pelas minhas costas. Seu toque quase me libertando. Tomando cuidado com seu ferimento, eu me posicionei entre suas pernas e retomei minha atenção a cada lugar que ela direcionava. Eu usei cada método de dedução que eu conhecia para descobrir se ela havia gostado, e o fazia novamente. Eu derramei beijos e os trilhei com a língua, adorando cada arrepio que vinha com a atenção. Quando ela tomou minha mão e a colocou em sua coxa, minha respiração parou. Eu sabia precisamente pelo que ela estava pedindo. Eu não lhe negaria nada. Eu tracei uma lenta linha em direção a sua panturrilha, e então deslizei para baixo de suas saias, meu coração martelando conforme eu subia. Eu nunca havia feito isso antes. — Você tem certeza? Um sorriso perplexo cruzou seu rosto. — Você está com medo? Ou, isso é demais para você? — Nada disso. Eu sorri contra seus lábios conforme ela se angulava em minha direção, sua respiração se tornando errática quando eu comecei a desenhar formas ao longo de sua coxa nua. Antes que eu pudesse provocá-la, sua boca estava na minha, e todos os meus pensamentos se voltaram a deduzir cada mudança sutil de seu corpo.
Logo, ela sussurrava meu nome como uma oração de novo, e de novo. Eu não parei até que seu aperto em minhas costas diminuiu, e seus sussurros se dissiparam em doces beijos. Nós nos deitamos na sala, respirando profundamente, ruborizados dos beijos, e sorrindo como dois tolos apaixonados. Eu nunca havia estado mais contente na minha vida. — Eu te amo, Thomas. — Claro que sim. Eu sou o alto e sombrio herói dos seus sonhos, se lembra? — Eu pressionei meus lábios contra sua têmpora, e a puxei para o enlace de meus braços. — Eu te amo, também. Pelas mesmas razões. Ela enterrou o rosto em meu peito, estremecendo de rir, e eu me senti um pouco mais apaixonado. Nós havíamos resistido à tempestade que era o RMS Etruria, e ficamos impossivelmente mais fortes. Isso me dava esperança para o nosso futuro. Eu não somente havia provado para mim mesmo que não era o monstro de ninguém, como Audrey Rose me escolhera. Eu não o repetiria, mas no fim, eu não podia negar me sentir grato pela provação. Mesmo que a constante sensação de homicídio persistisse. Só um pouco.
OITO Sala de estar Quinta Avenida, cidade de Nova Iorque 14 de Janeiro de 1889 Wadsworth balançou a cabeça, seus lábios em uma linha determinada. Liza era sábia o suficiente para não olhar em minha direção por assistência. Ela havia tentado algumas vezes, mas Audrey Rose não aceitou. Eu deixei meu lápis de lado, olhando para o diagrama de um sapato que eu havia feito, satisfeito com as medidas e estilo. — Ah, não, — Audrey Rose grunhiu para a grande peruca empoada que Liza segurava. — Não, não, não. Eu não irei usar essa peruca horrorosa novamente. Eu engasguei com uma tosse, ganhando um olhar rápido de ambas as garotas. Eu ergui uma sobrancelha. — A peruca empoada era muito… Maria Antonieta. Combinava com você. Audrey Rose praguejou. Foi uma extensa série de palavrões imundos. Eu estava tentando — e falhando — não cair na risada. — Não é engraçado, Cresswell! Eu deveria estar me recuperando, indo devagar. Isto, — ela gesticulou para a bagunça de vestidos espalhados pelas cadeiras e pelo chão da sala de estar, — não é conducente à paz. Liza cruzou os braços. — Se nós não fizessemos peças para o seu proveito, você morreria de tédio. O tio nos baniu de levá-la ao teatro até que sua fratura estivesse menos… qualquer que seja o termo adequado… então nós trouxemos o teatro até você. Agora pare de ser complicada. Esta peça requer uma peruca. Eu me escondi atrás do meu caderno de desenhos, fazendo um péssimo trabalho ao evitar que meus ombros tremessem com a risada reprimida. Uma almofada voou através da mesa de centro que me separava de Audrey Rose. Eu olhei para cima, surpreso ao vê-la dissolver em um ataque de risos. Algo apertado se desfez em meu peito, trazendo um pouco de rubor às minhas bochechas. Eu adorava quando ela se libertava. — Ugh! — Liza disse, jogando suas mãos para o alto. — Eu preciso de alguém para cantar em soprano neste papel. Minha voz não alcança as mesmas oitavas, e irá soar ridícula. Você deve vestir a peruca.
As garotas se entreolharam — uma silenciosa batalha travada entre elas. Eu admirava o quanto Liza amava sua prima. Ela nunca a deixou cair em desespero, e nunca forçava quando a Wadsworth estava frustrada de fato. Liza lia as pessoas tanto quanto eu o fazia, mas em um nível emocional. E ela estava certa de continuar, agora. Wadsworth estivera particularmente desassossegada a manhã inteira. Alguns dias são piores do que outros, e a temperatura baixa e as mudanças no barômetro[3] sempre pareciam causar mais dor. Às margens dos meus projetos experimentais de sapatos, eu estive fazendo anotações sobre os padrões climáticos na última semana e possíveis relações com o aumento nos sintomas de Wadsworth. Eu não acho que ela tenha percebido, mas eu sutilmente observei cada estremecimento, cada pequena pausa que ela dava ao se reacomodar no canapé ou na cama. Sua perna a incomodava mais do que ela admitia. Eu não tinha nada com o que comparar pessoalmente, mas lembrei minha mãe falando abertamente sobre suas dores crônicas antes de morrer. Ela havia me dito que uma das partes mais difíceis de sua condição era a persistência da dor — como isso afetou seu humor, gradualmente. Eu era muito jovem e inexperiente para ajudá-la, então, mas esse não era o caso agora. Eu suspirei e estiquei a mão. — Dê-me a peruca. Eu irei mostrar a vocês duas como se faz. Audrey Rose endireitou-se, estreitando os olhos. — Você canta? Desde quando? Desde nunca. Mas, eu estava disposto a tentar se isso a faria rir tão abertamente de novo. Eu dei de ombros. — Eu sou um homem de muitos talentos e mistérios, Wadsworth. Por favor, tente não parecer tão surpresa. É bastante prejudicial para o meu ego frágil. Quinze minutos depois, Liza me fizera sentar em um banco de piano, vestindo a peruca empoada com laços rosas e pássaros falsos, lábios escarlates e uma pinta/verruga na minha bochecha esquerda. Eu nem mesmo tive a oportunidade de encantar a Wadsworth com as minhas habilidades de canto antes que ela caísse em um ataque de risos. Eu cruzei meus braços. Meu traje azul claro saído da corte do Rei Louis XVI estava apertado em minhas costas. Eu rezei para não arrebentar a costura. Liza se jogou no canapé ao lado de Audrey Rose, mordendo o lábio tão forte que eu pensei que ela fosse se machucar. — Vocês duas são seres humanos terríveis, — eu disse, mantendo uma faceta séria. — Não fiquem tão surpresas quando Satã as levar diretamente ao inferno.
Qualquer controle que elas tinham — que era muito, muito pouco — se estilhaçou. Liza agarrou Audrey Rose forte, ofegante de tanto rir. Eu fingi estar insultado e ergui meu queixo, determinado a manter aquele sorriso no rosto da Wadsworth, com o sacrifício de minha dignidade remanescente. Eu respirei fundo, estufando o peito com grande exagero, e comecei a tocar o piano. Eu gritei, com a minha voz mais alta e clara: Sing a song of sixpence, A pocket full of rye, Four-and-twenty blackbirds, Baked in a pie. [Cante uma canção de seis centavos, Um bolso cheio de centeio, Vinte e quatro melros Em uma torta, assados.] Eu segurei minha própria risada conforme Audrey Rose tombava de lado, lágrimas saindo de seus olhos. Fingindo não notar o quão horrendo era o meu tom, eu adicionei um floreio aos acordes da canção de ninar no piano. When the pie was opened, the birds began to sing, “Wasn’t that a dainty dish to set before the king?” The king was in his counting house, counting out his money. The queen was in the parlor, eating bread and honey. [Quando cortaram a torta, os pássaros começaram a cantar, “Não era um prato saboroso para, ao Rei, dar?” O Rei estava no escritório, com o dinheiro contado. A Rainha estava na sala, comendo pão e melado.][4] Liza caiu do canapé, aterrissando em uma pilha de vestidos descartados. Milagrosamente, eu mantive uma faceta série enquanto eu terminava o resto da música, levantava, e então me curvava profundamente pela cintura. Minha peruca amaldiçoada caiu sobre as teclas do piano, e as garotas choravam de tanto rir. Uma hora depois, eu servi duas fatias de tortas de chocolate e menta. Uma para Wadsworth, uma para mim. Ela olhou para a sobremesa e sorriu. — Você está me mimando, Cresswell.
Eu despedacei a casca de chocolate externa da minha e gemi enquanto afundava minha colher no recheio de mousse. — São por puras razões egoístas, já que me permite me mimar, também. — Naturalmente. — Ela balançou a cabeça. — Eu não fazia ideia de que você podia cantar tão… alto. Diga-me, — ela provocou, — qual gato vadio lhe deu lições enquanto filhote? Eu bufei, rindo. — Eu a deixarei ciente de que todos os gatos vadios no mundo se ofenderam com isso. Nós focamos em nossos doces, e eu terminei o meu com uma xícara forte de espresso. O amargo do café combinou bem com o açúcar, e eu me encontrei desejando por mais de cada conforme eu abaixava minha xícara. Talvez eu estivesse nervoso para me pronunciar sobre o próximo assunto. — Então? — Ela perguntou, tirando minha atenção dos pensamentos de doces. — Sobre o que está ponderando, agora? Eu ergui uma sobrancelha, tentando não mostrar minha surpresa. — Como você sabe que estou ponderando? — Você está encarando profundamente seu prato vazio. Como se você esperasse que algo aparecesse, para poder organizar seus pensamentos antes de compartilhá-los. Ela me deu um olhar, satisfeita consigo mesma, quando eu pisquei de volta. Ela realmente estava ficando muito boa em me ler. Eu estiquei minhas pernas, enrolando. — Eu estive pensando sobre o que conversamos na Romênia. Sobre… — Eu passei uma mão pelo cabelo. — Sobre se você gostaria ou não de começar um cortejo formal. Ela ficou rígida. Meu coração desacelerou. — Você está pedindo permissão para escrever para o meu pai? — Sim. — Eu encontrei seu olhar, inabalavelmente — Eu gostaria de formal e publicamente cortejá-la. Eu gostaria de ser seu, oficialmente, se você me aceitar. Ela mordeu o lábio, e pela minha vida, eu não conseguia decifrar se ela estava satisfeita, temerosa, ou procurando por uma desculpa para adiar meu pedido. Ela rapidamente alcançou minha mão, e a segurou contra seu coração. Estava batendo como um tambor de guerra. Eu juntei minhas sobrancelhas, e ela riu. — É claro que eu te aceito, Thomas! — Ela levou minha mão aos seus lábios e a beijou, seu sorriso aumentando. — Depois de tudo que aconteceu no Etruria… Eu estava… — ela suspirou. — Eu não estava certa de que você
ainda gostaria de me cortejar. E então, quando você não disse nada depois... eu pensei — eu esperava que você fosse perguntar depois que discutíssemos o Mefistoféles. Quando os dias se passaram, e você não falou nada, eu não pensei que você quisesse. Eu a estudei atentamente. — Você pensou que eu tinha mudado de ideia sobre nós? — Honestamente? Eu não podia ter certeza. — Ela ergueu um ombro. — Eu cometi erros que te afetaram. Você tem todo o direito de mudar de ideia e fazer suas próprias escolhas por causa deles. Eu dificilmente poderia te culpar se você não quisesse mais nada comigo. Era eu quem havia ficado muito rígido. — E você teria me deixado ir? Ela abriu a boca e a fechou, considerando suas palavras, cuidadosamente. Ela enfiou uma mecha de cabelos pretos atrás da orelha. — Você sempre me deixou escolher. Teria sido difícil, mas eu faria o mesmo por você. Sempre. De alguma forma, quando eu não estivera prestando atenção, nós nos movemos para perto um do outro. Nossos joelhos tocaram, o contato enviando um raio de sentimentos através de mim. Meu pulso vibrou. — Eu ainda escolho você, Audrey Rose. — Uma lágrima escorregou por sua bochecha. Eu gentilmente a afastei. — Você concordaria se eu mandasse uma carta para o seu pai pedindo por um noivado, também? Sua resposta foi um beijo. Do tipo que despedaça paredes e as troca por luz.
NOVE Quarto do Thomas Quinta Avenida, cidade de Nova Iorque 20 de Janeiro de 1889 Eu encarei o pote de tinta, palmas curiosamente úmidas conforme eu rolava o bico da pena por entre as pontas de meus dedos. Eu havia passado a maior parte da última semana mentalmente praticando as palavras exatas, a precisão da pontuação, e onde eles cairiam. Como o pedaço de pergaminho ficaria com o espaço em branco entre as palavras. As vírgulas e os pontos de exclamação que nunca expressariam meu entusiasmo propriamente. As pausas que eu queria fazer, os pontos que eu faria em favor de por que eu era um pretendente perfeito. Poderia não ser matematicamente provável, mas eu estava certo de que ninguém amava outro alguém tanto quanto eu amava Audrey Rose. Caro Lorde Wadsworth, estimado Barão de Somerset, Eu lhe escrevo sob grande pressão. Eu pareço não conseguir pedir adequadamente para cortejar formalmente sua filha, e devo me livrar de minha miséria de uma vez. Por favor, envie uma ninhada de morcegos vampiros para me despachar o mais cedo possível. Seria uma clara melhora em relação a esta carta… O pretendente estúpido, porém esperançoso de sua filha, Thomas Eu amassei o pergaminho e o joguei na lata de lixo. Eu não havia tido tanto problema pedindo sua permissão para que nós frequentássemos a escola forensíca na Romênia. Isso não deveria ser diferente. Exceto que era. Muito diferente. Eu fechei os olhos e tentei me imaginar falando com o Lorde Wadsworth em pessoa. Eu me imaginei falando que eu queria me casar com sua filha. Eu queria tomá-la em meus braços e, egoistamente,
nunca deixá-la partir. Eu queria acordar ao seu lado todas as manhãs e cair na cama juntos à noite… Eu não achava que seria uma boa ideia dizer em voz alta esses exatos desejos. Eu abaixei a caneta e esfreguei minhas têmporas. Desesperançoso. Eu estava terrivelmente desesperançoso em assuntos do coração. Eu precisava de ajuda. Eu peguei minha caneta de volta e rapidamente rabisquei outra carta, muito mais fácil de ser escrita. Querida Daci, Eu desejo pedir a mão de Audrey Rose, e temo enfiar o pé na boca, em vez disso. O gosto de solas de couro não combina comigo. Você sabe o que eu penso de tolos, e eu sou o pior tipo deles. Por favor, ajude. Seu irmão extremamente inteligente, porém idiota, Thomas Pronto. Se pelo menos todas as cartas pudessem ser tão simples e diretas. Eu afastei o medo e a dúvida de mim. Eu pensei em como Audrey Rose e eu nos sentíamos a respeito um do outro — quão forte a nossa ligação havia se tornado. Eu nos imaginei envelhecendo juntos, sentados nos jardins de uma casa de campo, o ar do mar salgado e refrescante, enquanto um cadáver nos esperava em nosso necrotério particular. Talvez um dia houvesse crianças, se Audrey Rose as desejasse. Ou, talvez nós tivéssemos um bando de gatos e cães para mimar. Qualquer que fosse o caminho que escolhêssemos, nós o faríamos juntos. Nosso futuro pertencia somente a nós. Nosso passado pode ter nos moldado, mas nós éramos os mestres de como ele continuaria a fazê-lo em nosso presente. Eu apenas seria um monstro se eu me permitisse ser um. Eu também era livre para escolher outro caminho. Um que era completo de amor, risada e luz. Sonhos. Eu sempre escolheria os sonhos ao invés dos pesadelos. Luz ao invés de escuridão, e amor ao invés de ódio. E eu continuaria a fazer essas escolhas sempre. Cada um de nós detinha o poder para decidir nossos próprios destinos. Eu não estava mais sob o perigo de me tornar o príncipe das Trevas — a ameaça com a qual meu pai gostava de me provocar. Eu era Thomas
Cresswell, e eu era mais do que bom o suficiente para pedir a mão de Audrey Rose. Ela e eu viajaremos o mundo juntos, como iguais, e enquanto poderia haver outro, algum dia, que estaria disposto a permitir aquela liberdade a ela, ela não precisava de minha permissão. Eu sorri para o pergaminho, sem mais incertezas. Eu levei minha caneta ao papel e comecei a escrever. As palavras se derramaram de mim, rápidas e verdadeiras. Eu não estava mais escondendo quem eu era e pelo que desejava. Eu sabia antes de terminar o último traço da caneta como eu assinaria a carta. Eu não iria esconder nada, e sustentaria cada aspecto de quem eu era. Caro Lorde Wadsworth, Eu lhe escrevo hoje para formalmente solicitar uma audiência o mais breve possível. Eu desejo discutir o importante assunto do possível cortejo e noivado de sua filha. É, de certo modo, inconvencional, então imploro por seu perdão em ser tão ousado, mas eu já perguntei a Audrey Rose se ela permitiria o pedido. Eu percebo que você sabe tanto quanto eu que ela não toleraria menos de um pretendente em potencial. Igualdade é algo que todos nós devemos receber livremente. Ou, ao menos, eu firmemente acredito que sim. Eu espero que lhe agrade — tanto quanto a mim — que ela me encorajou a lhe enviar essa carta imediatamente. Eu quero que você saiba que estou completamente apaixonado por sua filha, senhor. Suas qualidades admiráveis vão muito além da beleza, embora eu pudesse certamente escrever mil sonetos para isso. Sua mente e alma me tem cativo — e eu estou disposto a ficar prisioneiro pelo resto de minha vida. Eu gostaria de nada mais do que ter Audrey Rose como minha parceira em vida, para sempre, se você nos oferecer sua benção.
Respeitosamente, Thomas James Dorin Cresswell, filho de Sua Graça, Lorde Richard Abbott Cresswell, Herdeiro de Drácula PS Estou enviando junto duas passagens de primeira classe para cruzar o Atlântico a bordo do próximo navio, caso você prefira falar em pessoa, embora eu deseje uma viagem mais agradável do que a que recentemente experienciamos. Nós ansiosamente esperamos sua chegada na casa de sua sogra, aqui em Nova Iorque.
[1]
RMS é a sigla para Royal Mail Ship, navios mercantis contratados pelo Correio da Coroa Britânica para entregarem correspondências além-mar, principalmente entre a Inglaterra e os Estados Unidos. Em tradução literal - Navios do Correio Real (NCR). Contudo, RMS parece ter uma sonoridade melhor e mais agradável de se ler, por isso decidi manter a sigla original. [2]
O trocadilho está em ‘Raising Cane’, que se assemelha muito, em som, a ‘Raising Cain’, uma expressão
que significa ‘causar uma bagunça, fazer o inferno na terra, ou até mesmo se comportar agressivamente. Infelizmente, a tradução não mantém o trocadilho. Cane significa bengala. Raising pode apresentar vários significados, como criar, erguer, levantar. Em tradução literal, teria-se “Criando a Bengala”. [3]
Medidor de pressão atmosférica
[4]
A tradução literal seria: ‘Quando cortaram a torta, os pássaros começaram a cantar,/“Não era uma
sobremesa saborosa para servir ao Rei?”/O Rei estava na casa bancária, contando seu dinheiro./A Rainha estava na sala, comendo pão e mel.’. Porém, modificou-se a estrutura das frases e algumas palavras para manter as rimas.
SOBRE O AUTOR Kerri Maniscalco cresceu em uma casa semi-assombrada perto da cidade de Nova Iorque, onde seu fascínio com os cenários góticos começou. Em seu tempo livre, ela lê qualquer coisa na qual consegue colocar as mãos, cozinha todos os tipos de comida com sua família e amigos, e bebe chá demais enquanto discute os melhores pontos da vida com seus gatos. Seu primeiro livro nesta série, Rastro de Sangue, estreou em #1 na lista de mais vendidos do New York Times, e Príncipe Drácula e O Grande Houdini foram ambos best-sellers do New York Times e USA Today. Ela está sempre animada para falar sobre paixões fictícias no Instagram e no Twitter @KerriManiscalco. Para novidades sobre os Cressworth, verifique k errimaniscalco.com.
JIMMY Patterson Books for Young Adult Readers James Patterson Presents Stalking Jack the Ripper by Kerri Maniscalco Hunting Prince Dracula by Kerri Maniscalco Escaping from Houdini by Kerri Maniscalco Capturing the Devil by Kerri Maniscalco Gunslinger Girl by Lyndsay Ely Twelve Steps to Normal by Farrah Penn Campfire by Shawn Sarles When We Were Lost by Kevin Wignall Swipe Right for Murder by Derek Milman Once & Future by Amy Rose Capetta and Cori McCarthy Sword in the Stars by Amy Rose Capetta and Cori McCarthy Girls of Paper and Fire by Natasha Ngan Girls of Storm and Shadow by Natasha Ngan The Maximum Ride Series by James Patterson The Angel Experiment School’s Out—Forever Saving the World and Other Extreme Sports The Final Warning MAX FANG ANGEL Nevermore Maximum Ride Forever The Confessions Series by James Patterson Confessions of a Murder Suspect Confessions: The Private School Murders
Confessions: The Paris Mysteries Confessions: The Murder of an Angel The Witch & Wizard Series by James Patterson Witch & Wizard The Gift The Fire The Kiss The Lost Nonfiction by James Patterson Med Head Stand-Alone Novels by James Patterson Expelled Crazy House The Fall of Crazy House Cradle and All First Love Homeroom Diaries For a preview of upcoming books and information about the author, visit JamesPatterson.com or find him on Facebook, Twitter, or Instagram.
First, she STALKED… Then, she HUNTED… After a narrow ESCAPE… Finally, she’s about to CAPTURE the killer Unless he gets to her first.
Read the New York Times bestselling series by Kerri Maniscalco that Kirkus Reviews called “A gripping mystery with a compelling heroine and just the right touch of romance.”
Thank you for buying this ebook, published by Hachette Digital. To receive special offers, bonus content, and news about our latest ebooks and apps, sign up for our newsletters.
Sign Up Or visit us at hachettebookgroup.com/newsletters