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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Aluno: Gabriel da Silva Rivas Professor: Everardo Paiva de Andrade Disciplina: Pesquisa e Prática de Ensino I / 2020.2
Resenha sobre o filme “Pro Dia Nascer Feliz” (2006), de João Jardim. O filme “Pro Dia Nascer Feliz”, dirigido e roteirizado por João Jardim foi lançado nacionalmente em 2006. A produção que é feita em estilo de documentário tem por objetivo tecer uma forte crítica ao ensino básico brasileiro. Para tal ação, a longametragem se sustenta em relatos de alunos, pais de alunos, profissionais da educação e que foram colhidos em diferentes regiões do país. Já em seu momento inicial, “Pro Dia Nascer Feliz” exibe uma realidade referente ao ano de 1962 na qual a educação nacional já apresentava fortes sinais de precarização. Conforme o filme se desenvolve e nos apresenta alguns casos mais atuais, percebemos a pouca evolução ocorrida dentro dos ambientes escolares. De 1962 até 2006, foram 44 anos vividos pela população. Certamente, um tempo suficiente para o corpo social sentir mudanças significativas para melhoria do sistema educacional. A película nos leva a três estados brasileiros: Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. Em relação ao primeiro, dos três listados, o diretor procurou focar na cidade de Manari onde existe a Escola Estadual Coronel Sousa Neto. O filme exibe a situação dessa unidade escolar e percebemos más condições de funcionamento devido a precarização da estrutura. Nesse ambiente, estão Clécia e Valéria. Duas alunas que cedem relatos exibidos no decorrer da história. Elas alegam que gostam de estudar. Clécia ainda defende a unidade, pois acredita que é melhor ter mesmo que seja com uma estrutura ruim do que não ter. Valéria já discorre acerca de um comportamento negativo vindo de professores que desacreditam de seu potencial. A jovem escreve poesias e os mestres não acreditam que seja ela a autora dos escritos. Além disso, “Pro Dia Nascer Feliz” também mostra a situação dos transportes responsáveis por levar os estudantes até os colégios. Ônibus são disponibilizados para os alunos, porém, se encontram em péssimas condições e acaba que em alguns dias, a viagem é impossibilitada promovendo, dessa forma, prejuízos ao desempenho dos alunos e alunas da rede.
Ao tratar do Rio de Janeiro, João Jardim foca na cidade de Duque de Caxias, localizada na baixada Fluminense. O Colégio Estadual Guadalajara é explicitado no filme. Em comparação com a estrutura da instituição de ensino mostrada em Pernambuco, a escola caxiense apresenta melhores condições. Todavia, um dos problemas colocados em pauta pelo documentário é a questão da localidade do colégio que se situa bem próximo a um ponto de venda de drogas, chamado popularmente de boca de fumo. Outra problemática abordada é a questão do desinteresse dos alunos pelo estudo. O jovem Deivison Douglas é trazido como exemplo de um estudante pouco interessado pelos livros e pela aprendizagem. Quando o perfil do Douglas é retratado, o telespectador é induzido a pensar no desafio que a escola tem com aquele jovem que está completamente vulnerável pela facilidade que se tem de comprar/ comercializar drogas visto que a própria unidade educacional está localizada bem próxima a um ponto do tráfico. Um dilema pode ser observado quando uma parte do conselho de classe do colégio é exibida, em relação ao futuro do estudante. Fica evidente a preocupação de não reprovar o Douglas para evitar que ocorra perda do estímulo pelo estudo. Em contrapartida é colocado em pauta a questão de como aprovar alguém que não possui a pontuação necessária. Um ponto positivo mostrado pela longa- metragem é a participação do Douglas em projetos artísticos que envolvem a dança e a valorização da cultura afrodescendente. O entendimento de que atividades complementares devem ser estimuladas pelos ambientes escolares como o teatro, a dança, montagem de oficinas interativas é de extrema importância. A violência é muito presente em comunidades e áreas periféricas, de uma maneira geral, e por isso, esses instrumentos devem ser potencializados a fim de evitar uma aproximação dos alunos com o tráfico. Principalmente daqueles que estão desestimulados com o estudo e acabam vendo o espaço escolar, muitas vezes, como uma prisão. A Escola Estadual Parque Piratininga II é a escolhida pela produção do filme para ser retratada dentro do contexto da cidade paulista de Itaquaquecetuba. A estrutura dessa é a melhor das três já citadas aqui. É importante ressaltar aqui a condição financeira dos alunos que não é boa. Portanto, a chance dos estudantes matriculados é o estudo. E de acordo com o que é exibido, muitos deles aproveitam a oportunidade e apresentam bom desempenho, por exemplo, no Exame Nacional do Ensino Médio.
A ausência de professores por faltas freqüentes é citada no documentário. A diretora do Parque Piratininga, atribui a falta de assiduidade do corpo docente à legislação que não pune os mestres por conta de muitas ausências. Entretanto, o relato de uma professora da instituição nos mostra que a falta ocorre pelo cansaço físico e mental que é proveniente a partir do envolvimento dos profissionais com os problemas dos alunos, pela visão equivocada que os estudantes têm em relação ao educador visto muitas vezes como o inimigo da classe. Em outras palavras, a fala da professora vai muito ao encontro da idéia de abandono do profissional da educação por parte do próprio Estado. Ela fala em perca de dignidade e empobrecimento do espírito. Também é interessante pensar no relato dado pela professora Suzana, da mesma instituição paulista em questão. A insatisfação com o modelo de escola é bem evidente em sua fala. De acordo com ela, vivemos em um ambiente escolar que não cumpre mais sua função por ser um modelo ultrapassado. A partir disso, entende-se a desmotivação existente entre os professores, em geral. Outra escola paulista também é trazida para o documentário. Agora, é a vez do Colégio Santa Cruz, situado no bairro de Pinheiros, em São Paulo. É uma instituição particular sendo retratada e com boa estrutura e organização. O que chama a atenção, mas não surpreende, por conta da lógica de racismo estrutural que é vigente em nosso país, é a questão da quantidade de estudantes de cor branca ser bem superior em relação ao número de alunos pardos e negros. Em certo momento do filme de João Jardim, ocorre uma conversa entre estudantes da rede privada de ensino em que eles debatem sobre desigualdades sociais, reconhecimento ou não de privilégio que possuem pela condição financeira que apresentam e caridade. Uma das alunas quebra a visão romântica de “todos somos iguais” explicitando a realidade da fome, da falta de dinheiro para por comida na mesa e fala que esse aspecto diferencia e muito as pessoas. Não a essência, mas sim, a situação de vivência. Assistir “Pro Dia Nascer Feliz” nos faz problematizar diversas questões. Desde fatos mais simples como a falta de uma pintura da parede escolar até situações mais graves como a localização de uma unidade de ensino próxima a uma boca de fumo retirando o referencial de um futuro diferente daquela realidade para o aluno. A questão da educação no Brasil é sustentada há anos por um pilar de desigualdade escancarado. Em tempos de pandemia, então, esse abismo social se torna ainda mais evidente quando tratamos do ensino. O debate é simples sobre ter ou não ter acesso à tecnologia, em
pleno século XIX. O podcast organizado pela equipe “Café da manhã” com tema “a educação a distância não é para todos” trata muito bem sobre isso. Com o fim da longa metragem, algumas reflexões importantes ficam. Pensamentos a respeito daquela criança que tem talento, que tem criatividade, mas que, muitas vezes, é limitada ao ambiente escolar precário em que freqüenta. Pensamentos a respeito de que perfil está mais bem condicionado para cursar uma universidade. Pensamentos a respeito da urgência que existe por investimentos na educação pública. Em um contexto de crise sanitária e fechamento de escolas, como o documentário iria abordar a situação da educação atual no Brasil? Bem, certamente, a situação seria pior ainda e o dia continuaria não nascendo feliz para todos. Tempo de duração do filme: 1 hora e 28 minutos Tempo médio calculado para organização das anotações + elaboração da resenha: 1 hora e 30 minutos.