257 - Segredos sedutores_ Harlequin D - Maureen Child

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TEMPESTADE DE PAIXÃO – Maureen Child Um cowboy e um bebê surpresa Tudo que o ex-fuzileiro Jake Hunter quer é paz e sossego. Para isso, precisa que sua mãe não o incomode mais. Jake não quer comandar o império da família, e vai assinar qualquer documento que sua mãe deseje para isso. Mas quando Cassidy Moore, assistente pessoal da mãe de Jake, chega ao rancho, surge uma atração mútua, que sai de controle durante uma nevasca. Catorze meses depois, Cassie ainda não contou a Jake que eles tiveram um filho. Porém, quando a mãe dele ameaça tomar-lhe o bebê, Cassie corre de volta para Jake em busca de ajuda, capaz de fazer qualquer coisa para ficar com o filho. DESEJO COMPARTILHADO – Andrea Laurence Ele queria o seu filho… a qualquer custo Claire Douglas, recentemente viúva, descobriu que seu falecido marido não é o pai de sua filha. Devido a uma troca de amostras em uma clínica de fertilidade, Luca Moretti se tornou pai da filha de Claire, mas eles nunca se conheceram. E como chefe de uma família italiana, de jeito nenhum ele vai abandonar sua filha. Luca quer a guarda compartilhada, mas Claire não está disposta a dividir a filha com um completo estranho. Agora, Luca tem trinta dias para convencê-la de que eles podem ser uma verdadeira família.

Maureen Child Andrea L aurence

SEGREDOS SEDUTORES

Tradução Maurício Araripe

2017

SUMÁRIO

Tempestade de paixão Desejo compartilhado

Maureen Child

TEM PESTADE DE PAIX ÃO

Tradução Maurício Araripe

Querida leitora, Eu adoro ler – e escrever – livros que se passam durante o Natal. Há algo de tão alegre nessa época do ano que parece que nem importa qual feriado estamos celebrando. É sobre família. E amor. E tirar tempo para ficar com aqueles que são importantes para nós – e para sermos nós mesmos, também. Em Tempestade de Paixão, você vai conhecer Jake Hunter e Cassidy Moore. Jake não comemora o Natal há anos. Ele também se distanciou da família. Então, quando Cassidy começa a puxá-lo de volta ao mundo dos vivos, ele tenta resistir até o fim. Eu realmente adorei escrever esse livro, e espero que você o adore também! E, seja qual for o feriado que você comemore no fim do ano, te desejo alegria, risos e livros ótimos! Me visite no Facebook ou no meu site, www.maureenchild.com. Boa leitura! Maureen

CAP ÍTULO 1

– Q UANDO BOSTON vem até Montana, nunca é boa coisa. Jake Hunter franziu a testa ao fitar o horizonte. – Você sempre é duro demais com a sua mãe. Jake virou a cabeça para fitar o homem mais velho postado ao seu lado. Aos 75 anos, Ben Hawkins não era mais tão alto quanto antes. Mas ainda tinha fartos cabelos brancos como a neve, penetrantes olhos azuis e um rosto marcado e bronzeado devido aos anos trabalhando sob o sol. – E você sempre foi mole demais com ela. Ben deu de ombros. – Ela é minha filha. – É, tem isso. – Jake assentiu. – Bem, se tudo correr como prometido, esta será a última vez que Boston virá até aqui para qualquer coisa que não seja uma visita familiar. – Eu tenho de perguntar. Tem certeza quanto a isso? – Ben ergueu a gola do seu casaco para proteger o pescoço do frio vento de outono. – Quero dizer, o que você está planejando não pode ser mudado. Está abrindo mão dos direitos do negócio que a sua família construiu. – Ah, eu tenho certeza. Já era para ter feito isso há muito tempo, Pop. – Jake sacudiu a cabeça. – A Hunter Media não tem nada que eu queira. Jamais teve. E ele sabia o quanto tal fato irritava a sua mãe. Ela sempre planejara que Jake assumisse a administração da empresa construída pela família do marido.

O fato de Jake jamais ter demonstrado interesse, no fundo, nunca fora importante. Elise Hawkins Hunter era a determinação em pessoa. Ben riu. – Você sempre foi mais teimoso do que qualquer outra coisa. – Não é teimosia. – Jake inspirou fundo, se deliciando com a intensa sensação gelada que lhe encheu os pulmões. – Apenas sei o que quero. Sempre soube. Olhou ao redor, passando os olhos pelo rancho que amava, o lugar que fora seu consolo e sua alegria durante os verões de sua infância… e quando retornara ali, após deixar as forças armadas. Outubro nas montanhas de Montana era espetacular, como se Deus estivesse montando um espetáculo antes da chegada do inverno. As árvores estavam ficando douradas e avermelhadas. Nuvens escuras cruzavam um céu tão azul que chegava quase a doer os olhos só de olhar. Do curral e do celeiro, vinham os sons de cavalos e dos homens que trabalhavam com eles. Estendendo-se diante da enorme casa que ele construíra, havia o Whitefish Lake. As águas cor de safira eram rodeadas por altos pinheiros que oscilavam ao sabor do vento. A vista acalmou os lugares sombrios dentro dele, exatamente como fizera da primeira vez em que ele a vira, ainda garoto. Mesmo então, Jake já soubera que ali era o seu lugar. Não em Boston, onde nascera, e onde a família começara e governava uma dinastia. Mas ali na montanha, onde o avô havia estabelecido um meio de vida que seduziu a alma de Jake de um modo como nada mais fora capaz. – Não – murmurou ele, o olhar fixo no lago abaixo. – Boston não tem nada a me oferecer capaz de competir com este lugar. – Devo dizer que concordo – comentou Ben. – Todavia, sua mãe jamais sentiu a conexão profunda com a terra que nós dois sentimos. A simples afirmação fez Jake sorrir. Talvez o amor pela terra pulasse gerações, ele pensou. Aquele rancho estivera na família de Ben por mais de cem anos, sempre cabendo ao filho mais velho manter o legado que os Hawkinses haviam construído desde que o primeiro colono chegou a Montana e se assentou na terra. Até, Jake pensou, a sua mãe. Elise Hawkins Hunter não sentira o encanto do rancho. Sua mãe fora

Elise Hawkins Hunter não sentira o encanto do rancho. Sua mãe fora nascida e criada ali, e escapara assim que pudera. Fizera faculdade em Boston, onde conhecera e se casara com o pai de Jake, e levara a vida com que sempre sonhara. Nada de acordar cedo para cuidar dos animais. Nada de tranquilidade silenciosa. Nada de solidão quando o rancho estava isolado pela neve. Ela fora até o rancho inúmeras vezes para visitar os pais, e, todo verão, enviara Jake e a irmã ali para passar algumas semanas. Mas Boston era o seu lar, como o rancho jamais fora. Elise ainda não entendera a decisão do filho de dar as costas à sofisticação endinheirada em favor de trabalho duro e espaços amplos. Mas Jake tinha a sua própria fortuna, construída por meio de bons investimentos e riscos bem calculados. Não precisava se escravizar a uma mesa para conseguir a sua parte da Hunter Media. Sua mãe podia não entender a sua decisão, porém havia, enfim, aceitado-a. – E quando é que sua mãe ficou de chegar? Jake olhou para o avô. – Hoje, em algum momento. E, com sorte, até amanhã, estará a caminho de volta para Boston. – Uma pena ela ter de voar até aqui para que você assinasse papéis que poderia ter enviado por fax. – Sabe como é a mamãe. Ligada nos detalhes. – Sacudindo a cabeça, Jake saltou da cerca, as surradas botas marrons afundando na terra fofa do curral. – Ela quer os documentos com firma reconhecida e sua assistente é tabeliã. – Útil – disse Ben. – Mas sua mãe sempre foi eficiente. Eficiente. E teimosa. E havia parte de Jake que ainda não conseguia acreditar que a mãe houvesse desistido de levá-lo de volta para Boston. Mas não fazia diferença, não é? Ele não iria a lugar algum. Montana era o seu lar. Seu santuário. E, de maneira alguma, abriria mão dele. AS MÃOS de Cassidy Moore estavam doendo após uma hora segurando o volante com tanta força que as juntas estavam brancas. Subir dirigindo a montanha fora mais angustiante do que teria pensado. Talvez, se a pista estreita fosse reta em vez de sinuosa, com a ocasional curva em noventa graus,

não teria sido tão ruim. Mas as curvas estavam ali, assim como o íngreme despenhadeiro do lado esquerdo. Se tivesse sabido que tipo de passeio seria, teria alugado um tanque no aeroporto, em vez do sedã de tração nas quatro rodas que estava dirigindo. – Todavia, um tanque jamais teria cabido nesta estrada – sussurrou para si mesma. É sério. As pessoas que construíram a estrada não poderiam tê-la feito um pouquinho mais larga? Cada vez que um carro vinha na sua direção, ela se encolhia toda em antecipação a uma terrível batida. A única coisa boa é que ainda não estavam no meio do inverno. – Imagine lidar com esta estrada na neve! Ficava arrepiada só de pensar. Normalmente, era provável que gostasse do passeio pelas montanhas, rodeada pelo colorido outonal. Mas a ameaça de morte iminente meio que acabava com a diversão da coisa toda. Cassidy estava fora do seu ambiente e sabia disso. Nascida e criada em Boston, jamais estivera além dos limites do lado oeste de Massachusetts. De modo que estava acostumada a arranha-céus, ruas movimentadas e sinais de trânsito a cada quarteirão. No seu mundo, prédios altos criavam despenhadeiros sombrios na cidade, e o som de carros buzinando garantiam que jamais se teria um pouco de silêncio. Ainda assim, ficaria bem. Apenas passaria a noite ali, e, no dia seguinte, voaria de volta para Boston com a documentação assinada de que a patroa precisava. Saiu da estrada estreita e pegou uma pista de cascalho que tomou uma inclinação acentuada. Quando emergiu por baixo do arco de árvores, simplesmente parou o carro, desligou o motor e ficou olhando. Meu filho se recusa a deixar o seu ranchinho, a chefe dissera. De modo que terá de ir até ele e conseguir assinaturas para estes documentos. Ranchinho. Sacudindo a cabeça, Cassidy desceu do carro, seus calcanhares precariamente apoiados no cascalho sob os pés. Ela passou os olhos lentamente pelos seus arredores, antes de eles voltarem a se pousar sobre o “ranchinho”. Não havia nada de diminutivo nele. Tudo bem, a única experiência que Cassidy já tivera com ranchos fora o que vira em filmes de final

de noite. Contudo, aquilo não era um lugar-comum. O lar de Jake Hunter era um palácio na montanha. Com dois andares, a casa principal de madeira e vidro, tinha janelas que iam do chão ao teto em cada um dos andares, oferendo ampla vista do lago abaixo. Pinheiros se aglomeravam ao redor da casa, fazendo com que ela parecesse ser, de fato, parte da paisagem, em vez de uma intrusa. Havia outras casas menores espalhadas pela propriedade, sem dúvida para os empregados que ali trabalhavam. Sortudos, Cassidy pensou, pois não conseguia se imaginar subindo e descendo aquela montanha todos os dias para chegar ao trabalho e voltar para casa. – Olá, minha jovem. Surpresa com a voz grave que veio de trás dela, Cassidy girou tão rapidamente que um dos saltos ficou preso no cascalho, desequilibrando-a. O homem mais velho agarrou-a pelo braço, oferecendo apoio. – Não quis assustá-la – falou ele, sorrindo. Devia estar na casa dos setenta; contudo, os olhos eram astutos e a pele era como couro curtido por anos no sol. Seu sorriso era caloroso e a sua voz, gentil. – Desculpe – disse Cassidy, estendendo a mão. – Não o escutei se aproximando. Sou Cassidy Moore. Ele apertou a mão dela com firmeza. – É a nova assistente de Elise. Sou o pai dela, Ben Hawkins. – Ela tem os seus olhos. O sorriso dele ficou mais largo. – Os olhos são meus; porém, felizmente, todo o resto ela puxou da mãe, que Deus a tenha. – Ele deu um passo para trás e disse: – Está aqui para ver meu neto. – Estou – respondeu, grata pela mudança de assunto. – Tenho alguns papéis para ele examinar e assinar… – Minha filha adora papelada – falou ele, acenando com uma das mãos. – Venha comigo. Eu a levarei até Jake. Ela olhou para o seu carro, pensando na bolsa largada no assento do carona, mas se deu conta de que não estava em Boston, e um trombadinha não ia enfiar a mão lá dentro para pegá-la, nem nada. Sendo assim, seguiu Ben

Hawkins com passos cuidadosos que nem de longe se comparavam às suas passadas longas e confiantes. Cassidy viera vestida para impressionar, e, agora que era tarde demais, estava reconsiderando a prudência da decisão. Estava usando uma calça preta, uma camisa social branca e um blazer vermelho. Os sapatos de saltos altos pretos acrescentavam quase dez centímetros ao seu mísero 1,72m, e, na cidade, lhe concediam um pouco de confiança extra. Ali, caminhando sobre cascalho, só pôde fazer desejar o par de tênis enfiado no fundo da bolsa. Contudo, primeiras impressões contavam, e ela quis dar a ideia de profissionalismo para o filho da patroa. De modo que encontrou um jeito de manobrar por sobre o terreno acidentado e ainda causar uma boa impressão ao fazê-lo. – É um lugar lindo – disse. – É sim – concordou o homem mais velho, desacelerando um pouco os passos. – Morei aqui a minha vida toda; contudo, nos poucos anos em que ele esteve à frente de tudo, Jake fez tantas mudanças que, às vezes, olho ao redor e nem consigo acreditar no tanto que ele conquistou em tão pouco tempo. Ela olhou para ele. – Parece satisfeito com isso. – Ah, e eu estou. – Ele piscou para ela. – Sei que a maioria dos velhos não gostam de mudanças. Contudo, no que me diz respeito, se você não está mudando, está morto. Sendo assim, quando Jake veio de vez para Montana, passei o rancho para ele e disse: Faça o que quiser. – Rindo novamente, ele acrescentou: – E ele levou a sério as minhas palavras. Sorrindo, Cassidy decidiu que gostava de Ben Hawkins. – Ele começou construindo uma nova casa principal para o rancho – prosseguiu Ben, acenando para a estrutura espetacular à esquerda deles. – Ele mesmo a projetou, e também meteu a mão na massa em boa parte da construção. – É linda. – Ah, é sim – concordou ele. – Contudo, é casa demais para um homem sozinho. – Sozinho? Também não mora aqui? Ben riu.

– Não, eu moro ali. Ele apontou para uma das outras construções menores, e Cassidy notou que ela tinha um aspecto mais antigo, mais vivido, do que as estruturas mais novas ao redor. – É a casa do rancho original e, para mim, é um lar. Eles se aproximaram de um curral, e Ben a segurou pelo cotovelo, equilibrando-a quando passou do cascalho para a terra macia. Seus saltos afundaram e ela fez uma careta, mas sua atenção logo foi chamada para o cowboy montando um enorme cavalo negro no centro do curral. O cowboy parecia tão à vontade na sela quanto ela ficava atrás de uma poltrona de trabalho. Homem e animal se moviam como um só, e Cassidy aproximou-se da cerca, fascinada. – É o meu neto, Jake – informou Ben. – Vou avisá-lo de que está aqui. Ben afastou-se, mas Cassidy não o viu ir. Em vez disso, estudou o cowboy com ainda mais atenção. E se deu conta de por que a patroa ainda não fora capaz de convencer o filho a se mudar para a cidade. Um homem tão à vontade sobre um cavalo jamais seria feliz em uma cidade de carros e concreto. Mesmo de longe, havia um quê de primitivo nele que a intrigava, ao mesmo tempo em que seus pensamentos sussurravam palavras de cautela. Afinal de contas, não estava ali para admirar o filho da patroa. A visita não só seria breve, como diria respeito estritamente aos negócios. O que não significava que não podia admirar a vista, pensou. Ben assoviou, e Jake ergueu a cabeça, antes de voltar o olhar para Cassidy, quando o avô apontou para ela. Viu as feições dele se retesarem e procurou se convencer de que não tinha importância. Contudo, quando ele avançou com o cavalo na direção dela, ela deu um único passo para trás, para longe da cerca do curral. Será que todos os cavalos eram tão grandes? Jake Hunter saltou do animal e, ao mesmo tempo em que apoiou o antebraço na parte de cima da cerca, descansou a ponta da bota surrada na parte de baixo dela. Cassidy engoliu em seco. De perto, ele conseguia ser ainda mais intrigante. Cabelos escuros, a maior parte escondida debaixo do chapéu, roçavam a gola da jaqueta de couro marrom. Os olhos eram tão azuis e tão duros que pareciam pedaços de gelo. A barba por fazer preta recobria o

queixo, e a boca se estendia em uma fina linha reta. O jeans era desbotado e gasto, e, por sobre eles, usava uma clara calça de couro, que parecia abraçar o que pareciam ser pernas muito musculosas. Sentindo algo quente e íntimo se espalhando pelo seu corpo, Cassidy inspirou fundo o ar frio das montanhas, torcendo para que a ajudasse. Não ajudou. – Você não é o que eu estava esperando – falou ele baixinho. Eu poderia dizer o mesmo, ela teve vontade de dizer. Mas não o fez. Isso era ridículo. Estava ali para realizar um serviço. Aquele era o filho da patroa dela, pelo amor de Deus, e ficar ali, babando por ele, como uma idiota, não era o tipo de impressão que planejara causar. – Bem, é um prazer conhecê-lo, de qualquer forma – disse ela por fim, estendendo uma das mãos. Ele olhou para a mão estendida por um ou dois longos segundos, em seguida esticou a sua por sobre a cerca e a apertou. Uma descarga de eletricidade na mesma hora percorreu o braço dela, se assentando no interior do peito e fazendo o coração dela galopar desembestado. Ah, minha nossa. Estou aqui há dez minutos e já estou usando metáforas de cavalos. Soltando-a, Jake tirou o chapéu e passou a mão pelos cabelos, o que só fez piorar um pouco as coisas para Cassidy. Afinal de contas, ele realmente tinha de ter um cabelo tão lindo, espesso e reluzente? – Mike! – O grito a sobressaltou, despertando-a de seus pensamentos. Graças a Deus. Um outro homem respondeu, e Jake ordenou: – Cuide de Meia-noite, por favor? Tenho negócios a tratar. – Claro, chefe – disse o homem. – Meia-noite é o seu cavalo? – Isso mesmo. Jake saltou por sobre a cerca e aterrissou no chão diante dela, provocandolhe outra sensação de perigo. Cassidy tentou se controlar. Não era do tipo de mulher de ficar sonhando acordada com um homem lindo. Normalmente. Jake Hunter parecia ser uma exceção. Era tão alto que ela se sentiu uma anã quando ele se postou diante dela – mesmo com os saltos altos, que agora estavam afundando ainda mais na terra macia.

Franzindo a testa, ele olhou para baixo, antes de fitá-la nos olhos e perguntar: – Veio de salto alto? Para um rancho? – É um problema? – Não para mim. Um ligeiro sorriso lhe curvou os lábios por um instante. Tão rápido que ela não pôde ter certeza do que vira. Depois, ele virou-se e seguiu para a casa. Ela o observou marchar determinadamente com aquelas pernas compridas sobre a trilha de cascalho. Ele jamais olhou para trás. Não se deu ao trabalho de ajudá-la, como o avô fizera. Fumegando em silêncio, Cassidy retirou um dos saltos da terra, e depois o outro, e avançou desajeitadamente na direção da casa. Sua primeira impressão fora terrível. Ele agora achava que ela era uma idiota por não se vestir apropriadamente. Mas tudo bem; afinal, ela o considerava um ogro por sair andando na frente e a deixar para trás, quando sabia muito bem que andar de salto alto por sobre o cascalho era praticamente um esporte radical. E lá se iam aqueles pensamentos calorosos e íntimos. Para uma mulher ter uma fantasia descente, o herói de tal fantasia tinha de ser ao menos civilizado. O que parecia ser esperar muito de Jake Hunter. JAKE SEGUIU direto para o grande salão e para o bar. Normalmente, seria cedo demais para um drinque, mas hoje era diferente. Hoje, olhara no fundo de um par de olhos acinzentados e sentira o despertar de algo em que sequer pensara nos últimos dois anos. Diabos, no que dependesse dele, jamais teria sentido novamente aquele profundo formigar ardente de expectativa. A única outra vez em que experimentara algo parecido resultara em um casamento infernal. – Bons tempos – murmurou, jogando o chapéu sobre a cadeira mais próxima. Ele lançou um olhar rápido na direção das amplas janelas da frente, onde a mulher ainda estava avançando na direção da casa por sobre a extensão de cascalho, com passos curtos e inseguros que o fizeram se sentir quase culpado por deixá-la para se virar por conta própria. Quase. É, poderia tê-la ajudado cruzar o terreno irregular, mas teria de tocála para fazer isso, e aquela vibração de algo quente e complicado ainda estava

tão fresco em sua mente que ele não quis correr o risco de repetir. – Eu não pedi que ela viesse aqui – sussurrou, antes de servir uma dose de uísque irlandês em um copo de cristal, que ele entornou de um gole só. Seu olhar se fixou nela além da janela. Atrás dela, o céu estava se enchendo de pesadas nuvens acinzentadas, trazendo chuva ou neve. Em Montana, nunca dava para se saber ao certo. O vento soprou os escuros cabelos louros de seus ombros, erguendo-os ao redor da cabeça como se fosse um halo. O curto paletó vermelho agarrava-se aos impressionantes seios, terminando na cintura fina. A calça preta ao sabor do vento salientava as pernas, pequenas, porém definitivamente bem torneadas, e aqueles estúpidos sapatos de salto alto bambeavam com cada passo. Uma garota da cidade. Exatamente como a última mulher que ele deixara entrar em sua vida. E, ao mesmo tempo em que seu corpo sentiu uma onda de interesse, seu cérebro gritou por um pouco de sanidade. Por que diabos se permitiria ficar interessado no mesmo tipo de mulher que arrancara um pedaço de sua alma, não fazia muito tempo? Pensou em se servir de outra bebida, mas desistiu quando a assistente da mãe, por fim, alcançou a casa. – Senhor Hunter? – Aqui dentro. Escutou primeiro os saltos altos batendo no piso de madeira. Notando que as batidas estavam chegando mais perto, saiu de trás do bar de carvalho para recebê-la. Ela se deteve na entrada em forma de arco, e ele viu os olhos dela passarem pela sala. Viu prazer e aprovação em seu olhar, e sentiu uma ligeira pontada de orgulho. Quando se mudara permanentemente para o rancho, quis construir uma nova casa principal maior. Algo capaz de abrigar toda a família quando ela viesse visitá-lo. Algo capaz de marcar a terra como sendo sua. Quisera deixar a sua marca no rancho, e seu avô lhe dera carta branca. Fizera um bom trabalho no lugar. Ele mesmo o projetara, com a ajuda de um arquiteto. Quisera dar a impressão de que a casa sempre estivera ali, como parte da floresta, e trazer para dentro a natureza. Ficara satisfeito com o resultado. As vigas de suporte foram construídas de modo a lembrar troncos de

As vigas de suporte foram construídas de modo a lembrar troncos de árvore. As janelas abaixo delas mostravam o lago e os inúmeros quilômetros de céu aberto, floresta e terra descampada que faziam de Montana o melhor lugar no mundo para se morar. Sofás e poltronas de couro marrom-escuro estavam distribuídas ao redor do grande espaço aberto, e uma grande lareira de pedra ocupava a parede ao fundo, as chamas dançando em seu interior. – Puxa – disse ela, ao adentrar lentamente o aposento. – Simplesmente… puxa. – Obrigado. – Ele sorriu, apesar de tudo, gostando da reação dela ao lar que ele adorava. – Eu admito, é espetacular. – Ah – disse ela, sacudindo a cabeça ao olhar ao redor –, é mais do que espetacular. É tão lindo que posso até perdoá-lo por ter sido um cretino e me deixar lá fora, tendo de vir sozinha para dentro da casa. Surpreso, ele riu. – Cretino? E isso é jeito de falar com o filho da sua patroa? Frios olhos acinzentados o olharam de alto a baixo. – Tenho a impressão de que ela não me culparia. Ele considerou um pouco, imaginando a reação da mãe a como ele abandonara a assistente dela plantada no meio do gramado, e teve de se encolher. – Não. Provavelmente não. – Há algum motivo em particular para não estar feliz de me ver? – perguntou ela. – Ou desaprova mulheres em geral? Um dos cantos da boca de Jake se repuxou. – Vamos responder isso com uma outra pergunta. É sempre tão franca? – Normalmente sou – falou ela, assentindo. – Mas provavelmente não deveria ser. Sendo assim, talvez devêssemos nos considerar quites e recomeçar do zero. De acordo? Ele a fitou por um longo instante e tentou não reparar que os olhos dela eram da cor da névoa que se levantava da superfície do lago. Nem que o cabelo dela parecia macio e revolto, como se ela houvesse acabado de pular da cama. Droga, realmente fazia muito tempo desde a última vez em que tivera uma mulher. – Tudo bem – concordou, interrompendo o raciocínio antes que ele

– Tudo bem – concordou, interrompendo o raciocínio antes que ele fugisse ainda mais ao seu controle. – De acordo. Agora, tem alguns documentos para eu examinar e assinar, não é? – É. Estão na minha bolsa, no carro. Ela chegou a se virar, como que para voltar a cambalear por sobre o cascalho para buscar a bolsa. Jake a deteve, dizendo: – Um dos rapazes trará as suas coisas para dentro. Deve estar cansada do voo e de subir a montanha dirigindo… – Na verdade – admitiu ela –, adoraria uma ducha e trocar de roupas. Ah, ele se recusava a pensar nela no chuveiro. Contudo, estivera ciente de que ela passaria a noite lá. Eram duas horas de carro do aeroporto, e, quando ele terminasse de examinar os papéis, antes de assiná-los, já estaria escuro demais para ela descer a montanha dirigindo com segurança. De modo que ela passaria a noite e iria embora pela manhã. Quanto mais cedo, melhor. – Minha governanta deixou um quarto pronto aguardando-a – falou ele abruptamente. Conduzindo-a até o outro lado do aposento, ele apontou para uma escadaria diante da porta da frente. – No topo das escadas, vire à direita. Terceira porta à sua esquerda. – Muito bem – disse ela, já seguindo para as escadas. – E obrigada. – O jantar será às sete – avisou ele. – Desça quando estiver pronta. Ela pousou uma das mãos sobre o corrimão pesadamente entalhado e virou a cabeça para perfurá-lo com um demorado olhar. – Eu o verei em uma hora. Poderemos examinar a papelada antes do jantar. – Tudo bem. Boa ideia. Lembrar que se tratava puramente de negócios. Sua mãe não enviara uma mulher para lhe aquecer a cama. Ela enviara a própria assistente para, enfim, dar a Jake aquilo que ele quisera por anos. Liberdade do conglomerado familiar dos Hunter. Liberdade para tocar a vida como queria. O fato de a mensageira da mãe ser mais do que ele esperava… bem, isso não faria diferença depois que ela tivesse ido embora.

CAP ÍTULO 2

ALGUNS MINUTOS mais tarde, Cassidy estava se esforçando para relaxar em um quarto de dormir digno de uma princesa. Estava cansada, e queria uma ducha e algo para comer. Todavia, primeiro, pegou o celular para verificar se havia cobertura de rede por ali. Não ficou surpresa de descobrir que o sinal era excelente. Diabos, Jake Hunter provavelmente construíra a própria torre de celular na montanha. Sacudindo a cabeça, ela apertou a discagem rápida e escutou a linha chamando até a irmã atender. – Oi, Claudia – falou Cassidy, sorrindo. – Só queria avisar que cheguei em segurança. A irmã mais nova riu. – É, Montana não fica do outro lado da Lua, de modo que, quando não soube de nenhum acidente aéreo, supus que estivesse bem. – Ui. Cassidy largou-se na beirada da cama e passou os olhos pelo quarto. Por mais espetacular que o resto da casa fosse, o quarto era tão grande quanto todo o seu apartamento em Boston. E bem melhor mobiliado, ela acrescentou, silenciosamente. Mais uma vez, janelas que iam do chão ao teto ofereciam aquela tremenda vista de água cercada de pinheiros que se curvavam ao sabor do vento. Tapetes coloridos se estendiam sobre o reluzente piso de madeira, o fogo ardia animadamente na lareira, e duas confortáveis poltronas se encontravam diante dela, a cena toda tão aconchegante que merecia estar em um cartão de Natal. Sob o estreito aparador encostado na

parede, havia uma garrafa de cristal, provavelmente contendo conhaque, ladeada por dois copos bojudos. Também havia duas garrafas de vinho. Tinto e branco, e taças para servi-los… E Cassidy pretendia se aproveitar deles assim que desligasse o telefone. A cama na qual estava sentada era enorme e coberta por uma colcha de seda de várias tonalidades de verde, lembrando-a da floresta ao redor da casa. O colchão era tão macio e acolhedor que praticamente estava implorando para ela dormir nele. – Como foi o seu teste hoje de manhã? – Gabaritei – respondeu Claudia, antes de rir alegremente. – Quando terminar, eu serei a melhor médica do país! – Será sim. E a mais modesta, também – falou Cassidy, ante o entusiasmo da irmã. Desde criança Claudia queria ser médica, e, agora que estava cursando a faculdade, ninguém podia com ela. Graças às bolsas de estudo e ao generoso salário que Elise Hunter pagava a Cassidy, não teriam de se preocupar com os gastos com a faculdade, e Claudia poderia correr atrás do sonho de sua vida. – E então, como estão as coisas no Oeste Selvagem? Cassidy riu. – Nenhum bangue-bangue, se é o que quer saber. É realmente lindo, embora o filho de Elise seja meio… Hummm. Como explicar a intensa atração, combinada com a atitude de ogro? – Ah – disse a irmã. – Pressinto romance. Cass está interessada em um macho de carne e osso. – Não estou interessada. – Tudo bem, era mentira, mas ela jamais admitiria. Além do mais, interesse e atração eram duas coisas diferentes, certo? Interesse sugeriria que ela estava olhando para Jake Hunter como mais do que apenas um homem bonitão com uma atitude terrível. Atração era um imperativo biológico involuntário para a sobrevivência das espécies e… ah, pelo amor de Deus, ela parecia um dos professores de Claudia. Para a irmã, disse: – Estou aqui apenas para conseguir a assinatura dele em alguns documentos, e então, amanhã de manhã, estou no primeiro voo de volta para casa. – Aham. Amanhã de manhã significa que vocês ainda têm toda a noite. É, eles tinham mesmo. Engraçado que a ideia de passar a noite no rancho só

É, eles tinham mesmo. Engraçado que a ideia de passar a noite no rancho só a incomodara depois que dera uma boa olhada em Jake. Agora, era diferente. A descarga de sensações que sentira só de apertar a mão dele a deixara estranhamente desnorteada, e ela não gostara nem um pouco disso. Não que fosse contar para Claudia, é claro. – Há algum motivo para a minha irmã caçula estar tentando me empurrar para um homem que nunca viu? Cassidy adiantou-se até a janela. – Porque minha irmã mais velha já passou tempo demais vivendo como uma freira – retrucou Claudia. – Há uma eternidade que você não sai com ninguém. Por acaso se lembra do que é diversão? Ofendida, Cassidy sentou-se no sofá da janela, apoiou-se de encontro à vidraça e disse: – Eu me divirto o tempo todo. – Fazendo o quê? – Gosto do meu emprego… – Trabalho não é diversão. – Tá bom. Bem, eu fui ao cinema ainda… – Parou para pensar e amarrou a cara ao se dar conta de quanto tempo atrás isso realmente acontecera. – As pessoas dão demasiada importância para a diversão. – Aham. – Um conhecido suspiro de exagerada paciência veio do outro lado da linha. – Já sou grandinha agora, Cass. Pode parar de se bancar a mãe substituta. Com o olhar fixo naquela vista fantástica, Cassidy permitiu que as palavras da irmã ecoassem pela sua cabeça por um ou dois segundos, antes de dizer: – Claud, eu nunca vi a coisa dessa maneira. – Ah, meu bem, eu sei. – Claudia voltou a suspirar. – Cass, você foi ótima. Sempre esteve ao meu lado, mas sou adulta agora… – É – interrompeu Cassidy sarcasticamente –, é praticamente uma idosa com 19 anos de idade. – … e estou na faculdade – prosseguiu Claudia, como se a irmã não tivesse dito uma única palavra. – Você realmente deveria começar a se concentrar na própria vida. – Eu tenho uma vida, muito obrigada. – Você tem trabalho – corrigiu Claudia. – E tem a mim. E Dave. Mas nosso

– Você tem trabalho – corrigiu Claudia. – E tem a mim. E Dave. Mas nosso irmão está casado e tem os próprios filhos. Verdade. Durante tanto tempo foram apenas os três que era duro perceber que o irmão e a irmã caçulas estavam crescidos e não precisavam mais dela por perto o tempo todo, como costumava ser o caso. Especialmente Claudia. Ela estava apenas com 10 anos de idade quando a mãe decidiu seguir a “alma gêmea” do momento rumo ao horizonte. De modo que, aos 19 anos, Cassidy tivera de assumir. Fora, ao mesmo tempo, mãe e pai, já que o ilustre doador de esperma deles desaparecera pouco após o nascimento de Claudia. E, imodestamente, Cassidy admitia que fizera um bom trabalho. Talvez fosse por isso que estivesse sendo tão difícil parar. – Tudo bem – disse ela. Prometo que, assim que chegar em casa, vou arranjar uma vida. – Por que esperar? Nada como o presente momento para começar. Está em um rancho com um cowboy, pelo amor de Deus. É uma fantasia clássica. Ele é bonitinho? Bonitinho? Não. Jake Hunter era másculo demais para ser relegado a um mero “bonitinho”. Ele era um arraso. Ou um pão. Ou forte, masculino e tudo mais. Porém, bonitinho, não. – Eu não notei – mentiu. – Está bem. – A irmã riu. – De qualquer modo, o meu ponto é: relaxe um pouco. Aproveite. Paquere. Considere um treinamento, para quando voltar para casa e eu encher o seu saco para você fazer para valer. Flertar? Com Jake Hunter? Ah, Cassidy achava melhor não. Primeiro, ele era filho da patroa dela. De modo algum arriscaria um trabalho que pagasse tão bem por um breve flerte… mesmo que ele estivesse interessado, o que provavelmente não estava, considerando o modo como falou com ela. Contudo, mais do que isso, Cass não era do tipo de garota de aventuras de uma noite apenas. Ela se sentiria pouco à vontade e fácil demais, tanto que não seria capaz nem de aproveitar o momento; sendo assim, de que adiantaria? Deus. Jake realmente a chamara de franca? Seus pensamentos estavam girando totalmente fora de controle no interior da cabeça dela. E, subitamente, não quis mais pensar naquilo. – Não tem outro teste hoje à tarde?

– Está vendo? – Claudia riu. – Está focada demais na minha vida. Hora de encontrar a sua própria, Cass! Amo você! Quando a irmã caçula desligou, Cassidy ficou apenas fitando o telefone, pensando na breve conversa. É, talvez Claudia tivesse razão; contudo, em sua própria defesa, Cass não tivera exatamente os melhores exemplos de relacionamento na sua vida. O pai de Cass abandonara a família quando Claudia nascera, alegando que três filhos eram simplesmente demais. Sua mãe passara de um homem para o outro, sempre à procura do seu “príncipe”. Mas não havia príncipes, apenas sapos que ela continuava a beijar na esperança de que houvesse uma mudança miraculosa. De modo que, em vez de seguir os passos da mãe, Cassidy trabalhou, fez faculdade e tratou de se certificar de que os irmãos permanecessem na escola. Seus esforços acabaram sendo recompensados. Dave era agora um bemsucedido empreiteiro, casado e com dois gêmeos de seis meses. E Claudia iria se tornar a médica que ela deveria ser. Mas talvez Cass tivesse mesmo permitido que o trabalho e a preocupação a envolvessem por completo. E talvez Claudia tivesse razão e fosse hora de Cass descobrir que havia mais na vida do que trabalho. Não que fosse descobrir agora, procurou se assegurar. – Bons tempos não começam com um cowboy mal-humorado, independentemente de como fosse lindo – disse em voz alta, a título de ênfase. – Além do mais, como você mesma disse, ele é o filho da sua patroa. Bem, isso deveria ser o suficiente para apagar quaisquer vestígios de atração que ainda ardessem em seu íntimo. Não podia se dar ao luxo de arriscar o seu emprego entregando-se a um ardor momentâneo que podia ou não significar que estivesse mesmo se sentindo atraída pelo homem rabugento lá em baixo. Não que sua patroa, Elise, fosse uma tirana, nem coisa parecida, mas, por que correr o risco? – Agora que isso está acertado, é hora de tomar uma ducha rápida e talvez tirar um rápido cochilo antes de descer para cuidar dos negócios – murmurou ela, jogando o celular sobre o veludo verde do sofá da janela. Ela adiantou-se até a cama, abriu o zíper da mala e pegou o que precisava antes de seguir para a porta de ligação, onde ficou paralisada. A casa

continuava a surpreendê-la. O banheiro era enorme e opulento. Mais uma vez, verde era a cor predominante, mas todas as tonalidades possíveis estavam representadas nos azulejos, no piso, nas bancadas de granito, no enorme chuveiro e principalmente na banheira de hidromassagem sob o janelão com sua vista para o lago. Ela olhou para o chuveiro, depois olhou para a banheira, que parecia estar chamando-a com seus frascos de xampu e loções. Não havia por que não começar sua nova aceitação de “diversão” em sua vida com um delicioso banho de espuma. – Muito bem – sussurrou ela, pegando uma fofa toalha branca. – Nada de ducha para você, garota. Um bom banho de banheira é o que terá. JAKE AJEITOU a gola da jaqueta ao redor do pescoço e lançou um olhar desconfiado para o céu escuro acima de sua cabeça. Apesar da resistência do vento frio, ele o ignorou e marchou na direção do celeiro. O melhor a fazer era tocar a vida. Tirar Cassidy Moore da cabeça e concentrar-se no que era real. No que era importante. E uma mulher que passaria menos de vinte e quatro horas no seu rancho não era importante. Foi recebido pelos aromas combinados de feno e cavalos ao entrar na enorme construção. Uma hora de trabalho duro depois, colocando feno e água para os animais e limpando baias, sentiu-se melhor. É claro que, uma vez concluído o trabalho, seu cérebro ficou com excesso de tempo livre. – É uma garota bonita. Revirando os olhos, Jake fungou. Não se deu ao trabalho de virar-se e olhar para o avô. – Ela não é uma garota, Pop. É uma mulher. – Quer dizer que você notou? Olhando para o homem mais velho, ele disse: – É difícil não notar, com ela rebolando por aí naqueles saltos altos. – Se isso foi a única coisa que notou, eu me preocupo com você, filho – disse Ben. Enfiando o chapéu na cabeça, Jake deixou o celeiro.

– Nesse caso, não precisa se preocupar. Não sou cego. – Ele olhou por sobre o ombro. – Apenas não estou interessado. Tudo bem, isso não era totalmente verdade. Seu corpo estava mais do que interessado. Era apenas o cérebro que tentava se manter racional. Já trilhara essa estrada antes, permitindo que seu desejo por uma mulher o cegasse para a realidade. Contudo, não havia por que se preocupar. A mulher em questão partiria de manhã cedo e, com sorte, jamais voltaria a vê-la. – Deixe para lá, Pop. – Jake continuou andando, sabendo, mesmo sem olhar, que o avô estava logo atrás dele. – Ela trabalha para a mamãe, e não vai ficar. Dois bons motivos para controlar a sua imaginação. – Uma mulher bonita aparece na sua montanha, e você quer ignorá-la. – Ele riu com desdém. – De fato, a juventude é desperdiçada nos jovens. Ante isso, Jake deteve-se e olhou para o homem mais velho. – Não sou tão jovem assim. De qualquer modo, não se sentia jovem. Aos 34 anos, ele fizera muito, vira muito. Após alistar-se para cumprir dois turnos de serviço como fuzileiro, e sobreviver a um casamento que jamais deveria ter acontecido, diabos, às vezes se sentia bem velho. Ben adiantou-se até ele e lhe deu um tapinha no ombro. – Sei que passou por tempos difíceis. Mas isso está no passado, rapaz, e está na hora de você seguir adiante. Seu problema é que passa tempo demais na sua cabeça, Jake. Sempre foi assim. Passe um pouco menos de tempo pensando e um pouco mais de tempo olhando para garotas bonitas. Talvez melhore a sua atitude. Jake riu baixinho. – Minha atitude está ótima, Pop. – Se é o que diz, rapaz. – Ben deu outro tapinha amigável no ombro do neto, antes de seguir na direção da sua casa. – Tudo que estou dizendo é que, se eu fosse você, não passaria o meu tempo nos estábulos cuidando dos cavalos, quando poderia estar conversando com uma garota bonita. Voltando o olhar para a casa principal, Jake pensou por um instante na mulher aguardando-o lá dentro. Provavelmente estava imaginando coisas. A explosão de sensações quando lhe apertara a mão não significara nada. Fora apenas uma coisa do momento. Reagira com tanta intensidade apenas porque

fazia meses que não descia da montanha. Celibato forçado podia deixar um sujeito meio sensível. Diabos, no fundo, precisava mesmo era de uma mulher. Qualquer mulher. Por isso reagira daquela maneira à assistente da mãe. Depois que ela fosse embora, seguiria para a cidade, encontraria uma mulher e resolveria o seu problema de “distração.” Duas horas mais tarde, estava no seu gabinete, quando escutou Cassidy Moore descendo as escadas. Já estava mais do que na hora, pensou. Será que sempre se atrasava para os seus compromissos, ou estava tão pouco ansiosa por aquela reunião quanto ele? Poderia deixá-la procurá-lo pela casa, mas não seria uma atitude muito corajosa. Adiantou-se até a porta e esticou a cabeça para o corredor. Bastou uma olhada para o interesse voltar a incendiar seu corpo. Ela trocara de roupas após o banho. Em vez da calça preta e do paletó vermelho, estava usando um jeans desbotado de aparência confortável e uma camisa de botão azul-escura, além de um par de tênis. O cabelo louro estava solto, tombando em ondas por sobre os ombros. Ele a notou olhando ao redor com apreciação, e sorriu. – Cansou dos saltos altos? – perguntou, sua voz grave parecendo reverberar no silêncio da casa. Ela virou bruscamente a cabeça na direção dele, seu olhar se chocando com o de Jake. – Você me pegou de surpresa. – Sinto muito. Não, não sentia. Gostara de dar uma demorada olhada nela sem que ela percebesse a sua presença. – Está tudo bem. – Cassidy fez um gesto de pouco-caso ante o seu pedido de desculpas. Olhando para as próprias roupas, deu de ombros e acrescentou: – Quanto aos sapatos de salto, não dava mais para colocá-los. Como a primeira impressão já fora mesmo causada, preferi o conforto. – Primeiras impressões são tão importantes assim? – É claro. – Ela veio andando na direção dele. – Represento a sua mãe, e a Hunter Media, e, mesmo sendo o filho dela, tenho de ser profissional. – Não sabia que minha mãe era tão tirana.

– Ah, ela não é. Isso não foi o que eu quis dizer. É só que levo o meu trabalho muito a sério e… – Relaxe – interrompeu ele, pois dava para ver nos olhos dela que estava preocupada com o que ele poderia dizer para a mãe. – Eu estava brincando. – Ah. – Ela inspirou fundo e expirou demoradamente. – Quem bom. Eu gosto mesmo do meu trabalho. – Estou certo de que gosta. E então, tem papéis para eu assinar? – Tenho. – Ela ergueu o envelope de papel pardo que descera trazendo em uma das mãos. – Desculpe se demorei mais do que pensei. Mas deitei naquela cama maravilhosa e adormeci. Acho que estava mais cansada do que pensei. Mas está tudo aqui. Sua mãe disse que enviou uma cópia para o seu advogado, para que ele pudesse dar uma olhada. – É. – Não que estivesse preocupado que a mãe pudesse tentar enganá-lo. Embora não duvidaria se ela tivesse tentado colocar em algum lugar uma cláusula que o obrigasse a visitar Boston, pelo menos, umas cinco ou seis vezes por ano. – Bom, é melhor terminarmos logo com isso. Ele voltou para o escritório, escutando os passos dela vindo logo atrás dele. Jake sentou-se atrás da mesa e aguardou que ela se sentasse diante dele. Quando Cassidy o fez, entregou-lhe o envelope, que ele abriu para retirar de lá de dentro o maço de papéis. Ela ficou olhando ao redor, seu olhar, por fim, se fixando na janela atrás dele, e a linda vista ali à mostra. – Como é que consegue trabalhar? – perguntou ela distraidamente. – Se fosse eu, passaria o tempo todo olhando pela janela. – Um dos motivos para ela ficar atrás de mim – falou ele, folheando os documentos. Deliberadamente, evitou olhar para a lista ou para ela. – Claro, mas não tem como não saber que ela está ali. Jake sabia que ela também estava ali, e isso era muito mais distrativo do que a fenomenal vista das montanhas que tanto adorava. Segurou a caneta com tanta força que a teria partido ao meio se não fosse feita de aço. Por que aquela mulher estava mexendo com ele daquele jeito? Ela ficou de pé e começou a circular pelo aposento, e Jake ergueu o olhar apenas o suficiente para vê-la. Ela examinou as pinturas penduradas nas

paredes, os livros nas estantes e até mesmo as fotografias na cornija da lareira acessa. Quando ela se voltou para ele, o olhar de Jake abaixou-se para os papéis sobre a mesa. – Esta casa é realmente impressionante – disse ela. – As vigas parecem troncos de árvore aqui dentro. Isso o fez sorrir. As vigas de sustentação eram uma de suas coisas favoritas, embora o construtor não tivesse gostado muito do trabalho extra que isso exigira. Desistindo de fingir que estava examinado os documentos, ele olhou para ela, acompanhando-a com os olhos enquanto Cassidy continuava sua inspeção do gabinete. Era um aposento grande, com mobília de madeira pesada e estofados de couro marrom-escuro, além de tapetes de cores discretas cobrindo o piso de madeira. Jake costumava passar muito tempo ali, de modo que gostava de ficar à vontade. – É uma casa grande para um homem sozinho – falou ela baixinho. – Gosto de ter muito espaço. – Posso ver que gosta. Mas eu acharia meio assustador ter uma casa enorme destas só para mim. – Assustador? Como assim? Intrigado, ele recostou-se na poltrona. Sorrindo por sobre o ombro, ela curvou-se para inspecionar os livros nas prateleiras mais baixas da estante. O olhar de Jake se fixou nas curvas das nádegas sob o jeans desbotado, e uma onda de calor percorreu o seu corpo com a velocidade de um raio. – Eu estaria sempre esperando que alguém pudesse invadir a casa. Franzindo a testa, ele desviou os olhos do traseiro dela. – Aqui não é Boston. – Ah, eu sei que não. – Ela endireitou-se e voltou para a poltrona do outro lado da mesa. Apoiando os cotovelos nos braços da cadeira de couro, cruzou as mãos sobre a barriga, inclinou a cabeça para um dos lados e disse: – Sabe, sua mãe quer mesmo que volte para Boston. – É, eu sei. – Um sorriso relutante lhe curvou os lábios. – Não é como se ela fizesse segredo disso.

– Ela fala muito de você. Acho que sente saudades. Ele reprimiu uma pontada de culpa. Culpa não resolvia nada. Não mudava nada. Franzindo a testa, Jake perguntou: – É assistente pessoal dela, não é? – Isso mesmo. Por quê? – Assistentes não fazem juramento de sigilo e discrição? Ela deu de ombros. – É filho dela. E não é como se não soubesse tudo que estou lhe contando. Verdade. Mas não gostava de ter alguém o lembrando de que a mãe sentia a sua falta. Sabia que ela sentia. Mas ele a via, e a irmã Beth com a família, sempre que visitavam o rancho. Era o suficiente. No que dependesse dele, Jake não voltaria para a cidade. – Por que é tão avesso a Boston? – perguntou ela baixinho. Ele estreitou os olhos ao fitá-la. – Sei que não foi minha mãe que lhe mandou fazer essa pergunta. – Não, isto é apenas eu sendo curiosa. – Uma palavra polida para enxerida. – Culpada. Não precisa responder. – É. Eu sei. – Mas vai responder – retrucou ela com um sorriso, acomodando-se mais confortavelmente na cadeira. – O que a leva a pensar assim? – Porque vai querer defender a sua posição. – Ah – disse ele, recostando-se na própria poltrona. – E por que eu deveria me preocupar com o que pensa de mim? – Ah, não deveria – disse ela. – Mas poderá se justificar para si mesmo ao me explicar. Curiosidade e irritação travavam uma guerra dentro dele. Será que mulheres nasciam sabendo como manobrar um homem a fazer o que elas queriam que ele fizesse? – Não é da sua conta – disse ele, por fim. – Ah. – Ela assentiu astutamente. – A melhor defesa é o ataque. Surpreso, ele riu. – Gosta de esportes? Ela deu de ombros.

– Meu irmão caçula jogou futebol americano no colégio e na faculdade. Fui a muitos jogos. E vejo que conseguiu mudar de assunto. Muito bem. Sacudindo a cabeça, Jake a estudou por longos minutos, e notou interesse e firmeza nos seus olhos acinzentados. – Tudo bem. Eu cresci na cidade grande. Mas esse rancho sempre foi um lar para mim. – E… – E, depois da faculdade e dos fuzileiros, não consegui me acostumar novamente com a cidade. Barulho demais. Gente demais. Coisas demais me sufocando. Ele ficou de pé, incapaz de permanecer mais tempo atrás da mesa. Adiantando-se até a lareira, pegou um atiçador e cutucou a lenha em brasa até ressuscitar as chamas. Engraçado, há muito tempo não pensava naquilo, e lembrar-se de retornar para casa de seu último turno de serviço e se ver cercado pelos insanos barulhos e multidões da cidade trouxe tudo de volta. Aquela incômoda sensação de desconforto que resultou no aperto gelado ao redor do coração e da alma, fazendo com que se sentisse como se estivesse lentamente congelando até a morte. Cerrando os dentes, ele engoliu em seco, lembrando-se de que deixara para trás aquela vida antiga, e disse: – Ali não era mais o meu lugar. Eu precisava de espaço para respirar. Não ia encontrar isso na cidade. Ela o estava observando. Não precisou vê-la para sentir o seu olhar. Sabia que ela não fazia ideia do que ele estava falando. Devia considerá-lo louco por dar as costas à Hunter Media, e tudo que isso representava. Mas não se voltou para ela. Em vez disso, ficou apenas fascinadamente fitando as chamas. Até que ela falou, rompendo o silêncio. – Realmente, eu me solidarizo com sua mãe, mas não o vejo morando em Boston. Ele ergueu a cabeça e lançou um olhar na direção dela. – É mesmo? Por quê? Ela riu baixinho. – Bem, em primeiro lugar, entendo tudo que disse. Às vezes, as multidões no centro da cidade me fazem sentir como se não conseguisse respirar.

Ele assentiu. – Contudo, em segundo lugar… Por favor. Você usa jeans, botas e um chapéu que consegue esconder os seus olhos das pessoas. Ela era observadora, não era? – Não consigo vê-lo sentado em reuniões de diretoria usando terno e gravata e bebendo expresso. Ele bufou ante aquela ideia. – É, isso nunca ia acontecer. – Acho que sua mãe entende isso agora – afirmou Cassidy. – Ela está desapontada, mas entende que você jamais voltará a morar na cidade. – Ótimo. Demorou um bocado para isso acontecer. Há anos a ideia de Jake retornar para Boston e assumir o comando da Hunter Media era ponto de discórdia entre ele e a mãe, mesmo ele repetidamente salientando que a irmã mais nova, Beth, estava bem ali, mais do que capaz e disposta a assumir o posto. – Mas estou curiosa. – Mais curiosidade? – Se não perguntar, nunca vou descobrir nada. – Perguntar o quê? – Por que o cowboy solitário no topo da montanha? – Seus olhos acinzentados se fixaram nos dele, enquanto ela o observava como se pudesse ler as respostas no rosto dele. – Você deu as costas a uma dinastia na cidade para vir para cá. Por que aqui? Nesta montanha? Neste lugar? – Franca, novamente – murmurou ele. – Na realidade, não. Enxerida novamente. Ele riu ante a confissão. – Pelo menos é sincera. – Tento ser. Jake outrora achara que a sua “ex” também fosse uma mulher sincera. Acabou que ela era como a maioria das pessoas. Sincera apenas até onde era interessante para ela. Mas, diabos, daria uma resposta para ela. – Quando éramos garotos, Beth e eu costumávamos vir aqui todos os verões para ver nossos avós. Era tão diferente aqui... Maior, é claro. Porém, mais do que isso. Pop costumava me levar para pescar e me deixava

acompanhá-lo quando estava trabalhando com o gado. Em Boston, eu não passava de um garoto que diziam para tomar cuidado, para não falar com estranhos e que sequer podia usar o metrô sem escolta. – É sério? Você não podia usar o transporte público sozinho? Ele deu de ombros. – Meus pais eram cautelosos. Sempre diziam que garotos ricos podiam ser sequestrados. De modo que Beth e eu éramos constantemente vigiados. – Sacudindo a cabeça, ele prosseguiu: – Aqui, éramos livres. Podíamos correr por todo o rancho sem ninguém para nos tolher. Nadávamos no lago, caminhávamos na floresta. Era um mundo diferente para nós dois. Contudo, para mim, era o mundo que eu queria. Quando deixei os fuzileiros, vim direto para cá. Precisava deste lugar e… Ele se interrompeu subitamente, surpreso por ter lhe contado tudo isso. Diabos, jamais fora de falar do passado. Não gostava de olhar para trás. Também não acreditava em olhar para o futuro. Para Jake, o presente era tudo que interessava. O aqui e agora era tudo que ele podia controlar, de modo que era onde residia o seu foco. – Eu compreendo – disse ela baixinho. Jake endireitou-se, devolveu o atiçador à base e retornou para a mesa. Pegando os papéis, começou a lê-los, seus olhos deslizando com facilidade sobre os termos legais. Afinal de contas, era um Hunter, e crescera sabendo tudo que tinha de saber sobre acordos legais. – Não pedi a sua compreensão. – Que pena. Você a tem, de qualquer modo. Ele amarrou a cara para ela, mas Cassidy o ignorou por completo. – Só porque é recluso, não significa que tenha de ser rabugento também. Quem escutasse, acharia que ele era um maldito eremita. Não era. Costumava ir à cidade. Apenas não ia há algum tempo. – Quem diz que sou recluso? – Sua irmã. Jake revirou os olhos. – Beth acha que cinco minutos de silêncio é uma espécie de tortura. Cassidy riu, e Jake chegou à conclusão de que gostava do som. – Com os filhos que tem, acho que ela não precisa se preocupar muito com

– Com os filhos que tem, acho que ela não precisa se preocupar muito com silêncio. Ele olhou para ela. – Parece saber tanto a respeito da minha família. – Faz parte do meu trabalho – falou ela, dando de ombros. – Como assistente da sua mãe, tento tornar a vida dela mais fácil… a vida profissional e pessoal. Por sorte, gosto muito da sua irmã. E sua mãe é uma mulher brilhante. Estou aprendendo muito com ela. Levantando-se, ela deu a volta na mesa e curvou-se por sobre o ombro dele para apontar para algo na parte da frente dos documentos. – Eu quase ia esquecendo. Falar de sua mãe me lembrou. Ela enfatizou que deveria ler esta cláusula com especial cuidado. Uma vez assinado, o documento será irrevogável. Jake esforçou-se para se concentrar no lugar para onde ela estava apontando. Em vez disso, o perfume dela o envolveu. Algo fresco e puro, como uma floresta após a chuva. Ela cheirava à primavera, e inspirá-la deixou o seu cérebro confuso e o corpo tenso. Diabos, aquilo não ia dar certo. – É, estou vendo. Obrigado. Ele virou a cabeça para olhar para ela, e a sua boca ficou apenas a centímetros da dela. Ela o fitou nos olhos e desviou por um instante o olhar, antes de voltar a fitá-lo. Depois, lambeu nervosamente os lábios, e o retesar no interior de Jake fugiu ao controle. Piscando freneticamente, Cassidy recuou um pouquinho e manteve o tom de voz profissional ao dizer: – Uma vez que assine isto, estará abrindo mão de qualquer chance de retornar e comandar a Hunter Media. Basicamente, sua assinatura significará que aceita Beth como a herdeira do trono, por assim dizer. – É o que venho querendo há anos – falou ele, grato por ela haver recuado o suficiente para ele poder respirar sem inspirar o perfume dela. – Mas é permanente, de modo que a sua mãe quis que entendesse que isto não poderá ser desfeito. Ela não quer criar problemas com o conselho de diretores da Hunter Media. – Permanente. Ótimo. – Jake assentiu e deixou que seu olhar voltasse a se pousar sobre o maço de papéis. Muito mais seguro do que ficar fitando

aqueles olhos enevoados, contendo sombras e luz e… Diabos! Precisava ficar concentrado nos negócios, mas não conseguiria fazer isso agora. Não com ela tão perto. – Assinarei depois do jantar. Por que não vamos ver o que minha governanta deixou para nós? Sair do gabinete era uma boa ideia. A cozinha era um bom lugar, um aposento amplo e espaçoso. Bem iluminado. Nada de cantinhos aconchegantes nem motivos para Cassidy Moore ficar se apoiando nele. – Tudo bem. Estou faminta. Ele também. Contudo, o que quer que encontrassem para comer, Jake duvidava que fosse ser capaz de aliviar o tipo de voracidade que ele estava sentindo.

CAP ÍTULO 3

O JANTAR foi bom, embora um pouco tenso. Como o restante da casa, a cozinha parecia saída das páginas de uma sofisticada revista. Intermináveis extensões de armários de madeira, uma pesada mesa de pedestal em um dos extremos do aposento, paredes cor de ameixa e quilômetros de reluzente granito preto. Os utensílios eram de aço escovado e o efeito era aconchegante e íntimo, apesar do seu tamanho. Os dois se sentaram à mesa, silenciosamente comendo um saboroso ensopado acompanhado do crocante pão caseiro que Anna, a governanta de Jake, deixara para eles. Cass teria gostado da refeição, senão pelo fato de que seu anfitrião se fechara por completo. Era impressionante que há poucos minutos estivessem conversando com tanta facilidade e, agora, ele se transformara no recluso de que a irmã o chamara. Ela tinha de se perguntar o que mudara. O que subitamente o fizera se fechar a ponto de ignorar que ela sequer estivesse no mesmo aposento que ele? Naturalmente, Cass não suportou o silêncio por muito tempo. – Realmente não gosta de ter companhia, não é? – perguntou ela. Ele ergueu a cabeça, seu olhar se fixando no dela. Cass sentiu aquele olhar como se fosse uma descarga elétrica que provocou ondas de expectativa por sobre cada centímetro da sua pele. Talvez ela não devesse ter dito nada. Talvez tivesse sido melhor deixar as coisas como estavam, com o silêncio vibrando entre eles. Contudo, agora, era tarde demais. – O que a leva a dizer isso? Cass sacudiu a cabeça e apontou a colher para ele.

– Por favor. Está sentado aí como uma estátua. A não ser pelo olhar que está lançando para mim agora. Não disse uma palavra desde que nos sentamos para comer e, pela sua linguagem corporal, no momento, você está dizendo não fale comigo. Ele amarrou a cara para ela. – Está vendo? É exatamente o que quero dizer. – Tudo bem – murmurou ele, pegando a taça de vinho tinto diante de si. – Não costumo receber muita companhia aqui. – Não é surpreendente, considerando que está no topo da montanha e a estrada para chegar aqui é uma aventura desafiadora da morte – salientou ela, com um ligeiro arrepio ao se lembrar do passeio de carro até ali. Ele voltou a amarrar a cara. – Não há nada de errado com a estrada… – … que alguns metros a mais de cada lado não resolva – interrompeu ela. – De qualquer modo, agora que, de fato, tem companhia, mesmo que por pouco tempo, poderia tentar ser… gentil. – Gentil. Ele disse a palavra como se estivesse falando uma língua estranha. Cass sorriu lentamente. – Quer que eu defina isso para você? – Obrigado, acho que eu entendi. Embora o seu tom fosse sarcástico, um retorcer de seus lábios lhe disse que ele poderia até estar achando aquilo divertido. – Excelente. – Ela tomou um gole do vinho. – Então, vamos tentar uma conversa. Eu começarei. Este jantar está maravilhoso. Sua governanta é uma grande cozinheira. – Ela é – concordou ele. – Duas palavras. Não é muito, mas é um começo – disse ela, se divertindo com o brilho de irritação que cruzou o olhar dele. – Sei que eu vivo falando isto, mas a sua casa é simplesmente fantástica. Cada aposento que eu vejo deixa isso ainda mais claro. Mas esta cozinha é tão grande, e para cozinhar apenas para você. De certa forma, parece uma pena. – Não para mim. – Ele pegou um pedaço de pão e o jogou na boca. – Além do mais, o que quer que Anna cozinhe aqui, ela leva a maior parte com ela

para casa, para ela e para o marido. E, quando há alguma coisa grande acontecendo, ela cozinha para todo o rancho. – Alguma coisa grande? Ele deu de ombros. – Qualquer coisa que impeça que os vaqueiros do rancho voltem para seus chalés e cozinhem para si mesmos. Pode ser uma tempestade, ou um incêndio na montanha que estejamos ajudando a apagar. Ou mesmo um leilão de cavalos, quando temos clientes em potencial aqui reunidos. Cowboys precisam comer e trabalham mais duro quando você os alimenta bem. Cass ficou observando-o enquanto ele falava. Para um recluso, ele sabia falar quando tinha vontade. É claro que tudo que ela precisava fazer eram perguntas sobre o rancho que ele obviamente tanto amava. Havia um brilho no seu olhar, e cada palavra que falava era carregada de entusiasmo. Ela suspirou internamente e ficou grata que ele não pôde escutar e nem pressentir. Jake Hunter realmente era lindo. Não era justo que ela pudesse se sentir tão atraída por um homem que deveria permanecer intocado. Filho da patroa. Recluso. Geograficamente indesejável. E, no entanto… ao observá-lo, sentiu algo quente começar a brotar dentro dela. Seu sorriso fazia o coração dela disparar, e um frio glacial se instalar na boca do seu estômago. Isso sem falar nos arrepios de expectativa que estavam se instalando um pouco mais abaixo. Já fazia muito tempo desde a última vez em que sentira atração instantânea por um homem, e jamais com tanta intensidade. E por que ficava escutando a voz de Claudia sussurrando, Aproveite! Paquere! Viva!? Não podia fazer isso, podia? Não. De jeito nenhum. Apenas pensar em fazer o que ela estava pensando em fazer após conhecer o homem por algumas poucas horas provavelmente a qualificava para a posição de Vadia do Século. – Ah, Deus… – Você está bem? Ele estava olhando para ela. – Estou, por quê? Eu falei isso em voz alta?– perguntou ela. – Falou. O que foi? Está se sentindo bem? – Estou bem. – Era fantástico como estava ficando fácil para ela mentir.

– Estou bem. – Era fantástico como estava ficando fácil para ela mentir. Talvez devesse se preocupar com isso. – Eu, hã, estava pensando sobre a papelada e fazendo uma anotação mental para não me esquecer de pedir para que você a assine. Ah, isso não pareceu nem um pouquinho patético. – Muito bem, vamos lá acabar logo com isso, agora mesmo – disse ele, e carregou os pratos sujos até a pia. Ele os enxaguou, antes de pegar os dela e enxaguá-los também. – Gosto de um homem que limpa a própria sujeira. – É, bem, não tínhamos muitas empregadas na Marinha. Ele desligou a luz da cozinha, e a escuridão tragou o aposento. Cass não se dera conta de quanto tempo havia se passado; contudo, aparentemente, escurecia cedo nas montanhas. Não havia luz do lado de fora, de modo que era impossível ver qualquer outra coisa além dos reflexos deles nas vidraças ao cruzarem a casa. Seu olhar se fixou no homem marchando corredor abaixo na frente dela. Ela o olhou de alto a baixo, desde os cabelos se encaracolando sobre a gola da camisa de mangas compridas até o modo como o jeans apertado lhe envolvia as nádegas. O homem tinha uma bunda maravilhosa. Ah, minha nossa. Outra onda de ardor apossou-se dela, e Cass foi forçada a sacudir a cabeça em um esforço de afastar os pensamentos que insistiam em aparecer em sua cabeça. Desesperada por uma conversa, perguntou: – Quanto tempo passou como fuzileiro? Ele olhou por sobre o ombro para ela. – Quatro anos. – Sente falta? – Às vezes – admitiu ele, parecendo surpreso com a própria declaração. – Era tudo claro nas forças armadas. Nem sempre é assim na vida civil. – Acho que entendo – falou ela, feliz por ter algo em que se concentrar além de como o homem ficava lindo de jeans. – Mas não acho que eu seria muito boa em seguir ordens. Ele virou para dentro do gabinete, lançando outro olhar por sobre o ombro para ela. – É estranho, pois minha mãe sempre foi ótima em dar ordens.

– Verdade – Cass teve de admitir, seguindo-o até a mesa no outro extremo do recinto. As luzes estavam ligadas no gabinete, de modo que o mundo exterior permanecia sendo um reflexo no espelho do interior, com a escuridão traçando o contorno das duas pessoas emolduradas no vidro. – Mas ela também dá ouvidos a sugestões, e suponho que os oficias superiores nas Forças Armadas não sejam muito dados a isso. Ele riu e assentiu. – Tem razão. Mas ela podia vê-lo como fuzileiro. Alto, bonitão, provavelmente sensacional em seu uniforme. E havia também a atitude. Seguro de si, autoconfiante de uma maneira que a maioria dos homens simplesmente não era. Jake era o tipo de homem com quem as mulheres sonhavam e, se ela não tivesse cuidado, cairia facilmente nessa armadilha. Deslizando para a sua poltrona, ele voltou a passar os olhos pelos documentos, e, embora parecesse ser um gesto rápido, Cass sabia que também era muito atento. Além do mais, o advogado dele já examinara a documentação, de modo que foi meio anticlimático quando ele rabiscou o nome ao pé da última página. – Pronto – disse ele, parecendo satisfeito. – Espero que não venha se arrepender disso um dia – disse Cass, quando ele passou os papéis para ela. Realmente, não era da conta dela, mas ele estava abrindo mão de sua herança. Qualquer interesse que ele pudesse ter tido na Hunter Media agora se fora, e ela torcia para que ele tivesse considerado isto por todos os ângulos. – Não me arrependerei. É algo que já deveria ter feito há muito tempo. Cass sabia que ele estava falando sério, mas parte de si simplesmente não conseguia entender. Estava cortando os laços que o ligavam à família. Tudo bem, eram vínculos financeiros, e não emocionais. Contudo, ainda eram laços. Família era algo a que Cass jamais deixava de dar o devido valor, pois ela lutara com unhas e dentes para segurar o que restara da sua. Não conseguia imaginar chegar um dia em que iria querer que Claudia ou Dave lhe dessem espaço. Passara anos tentando manter-se e aos irmãos unidos, e não conseguia entender que Jake fosse capaz de virar as costas para uma parte da família dele. – Isso está magoando a sua mãe, sabe?

O rosto dele ficou tenso, e Cass achou que talvez houvesse ido longe demais. Contudo, agora que as palavras haviam sido ditas, não havia como voltar atrás. – Essa história de franqueza consegue ser irritante. – Eu sei. Mas não muda a verdade. – Ela vai superar – respondeu ele, e ficou de pé. A presença física dele era tão intimidante que Cass instintivamente quase deu um passo para trás. Contudo, em vez disso, ficou onde estava… embora estivesse com os nervos à flor da pele. – É filho dela e está recusando algo que ela e o seu pai trabalharam muito para construir. Ele bufou demoradamente e virou-se para ela. A intensidade do seu olhar tornou difícil para ela se concentrar nas palavras dele. – Meus pais construíram o sonho que eles queriam. Estou fazendo o mesmo. Minha mãe entende. – Ele sorriu discretamente. – Mesmo que queira fingir que não. E, se está preocupada com a Hunter Media, não precisa. Minha irmã, Beth, é a pessoa certa para tocar a empresa. – Pode ser – disse ela, e se perguntou por que estava dizendo tudo aquilo. Elise não pedira a Cass para interferir a seu favor, e provavelmente ficaria horrorizada se soubesse que Cass estava perturbando o filho dela por conta de uma decisão que já fora tomada meses atrás. Mas ela não pareceu ser capaz de se impedir de continuar. – Mas sua mãe odeia que esteja tão longe. Odeia que não queira fazer parte do dia a dia deles. Franzindo a testa, ele apoiou o quadril na beirada da mesa e a fitou nos olhos. – Por que está se esforçando tanto? Por que isto é tão importante para você? – Porque não se trata do negócio. Embora a maioria das pessoas mataria para fazer parte da Hunter Media. Trata-se de família, e, para mim, isso é importante. Mesmo nas sombras, ela viu as feições dele se retesando mais uma vez, e se perguntou se seria a única capaz de irritá-lo com tanta facilidade. – E acha que família não é importante para mim? – Eu não disse isso.

– Nem precisou. – O azul daqueles olhos ficou mais escuro. – Não sei por que estou me dando ao trabalho de discutir isso com você. Só está aqui há algumas horas. Não me conhece; no entanto, acha que pode dizer o que minha vida e minha família deveriam significar para mim. Cass estremeceu, sabendo que merecera essa. – Vou ser direto. Escute atentamente, porque não vou repetir. Amo minha família. Isso não significa que eu esteja disposto a morar em uma cidade superpopulosa e barulhenta para provar isso. Esta é minha vida. Este rancho. Esta montanha. Amar minha família não significa que eu esteja disposto a abrir mão de meus sonhos. E, desde que eu era criança, meus sonhos se concentram aqui. Sua voz foi áspera e baixa, e carregada de uma paixão que ela já notara que só aparecia quando Jake estava falando do lar que construíra ali. Estava defendendo suas escolhas para ela, quando, no fundo, não lhe devia explicações. E Cass não pôde deixar de estranhar que ele estivesse lhe dizendo isso, em vez de marchar para fora da sala. – Tem razão – disse. – Eu não o conheço, e não é da minha conta o que você faz. Eu só estava… – Não importa. – Ele pegou o maço de documentos de sobre a mesa e o passou para ela. – Agora está feito. Cass detestava ser interrompida, mas estava evidente que aquela conversa chegara ao fim para ele, que não estava nem um pouco interessado em qualquer pedido de desculpas que ela pudesse oferecer. A mão dele roçou na dela quando Cass pegou os papéis, e ela sentiu a mesma descarga de eletricidade que experimentara antes. Pior. Tinha certeza de que ele também sentira, porque os olhos dele se estreitaram e escureceram… o que lhe dizia que Jake estava tão contrariado com aquilo quanto ela. Subitamente, a sala pareceu ficar menor, como se as paredes houvessem se encolhido, deixando-os em um espaço que agora parecia… íntimo, de certa forma. – Eu provavelmente deveria dar um pulo no celeiro – disse ele baixinho. – Dar uma olhada nos cavalos. – Certo – concordou ela. – E é melhor eu subir. Tenho de sair cedo amanhã de manhã para pegar o voo de volta para Boston.

– É – murmurou ele, curvando a cabeça na direção dela. – Boa ideia. – Vou colocar um pouco de trabalho em dia antes de ir para a cama – sussurrou ela, embora trabalho fosse a última coisa a lhe passar pela cabeça. Podia sentir o calor do corpo dele puxando-a, e inclinou-se na direção dele, inclinando a cabeça, de modo a poder lhe observar o rosto à medida que ele foi se aproximando cada vez mais. – É melhor mesmo – falou ele, seu olhar percorrendo o rosto dela, antes de retornar aos olhos dela. Ele não precisou falar qualquer palavra para ela saber o que ele estava pensando… em parte porque era o mesmo que ela estava pensando. A luxúria estava viva e bem, e ansiosamente saltando para cima e para baixo no canto da sala. Um campo eletromagnético parecia estalar no ar entre eles, intensificando cada respiração, cada sensação, cada desejo. – Isto seria uma péssima ideia – disse Cass, lambendo os lábios em antecipação ao beijo que sabia que estava por vir. – Sem dúvida que seria – concordou ele, apossando-se da boca de Cass com a sua. O ardor explodiu dentro dela. O cérebro de Cass deligou-se, e o corpo dela, seus desejos e necessidades assumiram o controle. Ela deixou os papéis assinados caírem de sua mão e envolveu-lhe o pescoço com os braços. Jake a puxou para si, os braços firmes como correias ao redor da sua cintura, mantendo-a apertadamente colada a ele. A boca de Cass se abriu sob a dele, e o primeiro deslizar da língua dele roubou o que restava do fôlego dela. Ela gemeu um pouquinho ao entregar-se à fantástica reação fervilhando em seu interior. Cass já fora beijada antes, é claro, mas nada do que já experimentara poderia tê-la preparado para o que estava sentindo agora. Era como se estivesse sendo incendiada por dentro. Centelhas de sensações faiscavam em sua corrente sanguínea, e a batida do seu coração estava tão alta que chegava a ser ensurdecedora. Seu estômago se contorcia, e um intenso latejar começou no seu âmago. Entregou-se ao desejo que a retalhava por dentro. Mergulhando os dedos nos espessos cabelos macios, puxou a cabeça dele para si, respondendo ao beijo com tudo que tinha. Suas línguas se enroscaram

em uma dança de paixão que só poderia levar a um lugar. Um lugar aonde ela subitamente queria ir mais do que qualquer outra coisa. Não importava que mal o conhecesse. Não importava que passaria apenas uma noite na casa dele. Não importava que estivesse ouvindo “Alarmes de Vadia” tocando no fundo da cabeça. Tudo que importava era o momento seguinte. O toque seguinte. As mãos dele subiam e desciam pelas costas dela, enquanto a boca vorazmente saqueava a dela. Cass lhe sentia os toques como descargas de ardor que penetravam até os ossos, e, ainda assim, ela queria mais. Havia um desespero entre os dois. Um desejo primitivo, pulsante, que ansiava por ser respondido. Quando ele mudou de posição, cobrindo um dos seios dela com a palma de uma das mãos, Cass libertou-se do seu beijo, arquejando de prazer renovado. O polegar dele acariciou o mamilo enrijecido dela, e, mesmo sob o tecido da camisa e do sutiã, ela pôde sentir o calor das carícias. – Isto é um erro – sussurrou ele, enquanto abria os botões na parte da frente da camisa dela. – Sem dúvida – concordou ela, virando-se para que ele não tivesse de ir muito longe para alcançar o seu objetivo. – Definitivamente deveríamos parar antes que isto fuja ao controle. Ela abriu os olhos, fitou no fundo dos dele e perguntou: – Que controle? Ele riu. – Tem razão. E então a blusa dela estava aberta, as mãos dele sobre o sutiã de renda, e o mamilo já duro parecia querer perfurar o tecido delicado apenas para alcançálo. Cass gemeu baixinho, fitando o infinito enquanto se concentrava no que ele a estava fazendo sentir. Fazendo-a querer. Foi quando ficou alerta o suficiente para notar e se lembrar de que havia uma parede de janelas bem atrás deles e que, se alguém passasse do lado de fora da casa, seria agraciado com um espetáculo e tanto. – Ah, meu Deus! Contorcendo-se nos braços dele, ela virou as costas para o vidro. – O que foi?

– As janelas – murmurou Cass. – O mundo todo está vendo. Ele riu, e Cass amarrou a cara para ele. – Não é engraçado. – Também não é problema. Quando a casa foi construída, mandei instalar vidros tratados. Podemos ver o lado de fora, mas ninguém consegue ver aqui dentro. Tomada de alívio, ela o fitou nos olhos. – É mesmo? – Mesmo. – Ele deslizou a ponta de um dos dedos pelo centro do peito dela, e Cass estremeceu. – Lembra-se de mim? O recluso? O sujeito que gosta de privacidade? – Privacidade é bom… Com as beiradas da camisa dela ainda caídas para o lado, foi fácil para ele abrir o fecho frontal do sutiã, expondo os seios. O beijo do ar fresco na sua pele a deixou arrepiada, mas, em seguida, o ardor do toque dele veio tão rápido que Cass mal notou. Agora que sabia que ninguém podia vê-los, tornou-se quase excitante ficar ali postada diante daquelas janelas enquanto ele a tocava. Podia ver o reflexo deles nas vidraças, e ficou fascinada ao ver as mãos dele lhe cobrindo os seios. Seus polegares deslizaram sobre os mamilos intumescidos, acariciando, puxando, provocando, e tudo nela se acendeu como reação. Seu coração bateu mais forte, o latejar entre as pernas se tornando mais insistente, a respiração mais acelerada. E então ele curvou a cabeça e tomou um dos mamilos na boca, e o que restou de tênue controle desapareceu de vez. Havia apenas o momento. Aquele homem. E sua boca incrivelmente talentosa. Loucura ou não, ia mesmo fazer aquilo. Ia fazer sexo com o filho da patroa, e também não se arrependeria disso depois. – Jake… – É. – Ele ergueu a cabeça apenas tempo o suficiente para voltar a se apossar de sua boca com um breve e intenso beijo. – Deveríamos levar isto lá para cima e… Ao longe, a porta da frente bateu, e ambos se sobressaltaram. – Jake?

Uma voz masculina ecoou pela casa. – Droga – murmurou Jake–, é o meu capataz, Charlie. Deve haver algo errado. – Vá – sussurrou ela freneticamente. – Vá. Ele obedeceu, deixando a sala e descendo o corredor. O som das botas sobre o piso de madeira foi se afastando. Com os dedos trêmulos e a cabeça ainda vibrando devido à sobrecarga sensorial, Cass tratou de fechar o sutiã e abotoar a camisa. Passando as mãos pelo cabelo, ela inspirou fundo e quase choramingou ao se dar conta da realidade. Durante aquele poucos e maravilhosos instantes roubados, ela esquecera tudo que não fosse ser tocada por Jake. Contudo, agora, o frio do recinto estava superando o ardor residual em seu interior, e a lucidez também estava mostrando a cara. O alarme de vadia que ela escutara tão distante agora tocava como se fosse sinos de igreja reverberando pelo seu cérebro. O que passara pela cabeça dela? Bem, essa resposta era óbvia. Nada. Ela se entregara ao que estava sentindo sem sequer pensar no que inevitavelmente viria em seguida. Agora, com alguns instantes para pensar, sabia que o que quase haviam feito teria sido um erro colossal. Ela ficaria ali por apenas uma noite. E se Elise descobrisse? A patroa a mandara ali a negócios, não para pular na cama com o filho dela. Ah, Deus, isto era tão humilhante! Antes que tivesse tempo para processar o quanto fora idiota, Cass escutou Jake voltando para o estúdio com passos apressados. Não podia estar parada ali, esperando para ser arrebatada, quando ele chegasse. Cass curvou-se, pegou os papéis assinados do chão e os apertou de encontro ao peito como uma armadura medieval. Teria de dispensá-lo com gentileza. Dizer que, enfim, pensara um pouco, e que seria melhor que ambos esquecessem o que acontecera. – É isso. Fácil – sussurrou, torcendo para que parecesse mais confiante quando falasse com Jake. Pois nem mesmo ela estava acreditando em si mesma. Ele se deteve no vão da porta aberta, as sombras escondendo a maior parte de seus traços. – Olhe – falou ele–, estão precisando de mim nos estábulos.

Decepção e tristeza se acumularam dentro dela, apesar de haver estado prestes a presenteá-lo com um discurso semelhante. Ele a estava dispensando, antes que ela pudesse fazer o mesmo com ele. Não sabia dizer por que isso a incomodava. – Algum problema? Ele adentrou a sala, e ela pôde lhe ver os olhos, frios e impassíveis, sem qualquer vestígio da paixão que vira ainda há pouco. Estava empertigado, como o fuzileiro que já fora. Era como se já houvesse se distanciado dela, e agora apenas o estivesse fazendo fisicamente. – É... – disse ele. – Uma das éguas entrou em trabalho de parto. Não está indo bem. O veterinário está a caminho. – Tudo bem – disse ela, apertando ainda mais os documentos de encontro ao peito. – Provavelmente é melhor assim. – Provavelmente – concordou ele, virando-se na direção da porta. Contudo, antes de ir embora, por sobre o ombro, lançou um demorado olhar para ela. Foi então que Cass soube que o ardor que haviam compartilhado não desaparecera. Estava sendo ignorado. JAKE ESTAVA tão cansado, e ainda tão tenso depois do seu encontro com Cassidy, que mal conseguia andar sem estremecer de dor. Diabos, não estivera tão duro e latejante por uma mulher há mais tempo do que gostaria de se lembrar. Tivera sorte na noite anterior ao ser chamado para os estábulos antes de entregar-se ao desejo que o vinha devorando há horas. O gostinho dela o assombrara a noite toda. Imagens do seu rosto, do seu corpo, nadavam pela sua mente como um filme sendo constantemente repetido. Ele se lembrava de cada toque, e da sensação da pele dela, lisa e sedosa, sob as mãos calejadas. E, apesar de tudo isso, procurou se convencer de que fora uma boa coisa eles terem sido interrompidos. Envolvimentos de uma noite só já eram ruins, mas com a assistente da mãe? Era pedir problemas de que não precisava. Além do mais, ele já tentara se envolver com uma mulher que não entendia a sua necessidade de estar ali na montanha. Recusava-se a passar por isso novamente.

Construíra a vida que adorava. Cass não tinha lugar nela. Nenhuma mulher tinha. Ele jamais permitiria que outra se aproximasse… independentemente do quanto pudesse desejá-la. De modo que os próximos dias seriam, no mínimo, desconfortáveis. Escutou-a descendo as escadas e foi ao encontro dela na parte da frente da casa. Ela estava tão bonita com uma calça preta, uma camisa verde-escura e o vibrante blazer vermelho. Estava inclusive usando de novo os sapatos de salto alto. Ele achara que a ver naquelas roupas de cidade grande, de volta ao seu papel de assistente pessoal, fosse apagar um pouco do fogo que ele sentia. Enganara-se. Ela sorriu e disse: – Eu só desci para um pouco de café, antes de seguir para o aeroporto. – Você não vai para o aeroporto – informou ele. – O quê? É claro que vou. Meu voo parte em duas horas. Tomando a mão dela, ele a conduziu na direção da porta da frente, que escancarou. – Ele vai partir sem você, Cass. Não há como descer da montanha. Ela arregalou os olhos e ficou boquiaberta ao olhar para o gramado. Jake ainda estava no celeiro quando a tempestade chegara. E, desde então, as pesadas nuvens acinzentadas acima haviam descarregado, pelo menos, vinte e quatro centímetros de neve fresca, que ainda estava caindo. Um vento frio soprou para dentro de casa, envolvendo as duas pessoas postadas no vão da porta. – Estamos apenas em outubro – murmurou ela. – Seja bem-vinda a Montana – disse ele, apertando-lhe a mão antes de soltá-la. – As estradas de acesso ao rancho estão fechadas. Vai demorar alguns dias antes que os tratores removedores de neve cheguem aqui; sendo assim, você não vai a lugar algum. – Mas… Cass desviou o olhar do mundo branco que se estendia diante dela para olhar para ele. Ele a fitou nos olhos e sentiu como se estivesse selando o próprio destino ao dizer: – Parece que estamos presos juntos aqui.

CAP ÍTULO 4

– JÁ FAZ dois dias – disse bem –, e você passou a maior parte desse tempo o mais longe possível da mulher. Jake olhou para o avô. – E daí? Ben apoiou um dos braços na ripa superior do portão, ficando confortável. – E daí que, quer você goste ou não, essa tempestade ilhou Cassidy aqui, e você deve à sua hóspede fazê-la sentir-se bem-vinda. Jake continuou escovando o seu cavalo. Haviam passado as duas últimas horas cavalgando pela neve pesada, verificando a pequena manada de gado premiado do rancho Hunter. Estava um dia frio, molhado e sombrio, o que resumia muito bem o humor de Jake. E, ainda assim, era melhor do que ficar zanzando pela casa do rancho, sentindo a presença de Cassidy em cada aposento. – Ela não é uma hóspede – argumentou. – Ela está presa aqui. – Uma hóspede relutante ainda é uma hóspede – retrucou Ben, cruzando os braços sobre a cerca e apoiando o queixo sobre os braços. – O que ela tem que o faz querer se esconder? A afirmação foi respondida com uma fungada de desdém. – Eu não me escondo. Tenho trabalho a fazer. Não tenho tempo para servir de babá para uma mulher entediada com nada para fazer. Além do mais, eu a vi ontem à noite. Ela estava no laptop, fazendo algum trabalho para a mamãe na internet. Suponho que seja o que ainda esteja fazendo. E ela não precisa da minha ajuda com isso.

É claro que Jake não podia ter certeza do que ela estava fazendo, pois deixara a casa ao raiar do sol com a maioria dos vaqueiros do rancho. Já era duro tentar dormir no final do corredor do quarto dela. Vê-la não ajudaria em nada. Além do mais, tinha trabalho a fazer. E, se esse trabalho o mantivesse longe de Cassidy Moore, melhor ainda. Normalmente, não se incomodava com tempestades de neve isolando-os do resto do mundo. Mas esta tempestade estava sendo um grande inconveniente. – Acha que sabe tudo que precisa saber a respeito dela, não é? Jake olhou de soslaio para o avô. Quando diabos o coroa ficara tão enxerido? O fato é que Ben sempre estivera por dentro de tudo que acontecia no rancho, a diferença sendo que, agora que Cassidy estava ali, ele tinha algo além dos afazeres do rancho com se ocupar. O problema é que Jake também estava interessado nela, embora de um modo bem diferente do avô. Por pior ideia que isso fosse. – Eu sei o que preciso saber a respeito dela. – Jake voltou a escovar as costas do animal. – Ela é da cidade grande, Pop. Quando neva em Boston, máquinas para limpar a neve tornam as ruas navegáveis. Calçadas são varridas e eu suponho que ela saberia se virar tão mal quanto Lisa se virava quando a neve chegava à altura da coxa e o simples ato de cruzar o gramado é um exercício aeróbico mais intenso do que a maioria das pessoas pratica em um ano. – Tudo sempre volta para Lisa, não é? Jake parou de escovar o cavalo e olhou para o avô. – E por que não haveria de voltar? Ela foi a minha mulher. – Foi sendo a palavra-chave aqui. Jake suspirou. – Foi você quem disse que, se vai cometer erros, não cometa sempre os mesmos. Lembra? Amarrando a cara, Ben disse: – Eu lembro. Contudo, não estou vendo Lisa em nenhum lugar por aqui… – Talvez ela não esteja aqui pessoalmente, mas Lisa parecia tão apegada ao seu computador quanto Cassidy parece ser ao dela. Ambas são da cidade. E estou disposto a apostar que nenhuma das duas sabe muito sobre a vida em

um rancho, nem sobre nada mais cansativo do que apertar os botões do teclado sem quebrar uma unha. Sacudindo a cabeça, Ben Hawkins disse: – Você me lembra da antiga fábula sobre o sujeito que foi trapaceado por um francês e passou a jurar que todos os franceses eram ladrões. – Eu não… – Eu só acho uma maneira estúpida de pensar, se quer saber. Coloque todas as mulheres no mesmo bote, e jamais notará quando a certa aparecer. Jake ficou fitando o outro homem por um longo instante. – Onde você esteve, Pop? Não estou procurando “a certa”. No que me diz respeito, tal mulher mítica não existe. – Mas Cassidy era perfeita como a mulher “certa para agora”. Com uma última carícia no lombo do cavalo, ele deixou a baia, trancando-a atrás de si. – Se o deixa feliz, vou até a casa agora ver como ela está – disse para o avô. Ben sorriu. – Se quer ver como Cassidy está, deveria vir comigo. Franzindo a testa, Jake seguiu o avô até o outro extremo do celeiro, onde o homem mais velho abriu uma das portas duplas e apontou lá para fora. Ainda de cara amarrada, Jake olhou para onde o avô estava apontando, e mal pôde acreditar no que estava vendo. Lá estava Cass, manuseando uma pá de neve ao lado de Jim Hatton, limpando a neve das calçadas e das varandas dos chalés. Os dois estavam rindo e conversando, agindo como se fossem os melhores amigos. – Ela está limpando a neve? – Está fazendo isso há horas – falou Ben, com um certo tom de satisfação na voz. – Você levou a maioria dos auxiliares do rancho com você, e isso deixou Jim para se encarregar da limpeza, enquanto eu cuidei dos cavalos. – É… Não era nada de mais. O rancho tinha um veículo para a remoção da neve. Tudo que Jim tinha de fazer era dirigir a porcaria do trator ao redor do gramado, limpando as trilhas, e ao redor do celeiro. Ninguém pediu para ele limpar as calçadas e as varandas também. Isso poderia ter esperado. – Cass disse que queria ajudar. – Ben sorriu quando Jake lhe lançou um olhar. – Ela pediu para Jim mostrar como se dirigia o trator, e eles ficaram se

alternando. Depois, Cass entrou para ajudar Anna a preparar o jantar para todo mundo, e, quando ela terminou, voltou aqui para fora para ajudar Jim a limpar as calçadas e as varandas. – Esteve ocupada. – É. E eu não a vi no laptop o dia todo… – Engraçadinho. – Ela é uma boa garota. Prestativa. Também parece saber se divertir. Talvez possa ensiná-lo a fazer o mesmo. Jake não sabia ao certo quanto a isso, mas havia muito que ele queria ensinar para ela. Olhou para ela a tempo de ver Cass escorregar no gelo e cair sobre uma pilha de neve fofa. Sua gargalhada rompeu o ar frio, incendiando algo no interior de Jake. Uma chama que só fez ficar mais intensa ao observar Jim estendendo a mão para ajudar Cassidy a se levantar, virando-a em seguida para espanar a neve de suas costas e de seu traseiro. Inquietação reverberou no íntimo de Jake, embora ele não fosse capaz de dar um nome à sensação. Foi difícil, mas ele ignorou a presença de Jim e concentrou-se em Cassidy. Ela estava usando um casaco grande demais para ela, e um gorro emprestado laranja. Pesadas luvas de couro lhe cobriam as mãos, e o jeans estava enfiado para dentro das botas de cano alto. As faces estavam avermelhadas devido ao frio, os cabelos, cobertos de neve, e, mesmo de longe, pôde notar a alegria no rosto dela, e soube que os olhos acinzentados estariam reluzindo. Ela estava se divertindo. Trabalhando. Ao ar livre. Diabos, Lisa jamais deixara os confins da casa até que alguém houvesse tirado toda a neve do caminho para ela. Também jamais se dera ao trabalho de conhecer os homens que trabalhavam no rancho… que dirá trabalhar ao lado deles. Tudo bem, talvez Jake houvesse se precipitado na sua avaliação de Cassidy, sendo um pouco duro demais. Mas não era essa a maneira mais segura de lidar com ela? Sabendo como ela fazia o seu corpo reagir, mantê-la a distância parecia ser a decisão mais prudente. – Na minha opinião, não lembra nem um pouquinho Lisa – comentou Ben. Jake lançou um olhar impaciente para o avô.

– Ninguém lhe perguntou coisa alguma. Ben fez apenas rir, o que levou Jake a cerrar os dentes. Era dose ser um homem de 34 anos e ainda ter um avô capaz de enxergar tão facilmente dentro dele. Dando as costas para a vista de Cass, voltou para dentro do celeiro. – Como está a nova potra? Outra gargalhada. – Bela mudança de assunto. – Sabe tão bem quanto eu que o inverno é duro para um animal tão jovem. Temos de estar atentos. – Ela sobreviverá. Tem uma baia quente, bastante comida e a mãe para mantê-la segura. – Mesmo assim, acho que vou dar uma olhada nela. – Achei que fosse mesmo dar. Jake interrompeu o seu avanço e olhou por sobre o ombro para o avô. – Isto nada tem a ver com evitar Cassidy. Trata-se de trabalho. De responsabilidade. – O que vem muito bem a calhar, quando lhe dá um motivo para não encarar aquela mulher rindo lá fora. Jake fez uma careta, mas não se deu ao trabalho de responder, em grande parte porque não podia discutir com a verdade. Em vez disso, seguiu para o interior do celeiro. Como a maioria dos cowboys ainda não haviam descido da montanha, a maior parte das baias estava vazia. Mas havia alguns cavalos sendo protegidos da tempestade de inverno. Ele se deu ao trabalho de parar e verificar como estavam todos eles, começando pelo garanhão que era o seu reprodutor premiado. Blackthorn. O cavalo grande bufou e começou a focinhar os bolsos de Jake, como se à procura de algo gostoso para comer. – Eu não trouxe nada, mas volto mais tarde com uma maçã, está bem? Jake seria capaz de jurar que o cavalo o entendia quando ele falava, e, como que para confirmar isso, o garanhão deu um desapontado empurrão nele com a cabeça. – Tudo bem – disse Jake, rindo. – Duas maçãs. Ele trancou a baia atrás de si e seguiu adiante, parando para verificar a égua com a torção na pata. Ela estava se recuperando bem. Era isso que ele

precisava fazer. Concentrar seus pensamentos e suas energias nos animais que precisavam dele. No rancho que se tornara o seu mundo. – Parece que está com os seus dias de descanso e mimos contados. Não havia terapia melhor do que falar com animais que não eram capazes de responder. Ninguém melhor do que ele para saber disso. Fizera bastante isso quando retornara de seu último turno de serviço. Foram os pesadelos que o levaram para o sofá de um psiquiatra. Lembranças com as quais não conseguia lidar quando, ainda acordado, davam um jeito de encontrar o caminho até os seus sonhos e enlouquecê-lo, como se ainda estivesse batalhando por sua vida. Imagens, sons, cheiros o perseguiam nos sonhos, noite após noite, despertando-o sobressaltado. Mas a terapeuta e toda a sua coisa de enfrente os seus medos, lembre-se e aceite o que perdeu em nada ajudara. O que estava perdido se fora para sempre. Só restara aquele lugar. Foi o que o salvara. Voltar para casa. Para o rancho que lhe aliviara a alma até ele, enfim, estar quase completo novamente. E, agora, seus sonhos estavam sendo assombrados novamente. Não pelos sons e imagens da guerra, mas pela necessidade visceral que o deixava tão tenso que ele mal era capaz de andar sem dor. A égua moveu-se impacientemente, como se chamando a sua atenção para coisas mais importantes. Jake estava de pleno acordo. – Mais um ou dois dias – murmurou ele, ao deslizar a mão pela sua perna. – E estará pronta para outra. – Ela está machucada? Jake ergueu a cabeça, se deparando com Cassidy observando-o do lado de fora do portão da baia. – O que está fazendo aqui? – É um prazer revê-lo também. – Ela sorriu, apesar da recepção menos do que calorosa. – Seu avô disse que, se eu viesse aqui, você me mostraria o cavalo bebê. – Potra – corrigiu ele, depois murmurou mais baixinho: – É claro que ele disse. Jake gostaria tanto que Ben encontrasse um outro hobby. – E então, este cavalo está bem? Concentrando-se na tarefa à mão, Jake voltou a procurar o inchaço,

Concentrando-se na tarefa à mão, Jake voltou a procurar o inchaço, sorrindo para si mesmo quando não encontrou nenhum. – Foi só uma distensão muscular – disse. – Ela já está quase boa. Rápida e eficientemente, ele voltou a enfaixar a perna do animal, deu um tapinha no seu lombo e deixou a baia, forçando Cassidy a sair do caminho. Ótimo. Manter distância era a chave. E, mesmo ao pensar nisso, pôde sentir a sua fragrância, inspirando-a profundamente. Seu olhar a examinou de alto a baixo. Sua jaqueta antiga engolia o corpo muito menor dela, chegando quase à altura dos joelhos. Neve lhe salpicava os cabelos e aquele gorro estúpido, sem falar que também recobria o velho par de botas de Anna. E ela parecia… feliz. Quando seu olhar se fixou no rosto dela, viu que suas faces estavam vermelhas devido ao frio, os olhos acinzentados estavam dançando e havia um ligeiro sorriso nos seus lábios. – É melhor voltar para dentro de casa. Deve estar congelando. – Estou com frio, mas ainda não estou congelando. – É, eu a vi lá fora com Jim. – Eu estava ajudando – disse ela com um dar de ombros, antes de estremecer ligeiramente e massageá-los. – Acha que seus músculos estão doendo agora? Espere só um pouquinho. – Valeu a pena – afirmou ela. – Foi bom sair de casa e sentir o ar frio. – Não vou discutir com isso – falou ele, adiantando-se para além dela e seguindo na direção das últimas baias. Ele entendia a necessidade de estar ao ar livre, fazendo alguma coisa, sentindo o vento no rosto. Só não achara que ela entenderia. O capão que ele visitou em seguida estava com a cabeça pendurada por sobre o portão da baia, esperando uma boa carícia entre os olhos. Jake lhe fez a vontade. – Olhe só para ele – disse Cassidy, vindo logo atrás dele. – É como um cachorrinho pedindo carinho na barriga. Jake teve de sorrir. – Rocky sempre quer um pouquinho de carinho. – O nome dele é Rocky? – É apelido de Rocking Chair, ou cadeira de balanço. – Que tipo de nome é esse?

Ela estendeu a mão para acariciar o focinho do cavalo, que se virou para ela, facilitando-lhe o trabalho. – Ele é preguiçoso – explicou Jake afetuosamente. – Desde pequeno, sempre preferiu andar a correr. Daí a associação com a cadeira de balanço, ou Rocking Chair. Ele não é um garanhão. Ninguém quer os genes preguiçosos dele. E as únicas pessoas que gostam de montá-lo são crianças pequenas, para uma volta ao redor do curral. Cass inclinou a cabeça para o lado e ficou fitando-o. – No entanto, você o mantém aqui. Jake olhou para ela. – Cavalos fazem parte do seu negócio, e Rocky, apesar de ser um amor, não se inclui nesses negócios, mas, ainda assim, fica com ele. Franzindo a testa, Jake murmurou: – E quem o compraria? Cass apenas sorriu e permaneceu atrás de Jake. – Seu avô falou que é preciso tomar cuidado extra com um cavalo nascido tão perto do inverno. – Ele tem razão. – Ele olhou para ela por sobre o ombro. – São jovens demais para suportar temperaturas tão baixas; sendo assim, temos de nos certificar de que fiquem quentinhos e bem alimentados. – Ben disse que você entende melhor os cavalos do que qualquer um que ele já viu. – Meu avô anda falando demais. – Eu gosto dele. Ele percebeu que ela estava falando sério e assentiu em sinal de aprovação. Lisa e o avô jamais haviam se dado bem. Não que importasse que não fosse assim entre Ben e Cass. – Ele também gosta de você. – Bom saber. – Ela apoiou-se no portão da baia depois que ele entrou. – Ah, mas não é uma gracinha? A potra era encantadora, com suas pernas compridas e olhos grandes. Ainda meio oscilante, ela adiantou-se até a entrada da baia e permitiu que Cass lhe acariciasse a cabeça. A égua, é claro, estava de olho em tudo, mas Sadie era um animal dócil, e Jake não estava preocupado. Ele seguiu em frente, verificando como estava a égua e lhe dando um pouco de atenção extra;

depois, certificou-se de que não faltava comida na baia e voltou a sair pelo portão, trancando-o de novo. Evidentemente relutante em deixar o cavalinho, ainda perto o bastante para ser acariciado, Cassidy falou baixinho: – Sua mãe diz que uma das coisas de que ela realmente sente falta no rancho são os cavalos. Entendo o porquê. Ele aproximou-se mais do que deveria e estendeu a mão por sobre o portão da baia para acariciar a cabeça da potra. – Sabe muito sobre cavalos? Ela o fitou com um sorriso. – Praticamente nada. Mas são tão lindos. E grandes. Exceto por esta garotinha aqui. – São lindos mesmo – concordou ele, em silêncio acrescentando: e você também é. O sorriso dela o incendiou por dentro, e Jake não precisava disso. Não queria isso. Sendo assim, forçou-se a afastar-se dela, afastar-se da tentação. – Também dão muito trabalho, de modo que é melhor eu tratar de trabalhar. – Ah, claro. Eu também. Acho que vou voltar para a casa. – Mais trabalho na internet? – Não. Prometi para Anna que a ajudaria a servir a mesa, para quando os vaqueiros chegassem. Sendo assim, é melhor eu voltar para a cozinha. Ele franziu a testa ao vê-la afastar-se. Ela o confundia, o intrigava e o atraía como nenhuma outra mulher já fora capaz de fazer, e isso era muito irritante. – Não precisa fazer isso, sabe. Ela parou e virou-se para ele. – Fazer o quê? Ele jogou ambas as mãos para o alto. – Ajudar. Trabalhar. Cozinhar com Anna. Limpar a neve com Jim. Nada disso é trabalho seu. Inclinando a cabeça para o lado, ela o fitou por um longo instante. – Isso o incomoda? – Isso me confunde – admitiu Jake, mal acreditando nas palavras que saíram de sua boca. Ela sorriu para ele e sacudiu a cabeça. – Não sei por quê. Há coisas para serem feitas. Eu estou ajudando. Simples.

– Por que eu acho que não há nada simples a seu respeito? Seu olhar fixou-se no dela. Neve caía atrás de Cass, retorcendo-se e dançando sob o vento frio. Cavalos relinchavam baixinho nas baias. Postada ali, de casaco, de botas de trabalho e de gorro idiota, ela parecia pertencer àquele lugar. Contudo, ele sabia que, apesar das aparências, não era verdade. – Acho que essa pode ser a coisa mais gentil que alguém já me disse – falou ela, postando-se diretamente diante dele. E então, antes que Jake pudesse pensar em alguma coisa para dizer, ela ficou na ponta dos pés e estendeu os braços, rodeando-lhe o pescoço com eles, e puxou a cabeça de Jake na direção da dela. Ela o beijou, e ele soube que deveria afastá-la de si, afastar de si o gosto provocante de Cass. Assim como soube que não o faria. Em questão de instantes, puxou-a para si, até os corpos estarem um colado ao outro, de tal maneira que era capaz de sentir o bater acelerado do coração dela. Cass entreabriu a boca para ele, e Jake adiantou-se, apossando-se daquilo pelo que passara os dois últimos dias ansiando. Cercado pelo seu ardor, o seu perfume, o seu gosto, Jake se perdeu na glória da coisa toda e ignorou todo e qualquer pensamento de cautela. Algo primordial e intenso brotou dentro dele, e ele se deixou levar pela onda de furioso desejo, levando Cassidy consigo. Ela chegou ainda mais perto, agarrando-se a ele como se Jake fosse o único ponto estável no universo dela. Ele sabia muito bem o que era isso, pois o mundo ao redor dele oscilava perigosamente. Uma voz insistente no fundo da sua cabeça sussurrava para que ele parasse agora, antes que perdesse o pouco que restava do seu autocontrole. Jake resistiu à voz, pois não queria controle. Queria aquilo. Queria ela. Não sabia por que ela tivera esse efeito sobre ele, mas não havia como negar a centelha entre eles, o calor que os envolvia. A pergunta era: deveria se render às chamas ou apagá-las? Antes que pudesse escolher, a decisão foi tirada de suas mãos quando gritos, gargalhadas e o som de conversas os alcançaram vindo de lá de fora. Os cowboys haviam retornado, e estavam indo para o celeiro. Jake arrancou a boca de sobre a dela, e rapidamente tirou os braços de Cass de cima dele. Ela chegou a cambalear um pouquinho; contudo, para a inveja

dele, recompôs-se em poucos segundos. Já o mundo de Jake ainda estava ligeiramente fora de prumo, e a dor na virilha lembrava uma dor de dente latejante. – É melhor eu ir. Ajudar Anna. – É. – Ele tirou o chapéu e passou os dedos pelo cabelo. – Logo entraremos todos. Assentindo, ela recuou, o olhar fixo no dele. Jake se cansara de fingir que o desejo gritando dentro dele iria embora. Precisava dela. Ele a queria. E ela o queria em troca. Hoje à noite, diabos, teriam um ao outro, e saciariam aquela paixão. Ela teve de se espremer entre os vaqueiros e seus cavalos quando chegou à porta. Alguns a cumprimentaram, mas Jake não prestou atenção. Tudo em que conseguia pensar é que não via a hora de a noite chegar. ERA COMO uma família grande e barulhenta, Cass pensou, ao carregar travessa após travessa de galinha frita, batatas e milho até a mesa montada de um dos lados da enorme cozinha. Ficou espantada que a mesa retrátil que havia sido desdobrada da parede fosse capaz de acomodar facilmente umas vinte pessoas. A casa continuava a surpreendê-la. Assim como o homem que projetara a coisa toda. O coração de Cass apertou-se um pouquinho ao voltar o olhar para a cabeceira da mesa, onde Jake estava sentado, rindo de algo que o seu capataz, e marido de Anna, Charlie, estava dizendo. Com a neve caindo lá fora e o fogo ardendo na lareira da cozinha, aquele aposento, com as risadas, as conversas animadas e as brincadeiras, parecia iluminado pela luz do sol. Cass sempre adorara a ideia de famílias grandes e barulhentas, e agora, ali estava ela, bem no meio de uma. Será que Jake se dava conta de que os empregados eram a família dele? Estava tão determinado a estar sozinho, a não ter vínculos, que provavelmente nem se tocara de que jamais estava, de fato, sozinho. Todo mundo ali era importante na sua vida. E, por ora, pelos menos, Cassidy fazia parte de tudo aquilo. Seu olhar voltou a se focar em Jake, e ele ergueu a cabeça, como se pressentindo que ela o estivesse observando. Os olhos azuis ficaram mais escuros e os músculos do maxilar se retraíram. Estava se lembrando do beijo

deles no celeiro. Lembrando-se de como incendiaram um ao outro. Diabos, ela mesma não conseguira pensar em outra coisa durante as últimas duas horas. – Cass, Anna disse que você fez estes biscoitos de chocolate. Despertada de seus pensamentos, ela se virou para Lenny, e assentiu. – Isso mesmo. – Então não tem jeito, vai ter de se casar comigo. Todo mundo riu, inclusive a esposa de Lenny, sentada ao lado dele. – Eu fugirei com você assim que Evelyn lhe der permissão para ir – prometeu Cass. – Vai me trocar por um biscoito de chocolate? Evelyn deu um tapa no ombro do marido. – São biscoitos muito bons – insistiu ele, colocando um pedaço de um deles na boca de Evelyn. Ela gemeu, olhou para Cass e disse: – Esqueça o Lenny. Case-se comigo. As pessoas ao redor daquela mesa eram família. De um modo geral, homens solteiros que moravam nos alojamentos. Apenas o capataz do rancho, Charlie, e o chefe dos domadores de cavalos, Lenny, moravam em chalés com as esposas. Mais risadas, mais diversão, e então Cass estava mirando novamente os olhos de Jake, e o humor morreu, queimando nas chamas que ali ela via ardendo. Ela o queria para valer e, se não deixasse aquela montanha muito em breve, não sabia o que iria fazer. Já o beijara. Duas vezes. E, infelizmente, tinha de admitir que, se os cowboys não tivessem retornado para o rancho quando retornaram… Ah, era melhor nem pensar nisso. O homem tinha mãos fantásticas. E uma boca incrível. Isso sem falar no traseiro fabuloso. Era o pacote completo e, como bônus de fantasia, era um cowboy. Claudia tinha razão, já fazia tempo demais dede que Cass tivera um homem em sua vida, ela pensou, acomodando-se o mais longe que pôde de Jake. Estava na hora de mudar isso. Mas não com Jake. Não podia repetir o beijo, e ele provavelmente continuaria a evitá-la até que chegasse a hora de Cass deixar o rancho… Contudo, assim que voltasse para Boston, procuraria um sujeito capaz de fazer com ela o que Jake provara ser capaz de fazer. Com certeza havia mais de

um homem no mundo capaz de fazer fogos de artifício explodirem na corrente sanguínea dela. Ao morder um pedaço da galinha frita, seu olhar virou-se infalivelmente na direção de Jake. Ele ergueu a cerveja para dar um gole, e ela ficou observando os músculos do pescoço se movendo. Cass lambeu os lábios e severamente disse para si mesma que nenhum homem seria capaz de se comparar a Jake Hunter. Encontrar um cowboy em Boston seria tão fácil quanto encontrar um corretor do mercado financeiro em Montana. Não. Quando voltasse para casa, estaria deixando a fantasia para trás. A questão era, será que ela retornaria para casa com um sorriso nos lábios? Ou tristeza no coração?

CAP ÍTULO 5

U MA VEZ terminado o trabalho, o que ela deveria fazer? Cass vagou pela casa grande e silenciosa, desejando que pudesse dormir. Mas isso não aconteceria. Tomara um banho quente para aliviar os músculos doloridos, tentara ler um livro e até ficara surfando entre algumas dezenas de canais de TV. Nada funcionara. Agora, estava tão irrequieta que sequer conseguia ficar sentada no mesmo lugar. Sendo assim, resolveu andar descalça sobre o piso de tábua corrida. Pausou para admirar as fotos emolduradas das paisagens de Montana penduradas nas paredes. Passou os dedos pelas espinhas dos livros com capa de couro nas estantes. Fitou a noite escura além das janelas e continuou andando, até chegar ao grande salão, onde as chamas estavam preguiçosamente se apagando na lareira. Por fim, ela interrompeu suas andanças e se sentou na confortável espreguiçadeira coberta por uma florida colcha azul e branca. Inspirando fundo, deixou que o ar deslizasse para fora dos pulmões e ficou olhando além da janela. Viu o próprio reflexo e o grande aposento atrás de si. E, então, ali estava ele. Como que invocado pelos seus pensamentos, Jake emergiu das sombras e postou-se atrás dela. – Por que está sentada aqui no escuro? – perguntou ele baixinho. – Ainda há um pouco de luz da lareira – retrucou ela aos sussurros, seu olhar fixo no homem na vidraça. Podia senti-lo atrás de si; no entanto, sua atenção estava toda voltada para a figura refletida à sua frente. – Eu o acordei?

Ele sacudiu a cabeça. – Não consegui dormir. Por que será? Será que estava sentindo o mesmo que ela estava? A inquietação que parecia devorá-la por dentro? Quando ele fechava os olhos, será que a via? Será que sentia o beijo que compartilharam? Lembrava-se da expectativa que explodira entre eles? Mesmo agora, o seu corpo estava formigando, e fitar aqueles olhos escuros no vidro a fez vibrar por dentro. Cass já cansara de pensar na coisa toda de “filho da patroa”, e era capaz de admitir para si mesma que não ligava mais. Afinal de contas, não era como se ela fosse correr de volta para Boston e anunciar que fizera sexo com o filho de Elise. Ninguém precisava saber. Aquilo não seria para sempre. Aquilo era – voltou a olhar para ele e sentiu tudo se retorcer em seu interior – uma necessidade. O silêncio se estendeu entre eles, vibrando de tensão. – Seja o que for que esteja pensando, eu gosto – disse ele. – Não é de surpreender, considerando que acredito que esteja pensando a mesma coisa. – Sua voz não pareceu nem um pouquinho ofegante e desesperada. Que bom para ela! Ele deu a volta na espreguiçadeira, estendeu uma das mãos para ela e, quando Cass a pegou, ele a puxou, forçando-a a ficar de pé. Não a soltou, mas ficou alisando a pele dela com o polegar, deixando-a toda arrepiada. Cass viu os olhos dele ficarem mais sombrios, repletos da mesma necessidade que ela sabia que reluzia nos seus próprios. – Tenho pensado nisso desde a primeira vez em que a vi. Algo quente e delicioso tomou conta de Cass, e ela inspirou fundo, deliciando-se com a sensação. – Eu também. Não conseguia acreditar que acabara de admitir isso para ele. Por outro lado, não era como se realmente fosse segredo, não é? Cada vez que eles se beijaram, deflagraram tantas explosões internas que ela ficara abalada por horas a fio. – Você deveria saber… – Ele a fitou, a voracidade reluzindo nos olhos, a boca provocativamente próxima. – Eu não queria sentir. Teve de sorrir. Como poderia não o fazer? Há dias vinha passando pela

Teve de sorrir. Como poderia não o fazer? Há dias vinha passando pela mesma coisa. Bom saber que não estivera sozinha. – Agora, quem está sendo franco? – Já estava na hora, não concorda? – Um sorriso curvou brevemente os lábios dele ao puxá-la mais para perto de si. Quando voltou a falar, qualquer traço de humor desaparecera de suas feições. Os olhos azuis estavam sombrios, sérios e fixos nela, como se fosse a única pessoa no mundo. – Quero você e estou cansado de esperar. – Ah. – Ela suspirou. – Tudo bem. Que bom. O tempo pareceu parar. Foram tantos os pensamentos que passaram pela cabeça dela, e, no entanto, ela foi capaz de reconhecer cada um deles. Ela gostava dele. Para valer. Antes que ela viesse para Montana, a mãe e a irmã de Jake haviam ambas falado sobre ele para Cass. Ela escutara as histórias, e escutara tanto o orgulho quanto a irritação na voz delas, quando se referiam a ele. Antes de ir até ali, ela já soubera que ele mantinha as emoções trancafiadas a sete chaves, que não gostava de companhia e que lealdade era importante para ele. Soubera do seu breve casamento, de seus serviços como fuzileiro e de seu amor por aquele rancho. Quando chegara ali, o avô dele lhe contara mais histórias, até Cass se sentir como se sempre o tivesse conhecido. Sim, ele era fechado e reservado, mas Cass vira a sua gentileza com os cavalos. Ela o vira sorrir para a governanta e rir com o avô. Lembrou-se dele com Rocky, o cavalo preguiçoso. Cass sorriu para si mesma ante a lembrança. Apesar de todas as justificativas furadas de Jake, vira nos olhos dele que amava o cavalo, e que esse era o único motivo de ficar com ele. Por trás da fachada durona de Jake, havia gentileza, e uma capacidade para amar que ele estava se negando. Ela não podia deixar de se perguntar por quê. Ele a intrigava, a atraía e tocava algo dentro dela que jamais fora despertado antes. As aparências enganavam, em se tratando de Jake Hunter. E Cass o queria tanto que a sensação chegava a ser esmagadora. Ela jamais sentira algo que chegasse perto daquela necessidade, dessa vontade de tocar e de ser tocada. Tais pensamentos passaram pela cabeça dela em apenas alguns segundos.

Ao olhar para ele, Cass não pôde deixar de se perguntar como haviam chegado àquele momento. Encontrar esta… conexão, com Hunter, não era algo que ela estivera esperando. Agora, parecia algo inevitável. Manteve o olhar fixo no dele ao falar novamente: – Bom? Ele voltou a sorrir, e o modo como o curvar de seus lábios iluminava os seus olhos era simplesmente estonteante. – É – falou ela, sabendo exatamente com o que estava concordando. – Fico feliz em saber. Puxando-a para si, ele curvou a cabeça para apossar-se de sua boca. O primeiro roçar dos lábios nos dela girou a chave em uma fechadura tão profundamente embebida nela que Cass sequer se dera conta de sua existência. Cada vez que ele a beijava, parecia ser algo predestinado. Contudo, desta vez, sabendo que o beijo levaria a algo mais, abriu todas as portas no seu coração e na sua mente. Ela entreabriu os lábios para ele, entrelaçando a língua à dele. Com a respiração acelerada, eles se beijaram até o coração dela estar martelando no peito. Sentiu as mesmas reações em Jake quando os braços dele se apertaram ao redor dela, colando-a a si, de tal modo que a única coisa a os separar era o tecido das roupas que estavam usando. E, subitamente, foi demais. Ele arrancou a boca de sobre a dela, fitou-a nos olhos e disse: – Lá em cima. Agora. – Ah, sim. Jake tomou-lhe a mão e a conduziu para fora do salão. Cass foi forçada a correr para lhe acompanhar as passadas largas. Aparentemente, não estava sendo rápida o suficiente para ele. Ao chegarem ao pé das escadas, ele a ergueu nos braços e passou a galgar dois degraus de cada vez, até chegar ao segundo andar. – Puxa, quando você disse agora, não estava brincando. Ele sorriu para ela e o coração de Cass disparou no interior do peito. – Agora que a decisão foi tomada, não há por que perder tempo, não acha? – Sem dúvida que não. – Ela envolveu o pescoço dele com os braços e aproveitou o passeio. Era romântico. Um sujeito lindo e forte carregando-a escadas acima até uma cama que era… – Essa é a maior cama que eu já vi. Jake deu outro sorriso.

– Feita sob encomenda. Grande o suficiente para eu me esticar. – Você e uma dúzia de amigos – sussurrou Cass. Como o resto da casa, o quarto dele era lindo, de uma maneira puramente masculina. Não que ela tivesse muito tempo para admirá-lo, mas bastou um olhar para ver a enorme cama com a colcha vermelha, e as poltronas de couro diante da lareira de pedra acesa. Havia estantes de livros, mesas e uma porta que provavelmente levava ao banheiro adjacente. Contudo, nada chamou tanto a sua atenção quanto a cama, ainda mais depois que ele a deitou nela. – Está tão pensativa. Não está mudando de ideia, está? – Não mesmo. – Bom saber – disse ele, deitando-se ao lado dela e tomando-a nos braços com uma força que a deixou toda arrepiada. O beijo de Jake despertou todas as terminações nervosas no corpo dela, deixando-a implorando por mais. Sua boca se abriu sob a dele, o beijo se aprofundando até que tudo em que ela conseguia pensar fosse quando ela sentiria mais o gosto dele. A paixão que lhe escapara a vida toda. Ali, nos braços dele, estava mergulhando de cabeça em um turbilhão de emoções e sensações vindo rápido demais para serem identificadas. E não importava. Nada importava além de ter as mãos dele sobre si. Sentiuo puxar-lhe a blusa e moveu-se para ajudá-lo a despi-la. Jake arrancou a boca de sobre a dela, como se desesperadamente precisasse de ar, mas depois deslizou a boca pelo pescoço dela, os lábios e a língua, deixando um rastro de fogo por onde passavam. Suspirando, ela se arqueou para ele quando os dedos de Jake abriram o fecho frontal do seu sutiã, puxando os seios para as suas mãos. Ao primeiro toque, ela meio que se levantou da cama, esfregando-se nele enquanto os dedos lhe massageavam os mamilos, o prazer dardejando pelo seu corpo com cada movimento. A respiração dela estava alterada quando Jake tomou um dos mamilos tesos na boca, depois o outro. Sua língua fez coisas fascinantes na pele dela, sua respiração quente fazendo-a arder mais do que achou que poderia suportar. – Linda – sussurrou ele. Ele ergueu a cabeça e a fitou. Em seus olhos, ela enxergou mais paixão do que jamais havia visto. – Cassie, eu a quero tanto que

não posso prometer ir devagar. Cassie. Ninguém na sua vida já a chamara de Cassie, e ela gostou. Dava uma impressão de intimidade, uma conexão que ia além do físico, que só fazia acrescentar ao que ela já estava sentindo. Sentiu-se tomada de voracidade. Uma necessidade de se perder nele. – E quem quer devagar? Ele sorriu para ela, e o seu coração respondeu disparando novamente. O que ele fazia com ela? Como conseguia fazer isso? Conhecia-o há apenas alguns dias e, no entanto, para Cassidy, era como se sempre o tivesse conhecido. Suas mãos estavam em tudo quanto era lugar. Ela sentiu cada toque, o calor de cada carícia. Contorcia-se na cama, afogando-se nas sensações que se apossavam dela. Eram muitas; contudo, não eram o suficiente. Jake arrastou a boca pela extensão do corpo dela, detendo-se apenas ao chegar à cintura do jeans. Seus dedos rapidamente o desabotoaram, deslizando-o pelas pernas dela até tirá-los. Os dedos dela também se puseram a trabalhar nas roupas dele, e Jake não ofereceu resistência. Ela deslizou as palmas das mãos para cima e para baixo sobre o peitoral musculoso, adorando como a extensão de pele bronzeada lhe aquecia as mãos. Repetidamente o tocou, como se não conseguisse se saciar, e a reação dele foi imediata. Ele saltou da cama, praticamente rosnando: – Já volto. Ele cruzou o quarto para desaparecer por uma porta. Ela vagamente escutou uma gaveta abrindo e fechando. Subitamente, ele estava de volta, não dando ao corpo dela a chance de sentir a sua ausência. Observando-a, postou-se ao lado da cama e despiu o que restou de suas roupas; depois, abriu a embalagem do preservativo que fora até o banheiro pegar. Ela o observou embainhar-se, o olhar fixo na sua extensão dura. Ele era tão grande ali quanto era em todos os outros lugares, e a expectativa vibrou com redobrada intensidade dentro dele. – Há dias que espero por isso – murmurou ele, descendo sobre ela, que afastou as pernas para recebê-lo. – Parece anos. – Parece mesmo – concordou ela ofegantemente. Ah, a sensação maciça de tê-lo sobre si era tão perfeita. Tão provocante. E,

Ah, a sensação maciça de tê-lo sobre si era tão perfeita. Tão provocante. E, com uma estocada gloriosa, ele deslizou para dentro dela. Cass arquejou e movimentou-se com ele. Jake a preencheu a ponto de ela chegar a pensar que jamais se sentiria vazia novamente, com ou sem a presença dele em sua vida. Sabia que a marca de Jake permaneceria por muito tempo após a noite haver chegado ao fim. Tal pensamento resultou em um aperto doloroso no coração, de modo que Cass o ignorou e concentrou-se no que ele estava fazendo agora. Mais tarde, não faltaria tempo para arrependimentos, para o sofrimento. Ele moveu-se dentro dela, seu corpo entrando e saindo em uma frenética dança de necessidade e paixão. As mãos dela deslizaram para cima e para baixo sobre as costas dele, ao longo das coxas, sentindo o poder do seu corpo esbeltamente musculoso, deliciando-se com ele. Ergueu as pernas para envolver-lhe os quadris com elas, puxando-o mais para dentro e, ainda assim, não foi o suficiente. Talvez jamais fosse o suficiente. Tensão chocou-se dentro dela, intensificando-se com cada estocada, até ela se ver arquejando, sem fôlego, o ar não conseguindo passar pelo nó que se instalara em sua garganta. E, ainda assim, ela queria mais. As palavras sussurradas de Jake, seus beijos, tudo a levava rumo ao apogeu. Ela acompanhava os movimentos dele, seus corpos fundidos pelo ardor e pela paixão. Cass gemeu, gritando o nome dele e estendendo as mãos na direção daquela estonteante luz diante de si. Tinha de tê-la. Jamais conhecera uma necessidade igual, um desespero… – Aceite, Cassie. Aceite-me – sussurrou ele. – Deixe vir. – Com você – insistiu ela, sacudindo a cabeça. Sombras se retorciam, a luz do fogo dançava nos olhos dele quando Cass fitou as suas profundezas. – Chegaremos lá juntos. Ele sorriu, enterrando o rosto na curvatura do pescoço dela, mordiscandoo enquanto estendia a mão entre os corpos dos dois para massagear o botão intumescido no âmago dela. Quando se estilhaçou nos braços dele, escutou-o murmurar. – Você primeiro. Tremores lhe percorreram o corpo ao agarrar-se a ele, alcançando alturas inéditas para ela enquanto ele continuava a se movimentar dentro dela,

levando-a a subir ainda mais. O restinho do seu clímax ainda estava lhe percorrendo o corpo quando o escutou gemendo-lhe o nome. Sem saber como faria para soltá-lo novamente, agarrou-se a ele enquanto o corpo de Jake se sacudiu de alívio. O que ela acabara de experimentar jamais se repetiria com outro homem. Tinha certeza disso. Fora Jake a driblar todas as suas hesitações, suas preocupações, e a fazê-la esquecer a relutância em se envolver com um homem que não deveria. E, agora, sabia por que instintivamente tentara evitá-lo. Nada tinha a ver com a preocupação com a chefe, nem com o fato de que estaria voltando para Boston. Não, era mais elementar do que isso. Em algum lugar dentro dela, soubera que aquele homem era o que poderia alcançar o seu coração. Jake Hunter era o único homem no mundo capaz de fazê-la querer abrir mão de antigas dúvidas e desconfianças. Fazê-la querer correr o risco de se apaixonar. Jake virou-se para um dos lados e ficou ali deitado junto dela. Cass podia praticamente senti-lo se retraindo. Sabia que, naquele exato instante, ele estava procurando uma maneira gentil de dispensá-la. De lhe dizer que aquilo nada significara. Que fora um erro, e que não seria repetido. Contudo, no que dependesse dela, seria repetido. Durante o tempo em que estivesse em Montana, Cass o queria com ela, dentro dela, sobre ela. Queria enrolar-se nele e se deliciar com a sensação da pele dele sobre a sua. Pois sabia que, no instante em que fosse embora, estaria tudo terminado. Ela não estava contando com aquilo, não estava esperando… encontrá-lo. Contudo, agora que o fizera, também tinha de aceitar o fato de que iria perdêlo, e seu coração apertou-se com uma dor que ela percebeu que a acompanharia pelo resto da vida. Mas ela não pedira uma relação duradoura, e ele também não oferecera, nem estava para oferecer, a julgar pela expressão fechada do seu rosto. De modo que Cass trataria de manter aquilo o mais casual possível, e jamais deixaria transparecer que estava mais do que meio apaixonada por ele. Virando a cabeça para olhar para o homem ao seu lado, notou os braços sobre os olhos, o peito subindo e descendo pesada e demoradamente, e muralha que ele já estava erguendo entre os dois.

Ela o viu virar-se para ela e ergueu-se sobre um dos cotovelos. Sabia que o discurso “isto não passou de um grande erro” estava a caminho, de modo que procurou se antecipar a ele, falando a primeira coisa que lhe veio à cabeça: – Por que não tem um cachorro? Ele a fitou como se ela estivesse falando em uma língua morta. – O quê? – Um cachorro. – Cass espreguiçou-se confortavelmente e sorriu. – Cowboys. Cães. Eles meio que andam de mãos dadas. Mas você não tem um. Por quê? Ele sacudiu ligeiramente a cabeça, a confusão reluzindo no seu olhar. – É sobre isso que quer falar? Agora? Cass forçou-se a dar de ombros. – E sobre o que mais prefere falar? Sobre como é um lobo solitário e que isto foi um erro e que não quer partir o meu coração, nem nada do gênero… – Ela interrompeu-se antes de prosseguir em um tom mais grave e dramático: – “Não sou o tipo de homem de que precisa e você deveria simplesmente esquecer tudo isto e se dar conta de que não estou interessado em começar uma relação?” Aquela expressão confusa nos olhos dele estava agora misturada com os primeiros sinais de irritação. Ela estivera certa, é claro. Era exatamente o que ele estivera prestes a dizer. Aparentemente não gostara de que ela o tivesse dito em seu lugar. Que pena! – De nada adianta ter “a conversa” – afirmou ela após alguns segundos de silêncio, ignorando o aperto no coração. – Então, por que não perguntar sobre a questão do cachorro? Ele bufou e amarrou a cara. – Não consigo entendê-la. – Sou franca, lembra? Por dentro, riu de si mesma. Se realmente fosse franca, estaria dizendo para Jake que estava quase se apaixonando por ele. Mas isso seria como gritar “fogo!”. Jake sairia voando dali tão rápido que o cabelo dela seria levantado pelo vento. O olhar dele estreitou-se sobre ela. – Certo. – Outro segundo se passou antes que dissesse: – Já cuido de um

– Certo. – Outro segundo se passou antes que dissesse: – Já cuido de um número grande o suficiente de animais. Não preciso de um cachorro; sendo assim, nunca arrumei um. Ela assentiu. – Entendo. Mas os cavalos são parte dos negócios, não são? Um cachorro seria apenas para companhia. – E quem precisa de companhia? Tenho vinte auxiliares de rancho que trabalham e moram aqui… dois deles com as mulheres… Tenho o meu avô do outro lado do gramado, e inúmeros clientes que vêm e vão. Não há muita chance de eu sofrer de solidão. Apesar da firmeza das palavras, e estava evidente que ele acreditava nelas, Cass achava que jamais conhecera alguém mais solitário. Era verdade que Jake vivia cercado de pessoas, mas ele jamais se abria para elas. De acordo com o avô, até mesmo ele tinha de lutar para manter algum nível de proximidade com o neto, e ela sabia que Jake amava muito o homem mais velho. – Cassie – falou Jake, a calma e paciência do seu tom de voz lhe chamando a atenção. – Realmente deveríamos conversar sobre isto. Ela não queria. Não queria vê-lo se retrair, de modo que girou para ele, envolvendo-lhe a cintura com um dos braços. – Não – disse, fitando-o nos olhos. – Não devíamos. Já sou grandinha, Jake. Estou na sua cama porque quero estar aqui. Você não me deve nada. Emoções variadas cruzaram o rosto dele, antes que ele a puxasse para si de tal modo que ela pôde sentir o desejo dele voltando à vida. – Você me confunde – admitiu ele. – Nunca faz nem diz o que eu espero. Ela sentiu o coração disparar no peito ante o ardor nos olhos dele. – Que bom – disse, roçando a boca sobre a dele. – Eu realmente detestaria ser previsível. Ele sorriu e sacudiu a cabeça. – Não se preocupe quanto a isso. – Jake, não há nada que tenhamos de dizer um para o outro agora, está bem? – Ela mergulhou os dedos nos cabelos espessos dele, cada fio roçando na pele dela como se fosse uma carícia. – Vamos simplesmente aceitar esta noite sem dissecá-la. Ele pareceu considerar as palavras dela por um longo instante. Depois, disse:

Ele pareceu considerar as palavras dela por um longo instante. Depois, disse: – A tempestade passou, sabe. A estrada deverá estar limpa em um ou dois dias. Cass sentiu outra pontada de dor, de tristeza, mas ela ignorou. – Nesse caso, em um ou dois dias, eu terei ido embora, e ambos poderemos retornar para as nossas vidas. Está bom para você? O braço ao redor dela se apertou, e, por um instante, Cass chegou a achar que ele não gostava da ideia de ela ir embora. Mas o instante passou, e ela tratou de se lembrar que não deveria construir ilusões, que isso só faria devastá-la mais tarde. Aproveite e valorize o agora. Era a única coisa a fazer. – Acho que já falamos demais. – Foi tudo que ele disse, antes de inclinar a cabeça e tomar um dos mamilos na boca. Cass gemeu e suspirou. Satisfação e desejo se fundiram em seu interior, até ela não saber dizer qual era mais forte. Ela segurou a cabeça dele de encontro ao seio, deslizando os dedos pelos seus cabelos enquanto sua boca a atormentava com uma gentil tortura capaz de fazê-la se derreter. Aproveite e valorize. Depois, deixe para lá. ALGUMAS HORAS mais tarde, Jake estava deitado em silêncio com Cass enroscada a ele. Dormindo. Por ora, o corpo dele estava em paz. Mas seus pensamentos não queriam se calar. A verdade é que ela lhe abalara o mundo, e ele ainda não sabia ao certo como permitira que isso acontecesse. Ela estava na cama dele. Enroscada nele. E Jake deveria era fugir. No entanto, ficava ali, ao lado dela, sentindo a sua respiração no peito. Inalandolhe o perfume. Sentindo-lhe a batida do coração. E sentindo os grilhões sendo fechados ao redor dos pulsos. Bem, essa imagem mental o fez se mexer. Com cuidado, afastou-se dela, que se enroscou às cobertas ainda quentes devido ao calor do corpo dele. Sob o luar que entrava pela janela, ele olhou para ela, os revoltos cabelos louros, a pele cremosa, o subir e descer dos seios sob a colcha que vinham compartilhando. A visão o abalou profundamente. Com um movimento deliberado, deu as costas para a cama e para a mulher, e marchou na direção do banheiro. Olhando no espelho, Jake viu um homem

no limite. – Que diabos? Ele a quisera por dias a fio, e, naturalmente, presumira que, no instante em que tivesse Cass, o desejo por ela passaria. Sempre fora assim. Todas as mulheres que passaram pela sua vida, inclusive a ex-mulher, deixaram zero de impressão duradoura nele. Quando Lisa o abandonara, estivera servindo alémmar, e ficara mais furioso do que magoado. E, quando voltara para casa, facilmente dera prosseguimento à sua vida sem ela. Jake sempre presumira que houvesse algo faltando nele, que o impedisse de formar vínculos duradouros com as mulheres que conhecia. Contudo, agora, estava pensando que podia não ser ele, e sim as mulheres que escolhera no passado. Pois tinha novas evidências. Cass estava dormindo na sua cama. E ele a queria novamente. Deu as costas para o espelho e para as perguntas que via nos próprios olhos. Entrando no chuveiro, abriu as torneiras e ficou debaixo do jato de água gelada. Sentia como se o seu sangue estivesse fervendo. Precisava de frio. De distância. E de um pouco de lógica. Cassidy Moore era uma complicação com a qual jamais contara. Tinha de reduzir o perigo para si mesmo, tirando-a da sua montanha e mandando-a de volta para Boston o mais rápido possível. Só porque a aceitara na sua cama pela noite não significava que houvesse espaço na sua vida para ela. Ficava melhor sozinho.

CAP ÍTULO 6

Quatorze meses mais tarde…

O MUNDO de Cass estava implodindo, e tudo que ela podia fazer era ficar ali vendo-o ir embora. Contudo, desde que ela deixara Montana, sua vida havia sido um choque após o outro. De modo que… o que era mais um? Deixar Jake fora mais difícil do que ela teria suposto. Naquela última manhã no rancho, ele mantivera a distância até chegar a hora de ela ir embora. Depois, despediu-se dela com um simples aceno… nada de beijo, nem sequer um vestígio de tristeza de vê-la partir… como se o que houvessem compartilhado nada tivesse significado para ele. E a dor daquela lembrança viajara com ela. E, ainda assim, ao chegar em casa, estava esperando que Jake fosse ligar para ela. Admitir que sentia falta dela. Naturalmente, ele não ligara. Homem teimoso. E então, dois meses após voltar para Boston, Cass descobriu que preservativos não eram infalíveis. Ela sorriu ante a lembrança do choque e da ligeira onda de pânico que se espalhara pelo corpo dela. Contudo, apesar de tudo isso, ficara muito feliz de saber que estava carregando no ventre o bebê de Jake. Ela sempre quisera a sua própria família, e saber que sempre teria um pedacinho de Jake consigo tornou mais fácil suportar a falta dele. Contudo, a gravidez significara ter de abrir mão do seu emprego, pois não poderia continuar trabalhando com Elise e não contar para ela do bebê… o neto dela.

Assim como não podia contar para Jake. Ah, sua consciência a enlouquecera durante semanas a fio; contudo, no final, Cass soube que era melhor assim. Jake queria ficar sozinho, e era difícil ficar sozinho com um recém-nascido dentro de casa. Sem dúvida era assustador ser uma mãe solteira, mas valia a pena. Seu filho era o seu mundo, e, até hoje, teria dito que tudo estava indo bem. É claro que isso fora antes de o irmão e a irmã dela provarem ser traidores. O pânico a devorava por dentro, e cada inspiração e expiração era uma vitória, enquanto tentava aceitar o terrível cenário que se desenrolava diante dos seus olhos. – Não acredito que fizeram isso. Cass precisava se mover, precisava ficar de pé e andar. Talvez até correr. O problema é que não havia para onde ir. Era início de dezembro em Boston, e, mesmo ali, estava nevando tanto que uma caminhada seria bem desagradável. Sendo assim, optou por levantar-se da cadeira ao lado da janela e andar de um lado para o outro no interior da sala do pequeno apartamento de um só quarto. Normalmente, o pequeno quarto e sala em nada a incomodava. Porém, hoje, com a família ali reunida, podia sentir as paredes se fechando ao redor dela. Enquanto marchava zangadamente, voltou a lançar um olhar duro para Claudia. – Não tinha o direito. – Voltando-se para o irmão, acrescentou: – Nenhum dos dois tinha. – Alguém tinha de fazê-lo – retrucou Claudia, não parecendo nem um pouco arrependida. – Dave e eu conversamos e decidimos que… Cass voltou o olhar furioso para o irmão mais novo, que insistentemente passava os dedos pelos curtos cabelos louros. A expressão do seu rosto deixava bem claro que ele queria estar em qualquer outro lugar que não fosse ali. – E como é que vocês dois tomam uma decisão por mim? Ele rosnou baixinho, lançando um olhar duro para a irmã caçula, antes de olhar de volta para Cass, acompanhando-a quando ela voltou para a sua cadeira, largando-se nela. – Todos nós conversamos. Eu, Emma e Claud. E concordamos que era a melhor maneira de lidar com isto.

Se estivesse um pouquinho mais furiosa, Cassidy tinha certeza de que a cabeça poderia explodir. – Você, sua mulher e sua irmã decidiram a melhor maneira de lidar comigo? Desde quando sou uma coisa com a qual é preciso lidar? – Desde que começou a se portar como um saco de pedras teimoso – disse Claudia. Cass sentiu-se tomada de outra onda de fúria e teve de se esforçar para encher os pulmões de ar. – Não tinham o direito. Esta é a minha vida. – É, é sim – falou Dave, e agachou-se ao lado dela. Fitando-a nos olhos, disse: – Você passou muitos anos trabalhando para cuidar de mim e de Claud. Não achamos justo que tenha de fazer isto por conta própria. Não só não é justo como não é certo. Ele merece saber. Ele merece saber. Essa frase não se repetira incessantemente na sua cabeça ao longo do último ano? Cass olhou para o outro lado do aposento, onde o filho bebê se encontrava dormindo, totalmente alheio à batalha familiar que estava se desenrolando a poucos metros de distância. O filho de Jake. Uma criança a respeito da qual ele nada sabia. Ah, desde que o exame de gravidez dera positivo, ela travava uma batalha interna no tocante a se deveria ou não contar para ele. Porém, ao mesmo tempo, ele deixara mais do que claro que família não era importante para ele. Além do mais, durante o tempo que passaram juntos, concordaram que a situação deles era temporária. Um bebê não era temporário. Mas era mais do que apenas isso, e ela sabia disso. Embora tivesse querido contar para Jake sobre o filho, não o fizera porque não quisera arriscar o coração do seu bebê. E se Jake resolvesse se envolver e, depois, mudasse de ideia? E se Luke já tivesse idade o suficiente para sentir a rejeição do pai tão brutalmente quanto ela sentira a ausência do próprio pai? Não. Recusava-se a fazer isso com o filho. Todavia, agora, talvez não tivesse escolha. – Por que agora? – exigiu, alternado o olhar de um para o outro. – Por que

– Por que agora? – exigiu, alternado o olhar de um para o outro. – Por que não seis meses atrás? Ou daqui a seis meses? – Porque é Natal – respondeu Claud. – Já está mais do que na hora de ele saber, Cass. E com as festas e tudo mais… – Droga, Cass – acrescentou Dave–, não vamos nos sentir culpados por isso. Você precisa de ajuda, e ele precisa saber que é pai. – A decisão era minha. Jake não queria filhos, por isso não contei para ele. – É, mais isso foi antes de você engravidar. É muito fácil rejeitar a ideia de ter filhos quando tudo é teórico. Mas, quando é verdade, a história é outra. – A tensão estava evidente na voz de Dave. – Ele mudaria de ideia rapidinho se soubesse que tinha um filho. Cass olhou para ele. – Não tem como saber disso. – Eu sou pai. Eu sei. – E, mesmo que ele não mude de ideia, e daí? – Claudia perguntou. – O mínimo que ele pode fazer é ajudar a sustentar Luke, para que tudo não caia nos seus ombros. Sacudindo a cabeça, Cass disse: – Não quero o dinheiro dele. – Pode ser que não, mas precisa dele – retrucou a irmã. – Desde que se demitiu da Hunter Media, tem tido dificuldades. – Claud tem razão – insistiu Dave. – Não há necessidade de se sacrificar como tem feito, Cass. – Quer admita ou não, sabe que o dinheiro tem andado apertado – acrescentou Claudia. – Não me faltam clientes – assegurou Cass, ficando cada vez mais na defensiva. Sim, sentia falta daquele cheque gordo da Hunter Media, mas tivera de se demitir daquele emprego quando descobrira que estava grávida. Como poderia continuar trabalhando para a avó do seu filho, e não contar para ela? Contudo, se tivesse contado para Elise, ela teria contado para o filho, e, então, Jake teria se sentido na obrigação de fazer o que quer que ele considerasse a coisa certa, e quem precisava disso? – Seus clientes são todos ótimos, Cass, porém são todos peixes pequenos, e não lhe pagam o suficiente.

Era verdade, ela tinha de admitir. Seu negócio caseiro de faturamento não decolara com a velocidade que estava esperando. Mas acabaria decolando. – Posso trabalhar de casa no meu laptop, o que significa que posso ficar aqui com Luke. Economizo em creche o que não recebo no contracheque. – É, mas precisará de um apartamento maior muito em breve, e em uma vizinhança melhor. – Dave voltou a argumentar. – Isso exige dinheiro, e não há motivo para Jake não a ajudar a sustentar o filho. Deus, ela se sentia como se estivesse sendo atacada de todos os lados, e pelas pessoas que mais amava. Sabia que só estavam fazendo aquilo porque se importavam, mas o que fizeram mudaria tudo. Arruinaria tudo. – Vocês não entendem. – Cass ficou de pé e ergueu a carta que já lera com incredulidade uma dúzia de vezes. – Claudia contou para Elise sobre Luke e, agora, Elise está ameaçando tomá-lo de mim. – Ela não pode fazer isso – alegou Dave. – Claro que pode – retrucou Cass. – Ela é rica. Eu não sou. Luke é o neto dela. – Ela pode, mas não vai – afirmou Claudia, recostando-se na poltrona e cruzando as pernas na altura dos tornozelos. Era enfurecedor que a irmã caçula não parecesse arrependida, e muito menos preocupada. – Ah, é mesmo? E por que não? – Porque irritaria para valer o filho dela, e Elise não quer fazer isso. – E devo aceitar a sua palavra porque você é uma grande perita em Elise Hunter? – Não, não deveria aceitar a minha palavra. – Endireitando-se na poltrona, Claudia fitou Cass no fundo dos olhos. – Pode ligar para Jake e contar o que a mãe dele está aprontando. Cass ficou apenas fitando a irmã, como se não houvesse escutado direito. – Ligar para Jake? Desde que descobri que estava grávida, tenho evitado ligar para Jake. – Algo com o que eu não concordei – salientou Dave. Cass lançou um olhar furioso para Dave, antes de voltar a olhar para a irmã. – Não acredito que vocês não ligaram para Jake. Ligaram para a mãe dele, traíram a sua irmã e praticamente entregaram o seu sobrinho de bandeja.

Traidores. São dois traidores. Fungando, Claudia estudou as unhas por um instante, antes de se levantar. – Você realmente se tornou a rainha do drama desde que teve esse bebê. Acredite, eu quis ligar para Jake. Mas não tinha o número dele. Liguei para Elise porque supus que ela fosse ligar para Jake. Cass suspirou e esfregou a testa. Elise não ligara para o filho. Se tivesse ligado, Jake Hunter, sem dúvida, já estaria postado na porta dela, exigindo respostas. Por que Elise não contara para ele era um mistério. Mas o significado de sua carta era claro. Ela queria o neto e, se Cass não encontrasse uma maneira de enfrentar a antiga chefe, a mulher daria um jeito de obter a guarda de Luke. Inspirou fundo, tentando ignorar o latejar na cabeça. E se estivesse enganada no tocante a Jake querer o filho? Será que ele tentaria tirar Luke dela? Será que, ao buscar a ajuda dele, ela se veria enfrentando dois processos pela guarda do filho? E se tudo se resolvesse da melhor maneira? Desde o início fora a única responsável por Luke. Como seria ter de compartilhá-lo? Apesar de todas as suas preocupações, não podia negar que parte de si sempre desejara a proximidade do pai do seu filho. – Cass, não tivemos a intenção de magoá-la – disse Dave. – Estávamos tentando ajudar – acrescentou Claudia. – Você deu duro a vida toda. Criou-me praticamente sozinha… também cuidou de Dave. Não é justo que tenha de passar por tudo sozinha novamente. Cass suspirou. – Sei que a intenção foi boa. Eles a amavam. Estavam tentando ajudar. Em vez disso, criaram uma bagunça que Cass teria de arrumar. Mas ela daria um jeito. Era uma batalha que não poderia se dar ao luxo de perder. Cruzou o aposento e ficou fitando o filho. Tinha os cabelos escuros e os grandes olhos azuis do pai. E, como o pai, o sorriso de Luke era capaz de fazêla derreter-se. Aos cinco meses de vida, ele era o seu mundo. Não podia correr o risco de perdê-lo, o que só lhe deixava uma opção. Jake. Aquele seria o primeiro Natal de Luke, e ela queria que fosse especial. Bem, nada mais especial do que encontrar o seu pai pela primeira vez. Foi tomada

de preocupação. Como seria rever Jake? Sonhara tantas vezes com isso e, agora, parecia que veria o seu desejo realizado. – Montana – sussurrou, mais para si mesma do que para os irmãos –, aqui vamos nós. A ÚLTIMA tempestade terminara há quatro dias, mas Jake sabia que havia outra chegando. Dezembro em Montana significava neve, muita neve. Contudo, estavam preparados. Geradores estavam de prontidão na casa, no celeiro e nos chalés, para o caso de a energia ser cortada. Havia bastante lenha cortada para durar um mês, e bastante comida armazenada. Estavam prontos para o que quer que a Mãe Natureza trouxesse. E, ainda assim, ele estava inquieto. – O Natal deve estar mexendo comigo – murmurou ele, postado na cozinha, olhando para o gramado e a extensão branca que parecia ocupar a paisagem. Ele já fizera o seu passeio tradicional até a floresta para cortar uma árvore de Natal para o avô e, depois, tivera a discussão tradicional no tocante a por que ele não queria uma para a casa principal. Há anos Jake não era fã de Natais. Na verdade, as últimas festas que “celebrara” fora durante o seu primeiro turno de serviço na zona de guerra. Os homens do seu batalhão haviam construído uma “árvore” feita do que quer que conseguissem encontrar; no geral, armas descartadas pelo inimigo, decoradas com barbante e balas, e neve de papel feita com o papel rasgado dos envelopes das cartas recebidas de casa. Sentindo saudades das famílias, todos cantaram músicas natalinas, montaram uma fogueira e fingiram estar em casa. Até morteiros disparados pelo inimigo explodirem no acampamento, destruindo a árvore improvisada e matando dois amigos de Jake. Desde então, ele não se dera ao trabalho de comemorar. Para Jake, dezembro era apenas um mês a ser superado. – Assim como superarei este. – Disse alguma coisa? Ele olhou para Anna, que acabara de entrar na cozinha e se dirigira para a panela de sopa fervendo sobre o fogão. – Não – falou ele, colocando as lembranças de lado e se concentrando no

– Não – falou ele, colocando as lembranças de lado e se concentrando no aqui e no agora. – Muito bem. – Ela terminou de mexer na panela e virou-se, apoiando ambas as mãos na cintura. Anna estava na casa dos 50, com os cabelos grisalhos, uma cintura larga e uma atitude franca e direta que Jake apreciava. – Charlie voltou da cidade. Está estacionando diante da casa. – Ótimo. – Jake pousou a caneca de café na bancada. – Estava mesmo querendo falar com ele. – O capataz deixara o rancho no Jipe há mais de uma hora, sem qualquer explicação. – Ele lhe disse por que teve de ir à cidade? As sobrancelhas de Anna se ergueram e ela lhe lançou um olhar duro e frio, antes de responder: – Disse. Por que ela estava zangada com ele? – E? – E – repetiu ela enfaticamente – você deveria ir ver por si mesmo. Anna costumava ser uma mulher razoável, mas, naquele instante, parecia pronta para bater nele com a colher de pau. Talvez o Natal estivesse mexendo com todo mundo. – Tudo bem, eu estou indo. Sacudindo a cabeça, ele deixou a cozinha e desceu o comprido corredor até a porta da frente da casa. Talvez Charlie soubesse o que diabos estava acontecendo com a esposa. Resmungando, Jake pegou e vestiu o pesado casaco. Em seguida, colocou o chapéu e abriu a porta, dando de cara com Cassie, postada ali na sua varanda. Seus olhos acinzentados reluziram de surpresa, o cabelo louro que aparecia por baixo do gorro roxo escorrendo por sobre os ombros. Estava usando um pesado casaco preto e botas de cano alto. As faces estavam rosadas devido ao frio e, superando a surpresa de se deparar com ela ali na sua porta da frente, ele enfim notou o que ela trazia nos braços. Um bebê. Enfatiotada como a criança estava, tudo que Jake pôde ver foram os grandes olhos azuis… tão parecidos com os dele. O choque que se apossou dele foi tão intenso que teve de segurar com força a maçaneta da porta para não desabar no chão. – Que diabos?

– Jake – disse Cassie–, conheça o seu filho Luke.

CAP ÍTULO 7

– M EU FILHO? Silenciosamente, Jake se congratulou pelo próprio autocontrole, que impediu que a sua voz fosse tomada pela fúria que sentia. O desafio que enxergou naqueles olhos acinzentados quase o levaram além do limite. Não conseguia acreditar. Por quase um ano e meio, aquela mulher o assombrara. Acordado ou dormindo. Diabos, ele mal a conhecia, e não deveria sequer ter pensado nela depois que se fora. Mas pensara. Sentira falta do seu corpo e da sensação macia e suave da sua pele sob as mãos. Do som de sua voz. De sua risada. Dos olhos acinzentados que traíam tudo que ela estava pensando e sentindo. Sentia falta dela nos seus braços, dos seus suspiros ao adentrá-la, e dos gemidos ofegantes quando cada um deles chegava ao orgasmo. Algumas vezes, Jake chegara a fantasiar revê-la ali. Só nunca imaginara vê-la trazendo consigo o seu filho. Seu filho. Ele tinha um filho. Há um ano e meio que Cassie vinha escondendo a verdade dele e, ainda assim, Jake sentiu aquela onda de desejo que jamais sentira com mais ninguém. Bastava olhar para ela para o seu corpo se retesar, seu coração bater mais forte e as mãos coçarem de vontade de tocá-la. Aparentemente, não importava o que ela escondera dele. Ainda a queria. Com determinação, colocou de lado tais desejos em favor de encará-la no tocante à verdade que agora sorria para ele com a boquinha babona.

– Que diabos, Cassie? – Não pragueje na frente do bebê – murmurou ela, passando por ele e adentrando a casa. Depois, parou, virou-se para ele e disse: – Temos de conversar. – É – falou ele, dividido entre atônito e furioso. – Eu diria que temos mesmo. Anna apareceu no corredor e fitou Jake com repreensão, o estalar de sua língua parecendo o disparar de uma metralhadora. Ela envolveu Cassie com o braço e conduziu-a e o bebê na direção do grande salão. – Venham se aquecer perto do fogo – disse a governanta vira-casaca. – E deixe-me dar uma olhada nessa gracinha… Jake sacudiu a cabeça e tirou o chapéu, amassando a borda entre os dedos cerrados. Com as emoções em polvorosa, virou-se na direção da porta ainda aberta, deparando-se com Charlie, postado no gramado, olhando para ele. – Sinto muito, chefe. Cass ligou para Ben do aeroporto, e Ben me mandou buscá-la. Por que diabos Ben não dissera nada para Jake, não o alertara? Lidaria com isso mais tarde. Agora, olhou para o capataz e disse: – Tudo bem. – Eu vou pegar as coisas do bebê e as malas de Cass na caminhonete. – As malas dela? – É claro que ela tinha malas. Aparentemente, tinha planos de ficar. Ótimo, pois não iria a lugar algum até que Jake tivesse algumas respostas. Cerrando os dentes, ele disse: – Leve-as para o quarto onde ela ficou da última vez que esteve aqui. Depois de falar com Cassie, eu irei ao seu encontro no celeiro. Assim que conseguisse respirar novamente. Assim que ela lhe desse algumas respostas. Cassie pedira ajuda para Ben. E Ben enviara Charlie ao aeroporto. Sem dizer uma só palavra para Jake. Seu próprio avô fazia parte daquilo. Será que Ben sempre soubera do bebê? Será que ajudara a esconder o filho de Jake? Sentiu a traição arder no sangue. Anna soubera que Cassie estava chegando, pois Charlie soubera. Há quanto tempo sabia? Também estava por dentro do segredo do bebê? Não parecera surpresa. Há quanto tempo Ben sabia? Será que todo o seu rancho estava por

dentro? Todo mundo o chamava de tolo pelas costas? Rindo do homem que não fazia ideia de que era pai? Descartando o chapéu e tirando o casaco, marchou para o grande salão. Anna e Cassie estavam conversando ao redor do bebê, enquanto Cassie tirava o agasalho da criança. Jake interrompeu o seu avanço e ficou olhando de longe o bebê. Antes que se deixasse ser distraído pelo menino, precisava de respostas. Como se tivesse pressentido a sua presença, ambas as mulheres se voltaram para ele. Anna estava agora segurando o menininho, que usava uma calça jeans pequenina, uma camisa de flanela e botas de cowboy para bebê. Ele sorriu para Jake, exibindo quatro ou cinco dentinhos. Jake sentiu um aperto doloroso no peito. Podia notar a semelhança. Diabos, ainda que quisesse, e Jake não queria, não havia como negar que aquele menino era seu filho. Como era possível sentir tanto em tão pouco tempo? Os instintos de Jake estavam entrando em ação com uma intensidade que o surpreendia. Subitamente, soube que faria qualquer coisa para proteger a criança cuja existência desconhecia até uma hora atrás. Ninguém manteria Jake longe dele. Já perdera demais. De modo algum perderia mais um minuto que fosse. Contudo, por ora, precisava de respostas. Mantendo o olhar fixo no bebê, disse baixinho: – Anna, leve-o para a cozinha. Dê-lhe um biscoito, ou coisa parecida. – Não se dá biscoitos para bebês, Jake Hunter. Mas, se a mãe dele concordar, acho que uma banana cairá bem. – Ah, Luke adora bananas. Obrigada, Anna – falou Cassie, dando um beijo rápido na cabecinha do bebê. Seu filho adorava bananas. Bom saber. O coração de Jake voltou a se apertar no interior do peito, quando o menininho riu e bateu palminha. Anna sorriu para Cassie, antes de estreitar os olhos para Jake. – De qualquer modo, sei como cuidar de um bebê sem a sua orientação, Jake Hunter – resmungou ela, pegando a sacola de fraldas das mãos de Cassie. – Não se preocupe, meu bem, criei quatro filhos. O menino ficará bem comigo. Quando tiver terminado com ele, venha tomar um chá. Ela lançou um olhar fulminante para Jake, antes de ir embora, carregando o filho dele.

Isso era loucura. De uma hora para a outra, ele se tornara o vilão daquela história? Como é que isso fazia sentido? – O que diabos eu fiz? – perguntou, para ninguém em especial. – Eu não sabia que tinha um filho, sabia? Anna continuou andando, seus passos ecoando como tiros no silêncio. Ele virou-se abruptamente para Cassie e teve a satisfação de vê-la empalidecer. – Sei que quer uma explicação, e estou disposta a lhe contar o que quiser saber – Cass apressou-se em dizer, tirando o pesado casaco e revelando o suéter vermelho e os jeans pretos que estava usando por baixo. Diabos, mas ela estava linda. Ter um bebê lhe acentuara ainda mais as curvas, deixando-a ainda mais desejável, se é que isso era possível. A questão não é essa. – Pode começar explicando por que ligou para o meu avô para providenciar uma carona do aeroporto até aqui? Por que não me ligou? Diabos, já que estamos falando sobre isso, por que é que não me ligou quando descobriu que estava grávida? Quando foi que teve o bebê? – Liguei para Ben hoje de manhã porque não queria ter de explicar isto tudo ao telefone. – Ela inspirou fundo. – E não queria que conhecesse o seu filho no aeroporto. – Isso explica o hoje. – Ele cruzou os braços. – Agora, esclareça os últimos quatorze meses. Ela inspirou fundo, então expirou. – Isso vai levar tempo. E há algo que precisa saber, primeiro. O motivo pelo qual estou aqui. – Quer dizer o motivo pelo qual finalmente veio me contar sobre o meu filho? – É. – Ela pegou uma carta da bolsa, adiantou-se até Jake e a estendeu para ele, ordenando: – Leia. Levou apenas um ou dois segundos e, nesse intervalo, a sua fúria, que ele achara que já estava chegando ao ponto de combustão, foi ainda além. – Minha mãe a está processando pela guarda do meu filho? Cass começou a andar de um lado para o outro no interior da sala. – Minha irmã, Claudia, contou para sua mãe sobre Luke, e, dois dias mais tarde, recebi isso pelo correio. Ela vai fazer o que está prometendo, Jake. Se

não a impedir, Elise Hunter vai tomar o meu bebê de mim. – Ninguém vai tirar o seu bebê de você – murmurou ele. – Nenhum juiz vai permitir isso. – Ela é rica – retrucou Cass. – Eu não sou. Ela pode contratar um exército de advogados. Eu não posso. – Cassie se deteve diante dele, inclinando a cabeça ao fitá-lo nos olhos. – Não perderei o meu filho. Você precisa fazer alguma coisa. Aquelas profundezas acinzentadas estavam repletas de dor e preocupação, despertando um instinto protetor dentro dele que Jake não sentia desde o seu tempo nas forças armadas. Na época, tinha de vigiar a retaguarda dos colegas. Cuidava deles como se fossem família. Arriscava a própria vida para salvar as deles. Sem hesitação. Ao voltar para casa, sentira a mesma lealdade para com o avô, a mãe e a irmã… Contudo, em se tratando de Cassie, tal vontade de proteger fervera no seu sangue como um grito de guerra. Amassando o papel em uma das mãos, adiantou-se até o telefone sobre a mesinha ao lado do sofá. Pegou o aparelho e digitou alguns números, antes de ficar esperando a mãe atender a sua linha particular. Quando ela o fez, Jake não perdeu tempo com gentilezas. – Que droga é essa de você tentar tomar o bebê de Cassie dela? – Ora, olá, Jake. É sempre tão bom ter notícias suas. Estou bem, obrigada por perguntar. E você? – Estou ótimo. Acabo de descobrir que sou pai e que minha mãe está tentando tomar o meu filho. Como está indo o seu dia? Cassie o fitava com preocupação no olhar. – Recuso-me a permitir que meu neto seja criado por uma mulher que não possui recursos para criá-lo decentemente – retrucou a mãe. – Ele é meu filho, e você não vai tomá-lo da mãe. Diabos, o que a levou a pensar que eu permitiria isso? – Você deu as costas à família, Jake – disse a mãe, e ele pôde notar a mágoa na sua voz. – Você cortou a sua irmã e a mim de sua vida. Como é que eu deveria saber que não se sentia da mesma maneira com relação ao seu filho? – Eu não as cortei de minha vida, mamãe. Cortei a empresa da minha vida. É diferente. – Não para mim – insistiu ela. – Isolou-se nessa montanha, Jake, e você me

– Não para mim – insistiu ela. – Isolou-se nessa montanha, Jake, e você me preocupa. Fechou-se e não precisa de nenhum de nós. Pois bem, o bebê é um Hunter e, se não fizer a coisa certa por ele, eu farei. Furioso, seu olhar fixo na mulher que impotentemente o fitava, ele lembrou à mãe: – Não me foi dada a chance de fazer a coisa certa. Ninguém me contou sobre o bebê. Até cinco minutos atrás, eu sequer sabia de sua existência. – Bem – disse a mãe, baixinho –, agora que você sabe, o que vai fazer a respeito? A questão era essa, não era? Ele não tinha uma resposta. Como poderia ter? Seu mundo acabara de ser virado de cabeça para baixo. Será que poderia ter cinco segundos para pensar? – Eu contarei mais tarde – retrucou, e desligou. Jogando o telefone sobre o sofá, antes que acabasse quebrando a droga do aparelho, ele virou-se para Cassie. – Pronto. Ela não vai mais tentar lhe tomar o bebê. – Você não sabe disso – sussurrou ela, e ele pôde escutar o medo na sua voz. – Eu me certificarei disso. Parte dele queria tomá-la nos braços, espantar os seus temores, aliviar-lhe as preocupações. Mas a maior parte dele ainda estava se sentindo traída. – Você deveria ter me contado. Ela empalideceu. – Talvez. – Talvez? – Ele adiantou-se na direção dela e estremeceu por dentro ao vêla recuar alguns passos. Não estava tentando assustá-la, pelo amor de Deus. Só queria respostas. Uma explicação. Mas talvez estivesse furioso demais agora para dar ouvidos a uma. Interrompendo o seu avanço, ele riu. – Acha mesmo que eu a machucaria? – Não, claro que não. – Cassie sacudiu a cabeça e passou a mão pelos cabelos. Estavam mais compridos, e caíram por sobre os ombros, descansando sobre os seios. Massageando a testa com a ponta dos dedos, ela murmurou: – É só que foi um longo dia. Luke não gostou da viagem de avião, e os passageiros não gostaram de um bebê chorando no voo. As malas demoraram para chegar e a subida da montanha foi desgastante… – Que dia legal, hein?

Ela ergueu o olhar, fitando-o nos olhos, e o que quer que tenha visto ali a fez relaxar. – Já tive melhores. – Eu também. – Ainda queria saber de muita coisa, mas precisava de tempo para pensar um pouco. – Venha, eu a acompanharei até a cozinha. Surpresa, ela perguntou: – Não vamos conversar? – Mais tarde. Há uma tempestade se aproximando. Precisamos preparar os animais para ela. Mas, depois, vou querer saber tudo. Na cozinha, Anna estava sentada à mesa, com o bebê no colo. No chão, havia um enorme labrador ao seu lado, seu focinho colado nos pés do bebê. – Um cachorro? – Cass constatou. – Você arrumou um cachorro? O labrador levantou-se e cruzou a cozinha para cumprimentar Cassie com algumas lambidas. Enquanto Cassie acariciava o animal na cabeça e atrás das orelhas, tudo em que Jake conseguia pensar era no quanto queria as mãos dela sobre si. – Quando foi que arrumou um cachorro? Anna respondeu, antes que ele pudesse fazê-lo: – Ele o conseguiu logo depois que você foi embora. Em menos de uma semana, havia um filhotinho correndo pela casa. Jake lançou um olhar furioso para a governanta, que o ignorou solenemente. A verdade é que a casa ficou grande demais, vazia demais, após a partida de Cassie. Ele comprara o cachorro para ter companhia. O que havia de mal nisso? Com um gritinho, o bebê ergueu os bracinhos para a mãe. Seguindo para a porta, Jake pegou o chapéu e vestiu o casaco. – Vamos, Boston. Hora de trabalhar. – Boston? – Cassie exclamou, repetindo o nome do cachorro, e Jake estremeceu de constrangimento. Cerrando os dentes, conseguiu dizer: – Também sou de Boston. – Quando ela nada disse, ele acrescentou: – Conversaremos mais tarde. Esperou que o cachorro se juntasse a ele, e abriu a porta para o vento frio e a neve. Pesadas cordas se estendiam entre a casa e o celeiro. Cordas também

Pesadas cordas se estendiam entre a casa e o celeiro. Cordas também interligavam os chalés, a casa principal e a casa do avô. Quando a tempestade de neve chegasse, os ventos seriam tão fortes que uma pessoa poderia se perder entre uma casa e as outras construções. Sem a corda para agarrar e orientar-se, alguém poderia sair da trilha e congelar antes de ser encontrado. Contudo, por ora, o vento estava fraco e a neve, pouca. Ajeitando a gola do casaco, Jake seguiu para o celeiro e os estábulos, com Boston vindo alegremente nos seus calcanhares. No interior do celeiro, Boston arrancou na frente para cumprimentar o avô de Jake, postado diante de uma das baias. Jake sentiu uma pontada de fúria. Marchou até o homem mais velho, postando-se diante dele. Ben sequer olhou para ele. – Charlie me disse que o garoto é a sua cara. Não vejo a hora de conhecê-lo. – Você sabia. – A traição explodiu em seu peito. O homem mais velho fora um dos centros da vida de Jake. Quando retornara da guerra, viera para o rancho, tanto pela constância do homem quanto pela paz das montanhas. – Você sabia e não disse uma só palavra. Ben massageou a nuca e virou-se para Ben. – Eu soube quando a sua mãe descobriu. Só há alguns dias. – Mas soube antes de mim. – Jake cerrou os dentes. – Deveria ter me contado. – Pensei em fazê-lo. – Isso não serve. – Sua mãe achou melhor que fosse assim. – Minha mãe quer tirar o bebê da própria mãe. Ben fungou. – Sua mãe quer que você faça o que tem de fazer pelo bebê. Atordoado e insultado, Jake ficou fitando-o. Será que a família realmente tinha uma opinião tão ruim a seu respeito? Achavam mesmo que ele não faria a coisa certa pelo seu próprio sangue? – Eu não sabia a respeito dele. Difícil fazer a coisa certa por alguém que você não faz ideia de que existe. – Bem, agora, você sabe. – Os olhos de Ben se estreitaram para ele. – O que

– Bem, agora, você sabe. – Os olhos de Ben se estreitaram para ele. – O que vai fazer a respeito? – Eu gostaria que as pessoas parassem de me perguntar isso – murmurou Jake. HORAS MAIS tarde, Cass ainda estava com os nervos à flor da pele. Claro que, graças a Jake, ela não tinha de se preocupar com os planos que a mãe dele pudesse ter para tirar Luke dela. Contudo, agora, teria de lidar com Jake. – Como foi que ele encarou a notícia? – Claudia perguntou. – Ficou atordoado. Chocado. – Zangado, acrescentou em silêncio. – Digamos que não ficou feliz. – Mas, depois que você explicou… – Não tive chance. Depois que ele ligou para a mãe, desapareceu. Não voltou para a casa desde então. – Quer dizer que a rainha do drama foi apresentada ao rei do drama. Uma união feita no… tudo bem, talvez não no céu. Revirando os olhos, Cass retrucou: – Muito fácil para você encarar isso com tão pouca seriedade. Não é a sua vida. – Não estou encarando nada com pouca seriedade. Mas, Cass, sabe muito bem que não poderia ter continuado para sempre sem contar para ele. – Pode ser – admitiu ela. Sentada no sofá da janela, viu ao longe escuras nuvens de tempestade se aproximando. – Mas também não gosto de ter sido forçada a fazê-lo. – Veja pelo lado positivo – prosseguiu a irmã. – O pior já passou. Ele sabe sobre Luke. Agora precisam apenas acertar as coisas entre vocês. – Essa é a pior parte. Ele sequer quer falar comigo, Claudia. Ele… Ela interrompeu-se, vendo Jake e o cão emergindo do celeiro e seguindo para a casa. Pela cara dele, seu humor não melhorara nem um pouco desde a última vez em que o vira. – Ele o quê? – Ele está vindo – falou Cass para a irmã. – Tenho de ir. – Tudo bem. Boa sorte. Ela iria precisar. Ao longo das últimas horas, Cass estivera se instalando no

Ela iria precisar. Ao longo das últimas horas, Cass estivera se instalando no quarto que ocupara da última vez… pelo menos até começar a ficar no quarto de Jake. É claro que isso não iria acontecer desta vez. Não viera até ali atrás de sexo. Franziu a testa ao sentir o corpo formigar. Simplesmente pensar em sexo era o suficiente para fazer o corpo dela vibrar e o cérebro desligar. Porém, precisava ser capaz de pensar racionalmente. Para conversar com Jake e explicar para ele por que fizera o que fizera. Contar para ele que seus planos foram para o bem do filho. E, então, precisaria deixar Montana. Agora, de uma vez por todas. Lá em baixo, escutou a porta da cozinha bater e estremeceu. Estava dentro de casa e, provavelmente, vindo falar com ela. Ficou de pé e empertigou os ombros. Uma rápida olhada no berço a fez sorrir. O filho estava dormindo profundamente. Cass sentiu Jake antes de escutá-lo. O homem ainda era capaz de se mover como um fantasma. Ela virou-se para vê-lo postado na entrada do quarto. O labrador entrou no quarto antes dele e adiantou-se até Cass, que o acariciou na cabeça. Em seguida, enfiou o focinho entre as barras do berço, deu uma fungada e deitou-se no chão diante dele, como que montando guarda para o menininho ali dentro. Jake não entrou. Ficou apenas fitando-a, depois desviou o olhar para o berço e para o bebê adormecido. – Onde encontrou o berço? – Anna pediu que Charlie o descesse do sótão. Ela disse que é onde o seu avô guarda as coisas da família, e que você não se importaria se Luke usasse o seu berço. – Tudo bem. – Suas feições se retesaram. – Deveria ter me contado. Cass sentiu as faces arderem. Podia lhe oferecer desculpas, presenteá-lo com racionalizações que passaram inúmeras vezes por sua cabeça no tempo em que estiveram separados. Diabos, chegara a ensaiar o que diria na viagem de avião até ali. Contudo, agora que era chegada a hora… Agora que estava fitando os seus olhos azuis como um lago, não conseguia fazê-lo. A simples verdade é que Jake tinha razão. Cass deveria ter contado para ele desde o início, compartilhado o milagre que era o filho dele desde o início.

Fora errado não o fazer. O irmão e a irmã tentaram convencê-la disso, mas seus próprios medos a impediram de perceber isso. – Eu sei. A surpresa brilhou nos olhos dele. – Eu não estava esperando por essa. Cass sabia que há muito deveria ter tido aquela conversa com Jake; contudo, não queria fazê-lo ali, onde poderiam acordar o filho deles. Ela olhou para onde o cão estava deitado diante do berço e, depois, olhou para Jake. – O cão pode ficar aqui? – Parece que ele já considera Luke seu – disse Jake. – Boston. O cão ergueu a cabeça. – Fique. O rabo balançou algumas vezes no chão, antes de Boston fechar os olhos para um cochilo. – Bom garoto. Cass curvou-se para acariciar novamente o animal, e, depois, adiantou-se até onde Jake estava aguardando. Não havia por que adiar mais. Já estava mais do que na hora de dizerem o que tinha de ser dito. Jake virou-se no vão da porta, permitindo que ela passasse por ele, e os seios de Cass roçaram no peito dele, provocando faíscas de desejo. Ela teve de inspirar fundo para se recompor. Deus, já fazia tanto tempo desde a última vez em que o seu coração disparara daquele jeito... Ela olhou para ele e soube que ele sentira a mesma descarga elétrica, e que, no momento, parecia tão pouco contente com isso quanto ela. – Jake… – Aqui não. Ele a puxou pelo braço na direção do seu quarto, no final do corredor. Lá dentro, deixou a porta entreaberta, para poderem escutar o bebê se ele despertasse, um cuidado que fez o coração dela se apertar de ternura. Mas o momento passou assim que ele a soltou e adiantou-se até a parede de janelas que dava vista para o lago e a floresta coberta de neve. – Explique. – Jake…

Ele a fitou com uma expressão severa no rosto. – Explique por que jamais se deu ao trabalho de usar a droga do telefone. Por que achou que eu não iria querer saber que estava esperando um filho meu? Cass estremeceu ante o ataque, mas parte dela sabia que ela merecia. Ela lhe causara dor, simplesmente porque fora covarde demais para encará-lo com a verdade. Contudo, em sua defesa, ele não fizera segredo do fato de que não estava interessado em ter uma família. Fora errado da parte dela acreditar na palavra dele? – Foi você quem disse que era um lobo solitário. Que não queria família por perto. – Eu nunca disse que não iria querer o meu filho. – Não, não disse. Mas concordamos que o que tínhamos era temporário, Jake. – E era. Mas Luke não é. – Não, ele não é. É precioso, maravilhoso e não quero que ele seja um fardo que você seja forçado a carregar porque é um homem honrado. Nem queria correr o risco de o menino se apegar ao pai, apenas para ser destruído caso Jake subitamente decidisse que não estava mais interessado em ter uma família. – Quer dizer que é você quem decide por mim? – Pensei que assim fosse mais fácil. Para nós dois. – Pois pensou errado. – É, eu estou vendo isso. – Ela adiantou-se até ficar postada na frente dele. – Se quiser conhecer o seu filho, ótimo. Mas não estou esperando nada de você, Jake. – Bem, pois eu estou esperando muito. – Os olhos dele estavam em chamas de tanta emoção. O sol se pusera enquanto estavam conversando, e apenas os raios da lua que conseguiam atravessar a espessa cobertura de nuvens carregadas iluminavam o aposento. – Qual é o nome dele? – Jake exigiu saber. – O sobrenome? – Moore. – Antes que ele pudesse falar, ela prosseguiu: – Está listado como o pai dele na certidão de nascimento, mas achei que seria mais fácil se meu filho e eu tivéssemos o mesmo nome.

– De acordo – falou ele, puxando-a para si. – A única diferença é que o sobrenome será Hunter. Cass levou um instante para se recuperar antes de falar: – Como assim? – Seja bem-vinda ao lar, sra. Hunter.

CAP ÍTULO 8

JAKE SENTIU um frio na barriga assim que disse as palavras. Diabos, e quem poderia culpá-lo? Da última vez que pedira uma mulher em casamento, fora um grande desastre. Jake jurara jamais repetir o erro, jamais se arriscar a permitir que alguém voltasse a se aproximar. No entanto, que escolha tinha? Seu filho estava dormindo no quarto ao lado. Ele gerara uma criança e, agora, era hora de fazer a coisa certa. Desposar a mãe dessa criança. Ao mesmo tempo em que considerava a situação, procurou se reassegurar de que aquele pedido nada tinha a ver com amor. Ainda não deixaria que Cassie mexesse com ele. Contudo, mexer nele era outra coisa. E tal consideração aliviou o pânico que ameaçou se instalar em sua mente. Sexo com Cassie era fantástico. Já não estava privado dele há quase um ano e meio? Casar-se com ela seria garantia de que poderia tê-la quando quisesse, e isso era um bônus e tanto. Isso sem falar que o filho ficaria ali no rancho, onde era o lugar dele. Em meio aos pensamentos confusos, veio a imagem do seu menininho correndo pelo gramado do rancho, com Boston nos seus calcanhares. A imagem não lhe trouxe um sorriso aos lábios. Até Cassie recomeçar a falar. – Você enlouqueceu? Não era a reação que a maioria dos homens recebia ante um pedido de casamento. – Não. – Só isso? Apenas “não”?

Ela o fitou por um longo minuto, os dois em silêncio, enquanto as sombras aos poucos iam tomando conta do quarto, como ladrões roubando o que restava da luz. Jake a estudou na penumbra e sentiu a sua virilha se retesar e latejar, tudo dentro dele ansiando por puxá-la mais para perto de si. É, ele a queria. Apesar da raiva que sentia por Cassie haver escondido o filho dele. Apesar de tudo, ele a queria. Ele sempre a quereria. Mas de modo algum admitiria isso para ela. Quando ela tentou se libertar de suas mãos, ele não ofereceu resistência. – Não vou me casar com você, Jake. Ele cruzou os braços diante do peito, as pernas afastadas, uma postura claramente combativa. – Não vejo outra solução. Você escondeu meu filho de mim. Manteve a existência dele em segredo. Acha mesmo que vou simplesmente ficar aqui, e agradecer por ter vindo para que eu pudesse dar uma olhada nele? Sem chance. O menino é um Hunter, e ele fica aqui, onde é o lugar dele. Piscando os olhos, ela sacudiu a cabeça. – O lugar dele é comigo. – Está vendo? Por isso que o casamento é a solução. Ele terá um pai e uma mãe. – Eu já lhe disse que não quero que Luke seja o fardo da sua honra, que você carregará apenas porque é a coisa certa a fazer – argumentou ela, cutucando o peito dele com o dedo em riste, como que para enfatizar cada palavra. – Pois bem, também não serei um dever para você. Sei que não quer uma família, e também não vou ser a sua mulher apenas por obrigação. Não, muito obrigada. A fúria explodiu. Não foi de se surpreender, considerando que estivera fervilhando ali, exigindo ser libertada desde que ela aparecera à sua porta com o bebê. Emoções que ele há muito pensara enterradas vieram à superfície, mas Jake não queria encará-las agora. Havia muitas, e ele não estava em posição de tentar decifrá-las agora. Não podia permitir que a fúria e as emoções o guiassem naquele instante. Em vez disso, agarrou-se a uma única linha de raciocínio. Fitou-a nos olhos, desejando que ela escutasse, que entendesse. – Você fala “dever” como se fosse uma palavra suja. Não é. Dever significa

– Você fala “dever” como se fosse uma palavra suja. Não é. Dever significa aceitar responsabilidade pelo que fez. Significa jurar fazer o que é certo. O que é necessário. É a obrigação de enfrentar o que os outros não podem, ou não querem. Dever significa algo para mim, Cassie, e não posso mudar isso. Nem mesmo por você. – Não espero que mude. Não estou pedindo para fazê-lo. Assim como não pretendo me casar com um homem que me considera uma obrigação. Ele fungou. – Uma obrigação, não, Cassie. Um incômodo. Um atraente incômodo que eu não teria nenhum problema em atirar na minha cama agora mesmo. Contudo, ainda assim, um incômodo. Ela fora exatamente isso desde o início. Um doloroso e irritante incômodo que se alojara sob a sua pele, até Jake conseguir removê-lo, mas não sem deixar para trás um rastro dolorido. Cassie se inserira na sua vida, enlouquecendo-o enquanto estivera ali no rancho e levando-o à insanidade completa depois que foi embora. Agora, ela estava de volta, e ele não fazia a mínima ideia do que estava sentindo, do que estava pensando. A única coisa que sabia ao certo é que a queria. Para valer. O desejo que sentia por ela não diminuíra nem um pouquinho no tempo em que passaram separados, e, agora, ele sabia que isso jamais aconteceria. – Nossa! Acalme-se, meu coração. – Sacudindo lentamente a cabeça, ela disse: – Isso me incentiva ainda menos a me casar com você, Jake. – Quer incentivo? Que tal o nosso filho? O que ele merece? – Merece ser amado. Não considerado uma cruz a ser carregada. A fúria ardeu ainda mais dentro dele. Ela realmente achava que era tão mesquinho que seria incapaz de amar o próprio filho? Não, ele não planejara ter uma família, confiar no destino para mantê-los a salvo, para que ele não tivesse o coração arrancado do peito; contudo, agora que a escolha fora tirada de suas mãos, não daria as costas a ela. – Não tem o direito de dizer isso para mim, Cassie. Qual é a idade dele? – Está com quase cinco meses. Jake cerrou os dentes. – Está com ele há cinco meses, e sabia da existência dele por mais nove meses antes disso. Teve a chance de amá-lo. Eu mal tive a chance de vê-lo.

Então, não venha me dizer que não vou amar o meu filho. – Não quero que você tenha de amá-lo. Será que não enxerga a diferença? – Se tivesse me contado desde o início, não haveria a preocupação no tocante a “ter” de amá-lo, não é? Ela jogou as mãos para o alto. – Como vou saber disso? Como você pode saber disso? Se eu tivesse ligado assim que soube, você teria querido o bebê? Ele engoliu em seco, e Cassie aproveitou o instante de hesitação. – Está vendo? Nem mesmo sabe como teria reagido, e eu não podia correr o risco. Não com a futura felicidade do meu bebê em jogo. – Eu merecia saber – disse ele por fim, não se dando ao trabalho de contraargumentar. Sabia que estava certo e que ela estava errada, e tinha a sensação de que ela também sabia disso. A combatividade a abandonou como o ar escapando de um balão. – Merecia. Merecia mesmo. E eu sinto muito. Assentindo, sentiu a alma ficar mais tranquila. Não diria que a amava, pois que diabos ele sabia a respeito do amor? Contudo, era capaz de admirá-la. De respeitá-la. De desejá-la. Ela fizera um bom trabalho como mãe solteira. Luke parecia saudável e feliz, e isso era graças a ela. Não fazia ideia do que a vida dela fora ao longo dos últimos quatorze meses, mas sabia muito bem como fora a dele, suportando intermináveis noites insones, em que amaldiçoava a solidão pela qual costumava ansiar. Ela fora forte, e ele podia apreciar isso. Contudo, agora, as coisas mudaram. Ela estava ali, e Jake jamais a deixaria ir novamente. Aquilo só terminaria de um jeito. Do jeito dele. – É, bem, eu também sinto muito, Cassie. Ela o fitou com desconfiança. – Sente muito pelo quê? Jake tomou o queixo dela entre os dedos, forçando-a a fitá-lo nos olhos. – Não precisa mais se preocupar com a minha mãe. Mas saiba de uma coisa. Ou se casa comigo, ou eu mesmo entrarei com um pedido pela guarda de Luke. Cass recuou, libertando-se do seu toque. Com os olhos arregalados, disse: –

Cass recuou, libertando-se do seu toque. Com os olhos arregalados, disse: – Não faria isso. – Experimente. Jake jamais teria se achado capaz de ameaçar uma mulher, ainda mais essa mulher, mas aparentemente o dia ainda traria muitas surpresas. – Não vou perder o meu filho. – Ela riu nervosamente, levando uma das mãos à boca. – Você percebe que vim até você em busca de ajuda? – Que irônico – reconheceu ele. Cass recuou até se sentar na beirada da cama dele. Vê-la ali novamente trouxe de volta todas as lembranças que ele vinha tentando ignorar há meses. O perfume nos travesseiros. Os cabelos esparramados sobre os lençóis. O brilho nos olhos dela quando lhe preenchia o corpo. E o suave suspiro sempre que chegava ao orgasmo. Lembranças que ele tratou de reprimir, antes que o sufocassem. Estivera bem no seu mundo, antes que ela viesse até o rancho e ficasse uma semana presa ali. Depois que ela partira, esforçara-se para valer para ficar bem novamente. Não dera muito certo, mas havia encontrado um pouco de paz, antes que ela desse as caras ali novamente. Quando olhou para ele, ela disse, baixinho: – Basicamente, pulei da frigideira para o fogo? – É. Ela riu baixinho e sacudiu a cabeça. – É típico. Suspirando, Jake permitiu que a raiva se dissipasse. Adiantou-se até ela e sentou-se ao seu lado, inspirando fundo e enchendo os pulmões com o seu perfume. – Algum dia ia me contar sobre Luke? Retorcendo as mãos sobre o colo, ela admitiu: – Não sei. Assentindo, ele olhou na direção da janela. – O que houve com a franqueza? Cass olhou para ele. – Se mentiras protegem o meu filho, recorrerei a elas. – Acha que ele precisa ser protegido? De mim? Ele se sentiu insultado.

– O meu trabalho é garantir que Luke seja feliz. Que esteja seguro e seja amado – retrucou ela, no fundo, sem responder à pergunta. O quarto estava tão escuro que ele mal conseguia enxergá-la, e talvez fosse melhor assim. Poderia amolecer se enxergasse medo ou fragilidade nos olhos dela. E não podia se dar a esse luxo. Não perderia o filho, de modo que era melhor Cassie resolver logo ser sua esposa. – Faremos isso juntos. – Não vou me casar com você, Jake. – A escolha é sua. Mas não vai a lugar nenhum. – Não sou sua prisioneira. Não pode me manter aqui se eu quiser ir, Jake. – Ah, não se engane. Eu poderia. Acontece que não vou precisar. – Ele apontou para a parede de janelas. – A região toda recebeu um alerta de pesadas tempestades pelos próximos cinco dias. Vai ser uma nevasca daquelas. Então, pode ir se acomodando, Cassie. Você e Luke não vão a lugar nenhum. O VENTO gritou por horas. Como o uivo de almas penadas, vagando pela casa. Assim como Cassie, frustrada por não encontrar uma saída. Fisicamente, estava aprisionada ali. Jamais se arriscaria a descer a montanha em meio a uma nevasca. Ainda mais com o filho. Contudo, emocionalmente, estava ainda mais aprisionada. Durante um ano e meio, fizera de tudo para esquecer Jake. Para tirá-lo da cabeça. Contudo, com Luke lembrando cada vez mais o pai a cada dia que passava, não estava sendo fácil esquecer. Chegara até a ter dúvidas se queria realmente esquecer. Tivera dúvidas constantes se fizera a coisa certa ao manter Luke em segredo. Mas não havia como mudar isso. Agora, estava de volta ali, com um homem furioso e determinado a casar-se com ela. Mas poderia se casar com um homem que não a amava? Mesmo com amor, o casamento já não era um risco? Cass vira o casamento dos pais desmoronar. Não poderia condenar o próprio filho ao mesmo destino. Jake podia querer ela e Luke agora, mas e em um ano? Em cinco anos? E se se cansasse e resolvesse mandá-los embora?

Para piorar as coisas, não estava conseguindo dormir. Luke não era o problema. Graças a Deus, desde os dois meses de idade ele dormia a noite toda. Não, eram seus próprios pensamentos que a estavam impedindo de dormir. Pensamentos sobre Jake, que se recusavam a se calar e ir embora. Sua viagem a Montana não estava indo como ela esperava. Cass estivera preparada para a raiva de Jake; contudo, a ideia de que ele pudesse querer a guarda de Luke jamais lhe passara pela cabeça. Quanto ao pedido de casamento, ambos sabiam que não era verdadeiro. Ele estava apenas zangado. Não a queria. Queria o filho. Ele não poderia ter Luke. Estremeceu ao recordar-se da conversa deles, horas antes. – Sei que acredita que me pedir em casamento é a coisa certa a fazer – disse ela, esforçando-se para aparentar uma calma que não estava sentindo. – E agradeço. Mas não estamos em 1950 e não preciso que salve a minha reputação. Luke e eu estamos nos virando muito bem sozinhos. – Mas não estão mais sozinhos, Cassie. Têm de contar comigo agora. E não estou nem aí para uma droga de ideal da década de 1950. Eu a pedi em casamento porque é a mãe do meu filho e achei que pudesse preferir ficar onde ele está. – E eu ficarei. Em Boston. – Em Montana. Pode ir se acostumando com a ideia. Como poderia se acostumar com um ultimato? E o pedido? Sentiu um frio na barriga de nervosismo e de… prazer? Ah, Deus. Deu um tapa na própria testa. Como podia sequer fingir apreciar aquela exigência de casamento? Tinha de ser tão louca quanto ele. Desejo era uma coisa, deixar que aquilo fugisse ao controle era outra completamente diferente. Não podia se esquecer do que era importante ali. Luke. Fora por isso que voltara para Montana. A segurança do filho sempre fora o seu objetivo. Contudo, agora, tinha de se preocupar com Jake tentando obter a guarda, de modo que... ela realmente garantira a segurança de Luke? Quando a porta do seu quarto se abriu lentamente, um facho de luz vindo do corredor cruzando o quarto, Cass não precisou nem olhar. Podia sentir a

presença de Jake. O que não sabia era o que ele queria. Contudo, como já discutira o suficiente por uma noite, fingiu estar dormindo, não movendo um único músculo quando ele adentrou o quarto. A porta permaneceu aberta, a luz entrando no quarto. Ele se moveu tão delicadamente que tudo que ela escutou foi o roçar das coxas envoltas pelo jeans. Prendendo a respiração, aguardou para ver o que ele ia fazer. Se viesse até ela, se a beijasse, Cass sabia que estaria perdida. Todos esses meses sem o toque dele a haviam deixado vulnerável à menor das carícias de Jake. Mas ele não foi até ela. Em vez disso, adiantou-se até o berço. Cass escutou o rabo de Boston batendo no chão, antes que Jake o aquietasse com um comando silencioso. Cass viu o homem nas sombras curvar-se sobre o berço, estendendo a mão para o bebê adormecido. Sentiu o coração se apertar ao vêlo acariciar a cabeça do filho. – Olá, Luke – sussurrou Jake. – Sou o seu pai. Você ainda não me conhece, mas prometo que vai conhecer. Jake observou o menino dormindo pelo que pareceu ser horas. Cass sentiu o coração se apertar pelo homem e por si mesma. Estava em sérios apuros. Pois a verdade é que amava Jake Hunter… um homem determinado a manter o coração trancafiado atrás de um muro que ele mesmo erguera. Enfim, tão silenciosamente quanto chegara, ele deixou o quarto, fechando a porta atrás de si. DE MANHÃ, o vento havia diminuído um pouco, e o céu parecia feito de prata derretida. Nuvens enormes pairavam sobre a montanha, parecendo prestes a cair do céu. Também estava frio, mas Cass agasalhara bem Luke. Quando o carregou até a varanda, do lado de fora da casa, o ar estava tão gelado que parecia estar inspirando cubos de gelo. Provavelmente deveria ter ficado na casa, mas queria falar com Ben, e não achou justo fazer o homem mais velho sair naquele frio. Levou apenas alguns segundos para cruzar o gramado até o chalé de Ben, e, ao aproximar-se, além da janela, notou a árvore de Natal na sala. Parecia tão alegre. O avô de Jake abriu a porta antes que ela pudesse bater, e a puxou com Luke para dentro.

– Não deveria estar por aí nesse frio, menina Cassie – falou Ben, habilmente tirando Luke de seus braços. – Admito que está muito mais gostoso aqui dentro. – Há uma nevasca chegando rápido – falou ele, com um rápido olhar pela janela. – Melhor não se demorarem a voltar para a casa principal. – Ficará bem aqui, sozinho, no meio da nevasca? Ele riu. – Cassie, já sobrevivi a mais nevascas em Montana do que você poderia contar. Não me falta comida, lenha e, por via das dúvidas, tenho o gerador. Jake mandou instalar um gerador de primeira linha na casa principal e em todos os chalés. Estamos preparados. – Ele deu de ombros. – Além do mais, gosto de ficar vendo as tempestades. Cass sorriu. – Jake é muito parecido com você, não é? – Só se isso for uma coisa boa – retrucou Ben, piscando o olho. – Sei que as coisas estão difíceis entre vocês agora, Cassie. Mas Jake é um bom homem. Ele fará a coisa certa. – Esse é o problema – admitiu ela. – Ele fará a coisa certa, mesmo que não queira. – Acha que ele não quer? – Ben riu. – Vocês jovens, às vezes, podem ser tão cegos. Eu me pergunto se não seria de propósito. – Se o que é de propósito? – Nada, nada. – Ben girou Luke nos seus braços, de modo a poder ver o rostinho do menino, e sorriu largamente. – Um bisneto. Quem diria? Cass sentiu uma intensa pontada de culpa. Jake não era o único para quem tinha de pedir desculpas. – Eu sinto muito, Ben. Eu deveria ter contado para você, para Jake e até mesmo para Elise, há muito tempo. Ben a fitou com os olhos azuis. – Suponho que tenha tido os seus motivos. – Eu tive – admitiu ela, tirando o casaco. – E faziam sentido, até eu chegar aqui e falar com Jake. Ben riu e carregou Luke até a grande espreguiçadeira de couro na sala, onde se sentou e ficou balançando o menino no colo.

– Bem, vocês dois acabarão se acertando. Cass viu o filho estender os bracinhos para apoiar as mãos pequeninas no peito do bisavô. Seus olhares se encontraram, e sorrisos foram trocados, e, em questão de instantes, Cass viu o amor nascer. Era doloroso admitir que vinha privando o filho do amor que ele merecia. Que era seu direito. Privara a todos disso, e não fazia ideia do que faria para se redimir. Ela sentou-se perto deles e ficou olhando para a árvore de Natal de Ben. Natal. O primeiro de Luke. – É uma linda árvore. – Todo ano Jake sai e corta a árvore perfeita. – Mas ele não corta uma para si mesmo? – Há tanto tempo Jake não celebra o Natal que talvez nem saiba mais como fazê-lo. Ela se perguntara por que não vira nenhum sinal de Natal na casa do rancho. É claro que um homem sozinho não se preocuparia muito com decoração, mas ela ficara surpresa que Anna não tivesse pendurado algumas luzes ou coisa parecida. Agora entendia a aridez da casa principal. – Você sabe por quê? – Ele nunca me contou. – Segredos e sombras – murmurou ela. – Não posso ficar com ele. – É cedo demais para desistir, Cassie. – É mesmo? – Ela olhou para o filho e, depois, para o homem mais velho. – Eu deveria ficar e tentar, para depois falhar? Devo deixar Luke se apaixonar pelo pai, tendo o seu coração, mais cedo ou mais tarde, partido, quando, por fim, tomarmos rumos diferentes? – Por que vocês jovens têm essa ideia fixa de divórcio? – Eu não… – Na minha opinião, quando se está falando em casamento, deve se pensar em ter sucesso, não em fracassar. Para que dar início a qualquer coisa quando acredita que vá falhar? – Ele não quer se casar comigo, Ben. Quer apenas o filho. – E pode culpá-lo por isso? – É claro que não, mas…

– Acho que vocês dois precisam encontrar uma maneira de chegar a um acordo – falou ele, como um diplomata. – Mas isso não acontecerá caso se fechem um para o outro. Ela riu baixinho. – Ele jamais se abriu para mim. Ben piscou para ela. – Ele arrumou um cachorro, não arrumou? – O quê? – O cão. Jake sempre disse que não queria um. Dizia que dava muito trabalho e que consumia muito tempo. Mas você não havia partido nem há uma semana quando ele trouxe o filhote para casa. – Isso não significa que… As sobrancelhas grisalhas de Ben se ergueram. – E o chamou de Boston. – Foi onde ele nasceu – disse Cass, sacudindo a cabeça com ainda mais firmeza. – A família dele mora lá. – Aham, e ele passou a maior parte da vida tentando deixar Boston para trás – comentou Ben. – O único motivo em que eu posso pensar para ele ter dado ao cão o nome da cidade que ele não suporta é você. Pois ele não conseguia esquecê-la. Mais do que isso, não queria esquecê-la. A esperança brotou em algum recôndito do seu coração. Se Ben estivesse certo, talvez houvesse uma chance. Talvez ela e Jake pudessem encontrar uma maneira de superar as próprias dúvidas e medos e fazer aquilo dar certo. Se Ben estivesse certo. Quando partira da última vez, estivera quase apaixonada por ele. Vê-lo com Luke no quarto fora o empurrãozinho de que ela precisava. Todavia, Cass sabia que apenas amor não seria o suficiente. Podia confiar nele para ficar? Poderia acreditar na possibilidade de um final feliz? – Será que se importa de cuidar de Luke por um tempinho? Cass ficou de pé e recolocou o casaco. – Nem um pouco. O que tem escondido na manga, Cass? Não tinha certeza. Diabos, aparentemente havia muita coisa de que ela não tinha mais certeza. Mas sabia que estava ali agora, o que significava que, se ao menos não tentasse se acertar com Jake, se arrependeria pelo resto da vida. – Estou torcendo para que haja um pouco de magia na minha manga.

CAP ÍTULO 9

JAKE ESTAVA gelado até os ossos e exausto. Várias horas trabalhando debaixo do vento forte e frio eram capazes de fazer isso com um homem. E claro que a exaustão podia ter a ver com o fato de que não pregara o olho na noite anterior. Com Cassie no quarto ao lado, ficara acordado, atormentado pelos pensamentos e imagens dela. A raiva que ardera tão intensamente no dia anterior não passava de brasas incandescentes agora. Sim, podia entender por que ela fizera o que fizera… Não mostrara para ela exatamente um homem interessado em ter uma família da última vez que Cassie estivera ali. Contudo, saber o quanto da vida do filho ele já perdera o feria mais profundamente do que qualquer vento gelado. O que tinha de decidir era o que fazer agora. Ele sabia o que queria. Queria Cassie. Agora mais do que nunca. E ele queria o filho. Mas o homem que ele se tornara não era exatamente um bom material para um final feliz. Jake guardou o cavalo no estábulo, deu-lhe uma boa escovada e certificouse de que ele e todos os animais no celeiro tivessem bastante comida e água, antes de seguir para a casa principal. A nevasca estava finalmente chegando, Jake pensou, ao deixar o abrigo do estábulo e dar de cara com ventos fortes o bastante para derrubar um homem no chão. Enrolando o braço na corda que se estendia até o outro lado do gramado, seguiu para a casa principal. A neve estava tão intensa que mal conseguia enxergar a varanda para onde estava se dirigindo. Era como se a

tempestade houvesse aguardado que ele e os vaqueiros chegassem antes de realmente cair. Enfim chegou à varanda e ficou aliviado ao adentrar a casa, suspirando ao ser recebido pelo calor. Levou um segundo para se dar conta de que o perfume de pinho permeava a casa. – Que diabos...? Ele tirou o casaco e o pendurou junto com o chapéu e o cachecol em um gancho na parede; depois, avançou na direção da sala, procurando a origem da fragrância. Todo mundo no rancho sabia que ele não comemorava o Natal. Que não montava árvores de Natal. Sendo assim, sabia que Anna não teria trazido nada para dentro de casa. Restava Cassie. Todavia, como ela teria conseguido… Seus pensamentos foram interrompidos. Não havia árvore na sala, apenas ramos de galhos de pinheiros ao redor da cornija da lareira e enfiados atrás dos retratos. Havia um vaso com galhos de pinheiros e o fogo ajudava a saturar o ar com o perfume. – Você voltou. Seu olhar se fixou na mulher sentada no chão diante da janela. O comprido cabelo estava solto por sobre os ombros e o sorriso quando olhou para ele quase o nocauteou. Fora um dia longo e cansativo; contudo, um homem poderia se acostumar a voltar para casa para aquele sorriso. Boston e Luke estavam sentados no chão com ela, e o bebê estava apoiando as mãos nas costas do animal, enquanto cambaleava ao tentar se levantar. O rabo de Boston abanava alegremente. – Esse é o melhor cachorro que já vi – falou Cassie, acariciando a cabeça de Boston, sua voz despertando-o de seus pensamentos. – Ele adora Luke. – É, adora sim. – Ela e o bebê estavam assumindo a sua casa, a sua vida. Diabos, até o seu cão o abandonara em favor de Luke. Jake passou os olhos pela sala, admirando o resto das decorações, até avistar o presépio sobre a mesinha de centro. Ele não o vira desde que era criança. – Onde encontrou aquilo? Cassie levantou-se do chão, pegou Luke e aproximou-se lentamente, como se tivesse todo o tempo do mundo. Como se não houvesse notado a tensão na voz de Jake. – No sótão – disse ela com um sorriso, depositando Luke diante das peças

– No sótão – disse ela com um sorriso, depositando Luke diante das peças de madeira entalhadas à mão. Na mesma hora, o menininho pegou uma ovelha e começou a mordê-la. – Foi ideia de Ben. Ele disse que todas as antigas decorações da família estavam lá em cima, e que eu deveria pegar o que eu quisesse. Seu próprio avô. Ainda trabalhando contra ele. Ben gostava de Cassie, e, agora que Luke também estava envolvido, o homem mais velho não estava fazendo segredo do fato de que queria que eles ficassem. Bem, diabos, Jake também queria. Contudo, tinha muito mais em risco do que Ben, de modo que tinha de analisar a situação de todos os ângulos. Inspirou fundo, tentando se acalmar, enquanto seu olhar se voltava para o presépio. O próprio Ben entalhara o jogo quando a mãe de Jake não passara de uma menina. Quando criança, Jake fizera o mesmo que Luke estava fazendo agora. Há anos ele não pensava no presépio. Por outro lado, não tinha o costume de pensar muito no passado, e nem no Natal, em especial. Ainda assim, sorriu ao ver Luke brincando com os animaizinhos de madeira. – Ótimo, não liga que eu o tenha montado. Luke adorou. Passou a tarde toda brincando com ele. – Ela olhou para Jake, como se estivesse vendo-o pela primeira vez. – Parece cansado. Está com fome? Anna deixou uma panela de ensopado no fogo antes de ir para casa. – Ainda bem que ela foi para casa descansar. Os homens devem trabalhar no meio desse tempo ruim, de modo que Anna deverá passar os próximos dias cozinhando para todo mundo. – Nossa, quantas palavras – falou Cass, com um sorriso. – Deve estar com fome. – É, fome. Provavelmente o motivo para estar com a guarda baixa e não mandar Cassie tirar as decorações e guardar o presépio, procurou se convencer. – Venha – disse ela, pegando Luke e seguindo para a cozinha sem ver se Jake estava vindo atrás dela. – Pode me contar como estão as coisas lá fora enquanto come. Ao segui-la, seu olhar se fixou nas nádegas dela envoltas pelo jeans desbotado. Apesar da exaustão, seu corpo se retesou todo. Talvez não

estivesse tão cansado assim. Independentemente do que quer que houvesse entre eles, a paixão ardente era intensa demais para ser ignorada. Sacudindo a cabeça, adentrou a cozinha e a deteve antes que ela pudesse pegar uma vasilha e uma colher. – Eu mesmo posso me servir. Não precisa fazer isso. Cassie colocou Luke na sua cadeirinha, sem dúvida também resgatada do sótão, prendeu-o e disse: – Não me importo. Esteve aí fora nesse clima horroroso o dia todo. – Ela olhou pela janela e viu a parede de neve ficando cada vez mais espessa, e estremeceu. – Sente-se. Ele sentou-se ao lado do filho e manteve o olhar fixo no menino, pois supunha ser mais seguro do que observar Cassie tão à vontade na cozinha dele. Lembranças de Lisa e de seu casamento fracassado lhe vieram à cabeça com tanta intensidade que ele se sentiu sufocado. Não se recordava de uma única vez em que Lisa tivesse vindo à cozinha para servir-se. Lembrava-se dela mais interessada no que os outros podiam fazer por ela. Especialmente na época do Natal, o que importava era os presentes que ganhava, e quanto mais caro melhor. Jamais teria ido até o sótão procurar um antigo presépio. Jamais teria pendurado ramos de pinho pela casa. Cassie não era como ela, pensou; no entanto, a falta de confiança ainda estava ali. Sabia que estava esperando que Cassie fosse falhar. Que lhe mostrasse que, debaixo da sua fachada, era uma outra Lisa. Ela era outro convite para a infelicidade. Cassie chegara na sua vida, a virara de cabeça para baixo como se fosse um globo de neve e partira… apenas para retornar com um bebê que ela não se dera ao trabalho de contar para ele. Isso não provava que não podia confiar nela? Sentiu o coração se recobrir de gelo ao observá-la. Não podia se permitir confiar novamente. Não podia correr o risco de cometer outro erro. E, no entanto… havia Luke a considerar em tudo isso. Seu filho. Jake não perderia o menino… e isso significava encontrar uma maneira de lidar com a sua mãe. Cassie estava cantarolando baixinho enquanto se movimentava pelo aposento, e os instintos de Jake entraram em alerta máximo. Estava alegre demais. Ali estava ela, aprisionada no rancho, e, a julgar pela intensidade da tempestade, não iria a lugar algum por um bom tempo. No entanto, estava cantarolando. Agindo como se estivesse feliz. Por quê?

– Ben me disse que foi deixar feno para o gado antes de a tempestade chegar. – É. Voltei bem a tempo. Ele passou uma das mãos pelo cabelo, antes de entregar para o bebê uma bolacha que pegou de um prato sobre a mesa. Sorrindo, viu Luke dar uma boa mordida, antes de esticar-se por sobre a beirada da cadeirinha para compartilhá-lo com Boston. Melhor falar sobre a rotina do rancho, sobre a tempestade, sobre qualquer coisa que não fosse a situação deles. Olhou pela janela. Meio da tarde, e estava escuro lá fora. Não conseguia enxergar as luzes da casa de Ben e nem dos outros chalés. A tempestade era das grandes, e tinha todo o jeito de que só faria piorar. – Depois de comer, vou dar outra verificada nos geradores, me certificar de que estão em perfeito estado para o caso de haver um apagão. – Ben e um dos rapazes fizeram isso enquanto você estava fora – disse ela, lhe servindo uma vasilha de ensopado que estava com um cheiro divino. – Verificaram todos, e estão todos na mais perfeita ordem. Ben disse que você comprou geradores de primeira linha para se certificar de que todo mundo ficasse aquecido durante um apagão. Ele não pôde deixar de sentir uma pontada de irritação que ela se sentisse tão à vontade ali. Ela era próxima do seu avô. Ficara amiga de Anna e dos vaqueiros que trabalhavam no rancho. Mais uma vez as palavras ecoaram em seus pensamentos. Por quê? Colocando todas as dúvidas de lado por ora, Jake pegou a colher e tratou de comer, deliciando-se com o calor que se espalhou pelo seu corpo ante a primeira colherada. Quando já havia comido metade de uma vasilha, olhou para Cassie, que estava sentada do outro lado da mesa. Estava na hora de esclarecer algumas coisas. Deixar que ela soubesse que não podia simplesmente rearrumar sua casa e sua vida como bem quisesse. – Talvez não saiba, mas eu não comemoro o Natal. – Eu sei – disse ela, passando outra bolacha para Luke. – Ben me contou. – Ben fala demais. – E em frases razoavelmente longas – acrescentou ela, com um ligeiro sorriso.

Ele suspirou, o olhar fixo nos lábios dela, a lembrança do seu gosto tão intensa. Ela era a mulher que ele não conseguia esquecer. A que não conseguia parar de desejar. E a que mais conseguia dificultar a sua vida… apenas sendo ela mesma. – Se sabe como me sinto, por que todos os pinhos? – Eu não montei uma árvore – salientou ela. – Não foi o que eu perguntei. Sacudindo a cabeça, ela olhou para Jake. – É o primeiro Natal de Luke, e meu primeiro Natal longe de meus irmãos. Até que possamos voltar para Boston, farei o que puder por aqui. Voltar para Boston. Tais palavras anularam qualquer outro argumento que ele pudesse ter sobre as decorações de Natal. Ele sentiu nos ossos o frio lá de fora. A noção de Cassie ir embora não era algo que estivesse disposto a considerar. Quer gostasse ou não, ela iria ficar. Sendo assim, antes que qualquer outra coisa fosse dita, precisavam deixar uma coisa bem clara. – Vocês não vão voltar – afirmou ele, fitando-a nos olhos, vendo o brilho de indignação nas suas profundezas. – Pelo menos, não tão cedo. De modo que é melhor ligar logo para quem quer que trabalhe e avisar que não estará de volta antes de, pelo menos, janeiro. Ela estremeceu na cadeira. – Não pode me dar ordens, Jake. – Acabei de fazê-lo. Quero tempo com o filho que acabo de descobrir que tenho. Ela estremeceu. Ótimo. Melhor mesmo que continuasse achando que ele estaria disposto a deixá-la partir quando chegasse janeiro, pois isso a levaria a baixar a guarda. A verdade é que Jake faria o que fosse necessário para garantir que ela e Luke jamais deixassem aquele rancho. Ele podia não ser um bom material para marido e pai, mas isso não tinha mais importância, não é? Confiando ou não um no outro, estavam ligados pelo filho que ambos queriam. Por ora, teria de ser suficiente. Suspirando, Cassie explicou: – Trabalho para mim mesma. De casa. Faço faturamento para várias empresas pequenas em Boston. O cão abanou o rabo, como se estivessem falando com ele.

– Ótimo. Nesse caso, pode ficar sem preocupações. Ele carregou a vasilha até a pia e a lavou. Depois, virou-se e, apoiando ambas as mãos na bancada atrás de si, fitou Cassie. Tinha a impressão de que poderia passar toda a vida olhando para ela sem se cansar da vista. Quando tal pensamento passou pela sua cabeça, ele sentiu que, provavelmente, deveria ficar preocupado. Mas não estava. Podia não confiar totalmente nela, contudo, ao menos para si mesmo, poderia admitir que ela despertava em seu íntimo coisas que sequer sabia que estavam ali. Ela estava degelando um coração que passara tanto tempo congelado, que era um milagre que ainda fosse capaz de bater. Mesmo quando os olhos acinzentados dela estavam brilhando de indignação, como estavam agora, Cassie era a coisa mais linda que ele já vira em toda a sua vida. E a queria mais agora do que queria continuar vivendo. Tudo em seu íntimo gritava para possuí-la. Para se perder no ardor dela. – Eu ficarei – disse ela baixinho, ao levantar-se da cadeira e adiantar-se até ele. – Pelo menos, por ora. Pelo menos nisso estavam de acordo. – Mas isto não está resolvido, Jake – sussurrou ela. Entregando-se aos instintos, Jake a puxou para si e a beijou, para valer. Sua cabeça girou, seu sangue bombeou pelo corpo e o coração bateu com tanta força que deve ter parecido um tambor no silêncio do aposento. Ela rendeu-se a ele, curvando o corpo na direção do dele, entreabrindo os lábios para a língua dele. Desejo fervilhou entre eles. Quando, após o que pareceu ser uma eternidade, ela recuou a cabeça, ele a fitou e concordou. – Não está resolvido. QUANDO O telefone tocou, Ben o atendeu, e sorriu. – Oi, querida. – Oi, papai – disse Elise. – Como estão as coisas por aí? Ben olhou pela janela, para a casa principal, e imaginou as três pessoas lá dentro. Cassie e Jake estavam dificultando tanto as coisas para si mesmos. Muito mais do que precisavam. Ben vira com os próprios olhos como o ar faiscava entre eles. E, com o bebê que compartilhavam, tinham o começo de algo maravilhoso… caso decidissem correr o risco.

– Estão… interessantes – disse, por fim. – O bebê é uma graça. – Eu vi, nas fotos que a irmã de Cassie me mostrou. – Ela suspirou baixinho. – Luke é a cara de Jake na sua idade. Nem acredito que tenho um neto que nunca conheci. E agora, com Cassie zangada comigo como está, quem sabe quando poderei conhecê-lo? – Você fez a coisa certa, Elise – disse Ben para a filha. – Ameaçando tomar o bebê. Jake e Cassie eram teimosos demais para enxergarem o que estava bem diante do nariz deles, até se depararem com um inimigo em comum. – E eu sou o inimigo – constatou Elise Hunter com um suspiro. – Vai dar tudo certo, meu bem. Agora, deixe-me lhe contar sobre o seu neto… A NEVASCA não aliviou durante os próximos três dias. Cassie jamais vira nada parecido. Cada vez que a ventania parava e os homens saíam de casa para remover a neve do gramado, assim que terminavam, tudo recomeçava. As árvores se curvavam sob o peso da neve, que também se acumulava de encontro às paredes das casas do rancho, e o vento uivava. Era como morar no meio de um filme de catástrofes. E, no entanto, a tempestade forçava uma proximidade que, sob outras circunstâncias, ela e Jake poderiam ter passado meses desenvolvendo entre si. Ela trabalhava dia e noite, assim como Jake e os auxiliares do rancho, cochilando sempre que podia. Preparava galões de café, centenas de sanduíches e um mar de sopa. Os homens não tinham hora para entrar e sair de casa, à procura de comida, ou apenas uma oportunidade de fugir do frio. Apesar de jamais ter trabalhado tanto, Cassie não conseguia se recordar de uma ocasião em que se divertira mais. Era necessária ali, e ver a aprovação e a surpresa nos olhos de Jake era como uma medalha para ela. Sabia que ele estava esperando que ela fosse se esconder no quarto durante a tempestade, concentrando-se apenas em Luke. Mas Cassie não perdia a oportunidade de ajudar, e sabia que ele era grato por isso. O que fazia cada instante de trabalho valer a pena. E claro que também não perdia a chance de atormentá-lo. Sabia que ele não gostava de Natal, mas não sabia por quê. E, como ele se recusava a abrir-se com ela, Cassie continuou montando aos poucos a decoração de Natal. Cada

noite que ele chegava em casa, havia mais enfeites espalhados. Meias que ela fizera de uma antiga colcha de retalhos penduradas na cornija da lareira, luzes que encontrara no sótão espalhadas pelo grande salão. E, embora não tivessem uma árvore, hoje descera uma caixa de ornamentos do sótão e resolvera pendurá-los nos ramos de pinheiros que espalhara pela casa. – O que tem aí? Cass se sobressaltou e ergueu o olhar para ver Jake entrar no grande salão. Estava sentada diante da lareira, a caixa de ornamentos diante de si, e já desembrulhara vários soldadinhos de brinquedo, um carro de bombeiro em miniatura que Luke ia adorar e uma estrela de Natal. – Encontrei isto no sótão. – O sótão já deve estar vazio, a esta altura. – Sacudindo a cabeça, agachouse ao lado dela e pegou o carrinho de bombeiros. – Eu me lembro disto. – Jake sentou-se no chão ao lado dela, suas costas viradas para a lareira, um sorriso sonhador no rosto. – Eu devia ter uns quatro ou cinco anos, e queria ser bombeiro. Mamãe comprou isto para mim em uma loja em Whitefish. Era o enfeite que eu sempre pendurava na árvore. O da minha irmã era um urso dançarino idiota e… – Este? Cassie estendeu a ursa de tutu e sapatilhas na ponta dos pés para ele, que assentiu. – É. Ela queria ser bailarina. – Ele riu. – Beth é tão desajeitada que tropeça nos próprios pés, mas sempre tentava dançar. – Sonhar é bom – falou Cass baixinho, tentando não estragar o momento. – É. – Ele ficou fitando as peças por um longo tempo, antes de voltar o olhar novamente para ela. Viu a emoção nele antes que Jake a reprimisse e perguntasse: – Onde está Luke? Cass se viu tomada de decepção. Perdera a chance de uma conexão mais profunda, e ele voltara a se esconder atrás da muralha que erguera entre eles. Se ele não fosse capaz de se abrir um pouco, de ceder, nem o amor seria capaz de mantê-la ali, Cass pensou. – Dormindo. Boston está deitado diante do berço. Eu juro que aquele cachorro é melhor do que qualquer babá eletrônica. Ele me avisa no instante em que Luke acorda.

– Que bom. Ele estava olhando para os ornamentos nas mãos, e ela pôde perceber que seus pensamentos estavam a quilômetros de distância. Podia não querer se abrir com ela, mas, talvez, se insistisse um pouquinho… – Por que o comprou? Boston? Ele olhou para ela, hesitando antes de responder: – Porque a casa ficou silenciosa demais depois que você foi embora. Sentiu o calor apossar-se do seu corpo. – Sentiu a minha falta. Amarrando a cara, ele devolveu os ornamentos para a caixa com uma gentileza que mostrava como aqueles lembretes do passado ainda eram preciosos para ele. – É. Não estava esperando. Não fiquei feliz. Mas, é, senti. – Eu estava torcendo para que você me ligasse, mas não o fez. Ele suspirou. – Também senti a sua falta. Deus, como sentira a falta dele. O som da sua voz taciturna. O calor do seu corpo envolvendo o dela no meio da noite. Sentira falta de escutar as botas dele sobre os pisos de madeira. Sentia falta de ver o chapéu dele pendurado em um gancho ao lado da porta. Sentia falta dos raros sorrisos que ele dava. Sentia falta de tudo nele. O sorriso dele desapareceu, até as feições dele ficarem impassíveis, e, se não tivesse visto as emoções fervilhando no seu olhar, Cass poderia ter pensado que ele sequer a escutara. – Você deveria ter me ligado, Cassie. Sobre Luke. Deveria ter me ligado. – Eu deveria – concordou ela, inclinando-se para a frente, atraída por aquele homem, como jamais se sentira atraída por outro homem. Mas seria o suficiente para embasar toda uma vida? Paixão? Será que poderia correr esse risco, não apenas por si mesma, mas pelo filho? Jake também se inclinou e, então, estavam se beijando, e o corpo de Cass se incendiou, iluminando-se como as luzes natalinas penduradas pela sala. Estendeu os braços para ele, envolvendo-lhe o pescoço com eles e agarrandose a ele como se tivesse medo de soltá-lo, de que ele se afastaria, recuaria. Todavia, não deveria ter se preocupado com isso. Jake a puxou para o colo,

Todavia, não deveria ter se preocupado com isso. Jake a puxou para o colo, aprofundando vorazmente o beijo, como se não conseguisse se saciar dela. As línguas se enroscaram umas nas outras, respirações se misturando, batimentos cardíacos disparando, à medida que um explorava o outro. Mãos se tocaram, se acariciaram, afastando do caminho o tecido que lhes negava a sensação da pele quente, encontrando aquilo que precisavam. Sentindo-se sufocar pelo batimento acelerado do próprio coração, Cass interrompeu o beijo, arquejando ofegante quando Jake cerrou a boca, primeiro, sobre um dos mamilos, e, em seguida, sobre o outro. Não sabia onde estava a blusa. Não se recordava de havê-la tirado. Não importava. Em questão de segundos, ambos estavam nus e estendidos sobre o tapete diante da lareira. Sombras dançavam e saltavam nas paredes. Do lado de fora, estava gelado; lá dentro, o ardor se apossava deles, envolvendo a ambos em um frenético mar de desejo, maior do que qualquer outra coisa. Tocando, provando, acariciando, eles se moviam juntos, pele deslizando sobre pele, os corpos emaranhados criando mais sombras nas paredes. Jake deslizou uma das mãos sobre os pelos louros no centro dela, e, quando acariciou o âmago quente e úmido, Cassie ergueu-se do chão, forçando-se de encontro à mão dele. – Jake, por favor – sussurrou ela, e escutou a própria voz falhar ao lutar para respirar. Já fazia quase um ano e meio desde a última vez em que ele a tocara, e ela estava pronta para se estilhaçar novamente. Seu corpo estava ansioso para mergulhar no esquecimento saciado do qual se recordava tão bem. – Estamos separados há tempo demais – sussurrou ele, inclinando a cabeça para beijá-la, a língua deslizando pelo lábio inferior dela. Mordicou-lhe a boca enquanto ela choramingava e esfregava os quadris de encontro a ele. – Verdade. Não consigo esperar. Não quero esperar. – Olhos acinzentados se fixaram nos olhos azuis. – Quero você dentro de mim – disse ela. – Fique comigo. Agora, Jake. – Agora – concordou ele, arremetendo para dentro dela, embainhando-se tão profundamente que Cass chegou a arquejar ante a força da posse. Ela se esquecera, ou, ao menos, tentara esquecer-se, de como era com Jake.

Ela se esquecera, ou, ao menos, tentara esquecer-se, de como era com Jake. De como ela se perdia nele. De como o seu corpo se tornava dele. De como ele era capaz de fazê-la querer e sentir muito mais do que jamais fizera. E, agora, ela o tinha novamente dentro de si, e era tão bom. Tão perfeito. Não queria que tivesse fim. Movia-se com ele e, quando Jake girou de costas para o chão, ela o montou, aceitando-o ainda mais profundamente à medida que se mexia. Observou a luz da lareira dançando sobre os músculos esculpidos e as próprias mãos lhe acariciando a pele. E o observou se contorcendo em resposta. Jake cerrou as mãos ao redor dos quadris dela, intensificando o ritmo dos movimentos. Ela mexia-se sobre ele, jogando a cabeça para trás, sentindose como uma selvagem rainha guerreira com ele debaixo dela. E, quando o corpo dela tremeu, permitindo que ela soubesse que o orgasmo estava vindo, Cass o fitou nos olhos, afogando-se naquele azul intenso. Gritou o nome dele quando o seu corpo se estilhaçou e, instantes mais tarde, escutou o grito dele, quando ele se esvaziou dentro dela. Quando tudo terminou, quando o corpo dela estava vibrando e saciado, Cass largou-se sobre o peito dele, jamais querendo voltar a se mexer. – E então – sussurrou ele, aguardando que ela erguesse a cabeça para fitálo. – Sei que é a hora errada para perguntar, mas você não estaria tomando pílula, estaria? Ela deixou que a testa caísse sobre o peito de Jake, quando as implicações daquela pergunta a atingiram. – Não, não estou. – Não importa – disse ele, o que chamou a atenção dela. – Não… Como assim…? Como pode não importar? – Já temos um filho. Outro seria tão ruim assim? Seu coração se magoou ante aquelas palavras. Sempre quisera uma grande família, e, na sua cabeça, podia imaginar ela, Jake e a multidão de filhos vivendo naquele rancho. Não faltaria espaço para as crianças correrem, e teriam cavalos, e cães, e seus pais… que não amavam um ao outro? Não. A imagem do sonho estourou como uma bolha de sabão. Apoiando-se nos cotovelos, olhou para ele e sacudiu a cabeça. – Não sabemos o que acontecerá entre nós, Jake. Não podemos fazer outro

– Não sabemos o que acontecerá entre nós, Jake. Não podemos fazer outro bebê. – Um pouco tarde para se preocupar com isso. Na verdade, eu espero que esteja grávida. – Não pode estar falando sério. – Pode apostar que estou. – Ele enganchou um dos braços ao redor da cintura dela e girou, imobilizando-a sob o seu peso. Fitando-a nos olhos, disse: – Se estiver mesmo grávida, desta vez, poderei ver a criança crescendo na sua barriga. Estarei presente quando ela nascer… e não descobrirei apenas cinco meses mais tarde. – E depois o quê, Jake? – Ela sacudiu lentamente a cabeça. – Não resolveria nada. Apenas… complicaria ainda mais as coisas. – Pode ser – disse ele baixinho –, mas teria de ficar aqui comigo. Isso, pelo menos, estaria resolvido. Ela o fitou pelo que pareceu uma eternidade, antes de dizer: – Em vez de me pedir para ficar, prefere me aprisionar. Ou me dar ordens. – Eu a pedi em casamento – lembrou ele, amarrando a cara. – Você me mandou casar com você. Há uma diferença. – Está tentando tornar isto romântico. Uma história de amor – murmurou ele, distraidamente afastando um cacho de cabelo do rosto dela. – Mas não é, Cassie. São duas pessoas que se dão bem juntas tentando entrar em comum acordo. Ela lhe segurou a mão, desejando que fosse tão fácil assim lhe tocar o coração. Todavia, precisou apenas olhar nos olhos dele para ver que, para ela, estava tudo acabado. Jake jamais seria o que ela precisava. Não seria o homem que poderia ser, simplesmente abrindo o seu coração. Sendo assim, ela não poderia ficar. Não poderia correr o risco de, um dia, ele ir embora, como o pai dela fizera. Cass se recusava a passar novamente por esse tipo de perda, e Luke jamais viria a saber o que era ver o pai virar-lhe as costas e deixá-lo para trás. Tinha de falar agora, quando ainda tinha coragem. – Quando a estrada estiver livre, vou pegar Luke e voltar para Boston. Jake ficou imóvel, a dor que viu nos olhos dele o único indício de que as palavras surtiram algum efeito, antes que voltasse a erguer as conhecidas

defesas. – Não a deixarei ir. – Jake, você não pode me impedir. – Cass levou a mão ao rosto dele. – Eu quero o que você não pode me dar. Amo você, Jake. Ele fechou os olhos, como se isso também fosse capaz de calar as palavras dela, sua reação feriando-a como se estivesse sendo rasgada por dentro. – Amo você, mas você se recusa a me amar – sussurrou, desejando que aqueles olhos azuis voltassem a se abrir. Quando o fizeram, ela disse baixinho: – Sendo assim, não posso ficar. – Você me ama. Mas ainda assim vai me deixar. – Amor unilateral não dará certo. Deus, será que Jake conseguia escutar o coração dela se partindo? Ele não enxergava a verdade. Cassie não conseguia entender porque, afinal, subitamente, tudo ficou tão claro para ela. – Isto que nós temos? Não é o suficiente, Jake. Não para mim. Não para Luke. Diabos, nem mesmo para você. – É aí que está errada – falou ele, os braços se apertando ao redor dela, como se fosse capaz de mantê-la ali apenas com a sua força de vontade. – Eu farei com que seja o suficiente.

CAP ÍTULO 10

JAMAIS SERIA o

suficiente. Não com Cassie. Jake sabia disso. Apenas não conseguia se forçar a admitir. Não para si mesmo. Nem para ela. Saber que ela o amava o fazia se sentir bem, como há muito não se sentia. Saber que ela ia deixá-lo o deixava encarando um mar de escuridão tão profundo que não tinha dúvida de que se afogaria nele. Sabia o que ela queria. Do que precisava. Mas não conseguia se forçar a ceder. Fazer isso colocaria tudo em risco. Arriscaria a vida que construíra para si. A paz que, enfim, encontrara. Embora, se fosse ser sincero consigo mesmo, teria de reconhecer que a dita “paz” não fora mais a mesma desde que Cassie entrara em sua vida. Concentrou-se em distribuir o feno nas baias para os cavalos. Tais tarefas comuns sempre costumavam acalmá-lo. Mas, agora, só via a hora de voltar para a casa principal. Sim, queria ver Cassie. Queria abraçá-la, beijá-la. Mas não queria ver as perguntas nos olhos dela. Não queria lhe dar a chance de dizer novamente que estava indo embora. Já fazia três dias desde que ele a fitara nos olhos enquanto Cassie dizia que não ficaria. Três dias e três noites, e passaram cada uma dessas noites juntos. Ele, tentando lhe mostrar o que poderiam ter juntos, se ela mudasse de ideia. Ela, se despedindo com cada toque. Jake podia senti-la se distanciando, exatamente como ele se distanciara dela desde o início. E era duro de aguentar. Apoiando-se no cabo do forcado, lançou um olhar na direção das portas

Apoiando-se no cabo do forcado, lançou um olhar na direção das portas abertas do estábulo. Desde ontem que não nevava, e os ventos haviam diminuído. Mais alguns dias como o de hoje e as estradas ficariam livres, e seria difícil para Jake mantê-la ali, onde era o lugar dela e de Luke. Não podia perdêlos. Nenhum dos dois. – Onde está uma boa nevasca quando mais se precisa de uma? – Falar sozinho nunca é um bom sinal, filho. Jake virou-se e se deparou com o avô se aproximando. – Pelo menos, quando falo sozinho, sei que não vou arrumar briga com ninguém – falou ele, usando o forcado para dar mais feno para os cavalos. Ben riu. – E não é o que está fazendo aqui? Brigando consigo mesmo? Jake lançou um olhar fulminante para o homem mais velho. Qualquer um dos seus empregados teria saído correndo. Mas não o avô. – Por que tem de ser tão perceptivo? – Vem com a idade. Algumas coisas ficam mais difíceis; contudo, você começa a ver as coisas com muito mais clareza. – É mesmo? Jake não queria ter aquela conversa. Tudo que queria era tempo para pensar. Para planejar. Para encontrar uma saída do labirinto que se estendia à sua frente. – Como vejo com toda a clareza que está apaixonado por Cassie. Jake estremeceu e sacudiu a cabeça. – Ninguém falou em amor. – É uma pena, pois, se não conseguir dizer as palavras, vai perdê-la. Sentiu o peito apertar-se. Perder Cassie. Já vivera sem ela uma vez, e não tinha a menor vontade de retornar para o vazio obscuro que sua vida se tornara na ausência dela. Mas amor? Amor era perigoso. Amor significava se expor à dor. Já não tivera dor o suficiente em sua vida? Ben ficou olhando o neto. – Eu tive quarenta e nove anos com a sua avó, Jake – disse ele baixinho –, e não trocaria um segundo desse tempo, nem por todos os tesouros do mundo. Jake suspirou ante o lembrete. Sabia que os avós tinham uma história de

Jake suspirou ante o lembrete. Sabia que os avós tinham uma história de amor com a qual a maioria das pessoas apenas sonhava. Fora um dos motivos do seu fracasso com Lisa abalá-lo tanto. Esperara ter o mesmo tipo de casamento. Talvez não o devesse ter feito. Mergulhara de cabeça na relação, fechando os olhos para quem Lisa realmente era. Pois quisera o que os avós tiveram. O que os pais encontraram juntos antes da morte do pai. Quando não conseguiu, ele se fechara, recusando-se a tentar novamente. Porém, quem poderia culpá-lo? Lisa fizera da vida de todos um inferno, até que o abandonara. Ele preferiria se alistar para outro serviço em uma zona de guerra a passar por outro casamento como aquele novamente. Na defensiva, perguntou: – Quer chegar a algum lugar com isso? – Quero. Meu ponto é, não seja um cretino. Jake fungou. – Sempre posso contar com você para ir direto ao ponto. Ben suspirou pesadamente, olhando para o neto como se ele fosse uma grande decepção, e Jake estremeceu, pouco à vontade. – Você é mesmo teimoso. Sempre foi. – A quem será que eu puxei? Ben riu. – Tenho certeza de que é um dom nato. De qualquer modo, estou aqui para lhe dizer que sua mãe quer falar com você. Ela está no telefone lá de casa. Jake não estava com humor para falar com a mãe. Ainda não se esquecera da ameaça dela de tirar Luke de Cassie. – Estou ocupado. – Jake… Teimoso, Jake lembrou-se. Na verdade, a família toda era tão teimosa que de nada adiantava evitar a ligação. A mãe só faria ligar de volta até que conseguisse falar com ele. Melhor acabar logo com aquilo. – Tudo bem – falou Jake, deixando o forcado de lado e marchando para fora do estábulo. Tinha mesmo poucas e boas para falar para ela. Talvez assim entendesse por que ela ameaçara Cassie. Ela não costumava ser tão malvada ou cruel. Ao seguir para a casa de Ben, deliberadamente evitou olhar para a casa principal. Não estava apaixonado. Estava era louco de luxúria. Tinha certeza

disso. Assim que entrou, deliciou-se com o calor e tentou ignorar o perfume de pinho que se espalhava pelo ar. Com um tremendo mau humor, Jake pegou o telefone da mesinha ao lado da poltrona favorita do avô. – O que foi, mãe? – Ora, bom dia para você também – retrucou Elise friamente. – E feliz Natal! Os olhos dele se reviraram. A família toda sabia que ele não comemorava o Natal; no entanto, nenhum deles desistia de tentar. – Certo. O mesmo para você. O que foi? – Acha que pode falar comigo sem tentar me arrancar a cabeça? Suspirando, Jake arrancou o chapéu e passou a mão pelos cabelos. – Uma semana atrás, você ameaçou tirar o meu filho da mãe dele, e agora se surpreende que eu esteja meio irritado? Ela riu, o som tão familiar que aliviou um pouco do peso que ele sentia por dentro. – Ah, Jake. Eu jamais tiraria Luke de Cassie. – O quê? Como assim? Você ameaçou Cassie. Foi por isso que ela veio me procurar, em primeiro lugar. – Não tem de quê. – O quê? – Jake, eu jamais tomaria o seu filho. Eu só estava tentando forçar Cassie a agir. Depois que a irmã dela me contou sobre Luke, eu deveria simplesmente ficar quieta e fingir que não sabia de nada? Preferia que eu não fizesse nada? Preferiria não saber sobre Luke? – Não – falou ele abruptamente. A ideia de jamais saber sobre Luke, de nunca sequer ver o menino era dura demais para ele. Se Cassie fosse embora, Jake jamais veria os primeiros passos do filho. Não escutaria as suas primeiras palavras. Não o ensinaria a montar um cavalo ou a fazer um forte de neve. Não mostraria para o filho os melhores lugares para pescar na montanha e não faria parte o dia a dia da vida do menino. Só de pensar em não ter Luke em sua vida, sentiu o vazio aumentando novamente dentro dele. E Cassie. Sem ela, o que diabos ele tinha? Uma casa

vazia? Um rancho solitário? Quase se sufocou ao imaginar mais cinquenta e poucos anos sem a risada dela. Sem o seu toque. – Jake – disse baixinho sua mãe–, não permita que esta chance com Cassie lhe escape por entre os dedos. Era o que ele estava fazendo? Realmente iria permitir que ela partisse e tentar fingir que não importava? – Eu sei. O eremita na montanha não quer escutar que não é invencível. – Não sou um eremita. – E nem é invencível. Jake, Cassie o ama. A irmã dela me contou. – Eu sei disso. – Acho que você também gosta dela – prosseguiu a mãe. – É claro que gosto dela. Acha que sou feito de pedra? – Já se deu ao trabalho de contar isso para ela? – Elise ficou esperando que ele dissesse alguma coisa e, quando isso não aconteceu, voltou a suspirar. – É claro que não. Jake, sou sua mãe, e o amo, de modo que vou lhe dizer que, se perder esta chance de ser feliz, jamais se perdoará. Ele passou a mão pelo rosto. Quem dera pudesse desligar. Contudo, encerrar a ligação não calaria nenhum dos pensamentos que gritavam em sua cabeça. – Esqueceu-se de Lisa? Ela riu. – Isso seria difícil de acontecer. A mulher causou mais problemas do que… espere um minuto. – A voz da mãe ficou baixa e dura. – Está dizendo que é por isso que deu as costas à sua família e a qualquer chance de encontrar o amor? Porque cometeu um erro com Lisa? – E isso não faz sentido? Eu me casei com ela, não casei? O erro foi meu, e foi dos grandes. – É, foi sim. – Elise suspirou baixinho, e ele escutou o amor na voz da mãe quando disse: – Mas a gente aprende com os nossos erros e segue em frente, Jake. Cassie não é Lisa. E está fazendo um desserviço aos dois se não puder enxergar isso. Cassie merece coisa melhor e, francamente, meu bem, você também. Ah, diabos! Desde o início estivera esperando que Cassie se transformasse em Lisa. Que se tornasse exigente e queixosa. Mas isso jamais acontecera. Ela

mais do que se provara para ele. No entanto, aparentemente, uma pequena parte dele ainda se recusava a acreditar. – Sei que ela não é Lisa. Ele sabia. Vira com os seus próprios olhos Cassie encontrar um lugar para si ali. Fizera amigos no rancho. Sabia trabalhar e não tinha medo de fazer o que precisasse ser feito. Ao contrário de Lisa, Cassie jamais se queixara que o rancho fosse tão longe da “civilização”. Diabos, ela não se queixara a respeito de nada. Amarrando a cara, travou uma batalha silenciosa com os próprios sentimentos. Desejo lutou contra a cautela. Desejo engalfinhou-se com o medo. Medo? Jake não era do tipo de homem de admitir estar com medo. Não no campo de batalha. Não em meio a uma nevasca. Nada o abalava… Bem, nada o abalara até Cassie aparecer. – Eu sabia que, se ameaçasse tirar Luke dela, Cassie iria procurá-lo – disse Elise, e Jake esforçou-se para concentrar-se na mãe. – Eu torcia para que os dois juntos encontrassem um modo de resolver o que os estava separando. – Não é tão fácil. – Poderia ser se você deixasse. Jake, eu amo você, mas será um tolo se permitir que a chance de ter a família que sempre quis lhe escape por entre os dedos. Quando a mãe desligou, Jake permaneceu onde estava, pensando. Cercado pelos sons e aromas do Natal, pensou em Cassie. No sorriso dela. Erguendo-se sobre ele na escuridão da noite, tomando-o dentro de si, mantendo-o ali. Cassie brincando com Luke. Cassie trabalhando ao lado dos vaqueiros para limpar a neve do gramado. Cassie rindo. Cassie dormindo ao seu lado. Cassie sentada no chão da sala, artigos de Natais passados espalhados ao seu redor. Cassie era uma dádiva e, porque fora burro demais para enxergar, estava destinado a perdê-la e a família que poderiam ter formado, deixando a infelicidade como a sua única companheira. E, se o que tivessem terminasse, a culpa seria toda dele. Cassie não falhara. Ele falhara. Por sua própria relutância em tentar novamente. E isso não fazia dele um covarde?

Olhou pela janela, para a sua casa do outro lado do gramado. Sua mulher e seu filho estavam naquela casa. Por caso iria falhar com eles? Uma ova que iria! – NÃO É o suficiente, Claudia. Cass estava sentada na janela do quarto de Jake. Ele estava em algum lugar do rancho, e Luke estava lá embaixo com Anna. – Cass – disse baixinho a irmã–, precisa parar de julgar todos os homens pelo exemplo de papai. – Falar é fácil – murmurou Cass. O céu estava azul, e ela sabia que, se o tempo continuasse firme, partiria em alguns dias. Sentiu um aperto no coração; contudo, que escolha tinha? – Só está aí há uma semana, Cass. Está pronta para desistir tão facilmente? Pensei que o amasse. Ofendida, Cass amarrou a cara. – Eu o amo. E não estou desistindo. Estou apenas aceitando a realidade, em vez de ficar esperando que ela me morda no traseiro. – Certo. – Claudia suspirou com irritação. – Você passou a maior parte da vida me dizendo que tenho de lutar pelo que quero. Para jamais deixar que algo se ponha no meu caminho. – E daí? – E daí que você quer o cowboy! E não está disposta a ficar e lutar por ele. – E como posso fazer isso? A não ser que ele me ame, não há garantias de que um dia ele não possa ir embora. – Não há garantias de qualquer forma – salientou Claudia. – Nossa, que encorajador. Muito obrigada. Claudia riu baixinho. – Quem diria que o amor poderia ser tão difícil, não é? – Espere só até chegar a sua vez. – Por favor, tenho 19 anos. Fale comigo quando eu estiver com trinta. – Pode deixar. Olhe, eu só queria avisar que, assim que as estradas estiverem livres, vou voltar para casa. – Aham. – Claudia bufou. – Cass, você disse que Jake quer se casar com

– Aham. – Claudia bufou. – Cass, você disse que Jake quer se casar com você. Que quer que você fique com ele nesse rancho sobre o qual você não parou de falar desde que voltou. Ele também quer que esteja grávida. – Mas ele não… – Cass, meu bem – Claudia a interrompeu –, você percebe que, desta vez, é você quem está indo embora, não é? A simples frase a acertou em cheio como uma bofetada. Ela empertigou-se no assento. Era o que estava fazendo? Estava fugindo primeiro para não ser deixada para trás? Tinha tão pouca fé que achava que a única maneira de se proteger era ir embora antes que Jake pudesse fazê-lo? – Ah, meu Deus, tem razão. – Nunca vou me cansar de escutar isso. Cass mal a escutou. – Engraçado. Jamais encarei a coisa desse jeito, Claud. Eu só quis garantir que Luke estivesse seguro. Protegido. E eu também. Também quero estar segura. Ela não suportaria se Jake a deixasse. Se virasse as costas para ela e os filhos. E então, o que fez? Desistiu para não ser magoada. – É claro que quer proteger Luke – concordou Claudia. – Mas talvez possa dar uma chance para o pai dele se situar? Quero dizer, teve o quê? Dezoito meses para se acostumar com a ideia de Luke. Jake teve o quê? Uma semana? – Verdade. Eu tenho de encontrar Luke, Claud. Ligo para você depois. Ela largou o celular sobre a cama e saiu correndo do quarto. Desceu as escadas e estava seguindo para a cozinha para falar com Anna, quando algo no salão lhe chamou a atenção, fazendo-a parar. Uma árvore de Natal. A maior e mais linda árvore de Natal que já vira estava postada diante da parede de vidro. Com o coração na garganta, Cass adentrou hesitantemente a sala, detendo-se novamente quando Jake, com Luke empoleirado em um de seus braços, saiu de trás da árvore e sorriu para ela. JAKE ESTAVA nervoso. Ele se sentiria melhor se Cassie sorrisse para ele, mas ela parecia tão atônita que era pouco provável que isso acontecesse. – Arrumei uma árvore para nós. Assentindo, ela sussurrou: – Estou vendo. É linda.

– Luke e eu a decoramos. – Bom trabalho. Jake… – Eu saí hoje de manhã e a cortei. Ao longo dos anos, eu me isolei de muita coisa, e foi preciso você e Luke para me lembrar de tudo que eu vinha perdendo. – Por quê, Jake? – Ela o fitou nos olhos. – Pode me dizer por que parou de comemorar o Natal? Ele inspirou fundo. Não seria fácil, mas estava cansado de se fechar. Era hora de arriscar. Contou para ela do Natal há muito tempo, no campo de batalha, e, ao fazê-lo, foi tomado de alívio. – Quando aqueles rapazes morreram, acho que algo também morreu em mim. Olhou para ela e viu as lágrimas reluzindo nos seus olhos. – Ah, Jake. Eu sinto tanto. – Usei aquela noite como uma desculpa para me retrair. Assim como usei Lisa para afastá-la. Só hoje consegui enxergar isso com clareza. Mas, agora, eu sei o que é importante. Sei quem é importante. Adiantando-se, manteve o olhar fixo no dela, e continuou segurando Luke com firmeza, até ele esticar os bracinhos para a mãe. Cassie tomou o filho nos braços, e Jake ficou fitando-os por um longo instante. – Vocês dois são tudo para mim, Cassie. Você é tudo para mim. Sacudindo a cabeça e piscando os olhos para conter as lágrimas, ela disse: – Não consigo acreditar que tenha saído com toda essa neve para arrumar uma árvore de Natal. – Você queria uma, e Luke merecia uma. Quanto a mim? – Ele lançou um olhar para a árvore por sobre o ombro e sentiu anos de solidão e tristeza abandonando-o. Olhando de volta para Cassie, disse: – Eu queria esta árvore porque este é o nosso primeiro Natal juntos, como uma família. – Ah, Jake… Ele puxou Cassie e Luke para os seus braços. – E preciso que você saiba que não quero que este seja o nosso último Natal juntos. – Curvando a cabeça, ele a beijou gentilmente nos lábios, antes de plantar um beijo na testa de Luke. – Eu quero tudo, Cassie. Quero filhos, e

cães, e o caos. Quero a vida que podemos construir juntos. Case-se comigo, Cassie. Case-se comigo porque eu a amo. Porque eu não existo sem você. Ela inspirou fundo, uma lágrima solitária escorrendo pela sua face. – Case-se comigo porque merecemos ser felizes. E seremos. Eu juro. – Ele fitou os olhos acinzentados e viu reluzindo ali um futuro que jamais teria acreditado ser possível antes de conhecê-la. – Case-se comigo, e eu juro que todos os dias serão Natal. Ela riu baixinho, e seu olhar se voltou para a árvore de Natal que ele cortara logo após uma nevasca, apenas para que ela não ficasse desapontada. Apenas para deixá-la feliz. Para provar que a amava. Fitando-o nos olhos, Cassie soube que aquele homem jamais abandonaria a família. Ele sempre estaria ao seu lado. Era um homem melhor do que o pai dela jamais fora, e jamais voltaria a duvidar dele. – Ainda não disse sim – falou Jake, passando o braço ao redor dos ombros dela e a conduzindo na direção da árvore de Natal. – Sendo assim, deixe-me lhe dar o seu presente. – Presente? Cassie riu. O homem era cheio de surpresas. Tomando Luke nos braços, Jake passou para Cassie uma pequena caixinha entalhada à mão que ele pegou debaixo da árvore. Quando ela abriu, seu coração se derreteu. No interior havia uma antiga aliança. Ouro, com vários pequenos diamantes e uma opala no centro. Era linda. – Ah, Jake. – Era da minha avó. Ele pegou a aliança e a deslizou pelo dedo dela. – Mas eu não posso… Ele a beijou e sorriu. – Quero que você a tenha. Pop também. Esta aliança tem uma história de muito amor. Quero contribuir para esse amor com você. – Jake levou a mão ao rosto dela. – Diga que ainda me ama e que a resposta é sim. Case-se comigo, Cassie. Não me deixe sozinho na montanha. – Sim, Jake, sempre sim. Eu o amo tanto. – Graças a Deus – sussurrou ele, voltando a beijá-la. E, sob o brilho suave do Natal, novas promessas nasceram.

EP ÍLOGO

Um ano mais tarde.

– E U FAZ, papai! – Luke saltitou até o pai pegá-lo no colo e erguê-lo para que pudesse colocar o enfeite do carrinho de bombeiro o mais próximo possível da estrela no topo. Quando conseguiu, o menininho virou-se para o pai com um largo sorriso no rosto. – Carro de bombeiro na árvore! – Pode apostar que está. Jake riu, deu um abraço no filho e o colocou no chão para que pudesse correr pela casa com Boston… provavelmente seguindo para a cozinha. – Ah, Jake, esse bebê é a coisa mais fofa que eu já vi – disse a mãe, descendo as escadas, vindo do quarto do bebê. – Depois mim, é claro – provocou Jake. – Ela quer dizer, depois de mim – salientou a irmã, de seu lugar no sofá. Beth, o marido e as crianças haviam vindo para o Natal, assim como Claudia, a irmã de Cassie, e o irmão Dave com a família. A casa estava cheia e Jake estava adorando cada instante. Que diferença fazia um ano, pensou, olhando para o avô, sentado diante da lareira e lendo para o caçula de Beth. Jake não só tinha Cassie e duas crianças fantásticas, como recuperara na sua vida a própria família. A montanha não era mais tão solitária quanto costumava ser e, todas as noites, agradecia aos céus por isso. – Cassie pediu para que você subisse – informou a mãe, ficando na ponta dos pés para beijar-lhe a face. – Os panos umedecidos acabaram e ela quer que

você lhe leve alguns da despensa do porão. – Tudo bem. Ele virou-se, pronto para ir cumprir a sua missão, mas a mãe o deteve ao pousar uma das mãos no seu braço. – Não consigo lhe dizer o quanto significa para mim vê-lo tão feliz. Ele a beijou na testa. – Não precisa. Agora que tenho filhos, enfim entendo. – Ótimo. Agora, vá. Não deixe a sua mulher esperando. Sorrindo, Jake desceu até o porão, pegou duas caixas de lenços umedecidos e voltou a subir as escadas. Ao passar pelo grande salão, olhou para a sua extensa família. Com as guirlandas, as velas acesas e a gigantesca árvore de Natal, parecia a cena perfeita. Da cozinha vinha o aroma fenomenal de um peru assando, e os sons de Anna dando um biscoito para Luke, que ele tinha certeza de que seria compartilhado com Boston. Claudia estava no seu gabinete, ao telefone com uma amiga, e Dave e a mulher estavam nos estábulos, enquanto os filhos dormiam lá em cima. Anna estava no paraíso com tantas crianças para cuidar, e ela vivia expulsando os pais da casa para que pudesse se divertir bastante. Com o som de músicas natalinas vindo do aparelho de som, Jake sacudiu a cabeça e subiu as escadas. Seguiu direto para o quarto do bebê, ao lado da suíte principal. Detendo-se na entrada do quarto apenas para admirar a visão da mulher com a filha, Jake soube que aquela era uma cena que jamais se cansaria de ver. Quando Cassie percebeu a sua presença, virou-se para ele e sorriu, e tudo no interior de Jake ficou paralisado. Ela era tudo para ele. – Como está a nossa garotinha? – perguntou, adentrando o quarto e agachando-se diante da cadeira de balanço. – Rachel está quase terminando de jantar, não está, meu docinho? Ele realizara o seu desejo, e passara nove meses vendo Cassie ficando maior com a filha dele, e adorara cada segundo. O parto fora mais difícil do que poderia ter imaginado; contudo, mais uma vez, descobriu como a sua mulher era forte. Rachel estava com apenas três meses, e Cassie já estava falando em ter outro. Para Jake, estava ótimo. Ambos queriam mesmo uma grande família.

O bebê deu um sorriso cheio de leite e estendeu a mãozinha para agarrar o dedo de Jake, cujo coração se apertou de maneira quase dolorosa ao curvar-se para beijar a testa da filha. Ele olhou para Cassie. Brevemente, recordou-se de sua vida antes do caos, quando a paz era tudo que importava e o silêncio lhe governara os dias e as noites. Sequer conseguia entender o homem que já fora. Na verdade, era grato que aquele homem tivesse desaparecido. Fitando os olhos acinzentados da esposa, Jake sussurrou: – Obrigado por salvar o solitário da montanha. – Feliz Natal, Jake.

Andrea L aurence

DESEJO COM PARTILHADO

Tradução Maurício Araripe

Querida leitora, Adoro escrever histórias sobre bilionários e bebês, especialmente quando consigo juntá-las a outro tema que gosto muito: Manhattan. Dessa vez, quis escrever sobre um bebê secreto – com uma diferença: ninguém sabe que ele é secreto! Na vida real, espero que esse tipo de confusão não aconteça, mas na terra do romance, quando acontece, sempre tem um bilionário sensual e solteiro envolvido! E aqui temos Luca, inteligente, bem-sucedido e extremamente reservado. Ele já passou por muitas coisas difíceis e nunca achou que teria um filho, muito menos com uma completa desconhecida como Claire. Juntar esse empresário teimoso com essa mamãe urso foi uma montanha-russa de emoções, e espero que você goste do passeio. Se adorar a história de Luca e Claire, me conte no meu site: andrealaurence.com, curta minha página no Facebook, e me siga no Twitter. Boa leitura! Andrea

CAP ÍTULO 1

– N ÃO IMPORTA, Stuart. Não vou deixar um completo desconhecido tirar a minha filha de mim. O advogado de Claire Douglas, Stuart Ewing, acariciou-lhe a mão. Ele tinha um jeitão de avô, uma atitude tranquila que não combinava com o fato de que era um tubarão nos tribunais. Ela tinha um bocado de fé e dinheiro investidos no homem, mas isso não significava que, no fundo, não estivesse apavorada. – Pensaremos em alguma coisa, Claire. Só preciso que mantenha a calma quando entrarmos ali. Não se deixe levar pelas emoções. Claire amarrou a cara. Manter as emoções sob controle não era exatamente a sua especialidade. Ao longo dos últimos dois anos, fora bombardeada por emoções. Sua vida se transformara em uma montanha-russa a partir do instante em que se descobriu grávida. Após dois anos de fracassados tratamentos de fertilidade, fora a última chance deles. Ela fora às alturas de tanta felicidade, naquele momento. E a morte do marido em um acidente de carro quando ela estava grávida de cinco meses a levara ao fundo do poço. Ainda mais levando em conta as dolorosas revelações que se seguiram. O nascimento da filha fora a única coisa a tirá-la daquele lugar escuro, dando-lhe uma razão para voltar a ser alegre e viver novamente a sua vida. Mas ela jamais esperara aquilo. A revelação do engano cometido na clínica de fertilidade mudara toda a sua vida, tornando-a uma milionária, e, ao mesmo tempo, ameaçando a estabilidade de sua pequena família.

– Senhora Douglas? Senhor Ewing? Estão sendo aguardados. De trás de sua mesa, a recepcionista gesticulou na direção de portas duplas que levavam a uma sala de reuniões. Ali, Claire presumia, aguardava o homem que estava tentando tirar dela a filha, e o advogado que contratara para ajudá-lo. Ela sentiu o estômago se revirar, ameaçando devolver o café e o pãozinho que forçara garganta abaixo naquela manhã. – Venha, Claire – disse Stuart, levantando-se da poltrona na sala de espera. – Tudo vai dar certo. Você não vai perder a sua filha. Claire assentiu, tentando agir com calma e confiança, embora estivesse longe de se sentir assim. Não havia garantia alguma. Estavam marchando para dentro de um aposento onde Edmund Harding os estava aguardando. Ele era o tipo de advogado que todo bilionário em Manhattan tinha na agenda de discagem rápida do telefone. Harding tinha um nível tal de prestígio e influência que, provavelmente, poderia convencer os tribunais a fazer o que quisesse. Pegando a bolsa, ela se forçou a cerrar as mãos trêmulas e seguiu Stuart para dentro da sala de reuniões. A sala era elegante e intimidadora, com uma enorme mesa de vidro retangular dividindo-a em duas. Não havia dúvida de que delimitava o espaço no campo deles e no campo dos seus oponentes. Havia confortáveis poltronas de couro ao redor da mesa; contudo, no momento, estavam todas vazias. O olhar de Claire voltou-se para as enormes janelas que iam do chão ao teto do lado esquerdo da sala. Um homem estava postado diante delas, admirando o Central Park. Ela não conseguia lhe enxergar as feições, apenas o contorno dos ombros largos e a cintura estreita. O homem era alto, e os braços estavam cruzados diante do peito. Irradiava uma energia tão intensa que Claire não pôde deixar de notá-lo imediatamente. – Ah, sra. Douglas. – Ela escutou uma voz dizendo. – Senhor Ewing. Por favor, sentem-se. Claire voltou-se na direção da voz, deparando-se com um homem no outro extremo da sala. Ele estava trazendo um punhado de documentos para a mesa. O homem tinha uma aparência estudiosa que a convenceu de que ele era o

infame Edmund Harding. Isso significava que o homem diante das janelas tinha de ser… – Luca, estamos prontos para começar – disse Edmund. Quando Claire se acomodou na poltrona, o homem na janela enfim se virou. Quando ele o fez, Claire ficou feliz de já estar sentada. O rosto que a fitou era como uma obra-prima florentina da arquitetura renascentista. Tinha o maxilar quadrado e liso, e as maçãs do rosto eram salientes, como se esculpidas em mármore. Sobrancelhas escuras pairavam sobre olhos estreitados, com ligeiras rugas nas extremidades. Tais olhos percorreram Claire por um instante, antes de se desviarem, desinteressados. Ele marchou até a mesa de conferências e sentou-se ao lado do advogado. Aquele era o pai da filha dela? Ela quase não conseguia acreditar; no entanto, os cabelos escuros e a tez azeitonada da garotinha, com certeza, não haviam vindo dela. – Antes de começarmos, será que alguém gostaria que minha assistente lhe trouxesse algo? Água? Café? – Edmund perguntou. – Não, obrigada – disse Claire, baixinho. – Café. Puro – exigiu o homem do outro lado da mesa. Nada de gentilezas, nada de “por favor”, nem “obrigado”. Parecia ser o tipo de homem acostumado a conseguir tudo que queria. Contudo, desta vez, não veria feita a sua vontade. Claire estava determinada a não permitir que a filha caísse nas garras daquele homem. Ele sequer conhecia Eva. Como é que poderia conseguir a sua guarda? A assistente trouxe uma xícara de café puro para Luca, desaparecendo tão prontamente quanto aparecera. – Obrigado por terem vindo hoje – começou Edmund, assim que a porta se fechou. – Solicitamos um encontro pessoalmente, pois achamos que nossos contatos anteriores não estavam tendo o impacto que deveriam. O sr. Moretti leva muito a sério a proposta de guarda compartilhada. Receber a intimação avisando que um desconhecido estava exigindo a guarda da sua filha a deixara chocada. Quando descobriu a verdade sobre a confusão na clínica de fertilidade, parte de si torceu para que o pai biológico não tivesse interesse em Eva. Logo soube que não seria esse o caso.

– Não acha que é um pedido precipitado? – Stuart perguntou. – Ele sequer conheceu a criança, mas acha que deveria ter direito à guarda compartilhada? – Ele já teria conhecido a menina há semanas, se a sua cliente houvesse cooperado com os nossos pedidos. Não tivemos opção senão tomar uma atitude que a senhora Douglas não pudesse continuar a ignorar. Os dois advogados continuaram a discutir, mas Claire viu a sua atenção atraída pela força silenciosa sentada do outro lado da mesa. Enquanto o advogado se encarregava das discussões, Luca Moretti recostou-se na poltrona e estudou Claire. Seus escuros olhos castanhos percorreram cada centímetro dela. Ela fez o possível para ficar imóvel, não querendo se contorcer nem demonstrar qualquer fraqueza diante dele. Em vez disso, ela se concentrou em estudá-lo com semelhante atenção. Era tão fácil enxergar partes dele em Eva. Quando a sua filha nasceu, Claire ficara confusa ao lhe ser entregue uma criança de cabelos escuros e encaracolados. Claire tinha cabelos cor de mel. Seu marido, Jeff, tinha cabelos castanhoclaros. Nenhum dos dois tinha pele azeitonada, nem uma covinha no queixo, mas Eva tinha. Contudo, toda a sua confusão e preocupação desapareceram no instante em que ela fitou os olhos acinzentados da filha. Apaixonou-se naquele instante, e não estava mais nem aí com a aparência de Eva, pois ela era perfeita. No que dizia respeito a Claire, Jeff devia ter sangue italiano ou espanhol, e ela jamais soubera. As dúvidas só voltaram à sua cabeça quando a clínica ligou para ela, três meses mais tarde. Eles a informaram de que o último frasco de esperma seria destruído em três meses, caso não fosse utilizado. Não haviam optado por pagar armazenagem por toda a vida, pois os planos deles eram utilizá-lo em relativamente pouco tempo. A ligação a confundiu, pois haviam usado a última dose quando conceberam Eva. A informação servira de alerta, e não demorou muito para a verdade ser descoberta: o esperma do marido estava com um dos números trocados na documentação, e o esperma de outro cliente fora utilizado. O de Luca Moretti, para ser exata. O pensamento a deixou arrepiada. O homem jamais a tocara; no entanto, parte dele já estivera dentro dela. De qualquer modo, o que um homem como

Luca estava fazendo em uma clínica de fertilidade? Vendendo esperma em troco de dinheiro para pagar as mensalidades da faculdade? Cada centímetro do seu corpo, dos ombros largos até o maxilar proeminente, irradiava o tipo de masculinidade a que ela não era exposta há muito tempo, se é que já acontecera. Com aquela aparência, Claire tinha certeza de que dele poderia fazer os ovários de uma mulher explodirem. Se um homem como Luca precisava dos serviços de uma clínica de fertilidade, um homem inferior não tinha a menor chance com a sua própria prole. Todavia, ali estava ele. Quando a novidade veio à tona, Luca voltara a sua atenção para a clínica de fertilidade. Mandara Edmund ir atrás deles, e, antes que Claire se desse conta, a clínica estava implorando para chegar a um acordo longe dos tribunais e para abafar o escândalo. Ela instantaneamente passara de uma mulher de classe média em situação confortável para alguém que jamais precisaria trabalhar outro dia na vida. Contudo, em seguida, Luca soltara os cachorros legais em cima dela. Mas Claire se recusou a ceder. Não estava nem aí se as batalhas nos tribunais lhe custassem até o último centavo recebido no acordo. Eva era sua filha. Já era duro ter de lidar com a revelação da paternidade da criança. Ainda estava tentando superar a raiva e a frustração provocadas pela morte de Jeff. Como poderia contar aos pais de Jeff que Eva não era a neta biológica deles? Já tinha problemas mais do que o suficiente. Não precisava de Luca aparecendo do nada e fazendo exigências no tocante à filha dela. – Precisa haver um meio-termo que deixe a todos felizes – disse Stuart, trazendo a atenção dela de volta para a conversa. – Meu cliente não está aberto a negociar nenhum termo que não envolva visitas à filha dele. – Minha filha. – Claire se manifestou com toda a força que foi capaz de reunir. Sentiu a mão de Stuart cobrindo a sua, tentando acalmá-la, mas de nada adiantaria. – Eva é minha filha. Não vou simplesmente entregá-la a um desconhecido. Não sei nada a respeito desse homem. Poderia ser um assassino em série ou uma espécie de tarado. Entregaria seu filho para um desconhecido, senhor Harding? A sua explosão pegou Edmund de surpresa, mas o som que chamou a atenção dela foi a gargalhada vinda do homem sentado ao seu lado. Era o

primeiro som emitido por Luca desde a sua exigência de café. Quando Claire se voltou para ele, notou o brilho de interesse nos olhos dele, e um curvar divertido dos cantos dos lábios bem-feitos. Não estava mais apenas estudando-a. Parecia genuinamente… intrigado. – Posso lhe assegurar de que meu cliente não é nenhum criminoso, senhora Douglas. Ele é presidente da Moretti’s Italian Kitchen, a maior cadeia de restaurantes italianos do país. Claire desviou os olhos do intenso olhar de Luca, pois a estava deixando pouco à vontade. Contudo, não era hora de se deixar abalar. Quer dizer que era um grande proprietário de restaurantes? Bom para ele. Mas o que isso realmente dizia sobre o seu caráter? Sucesso não fazia dele nenhum santo. – Quer dizer que está presumindo que um abastado homem de negócios não pode ser um assassino, ou um molestador de crianças? Eu argumentaria apenas que eles possuem os melhores advogados. – Meu cliente está disposto a cooperar para tranquilizá-la, sra. Douglas. Não somos os vilões desta história. Estamos apenas tentando garantir que Eva faça parte da vida do sr. Moretti. É bem-vinda a fazer uma investigação de antecedentes. Não encontrará nada questionável. Mas, quando não encontrar os esqueletos que está procurando, terá de deixá-lo ver Eva. – E se a sra. Douglas não cooperar? Claire prendeu a respiração, aguardando para ver o que diriam. Será que forçariam a barra, ou recuariam até o dia do julgamento? – Nesse caso, deixaremos de ser bonzinhos – explicou Edmund. – Darei entrada em uma moção emergencial de visitação para garantir o acesso à Eva, e deixarei que os tribunais decidam. Pode ter certeza de que o juiz dará ao meu cliente ainda mais tempo com a filha do que estamos solicitando. A escolha é sua, sra. Douglas. QUER DIZER que essa era Claire Douglas? Luca teve de admitir que ficou surpreso. O nome dela estivera em seus pensamentos e uma centena de vezes desde que a confusão viera à tona. Não sabia ao certo o que estava esperando da viúva sra. Douglas, mas, com certeza, jovem, esbelta e loura não estivera na lista. Foram necessárias todas as suas

forças para manter a compostura quando se voltou da janela e a viu postada ali. O prático terninho cinza se colava a cada curva deliciosa dela e combinava perfeitamente com a tonalidade dos olhos. O claro cabelo cor de mel estava preso em um coque profissional na nuca. A vontade dele era retirar os grampos e permitir que as ondas louras caíssem por sobre os ombros. Quanto mais tempo ficou ali sentado, observando-a, mais curioso se tornou a seu respeito. Como é que uma mulher tão jovem se tornara viúva? Será que ela sempre fora tão irritável, ou era apenas porque não gostava dele? A vontade dele era deslizar o polegar por entre as sobrancelhas dela, alisando os vincos da testa franzida. Isso o levou a se perguntar se a filha se parecia mais com ele ou com ela. Será que ela tinha a pele de porcelana de Claire e o seu nariz empinado? Será que suas orelhas ficavam vermelhas quando ficava zangada, como acontecia com a mãe? Claire tinha mais fogo em si do que o acinzentado conjunto sem graça indicava. – Eles podem fazer isso? – Claire perguntou, voltando-se para a advogado. A ideia de Luca ter acesso à filha deles parecia deixá-la tomada de pânico. Filha deles. Parecia tão errado ele ter uma filha com uma mulher que jamais conhecera. Luca jamais pensara seriamente em ter uma família. Ele só armazenara o esperma para agradar aos médicos e a mãe. Mas jamais esperara usá-lo. Contudo, agora que tinha uma criança de carne e osso, ele não iria cruzar os braços e fingir que ela não existia. Eva provavelmente era a única criança que ele viria a ter, e Luca já perdera meses da vida dela – algo que não continuaria a acontecer. – Podemos e faremos. – Luca, por fim, se pronunciou. – Esta confusão toda é uma confusão que nenhum de nós antecipara, mas não muda os fatos. Eva é minha filha, e tenho os resultados do exame de paternidade para comprovar isso. Não há um único juiz no condado de Nova Iorque que não vá me conceder visitações temporárias enquanto aguardamos o nosso dia nos tribunais. Eles dirão quando, onde e com que frequência terá de deixá-la comigo. Claire se viu boquiaberta ante as palavras dele.

– Ela não passa de um bebê. Tem apenas seis meses de vida. Por que lutar comigo por ela, apenas para entregá-la a uma babá? Luca riu ante o tom insolente. – O que a leva a ter tanta certeza de que terei uma babá para ela? – Porque… é um homem de negócios rico, poderoso e solteiro. Sabe mais a respeito de tocar uma empresa do que sobre trocar fraldas. Estou disposta a apostar que não sabe nada a respeito de criar um bebê, que dirá ter tempo para cuidar de um. Luca apenas sacudiu a cabeça e empoleirou-se no seu assento. – Sabe muito pouco a meu respeito, tesorina. Já admitiu isso; sendo assim, não tire conclusões precipitadas a meu respeito. Além do mais, mesmo que eu tenha uma babá, não importa, pois Eva também é minha filha. Vou lutar pelo direito de vê-la, mesmo que seja para entregá-la nas mãos de outra pessoa. Goste ou não, não tem o direito de opinar quanto ao que eu faça quando estiver com ela. Claire estreitou os olhos ao fitá-lo. Definitivamente não gostava de ser provocada por ele. E ele a estava provocando. Parcialmente porque gostava de ver o fogo no olhar dela e o rubor de sua pele, e, em parte, para fazê-la entender. Nenhum dos dois pedira para que aquilo acontecesse com eles, mas ela precisava aprender que não estava no comando. Para que aquela situação constrangedora melhorasse, teriam de cooperar. Ele começara com gentileza e polidez, pedindo para ver Eva, e fora descaradamente ignorado. À medida que cada pedido foi respondido com silêncio, ele fora aumentando a pressão. Foi assim que terminaram ali. Se ela continuasse a provocá-lo, teria de começar a jogar duro. Não queria fazê-lo, mas ele a esmagaria como fazia com os concorrentes dos seus restaurantes. – Podemos trabalhar juntos e sermos bonzinhos um com o outro, ou Edmund pode tornar as coisas muito difíceis para a senhora. Como ele disse, a escolha é sua. – Minha escolha?! Eu duvido. Fungando, ela cruzou os braços. O movimento empurrou para cima o busto abundante, deixando-o saliente sob o decote do paletó. O rubor se espalhara muito mais do que ele estava

esperando. Ficou curioso para saber até onde ia. – Senhor Moretti? Luca desviou o olhar do peito de Claire e a fitou nos olhos ardentes. – Desculpe, como disse? – Eu disse que me deixa de mãos atadas. Sequer está me dando ouvidos. Como podemos negociar quando não está me escutando? Luca engoliu em seco, de constrangimento, disfarçando-o com a máscara de indiferença e autoconfiança que costumava usar. Já fazia muito tempo desde a última vez em que perdera o foco durante uma discussão de negócios, que dirá por conta de uma mulher bonita. Aparentemente, vinha trabalhando muito e precisava de um pouco de companhia para não perder a vantagem. – E como é que vamos negociar, quando se recusa a mudar de posição? Não escuta nada que não seja exatamente o que quer. – Isso não é… – Claire – interrompeu o advogado com um sussurro. – Precisamos considerar o que estão oferecendo. – Não quero considerar nada. Esta coisa toda é ridícula. Terminamos aqui – falou ela, fazendo menção de se levantar. – Muito bem – retrucou Luca, recostando-se na poltrona. Hora de apertar os parafusos. – Acho que ficará linda de laranja. – Laranja? – Claire perguntou, acalmando-se um pouco. – É. Um macacão de presidiária laranja, para ser exato. Se o juiz ordenar visitações, e você não obedecer, poderá acabar na cadeia. O que seria bom para mim, na verdade. Eu ficaria com a guarda total de Eva. – Sente-se, Claire – mandou Stuart. A fachada de durona ruiu assim que ela voltou a se acomodar na cadeira. Enfim, ele a fizera entender. A última coisa que queria fazer era colocar uma jovem mãe na cadeia, mas ele colocaria. Não era do tipo de homem dado a blefes, de modo que ela faria bem em lhe dar ouvidos. Com um suspiro, Claire inclinou-se para a frente, entrelaçando os dedos delicados sobre o tampo de vidro da mesa. – Não acho que entenda o que está pedindo de mim. Por acaso tem sobrinhos ou sobrinhas, sr. Moretti? Se ele tinha? Era de uma grande família italiana. Com cinco irmãos e irmãs,

Se ele tinha? Era de uma grande família italiana. Com cinco irmãos e irmãs, tinha mais sobrinhos e sobrinhas do que poderia contar nos dedos de ambas as mãos. O mais novo, o pequeno Nico, tinha apenas algumas semanas de idade. – Tenho. – E como se sentiria se uma de suas irmãs estivesse na minha situação? Se o marido dela morresse e ela fosse pega de surpresa pela notícia de que ele não era o pai do bebê deles? Para, em seguida, ser forçada a entregar a sua sobrinha para um desconhecido devido a circunstâncias que fugiam totalmente ao controle dela? Isso fez Luca franzir a testa. Administrava a empresa da família com os irmãos ao seu lado. A Moretti Enterprises era a sua vida. Família… sangue… era tudo para ele. Por isso Eva era tão importante. Independente das circunstâncias, ela era família. A ideia de deixar Nico ir com alguém que não conheciam era perturbadora, mesmo que o homem tivesse o direito. Talvez precisasse mudar de tática com Claire. Intimidação não a faria mudar de ideia. Também não funcionaria com a irmã dele. – Entendo como isso deve ser difícil. A despeito do que possa pensar, sra. Douglas, não estou querendo arrancar o seu bebê dos seus braços. Contudo, eu quero conhecer a minha filha e fazer parte da vida dela. Não abrirei mão disso. Acho que se sentirá mais à vontade com a situação toda se vier a me conhecer melhor. Muitas das suas preocupações no tocante a mim e sobre como cuidarei de Eva desaparecerão se passarmos algum tempo juntos. Estou falando de todos nós juntos, para que possa estar presente em todos os momentos e ficar mais tranquila no tocante à minha capacidade de ser um bom pai. O franzir da testa de Claire foi se suavizando com as palavras dele. – Como visitas supervisionadas? Agradeço o que está fazendo, mas vai demorar um bocado para eu me sentir à vontade, se passarmos apenas uma ou duas horas juntos toda tarde de domingo. Quanto poderei descobrir a seu respeito durante o ocasional passeio pelo parque? Luca sacudiu a cabeça. – Na verdade, não, não foi bem isso que eu quis dizer. Tem razão, vai ser necessário muito mais do que isso.

– O que está sugerindo, sr. Moretti? – perguntou o advogado dela. – Estou sugerindo que ambos tiremos algum tempo de folga dos nossos trabalhos e passemos esse tempo juntos. – Na sua cobertura? – Claire perguntou. Ele deu de ombros. Não havia pensado muito no tocante a onde, e nem como. – Por que não? – Eu prefiro um território neutro, sr. Moretti. Não me sentirei à vontade na sua casa e duvido que vá gostar da bagunça que um bebê pode fazer no seu apartamento chique. Também não acho que vá gostar de vir para o Brooklyn. – Muito bem. O que acha de tirarmos férias juntos? Alugar uma casa de praia, ou algo parecido? – Luca, eu não sei se essa é uma boa… – Estou escutando – falou ela, interrompendo a queixa de Edmund. – Parece bom, mas de quanto tempo de férias estamos falando? Se ia fazer aquilo, e fazer dar certo, não podiam se contentar com pouco. Algumas horas aqui e ali não dariam em nada. Ele precisava conhecer a mãe da filha, formar um vínculo com a menina e tranquilizar Claire no tocante à sua capacidade de cuidar de Eva. Isso levaria tempo. – Acho que um mês dará conta do recado.

CAP ÍTULO 2

– U M MÊS? – Claire ficou atordoada. – Senhor Moretti… – Por favor, me chame de Luca – disse ele, com um sorriso que fez a pulsação dela disparar. Era um sorriso perigoso. Encantador. Irresistível. Combinado com a sua beleza de astro do cinema, era o suficiente para levá-la a esquecer que ele era o inimigo, e não um amante em potencial. Quase preferiria que ele retornasse à sua expressão de homem de negócios frio. – Luca, eu tenho um emprego. Sou curadora do Museum of European Arts. Não posso me afastar por um mês, ainda mais de uma hora para a outra. – E acha que será fácil para mim simplesmente passar adiante por um mês as rédeas da empresa de minha família? Será difícil para nós dois, mas é evidente a sua necessidade para que isto dê certo. Precisamos de um tempo só para nós, para ficarmos à vontade um com o outro. Não acha que o bem-estar de Eva vale a pena o sacrifício? Que ótimo. Agora Luca era o mocinho e Claire, a que estava sendo pouco razoável porque não estava disposta a fazer o que fosse necessário pela filha. – É claro que ela vale o sacrifício. Minha filha é toda a minha vida. – Nesse caso, qual é o problema? Pelo que entendo, o nosso dia nos tribunais será em seis semanas. Após passarmos quatro dessas semanas juntos, talvez possamos pensar em um acordo que nos deixe a ambos felizes, e que possamos apresentar ao juiz. Claire sentiu Stuart apertar o seu joelho por baixo da mesa. Não precisou olhar para o advogado para saber que ele gostara da ideia. Ninguém queria

enfrentar Edmund Harding nos tribunais, quando isso podia ser evitado. Encontrar o juiz com tudo resolvido facilitaria as coisas para todo mundo, inclusive para Eva. Foi esse o pensamento que a convenceu. Seu chefe não ficaria feliz; porém, ele entenderia. Ele sabia pelo que ela vinha passando nos últimos dois anos. Seria o primeiro a dizer que ela precisava de umas férias. Licença-maternidade não era exatamente um descanso. Era apenas uma introdução de seis semanas para a vida dura de uma mãe solteira. – Muito bem, se concordar em tirar da mesa a solicitação de visitação temporária, concordarei com a sua proposta. Luca assentiu lentamente e gesticulou para o seu advogado. – Muito bem. Tomarei as devidas providências para arrumar um local. – Eu preferiria que não fosse muito longe – disse Claire. – Viagens longas com um bebê são difíceis, e não sei se estou preparada para uma viagem de avião com ela. – Tenho um velho amigo de faculdade que tem um lugar em Martha’s Vineyard. Estaria bom para você? Claire se esforçou para não reagir. Martha’s Vineyard era o playground de verão dos ricos. Até recentemente, ela estivera solidamente inserida na classe média, e um local de férias como aquele sempre parecera fora do seu alcance. O súbito aumento no saldo da sua conta bancária não mudara a forma dela de pensar. – Seria bom – disse baixinho. – Muito bem. Falarei com Gavin e me certificarei de que o lugar esteja disponível. Quanto tempo precisará para se preparar para a viagem e providenciar sua licença no trabalho? Era segunda-feira. Na melhor das hipóteses, poderia partir no final de semana. – Alguns dias, provavelmente. – Vou lhe passar meus contatos. Avise-me quando estiver pronta que eu mandarei um carro para buscá-la. – Não será necessário. Posso cuidar do meu próprio transporte. Claire jamais fora do tipo de mulher de depender de outros para cuidar dela. Sempre fora mais do que capaz de fazer isso sozinha.

– Ridículo. Iremos juntos e começaremos a nos conhecer melhor assim que possível. Claire cerrou o maxilar. O modo como ele falava, como se tudo que dizia fosse lei, a enlouquecia. Contudo, precisava escolher as suas batalhas. – Muito bem. Acabamos aqui? Os lábios de Luca se retorceram em um sorriso divertido. – Acabamos. Ótimo. Claire estava desesperada para deixar aquela sala, que sentia encolhendo-se ao seu redor ante a intensidade do olhar de Luca. Ele parecia conseguir ver dentro dela com aqueles olhos castanho-claros ligeiramente dourados, enxergando todos os segredos e a vergonha que ela estava desesperada para esconder. Pegando a bolsa, ela levantou-se da poltrona e virou as costas para Luca Moretti. Precisava colocar um pouco de distância entre eles. Queria respirar um ar que não estivesse perfumado com a água-de-colônia dele. Claire saiu decididamente da sala de conferências, deixando o escritório de Edmund com Stuart em seus calcanhares. Ela só parou quando já estava na calçada, olhando para o tráfego intenso de Lexington Avenue. Claire inspirou fundo e sentiu os músculos dos ombros e do pescoço começando, enfim, a relaxar. Não era só o que ele via nela, era como ele a fazia se sentir. Luca a incendiava por dentro e despertava nela desejos que Claire ignorara por mais tempo do que gostaria de admitir. Quando ela e o marido decidiram ter um filho, e isso não aconteceu facilmente, sexo com Jeff se tornou uma tarefa. Mecânico. Quando isso não deu certo e eles procuraram uma clínica, a coisa tornou-se ainda pior. O desejo saiu pela janela diante de salas esterilizadas e procedimentos médicos. O relacionamento deles mudou, à medida que só conseguiam se concentrar nos fracassos. Não fora à toa que Jeff pulara a cerca. Claire ficara tão obcecada em engravidar, depois tão absorta com os preparativos da chegada do bebê, que sequer notara que havia algo de errado. Jeff estava trabalhando até mais tarde, fazendo mais viagens de negócios, mas isso não era algo incomum. Muitas pessoas faziam isso. Ela mesma trabalhava até mais tarde de tempos em tempos, especialmente quando estava

preparando uma nova exibição para ser inaugurada no museu. Também ignorou o fato de que ele seguia para o banho assim que chegava em casa, que parecia distante e que não tinha nenhum interesse em contato físico. Acostumara-se tanto a justificar os sinais de alerta que, se a amante de Jeff não houvesse morrido com ele no acidente de carro, talvez jamais admitisse que ele estava tendo um caso. Demorara um pouco para aceitar a verdade; contudo, saber que o seu relacionamento com Jeff teria terminado de qualquer modo a ajudara a lidar com a sua morte. Ela perdera o marido muito antes daquela noite. Se Jeff tivesse vivido o suficiente para a verdade sobre sua infidelidade ter vindo à luz, eles provavelmente teriam se divorciado. E se, por algum milagre, tivessem conseguido superar o momento difícil, descobrir que ele não era o pai de Eva teria sido o fim. O ego dele jamais teria sobrevivido a um golpe desses. Dar-se conta de tudo aquilo abalara significativamente a confiança dela na própria capacidade de fazer boas escolhas. Achara que Jeff fosse o homem perfeito para ela e estivera enganada. Achara que um bebê ajudaria a lhe dar o que estava faltando na sua vida e no seu casamento, e não deu certo. Amava Eva mais do que tudo e não se arrependia de tê-la tido, mas um bebê não fora a resposta para os seus problemas. No final das contas, apenas fizera piorá-los. Sentir-se atraída por Luca Moretti era outra decisão ruim. Ao sentir o olhar dele sobre si, soube que era uma péssima ideia. No entanto, há anos que não se sentia tão viva. Ele sequer tocara nela, e ela reagira a ele como jamais fizera com nenhum outro homem. – Claire, você está bem? Stuart apareceu atrás dela, pousando uma mão tranquilizante no ombro dela. – Estou, apenas não via a hora de sair dali. Ele assentiu, voltando o olhar para os carros que passavam. – Deixe-me levá-la para almoçar. – Ele se viraram e começaram a descer a rua. – Levando tudo em consideração, acho que hoje não foi tão ruim. Edmund não vai dar entrada no pedido de visitações emergenciais, de modo que isso nos dá algum tempo. Ele está disposto a trabalhar conosco para chegarmos a um acordo, antes de irmos ao juiz. Melhor do que isso, impossível.

– É, mas me custou quatro semanas da minha vida. Ela pagaria muito mais do que isso por Eva e pelo bem-estar dela, mas ainda estava um pouco atordoada diante de tudo que acontecera. – Claire… poderia ser pior. Vai passar um mês em uma casa de praia em Martha’s Vineyard – Com Luca Moretti – salientou ela. De algum modo, isso tornava a coisa toda menos umas férias e mais uma prova de obstáculos a ser superada. – E daí? Cá entre nós, acho que você está precisando da folga. Saia de Nova Iorque, sente-se na praia e inspire o ar marítimo. É lindo por lá nesta época do ano. Deixe Luca tomar conta de Eva sob o seu olhar atento, e seja grata pelo descanso. O que me diz de comida japonesa para o almoço? No papel, a viagem parecia ótima; contudo, Claire tinha certeza de que a realidade seria muito diferente. Mal sobrevivera a meia-hora com Luca, e isso com os advogados presentes. O que faria quando passasse um mês inteiro a sós com ele? LUCA MARCHOU Park Avenue abaixo, seguindo na direção do seu apartamento. Poderia ter chamado um carro para buscá-lo, mas a caminhada o ajudaria focar em algo diferente. Levou uns dez quarteirões para conseguir tirar da cabeça o som do suspiro de Claire. Aqueles olhos acinzentados como o aço o assombravam. Não esperara ter uma reação como aquela a ela. Também não era uma reação que queria ter. A mulher só lhe trouxera dificuldades. Não entanto, parecia não conseguir parar de provocá-la, apenas para ver o fogo nela. Tinha certeza de que, sob aquele terninho conservador e o coque apertado, havia uma mulher passional. Contudo, de que adiantava? Tinha quase certeza de que Edmund o aconselharia com veemência a não se envolver romanticamente com Claire. Sabia que era a coisa inteligente a fazer; contudo, Luca nem sempre seguia os conselhos dos outros. Virando a esquina, Luca, por fim, chegou ao seu prédio, onde encontrou Wayne, um dos porteiros, postado na entrada. – Boa tarde, sr. Moretti. Chegou cedo hoje. Espero que esteja tudo bem. Luca sorriu para o porteiro que trabalhava ali há mais tempo do que ele

Luca sorriu para o porteiro que trabalhava ali há mais tempo do que ele tinha o apartamento. – Sem problemas, Wayne. Tudo está bem. Na realidade, estou em casa um pouco mais cedo para começar a planejar minhas férias. – O senhor? Acho que desde que se mudou para cá que não tira férias. – Provavelmente não. Tenho trabalhado muito nos últimos tempos. Todavia, se tudo der certo, devo ficar um mês fora, em Martha’s Vineyard. Pode avisar ao síndico que ficarei fora? Vou precisar que guardem a minha correspondência. – Pode deixar, senhor. Posso perguntar se fará algo divertido na sua viagem? A imagem do rubor rosado percorrendo cada centímetro da pele de porcelana na mesma hora lhe veio à cabeça. Isso poderia ser divertido. Ou poderiam ser quatro semanas de discussão à beira-mar. – Talvez. Depende de como as coisas se desenrolarem. Eu espero que sim. Wayne abriu a pesada porta e deu um passo para trás. – Bem, espero que aproveite as suas férias, senhor. Sem dúvida, o senhor merece. – Obrigado, Wayne. Luca seguiu para o seu elevador privado. Sorriu ao apertar o botão que o levaria ao seu apartamento. Claire achava que sabia tanto a seu respeito; contudo, estava errada em vários pontos. Para começo de conversa, ele não morava na cobertura. Morava no décimo andar do prédio. A cobertura era grande demais para ele. Seu apartamento tinha três quartos e dependências de empregada. Era mais do que o suficiente. Quando comprara o lugar, alguns anos atrás, tivera quase certeza de que moraria ali sozinho pelo resto da vida. Apesar de ter se curvado à vontade da mãe e dos médicos quando adolescente, e armazenado seu material para, um dia, ter filhos, jamais tivera a intenção de fazer uso dele. Uma família era a última coisa a lhe passar pela cabeça. Chegara a conclusão de que pessoas que haviam passado pelo que ele passara reagiam de duas maneiras. Ou ficavam desesperados para ter uma família, ou apavorados com a ideia. Luca se encaixava na última categoria. As portas do elevador se abriram e, após destrancar a porta, adentrou a sua sala de estar. Tirando o casaco, Luca seguiu para o seu gabinete, onde se serviu

de um dedo de uísque, e largou-se na sua poltrona de couro favorita. Como o mais velho de seis crianças, sempre presumira que um dia teria a sua própria família. Gostara da sensação de camaradagem e do caos de seu lar de infância. E então, aos dezesseis anos, tais presunções pularam pela janela quando a sua vida toda foi descarrilhada por uma doença inesperada. A doença acabou sendo câncer testicular. O tratamento foi agressivo. Cirurgia e várias sessões de quimioterapia e radiação. A maioria dos pacientes que passava pelo tratamento acabava estéril. Embora a ideia fosse constrangedora, fez várias doações de sêmen para serem congeladas na clínica de fertilidade para o futuro. Contudo, Luca sempre teve a convicção de que jamais as usaria. Apesar de todas as garantias que lhe deram, ele sabia que o câncer poderia retornar e se espalhar a qualquer momento. Fisicamente, não era o homem completo que já fora. Cirurgia plástica corrigira a parte estética, mas ele sabia a verdade. Não podia entrar em um relacionamento com uma mulher sabendo as limitações do que podia oferecer. E sabia, do fundo do coração, que era limitado. Na única vez que uma mulher alegara ter dado à luz um filho seu, ele se permitira ter esperanças. Toda a sua família se permitira ter esperanças. Quando descobriram que o bebê miraculoso pertencia a outro, todo mundo ficara desapontado, inclusive a mãe interesseira do bebê, Jessica. Ele sempre fizera questão de usar proteção, mesmo que apenas por razões de segurança, mas, após isso, tornou-se quase militante. Não queria que nenhuma outra mulher sequer tivesse a ideia de ter um filho dele. Bebericando o seu drinque, passou os olhos pelo seu gabinete. Era parte de seu perfeito apartamento de solteirão, decorado com toques masculinos de couro e madeira escura. As estantes estavam repletas de livros que ele jamais lera. Um mapa-múndi emoldurado na parede o lembrava de todos os lugares que jamais visitara. Ele passara de ser criança para paciente de câncer, para estudante universitário, para presidente de empresa. Isso não deixara espaço para muito mais. Melhor mesmo que o bebê de Jessica não tivesse sido seu. Mesmo que quisesse uma família, não teria o tempo para ter uma. Desde o dia em que nascera, fora preparado para assumir os Restaurantes Moretti. O bisavô de Luca começara a empresa oitenta anos atrás, com um pequeno restaurante em

Little Italy. Quando o avô assumira o negócio, já tinham outro restaurante no Brooklyn e outro no Queens. A coisa crescera como uma bola de neve depois disso. O objetivo de ter um restaurante Moretti em cada estado foi alcançado pouco após o nascimento de Luca. Tendo tutores particulares cuidando de sua educação enquanto passava pelo tratamento, assim que se formou na escola, em plena remissão, Luca fora para Harvard para tirar o seu diploma em administração de empresas, pouco depois começando a trabalhar com o pai na empresa. Com o curso de pósgraduação, conquistara a vice-presidência, e assumiu por completo as rédeas do negócio assim que o pai se aposentou, dois anos atrás. Luca deixara a sua própria marca no império da família ao diversificar os restaurantes, dando início a uma bem-sucedida cadeia de lanchonetes chamada Antonia’s, em homenagem à mãe. Tocar um negócio como aquele exigia todo o seu tempo, e era assim que ele gostava. Com a vida cheia, não sentia falta da família que não tinha. E agora, subitamente, descobriu ter uma família que jamais esperara. Uma que fora confirmada como sendo realmente sua. Ainda bem que, em questão de espaço e tamanho, o apartamento poderia acomodar Eva. Bastaria um pouco de redecoração para seguramente adaptá-lo para uma criança, mas isso seria a menor de suas preocupações. O mais difícil seria adaptar o restante da sua vida para também acomodar a filha recém-descoberta. Isso começaria com aquela viagem. A primeira coisa que teria de fazer era ligar para Gavin Brooks, seu bom amigo da época de Harvard. Como Luca, Gavin era herdeiro do seu próprio império, a Brooks Express Shipping. Ambos entendiam o tipo de pressão que tinham sobre os ombros. A diferença é que Gavin conseguira tocar a BXS e ter uma família. Ele e a esposa, Sabine, tinham duas crianças pequenas, incluindo a bebezinha Beth, apenas alguns meses mais velha do que Eva. Talvez, além da casa, Gavin também pudesse oferecer alguns conselhos para Luca. Ele pegou o telefone e discou o número. – Não pode ser Luca Moretti me ligando – disse Gavin abruptamente ao atender. – Quero dizer, é o que acusa o identificador de chamadas, mas o meu amigo Luca jamais liga para mim.

Luca suspirou. – Isso é porque seu amigo Luca trabalha demais e nunca sabe quando é uma boa hora para ligar, sem acordar os seus filhos. Gavin riu. – É um tiro no escuro. Jared é o passarinho madrugador e Beth gosta da vida noturna. Quase nunca dormimos por aqui. Como vai, Luca? – Para falar a verdade, meio sobrecarregado. – O ramo dos restaurantes está lhe dando trabalho? – Não. O trabalho vai bem. Liguei porque preciso da sua ajuda para… questões mais pessoais. – Pensei que você não tivesse questões pessoais. – Eu também, mas esta caiu no meu colo. – Por mais estranho que pudesse parecer, era outra situação com a qual Gavin poderia se solidarizar. Ele só soubera da existência do filho, Jared, quando o menino já estava com quase dois anos. – Preciso da sua ajuda, Gavin. – Claro. Para o que quiser. O que foi? – Muito bem, se eu lhe contar algo, você promete não contar a ninguém? Luca não podia se dar ao luxo de que a notícia da existência de Eva se espalhasse. Trabalhara duro para abafar o processo correndo nos tribunais. – Parece sério – disse Gavin. – Ficarei calado. – Obrigado. Principalmente devido à minha família, estou tentando manter segredo sobre toda esta situação. Sabe como eles são. Quero resolver isto sem a interferência deles. – O seu câncer voltou – disse Gavin, em um tom sério. – Graças a Deus, não. Na realidade, descobri que sou pai. – Pai? Para valer, desta vez? Luca se arrependia de não ter guardado segredo sobre a situação envolvendo Jessica até ter certeza. Deveria ter sabido que era mentira no instante em que viu a expressão do rosto dela, após Edmund exigir um exame de paternidade. Como se o advogado fosse simplesmente aceitar a palavra dela! – É, desta vez os exames comprovam que a criança é minha. Tenho uma filha chamada Eva. – Mas eu pensei que você não pudesse…

– Não posso – confirmou Luca. – Contudo, congelei um pouco do meu esperma antes do tratamento. Houve uma confusão na clínica, e a mulher acabou grávida do meu filho, em vez de do marido dela. – Caramba! E o que você vai fazer? – Bem, a primeira coisa que fiz foi processar a clínica. Agora, estou tentando negociar os termos da guarda com a mãe. Posso lhe garantir que não tem sido fácil. Ela não está nada feliz com a situação. – Imagino que o marido dela também não esteja lá muito satisfeito. – Não sei se torna a coisa toda mais fácil, ou mais complicada, mas o marido dela morreu em um acidente automobilístico quando ela estava grávida. – E eu que achei que minha situação com Sabine fosse complicada... Mas você ganhou esta de lavada, Luca. – Obrigado. Isso me traz ao favor. Propus que nós três passássemos algum tempo juntos para nos conhecermos melhor. Ela não confia na minha capacidade de cuidar de um bebê, e tenho de convencê-la de que tudo dará certo. – Por que não conta para ela que ajudou a criar seus irmãos e que tem uma dúzia de sobrinhos e sobrinhas? Da última vez que esteve aqui, você cuidou de Jared como um profissional. – Duvido que ela acreditasse em mim. É uma mulher temperamental e, para ser sincero, acho mais divertido irritá-la. – Essas férias podem acabar sendo perigosas. Para onde vocês vão? – É aí que você entra. Eu estava torcendo para que pudéssemos ficar algumas semanas na sua casa de praia. Um mês, na verdade. – Claro. Só devemos voltar para lá depois do Memorial Day. Mas por que não ficar na casa da sua família, nos Hamptons? – Se eu fizesse isso, minha mãe descobriria. Eu já vou ter de inventar uma desculpa para convencer o meu irmão a tocar o negócio enquanto desapareço por um mês. Contarei para eles muito em breve, mas preciso passar algum tempo com Claire e Eva sem a mamãe rondando a neta como um tubarão na água. Gavin riu. – É justo. Quando pretende subir? Vou mandar dar uma limpeza no lugar e estocar a despensa antes da sua chegada.

– Não sei ao certo. Ambos temos providências a tomar no trabalho, mas eu espero que na semana que vem. – Quer dizer que vai passar quatro semanas em uma casa de praia com a mulher que acidentalmente engravidou e a filha que nunca conheceu? E, além de tudo, uma mulher que não gosta de você. Luca suspirou. – É, acho que isso resume a situação. – Bem, boa sorte, meu amigo – disse Gavin. – Eu mandarei um mensageiro entregar a chave para você amanhã. E, por via das dúvidas, vou pedir para o pessoal da limpeza esconder tudo que for quebrável.

CAP ÍTULO 3

C LAIRE ANDAVA nervosamente de um lado para o outro da sala de estar de sua casa no Brooklyn. Após sua reunião com Luca Moretti e o advogado dele, as coisas começaram a acontecer mais rápido do que estava esperando. O supervisor no museu fora compreensivo no tocante à situação dela. A exposição na qual passara os últimos meses trabalhando inaugurara na semana anterior, e tudo estava correndo bem. Na realidade, era a época perfeita para ela tirar férias, de modo que ele praticamente a colocara porta afora. Sem ter desculpas, ela ligara para Luca, avisando que poderia partir no sábado. E então sua consciência levou a melhor sobre ela. Apesar das batalhas dos dois ao longo das últimas semanas, Luca ainda não tivera oportunidade de conhecer Eva. Claire duvidava que o local ideal para o primeiro encontro fosse na traseira de um carro alugado quando estivessem a caminho de Martha’s Vineyard. Podia escutar a voz do advogado lhe dizendo para que ela fosse boazinha. Antes que pudesse se conter, já convidara Luca para vir à casa dela na quinta à noite. Ele deveria chegar a qualquer minuto. Naquele instante, Claire estava praticamente vibrando de ansiedade. Desde que chegara em casa, mal parara quieta. Já limpara e arrumara o andar de baixo, alimentara e banhara Eva e lhe vestira o pijama, para que estivesse pronta para a cama quando chegasse a hora. Eva estava agora deitada no seu tapetinho, brincando com os leões e macaquinhos coloridos pendurados acima dela. Podia ficar horas ali. O som da campainha quase fez com que Claire fosse ao teto, de tão

O som da campainha quase fez com que Claire fosse ao teto, de tão sobressaltada. Não sabia por que estava tão ansiosa. Não era apenas a noção de receber um bilionário em sua casa, embora isso, por si só, já fosse bem intimidante. Era um bilionário capaz de influenciar o modo como ela criaria a filha. Será que ele acharia que a casa dela não era boa o suficiente? Será que argumentaria que a vizinhança não era segura? Que não estava oferecendo uma boa vida para Eva? Qualquer uma dessas acusações poderia pesar a favor de Luca na balança dos tribunais. Na verdade, não sabia do que ele poderia reclamar. Ela e Jeff compraram e restauraram aquela bela casa alguns anos antes. Ainda que não fosse no luxuoso Upper East Side, ficava em uma parte sofisticada e segura do Brooklyn, com grandes escolas. Claire adiantou-se até a porta da frente, que, inspirando fundo, após verificar que era Luca pelo olho mágico, destrancou e abriu. – Boa noite, sr. Moretti – disse. Ele sorriu e cruzou o vão da porta. Estava com um ursinho de pelúcia corde-rosa nas mãos e uma expressão mais relaxada no rosto do que a que estava exibindo no escritório do advogado. – Por favor, eu pedi para me chamar de Luca – insistiu ele. Ela sabia que era o que ele queria, mas a ideia em nada a agradava. Era casual demais, íntimo demais. Preferia que houvesse um pouco de formalidade entre eles, pelo menos por ora. O distanciamento emocional facilitaria as coisas ao longo da próxima semana. Ignorando o pedido, fechou a porta assim que ele passou. Luca olhou ao redor, estudando os detalhes arquiteturais que ela trabalhara tanto para preservar. Ele estava muito bonito, com um caríssimo terno azulmarinho feito sob medida, de modo a salientar os ombros largos e a cintura fina. Já a gravata azul e marrom parecia capturar a mesma tonalidade achocolatada das ondas dos seus cabelos. Tonalidade achocolatada das ondas dos seus cabelos? Claire cerrou os olhos por um instante, tentando se livrar da imagem. Afinal de contas, por que estava analisando a boa aparência dele? Não se tratava daquilo. Luca podia ser o pai de Eva, mas isso não aconteceu do jeito tradicional. Pensar nele desse jeito era perigoso, ainda mais quando o acordo de guarda deles ainda estava

em suspenso. Não podia se dar ao luxo de cometer erros quando se tratava de Eva. – Queria agradecê-la por ter me convidado para vir aqui hoje – falou ele, pegando o casaco e pendurando-o no armário da entrada. – Percebo que isto deve ser difícil para você. Claire forçou um sorriso. – Era o mínimo que eu poderia fazer – disse. – Afinal, está nos convidando para um mês na praia. Ou nos aprisionando com você um mês na praia. Era a mesma coisa, ela supôs. – Na realidade, pode agradecer o presidente da Brooks Express Shipping por isso. Fizemos faculdade juntos. É na casa de praia dele que vamos ficar. Ele está me fazendo um favor. – É claro que está. Ela riu com ironia. Aparentemente, os ricos gostavam da companhia uns dos outros. Com certeza não passavam o tempo com gente como ela. Pelo menos, não até agora, quando teriam de fazê-lo. Sacudindo a cabeça, ela conduziu Luca até a sala de estar. – Bem, esta é Eva – falou ela, estendendo o braço na direção de onde a criança estava brincando. Luca ficou paralisado no instante em que seus olhos encontraram a filha. Para um poderoso presidente de empresa, sempre no controle de tudo, parecia completamente perdido naquele instante. Não deu um passo sequer na direção de Eva. Apenas ficou admirando-a de longe. Claire decidiu ajudá-lo a se acostumar com o seu novo papel de pai. Cruzou a sala e pegou Eva do chão. Aconchegando-a nos braços, ela voltou-se para Luca. – Olhe só quem veio visitá-la, Eva. Tem um novo amigo aqui para vê-la. Eva virou a cabeça para olhar para Luca, os grandes olhos acinzentados examinando aquela pessoa nova e processando-o da maneira que o seu cérebro de bebê era capaz. Luca, por fim, relaxou, inclinando-se na direção do bebê com um sorriso largo e amigável. – Olá, bella. Eva o recompensou com um sorriso babado, exibindo os dois novos dentes

Eva o recompensou com um sorriso babado, exibindo os dois novos dentes inferiores. Ela costumava ser um pouco tímida com desconhecidos, mas parecia ter gostado de Luca. Quando ele estendeu a mão para lhe acariciar o bracinho gorducho, ela agarrou com força o dedo dele. – Que aperto forte! Que tal trocar esse dedo por um ursinho felpudo? Luca estendeu o ursinho cor-de-rosa e os olhos de Eva na mesma hora se voltaram para a novidade. Ela soltou o dedo e, com um gritinho de alegria, estendeu as mãozinhas para o brinquedo. Luca o deu para ela, rindo quando, na mesma hora, ela enfiou a orelha do urso na boca. – Nos últimos tempos, tudo tem se transformado em mordedor – disse Claire. – Obrigada pelo presente. – Já estava mais do que na hora de eu dar alguma coisa – falou ele com uma certa tristeza na voz que Claire não pôde deixar de notar, tomada de culpa pela sua participação em tal atraso. O advogado dele tinha razão. Nada daquilo era culpa de Luca. Ele só queria fazer parte da vida da filha, e merecia fazer parte. Por mais que detestasse admitir, precisavam daquele tempo na praia para fazer aquela situação dar certo. – Quer segurá-la? – perguntou ela. – Quero. A empolgação era evidente nos olhos dourados dele. – Aqui vamos nós – falou Claire, naquela voz de bebê suave que usava para Eva. Ela passou Eva para os braços ansiosos de Luca, que a embalou como um profissional. Talvez fosse sorte de principiante. – Mas você é uma gracinha – murmurou ele para a filha. – Não tenho dúvidas de que logo vai me ter na palma da sua pequenina mão. Claire deu um passo para trás, permitindo que Luca tivesse o seu momento com Eva. Após alguns muitos, ele adiantou-se até o sofá, onde se acomodou com Eva sobre o joelho. Não demorou muito para Claire perceber que ele tinha razão. Luca estava completamente apaixonado pela filha, e eles haviam acabado de se conhecer. Ela podia entender isso muito bem. Amara Eva desde o instante em que colocara os olhos nela.

A realidade do momento a atingiu com a violência de um murro na boca do estômago. Deu-se conta de que já deveria ter tido vivido isso meses atrás, com Jeff ao seu lado. Ela deveria ter tido a oportunidade de ver o marido segurar a filha pela primeira vez, com semelhante expressão de adoração e admiração. Em vez disso, seus momentos no hospital foram agridoces. Ela embalara o seu bebê sozinha no seu quarto, e chorara. Eram lágrimas de alegria, lágrimas de tristeza, lágrimas de perda. Não teria aquele momento com Jeff porque ele dera um jeito de morrer enquanto passeava com a amante. Não teria aquele momento com Jeff porque, no final das contas, Eva sequer era sua filha. Como é que a sua vida saíra tanto dos trilhos? Claire sempre fizera tudo certo. Formara-se como uma das primeiras da classe, indo para a faculdade com uma bolsa acadêmica que não lhe deixava muito tempo para os rapazes. Depois da faculdade, ela se casara com o sujeito seguro que a amaria e cuidaria dela e da família que formariam. Jeff não fora a escolha empolgante, nem o homem que fazia o seu coração disparar e o seu interior se derreter, mas Claire achou que era um homem estável e responsável que daria um bom pai. Tomara todas as decisões certas e fizera tudo que a família esperara que fizesse. No entanto, dera tudo errado. Vendo Luca no sofá com Eva, não pôde deixar de enxergar o acentuado contraste entre ele e Jeff. Não era apenas a diferença do colorido mais escuro de Luca e da boa aparência bem americana de Jeff. Era uma diferença por dentro, em nível biológico, talvez até celular. Apesar do pouco tempo que passara com Luca, reagia a ele como jamais reagira a outro homem. Havia uma intensidade no modo como ele olhava para ela que a incendiava, fazendo com que suas faces ardessem. Tudo nele lhe chamava a atenção, e até o seu perfume era capaz de despertar nela incômodo desejo. Luca era tudo que ela não deveria desejar. Era perigoso. Não no sentido literal, mas Claire sabia que tinha de tomar cuidado com ele. Era um homem acostumado a ter as pessoas fazendo o que ele quisesse, e estava disposto a fazer o que fosse necessário para garantir que isso acontecesse. Também parecia ser o tipo de homem que já deixara uma trilha de corações partidos no seu rastro. Independentemente de como ele a fizesse se sentir, Claire estava determinada a não ser uma dessas mulheres. Chegariam a um acordo sobre a guarda que agradasse a ambos, mas era só.

Chegariam a um acordo sobre a guarda que agradasse a ambos, mas era só. Não poderia haver mais nada. Claire colocaria de lado qualquer atração que pudesse ter por Luca, e talvez, com o tempo, ela viesse a encontrar outro homem mais adequado para estar na sua vida. Adequado não lhe servira muito bem da última vez, mas não estava disposta a abrir mão da cautela apenas porque Jeff decidira pular a cerca. Claire inspirou fundo para se recompor e ergueu o olhar para notar que Luca a estava observando, enquanto segurava Eva. Ela sentiu seu interior se retesando. Não estava interpretando isto erroneamente. Luca já deixara claro que também se sentia atraído por ela. Talvez fosse apenas uma estratégia para amaciá-la nas negociações; contudo, quando ele olhava para ela daquele jeito, Claire sentia como se toda e qualquer resistência fosse inútil. Luca era um homem que sempre conseguia o que queria. O que ela faria se ele decidisse que a queria? DOIS DIAS mais tarde, Luca tocou a campainha da casa de Claire e ficou aguardando. – Só um segundo! – Ele a escutou gritar de lá de dentro. O som de passos se aproximou da porta. – Pode levar estas malas e o cercadinho – falou ela ao abrir a porta, antes de notar que era ele. – Luca? – O rubor tomou conta do seu rosto. – Sinto muito. Pensei que fosse mandar um motorista. Luca sacudiu a cabeça. Eles precisariam do carro na praia, mas ele queria o máximo de privacidade possível, e um chofer com muito pouco a fazer apenas interferiria no tempo que tinham para passar juntos. – Eu mudei de ideia. – Luca curvou-se e pegou as malas mais perto da porta. – Vou colocar isto no carro. Claire assentiu, ainda abalada com a inesperada presença dele. – Estou com a cadeirinha de Eva. Vou precisar de alguns minutos para instalá-la. – Não é necessário. Já tenho uma no carro pronta para a viagem. Claire amarrou a cara para ele, mas Luca simplesmente virou-se e desceu os degraus carregando as malas dela. Sabia que não deveria achar divertido surpreender Claire, mas não conseguia evitar. Ela fizera tantas suposições a seu respeito, e ele gostava de derrubar uma por uma. Ao carregar as malas na

traseira do Land Rover, notou Claire se aproximando com Eva nos braços. Sem dizer qualquer palavra, ela abriu a porta de trás para investigar a cadeirinha. Não encontraria nada de errado com ela. Era um modelo de primeira linha para a idade e o peso de Eva, instalada de acordo com as instruções do fabricante. Ele até colocou um móbile acima da cadeirinha para distraí-la enquanto viajavam. Todavia, Luca nada disse. Simplesmente colocou as malas no carro e voltou para a casa para pegar mais algumas, antes de aguardar o julgamento dela. – Vai servir? – perguntou, por fim. Claire voltou-se para ele com uma expressão ligeiramente atônita no rosto. – Sim. É perfeita. – Não precisa parecer tão surpresa, Claire. Administro um negócio de bilhões de dólares. Sou capaz de comprar e instalar uma cadeirinha. Ela abriu a boca para protestar. – Eu não… Quero dizer, eu não achei que… – Mais alguma mala para levar? – perguntou ele, com o intuito de salvá-la de si mesma. – Não, é só isso. Vou colocar Eva no carrinho e, depois, trancarei tudo. Assim que deixaram a cidade congestionada e pegaram a I-95, a viagem ficou mais tranquila, embora ainda longa. Claire passara a primeira parte da viagem atrás, com Eva. Quando pararam para comer, Eva adormeceu, de modo que Claire sentou-se na frente com ele. Passaram o tempo conversando sobre o restaurante e as exposições dela no museu. Quando desceram da balsa em Martha’s Vineyard, Luca estava ansioso para chegar. – Finalmente – disse, quando pegou a estrada de acesso à propriedade e parou o carro para que ambos pudessem dar uma boa olhada na casa de dois andares com fortes influências holandesas. Era charmosa para uma casa de praia. Luca parou na frente da casa, e eles desceram do veículo. – E então, o que achou? Claire ficou boquiaberta ao percorrer a casa com os olhos; depois, virou-se para admirar a vista de Katama Bay e do Oceano Atlântico mais além. – É linda. E tão grande. Não consigo acreditar que seja apenas para nós. Seu

– É linda. E tão grande. Não consigo acreditar que seja apenas para nós. Seu amigo não precisará dela o mês todo? Luca sacudiu a cabeça e abriu a traseira do Land Rover para começar a descarregar as malas. – Gavin trabalha tanto quanto eu. Ele comprou o lugar para que pudessem passar algum tempo aqui no verão. Ainda é cedo na estação para o vinhedo, de modo que ele só viria mesmo no mês que vem. Claire retornou para o carro para soltar Eva, levando-a na direção da casa. Luca veio atrás dela, trazendo algumas malas e as chaves da porta da frente. Ele a destrancou e a abriu, dando um passo para o lado e permitindo que ela entrasse primeiro. À esquerda deles havia uma escadaria. – Gavin disse que a área de estar principal e a suíte ficam no andar de cima, para poder aproveitar bem a vista. Eles subiram as escadas e se depararam com a área de estar. Era realmente um lugar estonteante. Tinha curvados tetos brancos, com vigas de madeira e paredes de janelas que ofereciam uma visão desimpedida da baía. A mobília ligeiramente rústica parecia muito confortável. Claire adiantou-se pela sala de estar bem iluminada até chegar a uma cozinha grande o suficiente para uma família grande preparar junta um banquete. Seis bancos altos rodeavam a ilha da cozinha, com panelas de cobre dependuradas do teto. As portas envidraçadas da área de jantar levavam ao deque com vista para a água. – Eu já volto. Luca desceu as escadas e fez várias viagens para trazer todas as malas para dentro, antes de ir estacionar o carro na garagem. Quando voltou a subir, Claire estava no deque com Eva apoiada no seu quadril, aproveitando a vista, o sol e a agradável brisa de primavera. A vontade de Luca foi se juntar a elas, mas estava hesitante em interromper aquele momento entre mãe e filha. Havia uma expressão de completa alegria no rosto de Claire ao olhar para o seu bebê. Os cabelos dourados escuros ao sabor da brisa, a luz do sol fazendo com que a sua pele de porcelana quase chegasse a reluzir. Parecia um anjo postada ali no seu vestido de verão. Luca sentiu o peito apertar-se ao observá-la puxar a filha para si e apontar para os pássaros que voavam acima. Descobrir a existência de Eva fora um verdadeiro choque; contudo, até

Descobrir a existência de Eva fora um verdadeiro choque; contudo, até alguns dias atrás, ela parecera mais uma ideia do que realidade. Ver Eva pela primeira vez mudara tudo. Quando a segurou nos braços, sentiu algo despertar em seu interior. Um instinto protetor ganhou vida dentro dele, quase instintivo de tão feroz. Após apenas alguns instantes juntos, ele teria feito qualquer coisa pela sua garotinha. Depois de tanto tempo reprimindo a noção de família, isso o pegou de surpresa. Havia uma parte de Luca que ainda queria filhos; no entanto, evitara descobrir se isso ainda era uma possibilidade para ele. De certo modo, era mais fácil evitar os médicos e não descobrir se estava mesmo fora de cogitação do que ser testado e saber ao certo que tinha apenas duas chances congeladas de paternidade. Uma chance, na verdade, agora que uma das amostras fora utilizada para criar Eva. Fora um erro gravíssimo, mas era difícil ficar zangado com isso. Subitamente, o vazio da sua existência fora preenchido. Tinha uma filha. Nada mais parecia tão importante quanto fazer o que pudesse para manter Eva feliz, segura e em sua vida. – São quantos quartos? A voz de Eva o despertou de seus pensamentos. Torceu para que ela não tivesse notado que ele estava fitando-a com tanta intensidade. – Quatro. A suíte principal fica à esquerda da sala de estar. Lá embaixo há mais três quartos. Claire olhou ao redor, encabuladamente estudando a casa. Provavelmente não sabia como iriam se acomodar ali. Era óbvio que não iriam dividir o mesmo quarto, por mais que ele gostasse da ideia. Estavam ali juntos, como uma família, mas também para se tornarem amigos e para aliviar as preocupações dela no tocante a ele cuidar da sua filha. Podia ser a mulher mais sedutora que ele já vira em um bom tempo, mas sexo, com certeza, apenas complicaria a situação já bem complicada dos dois. – Você e Eva podem ficar com a suíte principal – disse ele. – Gavin disse que há um berço ali, pois eles compraram o lugar pouco antes do nascimento de Beth, a filha deles. Também há bastante espaço para o cercadinho e para todas as coisas de Eva. Luca abriu a porta da suíte e gesticulou para que Claire entrasse na frente

Luca abriu a porta da suíte e gesticulou para que Claire entrasse na frente dele. – Tem certeza? – perguntou ela, adentrando o aposento e passando os olhos pelas alegres paredes amarelas e a enorme cama de ferro. Ao longo de uma das paredes havia um berço e um trocador, e uma grande cômoda se estendia ao longo de outra. – Ficaremos bem lá embaixo. – Bobagem. Isto é perfeito para vocês. E era mesmo. Claire era alegre e elegante como o quarto. Sua beleza era natural, e não forçada como a de tantas outras mulheres. Usava apenas o suficiente de maquiagem para salientar as suas feições, não as disfarçar. As roupas pareciam confortáveis, mas eram estilosas. Até mesmo o seu perfume era perfeito… como baunilha e canela. Contudo, não era só a aparência. Na viagem até ali, Luca ficou impressionado com como ela era inteligente e articulada. Trabalhando em um museu com um diploma em história da arte, era capaz de discutir com a mesma tranquilidade sobre obras impressionistas ou sobre pinturas em tumbas egípcias. Ele torcia para que a filha puxasse a mãe na inteligência e na beleza. Duvidava que, mesmo se tivesse tentado, pudesse ter sido capaz de escolher uma mulher melhor para ter a sua filha. O destino trilhava caminhos misteriosos. O destino? Esse tipo de superstição era coisa da mãe de Luca, não dele. Sacudindo a cabeça, voltou para a sala de estar e começou a trazer as coisas de Claire para dentro. – Vou deixar que se instale. Estou certo de que poderia dar um cochilo após uma viagem tão longa. Rindo, Claire sentou-se na beirada da cama com Eva. – Duvido que eu vá conseguir cochilar, mas talvez tenhamos alguns instantes de tranquilidade. Ele assentiu e deixou o quarto, descendo até o primeiro andar. Assim que chegou lá embaixo, inspirou fundo e esvaziou os pulmões do perfume de Claire. Se ao menos fosse tão fácil tirá-la da cabeça... Pegando uma das suas malas, escolheu o quarto mais longe de Claire. O quarto era aconchegante, com paredes azuis e uma cama tamanho queen. Quatro semanas seria um longo tempo para ficar a sós com ela ali. E com o

Quatro semanas seria um longo tempo para ficar a sós com ela ali. E com o desejo que ela era capaz de despertar nele com apenas um olhar, com certeza, pareceria muito mais tempo.

CAP ÍTULO 4

A LUZ da manhã brilhou através da janela, despertando Claire de seu sono. Ela bocejou e se espreguiçou, sentindo-se suntuosamente preguiçosa por não ter ligado o alarme. Podia se acostumar com aquela coisa de férias. Pela primeira vez, em muito tempo, sentiu-se bem descansada. Dormira como uma pedra. Não fazia isso desde antes do nascimento de Eva. Espere um minuto… Eva! Levantando-se com um salto, Claire olhou para o berço. Quando o alarme não a acordava, o bebê costumava fazê-lo, de modo que, se ainda estava dormindo, havia algo de errado com Eva. Passou os olhos pelo berço, mas não viu o bebê em lugar algum. – Eva? – chamou, com um quê de pânico na voz. – Eva! – voltou a gritar, abrindo a porta da suíte e saindo para a sala de estar. Deteve abruptamente o seu avanço, não acreditando no que os seus olhos estavam vendo. – Bom dia. Está com fome? Luca estava postado na cozinha, com Eva apoiada em seu quadril. O bilionário presidente de empresa estava misturando massa para panquecas, enquanto brincava de morder os dedinhos da menina, fazendo sons de mastigação. Após a tensa confrontação na sala de conferências do advogado, ver Luca tão à vontade segurando a sua filha parecia surreal. Seria aquele o mesmo homem que ameaçara colocá-la na cadeia? – Nós estivemos aproveitando a nossa manhã, não estivemos, bella? Tomamos a mamadeira e um pouco de café lá fora no deque e observamos as

gaivotas. Depois, decidimos preparar panquecas para o café da manhã. Claire estava feliz de ver que Eva estava bem, mas não gostou nem um pouco do susto que ele lhe dera. Luca franziu a testa. – Claire, você está bem? Ela não respondeu. Cruzando a sala de estar, tomou a criança dos braços dele e a apertou de encontro ao peito. Depois, só depois, ela foi capaz de responder. – Por favor, não faça isso. – Fazer o quê? – Pegá-la sem me dizer. – Quer dizer, pegá-la como se ela fosse a minha filha e cuidar dela como um pai faria? Claire franziu a testa para ele. Luca podia tecnicamente ser o pai de Eva, mas ainda não conquistara o direito de passear por aí com a menina sem a permissão dela. Sua filha mal o conhecia. – O objetivo desta viagem é justamente me deixar à vontade com você cuidando de Eva. Faz menos de vinte e quatro horas, e posso lhe garantir que ainda estou longe de me sentir à vontade. – Eu sinto muito – disse Luca, dando a volta na ilha da cozinha com a caneca de café na mão. – Estou acostumado a acordar cedo, de modo que fui buscá-la para que você pudesse dormir. Não faria muito sentido acordá-la para perguntar se você se incomodava. Quer um pouco de café? Eu preparei esta caneca para você; contudo, não pedi a sua permissão primeiro, de modo que, talvez, você não queira. Claire ignorou o tom mordaz dele. Ele estava irritado, mas ela não estava nem aí. Era cedo demais para Luca começar a ignorar limites. Mas é claro que esbravejar com ele não resolvia nada. – Claro – sussurrou. – Obrigada. Luca pousou a caneca sobre a bancada, ao alcance dela, depois se virou na direção da cozinha. Quando ele virou as costas, Claire fez um exame rápido em Eva, e constatou que ela mamara e fora trocada e limpa. Parecia feliz e nem um pouco preocupada de estar longe da mãe e com um homem desconhecido. Ficou evidente que ela subestimara Luca no tocante a sua

capacidade de cuidar de crianças. Ele tinha mais experiência do que deixara transparecer nas conversas anteriores. – Quer um pouco de bacon? – Parece uma boa ideia. Ela sentou-se em um dos bancos altos ao redor da ilha para observá-lo preparar o café da manhã. O homem de negócios parecia ter ficado em Manhattan e, no seu lugar, estava um homem aproveitando as férias. Estava descalço, usando uma camiseta azul e uma calça de pijama de flanela. Os cabelos estavam em ligeira desordem e a barba, por fazer. Claire supôs que aquela era uma imagem que poucos além da família dele tinham a oportunidade de ver. Ela gostava mais do que queria admitir. Perguntou-se qual seria a sensação de ter aquela barba por fazer roçando de encontro à sua face. De encontro às suas coxas… Claire apertou os olhos por um instante para espantar tais pensamentos. Não podia gritar com ele em um instante e criar fantasias com ele no instante seguinte. Era loucura. Ao reabrir os olhos, concentrou-se nos dotes culinários de Luca. Mesmo de pijama, ele se movia pela cozinha com objetividade e fluidez. Luca, com certeza, sabia o que estava fazendo. Por algum motivo, isso a surpreendia. Havia muito a respeito daquele homem que não era bem o que parecia ser. – Eu sabia que você administrava restaurantes, mas nunca parei para pensar que pudesse saber cozinhar – admitiu. Luca girou uma panqueca no ar, antes de olhar para ela com um sorriso desarmador. – Na minha família, comida é vida. Todas as nossas reuniões familiares giram em torno das refeições que preparamos juntos na cozinha. Assim que uma criança tem idade para descascar uma batata, é colocada para ajudar com os almoços de domingo. – A sua família é muito grande? Luca riu e girou outra panqueca no ar. – E como! Sou o mais velho de seis filhos. Meu pai é o mais velho de cinco. Quando nos reunimos com primos e cônjuges, chegamos facilmente a quarenta ou cinquenta. – Você ajudou a cuidar dos seus irmãos.

Ele assentiu. – Por acaso a surpreendi com minha habilidade de cuidar de um bebê sem me desesperar por completo? Os lábios de Claire se retorceram em um sorriso culpado. – É, me envergonho de reconhecer que sim. – Além dos meus irmãos, tenho uma dúzia de sobrinhos e sobrinhas que, volta e meia, eu vejo. Já cuidei de um bocado de crianças das mais diversas idades. Eu lhe garanto que Eva está em boas mãos. – Por que não disse isso no escritório do seu advogado? Sem dúvida, teria reduzido consideravelmente o nível de estresse por conta daquela decisão. Ainda não queria que ele pegasse Eva sem a sua permissão, mas saber que ela não era o primeiro bebê sob os cuidados dele fazia um bocado de diferença. Luca deu de ombros. – Fez uma suposição incorreta a meu respeito e eu deixei. Agora que estamos aqui, como mencionou ainda há pouco, podemos conhecer um ao outro como realmente somos, e não como os outros nos veem. Verá que a maioria das suas preocupações é infundada. Ele deslizou quatro panquecas douradas para um prato e acrescentou algumas fatias de bacon no canto. Depositou o prato diante de Claire. – Isso é uma tonelada de comida – exclamou ela, ao fitar as panquecas do tamanho do prato. – Bem, esse é o meu único problema na cozinha. Não sei cozinhar apenas para duas pessoas. Só sei cozinhar para um exército. Claire sequer podia imaginar ter uma família daquele tamanho. Ela não tinha quase ninguém. A família de Jeff fora a sua por muitos anos, e agora… Eva era tudo que ela realmente tinha. Ela deixou a menina na cadeirinha alta para poder comer. Luca colocou uma vasilha de cereais na bandejinha para a menininha mordiscar enquanto eles tomavam o café da manhã. – E quanto a você? – Luca perguntou, preparando o próprio prato. – Como é a sua família? Claire fitou a caneca de café. – Nada como a sua – disse. – Sou filha única. Meus pais também não tinham irmãos. Durante toda a minha vida, fomos apenas nós três.

– E agora? Parecia ser uma pergunta simples. No entanto, não era. Claire tinha família e, no entanto, não tinha. Era um limbo estranho para estar. – E, agora, no fundo, somos apenas Eva e eu. Meu pai morreu de enfarte quando eu estava na faculdade. Minha mãe voltou a se casar e, como eu já estava crescida e fora de casa, sua vida passou a girar em torno do novo marido. Eu não a vejo com muita frequência, pois ela mora em São Francisco agora. Eu me casei com Jeff pouco depois da mudança dela, de modo que não notei muito a sua ausência. A família dele foi muito boa em me incluir nas reuniões e festas antes mesmo de nos casarmos. Foi a minha família por muitos anos, mas, agora, perdi tudo. Luca acomodou-se na bancada com o seu prato e café. – Quer dizer que não a receberam mais desde a morte do seu marido? Claire deu de ombros. – Não é tão simples assim. A morte dele nos atingiu duramente. E as circunstâncias tornaram isso mais constrangedor para todo mundo. Acho que não sabem o que dizer para mim. Luca a fitou com preocupação nos olhos escuros. – Posso perguntar que circunstâncias foram essas? Ela ficou em silêncio enquanto passava manteiga e mel nas panquecas. Claire já contara essa história tantas vezes que já não deveria mais incomodá-la, mas ainda incomodava. A verdade nunca ficava mais fácil de aceitar. – Meu marido morreu em um acidente de carro com a amante. Ele me disse que teria de sair da cidade a negócios, mas, na realidade, estava com ela. Eu jamais teria descoberto a verdade, mas eles saíram da estrada e se chocaram com uma árvore, morrendo instantaneamente. A polícia pareceu achar que ela estava… distraindo-o de algum modo. Eu não tive a coragem para perguntar por que achavam isso. Claire respirou fundo, então continuou: – Na ocasião, eu estava grávida de cinco meses, após anos tentando ter um bebê – disse. – É difícil perder alguém que se ama e, ao mesmo tempo, ficar zangada com essa pessoa. A morte de Jeff envolve muitas emoções para mim e para todo mundo. Acho que, depois disso, a família dele não soube mais como lidar comigo. Sempre que vinham ver Eva, a morte dele pendia sobre nossas cabeças como uma nuvem negra. E,

agora, não há mais necessidade de passarem mais por isso. Desde que contei para os pais dele sobre a confusão na clínica, não tenho tido mais notícias deles. Aparentemente, como não somos mais ligadas por sangue a eles, Eva e eu nos tornamos descartáveis. Tendo dito isso, Claire enfiou um grande pedaço de panqueca na boca. Admitir essa história patética para Luca fora pior do que contá-la para qualquer outra pessoa. Não queria que ele tivesse pena dela ao escutar a sua história triste e sórdida. – Significa que agora é apenas você e Eva. Era uma afirmativa, não uma pergunta, mas, ainda assim, Claire assentiu enquanto mastigava. Era verdade. Eva era tudo que ela tinha, daí ela lutar tão ferozmente para não perder a filha para um pai misterioso. – Algum dia, espero ter outra chance no casamento, e talvez até outro filho, se isso for possível. Mas, se isso jamais acontecer, sou grata por ter Daisy, a babá de Eva. Ela é como se fosse família para mim. Luca ergueu as sobrancelhas. – Uma babá? Após pegar tanto no meu pé sobre entregar Eva para outra pessoa, você tem uma babá? – Não é a mesma coisa – argumentou Claire. – Eu não queria que Eva fosse passada adiante e ignorada. Daisy apenas fica de olho em Eva quando estou no museu. Quando chego em casa, Daisy vai embora e somos apenas nós duas. Ela tem atenção e cuidado exclusivos, e achei isso melhor do que colocá-la em uma creche, quando ela ainda é tão pequena. Pretendo colocá-la em uma boa pré-escola quando ela for mais velha. Já preenchi formulários de matrícula em alguns lugares. – E onde encontrou essa Daisy? Fez uma devida verificação de antecedentes antes de trazê-la para dentro de casa? Conseguiu referências de várias clientes anteriores? Claire suspirou. – Sim. Fiz tudo isso. Ela veio muito bem recomendada, e não tive nenhum problema com ela. Nos últimos meses, ela tem sido providencial. Luca riu baixinho e colocou um pedaço de bacon na boca. – Sei que fez tudo isso e muito mais. Estava apenas dando uma dura em você, tesourina. Nada mais justo, não acha?

Claire sabia que havia pegado muito no pé dele. Ela olhou para Eva, tentando pegar um pedaço de cereal com os dedinhos gorduchos. – Farei o que for necessário para mantê-la feliz e em segurança, Luca. Pode me culpar? Havia a chama feroz de proteção no seu olhar quando ele sacudiu a cabeça. – Não. Naquele instante, ficou fácil para Claire acreditar que Luca faria qualquer coisa pela filha, mesmo após passar apenas poucas horas juntos. A criança parecia mexer tanto com ele que ela não conseguiu entender por que o homem ainda não se casara e dera início à própria família. Era evidente que se sentia à vontade com crianças, e se deu bem com Eva instantaneamente. Será que administrar os negócios da família realmente tomava tanto do seu tempo que ele ainda não conseguira encontrar alguém com quem se estabelecer? Ou será que havia algo que ele não estava contando para ela? – O QUE é isto? Luca ergueu o olhar do jantar que estava preparando a tempo de ver Claire postada na entrada da cozinha. Ela estava segurando o esboço do acordo de guarda que o seu advogado lhe dera. Ele o havia deixado sobre a mesinha de centro para que pudessem discuti-lo. – Edmund mandou. É a proposta de guarda que nós enviamos para Stuart algumas semanas atrás. Eu não sabia se você a havia lido, mas ele queria que tivéssemos algo para discutir enquanto estivermos aqui. – Eu não li – admitiu Claire, com uma expressão de culpa no rosto. Luca não ficou surpreso. A mulher sentada do outro lado da mesa no escritório do seu advogado não estava interessada na oferta dele. A julgar pela expressão do rosto dela, pouca coisa mudara. Ele começou a misturar a salada com o molho. – Quer discuti-la agora? Claire olhou para o envelope, antes de depositá-lo sobre a ilha da cozinha. – Na verdade, não. – Posso perguntar por quê? Com um suspiro, ela apoiou-se na bancada. – Porque estou de bom humor. Estou gostando desta viagem, e não estou

– Porque estou de bom humor. Estou gostando desta viagem, e não estou disposta a arruiná-la com discussões acaloradas. Além do mais, por enquanto, minha posição não mudou. Você ainda é um desconhecido. Um desconhecido bom com crianças, porém ainda não é alguém para quem eu esteja disposta a entregar a minha filha. – A nossa filha – corrigiu Luca. Ela sempre dizia “minha filha”. Claire parecia ter um bloqueio mental no que dizia respeito à paternidade da filha deles. Claire o ignorou. – A questão é que ainda não estou pronta, de modo que, não adianta nada conversarmos agora. Vou ler a proposta. Quando chegar a hora, estarei bem informada sobre as suas exigências. Exigências? Luca não pôde deixar de se perguntar se Claire fazia ideia de como as suas palavras soaram para ele. Ambos estavam acostumados a ver suas vontades realizadas, mas Luca era inteligente o bastante para saber que ambos não poderiam vencer aquela batalha sem chegar a um acordo. – Nesse caso, adiaremos a discussão. O jantar já está quase pronto. Que tal escolher um vinho tinto? Claire adiantou-se até a prateleira de vinhos e examinou a seleção. – O chianti ou o merlot? Luca tirou a travessa de lasanha do forno. – O chianti. Ainda não o experimentamos. Como costumava acontecer em viagens de férias, a primeira semana deles na praia passara voando. Mas aquela fora a primeira vez que tocaram na questão da guarda, apesar de terem ido até ali para chegarem a um acordo. Pouco a pouco, Claire estava soltando as rédeas de Eva. Luca não tinha dúvida de que, até o final da viagem, ela não teria problemas em deixá-lo a sós com a filha deles. Eles haviam passado um bocado de tempo aproveitando a praia e dando caminhadas à beira da água. Claire leu alguns livros e Luca verificou e-mails de trabalho, embora soubesse que não devesse fazê-lo. Cozinharam fantásticas refeições juntos, mimaram Eva juntos e aprenderam mais um sobre o outro. Fora exatamente o que Luca estivera esperando quando combinaram aquelas férias.

Claire provara ser excelente companhia. Após o primeiro encontro com os advogados, ele estivera receando essa viagem, mas enganara-se redondamente a respeito dela. Ela protegia ferozmente Eva; contudo, assim que conseguiu passar pelos instintos de mamãe ursa dela, Luca ficou feliz em encontrar um lado mais tranquilo de Claire. Ela mostrou ser o tipo de mulher que ele poderia querer em sua vida… caso algum dia resolvesse ter uma mulher em sua vida. – Não consigo acreditar que tenha colocado Eva para dormir tão rapidamente – falou Claire, trazendo a garrafa de vinho tinto para a mesa. Luca também ficara surpreso, mas Eva tivera o dia inteiro para se cansar. Haviam dado uma demorada caminhada ao longo da baía, como vinham fazendo todos os dias. Comeram frutos do mar no quiosque na praia. Eva, é claro, tivera de se contentar com sua papinha de frango, ervilhas e cenouras. Ela tirara um breve cochilo e, depois, brincara no chão por um bom tempo com Claire, enquanto Luca preparava o jantar. Após o banho, já vestindo o seu pijaminha, os olhos de Eva estavam pesados. – Obrigado por me deixar colocá-la na cama, hoje – disse Luca. Desde que chegaram, fora a primeira vez que fizera isso. Ele usara uma canção de ninar que a mãe costumava cantar. Eva apagou em questão de minutos. – De nada. Acho que ela prefere a sua voz à minha. – Eu duvido. Férias podem ser cansativas. A esta altura, ela poderia ter dormido no meio de um tiroteio. Para ser sincero, eu mesmo não sei quanto tempo vou durar. Um prato de lasanha e uma taça de vinho vão me apagar. Claire serviu o vinho nas duas taças sobre a mesa. Pegando a vasilha de salada, ela acompanhou Luca até a mesa para começarem o banquete. – Está com um aroma delicioso – disse. Era domingo. De jeito algum Luca poderia deixar o dia passar sem preparar um banquete italiano capaz de deixar a mãe orgulhosa. Ele cortou uma grande fatia de lasanha e a serviu no prato de Claire, antes de cortar outra fatia para si mesmo. – O jantar de domingo está servido. – Eu vou ganhar tanto peso – falou ela, ao fitar a refeição. – Você cozinha bem demais, e em demasiada quantidade. Não consigo resistir. Faz apenas uma semana, e, hoje, meus shorts estavam um pouco apertados.

– Acho que você pode se dar ao luxo de ganhar alguns quilinhos sem se preocupar. É tão pequenina. Rindo, Claire bebericou o seu vinho. – Garanto que não é esse o caso. Ainda estou lutando contra os últimos quilos da gravidez. Luca não sabia ao certo onde estavam escondidos esses quilos misteriosos. Ele realmente achava que Claire parecia um pouco magra demais. – Não sei do que você está falando. Na minha opinião, você está fantástica. Se eu a levasse para casa para conhecê-la, minha mãe insistiria que está magrinha demais e a encheria de comida. Ele estremeceu por dentro quando as palavras escapuliram de seus lábios. Claire pareceu ficar dura na cadeira ao seu lado, e ele soube que suas palavras soaram tão estranhas para ela quanto para ele. Luca jamais considerara como seria para Claire conhecer o resto da sua família. Pensando bem, apresentar Claire para a família seria muito mais complicado do que apresentar uma nova namorada. Claire finalmente relaxou quando ele não insistiu no assunto, e apenas sacudiu a cabeça. – Não quero nem imaginar – disse ela. – Como a sua família reagiu à notícia de Eva? – Ainda não contei para eles – admitiu Luca. – Por que não? Luca suspirou. – Bem, como eu já lhe contei, tenho uma grande família. Também tenho uma família barulhenta, insistente e sufocante. Acho que minha mãe já havia desistido da ideia de eu vir a ter filhos. Descobrir sobre Eva abalaria o mundo. Seriam como abelhas rodeando um favo de mel. Eu quis que tivéssemos um pouco de espaço primeiro. Afastar-me de Manhattan teve um pouco a ver com isso. Contudo, eles não demorarão a descobrir. – Onde eles acham que você está agora? Quero dizer, você teve de convencer alguém a tocar a empresa enquanto passa essas semanas fora, não é? – Disse para meus irmãos que estava tirando férias com uma bela mulher. Eles concordaram em cuidar das coisas e não contar para ninguém.

Provavelmente porque estão tão desesperados quanto Mama para me ver encontrar uma mulher. – Sente-se mal por mentir para eles? Luca franziu a testa em uma expressão de confusão. – Não. Não estou mentindo. – Mas disse que… – Eu disse que estava tirando férias com uma bela mulher. – Luca a fitou do outro lado da mesa. – Isso é absolutamente verdadeiro. Aquele rubor rosado voltou a tomar conta das faces de Claire, distraindo-o de seu prato. – Pare com isso. Não precisa bajular. – Não estou bajulando-a, tesorina. Estou falando sério. Não faz ideia de como é atraente? Ela ficou boquiaberta, balbuciando uma aglomeração de palavras sem sentido enquanto tentava ordenar seus pensamentos. – Quero dizer, eu acho que sou bonita. Mas não sou nenhuma supermodelo e nem uma sofisticada socialite. – Tudo falso. Umas farsantes fabricadas por maquiadores, cirurgiões plásticos e programas de alteração de fotografias. Prefiro uma mulher de verdade, naturalmente bonita, a uma dessas fantasias, sem pestanejar. – Acho que está em minoria, Luca. Luca não pôde suportar a expressão pouco à vontade do rosto de Claire. Seria obra de Jeff, ou será que todos os homens na vida dela a haviam tratado mal? – Seu marido nunca lhe disse como você é linda? Claire abaixou o olhar e ansiosamente brincou com a comida no prato por um instante. – Na verdade, não. Quero dizer, ele me escolheu, de modo que devia achar que eu era bonita, mas não era dado a elogios. Ainda mais perto do fim. Luca recostou-se na cadeira por um minuto, tentando processar tudo que ela acabara de lhe contar. Jamais teria a própria mulher; contudo, sabia que, se tivesse, ele a valorizaria. – Sinto muito – disse, por fim. Os olhos de Claire se arregalaram de surpresa.

– Sente muito pelo quê? – Sinto muito que seu marido não a tenha tratado como deveria. Só de escutá-la falando sobre Jeff, Luca sentia o sangue ferver. Não só ele tratara com pouco-caso o casamento, mas demonstrara pouco-caso com a própria vida quando tinha uma criança a caminho. Descobrir que ele jamais oferecera o amor e os elogios que a esposa merecia, mesmo no início do casamento… era indesculpável aos olhos dele. – Estávamos tendo problemas – argumentou Claire. – Eu estava tão envolvida na ideia de ter um bebê que me esqueci do casamento. Acho que ele se sentiu solitário. – Isso não é desculpa – disse Luca, curvando-se para a frente e cobrindo a mão dela com a sua. – É natural para uma mulher querer filhos. Quando há dificuldades, o marido deveria ser mais atencioso e apoiador do que nunca. Ir pular na cama de outra só porque sentia que não estava recebendo atenção suficiente é absurda. Fui criado para acreditar que uma mulher deve ser valorizada. Ela é uma dádiva, um anjo colocado na sua vida pelos céus. Tratála como menos do que isso é uma abominação. Claire o observou falar com um misto de incredulidade e admiração nos olhos acinzentados. Ela inclinou-se na direção dele, os lábios se entreabrindo. Eram lábios generosos e macios que já haviam passado tempo demais sem beijos. Aos olhos de Luca, isso era uma tragédia. Algumas palavras gentis e ela estava se derretendo como manteiga. Ela merecia mais. Infelizmente, Luca não era o homem para dar isso a ela. Ele recostou-se na cadeira, retraindo a mão. Ela despertou de seu transe e deslizou a mão para o colo. – Acredita mesmo nisso tudo? – perguntou ela. – Acredito. Meus pais ficaram casados por mais de trinta anos com essa filosofia em mente. – Posso perguntar por que não se casou, então? Estou certa de que não faltam mulheres por aí que adorariam ser tratadas como presentes preciosos. Luca tentou não se retrair ante a pergunta. Ele já xeretara um bocado a vida pessoal dela. Nada mais justo que ela fizesse o mesmo. Contudo, havia minas terrestres nesse campo em que ele não queria pisar. Nem hoje e nem nunca. Em vez disso, deu de ombros e contou a história que repetira inúmeras vezes ao longo dos anos.

– Desde o dia em que nasci, fui preparado para assumir os negócios da família. O filho mais velho sempre estivera à frente da empresa. Fui da escola para a faculdade, para a pós-graduação, para a diretoria da empresa. Assim que meu pai se aposentou, eu tive esse enorme peso sobre os meus ombros para tocar a empresa de maneira rentável, ou estaria decepcionando todo mundo. Isso não me deixou muito tempo para mais nada. E não estou falando apenas de relacionamentos. Eu nunca viajo. Não tenho passatempos, nem interesses fora do trabalho. Tenho o meu negócio. E é só. O que Luca não mencionara era que, no caso dele, era tudo deliberado. O pai tocara a empresa e encontrara tempo para a mulher e os filhos, de modo que ele sabia que era possível. Porém, ocupar-se era a única maneira de Luca superar a solidão. Todavia, Claire não entenderia, pois não sabia que ele era um homem danificado. Ela via apenas o homem de negócios autoconfiante e bem-sucedido que ele apresentava para o mundo. – Nunca se apaixonou por ninguém? Luca considerou a sua resposta antes de falar: – Não – mentiu. – Cheguei perto, mas estava enganado. – Isso é meio triste. Apesar de todo o seu dinheiro e sucesso, tudo que isso lhe trouxe foi dinheiro e sucesso. Sequer tem alguém com quem compartilhar isso. Quando foi a última vez que tirou férias? – Eu estou de férias – argumentou Luca. – Não. Antes desta. – Só tive férias quando era criança. Pelo menos, não férias de verdade. De vez em quando, durante o verão, minha família se reúne para um final de semana prolongado nos Hamptons. – Parece que logo será um velho solteirão solitário. O que a sua família fará se não tiver um filho mais velho para assumir por você? Era a pergunta que o assombrava desde o dia de seu diagnóstico. Na realidade, não faltavam pessoas na família capazes de assumir as rédeas. Seu irmão mais novo, Marcello, tinha um filho que poderia facilmente ser o próximo presidente da empresa. Contudo, agora, havia uma nova possibilidade. – Bem, não estamos mais na década de 1950. Não está escrito em lugar nenhum que precisa ser um filho. Posso não me casar, e nem ter mais filhos;

contudo, por um acidente do destino, tenho Eva na minha vida. Sempre existe a possibilidade que ela possa assumir por mim. – Se ela quiser – retrucou Claire. – É bom ter um legado familiar, mas não quero que ela seja pressionada a seguir uma vida e uma carreira que ela não quer. – É claro. – Luca também não queria isso para a filha. Ele mesmo não fora pressionado a assumir a empresa. Era algo que ele sempre sonhara em fazer. Sua família era importante para ele, e levar adiante o legado era uma honra. Ele já tivera esperança de que pudesse ser substituído pelo filho, mas era uma fantasia que há anos já abandonara. – Antes de nos preocuparmos com o futuro e a carreira de Eva, temos de nos preocupar com as próximas três semanas. Claire assentiu e retornou a sua atenção para a comida. Bebericando pensativamente o seu vinho, Luca ficou observando-a comer, as ligeiras olheiras, o descair derrotado dos ombros. O estresse estava fazendo com que ela definhasse. Reconhecia a expressão de quando a mãe dele passara os dias sentadas ao lado do seu leito de hospital, preocupada com ele. Na ocasião, não pudera ajudar a mãe. Contudo, podia ajudar Claire, caso ela deixasse. Devia ser incrivelmente difícil ser uma mãe solteira, mesmo com todos os recursos de que ela dispunha. Sem dúvida ela estava precisando daquelas férias, mais do que ele se dera conta. Haviam ido até ali para se conhecerem melhor e para traçar o acordo de guarda; porém, agora, ele tinha um outro objetivo: encontrar uma maneira de deixar Claire feliz novamente.

CAP ÍTULO 5

C LAIRE NÃO conseguiu dormir naquela noite. Sua cabeça estava girando com tudo que Luca havia lhe dito no jantar. Não sabia se ele estava dizendo a verdade, ou se tinha a habilidade de encantar uma mulher ao saber exatamente o que ela precisava escutar. Haviam passado apenas uma semana juntos. Será que ela era tão fácil assim de decifrar? De qualquer modo, estava dando certo. Uma combinação de palavras gentis e vinho forte haviam minado as suas defesas. Ao final da refeição, ela teria concordado com qualquer coisa que ele sugerisse. Até com o tipo de coisa que sabia que seria uma péssima ideia. Como tocar nele. Durante todo o jantar, teve vontade de passar os dedos pelas ondas escuras dos cabelos dele. Queria roçar o polegar sobre o lábio inferior dele, enquanto Luca dizia as palavras que ela ansiara a vida toda que um homem dissesse. O que ele faria se ela estendesse a mão para ele? Será que a tomaria nos braços, ou a rejeitaria? Será que a chamaria de tesorina? Não fazia ideia do que isso significava, mas, sempre que ele dizia isso, Claire sentia as pernas bambearem. Agora, a inquietude em seu interior a impedia de dormir. Um profundo latejar na pelve. Não sabia se era azia devido ao picante molho de tomate, ou se era o desejo há muito adormecido voltando à vida. De qualquer forma, nenhum dos dois era muito bem-vindo. Fora até ali para conhecer o pai de sua filha, mas não no senso bíblico. Após a desastrosa relação com Jeff, ela se resignara a jamais apaixonar-se novamente. Era duro demais para o coração, e ela não achava que seria capaz de se arriscar

uma segunda vez. Se o fizesse, teria de ser com um homem que fosse, acima de tudo, sincero, e, naquele instante, não podia confiar em uma palavra sequer que saísse da boca de Luca. Estavam em campos opostos naquela batalha pela guarda da filha. Contudo, diante das belas praias, as refeições fabulosas e da conversa estimulante, era fácil se esquecer disso. Seria um erro perigoso, um erro que tinha certeza de que Luca não cometeria. Frustrada, jogou longe os cobertores e seguiu para a sala de estar. O vinho a esquentara tanto que não suportou a ideia de dormir com a calça do pijama de flanela e a blusa. Sendo assim, optara por passar a noite com um baby-doll curto e quase transparente. Felizmente, a casa estava escura e silenciosa quando saiu para o corredor. Sem saber ao certo o que queria, Claire acabou na cozinha. Não se deu ao trabalho de acender as luzes, pois o luar entrando pelas janelas iluminava tudo que ela precisava ver. Optando por uma xícara de chá, colocou uma xícara de água para esquentar no micro-ondas. Ela abriu a porta da geladeira, mas nada que viu lá dentro a apeteceu. Então retirou a água quente do micro-ondas. Após imergir o saquinho de chá por algum tempo, acrescentou um pouco de mel para adoçar. Ao virar-se, notou o vulto grande postado nas sombras da entrada da cozinha. Sentiu uma pontada de pânico quando o vulto se adiantou, até reconhecer Luca, iluminado pelo luar entrando pela janela. Seus batimentos cardíacos começaram a retornar ao normal. Pelo menos, até ela se dar conta de que ele estava usando apenas uma cueca samba-canção. A luz prateada evidenciou as saliências dos braços musculosos e o desenho do peitoral. A extensão de pelos escuros recobrindo o peito dele se estreitava ao descer pela barriga. Os olhos dela acompanharam a trilha ao longo do abdome firme, e ela sentiu o calor em seu interior intensificar-se. Tudo bem, não era azia, admitiu para si mesma. Era desejo. Quase havia se esquecido de como era a sensação. Quando seu olhar deslizou de volta para o rosto de Luca, notou o ligeiro retorcer de um sorriso em seus lábios. Será que ele notara que ela o examinara de cima a baixo? – Tudo bem? – perguntou ele.

– Tudo. Eu só não consegui dormir. – Eu também não. Seu olhar percorreu a camisola dela, a apreciação evidente em seus olhos. O maxilar de Luca se retesou, o que a levou a se perguntar se ambos não estariam sofrendo da mesma causa de insônia. – Gostaria de um pouco de chá? – perguntou ela, tentando se distrair. – Acabo de preparar um de camomila com mel para mim. – Não, obrigado. Ele permaneceu parado ali, deixando Claire sem saber o que fazer. Podia sentir a tensão no ar entre os dois. Era elétrica; contudo, nenhum dos dois parecia disposto a fazer algo a respeito. Provavelmente porque os dois sabiam que era uma péssima ideia. No entanto… Claire precisava voltar ao seu quarto, beber o seu chá e ir dormir. Era a única coisa que precisava fazer. Bastaria passar pela figura enorme de Luca bloqueando a passagem entre a geladeira e a ilha da cozinha. – Bem, boa noite, então – disse ela. Abaixando o olhar para a xícara nas mãos, ela avançou, esperando que Luca fosse sair do caminho. Mas ele não saiu. Em vez disso, sentiu a mão dele lhe agarrar o pulso, o calor do toque dele quase a marcando. – Claire? Ela deteve o seu avanço, a respiração entalada na garganta. Usando apenas uma palavra, ele fizera uma centena de perguntas diferentes ao mesmo tempo. Ela virou a cabeça para olhar para ele. Luca a estava fitando, a sua própria respiração alterada fazendo o seu peito subir e descer como se ela estivesse correndo. Ele engoliu em seco, os músculos do pescoço se contraindo. Ela observou a língua serpentear sobre o lábio inferior. O tempo todo, os olhos intensos a devorando. Naquele instante, Claire soube que, fosse qual fosse a pergunta que ele estivesse fazendo, a resposta era sim. Pousando a xícara sobre a bancada, virou-se para ele. – Sim? Luca não hesitou. Tomou-a nos braços e a puxou com vontade para si. Sua

Luca não hesitou. Tomou-a nos braços e a puxou com vontade para si. Sua boca chocou-se com a dela com a ferocidade de um homem morrendo de sede, sendo que ela era o seu copo de água. Ele a sorveu com vontade, e Claire se viu incapaz de detê-lo. Ela não queria fazê-lo. Já fazia tanto tempo desde a última vez em que fora desejada. Em todos os anos de casamento, Jeff nunca a beijara com tanta paixão quanto Luca estava fazendo naquele instante. Ela não queria abrir mão disso. Claire envolveu-lhe o pescoço com os braços e arqueou as costas de modo a colar os quadris nele. Pôde sentir a evidência do desejo dele ali, insistentemente a cutucando. Quando fizeram contato, ele lhe gemeu o nome de encontro à boca, depois a girou, até que as suas costas estivessem encostadas no frio aço escovado da geladeira. A sensação gelada nada fez para aliviar o ardor que se intensificava dentro dela. Com cada carícia da língua, e cada deslizar da mão de Luca ao longo do corpo dela, ele alimentava as chamas que ela há muito acreditara mortas. Quando sentiu a mão dele deslizar para baixo da camisola, e os dedos roçarem na borda de renda da calcinha, ela pressentiu uma ligeira hesitação. Como uma descarga elétrica, isso a despertou do torpor induzido pelos hormônios. As coisas estavam acontecendo rápido. Rápido demais. Realmente estava pronta para fazer sexo na cozinha com um homem que mal conhecia? Um homem que estava tentando tirar Eva dela? Antes que pudesse responder, o uivo zangado da filha lhe interrompeu os pensamentos. Não era o costumeiro choro de fome ou de fralda molhada de Eva. Havia algo errado. Luca estremeceu e recuou, os lábios a uma fração de centímetros dos dela, sua respiração acelerada. Empurrando o peito de Luca, Claire deu um passo para trás. – Sinto muito, tenho de ir verificar Eva. Ela saiu correndo o mais rápido que pôde da cozinha. A situação rapidamente fugira ao controle e, graças a Deus, Eva despertara na hora certa para impedir que as coisas fossem longe demais. Entrando no quarto, acendeu a luz e tomou nos braços a chorosa filha de rosto vermelho, erguendo-a do berço. Eva estava ardendo de febre, Claire notou, assim que encostou na face da

Eva estava ardendo de febre, Claire notou, assim que encostou na face da menina. Freneticamente, começou a revirar a sacola de fraldas à procura do termômetro, enquanto os gritos agudos em seu ouvido a impediam de pensar direito. – Ela está bem? Claire virou-se e se deparou com Luca postado na porta. – Está com febre. – Enfim localizando o termômetro, ela o posicionou no ouvido da criança. – Trinta e nove e meio. Era alta. Sentiu o pânico começando a brotar dentro dela. Estava longe do pediatra de Eva. Quanto mais Eva gritava, mais difícil ficava para Claire pensar. – Venha cá – falou Luca, gentilmente tomando Eva dos braços dela. – O que acha que está fazendo? – Tomando conta da nossa filha doente. Ignorando o tom irritado de Claire, Luca começou a desabotoar o pijaminha de Eva, tão controlado, quando controle era a última coisa que Claire estava se sentindo. – Vou lhe dar um banho frio para deixá-la mais à vontade. Tem algum remédio para baixar a febre? Ela assentiu. – Na sacola de fraldas. Eu vou buscar. Quando ela se juntou a Luca no banheiro, Eva já estava mais calma. Estava sentada na banheirinha, enquanto Luca passava uma esponja molhada sobre a pele dela. A água tépida e a espuma perfumada pareciam tranquilizá-la. Após alguns minutos, as lágrimas cessaram, mas ela ainda parecia um pouco irritadiça e pouco à vontade. Por fim, Luca a tirou da água e a secou. Após usar o conta-gotas para dar o remédio na boca de Eva, ele devolveu o frasco para Claire. – Enquanto acabo de secá-la, pode trazer uma mamadeira com água fria? Ela pode estar um pouco desidratada devido à febre, e isso vai deixá-la mais tranquila. Assentindo, Claire seguiu para a cozinha, sentindo-se estranhamente inútil, com Luca assumindo o comando. Sequer sabia o que acontecera direito, a não ser que, em um momento crucial, hesitara, dando a Luca a oportunidade que

ele vinha aguardando. Ao chegar à cozinha, olhou para a xícara de chá abandonada e para a geladeira embaçada, e sacudiu a cabeça. Aparentemente, aquela era uma noite de erros. Ao mesmo tempo, estava feliz de ter alguém ali com ela. Aquela era a primeira febre de verdade de Eva, e, embora Claire pensasse estar preparada, fora pega de calças curtas após ficar desnorteada com os beijos de Luca. Supunha ser esse um dos benefícios de se ter um casal de pais para dividir a responsabilidade. Jamais tivera isso. Ao encher a mamadeira de água, sentiu o arder de lágrimas nos olhos. Era apenas um momento para lembrá-la do que ela perdera com a inconsequência de Jeff. Seus sonhos de ter uma família haviam sido destroçados, criando uma nova realidade muito mais dura do que qualquer coisa que pudesse ter imaginado. Ele a deixara para criar uma filha sozinha, só para conseguir que lhe fizessem sexo oral em uma estrada sinuosa. – Claire? Claire rapidamente enxugou as lágrimas e fungou. Apertando a tampa da mamadeira, ela virou-se para ele. – Está pronta. Como está ela? Luca tomou a mamadeira de suas mãos com preocupação no olhar. – Acho que vai ficar bem. Não estou tão certo quanto a você. – Eu? – Eva vai ficar bem. Não há nada com que se preocupar. Claire assentiu. – Eu sei. – Nesse caso, o que a está incomodando? – Alguma coisa. Tudo. Não se preocupe comigo, Luca. Recentemente, a vida tem cutucado muitos dos meus pontos sensíveis. Luca ajeitou Eva nos braços e lhe deu a mamadeira. – Foi o beijo? Eu fui rápido demais? – Não. O beijo foi… adorável. Provavelmente não é a melhor das ideias no nosso caso, mas não me arrependo. – Acha que eu me intrometi demais com Eva, hoje à noite? Se for isso, eu sinto muito, mas você pareceu um pouco sobrecarregada, e eu quis ajudar. Minha irmã caçula teve um bocado de infecção de ouvido quando era

pequena, e tendia a ter febre. Já passei muitas noites com a minha mãe banhando bebês chorões. Isso explicava muito. Apesar de ser mãe, Claire estava aprendendo a cada dia. Como filha única, não tinha muita experiência em cuidar de bebês. Cada coisa que fazia era um misto de pesquisa e instinto maternal. – Não, também não é isso. Obrigada por toda a ajuda que me deu com ela. Tem razão, eu estava um pouco desnorteada, e foi bom alguém assumir a situação por mim. Eu não deveria precisar de ajuda, mas é bom ter um pouco de vez em quando. Luca pousou uma mão confortadora no ombro de Claire. O calor de encontro à pele dela a lembrou dos toques anteriores, deixando-a arrepiada. Subitamente, se deu conta de como Luca estava próximo, e de como ele cheirava bem. É claro que ela cedera aos encantos dele. Qualquer outra mulher em sua posição teria feito o mesmo. Ele lhe dissera que ela era linda. Tinham uma filha juntos. Ele a beijara como se não houvesse mais nada no mundo que desejasse tanto. Contudo, assim que o feitiço do beijo deles se dissipou, ela sabia que mais nada poderia acontecer. Luca parecia se esconder atrás de um muro. Ela sabia o instante exato em que as conversas deles invadiam um terreno em que ele se sentia pouco à vontade. Até mesmo as perguntas mais inocentes sobre o baile de formatura pareciam deixar os olhos dele envidraçados. As respostas que vinham em seguida pareciam superficiais e sem autenticidade. Não era necessariamente que estivesse mentindo, mas pareciam respostas ensaiadas. Claire já tivera sua experiência com discursos ensaiados, quando Jeff escondia com sucesso a sua infidelidade. Recusava-se a cometer o mesmo erro duas vezes, mesmo com um homem dez vezes mais atencioso e encantador do que Jeff jamais fora. – É uma mãe, tesorina, não uma super-heroína. É permitido aceitar ajuda. – Obrigada. Pelo menos em teoria, Claire sabia disso. Colocar em prática era um pouco mais difícil. Tirando Daisy, não havia mais ninguém com quem pudesse contar. Talvez não fosse tão ruim ter Luca na vida de Eva. Até aquele momento, ela jamais se dera conta do quanto precisava de ajuda, ou de uma folga ocasional.

Ainda não estava pronta para ceder no tocante à guarda, mas estava começando a ver algo de positivo na situação toda. – Ficarei um pouco com ela, caso queira voltar para a cama. A oferta na mesma hora incomodou Claire. Uma coisa era deixá-lo ajudar, outra bem diferente era permitir que ele assumisse por completo o controle. Detestava questionar as motivações dele o tempo todo, mas não podia ser ingênua. O que ele poderia dizer para o juiz? Que, quando Eva ficou doente, foi ele a cuidar dela? Não, muito obrigada. – Não será necessário – disse, estendendo as mãos para tomar Eva de seus braços. – Eu não estava mesmo conseguindo dormir. Vou ficar acordada até ela começar a se sentir melhor. Sem soltar Eva, Luca ficou observando Claire desconfiadamente, enquanto ela lutava contra a vinda de um bocejo inesperado. – Acho que o sono já chegou para você. Nós ficaremos bem. Volte para a cama, e eu a acordarei se algo acontecer. Caso contrário, eu a colocarei no berço quando ela adormecer. Apesar da sua relutância, Claire pôde ver no olhar determinado de Luca que ele pretendia insistir. Talvez estivesse apenas sendo bonzinho, e não procurando munição para usar contra ela no tribunal. De qualquer forma, suas pálpebras estavam ficando pesadas demais para continuar discutindo. – Muito bem, obrigada. Deixarei a porta para o quarto de dormir aberta. – Boa noite. Pelo modo como Eva estava aninhada nos braços dele, Claire pôde perceber que a filha provavelmente dormiria antes mesmo que ela, de modo que não havia muito com o que se preocupar. Relutantemente, voltou para o quarto e enterrou-se debaixo das cobertas. Seus últimos pensamentos antes de adormecer giraram em torno da maciez dos lábios de Luca sobre os dela. Será que um dia voltaria a senti-los? QUANDO VOLTOU a abrir os olhos, com a luz da manhã entrando pelas janelas, sentiu como se houvesse acabado de fechá-los. Claire sentou-se na cama e notou que a porta do quarto ainda estava aberta e o berço, vazio. Se Eva não adormecera, por que Luca não viera acordá-la? Descendo da cama, pegou o roupão e retornou para a sala de estar.

Descendo da cama, pegou o roupão e retornou para a sala de estar. Encontrou Luca e Eva no sofá, os dois dormindo debaixo de uma manta, Eva enroscadinha de encontro ao peito do homem. Claire ficou ali parada por um instante, observando os dois juntos. Era uma visão preciosa. Sua vontade era gravá-la na lembrança e jamais esquecê-la. – Bom dia. Claire ficou surpresa ao notar que os olhos de Luca haviam se aberto e ele a estava observando tão atentamente quanto ela o estava observando. – Bom dia. Vocês dois parecem estar muito confortáveis. Luca abaixou o olhar para a menina babando sobre o seu peito nu. – Suponho que sim. Devemos ter apagado logo depois que você foi para a cama. Acho que não me movi um centímetro a noite toda. – Ele sentou-se lentamente para não incomodar o bebê, gemendo ligeiramente ao alongar os membros encurtados. – Que horas são? – Nove e pouco. – Puxa. Há anos que não durmo até tão tarde. Claire aproximou-se e estendeu os braços na direção da filha. – Eu fico com Eva. Por que não vai tomar um banho e relaxar um pouco, enquanto preparo o café da manhã para nós? Luca ficou de pé e passou o bebê adormecido para ela. – Por favor, prepare um pouco de café. Puro e bem forte. – Eu posso fazer isso. Ele adiantou-se na direção das escadas, mas, antes que pudesse alcançá-la, Claire disse: – Luca? – Ele parou e voltou-se. – Eu queria agradecer. – Por quê? – perguntou ele. – Pela noite passada. Ele respondeu com um sorriso. – Qual parte? A parte em que perdi o controle e quase a possuí de encontro à geladeira? Ou a parte em que eu a empurrei para o lado para cuidar de Eva, quando dava para ver que não era o que você queria? Era uma boa pergunta. As palavras saltaram de seus lábios antes que ela tivesse tempo de ponderá-las. – Talvez as duas coisas. A combinação das duas coisas me deu um gostinho de como seria ter alguém novamente na minha vida. Para me ajudar. Para me

abraçar. Foi bom. – Sei o que quer dizer. Acho que nós dois nos acostumamos a ficar sozinhos. Minha mãe sempre diz que não é assim que as pessoas deveriam viver. Estou começando a achar que ela tem razão. – Posso não o conhecer muito bem, mas, pelo que eu já vi, diria que é um bom homem, Luca. A mulher que o deixar entrar em sua vida será uma mulher de sorte. Uma tristeza que Claire não conseguiu entender cruzou o rosto de Luca. Por que um elogio como aquele privaria os seus olhos do brilho, quando todos os seus insultos zangados no passado sequer haviam lhe amassado a couraça? – Obrigado – disse ele, mas ela teve a impressão de que não acreditara, assim como ela não acreditou quando ele dissera que era linda. Ambos pareciam ter muitas dúvidas no tocante à autoestima e no seu valor para o sexo oposto. Claire sabia que era assim que ela se sentia, mas Luca? Era um homem de negócios atraente e atencioso, capaz de deixar uma mulher com as pernas bambas com os seus elogios. Não sabia ao certo por que ele não estava rodeado de mulheres. Ele não era o tipo de homem que ela precisava na sua vida; contudo, seria uma excelente escolha para qualquer outra mulher. Claire queria que ele soubesse que falara sério, que não era apenas bajulação. – Quem dera eu tivesse encontrado um homem mais parecido com você quando era mais jovem, e estava procurando alguém com quem começar a minha vida. Se eu tivesse, talvez não fosse agora uma viúva me perguntando onde foi que a minha vida saiu dos trilhos. A tristeza desapareceu e o maxilar de Luca se retesou, assim como os dedos ao redor do corrimão. Ele olhou para ela com olhos que refletiam uma confusa combinação de tristeza e irritação. – Se eu fosse você, não desperdiçaria meus desejos com um homem como eu – disse ele, antes de desaparecer escada abaixo.

CAP ÍTULO 6

L UCA ESTAVA sentado sorumbaticamente em uma cadeira de praia. Claire estava na água com Eva. Embora a mãe estivesse segurando a maior parte do seu corpinho fora da água, a menininha dava gritinhos de alegria cada vez que a água fria cobria os seus pezinhos, rindo em seguida, como se fosse a coisa mais fenomenal que já experimentara. Quando Claire lhe soltava as mãozinhas, Eva agarrava punhados de areia molhada, apertando-a entre os dedos. Deveria ter sido uma visão feliz e divertida para Luca. Ele deveria estar na água fria com a filha. Em vez disso, estava sentado longe, com a cara amarrada sob o boné e os óculos escuros. No fundo, não tinha motivo para estar amuado. Conseguira fazer Claire afastar-se dele. Era o que queria, ou o que achava que tinha de fazer, quando ela começou a fitá-lo com aquela expressão sonhadora. Ele podia ter escorregado naquela outra noite e se deixado levar fisicamente, mas isso não mudava o fato de que não era o homem certo para Claire. Não era o salvador romântico vindo para resgatá-la de sua solidão. Melhor ela descobrir isso agora do que mais tarde. E, no entanto, os últimos dias foram angustiantes. A princípio, Claire se concentrara em Eva, cuidando da menininha enquanto ela se recuperava do mal-estar. Quando o bebê ficou bem, ela continuou a manter a distância. Não era grosseira, mas também estava longe de ser tão falante e extrovertida quanto antes. Deveria estar satisfeito por ela ter entendido o recado. Em vez disso, Luca se surpreendeu ao ver que sentia saudades das conversas deles. Também ficava rolando na cama à noite, pensando no beijo que haviam trocado na cozinha.

Bom Deus, não conseguia se conter. Assim que a provara, fora como se algo houvesse sido libertado de dentro dele. Cada toque, cada som que ela emitiu, foi como um incentivo para ele. Se Eva não tivesse acordado com aquela febre, ele não sabia o que teria acontecido. Pôde notar que Claire ficara aliviada com a intervenção. Passado o momento, ficou claro que não era a melhor das ideias, na situação deles. Mas isso não mudava o quanto a desejava. Era evidente que Claire não era do tipo de mulher de ter romances casuais. Fora mais encantador do que pretendia, e subitamente se vira em uma situação inesperada. De modo que recuou. Era mesmo a melhor coisa a se fazer. Claire merecia uma relação com um homem capaz de lhe dar tudo que ela queria, incluindo amor e outro filho. Por mais que ele a desejasse, este não seria Luca. Melhor dar um fim a tudo aquilo antes que fosse longe demais. Voltando a olhar para o mar, Luca não pôde deixar de admirar as curvas de Claire. Apesar de suas alegações de excesso de peso da gravidez, ela parecia fantástica usando apenas um short e a parte de cima do biquíni. A pele estava dourada do tempo que vinham passando na praia, e o sol parecia estar deixando o cabelo louro ainda mais claro. O corte do biquíni lhe oferecia provocantes vislumbres dos seios fartos. Não havia o que não gostar a respeito de Claire. Esse era o problema. Era fácil demais gostar dela. Fácil demais encontrar uma razão para tocar nela. O sangue pulsava nas suas veias sempre que sentia o perfume dela. Havia inquietação em cada músculo quando ficava deitado, sozinho, acordado, pensando nela. Era como se o seu corpo soubesse que haviam gerado uma filha juntos e estivesse pronto para começar a trabalhar em outra criança assim que possível. E, se Luca pudesse oferecer isso a ela, estaria na água agora, em vez de sentado naquela cadeira, amuado. Mas não podia. E preferia passar pela vida como um solteirão a desapontar a mulher que amava. Sua única alternativa seria encontrar uma mulher que não pudesse ter filhos; contudo, não era como se elas saíssem por aí fazendo propaganda do fato. Alto lá… Claire podia ser tal mulher. Ela não se aprofundara em seus problemas de fertilidade, mas tinha de ter algum, ou não estaria na clínica. Ele

também evitara o assunto. Não gostava que as pessoas soubessem que tivera câncer, quanto mais o tipo que tivera. Luca não era do tipo de acreditar em destino, mas a vida decididamente estava determinada a convencê-lo do contrário. E se Claire fosse a chance na qual ele jamais se permitira acreditar? Se Luca permitisse que a atração deles evoluísse para um relacionamento, esta poderia ser a sua segunda chance. Seria perfeito. Já tinham uma filha juntos. Se acabassem por se casar, isso resolveria toda a questão da guarda. Ele teria a família que queria em tempo integral e Claire não teria de ficar longe de Eva quando chegasse o final de semana dele. Claire aproximou-se da cadeira dele com a menina coberta de areia nos braços. – Vou dar um banho de mangueira nesta macaquinha, antes de colocá-la para cochilar. – Tudo bem. Vou recolher as nossas coisas e estarei de volta na casa em alguns minutos. Com o cenário do relacionamento se desenrolando em seus pensamentos, ele viu Claire afastar-se. Conquistá-la seria a solução perfeita. Ambos se beneficiariam disso. Claire teria um pai em tempo integral para Eva, e um homem que a tratasse como merecia ser tratada. Luca teria a família que pensara que jamais teria, e conseguiria com que a mãe largasse do seu pé de uma vez por todas. Seria bom ter alguém com quem conversar quando voltasse para casa. Seu apartamento estava se tornando insuportavelmente vazio. Isso sem mencionar que, enfim, conseguiria tocar nela. Seduzir Claire seria a melhor parte do seu plano. Nada de dúvidas, nada de desculpas, nada de interrupções. Passaria as mãos por aquelas pernas compridas e massagearia os seios dela. O simples ato de pensar em Claire o deixava ansioso. E nervoso. Só tentara ter um relacionamento uma única vez antes, e não acabara bem. Mesmo que quisesse tentar novamente, não era como se tivesse tempo. Tirando Jessica, jamais saíra com uma mulher tempo o suficiente para considerá-la sua namorada, quanto mais pensar em torná-la sua esposa. Poderia fazer isto agora, pelo bem da filha? Relutantemente, Luca levantou-se da cadeira e começou a reunir as coisas em uma sacola. Enquanto fazia isso, pensou que a resposta àquela pergunta

certamente seria “sim”. Faria qualquer coisa pela menininha. Apesar do que Claire pudesse pensar, não a queria pulando de uma casa para a outra, amarrada a acordos de visitação e a feriados alternados. Isso significava arriscar-se a ter uma família com Claire. Mas será que Claire iria querer ter alguma coisa com ele? Ela saíra de um casamento infeliz, e, desta vez, não se contentaria com o mesmo. Queria amor, paixão e tudo mais que acompanhava isso. Luca teria prazer em lhe dar a atenção e a paixão de que ela precisava. Amor era uma outra história. Já cometera o erro de ser generoso demais no tocante a isso, e acabara explodindo na sua cara. Se não tivesse cuidado, isso também poderia acontecer com Claire. Girando a sacola por sobre o ombro, avançou pela trilha que cortava entre as dunas de areia. Sabia que Claire se sentiria traída caso descobrisse o que havia de errado com ele. Todas as emoções geradas pela infidelidade do primeiro marido viriam à tona. Para se proteger, Luca teria de deixar as emoções fora da equação. Isso significava que ela não poderia saber da verdade. Nem sobre o câncer nem sobre como ele realmente se sentia. Teria de certificar-se de fazer tudo certinho para que ela jamais viesse a questionar o seu amor por ela. Não seria difícil tratá-la melhor do que Jeff a tratara. Ela merecia coisa melhor. Mesmo não se permitindo amar Claire, Luca faria de tudo para que ela se sentisse amada. Quando chegou à casa, Luca já sabia exatamente como faria para começar a conquistar as afeições de Claire. Para conseguir isso, teria de correr o maior dos riscos… teria de ligar para a irmã em Newport. HAVIA ALGO diferente em Luca. Nos últimos dias, após o encontro inesperado dos dois, Claire tentara lhe dar espaço. Ele dera sinais confusos, de modo que ela chegou à conclusão de que o beijo fora resultado da exaustão e falta de bom senso. Se Luca ia reagir dessa maneira a algo como isso, provavelmente era melhor assim. Ele estava calado e distante, quase temperamental. Contudo, desde que haviam voltado da praia, o humor dele mudara por completo. E para melhor. Quando ela terminou de dar banho em Eva e a

colocou para dormir, saiu da suíte principal para encontrá-lo na cozinha cantarolando e preparando algo saboroso para comerem. – Tenho uma surpresa – anunciou ele. – O quê? – Minha irmã caçula, Mia, virá nos visitar hoje à noite. Claire não conseguiu evitar o franzir do seu cenho. Por essa, não estava esperando. Luca deixara bem claro que escondera da família toda a situação envolvendo Eva; no entanto, ele parecia muito contente para um homem que vira suas intenções frustradas. – Por quê? Ela descobriu sobre Eva? – Descobriu – admitiu ele–, mas só porque eu contei para ela. Na verdade, eu a convidei para passar alguns dias aqui conosco. Mia mora aqui perto, em Newport. Claire não fazia ideia do que estava acontecendo. Eva era um grande segredo, e, então, de uma hora para a outra, ele estendia o tapete vermelho para a família? – Estou confusa – admitiu. – Por que contou para ela? A sua família toda está sabendo da verdade, agora? – Se toda a minha família estiver sabendo da verdade, vou esfolar Mia. Sendo assim, não, todo mundo não está sabendo. Contei apenas para ela e exigi sigilo. – Mais uma vez – insistiu Claire. – Por quê? – Para que pudéssemos ter uma babá – revelou Luca com um sorriso. – Quero levá-la para sair amanhã. Tenho o dia todo planejado. Mia ficará aqui com Eva, para que você possa relaxar e se divertir. Levá-la para sair? – Agradeço o gesto, Luca, mas eu não sei. Sequer conheço a sua irmã. Não sei se me sentirei à vontade deixando Eva com ela. – Prometo que Mia é ótima com crianças. Ela é professora primária, e cansa de cuidar dos meus sobrinhos e sobrinhas. Ficará bem com Eva. – Tudo bem, Luca, mas você nem me perguntou nada antes de tomar essa decisão. É justamente esse o tipo de coisa que me preocupa no nosso combinado. Não me importo de deixá-lo participar das decisões no tocante a Eva, mas não quero ser completamente excluída do processo decisório.

A irritação dela pareceu confundir Luca. Será que ele realmente não enxergava o que estava fazendo? – Muito justo – falou ele, após um instante de consideração. – A decisão final caberá a você. Quando conhecer Mia, poderá decidir se confia nela para cuidar de Eva. Se concordar, eu a levarei para sair. Caso contrário, minha irmã estará apenas nos visitando por alguns dias. Claire suspirou de alívio. Tudo que ela queria era uma voz no processo decisório, mesmo sabendo que, no final, deixaria Eva sob os cuidados da irmã dele para que pudessem sair. Ele queria levá-la para sair, e ela iria deixar. Talvez fosse bom. Já fazia tanto tempo desde a última vez em que tivera uma noite de folga, fazendo coisas de adultos... Costumava trabalhar tanto que se sentia culpada em deixar Eva com uma babá, após ela ter passado o dia todo com Daisy. – Quando ela chegará? – perguntou. Luca olhou para o relógio. – Em menos de uma hora. Ela ficou de chegar para o jantar, de modo que estou preparando o frango tetrazzini de que ela gosta. Está bom para você? Claire riu, adiantando-se até a geladeira para pegar algo para beber. – Qualquer refeição que eu não tenha de preparar está ótima para mim. E não faz mal, é claro, que você seja um ótimo cozinheiro. – Sou um cozinheiro razoável. Minha irmã é uma cozinheira fantástica. Você vai ver. – Sua irmã por acaso sabe que a convidou para vir aqui apenas para bancar a babá e cozinhar? Luca riu. – Quando a família se reúne, é o que fazemos. Muita comida, risadas, discussões amigáveis e crianças. Ela não vai se incomodar, mas, sim, eu avisei por que queria que ela viesse. Está louca para conhecê-la, e a Eva. Quem dera Claire estivesse igualmente empolgada para conhecer a irmã dele. Subitamente, a coisa toda a estava deixando ansiosa por um outro motivo. O que a família de Luca acharia dela? Será que a odiariam por lutar com Luca pela guarda? Achariam estranho os dois estarem juntos ali, a sós? Por ser uma mulher razoavelmente calada e discreta, desconhecidos costumavam vê-la como esnobe e indiferente. E se não gostassem dela?

– Você está bem? – Luca perguntou. – Não parece muito empolgada com a vinda de Mia. – Só estou um pouco nervosa por conhecer alguém da sua família. Não causo boas primeiras impressões. Luca virou-se para Claire e lhe tomou as mãos, puxando-as para si. Claire se viu sem fôlego. – Você vai ficar bem – insistiu ele. – Mia vai adorá-la, assim como o resto da família, quando conhecê-la. – Não está preocupado com o resto da sua família descobrindo o que está acontecendo? Claire não ligava que o resto da família de Luca descobrisse a verdade, mas sabia que isso o preocupava. Por que então mudara de ideia? Era uma grande mudança apenas pela oportunidade de sair para jantar. Ou será que havia mais por trás disso? – Sempre há o risco – respondeu Luca. – Mas ficará tudo bem. Eu não teria chamado Mia se não achasse que pudesse confiar nela. Carla, por outro lado, teria logo dado com a língua nos dentes. E, mesmo que descubram a verdade, não tem problema. Acho que nós dois estamos nos dando muito bem, e, provavelmente, conseguiremos esboçar um acordo de guarda que agrade a ambos. Eva parece gostar de mim. E, além do mais, não é como se estivéssemos noivos nem nada do gênero. Claire estava com ele até Luca mencionar a última parte. Era verdade, mas, por algum motivo, incomodava escutá-lo falar com tão pouco-caso. Dava a impressão de ser mais do que realmente era por causa da filha que tinham e das estranhas circunstâncias. Na verdade, tudo que compartilharam foi um beijo. Recuando para que ele não notasse a decepção no olhar dela, Claire deixou a cozinha. – Vou me arrumar para a visita. – Tudo bem – escutou Luca dizer, mas não se virou. Em sua suíte, trocou a calça de ioga por um vestido de verão; depois, sentou-se diante da penteadeira para ajeitar o cabelo, prendendo-o em um coque, e aplicou um pouco de maquiagem. Se Mia fizesse o relatório para o

resto da família, Claire não queria que dissesse que ela era descuidada com a aparência. Quando estava terminando, escutou vozes vindo da sala, e soube que Mia devia ter chegado. O barulho acordou Eva de seu cochilo, de modo que Claire a trocou e vestiu nela um lindo vestidinho cor-de-rosa e amarelo para conhecer a tia. Quando chegaram à sala de estar, Luca e uma jovem bonita estavam sentados no sofá, bebendo vinho. Luca na mesma hora ficou de pé e gesticulou na direção da irmã. – Claire, esta é minha irmã, Mia. Mia, estas são Claire e minha filha, Eva. Mia parecia uma versão menor e mais delicada de Luca, com compridos cabelos castanhos, pele azeitonada e grandes olhos escuros. Claire não pôde deixar de imaginar qual seria a aparência de Eva quando crescesse. Contudo, não teve muito tempo para ponderar, pois Mia saltou do sofá e abraçou Claire antes que ela tivesse tempo para se preparar. – Ah, minha nossa – declarou Mia, ao recuar e examinar Claire. – Ela é linda, Luca! Por que não me contou como ela era linda? – Porque eu não queria você pensando besteira – retrucou Luca com um sorriso. – Eu nunca faria isso – retrucou Mia com um sorriso igualmente maroto. Ela piscou para Claire e voltou a atenção para o bebê. – E você não é a menininha mais linda que eu já vi? Quando Claire se deu conta, Eva já estava quicando alegremente nos braços de Mia. – Você é a cara da sua prima Valentina, é sim – sussurrou ela, afastando-se. Claire se sentiu um pouco inútil, mas tentou não demonstrar. Afinal de contas, Mia era família para Eva, e a filha parecia feliz com as atenções. Era Claire quem precisava se ajustar à nova realidade. Pela primeira vez, se deu conta de que não estava trazendo apenas um pai para a vida de Eva, mas toda uma família. Eva teria uma identidade, um lugar que nada tinha a ver com Claire. Isso, ao mesmo tempo, a deixava feliz pela filha e ansiosa por si mesma. Como sempre, era a estranha no ninho. – Quer um pouco de vinho, Claire? – Luca perguntou. – Quero.

Sem dúvida, ela queria. Ele lhe serviu uma taça e todos se reuniram no sofá. Conversaram por algum tempo, antes de Luca seguir para a cozinha para terminar o jantar, deixando as mulheres a sós por alguns minutos. – Luca não me contou muito a seu respeito, apenas o básico no tocante a como acabaram tendo um filho juntos. É uma história e tanto. – Sem dúvida. – Se não se importa que eu pergunte, o que a levou a procurar uma clínica de fertilidade? Minha irmã, Carla, também estava tendo problemas, mas foram resolvidos com alguns remédios. Ela tem três pimentinhas agora. Parecia uma pergunta tão pessoal; contudo, sabendo a história de Eva, Claire supunha que a curiosidade fosse natural. – Meu marido e eu estávamos tendo problemas, e nada parecia resolver, de modo que tivemos de dar o passo seguinte. Os olhos de Mia se arregalaram. – É casada? – Viúva. Ela levou a mão à boca. – Eu sinto muito. – Ela virou-se na direção da cozinha. – Luca! Por que não me contou que Claire era viúva, me poupando de fazer uma pergunta rude? – Se não fosse tão xereta, eu não teria de ter feito nada. Mia murmurou algo em italiano. – Sinto muito. Eu só estava curiosa sobre como tudo isso aconteceu. Eu sei por que Luca optou por procurar uma clínica, mas, graças a Deus, nem todo mundo compartilha as circunstâncias dele. Claire empertigou-se no assento. Ela nunca perguntara diretamente para Luca sobre o seu envolvimento com a clínica. Sempre que tocavam no assunto, ele dava um jeito de desconversar. Ela não fazia ideia por que um homem jovem e tão cheio de vida teria armazenado sua futura chance de ter filhos em uma clínica. Talvez a irmã dele pudesse esclarecer isso para ela. – Eu era nova demais na época, mas Mama me contou tudo pelo que ele passou. Ela simplesmente não suportava a ideia de ele também perder a sua chance de ter uma família. – Jantar! – gritou Luca, aparecendo com uma grande travessa de massa nas mãos.

Tinha de ser. Com a chegada de Luca, foi-se a sua chance de descobrir toda a história. Contudo, sabia mais agora do que antes. Ele aparentemente passara por uma provação que podia ter lhe custado o futuro com uma família. Teria sido doença? Não havia nada faltando no espécime masculino que ela tocara na cozinha alguns dias atrás. Se ele ficara doente, já estava bom há muito tempo. Sentaram-se ao redor da mesa de jantar, com Eva sendo acomodada na cadeirinha alta para comer a sua papinha, enquanto eles devoravam o delicioso frango tetrazzini. Uma hora se passou como se fosse alguns minutos. Claire não saberia dizer se foi o vinho ou a natureza extrovertida de Mia, mas logo estavam conversando e rindo como se fossem velhas amigas. Foi um alívio para ela, pois não tinha muitas amigas. Mia era encantadora. Não voltaram a tocar no assunto de Luca; contudo, como Mia estudara artes na faculdade, ela e Claire encontraram muitas outras coisas sobre as quais conversar. – Ele parece amuado – falou Mia, quando enfim olhou para o irmão. – Talvez devamos falar sobre algo de que ele goste. Claire voltou-se para Luca, que estava silenciosa e polidamente bebericando o seu vinho, enquanto as escutava falar. Ele sacudiu a cabeça em protesto. – Ah, não, por favor, continuem. O ritual feminino de formação de vínculos é fascinante. Enquanto se abstiverem de assuntos que digam respeito a funções biológicas femininas e salões de beleza, eu estou bem. – Agora que você mencionou, eu estou com uma cólica terrível hoje – disse Mia. Luca, na mesma hora, ficou de pé e começou a tirar a mesa. – E essa é a minha deixa. Mia riu e pegou o seu prato. – Só estou brincando com você, fratello. Carla e eu sempre usávamos essa tática quando os meninos estavam nos perturbando – explicou ela para Claire. – Teve uma vez que corri pela casa atrás de Marcello e Giovanni com uma caixa de absorventes íntimos. Quem via, imaginaria ser uma cobra. – Eles teriam preferido uma cobra. Está vendo do que escapou sendo filha única, Claire? Torturávamos uns aos outros até sairmos de casa. – Na verdade, nem isso nos deteve. Ainda outro dia, Angelo me mandou a

– Na verdade, nem isso nos deteve. Ainda outro dia, Angelo me mandou a foto de uma aranha gigante. Juro que era maior do que a minha mão. Fiquei toda arrepiada. Sem conseguir reprimir o sorriso, Claire os acompanhou até a cozinha. Não fazia ideia do que Luca estava falando. Ela não evitara isso sendo filha única, apenas deixara de tê-lo. Era diferente. Gostava da camaradagem de que Luca e Mia compartilhavam. Jamais tivera isso com alguém. Ao passar o prato e a travessa de salada para Luca, se deu conta de que, infelizmente, Eva provavelmente compartilharia do seu destino. Teria o benefício de todos os primos pelo lado de Luca, mas não haveria irmãos com quem brincar ou conversar ao redor da mesa de jantar. Eva fora um milagre; todavia, naquele instante, Claire se sentiu gananciosa a ponto de torcer para que recebesse mais um.

CAP ÍTULO 7

– Q UANDO MENCIONOU arrumar uma babá e me levar para sair hoje, eu meio que imaginei algo diferente. Luca riu e entrou com o Land Rover no estacionamento mal iluminado da marina. O sol ainda não nascera, e o céu estava acinzentado com o horizonte ligeiramente rosado. – E no que estava esperando? – Não sei. Um dia no spa? Talvez um jantar agradável, ou um passeio pelo shopping da cidade. No mínimo, sair de casa após o sol haver nascido. – Talvez ainda façamos tudo isso. Temos o dia todo. Claire olhou para o relógio e assentiu. – Temos mesmo. – Ela olhou para os barcos na marina com uma expressão curiosa. – Vamos pegar um barco? – Talvez. – Luca estacionou o carro e desceu. Quando deu a volta e abriu a porta de Claire, ela estava com a cara amarrada. – Tudo bem... sim. Vamos pegar um barco. Você realmente não gosta de surpresas, não é? – Não é que não goste delas, apenas não estou acostumada a ter boas surpresas. – Pretendo mudar isso. Tomando a sua mão, Luca a conduziu até o atracadouro. Ali, aguardandoos, estava uma pequena tripulação em um catamarã. – Bom dia, sr. Moretti. Pronto para ver baleias, hoje? Os olhos de Claire se arregalaram quando o marinheiro a ajudou a subir no convés do barco.

– Vamos ver baleias? – É para onde eu vou – disse o comandante. – Como estão no meu barco, significa que também vão. Estamos zarpando na direção de águas com uma vida marinha muito diversa. Se tudo correr bem, devemos ver algumas baleiascorcundas e baleias-de-barbatana, e algumas espécies de golfinho. Luca observou quando o comandante se juntou à tripulação nos preparativos para zarparem. – Já fez algo parecido alguma vez? – perguntou para Claire. – Não. Mas estou muito empolgada. Estamos aguardando outros passageiros? Luca sacudiu a cabeça. – Não, reservei o barco apenas para nós. Os olhos dela se arregalaram de surpresa. – Apenas para nós? – Ela olhou ao redor da embarcação. – Isso é loucura. – Eu disse que queria que relaxasse e se divertisse hoje. Sim. Poderia tê-la levado para jantar, ou para um dia no spa, mas quis fazer algo diferente. Quando o barco começou a se afastar da marina, um dos membros da tripulação trouxe uma manta de flanela para eles. – Sentem-se no banco da proa para as melhores vistas. Enrolem-se na manta que vou lhes trazer um pouco de café e alguns enroladinhos de canela fresquinhos. Eles acomodaram-se na proa, e Luca os envolveu com a manta. Ele passou o braço ao redor de Claire e a puxou para si. Ela se aconchegou a ele de bom grado, descansando a cabeça em seu ombro. Era tão fácil estar ali com ela, daquele jeito, como se ali fosse o seu lugar. Inspirando fundo, ele encheu os pulmões com o ar salgado misturado com a fragrância de Claire. Luca inclinou-se mais para perto, pressionando os lábios de encontro ao topo de sua cabeça com um suspiro. Combinado com o suave balançar do barco, aquilo era incrivelmente relaxante. Estavam acabando de terminar o café com os enroladinhos de canela, quando um dos tripulantes gritou: – Olhem à direita! Luca e Claire ficaram de pé e se voltaram na direção apontada. Ao longe, com o dia mais claro, puderam avistar o esguichar de uma baleia vindo à superfície. Alguns minutos mais tarde, foram presenteados com a visão

estonteante da baleia-corcunda saltando no ar e espetacularmente voltando a cair na água. Luca tentou se concentrar na visão fantástica; contudo, seu olhar insistia em retornar para Claire. Ela estava completamente imersa no momento, os lábios suavemente entreabertos em admiração não expressada. Era um momento memorável, tornado ainda mais inesquecível pela presença dela ali com ele. Enrolados na manta, ficaram postados ali por quase uma hora, observando um grupo de golfinhos passar, e uma baleia após a outra vir à superfície. Quando o barco retornou para a marina, Claire girou nos braços dele, de modo a fitá-lo. – Isso foi incrível – disse ela. – A coisa mais linda que já vi. – Foi mesmo fantástico. Mas não foi a coisa mais linda que já vi. Claire fungou. – Estou certa de que ser um bilionário abriu as portas para muitas coisas mais bonitas do que isto, mas, para mim, provavelmente nada superará isso. A não ser, é claro, ver Eva pela primeira vez. – Meu dinheiro nada tem a ver com isso. Na verdade, a maior parte das coisas que vejo no meu dia a dia é bem entediante. Pelo menos, até tê-la conhecido. Você é, de longe, a coisa mais linda que já vi. Claire contorceu-se, pouco à vontade. – Luca… Mas ele não a deixou prosseguir. Levou o dedo aos lábios dela e sacudiu a cabeça. – Não. Nada de discutir comigo. Acho que sei melhor do que você o que eu penso, muito obrigado. As faces de Claire foram tomadas de um rubor rosado, e os olhos dela se fixaram no peito dele. – Eu sinto muito – disse. – É só que não estou acostumada a escutar coisas como essas. Nunca me parecem sinceras. – Eu sei. Já me disse isso. Mas precisa se acostumar, pois não pretendo parar. Eu nunca digo algo sem ser sincero, tesorina, de modo que pode aceitar o elogio pelo que ele é. Se digo que é linda e que a desejo acima de tudo, estou sendo sincero.

Ela voltou a ficar boquiaberta. Os olhos acinzentados lembrando as águas rodeando-os fitaram os dele. – Você me deseja? – Foi o que eu disse, não foi? – Eu sei. – Ela mordeu o lábio inferior. – Só não acho que uma relação física entre nós seja uma boa ideia. – Provavelmente, não é. – Luca riu. – Eu disse que era sincero, Claire, não esperto. – NÃO FAÇO ideia de como é que vou fazer para me acostumar novamente com a vida real. Luca riu para Claire ao destrancar a porta da casa. – Por que diz isso? Como se ele não soubesse o que fizera! – Você me arruinou para a realidade. Você me traz para esta linda ilha e me deixa passar os dias escutando as ondas, e cozinhando comidas deliciosas para mim. Não há alarmes, nem contas para pagar, nem telefonemas para atender. Entraram na casa, fecharam a porta e tiraram os casacos. O chalé estava às escuras e silencioso. Mia e Eva já deviam estar dormindo. Luca lhe envolveu a cintura com o braço e a puxou para si, sussurrando em seu ouvido: – E que mal há nisso? Você merece ser paparicada. Sentindo o calor do corpo dele queimar sob o vestido, Claire hesitou em responder. Seu corpo estava provocativamente colado ao dele. Não soube dizer ao certo se fora o contato físico ou as palavras sedutoras dele, mas, subitamente, o frio da noite se fora. Ardor se acumulava dentro dela, se espalhando por suas veias. – E então, hoje… – prosseguiu ela, afastando-se e seguindo para as escadas. – Pensei que houvesse se divertido hoje – falou ele, seguindo-a até o andar de cima. – Eu me diverti muito hoje. O cruzeiro e as baleias foram maravilhosos. O passeio pela cidade foi relaxante. E a refeição no Red Cat foi uma das melhores que já comi. – Melhor do que a minha comida? Claire não ia cair nessa armadilha. Não havia resposta certa.

– Estilos culinários totalmente diferentes. Nem vou tentar comparar. Luca voltou a se aproximar dela. Desta vez, quando lhe envolveu a cintura com os braços, não a deixou escapar com tanta facilidade. Em vez de tentar, Claire se permitiu derreter de encontro ao corpo dele. Não ia mentir, era bom sentir-se abraçada. Estava começando a ter dúvidas se Jeff algum dia a abraçara daquele jeito. O simples deslizar das mãos de Luca sobre as suas costas possuía mais ternura, mais intensidade, do que o toque de qualquer outro homem que já conhecera. Com ele, sentia-se viva e sexy, valorizada, e há muito não se sentia assim. Os olhos escuros dele se concentraram nela, fazendo-a se perguntar se ele saberia o que ela estava pensando. Os dedos se fincaram na carne dos quadris dela, não deixando dúvida de que ele a desejava. Desde que chegaram à ilha, vinham dançando ao redor daquele momento. Luca fizera de tudo para seduzi-la, para afastar o stress da vida dela e permitir que Claire se divertisse. Claire resistira a viagem toda; contudo, estava cansada de resistir ao que realmente queria. Agora, era o momento de se deliciar com isso. – Diga-me, o que há de errado com tudo que fiz por você hoje? Não posso lhe oferecer um pouco de diversão? – Pode me oferecer o que bem quiser. É só duro ter um dia como o de hoje, sabendo que a vida real não é assim. Logo, voltarei para o Brooklyn e prepararei novamente o meu próprio jantar. Não haverá uma praia linda do lado de fora da minha janela, e não acordarei ao som das ondas quebrando nas rochas. – Poderá ter o que bem quiser, tesorina. Precisa apenas pedir. Ela se perguntou o que ele queria dizer com aquilo. Antes que a imaginação levasse a melhor sobre ela, Claire decidiu focar em outra coisa. – Luca, o que significa tesorina? Ele sorriu para ela. – Literalmente significa tesouro em italiano, mas é uma forma de tratamento carinhosa, tipo “querida”, ou “meu bem”. – Por que me chama assim? – perguntou ela, lembrando-se de que era um termo que ele usara para se referir a ela desde o primeiro dia. Luca franziu a testa.

– Porque é o que você é, Claire, um tesouro e a criatura mais passional e desejável que já conheci. Ela não conseguiu mais se conter. As palavras eram um afrodisíaco mais potente do que qualquer comida que ela pudesse imaginar. Adiantando-se, colou os lábios nos dele, envolvendo o seu pescoço com os braços para puxálo mais para perto de si. Claire sentiu as mãos de Luca deslizarem ao redor da cintura dela. Queria mais. Queria que ele a tocasse pelo corpo todo. Ela colou o corpo ao dele. Podia sentir o volume firme do seu desejo cutucando-a na barriga. Esfregando-se nele, arrancou um gemido dos lábios de Luca. Sentindo-se ousada, permitiu que a palma deslizasse sobre o peito dele, descendo até acariciá-lo dentro da calça. Luca arrancou a boca de sobre a dela, segurando-lhe o pulso de modo a afastá-la. – Claire... – Ele quase gemeu, o corpo tenso, enquanto tentava não perder o controle. – Não. Eu não aguento. Eu a quero demais. – Nesse caso, me possua, Luca. Quero fazer amor com você. Quero que me mostre como é estar com um homem que realmente me deseja. Ela o viu fechar os olhos por um instante e inspirar pelo nariz. Quando as pálpebras voltaram a se erguer, havia ardor no seu olhar. Sua mão estava tremendo quando a estendeu na direção da dele. Antes que perdesse a coragem, virou-se e caminhou na direção da sua suíte. Mia transferira o cercadinho de Eva para o quarto dela por essa noite, de modo que tinham o quarto todo para eles. Sem virar-se para ele, levou as mãos aos botões na frente do vestido. Claire podia sentir o calor do corpo de Luca às suas costas, mas ele não a tocou. Pelo menos, ainda não. Deixou a parte de cima do vestido deslizar pelos braços, pendurando-se ao redor da cintura. A respiração de Luca foi quente quando ele se aproximou e plantou um beijo ardente nos ombros nus dela. O contraste fez com que um arrepio lhe percorresse a espinha. Tomando o tecido do vestido nas mãos, Luca o puxou pelos quadris de Claire. O vestido caiu ao redor dos pés dela, deixando-a apenas de roupa de baixo. Claire prendeu a respiração quando Luca abriu o fecho do seu sutiã e deslizou

as alças por sobre os seus ombros. Assim que o largou no chão, ele cobriu ambos os seios dela com as mãos. Arquejando, Claire arqueou as costas de modo a entregar-se mais plenamente ao toque dele. Podia sentir os mamilos se enrijecendo sob o toque dele. Luca continuou a salpicar beijos sobre os ombros expostos e o pescoço, a combinação de toques incendiando-a por dentro. – Luca – sussurrou, quando ele massageou os picos entre os dedos. Não sabia ao certo pelo que estava implorando, mas sabia que ele seria capaz de lhe satisfazer a vontade. A resposta de Luca foi deslizar a palma da mão sobre a barriga nua, até a borda da calcinha. Claire retesou-se quando ele chegou à pele que ainda não retornara ao devido lugar após o nascimento de Eva, mas Luca não pareceu notar. Estava focado no seu destino. Sem hesitação, a mão mergulhou por baixo do cetim, acariciando o seu âmago sensível. Claire suspirou, mas ele não permitiu que ela se contorcesse para longe da intensidade do seu toque. – Sì, bella – sussurrou ele no ouvido dela, por trás, ao mover-se implacavelmente sobre a carne lubrificada. Claire sentiu as pernas bambearem. Não sabia dizer quanto mais aguentaria. Poderia desabar ali mesmo, aos pés dele. – Ainda não – sussurrou ela, entre um grito urgente e outro. Para o seu alívio, e a sua decepção, ele retirou a mão, antes que ela fosse longe demais. Em vez disso, engatou os polegares na calcinha e a puxou para baixo. Ela agora estava completamente nua. Por sorte, não era a única. Escutou o ruído de tecido roçando em tecido e virou-se a tempo de ver Luca despir a camisa. Ela desafivelou o cinto e lhe desabotoou a calça. Luca deu um passo para fora do que restava de suas roupas e adiantou-se na direção de Claire, até seus corpos estarem quase roçando um no outro. Ele ladeou-lhe o rosto com as mãos e inclinou-lhe a cabeça de modo a poder beijá-la. O desejo que sentia mal foi contido, quando sua boca encontrou a dela. Era um beijo que vinha acumulando intensidade durante toda a estada deles ali. Sua língua buscou a dela, provando e provocando. Claire respondeu à sua intensidade mordicando-lhe o lábio inferior. A mordida arrancou um rosnado

do fundo da garganta dele. Luca desceu as mãos até os quadris dela, lentamente guiando-a para trás, até ela cair sobre a cama. Claire recuou para o meio da cama, até estar confortavelmente deitada, e Luca a acompanhou, beijando e tocando cada centímetro dela, até lhe cobrir o corpo com o seu. Deteve-se acima dela, a ereção insistentemente cutucando-a na parte interna das coxas. Ele abaixou a cabeça para voltar a beijá-la, e, depois, parou. Olhando para Claire, viu um brilho de pânico em seus olhos. – Por favor, diga que tem um preservativo com você. Um preservativo? Claire ficou paralisada. Ela não os usava desde a antes de se casar. – Eu não. Você não tem? – Não. Isto não foi exatamente planejado – falou ele, descendo da cama e correndo para o banheiro. – Deus o abençoe, Gavin – gritou Luca, antes de retornar para a cama com uma embalagem plástica na mão. Claire deixou escapar o ar que vinha prendendo nos pulmões. Graças a Deus. Ela não queria parar agora. Mesmo a menor das hesitações poderia permitir que a realidade se manifestasse e arruinasse o momento. As chances de eles conceberem eram praticamente nulas, considerando que haviam se conhecido por meio de uma clínica de fertilidade, mas essa não era a sua única preocupação. Já fazia um bocado de tempo desde a última vez que namorara, mas poderia ter pegado alguma coisa naquela época. Ela tombou a cabeça sobre o travesseiro, e Luca embainhou-se, retornando ao seu lugar, entre as coxas dela. – E agora, onde estávamos? – perguntou, com um sorriso. Claire estendeu a mão entre eles e envolveu a ereção com os dedos. Ela o puxou para o ponto exato da penetração e parou. – Bem aqui, eu acho. Luca assentiu e, lentamente, adiantou-se. Claire fechou os olhos, processando a sensação de ter um homem dentro de si após tanto tempo. Seus músculos se retesaram ao redor da invasão, fazendo com que Luca sibilasse e cerrasse os dentes, ao enterrar-se por completo dentro dela. Continuou se movendo em ritmo lento e deliberado, prolongando o prazer. Claire estivera nervosa no tocante a fazer isto após tanto tempo, mas o

nervosismo desapareceu no instante em que ele a tocou. Ela recolheu as pernas, de modo a aninhar os quadris dele entre as coxas, e permitiu que o corpo fosse embalado para a frente e para trás com os movimentos dele. As sensações geradas por Luca irradiavam dentro dela como ondas de choque de prazer. Foi só quando abriu os olhos novamente que se deu conta de que Luca a estava observando. Não apenas olhando para ela, mas prestando atenção em cada detalhe. Ver o prazer dançar pelo rosto dela parecia excitá-lo, deixando-o mais ousado. Ele enfiou a mão entre os corpos deles e começou a acariciá-la entre as coxas. Claire arquejou, contorcendo-se enquanto os dedos de Luca a levavam cada vez mais perto do apogeu. Quanto mais próxima do clímax ela chegava, mais forçosamente Luca arremetia para dentro dela, intensificando as sensações. Luca tinha uma espécie de poder sobre ela. Parecia saber exatamente como tocá-la, exatamente como estimular cada sensação do seu corpo, de um modo tal que um homem precisaria de tempo para dominar. Claire pôde apenas morder o lábio inferior e se preparar para o que estava por vir. E então a represa contendo a onda de prazer dentro dela se rompeu, e ela se deixou ser levada pela enxurrada de sensações. – Luca! – gritou, agarrando os lençóis, enquanto praticamente se erguia da cama. Luca desacelerou quando Claire desabou sobre os travesseiros. Sentia como se toda a energia houvesse sido sugada do seu corpo, mas não estava nem aí. Ele apoiou-se sobre os cotovelos, enterrando o rosto no pescoço dela. A barba por fazer arranhava a pele de Claire, enquanto, sem deixar de se mexer, ele sussurrava no ouvido dela: – Vê-la atingir o orgasmo desta maneira… Sei così bella, Claire – disse. – Ti voglio così male. Ela não fazia ideia do que ele acabara de dizer, mas as palavras sedutoras pareciam maravilhosas. – Sim – respondeu. – É a sua vez, agora. Luca gentilmente mordiscou o ombro dela, antes de arrastar os lábios pelo pescoço de Claire, até voltar a beijá-la nos lábios. Voltou a fitá-la com os olhos estreitados, uma das mãos firmemente plantadas na curva do quadril. As pontas dos dedos se fincaram na carne quando ele começou a se movimentar

com ainda mais força e velocidade do que antes. Claire sentiu cada músculo no seu corpo se retesar quando, no último instante, os olhos dele enfim se cerraram. Rugiu ao explodir dentro dela com uma última e poderosa estocada. E então ele ficou estranhamente imóvel, mergulhado na intensidade do momento. Ela esperava que ele fosse desabar sobre si, ou rolar para o lado, mas ele pareceu ficar paralisado. – O que foi? Ele engoliu em seco. – Acho que o preservativo se rompeu. – Luca estendeu a mão para a mesinha de cabeceira e pegou a embalagem. – Não acredito – esbravejou ele, atirando a embalagem no chão em um acesso de fúria. – Venceu há um ano. Antes que ela pudesse impedi-lo, Luca recuou para longe dela, desaparecendo no interior do banheiro, onde fechou a porta. Hesitantemente, sem saber o que fazer, Claire sentou-se na cama. Sua primeira tentativa de reacender uma vida sexual não acabara muito bem. Luca deixou o banheiro alguns minutos mais tarde com uma expressão torturada lhe distorcendo o rosto. – Rompeu mesmo. Eu sinto muito, Claire. Eu deveria ter verificado a data de validade. Estava tão desesperado para tê-la que nem pensei em olhar. Claire tinha certeza de que jamais alguém estivera tão desesperado por ela a ponto de esquecer uma coisa dessas. Com certeza não iria censurá-lo por isso. Além do mais, não havia mesmo muito que pudessem fazer agora. – Não se preocupe. Quero dizer, duvido que eu vá engravidar, se é com isso que está preocupado. Da última vez, foram necessários anos e uma intervenção médica. E estou limpa. Fizeram todo tipo de teste na clínica, e, desde então, não estive com ninguém. – Não estava insinuando que não estivesse limpa, e nem preocupado que tivesse engravidado. Seria necessário um milagre. – Luca subiu na cama e a puxou para si. – É só que nenhum jamais rompeu comigo, de modo que fiquei abalado. É uma regra minha sempre usar um preservativo quando estou com uma mulher. Eu sinto muito. Claire acomodou-se de encontro ao peito dele, sentindo-se um pouco melhor, agora que ele não fugira do quarto como se o lugar fosse a cena de um crime.

– Você não sabia que ia romper. Estou certa de que tudo ficará bem. – Provavelmente tem razão. Vamos esquecer isso e descansar um pouco. Amanhã, darei um pulo na farmácia. – Na farmácia? – Para comprar uma caixa de novos preservativos. Apenas comecei a adorar o seu corpo, tesorina.

CAP ÍTULO 8

AQUILO ERA bom. Com o nariz enterrado no pescoço de Claire, o perfume de canela e baunilha preencheu os pulmões de Luca. Seu braço a envolvia, puxando o corpo quente e macio de encontro a si. Ele não queria se mexer. Poderia ficar ali deitado por horas a fio. Já fazia muito tempo desde a última vez em que Luca acordara com uma linda mulher nos braços. Seu plano para conquistar Claire estava indo melhor do que esperava. Se todas as vezes fossem tão boas quanto a noite passada, ele de bom grado a pediria em casamento imediatamente. Nem mesmo o problema do preservativo foi capaz de lhe arruinar o bom humor. E então um som lhe chamou a atenção. A princípio, achou que estivesse imaginando coisas. O eco da voz da mãe estava tão completamente fora de contexto que não era possível que tivesse escutado o que pensara ter escutado. Justamente quando se convencera de que era apenas a sua imaginação, Luca escutou o inconfundível som da risada da mãe. Não, não podia ser. Luca escutou o gritinho divertido de Eva, e o coro de vozes admiradas que só podiam pertencer aos membros da sua família. Com um gemido, afastou-se de Claire e sentou-se na cama. Despertando, ela olhou para ele por sobre o ombro. – O que foi? – perguntou, ainda sonolenta. – Acho que… acho que minha família está aqui. Claire também se sentou na cama, cobrindo o corpo nu com os lençóis.

– Quer dizer, a sua irmã? Luca engoliu em seco e sacudiu a cabeça. – Não. Mais do que apenas ela. O som da risada da mãe voltou a chegar aos seus ouvidos. Quando se voltou para Claire, ele notou que a expressão sonolenta fora substituída por uma de puro pânico. – Está de brincadeira? – Quem dera eu estivesse. Acho que nosso segredo foi revelado. E isso significa que Mia está em sérios apuros. Jogando longe as cobertas, Luca pegou a calça e a vestiu. Precisava ir lá fora e descobrir exatamente o que diabos acontecera. Abriu a porta, completamente atônito com o que viu. No centro da sala de estar, a mãe estava segurando Eva, como se ela fosse o Santo Graal. Seu pai estava postado atrás dela, fazendo caretas para a menininha, que gritava de prazer. Como se já não fosse o suficiente, atrás deles, viu Mia conversando com a sua outra irmã, Carla. No mínimo cinco crianças estavam correndo pela sala de estar, em busca de diversão e destruição. Dava para ver que teria de passar um generoso cheque para Gavin para cobrir tudo que quebrassem. Luca virou-se bem a tempo de ver os irmãos caçulas, Giovanni e Angelo, subindo as escadas acompanhados das respectivas esposas. Estavam trazendo malas, o que não era um bom sinal. Aquilo não era apenas uma visita rápida. Pretendiam ficar. O que diabos estava acontecendo? – Luca! Você acordou! – exclamou a mãe. – Acha mesmo que dava para dormir em meio a tudo isso? – Sequer se deu ao trabalho de esconder a irritação. – O que estão fazendo aqui? E por que, em nome de Deus, trouxeram malas? – Tantas perguntas! – retrucou a mãe. Ela segurou Eva de encontro ao peito e estreitou o olhar ao fitá-lo. – Pois eu tenho uma pergunta para você, meu jovem! Quanto tempo ainda pretendia esconder de nós a minha nova neta? – Por um pouco mais de tempo do que isto – murmurou ele, lançando um olhar para Mia, que se escondeu atrás de Carla. – Como foi que descobriu? – A culpa foi minha – admitiu Mia, como se tivesse escolha. – Bem, na verdade, a culpa foi de Eva.

– Vai culpar o bebê? A incredulidade estava evidente na voz de Luca. – Sim e não. Carla me ligou ontem à noite, enquanto você e Claire estavam fora jantando. Eu não deveria ter atendido, mas atendi. Enquanto estávamos ao telefone, Eva começou a chorar. O que eu deveria ter dito? Não consegui pensar em uma boa mentira, de modo que contei a verdade, e pedi para que ela jurasse segredo. – Naturalmente, assim que desliguei, liguei para Mama – confirmou Carla, justificando o receio de Luca de não contar para ela de cara. – Sinto muito, mas não é o tipo de segredo que se guarda. – Ela tem razão – interrompeu Antonia, a sua mãe. – Como pôde esconder esta garotinha linda de nós? Ainda mais depois de tudo que passou com Jessica. – Porque acabo de descobrir a respeito dela – falou Luca, tomando Eva das mãos da mãe e a abraçando de modo protetor. – Depois do que, de fato, aconteceu com Jessica, eu quis ter certeza antes de contar para qualquer um. Assim que saíram os resultados, eu egoistamente optei por conhecer Eva e a mãe dela antes que isto acontecesse. A mãe levou a mãe à boca. – Sequer conhece a mãe dela? Pelo menos você e Jessica estavam juntos. Pensei que o houvesse criado melhor, Luca. Deveria ser um cavalheiro. Luca suspirou e revirou os olhos. – Não foi nada disso, Mama. Sabe que não posso… Ele nem conseguia dizer as palavras. Não precisou. A família toda conhecia a verdade. – Foi um acidente na clínica de fertilidade – disse uma voz feminina vinda de trás dele. Luca virou-se para ver Claire postada na porta da suíte. Em questão de minutos, ela se arrumara e voltara a ser a recatada e controlada Claire que ele conhecera. O cabelo louro escuro estava preso em um coque e a maquiagem era bem discreta. Estava usando um outro vestido de verão que lhe realçava o corpo fenomenal. – Mama, papai, todo mundo… Esta é Claire Douglas, a mãe de Eva. – Ah, Luca. – Antonia adiantou-se até Claire, abraçando-a. – Lei è bella.

Claire estremeceu ligeiramente ante o contato físico inesperado, mas Luca pôde ver que ela estava tentando disfarçar. Era melhor ir logo se acostumando. Sua família toda era muito afetuosa fisicamente. – Olá – conseguiu dizer com um sorriso, quando a mãe dele enfim recuou. – É tão bom conhecê-la, Claire. Tenho certeza de que teríamos nos conhecido mais cedo se eu tivesse sabido da sua existência e da de Eva. O sarcasmo das palavras foi inteiramente dirigido a Luca, mas ele não estava nem aí. – Claire, esta é minha família. Minha mãe, Antonia. Meu pai, Mario. Já conhece Mia. Minha outra irmã, Carla. Meu irmão, Giovanni, e a esposa, Nicole. Meu outro irmão, Angelo, e a sua esposa, Tonia. Meus sobrinhos, Tony, Giovanni Jr., Matteo, Paolo e minha sobrinha, Valentina. Luca viu os olhos de Claire se arregalarem com cada nome que ele listava. – É todo mundo? – perguntou ela. – Não. – Luca teve de admitir. – Aparentemente, meu irmão Marcello e a família não puderam vir. Estão com um bebê recém-nascido. E parece que o marido de Carla ficou em casa com as crianças. – Virando as costas para a família, Luca silenciosamente pronunciou para Claire as palavras: – Eu sinto muito. Ela apenas sacudiu a cabeça e sorriu. – Fico feliz que tenham podido vir. Por favor, sentem-se. Posso lhes oferecer algo para beber? Eu ia preparar o café da manhã. Já comeram? À menção de comida, metade da família ruidosamente seguiu para a cozinha. Ninguém se deu ao trabalho de dizer para Claire o que queria. Simplesmente seguiram para a cozinha como teriam feito em casa. Por um instante, ela os fitou com uma expressão confusa. Luca passou Eva para ela e sussurrou em seu ouvido: – Apenas aceite. Eles são assim mesmo. Ele tentou plantar um beijo abaixo da orelha dela, mas Claire afastou-se, seguindo para a cozinha para ajudar os outros. Luca procurou não levar a sério a rejeição. Voltou-se para Giovanni, sentado em uma das confortáveis poltronas. – É sério? O irmão deu de ombros.

– Sabe como são. Recebi um telefonema às dez da noite dizendo que era para estar de malas prontas no aeroporto às seis da manhã para pegar o jatinho da família e vir conhecer a sua filha. Achou mesmo que poderia manter isto em segredo? Luca acomodou-se na poltrona ao lado da dele. – Funcionou por alguns meses. – Meses? Giovanni pareceu surpreso. – É. Descobri sobre o erro cometido pela clínica, e quis esperar o resultado do exame de paternidade. Não se esqueça do que houve com Jessica. Quis manter tudo em segredo até ter certeza de que Eva era minha. Depois, houve algumas semanas batalhando com o advogado dela para poder ver Eva. Viemos até aqui para nos conhecer e para descobrir como faríamos para cooperar. Não parecia ser a hora certa de meter a família no meio disto tudo. – Acho compreensível; contudo, duvido que Mama vá aceitar as suas desculpas. Pode ficar esperando uma senhora bronca mais tarde. Luca riu. – Não foi o que acabou de acontecer? – Ah, não. Sua namoradinha bonita o salvou. Vai escutar poucas e boas depois que ela acabar de arrancar os detalhes de Claire. – Ela não é bem a minha namorada. Quero dizer, nós apenas… – Vocês saíram do mesmo quarto, Luca. E você está sem camisa. Luca olhou para baixo, dando-se conta de que precisava pegar a camisa que estava no chão da suíte. – É, mas foi a primeira vez. Não tenho certeza de que vá se repetir, ainda mais com vocês todos dando as caras por aqui e rompendo o feitiço romântico que tive tanto trabalho para criar. – Está tentando conquistá-la? – A princípio, não estava, mas, depois, me dei conta de que talvez seja a minha única chance de ter uma família de verdade. Seria estupidez minha deixar isso escapar por entre os meus dedos. – Você não sabe ao certo, Luca. Por acaso os médicos… – Não – Luca interrompeu. – Mas eu sei. Esta é a minha chance. Poderia ser pior. Claire é… – Era difícil encontrar as palavras certas. – Uma mulher muito

especial. E uma grande mãe. Os dois irmãos olharam na direção da cozinha, onde os pais, Mia, Carla, Nicole e Angelo estavam andando de um lado para o outro, preparando o café da manhã dos campeões. Com Eva nos braços, Claire estava sem coragem para se juntar à confusão. De vez em quando, a mãe deles interrompia o que estava fazendo para acariciar o braço de Claire e beliscar de leve a bochecha de Eva. – Bem, namorando ou não, mamãe parece gostar de Claire – notou Giovanni. – É um grande obstáculo superado. A mãe era notoriamente exigente no tocante às mulheres que os filhos namoravam. Conseguir o selo de aprovação de Antonia era uma grande vitória. – Ela sabe sobre a sua doença? – Giovanni perguntou. Luca estremeceu e sacudiu a cabeça. – Não. E não quero que ninguém conte para ela. – Não é nada de mais, Luca. Você teve câncer. Não há do que se envergonhar. Você sobreviveu. Deveria estar gritando isso do topo dos prédios. Luca sabia que o irmão tinha razão, mas jamais sentira vontade de gritar. Sempre sentira apenas como se tivesse perdido algo. Uma mulher como Claire merecia um homem completo, capaz de lhe dar tudo que queria. Talvez, apenas talvez, pudesse fingir, e fosse o suficiente para ela. ATORDOADOS NÃO era bem a palavra que Claire usaria para descrever os últimos três dias, mas chegava perto. Agora, sabia sobre o que Luca estava falando quando dissera que a família era barulhenta, tempestuosa e divertida. Eram tudo isso e muito mais. As irmãs e as cunhadas haviam inserido Claire no grupo. Após levarem as crianças para a praia e para tomar sorvete, sentaram-se no deque para tomar vinho e conversar sobre crianças e homens. Claire ficou surpresa com o senso de camaradagem que se instaurara entre elas. Claire mal vira Eva desde a chegada da família de Luca. Alguém sempre estava com ela nos braços. O único tempo que tinham juntas era quando insistia em dar banho em Eva e colocá-la para dormir. Sua suíte tornou-se o seu único santuário. Havia Morettis em todos os outros lugares. Os três casais

se apossaram dos quartos no andar de baixo, com as crianças dormindo no chão, em colchonetes. Mia e Carla dividiram o sofá-cama. Para ser sincera, havia um Moretti no seu quarto também, mas não era exatamente a mesma coisa. Deixara que Luca voltasse para o quarto dela enquanto a família dele estava ali, mas só porque não havia outro lugar para ele dormir. Ela se sentiu culpada ocupando uma confortável cama tamanho king, enquanto ele tentava descansar em uma poltrona reclinável. Contudo, estabelecera algumas regras. Nada de gracinhas. Havia gente demais por perto capaz de escutar cada vez que o chão rangesse. Além do mais, não tinha certeza se era algo que devesse ser repetido, por mais que ela quisesse. Luca era um homem complexo, e ela tinha a sensação de que demoraria muito para atravessar todas as suas camadas. Sexo era apenas uma distração. Se ela realmente fosse se entregar a alguém, teria de haver um certo nível de confiança e sinceridade entre eles. Na sua opinião, ela e Luca ainda não tinham isso. Talvez jamais viessem a ter. De qualquer modo, aquela viagem nada tinha a ver com romance. Dizia respeito à família, agora, mais do que nunca. Na terceira tarde da visita da família, os homens haviam saído em busca de lagosta fresca para o jantar. Mia e Carla haviam ido até o mercado para reabastecer a despensa. Nicole e Tonia haviam ido à praia com as crianças, mas Claire preferiu ficar em casa descansando. Subitamente, a casa pareceu tão silenciosa. Silenciosa demais. Após algum tempo, ela começou a se perguntar onde Eva estaria. Encontrou-a no deque com Antonia. – Posso me juntar a vocês? – perguntou. – É claro. Minha neta e eu estávamos apenas aproveitando um dia lindo. Vou detestar ir embora amanhã. Ainda tenho tantos beijos para dar nessas bochechinhas! Claire sentou-se e viu o rostinho de Eva iluminar-se ante os beijos da avó. Ela realmente estava adorando a atenção. Talvez fosse a hora de repensar a decisão de não a colocar em uma creche, onde poderia interagir com outras crianças. – Claire, como todo mundo saiu, eu queria conversar com você sobre uma coisa.

Seria aquela a hora em que ela falaria para Claire não magoar o filho dela, nem para tirar a filha dele? – Claro. – Não sei bem o que é que você e Luca têm. Sei que, o que quer que seja, ainda é cedo para saber se vai dar em algo sério, mas espero que dê. Jamais vi Luca tão feliz quanto ele está aqui com você e Eva. Nem mesmo com Jessica ele era assim. Com ela, parecia sempre estar esperando que algo desse errado, e, no final, acabou tendo razão. A vontade de Claire era arrancar mais informações de Antonia, mas conteve a língua, preferindo não interromper. – Partiu-me o coração vê-lo daquela maneira. Ficou surpreso ao saber que tinha um filho, mas logo se entusiasmou com a ideia. Jamais esperamos descobrir que o bebê não era dele. Claire tentou esconder a surpresa ante a revelação sobre Luca. Ele jamais mencionara outra criança, nem a mãe da criança. Mesmo não sendo sua no final das contas, era um acontecimento importante demais na vida dele para esconder dela. Ela fechou os olhos, vendo todas as peças começando a se encaixar em sua cabeça. Isso explicava a sua determinação em ter Eva reconhecida como sendo sua. Desta vez, tinha certeza de que o bebê era dele, e não ia perder a chance de ser pai, independentemente das circunstâncias. – Mas esta criança – prosseguiu Antonia com um sorriso – é o milagre que o trará de volta à vida. Ele enfim tem uma família. – Ele tem uma filha, sim – esclareceu Claire. Não estava disposta a conceder mais do que isso. – E eu vou me certificar de que ele tenha Eva na sua vida, o máximo que ele quiser. Os olhos castanhos de Antonia, tão parecidos com os de Luca, se fixaram nela. – Minha querida, nós duas sabemos que esta situação rendeu mais do que uma filha para ele. Claire mordeu o lábio inferior ao considerar a resposta. – Sinceramente, eu não sei. Às vezes, tudo está correndo bem, e acho que algo acontecerá entre nós. Em seguida, ele recua. Saber sobre o outro filho explica um bocado, mas não tudo. Ainda me sinto como se ele estivesse

escondendo alguma coisa de mim, e não aceito isso. Não vou me permitir investir emocionalmente em um homem em quem não posso confiar. – Luca é um bom homem, o melhor que vai encontrar. Só tem medo de se deixar apaixonar por uma boa mulher. Pessoalmente, acho que vocês dois deveriam ficar juntos. Não acredito em acidentes e nem em coincidências. O destino se encarregou de misturar os números naqueles dois rótulos para que dois desconhecidos pudessem ter uma filha juntos, e, com o tempo, uma vida juntos. Era uma ideia bonita, mas Claire não era tão supersticiosa assim. Acidentes aconteciam. Não significava que fosse o destino. Era apenas azar. Ou até sorte. Podia não ser o que ela planejara; contudo, pelo menos, Eva agora tinha um pai e uma família. Mas para Luca e ela? Claire duvidava que aquele romance de férias fosse durar quando voltassem para Manhattan, se ele continuasse a guardar segredos. A mãe de Luca o considerava um partidão. É claro. Mães amavam cegamente os filhos. Ele entregara o corpo para Claire, mas estava guardando para si todo o resto. A não ser que isso mudasse, não poderia confiar o seu coração a ele. Já cometera o erro de entregá-lo com demasiada facilidade no passado. Algo daria errado. O intenso latejar no seu peito era prova disso. A única dúvida era o quanto doeria quando acontecesse.

CAP ÍTULO 9

– E STÁ SILENCIOSO demais por aqui – falou Claire, ao acabar de lavar a louça do jantar. Luca ergueu o olhar de onde estava brincando com Eva, no chão da sala de estar. – Sei o que quer dizer. – A família dele fora embora há alguns dias. Após três dias de intenso caos familiar italiano, a casa parecia fazer eco de tão vazia. – Sempre levo um tempo para me acostumar a ficar sozinho, após as nossas reuniões. Isso significa que gosta da minha família? Claire lidara com a família dele melhor do que Luca estava esperando. Agora, se gostara ou não dos dias que passara com eles, isso era um mistério para ele. Claire voltou para a sala de estar, secando as mãos em um pano de prato. – Adorei a sua família, Luca. São todos fantásticos. Eles acabaram de me conhecer e já me trataram como se eu fizesse parte da família. A família de Jeff sempre foi boa comigo, mas eu jamais me senti como se fizesse parte dela, mesmo que, legalmente, eu fizesse. Luca sorriu para ela. – Realmente gostaram de você. Até mesmo Carla gostou de você, e ela é dura de se conquistar. Quanto à Mama... Bem, você é incapaz de fazer algo errado aos olhos dela. Se falasse italiano, seria perfeita. Talvez tenhamos de dar um jeito nisso – acrescentou ele, com um sorriso. – Engraçadinho. Claire sentou-se no sofá.

– Acho que está na hora de ela ir para a cama – comentou Luca, ante o enorme bocejo dado pela filha. – Como eu, acho que ela ainda está se recuperando dos excessos de estímulos. Ela fez menção de se levantar, mas Luca ergueu a mão. – Fique relaxando. Eu a colocarei para dormir. Por que não nos serve um pouco de vinho? Se é que minhas irmãs não beberam tudo... Luca ficou de pé e tomou Eva nos braços. Ele precisou apenas de alguns minutos para trocar a menina, vestindo o seu pijaminha, e acomodá-la no berço. – Buona notte, cara mia – disse, acariciando os macios cabelinhos dela. Eva balbuciou por alguns instantes, os olhinhos aos poucos se fechando. Até que foi rápido. Deixando o quarto sem fazer barulho, fechou a porta atrás de si. – Sabe, já está quase na hora de voltarmos para Nova Iorque, e ainda não fizemos aquilo que viemos até aqui para fazer – disse, ao retornar para a sala. Do sofá, Claire o fitou com curiosidade. – E o que seria isso? – Discutir o acordo de guarda que apresentaremos para o juiz. Uma expressão estranha brilhou nos olhos de Claire. Luca não soube dizer se fora decepção, medo, ansiedade ou uma combinação dos três. – Muito bem. Então, vamos discutir isso. Luca acomodou-se no sofá ao lado dela. – Já teve chance de dar uma olhada na proposta enviada por Edmund? – Já. Eu dei uma olhada. Para falar a verdade, fiquei surpresa. Pareceu-me um acordo padrão. Nada com que eu tivesse de me preocupar, ainda mais agora que todas as minhas dúvidas no tocante às suas habilidades como pai foram sanadas. Só achei a pensão alimentícia um pouco alta demais. Luca ergueu a sobrancelha. – Alta? Acho que é a primeira vez que alguém diz isso. Claire deu de ombros. – Mesmo que eu a coloque em uma das melhores escolas de Manhattan, e a vista apenas com roupas de grife, eu não precisarei de tanto. Temos um bom lar, uma babá. Isso me deixa um pouco preocupada.

– Com o quê? – Que esteja querendo mais de mim do que está descrito na proposta. Por acaso espera que eu venda a minha casa e me mude para Manhattan? As despesas de um apartamento no Upper East Side, perto de você, é a única coisa que eu poderia imaginar capaz de justificar o dinheiro. A ideia lhe passara pela cabeça uma ou duas vezes, mas ele aprendera bem cedo que tentar pressionar Claire não levaria a nada. Tinha de usar todo o seu talento como negociador para conseguir o que queria. – Não, não foi a minha intenção. Contudo, seria assim tão ruim se eu quisesse isso? Você estaria mais perto do museu. Mais perto das escolas sobre as quais falamos. Seria mais fácil para Eva ir da casa de um para a do outro, e para darmos apoio um ao outro quando necessário. – Luca pôde ver as engrenagens girando na cabeça dela. Apesar de saber que ele estava fazendo sentido, ela adorava a casa onde morava. – Depende de você. Contudo, como você mesma disse, o dinheiro que estou oferecendo poderia facilmente tornar isso uma possibilidade. Ela assentiu. – Terei de pensar no assunto. Gosto de poder ficar longe do caos da cidade. Ele riu. – Fala como se o Brooklyn fosse uma cidade de interior. Se quiser, compro uma casa de campo em Connecticut, e poderá visitá-la sempre que quiser fugir de tudo. Os olhos de Claire se arregalaram. – Não diga bobagens. Luca não achava bobagem. Parecia uma solução muito prática. Seus planos de seduzir Claire e estabelecer um relacionamento com ela enquanto se mantinha distante a nível emocional haviam falhado redondamente. Não estava certo se chamaria o que sentia por ela de amor, mas, sem dúvida, sentia mais do que pretendera. Àquela altura, estava disposto a fazer quase tudo para garantir que Claire tivesse um papel maior em sua vida. Morar perto dele era apenas parte do plano. Se comprar uma casa de campo ajudasse também, que assim fosse. Receava o final desta viagem. Sabia que voltar para casa significaria ficar até tarde no escritório e, se tivesse sorte, ver Eva de quinze em quinze dias. Não

era o suficiente para ele, ainda mais quando nada no acordo determinaria a frequência com que veria Claire. – Bem, que tal isto? Tenho pensado muito desde que a minha família partiu. Para ser sincero, não quero perder o que nós dois começamos aqui. Essa coisa de relação é nova para mim, mas quero saber o que mais podemos ter juntos. Não quero apenas Eva na minha vida, Claire. Quero você também. Após um instante boquiaberta, Claire fechou a boca e sorriu. – Também quero você na minha vida, Luca. Luca inclinou-se para a frente, apagando o sorriso dela com um beijo. No instante em que seus lábios tocaram os dela, sentiu a familiar onda de desejo percorrendo o seu corpo. Tal toque, combinado com o fato de estar novamente a sós com ela na casa, o lembraram há quanto tempo não tocava Claire do jeito que queria. Com a família ali, ela mantivera a distância. Agora que ela concordara em ficar na sua vida por mais algum tempo, ele também a queria na sua cama. – Luca – falou Claire, pressionando as palmas das mãos de encontro ao peitoral dele. – Espere. Fico satisfeita que tenha gostado; contudo, ainda não terminei. – Havia um “mas” a caminho. Mas? Franzindo a testa, Luca recostou-se no sofá. – O que há de errado? Claire suspirou. – Não há nada propriamente errado, mas eu queria que soubesse que sua mãe me contou uma coisa enquanto ela estava aqui. Luca sentiu um frio na barriga. – O que ela disse? – perguntou, sabendo qual seria a resposta. Claire sabia que ele era uma aberração de um testículo só e tinha reservas no tocante aos dois ficarem juntos. – Ela me contou sobre Jessica e o bebê. Principalmente fez questão de ressaltar como você parecia feliz, e como ela quisera tanto isso depois de tudo pelo que você passara com Jessica. Isso me preocupa, Luca. Luca ficou surpreso. Tinha tanta certeza de que a mãe teria dado com a língua nos dentes sobre a história do câncer. Suspirou aliviado. – O quê, exatamente, a preocupa? – Que você mesmo não tenha me contado – retrucou ela, surpreendendo-

– Que você mesmo não tenha me contado – retrucou ela, surpreendendoo. – Eu contei cada segredo de minha vida, desde que chegamos aqui. Falei de Jeff, de minhas inseguranças e do fracasso do meu casamento. Teve um milhão de oportunidades para se abrir comigo, mas preferiu não o fazer. – Não me pareceu relevante. Acabou não sendo nada. Não tenho outro filho a respeito do qual você não sabe, de modo que não achei que fosse importar para você. – Não se trata da criança, mas de você não ter me contado. Segredos me preocupam, Luca. Jeff guardava segredos. E, por mais que eu queira você em minha vida, e queira ver até onde isto pode ir, preciso saber que será sincero comigo, mesmo quando isto lhe seja desagradável. Mesmo quando exponha partes de você que não queira que mais ninguém saiba. Quando vejo que não confia em mim para contar isso, eu me pergunto o que mais está escondendo de mim. Luca fez menção de abrir a boca para insistir que não estava escondendo nada, mas ela levou o dedo em riste aos seus lábios. – Não, não venha me dizer que não está escondendo nada, porque eu sei que está, Luca. Conte-me por que foi à clínica de fertilidade. O que houve com você? Conte-me agora, ou não poderemos passar daqui. Luca suspirou. Desde que decidira construir um futuro com Claire, vinha temendo este instante. Todavia, poderia ser pior se não se abrisse. Por mais que não quisesse, tinha de contar a história mais uma vez. – Quando eu estava na escola, fui diagnosticado com câncer testicular. Perdi a maior parte dos anos finais me submetendo a tratamentos. Tive de passar por uma cirurgia para remover o tumor em um dos meus testículos; depois, foram extensos tratamentos de rádio e quimioterapia. Doei para a clínica antes da radioterapia porque havia grande chance de esterilização. Por isso que Jessica ter um bebê foi tão importante para a minha família. Eu não deveria ser capaz de ter filhos. Não gosto de falar sobre isso, então evitei as suas perguntas sobre a escola. Não fui a nenhuma festa de formatura. Recebi meu diploma em uma cadeira de rodas. Minha doença definiu todo aquele período da minha vida. Claire estava à beira das lágrimas. Ele estendeu os braços para ela. – Venha aqui – disse. Claire aninhou-se de encontro a Luca, que a envolveu

– Venha aqui – disse. Claire aninhou-se de encontro a Luca, que a envolveu com os braços. – Não chore. Eu deveria ter lhe contado, mas foi tão duro para mim que nem gosto de me lembrar. Eu não passava de um garoto. Não deveria ter de me preocupar se um dia poderia ter filhos. Na verdade, nem sabia se chegaria ao meu próximo aniversário. O preço de vencer o câncer foi alto. Não é algo que vá embora facilmente. Até hoje, continuo pagando. CLAIRE PODIA escutar a dor nas palavras de Luca, e cada uma delas partia ainda mais o seu coração. Ele tinha razão. Não era algo com que uma criança deveria ter de lidar. – O desgaste físico foi enorme. Eu me recuperei da cirurgia, meu cabelo voltou a crescer após a quimioterapia, mas nada disso foi o pior. O pior foi a espera. – A espera pelo quê? – A espera pelo retorno da doença. Ela pousou uma mão tranquilizadora sobre o joelho dele. – Não pode saber se ela vai retornar. Já faz mais de dez anos desde que ficou doente. Não acha que, se o câncer fosse retornar, já teria acontecido? – Lógica e câncer não andam de mãos dadas. Além do mais, sei que não é bem assim. Só os tratamentos que recebi para derrotar o câncer já me colocam em risco de, em algum momento, desenvolver um câncer secundário. Também podem provocar uma variedade de outros problemas de saúde mais tarde na vida. Contudo, suponho que eu deva agradecer de poder ter um “mais tarde na vida” para desenvolver tais problemas. – É por isso que se concentrou tanto no trabalho, à custa de seus relacionamentos? Para o caso de voltar a ficar doente? – Em parte – admitiu ele. – A parte de filhos também não ajuda. Não quero que nenhuma mulher abra mão de seu sonho de ter uma família porque teve o azar de se apaixonar por mim. – Luca! – Endireitando-se, Claire o fitou nos olhos. – A mulher que se apaixonar por você está longe de ter azar. Você tem tanto a oferecer. Não está sendo justo consigo mesmo, concentrando-se apenas no que não pode fazer. Além do mais, não faltam mulheres por aí que já têm filhos ou que nem os querem. Ou que não podem ter. Como eu.

A vulnerabilidade que ela viu nos olhos dele ao fitá-lo era algo que jamais esperara enxergar em seu confiante presidente de empresa. Detestava que ele tivesse passado por todas aquelas coisas terríveis; contudo, estava feliz que as últimas barreiras entre eles estivessem caindo. Luca merecia ser feliz. E, mais do que tudo, queria que ele fosse feliz com ela. Suas defesas estavam sendo derrubadas tão rapidamente quanto as dele. Antes que pudesse se conter, inclinou-se para a frente e capturou-lhe o rosto entre as mãos, antes de colar os lábios aos dele. A corrente emocional percorrendo os corpos dos dois se conectou com fagulhas de desejo. As mãos de Luca a puxaram para si, a boca voraz ansiosa por continuar do ponto onde haviam parado alguns minutos atrás. Desta vez, Claire não ia interrompê-lo. Entregou-se ao seu toque, ansiando por senti-lo. Não demorou muito para o latejar do desejo começar a se intensificar em sua pelve. Claire não tivera problemas em ficar meses sem ter um homem; porém, Luca abrira uma caixa de Pandora. Ela o queria. Agora. Puxando-o pela camisa, Claire rolou para o tapete com ele. Seus lábios jamais se separaram. O corpo pesado de Luca cobriu o dela, o seu peso, de algum modo, fazendo-a se sentir segura, mantendo-a ancorada. – Faça amor comigo, Luca – sussurrou, de encontro aos lábios dele. – Deixe-me lhe mostrar que é tudo de que uma mulher precisa. As palavras o incendiaram, e ela ficou feliz de ver os resultados disso. As mãos dele deslizaram ao longo do corpo dela, puxando o vestido de algodão e expondo a extensão das pernas embaixo dele. Luca continuou puxando o tecido para cima até ele se acumular ao redor da sua cintura. Ele sentou-se, enfim abandonando os lábios dela para que Claire pudesse puxar a sua camisa por sobre a cabeça dele, e descartá-la. As mãos dela na mesma hora se pousaram sobre o peito dele, começando a massagear os músculos rígidos. Permitiu que as unhas deslizassem sobre o abdome até chegar à cintura do jeans. Antes que pudesse desabotoá-los, Luca ficou fora do seu alcance. Ele viajou lentamente pelo corpo dela abaixo, deixando uma trilha de beijos sobre a pele nua. Empurrou as alças do vestido por sobre os ombros dela, até os seios aparecerem pela abertura do vestido. Sua boca a provocou e a provou,

sugando com força os mamilos enrijecidos, até Claire gritar e enterrar os dedos nos cabelos dele. Com dedos ágeis, Luca lhe removeu a calcinha. Claire suspirou de alívio, achando que enfim o teria, mas estava enganada. Luca ainda estava de jeans quando lhe afastou as coxas. Ela prendeu a respiração ao se dar conta do que ele estava fazendo. – Luca? – Sim, tesorina? – Por que está… não está…? Sequer era capaz de fazer a pergunta. Claire estava constrangida em admitir que era algo que jamais experimentara. Jeff não achava higiênico, embora não fosse uma preocupação quando queria que ela o satisfizesse. Luca a fitou com os olhos estreitados. – O que foi? Nunca lhe deram prazer desta forma? Fechando os olhos, ela sacudiu a cabeça. – Vejo que é outro aspecto do casamento de vocês onde o canalha do seu marido fracassou. Pretendo corrigir isso agora mesmo. – Não sei, Luca. Não estou certa de que… Sem aviso, a língua de Luca chicoteou a carne latejante, calando o seu protesto. Uma descarga de prazer como ela jamais experimentara percorreu o seu corpo. – Luca! – exclamou, arqueando as costas. Ele aguardou até que os músculos do corpo dela voltassem a relaxar; depois, voltou a acariciá-la com a língua. Claire mordeu o lábio inferior para se impedir de gritar e acordar Eva. Foi difícil, ainda mais quando Luca envolveu as pernas dela com os braços, afastando ainda mais as coxas dela para o seu acesso. As sensações das carícias íntimas tornaram ainda mais fácil para ela esquecer o constrangimento. O toque sedoso da língua nas suas partes mais sensíveis a trouxe ainda mais perto de um clímax intenso muito mais rápido do que antecipara. Ela se contorceu debaixo dele, sentindo as sensações se intensificando, impotente para fazer algo a respeito. – Sim, sim. – Foi tudo que Claire conseguiu dizer, sendo levada cada vez mais perto do limite. No momento perfeito, ele deslizou o dedo para dentro dela, e isso

No momento perfeito, ele deslizou o dedo para dentro dela, e isso significou a ruína de Claire. O orgasmo mais intenso que já experimentara explodiu. Pequenas faíscas de prazer dançaram pelo corpo dela, enquanto os músculos tremiam e se retesavam. Luca recuou, mas Claire mal teve energia para abrir os olhos. Quando o fez, vislumbrou o jeans dele sendo descartado no chão, junto com uma embalagem vazia de preservativo. Ele mantivera a sua palavra e comprara novos preservativos. Os nervos já estimulados de Claire se incendiaram quando ele lentamente inseriu a sua extensão para dentro dela. Com as pernas dela erguidas, ele alcançou mais a fundo do que ela poderia ter imaginado. Quando terminou, os joelhos dela estavam descansando em seus ombros. Mal teve tempo para recuperar o fôlego, mas não importava. Queria aquilo mais do que qualquer outra coisa. Jamais quisera tanto estar com uma pessoa quanto queria estar com ele. Luca murmurou palavras suaves em italiano no ouvido dela, enquanto voltava a arremeter para a frente. Cada movimento foi tão lento, tão deliberado, tão tortuoso, como se ele não quisesse que tivesse fim. Ela também não queria. Claire abriu os olhos e observou o rosto dele enquanto Luca se movia, para que jamais se esquecesse daquele momento. Seu cenho estava franzido de concentração, como se estivesse preparando um prato fantástico na cozinha, como se fosse a tarefa mais importante que ele já realizara. Também a fazia se sentir daquela maneira, como se fosse prioridade na vida dele. Jamais tivera algo assim e não queria abrir mão disso. Não ao final da viagem. Não após a decisão do juiz. Nunca. Pois estava apaixonada por ele. Depois do que acontecera com Jeff, ela se convencera de que não voltaria a cometer o erro de se apaixonar novamente. Claire se recusava a dar novamente tanto poder a alguém sobre ela. No entanto, ali estava. Talvez não fosse a coisa mais inteligente a fazer, e, talvez, no final, lhe trouxesse apenas sofrimento, mas não havia mais como resistir. – Sim! – voltou a arquejar, sentindo ambos se retesando de expectativa.

Sim, ela queria que ele se soltasse em seu interior. Sim, aquilo era melhor do que poderia ter imaginado. Sim, queria estar com ele também em Nova Iorque. Sim, amava Luca com tudo que tinha e tudo que era. Sim para tudo. Bastaria Luca fazer a pergunta, e Claire seria dele para sempre.

CAP ÍTULO 10

E RA ESTRANHO estar de volta a Nova Iorque. Apesar das garantias de Luca de que queria que a relação deles se estendesse além do tempo passado na praia, Claire ficou ansiosa em voltar à selva de concreto do seu lar. O frio na barriga ocasionalmente era tão intenso que chegava a ser quase nauseante. Não sabia ao certo do que tinha medo. Não, era mentira. Sabia exatamente do que tinha medo. De perder Luca. Era um risco que correra ao entregar-se aos sentimentos que tinha por ele. Manhattan não tinha o charme aconchegante da ilha. Seriam capazes de levar aquela relação em meio às exigências dos empregos e às agendas imprevisíveis da vida real? Naquela noite, ela descobriria. Já fazia alguns dias que estavam em casa. Esse fora o primeiro dia de Claire de volta ao museu. Luca a convidara para jantar naquela noite, para que pudessem terminar o acordo de guarda para que Edmund e Stuart apresentassem ao juiz. Ela ficara de se encontrar com ele no apartamento dele e, de lá, após terminarem, iriam jantar em algum lugar. Daisy ficara com Eva. O apartamento de Luca ficava a alguns quarteirões do museu. Estava uma noite agradável, de modo que Claire decidira ir andando. Estava tudo muito bem, até ela sentir o aroma vindo de uma carrocinha de cachorro-quente nos arredores. Freneticamente, procurou uma lata de lixo próxima, onde esvaziou o conteúdo do seu estômago. Quando terminou, endireitou-se e levou a mão à boca. Realmente fizera isso? Olhou ao redor para ver se alguém notara e percebeu que um bocado de

gente estava olhando para ela. Uma mulher próxima enfiou a mão dentro da bolsa e tirou de lá um lenço. – Não sei por que chamam de enjoo matinal – disse ela. – Está mais para enjoo o tempo todo. Aquelas carrocinhas de cachorro-quente também sempre acabavam comigo. Claire esforçou-se para não olhar feio para a mulher bem-intencionada. Não havia por que contar a sua história de vida e insistir que não podia ficar grávida. Apenas aceitou o lenço e ficou grata que ao menos uma pessoa não estivesse pensando o pior dela. – Obrigada. Assim que o sinal abriu, tratou de atravessar a rua, colocando o máximo de distância possível entre ela e a sujeira que fizera. Só ao parar no próximo sinal é que se permitiu processar as palavras da mulher. Grávida? Não podia estar grávida. De fato, lembrava muito o enjoo matinal que sentira durante a sua primeira gravidez. Houve dias em que mal conseguiu sair da cama. Perdeu peso, ao invés de ganhar. A infelicidade do primeiro trimestre foi algo que ela rapidamente apagara da memória como parte do preço que pagara por Eva. Contudo, agora, retornara com toda a clareza. Pegou o celular e deu uma olhada no calendário. Bastou um pouco de matemática para se dar conta de que passara um mês na praia, e que a sua menstruação estava bem atrasada. Voltou a atravessar a rua, sentindo-se cada vez mais ansiosa. Tinha de haver um erro. Não podia estar grávida. Mesmo que fosse capaz de conceber normalmente, e Luca não houvesse tido câncer, o preservativo rompera apenas uma vez. Basta uma vez. As palavras proféticas da sua antiga professora de educação sexual na escola a assombraram. Com isso pesando em seus ombros, jamais poderia marchar para dentro do apartamento de Luca e agir como se nada tivesse acontecido. Também não queria tocar na possibilidade e despertar esperanças nele apenas para descobrir que tivera uma intoxicação alimentar. Precisava comprar um teste caseiro de gravidez, realizá-lo e seguir em frente com o seu dia sem aquela incerteza. Seria

um desperdício de dez dólares, mas era um preço pequeno a se pagar pela sua paz de espírito. Na farmácia, procurou o corredor que a assombrara quando estava se submetendo aos tratamentos de fertilidade. Pegou a sua marca favorita e seguiu para o caixa. Quantos desses ela fizera ao longo dos anos? Dezenas. Apenas um dera resultado positivo. E agora isso provavelmente não se repetiria. Após pagar, seguiu para uma loja Starbucks no final do corredor, onde entrou no toalete feminino, fez o exame e aguardou o resultado. Quando o alarme do celular tocou, ela verificou a janelinha. Grávida. Claire ficou boquiaberta de surpresa e choque. Era impossível. Como…? Fora apenas…? Mal conseguia completar os pensamentos, quanto mais as frases. Devolvendo o exame à caixa, colocou-a novamente na bolsa e retornou para a farmácia para comprar um teste de outra marca, antes de repeti-lo. O resultado foi o mesmo. Confusa, pegou suas coisas e deixou a lanchonete. Só começou a realmente processar a notícia após percorrer outro quarteirão. Estava grávida. Após anos de tentativas desgastantes e invasivas para conceber Eva… conseguira ficar grávida acidentalmente. Eva ia ter um irmãozinho ou uma irmãzinha e ela e Luca iram ter uma segunda criança. Era um milagre. Por mais que quisesse surpreendê-lo com a notícia, quando chegou ao prédio de Luca, não conseguia parar de sorrir. – Oi – disse Luca, ao abrir a porta. – Por que está tão feliz? Ele deu um passo para o lado, permitindo que ela entrasse, e pegou o casaco dela. – Tenho novidades – disse Claire. – Primeiro, vamos nos sentar. Luca a seguiu até o sofá, onde eles se sentaram. Ela tomou as mãos dele nas suas. – Sei que só estamos juntos há pouco tempo e, para qualquer outra pessoa, esta não seria uma notícia muito bem-vinda, mas desde que voltamos que não tenho me sentido bem. Não dei muita bola, mas uma moça do lado de fora do museu me disse algo hoje que me fez pensar. Quando eu estava vindo para cá, fiz um exame de gravidez e…

Luca estremeceu. Eram as últimas palavras que ele esperava escutar saídas da boca de Claire. Endireitando-se no assento, retraiu as mãos das dela. – E...? – forçou-se a perguntar, já sabendo a resposta. Se o resultado tivesse sido negativo, ela não teria se dado ao trabalho de dizer qualquer coisa. Ela enfiou a mão na bolsa e tirou de lá de dentro os dois testes de gravidez. – E deu positivo. Nas duas vezes. Eu estou grávida. Mal pude acreditar. Deve ter acontecido da primeira vez, quando o preservativo rompeu. Luca pegou um dos exames das mãos dela, estudando a telinha, torcendo para que a informação mudasse. Estava acontecendo de novo. O que ele não conseguia entender era por que ela tentaria aquilo. Sabia que ele não podia ter filhos. Ele mesmo lhe dissera isso há poucos dias. – Não é possível – disse. – Eu sei. Quero dizer, foi o que pensei. Que fosse impossível. Por isso ignorei todos os sinais. Preciso ir a um médico para confirmar os resultados e verificar tudo, todavia… – Não – disse ele, lhe interrompendo o fluxo das palavras. Não podia ficar ali escutando o que sabia ser mentira. – Como assim, não? Você me disse que queria uma família. Por que está tão decepcionado? Estou grávida, Luca. – Tenho certeza de que está. Ele levantou-se do sofá e adiantou-se até a cozinha. Precisava de um pouco de espaço. Claire não entendeu a deixa. Com uma expressão confusa no rosto, seguiu-o pelo apartamento. – Pensei que fosse ficar feliz. Luca riu amargamente. Já cometera esse erro uma vez. Não o repetiria. Era uma esperança falsa. – Se eu fosse o pai, estaria feliz. Contudo, como eu disse, é impossível. Claire ficou paralisada, sem saber ao certo se deveria acreditar nas palavras dele. – Luca, você é o pai. Quem mais haveria de ser? Para ser sincero, ele não queria nem considerar a possibilidade. Já estava enfrentando esta tormenta de emoções. Não precisava acrescentar um acesso furioso de ciúmes à lista. Luca estreitou o olhar para ela.

– Não faço ideia, mas tenho quase certeza de que não é o sujeito estéril nesta sala. – Olhe, estou tão surpresa quanto você. Considerando todos os nossos problemas somados, jamais me passou pela cabeça que isso pudesse acontecer. Mas aconteceu. Você é o pai do bebê. Passei todos os dias e todas as noites do último mês com você. O último homem com quem estive antes de você morreu há um ano. Luca queria acreditar nela. Deus, como ele queria. Claire jamais lhe dera motivos para duvidar de suas palavras. Mas esta história era inacreditável demais. – Isso soa tão sincero, Claire. Deve ter praticado antes de vir aqui. Ela estremeceu, como se ele a houvesse esbofeteado. – Praticado? Acha mesmo que inventei tudo isto? A vontade dele era dizer que não, que acreditava nela e que estava feliz, mas não encontrou forças para fazê-lo. A raiva reprimida na última década borbulhou em seu íntimo. Não podia culpar ninguém pelo câncer, e Jessica desapareceu assim que chegaram os resultados negativos do exame de paternidade, de modo que jamais pôde lhe dizer o que queria. Claire era um alvo conveniente para as frustrações de sua vida. – Não. Apenas a parte em que eu sou o pai. O que eu não consigo imaginar foi onde arrumou tempo para dormir com outro. Luca viu o rosto de Claire ficar vermelho, a veia na testa começando a pulsar. – Não precisei de tempo! – esbravejou ela. – Não dormi com ninguém além de você. Como pode me acusar de algo assim depois do que houve com Jeff? Eu jamais… A voz de Claire falhou, como se fosse incapaz de completar a frase. Luca sabia que a acusação fora um golpe baixo, mas que outra opção havia? – Eu não sou Jessica. Entendo como deve ter sido terrível para você, mas não desconte em mim o que ela fez. Isto é completamente diferente. – É mesmo? – Luca perguntou. Por mais que quisesse que as coisas fossem diferentes, não se daria ao luxo de ter fantasias. Ele e Claire estavam acabados. Por mais doloroso que fosse, não havia mais como voltar atrás. Precisava dar um fim decisivo àquilo e

mandá-la embora antes que as coisas ficassem ainda mais feias do que já estavam. – Talvez tenha razão – concordou ele com amargura na voz. – Jessica se contentou em ter apenas um dos meus filhos. Você quer dois. Uma não foi o suficiente? Teve de tentar arrancar mais de mim? Claire tentou não reagir fisicamente ao insulto. Agora, não era apenas uma vagabunda, mas uma vagabunda gananciosa? Onde estivera escondido esse lado sombrio de Luca nas últimas semanas? – Mais o quê? Dinheiro? Não preciso do seu dinheiro, Luca. – Não? Então, o que há por trás disso? Medo que eu pudesse deixá-la assim que chegássemos em casa? Achou que ter uma segunda criança miraculosa ajudaria a me convencer a desposá-la, para que possamos viver felizes para sempre? Ela não sabia bem como responder. Esta conversa toda se tornara surreal, e Claire não sabia o que fazer para corrigir isso. – Admito que tive esperanças de que pudéssemos ter um final feliz com nossos dois filhos, mas não houve nenhuma artimanha envolvida. É simplesmente a situação. – Pois esta situação está é acabada, Claire. Eu sabia que a seduzir era uma péssima ideia, mas você, os seus olhos tristes e seus lábios generosos me convenceram do contrário. Não sei por que achei que ficarmos juntos seria a melhor solução para a nossa situação. Pois agora chega. Está tudo acabado. Uma dor intensa pareceu dilacerar o peito de Claire. Tinha certeza de que era o seu coração se partindo. Como podia amar um homem capaz de ser tão cruel? – Pensei que realmente houvesse algo especial entre nós, Luca, mas, se é capaz de fazer acusações tão terríveis, vejo que eu estava enganada. Sobre tudo. – Lamento desapontá-la. O tom arrogante a deixou zangada. Não iria permitir que outro homem a tratasse com menos consideração do que merecia. E, por ironia do destino, fora Luca quem lhe ensinara isso. Empertigando-se, Claire o fitou nos olhos. – Está desapontando apenas a si mesmo, Luca, pois é um covarde.

– Um covarde? Ele praticamente rugiu as palavras, mas Claire se recusou a recuar. – É, um covarde. Tem medo de ir ao médico e descobrir a verdade sobre a sua esterilidade. Prefere jogar fora tudo que temos, me acusar de ser uma meretriz e uma mentirosa, a encarar a realidade da sua condição. – E por que eu haveria de ter medo de fazer isso? O pior que podem me dizer é o que eu já sei. – Não, não é. O pior que podem fazer é lhe dizer que, esse tempo todo, esteve errado. Pois aí terá de encarar o fato de que passou todos esses anos vivendo a vida pela metade, sem motivo algum. Saberia ao certo que desperdiçou mais de uma década em que poderia ter encontrado alguém para amar e para dar início a uma família, em vez de ser sempre o “Senhor Presidente da Empresa Ocupado”. Em vez de viver, esteve se escondendo atrás da mesa. Luca ergueu o braço, apontando para a porta da frente. – Pegue as suas mentiras venenosas e dê o fora daqui, antes que eu chame a segurança para expulsá-la. – Não poderia me forçar a ficar mais um minuto que fosse aqui. – Claire girou nos calcanhares e marchou de volta para a entrada, onde pegou o casaco. – Como está tão certo de que o filho não é seu, presumo que não me arrastará até os tribunais para conseguir a guarda dele. – Não. Não estou interessado. Claire procurou não reagir à sua indiferença. – Muito bem. Nesse caso, me faça um favor e tente não ficar interessado em Eva também. Se não quiser ambos os seus filhos, nós também não queremos e nem precisamos de você nas nossas vidas. Ela abriu a porta e marchou para fora do apartamento, batendo-a atrás de si com a fúria de uma mãe ursa. A raiva só começou a diminuir quando já estava dentro do elevador, sendo substituída por uma enxurrada de lágrimas que ela não conseguiu conter. Como foi capaz de conseguir exatamente o que sempre quis e perder tudo de que precisava ao mesmo tempo?

UM RAIO de sol entrou pela janela e iluminou o rosto de Luca, despertando-o

UM RAIO de sol entrou pela janela e iluminou o rosto de Luca, despertando-o da posição desconfortável no sofá de couro da sala. Após uma furiosa batalha com uma garrafa de uísque, adormecera ali na noite anterior. Ao sentar-se, sentiu uma dor intensa na cabeça, como se esta estivesse em um torno que se apertava com cada movimento e cada som. Começou a se lembrar de fragmentos da noite anterior, a agonia de sua cabeça minúscula quando comparada à dor da perda e da decepção que se instalara em seu peito. As palavras zangadas ecoaram em sua cabeça. O exame de gravidez positivo, as expressões de esperança, devastação e raiva no rosto de Claire, e a porta batendo passaram pelos seus pensamentos como imagens de um projetor quebrado. Quando, enfim, ergueu a cabeça, avistou os destroços de seu celular, a coisa que estava mais a mão para ele arremessar na porta depois que Claire a bateu. A visão não lhe trouxe muita satisfação. Agora, para completar, teria de pedir à assistente para lhe encomendar um celular novo. Praguejando, recostou-se no sofá e ficou olhando para o teto. Era sempre tão controlado, mas a traição de Claire o levara a perder o controle na noite anterior. Um filho! Ela insistia que estava esperando o seu filho. Como podia confiar na declaração de Claire, quando sabia que era impossível? Mas será que sabia mesmo? Ela o chamara de covarde por ter passado todos esses anos sem tirar a prova dos nove. Ele jamais encarara a coisa por esse ângulo. Por que um papel do laboratório faria alguma diferença? Seria apenas o último prego no caixão que ele não suportava a ideia de lacrar. Os tratamentos com radiação haviam destruído suas chances de ser pai. Fim de papo. Não importava o quanto ele pudesse querer outro filho ou o quanto quisesse acreditar nela. Claire tinha de saber que ele queria outro filho. Não havia outro motivo para ela procurá-lo com uma história dessas. Ela encontrara a sua fraqueza e fizera o possível para explorá-la. Assim que o pensamento se formou na cabeça de Luca, ele soube que estava errado. Tudo que ele dissera e fizera na noite anterior era contrário ao que sabia ser verdade sobre Claire. Foi como se um monstro houvesse se libertado de dentro dele.

Enojado consigo mesmo, levantou-se do sofá e cambaleou até a cozinha para preparar uma xícara de café. Enquanto se ocupava com a tarefa, lembrou-se de que o tópico de Jessica viera à tona. Será que a história que a mãe contara para ela inspirara Claire a inventar a história do bebê? Ou será que o passado simplesmente envenenara a sua visão do presente? De uma coisa sabia: Claire tinha razão quando disse que não era Jessica. As duas mulheres não poderiam ser mais diferentes. Jessica era inteligente, mas ambiciosa. Haviam sido compatíveis na cama, mas ele sabia que ela queria mais. Ele também quisera, a princípio, mas a realidade falou mais alto, e Luca se deu conta de que jamais lhe daria a família que ela queria. De modo que recuara. “Mais” não estava na mesa. Ele ignorara as ligações dela por alguns meses, e ela finalmente desaparecera de sua vida. Até aparecer na sua porta grávida com o “seu” bebê. No final, não passara de uma mentira cruel. Ela quisera Luca de volta, quisera que ele se casasse com ela. Aparentemente, ela o queria a ponto de furar todos os preservativos que usaram juntos, sem saber que ele era estéril. Quando não funcionou, engravidou deliberadamente de um italiano que ela conhecera em um bar após eles terem terminado, no intuito de fingir que o filho era de Luca. Ele jamais teria acreditado que Claire pudesse descer ao nível de Jessica. E foi então que, em um momento de lucidez, se deu conta de que ela não faria isso. Verdade ou não, Claire acreditava no que estava dizendo. Mas Claire também lhe dissera que não havia estado com nenhum outro homem desde Jeff. Isso não deixava muitas opções, embora, com certeza, explicasse a expressão confusa e traída no seu rosto quando ele rejeitara a ideia de o bebê ser seu. Contudo, não deu para evitar. Aquele bebê não podia ser seu. Simplesmente não podia. Contudo, se fosse… Luca cometera um enorme, indesculpável e, talvez, imperdoável erro.

CAP ÍTULO 11

– M ORETTI. Quando a enfermeira chamou o seu nome, Luca ergueu o olhar do seu celular novo. Sua barriga doía de medo. Era o momento que adiara por dez anos. Por três vezes, quase ligara para cancelar a consulta. O único motivo pelo qual não o fez é porque sabia que, mais cedo ou mais tarde, teria de encarar Gavin. Seu amigo escutara solidariamente quando ele lhe contara a história triste. Contudo, em vez de ficar ao seu lado, ele surpreendera Luca ao dizer praticamente o mesmo que Claire dissera. Que ele era um medroso. Que suas acusações cruéis eram infundadas. Gavin concluíra a conversa lhe dizendo que ele precisava consultar um médico. Até que ele fosse testado e soubesse, com certeza, que o filho não podia ser seu, precisava ficar calado. Se estivesse errado, já dissera muita coisa de que viria a se arrepender. Luca sabia que Gavin tinha razão. Mas isso não significava que tinha de gostar. Em vez disso, marcara a consulta, e era onde ele se encontrava agora. Guardando o celular, ficou de pé e seguiu a enfermeira corredor adentro. Primeiro, Luca fora levado a um aposento privado para produzir material para o teste. Ao terminar, deixou o copo em uma janelinha e foi conduzido a uma sala de exames para aguardar o médico. Foi uma espera agonizante. Por fim, após uma batida de leve à porta, o médico entrou com a ficha debaixo do braço. Era o momento de que temia e evitara desde que terminara a radioterapia. Enfim saberia se realmente era o homem danificado que acreditava ser.

O médico apertou a mão dele e sentou-se no banquinho. – Senhor Moretti – começou, folheando a pasta. – Realizamos um rápido teste preliminar na sua amostra. Ela será enviada para o laboratório para uma análise mais detalhada, mas, com o que temos, não tenho problemas em lhe dizer que é, de fato, capaz de gerar filhos. Luca ficou paralisado de incredulidade. Não era o que estava esperando. – Tem certeza? – Não estou dizendo que será tão fácil engravidar uma mulher quanto seria para um homem sem o seu histórico médico. Sua contagem de espermatozoides é menor do que teria sido antes do seu tratamento; contudo, a formação e a mobilidade deles é boa. Com a combinação de circunstâncias certas, sem dúvida, o senhor poderia ter filhos. Luca não sabia ao certo o que dizer. Ficou ali sentado na mesa de exames, boquiaberto, enquanto processava as palavras do médico. – Se estiver tendo dificuldades em conceber com a sua parceira, talvez uma clínica de fertilidade possa ajudar. Luca riu baixinho e sacudiu a cabeça. – Obrigado pela sugestão, mas cansei de clínicas de fertilidade. – Não sei se entendi direito, mas importa-se se eu perguntar por que quis ser testado hoje, se não deseja começar uma família? Luca abaixou o olhar para as mãos. – Aparentemente, já comecei uma família. Não achei que fosse possível; contudo, parece que a combinação de circunstâncias certas ocorreu. O médico franziu a testa. – Eu lhe daria os parabéns, mas não parece muito animado com a perspectiva da paternidade. – Não é a paternidade que me incomoda – admitiu Luca. – Estou empolgado com a ideia, embora ainda corra o risco de o câncer retornar um dia. Se acontecer, eu encararei o problema quando ele surgir. É só que terei de pedir muitas desculpas para a mãe do bebê. – Ah. – O médico fechou a pasta e a deixou de lado. – Bem, se quiser ter certeza, um exame de sangue de paternidade pode ser realizado bem no início da gravidez. Luca sacudiu veementemente a cabeça. Depois do que dissera para Claire,

Luca sacudiu veementemente a cabeça. Depois do que dissera para Claire, não poderia lhe pedir isso. Seu único motivo para não ter acreditado nela foi o fato de achar que era impossível para ele engravidá-la. Mal saíram um do lado do outro durante semanas. Ela não tivera tempo e nem chance de conhecer e seduzir outro homem. Não tinha dúvidas disso agora. Claire estava esperando um filho dele, e Luca era um cretino. – Muito bem, acho que terminamos aqui, a não ser que tenha outras perguntas. Boa sorte com a sua situação. O médico ficou de pé e voltou a apertar a mão de Luca, retirando-se e deixando Luca a sós com seus pensamentos. Ele podia ter filhos. Da maneira tradicional. A ideia jamais lhe ocorrera. Os oncologistas foram tão fatalistas no tocante às suas perspectivas que ele presumira o pior. Depois presumira o pior a respeito de Claire. Claire, a mulher tão maltratada pelo marido que relutara tanto em confiar nele. A mulher que o aceitara como ele era. A mãe de seus filhos. Ele a tratara tão mal. Luca jamais pensara que pudesse ser tão cruel com alguém de quem gostasse; no entanto, as palavras brutais deslizaram de sua língua. Esperava que fosse capaz de pedir desculpas com igual facilidade. Luca resolveu voltar para o apartamento andando. Precisava de um tempo para processar tudo. Isso significava algum tempo longe da família. Nenhum de seus familiares sabia o que acontecera com Claire após deixarem Martha’s Vineyard, mas saberiam que havia algo de errado se o vissem agora. No caminho, passou pelo prédio da Brooks Express Shipping e pensou que talvez Gavin pudesse lhe dar algum conselho sobre como se redimir com Claire, após tudo que dissera e fizera. No saguão do prédio, ligou para o amigo e ficou aguardando. – Já se deu conta de que é a terceira vez que me liga no último mês? Estou começando a me sentir especial. Luca suspirou. – Estou no saguão. Está na empresa? – Estou. Tenho uma reunião em meia hora; contudo, por ora, sou todo ouvidos. Luca pegou o elevador até o andar do escritório de Gavin. Quando entrou

Luca pegou o elevador até o andar do escritório de Gavin. Quando entrou na sala, Gavin ergueu os olhos do computador com uma expressão de expectativa. – E então? Seus meninos conseguem nadar? Luca teve de rir ante a maneira como o amigo abordou uma questão tão delicada. – Sim, conseguem. Não vão ganhar nenhuma medalha, mas chegam ao outro lado da piscina. – Parabéns. Sente-se. – Gavin indicou a poltrona diante de si. – Isso exige uma comemoração. Ele dirigiu-se até o bar, onde serviu um líquido cor de mel em dois copos. Trazendo-os de volta para a mesa, passou um deles para Luca, sentado na poltrona indicada. Ele franziu a testa ao olhar para o amigo. – O que foi? Não parece muito entusiasmado com a notícia. – Estou bem. É sério. É só que saber a verdade torna muito pior a minha briga com Claire. Tenho de recuperá-la, de alguma maneira, mas não sei se ela me perdoará após tudo que eu disse. – Por acaso você a ama? Luca assentiu sem hesitação. Na realidade, nem pensara nisso, mas, no instante em que Gavin fez a pergunta, a resposta apareceu em sua cabeça como a clareza do dia. Claire era diferente de todas as mulheres que já conhecera. Desde o dia em que brigaram, andava por aí com um enorme buraco no peito. Sentia saudades dela. Sentia saudades de Eva. E, agora, sentia saudades até do bebê crescendo no ventre dela. Da primeira vez, não estivera por perto para levar Claire ao médico, para escutar os batimentos cardíacos de Eva, para lhe satisfazer os estranhos desejos. Se não consertasse logo isso, perderia a segunda chance de ter uma plena experiência de paternidade. – Estou perdidamente apaixonado por ela, Gavin. – Tudo bem. – Gavin franziu pensativamente a testa. – Então por que diabos está aqui no meu escritório dizendo isso para mim, em vez de na porta da casa de Claire, dizendo isso para ela? – Não é tão simples assim. Jamais senti algo tão profundo por alguém. Sempre me senti como o brinquedo quebrado que ninguém iria querer, de modo que sequer me permiti sonhar com algo assim.

Gavin simplesmente sacudiu a cabeça. – Você é um tolo. É um sujeito bem-sucedido. Não é feio. – Puxa, obrigado – falou Luca secamente. – A questão é que é um partidão. Mesmo com apenas um testículo. Luca ignorou a brincadeira do amigo. – Não sou um partidão. Sou uma bomba-relógio. E daí se eu disser para Claire que a amo? E se ela me perdoar e nos casarmos e tivermos o bebê juntos? E se eu fizer tudo isso e o câncer retornar? Ela já foi viúva uma vez. Não posso fazê-la passar por isso de novo. – Não pode viver a sua vida esperando a morte. Está na hora de começar a viver de verdade. Qualquer coisa pode acontecer a qualquer um de nós. Eu poderia ser atropelado, ou ser fulminado por um aneurisma aqui mesmo na minha mesa, sem nenhum aviso. Já faz muito tempo que está em remissão. Pare de permitir que a sua doença o impeça de viver. Se não a procurar, virtualmente a terá enviuvado de qualquer forma. Ela vai criar os seus filhos sozinha. – E se ela preferir ficar sozinha, a ficar comigo? – Nesse caso, a escolha será dela. Não pode tomar as decisões pelos outros. Eu fiquei anos sem Sabine porque ela decidiu que não éramos feitos um para o outro. Se a escolha fosse minha, eu jamais a teria deixado sair pela porta. Mas tem de dar a ela a oportunidade de escolher. Luca sabia que Gavin tinha razão. Tinha de colocar de lado todas as suas antigas ansiedades. Se o câncer voltasse, então voltara. Pelo menos, desta vez, teria Claire e as crianças para lhe dar motivos para lutar ainda mais. Contudo, sabia que uma recepção calorosa não o estava aguardando. Precisava fazer um gesto grandioso. Tinha de ser algo que significasse mais do que qualquer outra coisa para ela. E nada no mundo importava mais para Claire do que Eva. Luca sabia o que tinha de fazer. Pegou o telefone e ligou para o advogado. COM MOVIMENTOS lentos, Claire subiu as escadas da sua casa. Estava no início da gravidez, mas isso, combinado ao retorno da sua rotina após um mês fora, já a estava deixando exausta. Ao abrir a porta da frente, encontrou Daisy e Eva brincando no chão da

Ao abrir a porta da frente, encontrou Daisy e Eva brincando no chão da sala de estar. A babá, na mesma hora, ficou de pé e veio dar um abraço em Claire. – E aí, mamãe, como foi a consulta com o médico? Claire mostrou para ela a imagem do ultrassom. Não que houvesse muito para ser visto. Apenas uma mancha indistinta que lembrava um feijão. Daisy pegou a foto das mãos dela. – Parabéns. Nem acredito que, após todo o trabalho para ter Eva, você tenha engravidado com tanta facilidade. Claire assentiu distraidamente, mas, no fundo, não estava dando ouvidos à babá. Durante a última semana, parecia passar os dias como se fosse sonâmbula. Com certeza não estava dormindo à noite. Não conseguia se concentrar. Tudo que se repetia incessantemente pela sua cabeça eram as coisas terríveis que Luca lhe dissera. – Eu estava pensando, se enrolássemos Eva em um pouco de farinha de mesa podíamos fritá-la que ela ficaria bem crocante. – Que bom – disse Claire, automaticamente. – Claire! – Daisy exclamou. – Você nem está me escutando. – Eu estou – insistiu ela. – E com o que acaba de concordar? Com um suspiro, Claire sacudiu a cabeça. – Não faço ideia. – Sente-se – exigiu Daisy, apontando para o sofá. Sem querer discutir, Claire obedeceu. Daisy sentou-se ao lado dela, e Eva continuou brincando no chão diante do sofá. – O que está acontecendo? Claire abriu a boca para responder; contudo, antes que pudesse dizer uma palavra que fosse, lágrimas vieram aos seus olhos e tudo que escapou de seus lábios foi um soluço. Daisy a abraçou, puxando-a para si. Foram necessários vários minutos e uma blusa ensopada, mas, com o tempo, Claire acabou se sentando, enxugando os olhos e lhe contando a sua triste história. – Ele não acredita que o bebê seja dele. Não sei como ele pôde dizer uma coisa dessas. Eu passei o último mês com ele. De quem o bebê poderia ser? – Ele acabará caindo em si. Como você mesma disse, ele parece ter passado

– Ele acabará caindo em si. Como você mesma disse, ele parece ter passado muitos anos acreditando que jamais poderia acontecer. Acreditar que é pai significa que tudo que ele sabe é errado. É um golpe duro, encarar que jogou fora os últimos dez anos de sua vida, apavorado demais para se apaixonar e decepcionar a esposa. É mais fácil empurrá-la para longe com acusações furiosas do que encarar o fato de que foi covarde demais para descobrir se realmente era estéril esse tempo todo. Claire escutou, assentindo lentamente, mas não estava convencida de que Luca fosse se dar conta de que estava errado. Luca era teimoso. Poderia ser necessário um exame de paternidade ordenado pelo tribunal, depois do nascimento do bebê, para convencê-lo da verdade. A essa altura dos acontecimentos, ele poderia pedir desculpas até ficar roxo que não faria diferença. Não sabia se poderia perdoá-lo pelo modo como ele a tratara. – A pior parte é que eu me permiti apaixonar-me por ele, Daisy. Fui tão tola. Ele soube fazer tudo certo. Já fazia tanto tempo desde a última vez que eu me senti como se um homem realmente gostasse de mim. Eu devia estar desesperada por afeição. E veja só onde acabei… grávida e sozinha. – Não está sozinha, Claire. Tem a mim. Tem Eva. Tem esse novo bebê. Com ou sem o bilionário parasita, vamos achar um modo de fazer isso dar certo. – Como? – Eu virei morar aqui. Serei sua babá em tempo integral e a ajudarei a cuidar das duas crianças. Somos duas mulheres fortes, inteligentes e capazes. Ficaremos bem sem um homem. Para ser franca, só precisamos deles para dar o pontapé inicial no processo da maternidade; depois, eles são meio inúteis. Claire riu, enxugando o que restou de suas lágrimas. – Tem razão. Ficaremos bem. Independentemente do que aconteceu entre nós dois, estou saindo desta com outro lindo bebê. Jamais sonhei que poderia ter outro. Está na hora de começar a encarar isso como a bênção que verdadeiramente é. – É assim que eu gosto de ver. Eva já está jantada e de banho tomado. Agora, vá jantar e relaxe um pouco. Eu a verei amanhã, está bem? Claire assentiu. – Obrigada pela conversa encorajadora, Daisy. Você merece um aumento. Rindo, Daisy se levantou do sofá.

– Eu a lembrarei disso quando estiver preenchendo o meu próximo contracheque. Pegando o casaco, ela lhe deu “boa noite” e saiu pela porta da frente. Quando a porta se fechou, Claire inspirou fundo e tentou fazer o que Daisy mandou que fizesse. Pegou Eva do chão e a carregou até a cozinha. Colocou-a no balancinho para distraí-la tempo o suficiente para que esquentasse o jantar que Daisy deixara pronto para ela. Ao sentar-se à mesa, viu que havia algo escrito no bloquinho que Daisy usava para anotar recados. Stuart, seu advogado, havia ligado. Pegou o celular na bolsa e viu que havia uma ligação perdida dele. Devia ter sido quando estava na consulta médica. Ela apertou um botão para escutar a mensagem de voz. – Claire, é Stuart. Preciso que me ligue hoje. A hora que for. A mensagem fora tão vaga. Será que Luca voltara atrás e estava requerendo a guarda plena de Eva? Da última vez que vira Luca, ele estivera furioso o bastante para fazer qualquer coisa. Será que tentaria tomar Eva dela apenas para magoá-la? Melhor deixar de especulações e ligar logo para Stuart. Enlouqueceria se não o fizesse. – Claire – falou Stuart, ao atender o telefone. – Obrigado por retornar a ligação. Recebemos um pedido para encontrar Luca e o advogado dele amanhã de manhã. – Sabemos se são boas ou más notícias? – Não faço ideia. Não estava esperando ter notícias deles por agora. Tem alguma noção? Como foi a viagem com o sr. Moretti? Não nos falamos desde que voltou de Martha’s Vineyard. Era uma pergunta complicada de responder. – Correu tudo bem na viagem. Acho que chegamos a um acordo. Talvez seja apenas para finalizar os detalhes e apresentar ao juiz. Stuart hesitou na linha. – O que não está me contando, Claire? Algo em seu tom de voz me diz que deixou algo de fora. – Bem, isso é porque eu deixei. As coisas ficaram um pouco complicadas desde que deixamos Martha’s Vineyard, de modo que não sei se Luca vai

cumprir o combinado. Stuart suspirou pesadamente. – O que houve quando voltaram? – Descobri que estou esperando um filho de Luca. – Está grávida? Eu deveria ter sabido que vocês dois viajando juntos por um mês não resultaria em boa coisa. Estão juntos agora? Detesto dizer isso, mas provavelmente seria benéfico para a causa se estivessem. – Não estamos mais – admitiu Claire, dando fim às esperanças do advogado. – Ele não levou muito bem a notícia sobre o bebê. Deixou bem claro que não achava que fosse dele e ficou zangado com a coisa toda. De modo que, como eu disse, não faço ideia do que enfrentaremos amanhã. – Sabe, ao longo do último ano, tenho pensado um bocado em me aposentar. Talvez você seja a cliente que me levará a dar o passo derradeiro. Claire teve de rir. Sabia que Stuart trabalharia até cair duro em uma sala de tribunal, mas, ainda assim, ele reclamava. – Veja por este ângulo, Stuart… Você só precisa me representar no tribunal. Já esta é a minha vida. – Tem razão. Eu a encontrarei amanhã de manhã, às 8h45, no escritório de Edmund Harding.

CAP ÍTULO 12

– TEM CERTEZA de que quer fazer isto, Luca? Só lhe restam alguns minutos para mudar de ideia. Luca desviou o olhar da janela com vista para o Central Park para fitar o advogado. – Sim. É o que tenho de fazer. – Na verdade, não, não tem – contra-argumentou Edmund. Estivera tão irritado com Luca desde que ele começara a mudar os acordos que ele dera tanto duro para redigir! – Não há nada que diga que precisa abrir mão da guarda da criança só porque foi grosseiro com a mãe. – Não estou abrindo mão da guarda. Estou apenas concordando com termos que a deixarão mais feliz. É o mínimo que posso fazer, depois de tudo. – E quanto a você? O que o deixará feliz? Estamos falando dos seus filhos. Os filhos que jamais pensou que teria, devo acrescentar. – Ver Claire feliz me deixará feliz – respondeu ele, sem qualquer hesitação. E era verdade. Por mais que aquilo fosse difícil, precisava, mais do que qualquer outra coisa, ver Claire sorrir. A expressão de mágoa e desespero no rosto dela naquela noite no apartamento o assombrara por dias. Estava disposto a fazer de tudo para consertar isso, mesmo que fosse abrir mão da maior parte dos direitos sobre os filhos. Após uma batida de leve à porta, a recepcionista esticou a cabeça para dentro da sala. – Senhor Harding, a sra. Douglas e o sr. Ewing estão aqui para o seu compromisso das nove.

Edmund assentiu tristemente e olhou para Luca. – Última chance. Luca fez um gesto de pouco-caso. Sabia o que tinha de fazer e não estava nem aí se o advogado gostava ou não. – Podem entrar. Luca não sabia ao certo para onde olhar quando a porta se abriu. Não sabia o que veria nos olhos de Claire. Inspirando fundo, ergueu o olhar no instante em que ela entrou no escritório, logo atrás do advogado. Seus olhares se encontraram, e Luca soube que estava fazendo a coisa certa. Não havia o menor vestígio de animosidade ali. Estava ansiosa, exausta, triste, mas não zangada. Fora ele a estar zangado, a descontar nela. Claire estava ali apenas para saber que tipo de punição estava prestes a sofrer porque ele achava que ela estava mentindo para ele. Eles se acomodaram nos assentos, e Luca se contorceu ligeiramente na cadeira. Sua atenção estava toda concentrada em Claire. Ela não parecia estar bem. Parecia tão esgotada quanto quando ele a levara para Martha’s Vineyard. Um mês de sol, boa comida e amor a mudara; contudo, agora, era como se jamais houvessem viajado. – Está se sentindo bem? – perguntou ele. Todo mundo ao redor da mesa, inclusive Claire, parecia surpreso. O olhar dela se estreitou sobre ele por um instante, antes de ela assentir. – Estou bem. Estou apenas tendo um primeiro trimestre difícil. Foi o mesmo com Eva. Obrigada por perguntar. Seu tom foi frio. Ele merecia. – Senhor Harding. Minha cliente e eu estamos curiosos no tocante ao motivo desta reunião. Apareceremos diante do juiz na quinta-feira. É um pouco tarde para começar a fazer mudanças no acordo a que chegaram o sr. Moretti e a sra. Douglas durante a viagem. – Eu entendo – disse Edmund. – Como estou certo de que está sabendo, o acordo foi feito com respeito a Eva. O acréscimo de uma segunda criança à equação fez necessário que tivéssemos uma outra discussão. – Alto lá – disse Stuart. – Pelo que sei, o sr. Moretti se recusou a reconhecer o filho como sendo seu, e jurou para a sra. Douglas que não ia querer direitos

de visitação. Está me dizendo que o sr. Moretti está reconhecendo o segundo filho da sra. Douglas como também sendo seu? – Sim, ele está – retrucou Edmund. O olhar de Luca estava fixo no de Claire quando o advogado deu a notícia. Os olhos dela se arregalaram de surpresa, antes que ela se voltasse para ele boquiaberta. Luca conseguiu apenas assentir, torcendo para que a sua expressão arrependida deixasse bem claro o quanto lamentava tudo aquilo. – O sr. Moretti está exigindo algum exame para confirmar a paternidade da criança? – Stuart prosseguiu. – Não, ele não está. A irritação de Edmund estava clara na voz. Stuart parecia frustrado com a situação toda. Aparentemente, haviam vindo até ali esperando uma batalha, e foram pegos com a guarda baixa. Luca viu o advogado de Claire curvar-se para ela e lhe dizer algumas palavras. Conversaram baixinho por alguns instantes, os olhos de Claire encontrando os dele uma ou duas vezes. – Sinto muito – disse Stuart, por fim. – Da última vez que nossos clientes conversaram, ficou bem claro que o sr. Moretti acreditava que o filho não fosse seu. Apesar de apreciarmos que o seu cliente não esteja mais acusando a sra. Douglas de estar mentindo, posso perguntar o que provocou essa súbita mudança de opinião? Edmund virou-se para Luca, que assentiu. Inspirando fundo, o advogado disse: – O sr. Moretti se submeteu a exames médicos para confirmar o diagnóstico anterior. Foi determinado que ele é um candidato válido para a paternidade do segundo filho da sra. Douglas. O queixo de Claire caiu. Houve um momentâneo brilho de empolgação nos olhos dela, como se ela quisesse congratulá-lo pela notícia fantástica. A luz rapidamente se apagou. Considerando que estava grávida, ela já sabia que ele era capaz de ter filhos. Tudo que mudara é que, agora, ele também sabia. – Agora que o sr. Moretti reconhece a criança, como é que isto muda o acordo de guarda? – Stuart perguntou, dando sequência às negociações. Edmundo deslizou a pasta de documentos com o acordo atualizado por sobre a mesa. – Fiquem à vontade para examiná-lo. Presumo que sua cliente achará os

– Fiquem à vontade para examiná-lo. Presumo que sua cliente achará os novos termos aceitáveis. Luca observou enquanto Claire e Stuart reviam os documentos. De vez em quando, via Claire sacudir a cabeça e lançar um olhar na direção dele. Luca não entendia por que eles estavam demorando tanto para tomar uma decisão. Dera a Claire tudo que ela queria. Ele lhe dera guarda plena das crianças. Solicitara apenas direitos mínimos de visitação, menos de metade do que haviam acordado, de modo a não causar interrupções às rotinas das crianças. Triplicara o valor da pensão alimentícia solicitado. Até dera início a um generoso fundo fideicomisso para ambas as crianças. O que mais ela poderia querer? Ele não queria se afastar de vez para as crianças não acharem que não eram importantes para ele. Elas eram importantes. Mais do que tudo. Por fim, Stuart sacudiu a cabeça. – Eu sinto muito, mas esta oferta é inaceitável. Minha cliente quer mais. CLAIRE VIU a expressão do rosto de Luca ruir ante a declaração do seu advogado. Sabia que era um risco, mas um que tinha de correr. Sim, a oferta era tudo que ela poderia ter esperado quando deram início àquele processo; contudo, agora, tudo mudara. Estava faltando um elemento crucial… Luca. Com o que ele estava oferecendo, poderia facilmente criar duas crianças sozinha. Elas poderiam cursar as melhores escolas de Nova Iorque e terem tudo que pudessem querer. Tudo exceto um pai. – O que você quer, Claire? Quer que eu abra uma veia e sangre por você? Porque posso fazer isso. Era a primeira vez que ele falava desde que chegaram ali. Era tão estranho, tão formal, ter Stuart e Edmund se encarregando de falar tudo entre eles. Quem dera pudesse fazer os advogados desaparecerem por dez minutos que fosse para que pudessem falar de verdade. Luca havia reconhecido que o filho era dele. Aquele acordo atualizado era o mais próximo de um pedido de desculpas que ele era capaz de oferecer. Mas ela queria mais. Ele passara semanas lhe dizendo que ela valia muito mais do que Jeff lhe dera. Finalmente decidira acreditar nele e estava prestes a fazer suas exigências. – Isto não chega nem perto de ser o suficiente. Seu dinheiro não significa

– Isto não chega nem perto de ser o suficiente. Seu dinheiro não significa nada para mim. Quero que peça desculpa por todas as coisas terríveis e cruéis que disse para mim. Quero que peça desculpa por me acusar de dormir com outro e por ameaçar chamar a segurança para me expulsar. E, quando eu estiver satisfeita, eu vou querer você, Luca. O olhar dele se chocou com o dela por um instante. Ele engoliu em seco e ajeitou-se na cadeira. – Cavalheiros, será que podem nos dar um instante a sós? – Luca, eu não o aconselho a… – A sós – repetiu ele, em um tom de voz que não deixava dúvidas no tocante ao que queria. Claire apertou tranquilizadoramente a mão de Stuart, e os dois homens se levantaram. Deixaram a sala, fechando a porta atrás de si. Houve alguns instantes de tenso silêncio, antes que Stuart falasse: – Eu sinto muito, Claire. Apesar da vontade de responder, ela se conteve. Sem os advogados presentes, queria saber o que ele tinha a dizer. – Não estou dizendo isso porque você está exigindo. Estou dizendo porque precisa ser dito. Você tem toda a razão. Eu sinto muito por ter duvidado de você. Sinto muito por ter dito todas aquelas coisas terríveis. Eu só não conseguia acreditar que… – Sua voz falhou, e ele abaixou o olhar. – Durante tanto tempo, eu me senti tão incompleto. Ter câncer me privou de tanto! Não apenas da minha infância e da crença juvenil de minha própria imortalidade, mas da minha autoestima. Minha sensação de segurança. Claire o viu levantar-se da mesa e adiantar-se até a janela. – Tinha razão em tudo que disse naquele dia. Fiquei assustado. Eu adiei saber a verdade durante tanto tempo, porque me deixava um pequeno vestígio de esperança. Quando eu soubesse com certeza, não haveria mais jeito. Mas procurei o médico após a nossa briga. – Ele deu às costas para a vista e olhou para Claire. – Posso ter filhos. Jamais sonhei que um médico pudesse me dizer isso, mas ele disse. Contudo, em vez de ficar feliz, eu me senti terrível porque sabia que você não merecia as coisas que eu disse naquele dia. – Cruzando a sala, ele deteve-se diante de Claire. – Estava falando sério antes? Que ainda me quer mesmo após tudo que eu disse e fiz?

Luca ajoelhou-se diante dela, tomando as mãos dela nas suas. Claire sentiu o peito se apertar. – Eu estava falando muito sério. Não quero o seu dinheiro, Luca. Jamais quis. E aprecio a sua oferta de me dar plena guarda das crianças. Mas não é o suficiente. Quero que meus filhos tenham um pai. Quero que o tenham em suas vidas. A postura de Luca relaxou, seu olhar se voltando para os dedos entrelaçados. – E quanto a você? Também me quer em sua vida, Claire? – Eu não sei. Muito disso depende de você. Um homem muito inteligente certa vez me disse que a mulher é uma dádiva a ser valorizada. Já passei tempo demais sendo tratada como menos do que isso. Independentemente de qualquer coisa, vou querê-lo na vida das crianças; porém, para estar na minha, vou querer tudo. Não me contentarei com menos. Luca assentiu lentamente. – Jamais quis que uma mulher se contentasse comigo, e não quero que você tenha menos do que merece. Com egoísmo, eu lhe direi que a amo, Claire. O tempo que passamos separados foi agonizante. Sem dúvida quero que nossos filhos façam parte da minha vida, mas serei sincero ao dizer que me matará um pouquinho vê-la cada vez que as crianças passarem de uma casa para a outra. Não é o que eu quero. Quero que sejamos uma família, juntos, mas estou preocupado. – Com o quê? – Estou preocupado que eu possa voltar a ficar doente. Precisa saber que essa é uma possibilidade real. Se puder aceitar isso e quiser que sejamos uma família, tudo bem. Se perdê-la é o preço que pagarei por meus pecados, também aceitarei isso. – Pecados? Você não cometeu pecado algum, Luca. Apenas sofreu. Nós dois sofremos. Permitimos que essa decepção se colocasse entre nós. Não podemos permitir que isso volte a acontecer. Luca a fitou com um brilho de esperança no olhar. – Isso significa que há esperança de sermos “nós” novamente? Apesar das lágrimas, Claire assentiu. – Eu o amo demais para simplesmente virar as costas para isso.

O sorriso largo no rosto de Luca provocou um aperto no coração de Claire. – Você me ama? – Amo. Subitamente, Luca a fitou com uma expressão séria no rosto. – Estamos apaixonados, você vai ter o meu filho, e já estou de joelhos. Suponho que reste apenas uma coisa para eu fazer, Claire. Ela estremeceu. Ele realmente ia…? – Claire Marianne Lawson – começou Luca–, você entrou na minha vida da forma mais inesperada e me deu o maior presente que eu poderia ter imaginado… nossa linda Eva. Estar com você resultou em alguns dos momentos mais felizes da minha vida. Todos os dias, quero sair da cama e encontrar uma maneira de fazê-la sorrir. Quero fazer isso pelo resto da minha vida. Será que me permitirá fazer isso me concedendo a honra de ser minha mulher? Antes que ela pudesse responder, Luca tirou uma caixinha de veludo do bolso. Abriu a tampa e revelou um lindo diamante solitário ovalado em seu interior. De um dos lados da aliança havia uma safira azul-escura. Do outro, uma pedra azul mais clara. – A safira é para Eva, já que ela nasceu em setembro – explicou ele. – O topázio azul é para o novo bebê. Pelos meus cálculos, ele, ou ela, chegará em dezembro. Os olhos de Claire se encheram de lágrimas. – Sim – disse ela, se dando conta de que ainda não respondera à pergunta tão importante. – Sim, eu me casarei com você. Luca deslizou a aliança para o dedo dela. Claire mal olhou para a joia, antes de puxar o rosto de Luca para si. Seus lábios se encontraram. Ele não desapontou. Puxou-a para si, ficando de pé. Claire não conseguiu se saciar dele. Chegara perto demais de perder o seu toque para sempre. Por fim, Luca recuou, mas não permitiu que ela deixasse os seus braços. – É melhor pararmos. Acho que Edmund não gostará muito se eu fizer amor com a minha noiva na mesa dele. Claire sorriu ante o modo como ele se referiu a ela. – Bem, considerando o quanto o meu noivo paga pelos serviços dele, acho que podemos fazer o que bem entendemos.

– Em breve – prometeu ele. – Antes de irmos, tenho uma pergunta. Como soube o meu nome de solteira? Luca sorriu. – Você verificou os meus antecedentes, e eu verifiquei os seus. Nada mais justo, não acha? Ela sorriu. – Sem dúvida. Descobriu algo interessante? – Que tirou um D em química e que listou comida tailandesa como sendo a sua favorita no Facebook. É sério? Tailandesa? – Posso ter de atualizar isso. Atualmente, estou tendendo à italiana. – É melhor que esteja mesmo. – Ele suspirou. – Pronta para contar as novidades aos tubarões? Claire assentiu. – Vamos acabar logo com isso, para que eu possa levá-lo para casa e tirá-lo desse terno. – Edmund! – Luca gritou. Um instante depois, a porta se abriu e os dois advogados adentraram a sala, fitando curiosamente Luca e Claire, um nos braços do outro. – Sim? – Retire o pedido de guarda. Não precisaremos ir ao tribunal – anunciou Luca, sem tirar os olhos de Claire. – Não precisaremos? – Não – respondeu Claire, com um sorriso. – Em vez disso, iremos para a igreja.

EP ÍLOGO

Quatro de julho Martha’s Vineyard –

N ÃO VAI fechar.

Claire estava em total estado de pânico. O casamento começaria em menos de meia hora e sua desenvolvida barriga e seios inchados estavam causando sérios problemas com o vestido. – Vai fechar – garantiu Daisy. – Fez as últimas alterações uma semana atrás. Não ficou tão grande assim na última semana. Claire prendeu a respiração e sentiu Daisy puxar e gemer ligeiramente; em seguida, escutou o zíper subir até o topo. – Graças a Deus – disse, com um suspiro de alívio. – Ah, Claire. – Antonia Moretti adentrou a suíte principal do chalé e passou os olhos pelo belo vestido sem alças de corpete trabalhado. – Você está linda. Luca ficará sem fôlego quando a vir. Ela torcia para que sim. O casamento fora organizado tão rapidamente que ela estava nervosa, mas não quis estar grávida de oito meses e enorme em todas as fotos do casamento. Por sorte, a maior parte das peças foi se encaixando com relativa facilidade. Gavin ofereceu a casa de praia em Martha’s Vineyard para a realização da cerimônia. Era a escolha perfeita, considerando que foi onde se apaixonaram. Uma banda local se encarregaria da música e o banquete seria providenciado pelo quiosque de frutos do mar no final da estrada. Em meio à conversa animada das irmãs de Luca, que estavam ajudando-a

Em meio à conversa animada das irmãs de Luca, que estavam ajudando-a com o cabelo e a maquiagem, Claire escutou uma batida de leve à porta. Daisy abriu a porta e, para a surpresa de Claire, lá estava a sua mãe, com Eva nos braços. – Mamãe? Sua mãe sorriu e adentrou o quarto. – Olá, Claire. Olhe só para você. Está ainda mais bonita do que sonhei. Claire correu para abraçar a mãe, que não via desde o casamento com Jeff. – Não acredito que você veio. – Morando do outro lado do país, posso ser terrivelmente negligente de diversas formas, mas não vou perder o casamento da minha única filha. Já é terrível que esta seja a primeira vez que estou vendo Eva. – Ela plantou um beijo na face gorducha do bebê. Como a dama de honra honorária, Eva estava usando um vestidinho branco. – Mas isso vai mudar. Seu padrasto e eu vamos nos mudar para Connecticut no mês que vem. Pode contar que vai me ver com mais frequência – acrescentou ela, com um sorriso. Claire mal conseguiu acreditar. Já estava satisfeita em ganhar a família grande e barulhenta de Luca como sua, mas ter a mãe tão perto novamente fez com que as lágrimas se acumulassem em seus olhos. Ela olhou para cima e inspirou fundo. Carla brigaria com ela se borrasse a maquiagem. – Detesto interromper a reunião familiar – disse Daisy–, mas está na hora de começar este casamento. As irmãs Moretti reuniram suas coisas e deixaram o quarto. Daisy estava encarregada de carregar Eva até o altar, de modo que a pegou dos braços da avó. – Venha comigo que vou pedir para que a sentem na frente. E, então, Claire se viu sozinha. Deu uma olhada rápida no espelho e pegou o seu buquê. Inspirou fundo, contendo a ansiedade. Não havia por que estar preocupada com o casamento. Jamais estivera tão certa no tocante a qualquer coisa quanto estava sobre casar-se com Luca. Descendo cuidadosamente as escadas, deteve-se no deque para aguardar a sua música de entrada. De lá, pôde avistar o arco de flores, debaixo do qual estavam o celebrante, Daisy, Eva e Luca. O olhar dele estava fixo nela quando Claire deixou a casa. Desta vez, eram

O olhar dele estava fixo nela quando Claire deixou a casa. Desta vez, eram os olhos dele que estavam reluzindo devido às lágrimas. Estava usando um terno de linho branco sem gravata, de modo a manter as coisas informais. Ainda assim, continuava sendo o homem mais lindo que ela já vira. Era difícil acreditar que aquele homem, o pai de seus filhos, estava para se tornar o marido dela. Era mais do que jamais poderia ter esperado. A música começou e todos ficaram de pé e se viraram na direção dela. Descalça, Claire adiantou-se, pisando sobre a macia areia dourada e seguindo na direção do seu final feliz.

Lançamentos do mês: P AIX ÃO 489 – AM OR DEFINITIVO – CATH Y W ILLIAM S Quando Becky Shaw fugiu para Cotswolds no Natal, esperava se aquecer na frente da lareira, não nos braços de Theo Rushing. Enquanto a neve se acumula lá fora, a química entre eles só aumenta. P AIX ÃO ARDENTE 21 – UNIÃO DE CONVENIÊNCIA – M ichelle Smart M inissérie – Casamentos M ilionários 4/4 Elizabeth Young mal consegue acreditar quando Xander Trakas anuncia que o casamento deles nunca foi anulado! Seria muito fácil se entregar de novo ao quase ex-marido, mas Elizabeth não está pronta para arriscar o seu coração novamente. DESEJO 257 – SEGREDOS SEDUTORES Tempestade de paixão – M aureen Child Tudo que Jake Hunter quer é paz e silêncio. Mas quando sua mãe manda Cassidy Moore visitá-lo, o caos é instaurado. A atração mútua sai de controle e, catorze meses depois, Cassie não consegue contar a Jake que teve seu filho. Mas o destino sempre pode dar uma ajudinha. Desejo compartilhado – Andrea Laurence Uma confusão em uma clínica de fertilidade faz com que Luca Moretti seja pai da filha de uma mulher que nunca conheceu. Para não abandonar sua filha, Luca tem trinta dias para convencer a viúva Claire Douglas de que o melhor para criança é estar com os dois pais lado a lado. JESSICA 284 – RECOM P ENSAS E DESAFIOS H erdeiro da vingança – M aisey Yates Foi o pai de Charity Wyatt que roubou de Rocco Amari, mas é ela quem pagará o preço de sua vingança. Entregar sua virgindade deveria ter sido o

suficiente, mas a noite quente com o italiano enigmático tem consequências inesperadas, e Rocco tem planos maiores para ela. Uma mentira conveniente – M elanie M ilburne Violet Drummond não aguenta passar mais um Natal solteira, e Cameron McKinnon parece o acompanhante platônico perfeito. Até ele revelar seu plano de tornar Violet sua falsa noiva para se livrar do interesse da esposa de um cliente. COLEÇÃO CASA REAL DE NIROLI 1 DE 4 O príncipe herdeiro – P enny Jordan Emily Woodford ama Marco Fierezza, mas não faz ideia de que ele é um príncipe! Quando descobre a verdade, fica devastada, pois Marco a vê apenas como sua amante, não como uma possível esposa. Mas o que o futuro rei de Niroli vai fazer quando descobrir que Emily está grávida? O príncipe plebeu – M elanie M ilburne Alessandro Fierezza foi sequestrado quando bebê e dado como morto. Mas quando o brilhante cirurgião Alex Hunter chega a Niroli para ajudar o rei, boatos dizem que ele é o príncipe desaparecido! Ao descobrir a verdade, Alex fica dividido entre o dever e uma mulher que nunca poderá ser sua princesa...

P róximos lançamentos: P AIX ÃO 490 – UM P RÍNCIP E ARROGANTE – Jennifer H ayw ard M inissérie Romances & Reinados 1 de 3 Uma última noite com Sofia Ramirez foi tudo que o Príncipe Nikandros Constantinides quis antes de voltar a Akathinia. Ao descobrir que não deixou Sofia sozinha, Nik terá que cancelar o casamento político e legitimizar seu novo reinado... com sua esposa e filho! COLEÇÃO P AIX ÕES CLÁSSICAS 001 – P OSSUÍDA P ELA P AIX ÃO – Kate W alker Guido Corsentino está determinado a reconquistar sua esposa! Por fora, Amber é perfeita e intocável, mas Guido conhece seu interior apaixonado, e sabe conseguir o que quer dela. Mas ela já o recusou uma vez, então ele vai protegê-la das consequências de suas ações... na cama! DESEJO 258 – M OM ENTOS DE SEDUÇÃO Uma noite quente – Kristi Gold O Sheikh Rayad Rostam dedicou toda a sua vida a proteger seu país... e a vingar a morte prematura de sua esposa. Por isso, a atração repentina pela aventureira correspondente internacional Sunny McAdams é inesperada, indesejada – e inegável. Amor inesquecível – Elizabeth Lane Por três anos, Angie Montoya escondeu seu filho da família de seu falecido noivo... até que o irmão dele os encontrou. Jordan Cooper quer o sobrinho em segurança e, para isso, exige que Angie se mude para seu rancho em Santa Fé. Mas como ela pode aceitar dividir um lar com o único homem cujo o beijo ela nunca esqueceu? JESSICA 285 – CONSEQUÊNCIAS & P ERDÃO

Consequências do desejo – M ichelle Smart Catalina sempre obedeceu às regras. A não ser por uma única noite de paixão com o bilionário francês Nathanial Giroud. E isso muda sua vida para sempre. Para proteger a pequena vida que cresce dentro de si, ela fará qualquer coisa, até mesmo desafiar o homem que ela deseja desesperadamente! Nove meses para o perdão – M aisey Yates Ódio é tudo que Elle St James sente pelo homem que uma vez considerou ser sua família. Apollo Savas destruiu a empresa de seu pai, mas ela tem a última carta do jogo! Depois de uma noite proibida, serão nove meses o suficiente para Elle perdoar o grego? COLEÇÃO CASA REAL DE NIROLI 2 DE 4 Seduzida pelo príncipe – Carol M arinelli Luca Fierezza transformou Niroli no paraíso dos ricos e famosos – e fez de si mesmo um bilionário. Megan Donvan foi presa por trabalhar no cassino de Luca, e o novo chefe será também seu novo herói! Agora, ela está à mercê de seu perdão... e de sua paixão! A princesa e o magnata – Natasha Oakley O bilionário sombrio Domenic Vincini deseja as riquezas abundantes da ilha de Niroli, incluindo a joia da coroa, a princesa Isabella Fierezza. Mas, se ceder à tentação, Isabella estará entregando a si mesma – e seu reino – ao seu pior inimigo...

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

C464s Child, Maureen Segredos sedutores [recurso eletrônico] / Maureen Child, Andrea Laurence; tradução Maurício Araripe. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Harlequin, 2017. recurso digital Tradução de: The cowboy’s pride and joy + The ceo’s unexpected child Formato: epub Requisitos do sistema: adobe digital editions Modo de acesso: world wide web ISBN 978-85-398-2517-2 (recurso eletrônico) 1. Romance americana. 2. Livros eletrônicos. I. Laurence, Andréa. II. Araripe, Maurício. III. Título.

17-43512 CDD: 813 CDU: 821.111(73)-3

PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM HARLEQUIN BOOKS S.A. Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Título original: THE COWBOY’S PRIDE AND JOY Copyright © 2014 by Maureen Child Originalmente publicado em 2014 por Harlequin Desire Título original: THE CEO’S UNEXPECTED CHILD Copyright © 2016 by Andrea Laurence Originalmente publicado em 2016 por Harlequin Desire Publisher: Omar de Souza Gerente editorial: Mariana Rolier Assistente editorial: Tábata Mendes Arte-final de capa: Ô de Casa Produção do eBook: Ranna Studio Editora HR Ltda. Rua da Quitanda, 86, sala 218 – Centro – 20091-005 Rio de Janeiro – RJ – Brasil Tel.: (21) 3175-1030 Contato: [email protected]

Capa Texto da capa Rosto Sumário TEMPESTADE DE PAIXÃO Querida leitora Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8 Capítulo 9 Capítulo 10 Epílogo DESEJO COMPARTILHADO Querida leitora Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8 Capítulo 9

Capítulo 10 Capítulo 11 Capítulo 12 Epílogo Próximos lançamentos Créditos
257 - Segredos sedutores_ Harlequin D - Maureen Child

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