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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo AUTORES Alexandre Antonucci Bonsaglia. Analista Jurídico na Procuradoria de Justiça Criminal. Graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pósgraduando em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Aline Beatriz Bibiano. Analista Jurídica na Promotoria de Justiça de Limeira. Especialista em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Graduada em Direito pela Fundação Universidade Federal de Viçosa. Ana Paula de Lima Prado. Analista Jurídica na Procuradoria de Justiça Cível. Graduada em Direito pela Fundação de ensino Eurípedes Soares da Rocha de Marília. Ana Sofia da Fonseca Pereira. Analista Jurídica da Procuradoria de Habeas Corpus e Mandado de Segurança em matéria criminal. Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito.
Anderson Novaes Vieira. Analista Jurídico na Promotoria Cível da Capital, setor de Fundações. Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direitos Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo e Especialista em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Caio Polidoro. Analista Jurídico da Procuradoria Criminal. Pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal pela Escola Paulista de Direito. Graduado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Camila Fonseca Recouso. Analista Jurídica da Procuradoria de Habeas Corpus e Mandado de Segurança em matéria Criminal. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Interesses difusos e coletivos pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo. Denis Fernando Balsamo. Analista Jurídico na Procuradoria Criminal. Mestre em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo. Especialista em Justiça Constitucional e Direitos Fundamentais pela Università di Pisa (Itália). Especialista em Direito Penal e Processual penal pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Elisama Lúcia Gonçalves Fernandes. Analista Jurídica do GAECO de Guarulhos. Especialista em Interesses Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Lívia Astolfi Duarte Neves. Analista Jurídica da Procuradoria Criminal. Graduada em Direito Pelas Faculdades Metropolitanas Unidas. Especialista em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo.
Leandro Joy Fukase. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Graduando em Ciências Socais pela FFLCH-USP. Pós-graduando em Interesses difusos e coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Lucas G. P. Uchôa. Analista Jurídico nas 7ª e 8ª Promotorias de Justiça de São Caetano do Sul. Pós-graduado em Direito de Família e Sucessões pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pós-graduado em Direito notarial e registral imobiliário pela Escola Paulista de Direito. Pós-graduado em Direitos Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Professor convidado da FAAP (Fundação Armando Álvaro Penteado).
Luciana Rachel Keiner. Analista Jurídica da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da Capital. Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Luiz Otávio de Oliveira Goiata. Analista Jurídico da Procuradoria de Interesses Difusos e Coletivos. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Especialista em Interesses Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Márcio Spagnuolo Furtado. Analista Jurídico da Procuradoria de Justiça Cível. Especialista em Direito Penal e criminologia pelo Instituto de Criminologia e Política Criminal. Mariana Dantas Catena. Analista Jurídica da Procuradoria Criminal. Michel Ferreira. Analista Jurídico na Procuradoria de Interesses Difusos e Coletivos. Especialista em Interesses Difusos e Coletivos pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Michelle Aparecida Belli de Souza. Analista Jurídica na Procuradoria de Justiça Criminal. Graduada em Direito, Especialista em Direito Civil e
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Empresarial aplicado e pós-graduanda em Gestão Pública pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. Fernando Latorraca. Analista Jurídico da Promotoria de Justiça de Diadema. Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direitos Humanos pela Escola Superior Verbo Jurídico. Renata Navarro Pereira. Analista Jurídica na Procuradoria de Justiça Criminal. Graduada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Direito Processual Penal e Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Renato Padilha Sewaybricker. Analista Jurídico na Promotoria de Justiça de Itu. Pós-graduando em Direito Constitucional e Direito Administrativo pela Escola Paulista de Direito. Rodrigo Kiyoshi Fujiwara. Analista Jurídico na Promotoria de Justiça da Comarca de Santa Isabel. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Rodrigo Nunes Serapião. Analista Jurídico na Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Santo André. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus. Sarah Barrera C. Salinas. Analista Jurídica na Promotoria de Justiça da comarca de Getulina. Graduada em Direito pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília. Conciliadora capacitada pela Escola Paulista da Magistratura. Vinícius Azeredo Lopes Corrêa de Pace. Analista Jurídico da Procuradoria Criminal. Graduado em Direito e Especialista em Direito Patrimonial pela Pontifícia Universidade católica do Rio de Janeiro.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Romance LI ou Das Sentenças Já vem o peso do mundo com suas fortes sentenças. Sobre a mentira e a verdade desabam as mesmas penas. Apodrecem nas masmorras, juntas, a culpa e a inocência. O mar grosso irá levando, para que ao longe se esqueçam, as razões dos infelizes, a franja das suas queixas, o vestígio dos seus rastros, a sua inútil presença. (Romanceiro da Inconfidência. Cecília Meireles)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Agradecimentos Agradecemos aos colegas e às colegas que tornaram essa ideia possível.
Dedicatória: Dedicamos o trabalho a todas e todos futuros novos colegas da carreira de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Apresentação
O I curso popular de questões para o IV Concurso de Ingresso à carreira de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo é uma ideia e atitude voluntária de um grupo de pouco menos de 30 Analistas, já concursados, lotados em diversas regiões do Estado, em Promotorias e Procuradorias de diversas áreas, e tem o objetivo de oferecer ajuda aos futuros colegas, disponibilizando uma apostila de questões e dois simulados, com dissertações e questões discursivas das matérias que serão cobradas na segunda fase. Não temos vinculação nem orientação com a Instituição nem com a Banca Examinadora. Embora aprendamos muito com o trabalho, o conteúdo é desenvolvido com base no altruísmo e como atividade extraprofissional.
A Apostila Esta apostila reúne questões por nós elaboradas, com uma abordagem dinâmica e focada das matérias a serem cobradas na segunda fase do concurso. Nós estudamos os temas, reunimos a legislação, doutrina e jurisprudência, e, baseados em provas anteriores de concursos jurídicos, escolhemos as questões cuja cobrança nesta segunda fase é provável. Mais à frente, detalharemos o uso esperado da apostila, para o máximo aproveitamento do conteúdo.
Os simulados Os simulados serão disponibilizados, em datas a serem divulgadas no nosso perfil, e estão previstos, um para a semana do dia 15 de outubro e outro em torno de 10 de novembro, e consistirão num treino da prova a ser aplicada. Duas dissertações e cinco questões. Os candidatos imprimirão os simulados, resolverão em casa, à mão e com a própria letra, e deverão nos enviar, para correção e um pequeno feedback, com orientações sobre as notas atribuídas e dicas para melhorar o desempenho na prova.
O curso é gratuito e foi feito de forma gratuita. Pedimos a compreensão por eventuais equívocos e eventual atraso nas respostas das mensagens. Procuraremos, na medida do possível, ajudar a todos, e, principalmente, a quem precisa.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
SUMÁRIO
Parte I – Mensagens, instruções e dicas
1. 2. 3. 4.
Apresentação do Curso................................................................ 7 Pequeno manual de utilização da apostila.................................. 9 Pequeno manual para a prova escrita........................................ 11 Sobre ser servidor e Analista Jurídico do MP........................... 24
Parte II – Questões
1. Direito Constitucional e Ministério Público.............................. 32 2. Direito Administrativo................................................................. 86 3. Direito Penal.............................................................................. 107 4. Direito Processual Penal.......................................................... 202 5. Direito Civil................................................................................ 315 6. Direito Processual Civil............................................................ 388 7. Direito da Infância e Juventude............................................... 430 8. Direitos Difusos e Coletivos.................................................... 487 9. Direito Comercial e Empresarial.............................................. 563 10. Direitos Humanos..................................................................... 584 11. Direito Eleitoral......................................................................... 602
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo APOSTILA DE QUESTÕES – COMO UTILIZAR? A apostila é uma forma didática e prática de imergir o candidato aprovado para a segunda fase do concurso de Analista nas matérias e na dinâmica da prova escrita. Para aproveitar ao máximo o conteúdo da apostila, recomendamos os passos seguintes: 1) Impressão da apostila – Totalmente opcional. Embora saibamos das dificuldades financeiras do concurseiro e das pessoas carentes, e estejamos totalmente atentos à questão ambiental, recomendamos a impressão da apostila, com recomendação de que seja em cópias com frente e verso (para maior economia), pois a apostila está montada e confeccionada com espaços próprios para o candidato treinar sua própria escrita após a questão. Se a impressão for excessivamente dispendiosa em termos financeiros, treine a escrita em um velho caderno que já tiver ou em algum rascunho que possua folhas pautadas e com linhas; conte um espaço de 10 a 15 linhas, 12, exatamente, que é o que normalmente a examinadora do concurso oferece para as questões (Isso é extremamente importante! Para escrever bem, é preciso escrever!); 2) Divida seu tempo de forma racional. Tente resolver, por dia, não várias questões da mesa matéria, mas pelo menos uma questão de cada matéria, com um enfoque maior nas matérias-chave, que são Penal, Processo Penal, Difusos e Processo Civil; 3) Na própria apostila, há, para cada tema, a questão, o espaço que reservamos para que você responda, e, logo abaixo ou na folha seguinte, a resposta e explicações pertinentes. Como no dia da prova você não poderá consultar qualquer material (lei seca, doutrina, súmulas etc.), é melhor que tente responder com o conteúdo sedimentado que já possui, e, terminada a resposta por você elaborada, confira no gabarito logo em seguida. Não se preocupe com os erros e não tenha medo de responder. Treinar é errar, e é errando que se aprende! A intenção da apostila é exatamente essa! Estimular o aprendizado e a preparação através do treino e da autocorreção pelo candidato, com a exploração do próprio potencial ao resolver as questões e o autodidatismo; se não souber, leia a resposta elaborada e reescreva, com as próprias palavras, a sua resposta. Desculpem a redundância, pessoal, mas queremos que saibam o quanto é importante que TREINEM A ESCRITA! 4) Autodidatismo – Pessoal, uma dica muito importante. Sabemos que todos, principalmente nessa fase do concurso, buscam sempre um “esteio” para apoiar-se, algum cursinho para dali tudo absorver ou o Professor “X” ou “Y”. Ótimo. Os professores e cursinhos, para quem tem
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo condições e disponibilidade, podem ajudar, mas garantimos que, nenhum, absolutamente nenhum deles irá se sentar na sua cadeira no dia 9 de dezembro e fazer a prova por você! São sua cabeça, sua mão e seu conhecimento que lá estarão, então, absorvam sim o conteúdo dos materiais que têm à disposição, mas, acima de tudo, observem-se respondendo e tomem cuidado de si, com autocrítica e a autoanálise do próprio conhecimento e escrita. Testem, escrevam, escrevam, escrevam, e quando cansarem, escrevam mais ainda. São só 2 meses. Dediquemse ao máximo. O resultado virá! Tenham certeza! Por isso, esgotem o conteúdo da apostila e percebam a evolução na sedimentação do conhecimento. 5) Se for mais proveitoso, atribua-se uma nota após a resolução da questão, comparando com o gabarito que ofereceremos. Afinal, cada questão vale 10 pontos, e cada um desses pontos é extremamente valioso e importante para a aprovação. Na apostila, separamos “questão-treino” e “questãoestudo”, tentando criar um modo mais didático e destinado a racionalizar seu tempo nas questões que efetivamente escrever. Estude todas elas! 6) Espaço e tempo – Vá dosando, se preciso com um cronômetro, o seu tempo de prova e o espaço de escrita. Você não terá mais tempo nem mais espaço para resolver as questões na sua prova. Portanto, atente para o tempo e espaço. 7) Crie um “ambiente de prova” – A intenção é imergir a todos aos poucos no “clima da segunda fase”. Assim, resolva as questões num ambiente silencioso, se possível, com tempo, cronometrado, e sem consulta! Se precisar, erre escrevendo no espaço mesmo sem saber, e depois, corrijase, olhando o gabarito que estará logo abaixo (se precisar, aliás, tape ou esconda o gabarito/resposta da questão, para que tente resolver primeiro, e, depois, errando ou acertando absorva o conteúdo). Mais uma vez, pessoal! Não tenham medo de errar! Errando é que se aprende!
Essas, as dicas de como utilizar a apostila. A seguir, alguns comentários sobre a sua prova da segunda fase, com base na experiência nossa para o mesmo concurso que você está prestando!
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo RESOLVENDO A PROVA ESCRITA
A seguir, comentaremos as disposições do Edital, para que todos tenham uma prova tranquila e com tempo, organização e estratégia. No Edital, são as seguintes as orientações para a prova escrita:
4.3. A Prova Escrita e Discursiva destina-se a avaliar o domínio do conhecimento jurídico e da prática processual, o desenvolvimento do tema na estrutura proposta, o domínio da norma-padrão, a adequação da linguagem jurídica, a articulação do raciocínio jurídico e a capacidade de argumentação, necessários ao desempenho do cargo. Comentários: A avaliação levará em conta tanto o conhecimento jurídico, quanto a sua capacidade de argumentação e dissertação. Treine e observe as suas construções textuais. Procure responder, efetivamente ao que o examinador te pergunta. Não é proibido “florear” ou colocar aquele conhecimento “extra”, que para você, é um diferencial, mas desde que já tenha respondido ao que o examinador te pergunta. A correção é feita com base em um espelho. Nesse espelho, há algumas palavras-chave ou frases que o examinador quer ver na tua prova. Procure identificar essas palavras-chave na matéria estudada e não deixe de as colocar na prova. Isso é imprescindível. Por exemplo, se o tema for tutela provisória no Processo Civil, não deixe de falar em “urgência” e “evidência”, caráter “cautelar” e “antecipatório”, caráter “antecedente” e “incidental”. Claro que dentro da construção e raciocínio do texto. Não estamos orientando a colocação de palavras soltas, não. O que estamos orientando é que não deixem de colocar os termos legais, de súmulas ou doutrina que demonstrem seu conhecimento. O examinador não sabe que você sabe o que ele quer que você saiba! Ele quer ver! Então, demonstre!
4.4. Da Prova Escrita e Discursiva, de caráter eliminatório e classificatório, constará 2 (dois) temas de redação e 5 (cinco) questões discursivas, versando sobre o conteúdo programático indicado no Anexo II deste Edital. As redações normalmente tratam de temas que permitem certa “abertura”, para desenvolvimento em 25 ou 30 linhas. Não perguntarão, por exemplo, numa dissertação, sobre um assunto “fechado” e curto, como o conteúdo de um artigo, somente, ou a diferença entre um crime e outro. É fato que na última dissertação de penal, o assunto foi prescrição, e, dentro do tema proposto, havia a prescrição virtual, que é tema de curto desenvolvimento e consta de Súmula do STJ, mas
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo era apenas parte de um texto que te obrigava a desenvolver todo o tema da prescrição. A seguir, faremos algumas apostas para os temas que podem ser cobrados em dissertação e orientaremos o estudo para as dissertações. Não é permitida a consulta, e, é possível, sim, que lhes sejam exigidos conteúdos que simplesmente constem em texto de lei, a famosa “lei seca”. Procurem, assim, memorizar os termos legais sobre os temas.
4.4.1. As redações versarão sobre os seguintes temas: a) primeira redação: Direito Penal ou Direito Processual Penal, com o conteúdo indicado no Anexo II deste Edital; Faça um estudo “redondinho” dos temas da parte geral de Direito Penal. Procure uma boa doutrina e guarde bem os nomes das teorias que circundam os temas. Nas teorias da Lei Penal no tempo e espaço, por exemplo, revise e repise bem as teorias da atividade e do resultado, da ubiquidade, princípios da territorialidade e a “territorialidade temperada” adotado pelo Brasil, nacionalidade ativa e passiva, defesa, justiça universal. Nada impede, porém, de cair na dissertação, algum crime específico da parte especial que tenha “potencial de abertura” suficiente para uma dissertação. Por exemplo: “Homicídio. Causas de diminuição de pena. Homicídio qualificado. Feminicídio. Homicídio culposo. Natureza da qualificadora do feminicídio”. Sem a pretensão de adivinhação, e, obviamente, desprovidos de qualquer informação da Banca ou da Instituição, para Penal e Processo Penal, sugerimos, para o aperfeiçoamento em redação, que procurem estudar bem e treinar redações nos seguintes tópicos, que apelidaremos jocosamente de “apostas”: Direito Penal 1) Lei penal no tempo. Retroatividade e Ultratividade. Conflito de leis penais no tempo. Combinação de leis penais. Lei penal temporária e excepcional. Lei penal em branco e conflito intertemporal. 2) Tempo do crime. Teorias. Teoria adotada pelo Código Penal. Teoria adotada para efeitos de prescrição. Tempo do crime e crime continuado e permanente. Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal. 3) Lei penal no espaço. Territorialidade. Território por extensão. Teorias. Ubiquidade, atividade e resultado. Exceções. 4) Extraterritorialidade da lei penal. Extraterritorialidade incondicionada, condicionada e “hipercondicionada”. Princípios.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 5) Princípios dirimentes do conflito aparente de normas penais. Conflito aparente. Conceito. Finalidade. Especialidade. Subsidiariedade. Consunção e alternatividade. 6) Fato típico. Conduta. Resultado. Relação de causalidade e tipicidade. 7) Relação de causalidade ou nexo causal. Conceito. Teorias. Concausas. Relevância da omissão e imputação objetiva. 8) Crime doloso. Teorias do dolo. Elementos do dolo. 9) Crime culposo. Natureza jurídica, fundamento da punibilidade, conceito e elementos do crime culposo. Tentativa. Culpa consciente e dolo eventual. 10) Tentativa. Conceito. Elementos. Natureza jurídica. Teorias sobre a punibilidade da tentativa. 11) Erro de tipo e Erro de Proibição. Teorias. Conceito. Discriminantes putativas. Erro determinado por terceiro. 12) Iter criminis. Conceito. Teorias. Fases. Exaurimento. Exaurimento como qualificadora. 13) Causas excludentes de ilicitude. Conceitos. Teorias. Causas supralegais de exclusão da ilicitude. Excesso. 14) Culpabilidade. Conceito. Teorias. Elementos. Dirimentes de culpabilidade. 15) Imputabilidade penal. Conceito. Momento para a constatação. Sistemas ou critérios para a identificação. Causas de inimputabilidade. Emoção e paixão. Embriaguez. A actio libera in causa. 16) Concurso de pessoas. Conceito. Requisitos. Autoria e participação. Circunstâncias incomunicáveis. 17) Pena. Conceito. Princípios. Teorias e finalidades. 18) Penas restritivas de direitos. Conceito. Natureza jurídica. Espécies. Requisitos. Penas restritivas e os crimes de Tráfico de Drogas. 19) Pena de multa. Conceito. Critério de aplicação. Pena de multa e Habeas Corpus. Pena de multa e violência familiar contra a mulher. 20) Concurso de crimes. Concurso material, concurso formal e crime continuado. Crime continuado e conflito de leis no tempo. 21) Suspensão condicional da pena e Livramento condicional. Conceito. Requisitos. Revogação. 22) Condenação penal. Efeitos principais e secundários. Efeitos secundários penais e extrapenais. Perda de mandato de parlamentares. 23) Da medida de segurança. Conceito. Distinção com a pena. Prazo mínimo e prazo máximo. 24) Extinção da punibilidade já foi cobrada no último concurso. Especificamente, cobraram prescrição.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Parte Especial 1) Do aborto. Conceito. Bem jurídico protegido. Aborto criminoso. Aborto legal ou permitido. Feto anencefálico. 2) Furto. Conceito e objetividade jurídica. Consumação: teorias. Furto insignificante, furto famélico e furto privilegiado. Furto noturno e furto qualificado. Sistemas de vigilância e monitoramento eletrônico e crime impossível. 3) Roubo. Conceito, objetividade jurídica. Roubo próprio e impróprio. Roubo simples, circunstanciado e qualificado. Emprego de arma, de arma de fogo e de arma de brinquedo. 4) Extorsão. Conceito e objetividade jurídica. Extorsão mediante restrição da liberdade da vítima e extorsão mediante sequestro. Delação premiada. Extorsão indireta. 5) Peculato. Conceito e objetividade jurídica. Sujeito ativo. Espécies. Peculato doloso e peculato culposo. Peculato mediante erro de outrem.
Leis penais especiais 1) Crimes hediondos. Conceito e fundamento constitucional. Critérios para determinação da hediondez. Vedações: anistia, graça e indulto. Regime de cumprimento de pena. Tráfico privilegiado. 2) Lei de Drogas. Tráfico de drogas. Mandamento constitucional de criminalização. Associação para o Tráfico. Tráfico privilegiado e hediondez.
Direito Processual Penal 1) Ação Penal. Espécies. Princípios. O Ministério Público e a Ação Penal. 2) Ação Civil ex delicto. Sentença penal condenatória e efeitos civis. Efeitos civis da absolvição penal. Estado de Necessidade agressivo e defensivo. 3) Provas: conceito e princípios. Ônus da prova no processo penal. Sistemas de valoração. Provas ilícitas e provas ilícitas por derivação. 4) Acusação e Julgamento. Mutatio Libelli e Emendatio Libelli. O papel do Ministério Público. 5) Prisão e medidas cautelares. Características. Princípios. Ministério Público e as medidas cautelares no processo penal. O poder geral de cautela no processo penal. 6) Nulidades no Processo Penal. Nulidades absolutas e relativas. Princípios relativos às nulidades. A reformatio in pejus indireta. 7) Recursos no processo Penal. Princípios, efeitos. Requisitos de admissibilidade. Embargos infringentes e Ministério Público.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 8) Habeas Corpus. Previsão constitucional, natureza jurídica, conceito e cabimento. Legitimidade ativa. Pessoa Jurídica e Habeas corpus. O Ministério Público. 9) Procedimento do Júri. Fundamento constitucional, competência. Princípios. Fases. Recursos cabíveis nos procedimentos do Júri e a atuação do Ministério Público. 10) Execução Penal. Princípios Constitucionais. Órgãos da Execução e o Ministério Público. 11) Organizações Criminosas. Conceito e caracterização. Infrações penais em que é aplicada. Meios de obtenção de provas. Colaboração premiada: objeto, benefícios, controle e requisitos. O Ministério Público.
Dissertação 2 (Processo Civil ou Tutela de Interesses Difusos e Coletivos) Direito Processual Civil 1) Princípios do Novo Código de Processo Civil. Promoção da solução consensual dos conflitos. Primazia da decisão de mérito. Efetividade. O princípio da boa-fé processual. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil. Cooperação. 2) Atuação do Ministério Público no Processo Civil. Atuação como parte e como fiscal da ordem jurídica. Hipóteses de atuação como fiscal da ordem jurídica. Consequências da não atuação do Ministério Público no processo em que seja obrigatória sua intervenção. 3) Litisconsórcio. Litisconsórcio simples e unitário. Litisconsórcio facultativo e necessário. Litisconsórcio multitudinário ou limitação do litisconsórcio. 4) Sistema de precedentes vinculantes no Novo Código de Processo Civil. Efeito vinculante e limites. Incidente de resolução de demandas repetitivas e Incidente de Assunção de Competência. 5) Tutela provisória. Tutela de urgência: antecipada ou cautelar e incidental ou antecedente. Estabilização dos efeitos da Tutela Antecipada. Tutela de Evidência. O Ministério Público como fiscal da ordem jurídica e a possibilidade de requerimento de tutela provisória. 6) Negociação processual. Cláusula geral de negociação processual: requisitos e pressupostos. Controle pelo Juiz. Calendário Processual. 7) Mandado de segurança. Previsão constitucional e hipóteses. Hipóteses legais de não concessão. Oitiva do Ministério Público e obrigatoriedade do parecer. Mandado de segurança coletivo. Legitimação, objeto e efeitos.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Tutela de Interesses Difusos e Coletivos 1) Interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. O Ministério Público e a defesa de tais interesses. 2) Ação Civil Pública. Conceito, objeto, legitimação ativa e passiva. Competência. Coisa julgada e Execução. Contextualize o papel do Ministério Público no desenvolvimento dos tópicos. 3) Proteção ao patrimônio público e social e improbidade. Ação de improbidade administrativa: objeto, legitimação e prazos. Atuação do Ministério Público e possibilidade de celebração de acordo. 4) Inquérito Civil. Natureza. Finalidade. Princípios. Poderes instrutórios do Ministério Público. Termo de ajustamento de conduta. 5) Direitos do Consumidor. Proteção e defesa. Ações coletivas. Atuação do Ministério Público na defesa dos direitos do Consumidor.
Na prova passada, em 2015, as dissertações envolviam os seguintes temas:
Direito Penal – Prescrição. Parte 1. Natureza Jurídica, conceito e modalidades. Parte 2. Prescrição virtual. A dissertação envolvia conhecimento da doutrina, da lei seca e jurisprudência, notadamente a Súmula do STJ que refuta a prescrição virtual.
Difusos e Coletivos – Disserte sobre os Direitos e interesses das futuras gerações, relacionando-os aos princípios da prevenção e precaução, na temática do dano ambiental. Conteúdo advindo da legislação (Constituição Federal) e doutrina. Conceito dos princípios da precaução e prevenção.
4.4.2. As questões discursivas versarão sobre as matérias não contempladas nas redações, conforme conteúdo programático indicado no Anexo II deste Edital. Pessoal, isso não significa que você não deve estudar os tópicos que elencamos nas “apostas” para as dissertações, ok? O parágrafo nos informa unicamente, que se um tema foi abordado na dissertação, não será cobrado nas questões.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Que tipo de questão poderá cair na segunda fase? O que estudar? Pessoal, é bom avisar a todos que as provas anteriores foram elaboradas por Bancas diferentes (IBFC e Vunesp). Tomemos como parâmetro a última prova, feita também pela Vunesp. As questões dissertativas aplicadas no III concurso, envolveram conhecimento da Lei (Lei seca), conhecimento básico da doutrina e informativos (STJ e STF).
Na prova de 2015, por exemplo, vejam o conteúdo das questões: Questão 1 – Processo Penal – Discorra sobre os efeitos do provimento da revisão criminal, de acordo com o disposto no art. 627 do Código de Processo Penal, exemplificando, e esclareça se há extensão ao sentenciado não recorrente, por aplicação do art. 580 do mesmo diploma legal. A questão, como se pode ver, envolvia conhecimento do art. 627 do CPP, que trata do reestabelecimento dos direitos afetados pelos efeitos penais secundários e efeitos extrapenais da condenação, como a devolução da fiança, recondução à função pública. Também envolvia conhecimento básico da doutrina e jurisprudência, que admitem a aplicação do art. 580 do CPP (efeito extensivo dos recursos) ao corréu que não apresentou a ação. 50% Legislação e 50% doutrina.
Questão 2 – Processo Civil – Considerando menor que se encontra em situação regular, pretendendo contrair matrimônio, cujos genitores não se opõem às núpcias, mas que por sua idade, necessita de suprimento de idade e de consentimento, pergunta-se: a) É o Juízo da Infância e Juventude competente para julgar a questão? b) Sendo necessária a intervenção do representante do Ministério Público, qual seria a consequência de sua não atuação no feito? Conhecimento de legislação, apenas. Competência da Justiça cível para apuração de caso que envolva menor que não esteja em situação de vulnerabilidade e possível nulidade pela não atuação do MP. 100% do conteúdo envolvia Legislação.
Questão 3 – Município “X”, localizado no Estado de São Paulo, cria o “Cartão Cidadão”, que será emitido somente para moradores do referido Município e passará a ser necessário para acessar os serviços de saúde municipais. O
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo munícipe que não apresentar o documento, ou aquele que for oriundo de outra municipalidade, terá atendimento de saúde negado nos estabelecimentos municipais. Pergunta-se: a medida imposta pelo Município “X” é constitucional? A resposta podia até ser dada com base apenas na Constituição Federal, com o uso dos princípios do atendimento pelo SUS e a proibição da criação de distinção de brasileiros. Mas, o candidato que acompanha os informativos do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, com certeza, deu uma resposta mais elaborada, mais completa, pois o assunto foi objeto de julgado. 50% Constituição e 50% Informativos.
Questão 4 – Poderá ser concedida remissão pelo Ministério Público ou pela autoridade judiciária, na forma do Estatuto da Criança e do Adolescente. Quais alternativas do Ministério Público, além de remissão ministerial, após oitiva informal do adolescente? Diferencie remissão pré-processual ou ministerial de judicial quanto à natureza jurídica e momento da concessão.
A questão exigia puramente o conhecimento do Estatuto da Criança e do adolescente. Art. 180 e 188 do Estatuto. 100% Legislação.
Questão 5 – Direitos Humanos – Cidadão portador de doença grave necessita de medicamento de alto custo, de uso contínuo, para sua sobrevivência, mas não possui condições financeiras de adquiri-lo nas quantias necessárias. O fornecimento gratuito não é realizado por unidades de saúde pública de nenhum dos entes federativos, alegando-se que tal medicamento não se encontra nas listas de fornecimento aprovadas pelo Ministério da Saúde. Tal cidadão procura o Ministério Público do Estado de São Paulo. Pergunta-se: Pode o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizar demanda a fim de que o medicamento seja fornecido ao indivíduo? Fundamente. 100% do conteúdo em informativo.
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Graficamente, então, nas questões discursivas:
QUESTÕES Informativos 30%
Lei seca 60% Doutrina 10%
Não estamos estimulando o abandono da doutrina. Absolutamente. Aqueles que já estão na estrada há algum tempo já sabem como organizar o próprio estudo. Já têm a dimensão exata do que mais precisam ler e possuem uma sedimentação maior do conhecimento. Aos que chegaram agora (há alguns que ainda nem formados estão), é preciso racionalizar o estudo para que cheguem competitivos na prova, e esse é o objetivo da esquematização do que já foi cobrado e de que forma foi cobrado. Algumas dicas, para as matérias da prova escrita, podem ser dadas: Penal e Processo Penal, são matérias que, para nós, é imprescindível o bom conhecimento teórico e o acompanhamento com uma doutrina dinâmica e direcionada às provas. Não obstante, estejam atentos ao conteúdo do Código Penal, das súmulas e dos informativos. Direitos difusos e coletivos também exige o conhecimento teórico de alguma doutrina que o candidato preferir, legislação e informativos. Consumidor, Ambiental, Improbidade, ACP e Criança e Adolescente são os mais cobrados. Para Processo Civil, pela “Pouca idade” do Novo Código, foquem nos temaschave da Legislação. Tutela provisória, Novo sistema de precedentes vinculantes, Negociação processual são boas dicas.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Direito Constitucional, Legislação do Ministério Público e Direito Administrativo, exigem conhecimento da Legislação e de informativos. Em Direitos Humanos, atenha-se também a uma doutrina explicativa básica e tenha atenção aos julgados recentes que envolvem o tema. Direito Civil e Empresarial, exigem, mormente, conhecimento da legislação. Direito Eleitoral, procure estar atento às recentes reformas constitucionais e legislativas envolvendo o tema. Não nos surpreenderíamos com uma questão de Direito Eleitoral, embora não tenha sido cobrada na última prova. Com base nesses panoramas, nessas peculiaridades e com o conhecimento de cada um de nós que preparamos o material, é que a apostila foi elaborada. Há, aqui, uma mistura de tudo (Lei, doutrina e jurisprudência), com foco total na segunda fase do nosso concurso. Aproveitem!
4.4.3. A Prova Escrita e Discursiva terá duração de 4 (quatro) horas, não podendo o candidato ausentar-se da sala, definitivamente, antes das primeiras 2 (duas) horas do seu início. Aqui, futuros colegas, aqui é lugar da morada de um dos maiores mistérios do mundo e com certeza o maior problema em provas escritas: O TEMPO! O mesmo tempo que intrigou Albert Einstein e é a exata medida da principal sanção do Direito Penal (a pena), pode ser o seu principal inimigo no dia da prova. Não tenha medo dele! Treine e saiba como medir seu tempo! É FUNDAMENTAL, ABSOLUTAMENTE FUNDAMENTAL, que você fique atento ao tempo e organize-se para a resolução das questões e das dissertações em 4 horas de prova. Divida o tempo como achar melhor. Você conhece suas dificuldades melhor que ninguém, e, vá se testando, a apostila é exatamente para isso. Marque no relógio o tempo de resolução de uma questão. Nada nos impede, entretanto, de sugerir algumas divisões racionais do tempo. São 2 dissertações, com até 30 linhas cada uma, e cinco questões, com até 12 linhas cada uma. Uma sugestão de divisão, é, uma hora para cada dissertação. Sobram 2 horas. 2 horas, são 120 minutos. Divididos por cinco questões, teríamos 24 minutos para cada questão. É um tempo apertado, mas suficiente. É pouco para as questões? Tente então, 50 minutos para cada dissertação. Sobrariam 140 minutos, divididos por 5 questões, resultariam em 28 minutos para cada questão.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Acalmem-se. A conta aproximada é uma hora para 30 linhas, mais uma hora para 30 linhas. Cinco questões, com quase meia hora cada.
É preciso escrever em todas as linhas disponíveis ou podemos ser concisos e privilegiar a capacidade de resumo, ganhando tempo com isso? Depende. Há dois tipos de concurseiros: os que acreditam em “lendas urbanas do examinador”, e os que acreditam e morrem de medo delas. Uma certa lenda urbana sempre nos é dita: “Escrevam em todas as linhas. Usem o máximo do espaço. Demonstrem conhecimento ao examinador”. De fato, meus caros. Vocês não chegaram até aqui para descrever, em duas linhas, o princípio da dignidade da pessoa humana, não? Mas é preciso lembrar que também não estão para escrever o Tratado de Direito Privado do Pontes (de Miranda). Responda exatamente o que foi perguntado e tente aproveitar o máximo do espaço dado, escrevendo em todas as linhas. Não obstante, tendo feito um bom texto, tendo respondido a todos os questionamentos, para obtenção de mais tempo, os que julgarem que foram concisos e precisos o suficiente para não ocuparem todas as linhas, poderão o fazer, livremente. Aqui só estamos oferecendo sugestões. E, de fato, se o examinador é dotado de racionalidade, você até poderá ganhar pontos com o poder de síntese nas questões. A escolha é livre.
Como utilizar os espaços para rascunho? Na prova, serão oferecidas folhas de rascunho e a folha do texto definitivo. CUIDADO PARA NÃO CONFUNDIR AS FOLHAS. Não será fornecida nova folha de respostas. Na Vunesp, a folha de rascunho contém a expressão “RASCUNHO” ao fundo das linhas. Nas folhas de rascunho, se você conseguir elaborar uma dissertação inteira em rascunho e depois passá-la a limpo na folha definitiva, provavelmente você não terá tempo para as questões, ou, é um prazer conhecê-lo, “The Flash”. Brincadeiras de lado, se você conseguir um esboço de dissertação antes de escrever a definitiva, ótimo. Há quem consiga. Tente. Faça uma dissertação sobre um dos temas por nós propostos e marque seu tempo! Para uma boa parte dos concurseiros, rascunhar não é escrever a dissertação inteira e depois passar a limpo. Não dá tempo! Se não conseguirem, não teimem nesse ponto pessoal! O tempo é crucial!
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo No rascunho, aconselha-se o uso de tópicos, palavras ou frases-chave, apontamentos e remissões. Se preciso, faça até uma pequena estrutura das dissertações e das questões, para que, as escrevendo, não esqueçam de nada. Feito isso, escrevam efetivamente a dissertação e as questões na folha definitiva, e à caneta. Vocês estarão muito bem treinados até lá! Treinem na apostila!
Como elaborar a dissertação? Há muita diferença em relação à velha dissertação do colegial? Um texto dissertativo é o mesmo em qualquer lugar da sua vida acadêmica e profissional. A estrutura é praticamente a mesma. Mas, para a prova, é importante observar algumas peculiaridades.
Estrutura Geral A estrutura é a velha antiga ensinada nos cursinhos e colegiais. Introdução, desenvolvimento do tema e conclusão. Para 30 linhas, 4 ou 5 parágrafos. Linguagem técnica, escorreita e impessoal (sem o uso da primeira pessoa). Não se usa “pensamos que”, “entendemos que”. Capriche na grafia e não utilize palavras rebuscadas cujo real conteúdo você não compreenda. Uma boa dissertação não significa uma dissertação erudita, com um português “rocambolesco”, bem típico do “pessoal do Direito”.
Peculiaridades Saiba muito bem o que o examinador está pedindo. Há quem recomende sempre um parágrafo de introdução, com alusão a princípios e à base constitucional do tema cobrado. Mas tenha cuidado. Na dissertação de Direito Penal da prova passada, por exemplo, o examinador pediu: “Prescrição Penal. Natureza Jurídica, conceito e modalidades. ” Muitos de nós, do último concurso, no parágrafo de introdução, tratamos sobre a imprescritibilidade como exceção e a prescrição como regra, tratando do racismo e da ação de grupos armados contra o Estado etc. Lindo! Lindo? Não. Não para o examinador. Não foi cobrado o tema imprescritibilidade prevista na Constituição. O espelho não previu a pontuação.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Ok, Curso, mas o que abunda não prejudica, não? Correto, candidato. Mas você tem apenas trinta linhas para discorrer sobre o tema. Guarde espaço para “abrir” mais o tema nos tópicos efetivamente cobrados pelo examinador. Por exemplo, na mesma prova, pontuou mais quem tratou com maior profundidade as modalidades da prescrição, citando por exemplo as Súmulas que tratam do aumento da prescrição pela reincidência apenas para a prescrição executória, dentre outras peculiaridades. Pontuou mais quem abriu o tema efetivamente pedido e não “floreou” com um conteúdo que nem cobrado foi. Sintam-se mais livres, porém, se o tema contiver maior abstração, como foi o caso da Dissertação de Difusos, em que, invariavelmente, a remissão à Constituição Federal era quase obrigatória, por conta do princípio da solidariedade intergeracional, que nela está previsto.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
E, Curso, o que esperar da Carreira? Porque o curso está sendo oferecido? Ser Analista é bom? É legal?
Pessoal, pela curiosidade que o candidato obviamente tem, e pelas explicações que nós Analistas podemos oferecer, elaboramos um pequeno texto para tentar demonstrar o quão importante é nosso cargo e o quanto vem sendo valorizado na instituição. Perspectivas. Aspirações. Realidade. Talvez isso reflita um pouco o sentimento de boa parte de nós, Analistas. E vocês, que estão chegando, leiam com atenção.
“Neofuncionalismo e democratização da Justiça brasileira. O triunfo contemporâneo do amor do servidor pelo seu papel.”1 2
Prólogo “Chega da frieza do Direito. Queremos o amor da Justiça!” (De um simples cidadão a um profissional da Justiça)
Pobre do Direito. Como ciência e como fato social, imunizou-se das contaminações das aflições do injusto. A cessação da injustiça e a entrega a cada um daquilo que “é seu” deixou de ser o alimento dos aplicadores, julgadores e tribunais. Resumiu-se, o sistema jurídico, a uma conversão pura e simples de fórmulas conceituais, dissociadas da realidade humana e social. O corpo da justiça não é mais nutrido pelas necessidades dos indivíduos vivos que a ele estão sujeitos. O conhecimento jurídico se torna “frio e estéril, formal e formular, abstrato e conceitual, no lugar de humano e sensível, dialógico e reflexivo,
Sim. Você já leu algo parecido. O título tem origem no conhecidíssimo “Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do Direito Constitucional contemporâneo no Brasil”, do hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso. Disponível em: Jus.com.br. Acesso em 13/10/2018. 2 No excelente artigo do jurista carioca, é explicado o fenômeno chamado pela doutrina de “neoconstitucionalismo”, que seria, sem medo da redundância, o “novo direito constitucional”. Barroso expõe, principalmente, a força contemporânea do Direito Constitucional, expondo os marcos que deram origem ao fenômeno: marco histórico, marco filosófico e marco teórico e elenca os efeitos da “constitucionalização do direito”. 1
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo socialmente vocacionado”3. A sensibilidade com as questões humanas foi esterilizada. Eduardo Carlos Bianca Bittar, Professor do Largo de São Francisco, bem nos lembra dos “homens da ciência” e sua inacessibilidade. Aproveitamos, com ele concordando, para também retratar a forma de apresentação das autoridades públicas e o “frenesi da idolatria”, típicos dessa cultura jurídico-circense da “Era dos concursos”. Com o prestígio exacerbado e cego ao “topo”, perde-se o olhar ao corpo. A inflação da persona esvazia a função pública que exerce. Há primazia desta “imagem estereotipada da seriedade, do racionalismo, do linear-vertical, do fixo, do rigoroso, do discursivo-empolado, do masculino.”4 Perde a Justiça, o feminino, a imagem materna; perde o afeto. As parcas lembranças que se tem são as estatuetas de Dikè e Iustitia (da tradição grega e romana) empoeiradas nos escritórios de advogados e aplicadores do Direito. “A superação desse paradigma implica em trazer a consciência o fato de que o Direito, quando se afasta da Justiça, revela-se, em grande parte, arbítrio, força opressora, puro ato de imposição, e, com isso, sem ser balança, oprime pela espada que deve proteger”.5 Quanto mais o Direito se identifica com a instrumentalidade, mais se distancia da possibilidade de fazer-se o justo; “mais propenso se torna a anestesiar a compreensão sensível e emotiva do mundo”.6 O sistema de Justiça (entendido como o que envolve todos os atores e aplicadores do Direito: Juízes, Advogados, Assistentes, Defensores, Analistas, Promotores e intérpretes) precisa, prementemente, da superação do protótipo do poder pelo do amor.
(Pausa para a pergunta: Que viagem, Curso. Tudo isso para quê?)
O que queremos te mostrar, candidato, é a importância da carreira de Analista para o sistema de justiça (e não só o Analista do Ministério Público, mas o Assistente dos Tribunais, e os Analistas das demais instituições ligadas à Justiça), e, principalmente, despertar o teu amor pelo cargo e pela Justiça, enfim.
3
BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Razão e afeto, Justiça e Direitos Humanos: dois paralelos cruzados para a mudança paradigmática. Revoluções Frankfurtianas e a revolução pelo afeto. Revista Mestrado em Direito. Ano 8, N. 1. 2008. p. 99 a 128. 4 Idem. 5 Idem. 6 Idem.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo O/a ingressante à carreira deve atentar para o fato de que pode, sim, e deve, acima de tudo, valorizar o próprio papel que tem no sistema de justiça. O que propomos é um “despertamento da sensibilidade” do Analista para a importância do trabalho que desempenha (desempenhará, no caso de vocês candidatos) e o nascimento de uma “Ponte do afeto” entre tudo o que você estudou até hoje e o trabalho que agora exercerá. Romantizado o tema na intrudução, voltemos ao artigo. Seremos rápidos!
Neofuncionalismo e democratização da justiça brasileira
Há, no sistema de justiça brasileiro, sem dúvida, um novo jeito de se trabalhar. No Judiciário, no Ministério Público, nas Defensorias. Surgem, a cada dia, mais funções ligadas à Assistência e auxílio no desempenho da função pelo Promotor de Justiça, Juízes, Desembargadores, Procuradores, que, até pouco tempo, sempre carregaram, sozinhos, o peso hercúleo do trabalho de entregar, a tempo, a prestação jurisdicional. As manifestações e decisões judiciais têm, agora, na maior parte delas, a participação da “autoridade e sua equipe”. Hoje, não tem mais o aplicador do Direito “a solidão do trabalho e do argumento”. É assistido e auxiliado por profissionais igualmente concursados e competentíssimos, que contribuem com conhecimento técnico e material no desempenho dos trabalhos. Não há mais, apenas, um “auxílio” puramente formal e instrumental. Há, sim, apoio técnico, com conhecimento jurídico e participação efetiva no sistema da justiça. Não se resume mais, o assistente ou analista, a simplesmente exercer funções burocráticas ou administrativas (e a essas funções, aliás, se tem todo o respeito e prestígio). Não há mais a total ausência de ingerência do funcionário auxiliar no mérito da manifestação processual. Tem-se, sim, verdadeiro “aprofundamento técnico” do profissional, no desempenho da função pelo profissional que assiste. Há efetiva participação do Analista e do Assistente na decisão e manifestação. E na maioria absoluta dos casos, esse auxílio e assistência é extremamente producente, produtivo e democrático. Ganha o Desembargador com o Assistente e ganha o Assistente com o Desembargador; ganha o Analista com o membro do MP e ganha o membro do MP com o Analista. Não se fala aqui em enfraquecimento do papel dos Juízes e Promotores. Não. O poder decisório e instrutório sobre o “ato final” continua com o magistrado, com o membro do Ministério Público. É a Constituição de 1988 quem lhes garante isso. Mas o que se quer dizer é que, com as novas formas de análise, assistência
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo e auxílio, os atos tornaram-se mais céleres e mais democráticos. Tem-se a exata ideia de que há “uma equipe”, e não um. Há, pois, um novo funcionalismo no sistema de justiça, um “neofuncionalismo”. O funcionalismo passa a ser mais democrático, plural, racional. E a carreira de Analista Jurídico do Ministério Público de São Paulo é um exemplo desse novo funcionalismo. Membros do MP paulista, hoje, são assistidos pelos Analistas, colegas de instituição, nas manifestações processuais, diligências e decisões. Constituída por ótimos e capacitadíssimos (reforce-se) profissionais do Direito, a carreira de Analista do Ministério Público paulista não inova só em relação ao sistema de justiça, mas traz novos caracteres também à própria Instituição, que, por sua vez, parece cada vez mais investir no cargo. Para demonstrar essa nova mentalidade da Instituição, elencaremos três “marcos”, que dizem respeito à Instituição e aos Analistas, que julgamos fundamentais: que dizem respeito à instituição, o marco histórico-institucional, o marco funcional, e, que diz respeito ao Analista, o marco perceptivo ou de sensibilização.
Marco histórico-institucional A Lei complementar estadual nº 13.794 de 4 de novembro de 2009 criou, pela primeira vez, o cargo, então chamado de “Analista de Promotoria”. A Lei não trouxe as atribuições dos Analistas, que deveriam ser estabelecidas por ato específico do Procurador-Geral de Justiça. O Ato normativo nº 663/2010, então, tratou das atribuições.7 O Ato n 818/2014 complementou as disposições.8 Remetemos o candidato à leitura dos atos, para que já vão se acostumando às novas funções e atribuições. A carreira se expandiu. A nomenclatura foi alterada para “Analista Jurídico”, por abarcar com mais fidelidade o significado do cargo. A Instituição percebeu o papel importantíssimo do Analistas, 4 concursos (com o atual) foram realizados e hoje, tem-se uma estimativa de mais de 2 mil Analistas Jurídicos em todo o Estado de São Paulo, em Procuradorias e Promotorias.
7 8
http://biblioteca.mpsp.mp.br/PHL_IMG/ATOS/633compilado.pdf http://biblioteca.mpsp.mp.br/PHL_IMG/Atos/818.pdf
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A história da Instituição Ministério Público paulista, pois, agora, tem, em seus capítulos, a criação da nova e muito bem-vinda carreira de Analista. E cada vez mais a Instituição parece passar a mensagem da importância do cargo. Aproveitamos para citar o colega de Bauru, Francisco Mattosinho: “O Analista é o servidor que oxigena a atuação do Ministério Público. Com seu conhecimento recém-adquirido para a aprovação e a continuidade nos estudos para se alcançar outros cargos, o Analista pode contribuir de maneira relevante para a atuação do membro e para se efetivar os objetivos constitucionais atribuídos ao Parquet. A preparação das peças permite que o Analista desenvolva raciocínio jurídico e adquira conhecimento prático sobre os temas em que atua. Essa aliança entre teoria e prática mostra-se relevantíssima na preparação para eventual ingresso em outras carreiras jurídicas. O cargo propicia amadurecimento na vida e na lida com o Direito. Além da atuação eminentemente intelectual do Analista, em algumas Promotorias, há atendimento ao público, momento em que várias demandas são apresentadas e devem ser filtradas para se verificar quais delas exigem atuação ministerial. Em muitos casos, o Analista é chamado para realizar atendimentos mais complexos, a fim de apresentar a melhor solução ao caso concreto, sempre sob a supervisão do Promotor a que está subordinado. Com relação à estrutura, acredito que o MPSP não deixa nada a desejar. Dentre vários benefícios que o cargo proporciona, recentemente, houve regulamentação do teletrabalho (Home Office), o que tem facilitado a vida de colegas que estão lotados em Comarcas maiores, onde o deslocamento para o trabalho é mais difícil. Em síntese, a carreira de Analista Jurídico proporciona satisfação pessoal e profissional para o candidato que almeja integrar os quadros de uma das mais respeitadas instituições do país, que prima pelo fiel cumprimento de seu papel constitucional. Tenho certeza que aquele que escolhe prestar o concurso e logra êxito em ser aprovado encontrará um ambiente rico de experiências e oportunidades para crescer pessoal e profissionalmente.”9
Marco funcional
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http://www.eduardorgoncalves.com.br/2018/07/tudo-sobre-o-concurso-carreira-e.html.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo “Marco” funcional, singularmente, não reflete a realidade dos acontecimentos que culminaram na valorização da carreira de Analista. Mais fielmente falar em “marcos funcionais”, como os acontecimentos que fortaleceram e fortalecem, diariamente, o cargo. Um deles, sem dúvida, é a criação da “AAJUMP”. A criação de associação própria para o cargo é um sinal de solidez e fortalecimento da carreira. Fundada em 18 de abril de 2015, “a AAJUMP foi constituída com a finalidade de representar a carreira dos Assistentes Jurídicos perante a direção do Ministério Público e demais autoridades públicas do Estado, tendo se tornado, logo no primeiro mês de existência, a maior entidade representativa da carreira. (...) com base territorial em todo o Estado de São Paulo, tem por finalidade estatutária defender os direitos e interesses da categoria profissional dos seus associados, e prestar-lhes assistência, bem como aos seus dependentes e familiares, direta ou indiretamente, assim como qualquer ato que afete a sociedade e o patrimônio público.”10 A mobilização de 2017, que reuniu mais de 300 Analistas na Assembleia Legislativa de São Paulo também demonstrou bem esse processo de afirmação da carreira e solidificação funcional, bem como, o anseio dos Analistas por melhoras estruturais na carreira. Se já havia um processo de sedimentação e valorização institucional da carreira, com a Lei complementar nº 1.302 de julho de 2017, o Estado de São Paulo demonstrou a importância do cargo, aprovando projeto de reestruturação e melhoras ao servidorismo do Ministério Público. As melhoras para a carreira de Analista, talvez, sejam as mais significativas. O salário, que quando do início não ultrapassava os 4, 5 mil reais, hoje em dia, ultrapassa os 9 mil reais mensais (bruto). E o MP paulista, aliás, na vanguarda, consolida o preenchimento do cargo por concurso público, já que, em alguns Estados, o cargo tem natureza de cargo de confiança. A Instituição e o Estado sinalizam a importância do cargo.
Marco perceptivo ou de sensibilização
Feitos os esforços pela Instituição e pelo Estado de São Paulo em prol da carreira, é importante, acima de tudo, que o Analista mesmo perceba a importância do próprio cargo.
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http://www.aajump.com.br/index.php?_action=fe-sobre
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo O marco perceptivo ou de sensibilização é muito mais propositivo do que já existente e se destina tanto aos colegas Analistas quanto aos novos ingressantes, futuros colegas. É preciso valorizar a carreira de Analista! A comparação é esdrúxula, mas tem o objetivo de alertar para o inesperado: a felicidade que a carreira de Analista proporciona; a sensação de pertencer à Instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbida da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis; o aprendizado; o amor por tentar fazer o justo! Nós já somos do Ministério Público! O esbravejo é dirigido aos colegas que enxergam a carreira como “algo de passagem” ou aos novos ingressantes que “entram querendo sair”. Ora, meus caros, a vida é uma passagem, mas isso não significa que você tem que apenas viver uma “vida de passagem”. O cargo é (e será, no caso dos candidatos), fruto de muito suor e dedicação! O aproveite! Muito se tem de retrógrado na simples questão: “Você é Analista, mas estuda para quê?”. A resposta ideal é: Eu estudei para ser Analista Jurídico! E muito! Uma autocrítica e uma percepção do olhar alheio é: “A imagem que o Analista tem dele mesmo, por vezes, é a de ciclo não encerrado, expectativa de direito ou de meros nascituros no mundo jurídico. Não! Somos juristas já nascidos! Aplicamos conhecimento técnico no dia a dia, e a Instituição e os membros cada vez mais percebem e reconhecem isso. Nos corredores da Instituição, há Analistas felizes, satisfeitos com o cargo e cientes do papel fundamental que desempenham. E se é importante perceber o papel do Analista como fundamental à democracia nos atos da Instituição, é importante perceber que o acesso ao cargo também deve ser o mais democrático possível! Por isso, com a percepção da necessidade de inclusão e conscientização, surge o I Curso Popular de questões para a segunda fase, que busca, primordialmente, dois objetivos: I) dar oportunidade a pessoas menos abastadas para que tenham um material de qualidade para estudar para a prova escrita; II) demonstrar que já temos ótimos integrantes dos quadros da carreira, aptos a produzir bom material, de qualidade.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Conclusão e retomada da mensagem do prólogo
Ayrton Senna, o brasileiro que falava com os olhos, um dos maiores ídolos do esporte mundial, em entrevista a outro piloto, certa vez, rebatia a crítica a ele dirigida sobre seu jeito “arisco” e arriscado de pilotar, que, supostamente, colocava em risco tanto ele quanto outros competidores. Senna respondeu, em inglês: “Being a racing driver means you are racing with other people and if you no longer go for a gap that exists you are no longer a racing driver because we are competing.”11, o que significa, em livre tradução, “Ser um piloto significa que você está correndo com outras pessoas, e, se não for atrás de uma brecha ou espaço que existir, você não mais é um piloto...”. O que queremos que percebam, candidatos, é que, o papel do jurista é, principalmente, a busca da Justiça. E, seja no cargo que for, advogado, Juiz, Promotor, Defensor, Delegado ou Analista, tente realizar a Justiça! Quem, em qualquer cargo, esquece a busca pela Justiça, não é verdadeiramente um jurista. E a melhor forma de realizar a justiça é: tentar fazê-la com amor! Tenha amor pelo cargo! Amor pela instituição! Amor pela justiça!
Vai, Analista! Sê o que já és!
Aproveitem o material! Felizes e ansiosamente, os aguardamos aqui!
Curso Popular
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https://www.racefans.net/2015/11/20/if-you-no-longer-go-for-a-gap-which-exists-you-are-nolonger-a-racing-driver/
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 1. Direito Constitucional e Legislação do Ministério Público Conceito, classificação, objeto e elementos das Constituições. Princípios constitucionais da República Federativa do Brasil. Estado, Governo e Organização Federal, Estadual e Municipal. Direitos e deveres individuais e coletivos. Direitos Sociais. Nacionalidade e Cidadania. Direitos Políticos e Partidos Políticos. Repartição de competências. Administração Federal, Estadual e Municipal. Poder Legislativo. Processo Legislativo. Poder Executivo. Presidente da República, Ministros e Conselhos. Poder Judiciário, Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Regionais Federais e Tribunais Estaduais. Ministério Público: fins, princípios, organização, garantias, vedações e funções. Conselho Nacional da Justiça e Conselho Nacional do Ministério Público. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei Federal n. 8.625, de 1993) e Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo (Lei Complementar Estadual n. 734, de 1993) Ordem Social.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Conceito, classificação, objeto e elementos das Constituições. QUESTÃO-TREINO Os artigos 127 a 130 da Constituição Federal de 1988 estabelecem as normas atinentes ao Ministério Público. Em qual categoria seriam enquadrados tais dispositivos, com base na classificação quanto à eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais de José Afonso da Silva?
Resposta: A norma estabelecida no caput do art. 127, que consagra a instituição Ministério Público, é elemento orgânico da Constituição e tem eficácia plena e aplicabilidade imediata, “autoaplicabilidade”. O texto indica isso: “Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. ” Por outro lado, há, no §5º do artigo 128, porém, a previsão de que, “leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público (...)”. É, como se pode perceber, uma norma constitucional de eficácia limitada, cuja aplicação depende de atividade legislativa ulterior. José Afonso dá, a esta última, a classificação de norma constitucional limitada de princípio institutivo.12
Princípios constitucionais da República Federativa do Brasil. QUESTÃO-TREINO A Constituição Federal estabelece os casos de intervenção federal nos Estados ou no Distrito Federal em seu artigo 34. Uma das hipóteses, trata da intervenção para “garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação”. A quais poderes o dispositivo se refere e qual o 12
DA SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed. São Paulo, Malheiros, 2008, p. 134/135.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo procedimento de intervenção para o caso? Constitui, o Ministério Público, “Poder” para fins de intervenção federal?
Resposta: A Constituição Federal de 1988 elenca quais os poderes: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário. O art. 36, I, estabelece que, caso o coacto ou impedido seja o Poder Executivo ou o Legislativo, é necessária solicitação; caso o Poder coagido ou impedido seja o Poder Judiciário, haverá necessidade de requisição do Supremo Tribunal Federal. Apesar da estatura constitucional do Ministério Público, não tem ele estrutura de Poder como têm o Legislativo, o Judiciário e o Executivo.
QUESTÃO-ESTUDO Disserte sobre a teoria do estado de coisas inconstitucional abordando obrigatoriamente a origem, pressupostos, papel da Corte Constitucional, previsão legal, críticas e relação com o fenômeno da “erosão da consciência constitucional. ” R: A ideia do estado de coisas inconstitucional foi cunhada pela Corte colombiana ao analisar dois casos: o deslocamento forçado promovido pelas FARC que invadiam determinados lugarejos e expulsavam moradores de suas casas e pela análise do sistema penitenciário colombiano. Verifica-se o fenômeno do Estado de Coisas Inconstitucional quando há um quadro de grave violação dos direitos fundamentais, ocasionado pela inércia das autoridades públicas, de modo que somente mudanças estruturais na atuação do Poder Público, bem como, a atuação concatenada de uma pluralidade de autoridades possa modificar o quadro. O estado de coisas inconstitucional pressupõe a presença concomitante de três pressupostos: o primeiro é de origem fática e se consubstancia na violação generalizada e sistemática de direitos fundamentais de modo a afetar um número elevado e indeterminado de pessoas; a segunda é de cunho político e se revela na medida em que ocorre um conjunto de ações e omissões reiteradas e tendentes a perpetuar ou agravar o quadro de inconstitucional, podem ser
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo condutas comissivas ou omissivas; e por fim, um pressuposto jurídico, consistente na necessidade de medidas estruturas para superar as violações constatadas, sendo a responsabilidade compartilhada por todos os entes políticos. Presentes os pressupostos, a Corte promoverá um verdadeiro diálogo institucional entre os poderes sobre a questão, de modo a proteger os direitos fundamentais. Neste dialogo, a Corte terá que tomar uma atuação proativa, de modo a tomar medidas capazes de organizar a falta de coordenação entre os órgãos públicos, fixando remédios estruturais voltados à formulação e execução de políticas públicas que podem até, implicar em interferência direta na execução de políticas públicas. Embora tenha uma atuação proativa, as ordens emanadas do Poder Judiciário são flexíveis, limitando-se a formular parâmetros dentro dos quais os Poderes Executivo e Legislativo devem atuar. O Poder Judiciário deve ainda ter um papel de monitorar continuamente os demais Poderes de modo a tornar a prática efetiva. Em virtude da total falta de previsão legal e por implicar num papel atípico por parte do Poder Judiciário, a técnica do estado de coisas inconstitucionais deve ser reservada a situações excepcionais, cuja atuação do Poder Judiciário, nesse viés proativo, seja essencial para a solução do quadro. No Brasil, o principal precedente relacionado ao estado de coisas inconstitucional foi a ADPF 347 em que se discutiu a situação do sistema penitenciário brasileiro à luz dos preceitos fundamentais da Constituição. O STF reconheceu, em sede liminar, que o sistema penitenciário brasileiro vive uma situação de estado de coisas inconstitucional, com uma violação generalizada de direitos fundamentais dos presos, sendo que a responsabilidade por essa situação deve ser atribuída aos três poderes. A teoria do estado de coisas inconstitucional é bastante criticada por parte da doutrina, sob o argumento de que o Poder Judiciário estaria intervindo de forma ilegítima na formulação de políticas públicas, invadindo a competência dos Poderes Legislativo e Executivo. Tal crítica é rebatida ao argumento de que a concepção moderna de separação de poderes pressupõe que não mais admite a inércia do poder público. Há direito por parte dos particulares a prestações, acarretando aos poderes públicos obrigações conforme o texto constitucional. Neste diapasão, uma atuação pró ativa por parte do Poder Judiciário é justificada, de modo a impedir o fenômeno da erosão da consciência constitucional elaborada por Karl Loweinstein. Tal fenômeno se caracteriza pela indiferença dos destinatários do poder perante a Lei Fundamental, criando um sentimento de que a Constituição não é respeitada.13
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CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Invasão de domicílio (art. 150 CP). Disponível em Buscador Dizer o Direito. Acesso em 7 de setembro de 2018.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-ESTUDO Disserte sobre o princípio da proporcionalidade/razoabilidade, abordando, obrigatoriamente: definição, previsão legal, dimensões, subclassificações e críticas. Resposta: O princípio da proporcionalidade ou razoabilidade é uma diretriz utilizada pelos aplicadores do direito como instrumento na avaliação dos meios empregados e nas finalidades pretendidas pelas normas jurídicas. Assim, o princípio da proporcionalidade serve para controlar a constitucionalidade material tanto da atividade legislativa, quanto administrativa e judicial. Há forte embate doutrinário a respeito do fundamento legal do princípio da proporcionalidade. No entanto, na jurisprudência do STF prevalece que referido princípio deriva devido processo legal, conforme o art. 5º, LIV, em sua face material ou substantiva. O princípio da proporcionalidade pode ter um aspecto positivo e um negativo. O positivo se relaciona no controle do chamado “excesso de poder”, pressupondo a legitimidade dos meios utilizados e dos fins perseguidos pelos órgãos estatais e a adequação e a necessidade do que se visa. O objetivo então, é perquirir a partir de quando esse poder se torna excessivo em relação ao “núcleo essencial” de algum dos direitos fundamentais em discussão, caracterizando a chamada “proibição do excesso”. Por sua vez, o negativo, é utilizado para censurar a falta ou insuficiência de medidas estatais adequadas e necessárias ao cumprimento do dever estatal de garantia dos direitos fundamentais. Teve sua origem na Alemanha e recebe o nome de “proibição da proteção deficiente”. O princípio da proporcionalidade se divide em outros 3 subprincípios: adequação, onde vai se perquirir a aptidão do meio utilizado para atingir a finalidade pretendida, isto é, verificar se a restrição imposta ao direito fundamental é adequada ao fim visado; o segundo subprincípio é do da necessidade, que consiste em averiguar se não há outro meio que restrinja em menor grau o direito fundamental violado e que obtenha resultados próximos; e por fim, a proporcionalidade em sentido estrito, em que se analisa se o resultado obtido é melhor do que o ônus imposto pelo mesmo. As críticas ao princípio da proporcionalidade se relacionam mais com a sua aplicação pelos Tribunais brasileiros do que o conteúdo do mesmo, em si. Argumenta-se que ocorreu a banalização do princípio da proporcionalidade, em virtude de aplicações cotidianas e sem sistematicidade.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Organização governamental QUESTÃO-TREINO Diferencie sistema de governo, forma de governo e forma de Estado:
Resposta: “Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. ” -Forma de governo: entende-se o regime político (ou sistema político) ao conjunto de instituições políticas por meio das quais um Estado se organiza de maneira a exercer o seu poder sobre a sociedade. Republicana (coisa pública; igualdade; temporariedade dos mandatos; eletividade; responsabilidade dos governantes). -Forma de Estado: é a forma em que o Estado é estruturado. Como a Federação, que é uma cláusula Pétrea na CF, cujas capacidades políticas Administrativas e Legislativa, são distribuídas para a competência de entes regionais, possuindo então autonomia. Dessa forma, a Federação faz-se através da união de diversos Estados que, embora percam sua soberania em relação ao Estado Federativo, mantêm sua autonomia. -Sistema de governo: Presidencialista. Modelo de sistema em que há concentração do chefe de governo e o chefe de Estado na figura de uma só pessoa, o Presidente, mas não deve jamais ser confundido com monarquia ou
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo algo do gênero, pois neste sistema os governantes devem ser escolhidos pelo povo, pressupondo assim, a democracia (regime de governo). -Característica do Estado: Estado Democrático de Direito. Regime democrático pode ser entendido como aquele em que o poder é emanado do povo, um regime que proporciona voz e ação à população através na criação de leis, fiscalização (remédios constitucionais), escolha dos representantes, direta ou indiretamente e etc.
Direitos e deveres individuais e coletivos.
1) Leis relacionadas ao tema Constituição Federal 2) Súmulas dos Tribunais superiores SÚMULA VINCULANTE Nº 1: Ofende a garantia constitucional do ato jurídico perfeito a decisão que, sem ponderar as circunstâncias do caso concreto, desconsidera a validez e a eficácia de acordo constante de termo de adesão instituído pela Lei Complementar 110/2001. SÚMULA VINCULANTE Nº 5: A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a constituição. SÚMULA VINCULANTE Nº 18 - A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE OU DO VÍNCULO CONJUGAL, NO CURSO DO MANDATO, NÃO AFASTA A INELEGIBILIDADE PREVISTA NO § 7º DO ARTIGO 14 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SÚMULA Nº 667: Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa. SÚMULA Nº 654: A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art 5º, XXXVI, da Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado. SÚMULA Nº 667/STF: Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa. SÚMULA Nº 654: A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art 5º, XXXVI, da Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Súmula 403-STJ: lndepende de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais. Jurisprudência Direito à privacidade A questão do sigilo bancário e fiscal: o direito ao sigilo fiscal e bancário não foi consagrado expressamente na constituição. Contudo, se entende que o direito ao sigilo fiscal e bancário decorre do direito à vida privada e à intimidade (art. 5º, X, da C.F.). Sobre o assunto:
em regra, a quebra do sigilo bancário depende de ordem judicial; Exceção: STF: ADIs 2390, 2386, 2397 e 2859 e RE 601.314 (repercussão geral): constitucionalidade do art. 6º da L.C. 105/2001 (Receita Federal pode requisitar informações bancárias diretamente às instituições financeiras, sem necessidade de autorização judicial. O STF entende que o mesmo dispositivo pode ser aplicado às Receitas estaduais e municipais): O STJ entende que os dados obtidos nesses casos não podem ser utilizados em processo penal, mas apenas em processo administrativo fiscal (REsp 1.361.174-RS). - STF: Inquérito 2.424/RJ: válida a instalação de escuta ambiental por policiais, no escritório de advocacia de um advogado suspeito da prática de crimes. A colocação das escutas ocorreu no período da noite por determinação judicial. (...) , apesar de ser possível a equiparação legal da oficina de trabalho com o domicílio, julgou-se ser possível a instalação da escuta, por ordem judicial, no período da noite, principalmente porque durante esse período o escritório fica vazio, não sendo, portanto, possível sua equiparação neste caso a domicílio, que pressupõe a presença de pessoas que o habitem. - STF. Plenário. RE 603616/RO (repercussão geral): A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados. - STF: Inquérito 2.424/RJ: válida a instalação de escuta ambiental por policiais, no escritório de advocacia de um advogado suspeito da prática de crimes. A colocação das escutas ocorreu no período da noite por determinação judicial. (...) , apesar de ser possível a equiparação legal da oficina de trabalho com o domicílio, julgou-se ser possível a instalação da escuta, por ordem judicial, no período da noite, principalmente porque durante esse período o escritório fica vazio, não sendo, portanto, possível sua equiparação neste caso a domicílio, que pressupõe a presença de pessoas que o habitem.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Liberdade Intelectual - STF. Plenário. ADI 4815: Para que seja publicada uma biografia NÃO é necessária autorização prévia do indivíduo biografado, das demais pessoas retratadas, nem de seus familiares.
Liberdade de Expressão - Daniel Sarmento: nos E.U.A., a liberdade de expressão é encarada sob perspectiva ultralibertária (seria um fim em si mesma); no Brasil, sempre se falou em liberdade de expressão com limites explícitos e implícitos. Ex: STF: HC 82.424: Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. (...) O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o ‘direito à incitação ao racismo’”. - Mas, o STF, quando do julgamento da ADPF 130, afirmou que o direito à liberdade de expressão assume uma posição preferencial (preferred position) quando da resolução de conflitos com outros princípios constitucionais e direitos fundamentais. - a atividade de músico é manifestação artística protegida pela garantia da liberdade de expressão, sendo, por isso, incompatível com a Constituição Federal de 1988 a exigência de inscrição na Ordem dos Músicos do Brasil, bem como de pagamento de anuidade, para o exercício de tal profissão (STF, RE 795.467/SP). - comentário contra homossexuais proferido por parlamentar preconceituoso, de mau gosto e extremamente infeliz a liberdade de expressão não existe para proteger apenas aquilo que é humanista, de bom gosto ou inspirado (Min. Luis Roberto Barroso) (STF, Inq 3590/DF). - * marcha da maconha = “o debate sobre abolição penal de determinadas condutas puníveis pode ser realizado de forma racional, com respeito entre interlocutores, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa” (Min. Celso de Mello - STF, ADPF 187). (Obs.: crianças e adolescentes NÃO podem ser engajados nessas marchas “se a Constituição cuidou de prever a proteção dos menores dependentes químicos, é corolário dessa previsão que se vislumbre um propósito constitucional de evitar tanto quanto possível o contato das crianças e dos adolescentes com a droga e com o risco eventual de uma dependência” (Min. Luiz Fux).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Direito à vida - Dever do Estado de proteger indivíduos que estejam sob custódia: o STF reconhece a responsabilidade civil do Estado pela morte de detidos em presídios, mesmo nos casos em que o homicídio não é imputável ao agente público. - No julgamento da ADPF-54/DF, o STF decidiu que os fetos anencéfalos são natimortos cerebrais. Assim, a possibilidade de interrupção da gravidez, nesses casos, seria legítima, visto não se tratar de discussão relativa ao direito à vida, pois vida não há. - Início da vida humana: STJ: no REsp 1.415.727-SC, o Ministro Luis Felipe Salomão afirmou que a beneficiária legal do seguro DPVAT que teve sua gestação interrompida em razão de acidade de trânsito tem direito ao recebimento de indenização em virtude da morte do feto, pois: “o ordenamento jurídico como um todo – e não apenas o Código Civil de 2002 – alinhou-se mais à teoria concepcionista para a construção da situação jurídica do nascituro, conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina contemporânea”. Direito à saúde Em conformidade com o disposto no art. 186 da C.F.: (i) direito de todos (acesso universal, igualitário e integral); (ii) dever do Estado. - STF já afirmou existir um direito público subjetivo à saúde, de dupla dimensão (individual e coletiva): dever do Estado de fornecer medicamentos (abrange medicamentos novos; não abrange tratamentos experimentais). Ingo Sarlet: “o acesso igualitário não se confunde, necessariamente, com o acesso totalmente gratuito”. - STF (RE 581.488/RS): inconstitucionalidade da diferença de classes no SUS: Não se pode conceber que um atendimento público de saúde que se pretenda igualitário compreenda, dentro de si, diversas possibilidades de atendimento de acordo com a capacidade econômico-financeira do paciente, sobretudo quando esse atendimento se encontra a cargo do Estado.
ATENÇÃO!! Lei Federal 13.301/16 (limitação do direito de propriedade): autoriza expressamente o ingresso forçado dos agentes públicos nos imóveis para executar medidas de combate ao mosquito Aedes aegyptie quando: (i) o imóvel está em situação de abandono; (ii) não houver pessoa no imóvel (constatada em 2 visitas, no intervalo de 10 dias)
TITULARIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS POR ESTRANGEIROS: Muito embora esteja previsto, no art. 5º, caput, da C.F., que os direitos
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo fundamentais são garantidos “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País”, o STF entende que não se pode negar a titularidade dos direitos fundamentais àqueles estrangeiros não residentes no País, pois “a interpretação do art. 5º, caput, da CF não deveria ser literal, porque, de outra forma, os estrangeiros não residentes estariam alijados da titularidade de todos os direitos fundamentais.” pois existem “direitos assegurados a todos, independentemente da nacionalidade do indivíduo, porquanto considerados emanações necessárias do princípio da dignidade da pessoa humana.”. (STF: HC 94.477, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2011.) Breves comentários sobre a matéria CLASSIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL - direitos e garantias fundamentais (gênero) Título II: Capítulo I: direitos individuais e coletivos Capítulo II: direitos sociais Capítulo III: direitos da nacionalidade Capítulo IV: direitos políticos Capítulo V: partidos políticos A importância dos direitos individuais e coletivos para a ordem jurídica, fundada na dignidade da pessoa humana, pode ser observada na posição topográfica em que as respectivas normas estão previstas no texto da Constituição Federal; os dispositivos alusivos aos direitos fundamentais estão alocados em posição anterior àqueles que tratam da organização do político administrativa do Estado brasileiro. Disso se extrai uma das peculiaridades da Constituição de 1988: como a primeira constituição que colocou a posição dos direitos fundamentais no texto antes da organização do Estado. Diante disso, todas as disposições subsequentes devem guardar pertinência com as normas que são anteriores a própria organização do Estado. Outro ponto importante que merece destaque é no tocante à utilização da expressão “direitos fundamentais”, que foi a terminologia adotada pelo constituinte de 1988. Nas constituições brasileiras anteriores não se utilizava a expressão “direitos fundamentais”, mas “garantias individuais ou “direitos individuais” apenas. Ocorre que os “direitos fundamentais” não pode ser tomado exclusivamente como sinônimo de “direitos individuais”, mas deve ser levada em consideração a dimensão coletiva, isto é, “direitos sociais” e “direitos coletivos”, que também devem ser tratados como fundamentais. Os direitos individuais estão previstos no art. 5º, CF. Ressalta-se que o art. 60, IV, CF, consagrou estes direitos como cláusulas pétreas. Segundo o STF, os direitos e garantias individuais, apesar de sistematicamente consagrados no art.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 5º, não se restringem apenas a ele, podendo ser encontrados em várias partes do Texto Constitucional. No que toca aos direitos coletivos, apesar de a CF falar em direitos coletivos no art. 5º, é certo que eles também são encontrados, de forma muito mais extensa, nos arts. 6º e seguintes, notadamente quando se refere aos direitos sociais. Obs.1: Há quem afirme que os direitos fundamentais coletivos seriam os direitos fundamentais previstos no art. 5o, quando titularizados por uma coletividade (fundamentação: o art. 5o se encontra no Título II, Capítulo I, da CF: “Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”). Nesse sentido: Ingo Sarlet: direitos coletivos como “direitos fundamentais do homem-membro de uma coletividade”: são “direitos individuais de expressão coletiva, como as liberdades de reunião e associação”, ao passo que outros se encontram dispersos no texto Constitucional. Obs.2: Há quem afirme que os direitos fundamentais coletivos são direitos fundamentais que só ganham sentido na sua fruição coletiva, como no casos do direito de reunião e de livre associação. Para José Afonso da Silva, existem os direitos individuais de expressão coletiva (ex: liberdade de reunião e associação), os direitos coletivos previstos no art. 5o (liberdades de reunião e de associação - art. 5o, XVI a XX -, o direito de entidades associativas representar seus filiados - art. 5o , XXI - e os direitos de receber informações de interesse coletivo - art. 5o - e de petição -art. 5o, XXXV, “a”) e os direitos coletivos com natureza de direito social (liberdade de associação profissional e sindical - arts. 8o e 37, IV -, o direito de greve - arts. 9o e 37, VIII -, o direito de participação de trabalhadores e empregadores nos colegiados de órgãos públicos - art. 10, a representação de empregado junto aos empregadores - art. 11, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado - art. 225). CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS (INDIVIDUAIS E COLETIVOS): (José Afonso da Silva): 1) Universalidade; 2) Inalienabilidade; 3) Imprescritibilidade; 4) Historicidade; 5) Irrenunciabilidade; 6) Relatividade/limitabilidade. DIREITOS FUNDAMENTAIS x GARANTIAS FUNDAMENTAIS - não se confunde direitos com GARANTIAS, sendo essas últimas instrumentos criados para assegurar a proteção e efetividade dos direitos fundamentais = meio a serviço dos direitos. DIREITO
GARANTIA
+ vida privada (CF, art. 5º, X)
+ sigilo das comunicações telefônicas (CF, art. 5º, XII)
+ liberdade (CF, art. 5º)
+ habeas corpus (CF, art. LXVIII)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo + propriedade (CF, 5º, XII)
+ devido processo legal (CF, LIV)
. Aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais (art. 5º, § 1º, CF/88): significa que não é preciso de uma mediação concretizada para que os direitos fundamentais sejam aplicados. . Inclusão no rol das cláusulas pétreas (ou garantias de eternidade) (art. 60, § 4º, inciso IV). Quadros de fixação Dimensões/Gerações/Fases dos direitos: FASE DIREITO + Estado Liberal + liberdade + 1ª dimensão + direitos civis e políticos
MARCO + Revolução Francesa + Independência Americana
+ Estado Social + 2ª dimensão
+ igualdade + direitos sociais, econômicos e culturais
+ pós 1ª GM + Constituição Mexicana (1917) + Constituição Weimar (1919)
+ Estado Democrático + 3ª dimensão
+ solidariedade e fraternidade + direitos difusos e coletivos
+ pós 2ª GM
MARCO NO BRASIL + incipiente na CF/1824 + fortalecidos CF/1891 + CF/1934
+ CF/1988
- DIMENSÕES de direitos: + Primeira dimensão = Políticos + Segunda dimensão = Sociais, Econômicos e Culturais + Terceira dimensão = difusos e coletivos (de Todos) QUADRO – “TEORIA STATUS JELLINEK” – Direitos fundamentais TEORIA DOS STATUS (Jellinek): a) direitos de defesa = o indivíduo goza de um espaço de liberdade diante das ingerência dos poderes públicos. * direitos e garantias individuais = status negativo requer-se uma abstenção estatal. b) direitos prestacionais = o indivíduo tem o direito de exigir prestações materiais (ex: saúde pública e moradias populares) e jurídicas (ex: leis protetivas ao trabalhador e ao consumidor) do Estado.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo * direitos sociais = status positivo requer-se uma atuação estatal. c) direitos de participação = o indivíduo possui competências para influenciar na formação da vontade do Estado. * direitos políticos = status ativo. d) status passivo = o indivíduo se encontra submetido ao Estado na esfera das obrigações individuais (traça deveres - ex: alistamento eleitoral). QUESTÃO-TREINOÉ É possível a quebra direta de sigilo bancário pelo Ministério Público? (Prova Escrita – Ministério Público do Estado de Minas Gerais – 2016)
Resposta: NÃO. É necessária autorização judicial (STJ HC 160.646/SP, Dje 19/09/2011). Exceção: É lícita a requisição pelo Ministério Público de informações bancárias de contas de titularidade de órgãos e entidades públicas, com o fim de proteger o patrimônio público, não se podendo falar em quebra ilegal de sigilo bancário (STJ. 5ª Turma. HC 308.493-CE, j. em 20/10/2015). QUESTÃO-TREINO Discorra sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais e o seu reconhecimento (ou não) no Brasil. Responda de forma fundamentada e indique, se houver, o (s) dispositivo(s) constitucional (is) que embasa(m) a resposta. Apresente exemplos.
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Resposta: Ao examinar os destinatários dos direitos fundamentais, ou seja, quais são os sujeitos a eles vinculados no polo passivo, a doutrina indica que os direitos fundamentais são, tradicionalmente, oponíveis ao Estado. Diz-se, portanto, que ocorre a eficácia vertical dos direitos fundamentais. Contudo, parte da doutrina aponta que os direitos fundamentais não são oponíveis apenas ao Estado, aplicando-se também aos particulares. Isso se dá com fundamento no artigo 5º, § 1º, da CR/88, que determina que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Em outras palavras: os direitos fundamentais têm validade também nas relações travadas somente entre particulares. Além disso, há algumas normas, como, por exemplo, as que cuidam dos direitos trabalhistas, que preveem de maneira expressa a vinculação de particulares. No Brasil, a corrente majoritária da doutrina reconhece a eficácia horizontal e direta aos direitos fundamentais. Vale dizer: os direitos fundamentais incidem também nas relações entre particulares. O Supremo Tribunal Federal, em mais de uma oportunidade, fixou o entendimento de que os direitos fundamentais vinculam não apenas o Estado, mas também se destinam à proteção dos particulares em face dos poderes privados. O exemplo mais eloquente dessa aplicabilidade ocorreu na oportunidade em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o princípio da ampla defesa se aplica nas relações privadas, não podendo membro de uma sociedade ser excluído sem a observância desse princípio. O Excelso Sodalício também aceitou a teoria da eficácia horizontal dos direitos e garantias fundamentais, quando, por exemplo, reconheceu que viola o princípio da igualdade o estatuto de empresa que discrimina funcionários em razão do sexo, raça, nacionalidade ou credo religioso e que a revista íntima em funcionárias consiste na prática de constrangimento ilegal. QUESTÃO-TREINO Animais: direitos fundamentais. Discorra sobre o tema à luz da prática da vaquejada.
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Resposta: A questão resvala no conflito de normas constitucionais que alicerçam direitos fundamentais, tendo, de um lado, o direito ao meio ambiente que abrange a proteção dos animais (artigo 225, § 1º, VII, da CF) e, de outro, o direito à cultura que engloba a vaquejada (artigo 215 e seguintes da CF), sendo que os Ministros do STF, em sede de ADI (ADI nº 4983/CE), entenderam predominar na hipótese o direito ao meio ambiente como direito de terceira dimensão, ora fundado no valor solidariedade, sobre o direito decorrente das manifestações culturais justamente na esteira de outros precedentes relacionados a temas congêneres como a briga de galos e a farra do boi. Recentemente, contudo, o ordenamento jurídico brasileiro foi inovado pela Emenda Constitucional nº 96/2017 que, por via de interpretação, passou a legitimar a prática da vaquejada nos moldes de sua construção redacional. No caso, embora a Emenda prevaleça sobre a decisão adotada pelo STF, posto que a eficácia contra todos e o efeito vinculante da ADI não alcançam o Legislativo em nome do afastamento do fenômeno da fossilização constitucional, nada impede que o mesmo Tribunal aprecie a inovação legislativa, inclusive, sob a ótica de violação ou não de cláusula pétrea (artigo 60, § 4º, IV, da CF).
Direitos Sociais
QUESTÃO-TREINO Cespe – TCE – PE – Analista – Adaptada – 2017. Considerando o que dispõe a Constituição Federal acerca dos direitos sociais, direitos de nacionalidade e direitos políticos, bem como dos partidos políticos, é correto dizer que por imposição de lei, se um órgão estadual for criado, os servidores ocupantes de cargo efetivo desse órgão poderão, desde que com prévia autorização do órgão estatal competente, fundar sindicato?
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R: Não, uma vez que a lei não poderá exigir autorização do estado para fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente e vedadas ao poder público a interferência e a intervenção na organização sindical. Art. 8, da Constituição Federal. Nacionalidade e Cidadania
QUESTÕES-TREINO Considerando o texto abaixo, responda às perguntas: “Entre 2010 e 2016, mais de 80 mil brasileiros obtiveram a cidadania portuguesa e, com isso, passaram a fazer parte da União Europeia. Isso não significa, contudo, que eles deixaram de ser cidadãos brasileiros, e muito menos que deixaram de ser nacionais do Brasil — a não ser que tenham pedido expressamente por isso. A busca por uma segunda nacionalidade é comum entre brasileiros descendentes de europeus. Um dos motivos é o fato de que a nova nacionalidade abre as portas para a aquisição de, por exemplo, um novo passaporte que facilite a entrada em outros países. Pode também permitir a aquisição de uma nova cidadania e, com ela, novos direitos e deveres em outros territórios que não o brasileiro. Nacionalidade e cidadania são muitas vezes utilizadas como sinônimos, mas na verdade expressam ideias bem diferentes, e carregam consigo efeitos distintos”.14 a) Qual a diferença entre nacionalidade e cidadania? b) Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, é incorreto afirmar que se um brasileiro nato que mora nos EUA e possui o green card decidir adquirir a nacionalidade norte-americana, ele irá perder a nacionalidade brasileira e poderá ser extraditado?
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NEXO JORNAL LTDA. https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/07/14/Qual-adiferen%C3%A7a-entre-nacionalidade-e-cidadania Acesso em 27/09/2018.
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Resposta: a) Nacionalidade e cidadania são conceitos que não se confundem. Enquanto a nacionalidade traduz o “vínculo jurídico-político que une uma pessoa a determinado Estado do que se originou ou pelo qual foi adotado, fazendo deste indivíduo um componente do povo e sujeitando-o aos direitos e obrigações oriundos desta relação”,15 a cidadania reveste o indivíduo de “direitos políticos, ou seja, pode votar e ser votado, propor ação popular além de organizar e participar de partidos políticos (cidadania = vínculo marcantemente político)”. 16 A nacionalidade é um direito fundamental com proteção na Declaração Universal dos Direitos dos Homens, que estabelece em seu artigo XV que “todo homem tem direito a uma nacionalidade” e que “ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade”. b) Sim. A questão trata de hipótese excepcional de perda da nacionalidade fundada no art. 12, §4º, inciso II, “b”, CF, vez que a aquisição de nova nacionalidade não é requisito para obtenção de green card, documento que, dentre outros direitos, assegura a permanência no território nacional norteamericano por tempo indeterminado. Nessa hipótese, o indivíduo deixa de ser brasileiro e pode ser extraditado.17 15
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Principais julgados do STF e do STJ comentados. Manaus: Dizer o Direito, 2018. p. 45. 16 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Principais julgados do STF e do STJ comentados. Manaus: Dizer o Direito, 2018. p. 45. 17 Assim julgou a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF. 1ª Turma. MS 33864/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 19/4/2016): “A Primeira Turma, por maioria, denegou mandado de segurança em que se questionava ato do ministro da Justiça que declarara a perda da nacionalidade brasileira da impetrante (CF, art. 12, § 4º, II), por ter adquirido outra nacionalidade (Lei 818/1949, art.23). No caso, a impetrante, brasileira nata, obtivera a nacionalidade norteamericana de forma livre e espontânea e, posteriormente, fora acusada, nos Estados Unidos da América, da prática de homicídio contra seu marido, nacional daquele país. Diante disso, o governo norte-americano indiciara a impetrante e requerera às autoridades brasileiras a prisão para fins de extradição. O Colegiado entendeu que o ato do ministro da Justiça de cassação da nacionalidade brasileira é legítimo, pois a impetrante perdera a nacionalidade brasileira ao adquirir outra em situação que não se enquadraria em qualquer das duas exceções constitucionalmente previstas: (i) tratar-se de mero reconhecimento de outra nacionalidade originária, considerada a natureza declaratória desse reconhecimento (art. 12, § 4º, II, “a”); e (ii) ter sido a outra nacionalidade imposta pelo Estado estrangeiro como condição de permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis (art. 12, § 4º, II, “b”). Por fim, a Turma revogou a liminar deferida pelo Superior Tribunal de Justiça, que suspendera provisoriamente a eficácia da portaria ministerial de cassação da nacionalidade. Vencidos os Ministros Edson Fachin e Marco Aurélio, que concediam a segurança. O Ministro Edson Fachin assentava que o brasileiro nato não poderia ser extraditado pelo Brasil a pedido de governo estrangeiro, porque se cuidaria de garantia fundamental que não comporta exceção. Salientava ainda que se a extradição não for concedida, legitimar-se-á ao Estado Brasileiro, mediante a aplicação extraterritorial de sua própria lei penal, fazer instaurar a persecução criminal. O Ministro Marco Aurélio reputava que, em se tratando de mandado de segurança contra ato de ministro da
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Repartição de Competências no Estado Brasileiro. QUESTÃO-ESTUDO Com relação à Organização Político-Administrativa da Federação Brasileira e à repartição e competências entre os entes federativos, responda: A) No que consiste o chamado “federalismo de terceiro grau”, contemplado na forma de Estado adotada pelo Brasil? B) Considerando as técnicas de repartição de competências consagradas na Constituição Federal de 1988, diferencie competência exclusiva de competência privativa, no âmbito da União. C) Pode um Município exercer competência legislativa com relação à matéria de Direito Ambiental? Justifique, com base no entendimento sedimentado pela jurisprudência. Respostas: A) O Brasil adota a forma de Estado federativa, isto é, compõe-se de entes federativos dotados de autonomia para se auto-organizarem, autogovernarem, autolegislarem e autoadministrarem, mas submetidos à soberania, que é apenas do próprio Estado brasileiro, e à indissolubilidade do pacto federativo (art. 1º, caput, CF/88). Diz-se18 que o Brasil adotou um federalismo de terceiro grau, no sentido de que há três esferas de competência e autonomia dos entes federativos: da União, dos estados e dos municípios. Já o Distrito Federal detém as competências de estados e municípios (art. 32, §1º, CF/88); por isso, não consiste numa quarta esfera do federalismo. B) Nos dizeres de José Afonso da Silva, “Competência é a faculdade juridicamente atribuída a uma entidade ou a um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões” (2014, p. 483). Dessa forma, entende a Doutrina que a Constituição Federal de 1988 classificou as competências em dois grandes grupos: das competências materiais (ou administrativas) e das competências Justiça, o órgão competente para julgamento é o Superior Tribunal de Justiça. Além disso, concluía que o direito à condição de brasileiro nato seria indisponível” (Info 822). Em outras palavras e aprofundando mais o tema, o brasileiro nato titular de green card não tem muitas limitações nos EUA, lá podendo residir e trabalhar em caráter permanente. Pontue-se que a obtenção de green card não importa perda da nacionalidade brasileira e nem aquisição da nacionalidade norte-americana. Contudo, se o brasileiro nato titular de green card optar pela nacionalidade desse país, perderá a nacionalidade brasileira, pois já poderia morar e trabalhar regularmente nos EUA, não constituindo a aquisição da nova nacionalidade condição para gozar de tais direitos. Tornar-se nacional de outro Estado foi uma opção livre e espontânea, alheia, portanto, à exceção prevista no art. 12, §4º, inciso II, “b”, CF. Havendo perda da nacionalidade brasileira nata, a extradição para o novo Estado, por exemplo, não mais é obstada pelo art. 5º, inciso LI, CF. 18 José Afonso da Silva.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo legislativas. Tais grupos de competência são ainda classificados conforme critérios diversos, sendo pertinente à resposta da questão a classificação quanto à extensão – isto é, quanto à possibilidade de exercício por um ou mais entes. A competência será exclusiva quando for atribuída a um ente, com exclusão de todos os demais, albergando hipóteses de competência material da União (art. 21, CF/88); será privativa, quando embora atribuída a um ente em específico pela Carta Magna, puder ser delegada a outros entes (art. 22, par. único, CF/88), albergando, no caso da União, apenas hipóteses de competência legislativa. 19 C) Sim. Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal (ARE 748.206 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 14-3-2017, 2ª T, Informativo 857), Municípios podem legislar sobre matéria de Direito Ambiental, no exercício da competência legislativa referente a interesse local (art. 30, inciso I, CF/88), desde que a edição da norma seja devidamente fundamentada nesse sentido, isto é, calcada em interesse atinente à Municipalidade, e seja mais restritiva (isto é, mais protetiva em relação ao bem jurídico ambiental) que a legislação estadual e federal, também observada a competência dos municípios para suplementá-las (art. 30, inciso II, CF/88). Pelo princípio da ubiquidade, evidente que o dano ambiental não está adstrito a fronteiras artificialmente traçadas, o que não significa que a Municipalidade não possa abordar o tema conforme as suas especificidades, de forma mais rigorosa, respeitada a legislação dos entes em cujo território está inserida, à luz da vedação à proteção insuficiente. QUESTÃO-TREINO Competência legislativa dos Estados Processo legislativo no estado brasileiro ‘A’ culmina na edição de lei estadual contendo normas sobre o procedimento de retificação de assento de gênero junto ao Registro Civil, uma das quais condiciona a alteração à comprovação de prévia realização de cirurgia de redesignação de sexo e autorização judicial. À luz de recente entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, referida norma é constitucional? Fundamente a resposta apontando a modalidade de competência legislativa em que matéria se insere e, se o caso, os direitos eventualmente afrontados.
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AFONSO DA SILVA, J. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2014.
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Resposta:Não. No recente julgamento da ADI nº 4275, o Supremo Tribunal Federal aplicou a técnica da interpretação conforme à Constituição ao art. 58 da Lei nº 6.015/1973, adotando entendimento de que é possível a alteração de gênero no assento de registro civil, independentemente da realização de cirurgia para redesignação de sexo e de autorização judicial (no caso do segundo requisito, o entendimento pela prescindibilidade se deu por maioria). Por outro ângulo de análise, observa-se que referida norma é inconstitucional, também, por tocar matéria de competência legislativa privativa da União, registros públicos (art. 22, inciso XXV, CF/88). Em outras palavras, o estado ‘A’ não tem competência legislativa para editar referida norma, não havendo que se falar em competência suplementar diante da existência de regramento por Lei Federal, sobre a retificação de assento.
Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário
Das Comissões 1) Leis relacionadas ao tema Artigo 58 da Constituição Federal Lei n. 1.579/52 (Lei das Comissões Parlamentares de Inquérito) 2) Informativos HC 71.193/SP (STF), HC n. 100.341-AM (STF), MS 30.906-MC (STF), MS 35.216 AgR (STF). Breves comentários20 São subconjuntos de parlamentares organizados com o fim de tratar de um assunto específico. Podem ser permanentes quando seu início se dá ao começo de cada legislatura, com finalidade de analisar projeto de lei quanto a determinadas especificidades, como a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), ou podem ser provisórias ou temporárias - quando um grupo de parlamentares se reúne provisoriamente para tratar de um assunto específico, como ocorre com as Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Ainda, há as comissões representativas, reunidas durante o período de recesso parlamentar 20 Super-revisão
concursos jurídicos: doutrina completaIWander Garcia [coordenador] . - 4. Ed., lndaiatuba, SP: Editora Foco Jurídico, 2016.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo para que não sejam interrompidas as atividades do Congresso Nacional. Estão previstas no § 4° do art. 58 da Constituição. Especificamente sobre as CPIs (§ 3° do art. 58 da CF), elas têm por função apurar um fato determinado, por um prazo certo. São criadas no âmbito do Poder Legislativo, portanto são órgãos desse Poder e possuem natureza de comissão provisória ou temporária, pois, após ter sido apurado o fato, a comissão é desfeita. A doutrina menciona que fato determinado é aquele em que é possível verificar seus requisitos essenciais. Por exemplo: não há como investigar de forma abstrata a corrupção no Brasil, tem de ser especificado o fato determinado para que o procedimento se inicie. O prazo certo, ou seja, aquele que tem início e fim, terá de ser fixado pelos regimentos internos das Casas, já que a CPI é uma comissão temporária e não permanente. De acordo com o Supremo (HC 71.193/SP), a expressão "prazo certo" não impede prorrogações, desde que tais atos ocorram na mesma legislatura. Essas comissões são formadas ou instaladas pelo requerimento de 1/3 dos membros. Podem ser criadas separadamente tanto pela Câmara de Deputados, quanto pelo Senado Federal ou, ainda, conjuntamente pelas duas casas. Nesse caso, teremos uma CPI mista, que será instalada após assinatura de 1/3 dos Deputados Federais e Senadores conjuntamente. As CPIs têm poderes próprios das autoridades judiciais e não de autoridades policiais. Tomando por base a jurisprudência do STF, é possível concluir que elas podem: 1) convocar testemunhas, investigados e autoridades para prestarem esclarecimentos, mesmo que de forma coercitiva. Aliás, o art. 50 da CF determina que os Ministros de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República devem comparecer para prestarem informações, quando convocados, sob pena de responderem por crime de responsabilidade, na hipótese de ausência injustificada; 2) determinar a realização de certas perícias, necessárias à instrução da investigação; 3) determinar as buscas que sejam imprescindíveis à instrução da investigação; 4) quebrar sigilo fiscal, bancário, financeiro e telefônico (nessa última hipótese ocorrerá apenas a quebra em relação aos dados telefônicos, ou seja, as contas telefônicas). É imprescindível, segundo o Supremo, que o ato seja devidamente fundamentado e que haja efetiva necessidade para a da adoção da medida. De outra parte, é possível verificar que a CPI possui limites e há assuntos que estão resguardados pela denominada cláusula de reserva jurisdicional, ou seja, somente por ordem judicial tais atos podem ser determinados, em especial as medidas restritivas de direito. Desse modo, as CPIs não podem: 1) determinar a quebra do sigilo das comunicações telefônicas, ou seja, a CPI não pode determinar a interceptação telefônica, pois, segundo o art. 5°, XII, da CF, somente para fins de investigação criminal ou instrução processual penal é que
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo poderá haver tal diligência. Ressalta-se que o acesso às contas telefônicas (dados telefônicos) não se confunde com quebra de comunicação telefônica (que é a interceptação ou escuta). A primeira se inclui nos poderes da CPI, já a segunda é acobertada pela cláusula de reserva de jurisdição e, portanto, não cabe à CPI determiná-la. Outro detalhe: o STF já afirmou que, embora haja a vedação mencionada, se a interceptação foi realizada num processo criminal e a CPI quer emprestar a prova lá produzida, para ajudar nas suas investigações, isso poderá ser feito; 2) determinar e efetivar a busca domiciliar, que também depende de ordem judicial, conforme dispõe o inciso XI do art. 5° da CF; 3) decretar a prisão, ressalvadas as hipóteses de flagrante delito, conforme inciso LXI da art. 5° da CF, pois nesses casos não só a CPI, mas qualquer um do povo pode prender. Dispõe o art. 301 do Código de Processo Penal que qualquer pessoa do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Conforme a Suprema Corte (HC n. 100.341-AM), a existência de procedimento penal investigatório, em tramitação no órgão jurisdicional competente, não impede a realização de atividade apuratória por uma Comissão Parlamentar de Inquérito, ainda que seus objetos sejam correlatos, pois cada qual possui amplitude distinta, delimitada constitucional e legalmente, além de finalidades diversas. No mesmo julgado, o STF definiu que a CPI pode estender o âmbito de sua apuração a fatos ilícitos ou irregulares que, no curso do procedimento investigatório, revelarem-se conexos à causa determinante da comissão. Além disso, reiteradas vezes, a Suprema Corte tem garantido ao convocado a depor numa CPI o privilégio contra a autoincriminação, o direito ao silêncio e que possa comunicar-se com o seu advogado. Outra decisão relevante do Supremo sobre as CPIs é a de que elas, "no desempenho de seus poderes de investigação, estão sujeitas às mesmas normas e limitações que incidem sobre os magistrados, quando no exercício de igual prerrogativa. Vale dizer: as CPIs somente podem exercer as atribuições investigatórias que lhes são inerentes, desde que o façam nos mesmos termos e segundo as mesmas exigências que a Constituição e as leis da República impõem aos juízes, especialmente no que concerne ao necessário respeito às prerrogativas que o ordenamento positivo do Estado confere aos advogados.(...) A presença do advogado em qualquer procedimento estatal, independentemente do domínio institucional em que esse mesmo procedimento tenha sido instaurado, constitui fator inequívoco de certeza de que os órgãos do Poder Público (Legislativo, Judiciário e Executivo) não transgredirão os limites delineados pelo ordenamento positivo da República, respeitando-se, em consequência, como se impõe aos membros e aos agentes do aparelho estatal, o regime das liberdades públicas e os direitos subjetivos constitucionalmente assegurados às pessoas em geral, inclusive àquelas eventualmente sujeitas,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo qualquer que seja o motivo, a investigação parlamentar, ou a inquérito policial, ou, ainda, a processo judicial. (...) Não se revela legítimo opor, ao advogado, restrições, que, ao impedirem, injusta e arbitrariamente, o regular exercício de sua atividade profissional, culminem por esvaziar e nulificar a própria razão de ser de sua intervenção perante os órgãos do Estado, inclusive perante as próprias CPI" (MS 30.906-MC, Rei. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 05.10.2011, DJE de 10.10.2011). Sobre a utilização de documentos oriundos de inquérito sigiloso numa CPI, o Supremo também já decidiu pela possibilidade (HC 100.341-AM). Vale lembrar que a CPI não promove responsabilidades. Ao final das apurações, ela encaminha seus relatórios conclusivos ao Ministério Público para que este órgão, se entender pertinente, promova a responsabilização civil ou criminal dos investigados. É bom mencionar, entretanto, que a permissão legal para encaminhar relatório circunstanciado não se limita ao Ministério Público, mas também à AGU e outros órgãos públicos, podendo veicular, inclusive, documentação que possibilite a instauração de inquérito policial em face de pessoas envolvidas nos fatos apurados (art. 58, § 3º, CRFB/1988, c/c art. 6º-A da Lei 1.579/1952, incluído pela Lei 13.367/2016). Por último, cumpre mencionar que são cabíveis os remédios constitucionais, em especial mandado de segurança e habeas corpus, sempre que houver abusos no decorrer dos trabalhos realizados pelas comissões. A competência para o julgamento dessas ações dependerá da autoridade que pratica o ato abusivo. Se forem representantes do Congresso Nacional, o foro competente é o STF; se forem membros das Assembleias Legislativas ou da Câmara Legislativa do DF, o órgão destinado ao julgamento é o Tribunal de Justiça do respectivo Estado. Questão-Treino Sobre as Comissões Parlamentares de Inquérito: A) O que seria o caráter itinerante? B) É possível determinar a condução coercitiva de testemunha? E quanto a medidas cautelares?
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Resposta: a) O caráter itinerante das Comissões Parlamentares de Inquérito diz respeito à possibilidade de se transportarem aos lugares onde se fizer mister sua presença para o exercício de suas atribuições (artigo 2º, da Lei n. 1.579/52). b) Sim. Em caso de não comparecimento da testemunha sem motivo justificado, a sua intimação será solicitada ao juiz criminal da localidade em que resida ou se encontre, nos termos dos arts. 218 e 219 do Decreto-Lei no3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal (artigo 3º, §1º, da Lei n. 1.579/52). No caso de se afigurar necessária medida cautelar, caberá ao presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, por deliberação desta, solicitar, em qualquer fase da investigação, ao juízo criminal competente medida cautelar necessária, quando se verificar a existência de indícios veementes da proveniência ilícita de bens (artigo 3º-A, da Lei n. 1579/52).
QUESTÕES-TREINO Medidas provisórias e controle judicial É possível o controle judicial das medidas provisórias?
Resposta: O artigo 62, da Constituição Federal dispõe que nos casos de relevância e urgência o Presidente da República poderá editar medidas provisórias, com força de lei. Note-se que a definição da relevância e urgência para efeitos de edição de medidas provisórias consiste em um juízo político, de escolha discricionária por parte do Presidente da República. Segundo o STF, em virtude da natureza discricionária referidos requisitos se submetem a controle pelo Congresso, sendo que o Judiciário, somente poderá exercer o controle se
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo o abuso de editar medidas provisórias for notório, sob pena de violação à cláusula da separação dos poderes.
Trancamento da pauta em medidas provisórias O trancamento da pauta em virtude de as medidas provisórias não terem sido votadas no prazo de 45 dias alcança todas a espécies normativas?
Resposta: Conforme a dicção contida no artigo 62, § 6º, da Constituição Federal, se a medida provisória não for apreciada no prazo de quarenta e cinco dias contados da sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas. Segundo o entendimento do STF, apesar do dispositivo constitucional utilizar a expressão “todas as demais deliberações” o trancamento deve incidir apenas em votações de projetos de lei ordinária que versem sobre temas que podem ser tratados por medida provisória.
Perda da eficácia da medida provisória De acordo com a previsão constitucional explique como ficam as relações jurídicas decorrentes de medida provisória que perdeu a sua eficácia.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta: Consoante a previsão do artigo 62, da Constituição Federal as medidas provisórias perderão a sua eficácia desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, contados de sua publicação, havendo a suspensão destes prazos durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. Esse prazo de sessenta dias poderá ser prorrogado uma única vez por igual período. Prevê o texto constitucional que se ultrapassado esse período após a rejeição ou perda eficácia sem a edição do decreto legislativo, as relações jurídicas por ela disciplinadas e os atos praticados durante a sua vigência conservar-se-ão por elas regidas. Verifica-se assim, que o legislador constitucional disciplinou uma hipótese expressa de ultratividade da medida provisória, pois apesar da perda da sua eficácia continuará regulando as relações jurídicas por ela constituídas.
Limitações às Emendas Constitucionais Disserte sobre as limitações ao poder de emenda da Constituição.
Resposta: O texto constitucional traz limitações ao poder de emenda, temos como limitações circunstanciais que a Constituição Federal não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio. Dispõe o artigo 60, I, II, III e §§ 2º, 3º e 5º, da Constituição Federal (limitações formais) que a Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II – do Presidente da República e; III – de mais da metade das Assembleias Legislativas das Unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros e a proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos três quintos do votos. Ademais, a emenda será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal com o respectivo número de ordem e a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. As limitações materiais estão
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo previstas no § 4º, do artigo 62, da Constituição Federal no sentido de que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II- o voto direto, secreto, universal e periódico; III- a separação dos poderes e; IV – os direitos e garantias individuais. Vale notar, que, no Brasil, no momento, está incidindo uma limitação circunstancial ao poder de emenda, decorrente da intervenção federal do Rio de Janeiro.
Mandado de Segurança e Emenda à Constituição Há possibilidade de impetração do mandado de segurança preventivo contra o processo legislativo de emenda à Constituição Federal?
Resposta: O controle de constitucionalidade das emendas à Constituição pode ser dar de forma: a) preventiva; b) repressiva. O STF tem admitido a impetração de mandado de segurança preventivo por parlamentar para assegurar a ocorrência de um processo legislativo hígido, ou seja, nas hipóteses de vícios formais ou procedimentais. Trata-se de controle concreto de constitucionalidade, pois conforme o Texto Constitucional o parlamentar tem direito a um processo legislativo sem vícios. Contudo, o STF tem considerado inadmissível o controle judicial preventivo em virtude da existência de vício material, ainda que provocado por iniciativa parlamentar. QUESTÕES-ESTUDO Fundamentação per relationem É admitida, nas decisões do Poder Judiciário, a fundamentação “per relationem”? Resposta: O STJ vem sedimentando o entendimento no sentido de que a fundamentação per relationem é admitida no ordenamento jurídico, haja vista que nesta espécie de motivação o órgão julgador acolhe os argumentos das partes ou de outras decisões proferidas nos autos, adotando a fundamentação que lhe pareceu adequada. Contudo, segundo o mesmo STJ, será nulo o
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo acórdão que se limita a ratificar a sentença ou adotar parecer ministerial, sem sequer transcrevê-lo e deixando de afastar as teses defensivas ou de apresentar um fundamento próprio, devendo fazer referências concretas às peças que pretende adotar e transcrevendo as partes em que está apoiando a decisão com o fito de legitimar-se um raciocínio lógico que pauta a sua conclusão, sob pena de violação ao preceituado no artigo 93, X, da Constituição Federal.
Súmulas vinculantes Quais os requisitos para a Revisão e Cancelamento de Súmula Vinculante? Resposta: De acordo com o entendimento do STF, para que ocorra a revisão ou cancelamento de súmula vinculante é necessária a demonstração dos seguintes requisitos: a) que houve evidente superação da jurisprudência do STF no tratamento da matéria; b) alteração legislativa quanto ao tema; ou c) modificação substantiva do contexto político, econômico ou social. Impende ressaltar, que o mero desconhecimento ou descontentamento por parte do legitimado a respeito de eventual divergência não autoriza que ingresse com pedido de revisão ou cancelamento. QUESTÃO-TREINO Foro por prerrogativa de função O foro por prerrogativa de função é aplicável a qualquer crime cometido pelo detentor do cargo? Justifique.
Resposta: O STF, por meio do julgamento da ação penal 937, entendeu que o foro por prerrogativa de função deve ser interpretado restritivamente, incidindo apenas em relação aos crimes praticados durante o exercício do cargo e em razão dele. Vale notar, que se o crime foi cometido pelo parlamentar antes da sua diplomação como Deputado Federal, por exemplo, a competência para julgar a ação não será do STF, devendo haver o julgamento em Primeira Instância. Ademais, ainda que após a diplomação, se o crime não apresentar
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo relação direta com as funções exercidas, também não incide a regra do foro por prerrogativa de função. Dessa forma, decidiu a nossa Corte Constitucional que o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos após a diplomação e em razão das funções exercidas, conferindo uma interpretação restritiva ao instituto constitucional processual. QUESTÃO-TREINO Incidente de deslocamento de competência Quais os requisitos para a ocorrência do “Incidente de deslocamento de competência”?
Resposta: Dispõe o artigo 109, § 5º, da Constituição Federal que nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador Geral da República poderá suscitar perante o STJ o incidente de deslocamento de competência. Para que haja o deslocamento, além dos requisitos apontados deverá haver inércia ou dificuldades dos agentes locais. Dessa forma, poderá haver o incidente de deslocamento da competência: a) nas hipóteses em que ocorrer grave violação de direitos humanos; b) as autoridades locais estiverem demonstrando uma conduta reveladora de falhas, que pode ser proposital ou decorrente de dificuldades, ou ainda, se houver uma demora injustificada na apuração ou julgamento do caso; c) existência de risco de responsabilização do Brasil por violação as normas internacionais de direitos humanos. O IDC pode ser requerido nas fases pré-processual e processual e fixa a competência da Justiça Federal, bem como os feitos deslocados podem ser de matéria cível ou criminal, desde que se revele violador de normas previstas em Tratados Internacionais de Direitos Humanos, os quais o Brasil se obrigou a cumprir.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Direito Constitucional e Ministério Público QUESTÃO-TREINO O Ministério Público é legitimado para a impetração de Habeas Corpus em favor de terceiro? É possível mesmo quando desautorizado pelo paciente?
Resposta: O Ministério Público, como instituição responsável pela defesa da ordem jurídica e dos interesses individuais indisponíveis, tem legitimidade para impetrar Habeas Corpus. Há previsão legal, inclusive, no Código de Processo Penal e na Lei Orgânica do Ministério Público.21 Não pode, entretanto, o fazer no interesse da acusação, de maneira que desvirtue o fim da ação constitucional: o estado de liberdade do indivíduo. Quando desautorizado pelo próprio paciente e em interesse da acusação, conforme a jurisprudência dos tribunais superiores, não é admissível a ação constitucional de Habeas Corpus. QUESTÃO-TREINO Conflito de atribuições entre Ministérios Públicos Em caso de conflito de atribuições entre Ministérios Públicos de Estados distintos ou entre o Ministério Público Federal e algum Ministério Público Estadual, qual a autoridade/órgão responsável por dirimir o conflito? A decisão do conflito é vinculante? Justifique.
Código de Processo Penal: “Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público. ” 21
Reconhece-se ao Ministério Público a faculdade de impetrar habeas corpus e mandado de segurança, além de requerer a correição parcial (...). A legitimidade do Ministério Público para impetrar habeas corpus tem fundamento na incumbência da defesa da ordem jurídica e dos interesses individuais indisponíveis (...), e o Ministério Público tem legitimidade para impetrar habeas corpus quando envolvido o princípio do juiz natural (...). [HC 91.024, rel.
min. Ellen Gracie, j. 5-8-2008, 2ª T, DJE de 22-8-2008.]
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Resposta: A competência para dirimir conflitos de atribuição entre órgãos de Ministérios Púbicos de Estados distintos, ou entre os do Ministério Público Federal e os dos Estados, é do Procurador-Geral da República. O Supremo Tribunal Federal, que antes era quem decidia os conflitos, firmou entendimento no sentido de que o conflito de atribuições é matéria administrativa e não jurisdicional, que pode ser solucionada pelo Chefe da Instituição (Princípio da Unidade). A decisão vincula tão somente os Ministérios Públicos, não havendo vinculação do Poder Judiciário ao decidido administrativamente. O Juízo que receba o feito dirimido, caso não concorde com a solução, poderá suscitar conflito de competência perante o Superior Tribunal de Justiça.22 QUESTÃO-TREINO Princípio do Promotor Natural João, médico, prescreveu remédio para obesidade, não autorizado pela ANVISA para a sua paciente que veio a falecer em virtude de efeitos colaterais decorrentes do medicamento. Foi instaurado inquérito policial para apurar os fatos. Ao final da investigação, Carlos, Promotor de Justiça da Vara Privativa do Tribunal do Júri, entendeu que não se tratava de crime doloso contra a vida e promoveu a remessa dos autos a uma das varas criminais do Município. Após promover diligências, inquirir testemunhas e juntar novas provas, Vitor, Promotor que atuava na 1ª Vara Criminal comum concluiu que houve sim crime doloso contra a vida e ofereceu denúncia por homicídio doloso contra João, requerendo o retorno dos autos para o Juízo da Vara Privativa do Júri, que teria competência para analisar a ação penal. O Juiz da Vara do Tribunal do Júri recebeu a denúncia oferecida por Vitor. Houve instrução processual e, ao final desta fase, o Promotor que atua no Júri (Carlos) pediu a pronúncia de João, o que foi acolhido pelo Juiz da Vara do Tribunal do Júri. Diante disso, a defesa do réu impetrou habeas corpus alegando que houve nulidade da sentença de pronúncia. “Tratando-se de divergência interna entre órgãos do Ministério Público, instituição que a Carta da República subordina aos princípios institucionais da unidade e da indivisibilidade (CF, art. 127, § 1º), cumpre ao próprio Ministério Público identificar e afirmar as atribuições investigativas de cada um dos seus órgãos em face do caso concreto, devendo prevalecer, à luz do princípio federativo, a manifestação do procurador-geral da República. [Pet 4.863, rel. min. Marco Aurélio, j. 19-5-2016, P, DJE de 16-5-2017.]” 22
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Isso porque a denúncia por homicídio doloso recebida foi oferecida por Promotor de Justiça que não está vinculado ao Tribunal do Júri, tendo havido, portanto, violação ao princípio do “Promotor Natural”. Com base na jurisprudência dos tribunais superiores, deve a ordem ser concedida? Houve ofensa ao princípio do Promotor Natural? Responda definindo o princípio do Promotor Natural.
Resposta: O princípio do Promotor Natural consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público (porque lhe assegura o exercício pleno e independente do ofício), quanto tutelar a coletividade (quem tem como direito o de ver atuando, em quaisquer causas, o Promotor competente e designado por lei, a partir de critérios abstratos e prédeterminados.23 É um princípio que limita a Unidade (Princípio Constitucional) e o poder do Chefe do Ministério Público, e veda-se, com isso, a designação arbitrária de promotores para atuação específica. Evita-se o “promotor por encomenda” ou “ad hoc”. No caso, a ordem de Habeas Corpus deve ser denegada. Isso porque, mesmo que a denúncia tenha sido oferecida por Vitor, Promotor estranho à Vara do Júri, é certo que o “Promotor Natural” para o caso, Carlos, se manifestou na fase de pronúncia, deixando clara sua concordância com o colega. Operou-se, assim, verdadeira “Ratificação implícita” da denúncia. Não houve ofensa ao Princípio do Promotor Natural.24
23 24
(STF. 2ª Turma. HC 103038, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 27/10/2011). Fonte: (https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2017/11/info-880-stf.pdf.)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Independência Funcional e Autonomia Funcional Defina independência funcional e autonomia funcional, destacando os elementos de diferenciação e de aproximação entre os dois conceitos. Resposta objetivamente fundamentada. (Concurso MPRJ - 2018)
Resposta: O princípio da Independência Funcional constitui uma garantia dirigida ao membro do Ministério Público para que, na atividade-fim, exerça suas funções de acordo com sua consciência e interpretação da lei, livre de ingerências e subordinação hierárquica. Já a Autonomia Funcional, por seu turno, constitui garantia dirigida à Instituição do Ministério Público para que, na atividade-fim, seus membros exerçam suas funções livremente, sem ingerências externas à Instituição. Deste modo, há aproximação quanto à liberdade de atuação na atividade-fim, enquanto a diferenciação repousa no destinatário imediato da garantia, uma vez que a independência toca diretamente ao membro, a autonomia dirige-se em primeiro lugar à instituição.25 QUESTÃO-TREINO Ministério Público Estadual e exercício de outra função O Governador do Estado “A” nomeou, para o cargo de Secretário do Meio Ambiente, Procurador de Justiça, membro do Ministério Público Estadual atuante em segunda instância. Baseou-se, o Chefe do Executivo, em resolução do Conselho Nacional do Ministério Público e no entendimento de que é perfeitamente constitucional o exercício da função pelo agente nomeado. O Partido político “X”, atuante em “A”, questionou na Justiça a nomeação do Procurador para o cargo no Executivo.
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Prova do XXXV Concurso para a Carreira do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro:(http://www.mprj.mp.br/documents/20184/649863/gabarito_oficial_da_prova_escrita_pr eliminar.pdf).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo O questionamento do Partido “X”, quanto à constitucionalidade da nomeação, é procedente? Justifique.
Resposta: Com razão o Partido “X” no questionamento. É flagrantemente inconstitucional qualquer ato que permita que membros do Ministério Público, ainda a ele vinculados, exerçam cargos fora da instituição. A nomeação pelo Governador afronta o art. 128, §5º, II, “d”, da Constituição Federal, que veda aos membros o exercício de qualquer outra função pública, salvo uma de magistério. Em nem mesmo licenciado o Procurador poderá ser Secretário. Para exercer o cargo de Secretário, deve o integrante do Ministério Público deligar-se definitivamente da instituição (aposentadoria ou exoneração). Permitido exercício, haveria risco de subordinação do Ministério Público ao Poder Executivo. A vedação não se aplica aos ingressantes na carreira antes da Constituição de 1988, que tenham optado pelo regime jurídico antigo.26 QUESTÃO-TREINO Autonomia do Ministério Público Indique e conceitue as espécies de autonomia do Ministério Público contempladas na Constituição Federal de 1988?
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Fonte: (https://www.dizerodireito.com.br/2016/03/membros-do-ministerio-publico-que.html)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta: A autonomia do Ministério constitui importante garantia constitucional destinada à instituição, para que não seja subordinada a nenhum dos Poderes do Estado. A Constituição Federal de 1988 consagra, expressamente, a autonomia funcional e administrativa, e, implicitamente, a autonomia financeira. “A autonomia funcional, também prevista no art. 3º da Lei nº 8.625/1993, indica que a instituição está imune a qualquer influência externa no exercício de sua atividade finalística. Assim, poderá adotar as medidas contempladas no ordenamento jurídico, em face de quaisquer agentes, órgãos ou instituições, de caráter público de qualquer outro poder, ou privado, sem represálias ou ingerências contra a instituição. A autonomia administrativa assegura ao Ministério Público a prerrogativa de editar atos relacionados à gestão dos seus quadros de pessoal (v.g.: admissão, designação, exoneração, aposentadoria, disponibilidade etc.), à administração e à aquisição de bens, isso sem olvidar a iniciativa legislativa nas matérias que lhe são correlatas. Diversamente ao que se verifica em relação ao Poder Judiciário, a Constituição da República não utilizou a expressão autonomia financeira ao dispor sobre as garantias do Ministério Público. Essa autonomia, no entanto, é incontroversa, dispondo o art. 127, § 3º, que a instituição elaborará sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, podendo, ainda, empenhar as respectivas despesas.”27
QUESTÃO-TREINO Controle de Constitucionalidade e CNMP Por permissão legal contida na Lei complementar estadual “A”, o Ministério Público do Estado de São Paulo permitiu que Promotores de entrância inicial que atuavam na “Comarca X”, após a transformação desta comarca em comarca de entrância intermediária, escolhessem pela permanência na entrância, operando-se, assim, verdadeiras “promoções virtuais”. Após o ocorrido, outros Promotores, incomodados com a situação, apresentaram reclamação ao “Conselho Nacional do Ministério Público”, que decidiu que a permanência dos Promotores na Comarca era indevida, porque a Lei Complementar “A” era inconstitucional e que o nela disposto não poderia ser aplicado ao caso levado na reclamação e em outros casos posteriores. O Conselho, assim, declarou a inconstitucionalidade do dispositivo da Lei Complementar atacada. O Procurador-Geral de Justiça, então, na representação das prerrogativas da Instituição, ajuizou mandado de segurança perante o Supremo Tribunal Federal, contra a decisão do
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GARCIA, Emerson. A autonomia do Ministério Público: entre o seu passado e o seu futuro. Artigo para a Revista MPMG Jurídico. Edição Especial, 20 anos da Constituição Federal. Disponível no sítio eletrônico: https://aplicacao.mpmg.mp.br.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Conselho Nacional do Ministério Público. Diante do quadro hipotético, responda. A) Considerando que o Ministério Público não tem personalidade jurídica própria, é legítimo o Procurador-Geral para o ajuizamento de Mandado de Segurança em nome da Instituição? B) É competente o Conselho Nacional do Ministério Público para realizar o Controle de Constitucionalidade?
Respostas: A) Embora não seja dotado de personalidade jurídica própria, tem o Ministério Público a chamada “personalidade judiciária”, detendo capacidade ativa para a tutela de seus próprios interesses em juízo. Descabida, pois, a atuação de qualquer órgão de advocacia pública em seu interesse.28 B) Não tem o Conselho Nacional do Ministério Público competência para reconhecer inconstitucionalidade de Lei Estadual. Cabe-lhe, por expressa previsão constitucional, apenas o controle da legitimidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público. Inválida, portanto, a decretação de inconstitucionalidade.29
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O Ministério Público, embora não detenha personalidade jurídica própria, é órgão vocacionado à preservação dos valores constitucionais, dotado de autonomia financeira, administrativa e institucional que lhe conferem a capacidade ativa para a tutela da sociedade e de seus próprios interesses em juízo, sendo descabida a atuação da União em defesa dessa instituição.[ACO 1.936 AgR, rel. min. Luiz Fux, j. 28-4-2015, 1ª T, DJE de 27-5-2015.] 29 O CNMP não ostenta competência para efetuar controle de constitucionalidade de lei, posto consabido tratar-se de órgão de natureza administrativa, cuja atribuição adstringe-se ao controle da legitimidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público federal e estadual (...). [MS 27.744, rel. min. Luiz Fux, j. 6-5-2014, 1ª T, DJE de 8-6-2015
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Poderes investigatórios do Ministério Público O Ministério Público tem poderes investigatórios?
Resposta: O Supremo Tribunal Federal reconheceu o poder de investigação do Ministério Público, sob a tese de que o Ministério Público tem também a atribuição de promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei nº 8.906/94, art. 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade, sempre presente no Estado democrático de Direito, do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vinculante nº 14), praticados pelos membros dessa Instituição.30 DISSERTAÇÃO-TREINO Acordo de Não Persecução penal Discorra a respeito do acordo de não persecução penal. Resposta: O acordo de não persecução penal insere-se dentro do contexto da Justiça Penal Negociada e, particularmente no Brasil, surgiu em um período de ampliação da atuação do Ministério Público31, dentro do contexto das discussões sobre os poderes investigatórios do Parquet e da mitigação do princípio da 30Fonte:http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?inci
dente=2641697&numeroProcesso=593727&classeProcesso=RE&numeroTema=184. 31 José Afonso da Silva e Luis Roberto Barroso emitiram brilhantes pareceres sobre a atribuição de poderes investigatórios ao Ministério Público. Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/parecer-jose-afonso-silva-pec-37.pdf. Acesso em: 12/12/2017; Disponível em: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/7/docs/parecer_barroso__investigacao_pelo_mp.pdf. Acesso em 12/09/18.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo obrigatoriedade da ação penal. A Resolução 181/17 dispõe sobre a investigação criminal realizada pelo Ministério Público, por meio do PIC. O acordo de não persecução penal tipifica uma hipótese de exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal pública e guarda grande relação com o princípio da oportunidade (um critério de seleção orientado pelo princípio da intervenção mínima, o que, em tese, permite que o Ministério Público estipule as regras de seleção conforme a política criminal adotada pela instituição). Portanto, representa uma alternativa para tornar nosso sistema judicial mais eficiente, com uma escolha mais inteligente das prioridades (BRASILEIRO, 2018, p. 196/197). Nas hipóteses de acordo de não persecução penal, a acusação é viável, tanto que o acusado se vê obrigado a confessar circunstancialmente a prática do delito. Neste aspecto o acordo se diferencia de outros institutos de justiça negociada existentes em nosso ordenamento jurídico, por exemplo, a transação penal e a suspensão condicional do processo, que não exigem a confissão. Todavia, à semelhança destes, aceitação e o cumprimento do acordo não causam reflexos na culpabilidade do investigado. Neste sentido, a depender do modelo de definição dos consensos, o acordo de não-persecução penal funciona como uma espécie de diversão, opção de política criminal usada para a solução de processos penais de maneira diversa da tradicional, e que consiste na solução antes de qualquer determinação ou de declaração de culpa. A diversão pode ser de três espécies: diversão simples (a despeito de indícios de autoria e participação e prova da materialidade do delito, o processo é arquivado sem a imposição de qualquer obrigações ao acusado, porque a persecução penal seria inócua (ex. prescrição virtual); diversão encoberta (ocorre a extinção da punibilidade se o autor do fato delituoso praticar determinados atos, que impossibilitam a deflagração da persecução penal, como a composição de danos civis, artigo 74, § único da Lei 9099/95); diversão intervenção (o investigado, acusado fica sujeito ao cumprimento de certas condições, que uma vez cumpridas de maneira regular, o procedimento investigatório será arquivado ou o processo será extinto (é o que ocorre no acordo de não persecução penal, mas também nos casos de transação penal e suspensão condicional do processo). Assim, ante a falta de legislação específica, a Resolução 181/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público, regulamentou as hipóteses de acordo de não persecução penal, o qual pode ser definido como um negócio jurídico extrajudicial, bilateral, processual personalíssimo, disposto em uma espécie de contrato, que, assim como se dá no acordo de colaboração premiada, há uma contraposição de interesses, consubstanciados nas vantagens que as partes podem obter em razão do que foi pactuado, nos termos permitidos e autorizados pelo ordenamento jurídico. O acordo de não persecução penal deve ser homologado pelo juízo competente, celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato delituoso, amparado por defesa técnica, que confessa formal e circunstanciadamente a prática de delito, sujeitando-se ao cumprimento de certas condições não privativas de liberdade,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo em troca do compromisso do Parquet de promover o arquivamento do feito, caso a avença seja integralmente cumprida. O acordo de não-persecução penal tipifica uma hipótese de exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal pública e guarda grande relação com o princípio da oportunidade (um critério de seleção orientado pelo princípio da intervenção mínima, o que, em tese, permite que o Ministério Público estipule as regras de seleção conforme a política criminal adotada pela instituição). Portanto, representa uma alternativa para tornar nosso sistema judicial mais eficiente, com uma escolha mais inteligente das prioridades (BRASILEIRO, 2018, p. 196/197). Contudo, cabe ressaltar que embora o acordo seja fruto da convergência da vontade das partes, os interesses jurídicos envolvidos são distintos: para a acusação trata-se de um meio de obtenção de provas, que não se confunde com as provas que serão produzidas em razão dele, e que contribuí para a eficiente persecução penal de delitos graves, constituindo uma excelente ferramenta para o combate da corrupção e do crime organizado. Já do ponto de vista defensivo, trata-se de uma estratégia defensiva, decorrente dos princípios da ampla defesa e autonomia da vontade, na qual o colaborador avalia o que lhe parece mais vantajoso, o processo litigioso clássico ou o acordo de não persecução penal. As hipóteses de acordo de não persecução penal tem como pressuposto a viabilidade da acusação penal, tanto que o acusado se vê fortemente tendencioso a confessar circunstancialmente a prática do delito. Neste aspecto, o acordo se diferencia de outros institutos de justiça negociada existentes em no ordenamento jurídico brasileiro, por exemplo, a transação penal e a suspensão condicional do processo, que não exigem a confissão. Todavia, à semelhança destes, aceitação e o cumprimento do acordo não causam reflexos na culpabilidade do investigado. Neste sentido, a depender do modelo de definição dos consensos, o acordo de não-persecução penal funciona como uma espécie de diversão, opção de política criminal usada para a solução de processos penais de maneira diversa da tradicional, e que consiste na solução antes de qualquer determinação ou de declaração de culpa. A diversão32 pode ser de três espécies: diversão simples 32
O conceito de diversão, que está diretamente relacionado aos desdobramentos da justiça consensual. Diversão seria uma opção legislativa de política criminal caracterizada pela resolução dos processos penais de modo diverso do usual processo penal conflitivo, consistente na solução antes de qualquer determinação ou declaração de culpa. Aprofundando o conceito de diversão, este pode ser classificado em três categorias: i) diversão simples, é a possibilidade de arquivamento do processo sem qualquer imposição ao acusado, por ser a persecução penal, neste caso, inócua por razoes de política criminal, mesmo que estejam presentes indícios de autoria e elementos de materialidade do delito); ii) diversão encoberta, quando houver a previsão de extinção da punibilidade a partir da determinação de atos ao autor do fato, os quais, uma vez efetuados, impossibilitam o oferecimento da peça acusatória- no direito brasileiro seria a hipótese dos art. 75 e 74, caput, ambos da lei 9099/95; e iii) diversão com intervenção, quando houver previsão legal de condições
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (a despeito de indícios de autoria e participação e prova da materialidade do delito, o processo é arquivado sem a imposição de qualquer obrigações ao acusado, porque a persecução penal seria inócua (ex. prescrição virtual); diversão encoberta (ocorre a extinção da punibilidade se o autor do fato delituoso praticar determinados atos, que impossibilitam a deflagração da persecução penal, como a composição de danos civis, artigo 74, § único da Lei 9099/95); diversão intervenção (o investigado, acusado fica sujeito ao cumprimento de certas condições, que uma vez cumpridas de maneira regular, o procedimento investigatório será arquivado ou o processo será extinto (é o que ocorre no acordo de não persecução penal, mas também nos casos de transação penal e suspensão condicional do processo) QUESTÃO-ESTUDO O artigo 18 33da Resolução 181/17, do CNMP, é constitucional?
ao autor do fato- no direito brasileiro a transação penal e a suspensão condicional do processo, previstos na lei 9099/95 (BRANDALISE, 2016, p.24-25). 33 Art. 18. Não sendo o caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor ao investigado acordo de não persecução penal quando, cominada pena mínima inferior a 4 RESOLUÇÃO Nº 181, DE 7 DE AGOSTO DE 2017. 15/20 CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça a pessoa, o investigado tiver confessado formal e circunstanciadamente a sua prática, mediante as seguintes condições, ajustadas cumulativa ou alternativamente: (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo impossibilidade de fazê-lo; (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; (Redação CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO de 7 de agosto de 2006; (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) VI – a celebração do acordo não atender ao que seja necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 2º A confissão detalhada dos fatos e as tratativas do acordo serão registrados pelos meios ou recursos de gravação audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações, e o investigado deve estar sempre acompanhado de seu defensor. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 3º O acordo será formalizado nos autos, com a qualificação completa do investigado e estipulará de modo claro as suas condições, eventuais valores a serem restituídos e as datas para cumprimento, e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e seu defensor. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 4º Realizado o acordo, a vítima será comunicada por qualquer meio idôneo, e os autos serão submetidos à apreciação judicial. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 5º Se o juiz considerar o acordo cabível e as condições adequadas e suficientes, devolverá os autos ao Ministério Público para sua implementação. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 6º Se o juiz considerar incabível o acordo, bem como inadequadas ou insuficientes as condições celebradas, fará remessa dos autos ao procurador-geral ou órgão superior interno responsável por sua apreciação, nos termos da legislação vigente, que poderá adotar as seguintes providências: (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) I – oferecer denúncia ou designar outro membro para oferecê-la; (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) II – complementar as investigações ou designar outro membro para complementá-la; (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) III – reformular a proposta de acordo de não persecução, para apreciação do investigado; (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) IV – manter o acordo de não persecução, que vinculará toda a Instituição. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta: A doutrina ainda diverge sobre a constitucionalidade acordo de nãopersecução penal, questionando, dentre outras questões, o artigo 18 da Resolução 181/2017, CNMP: poderia uma simples resolução tratar do assunto? De um lado, pode-se argumentar que a resolução é inconstitucional, porque conforme o artigo 22, I, da Constituição Federal, compete à União legislar sobre direito processual penal, por meio de lei ordinária, o que requer processo legislativo e não simples Resolução. Há ainda que defenda a possibilidade de admissão do uso da analogia, como no caso da Resolução 213, do CNJ. Na ADI 5.420/SP, de relatoria do ministro Luiz Fux, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a Resolução 213 não é incompatível com os princípios da legalidade e da reserva de lei federal, pelo fato de regulamentar o que já estaria previsto na CADH, artigo 7º, § 5º, dotada de status normativo supralegal, e do próprio Código de Processo Penal, cujo artigo 656 prevê a possibilidade de apresentação do paciente preso em dia e hora a ser designada pela autoridade judiciária. Mas, este raciocínio não seria válido para o acordo de não persecução penal porque nesse caso não haveria previsão constitucional nem infraconstitucional explícita. Em sentido oposto, pela constitucionalidade da Resolução 181/2017, seria possível defender que no exercício de suas atribuições o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público podem expedir atos regulamentares (artigos 103-B, § 4º, I e artigo 130-A, § 2°, ambos da constituição), uma vez que, na visão do Supremo, suas resoluções ostentam caráter normativo primário e são dotadas de abstração e generalidade, cujos fundamentos de validade são diretamente extraídos de dispositivos constitucionais. Não haveria, portanto, violação à competência legislativa exclusiva da União prevista no artigo 22, I, da Constituição Federal, porque o
janeiro de 2018) § 7º O acordo de não persecução poderá ser celebrado na mesma oportunidade da audiência de custódia. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 8º É dever do investigado comunicar ao Ministério Público eventual mudança de endereço, número de telefone ou e-mail, e comprovar mensalmente o cumprimento das condições, independentemente de notificação ou aviso prévio, devendo ele, quando for o caso, por iniciativa própria, apresentar imediatamente e de forma documentada eventual justificativa para o não cumprimento do acordo. (Redação dada pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 9º Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo ou não observados os deveres do parágrafo anterior, no prazo e nas condições estabelecidas, o membro do Ministério Público deverá, se for o caso, imediatamente oferecer denúncia. (Incluído pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 10 O descumprimento do acordo de não persecução pelo investigado também poderá ser utilizado pelo membro do Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo. (Incluído pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 11 Cumprido integralmente o acordo, o Ministério Público promoverá o arquivamento da investigação, nos termos desta Resolução. (Incluído pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 12 As disposições deste Capítulo não se aplicam aos delitos cometidos por militares que afetem a hierarquia e a disciplina. (Incluído pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018) § 13 Para aferição da pena mínima cominada ao delito, a que se refere o caput, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. (Incluído pela Resolução n° 183, de 24 de janeiro de 2018)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo acordo de não persecução penal não tem natureza processual, porque realizado em procedimento administrativo. QUESTÃO-TREINO Hipóteses para o acordo de não persecução penal Em quais hipóteses é possível a realização do acordo de não persecução penal?
Resposta: O artigo 18 traz os requisitos para a celebração do acordo de não persecução penal: pena mínima inferior a 4 anos, infração cometida sem violência ou grave ameaça e que não seja hipótese de arquivamento de procedimento investigatório. Não é possível proposta de acordo de não persecução penal quando: cabível transação penal; houver dano superior a 20 salários mínimos ou parâmetro diverso definido pelo respectivo órgão de revisão ( o que revela brecha para a discricionariedade); aplicável o artigo 76, §2º, da Lei 9.099/95; houver risco de prescrição da pretensão punitiva; for hipótese de delito hediondo ou equiparado, ou crime praticado com violência doméstica e familiar conta a mulher; ou quando a celebração do acordo não atender ao que seja necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime; delitos cometidos por militares que afetem a hierarquia e a disciplina. QUESTÃO-TREINO De acordo com a Constituição Federal, quais são os fins e princípios institucionais do Ministério Público?
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Resposta: De acordo com o artigo 127, caput e §1o, da CF, o Ministério Público tem como fins a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, e tem como princípios a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. QUESTÃO-ESTUDO O que dispõe a Constituição Federal a respeito da organização do Ministério Público? Resposta: Sem prejuízo do detalhamento a ser disposto por meio da lei infraconstitucional (artigo 127, §2o, parte final, da CF), estabelece o artigo 128 que “o Ministério Público abrange: I - o Ministério Público da União, que compreende: a) o Ministério Público Federal; b) o Ministério Público do Trabalho; c) o Ministério Público Militar; d) o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios; II - os Ministérios Públicos dos Estados”.
QUESTÃO-TREINO Quais são as garantias e vedações constitucionais dos membros do Ministério Público?
Resposta: Estabelece o artigo 128, §5o: as garantias de - “vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado; inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa; irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo disposto nos arts. 37, X e XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I”; e as vedações de “receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; exercer a advocacia; participar de sociedade comercial, na forma da lei; exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; exercer atividade político-partidária; receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei”. QUESTÃO-TREINO Quais são as funções institucionais, estabelecidas na Constituição Federal, do Ministério Público?
Resposta: Conforme o art. 129 da CF, são funções institucionais do Ministério Público: “I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; II zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição; V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva; VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas”. Acerca das funções institucionais, é importante ressaltar a disposição do §1o do artigo 129, afirmando que: “a legitimação do
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei”. QUESTÃO-ESTUDO Na composição do CNJ, há integrantes que não são membros da magistratura? Resposta: Sim, dentre os quinze integrantes do CNJ, há: um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador-Geral da República; um membro do Ministério Público estadual, escolhido pelo Procurador-Geral da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição estadual; dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. Importante notar que o Procurador-Geral da República, embora oficie perante o CNJ, não o integra, ou seja, não é membro deste Conselho. QUESTÃO-ESTUDO Há, dentre as competências do CNJ expressas na Constituição Federal menção ao Ministério Público? Resposta: Sim, de acordo com o artigo 103-B, §4o, inciso IV, cabe ao CNJ, no exercício de suas funções, representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade. QUESTÃO-TREINO Como se compõe o Conselho Nacional do Ministério Público?
Resposta: De acordo com o artigo 130-A, da CF: “O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: I o
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Procurador-Geral da República, que o preside; II quatro membros do Ministério Público da União, assegurada a representação de cada uma de suas carreiras; III três membros do Ministério Público dos Estados; IV dois juízes, indicados um pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiça; V dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VI dois cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. Os membros do Conselho oriundos do Ministério Público serão indicados pelos respectivos Ministérios Públicos, na forma da lei”. Importante ressaltar que o Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil oficiará junto ao Conselho, mas não o integra como membro. QUESTÃO-TREINO Quais são as competências do CNMP?
Resposta: Estabelece o artigo 130-A, §2o da CF: “Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo-lhe: I zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; II zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas; III receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Ministério Público da União ou dos Estados, inclusive contra seus serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional da instituição, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa; IV rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de membros do Ministério
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Público da União ou dos Estados julgados há menos de um ano; V elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias sobre a situação do Ministério Público no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar a mensagem prevista no art. 84, XI”. QUESTÃO-ESTUDO O que dispõe a Constituição Federal acerca do Corregedor nacional do CNMP e sobre as ouvidorias do MP? Resposta: O artigo 130-A, §3o, estabelece que “O Conselho escolherá, em votação secreta, um Corregedor nacional, dentre os membros do Ministério Público que o integram, vedada a recondução, competindo-lhe, além das atribuições que lhe forem conferidas pela lei, as seguintes: I receber reclamações e denúncias, de qualquer interessado, relativas aos membros do Ministério Público e dos seus serviços auxiliares; II exercer funções executivas do Conselho, de inspeção e correição geral; III requisitar e designar membros do Ministério Público, delegando-lhes atribuições, e requisitar servidores de órgãos do Ministério Público.” O §5o, do mesmo artigo, estabelece que “Leis da União e dos Estados criarão ouvidorias do Ministério Público, competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Ministério Público, inclusive contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional do Ministério Público”.
QUESTÃO-ESTUDO De que maneira a Lei Orgânica Estadual classifica os órgãos do MPSP? Resposta: Os artigos 5o - 8o agrupam os órgãos do MP da seguinte maneira: “Artigo 5º - São órgãos da Administração Superior do Ministério Público: I - a Procuradoria-Geral de Justiça; II - o Colégio de Procuradores de Justiça; III - o Conselho Superior do Ministério Público; IV - a Corregedoria-Geral do Ministério Público. Artigo 6º - São órgãos de Administração do Ministério Público: I - as Procuradorias de Justiça; II - as Promotorias de Justiça. Artigo 7º - São órgãos de execução do Ministério Público: I - o Procurador-Geral de Justiça; II - o Colégio de Procuradores de Justiça;
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo III - o Conselho Superior do Ministério Público; IV - os Procuradores de Justiça; V - os Promotores de Justiça. Artigo 8º - São órgãos auxiliares do Ministério Público: I - os Centros de Apoio Operacional; II - a Comissão de Concurso; III - o Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional; IV - os órgãos de apoio técnico e administrativo; V - os Estagiários” QUESTÃO-ESTUDO O que são os Planos Gerais de Atuação do MPSP, de acordo com a Lei Orgânica Estadual? Resposta: A disciplina legal dos “PGAs” vem estabelecida nos artigos 97-99 da Lei Orgânica Estadual: “Art. 97. A atuação do Ministério Público deve levar em conta os objetivos e as diretrizes institucionais estabelecidos anualmente no Plano Geral de Atuação, destinados a viabilizar a consecução de metas prioritárias nas diversas áreas de suas atribuições legais. Art. 98. O Plano Geral de Atuação será estabelecido pelo Procurador-Geral de Justiça, com a participação dos Centros de Apoio Operacional, das Procuradorias e Promotorias de Justiça, ouvidos o Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça e o Conselho Superior do Ministério Público. Parágrafo único - Para execução do Plano Geral de Atuação serão estabelecidos: I - Programas de Atuação das Promotorias de Justiça; II - Programas de Atuação Integrada de Promotorias de Justiça; III - Projetos Especiais. Art. 99. O procedimento de elaboração do Plano Geral de Atuação, dos Programas de Atuação e dos Projetos Especiais será disciplinado em Ato do Procurador-Geral de Justiça.” É importante saber diferenciar os “PGAs”, dos programas de atuação e dos projetos especiais, cuja disciplina está nos artigos 100-102, da Lei Orgânica Estadual: “Art. 100. Os Programas de Atuação das Promotorias de Justiça, que serão por elas elaborados, especificarão as providências judiciais e extrajudiciais necessárias à sua concretização, a forma de participação dos órgãos do Ministério Público neles envolvidos e os meios e recursos para sua execução. Art. 101. Os Programas de Atuação Integrada, obedecido o disposto no artigo anterior, serão elaborados pelos integrantes das Promotorias de Justiça envolvidas, sempre que necessário para a consecução dos objetivos e diretrizes do Plano Geral de Atuação. Art. 102. Os Projetos Especiais, observado o
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo disposto no artigo 99, serão estabelecidos por Ato do Procurador-Geral de Justiça em vista de alterações legislativas ou de circunstâncias emergenciais”. QUESTÃO-TREINO O que dispõe a Lei Orgânica Nacional a respeito dos procedimentos de escolha e destituição do Procurador-Geral de Justiça?
Resposta: De acordo com a Lei Orgânica Nacional: “Art. 9º Os Ministérios Públicos dos Estados formarão lista tríplice, dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução, observado o mesmo procedimento. § 1º A eleição da lista tríplice far-se-á mediante voto plurinominal de todos os integrantes da carreira. § 2º A destituição do Procurador-Geral de Justiça, por iniciativa do Colégio de Procuradores, deverá ser precedida de autorização de um terço dos membros da Assembleia Legislativa. § 3º Nos seus afastamentos e impedimentos o Procurador-Geral de Justiça será substituído na forma da Lei Orgânica. § 4º Caso o Chefe do Poder Executivo não efetive a nomeação do Procurador-Geral de Justiça, nos quinze dias que se seguirem ao recebimento da lista tríplice, será investido automaticamente no cargo o membro do Ministério Público mais votado, para exercício do mandato”.
Ordem Social
3) Leis relacionada ao tema Constituição Federal – arts. 193 a 232. **Observação: Atenção para o art. 225, §7º, da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 96/2017, que dispõe sobre possibilidade da prática de atividades que utilizam animais, como a Vaquejada. A referida
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Emenda foi uma reação ao julgamento da ADI 4983/CE (Info 842), na qual o STF havia decidido pela inconstitucionalidade da prática em razão de afronta ao art. 225, §1º, VII, do texto constitucional34. 4) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores Súmulas do STF: 466 e 650. Súmulas do STJ: 34 e 140. 5) Informativos Informativos do STF:
Da Seguridade Social: Info 859 e Info 87435.
Da Educação, da Cultura e do Desporto: Info 853, Info 862, Info 876 e Info 87936.
Dos Índios: Info 858 e Info 873.
Informativos STJ:
Seguridade Social: Info 601 e Info 606.
Dos Índios: Info 564, Info 571 e Info 611.
QUESTÃO-TREINO Município “X”, localizado no Estado de São Paulo, cria o “Cartão Cidadão”, que será emitido somente para moradores do referido Município e passará a ser necessário para acessar os serviços de saúde municipais. O munícipe que não apresentar o documento, ou aquele que for oriundo de outra municipalidade, terá atendimento de saúde negado nos estabelecimentos municipais. Pergunta-se: a medida imposta pelo Município “X” é constitucional? Fundamente sua resposta (VUNESP – Analista de Promotoria MPSP – 2ª fase – 2015)
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Sobre o assunto: Dizer o Direito - Breves Comentários à EC/2017. As leis estaduais que proíbem o uso do amianto são constitucionais. O art. 2º da Lei federal nº 9.055/95, que autorizava a utilização da crisotila (espécie de amianto), é inconstitucional. Houve a inconstitucionalidade superveniente (sob a óptica material) da Lei nº 9.055/95, por ofensa ao direito à saúde (art. 6º e 196, CF/88); ao dever estatal de redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 7º, inciso XXII, CF/88); e à proteção do meio ambiente (art. 225, CF/88). STF. Plenário. ADI 3937/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgado em 24/8/2017(Info 874). Acerca do assunto ler comentários no link Dizer o Direito - Informativo 874 STF Comentado. 36 Traz o julgamento da ADI 4439, que decidiu pela possibilidade de oferta de ensino religioso em escolas públicas. A respeito do tema: Dizer o Direito - Informativo 879 STF Comentado 35
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Resposta – Gabarito fornecido pela Vunesp: A conduta do Município X é inconstitucional, por violar dois dispositivos da Constituição Federal. A conduta do Município X é inconstitucional, por violar o direito à saúde e o princípio da igualdade, ambos constitucionalmente assegurados. O direito à saúde, previsto nos artigos 6.º e 196 da Constituição Federal, é um direito social (ou de segunda dimensão/geração) de caráter universal (independe de qualquer contribuição). Isso significa que é um direito de todos e um dever do Estado, compreendido aqui em sentido amplo, ou seja, é um dever comum da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, devendo, então, os serviços de saúde ser prestados por todos os entes federativos, nos termos delineados pela própria Constituição Federal e pela legislação que regulamenta o Sistema Único de Saúde. Assim, o Município X, ao instituir o Cartão Cidadão está descumprindo as previsões constitucionais acerca de como deve prestar os serviços de saúde. Além disso, o Cartão Cidadão estabelece uma discriminação indevida, que viola o princípio da igualdade, insculpido no art. 5.º, caput, da Constituição Federal, que cria distinções, em razão de origem municipal, para a prestação de serviços de saúde, sendo assentado pelo Supremo Tribunal Federal que até mesmo estrangeiros não residentes no País têm assegurado o direito à saúde. Observação: a questão reproduz hipótese que foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal (ARE 661288, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 06/05/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 23-09-2014 PUBLIC 24-09-2014). QUESTÃO-TREINO A respeito da ADI 4066, que tinha por objeto eventual inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 12.687/2007, que proíbe o uso de produtos, materiais ou artefatos que contenham quaisquer tipos de amianto no Estado de São Paulo, responda: a. Os Estados-membros detém competência para a legislar sobre a matéria? Em caso positivo, qual o fundamento constitucional. b. Quais os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal em sua decisão no âmbito da ADI 4066.
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Respostas: a) Tendo em vista que a proibição do uso do amianto abrange assuntos de competência concorrente, os Estados-membros possuem competência para legislar sobre a proibição do uso do amianto. Nesse sentido, a Lei Estadual nº 12.687/2007, assim como as demais leis estaduais que versam sobre a proibição do uso de produtos, materiais e artefatos que contenham amianto, versa sobre matéria de produção e consumo, proteção do meio ambiente e proteção e defesa da saúde, previstos, respectivamente, nos incisos, V, VI e XII, do artigo 24 da Constituição Federal. b) No âmbito da ADI 4066 discutia-se a inconstitucionalidade da lei Estadual nº 12.687/2007, uma vez que em se tratando de competência concorrente, a União deteria a competência de editar normas gerais sobre o assunto e os Estados e Municípios teriam competência para suplementar a matéria, ou seja, os Estados-membros poderiam legislar sobre a matéria desde que não contrariassem as normas federais. Ocorre que, a mencionada Lei Estadual, proibia o uso do amianto, ao passo que a lei federal que estava vigente (Lei nº 9.055/95) permitia a utilização do amianto, desde que observados determinados requisitos. Em que pese a eventual inconstitucionalidade em razão da norma estadual em questão ser incompatível com a norma federal, o Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento da ADI 4066 pela possibilidade da edição de leis estaduais que proibissem o uso de material, tendo considerado que o dispositivo da lei federal que permitia o uso do amianto seria incompatível com o texto constitucional sob o fundamento de que a referida lei não protegeria de forma adequada e suficientemente os direitos à saúde e ao meio ambiente equilibrado. DISSERTAÇÃO-TREINO Dissertação da prova passada. Treine! Escreva! Disserte sobre os direitos e interesses das futuras gerações, relacionandoos aos princípios da prevenção e precaução, na temática do dano ambiental. (VUNESP – Analista de Promotoria MPSP – 2ª fase – 2015 – Redação de Tutela de Interesses Difusos e Coletivos) Resposta esperada e fundamentação publicados pela VUNESP:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo O candidato deverá versar sobre cinco pontos: a. Direitos e interesses das futuras gerações, em sintonia com o desenvolvimento sustentável, embasado no artigo 225 da Constituição Federal e na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, demonstrando que esses dispositivos trazem como objetivo a compatibilização do desenvolvimento econômico e social com a preservação da qualidade do meio ambiente para as presentes e futuras gerações. b. Menção ao artigo 225 da Constituição Federal e a alguma das convenções internacionais que tenham consagrado o princípio da prevenção e precaução. c. Abordagem do princípio da prevenção, trazendo o seu significado e importância na temática da preservação das futuras gerações. d. Abordagem do princípio da precaução, trazendo o seu significado e importância na temática da preservação das futuras gerações. e. A importância de evitar a ocorrência do dano ambiental pela aplicação dos princípios da prevenção e da precaução, que são materializados pelos instrumentos do licenciamento e estudo de impacto ambiental.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 2. Direito Administrativo Conceito e princípios gerais do Direito Administrativo. Administração Pública. Administração direta e indireta. Órgãos Públicos, conceito, classificação. Terceiro Setor. Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. Regime jurídico administrativo. Poderes Administrativos. Atos administrativos, classificação, requisitos, extinção, espécies. Licitações e contratos administrativos. Responsabilidade Civil do Estado Agentes Públicos, classificação, regime jurídico, direitos e deveres, responsabilidade civil, criminal e administrativa. Abuso de poder e desvio de finalidade. Improbidade Administrativa. Controle da Administração. Bens Públicos. Intervenção do Estado na propriedade. Serviços Públicos, concessão, permissão e regime das parcerias públicoprivadas.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Princípios da Administração Pública QUESTÃO-TREINO Princípios do Direito Administrativo Hely Lopes Meirelles definiu: “O administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum e deles não pode se afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. ” A) Qual o princípio em questão? Há previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro? Em caso positivo, em qual diploma legal? B) Este princípio sob a ótica da Administração Pública pode ser aplicado na esfera privada? Fundamente.
Resposta: A) O princípio descrito é o da legalidade. Ele é um dos princípios administrativos explícitos no ordenamento jurídico brasileiro. Este princípio é previsto na Constituição Federal (artigo 37, caput). B) Para a Administração só se é permitido fazer aquilo que o a lei expressamente determina. Ou seja, deve haver lei disciplinando a matéria. No entanto, os particulares podem fazer o que a lei não proíbe.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Administração Pública Direta e Indireta QUESTÃO-ESTUDO Entidades Diferencie OS’s de OSCIP’s OS Lei Regência
de Lei n. 9.637/98
Lei 9.790/99
Torna possível que pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, assumam atividades desenvolvidas por entidades ou órgãos da Administração Pública. Há uma transferência para a iniciativa privada
A qualificação das OSCIP’s não visa absorver atividades desenvolvidas pelo Estado, mas tão somente uma parceria, de intuito colaborativo. A OSCIP atua em colaboração
Contrato de gestão
Termo de Parceria
Discricionária
Vinculada
A qualificação como OS depende de aprovação discricionária do Ministro ou titular do órgão setorial (a depender da área de atuação) e do Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG).
A qualificação como OSCIP é ato vinculado do Ministro da Justiça, sendo que o indeferimento deve ser fundamentado.
As áreas de atuação das OS são mais restritas: ensino; pesquisa científica; desenvolvimento tecnológico; de proteção e preservação do meio ambiente; cultura e saúde.
As áreas de atuação das OSCIP’s são mais amplas, como: assistência social; cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; educação; saúde; segurança alimentar e nutricional; meio ambiente; combate à pobreza; direitos
Característica
Instrumento de Formalização
Qualificação
Áreas Atuação
OSCIP
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo humanos, etc. (art. 3º da Lei 9.790/99) A lei disciplina os requisitos específicos, ou seja, a pessoa jurídica deve atender às exigências legais (art. 2º da Lei n. 9.637/98)
A lei não disciplina os requisitos específicos, cuidando das hipóteses em que não se poderá qualificar a pessoa jurídica como OSCIP (art. 2º da Lei 9.790/99).
O conselho de administração Composição deve ser composto por 20 a do Poder 40% (vinte a quarenta por Público na cento) de membros natos Administração representantes do Poder Público.
É permitida a participação de servidores públicos na composição de conselho de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
Requisitos para qualificação
Tabela retirada do site , consultado em 04/10/2018.
QUESTÃO-ESTUDO Estatais 2. Aponte as principais diferenças entre os dois tipos de empresas estatais. Empresa pública
Sociedade de economia mista
Composição do capital
Integralmente público*
Capital público e privado, mas a maioria do capital votante tem que pertencer à Administração Direta – art. 4o, Lei 13.303/16
Forma de organização
Qualquer societária
Justiça competente
Justiça Federal – art. Justiça Comum Estadual** 109, I, CF
modalidade Sociedade apenas
anônima,
*Obs.: desde que a maioria do capital votante permaneça em propriedade da Administração Direta, será admitida, no capital da empresa pública, a participação de outras pessoas jurídicas de direito público interno, bem como de entidades da administração indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Ex.: é possível uma empresa pública formada por 3 acionistas:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo União Federal, que possui a maioria do capital votante, uma autarquia estadual e uma empresa pública municipal. Súmulas:
556, STF: “É competente a Justiça comum para julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista.”
517, STF: “As sociedades de economia mista só têm foro na Justiça Federal, quando a União intervém como assistente ou opoente.”
42, STJ: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu detrimento.”
QUESTÃO-ESTUDO Órgãos Públicos Órgãos públicos: conceitue e apresente sua classificação com exemplos. De acordo com a doutrina (Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Hely Lopes Meirelles), órgãos públicos representam centros de competência instituídos para o exercício da função administrativa. Seguindo o mesmo sentido está a definição legal, disposta no art. 1º, §2º, I, Lei 9.784/99, que descreve órgão público como a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta e da estrutura da Administração indireta. Os órgãos públicos não têm personalidade jurídica própria, são entes despersonalizados, criados para explicar a relação jurídica entre o Estado e o agente público. É possível classificar os órgãos públicos em 4 categorias: a) órgãos independentes: que estão no topo da hierarquia, na cúpula, e possuem previsão constitucional. Não há subordinação, eles detêm plena autonomia. Ex.: Presidência da República, MP. b) órgãos autônomos: também se encontram no topo da estrutura administrativa, e, apesar de possuírem autonomia, são subordinados aos órgãos independentes. Ex.: Ministérios. c) órgãos superiores: órgãos de chefia e direção, subordinados aos órgãos anteriores (independentes e autônomos) e que não apresentam autonomia administrativa e financeira. Ex.: Procuradoria da Fazenda Nacional (subordinada à Fazenda Nacional, que, por sua vez, está subordinada à Presidência da República)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo d) órgãos subalternos: estão na base da estrutura organizacional, subordinados aos órgãos anteriores, não tendo qualquer poder decisório. Possuem função, eminentemente, executiva. Ex.: reprografia, almoxarifado.
Atos administrativos QUESTÃO-TREINO (Procurador do Estado do AM – adaptada) A Administração vem a constatar, após o recebimento de uma denúncia, que um servidor público estadual havia falsificado o certificado de conclusão de graduação em curso de nível superior, necessário à titulação do cargo efetivo por ele ocupado. Sabe-se que, posteriormente à posse, o referido servidor concluiu o curso de graduação exigido para a titulação do cargo. a) Qual o procedimento a ser adotado pela Administração neste caso? b) Os atos praticados por este servidor durante o exercício da função reputam-se inválidos por esse motivo?
R: a) O ato administrativo em questão (posse no serviço público) é nulo, pois a Administração foi induzida a erro (vício na motivação do ato). Como o servidor agiu de forma dolosa, não é possível convalidar o ato da posse, ainda que ele tenha posteriormente atingido o requisito para a investidura no cargo público, concluindo o curso de graduação exigido. E, embora a Administração esteja autorizada a anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais37, é imperiosa, no caso, a instauração do procedimento administrativo competente, com obediência aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório38. O procedimento administrativo não exclui a responsabilidade 37
Súmula 473 STF: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial. 38 AI 710.085. AgR, STF – 1ª Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 03.02.2009, DJe: 05.03.2009.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo do servidor na esfera cível, inclusive em sede de ação de improbidade administrativa, e a responsabilidade penal pela falsificação. b) Não, o defeito invalidante da investidura de um agente público não acarreta, por si só, a nulidade dos atos que ele praticou. Trata-se da teoria do “funcionário público de fato”, segundo a qual, embora a investidura do servidor tenha sido irregular, a situação tem aparência de legalidade. Em nome dos princípios da aparência, da boa-fé dos administrados, da segurança jurídica e da presunção de legalidade dos atos administrativos, são considerados válidos os atos por ele praticados, salvo se por outra razão forem viciados39. QUESTÃO-TREINO Marcelo é servidor público estadual e praticou ato de corrupção. Foi instaurado procedimento administrativo disciplinar para apuração de sua conduta, tendo-lhe sido imposta a pena de demissão. Marcelo interpôs recurso administrativo contra a decisão proferida. Porém, antes do julgamento do recurso, a Administração Pública cessou o pagamento da remuneração do servidor e o afastou das funções. É possível que a sanção aplicada seja, desde logo, executada mesmo que ainda esteja pendente recurso interposto no âmbito administrativo?
Resposta: Sim. O STJ firmou entendimento no sentido de ser possível o cumprimento imediato de penalidade imposta ao servidor em procedimento administrativo disciplinar, ainda que pendente o julgamento do recurso administrativo, sob o argumento de que os atos administrativos gozam de autoexecutoriedade, de modo a permitir que a Administração execute seus efeitos materiais, independentemente de autorização judicial ou trânsito em julgado da decisão administrativa40. Ademais, a execução dos efeitos materiais da penalidade imposta ao servidor não dependem do julgamento de recurso 39
MELLO, Celso Antônio B. Curso de Direito Administrativo. 25. Ed. rev. e atual. São Paulo, Malheiros: 2008. p. 245. 40 STJ. 1ª Seção. MS 19.488-DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 25/3/2015 (Info 559) (Fonte: Dizer o Direito).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo interposto na esfera administrativa, uma vez que, em regra, não possui efeito suspensivo41. QUESTÃO-TREINO Ato administrativo é o meio pelo qual a Administração Pública exterioriza sua vontade, a fim de produzir efeitos jurídicos. Quais os requisitos dos atos administrativos?
Resposta: Embora exista divergência sobre o assunto, grande parte da doutrina reconhece que os elementos do ato administrativo se encontram elencados no artigo 2º da Lei 4.717/65 (Lei de Ação Popular), sendo eles: competência/sujeito, forma, objeto, motivo e finalidade. Diante disso, tem-se que o ato administrativo válido é aquele que tenha sido editado por autoridade competente para tanto, obedecendo as formalidades e solenidades previstas em lei e cujo conteúdo seja lícito e possível, com exposição dos fatos e fundamentos jurídicos geradores vontade administrativa e direcionado ao atingimento do interesse público. Os atos editados em desconformidade com esses requisitos são considerados nulos, nos termos do dispositivo acima mencionado.
Licitações QUESTÃO-TREINO Participação em Licitações A Prefeitura do Município de Guarulhos abriu licitação para a compra de materiais escolares para as escolas públicas. Um servidor público da prefeitura de Guarulhos participante de uma das empresas concorrentes decidiu participar da licitação. Pergunta-se: 41 Art. 109 da Lei 8.112/90.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo a) A empresa em que o servidor faz parte poderá participar da licitação? b) Caso este mesmo servidor esteja licenciado, a empresa poderá participar da licitação?
RESPOSTA: a) O servidor não poderá participar da licitação, pois lhe é vedado, conforme dispõe o artigo 9º, III, da Lei 8.666/93. b) Não. O fato de estar o servidor licenciado, à época do certame, não ilide a aplicação do referido preceito legal, eis que não deixa de ser funcionário o servidor em gozo de licença" (REsp 1607715/AL, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/03/2017, DJe 20/04/2017) QUESTÃO-TREINO Contratação direta É possível a contratação direta de escritório de advocacia para prestação de serviços advocatícios, sem licitação? Explique.
Resposta: É possível, desde que cumpridos alguns requisitos a) existência de procedimento administrativo formal; b) notória especialização profissional; c) natureza singular do serviço; d) demonstração da inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público; e) cobrança de preço compatível com o praticado pelo mercado. (Inq 3074, Relator(a): Min. ROBERTO
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo BARROSO, Primeira Turma, julgado em 26/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 02-10-2014 PUBLIC 03-10-2014) QUESTÃO-TREINO Contratação direta Diferencie licitação deserta de licitação fracassada.
Resposta: Licitação deserta é aquela em que não aparece nenhum interessado, enquanto a licitação fracassada é aquela em que aparecem interessados, porém nenhum é selecionado, em decorrência de inabilitação ou desclassificação.
Responsabilidade Civil do Estado
1) Legislação relacionada ao tema Artigo 37, § 6º, da Constituição da República Artigo 43, do Código Civil Artigo 206, § 3º, do Código Civil Decreto-Lei nº 20.910/32 2) Informativos Informativo nº 421, do Supremo Tribunal Federal Informativo nº 819, do Supremo Tribunal Federal (morte de detento. MUITO IMPORTANTE) Informativo nº 615, do Superior Tribunal de Justiça Informativo nº 545, do Superior Tribunal de Justiça (dano ambiental)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Informativo nº 553, do Superior Tribunal de Justiça (cadáver em decomposição em reservatório de água) Informativo nº 532, do Superior Tribunal de Justiça Jurisprudência em Teses (STJ): edição nº 61 (leitura rápida e muito importante, pois traz os julgados mais importantes sobre os temas, além de individualizar os informativos). QUESTÃO-TREINO “L'Etat cest moi". A famosa expressão, atribuída ao rei francês Luis XIV, representa a doutrina política adotada pelos Estados absolutistas. A ideia de soberania das monarquias trazia, por via obliqua, a irresponsabilidade do Estado, porquanto não havia resposta estatal aos atos danosos praticados contra os súditos. Tal premissa remonta à Teoria da Irresponsabilidade do Estado, mas é certo que houve clara evolução no sentido de que, hoje, o ente público é responsabilizado pelos atos dos agentes que causarem lesão ao particular. a) Com fundamento no texto, explique como se manifesta a responsabilização civil do Estado, seus elementos caracterizadores e o fundamento no ordenamento jurídico brasileiro. b) Como ocorre a responsabilização do agente público que praticou o ato danoso? No caso de propositura de ação para indenização, como o agente público seria demandado?
Respostas: a) O Brasil adota da Teoria da Responsabilidade Objetiva, com fundamento no artigo 37, 6, da Constituição da República e também como previsto no artigo 43, do Código Civil. Nesse sentido, tem-se que o Estado deve ressarcir os particulares pelos danos que lhe foram causados pela conduta comissiva do agente público, seja ilícita ou lícita, a despeito da inexistência de contrato anterior entre as partes, uma vez que a natureza da responsabilidade é extracontratual. E por se tratar de responsabilidade objetiva, prescinde da comprovação de dolo ou culpa do agente público causador do dano, visto que basta a relação causal entre o seu ato e os prejuízos sofridos pelo particular. Desse modo, os elementos caracterizadores da responsabilidade civil objetiva
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo do Estado são: a conduta, lícita ou ilícita, o dano, ainda que moral, e o nexo de causalidade entre ambos (de que a conduta do agente foi determinante para que o prejuízo fosse causado). b) Embora a responsabilidade civil do Estado seja objetiva, o agente responde pelos atos praticados se sua conduta foi dolosa ou culposa e, nesse sentido, a responsabilidade é subjetiva. Assim, além dos elementos conduta, dano e nexo de causalidade, deve-se analisar o dolo ou a culpa do sujeito que causou a lesão ao particular.No caso, a vítima busca ressarcimento junto ao Estado e este cobra do agente, em ação de regresso, como dispõe o artigo 37, 6, da Constituição da República. Pelo entendimento majoritário, não é possível a denunciação à lide do agente público, porquanto haveria ampliação do mérito da ação por ser necessário discutir o dolo ou a culpa, o que traria maior prejuízo à vítima e ineficiência processual.
BREVES COMENTÁRIOS (letra a): Como explicitado, o ato do agente público causador do dano pode ser ilícito ou lícito. Neste último caso, a conduta lícita deve ensejar um dano extraordinário, anormal, sobretudo porque o ato busca beneficiar a coletividade em face de um (ou mais) particular prejudicado. Assim, a responsabilidade civil do Estado por ato lícito observa o princípio da isonomia, na medida em que há atuações estatais que, mesmo beneficiando a coletividade, prejudica um indivíduo. Fernanda Marinela traz como exemplos a construção de cemitérios, presídios ou viadutos, os quais podem gerar grande incômodo e até mesmo desvalorização dos imóveis vizinhos. Outro exemplo interessante é a requisição de automóvel particular para a perseguição de criminosos, acaso o veículo venha a sofrer danos. Em todos esses casos, se demonstrado o grave prejuízo com a conduta lícita do Estado, haverá ressarcimento pelos danos. Cumpre informar que pela "Teoria do Duplo Efeito dos Atos Administrativos", o mesmo ato pode vir a causar um dano específico e anormal para um indivíduo, passível de indenização, e não causar para outro. Assim, a pessoa que não suportou o dano anormal não poderá justificar o pedido de indenização apenas porque outro indivíduo foi ressarcido. BREVES COMENTÁRIOS (letra b): Atualmente, há controvérsia na doutrina, bem como entre decisões do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de se demandar diretamente o agente público causador do dano. Celso Antônio Bandeira de Mello defende que a vítima ingresse diretamente contra o agente causador do dano, mas desde que renuncie à garantia da responsabilidade objetiva do Estado. Em decisão da 1 Turma do Supremo Tribunal Federal, sustenta-se que a vítima não poderá buscar a reparação dos
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo danos diretamente do agente público, visto que a Constituição da República, ao mesmo tempo que impõe a responsabilidade do Estado em prol da vítima, também garante ao agente ser cobrado apenas pelo ente, como fundamento da "teoria da dupla garantia". Por outro lado, há julgado do Superior Tribunal de Justiça, de 2014, permitindo propor ação diretamente contra o agente público com fundamento na economia processual. Há decisão do Superior Tribunal de Justiça que admite a denunciação à lide do agente público pelo Estado, mas sem que o ente seja obrigado a fazê-lo. Assim, é possível ação autônoma de regresso: “Nas ações de responsabilidade civil do Estado, é desnecessária a denunciação da lide ao suposto agente público causador do ato lesivo”. (STJ. Jurisprudências em Teses, edição nº 61). QUESTÃO-TREINO "Sr. X", motorista de ônibus da concessionária "Y", fazia o transcurso rotineiro sentido bairro-centro. Em dado momento, o "sr. X"parou o veículo no ponto para que 10 passageiros subissem, ao passo que, após todos sentarem, ele retomou o percurso. Contudo, ao ultrapassar para a faixa da esquerda, o motorista acelerou de forma brusca, por descuido, e atingiu o poste que ficava na via, sendo que uma senhora passava pelo local. Esta senhora veio a ser atropelada e, por sorte, sofreu ferimentos leves. a) Qual é a responsabilidade da concessionária e do ente público que a contratou? b) Há diferença entre a responsabilização pelos danos causados aos passageiros, usuários do serviço, e à lesão causada à senhora, que não era usuária do serviço no momento do acidente?
Respostas: a) Tanto a concessionária de serviço público quanto o Estado respondem objetivamente pelos ato praticado pelo motorista, visto que, além dos entes da Administração Pública (Direta ou Indireta), os particulares prestadores de serviço público por delegação também se submetem ao regime previsto no artigo 37,6 da Constituição da República. Contudo, é necessário observar que, em regra, a responsabilidade do Estado é subsidiária à da concessionária, pois
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo devem ser esgotados todos os meios de pagamento por parte da prestadora de serviço público. b) Não há diferença se o ato danoso atingiu um usuário ou um não usuário do serviço público, em atenção ao princípio da isonomia, visto que as vítimas não usuárias do serviço seriam consumidoras por equiparação (bystanders). Assim, a responsabilidade também será objetiva, visto que a Constituição da República não distingue. BREVES COMENTÁRIOS: Somente as empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos observam o regime previsto no artigo 37, 6, da Constituição da República, ou seja, respondem conforme as regras do Direito Administrativo, Já as empresas estatais que exploram atividade econômica respondem pelos atos dos seus agentes conforme as regras do direito privado e varia conforme a relação jurídica instaurada. Por exemplo: relação de consumo. Não confundir a responsabilidade subsidiária do Estado com a responsabilidade solidária, pois, neste caso, tanto o prestador de serviço público quanto o Estado responderam ao mesmo tempo. O Superior Tribunal de Justiça em caso de ano ambiental já entendeu que haveria responsabilidade solidária entre o Município e a concessionária. Sobre esse assunto ler notícia extraída do site do Tribunal: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noti cias/Not%C3%ADcias/A-responsabilidade-do-Estado-e-dasconcession%C3%A1rias-de-servi%C3%A7os-p%C3%BAblicos Para aprofundar: " (...) 2. As concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com o usuário, subordinam-se aos preceitos do Código de Defesa do Consumidor e respondem objetivamente pelos defeitos na prestação do serviço. Precedentes. 3. No caso, a autora é consumidora por equiparação em relação ao defeito na prestação do serviço, nos termos do art. 17 do Código consumerista. Isso porque prevê o dispositivo que "equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento", ou seja, estende o conceito de consumidor àqueles que, mesmo não tendo sido consumidores diretos, acabam por sofrer as consequências do acidente de consumo, sendo também chamados de bystanders. 4. "A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal" (RE 591874, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 26/08/2009, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-237 DIVULG 17-12-2009 PUBLIC 18-12-2009). "(Resp 1268743/RJ)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Em se tratando de responsabilidade civil do Estado, tem-se que o artigo 37, § 6º, da Constituição da República, adotou a responsabilização objetiva, mas não especifica se é aplicada apenas quando das condutas comissivas dos agentes públicos. Nos casos de ausência de conduta do agente, em situações nas quais ele deveria agir, ocorrido um evento danoso, aplica-se a responsabilidade objetiva do Estado segundo a doutrina e jurisprudência majoritárias? Justifique.
Resposta: Na doutrina majoritária, a posição adotada é de que a responsabilidade do Estado em caso de conduta omissiva é subjetiva, com fundamento na teoria da culpa administrativa. Dessa forma, dever-se-ia comprovar o dano, o nexo causal, a omissão do Estado e a culpa administrativa, que seria a falha no serviço público prestado ou a sua ineficiência. Também é a posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça. Contudo, o Supremo Tribunal Federal passou a entender que a responsabilidade civil nos casos de omissão do Estado também é objetiva, visto que o artigo 37, § 6º, da Constituição da República não faria diferenciação quanto à conduta do agente, ou seja, se comissiva ou omissiva. Assim, bastaria ao particular prejudicado a comprovação do nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público. BREVES COMENTÁRIOS: 1. Teoria do Risco criado/risco suscitado e omissão do Estado: Deve-se fazer, no entanto, uma advertência: para o STF, o Estado responde de forma objetiva pelas suas omissões, mas o nexo de causalidade entre a conduta omissiva e os danos sofridos pelos particulares só é caracterizado quando o ente público tinha o dever legal específico de agir para impedir o evento danoso e, mesmo assim, não cumpriu tal dever. É a chamada omissão específica (STF. Plenário. RE 677139 AgR-EDv-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 22/10/2015).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Acórdão: (...) A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por atos omissivos, desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público. (...) STF. 2ª Turma. ARE 897890 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 22/09/2015.
2. Para aprofundar, quanto ao entendimento do STJ:
Informativo de Jurisprudência n. 0437, publicado em 04 de junho de 2010. Superior Tribunal de justiça. Jurisprudência em teses: “A responsabilidade civil do Estado por condutas omissivas é subjetiva, devendo ser comprovados a negligência na atuação estatal, o dano e o nexo de causalidade”.
Acórdãos: SEGUNDA TURMA. AgRg no REsp 1345620/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 24/11/2015. AgRg no AREsp 501507/RJ,Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA. Julgado em 27/05/2014, DJE 02/06/2014. REsp 1230155/PR,Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, Julgado em 05/09/2013,DJE 17/09/2013.
QUESTÃO-ESTUDO É possível a exclusão da responsabilidade civil do Estado. Qual a teoria justifica a resposta à questão anterior e quais as hipóteses de exclusão da responsabilidade civil do Estado, considerando o elemento nexo de causalidade? Resposta: Sim, é possível a exclusão da responsabilidade civil do Estado a partir da adoção da teoria do risco administrativo, a partir da ausência de um dos elementos que compõem a responsabilidade civil objetiva, quais sejam: conduta, dano, ainda que moral, e nexo causal. Quanto aos dois primeiros elementos não há qualquer indagação. No que reporta ao nexo de causalidade, tem-se que há interrupção nos casos em que a conduta do agente público não é bastante para lhe imputar o dano e, consequentemente, ensejar a responsabilidade civil. Dessa forma, o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima são aptas a interromper o nexo causal.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo BREVES COMENTÁRIOS: 1. Para aprofundar: em caso de suicídio de preso (informe do site Dizer o Direito) • Em regra: o Estado é objetivamente responsável pela morte de detento. Isso porque houve inobservância de seu dever específico de proteção previsto no art. 5º, inciso XLIX, da CF/88. • Exceção: o Estado poderá ser dispensado de indenizar se ele conseguir provar que a morte do detento não podia ser evitada. Neste caso, rompe-se o nexo de causalidade entre o resultado morte e a omissão estatal. O STF fixou esta tese em sede de repercussão geral: Em caso de inobservância de seu dever específico de proteção previsto no art. 5º, inciso XLIX, da CF/88, o Estado é responsável pela morte de detento. STF. Plenário. RE 841526/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 30/3/2016 (repercussão geral) (Info 819).”42 2. A teoria do risco integral não admite qualquer hipótese de exclusão da responsabilidade civil do Estado, porquanto é um garantidor universal e haveria responsabilidade absoluta pelos danos ocorridos. Tais hipóteses, segundo a doutrina majoritária, tal hipótese se aplica a danos decorrentes de atividade nuclear, danos ao meio ambiente, crimes ocorridos a bordo de aeronaves que sobrevoam o espaço aéreo brasileiro e ataques terroristas. 3. Nos casos de culpa concorrente da vítima permanecerá a responsabilidade civil do Estado, mas haverá redução do valor a ser indenizado.
Controle da Administração Pública
QUESTÃO-ESTUDO Controle da Administração Acerca do controle da Administração Pública, responda às seguintes perguntas: a) O controle externo é exercido por qual (is) Poder (es), e com o auxílio de qual (is) órgão(s)?b) O controle interno, por sua vez, é exercido por qual (is) Poder (es)? c) Quais são os parâmetros de controle?d) Qual é o órgão responsável pela fiscalização contábil, financeira e orçamentária do Ministério Público? O órgão em questão realiza qual tipo de controle, externo ou interno? 42
Informe publicado no site https://www.dizerodireito.com.br/2018/08/responsabilidadecivil-do-estado-em.html:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Respostas: a) Controle externo – aquele exercido por um Poder sobre os demais – é exercido pelo Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, nos termos do artigo 71, caput, da Constituição Federal. b) Controle interno, por sua vez, é aquele que cada um dos Poderes exerce sobre seus próprios atos, e por este motivo é exercido por todos os três poderes, quais sejam: Legislativo, Executivo e Judiciário. É exercido dentro de um mesmo poder. c) Nos termos do artigo 70, caput, da Carta Magna, os parâmetros são os seguintes: legalidade, legitimidade, finanças e economicidade. Por legalidade, entende-se a conformidade com a lei e a Constituição, nos termos de seu artigo 37, caput. Já a legitimidade diz respeito ao mérito das decisões tomadas (conformidade com o interesse público). Quanto às finanças, o controle tem como parâmetro noções de contabilidade e a aplicação de subvenções, despesas e renúncia de receitas. Finalmente, é realizado um controle no tocante à economicidade, que significa a compatibilidade custo-benefício e eficiência (artigo 37, caput, da Constituição Federal). d) É o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) o órgão responsável por realizar o controle interno do Ministério Público, nos termos do artigo 130-A, parágrafo 2º, da Constituição Federal.43 NOTA: O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) não possui natureza de órgão governante superior, e sim natureza de órgão de controle constitucional. Essa foi a deliberação, unânime, do Plenário do CNMP realizada em 14 de junho de 2016, durante a 2ª Sessão Extraordinária de 2016. A deliberação ocorreu no julgamento de procedimento interno da Comissão de Planejamento Estratégico do CNMP que teve por objetivo verificar a possibilidade de enquadramento do CNMP como Órgão Governamental Superior (OGS) da Administração Federal, assim como no que se refere à abrangência de sua atuação no exercício do controle administrativo e financeiro do MP brasileiro. De acordo com o relator do processo, conselheiro Orlando Rochadel, o procedimento foi iniciado com base em deliberação do Tribunal de Contas da União (TCU) que recomendou ao CNMP a elaboração de modelo de governança com o intuito de aprimorar a atuação das organizações públicas brasileiras. Após analisar o procedimento, o Plenário do CNMP seguiu o voto do 43
SCATOLINO, Gustavo; TRINDADE, João. Manual de Direito Administrativo. 2. ed. [S.l.]: Juspodivm, 2014. 981 p.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo conselheiro Orlando Rochadel e concluiu que o CNMP não possui natureza de órgão governante superior, e sim natureza de órgão de controle constitucional. Além disso, o Plenário deliberou que são indevidas as intervenções do TCU na atividade finalística do CNMP, na medida em que a atuação do CNMP deve ter como limite a autonomia administrativa e financeira conferida pela Constituição Federal à Institucional Ministerial. Outra conclusão foi a de que o CNMP não integra funcionalmente (atividades finalísticas) a União e as suas entidades de Administração Direta e Indireta, pois a Constituição confere ao CNMP, no que se refere às suas atividades finalísticas, a função de órgão de controle externo do MP brasileiro como instituição de caráter nacional, o que abrange o controle externo do MP da União e dos Estados. Ademais, foi deliberado pelo Plenário que o CNMP é instituição constitucional de caráter nacional, e suas competências constitucionais, relacionadas ao controle da atuação administrativa e financeira do MP brasileiro, bem como ao cumprimento dos deveres funcionais de membros da Instituição, prevalecem sobre as competências constitucionais do TCU, restritas ao âmbito do controle externo da União e das entidades da Administração Direta e Indireta. Por fim, o Plenário deliberou que o modelo de composição do CNMP, com representatividade plural e mandatos de dois anos, admitida uma recondução, deixa claro que os seus atos, no exercício de suas atividades finalísticas, somente poderão ser controlados jurisdicionalmente, sendo que a própria Constituição Federal confere ao Supremo Tribunal Federal, na qualidade de Tribunal Constitucional de superposição aos demais órgãos constitucionais, competência originária para as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o CNMP. Com o intuito de apresentar a proposta aprovada e manter diálogo institucional com o TCU, foi instituída comissão integrada pelos conselheiros do CNMP Orlando Rochadel, Walter Agra, Leonardo Carvalho e Valter Shuenquener. Cópias do acórdão referente ao procedimento interno da comissão serão remetidas ao TCU e ao CNJ, para conhecimento. Processo: 337/2016-92 (procedimento interno de comissão)44
BENS PÚBLICOS
QUESTÃO-ESTUDO a) Classifique os bens públicos quanto à destinação. Explique, ainda, os institutos da “afetação” e “desafetação”. b) Imagine a seguinte situação: Mévio está ocupando irregularmente um bem público de uso comum do povo. Pergunta-se: caso tenha
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Fonte: http://www.cnmp.mp.br/portal/noticias-cddf/9438-plenario-delibera-que-o-cnmp-possuinatureza-des-orgao-de-controle-constitucional.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo sua posse ameaçada pelo Poder Público, poderá valer-se de ações possessórias? E se for um particular? Fundamente. c) Defina e diferencie autorização, permissão e concessão de uso de bem público. Respostas: A) Os bens públicos são aqueles bens móveis ou imóveis pertencentes às Pessoas Jurídicas de Direito Público, bem como aqueles que, ainda que pertencentes à iniciativa privada, estejam afetados à prestação de um serviço público. Com relação à classificação quanto à destinação, temos: bens de uso comum do povo, bens de uso especial e bens dominicais. Os bens de uso comum do povo constituem patrimônio indisponível das Pessoas Jurídicas de Direito Público e estão à disposição da coletividade, destinando-se à utilização geral sem distinção. Os bens de uso especial também constituem patrimônio indisponível, mas destinam-se à prestação de serviços públicos (também chamados de bens de instrumento). Vale destacar que os bens de uso comum do povo e de uso especial não poderão ser onerados ou alienados. Isso somente poderá ocorrer através de sua transformação, mediante desafetação, para a qualidade de bens dominicais. Por fim, os bens dominicais são considerados como os bens sem destinação pública. Estão desafetados e se submetem a regime jurídico de direito privado. Um bom exemplo são as terras devolutas. O instituto da afetação implica na transformação de um bem dominical em bem de uso comum do povo ou bem de uso especial, e poderá ser realizada de qualquer maneira: através de Lei, mediante ato administrativo ou pelo simples uso. Já o instituto da desafetação consiste na transformação de bem de uso comum do povo ou especial em bem dominical. Tal alteração somente poderá ocorrer através de Lei ou ato administrativo. Há a possibilidade, ainda, de ocorrer a desafetação em razão de um fenômeno da natureza (força maior), por exemplo. B) Os bens de uso comum do povo e de uso especial são inalienáveis, conforme dispõe expressamente o Código Civil. Entretanto, trata-se de inalienabilidade relativa (ou alienabilidade condicionada), pois não poderão ser alienados somente enquanto mantiverem este “status”. Já os bens dominicais poderão ser alienados, por não estarem afetados ao serviço público. Importante salientar que todas elas são imprescritíveis, ou seja, insuscetíveis de usucapião. A despeito da impossibilidade de usucapião, poderão ocorrer situações similares à descrita no enunciado, em que um indivíduo ocupa irregularmente um bem público dominical determinado. Nestas hipóteses, a própria jurisprudência do STJ entendeu, recentemente, que o particular não terá direito ao manejo de ações possessórias em face do Poder Público, pois tratar-se-á de mera detenção, de natureza precária. Entretanto, será possível o manejo de interditos possessórios quando o litígio envolver particulares com relação ao bem dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à posse. Isso porque a ocupação por particular de um bem público abandonado/desafetado vai conferir justamente a função social da qual o bem está carente em sua essência. Para aquela Corte, a posse deve ser protegida como um fim em si mesma. Assim, exercendo o particular o poder fático sobre a res e garantindo sua função social, pode ser reconhecida, de forma excepcional, a posse pelo particular sobre bem público dominical, até porque
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo esta categoria de bem possui estatuto semelhante ao dos bens privados, não sendo considerado res extra commercium (isto é, indisponível e inalienável). Nestas hipóteses, portanto, tem-se que o particular poderá manejar interditos possessórios contra terceiros que venham a ameaçar ou violar a sua posse. Observação: recentemente, no Informativo 623 do STJ, importante julgado definiu a seguinte tese: “Em ação possessória entre particulares é cabível o oferecimento de oposição pelo ente público, alegando-se incidentalmente o domínio de bem imóvel como meio de demonstração da posse”. STJ. Corte Especial. EREsp 1.134.446-MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 21/03/2018 (Info 623). Ou seja, relativizou-se o artigo 557 do CPC, permitindo ao Poder Público ingressar com oposição para discutir o domínio do imóvel (Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa). “Desse modo, se dois particulares estão discutindo a posse de um bem público e há a oposição do Poder Público, este também estará discutindo a posse do Estado sobre a área”. C) Tratam-se de institutos de utilização especial privativa. Os bens públicos de domínio público são usados, por utilização pública, pelo Estado. Se o particular se utilizar de um bem público de forma privativa, esta não poderá colidir com a utilização pública, e será regida pelas regras de direito público. Os instrumentos que viabilizam a sua utilização também serão de direito público, sendo eles: concessão, autorização e permissão de uso. Para tanto, dependerá de título jurídico formal, através do qual a Administração exprimirá seu consentimento. É nesse título que estarão fixadas as condições de uso, condições essas a que o administrado deverá se submeter estritamente. Autorização de uso – interesse do particular / eventos ocasionais e temporários / sem licitação / ato administrativo unilateral, precário e discricionário / gratuita ou onerosa / Não cria deveres de utilização, mas mera faculdade. Exemplo: Luau em praia. Permissão – Interesse do particular e do Poder Público em igualdade / situação com maior permanência / sem licitação / ato administrativo unilateral, precário e discricionário / gratuita ou onerosa / aqui, por haver também o interesse público, significa que a Administração terá algum interesse público na exploração do bem pelo particular. Desta forma, haverá por parte do permissionário o dever de utilização do bem para o fim predeterminado. Exemplo: Banca de jornal. Concessão – Interesse público / situação permanente / licitação obrigatória / contrato administrativo, oneroso ou gratuito.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 3. Direito Penal Parte Geral do Código Penal: A aplicação da lei penal. Da Lei Penal no tempo. Da Lei Penal no espaço. Da extraterritorialidade da lei penal. Princípios dirimentes dos conflitos aparentes de normas. Crime doloso e Culposo. Do crime. Relação de causalidade. Crime omissivo. Do crime. Erro de Tipo e Erro de Proibição. Da tentativa. Desistência voluntária. Arrependimento eficaz. Do concurso de pessoas. Das causas excludentes de antijuridicidade. Das penas. Medidas de segurança. Causas Dirimentes da culpabilidade. Da imputabilidade penal. Da extinção da punibilidade. Parte Especial do Código Penal: Dos crimes contra a pessoa: Dos crimes contra a vida; Das lesões corporais. Da periclitação da vida e da saúde. Dos crimes contra a liberdade pessoal. Dos crimes contra a inviolabilidade do domicílio. Dos crimes contra o patrimônio: Do furto. Do roubo e da extorsão. Da extorsão mediante sequestro. Dos crimes contra a fé pública: Da falsidade documental. Falsa identidade. Dos crimes contra a administração pública: Peculato; Concussão; Corrupção passiva; Prevaricação. Funcionário público; Resistência; Desobediência; Desacato; Corrupção ativa; Falso testemunho ou falsa perícia; Coação no curso do processo. Legislação Penal Especial: Crimes de responsabilidade de Prefeitos Municipais. Crimes eleitorais. Crimes referentes a licitações e contratos administrativos. Crimes contra pessoas com deficiência. Crimes referentes ao idoso. Crimes hediondos. Crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Crimes de tortura. Crimes contra o consumidor. Crimes contra a ordem tributária e as relações de consumo. Crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. Crimes
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo contra a Economia Popular. Crimes referentes à falência e à recuperação judicial ou extrajudicial. Crimes de Trânsito. Crimes contra o meio ambiente. Crimes referentes ao parcelamento do solo urbano. Estatuto do Desarmamento. Crimes referentes a drogas. Crimes referentes ao abuso de autoridade. Crimes relativos à interceptação telefônica. Crimes de organização criminosa. Tratamento jurídico do tráfico de pessoas (Lei n. 13.344/16).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Parte Geral do Código Penal: A aplicação da lei penal. Da Lei Penal no tempo. Da Lei Penal no espaço. Da extraterritorialidade da lei penal. Princípios dirimentes dos conflitos aparentes de normas. Crime doloso e Culposo.
QUESTÃO-TREINO O que é lei penal em branco? Quais as espécies? Em que consiste a lei penal em branco inversa ou às avessas? Em que consiste a lei penal em branco de fundo constitucional?
Resposta: Lei penal em branco pode ser definida como espécie de lei penal em que a definição da figura criminosa reclama complementação, seja por outra lei ou por ato administrativo. Quando o complemento provier do mesmo órgão que elaborou a lei incriminadora, há norma penal em branco homogênea ou em sentido lato (Exemplo: art. 169, parágrafo único, inciso I do CP, crime de apropriação de tesouro e art. 1.264, do Código Civil, que define “tesouro”). Quando o complemento tiver natureza jurídica diversa e provier de órgão distinto do elaborador da lei penal incriminadora, como as Portarias da ANVISA que estabelecem o que são as drogas, haverá lei penal em branco heterogênea ou em sentido estrito. Lei penal em branco às avessas é a lei cujo preceito primário do tipo é completo, mas o secundário reclama complementação (Exemplo: crimes de genocídio). Cleber Masson dá um exemplo de Lei penal em branco de fundo constitucional, que é a que o complemento da norma advém da própria Constituição Federal. É o que se dá no crime do art. 246 do Código Penal, cujo conceito de “instrução primária” está no art. 208 da Constituição Federal de 1988.45
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MASSON, Cleber. Direito Penal – Parte geral. São Paulo: Método, 2012. p. 109.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Em que consiste a Abolitio Criminis? Qual sua natureza jurídica? Quais os efeitos? Qual a diferença com os casos em que há continuidade normativotípica?
Resposta: Abolitio criminis é a nova lei que exclui do âmbito penal um fato até então considerado como criminoso. Tem natureza jurídica de causa de extinção da punibilidade e alcança todos os efeitos penais da sentença condenatória, primários e secundários, não caracteriza reincidência nem maus antecedentes. Permanecem, contudo, os efeitos civis da condenação, como obrigação de reparação do dano e constituição do título executivo judicial. A continuidade normativo-típica se dá quando, nada obstante houver revogação formal do tipo incriminador, o fato criminoso continua a ser disciplinado em dispositivo legal diverso (Exemplo do atentado violento ao pudor, cuja conduta passou a ser incriminada no mesmo tipo penal do estupro). QUESTÃO-TREINO Héctor Bonilha, primário, com bons antecedentes, não envolvido com atividade criminosa e não integrante de organização criminosa, praticou o crime de Tráfico de Drogas no final do ano de 2005. Foi enquadrado com incurso no art. 12, da Lei nº 6.368/76, que tinha pena prevista de 3 a 15 anos. Durante o processo, adveio a Lei nº 11.343/2006, que estabeleceu pena de 5 a 15 anos de reclusão para o crime de Tráfico, mas com a novidade do chamado “tráfico privilegiado”, §4º do art. 33, que autoriza a redução da pena de um sexto a dois terços. O magistrado, ao sentenciar, justificando ser medida mais benéfica ao réu, utilizou a pena mínima de 3 anos da Lei nº 6.368/76 (3 anos) e a reduziu em dois terços, pela incidência do §4º da Lei nº 11.343/2006, chegando à pena final de 1 ano de reclusão. O Ministério Público recorreu. Que argumentos deverá o Ministério Público utilizar? Quais as teorias aplicáveis ao caso em tela?
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Resposta: No recurso, deverá o Ministério Público utilizar, como argumento, a proibição da combinação de leis penais, e que o magistrado, ao combinar leis penais, feriu a separação de poderes e o princípio da legalidade, criando uma “Lei terceira” ou “Lex tertia”. O raciocínio é exposto na Súmula nº 501 do Superior Tribunal de Justiça, que diz: “É cabível a aplicação retroativa da Lei n. 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n. 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis.” Embora a retroatividade da lei penal mais benéfica seja valor constitucional de peso, não é suficiente para que um magistrado aplique dois dispositivos de leis penais subsequentes (uma revogando a outra) para melhorar a situação do apenado. As teorias aplicáveis ao caso são: teoria da ponderação unitária (que repele a combinação de leis penais e autoriza tão somente a incidência de uma lei ou de outra, quando houver conflito) e teoria da ponderação diferenciada (que permite a combinação de leis penais, considerada a complexidade de cada diploma e a possibilidade de aplicação simultânea de ambas as leis). QUESTÃO-TREINO Tendo em conta o conflito aparente de normas penais, conceitue os princípios da especialidade e da subsidiariedade, apontando as diferenças entre ambos, caso existentes.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta: O conflito aparente de leis penais ocorre quando é possível, para um único fato, a aplicação de dois ou mais tipos legais, plenamente vigentes e com a mesma hierarquia normativa. A finalidade da resolução do conflito é evitar o bis in idem. O princípio da especialidade se mostra presente quando a lei penal estabelece elementos especializantes das condutas criminosas, que fazem aparecer uma figura típica especial em relação a uma figura mais ampla. Por exemplo, os crimes de homicídio e infanticídio. Em ambas as figuras há o ato de matar alguém (homicídio), mas quando o fato diz respeito à mãe que mata o filho recém-nascido, sob a influência do estado puerperal, durante ou logo após o parto (elementos especializantes) incide a figura típica do art. 123 e não do art. 121. O princípio da subsidiariedade se revela quando há uma lei primária (mais abrangente e mais gravosa) que contém uma figura subsidiária (menos abrangente e menos gravosa), ficando a existência desta subordinada à inexistência daquela. A figura subsidiária só terá incidência caso não fique demonstrada a existência da figura principal. Exemplo é a figura do art. 129, §3º (Lesão corporal seguida de morte – figura subsidiária), que apenas aparecerá quando ficar evidente que o agente não quis nem assumiu o risco do resultado morte, caso em que responderia por homicídio. Há diferenças entre os princípios. Na especialidade, a lei especial é aplicada mesmo quando mais branda que a geral; na subsidiariedade, a lei subsidiária menos grave será sempre excluída pela mais grave. Na especialidade, a análise é em abstrato; na subsidiariedade, a análise demanda o caso concreto, com a busca da aplicação da lei mais gravosa. QUESTÃO-TREINO Senhor Furtado, primário e com 60 anos de idade, durante as festividades de fim de ano, aproveitando-se da ausência dos moradores da Vila em que vivia, que foram todos a Acapulco em férias, praticou dois furtos simples, num intervalo de cinco dias, no mesmo local, e com o mesmo modo de agir. No dia 25 de dezembro de 2012, praticou o primeiro furto; no dia 30 de dezembro de 2012, praticou o último. Até dia 28 de dezembro 2012, estava em vigência a Lei “A”, que fixava pena de 1 a 4 anos de reclusão para o furto simples. No dia 29 de dezembro de 2012, entrou em vigor a Lei “B”, que aumentou as penas do furto simples para 2 a 5 anos de reclusão. Denunciado e regularmente processado, em 1º de dezembro de 2018 (data da sentença), Senhor Furtado foi condenado, por três furtos consumados, em continuidade delitiva, a 2 anos e 4 meses de reclusão, tendo o magistrado utilizado a pena estabelecida pela lei mais gravosa (2 anos), aumentando-a em um sexto pela continuidade delitiva. Proferiu, entretanto, o magistrado, “sentença autofágica”, reconhecendo extinta a punibilidade do réu pela prescrição. Considerando que realmente era caso de continuidade delitiva e tendo em conta os prazos prescricionais fixados no Código Penal, que estabelece a prescrição: em quatro anos, se o máximo
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo da pena é igual a um ano ou, se superior, não excede a dois, e, em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro, responda: a) Com relação à dosimetria da pena, agiu com acerto o magistrado? b) E com relação à extinção da punibilidade?
a) Sim. O magistrado agiu com acerto na dosimetria da pena. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça autoriza o aumento mínimo de um sexto quando praticadas duas infrações, e, pelo teor da Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal, a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou permanência. b) Também agiu com acerto o magistrado. Isso porque, embora a quantidade da pena aplicada indique que o prazo prescricional é de 8 anos, caso em que os crimes só prescreveriam em 2020, para o caso, em que há continuidade delitiva, incide a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal, que determina que quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta, não se computando o acréscimo decorrente da continuação.
Nexo de Causalidade QUESTÃO-TREINO Flávio, após avistar Jackson, seu desafeto, desferiu contra ele disparo de arma de fogo e empreendeu fuga do local. Em seguida, Jackson foi socorrido por terceiros e levado até o hospital mais próximo. Naquele local, entretanto, contraiu infecção hospitalar e veio a óbito em decorrência dela. Qual crime Flávio cometeu? Justifique.
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Resposta: Nesta hipótese, Flávio responderá pelo crime de homicídio consumado. Trata-se, aqui, de concausa superveniente relativamente independente que não produziu, por si só, o resultado, não havendo rompimento do nexo de causalidade. Aplica-se a teoria da equivalência dos antecedentes, ou teoria da “conditio sine qua non”, segundo a qual causa é todo e qualquer acontecimento provocado pelo agente, sem o qual o resultado não teria ocorrido como e quando ocorreu. A infecção hospitalar está na mesma linha de desdobramento físico de sua conduta, tratando-se de um evento previsível, devendo o agente responder pela morte da vítima.
QUESTÃO-TREINO Valendo-se do exemplo anteriormente descrito, imagine que Jackson foi resgatado por uma ambulância, ainda com vida, mas no decorrer do caminho até o hospital, o veículo se envolveu em um acidente, circunstância que levou a vítima a óbito. Qual crime Flávio cometeu? Justifique.
Resposta: Nesta hipótese, Flávio responderá pelo crime de tentativa de homicídio. Trata-se, aqui, de concausa superveniente relativamente
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo independente que produziu, por si só, o resultado, rompendo-se o nexo de causalidade. Aplica-se a teoria da causalidade adequada, segundo a qual causa é todo e qualquer comportamento humano eficaz para produzir o resultado. Na determinação da causalidade adequada, o que importa é se há um nexo normal prendendo o atuar do agente como causa ao resultado como efeito. O problema se resume, portanto, em verificar se o fato praticado conduz normalmente a um resultado dessa índole, ou seja, se esse resultado é consequência normal, provável, previsível daquela manifestação de vontade do agente. Seu fundamento é um juízo estatístico (“it quod plerumque accidit”, ou seja, aquilo que normalmente acontece), identificado pelas máximas da experiência, um critério de probabilidade. A causa efetiva do resultado (acidente de ambulância) é um evento imprevisível, que sai da linha de desdobramento causal então existente, produzindo, por si só, o resultado, devendo o agente responder somente pelo seu dolo, e não pelo resultado, o qual não foi uma consequência natural de sua conduta inicial.
Crimes Omissivos
QUESTÕES-TREINO Diferencie crimes omissivos próprios de crimes omissivos impróprios.
Resposta: Os crimes omissivos próprios (ou puros) são aqueles em que a omissão está descrita no próprio tipo penal. Nestes crimes, o sujeito ativo é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa. Tratam-se de crimes unissubsistentes, com a conduta composta de um único ato. Não admitem, portanto, tentativa, ante a impossibilidade de fracionamento da execução. São, em regra, crimes de mera conduta, sem previsão de resultado naturalístico, consumando-se o delito com a mera omissão. São previstos apenas na modalidade dolosa. A título de exemplo, menciona-se o crime de omissão de socorro, previsto no artigo 135 do Código Penal, no qual bastará ao agente
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo deixar de prestar o socorro a alguém para que o crime esteja consumado. Já nos crimes omissivos impróprios (espúrios, ou comissivos por omissão), o tipo penal descreve uma ação, mas a inércia do agente que possui o dever de agir e não o faz, leva à produção do resultado naturalístico. Adota-se, quanto à natureza jurídica da omissão, a teoria normativa. Aqui, a causalidade não é física (ou seja, diretamente decorrente de um comportamento omissivo), mas, sim, normativa, decorrente da própria Lei, que impõe determinada forma de agir ao agente quando houver o dever de agir para evitar o resultado. A omissão será penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O poder de agir consubstancia-se na possibilidade real e efetiva de alguém, na situação concreta e em conformidade com o padrão do homem médio, evitar o resultado penalmente relevante. Haverá o dever de agir nas seguintes hipóteses: quando presente o dever legal; quando o autor assumir a responsabilidade de impedir o resultado (figura do garante); ou quando, com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado (ingerência). Quanto ao sujeito ativo, trata-se de crime próprio, na medida em que o tipo penal reclama uma situação fática ou jurídica diferenciada do autor. São, ainda, crimes materiais, exigindo a presença de resultado naturalístico. Admitem tentativa, por se tratarem de crimes plurissubsistentes, e são previstos na modalidade dolosa ou culposa.
QUESTÕES-TREINO Mévio e Tício, em um belo dia de sol, resolveram mergulhar no mar. Entretanto, por serem inexperientes em águas mais agitadas, começam a se afogar. Naquela localidade se encontrava Jucemar, profissão salvavidas, que, percebendo o afogamento somente de Mévio, seu desafeto, nada faz para salvá-lo. Na mesma localidade, Joceano, morador da região e inimigo de Tício, observa seu afogamento e, podendo ajuda-lo, nada faz. Mévio e Tício acabam morrendo em razão do afogamento. Pergunta-se: Jucemar e Joceano cometeram algum crime? Se sim, qual a tipificação legal? Fundamente.
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A omissão não é apenas um não fazer. É não fazer aquilo que a lei impõe que seja feito. Não se pode punir se a lei não exige um comportamento contrário. Haverá, portanto, duas formas de exigir: no próprio tipo penal (omissão própria) ou violando-se o dever geral de agir presente no artigo 13, §2º do Código Penal (omissão imprópria). Jucemar tinha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância. Ou seja, tinha o dever legal de impedir o resultado naturalístico. No entanto, agindo com a vontade de produzir o resultado, omitiu-se. Deverá responder, assim, não pela sua omissão, mas pelo resultado produzido, no caso, homicídio doloso. De outro lado, para Joceano existia um dever de agir imposto normativamente a todos, não estando enquadrado nas hipóteses do artigo 13, §2º do Código Penal. Sendo assim, responderá por omissão de socorro, com a pena triplicada pelo resultado morte, nos termos do artigo 135, parágrafo único, in fine, do Código Penal.
Erro de Tipo e Erro de Proibição
QUESTÃO-TREINO Erro de Tipo e Erro de Proibição Juarez pretendia matar sua esposa Ana, pois insatisfeito com seu comportamento e sua insubordinação às ordens por ele proferidas. No dia dos fatos, ao vê-la de costas em frente à residência do casal na companhia de seus filhos, efetua diversos disparos de arma de fogo, mas, na verdade, acerta sua vizinha Liz, que contava com 16 anos de idade. Em virtude dos disparos Ana faleceu. Considerando a situação narrada. A) Classifique o erro cometido por Juarez fundamentadamente. B) O acusado responderá por algum crime? Em caso positivo, qual (is)? Há causas de aumento para prevista para a hipótese?
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Resposta: a) Houve erro sobre a pessoa (error in persona), pois Juarez confundiu-se e atingiu pessoa diversa da pretendida – artigo 20, §3º, do Código Penal. b) Juarez não será isento de pena, e deverá responder pela prática de feminicídio (artigo 121, VI, do Código Penal), pois praticado contra mulher por razões da condição do sexo feminino. Ainda, incidirá a causa de aumento da presença de descendente da vítima no momento consumativo (artigo 121, §7º, III, do Código Penal).
Tentativa, desistência voluntária e arrependimento eficaz
QUESTÃO-TREINO Como funciona a punição do conatus consoante o sistema subjetivo?
Respostas: Várias são as teorias que explicam a punição decorrente da tentativa. A teoria subjetiva (voluntarística ou monista), como o nome sugere, observa o aspecto subjetivo do delito. Ou seja, analisa o delito sob a perspectiva do dolo. Nesse sentido, sob o aspecto do dolo, o crime é completo tanto na modalidade consumada quanto na tentada, merecendo a mesma pena. Nos dizeres de Rogério Sanches Cunha, verbis: A punição da tentativa deve observar seu aspecto subjetivo do delito, da perspectiva do dolo do agente. Sabendo que, seja na consumação seja na tentativa, o crime é subjetivamente completo, não pode haver, para esta teoria, distinção entre as penas nas duas modalidades. A tentativa merece a mesma pena do crime consumado (CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal, Parte Geral. 5ª Ed. Salvador, 2017. p. 278).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-ESTUDO Existe algum crime que só admite a forma tentada, constituindo a consumação fato atípico? Sim. Os crimes de lesa-pátria previstos na Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83), nos artigos 11 (Tentar desmembrar parte do território nacional para constituir país independente) e 17 (Tentar mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito).
QUESTÃO-TREINO Hakanishu, candidato ao cargo de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo, escreveu na prova o seguinte texto: “O latrocínio constitui crime contra o patrimônio e, portanto, não é julgado pelo Tribunal do Júri, nem mesmo quando há morte da vítima, mas a subtração patrimonial não ocorre. Nessa hipótese houve a tentativa do delito. A tentativa é causa de diminuição de pena aplicada na segunda fase da dosimetria. Deve-se reduzir a pena na fração entre 1/3 a 2/3, de acordo com o menor ou maior percurso do iter criminis percorrido pela conduta delitiva. Referida operação em hipótese alguma pode conduzir a pena aquém do mínimo legal. Isto porque caso o juiz o fizesse, estar-se-ia diante de uma nova norma, arvorando-se, pois, na posição de legislador, ofendendo o princípio constitucional da separação dos Poderes”. APONTE EVENTUAIS ACERTOS E ERROS DE HAKANISHU.
ACERTOS: O latrocínio (roubo qualificado pela morte) é crime complexo, pois une o crime de roubo e o delito de homicídio em um único tipo penal, situado no “Título II – Dos Crimes contra o Patrimônio”, na Parte Geral do Código Penal, sendo considerado, portanto, crime contra o patrimônio. Portanto, fora da abrangência do julgamento pelo Tribunal do Júri, consoante o art. 5º, XXXVIII, “d”, CF e a Súmula 603/STF: “A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular e não do tribunal do júri”, sendo prescindível a efetiva
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo subtração patrimonial. A natureza jurídica da tentativa é de causa de diminuição de pena, na segunda fase da dosimetria. A fração apontada para diminuir a reprimenda também está correta, devendo o juiz avaliar o grau de aproximação da consumação, com base no iter criminis. Por fim, a Súmula 231/STJ dispõe que: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. Isso porque o juiz deve ser respeitar o limite mínimo da pena definido pelo Poder Legislativo. ERRO: O único erro da questão é contrariar a Súmula 640/STF: “Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima”. Portanto, está consumado o latrocínio se ocorrer a morte da vítima e a tentativa de subtração de seus bens.
Do concurso de pessoas Legislação relacionada ao tema Artigos 29 a 31, do Código Penal Vide: item 25 da Exposição de Motivos do Código Penal
QUESTÃO-TREINO Quando o Código Penal prevê título específico acerca do concurso de pessoas, não se refere apenas ao autor da infração, porquanto também trata da figura do partícipe. Nesse sentido, o concurso de agentes é analisado como a colaboração entre dois ou mais indivíduos para a prática de uma infração penal. A partir do conceito, descreva quais os requisitos do concurso de pessoas.
Resposta: Para que se configure o concurso de pessoas, cinco requisitos são exigidos. O primeiro trata da pluralidade de pessoas dotadas de culpabilidade, visto que, para ocorrer a colaboração entre dois ou mais agentes, é imprescindível a capacidade para um aderir à vontade do outro. O segundo
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo requisito afirma a relevância causal das condutas para produzir o resultado, ou seja, a contribuição dos agentes deve ser relevante a influir no resultado. Dessa forma, os agentes devem dar causa à prática da infração penal por meio das suas condutas, sejam elas comissivas ou omissivas. Ainda, exige-se o vínculo subjetivo ou concurso de vontades homogêneas entre os agentes para a prática da infração penal, ainda que não haja prévio ajuste entre os infratores, pois basta um deles ter ciência de que concorre para a conduta do outro. Como quarto requisito, tem-se que a infração penal deve ser unitária para todos os que concorrem, o que caracteriza a teoria monista/unitária. Dessa forma, todos os agentes respondem pelo crime a eles imputado. Por fim, o último requisito para o concurso de pessoas determina que o fato praticado seja punível, ou seja, deve haver início da execução.
BREVES COMENTÁRIOS: 1. O artigo 29 e seguintes do Código Penal trata do concurso eventual de pessoas (crimes unissubjetivos), que não exige a presença de mais de uma pessoa para restar caracterizada a infração penal (não é elementar). Ao contrário, nos crimes de concurso necessário ou crime plurissubjetivo/plurilateral, a pluralidade de agentes é elementar do tipo e, este caso, a culpabilidade de todos os autores é desnecessária, uma vez que o crime se perfaz com a presença de mais de uma pessoa, ainda que somente uma delas seja culpável. O exemplo é a associação para o tráfico de drogas quando um dos associados é adolescente, um inimputável. 2. A conduta penalmente relevante, que dá causa ao resultado, deve ser anterior ou concomitante com a execução. Se posterior à consumação, pode resultar em infração penal autônoma e não há falar em concurso de pessoas. Contudo, MASSON esclarece que poderá haver concurso de pessoas no caso da contribuição posterior à consumação se houve um ajuste anterior entre as partes (exemplo é quem auxilia esconder o homicida; se ajustaram previamente ao homicídio, quem escondeu o autor do crime será partícipe). 3. O vínculo subjetivo é conhecido como o "princípio da convergência". Assim, se não houver o liame subjetivo entre os agentes, tem-se a chamada autoria colateral (não há concurso de pessoas, pois inexiste o liame subjetivo). 4. A exceção trazida pelo Código Penal é a teoria pluralista/autonomia da cumplicidade, por meio da qual há crimes diversos para cada conduta. O exemplo maior é do aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante. 5. Sobre o fato ser punível, o artigo 31 é expresso: “O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado”.
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QUESTÃO-TREINO No que reporta ao concurso de pessoas, adotaram-se teorias que diferenciaram as figuras do autor e do partícipe. A partir das teorias aplicadas pelo Direito Penal pátrio, diferencie autor e partícipe.
Resposta: O Código Penal adotou a teoria restritiva para diferenciar autor e partícipe, conceituando aquele como quem pratica o verbo-núcleo do tipo. Lado outro, o partícipe seria quem, de qualquer modo, concorre para a prática da infração penal, sem que execute, por suas próprias mãos, a conduta penal. Nesse caso, o partícipe detém o propósito de colaborar efetivamente com o autor, seja de forma material ou intelectual.
BREVES COMENTÁRIOS:
1. Atentar que esta é a teoria adotada pelo Código Penal, que acolheu a teoria objetivo-formal, segundo o item 25 da exposição de motivos. Contudo, na Ação Penal 470 ("Mensalão"), alguns dos Ministros do Supremo Tribunal Federal assentaram a Teoria do Domínio do Fato . Tal teoria é um misto entre as teorias objetiva e subjetiva, trazendo a ideia de que autor "é a figura central do acontecimento criminoso" (Roxin), ou seja, aquele que possui o controle final do fato e decide sobre a prática do crime, com análise do elemento subjetivo (afasta a responsabilidade penal objetiva). Inclusive, a Lei n 12850/13 trouxe força à teoria, pois prevê o autor intelectual. De mais a mais, a Teoria do Domínio do Fato" explica a autoria mediata, que é uma criação doutrinária, porquanto autor seria aquele que usa um inimputável (ou pessoa que age sem dolo/culpa) para cometer o crime. Nesse sentido, partícipe é aquele que não executa a infração, como também aquele que não tem o controle final do fato.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo SUPERQUESTÃO-TREINO A expressão "(...) na medida de sua culpabilidade", trazida pelo artigo 29, do Código Penal, no capítulo relativo ao concurso de pessoas, enfatiza a teoria monista ou unitária, que impõe aos agentes a responsabilidade pelo mesmo crime praticado. Há pluralidade de agentes e unidade de crime. Contudo, tal premissa não leva à conclusão de que todos os concorrentes quiseram praticar o mesmo crime, de forma que poderá ocorrer o que se denomina desvio subjetivo entre os agentes. A) Com base no texto acima, conceitue a colaboração dolosamente distinta.
B) "Bruna" ajustou com "Ana" a prática de furto a uma residência, sendo que “Ana” lhe prestaria auxílio material. No local, ao tentarem arrombar a porta de acesso ao imóvel, o proprietário surgiu e abriu referida porta. "Bruna" pegou um revólver, o qual escondia debaixo do moletom, atirou contra a vítima e lhe subtraiu o aparelho celular, enquanto "Ana", desconhecendo o porte da arma de fogo, empreendeu fuga. Nesse caso, como respondem "Ana" e "Bruna"?
c) No caso hipotético descrito na letra “b”, se "Bruna" andasse armada e "Ana" tivesse ciência que ele o acompanhou à prática do furto com um revólver, como responderia "Ana"?
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Respostas: a) A colaboração ou cooperação dolosamente distinta é entendida como o desvio do liame subjetivo por um dos agentes em concurso. Tem-se que a vontade de um dos concorrentes era praticar crime menos grave, sendo que o outro vem a praticar o crime mais grave. Diante do desvio subjetivo da conduta, deve, em tese, o agente responder pelo crime que, inicialmente, pretendia praticar, por não ter dado causa ao resultado mais gravoso. É uma exceção à teoria monista. b) Conforme caso hipotético, “Ana” responderia como partícipe por crime de furto, vez que era a infração ajustada junto à autora, o que remonta ao requisito do vínculo subjetivo no concurso de pessoas. Ainda, “Bruna” responderá pelo crime de “roubo”, visto que praticou a violência contra a vítima e lhe subtraiu o bem. Como houve desvio subjetivo das condutas, a “Ana” será imputado o crime mais grave. c) No caso hipotético, se “Ana” soubesse que “Bruna” andava armada e assim a acompanhou para a prática do crime com um revólver, também responderá pelo crime mais grave, vez que aderiu ao crime consciente de que a concorrente poderia dispara-lo. Assim, havia previsão do resultado mais gravoso.
BREVES COMENTÁRIOS:
1. Atentar que esta é uma teoria muito adotada como tese defensiva, sendo que somente a partir do fato concreto é possível concluir se, realmente, houve desvio subjetivo da conduta. 2. Para aprofundar: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO (ART. 157, § 3º, DO CP). PRETENDIDA DESCLASSIFICAÇÃO. COOPERAÇÃO DOLOSAMENTE DISTINTA. INAPLICABILIDADE AOS COAUTORES. DOMÍNIO DOS FATOS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Na esteira do entendimento desta Corte, a ciência a respeito da utilização de arma de fogo no delito de roubo impõe, a princípio, a responsabilização de todos os agentes por eventual morte da vítima, haja vista ser tal resultado desdobramento ordinário da ação criminosa em que todos contribuem para realização do evento típico. 2. In casu, o Tribunal de origem destacou que, embora não tenha realizado o disparo, o agravante possuía pleno domínio dos fatos, sendo inclusive quem planejou a empreitada criminosa e forneceu a arma utilizada, de modo a responder em coautoria pelo latrocínio. 3. Para se concluir de forma diversa, sobretudo no sentido de que o agravante não
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo forneceu a arma do crime, seria imprescindível o reexame do conjunto fáticoprobatório, providência inviável de ser adotada no âmbito do recurso especial, nos termos da Súmula n. 7/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ. AgRg no AREsp 1163320/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 10/04/2018, DJe 20/04/2018)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. LATROCÍNIO. Ação ajuizada para absolvição por insuficiência de provas e para desclassificação por participação dolosamente distinta. 1. Descabimento no emprego da revisão como sucedâneo recursal. Hipótese que não se amolda ao rol do art. 621 do CPP. Conhecimento excepcional, para avaliação sobre existência ou não de decisão contrária à evidência dos autos, inocorrente na espécie. Conjunto probatório adequado. Provas orais atestando o enredamento do peticionário que, ingressando armado na residência da vítima para cometer a subtração patrimonial, aderiu ao dolo típico. Desnecessidade do dolo quanto ao consequente. 2. Descabimento na desclassificação por participação dolosamente distinta. Comprovado o enredamento quanto ao resultado mais lesivo, vez que incabível arguir falta de previsão do resultado. Súmula n° 610 do C. STF. Improcedente. (TJSP; Revisão Criminal 0027976-60.2015.8.26.0000; Relator (a): Alcides Malossi Junior; Órgão Julgador: 4º Grupo de Direito Criminal; Foro de Iguape - 1ª. Vara Judicial; Data do Julgamento: 09/11/2017; Data de Registro: 13/11/2017)
QUESTÃO-TREINO De acordo com a regra estabelecida pelo Código Penal Brasileiro, a conduta do partícipe tem natureza acessória, uma vez que é o autor quem realiza o verbo-núcleo do tipo penal. Por via obliqua, não se fala em participação sem a conduta principal do autor da infração penal. a) A partir desse fundamento, descreva as teorias que explicam a acessoriedade da ação do partícipe, ou seja, como se dá a sua punição. b) Qual a teoria adotada pelo ordenamento penal brasileiro? Justifique.
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Respostas: a) Conforme dispõe o artigo 31, do Código Penal, para que o partícipe seja punido, o crime executado pelo autor deve ter sido, ao menos, tentado. Há teorias que explicam a acessoriedade da conduta do partícipe, as quais são divididas em graus. A Teoria da Acessoriedade Mínima esclarece que, para o partícipe ser punido, bastaria o autor praticar um fato típico. Para a Teoria da Acessoriedade Limitada, basta que o autor tenha praticado um fato típico e ilícito para que o partícipe também seja punido. Quanto à Teoria da Acessoriedade Máxima, há exigência de que o autor pratique um fato típico, ilícito e seja culpável (autor deve ser imputável). Por fim, a Teoria da Hiperacessoriedade exige que o autor, além de praticar fato típico, ilícito e culpável, também seja punido para que o partícipe, de igual modo, sofra as consequências penais. b) Apesar de o Código Penal não prever expressamente a forma de punição do partícipe, levando em consideração a conduta do autor, tem-se que a doutrina majoritária apoia a aplicação da Teoria da Acessoriedade Limitada, ou seja, basta que o autor pratique um fato típico e ilícito para que o partícipe seja punido.
BREVES COMENTÁRIOS:
1. Segundo MASSON, merece atenção a Teoria da Acessoriedade Máxima ao possibilitar a "autoria mediata". Nesse sentido, se "A" manda que "B", inimputável, pratique um homicídio, "A" seria o autor mediato e não partícipe. Já para a Teoria da Acessoriedade Limitada, não haveria concurso de pessoas, vez que "B" é inimputável e, assim, atua sem culpabilidade, o que afasta o vínculo subjetivo exigido para o concurso de pessoas. QUESTÃO-TREINO O artigo 29, 1, do Código Penal, vem disciplinar a participação de menor importância, que se refere à conduta do partícipe quando da prática da infração penal pelo autor. Assim, embora a participação não seja inócua, ela foi de reduzida eficiência para a produção do resultado perquirido. a) Qual a natureza jurídica da participação de menor importância? b) É possível a aplicação do instituto à coautoria?
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Respostas: a) A participação de menor importância tem natureza jurídica de causa de diminuição de pena, de forma que a pena pode ser diminuída de 1/6 a 1/3, aplicável na terceira fase de fixação da pena. b) Não é possível aplicar a causa de diminuição ao coautor, uma vez que a lei disciplina sobre a participação de menor importância e, ainda, não é possível aduzir uma coautoria de menor importância, visto que o autor sempre tem papel fundamental na execução do crime.
SUPERQUESTÃO-TREINO No que reporta às circunstâncias incomunicáveis no concurso de pessoas, o Código Penal, em seu artigo 30, estabelece que "não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime". A partir da regra transcrita, analise os casos hipotéticos: a) “M” foi surpreendido pela filha, que disse ter sido vítima de estupro praticado por “J”. O pai, por motivo de relevante valor moral, contratou o pistoleiro “C” para matar “J”, sendo que o homicídio é consumado. Nesse caso, como respondem “M”e “C”?
b) “A”, funcionário público, convida “B” para subtraírem um veículo institucional, que estava no estacionamento do Fórum. “B”, embora desconhecesse que “A” era funcionário público, anuiu à conduta. Nesse caso, como respondem “A” e “B”?
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Respostas: a) Em consideração à regra do artigo 30, tem-se que o relevante valor moral é circunstância pessoal que não se comunica. Desse modo, “M” responderá por homicídio privilegiado, enquanto “C” será responsabilizado por homicídio qualificado pelo motivo torpe. b) Em consideração à regra do artigo 30, tem-se que “A” responderá por peculato-furto, enquanto “B” somente responderá por furto, visto que a condição de funcionário público é elementar subjetiva, exigindo-se que seja de conhecimento do coautor.
BREVES COMENTÁRIOS:
1) Circunstâncias são todos os elementos que circundam o tipo penal, os quais, basicamente, servem para aumentar ou diminuir a pena. Assim, se você excluir essas circunstâncias, o fato ainda é típico. Ao contrário, as elementares são dados essenciais e forma o tipo penal, de modo que, se excluídos, o a conduta é atípica. Como na questão anterior, o motivo de relevante valor moral é circunstância, porquanto, se excluído, permanece o fato típico quanto ao homicídio. 2) Quando a elementar é subjetiva, deve-se ter em mente que ela deve estar no âmbito de conhecimento do agente, sob pena de configurar responsabilidade penal objetiva. É o caso, por exemplo, do pai que ajuda a mãe, abalada pelo estado puerperal, a matar o próprio filho. Por se tratar de elementar o estado puerperal, exige-se que tenha entrado no âmbito de conhecimento do pai por se elementar subjetiva.
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Culpabilidade
QUESTÃO-TREINO Culpabilidade Analise o conceito de culpabilidade à luz da Teoria Funcionalista:
Resposta: A teoria funcionalista surgiu para superar a teoria normativa pura e está amparada na política criminal e nos fins da pena. Temos dois grandes expoentes que se propõem a explicar a aplicação do funcionalismo. Para Jakobs, que adotou o funcionalismo sistêmico, a função do direito penal é afirmar a vigência da norma em favor da estabilização social e a culpabilidade funciona como uma falta de fidelidade ao direito, de modo a justificar a imposição da pena. Por sua vez, Roxin faz uma crítica à teoria de Jakobs afirmando que a culpabilidade é fundamento e limite da pena e destina-se a coibir abusos do Estado, passando a ter um papel fundamental no conceito de responsabilidade penal. Dessa forma, para a teoria funcionalista na vertente adotada por Roxin, a culpabilidade tem caráter ambivalente, pois serve como pressuposto fundamental da responsabilidade penal, funcionando ainda, como limite à própria prevenção geral positiva ou negativa.
QUESTÃO-TREINO Causas legais e supralegais de exclusão da culpabilidade Aponte as causas legais de exclusão ou dirimentes da culpabilidade. Há causas supralegais de exclusão da culpabilidade?
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Resposta: O Código Penal prevê causas legais de exclusão da culpabilidade: a) inimputabilidade, por doença mental ou desenvolvimento mental ou incompleto ou retardado; b) inimputabilidade do menor de 18 anos; c) embriaguez involuntária completa; d) erro de proibição inevitável; e) obediência hierárquica a ordem não manifestamente ilegal; f) coação moral irresistível. A doutrina, no entanto, diverge a respeito da possibilidade de aplicação de causas supralegais de exclusão da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa. O principal argumento no tocante à impossibilidade de sua adoção encontra guarida na violação da separação dos poderes, isto porque o magistrado estaria aplicando uma causa de exclusão da culpabilidade não prevista em lei, ou seja, não elaborada pelo legislador. Contudo, a doutrina vem entendendo no sentido da possibilidade de sua aplicação, haja vista que não há como o legislador conseguir prever todas as hipóteses em que haverá a exclusão da culpabilidade, alcançando, assim, de forma plena o caráter garantidor do princípio da culpabilidade. Podemos citar como exemplo, de causa supralegal de exclusão de culpabilidade inclusive adotada pelo STJ a previsão dos jurados absolverem o acusado por razões humanitárias e por clemência, conforme o senso de justiça.
QUESTÃO-TREINO Imputabilidade Conceitue imputabilidade e cite os critérios adotados pelo Código Penal para a determinação da inimputabilidade.
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Resposta: Podemos conceituar imputabilidade como a possibilidade de o agente compreender o caráter ilícito do fato e de agir conforme essa compreensão. O artigo 26, do Código Penal trata das causas de inimputabilidade: doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado – adotando o critério biopsicológico. Vale notar, que no artigo 27, do Código Penal há a previsão de que os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, e, aqui, adotou o legislador o critério biológico. Trata-se de uma presunção legal absoluta no sentido de que os menores de 18 anos possuem desenvolvimento mental incompleto. Verifica-se, assim, que o Código Penal não adotou a teoria psicológica da imputabilidade penal, prestigiando o critério etário e o biopsicológico, pois o doente mental apenas será considerado inimputável se a sua anomalia comprometer a sua capacidade de entendimento e autodeterminação.
QUESTÃO-TREINO Inimputabilidade e embriaguez Em que situações há a exclusão da imputabilidade por embriaguez?
Resposta: A embriaguez é a intoxicação transitória causada pela ingestão de álcool ou substâncias análogas. Por sua vez, a embriaguez pode ser voluntária ou não acidental: nesta hipótese o agente ingere substância alcóolica ou análoga com a intenção de se embriagar e poderá ser: a) completa, retirando a capacidade de entendimento ou autodeterminação e; b) incompleta com a redução da capacidade de entendimento do agente. Sendo voluntária a embriaguez, a imputabilidade fica preservada. Na embriaguez acidental, ou decorrente de caso fortuito ou força maior, o sujeito desconhece o efeito da substância ingerida ou ainda é forçado a ingerir referida
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo substância contra a sua vontade. Se completa isenta o agente de pena e caso venha ser incompleta reduz a pena do agente, nos termos do preceituado no artigo 28, § § 1º e 2º, do Código Penal. Temos ainda a embriaguez patológica que é a doentia, e, a depender do caso, poderá gerar a exclusão da culpabilidade. Há, ainda, a embriaguez preordenada, em que o agente propositadamente ingere substâncias alcóolicas com a finalidade de cometimento de crime. Nesta última hipótese incide a teoria da actio libera in causa, ou ação livre na causa, no qual o ato antecedente (embriagar-se) foi livre e voluntário, não havendo, portanto, exclusão da culpabilidade.
QUESTÃO-TREINO Teorias da culpabilidade e descriminantes putativas Qual o tratamento dado pela teoria normativa limitada da culpabilidade, adotada pelo Código Penal, em relação às descriminantes putativas?
Resposta: Para a teoria limitada, a culpabilidade é composta pelos seguintes requisitos: a) imputabilidade; b) potencial consciência da ilicitude e; c) exigibilidade de conduta diversa. Referida teoria diferencia-se da teoria extremada da culpabilidade com relação ao tratamento das discriminantes putativas, pois para a teoria limitada toda a espécie de descriminante putativa é sempre considerada como erro de proibição, seja incidente a respeito dos limites autorizadores da norma, seja sobre situação fática pressuposto de uma causa de justificação.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Penas e Medidas de Segurança
QUESTÃO-TREINO Cite as teorias quanto à finalidade da pena.
Resposta: Quatro são as principais teorias quanto à finalidade da pena: a) Teoria absoluta: Traz a finalidade retributiva da pena, que é um mal imposto em face de outro mal. Quanto maior o grau de culpabilidade, maior a punição retributiva. Tem previsão nos artigos 29 e 59 do CP. O limite da pena, assim, é a culpabilidade do acusado. Ex: art. 121, § 5°, CP, que traz o perdão judicial quando as consequências do delito já houverem sido suficientes, tornando a pena desnecessária. b) Teoria relativa: Traz a finalidade preventiva da pena, que visa a evitar o cometimento de novos delitos. Para tanto, é imposto um castigo ao delinquente, a fim de desestimulá-lo a voltar a cometer delitos, além de, durante o encarceramento, estar impedido de fazê-lo. c) Teoria mista ou unificadora ou eclética ou unitária: A pena tem caráter retributivo e preventivo. O artigo 59 do CP indica sua observância ao prever que a pena deverá ser suficiente para a “reprovação e prevenção do crime”. d) Teoria abolicionista: Prega o fim da pena privativa de liberdade. Trabalha com o conceito de cifra negra do direito penal, que trata dos crimes que sequer chegam ao conhecimento da autoridade policial. Para os abolicionistas, o direito penal e o Poder Judiciário pretendem garantir a segurança e impedir o cometimento de infrações, mas acabam contribuindo para a violência e a desordem.
QUESTÃO-ESTUDO Sobre a dosimetria da pena: a) Qual o sistema adotado pelo Código Penal? b) Discorra brevemente sobre suas etapas. a) O Código Penal de 1940 adotou o sistema trifásico, elaborado por Nelson Hungria para a fixação da pena,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo conforme dispõe o artigo 6846, em detrimento do método bifásico, idealizado por Roberto Lyra. Assim, segundo o sistema vigente, deve o magistrado percorrer 3 três fases de análise e individualização para se chegar à pena final aplicável ao caso concreto. b) O Código Penal e leis extravagantes preveem apenas a sanção em abstrato cominada a determinada infração penal. Assim, cabe ao magistrado, observando os limites legais, dosar a reprimenda a ser imposta caso a caso e, para tanto, deve percorrer 3 (três) fases, a saber: - 1ª Fase – Nesta primeira etapa, a pena deve ser fixada com base na valoração, devidamente fundamentada, das 8 circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal (culpabilidade, antecedentes criminais, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstancias do crime, consequências e comportamento do ofendido), devendo o magistrado ater-se aos limites mínimo e máximo previstos abstratamente no tipo penal. - 2ª Fase – Já nesta etapa, serão analisadas as circunstâncias atenuantes e agravantes. As circunstâncias atenuantes estão elencadas no artigo 65 do Código Penal47, sendo a confissão espontânea e a menoridade relativa as mais comuns. Ressalte-se, por oportuno, que a lei possibilita ao magistrado reconhecer circunstância atenuante não prevista (inominada), nos termos do artigo 66 48do mesmo diploma legal. Já as circunstâncias agravantes estão previstas nos artigos 61 e 62 do Código Penal49, sendo a mais corriqueira a reincidência.
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Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua. 47
Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena: I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; II - o desconhecimento da lei; III - ter o agente:a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral; b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou. 48 Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei. 49 Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - a reincidência; II - ter o agente cometido o crime: a) por motivo fútil ou torpe; b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime; c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido; d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum; e) contra ascendente,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A lei não fixa o percentual a ser adotado na hipótese de reconhecimento de uma ou outra circunstância, mas aqui também o juiz está adstrito aos limites previstos no tipo, sendo, aliás, nesse sentido a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. E, na hipótese de concurso entre uma circunstância agravante e uma atenuante, deve prevalecer aquela relacionada aos motivos do crime, à personalidade e à reincidência (artigo 67 do Código Penal). 3ª Fase – Nesta última etapa, serão consideradas as causas de aumento e de diminuição, também denominadas majorantes e minorantes, previstas nas partes geral e especial do Código Penal, como, por exemplo, a tentativa. Diferentemente do que ocorre nas etapas anteriores, aqui a pena pode ficar aquém do mínimo ou além do máximo. O percentual de diminuição ou aumento está previsto na lei, ainda que de forma variável. Na hipótese de concurso de causas de diminuição e de aumento previstas na parte especial, deverá o juiz limitar-se a aplicar apenas uma diminuição e um só aumento, prevalecendo a que mais aumente ou diminua (artigo 68, parágrafo único do Código Penal).
QUESTÃO-TREINO Medida de segurança É cediço que a medida de segurança, sanção penal com finalidade preventiva, destina-se ao tratamento de imputáveis e semi-imputáveis portadores de periculosidade, com vistas a evitar a prática de futuras infrações penais. Trata-se de mais um instrumento utilizado pelo Estado na resposta à violação da norma penal. Acerca da medida de segurança: a) Fale sobre as espécies de medida de segurança e seus critérios de aplicabilidade.
descendente, irmão ou cônjuge;f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão; h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida; i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade; j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido; l) em estado de embriaguez preordenada. Art. 62 - A pena será ainda agravada em relação ao agente que: I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes; II coage ou induz outrem à execução material do crime III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não-punível em virtude de condição ou qualidade pessoal; IV - executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo b) Quais os prazos, mínimo e máximo da medida?
Respostas: a) O art. 96, do Código Penal, apresenta duas espécies de medida de segurança: a detentiva e a restritiva. A detentiva consiste em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, ao passo que a restritiva sujeita o sentenciado a tratamento ambulatorial. Com efeito, a medida a ser aplicada dependerá da natureza da pena cominada à infração penal, de forma que, a teor do artigo 97, caput, do Código Penal, se o fato é punido com reclusão, o magistrado, obrigatoriamente aplicará a internação. Por outro lado, em se tratando de fato punível com detenção, poderá o juiz optar entre a internação e o tratamento ambulatorial, sempre pautado pelo grau de periculosidade do réu. b) Nos termos do artigo 97, §1º, do Código Penal, ao proferir a sentença que aplica a medida de segurança, deve o juiz, obrigatoriamente, fixar o prazo mínimo para a medida de segurança que será entre um a três anos. No que concerne ao prazo máximo, a despeito de inúmeras divergências doutrinárias, o Superior Tribunal de Justiça, em observância aos princípios da isonomia e proporcionalidade, sumulou o entendimento de que o tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado (súmula 527 -STJ).
QUESTÃO-TREINO Espécie de sanção penal de cunho patrimonial, a pena de multa consiste no pagamento de determinado valor em dinheiro, em favor do Fundo Penitenciário Nacional. Sobre a pena de multa, responda às seguintes questões: a) Quando deve ser feito o pagamento voluntário da multa? b) Quem possui legitimidade para a execução da pena de multa?
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Respostas: a) A teor do artigo 50, caput, 1ª parte, do CP, o pagamento voluntário ou espontâneo da pena de multa deve se dar no prazo de 10 dias depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. b) Nos termos da súmula 521, do STJ, a legitimidade para a execução fiscal de multa pendente imposta em sentença penal condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda.
Extinção da Punibilidade
QUESTÃO-TREINO Extinção da punibilidade e citação (TJ/RJ/2012) Após a citação por edital do acusado, o juiz suspendeu o processo e o curso da prescrição. A defesa requereu o afastamento da suspensão do lapso prescricional ao argumento de que o artigo 396, do CPP, em seu parágrafo único, teria revogado tacitamente o artigo 366. A tese defensiva é aceitável?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta. Não assiste razão à defesa, uma vez que o artigo 396, parágrafo único, do CPP não revogou o artigo 366, CPP. Este artigo foi criado com a finalidade de impedir que o acusado, citado por edital, seja condenado sem que tenha sido ouvido em juízo. Esta é a mesma regra que se encontra delineada no parágrafo único do artigo 396 do CPP. Assim, há necessidade de interpretação sistemática dos dois artigos, para que se compreenda que o processo e o curso do prazo prescricional permaneçam suspensos até o comparecimento pessoal do acusado ou de seu advogado constituído. Outrossim, é exatamente em razão da suspensão do processo e do prazo prescricional, que o prazo de 10 dias, para a apresentação de resposta escrita, começa a correr a partir do comparecimento do acusado ou da constituição de advogado.
QUESTÃO-ESTUDO Emendatio Libelli e Prescrição Penal A emendatio libelli (artigo 383, CPP) surte efeitos na prescrição penal? Resposta: Sim, segundo orientação do STJ, no julgamento dos EDcl no AREsp. 689.468/SP50, transcorrido o prazo prescricional com base na pena máxima em abstrato do crime imputado na denúncia recebida, deve-se reconhecer a extinção da punibilidade, não podendo o juiz ou tribunal condenar o acusado por crime mais grave que viesse a afastar a prescrição. O novo enquadramento legal não tem o condão de retroagir para superar a prescrição que tenha se consumado antes da efetivação da emendatio libelli. Conforme a dicção do artigo 383, CPP, a emendatio libelli possibilita que o magistrado, sem modificar a descrição dos fatos contida na denúncia ou queixa, atribua-lhes nova definição jurídica, ainda que disso resulte a aplicação de pena mais grave ao acusado, podendo ocorrer tanto na primeira instância como em segundo grau de jurisdição, contudo, em caso de recurso exclusivo da defesa, a situação do acusado não pode ser agravada, em função da proibição
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STJ- EDcl no AREsp. 689.468/SP: EMENTA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRELIMINAR. PRESCRIÇÃO PELA PENA EM ABSTRATO. OCORRÊNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO RÉU. 1. Embora a denúncia afirme que os equipamentos apreendidos poderiam vir a causar danos a terceiros, o órgão acusatório deixou de indicar elementos concretos da investigação que evidenciassem prejuízo efetivamente acarretado pela conduta do embargante. 2. Não havendo dano a terceiro, a reprimenda máxima prevista para o delito é de 2 anos de detenção, de forma que a prescrição pela pena em abstrato opera-se em 4 anos, consoante disposto no art. 109, V, do Código Penal. 3. Transcorridos mais de 4 anos entre a data do recebimento da denúncia (24/5/2007) e a prolação do acórdão condenatório (1º/12/2014), verifica-se a prescrição da pretensão punitiva dos delitos imputados ao réu. 4. Preliminar acolhida para reconhecer a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva e declarar, por conseguinte, extinta a punibilidade do embargante. Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/acordao-aresp-689468.pdf. Visualizado em 06/10/2018.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo de reformatio in pejus (HC 201.343/STJ, rel. min. Sebastião Reis Júnior, DJe 10/10/2014; HC 104.047/STJ, rel. min. Felix Fischer, DJe 3/11/2008). Questão interessante diz respeito à possibilidade de modificar a capitulação legal originalmente estampada na denúncia, por meio da emendatio libelli, para imputar crime mais grave ao indicado na inicial acusatória, quando já transcorrido o prazo prescricional pela pena máxima em abstrato, pena tomada por parâmetro antes do trânsito em julgado para a acusação. Isso porque a nova qualificação jurídica dos fatos geralmente repercute na pena máxima cominada e, por consequência, no prazo prescricional. A seguir uma matéria do site Conjur, explicando o acórdão dos EDcl no AREsp. 689.468/SP. “Suponhamos uma denúncia que narre crime de roubo, mas capitule os fatos como furto. Nesse caso, o julgador pode entender que a qualificação jurídica dos fatos da denúncia não foi correta e condenar o acusado pelo crime de roubo (artigo 157 do CP), cuja pena máxima é de 10 anos, enquanto que o crime de furto (artigo 155) possui pena máxima em abstrato de 4 anos. Tem-se, assim, significativa alteração do prazo prescricional, que passa de 8 (furto) para 16 anos (roubo), nos termos do artigo 109 do Código Penal. A partir daí, surgem importantes questionamentos: qual deve ser o prazo considerado para o cálculo da prescrição pela pena máxima em abstrato? O do crime originalmente capitulado na denúncia ou do crime da condenação? A resposta nem sempre é simples, e uma análise em perspectiva pode mostrar as vicissitudes que o tema propõe. As repercussões da emendatio libelli na contagem do prazo prescricional Ainda que o réu se defenda dos fatos apresentados na denúncia, não do tipo penal a ele imputado, a prescrição pela pena em abstrato deve ser averiguada com base na capitulação legal proposta na denúncia recebida pelo juiz. Em outros termos, caso o magistrado ou tribunal atribua nova qualificação jurídica aos fatos descritos pela acusação para imputar crime mais grave ao réu por meio da emendatio libelli, até esse exato marco temporal deve ser observado o prazo prescricional estabelecido pelo tipo penal originalmente capitulado na denúncia. Essa tese foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça na petição incidental nos EDcl no AREsp 689.468/SP, rel. min. Rogério Schietti, julgada no dia 14/2/2017, quando a 6ª Turma, por unanimidade, extinguiu a punibilidade do denunciado por crimes de telecomunicações. Apesar da já avançada fase processual (embargos de declaração no agravo regimental no agravo em recurso especial), o STJ acolheu a preliminar de mérito da prescrição, pois entendeu tratar-se de questão de ordem pública, reconhecível de ofício a qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição. Confira-se trecho do acórdão: “Preliminarmente, a defesa sustenta que, como foi imputada ao réu, na denúncia, a suposta prática do delito previsto no art. 70 da Lei n. 4.117/1962, por duas vezes (uma na forma tentada e uma consumada), a prescrição pela pena em abstrato deve ser analisada com base na reprimenda prevista nesse dispositivo legal. (...) À vista
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo do exposto, por ser matéria de ordem pública, que pode ser apreciada em qualquer fase processual, reconheço a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva e declaro, por conseguinte, extinta a punibilidade do embargante no que aos delitos apurados nos autos” (trecho do acórdão no EDcl no AREsp. 689.468/SP, rel. min. Rogério Schietti, j. 14/2/2017). Neste acórdão, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia pelo crime de instalação ou utilização irregular de telecomunicações, previsto no artigo 70 da Lei 4.117/62, que é crime de menor potencial ofensivo, com pena máxima de 2 anos e prazo prescricional de 4 anos (artigo 109, V, do CP). O acusado foi absolvido em primeira instância e o MPF requereu, em sede de apelação, a condenação pelo crime de desenvolvimento clandestino de telecomunicações, nos termos do artigo 183 da Lei 9.472/97, cuja pena máxima em abstrato é de 4 anos, e o prazo prescricional é de 8 anos (artigo 109, IV, do CP). O Tribunal Regional Federal da 3ª Região deu provimento à apelação para condenar o réu, em segunda instância, pela prática do crime mais grave previsto no artigo 183 da Lei 9.472/97, o que afastaria a extinção da punibilidade pela prescrição com base na pena máxima em abstrato do crime capitulado na denúncia, do artigo 70 da Lei 4.117/62. Sucede que a decisão da corte regional de atribuir nova qualificação jurídica dos fatos — imputando crime mais grave — ocorreu após o exaurimento do prazo prescricional com base na capitulação jurídica da inicial acusatória. Assim, o STJ concluiu pelo reconhecimento da extinção da punibilidade, por não ser possível ignorar o crime originalmente capitulado na denúncia. Essa interpretação jurídica confirma as premissas estabelecidas pela corte em precedente datado de 2011, quando foi fixada a tese de que, “embora seja provisória a classificação dada pelo Ministério Público na denúncia, a prescrição pela pena em abstrato deve ser averiguada com base na capitulação nela proposta e recebida pelo Magistrado” (HC 121.743/RN, 5ª Turma, rel. min. Laurita Vaz, DJe 7/2/2011). Nesse caso, o STJ refutou o aditamento da denúncia com nova classificação jurídica dos fatos após verificada a prescrição com base nos crimes originalmente capitulados. A emendatio libelli e seus limites frente aos marcos interruptivos da prescrição. Os que defendem a posição de que é possível a emendatio libelli mesmo após o transcurso do prazo prescricional do crime elencado na denúncia afirmam que o réu se defende dos fatos que lhe são imputados, e não de sua capitulação jurídica, o que conferiria ampla liberdade ao julgador para utilizar, como parâmetro de contagem do prazo prescricional, o tipo penal que no seu entender melhor se adeque à situação fática dos autos. Contudo, a nova capitulação legal, além de poder provocar prejuízos à defesa técnica do acusado diante da surpresa, não pode ignorar os marcos interruptivos da prescrição, dispostos taxativamente no artigo 117 do Código Penal, que dispõe: “Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se: I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa; II - pela pronúncia; III - pela decisão confirmatória da
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo pronúncia; IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis; V - pelo início ou continuação do cumprimento da pena; VI - pela reincidência.” Dessa forma, a prescrição será regulada pela pena máxima em abstrato do delito previsto na exordial acusatória, até que sobrevenha novo marco interruptivo da prescrição nos termos do artigo 117 do CP. Essa interpretação é a que melhor se coaduna com os princípios constitucionais da segurança jurídica e do devido processo legal, sob pena de se permitir novas capitulações legais com o intuito primário de afastar a prescrição em prejuízo ao réu. Assim, caso a denúncia tenha sido oferecida e recebida com determinada definição jurídica, caberá ao julgador observar o prazo prescricional pela pena máxima em abstrato deste delito, antes de proceder a qualquer alteração na qualificação jurídica dos fatos. A prescrição é matéria prejudicial que impede a análise do mérito da ação penal, inclusive em grau de recurso, o que exige constante atenção aos prazos prescricionais. O entendimento perfilhado pela melhor doutrina ressalta o caráter prejudicial da prescrição. Veja-se: “A prescrição (...) constitui-se em matéria preliminar, isto é, impede a análise do mérito da ação penal, seja pelo juízo natural, seja em grau de recurso. Logo, em caso de prescrição não há falar em absolvição ou condenação, apenas em extinção da punibilidade. Nessa esteira, dispunha a Súmula 241 do extinto Tribunal Federal de Recursos: “A extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva prejudica o exame de mérito da apelação criminal” (Masson, Cleber. Prescrição Penal como Direito Fundamental: correlação lógica entre limites estatais ao direito de punir. In Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana, p. 817).”51
QUESTÃO-TREINO Prescrição No dia 23/10/2011, Júlia, jovem de apenas 20 anos de idade, praticou um crime de lesão corporal leve (pena: de 03 meses a 01 ano) em face de Carmem, que representou contra sua agressora dentro do prazo decadencial de 6 meses. A denúncia somente foi oferecida em 01/04/2014 e recebida em 05/04/2014. Ocorreu a prescrição? Se ocorreu, qual a modalidade? Justifique.
51https://www.conjur.com.br/2017-mar-23/prescricao-penal-limite-emendatio-libelli?imprimir=1
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Resposta: Sim, ocorreu a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, pela pena em abstrato. A pena máxima da lesão corporal leve é de 1 ano, que de acordo com a tabela do art. 109, CP, prescreve em 4 anos, porém tendo em vista que Júlia era menor de 21 anos na data do fato, o prazo prescricional é reduzido pela metade (2 anos), de acordo com o art. 115, CP. Assim, para que não houvesse prescrito, a denúncia deveria ter sido recebida na data máxima de 22/10/2013. Se o recebimento foi em 05/04/2014 já ocorreu a prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato.
QUESTÃO-TREINO Prescrição Marcio, em 01/05/2015, culposamente atirou em seu desafeto Denis, que veio a falecer em 20/05/2015. Em 25/06/2015, o juiz recebeu a denúncia. A sentença transitada em julgado condenou Marcio à pena privativa de liberdade de 2 anos de detenção. Pergunta-se: a) quando se iniciou o cômputo da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita? b) no presente caso ocorreu a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita? Justifique.
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a) O crime se consumou em 20 de maio de 2015 o que sinaliza o termo inicial para cômputo do prazo prescricional, com base no art. 111, I, CP. Em se tratando de Prescrição Pretensão Punitiva propriamente dita que é baseada na pena em abstrato, deve-se atentar ao homicídio culposo (art.121 §3º, CP), donde percebemos a pena máxima in abstrato de 3 anos. Ademais, o início do cômputo da prescrição punitiva propriamente dita tem como termo inicial a data de 20/05/2015 por ser esta a data de consumação do crime. b) Não. A pena máxima em abstrato para o crime de homicídio culposo é de 3 anos, que prescreve em 08 anos (art. 109, IV, CP). Assim, não houve a prescrição porque da data de consumação do crime até o recebimento da exordial acusatória não se ultrapassou 8 anos.
Crimes de Periclitação. Crimes contra a liberdade pessoal. Inviolabilidade do domicílio. QUESTÕES-TREINO Centenas de manifestantes invadiram o gabinete de um Promotor de Justiça para cobrar medidas urgentes numa ação civil pública que tramita contra um ex-prefeito acusado de improbidade administrativa. Solicitados a sair, os mesmos resolveram permanecer e intensificaram os protestos. Não houve violência e nem grave ameaça. Dê a correta capitulação jurídicopenal da conduta dos manifestantes.
Resposta: Os manifestantes cometeram o crime de violação de domicílio (art. 150 do CP), pois permaneceram em casa alheia contra a vontade expressa de quem de direito. Embora o Promotor não residisse no local, o §4º do referido artigo estabelece que se considera casa o compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.O fato de o Promotor exercer seu ofício em prédio público, em nada altera o deslinde do feito, pois, o STJ entendeu
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo no HC 298763-SC que sendo local fechado ao público, em que o indivíduo exerce suas atividades laborais, há o necessário enquadramento no conceito de casa. Caso contrário, ocorreria a vulneração do bem jurídico “liberdade individual”, já que qualquer um que exercesse seu ofício em prédio público, poderia ter seu gabinete invadido, o que inviabilizaria o próprio serviço público52.
QUESTÕES-TREINO Leonardo e Michel, pai e filho, este último com apenas 08 anos, numa tarde ensolarada estavam numa piscina pública. Ambos brincavam na parte rasa da piscina. Em dado momento, Leonardo reconhece Natália, sua antiga namorada dos tempos de colégio. Acreditando que Michel, por já saber nada, teria condições de se manter sozinho na piscina, resolve conversar com a mesma. Sozinho na piscina, Michel vai para a parte funda da mesma e começa a se afogar, sendo salvo por um outro frequentador da piscina, sem quaisquer lesões daí decorrentes. Capitule a conduta jurídico-penal de Leonardo.
Resposta: Leonardo não responde por crime algum. Não haverá responsabilidade pelo delito de abandono de incapaz, pois não houve nem dolo direto e nem dolo eventual por parte dele, que acreditava que Michel poderia permanecer na piscina sozinho, já que sabia nadar. Tal crime não é punido na modalidade culposa.
QUESTÕES-TREINO Diante da imensa quantidade de crianças e adolescentes brasileiros em situação de rua, Márcio e Marcelo, ambos primários e não integrantes de qualquer outra organização criminosa, resolveram iniciar um empreendimento consistente em facilitar a adoção dessas crianças por casais brasileiros, à revelia de todo o procedimento pertinente 52
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Invasão de domicílio (art. 150 do CP). Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 07/09/2018
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo estabelecido no Estatuto da Criança e do Adolescente. O papel de Márcio seria recrutar tais crianças mediante grave ameaça ou violência, enquanto o papel de Marcelo seria o de transferir as crianças e adolescentes, mediante o pagamento de pecúnia. A primeira criança a fazer parte do programa desenvolvido é Erick, de 10 anos de idade. O mesmo foi recrutado mediante promessa de mal grave por Márcio e enquanto era preparado para ser transferido para determinada família, a polícia descobriu o esquema e efetuou a prisão. Qual a capitulação jurídico-penal da conduta de Márcio e de Marcelo? Ambos respondem pelo mesmo crime?
Resposta: Márcio e Marcelo responderão pelo delito de tráfico de pessoas (art. 149-A do Código Penal), pois, praticaram os atos típicos de recrutar e transferir criança para adoção ilegal. A pena deve ser aumentada de 1/3 até 1/2 pelo fato de o crime ter sido cometido contra criança ou adolescente. Deve ser reduzida também de 1/3 a 2/3 pelo fato de serem primários e não integrantes de organização criminosa.
Crimes contra o patrimônio
1) Leis relacionadas ao tema Código Penal Lei 13.654/18 2) Súmulas dos Tribunais superiores
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Súmula 567/STJ - Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto. STJ Súmula: 442/STJ: É INADMISSÍVEL aplicar, no furto qualificado, pelo concurso de agentes, a majorante do roubo. Súmula 443-STJ: O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes. Súmula 511/STJ: É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva. Súmula 582 STJ: Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.
3) Jurisprudência Informativo 563/STJ
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Material retirado do site Dizer o Direito.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo - STF - Para a consumação do crime de roubo, basta a inversão da posse da coisa subtraída, sendo desnecessária que ela se dê de forma mansa e pacífica, como argumenta a impetrante. STF. 2ª Turma. HC 100.189/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 16/4/2010. - STF - É prescindível, para a consumação do roubo, que o agente consiga a posse tranquila da coisa subtraída, mesmo que perseguido e preso por policiais logo após o fato. STF. 2ª Turma. HC 91.154/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 19/12/2008. - STF - Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que a prisão do agente, ocorrida logo após a subtração da coisa furtada, ainda sob a vigilância da vítima ou de terceira pessoa, não descaracteriza a consumação do crime de roubo. STF. 1ª Turma. HC 94.406/SP, Rel. Min. Menezes Direito, DJe 05/09/2008 - STJ - (...) Praticado o crime de roubo mediante uma só ação contra vítimas distintas, no mesmo contexto fático, resta configurado o concurso formal próprio, e não a hipótese de crime único, visto que violados patrimônios distintos. (...) (STJ. 6ª Turma. HC 197.684/RJ, Rel. Min. Sebastião Reis CS – DIREITO PENAL PARTE ESPECIAL 2018.1 189 Júnior, julgado em 18/06/2012) (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1189138/MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 11/06/2013).
4) Breves comentários sobre a matéria FURTO BEM JURÍDICO TUTELADO: Protege a propriedade, a posse e a detenção (desde que a detenção seja legítima) (corrente majoritária). CRIME COMUM. SUJEITO PASSIVO: Proprietário, possuidor ou detentor da coisa alheia móvel (pessoa física ou jurídica). TIPO OBJETIVO: Conduta subtrair (apreensão manual ou por pessoa interposta); Objeto Material Coisa (bem economicamente apreciável) alheia (que não pertence àquele que subtrai; pertence a outrem) móvel (aquela que pode ser transportada sem perder sua identidade); TIPO SUBJETIVO: para si ou para outrem (ter a coisa para sua disposição ou para outra pessoa) (animus furandi) (Obs.: Furto de uso – fato atípico: ausente elemento subjetivo do tipo, uma vez que destinada a subtração para utilização momentânea, com intenção de posterior devolução).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo CONSUMAÇÃO: TEORIA DA “AMOTIO”: Dá-se a consumação quando a coisa subtraída passa para o poder do agente, mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de deslocamento ou de posse mansa e pacífica. Quando se diz que a coisa passou para o poder do agente, isso significa que houve a inversão da posse. Por isso, ela é também conhecida como teoria da inversão da posse. Vale ressaltar que, para esta corrente, o furto se consuma mesmo que o agente não fique com a posse mansa e pacífica. A coisa é retirada da esfera de disponibilidade da vítima (inversão da posse), mas não é necessário que saia da esfera de vigilância da vítima (não se exige que o agente tenha posse desvigiada do bem). REPOUSO NOTURNO: É o período em que, à noite, pessoas se recolhem para o descanso diário. A razão da agravante está ligada ao maior perigo ao qual está submetido o bem, em razão da precariedade de vigilância decorrente do horário. (Obs.: Tanto o STJ quanto o STF dispensam a habitação do local onde ocorre o furto, permitindo a incidência da majorante até mesmo em furtos de estabelecimentos comerciais). Pode incidir a causa de aumento de pena no furto simples ou qualificado (Súmula 511/STJ). FURTO PRIVILEGIADO (furto mínimo): Requisitos: a) agente Primário: É aquele que não é reincidente, ainda que tenha condenações no passado; b) Coisa de pequeno valor: Coisa de até 01 Salário-Mínimo (ao tempo do fato). Lesão mínima. É DIFERENTE de “furto insignificante”. Pode ser aplicada a causa de diminuição de pena com as qualificadoras de ordem objetiva (isto é, relacionadas ao modo de execução, tempo e lugar do crime, bem como dos instrumentos utilizados). Não pode ser aplicada com qualificadora subjetiva (que dizem respeito a pessoa doa gente, p. ex., com abuso de confiança). PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: Para que incida o princípio da insignificância, é necessário que estejam presentes os seguintes requisitos construídos pela jurisprudência do STF/STJ: a) mínima ofensividade da conduta; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. FURTO DE SEMOVENTE (ANIMAL) (art. 155, §6º, do Código Penal – acrescentado pela Lei n. 13.330/2016). Estabeleceu nova QUALIFICADORA para o crime de furto. Veja a redação do parágrafo inserido: Art. 155, § 6º A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração. Desse modo, se o agente subtrai semovente domesticável de produção (ex: um boi, uma galinha, um porco, uma cabra etc.), ele não mais responderá pela pena do caput do art. 155 do CP e sim por este § 6º.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Abigeato: O § 6º do art. 155 pune mais gravosamente o abigeato, que é o nome dado pela doutrina para o furto de gado. Importante destacar que o abigeato abrange não apenas o furto de bovinos, mas também de outros animais domesticáveis, como caprinos, suínos etc. Vale ressaltar que haverá a incidência da referida qualificadora ainda que o larápio mate o semovente ou venha a dividi-lo em partes no local da subtração. Destarte, pouco importa seja subtraído o animal vivo ou morto, integralmente ou somente uma das suas partes. Em qualquer situação terá incidência a figura qualificada prevista no art. 155, § 6º, do CP. Se o agente subtrai uma peça de picanha de uma residência, de um supermercado ou mesmo de um açougue, ela responderá pela nova qualificadora do § 6º do art. 155? RESPOSTA: Não. O § 6º aplica-se para o caso de furto de semovente “dividido em partes no local da subtração”. Essa divisão deve ser efetuada pelo agente no local em que furto é praticado. Caso o animal tenha sido legitimamente dividido pelo seu proprietário e suas diversas partes tenham seguido destinos diferentes, não se pode dizer que ainda exista aí um semovente. Uma peça de picanha, de costela, de maminha etc., isoladamente considerada, não pode ser equiparada a um semovente. ROUBO BEM JURÍDICO TUTELADO: patrimônio + integridade física ou liberdade ou vida (decorrentes de violência ou grave ameaça crime pluriofensivo). Precipuamente, protege-se o patrimônio, posse ou detenção da coisa. Mediatamente, tutelam-se a integridade física, a liberdade, bem como a vida da vítima (no caso do latrocínio). A violência empregada no roubo pode ser própria (física) ou impópria (por meio de psicotrópicos, hipnose etc). ROUBO PRÓPRIO (artigo 157, caput): violência/grave ameaça antecedente e subtração subsequente ou concomitante; ROUBO IMPRÓPRIO (“roubo por aproximação”) (art. 157, §1º): Emprego de violência física ou grave ameaça, APÓS a subtração da coisa, como forma de assegurar a detenção da coisa ou a impunidade do crime. Percebe-se que aqui, a conduta criminosa é o oposto do roubo próprio: Primeiro ocorre a subtração (ato antecedente), depois a violência ou grave ameaça (atos subsequentes). (OBS.: ATENÇÃO: Para a configuração do roubo impróprio é INDISPENSÁVEL o prévio apoderamento da coisa. Se a violência ocorre antes ou durante a subtração, estar-se-á diante de roubo próprio) STF e STJ: não aplicam o princípio da insignificância no roubo.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo ROUBO MAJORADO PELA PRIVAÇÃO DA LIBERDADE X ROUBO EM CONCURSO COM SEQUESTRO
ROUBO MAJORADO
ROUBO + SEQUESTRO
Privação da liberdade da vítima é A privação da liberdade não é um meio necessário para o necessária. sucesso da detenção da coisa ou para a impunidade do crime (garantir a fuga). A privação não é prolongada. Dura A privação da liberdade é o tempo necessário para o prolongada: dura mais que o sucesso da empreitada. necessário à subtração da coisa. Ex.: Assalto a casa, coloco todos os moradores no banheiro, subtraio os pertences e vou embora.
Exemplo: Assaltante rouba carro e deixa o dono no porta-malas por várias horas, enquanto faz seus assaltos a banco pela cidade.
QUESTÕES-TREINO Furto Em uma pequena mercearia de São Paulo, Roberto se aproveita de um momento de distração dos funcionários presentes e apanha três garrafas de cerveja de pequeno valor não vigiadas, dirigindo-se, em seguida, à saída do estabelecimento com as mercadorias ocultas sob sua jaqueta. No entanto, logo após deixar o recinto, é abordado por seguranças e voluntariamente admite ter subtraído os produtos com intento de consumilos, sem pagar por eles. Diante dessa situação: a) Identifique o tipo penal referente à infração praticada, abordando a sua natureza no tocante ao bem jurídico protegido, bem como, a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância no caso apresentado e os seus efeitos. b) Instaurada fase investigatória de persecução penal, verifica-se que os seguranças da mercearia tiveram conhecimento da conduta de Roberto após a mesma ter sido registrada por câmeras de vigilância, intermitentemente observadas por funcionário. Com base apenas nesses dados, é possível dizer que se trata de crime impossível?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Responda com amparo no consagrado pela jurisprudência.
entendimento
majoritariamente
c) Suponha que, abordado pelos seguranças, Roberto tenha entrado em luta corporal com os mesmos antes de conseguir se evadir do local. A conduta praticada configura o mesmo tipo penal da situação inicialmente narrada? Justifique e, em caso negativo, identifique qual a figura típica em questão.
Respostas: a) Trata-se do crime de furto (art. 155 do Código Penal), crime contra o patrimônio que, em princípio, conforme entendimento jurisprudencial consolidado, admite aplicação do princípio da insignificância, acarretando o reconhecimento de ausência de tipicidade material da conduta. Para tanto, a conduta praticada deve atender a requisitos consolidados pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: mínima ofensividade da conduta; ausência de periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade da conduta; e inexpressividade da lesão jurídica. Dessa maneira, pelo último requisito, o valor da res furtiva deve ser de pequena monta. É relevante destacar, ainda, que a conduta proibida no furto exclui a violência e a grave ameaça como meios de execução, diferentemente do roubo, que, para a jurisprudência, não permite aplicação do princípio da insignificância, por esse motivo (RHC 106360 – DF, 1ª. T., Rel. Rosa Weber, 18.09.2012). b) Não. Segundo o entendimento consolidado pela jurisprudência, o simples fato de a conduta ser praticada em ambiente monitorado não é suficiente para a configuração de crime impossível, que exige a impossibilidade de consumação do crime por “ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto” (art. 17 do Código Penal), a excluir a tipicidade da conduta. Em outras palavras, não há crime, porque o agente jamais conseguiria consumá-lo; o bem jurídico protegido sequer foi posto em risco. Se o caso concreto apontar que o agente tinha alguma possibilidade de subtrair coisa alheia móvel, adquirindo a
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo sua posse, não há que se falar em crime impossível. Como exemplo, mencionase a possibilidade de falha no sistema de vigilância ou de fuga do agente do recinto, por saída não vigiada. Com efeito, no caso em tela, a existência de câmeras de vigilância no recinto não impede que o agente logre consumar o crime de furto, tanto é assim que conseguiu deixar o recinto com as garrafas de cerveja. Ressalva pode ser feita com relação a julgado em que se reconheceu caracterização de crime impossível, em situação na qual funcionários do estabelecimento “monitoravam, ininterruptamente, todo o iter criminis”, o que “…tornou impossível a consumação do crime, dada a ineficácia absoluta do meio empregado” (STF, HC nº 144.851, Rel. Dias Toffoli). c) Não. Trata-se de crime de roubo com violência imprópria, (art. 157, §1º, CP), em que a violência ou grave ameaça é praticada após a subtração, como meio para “assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro”.
SUPERQUESTÃO-ESTUDO 1) O que pode ser considerado “arma”? Para fins de definição do conteúdo podem ser incluídos no conceito de arma: • Arma própria: é o instrumento vulnerante, com ou sem a finalidade bélica; isto é, aquele que é destinado ao ataque ou defesa (Ex.: revólver). • Arma imprópria: quaisquer outros "artefatos" capazes de causar dano à integridade física do ser humano ou de coisas, como por exemplo uma garrafa de vidro quebrada, um garfo, um espeto de churrasco, uma chave de fenda etc. 2) Se o agente emprega no roubo uma “arma” de brinquedo, haverá a referida causa de aumento? NÃO. Até 2002, prevalecia que sim. Havia até a Súmula 174 do STJ afirmando isso. Contudo, essa súmula foi cancelada, de modo que, atualmente, no crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo não autoriza o aumento da pena. Fundamentos do cancelamento da Súmula a) A arma de brinquedo, não obstante caracterize a ameaça elementar do roubo, não gera um maior risco à incolumidade pessoal da vítima, que foi exatamente o que o legislador buscou impedir com a criação da majorante em análise. b) Trabalha-se aqui com o Princípio da lesividade e com a Teoria da Imputação objetiva: A arma de brinquedo não é capaz de criar ou incrementar o risco proibido.
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3) É necessário que a arma utilizada no roubo seja apreendida e periciada para que incida a majorante? NÃO. O reconhecimento da causa de aumento prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal prescinde (dispensa) da apreensão e da realização de perícia na arma, desde que provado o seu uso no roubo por outros meios de prova. Se o acusado alegar o contrário ou sustentar a ausência de potencial lesivo na arma empregada para intimidar a vítima, será dele o ônus de produzir tal prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. 4) Se, após o roubo, foi constatado que a arma empregada pelo agente apresentava defeito, incide mesmo assim a majorante? Depende: a) Se o defeito faz com que o instrumento utilizado pelo agente seja absolutamente ineficaz, não incide a majorante. Ex.: revólver que não possui mecanismo necessário para efetuar disparos. Nesse caso, o revólver defeituoso servirá apenas como meio para causar a grave ameaça à vítima, conforme exige o caput do art. 157, sendo o crime o de roubo simples; b) Se o defeito faz com que o instrumento utilizado pelo agente seja relativamente ineficaz, INCIDE a majorante. Ex.: revólver que algumas vezes trava e não dispara. Nesse caso, o revólver, mesmo defeituoso, continua tendo potencialidade lesiva, de sorte que poderá causar danos à integridade física, sendo, portanto, o crime o de roubo circunstanciado. 5) O Ministério Público que deve provar que a arma utilizada estava em perfeitas condições de uso? NÃO. Cabe ao réu, se assim for do seu interesse, demonstrar que a arma é desprovida de potencial lesivo, como na hipótese de utilização de arma de brinquedo, arma defeituosa ou arma incapaz de produzir lesão (STJ EREsp 961.863/RS). 6) Se, após o roubo, foi constatado que a arma estava desmuniciada no momento do crime, incide mesmo assim a majorante? NÃO. A utilização de arma desmuniciada, como forma de intimidar a vítima do delito de roubo, caracteriza o emprego de violência, porém, não permite o reconhecimento da majorante de pena, já que esta está vinculada ao potencial lesivo do instrumento, pericialmente comprovado como ausente no caso, dada a sua ineficácia para a realização de disparos (STJ HC 190.067/MS).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 7) Além do roubo qualificado, o agente responderá também pelo porte ilegal de arma de fogo (art. 14 ou 16, da Lei n. 10.826/2003)? Em regra, não. Geralmente, o crime de porte ilegal de arma de fogo é absorvido pelo crime de roubo circunstanciado. Aplica-se o princípio da consunção, considerando que o porte ilegal de arma de fogo funciona como crime meio para a prática do roubo (crime fim), sendo por este absorvido. “A conduta de portar arma ilegalmente é absorvida pelo crime de roubo, quando, ao longo da instrução criminal, restar evidenciado o nexo de dependência ou de subordinação entre as duas condutas e que os delitos foram praticados em um mesmo contexto fático, incidindo, assim, o princípio da consunção” (STJ HC 178.561/DF). No entanto, poderá haver condenação pelo crime de porte em concurso material com o roubo se ficar provado nos autos que o agente portava ilegalmente a arma de fogo em outras oportunidades antes ou depois do crime de roubo e que ele não se utilizou da arma tão somente para cometer o crime patrimonial.
QUESTÕES-TREINO No dia 21 de abril de 2018, na Rua das Flores, nesta Comarca, Bravo Charlie, com o emprego de uma faca de cozinha, proferiu grave ameaça à vítima Francisca e dela subtraiu a quantia de R$ 500,00 (quinhentos reais) e um aparelho de telefonia celular. Por crime o agente irá responder? Considere que o Ministério Público recebeu o inquérito policial relatado para oferecimento da denúncia em 09 de maio de 2018.
Resposta. Para melhor adequação típica devemos levar em consideração que o fato aconteceu em data anterior ao início de vigência da Lei Federal n. 13.654/18 (que entrou em vigor em 23 de abril de 2018). Assim, considerando que o aludido dispositivo legal revogou expressamente o inciso I, do § 2º do, art. 157 do Código Penal (que previa a causa de aumento de fogo pelo emprego de arma – leia-se,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo qualquer arma própria ou imprópria), o agente, em tese, responderia por roubo simples (artigo 157, caput, do Código Penal), diante da aplicação retroativa da lei posterior mais benéfica. É salutar lembrar que a Lei Federal n. 13.654/18, apesar de agravar a resposta penal nos crimes de furto qualificado e de roubo quando envolvam explosivos e do crime de roubo praticado com emprego de arma de fogo ou do qual resulte lesão corporal grave, deixou de considerar crime as modalidades de roubo que envolva armas (próprias ou impróprias) que não se qualificam como “armas de fogo ou explosivos”. Sem se questionar acerca da eventual violação ao princípio da proporcionalidade (sob o aspecto da proibição da proteção deficiente ou insuficiente), é certo que Ministério Público do Estado de São Paulo (AVISO 162/18 – PGJ – CaOCrim) possui entendimento de que o inciso I, do § 2º do, art. 157 do Código Penal, ainda permanece válido, diante da suposta inconstitucionalidade formal da Lei Federal n. 13.654/18, em razão de vício no processo legislativo exclusivamente em relação ao dispositivo que revogou a norma mencionada.
QUESTÕES-TREINO Crimes contra o patrimônio Sobre os crimes contra o patrimônio, responda: a) Discorra brevemente sobre a distinção entre a tentativa e o crime de roubo na forma consumada, levando em conta a natureza da infração e o momento da consumação, conforme entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça. b) Luciano, na condução de bicicleta, em alta velocidade, choca-se com transeunte na calçada e, ato contínuo, arrebata corrente de ouro que este usava, ocasionando-lhe ferimentos no pescoço. Qual a infração penal praticada? Justifique. c) Diferencie a extorsão cometida mediante restrição da liberdade da vítima, praticada como condição necessária para obtenção da vantagem econômica (art. 158, §3º, CP), da extorsão mediante sequestro (art. 159, CP).
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Respostas: a) Por se tratar de crime material, o crime de roubo (art. 157, CP) se consuma com a produção do resultado naturalístico (subtração de coisa alheia móvel) previsto no tipo penal. Conforme entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 582), essa consumação do crime se dá: “… com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada”. Ou seja, por esse entendimento, o roubo se consuma quando ultrapassado o momento da inversão da posse do bem (subtração), retirando-o da esfera de vigilância da vítima e tendo a sua livre disponibilidade, ainda que por breve período e sujeitando-se a perseguição imediata, consagrando a chamada “teoria da amotio”. Contrario sensu, o roubo é tentado se o agente, mesmo se valendo dos meios de execução “violência ou grave ameaça”, não obtiver a posse da coisa. b) Trata-se de crime de roubo, em que a subtração se dá por arrebatamento da coisa trazida junto ao corpo da vítima, praticado mediante violência. Veja-se que previamente à subtração por arrebatamento, houve contato físico contundente entre autor e vítima da infração, que também sofreu lesões físicas no pescoço em função do ato de subtração, afastando a configuração do crime de furto. Ou seja, houve ofensa à integridade física da vítima, caracterizando violência como meio de execução da subtração, não direcionada apenas à coisa que se pretende subtrair, mas à própria vítima, configurando-se o roubo. c) Há pelo menos três critérios de distinção possíveis: quantidade de tempo pelo qual a vítima tem tolhida sua liberdade, em ambos os casos, meio de execução para obtenção de vantagem pelo agente; a vantagem almejada pelo agente e a hediondez. A extorsão cometida mediante restrição da liberdade é forma qualificada de extorsão, prevista no art. 158, §3º, do Código Penal, em que a restrição da liberdade é menos duradoura que a privação da liberdade e se dá apenas pelo tempo necessário para a obtenção de vantagem de natureza econômica. Exemplo: a vítima é levada ao caixa eletrônico pelos agentes, para que efetue saque de numerário, período em que tem a sua liberdade restringida (“saidinha”). Não se trata de crime hediondo, pelo princípio da reserva legal, não sendo indicado no rol taxativo da Lei 8.072/1990. Já a privação da liberdade,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo contida no tipo do crime de extorsão mediante sequestro (art. 159, CP), se protrai no tempo, devendo ser duradoura o suficiente para que o agente, por exemplo, exija de familiares da vítima o “pagamento de qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate”, ou seja, não é preciso que a vantagem almejada seja econômica. Frise-se se tratar de crime hediondo (art. 1º, inciso IV, da Lei 8.072/1990).
QUESTÕES-TREINO Extorsão e Concussão Adélia toma conhecimento de que seu vizinho, Tércio, sofre investigação criminal por suposto cometimento de crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do Código Penal), temendo ele que pessoas de sua família e da comunidade em que vive saibam da existência da persecução penal em curso. Munida dessa informação, Adélia, recém-aprovada em concorrido concurso público para a carreira de membro do Ministério Público e na iminência de tomar posse no cargo, exige de Tércio alta soma em dinheiro para si, sob promessa de, quando Promotora de Justiça, providenciar o arquivamento do procedimento investigatório. Na situação descrita, Adélia praticou crime de extorsão? Justifique e, em caso negativo, identifique a figura típica eventualmente aplicada, trazendo ao menos três diferenças entre a extorsão e a infração praticada.
Resposta: Não. Adélia não praticou crime de extorsão, mas sim, de concussão (art. 316 do Código Penal). Em ambos os casos, o preceito primário consiste em conduta intimidatória, almejando obter de outrem uma vantagem indevida. Entretanto, sobressaem muitas diferenças entre as duas infrações.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A extorsão:
é crime contra o patrimônio e crime comum, isto é, passível de cometimento por qualquer pessoa na condição de autor, inclusive, funcionário público;
tem no núcleo do tipo o verbo “constranger”, o meio de execução deve ser “violência ou grave ameaça” e o fim almejado pelo agente é necessariamente uma vantagem econômica indevida, de modo que a vítima faça, tolere que se faça ou deixe de fazer alguma coisa;
tem pena para a forma simples de reclusão de 4 a 10 anos e multa.
Já a concussão:
é crime contra a Administração Pública e crime próprio, só podendo ser praticado por funcionário público, na condição de autor;
tem no núcleo do tipo verbo “exigir, para si ou para outrem”, almejando que a vítima proporcione vantagem indevida, e o meio de execução decorre da própria condição de funcionário público (isto é, a intimidação decorre do próprio cargo, sua autoridade e respeito), isto é, não reclama “violência ou grave ameaça”; por fim, a vantagem indevida não precisa ser econômica, embora possa sê-lo;
tem pena para a forma simples de reclusão de 2 a 8 anos e multa.
É importante frisar que, embora Adélia não fosse ainda Membro do Ministério Público ao tempo da conduta, exigiu vantagem econômica de Tércio se valendo do cargo público no qual viria a ser investida, incorrendo na prática de concussão.53
Crimes contra a vida QUESTÃO-TREINO No dia 15 de agosto de 2018, por volta de 01h50min., na cidade e Comarca de São Paulo, o denunciado João, imbuído de animus necandi, efetuou disparos de arma de fogo contra sua companheira, Maria, causando-lhe lesões que provocaram sua morte, conforme laudo de necropsia juntado 53
BITTENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. VELLUDO SALVADOR NETTO, Alamiro. “Dos Crimes Contra o Patrimônio”. In: REALE JÚNIOR, M (coord.). Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2017. pp. 469-511.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo aos respectivos autos. O denunciado agiu torpemente motivado, em razão de infundado ciúme, após a vítima ter atendido a ligação telefônica de um amigo. O delito foi praticado contra mulher, em contexto de violência doméstica e familiar, pois o denunciado e a vítima mantinham união estável. a) É possível que o agente seja condenado pelas qualificadoras de motivo torpe e feminicídio? b) O que são as “razões de condição de sexo feminino” previstas no artigo 121, VI, do Código Penal, que configuram o crime de feminicídio?
R: a) Sim. Em recente julgado, o STJ adotou posicionamento no sentido de que não caracteriza bis in idem o reconhecimento das qualificadoras de motivo torpe e de feminicídio no crime de homicídio praticado contra mulher em situação de violência doméstica e familiar54. Isso porque, para o STJ, a qualificadora do feminicídio (art. 121, VI, do CP) é de natureza objetiva e incide nos crimes praticados contra a mulher em razão do seu gênero feminino e/ou sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar propriamente dita, enquanto que a torpeza é de cunho subjetivo (relacionada aos motivos que levaram o agente a praticar o delito), sendo, portanto, possível a incidência das duas qualificadoras no caso concreto. b) O próprio Código Penal inseriu norma penal interpretativa para esclarecer o significado dessa expressão55, tratando-se das hipóteses em que o crime envolve violência doméstica ou familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
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STJ. 6a Turma. HC 433.898-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 24/04/2018 (Info 625) (Fonte: Dizer o Direito). 55 Art.121, § 2º-A do Código Penal.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO No ano de 2004 iniciou-se discussão no STF acerca da possibilidade de antecipação terapêutica do parto nos casos de anencefalia, com a propositura de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde, pleiteando o direito de que gestantes nessa situação pudessem interromper a gestação sem a necessidade de autorização judicial ou permissão específica do Estado. Diante do julgamento da ADPF nº 54 no ano de 2012, discorra brevemente sobre o atual entendimento acerca da questão e os principais aspectos da decisão do STF.
R: Atualmente, a conduta de interromper a gravidez de feto anencéfalo é atípica, não se subsumindo à nenhuma das figuras previstas nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II do Código Penal. Dentre os fundamentos utilizados pelo STF no julgamento da ADPF, pode-se citar, resumidamente, a laicidade do Estado, a equiparação do feto anencéfalo ao natimorto cerebral, a impossibilidade de manutenção da gravidez apenas para viabilizar eventual doação de órgãos e no próprio direito de escolha da mulher em prosseguir ou não com a gestação, a fim de garantir sua higidez física e psíquica56.
QUESTÃO-TREINO José agride fisicamente seu irmão Pedro após uma discussão em uma partida de futebol, causando-lhe lesões corporais de natureza leve. Diante desses fatos, o Ministério Público ofereceu denúncia em face de José, imputando-lhe a prática do delito previsto no artigo 129, § 9º do Código Penal. Considerando que o crime não ocorreu no ambiente familiar, é correta a imputação do delito de lesão corporal leve qualificada pela violência doméstica?
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Fonte: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/adpf54.pdf.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
R: Sim. Preliminarmente, é de se mencionar ser pacífico na Jurisprudência o posicionamento no sentido de que a qualificadora prevista no § 9º do artigo 129 do Código Penal aplica-se também às lesões corporais cometidas contra homem, no âmbito das relações domésticas57. É cabível, ainda, a incidência da qualificadora do §9º do CP, ainda que a lesão corporal não tenha sido praticada no âmbito doméstico, visto que uma das formas de se praticar o crime é simplesmente cometer lesão corporal contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro. Verificada a ocorrência do delito contra algum desses sujeitos, estará configurada a forma qualificada, independentemente do local da agressão58.
Dos crimes contra a Administração Pública
1) Leis relacionadas ao tema
Artigos 312 a 327 do Código Penal
2) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores (Súmula 330/STJ) A notificação do funcionário público, nos termos do art. 514 do Código de Processo Penal, não é necessária quando a ação penal for precedida de inquérito policial.
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Vide STJ. 5a Turma. RHC 27.622-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 7/8/2012. Assim, decidiu o STJ: Não é inepta a denúncia que se fundamenta no art. 129, § 9o, do CP – lesão corporal leve –, qualificada pela violência doméstica, tão somente em razão de o crime não ter ocorrido no ambiente familiar. STJ. 5a Turma. RHC 50.026-PA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 3/8/2017 (Info 609) (Fonte: Dizer o Direito). 58
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (Súmula n. 599/STJ) O princípio da insignificância é inapçicável aos crimes contra a administração pública.
3) Informativos (Teses/STJ) É possível o agravamento da pena-base nos delitos praticados contra a Administração Pública com fundamento no elevado prejuízo causado aos cofres públicos, a título de consequências do crime (Tese/STJ) A regularidade contábil atestada pelo Tribunal de Contas não obsta a persecução criminal promovida pelo Ministério Público, ante o princípio da independência entre as instâncias administrativa e penal. (Teses/STJ) A agravante prevista no art. 61, II, g, do Código Penal não é aplicável nos casos em que o abuso de poder ou a violação de dever inerente ao cargo configurar elementar do crime praticado contra a Administração Pública. (Teses/STJ) Somente após o advento da Lei 9.983/2000, que alterou a redação do art. 327 do Código Penal, é possível a equiparação de médico de hospital particular conveniado ao Sistema Único de Saúde - SUS a funcionário público para fins penais. (Teses/STJ) Os advogados dativos, nomeados para exercer a defesa de acusado necessitado nos locais onde não existe Defensoria Pública, são considerados funcionários públicos para fins penais, nos termos do art. 327 do Código Penal. (Tese/STJ) A prática de crime contra a Administração Pública por ocupantes de cargos de elevada responsabilidade ou por membros de poder justifica a majoração da pena base. (Tese/STJ) A elementar do crime de peculato se comunica aos coautores e partícipes estranhos ao serviço público. (Tese/STJ) A consumação do crime de peculato-apropriação (art. 312, caput, 1.ª parte, do Código Penal) ocorre no momento da inversão da posse do objeto material por parte do funcionário público (Tese/STJ) A consumação do crime de peculato-desvio (art. 312, caput, 2ª parte, do CP) ocorre no momento em que o funcionário efetivamente desvia o dinheiro, valor ou outro bem móvel, em proveito próprio ou de terceiro, ainda que não obtenha a vantagem indevida. (Tese/STJ) A reparação do dano antes do recebimento da denúncia não exclui o crime de peculato doloso, diante da ausência de previsão legal, podendo configurar arrependimento posterior, nos termos do art. 16 do CP
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (Tese/STJ)A instauração de ação penal individualizada para os crimes de peculato e sonegação fiscal em relação aos valores indevidamente apropriados não constitui bis in idem. (Tese/STJ) Compete à Justiça Federal o julgamento do crime de peculato se houver possibilidade de utilização da prova do referido delito para elucidar sonegação fiscal consistente na falta de declaração à Receita Federal do recebimento dos valores indevidamente apropriados. (Tese/STJ) Compete à Justiça Federal processar e julgar desvios de verbas públicas transferidas por meio de convênio e sujeitas a fiscalização de órgão federal. (Tese/STJ) Não há bilateralidade entre os crimes de corrupção passiva e ativa, uma vez que estão previstos em tipos penais distintos e autônomos, são independentes e a comprovação de um deles não pressupõe a do outro. (Tese/STJ) No crime de corrupção passiva, é indispensável haver nexo de causalidade entre a conduta do servidor e a realização de ato funcional de sua competência. (Tese/STJ) O crime de corrupção passiva praticado pelas condutas de “aceitar promessa” ou “solicitar” é formal e se consuma com a mera solicitação ou aceitação da vantagem indevida. (Tese/STJ) O crime de corrupção ativa é formal e instantâneo, consumando-se com a simples promessa ou oferta de vantagem indevida. (Tese/STJ) Não há flagrante quando a entrega de valores ocorre em momento posterior a exigência, pois o crime de concussão é formal e o recebimento se consubstancia em mero exaurimento. (Tese/STJ) Comete o crime de extorsão e não o de concussão, o funcionário público que se utiliza de violência ou grave ameaça para obter vantagem indevida.
Breves comentários O Código Penal, em seus artigos 312 a 327 regula os crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral. Será sujeito ativo de qualquer dos crimes previstos nos arts. 312 a 326 do CP o funcionário público. Importante anotar que a doutrina cuidou de classificar os crimes funcionais em dois grupos: a) crimes funcionais próprios (ou puros, ou propriamente ditos) são aqueles em que, eliminada a condição de funcionário público do agente delitivo, inexistirá crime (atipicidade penal absoluta). É o que se verifica, por exemplo, com o crime de prevaricação (art. 319 do CP) e; b)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo crimes funcionais impróprios (ou impuros, ou impropriamente ditos) são aqueles que, eliminada a condição de funcionário público do agente delitivo, este responderá por outro crime (atipicidade penal relativa). É o que ocorre, por exemplo, com o crime de peculato (art. 312 do CP). Se o agente não for funcionário público e se apropriar de coisa alheia móvel particular que estiver em sua posse, responderá por apropriação indébita (art. 168 do CP) e, não, peculato (art. 312 do CP). O conceito de funcionário é expresso no próprio Código Penal (art. 327, caput), nele sendo compreendido o conceito de funcionário público por equiparação (art. 327, §1º). Os tipos penais em espécie, tendo em vista a finalidade do presente trabalho no que se refere à abordagem concisa e objetiva de prováveis temas para prova escrita, não serão vistos individualmente.
QUESTÃO-TREINO Peculato eletrônico Segundo a doutrina, o que vem a ser o peculato eletrônico?
Resposta: É o delito previsto no artigo 313-A do Código Penal (Inserção de dados falsos em sistema de informação), no qual o agente insere dados falsos, facilita a inserção de dados falsos, altera ou exclui indevidamente dados nos sistemas informatizados da Administração Pública. Considerando que as condutas típicas recaem sobre dados em sistema informatizado, convencionouse denominar tal crime de peculato eletrônico. Cuidado, pois o crime previsto no artigo 313-B do Código Penal tem como objeto jurídico o próprio programa (software) que é alterado, e não as informações nele contidas.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Legislação Penal Especial: Crimes de responsabilidade de Prefeitos Municipais. Crimes eleitorais. Crimes referentes a licitações e contratos administrativos. QUESTÃO-TREINO Crimes de responsabilidade de prefeitos Quais as principais espécies de infrações previstas pelo Decreto-Lei 201/67?
Resposta: O mencionado Decreto-Lei prevê os crimes de responsabilidade impróprios e as infrações político-administrativas (crimes de responsabilidade próprios) dos prefeitos municipais. O artigo primeiro elenca os crimes de responsabilidade impróprios, de ação pública, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário (no caso, compete aos Tribunais de Justiça, por força do art. 29, X, da CF, sendo válido verificar também o teor do enunciado 702 da súmula do STF), sem necessidade de intervenção da Câmara Municipal, tendo como consequências da condenação definitiva: além da prisão (na maioria das hipóteses é detenção, sendo que a reclusão - de dois a doze anos - é cominada apenas nos casos de apropriação/desvio ou uso indevido de bens/rendas públicas), também a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular. Já o artigo quarto elenca as infrações político administrativas (crimes de responsabilidade próprios), que serão julgadas pela Câmara Municipal.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-ESTUDO Crimes eleitorais e leis aplicáveis Quais são os principais diplomas normativos aplicáveis aos crimes eleitorais? Resposta: Além do próprio Código Eleitoral, que traz disposições preliminares e prevê um significativo elenco dos crimes eleitorais em espécie, e das outras leis eleitorais que prevêem delitos específicos (Lei das Eleições, Lei das Inelegibilidades, dentre outras), aplica-se também a parte geral do Código Penal. Especificamente quanto aos crimes eleitorais cometidos por meio da imprensa, do rádio ou da televisão, aplicam-se exclusivamente as normas do Código Eleitoral e as eventuais remissões a outras leis nele contempladas. De acordo com parte da doutrina, quando temos uma conduta tipificada tanto no Código Penal quanto na legislação eleitoral, estamos diante de um crime eleitoral impróprio, devendo ser aplicados os postulados de solução dos conflitos aparentes de normas, tais como o princípio da especialidade. Importante também lembrar que, de acordo com o artigo 283, do Código Eleitoral: “Art. 283. Para os efeitos penais são considerados membros e funcionários da Justiça Eleitoral: I - os magistrados que, mesmo não exercendo funções eleitorais, estejam presidindo Juntas Apuradoras ou se encontrem no exercício de outra função por designação de Tribunal Eleitoral; II - Os cidadãos que temporariamente integram órgãos da Justiça Eleitoral; III - Os cidadãos que hajam sido nomeados para as mesas receptoras ou Juntas Apuradoras; IV - Os funcionários requisitados pela Justiça Eleitoral. § 1º Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, além dos indicados no presente artigo, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 2º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal ou em sociedade de economia mista”.
QUESTÃO-ESTUDO Licitações e crimes Quais são as principais especificidades dos crimes referentes a licitações e contratos administrativos (Artigos 81-85 e 89-99 da Lei 8.666/93). Resposta: Podemos apontar, como algumas das especificidades mais importantes: “pena imposta será acrescida da terça parte, quando os autores dos crimes previstos nesta Lei forem ocupantes de cargo em comissão ou de função de confiança em órgão da Administração direta, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, fundação pública, ou outra entidade controlada direta ou indiretamente pelo Poder Público” (artigo 84, §2o); “Os crimes definidos nesta Lei, ainda que simplesmente tentados, sujeitam os seus autores, quando
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo servidores públicos, além das sanções penais, à perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo” (artigo 83); “O produto da arrecadação da multa reverterá, conforme o caso, à Fazenda Federal, Distrital, Estadual ou Municipal” (artigo 99, §2o); “Considera-se servidor público, para os fins desta Lei, aquele que exerce, mesmo que transitoriamente ou sem remuneração, cargo, função ou emprego público. Equipara-se a servidor público, para os fins desta Lei, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, assim consideradas, além das fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, as demais entidades sob controle, direto ou indireto, do Poder Público” (artigo 84, caput e §1o). Além desses aspectos, é válido lembrar que a ação penal nesses casos é sempre pública incondicionada (artigo 100).
Crimes contra pessoas com deficiência QUESTÃO-TREINO No que consistem os chamados crimes de cifra oculta e qual a relação que podemos estabelecer entre eles e as pessoas com deficiência? Discorra, sob o ponto de vista da inclusão social.
R: Os crimes cometidos contra as pessoas com deficiência (assim como os crimes cometidos contra outras minorias - crianças, mulheres, idosos, etc), em razão da imensa vulnerabilidade da vítima e da falta de consciência social acerca da gravidade das condutas cometidas, acabam por compor os chamados crimes de cifra oculta. Estes podem ser definidos como crimes concretamente praticados mas que não irão integrar as estatísticas oficiais, por não terem sido perseguidos policial ou judicialmente, havendo uma falta de interesse em apuralos. Conforme aponta Alexandre de Matos Guedes, “o principal desafio que se apresenta na defesa da pessoa com deficiência no plano penal – e também nos outros planos – é buscar conscientizar os operadores jurídicos em geral, não apenas quanto à existência dessas condutas específicas, mas também da necessidade de sua aplicação dentro de uma cultura inclusiva. O que chamamos aqui de cultura inclusiva não se refere apenas à compreensão comum de que devemos perceber a existência da pessoa com deficiência como elemento
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo integrante da sociedade, mas também ao fato de que os crimes contra a pessoa com deficiência não pertencem ao imaginário comum dos juristas.59” Isso equivale a dizer, portanto, que a previsão de crimes em defesa das pessoas com deficiência não se demonstra, por si só, suficiente, se não vier acompanhada de políticas públicas que se destinem a efetivar a inclusão social e à aplicar esse tipo de política penal, em uma abordagem que envolva desde à sociedade ao estado, incluindo-se aí os juristas. Nos ensina o mesmo autor que “A questão da invisibilidade do outro como elemento de discriminação cultural se constitui um dos maiores desafios para a inclusão de categorias de pessoas historicamente relegadas (...)60”.
Crimes do Estatuto do Idoso 1) Leis relacionadas ao tema Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 – Estatuto do Idoso. Código Penal. Breves comentários Sujeito passivo: O sujeito passivo será o idoso, ou seja, pessoa maior de 60 anos (art. 1º do Estatuto do Idoso). Ação Penal: Os crimes praticados contra idosos serão processados por ação penal incondicionada (art. 95 do Estatuto). Cuidado – Lei 9.099/95 e Competência: O art. 94 da Lei prevê a possibilidade de aplicação da Lei nº 9.099/95 aos crimes previstos no Estatuto do Idoso com pena máxima de até 04 (quatro) anos. Entretanto, o STF, no âmbito da ADI 3096, entendeu que são inconstitucionais as aplicações da transação penal e da suspensão condicional do processo para os crimes praticados contra idosos, independentemente da quantidade da pena abstrata prevista. Assim, tem-se que: a. aos crimes do Estatuto do Idoso que tenham pena máxima abstrata até 02 (dois) anos – e, portanto, caracterizados como infrações de menor potencial ofensivo – é possível aplicação das medidas despenalizadoras da Lei nº 9.099/95; 59
GUGEL, Maria Aparecida, MACIEIRA, Waldir, e RIBEIRO, Lauro, organizadores. Deficiência no Brasil: uma abordagem integral dos direitos das pessoas com deficiência. Editora Obra Jurídica, 2007, p.482. 60 GUGEL, Maria Aparecida, MACIEIRA, Waldir, e RIBEIRO, Lauro, organizadores. Deficiência no Brasil: uma abordagem integral dos direitos das pessoas com deficiência. Editora Obra Jurídica, 2007, p.481.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo b. os crimes que tenham pena abstrata máxima superior a 02 (dois) anos e que não ultrapasse 04 anos, o delito será de competência do Juízo Comum, com aplicação do procedimento da Lei nº 9.099/95, em que pese a impossibilidade de aplicação dos benefícios da suspensão condicional do processo, da transação penal e da composição dos danos civis e c. os crimes que tenham pena máxima abstrata superior a 04 (quatro) anos serão de competência do Juízo comum e será seguido o procedimento comum ordinário. Prescrição: o Estatuto do Idoso não traz previsão específica sobre prescrição. A seu turno, o Código Penal prevê que a prescrição será contada pela metade aos condenados que na data da sentença contem com mais de 70 (setenta) anos – art. 115, do CP.
Principais tipos penais do Estatuto do Idoso:
Art. 96, “caput” e parágrafos: Crime de discriminação de pessoa idosa;
Art. 98: Crime de abandono de idoso;
Art. 99, “caput” e parágrafos: formas de maus tratos a idosos;
Art. 100: outras modalidades de discriminação a idoso;
Art. 102: apropriação indébita de bens de idoso;
Art. 104: crime de retenção de cartão magnético;
Art. 109: “Impedir ou embaraçar ato do representante do Ministério Público ou de qualquer outro agente fiscalizador”
Estelionato contra idoso: a Lei nº 13.228/15 acrescentou o §4º ao art. 171 do Código Penal, passando a prever causa de aumento de pena ao estelionato praticado em face de pessoa idosa (“Aplica-se a pena em dobro se o crime for cometido contra idoso”).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Especificamente quanto aos crimes previstos no Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), é cabível transação penal quando a pena máxima privativa de liberdade cominada não superar o patamar de 4 anos? (MPDFT – 31º Concurso de Ingresso – Adaptada)
Resposta: Em que pese a previsão do art. 94 do Estatuto do Idoso sobre a aplicação do procedimento previsto na Lei nº 9.099/95 aos crimes que tenham pena máxima de quatro anos, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 3096, entendeu que as medidas despenalizadoras são incompatíveis com os crimes praticados contra o idoso, uma vez que o Estatuto visava a proteção dos direitos dos idosos e não daqueles que violem os direitos do beneficiário da lei. Por essa razão, a transação penal, assim como as demais medidas despenalizadoras, apenas será cabível às infrações penais de menor potencial ofensivo, cuja pena máxima é de dois anos.
Crimes de Tortura 1) Leis relacionadas ao tema Lei 9.455/1997 2)
Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores
Súmula vinculante 11-STF: Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do estado
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3) Informativos “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. REGIME MILITAR. DISSIDENTE POLÍTICO PRESO NA ÉPOCA DO REGIME MILITAR. TORTURA. DANO MORAL. FATO NOTÓRIO. NEXO CAUSAL. NÃO INCIDÊNCIA DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL - ART. 1º DECRETO 20.910/1932. IMPRESCRITIBILIDADE. 1. A dignidade da pessoa humana, valor erigido como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, experimenta os mais expressivos atentados quando engendradas a tortura e a morte, máxime por delito de opinião. 2. Sob esse ângulo, dispõe a Constituição Federal: "Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana;" "Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes; (...) III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;" 3. Destarte, o egrégio STF assentou que: "...o delito de tortura - por comportar formas múltiplas de execução - caracteriza- se pela inflição de tormentos e suplícios que exasperam, na dimensão física, moral ou psíquica em que se projetam os seus efeitos, o sofrimento da vítima por atos de desnecessária, abusiva e inaceitável crueldade. - A norma inscrita no art. 233 da Lei nº 8.069/90, ao definir o crime de tortura contra a criança e o adolescente, ajusta-se, com extrema fidelidade, ao princípio constitucional da tipicidade dos delitos (CF, art. 5º, XXXIX). A TORTURA COMO PRÁTICA INACEITÁVEL DE OFENSA À DIGNIDADE DA PESSOA. A simples referência normativa à tortura, constante da descrição típica consubstanciada no art. 233 do Estatuto da Criança e do Adolescente, exterioriza um universo conceitual impregnado de noções com que o senso comum e o sentimento de decência das pessoas identificam as condutas aviltantes que traduzem, na concreção de sua prática, o gesto ominoso de ofensa à dignidade da pessoa humana. A tortura constitui a negação arbitrária dos direitos humanos, pois reflete - enquanto prática ilegítima, imoral e abusiva - um inaceitável ensaio de atuação estatal tendente a asfixiar e, até mesmo, a suprimir a dignidade, a autonomia e a liberdade com que o indivíduo foi dotado, de maneira indisponível, pelo ordenamento positivo." (HC 70.389/SP, Rel. p. Acórdão Min. Celso de Mello, DJ 10/08/2001) 4. À luz das cláusulas pétreas constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a proteção da dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República Federativa, posto seu fundamento. 5. Consectariamente, não há falar em prescrição da ação que visa implementar um dos pilares da República, máxime porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao direito de agir, correspondente ao direito inalienável à dignidade. 6. Outrossim, a Lei 9.140/95, que criou as ações correspondentes às violações à dignidade humana, perpetradas em período de supressão das liberdades públicas, previu a ação
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo condenatória no art. 14, sem estipular-lhe prazo prescricional, por isso que a lex specialis convive com a lex generalis, sendo incabível qualquer aplicação analógica do Código Civil no afã de superar a reparação de atentados aos direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a dignidade retratada no respeito à integridade física do ser humano. 7. Ação ordinária proposta com objetivo de reconhecimento de danos materiais e morais, em face do Estado, pela prática de atos ilegítimos decorrentes de perseguições políticas perpetradas por ocasião do golpe militar de 1964, que culminaram na prisão do pai dos autores, bem como na sua tortura, cujas consequências alega irreparáveis. 8. A prova inequívoca da perseguição política à vítima e de imposição, por via oblíqua, de sobrevivência clandestina, atentando contra a dignidade da pessoa humana. 9. A indenização pretendida tem amparo constitucional no art. 8º, § 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Precedentes. 10. Adjuntemse à lei interna, as inúmeras convenções internacionais firmadas pelo Brasil, a começar pela Declaração Universal da ONU, e demais convenções específicas sobre a tortura, tais como a Convenção contra a Tortura adotada pela Assembleia Geral da ONU, a Convenção Interamericana contra a Tortura, concluída em Cartagena, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). 11. A dignidade humana desprezada, in casu, decorreu do fato de ter sido o autor torturado revelando flagrante violação a um dos mais singulares direitos humanos, os quais, segundo os tratadistas, são inatos, universais, absolutos, inalienáveis e imprescritíveis. 12. A exigibilidade a qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de que o reconhecimento da dignidade humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz, razão por que a Declaração Universal inaugura seu regramento superior estabelecendo no art. 1º que "todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos". 13. A Constituição federal funda-se na premissa de que a dignidade da pessoa humana é inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual. 14. O egrégio STJ, em oportunidades ímpares de criação jurisprudencial, vaticinou: "RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRISÃO, TORTURA E MORTE DO PAI E MARIDO DAS RECORRIDAS. REGIME MILITAR. ALEGADA PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. LEI N. 9.140/95. RECONHECIMENTO OFICIAL DO FALECIMENTO, PELA COMISSÃO ESPECIAL DE DESAPARECIDOS POLÍTICOS, EM 1996. DIES A QUO PARA A CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL. A Lei n. 9.140, de 04.12.95, reabriu o prazo para investigação, e consequente reconhecimento de mortes decorrentes de perseguição política no período de 2 de setembro de 1961 a 05 de outubro de 1998, para possibilitar tanto os registros de óbito dessas pessoas como as indenizações para reparar os danos causados pelo Estado às pessoas perseguidas, ou ao seu cônjuge, companheiro ou companheira, descendentes, ascendentes ou colaterais até o quarto grau. omissis ...em se tratando de lesão à integridade física, deve-se entender que esse direito é imprescritível, pois não há confundi-lo com seus efeitos patrimoniais reflexos e dependentes. "O dano
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo noticiado, caso seja provado, atinge o mais consagrado direito da cidadania: o de respeito pelo Estado à vida e de respeito à dignidade humana. O delito de tortura é hediondo. A imprescritibilidade deve ser a regra quando se busca indenização por danos morais consequentes da sua prática" (REsp n. 379.414/PR, Rel. Min. José Delgado, in DJ de 17.02.2003). Recurso especial não conhecido." (REsp 449.000/PE, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 3/06/2003) 15. Recurso especial provido para afastar in casu a aplicação da norma inserta no art. 1.º do Decreto n.º 20.910/32, determinando o retorno dos autos à instância de origem, para que dê prosseguimento ao feito. (REsp 1165986/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/11/2010, DJe 04/02/2011)
PENAL. HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE RECURSO PRÓPRIO.TORTURA. SENTENÇA. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. ELEMENTOS DO TIPO. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 1º, §4º, II, DA LEI 9.455/97. AGRAVANTE DO ART. 61, II, "F", DO CÓDIGO PENAL. APLICAÇÃO CONJUNTA. BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. FUNDAMENTOS DISTINTOS. ILEGALIDADE NÃO EVIDENCIADA. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso especial. 2. Não há se falar em bis in idem quando as circunstâncias judiciais valoradas pelo magistrado vão além da descrição genérica e abstrata do delito contida no próprio tipo, ressaltando a gravidade em concreto do crime. Dever de fundamentação atendido. 3. Haja vista a existência de fundamentos díspares, não há falar em bis in idem na aplicação conjunta da causa de aumento de pena prevista no art. 1º, §4º, II, da Lei de Tortura, e da agravante genérica estatuída no art. 61, II, "f", do Código Penal. Com efeito, a majorante tem por finalidade punir de forma mais severa aquele que se favorece da menor capacidade de resistência da vítima, ao passo que a agravante tem por desiderato a punição mais rigorosa do agente que afronta o dever de apoio mútuo existente entre parentes e pessoas ligadas por liames domésticos, de coabitação ou hospitalidade, além dos casos de violência doméstica praticada contra a mulher. 4. Writ não conhecido. (HC 362.634/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 16/08/2016, DJe 29/08/2016).
HABEAS CORPUS. CRIMES DE TORTURA (OMISSÃO CRIMINOSA). PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. INCOMPATIBILIDADE COM A VIA ELEITA. PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA. EFEITO AUTOMÁTICO DA CONDENAÇÃO. 1. O pedido absolutório, calcado no fundamento de que o paciente não teria ciência
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo da violência praticada no estabelecimento em que trabalhava, demanda inevitável revolvimento do conjunto fático-probatório, providência de todo incompatível com a via eleita. 2. Além disso, a condenação foi lastreada em farto conjunto probatório, incluindo o depoimento de testemunhas, que relataram ter ouvido, de suas casas, vários pedidos de socorro, partidos de dentro do batalhão de polícia. 3. "O Tribunal de Justiça local tem competência para decretar, como conseqüência da condenação, a perda da patente e do posto de oficial da Polícia Militar, tal como previsto no art. 1º, § 5º, da Lei de Tortura (Lei n° 9.455/97). Não se trata de hipótese de crime militar." (HC 92181/MG, Relator Ministro Joaquim Barbosa, DJ de 1º.8.2008). 4. A condenação por delito previsto na Lei de Tortura acarreta, como efeito extrapenal automático da sentença condenatória, a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada. Precedentes do STJ e do STF. 5. No caso, a perda da função pública foi decretada na sentença como efeito da condenação e mantida pelo Tribunal de origem, quando do julgamento da apelação. 6. De mais a mais, embora não se fizesse necessário (por ser efeito automático da condenação), o Magistrado apontou as razões pelas quais deveria ser aplicada também a pena de perda do cargo. 7. Ordem denegada. (HC 47.846/MG, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 11/12/2009, DJe 22/02/2010) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.POLICIAIS CIVIS. TORTURA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS.PRECEDENTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. Histórico da demanda. 1. Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Público estadual contra o ora recorrido, policial, pela prática de supostos atos de tortura. 2. O Juiz de 1º Grau recebeu a petição inicial, e desta decisão os réus, ora recorridos, interpuseram Agravo de Instrumento. 3. O Tribunal a quo deu provimento ao Agravo de Instrumento para trancar a Ação de Improbidade Administrativa, e assim consignou na decisão: "Não obstante a gravidade dos fatos narrados na referida Ação Civil, dando conta da prática abominável de Tortura perpetrada por agentes policiais contra presos mantidos sob a sua custódia, que sem sombra de dúvidas merecem e devem ser cuidadosamente investigados, entendo não ser a Ação por Improbidade Administrativa a via adequada para tanto. In casu, o autor/agravado embasa a demanda em fatos ocorridos na Comarca de Lagarto, sustentando, em suma, que os terem submetido alguns presos que se encontravam custodiados na delegacia local a "espancamentos, asfixia e graves ameaças, para confessaram a prática de crimes", configurando, segundo alega, ato de improbidade administrativa por violação dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade e imparcialidade da Administração Pública, nos termos do art. 11, caput, e inciso I, da Lei nº 8.429/92, como também nas condutas previstas no art. 10, § 20, da Lei nº 9.455/97 (Lei de Tortura)." (fls. 122-123, grifo acrescentado).Tortura: improbidade administrativa 4. Injustificável pretender que os atos mais gravosos à dignidade da pessoa humana e aos direitos humanos, entre os quais se incluem a tortura, praticados por servidor público,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo quanto mais policial armado, sejam punidos apenas no âmbito disciplinar, civil e penal, afastando-se a aplicação da Lei da Improbidade Administrativa. 5. Conforme orientação jurisprudencial do STJ, eventual punição administrativa do servidor faltoso não impede a aplicação das penas da Lei de Improbidade Administrativa, porque os escopos de ambas as esferas são diversos; e as penalidades dispostas na Lei 8.429/1992, mais amplas. Precedentes: MS 16.183/DF, Rel. Ministro Ari Pargendler, Primeira Seção, DJe 21.10.2013, MS 15.054/DF, Rel.Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Gilson Dipp, Terceira Seção, DJe 19.12.2011, MS 17.873/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 2.10.2012, AgRg no AREsp 17.974/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 11.11.2011, MS 12.660/DF, Rel. Ministra Marilza Maynard (Desembargadora Convocada do TJ/SE), Terceira Seção, DJe 22.8.2014, e MS 13.357/DF, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, DJe 18.11.2013. Universo dos sujeitos abrangidos pelas sanções da Lei 8.429/92 6. "A Lei 8.429/1992 objetiva coibir, punir e afastar da atividade pública todos os agentes que demonstraram pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida" (REsp 1.297.021/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 12.11.2013, DJe 20.11.2013). Universo das vítimas protegidas pela Lei 8.429/92 7. A detida análise da Lei 8.429/1992 demonstra que o legislador não determinou expressamente quais seriam as vítimas mediatas ou imediatas da atividade ímproba para fins de configuração do ato ilícito. Impôs, sim, que o agente público respeite o sistema jurídico em vigor, pressuposto da boa e correta Administração Pública. Essa ausência de menção explícita certamente decorre da compreensão de que o ato ímprobo é, muitas vezes, fenômeno pluriofensivo, de tal modo que pode atingir bens jurídicos e pessoas diversos de maneira concomitante. 8. Na avaliação do ato de improbidade administrativa, o primordial é verificar se, entre os bens atingidos pela postura do agente público, existe algum vinculado ao interesse e ao bem público. Se assim for, como consequência imediata a Administração Pública estará vulnerada; e o art. 1º da Lei 8.429/1992, plenamente atendido. Ofensa aos princípios administrativos por policiais civis e militares 9. No caso dos autos, trata-se de discussão sobre séria arbitrariedade e grave atentado a direitos humanos fundamentais. Como resultado, tal postura imprópria tem o condão de afrontar não só a Constituição da República (arts. 1º, III, e 4º, II) e a legislação infraconstitucional, mas também tratados e convenções internacionais, a exemplo da Convenção Americana de Direitos Humanos (promulgada pelo Decreto 678/1992). Possibilidade, pois, de responsabilização nas ordens interna e externa. 10. Nos termos do art. 144 da Constituição Federal, as forças de segurança são vocacionadas à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas. Assim, o agente público incumbido da missão de garantir o respeito à ordem pública, como é o caso do policial, ao descumprir com suas obrigações legais e constitucionais de forma frontal, mais que atentar apenas contra um indivíduo, atinge toda a coletividade e a corporação a que pertence de forma imediata. 11. O legislador, ao prever, no art. 11 da Lei 8.429/1992, que constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de lealdade às instituições, findou por tornar de interesse público, e da própria Administração, a proteção da legitimidade social, da imagem e das atribuições dos entes/entidades estatais. Daí resulta que atividade que atente gravemente contra esses bens imateriais tem a potencialidade de ser considerada improbidade administrativa. 12. A tortura perpetrada por policiais contra presos mantidos sob a sua custódia tem ainda outro reflexo jurídico imediato, que é o de gerar obrigação indenizatória ao Estado, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Há aí, como consequência, interesse direto da Administração Pública. Uso ilegal de Bens e Prédios Públicos. 13. Na hipótese dos autos, o ato ímprobo se caracteriza quando se constata que as vítimas foram torturadas, em instalações públicas, ou melhor, na Delegacia de Polícia. O V. Acórdão recorrido afirma: ..."terem submetido alguns presos que se encontravam custodiados na delegacia local a "espancamentos, asfixia e graves ameaças, para confessaram a prática de crimes". (fls. 122-123, grifo acrescentado). Conclusão: violência policial arbitrária é ato que viola frontalmente os mais elementares princípios da Administração Pública 14. A violência policial arbitrária não é ato apenas contra o particular-vítima, mas sim contra a própria Administração Pública, ferindo suas bases de legitimidade e respeitabilidade. Tanto assim que essas condutas são tipificadas, entre outros estatutos, no art. 322, do Código Penal, que integra o Capítulo I ("Dos Crimes Praticados por Funcionário Público contra a Administração Pública, grifo acrescentado"), que por sua vez está inserido no Título XI ("Dos Crimes contra a Administração Pública"), e também nos artigos 3º e 4º da Lei 4.898/65, que trata do abuso de autoridade. 15. Em síntese, atentado à vida e à liberdade individual de particulares, praticado por agentes públicos armados - incluindo tortura, prisão ilegal e "justiciamento" -, afora repercussões nas esferas penal, civil e disciplinar, pode configurar improbidade administrativa, porque, além de atingir a pessoavítima, alcança simultaneamente interesses caros à Administração em geral, às instituições de segurança pública em especial, e ao próprio Estado Democrático de Direito. Nesse sentido: REsp 1081743/MG, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24.3.2015, acórdão ainda não publicado. 16. Recurso Especial conhecido e provido para determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que seja recebida a petição inicial da Ação de Improbidade Administrativa. (REsp 1177910/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 17/02/2016)
Breves Comentários: A tortura talvez seja uma das práticas mais perversas que o ser humano possa praticar contra um semelhante. O sistema internacional de proteção dos direitos humanos possui grande preocupação com essa prática, sobre o tema, existem a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, de 1984, e a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, 1985.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Já no plano interno, a Constituição Federal no artigo 5º, III, estabelece que “ ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. No inciso XLVII estabelece que não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis;”. No plano de legislação infraconstitucional, existe a Lei que tipifica o crime de tortura - 9.455/1997, no seu artigo 1º:
Art. 1º Constitui crime de tortura: I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. QUESTÃO-ESTUDO Tortura Paulo, agente público, foi condenado por causar graves aflições físicas e psicológicas a Luis Gustavo, sem causar sua morte. Pergunta-se a) O crime cometido por Paulo é hediondo? b) Quais os efeitos extrapenais obrigatórios que decorrem da sua condenação pela prática do crime de tortura? c) Paulo cometeu ato de improbidade administrativa? d) É possível a prática de tortura por omissão? e) Caso os atos de tortura sofridas por Luis Gustavo tenham ocorrido na ditadura militar, por ser preso político, terá 5 anos para propor eventual ação de danos morais em face do Estado?
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RESPOSTAS: a) O crime de tortura está previsto na Lei nº 9.455/97. No seu artigo 1º traz as tipificações legais do crime. O artigo 1º, I, diz que constitui crime de tortura: I constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa. Já o inciso II do Mesmo artigo, estabelece que constitui crime de tortura: II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. a) O crime praticado por Paulo é equiparado a hediondo, nos termos do artigo 5º, XLIII, da Constituição Federal. Ademais, cabe observar que o crime de tortura pode ser praticado por qualquer pessoa (crime comum), o sujeito ativo não precisa ser necessariamente agente do Estado. b) o artigo 1º, §5º, da Lei nº 9.455/97 impõe efeitos extrapenais obrigatórios, quais sejam, (i) perda do cargo, função ou emprego público e (ii) interdição, inabilitação, para exercício do cargo pelo dobro do prazo da pena aplicada. O STJ entende que o magistrado não precisa fundamentar a perda do cargo, função ou emprego público, bem como sua inabilitação, pois esses efeitos decorrem expressamente do texto legal, não é necessário Nesse sentido, cita-se o HC 47.846/MG, onde o Ministro Relator Og Fernandes assim se manifestou “estacou o Min. Relator que a jurisprudência consolidada neste Superior Tribunal é que, nos crimes de tortura, a perda do cargo é efeito automático e obrigatório da condenação. Assim, não haveria sequer a necessidade de fundamentar a medida.”. c) Sim, segundo a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, o agente público que pratica o crime de tortura incide em ato de improbidade administrativa. No REsp 1.177.910/SE, o STJ entendeu que policial que tortura preso em custódia atenta contra os princípios da administração. Salientou o Tribunal Cidadão que a tortura vai de encontro com os artigos 1º, III, e 4º, I, da Constituição Federal, bem como o artigo 144, pois “as forças de segurança são vocacionadas à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas. Assim, o agente público incumbido da missão de garantir o respeito à ordem pública, como é o caso do policial, ao descumprir com suas obrigações legais e constitucionais de forma frontal, mais que atentar apenas contra um indivíduo, atinge toda a coletividade e a corporação a que pertence de forma imediata.”. Quanto a legislação infraconstitucional, entendeu o STJ que tal crime fere o artigo 11 da Lei 8.429/92, lei que tratam dos casos de administrativa, pois a
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo tortura atenta contra os princípios da administração, pois viola as deveres de lealdade às instituições, findou por tornar de interesse público, e da própria Administração, a proteção da legitimidade social, da imagem e das atribuições dos entes/entidades estatais. Por fim, cabe destaca as palavras do Tribunal acerca dessa conduta odiosa, que fere todos princípios humanos: “A violência policial arbitrária não é ato apenas contra o particular-vítima, mas sim contra a própria Administração Pública, ferindo suas bases de legitimidade e respeitabilidade. Tanto assim que essas condutas são tipificadas, entre outros estatutos, no art. 322, do Código Penal, que integra o Capítulo I ("Dos Crimes Praticados por Funcionário Público contra a Administração Pública, grifo acrescentado"), que por sua vez está inserido no Título XI ("Dos Crimes contra a Administração Pública"), e também nos artigos 3o e 4o da Lei 4.898/65, que trata do abuso de autoridade. Em síntese, atentado à vida e à liberdade individual de particulares, praticado por agentes públicos armados – incluindo tortura, prisão ilegal e "justiciamento" –, afora repercussões nas esferas penal, civil e disciplinar, pode configurar improbidade administrativa, porque, além de atingir a pessoa-vítima, alcança simultaneamente interesses caros à Administração em geral, às instituições de segurança pública em especial, e ao próprio Estado Democrático de Direito.” d) Sim, o artigo 2º, §7º, dispõe expressamente que “Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos”. Trata-se de um importante avanço em relações aos Tratados Internacionais de Direitos Humanos acerca do tema, pois não preveem a possibilidade da prática do crime por omissão, “Convenção de 1984 é criticada por ter adotado uma definição estrita de tortura, dando a entender que a tortura não pode ser cometida por omissão e negligência.” (André de Carvalho Ramos, curso de direitos humanos, 5ª edição, São Paulo: Saraiva Educação, pág. 646). Aqui cabe outra observação importante, o §7º do artigo 1º, estabelece que o condenado por crime de tortura por omissão deve iniciar seu cumprimento de pena em regime fechado. Contudo, o STJ, no julgamento do HC 286.925-RR, entendeu que não é obrigatório que o condenado inicia o cumprimento de pena no regime fechado, utilizando como fundamento o HC 111.840/ES, julgado pelo plenário do STF que afastou a obrigatoriedade da fixação do regime inicial fechado aos crimes hediondos e equiparados. e) Não. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, por violar a dignidade humana, o dano moral em caso de tortura ocorrida na ditadura militar é imprescritível, não se aplicando o prazo prescricional de 5 anos de ações contra a fazenda pública. Da ementa do REsp. 1165986/SP, acima transcrita, vale citar o raciocínio realizado pelo Tribunal Cidadão
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo “4. À luz das cláusulas pétreas constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a proteção da dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República Federativa, posto seu fundamento. 5. Consectariamente, não há falar em prescrição da ação que visa implementar um dos pilares da República, máxime porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao direito de agir, correspondente ao direito inalienável à dignidade. 6. Outrossim, a Lei 9.140/95, que criou as ações correspondentes às violações à dignidade humana, perpetradas em período de supressão das liberdades públicas, previu a ação condenatória no art. 14, sem estipular-lhe prazo prescricional, por isso que a lex specialis convive com a lex generalis, sendo incabível qualquer aplicação analógica do Código Civil no afã de superar a reparação de atentados aos direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a dignidade retratada no respeito à integridade física do ser humano. 7. Ação ordinária proposta com objetivo de reconhecimento de danos materiais e morais, em face do Estado, pela prática de atos ilegítimos decorrentes de perseguições políticas perpetradas por ocasião do golpe militar de 1964, que culminaram na prisão do pai dos autores, bem como na sua tortura, cujas consequências alega irreparáveis.”. Crimes contra o Meio Ambiente
1) Leis relacionadas ao tema Artigo 225, §3º, CF e a Lei n. 9.605/98 2) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores Súmula 613/STJ - Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito Ambiental. 3) Informativos STF – É admissível a condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental, ainda que absolvidas as pessoas físicas ocupantes de cargo de presidência ou de direção do órgão responsável pela prática criminosa. TESE/STJ – É defeso ao IBAMA impor penalidade decorrente de ato tipificado como crime ou contravenção, cabendo ao Poder Judiciário referida medida. Breves comentários61 A tutela penal do meio ambiente tem núcleo na lei n. 9.605/98, que revogou quase todos o tipos penais ambientais previstos no Código Penal, bem como a legislação extravagante que tutelava o meio ambiente e, ainda, a maior parte das contravenções penais constantes no Código Florestal. 61 Realizado a partir de excertos de: AMADO, Frederico: Direito Ambiental, Coleção Sinopses para concursos “30”. 6ª Edição: JusPodivm – Salvador, 2018.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A considerar a proposta do presente material, serão abordados apenas pontos específicos e dirigidos, com maiores chances de serem cobrados no concurso de Analista Jurídico do Ministério Público. Sem prejuízo, pode e deve o candidato arvorar-se em outros temas se entender necessário. Essa lei regulamentou o artigo 225, §3º, da Constituição e foi pioneira em prever a responsabilidade penal para pessoas jurídicas, sendo seguida dos crimes conta a economia popular e contra a ordem financeira. Para que a pessoa jurídica seja responsabilizada requer-se a presença de dois pressupostos: a) que a decisão cometida por ordem de seu representante legal ou contratual e; b) seja cometida a infração no interesse ou em benefício da pessoa jurídica. Importante frisar que embora STF e STJ admitam a hipótese de responsabilidade criminal das pessoas jurídicas, há setores na doutrina que divergem, afirmando a máxima “pessoa jurídica não pode delinquir”. Frise-se que apesar de por muito tempo os tribunais terem mantido entendimento sobre a necessidade de dupla imputação (PJ + pessoas físicas representantes), atualmente prevalece o entendimento, tanto no STF quanto no STJ, no sentido de que é dispensável a dupla responsabilização, diz-se: sistema da dupla imputação não necessariamente concomitante. A lei ainda criou a figura do garantidor ambiental, semelhante ao que ocorre no Código Penal (art. 13, §2º, CP), ao prever que as pessoas naturais que mantenham vínculo com pessoas jurídicas (diretores, administradores, órgãos técnicos, membros de conselho, auditores, gerentes, prepostos ou mandatários), se sabiam que um crime ambiental material iria se consumar e nada fizeram, quando podiam agir para evitá-lo, responderão por crime comissivo por omissão. A competência para processamento dos crimes é sempre da justiça estadual, exceto quando consumado o crime contra bens, serviços e interesses da União; quando se tratar de conduta prevista em tratado internacional ratificado pelo Brasil e que tenha execução iniciada aqui, ou tendo sido iniciada no exterior aqui ocorra o resultado e; quando praticado a bordo de navio ou aeronave. Sempre que verificada uma infração penal ambiental a Autoridade Policial deverá proceder a apreensão de produtos e instrumentos do crime. A peculiaridade da Lei de Crimes Ambientais é que o perdimento dos instrumentos apreendidos não se limita àqueles cujo, fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito (efeito automático da sentença, cfe. Art. 91, CP), todos eles serão perdidos. Além disso, as sentenças condenatórias obrigatoriamente deverão fixar quantia mínima de indenização (reparação dos danos causados) à pessoa diretamente lesada ou à coletividade (art. 20).
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QUESTÃO-TREINO No âmbito dos crimes contra o meio ambiente, admite-se responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público?
a
Resposta: Parte da doutrina entende plenamente possível a responsabilização criminal da pessoa jurídica de direito público, haja vista que a lei e a Constituição não fizeram ressalvas nesse sentido. Contudo, tendo em conta que a Administração Pública deve sempre se pautar pela legalidade de seus atos e buscar finalidade pública, o mais correto seria responsabilizar apenas seus agentes, mesmo porque algumas sanções não seriam aplicáveis à Administração. Ademais, inexiste funcionalidade na aplicação de pena porque, por via transversa, se punirá a coletividade que se pretendeu resguardar.
QUESTÃO-TREINO No âmbito dos crimes contra o meio ambiente, tratando-se de tipo penal material, é necessária a conclusão do procedimento administrativo de apuração do dano ambiental para início da persecução penal?
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Resposta: Não. Mesmo nos casos de crimes ambientais materiais – em que é necessária a ocorrência do dano para que se possa caracterizar – não há dúvidas de que o Ministério Público não precisa aguardar a conclusão do processo administrativo instaurado para deflagrar a respectiva ação. As esferas administrativa e penal são independentes, razão pela qual o Parquet, dispondo de elementos mínimos para oferecer a denúncia, pode fazê-lo (STJ, HC 160.525, de 05.03.2013).
SUPERQUESTÃO-TREINO Crimes ambientais Kevin, funcionário da loja de animais “X”, recebeu Brian – seu superior imediato e representante legal da empresa – a incumbência de conseguir, “independentemente da maneira que fosse”, mais pássaros da espécie canário da terra para serem vendidos na loja em questão. Após receber a ordem, foi até uma pequena área verde existente na fronteira do município e conseguiu capturar dois pássaros da referida espécie; os colocou em gaiolas que havia levado dentro do carro da empresa. Ocorre que no caminho de volta foi abordado em fiscalização de rotina, autuado e levado até a delegacia, oportunidade em que foi lavrado termo circunstanciado por incursão no artigo 29, inciso III, da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais). Considerando os fatos narrados, responda: a)
Sobre quem recairá a responsabilidade penal pela prática do crime ambiental em comento? Justifique.
b)
Acerca da responsabilidade penal ambiental, qual teoria é adotada: objetiva, subjetiva ou do risco integral? Explique.
c)
No que consiste a “responsabilidade penal por ricochete”, também conhecida como “teoria da dupla imputação”?
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Respostas: a) A responsabilidade recairá sobre Kevin, sobre Brian, e ainda sobre a pessoa jurídica “X”. Kevin deverá ser responsabilizado por ter praticado os atos executórios do crime ambiental, uma vez que foi ele quem capturou e transportou os pássaros sem autorização legal. Brian, por sua vez, deverá ser igualmente responsabilizado por ter efetivamente mandado Kevin – seu subordinado – praticar o crime em benefício da pessoa jurídica onde ambos trabalham. A pessoa jurídica também sofrerá as penas da lei em virtude de a infração ter sido cometida por decisão de representante legal em benefício do estabelecimento. (Artigo 225, § 3º, da Constituição Federal. Artigos 2º e 3º da Lei de Crimes Ambientais) b) A responsabilidade penal ambiental é subjetiva, ou seja, a criminalização só é possível após a efetiva comprovação de dolo ou culpa. c) Segundo a teoria da dupla imputação, também conhecida como responsabilidade penal por ricochete, o gestor da pessoa jurídica também é responsabilizado uma vez que, em alguns casos, a pessoa jurídica não pode ter sua responsabilidade dissociada da pessoa física. A responsabilidade da pessoa jurídica ficará condicionada à prática de um fato típico pela pessoa física.62
Estatuto do Desarmamento
Porte de munição João, em atividade suspeita, foi abordado por policiais militares. Verificouse que trazia consigo quantidade ínfima de munição, sem, contudo, portar qualquer arma de fogo. Pergunta-se a)Qual a natureza jurídica do crime de possuir ou portar munição? b)Em razão da quantidade ínfima, é possível reconhecer a atipicidade material da conduta de João?
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FARIAS, Talden; SERÁPHICO DA NÓBREGA COUTINHO, Francisco; KERÊNIA M. M. MELO, Geórgia. Direito Ambiental: Coleção Sinopses. 3. ed. [S.l.]: Juspodivm, 2015. P. 318.
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RESPOSTA: O artigo 12 do Estatuto do Desarmamento traz a tipicidade formal do crime de posse irregular de arma de fogo de uso permitido, qualificando tanto a conduta de “possuir” e “manter” sob guarda sua guarda arma de fogo, acessório ou munição. a) O STJ entende que o crime de posse ou porte munição é de crime comum, de perigo abstrato e de mera conduta. É crime comum porque não exige do agente qualquer qualidade especial. É crime de perigo abstrato e de mera conduta porque é desnecessário perquirir qualquer lesividade concreta da posse ou porte da munição, tendo em vista que o bem tutelado pelo crime é a segurança púbica e a paz social, e não a incolumidade física das pessoas. Assim, basta a posse de munição, sem autorização devida, para tipificar o crime. b) Como no item anterior, o STJ entende que o crime de posse de munição é crime abstrato e de mera conduta, contudo, em determinados casos, tanto o Tribunal Cidadão quanto o STF reconhecem atipicidade material de possuir e portar drogas, aplicando o princípio da insignificância. A atipicidade da conduta de posse ou porte de munição ocorre em situações excepcionalíssimas, quando a quantidade de munição é ínfima aliada à ausência de artefato capaz de disparar o projétil, demonstrando que incapacidade de gerar perigo à incolumidade pública. Nesse sentindo, vale também citar a posição da segunda turma do STF, no julgamento do HC 133984 MG, que entendeu que é atípica a conduta de portar, na forma de pingente, munição desacompanhada de arma: EMENTA: HABEAS CORPUS. DELITO DO ART. 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003. PACIENTE PORTANDO MUNIÇÃO. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A análise dos documentos pelos quais se instrui pedido e dos demais argumentos articulados na inicial demonstra a presença dos requisitos essenciais à incidência do princípio da insignificância e a excepcionalidade do caso a justificar a flexibilização da jurisprudência deste Supremo Tribunal
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo segundo a qual o delito de porte de munição de uso restrito, tipificado no art. 16 da Lei n. 10.826/2003, é crime de mera conduta. 2. A conduta do Paciente não resultou em dano ou perigo concreto relevante para a sociedade, de modo a lesionar ou colocar em perigo bem jurídico na intensidade reclamada pelo princípio da ofensividade. Não se há subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do direito penal, que somente deve ser acionado quando os outros ramos do direito não forem suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos. 3. Ordem concedida. (HC 133984, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 17/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-112 DIVULG 01-06-2016 PUBLIC 02-06-2016 - destacamos)
QUESTÃO-ESTUDO Porte de arma 2- Sobre posse e porte de arma, pergunta-se: a) Qual a diferença entre posse e porte de arma de fogo de uso permitido e de uso restrito? b) É típica a conduta de posse legal de arma de fogo de uso permitido com registro vencido? c) É típica a posse e porte de arma desmuniciada? d) É necessária perícia comprovando a potencialidade lesiva da arma para condenação por porte ou posse de arma de fogo? e) EDUARDO foi preso por porte ilegal de arma de uso permito. Ele praticou crime hediondo? f) O crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido é afiançável? g) É aplicável o princípio da consunção entre os crimes de posse irregular de arma de fogo de uso permitido e de uso restrito? a) É importante fazer uma breve distinção entre arma de uso permito e uso proibido. O decreto 3.665/00, que tem por finalidade trazer normas para a correta fiscalização das atividades exercidas por pessoas físicas e jurídicas que envolvam produtos controlados pelo Exército. O art. 3º, desse dispositivo legal, traz as definições legais de arma de uso permitido e restrito, nos seguintes termos: XVII - arma de uso permitido: arma cuja utilização é permitida a pessoas físicas em geral, bem como a pessoas jurídicas, de acordo com a legislação normativa do Exército;
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo XVIII - arma de uso restrito: arma que só pode ser utilizada pelas Forças Armadas, por algumas instituições de segurança, e por pessoas físicas e jurídicas habilitadas, devidamente autorizadas pelo Exército, de acordo com legislação específica. Embora dificilmente cairá no concurso, caso vocês tenham curiosidade, o artigo 17 do Decreto traz quais armas são de uso permitido. b) O STJ possui jurisprudência reconhecendo a atipicidade da conduta de posse de arma de uso permitido com registro vencido. Cite-se, por exemplo, o HC 294.078/SP. HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. ART. 12 DA LEI N. 10.826/2003. POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO COM O REGISTRO VENCIDO. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. SUBSIDIARIEDADE DO DIREITO PENAL. PUNIÇÃO ADMINISTRATIVA QUE SE MOSTRA SUFICIENTE. 3. ORDEM NÃO CONHECIDA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando a racionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal, vinha se firmando, mais recentemente, no sentido de ser imperiosa a restrição do cabimento do remédio constitucional às hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal. Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal Federal passou a não mais admitir habeas corpus que tenha por objetivo substituir o recurso ordinariamente cabível para a espécie. Precedentes. Contudo, devem ser analisadas as questões suscitadas na inicial no intuito de verificar a existência de constrangimento ilegal evidente - a ser sanado mediante a concessão de habeas corpus de ofício -, evitando-se prejuízos à ampla defesa e ao devido processo legal. 2. O trancamento de ação penal na via estreita do writ configura medida de exceção, somente cabível nas hipóteses em que se demonstrar, à luz da evidência, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou outras situações comprováveis de plano, suficientes ao prematuro encerramento da persecução penal. Na espécie, o paciente foi denunciado pela suposta prática da conduta descrita no art. 12 da Lei n. 10.826/2003, por possuir irregularmente um revólver marca Taurus, calibre 38, número QK 591720, além de dezoito cartuchos de munição do mesmo calibre. 3. Todavia, no caso, a questão não pode extrapolar a esfera administrativa, uma vez que ausente a imprescindível tipicidade material, pois, constatado que o paciente detinha o devido registro da arma de fogo de uso permitido encontrada em sua residência - de forma que o Poder Público tinha completo conhecimento
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo da posse do artefato em questão, podendo rastreá-lo se necessário -, inexiste ofensividade na conduta. A mera inobservância da exigência de recadastramento periódico não pode conduzir à estigmatizadora e automática incriminação penal. Cabe ao Estado apreender a arma e aplicar a punição administrativa pertinente, não estando em consonância com o Direito Penal moderno deflagrar uma ação penal para a imposição de pena tão somente porque o indivíduo - devidamente autorizado a possuir a arma pelo Poder Público, diga-se de passagem - deixou de ir de tempos em tempos efetuar o recadastramento do artefato. Portanto, até mesmo por questões de política criminal, não há como submeter o paciente às agruras de uma condenação penal por uma conduta que não apresentou nenhuma lesividade relevante aos bens jurídicos tutelados pela Lei n.10.826/2003, não incrementou o risco e pode ser resolvida na via administrativa. 4. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido, de ofício, para extinguir a Ação Penal n. 0008206-42.2013.8.26.0068 movida em desfavor do paciente, ante a evidente falta de justa causa. (HC 294.078/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 04/09/2014 - destaquei)
Nesse acórdão o Ministro Relator MARCO AURÊLIO BELLIZZE afirmou que, diante do princípio da intervenção mínima do Direito Penal, que impõe a incidência dos rigores do direito penal apenas quando estritamente necessárias à proteção da sociedade e proteção de bens essenciais, essa conduta é atípica. Afirmou que a mera inobservância da exigência de recadastramento periódico não deve se submeter aos rigores e os malefícios do direito penal, cabendo ao Estado apreender a arma e aplicar sanção administrativa. Ou seja, a simples ausência de recadastramento da arma não caracteriza fato punível. c) Sim, o STF (ex. HC 95073/MS) e STJ (ex. AgRg no EAREsp 260.556) possuem posições sedimentadas que se trata de crime previsto no artigo 14 do Estatuto do Desarmamento, tendo em vista que se trata de crime de perigo abstrato.
Cite-se, como exemplo, o HC julgado pelo Pretório Excelso:
DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE. ARMA DESMUNICIADA. CRIME DE MERA CONDUTA. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. A tese apresentada no habeas corpus consiste
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo na alegada atipicidade da conduta de o paciente portar arma de fogo, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, quando se tratar de arma desmuniciada. 2. O tipo penal do art. 14, da Lei n° 10.826/03, ao prever as condutas de portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, contempla crime de mera conduta, sendo suficiente a ação de portar ilegalmente a arma de fogo, ainda que desmuniciada. 3. O fato de estar desmuniciado o revólver não o desqualifica como arma, tendo em vista que a ofensividade de uma arma de fogo não está apenas na sua capacidade de disparar projéteis, causando ferimentos graves ou morte, mas também, na grande maioria dos casos, no seu potencial de intimidação. 4. Vê-se, assim, que o objetivo do legislador foi antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população - como o porte de arma de fogo em desacordo com as balizas legais -, prevenindo a prática de crimes como homicídios, lesões corporais, roubos etc. E não se pode negar que uma arma de fogo, transportada pelo agente na cintura, ainda que desmuniciada, é propícia, por exemplo, à prática do crime de roubo, diante do seu poder de ameaça e de intimidação da vítima. 5. Habeas corpus denegado. (HC 95073, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 19/03/2013, DJe-066 DIVULG 10-04-2013 PUBLIC 11-04-2013 EMENT VOL02687-01 PP-00001 - destacamos)
d) Por se tratar de crime de perigo abstrato, não é necessária a realização de perícia para comprovar a potencialidade da arma, pois é necessário a simples porte de arma, conforme entendimento consolidada no STJ (AgRg no REsp 1294551/GO).
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARTIGO 14 DA LEI N. 10.826/2003. PERÍCIA DA ARMA. COMPROVAÇÃO DE SUA POTENCIALIDADE LESIVA. DESNECESSIDADE. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. 1. A Terceira Seção deste Sodalício consolidou o entendimento de que o crime previsto no art. 14 da Lei 10.826/03 é de perigo abstrato, cujo objeto jurídico imediato é a segurança coletiva. 2. É irrelevante, portanto, a realização de exame pericial para a comprovação da potencialidade lesiva do artefato, pois basta o simples porte de arma de fogo, ainda que desmuniciada (como no caso em apreço), em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para a incidência do tipo penal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1294551/GO, Rel. Ministro
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 07/08/2014, DJe 19/08/2014 destacamos)
Contudo, caso realizada e comprove que a arma é ineficaz, mostrando que não tem nenhuma potencialidade lesiva, impõe-se o reconhecimento da atipicidade da conduta, segundo STJ (Resp. 1.451.397/MG).
RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PROIBIDO. ART. 16, CAPUT, DA LEI Nº 10.826/2003. INEFICÁCIA DA ARMA DE FOGO ATESTADA POR LAUDO PERICIAL. MUNIÇÕES DEFLAGRADAS E PERCUTIDAS. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. 1. A Terceira Seção desta Corte pacificou entendimento no sentido de que o tipo penal de posse ou porte ilegal de arma de fogo cuida-se de delito de mera conduta ou de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de seu efetivo caráter ofensivo. 2. Na hipótese, contudo, em que demonstrada por laudo pericial a total ineficácia da arma de fogo (inapta a disparar) e das munições apreendidas (deflagradas e percutidas), deve ser reconhecida a atipicidade da conduta perpetrada, diante da ausência de afetação do bem jurídico incolumidade pública, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio. 3. Recurso especial improvido. (REsp 1451397/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 15/09/2015, DJe 01/10/2015 - destacamos) e) Não. O fato típico praticado por EDUARDO não é hediondo. Recentemente, a Lei 13.497/17 modificou a redação do parágrafo único do artigo 1º da Lei 8.072/90, inserindo no rol de crimes hediondo a posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, previsto no art. 16 do Estatuto do Desarmamento, in verbis: Parágrafo único. Consideram-se também hediondos o crime de genocídio previsto nos arts. 1o, 2o e 3o da Lei no 2.889, de 1o de outubro de 1956, e o de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, previsto no art. 16 da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, todos tentados ou consumados. (destacamos)
f) Pela letra fria do Estatuto do Desarmamento, o crime é inafiançável, conforme artigo 14, parágrafo único. Contudo, na ADI 3.112, o STF reconheceu a inconstitucionalidade, nos seguintes “A proibição de estabelecimento de fiança para os delitos de ‘porte ilegal de arma de fogo de uso permitido’ e de ‘disparo de arma de fogo’, mostra-se desarrazoada, porquanto são crimes de mera
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo conduta, que não se equiparam aos crimes que acarretam lesão ou ameaça de lesão à vida ou à propriedade”. g) Não. Segundo o STJ (REsp 1.624.295/GO), a prática dos crimes tipificados nos artigos 12 e 16, caput, do Estatuto do Desarmamento não podem ser considerados crime único, pois se tratam de tipos penais diferentes. Assim, devese aplicar o concurso material de crimes. Observação final: são recorrentes as questões da VUNESP indagando sobre a espécie de pena imposta aos crimes previstos no Estatuto do Desarmamento. Observo que apenas os crimes de posse irregular de arma (art. 12) e omissão de cautela (art. 13) possuem pena de detenção.
Lei de Drogas
QUESTÃO-TREINO Majorantes no tráfico Tício foi até Minas Gerais para comprar drogas e trazer a São Paulo para venda. A droga foi colocada em seu veículo e este antes de chegar a São Paulo foi parado por policiais que descobriram a droga no porta malas do veículo. Pergunta-se: Tício responderá pelo crime de tráfico de drogas, com a majorante do tráfico interestadual prevista no artigo 40, V, da Lei 11.343/06? Explique.
RESPOSTA: Sim. Conforme dispõe a Súmula 587-STJ: Para a incidência da majorante prevista no artigo 40, V, da Lei 11.343/06, é desnecessária a efetiva transposição de fronteiras entre estados da federação, sendo suficiente a demonstração inequívoca da intenção de realizar o tráfico interestadual (Aprovada em 13/09/2017, DJe 18/09/2017).
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QUESTÃO-TREINO Majorantes no tráfico Mévio traficava nas imediações de estabelecimento prisional, sendo preso em flagrante quando vendia determinada quantidade de droga a uma pessoa que apenas passava nas proximidades. Não sendo, portanto, nenhum dos detentos ou frequentadores do presídio, ainda sim deverá incidir a causa de aumento prevista no artigo 40, III, da Lei 11.343/06? Justifique.
RESPOSTA: Sim, incidirá o aumento, pois a aplicação da causa de aumento prevista no art. 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06 se justifica quando constatada a comercialização de drogas nas imediações de estabelecimentos prisionais, sendo irrelevante se o agente infrator visa ou não os frequentadores daquele local. (HC 138944, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 21/03/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-170 DIVULG 02-08-2017 PUBLIC 03-08-2017)
QUESTÃO-TREINO Confisco e tráfico de drogas É possível o confisco de bens apreendidos em decorrência do tráfico de drogas? Justifique. Se o bem apreendido na posse do traficante não era utilizado de forma habitual na traficância, é possível o confisco?
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RESPOSTA: Sim, é possível o confisco por tratar-se de previsão constitucional (art. 243, parágrafo único da CF). É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no artigo 243, parágrafo único, da Constituição Federal. (RE 638491, Relator (a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 17/05/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-186 DIVULG 22-08-2017 PUBLIC 23-08-2017)
QUESTÃO-TREINO Tráfico privilegiado Sobre o tráfico privilegiado, responda: a) O que é o tráfico privilegiado? b) Inquéritos policiais e ações penais em curso podem ser utilizadas para afastar o benefício do tráfico privilegiado? Justifique. c) O tráfico privilegiado é considerado crime equiparado a hediondo? d) É possível a aplicação do princípio da insignificância ao crime de tráfico de drogas? Justifique.
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RESPOSTA: a) é aquele em que se o agente for primário, de bons antecedentes, bem como não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa, terá redução na pena de um sexto a dois terços. (art. 33 § 4º, da Lei 11.343/06) b) Sim, é possível a utilização de inquéritos policiais e/ou ações penais em curso para formação da convicção de que o réu se dedica a atividades criminosas, de modo a afastar o benefício legal previsto no art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/2006. STJ. 3ª Seção. EREsp 1431091-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 14/12/2016 (Info 596) c) Não, conforme preconiza jurisprudência do STJ: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL, PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.072/90 AO TRÁFICO DE ENTORPECENTES PRIVILEGIADO: INVIABILIDADE. HEDIONDEZ NÃO CARACTERIZADA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O tráfico de entorpecentes privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.313/2006) não se harmoniza com a hediondez do tráfico de entorpecentes definido no caput e § 1º do art. 33 da Lei de Tóxicos. 2. O tratamento penal dirigido ao delito cometido sob o manto do privilégio apresenta contornos mais benignos, menos gravosos, notadamente porque são relevados o envolvimento ocasional do agente com o delito, a não reincidência, a ausência de maus antecedentes e a inexistência de vínculo com organização criminosa. 3. Há evidente constrangimento ilegal ao se estipular ao tráfico de entorpecentes privilegiado os rigores da Lei n. 8.072/90. 4. Ordem concedida. (HC 118533, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 23/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-199 DIVULG 16-092016 PUBLIC 19-09-2016). d) Não aplica-se o princípio da insignificância visto se tratar de crime de perigo abstrato ou presumido, sendo, portanto, irrelevante a quantidade de droga apreendida. (STJ. 5ª Turma. HC 318936/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 27/10/2015).
QUESTÃO-TREINO Associação para o tráfico João, maior de idade, convidou Guilherme (17 anos) para associarem-se a prática constante de tráfico de drogas no bairro onde moravam. Perguntase: a) É possível denunciar João pela associação para o tráfico e ainda pleitear a aplicação da causa de aumento pela participação de menor de idade (art. 40, VI, da Lei 11.343/06)? b) Caso João seja denunciado pelo crime de tráfico previsto no artigo 33, caput e pelo crime de associação para o tráfico, prevista no art. 35, caput, a causa de aumento por envolvimento do menor (art. 40, VI) poderá aplicar-se duas vezes?
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RESPOSTA: a) Sim. É possível, conforme entendimento do STJ (HC 250.455RJ, julgado em 17/12/2015 - Info 576). b) Sim, por tratar-se de delitos diversos e totalmente autônomos com motivação e finalidade distintas (STJ – HC250.455RJ, julgado em 17/12/2015 – Info 576)
Crimes referentes à Lei de Interceptação Telefônica
QUESTÃO-TREINO Interceptações telefônicas Determinado Réu estava sendo investigado pela prática de crime de tráfico de drogas, sendo autorizada a interceptação telefônica pelo Magistrado. Por meio dos diálogos obtidos, descobriu-se que o mesmo réu foi autor de um homicídio. Pergunta-se: A prova quanto à prática do crime de homicídio é considerada lícita? Justifique.
RESPOSTA: Sim, é o chamado “crime achado”. É possível desde que tenha três componentes essenciais: (a) TIPICIDADE (adequação de uma conduta fática a
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo um tipo penal); (b) PUNIBILIDADE (além de típica, a conduta precisa ser punível, ou seja, não existir quaisquer das causas extintivas da punibilidade); e (c) VIABILIDADE. (existência de fundados indícios de autoria) (HC 129678, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 13/06/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-182 DIVULG 17-08-2017 PUBLIC 18-08-2017).
Crimes de Trânsito
1) Leis relacionadas ao tema Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro) Ler artigos 291 a 312-A do CTB 2) Dispositivos mais citados em provas do CTB Art. 291. Aplica-se o CP e CPP para os crimes de trânsito § 1º. Aplica-se a transação penal, composição civil e depende de representação se for caso de lesão corporal (institutos da Lei 9.099/95) Exceções (não é cabível a transação, composição e a ação será pública incondicionada). Se o agente: 1. Estiver sob influência de álcool ou outra substância psicoativa; 2. Participando de racha; 3. Transitando na via com velocidade à máxima permitida em mais de 50km/h. Nesses casos, instaura-se inquérito policial e não termo circunstanciado de ocorrência. Atenção!!! Art. 298. Traz as agravantes específicas nos crimes do CTB As agravantes que mais caem são: II- o agente utilizar veículo sem ou com placas falsas ou adulteradas; III- sem permissão ou CNH; IV- ou com permissão ou CNH de categoria diferente. Muitas vezes colocam em prova que se o agente estiver sob influência de álcool ou de substância psicoativa é causa agravante, mas é uma pegadinha. DOS CRIMES EM ESPÉCIE NO CTB - Tecerei comentários sobre os 4 principais crimes e que mais caem nas provas. ART. 302 – HOMICÍDIO CULPOSO ART. 303 – LESÃO CORPORAL CULPOSA
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo ART. 306 – EMBRIAGUEZ AO VOLANTE ART. 308 – PARTICIPAR DE RACHA - ART. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor. Modalidade culposa – Caso se entenda que foi doloso responde pelo art. 121 do Código Penal. § 1º - Causas de aumento de pena – 1/3 à metade I - não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação; II - praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada; III - deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente; IV - no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros. Atenção!! §2º - homicídio culposo qualificado. Inserido pela Lei nº 13.546/17, em vigor a partir de 19.04.18, com punição mais severa para aqueles que cometem homicídio culposo na condução de veículo automotor, estando sob influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa. Pena de reclusão de 05 a 08 anos: Delegado de Polícia não pode fixar fiança pelo Delegado de Polícia (art. 322, CPP) Não há que se falar em absorção do crime do art. 306 (embriaguez ao volante) pelo do art. 302 (homicídio culposo na direção). ART. 303. Lesão corporal culposa Crime de menor potencial ofensivo Aplica-se os benefícios do art. 291, § 1º, CTB desde que não estejam preenchidas as hipóteses de exceção acima descritas §1º. Causas de aumento de pena 1/3 à metade. Mesmas do homicídio culposo. Não é de menor potencial ofensivo, já que a pena máxima será superior a 02 anos. Nesse caso, deve ser instaurado inquérito policial e a competência não será do Juizado Criminal como na hipótese do art. 303, caput, CTB. Mesmo assim, aplicam-se os benefícios do art. 291 desde que não estejam presentes as hipóteses de exceção
§ 2º - Lesão corporal culposa qualificada Também em vigor a partir de 19.04.18, com punição mais severa
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Reclusão de 02 a 05 anos, se o agente conduz o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa E do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima Soma das duas condições para configurar o crime Não permite a fixação de fiança pelo Delegado de Polícia (art. 322, CPP) e não existe mais concurso entre os crimes de lesão corporal e o de embriaguez ao volante. ART. 306 – EMBRIAGUEZ AO VOLANTE Desde 20.12.2012 não exige mais bafômetro ou teste de sangue para comprovar o crime Crime de médio potencial ofensivo – pena de detenção de 06 meses a 03 anos Cabível suspensão condicional do processo Concentração igual ou superior a 06 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 de álcool por litro de ar alveolar Admite todos os meios de provas legítimos e legais para sua verificação ART. 308 – RACHA Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de CORRIDA, DISPUTA ou COMPETIÇÃO AUTOMOBILÍSTICA ou ainda de EXIBIÇÃO OU DEMONSTRAÇÃO DE PERÍCIA EM MANOBRA DE VEÍCULO AUTOMOTOR Essa parte em negrito passou a ter vigência em 19.04.18 – Alteração recente Atenção!!! Necessidade de ser comprovado que o comportamento narrado pelo tipo penal, praticado pelo condutor do veículo automotor, gerou, efetivamente, uma situação de risco à incolumidade pública ou privada Não é mais crime de perigo abstrato pelo qual a simples prática do comportamento, independentemente de comprovação de perigo, já configurava o tipo. §§ 1º e 2º - Racha qualificado Se da prática do crime previsto no caput resultar lesão corporal de natureza grave, e as circunstâncias demonstrarem que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena privativa de liberdade é de reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, sem prejuízo das outras penas previstas neste artigo. § 2o Se da prática do crime previsto no caput resultar MORTE, e as circunstâncias demonstrarem que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena privativa de liberdade é de reclusão de 5 (cinco) a 10 (dez) anos, sem prejuízo das outras penas previstas neste artigo STF: "(...) a lei deixa claro que as figuras qualificadas são aplicáveis apenas se as circunstâncias demonstrarem que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo (parágrafos 1º e 2º). Logo, se o agente assumiu o risco de causar o resultado (lesão corporal grave ou morte), por eles responde na forma dos tipos penais autônomos do Código Penal”.
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QUESTÕES-TREINO No dia 23 de agosto de 2018, Mérvio conduzia, imprudentemente, seu veículo GM/Astra, pela via pública, com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, quando atropelou e provocou lesão corporal grave em Mathias. O condutor foi preso em flagrante e conduzido à Delegacia de Polícia. Diante dessa situação, responda as questões abaixo: A) O Delegado de Polícia poderá fixar a fiança ao condutor para que ele responda ao processo em liberdade?
NÃO. A partir da vigência da Lei nº 13.546/17 a partir de 19.04.18 que inseriu ao CTB a lesão corporal qualificada no artigo 303, § 2º, do mesmo Diploma Legal com previsão de pena de reclusão de 02 a 05 anos, se o agente conduz o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa E do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, umas das consequências foi a vedação para que o Delegado de Polícia fixasse a fiança diante desse crime. B) O condutor recusou-se a se submeter ao bafômetro e ao exame de sangue. Portanto, está comprovada a sua embriaguez ao volante?
SIM. Desde 20.12.2012 não exige mais bafômetro ou teste de sangue para comprovar a embriaguez ao volante. Isso porque o § 2º do artigo 306 é inequívoco no sentido de que a comprovação “poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova”.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo C) O Delegado de Polícia indiciou Mérvio pela prática, em concurso de crimes, de lesão corporal culposa (art. 303) e de embriaguez ao volante (art. 306). Está correta a capitulação jurídica? Justifique.
NÃO. O crime foi praticado no dia 23 de agosto de 2018, já com a vigência da Lei nº 13.546/17 que se deu em 19.04.18 e, portanto, não existe mais concurso entre os crimes de lesão corporal e o de embriaguez ao volante. Mérvio responderá pelo crime de lesão corporal culposa qualificada (art. 303, § 2º, do CTB), já que conduzia o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa E do crime resultou lesão corporal de natureza grave em Mathias.
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4. Direito Processual Penal Princípios que regem o processo penal. Aplicação e interpretação da lei processual. Inquérito policial, Investigação Criminal. Ação Penal. Jurisdição e Competência. Reparação do dano ex delicto. Ação civil e execução civil da sentença penal. Questões e processos incidentes. Prova. Sujeitos do processo. Prisão e medidas cautelares pessoais alternativas à prisão. Fatos e atos processuais. Citação, notificação e intimação. Sentença. Coisa Julgada. Nulidades. Recursos e outros meios de impugnação. Teoria Geral dos Recursos. Apelação. Recurso em sentido estrito. Embargos. Carta testemunhável. Correição parcial. Habeas corpus. Mandado de segurança em matéria criminal. Interdição de direitos. Medida de segurança. Procedimento comum. Procedimento nos processos de competência do Tribunal do Júri. Procedimentos especiais. Procedimento nos crimes falimentares. Procedimento nos crimes de responsabilidade de funcionários públicos. Procedimento nos crimes contra a honra. Procedimento nos crimes contra a propriedade imaterial. Lei dos Juizados especiais criminais. Execução Penal. Objeto e aplicação da Lei de Execução Penal. O condenado e o internado. Classificação. Assistência. Trabalho. Direitos e deveres do preso. Disciplina. Faltas e sanções disciplinares. Regime disciplinar diferenciado. Procedimento disciplinar. Órgãos da execução penal. Estabelecimentos penais. Execução das penas privativas de liberdade. Regimes. Autorizações de saída. Remição. Livramento condicional. Sursis. Execução das penas restritivas de direitos. Suspensão condicional da pena. Execução das penas de multa. Execução das medidas de segurança. Incidentes de execução. Conversões. Excesso ou desvio de execução. Anistia. Indulto. Procedimentos judiciais. Recursos. Prisão temporária.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Crimes hediondos. Repressão aos crimes praticados por organizações criminosas e Lavagem de Capitais. Crimes de trânsito. Crimes contra o meio ambiente. Proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas e a réus colaboradores. Identificação criminal. Crimes referentes à falência e a recuperação judicial ou extrajudicial. Violência doméstica e familiar contra a mulher. Crimes de drogas. Interceptação (ou escuta) telefônica. Abuso de Autoridade.
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Princípios do Processo Penal e Inquérito Policial QUESTÕES-ESTUDO 1. Quais são as características do IP? 1) Procedimento ESCRITO: art. 9º do CPP. O IP pode ser gravado? Art. 405, § 1º, “Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações”. 2) Procedimento DISPENSÁVEL: art. 39, § 5º “O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de quinze dias”. 3) Procedimento SIGILOSO: art. 20. E o Princípio da Publicidade (art. 93, IX, CF “todos os atos PROCESSUAIS serão públicos”)? Como já foi dito, IP não é processo. É procedimento, por isso que não há falar em absoluta aplicação do princípio da publicidade às investigações. A publicidade prejudica o trabalho investigatório, colocando em risco a coleta das fontes de prova. Em regra, o sigilo deve valer para o inquérito policial. Exceção: em algumas hipóteses, a publicidade pode ser útil para as investigações. Ex.: retrato falado. 4) Procedimento Inquisitorial 5) Procedimento Discricionário -discricionariedade significa liberdade de atuação dentro dos limites legais. O delegado tem discricionariedade para ouvir testemunhas, para deixar o interrogatório no começo ou no final, etc. Isso não significa arbitrariedade, que é agir ao arrepio da lei. As pessoas podem pedir diligências? Sim. Art. 14 do CPP. Serão realizadas ou não a juízo da autoridade. As diligências podem ser requisitadas pelo investigado? Não. A alínea "b" do inciso XXI do art. 7º do EOAB foi vetada. Discricionariedade do delegado não afasta eventuais requisições ministeriais. Esse poder do MP deriva da própria CF, art. 129, inciso VIII. O delegado é obrigado a atendê-las, desde que sejam pertinentes (não há hierarquia entre MP e Polícia. O delegado as atende por conta do Princípio da Obrigatoriedade =
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo crime de ação penal pública = o aparato estatal é obrigado a agir). Ele não é obrigado quando forem ilegais. O art. 2º, § 3º, da Lei 12830/13, que dizia que o delegado conduziria a investigação de acordo com o seu livre convencimento técnico jurídico, com isenção e imparcialidade, foi VETADO. A redação dava a impressão de que o delegado não seria obrigado a atender as requisições ministeriais e de que apenas a polícia poderia investigar. 6) Procedimento Indisponível: o inquérito não pode ser arquivado pelo próprio delegado de polícia. Só pode ser arquivado por meio de promoção do MP e posterior homologação pela autoridade judiciária. Art. 17 do CPP. 7) Procedimento temporário: não pode durar para sempre. Quando se trata de investigado preso, o prazo para conclusão do inquérito é de 10 dias. Improrrogável.Quando se trata de investigado solto, o prazo para conclusão é de 30 dias. Prorrogável de maneira sucessiva. A jurisprudência moderna vem dizendo que ao inquérito também se aplica a Garantia da Razoável Duração do Processo (STJ, HC 96666/MA). “HABEAS CORPUS PREVENTIVO . TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ESTELIONATO CONTRA ENTE PÚBLICO E FALSIDADE IDEOLÓGICA. ALEGAÇÃO DE QUE OS FATOS INVESTIGADOS JÁ FORAM OBJETO DE OUTRO INQUÉRITO POLICIAL, ARQUIVADO A PEDIDO DO MPF. FRAUDE NA OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTOS CONCEDIDOS PELO FINAM E PELA SUDAM E DESVIO DE RECURSOS. NÃO APURAÇÃO DE QUALQUER FATO QUE PUDESSE AMPARAR EVENTUAL AÇÃO PENAL, TANTO QUE NÃO OFERECIDA A DENÚNCIA. EXCESSO DE PRAZO. INVESTIGAÇÃO QUE DURA MAIS DE 7 ANOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EXISTENTE. ORDEM CONCEDIDA (...) 5. No caso, passados mais de 7 anos desde a instauração do Inquérito pela Polícia Federal do Maranhão, não houve o oferecimento de denúncia contra os pacientes. É certo que existe jurisprudência, inclusive desta Corte, que afirma inexistir constrangimento ilegal pela simples instauração de Inquérito Policial, mormente quando o investigado está solto, diante da ausência de constrição em sua liberdade de locomoção (HC 44.649/SP, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJU 08.10.07); entretanto, não se pode admitir que alguém seja objeto de investigação eterna, porque essa situação, por si só, enseja evidente constrangimento, abalo moral e, muitas vezes, econômico e financeiro, principalmente quando se trata de grandes empresas e empresários e os fatos já foram objeto de Inquérito Policial arquivado a pedido do Parquet Federal. 6. Ordem concedida, para determinar o trancamento do Inquérito Policial 2001.37.00.005023-0 (IPL 521/2001), em que pese o parecer ministerial em sentido contrário.”
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 2. Quem tem acesso ao procedimento investigatório? Juiz, MP. E o advogado? A CF assegura a todos nós a assistência de advogado (art. 5º, LXIII, CF = fala em preso, mas deve-se ler “imputado”, preso ou solto = máxima eficácia). Além disso, o EOAB prevê no inciso XIV do art. 7º: “XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital”. Ademais, a Súmula Vinculante nº 14 do STF dispõe que “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.
Competência no Processo Penal QUESTÕES-TREINO Diferencie competência de natureza absoluta e natureza relativa, no âmbito do processo penal.
O critério de competência de natureza absoluta é aquele fixado em favor do interesse público, com fixação constitucional. Seu descumprimento é gerador de nulidade absoluta. Tal vício não preclui, podendo ser reconhecido a qualquer tempo, inclusive de ofício pelo magistrado, no decorrer do processo. São competências de natureza absoluta: em razão da matéria (“ratione materiae”); por prerrogativa de função (“ratione personae”); e funcional. Já no critério fixador da competência de natureza relativa, prevalece o interesse das partes, sendo prevista em âmbito infraconstitucional. Seu descumprimento é gerador de nulidade relativa (anulabilidade). Apenas o critério de competência territorial será de natureza relativa, adotando-se, como regra geral para fixação da competência, a teoria do resultado (local do resultado). A competência territorial poderá ser fixada, ainda, por prevenção, ou adotando-se a teoria da ubiquidade, tal como ocorre nos crimes à distância. Há, ainda, a possibilidade de ser fixada
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo a competência territorial no juízo da ação ou omissão (teoria da atividade), de modo a facilitar a produção da prova e para potencializar o efeito intimidatório da pena, mormente em situações envolvendo o delito de homicídio. “Tício” praticou estelionato em face de “Mévio”, sacando valores da conta da vítima em agência bancária situada em Campinas. A agência da vítima está situada em Jundiaí, local em que reside e em que foi alvo da ação criminosa. Qual é o foro competente para julgar a ação penal?
O foro competente para julgar a aludida ação penal, conforme entendimento recente adotado pelo Colendo STJ, será o de Jundiaí, local em que a vítima mantém a agência bancária, na medida em que o delito de estelionato consumase no local em que ocorre o efetivo prejuízo ao ofendido. Dessa forma, superouse o anterior entendimento da mesma Corte, de que era competente o foro onde localizada a agência bancária por meio da qual o autor recebia o proveito do crime (e não o juízo do foro em que situada a agência na qual a vítima possui conta bancária). Obs. Nesse sentido: STJ. 3ª Seção. CC 147811/CE, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 14/09/2016. STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 146524/SC, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 22/03/2017. Jurisprudência em Teses - O delito de estelionato é consumado no local em que se verifica o prejuízo à vítima (AgRg no CC 146524/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, Julgado em 22/03/2017, DJE 30/03/2017). Baseando-se no mesmo caso, se Tício tivesse emitido, dolosamente, cheque sem provisão de fundos em face de Mévio, qual seria o foro competente para o julgamento da correspondente ação penal?
Já nesta situação, o foro competente para o processo e julgamento será o local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado, nos termos da Súmula nº 521
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo do STF e nº 244 do STJ. Obs. Jurisprudência em Teses - Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos (Súmula n. 244/STJ) (CC 116295/PR, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Seção, Julgado em 12/06/2013, DJE 25/06/2013). Marlon, prefeito do Município “X”, agindo em concurso com “Cláudia”, cometeu homicídio doloso tentado em face de “Marcos”. Pergunta-se: serão o Prefeito e Cláudia julgados no mesmo Juízo? Fundamente sua resposta.
Não. Marlon, prefeito do Município “X”, tratando-se de crime de competência da Justiça Estadual, será julgado pelo Tribunal de Justiça do respectivo Estado (Súmula nº 702 do STF); tratando-se de competência da Justiça Federal, será julgado perante o respectivo Tribunal de 2º grau. De outro lado, Cláudia será julgada perante o Tribunal do Júri. Nos termos da Súmula nº 45 do STF, a competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função, quando estabelecido, exclusivamente, pela Constituição Estadual. Não obstante, os Prefeitos possuem foro por prerrogativa de função estabelecido na própria Constituição Federal (artigo 29, inciso X da CF), motivo pelo qual a eles não se aplica o referido verbete sumular nº 45 do STF. Desta forma, os processos contra Marlon e Cláudia deverão ser separados, na medida em que ambas as competências são previstas na própria Constituição Federal, e uma norma infraconstitucional (previsão da continência) não poderá sobre ela prevalecer. Com relação ao foro por prerrogativa de função, trata-se de competência absoluta ou relativa? Em quais hipóteses os parlamentares federais serão julgados pelo STF? Fundamente sua resposta, considerando-se o recente entendimento adotado pelo STF.
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O foro por prerrogativa de função é hipótese de competência absoluta. Recentemente, o STF entendeu que as normas da Constituição de 1988 que estabelecem as hipóteses de foro por prerrogativa de função devem ser interpretadas restritivamente, aplicando-se apenas aos crimes que tenham sido praticados durante o exercício do cargo e em razão dele. Dessa forma, por exemplo, se o crime foi praticado antes de o indivíduo ser diplomado como Deputado Federal ou Senador, não se justifica a competência do STF, devendo ele ser julgado pela 1ª instância mesmo ocupando o cargo de parlamentar federal. Além disso, mesmo que o crime tenha sido cometido após a investidura no mandato, se o delito não apresentar relação direta com as funções exercidas, também não haverá foro especial. Portanto, o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. Importante salientar, por fim, que o STF delimitou um marco para a fixação da competência, qual seja, o término da instrução. Com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.
Ação Civil e Ação Penal. Reparação Civil Ex Delicto SUPERQUESTÃO-ESTUDO Os delitos sexuais estão em destaque em razão da repercussão nacional de casos recentes. À luz da nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018, bem como pela alteração anterior conferida pela Lei 12.015/2009 e, ainda pela redação originária do art. 225 do Código Penal, consoante a jurisprudência dos Tribunais Superiores a respeito da ação penal nos crimes sexuais, responda qual é a natureza jurídica da ação penal nas hipóteses listadas abaixo. Responda
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo com base nas Leis de 2018 e de 2009 e, na questão “e”, na redação originária do art. 225, CP. a) João constrange Bruna, menor de 18 anos, mediante grave ameaça, a ter com ele conjunção carnal. b) Bruna constrange João e Lucas, mediante violência real, a praticarem ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Da conduta resulta lesão corporal grave em João e morte de Lucas. c) João pratica conjunção carnal com Lucas, pessoa menor de 14 anos de idade. d) João constrange Bruna, mediante grave ameaça, a ter com ele conjunção carnal. e) Antes da vigência da Lei nº 12.015/2009, Carlos constrange Bianca, mediante grave ameaça, a ter com ele conjunção carnal. f) Bruna constrange Carolina, mediante violência real, a permitir que com ela se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Laudo pericial concluiu que da violência resultou lesões corporais. g) João constrange Bruna, mediante violência real, a permitir que com ela se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Laudo pericial concluiu que da violência não resultou nem lesões corporais, nem marcas na vítima.
RESPOSTAS A Lei 13.718/2018 alterou o art. 225, CP para determinar que doravante os crimes sexuais sejam processados por meio de ação penal pública incondicionada. Anteriormente, conforme a redação do referido dispositivo dada pela Lei 12.015/2009 e em harmonia à jurisprudência dos Tribunais Superiores, diversas eram as possibilidades da ação penal nos crimes sexuais. Veja a seguir o tratamento jurídico conferido pela Lei 12.015/2009, revogada em relação ao art. 225, CP e a antiga redação deste dispositivo: a) Trata-se de ação penal pública incondicionada (art. 225, parágrafo único, primeira figura, do Código Penal. b) Em relação ao estupro qualificado pela lesão corporal grave ou morte, pela letra fria da lei, a ação é púbica condicionada à representação. Contudo, a Procuradoria-Geral da República ajuizou a ADI 4.301 requerendo que o art. 225, caput, do Código Penal seja declarado parcialmente inconstitucional, sem redução de texto, apenas “para excluir do seu âmbito de incidência os crimes de estupro qualificado por lesão
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo corporal grave ou morte, de modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da ação penal pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código de Processo Penal)”. Os precedentes acima citados reforçam a probabilidade de procedência da ADI 4.301, ainda pendente de julgamento. c) Trata-se de ação penal pública incondicionada (art. 225, parágrafo único, última figura, do Código Penal. d) Trata-se de ação penal pública condicionada à representação (art. 225, caput, do Código Penal. e) Antes da vigência da Lei nº 12.015/2009, tratava-se de ação penal privada, somente iniciada com o oferecimento de queixa-crime (art. 225, caput, CP, em sua redação original: “Nos crimes definidos nos capítulos anteriores, somente se procede mediante queixa”). f) Trata-se de ação penal pública incondicionada (art. 225, caput, do Código Penal. g) Trata-se de ação penal pública incondicionada (Súmula 608/STF). O Supremo Tribunal Federal possui uma súmula antiga sobre o tema, editada em 1984: “Súmula 608/STF: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada”. Quando da edição da Lei nº 12.015/2009 a doutrina formou entendimento majoritário no sentido de que esta súmula estaria superada. Contudo, decidiu a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal que “a Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada” (STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 27/2/2018. Vide Info. 892). Outrossim, entende a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal que a caracterização de violência real prescinde da ocorrência de lesões corporais ou de marcas na vítima. Havendo violência, qualquer que seja o caso, a ação será pública incondicionada (STF. 2ª Turma. HC 102683, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 14/12/2010).
QUESTÃO-TREINO O Juízo Criminal da Comarca “Y”, ao apreciar ação civil ex delicto proposta pelo Ministério Público em favor de Maria, menor em situação de vulnerabilidade (moradora de rua) que foi vítima de crime de estupro, acolheu tese defensiva no sentido de que o Ministério Público não seria
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo parte legítima para propor a ação, considerando a existência de Defensoria Pública instalada no Município, e extinguiu o processo sem resolução do mérito. a) O Ministério Público tem legitimidade ativa para a propositura de ação civil ex delicto neste caso? b) Agiu acertadamente o Juiz ao extinguir o mérito da ação sem resolução do mérito?
R: a) Não. Embora haja texto expresso de lei no sentido de ser o Ministério Público legitimado a promover a ação civil de reparação de dano quando a vítima for pobre63, o STF entendeu que a partir da Constituição Federal de 1988, cabe à Defensoria Pública a defesa, em todos os graus, dos necessitados64. No entanto, em razão da ausência de instalação dessa Instituição em todas as Comarcas, estabeleceu-se que nos Estados nos quais a Defensoria esteja devidamente organizada, será ela a legitimada à propositura da ação. Já nos locais em que não haja Defensoria, o Ministério Público poderá ingressar com 63
Art. 68 do CPP. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, §§ 1o e 2o), a execução da sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público. 64 LEGITIMIDADE - AÇÃO "EX DELICTO" - MINISTÉRIO PÚBLICO - DEFENSORIA PÚBLICA ARTIGO 68 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CARTA DA REPÚBLICA DE 1988. A teor do disposto no artigo 134 da Constituição Federal, cabe à Defensoria Pública, instituição essencial à função jurisdicional do Estado, a orientação e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5o, LXXIV, da Carta, estando restrita a atuação do Ministério Público, no campo dos interesses sociais e individuais, àqueles indisponíveis (parte final do artigo 127 da Constituição Federal). INCONSTITUCIONALIDADE PROGRESSIVA - VIABILIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE DIREITO ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE - ASSISTÊNCIA JURÍDICA E JUDICIÁRIA DOS NECESSITADOS – SUBSISTÊNCIA TEMPORÁRIA DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao Estado, no que assegurado constitucionalmente certo direito, cumpre viabilizar o respectivo exercício. Enquanto não criada por lei, organizada e, portanto, preenchidos os cargos próprios, na unidade da Federação - a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de Processo Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele prevista. (...) STF. Plenário. RE 135328, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 29/06/1994 (Fonte: Informativo Esquematizado nº 592-STJ – Dizer o Direito).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo as ações de ressarcimento. No caso dos autos, diante da informação de existência da Defensoria no Município, não há que se falar em legitimidade do Ministério Público para a propositura da ação. b) Não. No caso em concreto, como dito, o Ministério Público não detém legitimidade para a propositura da ação civil ex delito em razão da existência de Defensoria Pública instalada na Comarca. Contudo, essa situação não acarreta a imediata extinção do processo sem julgamento de mérito. O STJ firmou entendimento no sentido de que, nesses casos, é necessária a intimação da Defensoria para que, cientificada do feito, informe eventual interesse na continuidade da demanda. O reconhecimento da ilegitimidade ativa do Ministério Público sem o cumprimento desta etapa, configura ofensa ao artigo 68 do Código de Processo Penal 65.
QUESTÃO-TREINO Luiz, Promotor de Justiça na Comarca de Assis, atuou no inquérito policial que apurava suposta prática de crime de receptação no ano de 2013, requerendo diligências variadas no curso da investigação. No ano de 2014 a Autoridade Policial concluiu a apuração e relatou o inquérito, remetendoo ao Ministério Público para apreciação. Luiz, entendendo existir prova da materialidade do crime e indícios suficientes de autoria, ofereceu denúncia contra a pessoa de Antônio, imputando a ele o crime previsto no artigo 180, caput, do Código Penal. a) Poderia o membro do Ministério Público que requerer diligências na fase investigatória ofertar a denúncia? b) Verificando-se alguma das hipóteses legais de suspeição de membro do Ministério Público, qual o procedimento a ser adotado? É cabível recurso da decisão que declara a suspeição do órgão do MP?
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O reconhecimento da ilegitimidade ativa do Ministério Público para, na qualidade de substituto processual de menores carentes, propor ação civil pública ex delicto, sem a anterior intimação da Defensoria Pública para tomar ciência da ação e, sendo o caso, assumir o polo ativo da demanda, configura violação ao art. 68 do CPP. STJ. 4a Turma. REsp 888.081-MG, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 15/9/2016 (Info 592) (Fonte: Dizer o Direito).
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R: a) Sim. A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia. Trata-se do enunciado da Súmula 234 do STJ. b) Aplicam-se aos membros do Ministério Público as mesmas prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes (Art. 258 do CPP). As hipóteses de suspeição encontram-se previstas no artigo 254 do CPP e, verificada alguma delas, o membro do Ministério Público deve afastar-se espontaneamente do processo, declinando o motivo nos autos. Não havendo o afastamento voluntário, a parte poderá arguir a suspeição perante o juiz junto ao qual o Promotor de Justiça atue. Nesse caso, o juiz deverá ouvir o Promotor, colher provas e decidir no prazo de três dias. Não cabe recurso contra a decisão de primeiro grau que julga suspeição do órgão do Ministério Público (cf. Art. 104 do CPP).
QUESTÃO-TREINO No curso de ação penal que apura prática de crime de homicídio triplamente qualificado, o Ministério Público suspeitou da integridade mental do acusado Pedro. Diante disso, requereu a instauração de incidente de insanidade mental, nos termos do artigo 149 do CPP. O pedido foi deferido pelo magistrado. Entretanto, o acusado, através de seu advogado, impetrou habeas corpus, insurgindo-se contra a realização do exame médico-pericial. a) Poderá o réu ser submetido ao exame, mesmo contra sua vontade? b) Caso o acusado concordasse com a realização do exame e fosse constatado que ele era, ao tempo da infração, irresponsável, nos termos do artigo 26 do CP, qual a medida a ser adotada pelo membro do Ministério Público no processo?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo R: a) Não. Segundo entendimento firmado pelo STF, o incidente de insanidade mental é prova pericial constituída em favor da defesa. Assim, não é possível determina-lo compulsoriamente na hipótese em que a defesa se oponha à sua realização66. Aplica-se, neste caso, o princípio da “não-autoincriminação”, garantia constitucional que permite que o réu não se submeta a prova pericial que entenda, por qualquer razão, lhe ser desfavorável. b) Constatando-se que, por motivo de doença ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, o réu era, ao tempo da ação, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento, o processo seguirá com a presença de curador a ser nomeado pelo juízo (Art. 151 do CPP). E ao final da instrução criminal, deverá o Ministério Público, em sede de alegações finais, opinar pela absolvição do acusado nos termos do Artigo 386, VI, do CPP, pleiteando a imposição de medida de segurança ao réu, a fim de que seja submetido a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico (Art. 97 do CP).
Provas
1) Legislação relacionada ao tema Artigos 155 a 157, do Código de Processo Penal 2) Súmulas Superior Tribunal de Justiça: Enunciado nº 74. Menoridade. Reconhecimento. Prova. Necessidade de documento hábil. CP, art. 115. «Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil.» Enunciado nº 74. A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo. Rel. Min. Felix Fischer, em 25/8/2010.
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STF. 2ª Turma. HC 133.078/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 6/9/2016 (Info 838) (Fonte Dizer o Direito).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Supremo Tribunal Federal: VINCULANTE 14: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. Enunciado nº 74: No processo penal, é nulo o exame realizado por um só perito, considerando-se impedido o que tiver funcionado, anteriormente, na diligência de apreensão.
QUESTÃO-TREINO De acordo com a previsão do artigo 155, do Código de Processo Penal, o juiz poderá formar sua convicção com base em provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, mesmo que produzidas durante a investigação. a) Nesse sentido, conceitue provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. b) O "depoimento sem dano" ou "depoimento especial", conforme dispõe a Lei n. 13.431/2017, é ato produzido segundo qual tipo de prova, dentre as referidas acima?
Respostas: a) As provas cautelares são aquelas produzidas devido ao risco de desaparecimento do objeto da prova por conta do tempo. No caso, o contraditório é diferido, sendo que tais provas podem ser coletadas tanto durante a fase de investigação quanto em juízo, como o exemplo da interceptação telefônica. As provas não repetíveis são aquelas que, acaso realizadas, não poderão ser novamente produzidas em virtude de desaparecimento, como no caso dos exames de leões corporais logo após a prática do crime. Tais provas podem ser coletadas durante a persecução penal investigativa ou em juízo e, em regra,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo independem de autorização judicial. Quanto às provas antecipadas, sabe-se que elas são produzidas em contraditório real, mas em momento processual diverso em relação ao previsto na lei diante da urgência. Nesse caso, também é indispensável a autorização judicial. b) O "depoimento especial" passou a ser regulamento pela referida lei, que traz o procedimento para a oitiva de criança ou adolescentes vítima ou testemunha de violência. Assim, colhe-se o depoimento perante a Autoridade Policial ou Judiciária, conforme a produção de prova antecipada.
BREVES COMENTÁRIOS:
1. Contraditório diferido é aquele realizado após a produção da prova, vsito que o conhecimento por parte do investigado/acusado da produção da cautelar gera risco de perdimento do objeto. É o contraditório das medidas cautelares inaudita altera parte. 2. Sobre as provas não repetíveis, é importante pontuar o que dispõe o artigo 6, inciso VII, do Código de Processo Penal, vez que a Autoridade Policial pode determinar a colheita do elemento de informação/prova (durante a investigação policial, tecnicamente fala-se em colheita de elemento de informação e não de prova). 3. Os exemplos clássicos de provas antecipadas são o depoimento ad perpetuam rei memoriam, cujo procedimento é previsto no artigo 225, do Código de Processo Civil, bem como a prova antecipada produzida quando há suspensão do processo e do prazo prescricional. Como prevê o artigo 366, do citado diploma, quando o acusado é citado por edital e não comparece ou constituiu advogado, ocorrerá a suspensão do feito e da prescrição, de modo que o juízo poderá determinar a produção de provas urgentes. 4. O artigo 11, da Lei n Lei n. 13.431/2017 prescreve: Art. 11. O depoimento especial reger-se-á por protocolos e, sempre que possível, será realizado uma única vez, em sede de produção antecipada de prova judicial, garantida a ampla defesa do investigado. § 1o O depoimento especial seguirá o rito cautelar de antecipação de prova: I - quando a criança ou o adolescente tiver menos de 7 (sete) anos; II - em caso de violência sexual.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO De acordo com o Código de Processo Civil, independem de prova os fatos afirmados pela parte e confessados pela parte contrária ou aqueles fatos admitidos como incontroversos. Do mesmo modo, se acaso o réu não contestar ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmado pelo autor da ação. Ocorre o mesmo no âmbito do Processo Penal?
Resposta: Os efeitos da confissão e da revelia no Processo Penal são diversos em relação ao Processo Civil, uma vez que vigora a presunção da inocência. Ainda que o réu confesse a prática da infração penal, mantém-se o ônus da prova à acusação, ao passo que o juiz deve confrontar a confissão com as demais provas coletadas nos autos. De igual modo, ainda que o acusado seja revel, não existe a confissão ficta, que gera o efeito de presunção da veracidade dos fatos alegados na inicial, sendo mantido o ônus probatório do órgão acusador.
QUESTÃO-TREINO Segundo o art.156, do CPP, "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer...". A partir do que dispõe a norma, seria possível falar em distribuição e inversão do ônus da prova no Processo Penal? Justifique.
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Resposta: Acerca da distribuição dos ônus da prova, há duas correntes: a primeira informa que haverá distribuição do ônus da prova entre a acusação e a defesa; já a segunda corrente afirma que o ônus da prova é exclusivo da acusação. A primeira é majoritária. Dessa forma, segundo entendimento predominante, incumbiria à acusação provar a existência do fato típico, a autoria ou participação, o nexo causal e o dolo ou culpa. À defesa, assim, incumbiria o ônus de provas as excludentes da ilicitude, culpabilidade e da punibilidade, de igual modo se apontar um álibi. No que reporta à inversão do ônus da prova, tem-se que não é possível no Processo Penal, sob pena de violar o in dubio pro reo. Nesse caso, seria admitir o in dubio pro societate, que não é aceito em vista da presunção de inocência, instituto de hierarquia constitucional.
BREVES COMENTÁRIOS 1.É preciso destacar que, acaso comprovado o fato típico, presume-se que ele também é ilícito e culpável. Quanto ao elemento subjetivo dolo, há muitos doutrinadores que entendem que é também presumido e que o ônus da acusação seria apenas de comprovar a conduta culposa (negligência, imprudência e imperícia). Quanto ao ônus da prova, ao Ministério Público cabe produzir um juízo de certeza para a condenação (regra de julgamento do in dubio pro reo) , ao passo que à defesa é suficiente gerar uma dúvida fundada para a absolvição. Contudo, há doutrinador que entende que a inversão caberia quanto aos efeitos secundários da sentença condenatória, como a reparação civil. QUESTÃO-TREINO Acerca da avaliação, pelo magistrado, da prova produzida no Processo Penal, relacione e conceitue os sistemas relacionadas ao assunto. Qual o adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro?
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Resposta: Sabe-se que são três sistemas em estudo. O primeiro é nominado como o sistema da íntima convicção do juiz (da certeza moral ou da livre convicção), por meio do qual o magistrado é livre para valoras as provas produzidas, sem que lhe seja imposta a fundamentação, como ocorre no âmbito do Tribunal do Júri. O segundo é o sistema da prova tarifada (das regras legais, da certeza moral do legislador ou prova legal) e acomoda um valor preestabelecido a cada prova, impondo que o juiz fique vinculado àquela valoração definida pelo legislador. Por fim, trata-se o sistema do convencimento motivado (persuasão racional do juiz) da liberdade de apreciação da prova pelo juiz, mas que exige a fundamentação da decisão, por se tratar de uma discricionariedade regrada. Esta é a teoria adotada pelo ordenamento brasileiro, conforme prevê o próprio Código de Processo Penal, em seu artigo 155, sobretudo porque a Constituição da República exige que o magistrado fundamente suas decisões.
BREVES COMENTÁRIOS Quando se recordar de um exemplo ao conceituar um instituto, o examinador, com certeza, dará mais valor à resposta do examinado. Somente se recordar, quando não exigido. A partir do sistema do convencimento motivado do juiz é possível concluir que: não há prova com valor absoluto, o juiz deve valorar todas as provas, ainda que para afasta-las, bem como somente considerar provas aquelas produzidas sob o crivo do contraditório.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Sabe-se que nenhum direito é absoluto, inclusive o direito à da prova. Temse que há limitações na sua produção, de modo que a constituição da República prevê que "são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos", trazendo a ideia de inadmissibilidade da utilização de provas obtidas por meio ilícito no Processo Penal. A partir deste contexto, responda: a) Qual a diferença entre provas ilícitas e ilegítimas? b) Qual a consequência da inadmissibilidade das provas ilícitas ou ilegítimas?
Respostas a) A prova ilícita é aquela obtida por meio da violação de regras de direito material, sejam penais ou constitucionais, como no caso da violabilidade do sigilo das comunicações telefônicas. Lado outro, a prova será considerada ilegítima quando produzida com violação de norma processual penal, a exemplo de quando o juiz deixa de compromissar uma testemunha durante a audiência. b) No caso das provas ilícitas, haverá a exclusão da prova por meio do desentranhamento dos autos do processo, como prescreve o artigo 157, § 3o, do CPP. Quanto à prova ilegítima, deve-se atentar ao grau de violação, que poderá repercutir em mera irregularidade no processo, ou mesmo nulidade absoluta ou relativa.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo BREVES COMENTÁRIOS Observa-se que nenhuma nulidade poderá ser declarada quando não houver prejuízo. "Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa". QUESTÃO-ESTUDO O art. 157, do CPP, dispõe que: "São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais". A partir da inadmissibilidade da utilização das provas obtidas por meio ilícito, o Processo Penal também passou a disciplinar as provas que derivam as ilícitas, ao dispor no § 1o, do citado artigo, que: "São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas". Consagra-se, assim, a "Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada", ao informar que as provas ilícitas por derivação são aquelas que, embora produzidas validamente em momento posterior, são atingidas pela ilicitude anterior. A partir destas premissas, pode-se dizer que há limitações/exceções que admitem a prova derivada da ilícita no Processo Penal? Descreva as três principais teorias justificantes. Não obstante a norma processual penal preveja que as provas derivadas das ilícitas também assim são consideradas, o mesmo Código de Processo Penal passou a dispor sobre as exceções que possibilitam a utilização da prova. A primeira teoria é a da fonte independente. Quando da persecução penal for possível demonstrar que a prova foi obtida legitimamente a partir de uma fonte independente, sem qualquer relação de dependência da prova originalmente ilícita, aquela será admissível. Deve a fonte ser efetivamente autônoma, a ponto de não ter qualquer vínculo causal com a prova originalmente ilícita. Não obstante o § 2º, do artigo 157, do CPP, faça menção à fonte independente, tem-se que o dispositivo é relacionado à teoria da descoberta inevitável. Segundo esta teoria, se restar demonstrado que a prova derivada da ilícita seria produzida de qualquer forma, ela será válida e considerada independente da prova ilícita originária. É preciso que se formulem dados concretos e não meramente especulativos, a fim de ratificar que a prova seria produzida de qualquer modo e atenuar o nexo causal.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Por fim, a terceira teoria justificante é a denominada limitação da mancha purgada ou da tinta diluída. Apesar de guardar semelhança com a teoria anterior, esta descreve que, embora tenha havido contaminação, a ilicitude da prova derivada é expurgada por conta de um acontecimento futuro que influencia na cadeia probatória. Assim, afasta-se o nexo de causalidade em razão da menor relevância da ilicitude secundária da prova, bem como, por exemplo, pela vontade do investigado em contribuir com a persecução penal. Alguns doutrinadores entendem que a teoria da mancha purgada (purged taint) seria prevista, expressamente, no § 1º, do artigo 157, do CPP, ao dispor que "são também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras."
BREVES COMENTÁRIOS 1. O exemplo mais comum na doutrina sobre prova ilícita por derivação é a localiação de um cadáver (apreensão aparentemente lícita) por meio de uma confissão obtida por tortura (ilicitude originária). E M E N T A: PROVA PENAL - BANIMENTO CONSTITUCIONAL DAS PROVAS ILÍCITAS (CF, ART. 5º, LVI) - ILICITUDE (ORIGINÁRIA E POR DERIVAÇÃO) - INADMISSIBILDADE - BUSCA E APREENSÃO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS REALIZADA, SEM MANDADO JUDICIAL, EM QUARTO DE HOTEL AINDA OCUPADO - IMPOSSIBLIDADE - QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DESSE ESPAÇO PRIVADO (QUARTO DE HOTEL, DESDE QUE OCUPADO) COMO "CASA", PARA EFEITO DA TUTELA CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR GARANTIA QUE TRADUZ LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO PODER DO ESTADO EM TEMA DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO EM SUA FASE PRÉ-PROCESSUAL - CONCEITO DE "CASA" PARA EFEITO DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 5º, XI E CP, ART. 150, § 4º, II) - AMPLITUDE DESSA NOÇÃO CONCEITUAL, QUE TAMBÉM COMPREENDE OS APOSENTOS DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO, POR EXEMPLO, OS QUARTOS DE HOTEL, PENSÃO, MOTEL E HOSPEDARIA, DESDE QUE OCUPADOS): NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL (CF, ART. 5º, XI). IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DE PROVA OBTIDA COM TRANSGRESSÃO À GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR - PROVA ILÍCITA - INIDONEIDADE JURÍDICA - RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO. BUSCA E APREENSÃO EM APOSENTOS OCUPADOS DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO QUARTOS DE HOTEL) - SUBSUNÇÃO DESSE ESPAÇO PRIVADO, DESDE QUE OCUPADO, AO CONCEITO DE "CASA" - CONSEQÜENTE NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL, RESSALVADAS AS EXCEÇÕES PREVISTAS NO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL. - Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de "casa" revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa específica limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina. Precedentes. - Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de quem de direito ("invito domino"), ingressar, durante o dia, sem mandado
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude originária. Doutrina. Precedentes (STF). ILICITUDE DA PROVA - INADMISSIBILIDADE DE SUA PRODUÇÃO EM JUÍZO (OU PERANTE QUALQUER INSTÂNCIA DE PODER) INIDONEIDADE JURÍDICA DA PROVA RESULTANTE DA TRANSGRESSÃO ESTATAL AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS. - A ação persecutória do Estado, qualquer que seja a instância de poder perante a qual se instaure, para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à garantia constitucional do "due process of law", que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso sistema de direito positivo. - A Constituição da República, em norma revestida de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, LVI), desautoriza, por incompatível com os postulados que regem uma sociedade fundada em bases democráticas (CF, art. 1º), qualquer prova cuja obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão a cláusulas de ordem constitucional, repelindo, por isso mesmo, quaisquer elementos probatórios que resultem de violação do direito material (ou, até mesmo, do direito processual), não prevalecendo, em conseqüência, no ordenamento normativo brasileiro, em matéria de atividade probatória, a fórmula autoritária do "male captum, bene retentum". Doutrina. Precedentes. A QUESTÃO DA DOUTRINA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA ("FRUITS OF THE POISONOUS TREE"): A QUESTÃO DA ILICITUDE POR DERIVAÇÃO. - Ninguém pode ser investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se cuide de ilicitude por derivação. Qualquer novo dado probatório, ainda que produzido, de modo válido, em momento subseqüente, não pode apoiar-se, não pode ter fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela mácula da ilicitude originária. - A exclusão da prova originariamente ilícita - ou daquela afetada pelo vício da ilicitude por derivação - representa um dos meios mais expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do "due process of law" e a tornar mais intensa, pelo banimento da prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva os direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado em sede processual penal. Doutrina. Precedentes. - A doutrina da ilicitude por derivação (teoria dos "frutos da árvore envenenada") repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício (gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite, contaminando-os, por efeito de repercussão causal. Hipótese em que os novos dados probatórios somente foram conhecidos, pelo Poder Público, em razão de anterior transgressão praticada, originariamente, pelos agentes da persecução penal, que desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar. - Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios a que os órgãos da persecução penal somente tiveram acesso em razão da prova originariamente ilícita, obtida como resultado da transgressão, por agentes estatais, de direitos e garantias constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa limitação de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos cidadãos. - Se, no entanto, o órgão da persecução penal demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de informação a partir de uma fonte autônoma de prova - que não guarde qualquer relação de dependência nem decorra da prova originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal -, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis, porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária. - A QUESTÃO DA FONTE AUTÔNOMA DE PROVA ("AN INDEPENDENT SOURCE") E A SUA DESVINCULAÇÃO CAUSAL DA PROVA ILICITAMENTE OBTIDA - DOUTRINA - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - JURISPRUDÊNCIA COMPARADA (A EXPERIÊNCIA DA SUPREMA CORTE AMERICANA): CASOS "SILVERTHORNE LUMBER CO. V. UNITED STATES (1920);
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo SEGURA V. UNITED STATES (1984); NIX V. WILLIAMS (1984); MURRAY V. UNITED STATES (1988)", v.g..
(RHC 90376, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/04/2007, DJe-018 DIVULG 17-05-2007 PUBLIC 18-05-2007 DJ 18-05-2007 PP-00113 EMENT VOL02276-02 PP-00321 RTJ VOL-00202-02 PP-00764 RT v. 96, n. 864, 2007, p. 510-525 RCJ v. 21, n. 136, 2007, p. 145-147)
2. Teoria da Fonte independente: Caso Bynum x U.S, de 1960, da Corte Americana. No Brasil: E M E N T A: PROVA PENAL - BANIMENTO CONSTITUCIONAL DAS PROVAS ILÍCITAS (CF, ART. 5º, LVI) - ILICITUDE (ORIGINÁRIA E POR DERIVAÇÃO) - INADMISSIBILDADE - BUSCA E APREENSÃO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS REALIZADA, SEM MANDADO JUDICIAL, EM QUARTO DE HOTEL AINDA OCUPADO - IMPOSSIBLIDADE - QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DESSE ESPAÇO PRIVADO (QUARTO DE HOTEL, DESDE QUE OCUPADO) COMO "CASA", PARA EFEITO DA TUTELA CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR GARANTIA QUE TRADUZ LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO PODER DO ESTADO EM TEMA DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO EM SUA FASE PRÉ-PROCESSUAL - CONCEITO DE "CASA" PARA EFEITO DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 5º, XI E CP, ART. 150, § 4º, II) - AMPLITUDE DESSA NOÇÃO CONCEITUAL, QUE TAMBÉM COMPREENDE OS APOSENTOS DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO, POR EXEMPLO, OS QUARTOS DE HOTEL, PENSÃO, MOTEL E HOSPEDARIA, DESDE QUE OCUPADOS): NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL (CF, ART. 5º, XI). IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DE PROVA OBTIDA COM TRANSGRESSÃO À GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR - PROVA ILÍCITA - INIDONEIDADE JURÍDICA - RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO. BUSCA E APREENSÃO EM APOSENTOS OCUPADOS DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO QUARTOS DE HOTEL) - SUBSUNÇÃO DESSE ESPAÇO PRIVADO, DESDE QUE OCUPADO, AO CONCEITO DE "CASA" - CONSEQÜENTE NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL, RESSALVADAS AS EXCEÇÕES PREVISTAS NO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL. - Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de "casa" revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa específica limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina. Precedentes. - Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de quem de direito ("invito domino"), ingressar, durante o dia, sem mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude originária. Doutrina. Precedentes (STF). ILICITUDE DA PROVA - INADMISSIBILIDADE DE SUA PRODUÇÃO EM JUÍZO (OU PERANTE QUALQUER INSTÂNCIA DE PODER) INIDONEIDADE JURÍDICA DA PROVA RESULTANTE DA TRANSGRESSÃO ESTATAL AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS. - A ação persecutória do Estado, qualquer que seja a instância de poder perante a qual se instaure, para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à garantia constitucional do "due process of law", que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso sistema de direito positivo. - A Constituição da República, em norma revestida
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, LVI), desautoriza, por incompatível com os postulados que regem uma sociedade fundada em bases democráticas (CF, art. 1º), qualquer prova cuja obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão a cláusulas de ordem constitucional, repelindo, por isso mesmo, quaisquer elementos probatórios que resultem de violação do direito material (ou, até mesmo, do direito processual), não prevalecendo, em conseqüência, no ordenamento normativo brasileiro, em matéria de atividade probatória, a fórmula autoritária do "male captum, bene retentum". Doutrina. Precedentes. A QUESTÃO DA DOUTRINA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA ("FRUITS OF THE POISONOUS TREE"): A QUESTÃO DA ILICITUDE POR DERIVAÇÃO. - Ninguém pode ser investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se cuide de ilicitude por derivação. Qualquer novo dado probatório, ainda que produzido, de modo válido, em momento subseqüente, não pode apoiar-se, não pode ter fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela mácula da ilicitude originária. - A exclusão da prova originariamente ilícita - ou daquela afetada pelo vício da ilicitude por derivação - representa um dos meios mais expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do "due process of law" e a tornar mais intensa, pelo banimento da prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva os direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado em sede processual penal. Doutrina. Precedentes. - A doutrina da ilicitude por derivação (teoria dos "frutos da árvore envenenada") repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício (gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite, contaminando-os, por efeito de repercussão causal. Hipótese em que os novos dados probatórios somente foram conhecidos, pelo Poder Público, em razão de anterior transgressão praticada, originariamente, pelos agentes da persecução penal, que desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar. - Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios a que os órgãos da persecução penal somente tiveram acesso em razão da prova originariamente ilícita, obtida como resultado da transgressão, por agentes estatais, de direitos e garantias constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa limitação de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos cidadãos. - Se, no entanto, o órgão da persecução penal demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de informação a partir de uma fonte autônoma de prova - que não guarde qualquer relação de dependência nem decorra da prova originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal -, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis, porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária. - A QUESTÃO DA FONTE AUTÔNOMA DE PROVA ("AN INDEPENDENT SOURCE") E A SUA DESVINCULAÇÃO CAUSAL DA PROVA ILICITAMENTE OBTIDA - DOUTRINA - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - JURISPRUDÊNCIA COMPARADA (A EXPERIÊNCIA DA SUPREMA CORTE AMERICANA): CASOS "SILVERTHORNE LUMBER CO. V. UNITED STATES (1920); SEGURA V. UNITED STATES (1984); NIX V. WILLIAMS (1984); MURRAY V. UNITED STATES (1988)", v.g.. (RHC 90376, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/04/2007, DJe-018 DIVULG 17-05-2007 PUBLIC 18-05-2007 DJ 18-05-2007 PP-00113 EMENT VOL-02276-02 PP-00321 RTJ VOL-00202-02 PP-00764 RT v. 96, n. 864, 2007, p. 510525 RCJ v. 21, n. 136, 2007, p. 145-147).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 3. Teoria da Descoberta Inevitável: Caso Nix x Williamns-Williamns II da Corte Americana. No Brasil: HABEAS CORPUS. NULIDADES: (1) INÉPCIA DA DENÚNCIA; (2) ILICITUDE DA PROVA PRODUZIDA DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL; VIOLAÇÃO DE REGISTROS TELEFÔNICOS DO CORRÉU, EXECUTOR DO CRIME, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL; (3) ILICITUDE DA PROVA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS DE CONVERSAS DOS ACUSADOS COM ADVOGADOS, PORQUANTO ESSAS GRAVAÇÕES OFENDERIAM O DISPOSTO NO ART. 7º, II, DA LEI 8.906/96, QUE GARANTE O SIGILO DESSAS CONVERSAS. VÍCIOS NÃO CARACTERIZADOS. ORDEM DENEGADA. 1. Inépcia da denúncia. Improcedência. Preenchimento dos requisitos do art. 41 do CPP. A denúncia narra, de forma pormenorizada, os fatos e as circunstâncias. Pretensas omissões – nomes completos de outras vítimas, relacionadas a fatos que não constituem objeto da imputação –- não importam em prejuízo à defesa. 2. Ilicitude da prova produzida durante o inquérito policial - violação de registros telefônicos de corréu, executor do crime, sem autorização judicial. 2.1 Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2 Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. 2.3 Art. 6º do CPP: dever da autoridade policial de proceder à coleta do material comprobatório da prática da infração penal. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o seu mister, buscou, unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria e a materialidade do delito (dessa análise logrou encontrar ligações entre o executor do homicídio e o ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha investigatória a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes para a investigação. 2.4 À guisa de mera argumentação, mesmo que se pudesse reputar a prova produzida como ilícita e as demais, ilícitas por derivação, nos termos da teoria dos frutos da árvore venenosa (fruit of the poisonous tree), é certo que, ainda assim, melhor sorte não assistiria à defesa. É que, na hipótese, não há que se falar em prova ilícita por derivação. Nos termos da teoria da descoberta inevitável, construída pela Suprema Corte norte-americana no caso Nix x Williams (1984), o curso normal das investigações conduziria a elementos informativos que vinculariam os pacientes ao fato investigado. Bases desse entendimento que parecem ter encontrado guarida no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Lei 11.690/2008, que deu nova redação ao art. 157 do CPP, em especial o seu § 2º. 3. Ilicitude da prova das interceptações telefônicas de conversas dos acusados com advogados, ao argumento de que essas gravações ofenderiam o disposto no art. 7º, II, da Lei n. 8.906/96, que garante o sigilo dessas conversas. 3.1 Nos termos do art. 7º, II, da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia garante ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. 3.2 Na hipótese, o magistrado de primeiro grau, por reputar necessária a realização da prova, determinou, de forma fundamentada, a interceptação telefônica direcionada às pessoas investigadas, não tendo, em momento algum, ordenado a devassa das linhas telefônicas dos advogados dos pacientes. Mitigação que pode, eventualmente, burlar a proteção jurídica. 3.3 Sucede que, no curso da execução da medida, os diálogos travados entre o paciente e o advogado do corréu acabaram, de maneira automática, interceptados, aliás, como qualquer outra conversa direcionada ao ramal do paciente. Inexistência, no caso, de relação jurídica cliente-
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo advogado. 3.4 Não cabe aos policiais executores da medida proceder a uma espécie de filtragem das escutas interceptadas. A impossibilidade desse filtro atua, inclusive, como verdadeira garantia ao cidadão, porquanto retira da esfera de arbítrio da polícia escolher o que é ou não conveniente ser interceptado e gravado. Valoração, e eventual exclusão, que cabe ao magistrado a quem a prova é dirigida. 4. Ordem denegada. (HC 91867, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 24/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 19-092012 PUBLIC 20-09-2012)
QUESTÃO-TREINO Conceitue a serendipidade no Processo Penal e dê um exemplo.
Resposta: A teoria da serendipidade, também denominada teoria do encontro fortuito de provas, é aplicada quando há uma localização casual de provas através do cumprimento de diligência pela autoridade policial, sendo que estas não estariam dentro da linha de desdobramento normal da investigação. É o que faz surgir a expressão "crime achado", possibilitando-se a utilização da prova encontrada desde que a diligência tenha sido corretamente cumprida, sem qualquer desvio de finalidade. Como exemplo, pode-se citar a expedição de mandado de busca e apreensão para uma residência, a fim de localizar drogas, sendo que, além das substâncias ilícitas, os policiais também apreendem pássaros da fauna silvestre em cativeiro. Embora não fosse objeto do mandado, a apreensão materializou, além do tráfico de drogas, o crime contra a fauna.
BREVES COMENTÁRIOS 1.Atentar sobre as buscas realizadas em escritórios de advocacia, uma vez que os documentos relacionados à contratação pelo cliente não serão admitidos, diante do sigilo profissional.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 2.Para aprofundar: Informativo 869, do STF, a respeito do crime achado. https://www.dizerodireito.com.br/2017/07/informativo-comentado-869-stf.html
QUESTÃO-TREINO Expedido um mandado de busca e apreensão para a residência de Mévio, os agentes de segurança localizaram grande quantidade de drogas, o que motivou a prisão em flagrante delito. Além das drogas, os Policiais apreenderam o aparelho celular de Mévio, que não tinha senha para acesso. A partir da apreensão, o Delegado de Polícia acessou o whatsapp e constatou que Mévio vendia drogas, a partir da leitura das mensagens disponíveis no aplicativo. A Autoridade Policial imprimiu todas as mensagens e as juntou nos autos do Inquérito. Agiu corretamente o Delegado de Polícia? Justifique.
Resposta: Não agiu corretamente o Delegado de Policial, porquanto, após a apreensão do aparelho celular, ele deveria ter representado ao juízo para a quebra do sigilo dos dados armazenados. Garante-se a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, conforme prescreve a Constituição da República, e isso inclui as conversas registradas pelo aplicativo. Como entendeu o Superior Tribunal de Justiça em decisão recente, as mensagens juntadas ao inquérito são consideradas provas ilícitas e devem ser desentranhadas dos autos.
BREVES COMENTÁRIOS 1. Leitura imprescindível:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo https://www.dizerodireito.com.br/2018/02/acesso-as-conversas-do-whatsapppela.html 1. Superior Tribunal de Justiça “Acesso ao Whatsapp em celular apreendido, só com a autorização judicial”. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noti cias/Not%C3%ADcias/Acesso-ao-Whatsapp-em-celular-apreendido,s%C3%B3-com-a-autoriza%C3%A7%C3%A3o-judicial “Reconhecida ilicitude de provas obtidas por meio do WhatsApp sem autorização judicial”. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noti cias/Not%C3%ADcias/Reconhecida-ilicitude-de-provas-obtidas-por-meio-doWhatsApp-sem-autoriza%C3%A7%C3%A3o-judicial Informativo 617: RHC 86.076-MT, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. Acd. Min. Rogerio Schietti Cruz, por maioria, julgado em 19/10/2017, DJe 12/12/2017 “Não há ilegalidade na perícia de aparelho de telefonia celular pela polícia, sem prévia autorização judicial, na hipótese em que seu proprietário – a vítima – foi morto, tendo o referido telefone sido entregue à autoridade policial por sua esposa”
QUESTÃO-TREINO Busca e apreensão João estava sendo investigado pela polícia e o juiz autorizou a realização de medida de busca e apreensão em sua casa. A polícia cumpriu o mandado e realizou a busca na residência do investigado. Posteriormente, o Delegado se lembrou de uma agenda que poderia estar no veículo do investigado e passou a procurar no interior do veículo o objeto, que foi achado. Pergunta-se: a) o ato foi legal? Era possível a busca no interior do veículo, mesmo sem mandado? Justifique. b) se fosse veículo destinado à habitação do indivíduo, como trailers, seria necessária autorização judicial?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
RESPOSTA: a) A apreensão de documentos no interior de veículo constitui uma espécie de “busca pessoal” e, portanto, não precisa de autorização judicial. b) quando o veículo servir à moradia do investigado, como por exemplo os trailers ou o compartimento traseiro do caminhão, parte da doutrina entende que seria necessária autorização judicial.
Sujeitos do processo
Sobre a investigação direta pelo Ministério Público: ATENÇÃO! TREINE DISSERTANDO! DISSERTAÇÃO-TREINO! Apresente os principais argumentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal RE 593.727/MG para garantir a investigação direta pelo Ministério Público. O primeiro dos argumentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal para assentar a possibilidade de investigação direta pelo Ministério Público foi o dos poderes implícitos. Se a Constituição, no art. 129, incisos VII e VIII, estabelece, dentre outras, a possibilidade de o Ministério Público controlar externamente a atividade policial e ordenar diligências investigatórias, ele poderia investigar como uma consequência lógica desse entendimento, trata-se de um poder implícito do Ministério Público. Em segundo lugar, o mesmo artigo 129, no inciso III, estabelece a possibilidade de o Ministério Público promover o inquérito civil e a consequente ação civil pública. Se o Ministério Público pode propor inquérito civil como ato antecedente a uma ação civil pública versando sobre direitos indisponíveis, naturalmente, poderia promover uma investigação dando subsídios à futura ação penal, pois os direitos aqui também são indisponíveis. Em terceiro lugar, o art. 129, inciso IX diz que o Ministério Público poderia exercer outras funções, desde que compatíveis com a sua finalidade. Tal inciso consagra a ideia de que o rol do artigo 129 é exemplificativo. Levando-se em conta que o inciso I estabelece a função institucional de promover a ação penal
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo pública, a investigação direta seria possível, pois plenamente compatível com a finalidade exposta no inciso I. Em quarto lugar, o artigo 58, §3º, ao versar sobre as Comissões Parlamentares de Inquérito, deixou claro que a investigação não é monopólio da polícia, já que deu possibilidade de investigação pelas Comissões Parlamentares de Inquérito. Logo, inexistindo monopólio da atividade investigativa por parte da polícia, plena a possibilidade de investigação por parte do Ministério Público. Em quinto lugar e rebatendo um argumento utilizado pelos que defendiam a impossibilidade de investigação direta pelo Ministério Público, há órgãos que controlam o Ministério Público. O controle extrajudicial será realizado pelo Conselho Nacional do Ministério Público, de modo a que abusos e excessos não sejam cometidos pelo membro titular da investigação. Em sexto lugar, já há embasamento para investigação pelo Ministério Público desde 1941, quando foi editado o Código de Processo Penal. O art. 4º, parágrafo único diz que a atribuição para investigar da polícia, não exclui a de entidades a que por lei for conferida tal função, demonstrando que a investigação não é exclusiva da polícia. Outrossim, o artigo 27 dispõe que qualquer pessoa do povo pode comunicar ao Ministério Público a ocorrência de crime, se fosse atribuição exclusiva da polícia, qualquer do povo só poderia procurar a polícia. Além disso, há todo um arcabouço normativo apto a subsidiaria a possibilidade de uma investigação direta pelo Ministério Público na Lei Complementar 75/93, no art. 8º, inciso V, ao afirmar que o Ministério Público pode fazer diligências investigatórias e inspeções; na Lei 8625/93, no art. 26, inciso I, ao mencionar expressamente a possibilidade de instaurar inquérito civil e “outros procedimentos administrativos pertinentes”. Por fim, sétimo e último argumento é aquele de direito comparado, pois, em países como Portugal e Itália, a regra é a possibilidade de investigação pelo Ministério Público. QUESTÃO-TREINO Quais limites para a atividade investigativa ministerial conforme o entendimento firmado pelo STF no RE 593.727/MG?
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Resposta: Os direitos e garantias individuais dos investigados devem ser garantidos e respeitados; a investigação deve se dar em prazo razoável; observância das hipóteses de reserva constitucional de jurisdição; observância das prerrogativas profissionais dos advogados, conforme a Súmula vinculante 14 do STF; os atos investigatórios devem ser documentados; atos investigatórios devem ser praticados por membros do Ministério Público; e possibilidade de permanente controle jurisdicional dos atos.
QUESTÃO-TREINO Em determinado processo submetido ao rito do Tribunal do Júri, durante os debates orais o Promotor de Justiça pediu a absolvição do réu, tendo o mesmo sido absolvido pelos jurados. Inconformado com tal decisão, a vítima constitui advogado para atuar como assistente de acusação, visando interpor recurso de Apelação. Em sede de contrarrazões, a defesa pleiteou pela impossibilidade de intervenção do assistente de acusação depois da sentença absolutória e pela ausência de legitimidade para interpor recurso de apelação, em caso no qual o Ministério Público houver opinado pela absolvição. Qual pleito deve prosperar?
Resposta: Merece prosperar o pleito do assistente de acusação. Conforme os arts. 269 e 598 do Código de Processo Penal, plenamente admissível a interposição de recurso de apelação, após a prolação da sentença, visando evitar o trânsito em julgado do processo. Outrossim, conforme entendimento do STJ no RESP 1.451.720/SP, o assistente de acusação possui legitimidade para interpor recurso de apelação, ainda que o Ministério Público tenha requerido a absolvição do réu, já que a legitimidade do assistente é ampla.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Suspeitando do cometimento de determinado delito por parte de policiais, o Promotor de Justiça da cidade X resolve iniciar uma investigação. Depois de obter indícios de autoria e materialidade, o mesmo Promotor que participou da investigação oferece denúncia contra os referidos policiais. O Juiz não recebe a denúncia, argumentando violação ao princípio do Promotor Natural. Assiste razão ao Juiz?
Resposta: Não. Conforme a Súmula 234 do STJ, a participação do Promotor que participou das investigações não acarreta seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia. Conforme Roberval Rocha Ferreira Filho e Albino Carlos Martins Vieira67, apenas nos casos previstos em lei é que é possível o afastamento do Promotor. Como tal hipótese não consta do rol taxativo dos casos de impedimento e suspeição (arts. 252, 254 e 258 do Código de Processo Penal), possível que o mesmo Promotor que atuou na investigação atue no oferecimento da denúncia, sem que exista qualquer violação ao princípio do Promotor Natural. ATENÇÃO! TREINE DISSERTANDO! DISSERTAÇÃO-TREINO! Assistente de acusação Sobre o assistente de acusação, responda: a) Indique sua natureza e o momento oportuno para sua atuação, bem como, os sujeitos legitimados a intervir no processo penal nessa condição. b) Aponte as principais faculdades processuais deste sujeito do processo, salientando as restrições com relação à sua legitimidade recursal. 67
FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; MARTINS VIEIRA, Albino Carlos. STJ. Súmulas comentadas. Ed. JusPODIVM. 7ª ed. 2015. Pgs 705/706.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo c) Suponha que, durante os debates em sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, o Promotor de Justiça requeira a absolvição do réu; ao final, é prolatada sentença absolutória. Nesta situação, o assistente de acusação tem legitimidade para interpor apelação? Em caso positivo, qual o prazo para a interposição? d) Há situações em que sua atuação não é admitida. Mencione ao menos duas delas, distinguindo-o da figura do querelante e do Ministério Público, e o meio de impugnação cabível contra a decisão que inadmita sua intervenção. Respostas: a) O assistente de acusação atua supletivamente na ação penal de iniciativa pública, sendo, portanto, uma parte ad coadjuvandum em relação ao titular da ação penal, no caso, o Ministério Público (art. 129, inciso I, CF/88). Em outras palavras, trata-se de uma parte contingente, não necessária, que não pode promover a ação penal, nem intervir nessa condição no curso das investigações, mas apenas depois de instaurada a fase processual, “coadjuvando o Ministério Público no exercício da tese acusatória” (BADARÓ, 2014, p. 204).68 Pode intervir como assistente de acusação a vítima da infração penal, pessoa natural ou jurídica ou, se falecida a pessoa natural, os sujeitos indicados no rol do art. 31 do CPP: cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Observação: conforme Badaró (2014, p. 204), embora a doutrina debata qual o interesse ou finalidade da atuação do assistente de acusação no processo penal, prevalece o entendimento de que seu interesse jurídico se volta para a justa condenação de forma geral, não estando adstrito à mera obtenção de um título executivo a ser executado no âmbito civil. b) Faculta-se ao assistente de acusação “…propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio” (art. 271, CPP), prevalecendo o entendimento de se tratar de um rol taxativo (STJ, AgRg no Ag 1378822/ES, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 22/09/2015). Ademais, o assistente de acusação também pode requerer a prisão preventiva, no curso da ação penal (art. 311 do CPP), indicar assistente técnico (art. 159, §3º, CPP) e requerer o desaforamento no procedimento do tribunal do júri (art. 427, caput, CPP). Com relação à legitimidade recursal, o assistente de acusação pode recorrer de decisões de impronúncia ou de extinção de punibilidade (arts. 271 e 584, §1º, do CPP), apelar de sentença absolutória (art. 598 do CPP), ou da sentença condenatória para exasperar a pena, desde que o Ministério Público não o tenha feito. Nesse sentido: HC 137.339/RS, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 68
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo Penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 09/11/2010. Todavia, observando que o assistente de acusação não está autorizado a intervir antes de iniciada a fase processual e não é o titular da ação penal, não pode ele oferecer ou aditar a denúncia, nem recorrer em sentido estrito da decisão que a rejeita. Nesse sentido: (STJ, HC 430.317/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018). c) Sim. Mesmo que o Ministério Público tenha pugnado pela absolvição, o assistente de acusação mantém a legitimidade recursal para interpor apelação da sentença absolutória, nos termos do art. 598 do CPP, conforme entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (6ª Turma, REsp 1.451.720-SP, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Nefi Cordeiro, julgado em 28/4/2015). Caso o assistente de acusação esteja devidamente habilitado nos autos ao tempo da sentença, o prazo para interposição do recurso será de 5 dias, contados da sua intimação após findo o prazo recursal do Ministério Público (súmula 448 do STF); caso contrário, o prazo será de 15 dias, contados do dia em que terminar o do Ministério Público (art. 598, par. único, do CPP). d) A atuação do assistente de acusação somente é admitida na ação penal de iniciativa pública, situação em que não é o titular da ação penal. Por conseguinte, não se admite intervenção do assistente de acusação na ação penal de iniciativa privada, tampouco, no habeas corpus (STJ HC 65.017/BA, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 15/05/2008, DJe 02/06/2008), na fase de execução penal (art. 269, CPP) e na revisão criminal. Ademais, o corréu não pode se habilitar como assistente de acusação no mesmo processo em que é acusado (art. 270, CPP). Não há recurso cabível contra a decisão que indefere a habilitação do assistente de acusação, por ausência de previsão legal. Todavia, a jurisprudência admite a impetração de mandado de segurança, ação autônoma de impugnação. Nesse sentido, o quanto decidido no Mandado de Segurança nº 214333264.2018.8.26.0000 da 7ª Câmara de Direito Criminal do TJ/SP. QUESTÃO-TREINO Ministério Público e Processo Penal Sobre o Ministério Público, responda: a) Relacione o Princípio Institucional da Independência Funcional dos membros do Ministério Público (art. 127, §1º, CF/88) com o Princípio do Promotor Natural. b) A defesa de Alexandre, réu em ação penal de iniciativa pública, irresignada com sentença penal condenatória, interpõe recurso de
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo apelação. São ofertadas contrarrazões pelo Promotor de Justiça oficiante em 1º grau (art. 600, CPP) e, previamente ao julgamento do recurso, Procurador de Justiça apresenta parecer, frisando uma tese contrária aos interesses do réu. Nessa situação, antes do julgamento da apelação, é dado à defesa pugnar por manifestação sobre o parecer ofertado, à luz dos princípios do contraditório e da ampla defesa e do direito à última palavra? Justifique, respondendo com base no entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça.
Respostas: a) Pela independência funcional, o membro do Ministério Público tem assegurada, inclusive, no âmbito da própria instituição, liberdade para exercer suas atribuições legais conforme seu próprio juízo técnico. Por isso, goza, nos limites dessa independência, de “inviolabilidade pelas opiniões que externar ou pelo teor de suas manifestações processuais ou procedimentos” (art. 41, inciso V, Lei 8.625/1993). Ou seja, não há vinculação técnica do membro do Ministério Público, mesmo em face de superiores hierárquicos na administração da instituição. E pelo Princípio do Promotor Natural, à semelhança do Princípio do Juiz Natural, deve haver “…prévia definição legal sobre sua atribuição para atuar em determinados casos, afastando-se, assim, a possibilidade de interferências hierárquicas” (BADARÓ, 2014, p. 195). Ou seja, coadunando-se com a independência funcional, não pode o Membro do Parquet atuante em determinado feito ser dele afastado arbitrariamente, mediante substituição, designação, delegação ou avocação por parte do órgão dirigente da instituição. b) Não. O parecer do Procurador de Justiça, a respeito de recurso interposto por qualquer das partes, configura atuação do Ministério Público na condição de custos legis (art. 257, inciso II, do CPP), não como parte interessada (acusadora). Por isso, não há que se oportunizar manifestação da defesa sobre o parecer, sob alegação do direito à última palavra, ainda que o seu teor seja
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo contrário aos interesses do acusado. Este é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, HC 231.518/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 22/05/2012, DJe 11/06/2012; STJ, HC 132.664/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 28/09/2010, DJe 25/10/2010).
Prisões e medidas cautelares. Citação, intimação e notificação. Sentença. Coisa Julgada. Nulidades. Recursos. Ações autônomas de impugnação.
QUESTÃO-TREINO Prisão e medidas cautelares alternativas É correto afirmar que a prisão domiciliar, no âmbito da persecução penal, consiste em medida alternativa ou diversa à prisão preventiva? (MP/RJ – Concurso para Promotor – 2018)
Resposta: Com efeito, não é correto afirmar que a prisão domiciliar, no âmbito da persecução penal, consista em medida alternativa ou diversa à prisão, tratando-se, na verdade, de medida substitutiva à prisão preventiva, pois inclusive o decreto da medida impõe ao julgador a análise dos pressupostos autorizadores da prisão preventiva (CPP, artigos 311/312, do CPP). Se presentes, poderá caber a prisão domiciliar, desde que configurada uma das situações do artigo 317/318 do CPP. Por outro lado, as medidas alternativas ou diversas à prisão, previstas nos artigos 319/320 do CPP, somente têm lugar exatamente quando a extrema ratio da ultima ratio (Prisão Preventiva) não puder ser decretada, mas houver alguma necessidade de acautelamento dos meios e fins do processo por medida menos tormentosa. (Resposta da Banca)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Medidas cautelares reais e pessoais O que são medidas cautelares reais e pessoais? Pode ser aplicada prisão preventiva em crimes aos quais não seja cominada pena privativa de liberdade, alternativa ou cumulativamente?
Medidas cautelares reais são medidas cautelares preventivas relacionadas à reparação do dano e ao perdimento de bens como efeitos da condenação e destinam-se a assegurar meios suficientes a evitar que a demora processual ocasione o perdimento de patrimônio suficiente às sanções. Como exemplos, podem ser citados o sequestro e a especialização e registro da hipoteca legal. Já as medidas cautelares pessoais são aquelas tomadas contra o investigado ou acusado durante as investigações e no curso do processo, que acarretam algum grau de sacrifício de sua liberdade. Como exemplos, podem ser citadas a prisão preventiva e a prisão temporária. Por expressa previsão legal, a prisão preventiva não pode ser aplicada a infração penal que não seja cominada, cumulativa ou isoladamente cominada pena privativa de liberdade.
QUESTÃO-TREINO Prisão domiciliar. LEP E CPP. Diferencie a prisão domiciliar prevista nos artigos 317 e 318 do Código de Processo Penal da previsão contida no artigo 117, da LEP?
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A Lei nº 12.403/2011 introduziu modificações no tratamento do instituto da prisão e por razões humanitárias passou a disciplinar de forma expressa a prisão domiciliar. Podemos conceituar a prisão domiciliar como uma medida cautelar alternativa à prisão preventiva que visa a permissão para que ao agente seja imposta a obrigação de permanecer em sua residência. O artigo 318, do CPP traz os requisitos mínimos para que seja deferida ao agente a prisão domiciliar, quais sejam: agente maior de 80 anos de idade, extremamente debilitado por motivos de doença; imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos incompletos; gestante; mulher com filho menor de 10 (doze) anos incompletos; homem, caso seja o único responsável pelos cuidados de filho até 12 (doze) anos incompletos. Trata-se de requisitos mínimos, pois como estabelece o parágrafo único, do artigo 318, do CPP, para que haja a substituição o juiz exigirá prova idônea da necessidade da prisão domiciliar, devendo incidir o princípio da suficiência, ínsito das cautelares. Por sua vez, a prisão domiciliar prevista no artigo 117, da Lei de Execução Penal, é uma forma de cumprimento de pena em regime aberto e possui requisitos diferenciados dos estabelecidos no CPP: condenado maior de 70 anos; condenado acometido de doença grave; condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental e condenada gestante. Da mesma forma que o tratamento das cautelares, a prisão domiciliar na execução não é automática, devendo ser comprovado pelo executado que o estabelecimento carcerário não oferece tratamento adequado às situações previstas em lei. Ademais, o STJ vem entendendo que a prisão domiciliar é aplicável, nas hipóteses de ausência de vagas no regime semiaberto, por configurar constrangimento ilegal a manutenção do executado em regime de pena mais gravoso do que o previsto em lei.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Intimação - Citação É admitida a citação por edital, em qualquer dos procedimentos previstos na legislação processual penal? E em caso de réu preso? Quais as consequências ao réu que, citado por edital, não comparecer nem constituir advogado?
Resposta: A citação por edital é medida expressamente prevista no Código de Processo Penal e cabe quando o acusado estiver em local incerto e não sabido. No procedimento sumaríssimo, não cabe a citação por edital. No caso de réu preso, de acordo com entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula nº 351) não é admitida a citação por edital, quando o réu preso encontrar-se cumprindo pena na mesma Unidade da Federação em que o Juiz exerce sua jurisdição. Em caso e não comparecimento ou constituição de advogado após a citação por edital, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o Juiz determinar a produção antecipada de provas. (Art. 366 do Código de Processo Penal)
QUESTÃO-TREINO Intimação – Contrarrazões Joel, conhecido vendedor de CD’s e DVD’s piratas, teve contra si oferecida denúncia pelo crime previsto no art. 184, §2º do Código Penal. Jael, o Juiz responsável pelo processo, rejeitou a denúncia com o fundamento de que a conduta de Joel não é típica, porque socialmente adequada e aceita. O membro do Ministério Público em primeira instância, não conformado, recorreu, pugnando pelo recebimento da peça acusatória. Jael, o Juiz, zeloso pelo contraditório, nomeou advogado dativo para contra-arrazoar o
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo recurso do Ministério Público, não intimando, porém, o próprio Joel. Com base no problema exposto, responda: A) Assiste razão ao Ministério Público independentemente da admissibilidade? B) Correta a conduta do magistrado?
no
mérito
do
recurso,
A) O recurso interposto pelo Ministério Público, no mérito, comportaria provimento. Conforme entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 502 do STJ), presentes a materialidade e autoria, afigura-se típica, em relação ao art. 184, §2º do Código Penal a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas. O princípio da adequação social, para o caso, não faz desaparecer a tipicidade penal da conduta de Joel. B) Não. Jael, o Juiz, deveria ter intimado Joel para o oferecimento de contrarrazões ao recurso interposto da rejeição da denúncia. A mera nomeação de defensor dativo não é suficiente. Esse é o teor de entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça. (Súmula 707)
QUESTÃO-TREINO Sentença – Coisa Julgada A absolvição pela existência de causas excludentes de ilicitude gera o dever de indenização na esfera cível? Isto é, faz coisa julgada na esfera cível a sentença que reconhece a existência de excludentes de ilicitude? Aponte as regras e eventuais exceções.
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Excludentes de ilicitude são as elencadas no art. 23 do Código Penal: Estado de Necessidade, Legítima Defesa, Estrito cumprimento do dever legal e Exercício Regular de Direito. O art. 65 do CPP dispõe que faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em qualquer uma daquelas circunstâncias. Na Legítima defesa, há coisa julgada no cível, mas, excepcionalmente não haverá em caso de legítima defesa real com aberratio ictus, quando, por erro, atinge-se terceiro. No Estado de necessidade defensivo, que é aquele em que o agente pratica o fato necessitado contra bem jurídico pertencente àquele que causou o dano, não haverá obrigação de ressarcimento do dano. Já no Estado de necessidade agressivo, que envolve ato contra terceiro não causador do dano, não há coisa julgada na esfera cível, podendo, o praticante do fato necessitado, entretanto, ingressar com ação de regresso contra o causador da situação de perigo.69
QUESTÃO-TREINO Sentenças – Decisões Interlocutórias e Coisa julgada material Foi instaurado inquérito policial em que figuravam como investigados Glauber e Rodrigo. Segundo os autos, houve denúncia de que eles difamaram, pela internet, Fernando Maldade, atribuindo-lhe a prática de ato ofensivo à sua reputação. O inquérito policial foi arquivado, por decisão que reconheceu a atipicidade do fato. Um ano depois, o Promotor de Justiça com atribuição para o caso, sem saber ou ter notícia de qualquer nova prova ou elemento que pudesse alterar os fatos, deu início a ação penal. Diante do exposto, responda: a) A decisão de arquivamento do inquérito policial faz coisa julgada material? b) A ação penal proposta pelo Promotor de Justiça terá prosseguimento?
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MASSON, Cleber. Direito Penal. Parte Geral. Vol. I. Método, São Paulo, 2018. p. 430/431.
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Respostas: a) A decisão de arquivamento, quando exclusivamente baseada em falta de elementos para a propositura da denúncia não faz coisa julgada material. Entretanto, são aptas a formarem coisa julgada material as decisões de arquivamento baseadas na atipicidade do fato ou se estiver extinta a punibilidade.70 b) Não. A denúncia proposta pelo Promotor de Justiça não poderia ter sido oferecida sem novas provas, de acordo com Súmula 594 do Supremo Tribunal
No mesmo sentido, Antônio Alberto Machado: “Todavia, quando a decisão que arquiva o inquérito se fundar num outro motivo que não seja apenas o motivo genérico da falta de base para a denúncia”, tal decisão poderá ser definitiva, qual verdadeira sentença terminativa de mérito ou decisão interlocutória mista. Assim é quando, por exemplo, o promotor propõe e o juiz manda arquivar o inquérito policial por atipicidade do fato, pela ocorrência da prescrição penal, pela inimputabilidade do agente etc. Nesse sentido decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo: “o pedido de arquivamento dos autos de inquérito policial pelo Ministério Público, fundamentado na atipicidade da conduta, acolhido pelo juiz, gera coisa julgada material, impossibilitando, assim, a instauração da ação penal baseada nos mesmos fatos (RT 850/568)”. (MACHADO, Antônio Alberto. Curso de Processo Penal. 2. ed. Atlas, São Paulo, 2009. p. 33. Guilherme de Souza Nucci: “Arquivamento com fundamento na atipicidade da conduta: nesse caso, é possível gerar coisa julgada material. A conclusão extraída do Ministério Público (órgão que requer o arquivamento), encampada pelo Judiciário (órgão que determina o arquivamento), de se tratar de fato atípico (irrelevante penal) deve ser considerada definitiva. Não há sentido em sustentar que, posteriormente, alguém possa conseguir novas provas a respeito de fato já declarado penalmente irrisório. Nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal federal (...). Arquivamento com base em excludente de ilicitude ou culpabilidade: conforme a situação, em nosso entendimento, gera, igualmente, coisa julgada material. Se o representante do Ministério Público chega à conclusão de não haver crime, por ter o indiciado (ou mero investigado) agido sob alguma excludente de ilicitude (...), bem como situação de exclusão da culpabilidade (...), não há cabimento em se reabrir, futuramente, a investigação a pretexto de terem surgido novas provas. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 15. ed. Forense, São Paulo, 2016, p. 109) 70
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Federal, e, no caso, muito menos, pela formação da coisa julgada material com a decisão de arquivamento por atipicidade.
QUESTÃO-TREINO Nulidades no processo penal Aponte os princípios que regem as nulidades no processo penal e a aplicação de cada um às nulidades relativas e absolutas.
Os princípios que regem as nulidades no Processo Penal são: I) Prejuízo ou instrumentalidade das formas; II) Causalidade; III) Interesse. Segundo o princípio do prejuízo ou instrumentalidade das formas, não se anula um ato se, embora praticado em desacordo com a prescrição legal, atingiu o seu fim, e que não se decreta nulidade sem que tenha havido prejuízo ao réu. A doutrina majoritária entende que o princípio do prejuízo só se aplica às nulidades relativas, e que, nas nulidades absolutas, o prejuízo é presumido. A causalidade determina que a nulidade de um ato precedente acarretará a nulidade dos atos que dele diretamente dependam e aplica-se tanto às nulidades absolutas quanto às relativas. O interesse determina que a parte que deu causa à nulidade não poderá pleitear seu reconhecimento. Aplica-se somente às nulidades relativas, pois as absolutas têm interesse público.71
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BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. São Paulo, Revista dos Tribunas, 2016. p. 796.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Recursos – Admissibilidade Aponte e conceitue quais são os requisitos de admissibilidade ou pressupostos de admissibilidade dos recursos no Processo Penal.
A doutrina tradicional aponta como requisitos ou pressupostos de admissibilidade recursal, de ordem objetiva: o cabimento, que é a previsão legal do recurso; a adequação, que é a utilização da via impugnativa correta para atacar a decisão; a tempestividade, que é a obediência ao prazo previsto em lei a regularidade procedimental, que é o respeito à forma de interposição formal, por petição ou por termo nos autos; e a inexistência de fato impeditivo ou extintivo ao direito de recorrer, que, são a ausência de renúncia e a ausência de preclusão. Os pressupostos de ordem subjetiva são: o interesse em recorrer, que é, mutatis mutandis, a possibilidade jurídica do pedido e a legitimação aos recursos, que é a pertinência subjetiva ao recurso, as partes legitimadas a recorrer, que ordinariamente, são o Ministério Público, o querelante, o réu e seu defensor.
QUESTÃO-TREINO Recursos – Legitimação Márcio matou, mediante facadas, seu desafeto Guga. Denunciado e processada a primeira fase do Júri, o Juiz sumariante entendeu pela inexistência de elementos suficientes para a pronúncia e impronunciou Márcio, em 1º de fevereiro de 2018. O Ministério Público, intimado pessoalmente da decisão em 4 de fevereiro de 2018, não recorreu. Letítia
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Criminis, irmã de Guga, ainda não devidamente habilitada com assistente de acusação, porém, inconformada, no dia 20 de fevereiro, apelou da sentença de impronúncia, requerendo a submissão de Márcio a julgamento em plenário. Com base no caso, responda. A) Tem Letitia Criminis, legitimidade para recorrer? Sob quais efeitos será recebido o recurso? É tempestivo o recurso? B) No processo penal, quais os legitimados recursais ordinários e os especiais?
Respostas: A) Sim. Letitia é legitimada a recorrer. É o que prevê expressamente o art. 598 do Código de Processo Penal, que nos crimes de competência do Tribunal do Júri, se da sentença não for interposta apelação no prazo legal, o ofendido ou o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão poderão interpor apelação. Por expressa disposição legal, o recurso de apelação será recebido apenas no efeito devolutivo, e não terá efeito suspensivo. O recurso também é tempestivo. Apesar do prazo geral para a apelação ser de 5 dias, o parágrafo único do art. 598 estabelece que, para o caso, o prazo é de 15 dias, contados do dia em que terminar o prazo para o Ministério Público. B) O art. 577 do Código de Processo Penal estabelece como legitimados ordinários ou amplos para recorrer, o Ministério Público ou o querelante, o réu, seu procurador ou defensor. Esses, os que têm legitimação ampla. Costuma-se também falar em legitimidade especial, para o ofendido, nas ações penais públicas, dado que não é parte e também o assistente de acusação.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Recursos – “Reformatio in mellius” Clóvis Anthony, tatuador, fez, sem autorização dos pais ou responsáveis, uma tatuagem com o desenho de uma “fadinha” no braço da menor impúbere Joana Dark. A mãe da menina descobriu os fatos e, abominando a tatuagem, foi à Polícia e relatou os fatos. O Promotor de Justiça, recebendo o inquérito, denunciou Clóvis Anthony como incurso no art. 129, §2º, inciso IV do Código Penal (Lesão Corporal gravíssima por deformidade permanente). Clóvis foi condenado a 2 anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída a privativa de liberdade por restritivas de direitos. A defesa de Clóvis não recorreu. Apelou apenas o Ministério Público, pugnando pelo afastamento da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Estarrecido com a condenação de Clóvis e com a ausência de recurso defensivo, Bruno Borja, Desembargador Relator do caso no Tribunal deparou-se com uma condenação injusta, sem recurso defensivo. Com base no problema exposto, responda: A) Em que consistem a proibição da “reformatio in pejus” e a proibição da “reformatio in pejus indireta”? B) Em que consiste e é admitida a chamada “reformatio in mellius” ou “reformatio in pejus para o Ministério Público”?
Respostas: A) A proibição da “reformatio in pejus”, consagrada expressamente no art. 617 do Código de Processo Penal, consiste na impossibilidade de ter o réu sua situação agravada em caso de recurso exclusivo da defesa, isto é, não pode ter o réu sua situação piorada quando apenas a defesa apresentar recurso. Como decorrência da vedação à reformatio in pejus, tem-se que, quando há recurso exclusivo da defesa e o reconhecimento de nulidade do julgamento ou decisão, não poderia
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo uma nova decisão, substituta dessa primeira anulada, ser mais gravosa. Essa, em suma, a vedação à “reformatio in pejus indireta”. B) A “reformatio in mellius” ou “reformatio in pejus para o Ministério Público” consiste na possibilidade de o Tribunal abrandar a pena ou mesmo absolver o réu, quando houver recurso exclusivo da acusação. A doutrina e a jurisprudência dominantes têm o entendimento de que é possível, no bojo do próprio recurso, reconhecer a melhora da situação do réu e até mesmo decretar a absolvição. Parte da doutrina, por outro lado, entende que a acusação não poderia ter sua situação agravada quando há recurso exclusivo da defesa, e, para esses casos, quando houver teratologia ou injustiça na decisão, deve o Tribunal utilizar outros meios, como o Habeas Corpus de Ofício, por exemplo.72
QUESTÃO-ESTUDO Mutatio e Ementadio Sobre os institutos da emendatio libelli e mutattio libelli: a) a qual princípio processual penal estão relacionados; b) defina e explique suas consequências no processo; e c) discorra sobre a aplicabilidade em 2º grau. a) Os institutos em questão são limitados e orientados pelo princípio da correlação (também chamado de princípio da congruência), segundo o qual a sentença judicial deve limitar-se ao fato criminoso exposto na denúncia ou queixa-crime, sob pena de nulidade absoluta.
“Não há dúvidas, no Processo Penal, quanto à proibição da reformatio in pejus para agravar a situação do réu, no seu próprio e único recurso. (...) Mas a mesma tranquilidade não ocorre quando se trata de recurso exclusivo da acusação. Isso porque, na própria redação da parte final do art. 617 CPP, o que se impede expressamente é apenas a agravação da situação do réu, pela via do recurso exclusivo. Duas posições divergentes surgem a partir disso. Uma admite, outra não, a denominada reformatio in mellius (...). Segundo a primeira, em face do princípio da igualdade das partes, também a acusação não pode ter a situação agravada, por intermédio de seu recurso, se não houver impugnação do réu. Ademais, o art. 617, ao referir-se aos arts. 383. 386 e 387, não estaria ditando uma regra geral de proibição à reformatio in pejus, mas trataria apenas de fixas limites às sentenças de desclassificação. Afirma-se, então, que nosso sistema não agasalhou a reformatio in mellius (rectius, reformatio in pejus para o Ministério Público), devendo o Tribunal utilizar instrumentos como o Habeas Corpus de ofício para corrigir em favor do acusado ilegalidades da decisão. (...) Numa segunda linha de entendimento, que é acolhida pela jurisprudência dominante, a situação do réu que não recorreu pode ser melhorada pelo recurso exclusivo da acusação. Militam em prol desse entendimento vários argumentos, desde o favor rei ou favor libertatis – que ditam a regra do art. 617, in fine, CPP apenas para beneficiar a defesa – até princípios como o da simplicidade e da economia processual, pois o mesmo resultado poderia ser obtido por meio do Habeas Corpus ou da revisão criminal. ” (GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO; Antônio Magalhães; SCARANCE FERNANDES, Antônio. Recursos no processo penal. 4. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005. p. 48/49) 72
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo b) Na emendatio libelli (artigos 383 e 418 do Código de Processo Penal73), o magistrado limita-se a corrigir a definição jurídica dada ao fato pelo autor da ação penal. Nessa hipótese, a descrição do fato delituoso - ou seja, a imputação fática -, contida na peça inicial, permanece inalterada. Assim, considerando que o acusado se defende dos fatos, nada obsta que o magistrado profira sentença condenatória com capitulação jurídica diversa, ainda que isso implique na aplicação de pena mais grave. Prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que o momento processual adequado para a realização da emendatio libelli é na sentença, mas há aqueles que defendem a possibilidade de a correta tipificação ocorrer quando do recebimento da inicial acusatória para, por exemplo, permitir a concessão da liberdade provisória ou aplicação de medida despenalizadoras. Na mutatio libelli (artigo 384 do Código de Processo Penal74), por sua vez, há mudança da imputação fática em razão do surgimento, no curso da instrução, de prova de elementar ou circunstância (qualificadoras, privilégios, causas de aumento e de diminuição) não descrita na inicial. Neste caso, necessário se torna o aditamento, que será seguido de manifestação da defesa e refazimento de atos processuais, como o interrogatório. Ressalte-se, por oportuno, que não é necessário o aditamento em razão do acréscimo de circunstância agravante, pois sequer precisam constar da exordial acusatória, nos termos do artigo 385 do Código de Processo Penal75.
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Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. § 1o Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei. § 2o Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos. Art. 418. O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da acusação, embora o acusado fique sujeito a pena mais grave. 74 Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente § 1o Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código. § 2o Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento. § 3o Aplicam-se as disposições dos §§ 1o e 2o do art. 383 ao caput deste artigo. § 4o Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento. § 5o Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá. 75 Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo c) Analisando o disposto no artigo 617 do Código de Processo Penal 76, forçoso concluir que é perfeitamente possível que ocorra emendatio libelli na 2ª instância, desde que respeitado o princípio da reformatio in pejus, ou seja, na hipótese de recurso exclusivo da defesa, ou ainda que haja recurso da acusação, o ponto não seja objeto de questionamento. Assim, é defeso ao Tribunal dar nova definição jurídica ao fato que resulte no agravamento da situação do réu, o que não se limita apenas ao quantum da pena imposta, mas também aos efeitos da condenação decorrente da nova capitulação. Já com relação à mutatio libelli é vedada na 2ª instância, sob pena de verdadeira supressão de instância, tanto que o dispositivo acima citado não faz menção ao artigo 384 do Código de Processo Penal. Aliás, é nesse sentido a Súmula n° 453 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: “Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa”. Importante salientar que nada obsta que o Tribunal aplique o disposto no artigo 384 do Código de Processo Penal em sede de competência originária.
QUESTÃO-TREINO Ações autônomas – Habeas Corpus e Mandado de Segurança Sujão e Sujinho são diretores da “Sujona Mineradora”, empresa do ramo de mineração. Em meados do mês outubro de 2018, por ordem de Sujão e Sujinho, foram despejadas toneladas de detritos de mineração no “Rio da Onça”, que afluía na região onde funcionava a Mineradora. Milhares de peixes morreram. Para a apuração de crime ambiental, foi instaurado inquérito policial. Embrulhão Patronus, advogado da empresa, acreditando na inocência de seus clientes e considerando as possíveis sanções penais a serem aplicadas a eles e à Mineradora, pretende trancar o inquérito policial. Diante da situação exposta, responda: a) Qual o meio cabível, ou os meios cabíveis para o trancamento do inquérito policial? b) Supondo-se que Embrulhão Patronus tenha baseado o pedido de trancamento na ausência de justa causa, responda se o pleito será exitoso, oferecendo um conceito de justa causa.
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Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.
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Resposta: a) Sujinho e Sujão podem ser pacientes e por eles podem ser impetrados Habeas Corpus. Ambos têm legitimidade ativa para a impetração e para figurarem como pacientes. Para a empresa, a doutrina se divide sobre a possibilidade de serem as pessoas jurídicas pacientes em Habeas Corpus. Há quem entenda que é cabível, pois haveria possível restrição à liberdade de ação da pessoa jurídica, nos moldes que é compreendida; e há quem entenda que é incabível, porque não haveria constrangimento ilegal à liberdade de locomoção, que é atributo apenas de pessoas físicas. Nesse sentido, pela inadmissibilidade, já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal77, pois não haveria pena privativa de liberdade e possível constrangimento à liberdade de locomoção. Não obstante, adotado esse entendimento, seria cabível que a empresa figurasse como paciente em Mandado de Segurança para o trancamento do inquérito. b) Não. A impugnação não será exitosa, porque o trancamento de inquérito policial por ausência de justa causa é excepcionalíssimo e só deve ocorrer quando não houver um suporte mínimo de provas ou quando evidente a atipicidade ou, numa ampliação do conceito de justa causa, a existência de qualquer causa que possa resultar em absolvição sumária. Parte da doutrina conceitua a justa causa como o suporte mínimo probatório que deve lastrear toda e qualquer ação penal.78 Por outro lado, há autores, como Gustavo Badaró, que defendem um cotejo conjunto da falta de justa causa, com as hipóteses autorizadoras da absolvição sumária. (art. 397 do CPP)
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STF. 1ª Turma. HC 92.921/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 19/8/2008. BRASILEIRO DE LIMA, Renato. Manual de Processo Penal. Editora Juspodivm. 6. ed. p. 225.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Interdição de Direitos e Medidas de Segurança QUESTÃO-TREINO Conforme previsão contida no art. 97, § 1º do Código Penal, o prazo mínimo de duração das medidas de segurança de internação ou tratamento ambulatorial é de 1 a 3 anos. Já a desinternação ou a liberação dependem do estado de periculosidade criminal, verificado por perícia médica (art. 97, p 2º, CP), o que equivale a dizer, um acontecimento futuro e imprevisível. Nesse sentido, o prazo máximo das medidas de segurança é indeterminado. Considerando que a duração indeterminada das medidas de segurança significa, muitas vezes, o esquecimento de seres humanos em hospitais psiquiátricos e a sua privação da liberdade de forma perpétua, os Tribunais Superiores enfrentaram essa questão. Dessa forma, qual a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça acerca do prazo máximo da medida de segurança?
R: O STF possui julgados afirmando que a medida de segurança deverá obedecer a um prazo máximo de 30 anos, fazendo uma analogia ao art. 75 do Código Penal e à vedação constitucional das penas de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, CF88). Nesse sentido, “EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. RÉU INIMPUTÁVEL. MEDIDA DE SEGURANÇA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PERICULOSIDADE DO PACIENTE SUBSISTENTE. TRANSFERÊNCIA PARA HOSPITAL PSIQUIÁTRICO, NOS TERMOS DA LEI 10.261/2001. WRIT CONCEDIDO EM PARTE. I – Esta Corte já firmou entendimento no sentido de que o prazo máximo de duração da medida de segurança é o previsto no art. 75 do CP, ou seja, trinta anos. Na espécie, entretanto, tal prazo não foi alcançado. II - Não há falar em extinção da punibilidade pela prescrição da medida de segurança uma vez que a internação do paciente interrompeu o curso do prazo prescricional (art. 117, V, do Código Penal). III – Laudo psicológico que reconheceu a permanência da periculosidade do paciente, embora atenuada, o que torna cabível, no caso, a imposição de medida terapêutica em hospital psiquiátrico próprio. IV – Ordem concedida em parte para determinar a transferência do paciente para hospital psiquiátrico que disponha de estrutura adequada ao seu tratamento, nos termos da Lei 10.261/2001, sob a supervisão do Ministério Público e do órgão judicial competente. (HC 107432, Relator(a):
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 24/05/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-110 DIVULG 08-06-2011 PUBLIC 09-06-2011 RMDPPP v. 7, n. 42, 2011, p. 108-115 RSJADV set., 2011, p. 46-50)79
Procedimento comum e procedimento do Júri
QUESTÃO-TREINO Recebimento da denúncia À respeito da decisão que recebe a denúncia no Processo Penal, responda: a) quais são as hipóteses previstas para rejeição da denúncia? b) qual o recurso cabível contra a decisão que rejeita da denúncia pela prática de crimes que seguem o procedimento comum previsto no Código de Processo Penal? E para a hipótese de rejeição de denúncia pela prática de crimes de menor potencial ofensivo? c) Qual medida cabível em face da decisão que recebe denúncia?
Respostas: a) Art. 395, do CPP: A denúncia ou queixa será rejeitada quando: for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.
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CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Tempo de duração da medida de segurança. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 30/09/2018 O STJ, por sua vez, pacificou entendimento mais benéfico ao autor do crime com a edição da Súmula 527: “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado”. http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=@num=%27527%27
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo b) Na hipótese de rejeição da denúncia de crimes que seguem procedimento comum, caberá interposição de Recurso em Sentido Estrito 581, I CPP (RESE). Já na hipótese de rejeição de denúncia rejeição da denúncia de crimes de menor potencial ofensivo, caberá apelação (Art. 82; Lei nº 9099/95). c) Não há recurso previsto em lei contra decisão que recebe a denúncia, no entanto, se for o caso, caberá habeas corpus.
1) Leis relacionadas ao tema Código de Processo Penal 2) Súmulas dos Tribunais superiores STF Súmula 712 “É nula a decisão que determina o desaforamento sem a audiência da defesa”. Súmula 713 STF - O efeito devolutivo da apelação contra decisões do júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição. STF – Súmula Vinculante nº11 “Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do estado” STJ Súmula: 191 A pronuncia e causa interruptiva da prescrição, ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime. STJ Súmula: 21 Pronunciado o réu, fica superada a alegação do constrangimento ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução. 3) Jurisprudência PLENITUDE DE DEFESA NO JÚRI DEFESA - GRAVIDADE DO CRIME. Quanto mais grave o crime, deve-se observar, com rigor, as franquias constitucionais e legais, viabilizando-se o direito de defesa em plenitude. PROCESSO PENAL - JÚRI - DEFESA. Constatado que a defesa do acusado não se mostrou efetiva, impõe-se a declaração de nulidade dos atos praticados no processo, proclamando-se insubsistente o veredicto dos jurados. JÚRI - CRIMES CONEXOS. Uma vez afastada a valia do júri realizado, a alcançar os crimes conexos, cumpre a realização de novo julgamento com a abrangência do primeiro. Informativo 706 do STF
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Incomunicabilidade dos jurados STF AO 1.047. Não se constitui em quebra da incomunicabilidade dos jurados o fato de que, logo após terem sido escolhidos para o Conselho de Sentença, eles puderam usar telefone celular, na presença de todos, para o fim de comunicar a terceiros que haviam sido sorteados, sem qualquer alusão a dados do processo. Certidão de incomunicabilidade de jurados firmada por oficial de justiça, que goza de presunção de veracidade. Desnecessidade da incomunicabilidade absoluta. Precedentes. Nulidade inexistente. Ação rescisória e soberania dos veredictos HC 89544 STF. EMENTA: AÇÃO PENAL. Homicídio doloso. Tribunal do Júri. Três julgamentos da mesma causa. Reconhecimento da legítima defesa, com excesso, no segundo julgamento. Condenação do réu à pena de 6 (seis) anos de reclusão, em regime semiaberto. Interposição de recurso exclusivo da defesa. Provimento para cassar a decisão anterior. Condenação do réu, por homicídio qualificado, à pena de 12 (doze) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, no terceiro julgamento. Aplicação de pena mais grave. Inadmissibilidade. Reformatio in peius indireta. Caracterização. Reconhecimento de outros fatos ou circunstâncias não ventilados no julgamento anterior. Irrelevância. Violação consequente do justo processo da lei (due process of law), nas cláusulas do contraditório e da ampla defesa. Proibição compatível com a regra constitucional da soberania relativa dos veredictos. HC concedido para restabelecer a pena menor. Ofensa ao art. 5º, incs. LIV, LV e LVII, da CF.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Inteligência dos arts. 617 e 626 do CPP. Anulados o julgamento pelo tribunal do júri e a correspondente sentença condenatória, transitada em julgado para a acusação, não pode o acusado, na renovação do julgamento, vir a ser condenado a pena maior do que a imposta na sentença anulada, ainda que com base em circunstância não ventilada no julgamento anterior. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA NO JÚRI
ELOQUÊNCIA ACUSTÓRIA ou EXCESSO DE ACUSAÇÃO
ADIAMENTO DO PLENARIO DO JÚRI POR AUSÊNCIA DE TESTEMUNHA
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4) Breves comentários sobre a matéria - O instituto do júri é previsto no art. 5º, XXXVIII da CF/88. - O tribunal do júri é composto por um juiz presidente + 25 jurados, dos quais 07 irão compor o Conselho de Sentença. O MP atua perante o Tribunal do Júri, mas não pode ser apontado como seu componente, até porque o MP não faz parte do poder judiciário. (artigo 447, CPP). - Garantias constitucionais do Júri: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; - Possibilidade de Revisão Criminal contra decisão do Júri: Diz-se que é possível, uma vez que tanto a revisão criminal quanto a soberania dos veredictos são garantias instituídas em prol da liberdade do acusado, logo não há que se falar em incompatibilidade. Prevalece na doutrina, que na revisão criminal o Tribunal faz tanto juízo rescindente quanto o juízo rescisório, vale dizer, o veredicto é totalmente substituído pela decisão dos magistrados. - Non reformatio in pejus x Tribunal do Júri Como se sabe, de acordo com o princípio da non reformatio in pejus direta, a pena não pode ser agravada em recurso exclusivo da defesa (incluindo erros materiais, exemplo: erro na soma da condenação). Art. 617 CPP. - Entretanto, na non reformatio in pejus INDIRETA, em recurso exclusivo da defesa, caso o tribunal anule a decisão de primeira instância, o acusado não poderá ser prejudicado quando da prolação de nova sentença condenatória. E no júri? O tribunal do júri condena o acusado a uma pena, a defesa entra com recurso e o tribunal ad quem anula a sentença (juízo rescindente), para que seja proferida outra no júri (juízo rescisório). Este novo júri pode agravar a pena? Doutrina: nada impede que os jurados reconheçam qualificadoras ou causas de aumento de pena que não foram reconhecidas no primeiro julgamento, por força
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo da soberania dos vereditos. Porém, se a decisão dos jurados no segundo julgamento for idêntica à decisão anterior (exemplo: homicídio antes e homicídio agora...), o juiz presidente não poderá agravar a pena do acusado, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus indireta. - Competência do Júri crimes dolosos contra a vida. - Delitos envolvendo a morte dolosa de pessoa que NÃO são julgados pelo júri: 1) Latrocínio (Súmula 603 do STF); 2) Extorsão qualificada pelo resultado morte; 3) Ato infracional; 4) Foro por prerrogativa de função previsto na CF/88 (pelo princípio da especialidade prevalece sobre o júri). Súmula Vinculante 45. 5) Genocídio. É crime da competência de juiz singular, pois o bem jurídico tutelado não é a VIDA, mas sim a existência de um grupo nacional, étnico ou religioso. OBS: Se o genocídio for cometido mediante morte de membros do grupo, haverá concurso formal impróprio de delitos (homicídio + genocídio), caso no qual o delito de homicídio será julgado em um tribunal do júri, que exercerá força atrativa em relação ao crime conexo de genocídio. RE 351487. 6) Militar da ativa que mata militar da ativa, mesmo que não estejam em serviço. STF: Nesse caso, atinge-se indiretamente a disciplina, base das instituições militares (CC 7.071). 7) Civil que mata militar das Forças Armadas em serviço (STF HC 91.003). Entendeu-se que a competência da Justiça Militar, também prevista na CF, afasta a competência do júri. Se o militar for dos estados, o civil é julgado pelo tribunal do júri, eis que, como visto, a JME não julga civis. 8) Lei 7.170/83, art. 29 – crime por motivação política (Ex.: Caso Bolsonaro). - Júri tem procedimento bifásico/escalonado: Sumário da Culpa e Juízo da Causa. - Judicium Accusationis (Sumário da culpa). 1.1) Atuação exclusiva do Juiz sumariante; 1.2) Tem início com o oferecimento da denúncia/queixa. OBS: A queixa crime ocorre no júri quando: - Ação penal privada subsidiária da pública ou; - Litisconsórcio ativo entre MP no crime de ação penal pública e querelante no crime de ação penal privada. 1.3) Termina com a: A) pronúncia (Recurso: RESE); B) impronúncia (Recurso: APELAÇÃO - (Trata-se de decisão interlocutória mista terminativa; Interlocutória: Ocorre em meio à marcha processual; Mista: Coloca fim a uma fase procedimental; Terminativa: Caso não haja recurso do MP, ou este seja improvido, põe fim ao processo); C) desclassificação (Recurso: RESE) ou D) absolvição sumária (Recurso: APELAÇÃO). - Judicium Causae: 2.1) Juiz-presidente + jurados. 2.2) Início: Antes da lei 11.689 era com o oferecimento do libelo acusatório. Após a lei 11.689, o libelo foi suprimido, portanto o início ocorre com a preparação do processo para julgamento em plenário. 2.3) Termina com o julgamento no plenário do júri.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Questão-Treino Julgamento em sala secreta O julgamento em “sala secreta” (sala especial) viola o PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE dos atos processuais?
Resposta: Não. Conforme o art. 93, IX da CR a publicidade é mitigada em benefício da imparcialidade dos jurados. Nesse sentido, também o art. 5º, LX, que permite a relativização da publicidade quando em prol do interesse social. CPP Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; CF Art. 5º. LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; CP Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de justiça.
Questão-Treino Aplicação do in dubio pro societate É possível aplicar o princípio do in dubio pro societate, no caso de julgamento de pronúncia no procedimento do Júri?
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Resposta: 1ª corrente: a maioria da doutrina e da jurisprudência ainda entende que se aplica o princípio do in dubio pro societate, exigindo-se, no entanto, que seja interpretado com reservas uma vez que é necessária a presença de indícios mínimos de autoria. Nesse sentido: Távora e Alencar: “Note-se que vigora, nesta fase, a regra do in dubio pro societate: existindo a possibilidade de se entender pela imputação válida do crime contra a vida em relação ao acusado, o juiz deve admitir a acusação, assegurando o cumprimento da Constituição, que reservou a competência para o julgamento de delitos dessa espécie para o tribunal popular. (...) Todavia, o in dubio pro societate deve ser aplicado com prudência, para evitar que os acusados sejam pronunciados sem um suporte probatório que viabilize o exame válido da causa pelos jurados.” (Curso de Direito Processual Penal. 7ª ed., Salvador: Juspodivm, p. 843). Na primeira fase do procedimento do tribunal do júri prevalece o princípio in dubio pro societate, devendo o magistrado, na decisão de pronúncia, apenas verificar a materialidade e a existência de indícios suficientes de autoria ou participação (art. 413 do CPP). Assim, a verificação do dolo eventual ou da culpa consciente deve ser realizada apenas pelo Conselho de Sentença. (...) REsp 1.279.458-MG, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/9/2012. 2ª corrente: afirma que, para a pronúncia, exigem-se realmente apenas indícios (e não provas) e que, em caso de dúvida, a regra é a remessa para o Tribunal Popular decidir. No entanto, defende que esta regra não significa que tenhamos adotado o princípio do in dubio pro societate. É o que defende a doutrina mais moderna. Por todos, cite-se Pacelli e Fischer: “Há entendimento jurisprudencial e doutrinário no sentido de que, nessa fase procedimental, a submissão ao Tribunal Popular decorreria do princípio do in dubio pro societate. Compreendemos que, num sistema orientado por uma Constituição garantista, não poderia em sua essência o princípio invocado servir como supedâneo para a submissão ao Tribunal Popular. De fato, a regra é a remessa para julgamento perante o juízo natural nessas circunstâncias (eventual dúvida). Mas não pelo in dubio pro societate. Parece-nos que esse é o fundamento preponderante: como regra, apenas o Tribunal do Júri é quem pode analisar e julgar os delitos dolosos
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo contra a vida (também os conexos – art. 78, I, CPP). É dizer, o juiz natural para a apreciação dos delitos contra a vida é o Tribunal do Júri, a quem, como regra (salvo nas hipóteses de absolvição sumária ou desclassificação), deverá ser regularmente encaminhado o processo.” (Comentários ao Código de Processo Penal e Sua Jurisprudência. São Paulo: Atlas, 2012, p. 849).
Questão-Treino Pronúncia e Júri Durante os debates, na sessão de julgamento plenário do júri, é possível a leitura da decisão de pronúncia?
Resposta: Alguns doutrinadores dizem que jamais pode ser feita essa leitura. Outros doutrinadores, no entanto, dizem que é possível fazer a leitura, mas desde que com moderação (sem usar como argumento de autoridade). Argumento dessa corrente: O próprio jurado já tem essa decisão em mãos.
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Procedimentos especiais no Processo Penal
QUESTÃO-ESTUDO Procedimentos especiais Aponte as diferenças entre o procedimento comum ordinário e os seguintes procedimentos especiais: a) crimes de responsabilidade de funcionários públicos b) crimes contra a honra c) crimes contra a propriedade imaterial Respostas: a) crimes de responsabilidade de funcionários públicos
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Este procedimento especial se aplica aos crimes previstos nos arts. 312 a 326 do CP (RHC 43978/SP, Jorge Mussi, j. 05.08.14). Entretanto, alguns desses crimes são de competência do JECRIM e, no JECRIM, seguirão o rito da Lei 9.099/95. A grande diferença para o procedimento comum ordinário é que o juiz mandará notificar o funcionário público para a apresentação de defesa preliminar, no prazo de 15 dias. Apenas após a defesa preliminar, o magistrado analisará se receberá ou rejeitará a denúncia ou queixa. Em caso de recebimento, mandará citar o réu já de acordo com o rito comum ordinário, que será seguido até o final do processo. O STJ defende que quando a ação penal é instruída por inquérito policial, é desnecessária a defesa preliminar – Súmula 330, STJ: “É desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial.” Apesar de ser matéria sumulada pelo STJ, o STF entende que é sempre obrigatória a defesa preliminar, sob pena de nulidade relativa – RHC 128.109/MG, Teori Zavascki, j. 08.09.15 Se o acusado não for mais funcionário público, o rito especial não será seguido – RHC 31752/MT, Marco Aurélio Bellizze, j. 27.03.12 b) crimes contra a honra Este procedimento especial se aplica aos crimes previstos nos arts. 138 a 140 do CP, exceto os crimes suscetíveis ao JECRIM. A principal distinção para o procedimento comum é a existência de uma audiência de reconciliação anterior ao recebimento da queixa ou denúncia. Entretanto, se o juiz entender que é caso de rejeição liminar da peça acusatória, não precisa marcar a audiência – REsp 650.355/PE, Gilson Dipp, j. 07.10.04. A ausência imotivada do querelante na audiência de reconciliação não gera perempção, pois não há ainda ação penal e significa simplesmente que ele não deseja reconciliar – REsp 605.871/SP, Felix Fischer, j. 15.04.04 É possível, ainda, o pedido de explicações, que tem natureza cautelar e não afeta o prazo decadencial. Entretanto, só é cabível quando houver situações de equivocidade, ambiguidade ou dubiedade na fala – ED Pet 2740/DF, Celso Mello, 26.03.03. Por fim, há a previsão de oposição de exceção da verdade, na qual o exepto responde em 2 dias e é julgada junto com a ação principal. O juiz poderá rejeitar desde logo a exceção quando for manifestamente improcedente, ainda que se trate de caso envolvendo prerrogativa de função – Rcl 7391/MT, Laurita Vaz, j. 19.06.13.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Nos casos de calúnia em que o querelante seja detentor de prerrogativa de função, a exceção é processada no 1º grau e julgada na competência originária. c) crimes contra a propriedade imaterial Este procedimento especial se aplica aos crimes previstos nos art. 184 do CP e os dispostos na Lei 9.610/98. A maior diferença deste rito está exatamente antes do início da ação penal, em medidas preliminares. A busca e apreensão autorizada pelo magistrado deve ser realizada por 2 peritos por ele nomeados, que verificarão a existência de fundamento para a apreensão e terão 3 dias para a apresentar o laudo, que deve ser homologado pelo juiz. A denúncia ou queixa não será recebida se não estiver acompanhada do laudo pericial, exame de corpo de delito, se tratando de verdadeira condição de procedibilidade da ação penal. Ainda, o querelante possui o prazo decadencial de 30 dias da homologação do laudo para a propositura da ação penal. Após esta, o processo segue o procedimento comum ordinário.
QUESTÃO-TREINO Crimes praticados por funcionário público Acerca do procedimento especial quanto aos crimes afiançáveis de responsabilidade de funcionário público, previsto nos artigos 513 a 518 do CPP, responda: a) Qual a principal especificidade do mencionado rito? b) Se quando do oferecimento da denúncia o acusado não for mais funcionário público, haverá aplicação do rito?
Respostas: a) A principal peculiaridade do rito consiste na notificação do acusado, a ser realizada antes do recebimento da denúncia para apresentar em
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 15 dias defesa preliminar. A defesa que será instruída com documentos e justificações, a teor do artigo 514, do CPP. b) Não haverá incidência do rito, na medida em que o sentido dele é a proteção especial que a Administração Pública merece. STJ RHC 31.752/MT.
QUESTÃO-TREINO Lei 9.099 A transação penal é um acordo celebrado entre o Ministério Público (se pública a ação penal) ou o querelante (se privada a ação penal) - e o sujeito apontado como autor do delito. Por meio desse instituto, antes de oferecida a denúncia, se propõe ao investigado que aceite cumprir algumas condições ou pagar uma multa e, em troca disso, a ação penal não é proposta e o processo criminal sequer se inicia. Está previsto no art. 76, da Lei 9.099/95. Acerca da transação penal, responda: a) A homologação da transação penal faz coisa julgada material? b) Os efeitos do artigo 91, do Código Penal, aplicam-se na transação penal?
Respostas: a) Nos termos da Súmula Vinculante 35, do Supremo Tribunal Federal, a homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material. Uma vez descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial. b) Não. As consequências geradas pela transação penal são apenas aquelas decorrentes do acordo estipulado de forma consensual. Com efeito, em se tratando de transação penal a sentença não é condenatória, mas meramente homologatória do acordo, não havendo qualquer
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo juízo de valor quanto a responsabilização do aceitante. – STF – Plenário – RE 795.567/PR – Ministro Teori Zavascki – Julgado em 28/05/2015
Execução Penal QUESTÃO-TREINO Livramento condicional, falta grave e extinção da punibilidade Fulano teve deferido o livramento condicional. Contudo, praticou novo crime no gozo do benefício. Ocorre que o magistrado não sustou cautelarmente o livramento condicional, no momento da notícia da prática de crime, o fazendo apenas após a data prevista para o término de cumprimento de pena. Discorra, a partir do entendimento do STJ a solução para o caso concreto.
O artigo 145, da Lei de Execução Penal dispõe que: Praticada pelo liberado outra infração penal, o juiz deverá suspender o curso do livramento condicional, cuja revogação, dependerá de decisão final. Entretanto, referido dispositivo legal não pode ser lido de forma isolada, conjugando-se a sua leitura com os artigos 89 e 90 do Código Penal disciplinando que se até o término, o livramento não é revogado, extingue-se a pena privativa de liberdade. O STJ pacificou o entendimento no sentido de que a sustação cautelar deve ocorrer antes do termo final de cumprimento da reprimenda, sob pena de ser declarada a extinção da punibilidade. (Súmula 617) Assim, se não houver a sustação cautelar e ocorrer o término de cumprimento de pena, a solução será a declaração da extinção da punibilidade do agente, com fundamento no integral cumprimento da reprimenda.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Presunção de inocência e execução penal Há compatibilidade entre o princípio da presunção de inocência e início de execução da pena?
Resposta: O STF no julgamento das ADC’s 43 e 44, em sede controle concentrado de constitucionalidade se posicionou no sentido de que a previsão contida no artigo 283 do Código de Processo Penal não viola o princípio da presunção de inocência. Entendeu a Corte Constitucional pela possibilidade de início de execução da pena após o esgotamento das instâncias ordinárias, não havendo necessidade de transito em julgado da condenação para iniciar a execução provisória. Trata-se de mudança de entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, que antes do julgamento das ações declaratórias, vedava a execução provisória antes do transito em julgado da condenação. Dessa forma, a execução provisória da pena não viola o princípio da presunção de inocência, conforme atual posicionamento do STF. QUESTÃO-TREINO Prisão domiciliar e regime semiaberto A prisão domiciliar prevista no artigo 117, da LEP pode ser aplicada nas hipóteses de regime semiaberto? Justifique com base na jurisprudência do STJ.
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Dispõe o artigo 117, da Lei de Execução Penal que somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular. Contudo, apesar da dicção legal prever expressamente a aplicabilidade do instituto às hipóteses de regime aberto, o STJ vem relativizando o entendimento, incidindo excepcionalmente a prisão domiciliar no regime semiaberto ou fechado, se a peculiaridade do caso concreto demonstrar a sua imprescindibilidade. Dessa forma, o STJ vem entendendo pela possibilidade de aplicação da prisãoalbergue domiciliar nas hipóteses de condenados acometidos de graves enfermidades, na impossibilidade de tratamento adequado no próprio estabelecimento prisional, bem como quando houver inexistência de vagas no regime adequado.
QUESTÃO-TREINO Prisão domiciliar para mulheres Disserte sobre a prisão domiciliar para mulheres a partir do entendimento do HC coletivo 143.641. a) Discorra sobre a possibilidade nas hipóteses de execução provisória; b) Sua aplicabilidade na execução definitiva.
Resposta: Como forma de corrigir o déficit estrutural do sistema carcerário e homenagear o Estatuto da Primeira Infância, o Ministro Ricardo Lewandowski concedeu habeas corpus coletivo em favor de todas as mulheres presas preventivamente substituindo-se a constrição cautelar pela prisão domiciliar,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no artigo 319, do Código de Processo Penal. Vale notar, que a concessão abarca todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, bem como as adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas que se encontrem na mesma situação. Para a incidência desta forma de prisão domiciliar os delitos por elas praticados não podem ter sido cometidos mediante violência ou grave ameaça, ou contra seus descendentes. O TJ/SP vem decidindo no sentido de que a substituição da prisão provisória pela domiciliar nestas hipóteses somente é aplicável nas hipóteses de prisão preventiva, não incidindo na execução provisória e tampouco na definitiva, haja vista que há previsão de regramento próprio de prisão domiciliar na Lei de Execução Penal.
Breves comentários Execução das medidas de segurança. O artigo 96, do Código Penal dispõe a respeito das espécies de medida de segurança: I- internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico; II – tratamento ambulatorial. Por sua vez, no artigo 97, do Código Penal há a previsão no sentido de que se o delito é apenado com reclusão, estará sujeito o inimputável a medida de segurança de internação, e se o delito for apenado com detenção incidirá o tratamento ambulatorial. A internação, ou o tratamento ambulatorial serão fixados por prazo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada por perícia a cessação da periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de um a três anos. Dispõe o artigo 175, da Lei de Execução Penal que a cessação da periculosidade será averiguada no fim do prazo mínimo de duração da medida de segurança pelo exame das condições pessoais do agente. Impende ressaltar, que o artigo 176, da Lei de Execução Penal prevê que a qualquer tempo, ainda no decorrer do prazo mínimo da duração da medida de segurança, poderá o juiz da execução diante de requerimento fundamentado do Ministério Público ou do interessado, seu procurador ou defensor, ordenar a realização de exame para se verificar a cessação da periculosidade. O STJ vem entendendo no sentido de que a execução da medida de segurança tem de ter sido iniciada para a incidência da previsão contida no artigo 176, da Lei de Execução Penal.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Modalidades de medida de segurança A dicção do artigo 97, do Código Penal, no sentido de que crimes apenados com reclusão aplica-se medida de segurança na modalidade de internação e detenção tratamento ambulatorial, atende a parâmetros rígidos?
Resposta: A previsão legislativa do artigo 97, do Código Penal é no sentido de que se o crime for apenado com reclusão deverá ser aplicada a medida de segurança na modalidade de internação, e caso venha a ser apenado com detenção caberá tratamento ambulatorial. O STJ vem entendendo pela rigidez do sistema, como regra. Porém, em hipóteses excepcionais tem admitido a incidência de tratamento ambulatorial para delitos punidos com pena de reclusão, caso a conduta praticada seja de menor gravidade, como por exemplo um furto simples, em homenagem ao princípio da proporcionalidade.
QUESTÃO-TREINO Prescrição e medida de segurança Discorra a respeito da possibilidade da incidência do instituto da prescrição nas medidas de segurança.
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Resposta: A matéria é bem controvertida na doutrina e jurisprudência. Uma primeira corrente é no sentido da imprescritibilidade das medidas de segurança. Este posicionamento não vem prevalecendo por ofensa à previsão contida no artigo 5º, inciso XLVII, da Constituição Federal que veda as penas de caráter perpétuo. Há um segundo entendimento que reza pela aplicação do artigo 75, do Código Penal, ou seja, que deveria incidir o limite máximo de 30 anos. Também não é majoritário. Por fim, tem prevalecido o entendimento de que a prescrição da medida de segurança deve ser calculada pelo máximo da pena cominada ao delito cometido pelo agente, é o que se extrai do teor da súmula 527 do STJ: “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado”.
QUESTÃO-TREINO Detração e medidas de segurança Aplica-se o instituto da Detração às Medidas de Segurança?
Resposta: O instituto da detração pode ser conceituado com o cômputo na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, do tempo de prisão provisória. Dispõe o artigo 42, do Código Penal que: computam-se na pena privativa de liberdade e na medida de segurança o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação. O STJ vem entendendo pela possibilidade de detração nas medidas de segurança. Contudo, é inviável a aplicação do instituto em relação aos crimes cometidos posteriormente à custódia cautelar.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Regimes e Autorizações de Saída O Juízo da Execução Penal da Comarca “Y”, analisando os diversos pedidos de concessão de benefícios, considerando a morosidade do sistema judicial e buscando simplificar a concessão das Saídas Temporárias, deferiu pedido de saída temporária “I” para o recluso “X”, e, para as demais 4 saídas do ano, delegou à autoridade administrativa do presídio a concessão das benesses, sem a necessidade de nova análise pormenorizada de cada uma das demais saídas pelo Juiz, tampouco pelo Ministério Público. Efetuou o magistrado, pois, a chamada “calendarização das saídas temporárias” ou “saídas temporárias automatizadas”, fixando a data para cada uma delas. a) Quais os casos de concessão e quais os requisitos legais para as saídas temporárias? b) É aceita a chamada “concessão programada de saídas temporárias” ou “calendarização” das saídas?
Resposta: a) Aplicável aos condenados em regime semiaberto, a saída temporária, em que não há vigilância direta, se dá nos casos de visita à família, frequência a curso educacional e atividades que concorram para o retorno ao convívio social. A concessão é feita por ato motivado do Juiz da Execução, ouvido o Ministério Público e a Administração Penitenciária e exige do condenado: comportamento adequado, cumprimento mínimo de 1/6 da pena para o primário e um quarto para o reincidente e que o benefício seja compatível com os objetivos da pena. (Artigos 122 e 123 da Lei de Execução Penal) b) Sim. Embora haja texto expresso de lei e entendimento sumulado (520 do STJ) no sentido de que a saída temporária é ato jurisdicional insuscetível de
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo delegação à autoridade administrativa, o STF e o STJ firmaram entendimento no sentido da possibilidade da fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único, observadas as hipóteses de revogação automática do benefício. Em recursos repetitivos, o STJ estabeleceu que é recomendável que cada saída seja precedida de decisão judicial motivada, entretanto, se a deficiência e a morosidade estatal atrapalharem a fruição de direito subjetivo do apenado, deve ser reconhecida, excepcionalmente, a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias.80
QUESTÃO-TREINO Saídas temporárias – Número de saídas, intervalo e prazo de duração Na Execução Penal, entre os benefícios, são previstos alguns que têm o escopo de atender aos fins de ressocialização do condenado à sociedade. Entre eles, as Autorizações de Saída, que compreendem Permissões de Saída e Saídas Temporárias. a) Estabeleça os conceitos, requisitos e diferenças entre as Saídas Temporárias e Permissões de Saída. b) É possível, no caso das Saídas temporárias, a concessão de mais saídas que o número fixo previsto em lei?
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Para fins de recurso repetitivo, o STJ firmou duas teses que sintetizam o raciocínio acima exposto: Primeira tese: É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso seja precedida de decisão judicial motivada. Entretanto, se a apreciação individual do pedido estiver, por deficiência exclusiva do aparato estatal, a interferir no direito subjetivo do apenado e no escopo ressocializador da pena, deve ser reconhecida, excepcionalmente, a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único, observadas as hipóteses de revogação automática do art. 125 da LEP. Segunda tese: O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado, obrigatoriamente, pelo Juízo das Execuções, não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios. STJ. 3ª Seção. REsp 1.544.036-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/9/2016 (recurso repetitivo) (Info 590). (Fonte: Dizer o Direito)
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Resposta: a) As permissões de saída são garantidas aos condenados em regime fechado ou semiaberto e aos provisórios, mediante escolta, quando houver falecimento ou doença grave de cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão ou necessidade de tratamento médico. São concedidas pelo Diretor do estabelecimento e terão duração necessária à finalidade. Já as saídas temporárias, aplicáveis somente aos condenados em regime semiaberto, sem vigilância direta, se dão nos casos de visita à família, frequência a curso educacional e atividades que concorram para o retorno ao convívio social. A concessão se dá por ato motivado do Juiz da Execução, ouvido o Ministério Público e a Administração Penitenciária e exige: comportamento adequado; cumprimento de 1/6 da pena para o primário e um quarto para o reincidente; e que o benefício seja compatível com os objetivos da pena. (Artigos 120 a 123 da LEP) b) A saída temporária será concedida por prazo não superior a 7 dias e renovada por mais 4 vezes durante o ano. São, portanto, 5 saídas por ano, num total de 35 dias. A LEP garante que nos casos de saída para frequência a curso profissionalizante, o tempo será o necessário ao cumprimento das atividades discentes. Para outras saídas, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento em recursos repetitivos, no sentido de que, respeitado o limite anual de 35 dias, é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração.81
Prisão Temporária
1) Leis relacionadas ao tema Lei nº 7.960/89; Lei nº 8.072/90; Código de Processo Penal (art. 283).
Breves comentários
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Respeitado o limite anual de 35 dias, estabelecido pelo art. 124 da LEP, é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração. STJ. 3ª Seção. REsp 1.544.036-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/9/2016 (recurso repetitivo) (Info 590). (Dizer o Direito
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A prisão temporária é espécie de prisão provisória cabível durante a fase de investigação, sendo decretada pelo Juiz, após representação da autoridade judicial ou de requerimento do membro do Ministério Público. Prazo máximo: a regra é de prazo máximo de 5 dias, prorrogável, apenas uma vez, por igual período (Art. 2º). Nos crimes previstos na Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), o prazo máximo será de 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias (art. 2º, §4º, da referida lei). Em ambos casos, para que haja prorrogação do prazo máximo exige-se a presença de extrema e comprovada necessidade. Requisitos (art. 1º): os requisitos para a sua decretação são: I - quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; II - quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade; III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2°); b) seqüestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1° e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°); e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); (Vide Decreto-Lei nº 2.848, de 1940) g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); (Vide Decreto-Lei nº 2.848, de 1940) h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único); (Vide Decreto-Lei nº 2.848, de 1940) i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1°); j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285); l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 2.889, de 1° de outubro de 1956), em qualquer de sua formas típicas; n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro de 1976); o) crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo p) crimes previstos na Lei de Terrorismo. (Incluído pela Lei nº 13.260, de 2016)
Necessário destacar que para a decretação da prisão temporária exige-se a presença dos requisitos I ou II, em qualquer caso devendo estar sendo investigado quaisquer dos crimes previstos no rol taxativo previsto no inciso III – assim, poderá ser decretada quando cumulados os incisos I e III, II e III ou todos. Cuidado: a Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90) traz outro rol taxativo de delitos que também se submetem à prisão temporária, conforme o art. 2º, §4º, da referida lei82.
QUESTÃO-TREINO É correto afirmar que o prazo da prisão temporária, ainda que prorrogada, jamais excederá a 10 (dez) dias? (VUNESP – TJM – Adaptada).
Resposta: A afirmativa está incorreta. A regra é a de que o prazo da prisão temporária é de 5 dias, prorrogáveis por igual período (Art. 2º da Lei nº 7.960/89). Entretanto, a Lei dos Crimes Hediondos prevê prazo diferenciado para a prisão temporária, estabelecendo como limite o prazo de 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias (art. art. 2º, §4º, da Lei 8.072/90).
QUESTÃO-TREINO Tendo em vista a legislação vigente, é cabível a decretação de prisão temporária a crime culposo ou contravenção penal?
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Ver o item 13 do Edital.
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Resposta: Não. A prisão temporária apenas poderá ser aplicada aos crimes do rol taxativo da Lei de Prisão Temporária ou aos crimes da Lei de Crimes Hediondos, não havendo, em nenhum dos referidos diplomas, previsão de crime culposo ou de contravenção penal que admita a decretação de prisão temporária.
Crimes de Falências QUESTÃO-TREINO Efeitos da condenação O artigo 181 da Lei 11.101/95 (Lei de Falência e Recuperação Judicial) prevê os três efeitos da condenação por crime previsto na mencionada lei. Quais são eles?
Resposta: De acordo com a Lei 11.101/95, uma vez condenado, o sentenciado sofrerá os seguintes efeitos: inabilitação para o exercício de atividade empresarial; impedimento para o exercício em cargo ou função de conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas à Lei 11.101/95; e
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo impossibilidade de gerir empresas por mandato ou por gestão de negócios. Vale ressaltar que os efeitos não são automáticos, ou seja, devem ser declarados na sentença, e perdurarão até 5 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes por meio da reabilitação penal. (Artigo 181 da Lei 11.101/95)
Maria da Penha83
1) Leis relacionadas ao tema: Lei 11.340/06 – Lei Maria da Penha. Destacando, o artigo 10-A e 24-A.
2) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores
Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. Súmula 588 do STJ: A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Súmula 589 do STJ: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas Súmula 600 do STJ: Para configuração da violência doméstica e familiar prevista no artigo 5º da lei 11.340/2006, lei Maria da Penha, não se exige a coabitação entre autor e vítima
Breves comentários84
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Item em parte desenvolvido com base na doutrina de: CUNHA, Rogério Sanches, Pinto Ronaldo Batista, SOUZA, Renee do Ó. Leis Penais Especiais Comentadas- artigo por artigo. Salvador: Editora JusPodivm, 2018, p.34-36. 84
1. As referências histórias e cronológicas foram tiradas no endereço eletrônico: https://www.institutomariadapenha.org.br/2016/index.php/sobre-maria-da-penha/minha-historia
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo É desnecessário dizer que a Lei Maria da Penha traz importantes conquistas para as mulheres contra a violência doméstica no contexto familiar. Apesar de amplamente festejada e regularmente citada como um símbolo do reconhecimento dos direitos das mulheres, a trajetória da sua criação não foi tranquila.
Vale dizer que a Sra. Maria da Penha sofreu agressões de seu marido por anos e anos. Até o momento que tomou coragem para denunciá-lo aos órgãos de persecução penal. Seu marido, Marco Antônio Heredita Viveros, que a deixou paraplégica e infligiu intenso sofrimento a ela, foi absolvido duas vezes pela justiça, além da demora na apuração do crime e uma clara ineficiência do Estado em lidar esse tipo de crime. Diante dessa incapacidade e falta de resposta do Estado brasileiro à violência sofrida por ela, o Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher – CLADEM e Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) denunciou o Brasil à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Após o regular trâmite do processo internacional, a Comissão reconheceu a responsabilidade do país diante da tolerância e omissão estatal sistemática nos casos de violência contra à mulher. Entre as recomendações formuladas pela Comissão IDH estava a criação de legislação que prevenisse e protegesse a mulher contra violência sofrida no âmbito doméstico. Diante dessa recomendação feita, o então Presidente Luís Inácio Lula da Silva, junto com diversos juristas, à luz, inclusive, de diversos tratados internacionais de Direitos Humanos, elaborou o projeto de lei que culminou com a criação do a Lei Federal nº 11.340/06. Portanto, note-se que o Brasil somente criou a Lei Maria da Penha porque foi constrangido internacionalmente e diante de pressões de órgãos internacionais. E não poderia ser diferente, o país é conhecido como um violador contumaz dos direitos humanos mais básicos, principalmente, pela composição das instituições e poderes internos. Por fim uma observação necessária. Esse tema realmente é apaixonante e desperta muita curiosidade, principalmente em tempos difíceis como o nosso. Entretanto, como aqui se trata de um curso direcionada a concurso público, iremos direto ao ponto, sem maiores digressões, o tempo é curto e há muitas matérias.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO 1) Dirma compareceu à Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher diante da violência doméstica que sofreu de Jairo. Diante dessa situação, pergunta-se: a) Qual o juízo competente para deferir eventuais medidas protetivas? b) Em caso de ameaça por redes sociais ou pelo Whatsapp, qual o juízo competente para deferir as medidas protetivas? c) A fixação de medida protetiva depende da existência de inquérito policial ou de ação criminal? d) Cabe Habeas Corpus para questionar a legalidade de medida protetiva? e) O descumprimento desobediência?
de
medida
protetiva
configura
crime
de
RESPOSTAS a) O juízo competente é o Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. O artigo 33 da Lei expressamente prevê que, enquanto esses juizados não tiverem estruturados, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal: Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput. b) Segundo o STJ, o juízo competente é do local que a vítima tomou conhecimento das intimidações. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME DE AMEAÇA PRATICADO POR WHATSAPP E FACEBOOK. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA. DELITO FORMAL. CONSUMAÇÃO NO LOCAL ONDE A VÍTIMA CONHECE DAS AMEAÇAS. CONFLITO DE COMPETÊNCIA CONHECIDO. DECLARADA A COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. 1. O crime de natureza formal, tal qual o tipo do art. 147 do Código Penal, se consuma no momento em que a vítima toma conhecimento da ameaça. 2. Segundo o art. 70, primeira parte, do Código de Processo Penal, "A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração". 3. No caso, a vítima tomou conhecimento das ameaças, proferidas via Whatsapp e pela rede social Facebook, na Comarca de Naviraí, por meio do seu celular, local de consumação do delito e de onde requereu medidas protetivas. 4. Independentemente do local em que praticadas as condutas de ameaça e da existência de fato anterior ocorrido na Comarca de Curitiba, deve-se compreender a medida protetiva como tutela inibitória que prestigia a sua finalidade de prevenção de riscos para a mulher, frente à possibilidade de violência doméstica e familiar. 5. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo da 1º Vara Criminal da Comarca de Naviraí/MS, ora suscitado. (CC 156.284/PR, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/02/2018, DJe 06/03/2018) c) Não é necessária a existência de inquérito policial ou ação penal em curso para se requerer medida protetiva. Segundo o STJ as medidas protetivas têm natureza cível: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. MEDIDAS PROTETIVAS DA LEI N. 11.340/2006 (LEI MARIA DA PENHA). INCIDÊNCIA NO ÂMBITO CÍVEL. NATUREZA JURÍDICA. DESNECESSIDADE DE INQUÉRITO POLICIAL, PROCESSO PENAL OU CIVIL EM CURSO. 1. As medidas protetivas previstas na Lei n. 11.340/2006, observados os requisitos específicos para a concessão de cada uma, podem ser pleiteadas de forma autônoma para fins de cessação ou de acautelamento de violência doméstica contra a mulher, independentemente da existência, presente ou potencial, de processo-crime ou ação principal contra o suposto agressor. 2. Nessa hipótese, as medidas de urgência pleiteadas terão natureza de cautelar cível satisfativa, não se exigindo instrumentalidade a outro processo cível ou criminal, haja vista que não se busca necessariamente garantir a eficácia prática da tutela principal. "O fim das medidas protetivas é proteger direitos fundamentais, evitando a continuidade da violência e das situações que a
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo favorecem. Não são, necessariamente, preparatórias de qualquer ação judicial. Não visam processos, mas pessoas" (DIAS. Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na justiça. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012). 3. Recurso especial não provido. (REsp 1419421/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/02/2014, DJe 07/04/2014) d) Sim. Segundo o STJ é possível impetrar HC para contestar aplicação de medida protetiva, pois eventual descumprimento pode ensejar a prisão preventiva do impetrante. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA MULHER. LEI MARIA DA PENHA. MEDIDAS PROTETIVAS APLICADAS. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício (Precedentes). 2. Caso em que, irresignado com as medidas protetivas de urgência previstas na Lei nº 11.340/2006, que lhe foram aplicadas pelo Juízo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Maceió, o paciente requereu ao Tribunal de Justiça de Alagoas fossem elas revogadas. A Câmara Criminal, no entanto, partindo do princípio que as medidas protetivas não representariam ameaça ao seu direito de ir, vir ou permanecer, entendeu que o meio pertinente para a apreciação da matéria não seria o habeas corpus e deixou de conhecer o mandamus lá impetrado. 3. O eventual descumprimento de medidas protetivas arroladas na Lei Maria da Penha pode gerar sanções de natureza civil (art. 22, § 4º, da Lei nº 11.340/2006 c/c art. 461, §§ 5º e 6º, do Código de Processo Civil, bem como a decretação de prisão preventiva (art. 313, III, do Código de Processo Penal). Ademais, a lei adjetiva penal prevê: "Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar". 4. Se o paciente não pode aproximar-se a menos de 500m da vítima ou de seus familiares, se não pode aproximar-se da residência da vítima, tampouco pode frequentar o local de trabalho dela, decerto que se encontra limitada a sua liberdade de ir e vir. Posto isso, afigura-se cabível a impetração do habeas corpus, de modo que a indagação do paciente merecia uma resposta mais efetiva e assertiva. 5. Writ não conhecido. Ordem de habeas corpus concedida de ofício para determinar que o Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas examine a existência de eventual constrangimento ilegal sofrido pelo paciente, em decorrência das medidas protetivas determinadas pelo Juízo de Maceió. (HC 298.499/AL, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 01/12/2015, DJe 09/12/2015 - grifamos)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo e) Não. O descumprimento de medida protetiva não configura crime de desobediência. Nesse sentido é a jurisprudência do STJ: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA PREVISTA NA LEI MARIA DA PENHA. AFASTAMENTO DA CONFIGURAÇÃO DO DELITO. EXISTÊNCIA DE SANÇÕES ESPECÍFICAS DE NATUREZA PENAL, ADMINISTRATIVA OU CIVIL. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento de que para a configuração do "crime de desobediência, não basta apenas o não cumprimento de uma ordem judicial, sendo indispensável que inexista a previsão de sanção específica em caso de seu descumprimento" (HC n.º 115504/SP, Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada), 6.ª Turma, Dje 09/02/2009). 2. Resta evidenciada a atipicidade da conduta, porque a legislação previu alternativas para que ocorra o efetivo cumprimento das medidas protetivas de urgência, previstas na Lei Maria da Penha, prevendo sanções de natureza civil, processual civil, administrativa e processual penal. 3. Recurso provido para, reconhecida a atipicidade da conduta, trancar a ação penal. (RHC 41.970/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 07/08/2014, DJe 22/08/2014). Por outro lado, em recente mudança legislativa, foi inserido o artigo 24-A na Lei, criando um tipo penal específico, “o Crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência. Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência. Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. § 1o A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas. § 2o Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança. § 3o O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Ações penais na Lei Maria da Penha Eduardo é réu em ação penal diante da violência praticada contra a sua exnamorada, Maria. Diante disso, pergunta-se: a)
Por serem ex-namorados, a Lei se aplica?
b) É necessário a coabitação para que se reconheça a incidência da Lei Maria da Penha? c) Eduardo, em sua defesa, pode alegar o princípio da insignificância diante da pequena lesão que causou à Maria? d) Caso Eduardo e Maria façam as pazes e voltem a namorar, a ação penal irá prosseguir? e) O magistrado, ao condená-lo, poderá converter a pena privativa de liberdade por restritivas de direito, nos termos do artigo 44 do Código Penal? f) Qual a natureza jurídica da ação penal decorrente de lesão corporal? g) É possível condenar Eduardo ao pagamento de dano moral no bojo no processo crime? h) Eduardo terá direito à suspensão condicional do processo previsto no artigo 9.099/95? Respostas: a) Com certeza a Lei Maria da Penha se aplica em caso de ex-namorados desde que o vínculo não seja superficial ou eventual. O Superior Tribunal de Justiça tem posição consolidada nesse sentido: HABEAS CORPUS. PENAL. LEI MARIA DA PENHA. VIOLÊNCIA PRATICADA EM DESFAVOR DE EX-NAMORADA. CONDUTA CRIMINOSA VINCULADA À RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO. CARACTERIZAÇÃO DE ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 41 DA LEI 11.340/06. VEDAÇÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. 1. A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, analisando o tema em voga, vem manifestando seu entendimento jurisprudencial no sentido da configuração de violência doméstica contra a mulher, ensejando a aplicação da Lei nº 11.340/06, à agressão cometida por exnamorado. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido da inaplicabilidade da Lei n.º 9.099/95 aos crimes praticados com violência doméstica ou familiar, em razão do disposto no art. 41 da Lei n.º 11.340/06. In casu, por expressa vedação legal, não pode ser concedida a
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo suspensão condicional do processo. 3. Ordem denegada. (HC 182.411/RS, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 03/09/2012) Aproveito a oportunidade e cito um quadro-resumo diretamente do site do Dizer o Direito, magnífico amigo de todo concurseiro honesto: Violência praticada por...
É possível?
FILHO CONTRA A MÃE
SIM
A Lei Maria da Penha aplica-se também nas relações de HC parentesco. 290.650/MS FILHA CONTRA A MÃE
SIM
Relembrando que o agressor pode ser também mulher.
HC 277.561/AL
PAI CONTRA A FILHA
SIM HC 178.751/RS
IRMÃO CONTRA IRMÃ
SIM
Obs.: ainda que não morem sob o mesmo teto.
HC 175.816/RS
GENRO CONTRA SOGRA
SIM RHC 50.847/BA
NORA CONTRA A SOGRA
SIM
Desde que estejam presentes os requisitos de relação íntima HC de afeto, motivação de gênero e situação de vulnerabilidade. 175.816/RS Ausentes, não se aplica. COMPANHEIRO DA MÃE (“PADRASTO”) CONTRA A ENTEADA SIM Obs.: a agressão foi motivada por discussão envolvendo o RHC relacionamento amoroso que o agressor possuía com a mãe 42.092/RJ da vítima (relação íntima de afeto). TIA CONTRA SOBRINHA
SIM
A tia possuía, inclusive, a guarda da criança (do sexo HC feminino), que tinha 4 anos. 250.435/RJ
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo EX-NAMORADO CONTRA A EX-NAMORADA
SIM
Vale ressaltar, porém, que não é qualquer namoro que se HC enquadra na Lei Maria da Penha. Se o vínculo é eventual, 182.411/RS efêmero, não incide a Lei 11.340/06 (CC 91.979-MG). FILHO CONTRA PAI IDOSO
NÃO
O sujeito passivo (vítima) não pode ser do sexo masculino.
RHC 51.481/SC
b) Segundo entendeu o STJ, não é necessária a coabitação para a incidência da Lei Maria da Penha. Nesse sentindo, está a súmula 600 do Tribunal Cidadão: Súmula 600 do STJ: Para configuração da violência doméstica e familiar prevista no artigo 5º da lei 11.340/2006, lei Maria da Penha, não se exige a coabitação entre autor e vítima c) Não é possível alegação de princípio da insignificância no caso de crimes cometidos contra mulher no contexto de violência doméstica. A súmula 589 do STJ é expresso ao trazer a impossibilidade de alegação desse princípio nos crimes contra a mulher no âmbito das relações domésticas. (Súmula 589 do STJ: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas). Isso porque os delitos praticados contra a mulher nesse contexto não cumprem os requisitos previstos pelo STF para o reconhecimento do princípio da insignificância. Em outras palavras, o crime não possui a mínima ofensividade da conduta do agente, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento, nenhuma periculosidade social e inexpressiva lesão ao bem jurídico.
d) Sim. Esse tema foi objeto de análise pelo STJ, no AgRg no REsp 1.463.975/MS. O Tribunal Cidadão entendeu que o fato do casal se reconciliar não acarreta a chamada bagatela imprópria, que diz respeito àqueles crimes que são penalmente relevantes, mas em virtudes de fatos supervenientes, observase que a pena se tornou desnecessária. Portanto, mesmo que o casal se reconcilie, o crime continua sendo punível, não podendo se falar em bagatela imprópria.
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. LESÃO CORPORAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. ART. 129, § 9º, DO CP. PRINCÍPIO DA BAGATELA IMPRÓPRIA. INAPLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo IMPROVIDO. 1. O princípio da bagatela imprópria não tem aplicação aos delitos praticados com violência à pessoa, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal da conduta, não implicando a reconciliação do casal em desnecessidade da pena (HC 331.580/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 17/09/2015, DJe 07/10/2015). 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1463975/MS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 22/08/2016) e) Não é possível a aplicação de penas restritivas de direito nos crimes de violência contra a mulher. O artigo 17 da Lei expressamente veda a pena de cesta básica ou outra prestação pecuniária, bem como qualquer outra pena que implique em pagamento isolado de multa: “Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.” Nesse sentindo, o STJ assentou posição no sentindo de ser incabível a conversão de pena privativa de liberdade em restritivas de direito. Inclusive, recentemente sumulou esse entendimento: “Súmula 588-STJ: A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.” Aqui, vale uma importante observação feita pelo Prof. Marcio Cavalcante do Dizer o Direito, que deve ser conhecida por vocês: “IMPORTANTE. O STF concorda com o teor da súmula 588 do STJ? Em parte. Em caso de CRIMES praticados contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico: o STF possui o mesmo entendimento do STJ e afirma que não cabe a substituição por penas restritivas de direitos. Nesse sentido: Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico (art. 129, § 9º do CP). A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos pressupõe, entre outras coisas, que o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça (art. 44, I, do CP). STF. 2ª Turma. HC 129446/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 20/10/2015 (Info 804).
Em caso de CONTRAVENÇÕES PENAIS praticadas contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico há uma discordância. Ex: imagine que o marido pratica vias de fato (art. 21 da Lei de Contravenções
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Penais) contra a sua esposa; ele poderá ser beneficiado com pena restritiva de direitos? • STJ e 1ª Turma: NÃO. Não é possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos tanto no caso de crime como contravenção penal praticados contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico. É o teor da Súmula 588-STJ. A 1ª Turma do STF também comunga do mesmo entendimento: HC 137888/MS, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 31/10/2017. • 2ª Turma STF: SIM. Afirma que é possível a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, nos moldes previstos no art. 17 da Lei Maria da Penha, aos condenados pela prática da contravenção penal. Isso porque a contravenção penal não está na proibição contida no inciso I do art. 44 do CP, que fala apenas em crime. Logo, não existe proibição no ordenamento jurídico para a aplicação de pena restritiva de direitos em caso de contravenções. Nesse sentido: STF. 2ª Turma. HC 131160, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 18/10/2016. Relembre o que diz o inciso I do Código Penal: Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; O STJ e a 1ª Turma do STF fazem, portanto, uma ampliação do inciso I do art. 44 do CP para abranger também os casos de contravenção penal praticados com violência ou grave ameaça (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1607382/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/09/2016). A 2ª Turma do STF não admite essa ampliação e trabalha com o texto literal do art. 44, I, do CP.
Resumindo: É possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos casos de crimes ou contravenções praticadas contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico? 1) Crime: NÃO. Posição tanto do STJ como do STF. 2) Contravenção penal: • 2ª Turma do STF: entende que é possível a substituição. • 1ª Turma do STF e STJ: afirmam que também não é permitida a substituição.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Em concursos, se o enunciado não estiver fazendo qualquer distinção, fiquem com a posição exposta na súmula e que também é adotada pela 1ª Turma do STF.”85
f) A súmula 542 do STJ diz expressamente que se trata de ação penal pública incondicionada. Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada Como dito acima, não se pode alegar princípio da insignificância nos crimes cometidos contra as mulheres no contexto de violência doméstica, inclusive quando se trata de lesão corporal leve.
PETIÇÃO. QUESTÃO DE ORDEM. RECURSOS REPETITIVOS. TEMA N. 177. CRIME DE LESÕES CORPORAIS COMETIDOS CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR. NATUREZA DA AÇÃO PENAL. REVISÃO DO ENTENDIMENTO DAS TERCEIRA SEÇÃO DO STJ. ADEQUAÇÃO AO JULGAMENTO DA ADI N. 4.424/DF PELO STF E À SÚMULA N. 542 DO STJ. AÇÃO PÚBLICA INCONDICIONADA. 1. Considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, deve ser revisto o entendimento firmado pelo julgamento, sob o rito dos repetitivos, do REsp n. 1.097.042/DF, cuja quaestio iuris, acerca da natureza da ação penal nos crimes de lesão corporal cometidos contra a mulher no âmbito doméstico e familiar, foi apreciada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em sentido oposto, já incorporado à jurisprudência mais recente deste STJ. 2. Assim, a tese fixada passa a ser a seguinte: a ação penal nos crimes de lesão corporal leve cometidos em detrimento da mulher, no âmbito doméstico e familiar, é pública incondicionada. 3. Questão de ordem acolhida a fim de proceder à revisão do entendimento consolidado por ocasião do julgamento do REsp n. 1.097.042/DF - Tema 177. (Pet 11.805/DF, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/05/2017, DJe 17/05/2017 - grifamos)
Observo que tanto a súmula quanto o julgado acima citado dizem respeito à lesão corporal. Ou seja, não importa qual a gravidade da lesão, se leve, grave ou gravíssima, sempre será de ação penal pública incondicionada.
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(CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Não cabe pena restritiva de direitos nos crimes ou contravenções penais cometidos contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 04/10/2018)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Com efeito, há outros crimes, que, mesmo realizados em contexto domiciliar, não são de ação penal pública incondicionada. É o caso, por exemplo, do crime de ameaça, que se processa mediante representação da ofendida. g) Sim, é possível desde que requerido pelo Ministério Público ou pela ofendida, nos termos do artigo 394, IV, CPP. Nesse sentindo, é a jurisprudência do STJ: RECURSO ESPECIAL. RECURSO SUBMETIDO AO RITO DOS REPETITIVOS (ART.1.036 DO CPC, C/C O ART. 256, I, DO RISTJ). VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO MÍNIMA. ART.397, IV, DO CPP. PEDIDO NECESSÁRIO. PRODUÇÃO DE PROVA ESPECÍFICA DISPENSÁVEL. DANO IN RE IPSA. FIXAÇÃO CONSOANTE PRUDENTE ARBÍTRIO DO JUÍZO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça - sob a influência dos princípios da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), da igualdade (CF, art. 5º, I) e da vedação a qualquer discriminação atentatória dos direitos e das liberdades fundamentais (CF, art. 5º, XLI), e em razão da determinação de que "O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações" (art. 226, § 8º) - tem avançado na maximização dos princípios e das regras do novo subsistema jurídico introduzido em nosso ordenamento com a Lei n. 11.340/2006, vencendo a timidez hermenêutica no reproche à violência doméstica e familiar contra a mulher, como deixam claro os verbetes sumulares n. 542, 588, 589 e 600. 2. Refutar, com veemência, a violência contra as mulheres implica defender sua liberdade (para amar, pensar, trabalhar, se expressar), criar mecanismos para seu fortalecimento, ampliar o raio de sua proteção jurídica e otimizar todos os instrumentos normativos que de algum modo compensem ou atenuem o sofrimento e os malefícios causados pela violência sofrida na condição de mulher. 3. A evolução legislativa ocorrida na última década em nosso sistema jurídico evidencia uma tendência, também verificada em âmbito internacional, a uma maior valorização e legitimação da vítima, particularmente a mulher, no processo penal. 4. Entre diversas outras inovações introduzidas no Código de Processo Penal com a reforma de 2008, nomeadamente com a Lei n. 11.719/2008, destaca-se a inclusão do inciso IV ao art. 387, que, consoante pacífica jurisprudência desta Corte Superior, contempla a viabilidade de indenização para as duas espécies de dano - o material e o moral -, desde que tenha havido a dedução de seu pedido na denúncia ou na queixa. 5. Mais robusta ainda há de ser tal compreensão quando se cuida de danos morais experimentados pela mulher vítima de violência doméstica. Em tal situação, emerge a inarredável compreensão de que a fixação, na sentença condenatória, de indenização, a título de danos morais, para a vítima de violência doméstica, independe de indicação de um valor líquido e certo pelo postulante da reparação de danos, podendo o quantum ser fixado minimamente pelo Juiz
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo sentenciante, de acordo com seu prudente arbítrio. 6. No âmbito da reparação dos danos morais - visto que, por óbvio, os danos materiais dependem de comprovação do prejuízo, como sói ocorrer em ações de similar natureza -, a Lei Maria da Penha, complementada pela reforma do Código de Processo Penal já mencionada, passou a permitir que o juízo único - o criminal - possa decidir sobre um montante que, relacionado à dor, ao sofrimento, à humilhação da vítima, de difícil mensuração, deriva da própria prática criminosa experimentada. 7. Não se mostra razoável, a esse fim, a exigência de instrução probatória acerca do dano psíquico, do grau de humilhação, da diminuição da autoestima etc., se a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de desonra, descrédito e menosprezo à dignidade e ao valor da mulher como pessoa. 8. Também justifica a não exigência de produção de prova dos danos morais sofridos com a violência doméstica a necessidade de melhor concretizar, com o suporte processual já existente, o atendimento integral à mulher em situação de violência doméstica, de sorte a reduzir sua revitimização e as possibilidades de violência institucional, consubstanciadas em sucessivas oitivas e pleitos perante juízos diversos. 9. O que se há de exigir como prova, mediante o respeito ao devido processo penal, de que são expressão o contraditório e a ampla defesa, é a própria imputação criminosa - sob a regra, derivada da presunção de inocência, de que o onus probandi é integralmente do órgão de acusação -, porque, uma vez demonstrada a agressão à mulher, os danos psíquicos dela derivados são evidentes e nem têm mesmo como ser demonstrados. 10. Recurso especial provido para restabelecer a indenização mínima fixada em favor pelo Juízo de primeiro grau, a título de danos morais à vítima da violência doméstica. TESE: Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória. (REsp 1643051/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/02/2018, DJe 08/03/2018 – grifamos). Percebe-se da leitura do acórdão e da tese fixada pelo Tribunal Superior, que o dano moral decorrente de violência contra a mulher no contexto doméstico pode ser fixado diante de expresso pedido, mas não é necessário especificar a quantia e independe de instrução probatória, tendo em vista que é desarrazoado determinar a comprovação da humilhação, redução da autoestima e outros efeitos perversos que tal violência causa na mulher. h) Não é possível. O artigo 41 da Lei Maria da Penha é expresso ao estabelecer: ”Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995.” Assim, incabível a aplicação de qualquer instituto da Lei 9.009/95 no âmbito da violência doméstica.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Como reforço, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 536, que possui a seguinte redação: Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. Observação final: Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, toda mulher que sofre violência doméstica tem sua hipossuficiência e vulnerabilidade presumidas. Ou seja, pouco importa a classe social, cor de pele ou profissão. Nesse sentindo são valorosos os ensinamentos da Ministra Laurita Vaz, no REsp. 1416580/RJ: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE LESÃO CORPORAL PRATICADOS CONTRA NAMORADA DO RÉU E CONTRA SENHORA QUE A ACUDIU. NAMORO. RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO. CARACTERIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA. ART. 5.º, INCISO III, E ART. 14 DA LEI N.º 11.340/06. PRECEDENTES DO STJ. VÍTIMA MULHER DE RENOME DA CLASSE ARTÍSTICA. HIPOSSUFICIÊNCIA E VULNERABILIDADE AFASTADA PELO TRIBUNAL A QUO PARA JUSTIFICAR A NÃO-APLICAÇÃO DA LEI ESPECIAL. FRAGILIDADE QUE É ÍNSITA À CONDIÇÃO DA MULHER HODIERNA. DESNECESSIDADE DE PROVA. COMPETÊNCIA DO I JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA CAPITAL FLUMINENSE. RECURSO PROVIDO. DECLARAÇÃO, DE OFÍCIO, DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, EM RELAÇÃO AO CRIME COMETIDO CONTRA A PRIMEIRA VÍTIMA, EM FACE DA SUPERVENIENTE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. 1. Hipótese em que, tanto o Juízo singular quanto o Tribunal a quo, concluíram que havia, à época dos fatos, uma relação de namoro entre o agressor e a primeira vítima; e, ainda, que a agressão se deu no contexto da relação íntima existente entre eles. Trata-se, portanto, de fatos incontestes, já apurados pelas instâncias ordinárias, razão pela qual não há falar em incidência da Súmula n.º 07 desta Corte. 2. O entendimento prevalente neste Superior Tribunal de Justiça é de que "O namoro é uma relação íntima de afeto que independe de coabitação; portanto, a agressão do namorado contra a namorada, ainda que tenha cessado o relacionamento, mas que ocorra em decorrência dele, caracteriza violência doméstica" (CC 96.532/MG, Rel. Ministra JANE SILVA - Desembargadora Convocada do TJMG, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 05/12/2008, DJe 19/12/2008). No mesmo sentido: CC 100.654/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/03/2009, DJe 13/05/2009; HC 181.217/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 20/10/2011, DJe 04/11/2011; AgRg no AREsp 59.208/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 26/02/2013, DJe 07/03/2013. A situação de vulnerabilidade e fragilidade da mulher, envolvida em relacionamento íntimo de afeto, nas circunstâncias descritas pela lei de regência, se revela ipso facto. Com efeito, a presunção de hipossuficiência da mulher, a
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo implicar a necessidade de o Estado oferecer proteção especial para reequilibrar a desproporcionalidade existente, constitui-se em pressuposto de validade da própria lei. Vale ressaltar que, em nenhum momento, o legislador condicionou esse tratamento diferenciado à demonstração dessa presunção, que, aliás, é ínsita à condição da mulher na sociedade hodierna. 4. As denúncias de agressões, em razão do gênero, que porventura ocorram nesse contexto, devem ser processadas e julgadas pelos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, nos termos do art. 14 da Lei n.º 11.340/2006 5. Restabelecida a condenação, cumpre o reconhecimento, de ofício, da extinção da punibilidade do Recorrido, em relação ao crime cometido contra a primeira vítima, em face da prescrição da pretensão punitiva estatal, a teor do art. 110, § 1.º, c.c. o art. 119, c.c. o art. 109, inciso VI (este com a redação anterior à Lei n.º 12.234, de 5 de maio de 2010, já que o crime é de 23/10/2008), todos do Código Penal. 6. Recurso especial provido para, cassando o acórdão dos embargos infringentes, restabelecer o acórdão da apelação que confirmara a sentença penal condenatória. Outrossim, declarada, de ofício, a extinção da punibilidade do Recorrido, em relação ao crime de lesão corporal cometido contra a primeira vítima, em face da superveniente prescrição da pretensão punitiva estatal, remanescendo a condenação contra a segunda vítima. (REsp 1416580/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 01/04/2014, DJe 15/04/2014 - destacamos)
QUESTÃO-TREINO Homoafetividade Jorge e Rogéria mantém um relacionamento afetivo, mas Rogéria sente-se incomodada com o namoro, pois Jorge é controlador, constantemente liga no trabalho, atrapalhando seu rendimento, faz críticas a respeito de sua aparência, depreciando sua autoestima, impondo-lhe regras quanto à sua conduta, restringindo seu relacionamento com amigos e familiares, interferindo até mesmo na gestão de seu salário. Insatisfeita com esta situação, Rogéria resolveu terminar e, após forte discussão, Jorge, contrariado e enciumado, perdeu o controle emocional e deu-lhe chutes nas pernas e socos no rosto, e também raspou seus longos cabelos, desejando rebaixar sua autoestima, pois sabia que Rogéria adora suas madeixas. Logo em seguida à violência, Rogéria foi a delegacia e realizou um boletim de ocorrências. Discorra sobre o conceito de violência e a ação penal aplicada ao caso.
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Resposta: O artigo 5º da Lei 11.340/11 descreve as modalidades de violência doméstica e familiar contra a mulher, definindo como qualquer ação ou omissão baseada na violência de gênero, que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. A ação penal, em regra, é de ação penal pública incondicionada, mas admite exceções, como no caso do crime de ameaça86, de lesão corporal de natureza leve ou culposa e na Lei Maria da Penha, se praticado contra mulher. Quanto à ação penal na lesão corporal temos, no caso de lesão corporal de natureza leve ou culposa, a ação será pública condicionada à representação da vítima (inclusive, na hipótese de violência doméstica e familiar contra homem87), contudo, se o crime for cometido no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, a ação penal será pública incondicionada. Neste sentido, temos a súmula 542 do STJ, a ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. Isso porque o STF (ADI 4424/DF), dando interpretação conforme aos artigos 12, inciso I, e 16, ambos da Lei 11.340/06, em consonância com o artigo 226, § 8º, CF, assegurou a natureza incondicionada da ação penal, sendo indiferente a extensão da lesão corporal praticada no contexto doméstico, o que afasta a incidência da Lei 9.099/95.
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No crime de ameaça, cometido no âmbito das relações domésticas contra a mulher, é possível a retratação da representação, perante o juiz, em audiência especialmente designada para tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público- artigo 16, Lei 11.343/06. Note-se que a lei fala em renúncia, mas o termo correto é retratação, uma vez que não se renuncia direito já exercido. 87
É certo que sendo a vítima mulher, a lei é aplicada independentemente da orientação sexual (artigos 2º e 5º, parágrafo único), mas, sendo a vítima do gênero masculino, conduta de um agente que cause lesões corporais em desfavor de seu companheiro, prevalecendo-se das relações de coabitação, não são abrangidas dentro do âmbito da lei Maria da Penha, embora as lesões corporais sejam qualificadas na forma do artigo 129, § 9º, CP.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Lei Maria da Penha e contravenções penais A Lei maria da Penha é aplicável às contravenções penais?
Resposta: Dentro do amplo aspecto de violência doméstica e familiar (artigo 7º), é possível que alguma conduta configure contravenção penal, por exemplo, vias de fato (artigo 21). Nesses casos (referindo-se o artigo 41 da lei 11.340/40 apenas a crimes), há quem entenda que continua aplicável às contravenções a Lei 9.099/95, e suas medidas despenalizadoras, ressalva apenas às proibições trazidas no artigo 17 da Lei 11.340/06. O artigo 17, da LCP, determina que a ação é pública incondicionada. Contudo, após o advento da Lei 9.099/95, artigo 88, que passou a exigir representação para as ações penais de lesão corporal leve e culposa, parte da doutrina (Ronaldo Batista Pinto- A Lei 9.099/95 e a contravenção de vias de fato- Boletim do IBCCrim, vol. 44, agosto de 1996) e ainda o Enunciado 76 do XVII Fonaje, passou a defender a tese de que a ação penal de vias de fato é condicionada à representação, sob o argumento de analogia in bonam partem. Todavia, para o artigo 17 remanesce em vigor (STF no HC 80617/MG, j. 20.03.2001, DJ 04/05/2001, p.5; e nas ADIn 4.424 e ADC 4.424, que definiram a incondicionalidade da ação penal, no âmbito da Lei Maria da Penha,). Ainda, a respeito da LCP, temos que quanto às vias de fato- artigo 21, LCP, cometida no âmbito das relações domésticas e familiares, a jurisprudência oscila quanto à possibilidade de conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos: o STF considera ser viável a conversão da pena corporal em pena alternativa, nos moldes do artigo 17, da Lei 11.340/06, por se tratar de modalidade de pena não alcançada pelo artigo 44, I, do Código Penal (há posicionamentos da 2ª turma do STF neste sentido- HC 131160/MS e HC 132342/MS); contudo, o STJ e a 1ª turma do STF, por sua vez, têm firmado entendimento pela inviabilidade da substituição da pena privativa de liberdade
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo seja para contravenção ou crime contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico- súmula 588-STJ. No caso do corte de cabelo, a doutrina diverge sobre a tipificação, seria lesão corporal contravenção penal ou injúria real? Na contravenção penal não há a intenção de ofender a integridade física da vítima, enquanto na lesão corporal sim, sendo esse elemento subjetivo que diferencia as vias de fato da tentativa de lesão corporal. Por outro lado, na injúria real (artigo 140, § 2º do CP), o animus do agente é a ofensa à dignidade, o decoro da vítima, à honra subjetiva da vítima. Neste sentido, depreende-se do enunciado que tipificou-se injúria real, pois Jorge realizou o corte de cabelo sem autorização da vítima e com o fim de envergonhar e humilhar a vítima.88
QUESTÃO-ESTUDO Princípio da igualdade e Maria da Penha Considerando-se que a Constituição Federal dispõe que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, como se justifica a maior proteção ao gênero feminino na Lei 11.340/06? Resposta: A maior proteção ao gênero feminino concretiza a preocupação de se assegurar a efetividade do princípio da igualdade, inclusive na sociedade conjugal (artigo 5º, I, e artigo 226, § 8º, ambos da CF). Neste sentido, a Lei 11.340/06, foi uma das medidas adotadas em virtude da condenação sofrida pelo estado Brasileiro perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos por negligência e omissão frente à violência doméstica. A Lei Maria da Penha foi criada com o fim de romper com todo contexto histórico de dominação masculina e violência contra as mulheres, que estejam inseridas em relações patriarcais em clara situação de hipossuficiência e cuja consequência se traduz em expressivo número de casos de violência de gênero. Portanto, não se trata de desequiparação fortuita ou injustificada, uma vez que a maior proteção da Lei à mulher justifica-se pela necessidade de políticas compensatórias que restaurem o equilíbrio inexistente nessas relações. O objetivo da Lei, longe de privilegiar a mulher em detrimento do homem, busca a igualdade, o equilíbrio entre os sexos, tratando-se de uma clara proteção legislativa, que evita o tratamento desigual entre os sexos. Deve-se ressaltar também que a norma visa a proteção do gênero nas relações familiares e domésticas, independentemente da orientação sexual (artigo 5º, parágrafo 88
CUNHA, Rogério Sanches, Pinto Ronaldo Batista, SOUZA, Renee do Ó. Leis Penais Especiais Comentadas- artigo por artigo. Salvador: Editora JusPodivm, 2018, p.34-36.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo único, da Lei 11.343/06), de modo que é possível sua aplicação às relações homoafetivas, em decorrência de violência praticada em razão do convívio familiar ou afetivo. Contudo, em relação à sua aplicação para pessoas do sexo masculino, não há essa possibilidade, mesmo quando as agressões sejam originadas em ambiente doméstico, eis que o sujeito passivo será a mulher (STJCC 96533).89
QUESTÃO-TREINO Transsexualidade e Maria da Penha É possível a aplicação da Lei Maria da Penha à vítima transexual?
Resposta: Sobre o tema, há duas correntes: pela impossibilidade, pois geneticamente o transexual não seria mulher; em sentido inverso, Rogério Greco leciona que se houver decisão transitada em julgado modificando a condição sexual de alguém, tal fato deve repercutir em todos âmbitos de sua vida, inclusive o penal. Neste sentido tem caminhado a jurisprudência e a legislação, a se ver pela possibilidade de retificação do registro civil, o uso de nome social (artigo 3º, do Decreto 8.727/16), a ADI 4.275, de março de 2018, na qual o STF, em interpretação conforme a jurisprudência conferiu às pessoas transgênero o direito de substituição do prenome e do sexo no registro civil, independentemente de cirurgia de transgenitalização ou de realização de tratamento hormonal.90
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CUNHA, Rogério Sanches, Pinto Ronaldo Batista, SOUZA, Renee do Ó. Leis Penais Especiais Comentadas- artigo por artigo. Salvador: Editora JusPodivm, 2018, p.34-36. 90 IDEM.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Organizações Criminosas, Tráfico de Pessoas e Lavagem de Dinheiro
I.
CRIMES DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA.
i.
Lei relacionada ao tema – Lei nº 12.850/13
ii.
Informativos: 895 STF – "competência para homologação do acordo de colaboração premiada se o delatado tiver foro por prerrogativa de função"
BREVES COMENTÁRIOS - Atenção ao Processo Penal: meios de obtenção de prova – institutos da Colaboração Premiada e Ação Controlada91. O Brasil não possuía uma definição legal de organização criminosa e essa omissão legislativa fazia com que o conceito dado pela Convenção de Palermo92 fosse adotado, porém a definição era genérica, violando o princípio da taxatividade, e vale somente para as relações internacionais. No julgamento do HC 96.007/SP, pelo Ministro do STF, Marco Aurélio, o crime de organização criminosa não poderia adotar o conceito definido na Convenção de Palermo, pois foi introduzida no Brasil "por meio de simples Decreto". Em 2013 entrou em vigou a Lei nº 12.850, que dispôs sobre a definição de organização criminosa, a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal.
Com relação aos aspectos processuais da Lei nº 12.850/13, merece destaque os meios de obtenção de prova93, em especial o instrumento da colaboração premiada e o instituto da ação controlada que não deve ser confundido com o flagrante preparado94.
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Deixo de discorrer sobre Infiltração de Agentes, porque sua técnica está descrita pela lei e no dia da prova não haverá consulta. Assim, selecionei os institutos da Colaboração Premiada e da Ação Controlada que acredito terem maior chance de incidir na prova. 92 "(…) grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material˜. 93 Meios de prova previstos pelo artigo 3º: colaboração premiada, captação ambiental, ação controlada, acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, infiltração de agentes e cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e municipais. 94 Dei maior destaque à colaboração premiada e ação controlada, em razão de acreditar que os dois institutos têm maio chance de incidir na prova de segunda fase de Analista Jurídico do MPSP.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Deve se atentar que "meio de obtenção de prova" não deve ser confundido com "meio de prova" (apto para servir ao convencimento do juiz), porque trata-se de técnica, instrumento para se obter as provas.
QUESTÕES SOBRE COLABORAÇÃO PREMIADA E AÇÃO CONTROLADA (Temas relevantes na 2ª Fase do concurso) SUPERDISSERTAÇÃO-TREINO! ESCREVA SOBRE! Em quais momentos é possível a celebração de acordo de colaboração premiada? Qual o papel do juiz? Resposta: São três os momentos que a colaboração poderá ocorrer: na fase de investigação criminal, durante o curso do processo penal e após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. O procedimento da colaboração premiada tem início com a negociação entre o investigado ou acusado, assistido por advogado, com o delegado de polícia ou com o Ministério Público. O juiz não deverá participar das tratativas, sob pena de violar o sistema acusatório e prejudicar sua imparcialidade. Caso as negociações sejam frutíferas, as declarações do colaborar serão registradas e será elaborado um termo de acordo de colaboração premiada (formalidades previstas pelo artigo 6º da Lei nº 12.850/13), o qual será submetido para apreciação judicial para homologação. O pedido de homologação do acordo é autuado como processo sigiloso. O juiz deverá analisar os aspectos de regularidade, legalidade e voluntariedade, a homologação não significa que o juiz está concordando que as declarações prestadas pelo colaborador são verdadeiras, pois ainda serão objeto de apuração. Apesar de não existir previsão expressa sobre recurso de decisão que não homologar o acordo de colaboração premiada, a doutrina afirma caber, por analogia, recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso I, do CPP). Após a homologação do acordo, se as declarações já forem suficientes para se obter um dos resultados previstos pelo artigo 4º da Lei nº 12.850/13, o benefício penal deve ser concedido (direito subjetivo ao prêmio). Se diligências forem necessárias, o prazo para oferecimento da denúncia ou o processo e o prazo prescricional ficarão suspensos por até 06 meses, prorrogáveis por igual período. Importante consignar que para a concessão dos benefícios ao investigado ou acusado, a colaboração deve ser efetiva, isto é, obtido um dos resultados previstos no artigo 4º da Lei nº 12.850/13. A escolha do benefício (prêmio) será analisada de acordo com a personalidade do colaborador, natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso, além da eficácia da colaboração.
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É comum a imprensa tratar colaboração premiada como sinônimo de delação premiada, contudo, são diferentes. Em que consiste essa distinção? Resposta: A colaboração premiada não é sinônimo de delação premiada. A colaboração premiada é mais ampla que a delação premiada, esta merece ser tratada como espécie da colaboração, porque a delação premiada ocorre quando o investigado ou acusado colabora com as autoridades ao deletar os comparsas. No entanto, é possível o agente se beneficiar da colaboração premiada ao fornecer as informações necessárias para a recuperação do dinheiro desviado, sem delatar outros indivíduos que participaram do crime. O acordo de colaboração pode ser impugnado por terceiros? Resposta: O acordo não pode ser impugnado por terceiros, ainda que venham a ser mencionados, porque trata-se de negócio jurídico processual personalíssimo. Os terceiros poderão impugnar as imputações posteriores, constantes do depoimento do colaborador (STF HC 127483/PR), isto é, o contraditório e a ampla defesa serão exercidos pelo delatado apenas no processo penal que for instaurado com as provas produzidas pelo colaborador. Exceção: o delatado poderá impugnar a competência para homologação do acordo (Info 895 STF). Qual o Juízo competente para homologação do acordo de colaboração premiada se o delatado tiver foro por prerrogativa de função? (Info 895 STF) Resposta: Segundo o art. 4º, § 7º da Lei nº 12.850/2013, o acordo de colaboração premiada deve ser remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade. Muito embora a lei fale apenas em “juiz”, é possível que a homologação da colaboração premiada seja da competência de tribunal, nos casos em que o delator ou os delatados possuem foro por prerrogativa de função. Com efeito, o colaborador admite seus próprios delitos e delata outros crimes. Assim, quanto à prerrogativa de função, será competente o juízo mais graduado, observadas as prerrogativas de função do delator e dos delatados. Ex: se um Prefeito (julgado pelo TJ) faz um acordo de colaboração premiada e delata um Deputado Federal que teria praticado crimes no exercício de seu cargo e em função dele, a competência para homologar este acordo é do STF (art. 102, I, “b”) Para o STF, se a delação do colaborador mencionar autoridade com prerrogativa de foro, este acordo deve ser celebrado pelo Ministério Público respectivo, com homologação pelo Tribunal competente. Nessa senda, é possível que o delatado faça impugnação quanto à competência para homologação do acordo, porque está relacionada às regras constitucionais de prerrogativa de foro. Portanto, em caso de homologação de acordo sem observância das regras de competência, o que se tem é uma hipótese de ineficácia do acordo em relação à autoridade delatada, assim, as provas deverão ser excluídas do inquérito.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Qual a natureza jurídica da decisão que homologa o acordo de colaboração premiada? Resposta: O ato homologatório é simples fator de eficácia do acordo, pois o juiz se limita a analisar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, sem realizar juízo de valor sobre as declarações já prestadas. É possível um coautor, mencionado pelo colaborador em sua delação premiada, impetrar Habeas Corpus contra decisão que homologou o acordo de colaboração, sob a justificativa de que o delator seria inidôneo e teria descumprido outro acordo de delação, para que as provas obtidas a partir de sua colaboração premiada sejam ilícitas por derivação? Resposta: O STF entendeu não ser possível (Informativo 796), porque o acordo de colaboração não constituiu meio de prova propriamente dito, mas instrumento para obtenção de prova. O acordo de colaboração não se confunde com o depoimento do colaborador, este sim é meio de prova para formação do convencimento do magistrado. O acordo de colaboração não viola o princípio do contraditório, porque a Lei nº 12.850/13 estabelece que nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador. Outrossim, a inidoneidade do colaborador não importa para o sucesso da colaboração premiada, pois serão analisadas as informações por ele prestadas. A personalidade de colaborador influenciará a escolha do benefício a ser concedido, mas não interfere nos resultados obtidos por suas declarações. O instituto da delação premiada é compatível com os princípios reitores da ação penal de iniciativa pública? (Questão do XXXIV do MPRJ – 31.01.16) Resposta: De acordo com o artigo 4º da Lei nº 12.850/13, ao delator poderão ser concedidos os seguintes benefícios: perdão judicial, redução de pena privativa de liberdade ou substituição por restritiva de direitos. Ainda, o artigo 4º, em seu parágrafo 4º, possibilita que o Ministério Público não ofereça denúncia contra o colaborador se ele não for o líder da organização criminosa e for o primeiro a prestar efetiva colaboração. A hipótese de não oferecimento de denúncia implica na mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública e da indisponibilidade, o que confronta a atuação ministerial. Todavia, a mitigação mencionada deve ser compreendida em prol do interesse público e no objetivo do processo penal, na busca da verdade real, sobretudo em virtude da sofisticação das organizações criminosas, de difícil elucidação, que impõe inovação nos meios de obtenção de prova. Assim, ponderam-se os princípios da busca da pacificação social com a efetividade da persecução penal e justifica-se o instituto da delação premiada com a ação penal de iniciativa pública.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Discorra sobre a legitimidade para a celebração do acordo de colaboração premiada, com referência ao Delegado de Polícia, ao Ministério Público e ao assistente da acusação. (Questão do MPPR – 2016)
Espelho: Prevê a Lei nº 12.850/2013 que o Ministério Público, a qualquer tempo, e o Delegado de Polícia, nos autos de inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, cujas negociações ocorrerão entre o Delegado de Polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor. O regramento legal apontaria, assim, para a legitimidade tanto do Ministério Público quanto do Delegado de Polícia para a celebração de acordo de colaboração premiada. Entretanto, sustenta-se a legitimidade exclusiva do Ministério Público para a celebração, diante da outorga constitucional da titularidade da ação penal pública ao Ministério Público (art. 129, inciso I, da CF), do que deriva a inafastável necessidade de intervenção do Ministério Público como parte principal legitimada para a celebração do acordo de colaboração, sob pena de se admitir a derrogação do dispositivo constitucional por força de regramento infraconstitucional. Disto se conclui que a Autoridade Policial não dispõe, por si, de legitimidade para celebrar o referido acordo, incumbindo ao juiz competente recusar sua homologação, ressalvada a hipótese de chancela deste pelo Ministério Público, através de manifestação favorável. Por fim, falece ao assistente de acusação legitimidade para a proposta e celebração de acordo de colaboração premiada, delimitando-se a sua atuação ao curso do processo judicial, sem outorga de poderes investigatórios.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Qual a diferença entre ação controlada e flagrante preparado?
Resposta: A ação controlada é técnica de obtenção de prova consistente em retardamento do flagrante ou intervenção da autoridade policial ou administrativa no crime, a fim de obter um resultado mais eficaz em sua diligência, angariar prova mais robusta. A ação controlada também é chamada de flagrante retardado, esperado, diferido ou prorrogado. O mencionado instituto é prática legal e encontra previsão na Lei de Organizações Criminosas, de Drogas e de Lavagem de Capitais. A ação controlada ocorre enquanto o crime está sendo praticado, não há provocação do agente policial, mas mero acompanhamento e espera para deflagrar o melhor momento da intervenção. No flagrante preparado, por sua vez, o agente policial ou a vítima cria uma situação para que o crime aconteça, provoca uma conduta de uma pessoa, sem a qual o crime não ocorreria, motivo pelo qual o flagrante preparado trata de hipótese de crime impossível e não haverá crime, conforme orienta a Súmula 145 do STF. O que é a entrega vigiada? Resposta: Trata-se de uma das técnicas de ação controlada, cujo objetivo é a identificação do maior número possível de agentes do esquema criminoso, dos ativos ocultos e de outras fontes de prova. A entrega vigiada consiste no monitoramento pela autoridade policial ou administrativa das remessas ilícitas de objetos do ponto de partida até o ponto final. A entrega vigiada pode ser limpa (ou com substituição) ou suja (ou com acompanhamento). Será limpa quando as remessas ilícitas são trocadas antes de serem entregues ao destinatário final por outro produto qualquer, afastandose o risco de extravio da mercadoria; será suja quando a encomenda segue seu itinerário sem alteração do conteúdo. Em que consistem os limites da ação controlada? Resposta: De acordo com o artigo 8º, § 1º, da Lei nº 12.850/13, a ação controlada depende de "prévia comunicação ao juiz competente", isto não
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo significa que a autoridade policial ou administrativa dependa de autorização judicial, pois a eficácia da ação seria colocada em risco em razão da morosidade do procedimento jurídico. Após ser comunicado, o magistrado poderá estabelecer os limites da ação controlada se for o caso, ouvido o Ministério Público. Os limites são de duas espécies: temporal e funcional. O limite temporal fixa um prazo máximo da técnica de obtenção de prova em epígrafe, enquanto o limite funcional consiste na pronta intervenção da autoridade policial ou administrativa por conta da possibilidade de dano a bens jurídicos de maior relevância. O procedimento no caso da comunicação da ação controlada deve transcorrer sigilosamente, desde sua distribuição. A comunicação deverá demonstrar a conveniência da medida e o planejamento de atuação. Ao receber a peça, o juiz comunicará ao Ministério Público, a fim de verificar a necessidade de serem estabelecidos limites à ação controlada. Ao término da diligência, a autoridade policial ou administrativa deverá elaborar um auto circunstanciado acerca da ação controlada.
II.
TRATAMENTO JURÍDICO DO TRÁFICO DE PESSOAS
i.
Lei relacionada ao tema: Lei nº 13.344/16
BREVES COMENTÁRIOS O comércio de seres humanos é uma atividade extremamente rentável para os criminosos, perde somente para o tráfico de drogas e de armas95. Assim, são necessários instrumentos para não só coibir essa atividade, mas também auxiliar as vítimas. Nessa senda, a Lei nº 13.344/16 dispõe sobre a prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional das pessoas, altera o Estatuto do Estrangeiro 96, o Código Penal e o Código de Processo Penal. Os artigos 2º e 3º da supracitada norma cuidam dos princípios e diretrizes para o enfrentamento ao tráfico de pessoas, destacando a importância da cooperação internacional, estruturação de rede e incentivo à participação da sociedade. Ainda, o artigo 6º versa sobre a proteção e o atendimento à vítima direta ou indireta do crime, inclusive, esse capítulo alterou o Estatuto do Estrangeiro e viabilizou a concessão de residência permanente às vítimas de 95
De acordo com a ONU, o tráfico de pessoas movimenta anualmente 32 bilhões de dólares em todo o mundo. http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/assuntos-fundiarios-trabalho-escravo-e-trafico-depessoas/trafico-de-pessoas 96 Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80) foi revogado pela Lei nº 13.445/17 que instituiu a Lei da Migração.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo tráfico de pessoas, independente de sua situação migratória e de colaboração em procedimento administrativo, policial ou judicial. O artigo 8º tratou das medidas assecuratórias relacionadas a bens, direitos ou valores dos investigados, acusados e de terceiros que se beneficiaram com o crime. As medidas poderão ser adotadas de ofício pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade polícia, quando houver indícios suficientes de infração penal. A Lei nº 12.850/13 deverá ser aplicada subsidiariamente. A Lei nº 13.344/16 revolucionou o tratamento que o Brasil dá para o tráfico de pessoas e se ajusta com as convenções internacionais, em especial ao Protocolo de Palermo, ratificado pelo Decreto nº 5.017/2004. Não deve ser encarada como simples inovação do tipo penal, porque criou instrumentos de investigação, estabeleceu princípios e diretrizes para orientar o combate preventivo e repressivo ao crime de tráfico de pessoas, bem como dispôs sobre medidas que auxiliam as vítimas. Esta norma expôs que o tráfico de pessoas não visa somente a exploração sexual, mas também o comércio de remoção de órgãos, adoção ilegal e serviços escravos. QUESTÕES SOBRE TRÁFICO DE PESSOAS QUESTÕES-ESTUDO A Lei nº 13.344/16 trouxe importantes alterações no Direito Penal, mas qual sua maior contribuição para as investigações de crimes de tráfico de pessoas? Resposta: Com relação aos aspectos processuais penais, a Lei nº 13.344/16 inseriu no Código de Processo Penal os artigos 13-A e 13-B que dispõe sobre o acesso aos dados cadastrais97 de vítimas e de suspeitos de forma imediata pelo Delegado de Polícia e pelo órgão do Ministério Público, bem como sobre a requisição de informações acerca das estações rádio base (ERB) que permitem a localização da vítima ou dos suspeitos do delito, esta diligência depende de autorização judicial. Não se trata de novidade legislativa, pois a Lei nº 9.613/98 (Lavagem de Capitais) e a Lei nº 12.850/13 (Organizações Criminosas) possuíam dispositivos semelhantes. Importante consignar que a autoridade policial e o Parquet terão acesso somente aos dados cadastrais da vítima e do investigado consistentes na qualificação pessoal, filiação e endereço. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que essas informações não violam o sigilo e a intimidade tutelada pelo artigo 5º, incisos X e XII, da Constituição Federal (HC 83.338/DF e HC 190.917/SP). 97
A diligência prevista pelo artigo 13-A do CPP pode ser realizada para investigar os seguintes crimes: sequestro e de cárcere privado (art. 148 CP), redução análoga à de escravo (art.149 CP), tráfico de pessoas (art. 149-A CP), extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima (art. 158, § 3º, CP), extorsão mediante sequestro (art. 159 CP) e promover ou auxiliar o envio de menor para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com a finalidade de obter lucro (art. 239 ECA).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Para compreender o artigo 13-B do Código de Processo Penal, esclareço que a estação rádio base (ERB), a grosso modo, é a antena ou estação utilizada pelos aparelhos celulares para se comunicar. Assim, utilizando seus dados é possível saber a localização aproximada de qualquer aparelho celular ligado. Nessa condição, o acesso ao posicionamento das ERB depende de prévia autorização judicial, porque torna-se possível a localização aproximada da pessoa, o que viola o direito à intimidade e à vida privada. Em que sentido a Lei nº 13.344/16 inovou o Direito Penal a ensejar adequação do Brasil com as convenções internacionais? Resposta: No Código Penal, o tráfico de pessoas antes inserido no título dos crimes contra a dignidade sexual foi colocado no título das infrações penais contra a pessoa, expandindo a sua incidência 98. O bem jurídico protegido é a liberdade pessoal de forma ampla, não se limitando à liberdade sexual. Esta alteração se adequou às convenções internacionais que busca prevenir e reprimir o tráfico de pessoas não somente contra a exploração sexual, mas também o comércio de remoção de órgãos, adoção ilegal e serviços escravos.
III.
REPRESSÃO AOS CRIMES PRATICADOS POR ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS E LAVAGEM DE CAPITAIS
i.
Lei relacionada ao tema – Lei nº 9.613/98 e Lei nº 12.683/12
ii.
Jurisprudência Sumulada dos Tribunais Superiores
iii.
Informativos:
a) 866 STF – Lavagem de dinheiro, na modalidade "ocultar", é crime permanente b) 904 STF – simples fato de ter recebido a propina em espécie não configura lavagem de dinheiro c) 904 STF – recebimento de propina em depósitos bancários fracionados pode configurar lavagem
98
De acordo com o artigo 149-A do Código Penal, para a tipificação do crime de tráfico de pessoas o agente deve "agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de: I) remover-lhe órgãos, tecidos ou parte do corpo; II) submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo; III) submetê-la a qualquer tipo de servidão; IV) adoção ilegal; ou V) exploração sexual˜. O tráfico internacional de pessoas é uma causa de aumento de pena (artigo 149-A, § 1º, inciso IV, do Código Penal). Vale destacar que o consentimento do ofendido não exclui o crime, em razão das finalidades do tráfico de pessoas.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo d) 866 STF – culpabilidade de parlamentar que exerce mandato há muitos anos é mais intensa e) 866 STF – reprovabilidade do crime cometido por "homem público" é maior f) 866 STF – pena pode ser aumentada se a lavagem de dinheiro ocorreu por meio de várias transações financeiras envolvendo diversos países g) 866 STF – pena pode ser aumentada se o crime de lavagem envolveu grandes somas de valores BREVES COMENTÁRIOS: A expressão "lavagem de dinheiro" teve origem nos Estados Unidos (money laundering), a partir da década de 1920, quando as lavanderias na cidade de Chicago teriam sido utilizadas pelos mafiosos para ocultar a origem ilícita do dinheiro. Nessa senda, a Lavagem de Capitais pode ser conceituada como o ato ou sequência de atos realizados para encobrir a natureza, localização ou propriedade de bens, direitos ou valores de origem criminosa, a fim de reintroduzi-los à economia formal com aparência de lícita. O crime de Lavagem de Capitais é acessório, parasitário, isto é, a sua tipificação está conectada a uma infração antecedente. Com efeito, a ausência da infração penal antecedente afasta a própria tipicidade do delito de lavagem de dinheiro. Vale destacar que o processo e julgamento dos crimes de lavagem de capitais independe do processo e julgamento das infrações penais antecedentes99, ainda que praticados em outro país (Teoria da Acessoriedade Limitada)100. Outrossim, não há necessidade de condenação judicial anterior para que o crime em epígrafe reste caracterizado, o processo do crime antecedente e do de lavagem de dinheiro podem tramitar em separado. Apesar de haver uma conexão probatória (artigo 76, inciso III, do CPP) entre a infração antecedente e a lavagem de dinheiro, a reunião de processos não é obrigatória. Caberá ao juízo competente para o julgamento da lavagem de capitais decidir sobre a junção dos processos (artigo 2º, inciso II, da Lei nº 9.613/98). Portanto, quando se oferece a denúncia em face do crime de lavagem de capitais, exige-se não apenas o lastro probatório mínimo do crime de lavagem 99
ATENÇÃO: qualquer infração penal (crime ou contravenção penal) pode funcionar como crime antecedente da lavagem de capitais. Desde que de fonte produtora, ou seja, aquela capaz de gerar bens, direitos ou valores possíveis de mascaramento. 100 A condenação em relação à infração penal antecedente não é condição imprescindível para eventual condneação pelo crime de lavagem de capitais. A lavagem poderá ser julgada independentemente da infração penal antecedente.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo de dinheiro, mas é preciso também o lastro probatório mínimo da infração penal antecedente101 (artigo 2º, § 1º, da Lei nº 9.613/98) (justa causa duplicada). QUESTÕES SOBRE LAVAGEM DE CAPITAIS QUESTÕES-ESTUDO A Lei n.º 9.613/98, de 3 de março de 1998, conhecida como Lei da Lavagem de Dinheiro, resulta de compromisso assumido pelo Brasil com a comunidade internacional ao firmar a Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de substâncias Psicotrópicas, nomeada como Convenção de Viena, de 20 de dezembro de 1988, referendada pelo Brasil em 1991 e aprovada pelo DL nº. 162/91. Considerando o contido no texto precedente e a relevância da citada Lei para atacar a criminalidade organizada no aspecto financeiro, responda fundamentadamente às indagações seguintes: a) Elenque e conceitue as três fases para a configuração dos delitos previstos na referida Lei, segundo as definições do GAFI (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo), sustentando ao final acerca da necessidade da ocorrência das três fases para a consumação do ilícito; b) Determine, segundo as três principais correntes doutrinárias, o bem jurídico tutelado pela Lei; c) Dentro do âmbito de aplicação da presente Lei, defina crime parasitário e responda se o crime de sonegação fiscal pode ser crime antecedente em relação ao de lavagem de dinheiro e d) Existe a possibilidade de ocorrência de concurso material entre o crime antecedente e o de lavagem de dinheiro, ou esta hipótese se constitui em verdadeira progressão criminosa? (Questão do Concurso para Promotor de Justiça no MPPR – 2014)102 Espelho: a) 1ª Fase: colocação (placement), ocultação ou conversão, é a separação física do dinheiro dos autores do crime, sem ocultação da identidade dos titulares, antecedida pela captação e concentração do dinheiro; 2ª Fase: dissimulação (layering), nessa fase multiplicam-se as transações mediante a realização de várias transferências via cabo (wire transfer), através de diversas empresas e contas, de modo a que se perca a trilha do dinheiro (paper trail), “A majoritária jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a apuração do crime de lavagem de dinheiro é autônoma e independe do processamento e da condenação em crime antecedente, sendo necessário apenas sejam apontados os indícios suficientes da prática do delito anterior.” (HC 137.628/RJ, julgado em 26/10/2010, DJe 17/12/2010). “(...) 5. O processo e julgamento do crime de lavagem de dinheiro é regido pelo Princípio da Autonomia, não se exigindo, para que a denúncia que imputa ao réu o delito de lavagem de dinheiro seja considerada apta, prova concreta da ocorrência de uma das infrações penais exaustivamente previstas nos incisos I a VIII do art. 1º do referido diploma legal, bastando a existência de elementos indiciários de que o capital lavado tenha origem em algumas das condutas ali previstas. 101
102
Uma das questões mais completas sobre Crime de Lavagem de Dinheiro, abarca diversos temas.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo constituindo-se na lavagem propriamente dita, cujo objetivo é o de tornar não identificável a origem ilícita dos valores ou bens; 3ª Fase: integração (integration ou recycling), se dá quando o dinheiro é empregado em negócios lícitos ou compra de bens, dificultando ainda mais a investigação, já que o criminoso assume ares de respeitável investidor, atuando conforme as regras do sistema. Para a consumação do delito não se exige a ocorrência dessas três fases. b) 1ª corrente: o mesmo bem jurídico do crime antecedente, que é novamente ou mais intensamente lesado com a prática da lavagem; 2ª corrente: a administração da justiça, na ideia de que o cometimento desses crimes torna difícil a recuperação do produto do crime e isso dificultaria a ação da Justiça, sendo este o bem jurídico principal, ao lado da ordem econômica e do sistema financeiro; 3ª corrente: a ordem econômica ou socioeconômica afetada porque, na maioria das vezes, a lavagem se dá mediante a utilização do sistema financeiro, bem como porque a lavagem constitui um obstáculo para a atração de capital estrangeiro lícito, além de comprometer a confiança, que é essencial ao funcionamento do sistema financeiro, afetar o equilíbrio de mercado e a livre concorrência c) Assim como a receptação, a lavagem de dinheiro é considerada um crime derivado, acessório ou parasitário, que se constituem em tipos penais que pressupõem a ocorrência de um delito anterior. Para se receber uma denúncia pelo crime de lavagem de dinheiro, deve haver, no mínimo, indícios de crime antecedente ou crime-base, o que não significa que deva haver condenação prévia. O fundamento para a impossibilidade de inclusão do crime contra a ordem tributária como antecedente da lavagem é a de que no próprio crime de lavagem de dinheiro está contida a ideia de que no crime antecedente haja algum proveito econômico, ou seja, que o sujeito agregue patrimônio. Nos crimes contra a ordem tributária, o sujeito não agrega patrimônio de forma direta, como por exemplo, na sonegação por omissão de receita onde o sujeito deixa de pagar, mas não aumenta patrimônio. Nesse sentido, a sonegação produz dinheiro negro, mas não dinheiro sujo, não podendo, portanto, o crime de sonegação fiscal ser indicado como crime antecedente em relação do de lavagem de dinheiro d) O agente que pratica o crime de lavagem de dinheiro oriundo de atividade criminosa, responde em concurso material pelo crime de lavagem e pelo crime antecedente que deu origem criminosa aos bens, valores ou direitos. Essa não é uma hipótese de progressão criminosa, porque a autonomia dos crimes está expressa na própria lei QUESTÃO-TREINO “LAVAGEM EM CADEIA” (Lei n. 9613/1998): conceituação e compatibilidade com o ordenamento jurídico brasileiro. (59º Concurso Público para Promotor de Justiça no MPGO – 2016)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Espelho: Ocorre a lavagem em cadeia quando o crime antecedente também é crime de lavagem de capitais. Trata-se, pois, da lavagem da lavagem. Com a alteração do art. 1º da Lei 9.613/1998, pela Lei 12.683/2012, toda e qualquer infração penal produtora – aquela capaz de gerar bens, direitos ou valores passíveis de branqueamento – poderá figurar como antecedente de lavagem de capitais (legislação de terceira geração), inclusive o próprio crime de lavagem. Exemplo: lavagem de capitais do rendimento de aplicação financeira oriunda de anterior crime de lavagem. Nesse caso, como a lavagem de capitais inicial tem como elementar uma infração penal antecedente, a comprovação da materialidade da lavagem anterior somente será possível com a identificação da infração penal que a antecedeu. (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação especial criminal comentada – volume único. 4ª ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 330). Portanto, com a extinção do rol de crimes antecedentes, é possível haver a lavagem da lavagem, ao contrário do que ocorria na sistemática anterior, como bem alertava Carla de Carli (Dos crimes: aspectos objetivos. In Lavagem de dinheiro. Org. Carla Verissimo de Carli. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011, p.172-208): “enquanto tivermos o rol de crimes antecedentes do art.1º não será possível punir a lavagem de dinheiro realizada sobre o produto da lavagem de dinheiro anterior.” QUESTÃO-ESTUDO No que tangencia ao tema Lavagem de Dinheiro, responda fundamentadamente se há no ordenamento pátrio a “RESERVA DE AUTOLAVAGEM” e discorra sobre o tratamento jurídico da “AUTOLAVAGEM” (selflaundering) no Brasil sob os prismas da legislação, da doutrina e dos precedentes dos Tribunais Superiores. (57º Concurso Público para Promotor de Justiça no MPGO – 2013) Espelho: Há países (v. g.: Itália e França) em que o autor da infração antecedente não pode responder pelo crime de lavagem de dinheiro (selflaundering), atendendo-se à reserva contida no art. 6º, item 2, “e”, da Convenção de Palermo (“se assim o exigirem os princípios fundamentais do direito interno de um estado parte, poderá estabelecer-se que as infrações enunciadas no parágrafo 1 do presente artigo não sejam aplicáveis às pessoas que tenham cometido a infração principal”). Por excluírem expressamente o autor do crime antecedente do âmbito da lavagem de dinheiro, diz-se que estes países fazem a “reserva de autolavagem”. Interpretando-se esse dispositivo, entende-se que deve estar expresso na legislação interna o fato de não ser
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo punível o mesmo agente por ambos os crimes. Na Itália e na França, por exemplo, prenomina a estruturação típica da lavagem de capitais como a da receptação ou do favorecimento real, não se admitindo que o autor da infração antecedente seja também o autor da conduta de reciclagem. Em outros termos, nessas legislações a lavagem de capitais é considerada post factum impunível. Por outro lado, no Brasil, não existe tal vedação legal, “sendo este um claro indicativo da possibilidade de responsabilização criminal do autor do delito base pelo crime de lavagem de capitais”. Em outros termos: não há a “reserva de autolavagem” no Brasil. Fixada esta noção, calha acentuar como a doutrina e os tribunais têm se posicionado sobre o tema (autolavagem). Primeira corrente doutrinária: não pode haver concurso material entre a infração antecedente e o branqueamento, assim como não ocorre concurso material entre o delito antecedente e a receptação/favorecimento real praticados pelo mesmo autor. Para Delmanto, “àquele que é condenado pelo delito antecedente não se pode impor o dever jurídico de espontaneamente entregar ao Estado, para ser confiscado, o produto ou o provento do crime pelo qual foi apenado. É contra a natureza das coisas, o bom senso e até mesmo a lógica punir o delinquente por ter, ele mesmo, sem ofender outros bens juridicamente tutelados […] ocultado ou dissimulado a origem do dinheiro proveniente do crime que praticou e pelo qual já está sendo punido. A conduta posterior é, portanto, atípica; a sua punição, ademais, importaria em inadmissível bis in idem”. Para esse entendimento, a lavagem funcionaria como mero exaurimento do delito precedente. Argumenta-se, ainda, que a tese do concurso material fere de morte o princípio que veda a autoincriminação (art. 5º, LXIII, CR/88), haja vista que não se poderia exigir de uma pessoa que delinquiu que se entregue à polícia ou à Justiça. Segunda corrente doutrinária: preconiza que, ao contrário do que se dá com a receptação e o favorecimento real, nada impede que o sujeito ativo da infração antecedente também responda pelo crime de lavagem de capitais (selflaundering), pelos seguintes motivos: a) a legislação brasileira não veda expressamente a punição da autolavagem, inexistindo a chamada “reserva de autolavagem” prevista em outros países; b) comparando-se a redação do art. 1º da lei 9.613/98 com aquela do art. 349 do Código Penal, nota-se que consta desse tipo penal expressa exoneração do autor do ilícito antecedente, o que não acontece no crime de lavagem de capitais; c) não se afigura possível a aplicação do princípio da consunção (incidente nas hipóteses de pós-fato impunível) em razão de o branqueamento configurar lesão autônoma a bem jurídico diverso daquele afetado pela infração antecedente; ser praticado contra sujeito passivo distinto e cometido por meio de conduta não compreendida como consequência natural e necessária da primeira; d) não há ofensa ao brocardo nemo tenetur se detegere, haja vista que, em virtude do princípio da convivência das liberdades, não se permite que qualquer das liberdades seja exercida de modo danoso à ordem pública e às liberdades alheias, do que se infere que o aludido brocardo não pode ser entendido em sentido absoluto. Assim, da mesma forma que o autor de um homicídio também responde por fraude processual (art. 347, CP), caso venha a inovar artificiosamente o estado do lugar, de coisa ou de pessoa,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito em processo penal, o autor da infração antecedente também deverá responder por lavagem de capitais se, após o exaurimento do delito-base, empreender nova conduta delituosa visando à ocultação dos bens, direitos e valores obtidos ilicitamente. Não se pode admitir que o direito de não produzir prova contra si mesmo possa atenuar a responsabilidade criminal do agente quanto a este novo delito por ele praticado para ocultar o primeiro; e) Renato Brasileiro aponta, ainda, outro argumento em reforço à segunda corrente: “levando-se em consideração que um terceiro que não concorreu para a infração antecedente pode, de alguma forma, concorrer para a lavagem de dinheiro, que permanece sob a direção e controle do autor da infração-base, que, por possuir domínio do fato, seria considerado autor, fosse vedada a punição da autolavagem, ter-se-ia, então, uma situação em que existiriam partícipes de um crime sem autor.” Exceção à possibilidade de punição da autolavagem: nas modalidades adquirir, receber e receber em garantia do art. 1º, § 1º, II, da Lei 9.613/98, entende-se que, por uma questão lógica, o sujeito ativo do delito será necessariamente pessoa diversa daquela que praticou a infração antecedente, porquanto não se pode adquirir o que já é seu, nem se receber algo a não ser que essa coisa pertença a terceiro. Precedentes do STF e do STJ: os Tribunais Superiores têm admitido a punição do autor tanto pelo crime antecedente por ele praticado como pela subsequente lavagem de dinheiro, em razão de que: a) não há falar em mero exaurimento do delito-base; b) a lavagem de dinheiro configura crime autônomo; c) não há bis in idem em razão de os bens jurídicos tutelados serem diversos (em regra). QUESTÃO-TREINO Haverá tipificação do crime de Lavagem de Capitais, se houver a extinção da punibilidade pela prescrição quanto à infração penal antecedente?
Resposta: Após a alteração da Lei nº 9.613/98 pela Lei nº 12.683/12, o crime de Lavagem de Capitais será tipificado, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente (art. 2º, §1º, da Lei nº 9.613/98). Logo, poderá haver o crime de lavagem de dinheiro.
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QUESTÃO-ESTUDO Segundo previsão expressa do art. 2º, § 2º da Lei n.° 9.613/98, o art. 366 do CPP não se aplica no caso do processo pelo crime de lavagem de dinheiro. Por quê?103 Resposta: Trata-se de mera opção legislativa. O legislador entendeu que, para os crimes de lavagem de dinheiro, deve haver um tratamento mais rigoroso ao réu, não se aplicando a suspensão do processo: “A suspensão do processo constituiria um prêmio para os delinquentes astutos e afortunados e um obstáculo à descoberta de uma grande variedade de ilícitos que se desenvolvem em parceria com a lavagem ou a ocultação.” (item 63 da Exposição de Motivos 692/MJ). Todavia, o dispositivo ainda é polêmico, pois parte da doutrina entende que a não aplicação do artigo 366 do CPP é inconstitucional e outra defende ser constitucional (TR3 e Gilmar Mendes).
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Fonte: https://www.dizerodireito.com.br/2012/07/comentarios-lei-n-126832012-que-alterou.html
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 5. Direito Civil Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Das pessoas. Das pessoas naturais e jurídicas. Personalidade e da capacidade. Dos direitos da personalidade. Da ausência. Das pessoas jurídicas. Disposições gerais. Constituição, extinção, responsabilidade. Associações, fundações e sociedades. Desconsideração da personalidade jurídica. Do domicílio. Dos bens. Dos bens considerados em si mesmos (bens imóveis, móveis, fungíveis e consumíveis, divisíveis, singulares e coletivos). Dos bens reciprocamente considerados. Bens públicos e particulares. Dos fatos jurídicos. Do negócio jurídico: modalidade, forma, defeitos e nulidades. Da representação. Da condição, do termo e do encargo. Dos defeitos do negócio jurídico. Da interpretação do negócio jurídico. Da invalidade e da ineficácia do negócio jurídico. Dos atos jurídicos lícitos. Dos atos ilícitos. Da prescrição e da decadência. Da forma e da prova. Do direito das obrigações. Das modalidades e efeitos. Adimplemento, extinção e inadimplemento das obrigações. Cláusula Penal e arras. Transferência das obrigações. Responsabilidade civil: culpa, dano, nexo de causalidade e excludentes. Responsabilidade objetiva. Responsabilidade contratual e extracontratual. Dos contratos em geral. Disposições gerais: Princípios, requisitos, formação, interpretação, classificação. Dos efeitos. Vícios redibitórios. Evicção. Da extinção do contrato. Das várias espécies de contrato. Do direito das coisas: Princípios. Da posse e de sua classificação. Da aquisição, efeitos e perda da posse. Dos Direitos Reais. Da propriedade em geral. Histórico da propriedade e sua funcionalidade social. Da aquisição da propriedade imóvel e móvel. Usucapião constitucional urbana. Usucapião constitucional rural. Usucapião especial coletiva. Usucapião administrativa. Usucapião especial indígena. Da perda da propriedade. Das restrições ao direito da propriedade. Dos direitos de vizinhança. Do condomínio geral. Do condomínio necessário. Do condomínio edilício. Novas formas de propriedade condominial. Condomínios e incorporações. Da propriedade resolúvel. Da propriedade fiduciária. Dos direitos reais sobre coisa alheia. Da superfície. Das servidões. Do usufruto e da administração dos bens de filhos menores. Do uso. Da habitação. Do direito do promitente comprador. Do penhor, da hipoteca e da anticrese. Incorporação. Parcelamento e Regularização do Solo Urbano.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Estatuto da Cidade. Do direito de família. Do direito pessoal. Do casamento. Da capacidade matrimonial. Formalidades. Dos impedimentos. Das causas suspensivas. Do processo de habilitação. Da celebração e do casamento. Das provas do casamento. Dos efeitos. Da eficácia do casamento. Da invalidade ou nulidade do casamento. Da dissolução da sociedade e do vínculo conjugal (manter apesar da discussão quanto à separação). Do pacto antenupcial. Do regime de comunhão parcial. Do regime de comunhão universal. Do regime de participação final dos aquestos. Do regime de separação de bens. Do direito assistencial. Da proteção da pessoa dos filhos. Da filiação: registral, biológica e socioafetiva. Do reconhecimento dos filhos. Da adoção. Do poder familiar. Do direito patrimonial. Da união estável. Da Conversão da União Estável em Casamento. Do Casamento ou Conversão da União Estável em Casamento de Pessoas do Mesmo Sexo. Da guarda, tutela, curatela e da interdição. Do bem de família. Alienação Parental. Dos direitos das sucessões: Da sucessão em geral. Da sucessão legítima. Da sucessão testamentária. Do testamento em geral. Da capacidade de testar. Das formas ordinárias do testamento. Da revogação. Dos codicilos. Dos testamentos especiais. Das disposições testamentárias. Dos legados. Herdeiros necessários. Do direito de acrescer entre herdeiros e legatários. Das substituições. Da deserdação. Da redução das disposições testamentárias. Da revogação. Do rompimento do testamento. Do testamenteiro. Do inventário e da partilha. Registros Públicos. Registro de imóveis. Noções gerais. Princípios do Registro de Imóveis: Continuidade, Especialidade, Legalidade, Inscrição, Presunção e Fé Pública, Prioridade e Instância. Transcrição, inscrição e averbação. Procedimento de dúvida. Lei Federal nº 6.015/73. Lei Federal nº 4.591/64. Registro Civil das Pessoas Naturais. Do Nascimento. Lei Federal 11.790/08. Do Registro Civil Fora do Prazo. Do Casamento. Do Registro do Casamento Religioso para Efeitos Civis. Do Óbito. Da Morte Presumida. Da Emancipação, da Interdição, da Ausência, da União Estável e da Adoção. Das Averbações em Geral e Específicas. Das Anotações em Geral e Específicas. Das Retificações, Restaurações e Suprimentos. Reconhecimento de Filhos.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro
4) Leis relacionadas ao tema Decreto-Lei 4.657/42 Breves comentários A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, Decreto-Lei 4.657/42, nem sempre possuiu esse nome. Até a entrada em vigor da Lei 12.376/10, era chamada de Lei de Introdução ao Código Civil. A atual denominação é a mais correta porque, de fato, não se trata de introdução às normas previstas no Código Civil, mas sim de regras que se aplicam a todo o ordenamento. Até por isso a doutrina costumeiramente classifica a LINDB como “sobrenorma”, ou seja, normas que disciplinam outras normas. Nos dizeres de Cristiano Chaves, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald: “A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro é uma sobrenorma, ou uma norma de sobredireito (a expressão, em português, é criação de Pontes de Miranda). Apenas mediatamente dirige-se à conduta humana. O direito brasileiro infraconstitucional, nesse contexto, submete-se, em princípio, à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Formalmente falando, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro foi recebida, pela atual ordem constitucional, como lei ordinária” (manual de direito civil – volume único, Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, pág. 156). Recentemente, no ano de 2018, a LINDB sofreu uma importantíssima mudança com a entrada em vigor da Lei 13.655/18, que trouxe disposições sobre “segurança jurídica e eficiência na criação e na aplicação do direito público”, acrescentando à sua redação os artigos 20 a 30, sugiro fortemente a leitura, são curtos, embora há (e haverá) muita discussão acerca da constitucionalidade.
QUESTÕES-ESTUDO 1. Considerando que a Lei “A” foi publicada em 01/05/2017 e foi revogada pela Lei “B”. Pergunta-se: a) A Lei “B” começa a vigorar ao mesmo momento no Brasil e nos países estrangeiros? b) A Lei “A” poderá ser aplicada mesmo após ser revogada?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo c) É possível a modificação do texto legal durante o período de vacatio legis? d) c) Considerando a publicação de nova Lei “C” revogado a Lei “B”, ocorrerá o efeito repristinatório, voltando a Lei “A” a viger? e) É possível a retroatividade de lei? f) O costume pode revogar ou modificar a lei? RESPOSTAS: a) Não. A vigência se dá em momentos distintos. Em primeiro lugar, vale aproveitar o momento para fazer a distinção entre vigência e vigor de uma norma.Vigência é o “período de tempo em que a norma goza de eficácia, ou seja, ocorre desde o momento da sua publicação para leis sem vacatio legis e após a vacatio legis para as demais leis, tendo seu termo final com a revogação” (KUMPEL, Vitor Frederico, introdução ao estudo do direito, São Paulo: Método, 2007, pag.110/111). Em outras palavras, é o espaço temporal entre sua entrada em vigor até a revogação. Já o fenômeno do vigor, é a “força vinculante da norma, ou seja, o fator que condiciona os sujeitos de direito ao império da norma, transcendendo o período de vigência ou eficácia da norma” (KUMPEL, Vitor Frederico, introdução ao estudo do direito, São Paulo: Método, 2007, pag. 111). O artigo 1º da LINDB estabelece que, salvo disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada. O parágrafo primeiro desse mesmo artigo, por sua vez, prevê que a lei passará a viger nos Estados estrangeiros, quando admitida, 3 meses após oficialmente publicada. b) Sim. A Lei “A” regerá as relações jurídicas que foram realizadas durante sua vigência. Trata-se do fenômeno da ultratividade da lei. Ultratividade da norma é o “fenômeno pelo qual a norma já foi revogada, ou seja, não tem mais vigência, mas continua a gerar força vinculante” (KUMPEL, Vitor Frederico, introdução ao estudo do direito, São Paulo: Método, 2007, pag. 112) Ex. A Lei “A” incidiu sobre determinado negócio jurídico realizado na sua vigência. Mesmo com a sua revogação pela lei “B”, ela ainda regerá tal negócio. Assim, em caso de judicialização, o magistrado deverá analisar a demanda à luz da Lei “A”, que vigia no momento da surgimento da obrigação, e não da Lei “B”vigente no momento da prolação da sentença. c) Sim. Nos termos do artigo 1º, §3º, da LINDB. Vacatio legis é o “período de tempo ou intervalo entre a data da publicação da lei no Diário Oficial e a sua entrada em vigor, ocasião em que a norma passa a gozar de obrigatoriedade”.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (KUMPEL, Vitor Frederico, introdução ao estudo do direito, São Paulo: Método, 2007, pag. 115). Voltando a questão, publicada a Lei “B” com vacatio legis de 30 dias, poder-seà modificar seu texto, nos termos do artigo citado acima, contudo, o prazo da vacatio legis começará novamente. Exemplo, Lei “B” foi publicada em 20/07/2018, com vacatio legis de 30 dias, no dia 29/07/2018 é publicada novo texto. A vacatio de 30 dias, então, começará a contar novamente dessa última data. Por fim, vale uma observação importante. Caso superado o período de vacatio legis, a lei já está em vigor e, assim, eventual mudança no seu texto deverá ocorrer por uma nova lei retificadora, nos termos do art. 1º, §4º, da LINDB. d) Estabelece o artigo 2º da LINDB que, não destinado à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique e a revogue. Já o parágrafo terceiro do mesmo artigo prevê que, salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência. Trata-se aqui do fenômeno da repristinação, que proíbe, salvo disposição em contrário, que a norma revogada volte a viger diante da revogação da sua lei revogadora. e) Em regra, a lei não retroagirá, nos termos do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal e 6º da LINDB. Assim, temos a irretroatividade das leis como regra e a retroatividade como exceção. Nos dizeres de Carlos Roberto Gonçalves: Acolheu-se a teoria subjetiva de Gabba, de completo respeito ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada. Assim, como regra, aplica-se a lei nova aos casos pendentes (facta pendentia) e aos futuros (facta futura), só podendo ser retroativa, para atingir fatos já consumados, pretéritos (facta praeterita), quando: não ofender o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada ou quando o legislador expressamente mandar aplicá-la a casos pretéritos, mesmo que a palavra retroatividade não seja usada GONÇALVES, Carlos Roberto, direito civil esquematizado, volume I, São Paulo: Saraiva, 2011,pág; 82) Sobre o tema, merece ainda trazer a lição de Farias, Braga Netto e Rosenvald: “No contexto descrito é possível afirmar que as leis não têm retroatividade. Assim sendo, a lei nova é aplicável aos casos pendentes e futuros. Excepcionalmente, no entanto, admitir-se-à a aplicação da lei nova aos casos passados (a retroatividade) quando: (i) houver expressa previsão na lei, determinando sua aplicação a casos pretéritos (ou seja, no silêncio da lei, prevalece a irretroatividade, e (ii) desde que essa retroatividade não ofenda o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.” (Manual de direito civil – volume único, Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, pág. 168).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo f) Não. O artigo 4º da LINDB estabelece que, quando a lei for omissa, o juiz decidirá de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito. Quanto a analogia, cito uma sucinta e importante lição de Farias, Braga Netto e Rosenvald: “A analogia busca semelhanças entre casos que, embora diferentes, guardam fortes ou razoáveis similitudes. Por isso, nesses casos, postula-se a aplicação da mesma norma, porque idêntica a razão jurídica que norteou a solução dos outros casos (já previstos em lei). Costuma-se bipartir a analogia em analogia legis e analogia juris. A primeira seria a operação a partir de uma norma jurídica isolada (essa é a verdadeira analogia, no seu sentido tradicional); e a segunda – analogia juris – parte-se, não de uma norma, mas do sistema jurídico como um todo” (Cristiano Chaves, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald, manual de direito civil – volume único, Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, pag. 161). Agora voltando aos costumes. A doutrina costuma classificá-los em secundum legem, praeter legem e contralegem. Secundum legem é o costume de acordo com a lei. Praeter legem é o costume que se forma por ausência de qualquer lei. Contralegem é o costume que confronta a lei. A doutrina majoritária não a admite. Portanto, respondendo a questão, não é possível que costume modifique ou revogue lei, pois, nos termos do artigo 3º da LINDB, “ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”.
QUESTÃO-TREINO Casamento e leis aplicáveis Marx, economista alemão, professor universitário, residente no Brasil, casou-se com Manuela, brasileira, advogada, em Cabo Frio, Rio de Janeiro. Pergunta-se a) A lei de qual país regerá os impedimentos, as formalidades do casamento e regime de bens? b) Após longas décadas de convivências com Manuela, Marx falece em sua casa, na zona oeste de São Paulo. Segundo a LINDB, a Lei de qual país é aplicável, da Alemanha, país de nascença de Marx ou Brasil, país do seu domicílio?
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RESPOSTA: a) Nos termos do artigo 7º, §1º, LINDB é a lei brasileira que incide sobre os impedimentos e as formalidades da celebração do casamento. Já o regime de bens, legal ou convencional, também será regido pelas leis brasileiras, pois aqui é o domicílio do casal, nos termos do §4º do artigo 7º. b) Nos termos do artigo 10, §1º da LINDB a lei aplicável é brasileira, pois quando do seu falecimento, Marx possuída domicílio no país, desde que seja mais benéfico para Manuela ou de seus filhos. Caso a lei da Alemanha seja mais benéfica para Manuela e eventuais filhos, é ela que irá incidir. QUESTÃO-TREINO Cobrança de dívidas por empresas estrangeiras Neymar, jogador amador de poker, participou de um torneio em Las Vegas. Como era um assíduo hóspede do Cassino, não pagou antecipadamente pelas fichas, assinou espécie de título de crédito, confessando a dívida. Diante da sua péssima performance, Neymar perdeu todo seu dinheiro e retornou ao Brasil sem pagar a dívida com o Cassino americano. Perguntase: o Cassino pode propor ação de cobrança no Brasil para cobrar dívida de jogo contraído em outro país?
Sim, é possível que o cassino americano ajuíze ação de cobrança. Com efeito, Neymar, apesar de sua ousadia e alegria, não poderá alegar impossibilidade
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo jurídica do pedido, sob o fundamento que o ordenamento brasileiro proíbe a dívida de jogo. Isso porque o artigo 9º da LINDB expressamente prevê que as obrigações serão qualificadas e reger-se-ão pela lei do país em que se constituírem. Com efeito, uma vez que o Estado de Nevada, onde se localiza a Cidade de Las Vegas, permite a prática desses jogos em cassinos, é possível a persecução da dívida no país. Ademais eventual impossibilidade de cobrança de dívida de jogo no país acarretaria enriquecimento sem causa a Neymar. Nesse sentindo, manifesta-se o STJ: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. COBRANÇA. DÍVIDA DE JOGO. CASSINO NORTE-AMERICANO. POSSIBILIDADE. ART. 9º DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO. EQUIVALÊNCIA. DIREITO NACIONAL E ESTRANGEIRO. OFENSA À ORDEM PÚBLICA. INEXISTÊNCIA. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. VEDAÇÃO. TRIBUNAL ESTADUAL. ÓRGÃO INTERNO. INCOMPETÊNCIA. NORMAS ESTADUAIS. NÃO CONHECIMENTO. PRESCRIÇÃO. SÚMULA Nº 83/STJ. CERCEAMENTO DE DEFESA. OCORRÊNCIA. 1. Na presente demanda está sendo cobrada obrigação constituída integralmente nos Estados Unidos da América, mais especificamente no Estado de Nevada, razão pela qual deve ser aplicada, no que concerne ao direito material, a lei estrangeira (art. 9º, caput, LINDB). 2. Ordem pública é um conceito mutável, atrelado à moral e a ordem jurídica vigente em dado momento histórico. Não se trata de uma noção estanque, mas de um critério que deve ser revisto conforme a evolução da sociedade. 3. Na hipótese, não há vedação para a cobrança de dívida de jogo, pois existe equivalência entre a lei estrangeira e o direito brasileiro, já que ambos permitem determinados jogos de azar, supervisionados pelo Estado, sendo quanto a esses, admitida a cobrança. 4. O Código Civil atual veda expressamente o enriquecimento sem causa. Assim, a matéria relativa à ofensa da ordem pública deve ser revisitada sob as luzes dos princípios que regem as obrigações na ordem contemporânea, isto é, a boa-fé e a vedação do enriquecimento sem causa. 5. Aquele que visita país estrangeiro, usufrui de sua hospitalidade e contrai livremente obrigações lícitas, não pode retornar a seu país de origem buscando a impunidade civil. A lesão à boa-fé de terceiro é patente, bem como o enriquecimento sem causa, motivos esses capazes de contrariar a ordem pública e os bons costumes. 6. A vedação contida no artigo 50 da Lei de Contravenções Penais diz respeito à exploração de jogos não legalizados, o que não é o caso dos autos, em que o jogo é permitido pela legislação estrangeira. 7. Para se constatar se houve julgamento do recurso de apelação por órgão incompetente e se, no caso, a competência é absoluta, seria necessário examinar a competência interna da Corte estadual a qual está assentada em Resolução e no Regimento Interno, normas que não se revestem da qualidade de lei federal, o que veda seu conhecimento em recurso especial. 8. A juntada
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo dos originais de documento digital depende de determinação judicial e, no caso dos autos, tanto o juiz de primeiro grau quanto a Corte estadual dispensaram a providência, dada a ausência de indícios de vício, não restando comprovada a violação do art. 365, § 2º, do CPC/1973. 9. Nos termos da iterativa jurisprudência desta Corte, sedimentada em recurso repetitivo, a ação monitória fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo de 5 (cinco) anos, previsto para a cobrança de dívidas líquidas. Incidência da Súmula nº 83/STJ. 10. Apesar de se tratar de processo monitório, havendo dúvidas acerca do contexto em que deferido o crédito, de valor vultoso, sem a exigência de garantias, deve ser permitida a produção de provas em sede de embargos, sob pena de cerceamento de defesa. 11. Recurso conhecido em parte e, nessa parte, parcialmente provido. (REsp 1628974/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 25/08/2017)
Das pessoas Jurídicas QUESTÕES-ESTUDO Princípios aplicáveis às pessoas jurídicas O artigo 5º, inciso II da Constituição Federal prevê o chamado princípio da legalidade, do qual, dentre outros, decorre o princípio da autonomia privada da vontade. Aplicando-se tal regramento para a criação de fundações privadas e associações, temos que é garantido, desde que observados os limites legais, sua livre constituição. Partindo-se das previsões constantes na Constituição Federal e no Código Civil, responda, fundamentadamente, as questões abaixo: a) Há diferença entre fundações e associações quanto ao alcance do princípio da autonomia privada da vontade, no que concerne a sua instituição? Resposta: Desde que observados os requisitos previstos no Código Civil, e outras legislações, como por exemplo, a Lei de Registros Públicos, associações e fundações privadas poderão ser criadas livremente, ou seja, a ambas se aplica o princípio da autonomia de vontade. No entanto, é possível afirmar que o espectro de abrangência de referido princípio é diferenciado, sofrendo mitigações em relação à criação de entidades fundacionais, cuja constituição deve observância ao quanto previsto no artigo 62, parágrafo único do Código Civil. Tal dispositivo elenca, de forma exaustiva, quais as finalidades que poderão ser buscadas pela entidade, limitando a manifestação de vontade do
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo instituidor. No que se refere às associações, porém, o artigo 5º, incisos XVII e XVII da Constituição Federal prevê a liberdade associativa e a não intervenção estatal em seu funcionamento, definindo que tais entidades poderão ser livremente criadas, não sendo possível ao legislador impor condições à manifestação de vontade do instituidor, respeitadas, obviamente aquelas gerais previstas no Código Civil para todas as pessoas jurídicas. b) O Ministério Público pode limitar o exercício dessa autonomia? Resposta: De acordo com as disposições do Código Civil, não é o Parquet que efetivamente limita a vontade do instituidor, mas sim, no exercício regular de suas atribuições legais, fiscaliza que referida manifestação esteja de acordo com as regras legais previstas pelo legislador. Assim, ao indeferir a constituição de uma Fundação, por exemplo, por não observar alguma das finalidades previstas no Código Civil, o Ministério Púbico não o faz em decorrência de critérios de conveniência e oportunidade, mas por não respeitar as regras legais previstas no ordenamento jurídico, exercendo unicamente controle dos limites impostos pelo legislador.
QUESTÃO-TREINO Fundações e Associações Por definição legal, Fundações privadas e Associações são pessoas jurídicas às quais se veda a atuação dirigida à finalidade lucrativa. Imaginese que tais entidades venham a comercializar alguns produtos que tenham recebido em doação de particulares, obtendo superávit de tal operação. Considerando tal vedação legal, essa iniciativa deve ser considerada ilegal?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta: Não há qualquer ilegalidade em tal opção, vez que lucro e superávit, mesmo que guardem intrínseca relação conceitual, pois ambos representam a obtenção de resultados financeiros positivos decorrentes de uma certa atividade, não se confundem. O que os diferencia, em linhas gerais, é a finalidade e destinação. Enquanto que o lucro tem por finalidade de ordem eminentemente individual, sendo destinado à satisfação de interesses de natureza privada, o superávit, no contexto de associações e fundações, tem por fim a potencialização da capacidade financeira em desenvolver suas atividades voltadas ao coletivo, devendo ser destinado, e empregado, na própria entidade. Assim, além de não ser vedado, a atuação superavitária de tais entidades, desde que respeitados os aspectos expostos, deve ser incentivada, principalmente porque se apresenta como meio de obtenção de recursos financeiros para potencial o desenvolvimento de suas respectivas atividades finalísticas.
QUESTÃO-TREINO Entidades desportivas Como se sabe, as entidades desportivas são pessoas jurídicas de direito privado que ostentam natureza associativa, às quais a Constituição Federal (art. 217, I) garante autonomia quanto a sua organização e funcionamento. Por seu turno, ao tratar das associações privadas, o Código Civil fixa competir à assembleia geral deliberar sobre a destituição dos administradores e sobre a alteração do estatuto. Em razão de ambas as previsões, pergunta-se: a) uma entidade desportiva, ao argumento de exercer sua prerrogativa constitucional, poderia deixar de observar as regras do Código Civil e prever que referidas matérias poderão ser deliberadas por órgão diverso?
Resposta: Já há muito encontra-se assentada a premissa de que nenhum direito assume viés absoluto, mesmo os de índole constitucional, de forma a não ser possível à uma entidade esportiva invocar o art. 217, I da CF como argumento para desrespeitar as normas gerais previstas no Código Civil. O STF, inclusive, ao decidir o Ag. Reg. no RE nº 935.482/SP, julgado em 07/02/2017, de Relatoria da
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Min. Rosa Weber, afirmou não haver qualquer de incompatibilidade entre o quanto previsto na norma constitucional (CF, 217, I), que garante autonomia quanto à organização e funcionamento das entidades desportivas, e a norma geral prevista no Código Civil (CC, 59) que, por sua vez, confere prerrogativa exclusiva à Assembleia Geral das entidades associativas deliberar pelas eventuais alterações estatutárias. Ademais, tal entendimento já foi também adotado pelo STF no julgamento da ADI 2937/DF, de relatoria do Min. Cesar Peluso, oportunidade em que se afirmou que a imposição das normas gerais previstas no Código Civil às entidades desportivas não ofende a autonomia prevista no artigo 217, I da CF, tampouco qualquer forma de lesão a direitos e garantias fundamentais. b) a partir da resposta anterior, e considerando o quanto previsto nos mencionados diplomas normativos, haveria alguma irregularidade se tal entidade admitisse a transferência automática de natureza hereditária da condição de associado?
Resposta: Não há qualquer forma de irregularidade a ser reconhecida no caso, vez que a deliberação encontra-se inserida na esfera de autonomia conferida às entidades desportivas tanto pelo referido art. 217, I, quanto pelo art. 5, incisos XVII, ambos da Constituição Federal, bem como está em consonância com as regras gerais previstas no Código Civil. Como se sabe, o art. 56 do Código Civil prevê competir à própria entidade, por meio de seu estatuto, tratar sobre a eventual transmissibilidade da condição de associado, aplicando-se a norma supletiva, que veda tal proposição, apenas na hipótese de lacuna estatutária. Dessa forma, ao decidir por admitir a transmissão hereditária da condição de associado, a entidade o faz no regular exercício de suas prerrogativas constitucionais e legais, não havendo qualquer irregularidade em tal deliberação.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Fiscalização das Fundações Conforme previsto no artigo 71, II da Constituição Federal, compete ao Tribunal de Contas da União julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal. Analisando alcance de tal dispositivo, responda as seguintes questões: a) é possível afirmar que tal competência fiscalizatória abrange as Fundações privadas?
Resposta: Como regra, as Fundações privadas, por serem pessoas jurídicas de direito privado (CC, 44), que manejam verbas de natureza também privada, não se submetem à fiscalização dos tribunais de contas. Nesse caso, compete ao Ministério Público, no exercício de suas atribuições legais de velamento (CC, 66) tal atribuição, o que se dá por meio da prestação de contas anual. No entanto, tais entidades, não obstante tal natureza privada, estarão sujeitas ao exercício das competências fiscalizatória dos Tribunais de Contas na hipótese de manusearem verbas públicas, o que pode advir da celebração de parcerias com o Poder Público. Mas é de se ressaltar que a atuação das Cortes de Contas fica restrita unicamente às verbas públicas, excluídas as verbas de natureza eminentemente privada. b) e se a Fundação for instituída por uma Sociedade de Economia Mista (administração indireta) com natureza jurídica de direito privado, há limites para a atuação da Corte de Contas?
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Resposta: Em recente decisão, proferida em sede do Agravo Regimental em Mandado de Segurança nº 32.703/DF, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, julgado em 10/04/2018 (informativo nº 897), o Supremo Tribunal Federal estabeleceu que se deve observar o critério cronológico de instituição da entidade fundacional e a origem dos recursos para que se possa afirmar a possibilidade de fiscalização pelo Tribunal de Contas. Se criada antes da promulgação da Constituição Federal, há que se analisar se a Fundação foi constituída em observância aos termos do decreto-lei 900/69, excluída a atuação do Tribunal de Contas se lhe foi atribuída natureza de direito privado e se não executar atividades típicas do poder público o que ocorre com a sociedades de economia mista, criadas, em linhas gerais, com finalidade de atuar no mercado em regime concorrencial. Por sua vez, deve ser analisada a origem dos recursos manuseados, de forma que apenas aqueles de origem pública e que tenham sido efetivamente repassados à Fundação, além dos aspectos acima apontados, é que legitimarão a atuação do Tribunal de Contas. De outro lado, no que se refere aos recursos financeiros de origem estritamente privadas, que podem advir de doações recebidas de particulares, não há legitimidade ao Tribunal de Contas para submeter a entidade à sua fiscalização, vez que a natureza eminentemente privada que a reveste lhe garante liberdade de atuação, em respeito ao princípio da autonomia da vontade.
Desconsideração da personalidade jurídica No que consiste e qual o fundamento da desconsideração da personalidade jurídica indireta?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Resposta: Como regra, a desconsideração da personalidade jurídica exige a ocorrência do abuso da personalidade jurídica, admitindo que os efeitos de algumas obrigações contraídas originalmente pela PJ atinjam os bens particulares dos respectivos sócios. De acordo com a Teoria Maior, adotada pelo Código Civil no artigo 50, esse abuso pode ser caracterizado pela ocorrência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. A desconsideração indireta se apresenta como uma hipótese configuradora de confusão patrimonial, presente em grupos societários, na qual a empresa controladora se vale de uma de suas controladas como “escudo” para a prática de negócios jurídicos de forma que o eventual credor, ao buscar a satisfação da obrigação, não encontra condições suficientes para tanto. A teoria da desconsideração indireta prevê a possibilidade de que se busque a satisfação da obrigação junto ao patrimônio da empresa controladora, desconsiderando-se, episodicamente, a personalidade jurídica da empresa controlada, com a qual o credor tenha celebrado originalmente a obrigação.
QUESTÃO-TREINO Ultra Vires e teoria da aparência No que consiste a teoria da ultra vires? Trata-se de teoria aplicável no direito brasileiro, especialmente em razão da teoria da aparência?
Resposta: De acordo com o artigo 47 do Código Civil, os atos praticados pelos respectivos representantes vinculam a pessoa jurídica, desde que a representação seja exercida nos limites do quanto previsto no ato constitutivo. É dizer, na hipótese de o administrador abusar dos poderes que lhe foram outorgados e praticar atos estranhos àqueles previstos no ato constitutivo, a pessoa jurídica não se verá obrigada por eles, respondendo pessoalmente apenas o administrador. Nesse
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo sentido, a teoria da ultra vires consiste na possibilidade de se desvincular a pessoa jurídica da responsabilidade por atos praticados com abuso ou desvio de poder por parte do administrador, mesmo que este tenha atuado em nome daquela. O Código Civil, no artigo 1015, parágrafo único prevê hipóteses de aplicação da teoria da ultra vires, exonerando da responsabilidade a pessoa jurídica nas hipóteses elencadas nos incisos I, II e III, debatendo a doutrina sobre a aplicação da teoria da aparência em favor de terceiro de boa-fé. O posicionamento prevalente da doutrina, representada por Nelson Rosenvald, bem como da jurisprudência, defende que o terceiro de boa-fé, em regra, deve ser protegido nas hipóteses de terem sido praticados atos que extrapolaram os poderes conferidos ou o objeto social da pessoa jurídica, em aplicação da teoria da aparência. No entanto, é plenamente possível a exoneração completa da pessoa jurídica na hipótese em que se comprove que o terceiro tinha ciência de que o ato praticado pelo representante transcendia inequivocamente os poderes a ele atribuídos, configurando-se a figura do terceiro de má-fé.
QUESTÃO-TREINO Desconsideração da personalidade jurídica O reconhecimento e aplicação dos efeitos decorrentes desconsideração da personalidade jurídica podem se dar na esfera administrativa ou trata-se de matéria sujeita à cláusula da reserva de jurisdição? Fundamente.
Resposta: Como regra, a desconsideração da personalidade jurídica é matéria afeta ao princípio da reserva da jurisdição, como se verifica expressamente no art. 50 do Código Civil e 28 do CDC, os quais referem-se expressamente a figura do juiz quando tratam do assunto, conferindo-lhe a competência para tal deliberação. Ocorre que, excepcionalmente a administração pública, no exercício regular de
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo seu poder disciplinar, fica autorizada a desconsiderar a personalidade jurídica em processo administrativo, desde que garantido o contraditório e ampla defesa, como ficou assentado julgamento do RMS 15.166/BA, de relatoria do Min. Castro Meira. Em tal oportunidade, destacou-se que, na hipótese de fraude à lei de licitação, a administração pública pode, em observância aos princípios da moralidade e da indisponibilidade do interesse público, realizar a desconsideração para estender às sanções administrativas a outra entidade empresarial constituída fraudulentamente pelos mesmos sócios condenados anteriormente à pena de inidoneidade, para burlar os efeitos de tal sanção e, assim, participar de processo licitatório mediante a constituição de nova pessoa jurídica.
QUESTÃO-TREINO Desconsideração da personalidade jurídica É possível reconhecer a desconsideração da personalidade jurídica de ofício? Há diferença se a lide versar sobre relações de consumo?
Resposta: Atualmente, prevalece o entendimento de que é vedado ao juiz decretar a desconsideração da personalidade jurídica de ofício, sendo necessário o requerimento da parte ou do MP, quando for hipótese em que intervir na lide. Isso porque, tanto o artigo 50 do Código Civil, quanto o artigo 133 do Código de Processo Civil, são expressos em estabelecer que o afastamento episódico da personalidade jurídica deve ser objeto de requerimento, de forma que prevalece a interpretação, portanto, de ser vedado ao juiz decretá-lo por iniciativa própria. Por outro lado, no que se refere às lides de natureza consumerista, o quadro é diverso, prevalecendo ser absolutamente possível que o juiz, de ofício, desconsidere a personalidade jurídica da pessoa jurídica em favor do consumidor ao verificar a presença de alguma das hipóteses legais elencadas no artigo 28 do CDC. Além disso, não se pode olvidar que o arcabouço protetivo
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo consubstanciado no CDC é formado por normas de ordem pública e interesse social, de forma que, ante tal natureza expressamente prevista, é permitido que o juiz, diante do caso concreto, efetivamente adote as medidas necessárias para fins de proteção ao consumidor, notadamente ante sua presumida vulnerabilidade.
Bens
QUESTÕES-TREINO Classifique os bens quanto à mobilidade.
Quanto à mobilidade, os bens são classificados em imóveis e móveis. Os bens imóveis são aqueles que não podem ser removidos ou transportados sem a sua deterioração ou destruição. Podem ser classificados, aqui, como: bens imóveis por essência, formados pelo solo e tudo quanto se lhe incorporar de forma natural, abrangendo sua superfície, o subsolo e o espaço aéreo; bens imóveis por acessão física industrial, formados por tudo o que o homem incorporar permanentemente ao solo; e bens imóveis por disposição legal, os quais são considerados como bens imóveis para que possam receber melhor proteção jurídica, por exemplo, o direito à sucessão aberta. Já os bens móveis são aqueles que podem ser transportados, por força própria ou de terceiro, sem a deterioração, destruição e alteração da substância ou da destinação econômicosocial. Como subclassificações, podem ser: bens móveis por essência, entendidos como aqueles que podem ser transportados sem qualquer dano, por força própria (semovente) ou alheia. Importante destacar, aqui, que os materiais destinados a uma construção, enquanto não empregados, conservarão a sua mobilidade (bens móveis propriamente ditos); bens móveis por antecipação, assim classificados os bens que eram imóveis, mas que foram mobilizados por uma atividade humana, por exemplo, a colheita de uma plantação ou a demolição de um prédio; e bens móveis por determinação legal, que dizem respeito às situações em que a própria lei determina que o bem é móvel, por exemplo, os direitos reais e as ações respectivas que recaiam sobre bens móveis, bem como as energias com valor econômico.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Classifique os bens quanto à consuntibilidade
Para esta classificação, adotam-se dois parâmetros: se o consumo do bem implicar destruição imediata, a consuntibilidade será física ou fática; se o bem puder ser alienado, a consuntibilidade será jurídica. Bens consumíveis são os bens móveis, cujo uso importa na destruição imediata da própria coisa (consuntibilidade física), bem como aqueles destinados à alienação (consuntibilidade jurídica). De outro lado, os bens inconsumíveis são aqueles que proporcionam reiteradas utilizações, permitindo que se retire a sua utilidade, sem deterioração ou destruição imediata (inconsuntibilidade física), bem como aqueles que são inalienáveis (inconsuntibilidade jurídica). QUESTÃO-TREINO Classifique os bens quanto à dependência em relação a outro bem (bens reciprocamente considerados)
Bens principais são aqueles que existem de maneira autônoma e independente, e exercem função ou finalidade não dependente de qualquer outro objeto. Já os bens acessórios são aqueles cuja existência e finalidade dependem de outro bem, denominado bem principal. Sendo assim, o bem acessório segue o principal (princípio da gravitação jurídica), salvo disposição especial em contrário. São bens acessórios: os frutos, produtos, pertenças, partes integrantes e as benfeitorias. Frutos são os bens acessórios que têm sua origem no bem principal, mantendo a integridade deste último, sem a diminuição da sua substância ou quantidade. Poderão ser naturais, industriais ou civis. Produtos são os bens acessórios que saem da coisa principal, mas diminuindo a sua quantidade e substância. Por exemplo, uma pepita de ouro retirada de uma mina. Pertenças são bens destinados a servir um outro bem principal, por vontade ou trabalho intelectual do proprietário. São bens acessórios “sui generis” destinados, de modo duradouro, a conservar ou facilitar o uso ou prestar serviço,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo ou, ainda, a servir de adorno ao bem principal, sem ser parte integrante. Vinculam-se ao bem principal para que ele atinja suas finalidades. Serão consideradas pertenças todos os bens móveis que o proprietário, intencionalmente, empregar na exploração industrial de um imóvel no seu aformoseamento ou na sua comodidade. Partes integrantes são os bens acessórios que estão unidos ao bem principal, formando com este último um todo independente. São desprovidas de existência material própria, mesmo mantendo sua integridade. Por exemplo, uma lâmpada em relação ao lustre, ou uma lente com relação a uma câmera filmadora. Benfeitorias são acessórios introduzidos em um bem móvel ou imóvel, visando a sua conservação ou melhora de sua utilidade. Enquanto os frutos e produtos decorrem do bem principal, as benfeitorias são nele introduzidas. As benfeitorias necessárias são aquelas essenciais ao bem principal, com a finalidade de conserva-lo ou evitar que se deteriore. Por exemplo, a reforma do telhado de uma casa. Já as benfeitorias úteis são aquelas que aumentam ou facilitam o uso da coisa, tornando-a mais útil. Por exemplo, a instalação de uma grade na janela de uma casa. Por fim, as benfeitorias voluptuárias são aquelas de mero deleite, que não facilitam a utilidade da coisa, mas apenas tornam mais agradável o seu uso. Por exemplo, a construção de uma piscina em uma casa.
Negócios Jurídicos
QUESTÃO-ESTUDO O que dispõe o Código Civil acerca da interpretação do negócio jurídico? Resposta: De acordo com o art. 113, “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. Por sua vez, o art. 114 especifica que “os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente”.
QUESTÃO-TREINO Quais as características principais das nulidades dos negócios jurídicos? Quais os defeitos e vícios que causam a nulidade e a anulabilidade dos negócios jurídicos?
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Resposta: Diferentemente das anulabilidades, as nulidades podem ser alegadas por quaisquer interessados, ou pelo MP, quando lhe couber intervir e devem ser reconhecidas pelo juiz (possibilidade de reconhecimento “de ofício”), não sendo permitido o suprimento das nulidades ou a confirmação do negócio jurídico nulo, tampouco sua convalidação pelo decurso do tempo. Nada obstante, prevê o artigo 170, do Código Civil, que “se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade”. Além do negócio jurídico simulado (que é nulo), haverá nulidades do negócio quando: “I celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibirlhe a prática, sem cominar sanção” (artigo 166). Já o artigo 171, estabelece que: “Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico: I - por incapacidade relativa do agente; II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores”. Por fim, mencionase que a anulabilidade se sujeita a um prazo decadencial (de quatro anos nas hipóteses do artigo 178 do Código Civil) e “não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade” (artigo 177).
QUESTÃO-TREINO Qual é a disciplina aplicável aos atos jurídicos lícitos? O que caracteriza a ilicitude do abuso de direito?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Resposta:Aos atos jurídicos lícitos que não sejam negócios jurídicos, além das disposições específicas, aplicam-se também as normas dos negócios jurídicos, no que couber. O titular de um direito comete abuso e, portanto, ato ilícito quando, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
QUESTÃO-TREINO Luisa, socialite, transfere a Pedro uma quitinete sob a condição de que este reformasse a casa que ela e seu filho João residiam até a realização do baile anual da família Granaviva, evento importante da classe alta paulistana. Quinze anos após ser realizada a obra e transferida a propriedade, João, agora maior de idade, 18 anos, entra na justiça para reaver o imóvel, sob a justificativa que não foi Pedro que realizou o serviço e que o imóvel doado era seu, fruto de herança de seu falecido pai Malaquias. Em defesa, Pedro alega que realizou sim a obra, estava de boafé porque Luisa afirmava que o imóvel era seu e que eventual direito do autor decaiu. Pergunta-se: A) Qual o tipo de doação realizada por Luisa? B) Houve decadência de eventual direito de João? C) O negócio Jurídico deve ser anulado?
Respostas: a) Trata-se de doação com encargo, que é aquela em que o doador oferta uma dádiva acompanhada de exigências ao donatário, que são aceitas e por ele
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo devem ser cumpridas quando recebe o benefício. b) Não. Como João era infante ao tempo da realização do negócio e assim que atingiu a maioridade ingressou com a demanda, não houve perda de seu direito. Tal regra é encontrada no artigo 198, I do Código Civil, o qual determina: “Art. 198. Também não corre a prescrição: I - contra os incapazes de que trata o art. 3º”. c) Sim. Em que pese a boa-fé de Pedro, o imóvel era de João, e sua mãe, mesmo sendo sua representante, não poderia dispor de bens do menor sem ter autorização judicial, em procedimento próprio com a presença do Ministério Público como fiscal da lei. A ilegalidade atinge a própria essência do negócio jurídico e não é convalidada pelo tempo, uma vez que é causa de nulidade absoluta. Pedro, caso queria, poderá ingressar com eventual ação indenizatória contra Luisa. Jurisprudência: COMPRA E VENDA – Cessão de direitos de menores sobre imóvel sem autorização judicial - Nulidade do negócio jurídico verificada – Proibição legal de disposição de bens imóveis de filhos menores pelos seus pais - Art. 1.691 do CC – Hipótese de nulidade absoluta, que não se convalesce pelo decurso do tempo – Exegese do art. 166, inciso VII – Decadência não incidente no caso – Pronunciamento que tem efeito "ex tunc", retroagindo desde à data de sua celebração, a partir de quando é devida aos autores indenização pela impossibilidade de uso do imóvel que sempre lhes pertenceu - Taxa de ocupação devida desde a citação – Reintegração de posse autorizada sem contrapartida Devolução dos valores pagos, por força do artigo 181 do Código Civil, que deve ser requerida da alienante em processo autônomo – Contestação que não é a via adequada para formulação de pedido entre os corréus - Má-fé dos adquirentes reconhecida – Indenização por benfeitorias indevida – Recurso provido. TJSP. 1ª Câmara de Direito Privado. Apelação n. 101099264.2014.8.26.0405. Relator: Rui Cascaldi. Comarca: Osasco. Data do julgamento: 11/09/2018. Data de publicação: 11/09/2018. Data de registro: 11/09/2018
Prescrição e Decadência Questão-Treino Prescrição e Decadência Laura, vítima de atos de tortura ocorridos durante o Regime Militar, ajuíza ação de danos morais em 2010 contra a União. Na peça defensiva, o ente estatal alegou prescrição, tendo em vista que os fatos se deram em 1978 e a ação apenas foi proposta em 2015. De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, assiste razão a tese arguida pela União?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Resposta: Não, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacificado no sentido de que as ações de indenização por danos morais decorrentes de atos de tortura ocorridos durante o Regime Militar de exceção são imprescritíveis. Dessa maneira, não se aplica o prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 1º do Decreto 20.910/1932 aos danos decorrentes de violação de direitos fundamentais, pois são imprescritíveis, “principalmente quando ocorreram durante o Regime Militar, época na qual os jurisdicionados não podiam deduzir a contento as suas pretensões” (REsp 1374376/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/05/2013, DJe 23/05/2013).
Responsabilidade Civil QUESTÃO-TREINO Culpa exclusiva da vítima e culpa concorrente A culpa exclusiva da vítima exclui o dever de indenizar? E a culpa concorrente? Justifique sua resposta.
Resposta: A culpa exclusiva da vítima exclui o dever de indenizar. Ela ocorre quando o causador do dano configura mero instrumento do acidente, eis que o responsável real pelo evento causador do dano é a própria vítima. Com isso, rompe-se o nexo causal entre a conduta do agente e o evento danoso, excluindo-
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo se o dever de indenizar. Por sua vez, a culpa concorrente ocorre quando aquele que causou o dano concorre com a vítima ou com terceiro para a produção do evento danoso, de forma que não há exclusão do dever de indenizar. Na verdade, ela pode ser valorada quando da fixação do valor da indenização (art. 945, CC). QUESTÃO-TREINO Exposição de menores em situação vexatória A veiculação em revista de imagens de crianças, expostas a situação vexatória e sem autorização dos pais, configura dano moral? O Ministério Público tem legitimidade para ingressar com ação civil nesse caso?
Resposta: Sim. O art. 227 da CF assegura o direito fundamental a dignidade da criança, de forma que seus interesses se sobrepõem aos interesses econômicos dos meios de comunicação. Trata-se de dano moral in re ipsa. No mais, o bem jurídico tutelado, qual seja o direito da criança e do adolescente, está atrelado às finalidades institucionais do Ministério Público, sendo o órgão legítimo para ingressar com ação civil, a teor dos artigos 127 e 129, III, da Constituição Federal e arts. 1º e 5º da Lei nº 7.347/198. (STJ. 3ª Turma. REsp 1628700/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 20/02/2018)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Direitos Reais QUESTÃO-TREINO O que é usufruto? Qual é o seu objeto? É possível constituir usufruto simultâneo?
Resposta: O usufruto é o direito real na coisa alheia que permite ao terceiro a retirar todas as utilidades de um bem. O proprietário passa a ter sua propriedade nua, porque desprovidas de suas utilidades, por isso nu- proprietário. O objeto do usufruto são bens móveis ou imóveis, um patrimônio inteiro ou parte dele. (artigo 1390 do CC). É possível constituir usufruto simultâneo, quando instituído em favor de duas ou mais pessoas (artigo 1411 do CC). Mas não se admite o usufruto sucessivo ou de segundo grau (Ex: não pode passar o usufruto para Maria e de Maria para Marta). Se houver cláusula neste sentido ela é nula, uma vez que o artigo 1410, inciso I, do CC,j define que o usufruto extingue- se pela renúncia ou morte do usufrutuário. Bibliografia: “Manual de Direito Civil” – Flávio Tartuce”. QUESTÃO-TREINO Pedro e Joana viviam, desde 2012, em união estável, em um apartamento de 150 m2 em São Paulo, que compraram juntos. Em janeiro de 2015, Pedro, após grande discussão, abandonou o lar, tendo permanecido Joana morando no imóvel. Joana, abalada emocionalmente, durante esse período, passava os finais de semana, em sua chácara que herdara, ainda em 2012, de seu pai. Em janeiro de 2018, Joana, já muito triste com a situação, requer seja reconhecida a usucapião familiar, em seu benefício. Ela tem direito? Explique.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
Resposta: Não. Explico: Joana pretendia que fosse reconhecida a usucapião familiar em seu favor (instituto previsto no artigo 1240-A do Código Civil). Contudo, Joana já era proprietária de outro imóvel desde 2012 (chácara), o que a impossibilita que tal direito fosse reconhecido, conforme o referido artigo descreve expressamente. Os outros requisitos restaram preenchidos, imóvel de até 250 m2, e Pedro tendo permanecido mais de 2 anos sem retornar ao lar conjugal (a lei exige 2 anos). Condomínio 1) Leis relacionadas ao tema Artigos 1.331 do Código Civil; Artigos 1.358-A do Código Civil; Art. 2 e Art. 36-A da Lei 6.766 (Lei de parcelamento do solo); Lei n. 4.591/64 2) Jurisprudência dos Tribunais superiores REsp n. 1280871/SP (recurso repetitivo) REsp n. 1439164/SP (recurso repetitivo) RExt 607.940/DF – Repercussão Geral 3) Informativos Informativo do STF n. 805; Informativo do STJ – n. 562;
O tema tem relevância são só porque caiu na primeira fase uma questão sobre a Lei de Condomínio e Incorporações Imobiliárias (Lei n. 4.591/64), mas notadamente pela entrada em vigor da Lei de Regularização Fundiária que reavivou certas polêmicas no campo dos direitos reais. Houve mudanças relevantes no Código Civil e Lei de Loteamento (Lei 6.766) que podem ser cobradas na segunda etapa do concurso, pois penso que está inserido no ponto “tutela de interesses difusos e coletivos”, especificamente ‘Principais categorias e legislação respectiva: meio ambiente e urbanismo”. A polêmica que envolve a cobrança de “mensalidades”, “taxas” (em sentido não técnico, não tributário) em loteamento de acesso controlado, é bem relevante. O que motivou a formulação da questão.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo “Poxa, mas isso não tem nada a ver com o Ministério Público”, ledo engado! O MP tem atuação recente sobre o tema de cobrança de “taxa de manutenção” em condomínio de acesso controlado no Município de São Sebastião, caso julgado pelo TJSP em sede de agravo de instrumento104. A partir de Ação Civil Pública proposta pelo parquet buscava-se discutir, dentre outros pontos, a legalidade de cobrança das “taxas de manutenção”. Pela atualidade da legislação; jurisprudência julgada em sede de recurso repetitivo; tudo indica uma possibilidade de superação de precedente; atuação no caso concreto, formulo a questão para traçar pontos de destaque neste assunto.
3. Diferencie condomínio edilício de loteamento de acesso controlado. Condomínio edilício tem definição legal a partir da leitura da disposição do art. 1.331 do CC. São também chamados de condomínios em edificações e condomínio horizontal. São regidos também pela Lei n. 4.591/64. O condomínio edilício é aquele que primeiro nos vem a cabeça, estruturado em duas modalidades de partes: Partes que são propriedade exclusiva (áreas autônomas ou exclusivas) – caso dos apartamentos, dos escritórios, das salas, das lojas. E de outro lado: Partes que são propriedade comum dos condôminos (áreas comuns) – o solo, estrutura do prédio, telhado105. Vale lembrar que o condomínio não é uma pessoa jurídica, mas ente despersonalizado (REsp n. 1.486.478/PR). Nesta espécie de condomínio o que se percebe é que não há área pública. Pelo contrário, todas as partes são particulares, sendo que algumas delas são privativas (por exemplo, o apartamento ou sala comercial) e outras de uso comum (hall, quadra, piscina etc). A melhor definição do condomínio edilício seria condomínio em unidades autônomas106. E em razão desta convivência conjunta nas partes comuns, por lei (1.336 do CC), surge o dever de o condômino contribuir para as despesas do condomínio. Ideia já prevista na Lei Especial:
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Agravo de Instrumento n. 2172238-98.2017.8.26.0000 Tartuce, Flavio. Manual de direito civil: volume único. 3. Ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 953. 106 https://www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI266901,21048A+positivacao+do+condominio+de+lotes+Mais+uma+importante+novidade+da 105
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Art. 12, da Lei 4.591/64. Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio. Diferentemente é a regência do loteamento (de acesso controlado). Está expresso na Lei n. 6.766/79, com redação dada pela Lei n. 13.465/17: Art. 2º da Lei do Parcelamento do Solo Urbano – O parcelamento de solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e das legislações estaduais e municipais pertinentes. §1º. Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. § 7º O lote poderá ser constituído sob a forma de imóvel autônomo ou de unidade imobiliária integrante de condomínio de lotes. § 8º Constitui loteamento de acesso controlado a modalidade de loteamento definida nos termos do §1º, deste artigo, cujo controle de acesso será regulamentado por ato do poder público Municipal, sendo vedado o impedimento de acesso a pedestres ou a condutores de veículos, não residentes, devidamente notificados ou cadastrados.
E dos pontos sublinhados se extrai a principal diferença entre as duas modalidades de espaços urbanos. O núcleo urbano formado a partir de loteamento, pressupõe uma gleba (imagine um terreno grande) que se subdivide, desta subdivisão há abertura de ruas. Isto, a rua definida como “bem de uso comum do povo” (art. 99, inc. I do Código Civil). Nos termos do artigo 22 da Lei de Loteamento, desde o registro do loteamento, passam a integrar o domínio do Município as vias e praças. Portanto, ao contrário do condomínio edilício, no loteamento de acesso controlado há espaço público e também privado (pensa no “prédio” em contraponto com uma ‘rua fechada’ com casas, é aqui que quero chegar). Não posso sair por aí andando tranquilamente pela ‘área comum’ de qualquer condomínio sem prévia autorização, pois se constitui área em regime de condomínio (copropriedade) dos condôminos. Por outro lado, no loteamento, como houve abertura de ruas, pode(ria) circular-se tranquilamente pelas vias e praças (vide §8º acima).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Até aqui tudo bem? Porque agora vêm as polêmicas. Sabe aquele “condomínio de casas”107 em que cada proprietário comprou o lote e construiu sua casa – com portaria e ruas para se chegar até o imóvel – que existem por aí pelo Brasil? Então, já vimos pelo §8º acima, que é possível “controlar o acesso” deles! Mas e quem mantém esta estrutura, quem paga os funcionários, conservação, conserta e estrutura as ruas, coleta de lixo e segurança? Pois é, aqui surge toda a polêmica mal resolvida. A questão não está irresoluta pela jurisprudência, notadamente após o implemento da Lei n. 13.465/2017. Veja o que diz o artigo 36-A da Lei de Loteamento (alterada pela Lei da Regularização Fundiária, sobredita): Art. 36-A. As atividades desenvolvidas pelas associações de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos ou empreendimentos assemelhados, desde que não tenham fins lucrativos, bem como pelas entidades civis organizadas em função da solidariedade de interesses coletivos desse público com o objetivo de administração, conservação, manutenção, disciplina de utilização e convivência, visando à valorização dos imóveis que compõem o empreendimento, tendo em vista a sua natureza jurídica, vinculam-se, por critérios de afinidade, similitude e conexão, à atividade de administração de imóveis. P. único. A administração de imóveis na forma do caput deste artigo sujeita seus titulares à normatização e à disciplina constantes de seus atos constitutivos, cotizando-se na forma desses atos para suportar a consecução dos seus objetivos. Este artigo veio para regulamentar a atuação das associações de moradores destes núcleos urbanos fechados, formados a partir de loteamento. Isso quer dizer que: aquelas glebas que se subdividiram, criando ruas e espaços públicos (LOTEAMENTOS), podem ser “geridas” por associações. Lembremos que associações são caracterizadas pela reunião de pessoas com propósito comum. E estas associações podem cobrar “taxas de manutenção” ainda que de não associados, pela nova redação, pois se criou um vínculo ficto (ou talvez propter rem).
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Não vou aqui abrir a discussão acerca da divergência existente entre todas as modalidades urbanísticas: condomínio de lotes, condomínio deitado, loteamento fechado. Pressuponho para questão que houve o loteamento e a partir disso houve o fechamento da rua.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Os não associados que deixassem de pagar mensalidades de conservação poderiam ser demandados em virtude – segundo a recém e provisória decisão doTJSP – de um novo vínculo propter rem, agora previsto em lei. Até aqui tudo bem? Caso você esteja acompanhando a jurisprudência do STJ, o que recomendo fortemente, vai se lembrar que este órgão já julgou em sentido contrário, lembra? Se não lembra, veja o que se diz no Informativo 562/STJ108: As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram. (Recursos Representativos de Controvérsia – REsp n. 1.280.871/SP e REsp n. 1.439.163/SP – Tema 882) A jurisprudência anterior ao implemento da Lei de Regularização Fundiária (a qual alterou a Lei do Parcelamento do Solo Urbano) seguia no sentido de que as cobranças para manutenção destes núcleos por associações de moradores não obrigavam os que não eram associados ou que não anuíram com a cobrança. Pensa naquele loteamento fechado, com 20 casas, uma guarita, coleta seletiva de lixo, festinhas de época e tudo mais. Eles se juntavam e, depois de formarem uma associação, conseguiam junto a Municipalidade – à título precário – concessão ou permissão de murar e “preservar” as ruas. Porém, destas 20 casas, 3 proprietários não se associavam e se negavam a pagar as “taxas de manutenção”. Por esta razão a associação entrava em juízo com ações de cobrança alegando o enriquecimento ilícito. O STJ entendeu – em recurso repetitivo – que é ILEGAL a cobrança de taxa de manutenção pela ASSOCIAÇÃO DE MORADORES aos não-associados. No caso, não se pagou taxas de manutenção e conservação ("não havia lei nem contrato que os obrigassem"). PROPRIETÁRIO DE LOTEAMENTO NÃO é CONDÔMINO. Contrato de compra e venda NÃO é suficiente para impor obrigação de pagamento. E o fundamento era o DIREITO CONSTITUCIONAL DE LIVRE ASSOCIAÇÃO, aplicado em razão da EFICÁCIA HORIZONTAL DOS D. FUNDAMENTAIS (art. 5º, caput e incisos XVII e XX da CF)109.
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https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2015/07/info-562-stj1.pdf REsp n. 1.422.859/SP - Ressalvo o julgamento de caso concreto que deu tratamento diferenciado, à título de curiosidade. 109
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Bom, já perceberam o tamanho da polêmica110 (irresoluta), né? Voltemos para pergunta! As principais diferenças entre condomínio e loteamento são: 1) regime jurídico – um pautado na Lei de Condomínio e Incorporações Imobiliárias e outro na Lei de Loteamento; 2) relação privada entre condôminos e relação não exclusivamente privada entre proprietários de lote; 3) diferença na cobrança das taxas de manutenção. Poderíamos delongar este assunto maravilhoso, mas perderíamos o viés do concurso. Pequeníssimo detalhe: percebam que todos os recursos mencionados nesta questão têm como origem São Paulo, né! Pois é?! Boa Sorte! QUESTÕES-TREINO O condomínio edilício, cuja característica é a existência, em edificações, de partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos, devido às suas peculiaridades, está disciplinado em Capítulo próprio do Código Civil, distinto daquele destinado ao regramento do condomínio geral. a) Quais os requisitos para a instituição do condomínio edilício? b) Admite-se a validade das convenções condominiais, ainda que não registradas?
R: a) A instituição do condomínio edilício dá-se por ato constitutivo “inter vivos” ou “mortis causa” (testamento), registrado no Cartório de Registro Imobiliário, com as seguintes disposições necessárias: a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas umas das outras e das partes comuns; a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, 110
Anoto que pende de julgamento perante o STF, tema com repercussão geral, o RExt n. 695.911/SP: TEMA 492 - Cobrança, por parte de associação, de taxas de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não-associado.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo relativamente ao terreno e partes comuns; e o fim a que as unidades se destinam (Art. 1.332 do Código Civil). b) Sim. De acordo com a Súmula 260 do STJ, a convenção de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é eficaz para regular as relações entre condôminos. Note-se, contudo, que a eficácia erga omnes da convenção celebrada dependerá do registro civil competente. QUESTÃO-TREINO (VUNESP – DPE/RO 2017 – Adaptada) A Medida Provisória n° 759/2016, convertida para a Lei n° 13.465/2017, instituiu o direito real de laje. a) Em que consiste este direito? b) O direito de laje configura direito de propriedade?
R: a) O direito real de laje consiste na possibilidade de coexistência de unidades imobiliárias autônomas de titularidades distintas situadas em uma mesma área, de maneira a permitir que o proprietário ceda a superfície de sua construção a fim de que terceiro edifique unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo (Art. 1.510-A do Código Civil) b) Não, pois não há atribuição de fração ideal sobre o solo, nem sobre as áreas comuns, tais como jardins ou quintais, nem participação proporcional em áreas já edificadas (Art. 1510-A, § 4º, do Código Civil). Trata-se de uma espécie de direito real de superfície de graus sucessivos, abrangendo tanto o espaço aéreo acima da laje (andares ascendentes), quanto abaixo do solo (andares subterrâneos)111.
111Fonte:
https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/417476632/direito-real-de-laje-primeirasimpressoes e https://www.editorajuspodivm.com.br/cdn/arquivos/167e4d1c983b6f203b237b4c4e180ce4.pdf (Acesso em out/18)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Direito de Propriedade 1)
LEGISLAÇÃO
Artigos 1.228 a 1.237 do Código Civil.
Breves comentários O conceito e proteção à propriedade evoluíram ao longo da história humana. A cronologia que iremos abordar abaixo foi retirada do livro do constitucionalista André Ramos Tavares, curso de direito constitucional, 5ª edição, São Paulo: Saraiva, 2007, entre as págs. 603 a 609, que começa advertindo “historicamente, caminhou-se de uma concepção coletiva de propriedade, considerada como bem comum de todos, para a ideia de um direito individual e absoluto até alcançar a concepção atual de que, embora assegurada individualmente, a propriedade deverá atender sua função social” (ob. Cit. Pág 603). Na antiguidade, o Código de Hamurabi já tratava da compra e venda de bens móveis ou imóveis e protegia a propriedade. Já entre os gregos e os romanos, a propriedade era considerada comum, pertencentes a todos os cidadãos. Contudo, houve uma evolução de conceito de propriedade, decorrente da própria evolução da estrutura da sociedade, passando a propriedade ser inerente à família, surgindo a ideia de propriedade privada. Já no período medieval, a propriedade era permitida apenas para determinada classe social, a chamada classe proprietária, os patronos. A famosa Magna Charta Libertatum também se preocupou com a propriedade das terras. Já a idade moderna foi marcada pelas grandes navegações e descobertas de terras no mundo novo. Nesse contexto, as terras descobertas eram de propriedade dos reis de Portugal e Espanha. Ainda, com a revolução industrial a propriedade privada ganhou estrema importância. Assim, percebe-se que desde o seu surgimento, a propriedade sempre teve um viés puramente individualista. Por causa disso, no período contemporâneo, muito influenciada pelas revoluções socialistas e movimentos anarquistas de outrora, a propriedade assume uma conotação social. QUESTÃO-ESTUDO Propriedade Sobre o direito de propriedade, disserte sobre o seu conceito, suas estruturas e características. Em primeiro lugar, deve-se dizer que a propriedade é um direito fundamental estampada na Constituição Federal. O artigo 1.225 do Código Civil traz o rol de direitos reais, entre eles o direito à propriedade. Talvez o direito real mais óbvio em uma sociedade capitalista. A propriedade, por ser um direito de primeira geração, inegavelmente possui um viés individualista. Até por isso, o artigo 1.228, caput, do Código Civil traz sua estrutura jurídica, que é justamente a faculdade do proprietário de usar, gozar e dispor livremente do bem, além do direito e reavê-la de que injustamente a detém. Por seu turno, o artigo 1.231 do
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo CC/02 traz as características da propriedade, ao estabelecer que “a propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário”. A exclusividade da propriedade estabelece que ela não pode pertencer a mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Essa afirmação em um primeiro momento parece estranha, diante da existência do instituto do condomínio. Entretanto, nesse caso o bem não é titularizado por várias pessoas ao mesmo tempo, na verdade, cada pessoa detém fração ideal do imóvel. Já a perpetuidade, defendida pela doutrina civilista clássica, traz a duração ilimitada da propriedade. Ou seja, a propriedade perdura independente do exercício do seu titular, sendo que o proprietário apenas a perde nos casos previstos em lei ou por vontade. No caso da usucapião, a pessoa não perde a propriedade por causa do decurso do tempo, mas sim pela posse ao longo do tempo por outra pessoa. Outrossim, apesar desse viés puramente individual, a propriedade deve estar “em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” (art. 1.228, §1º, CC/02). Em outras palavras, a propriedade deve ser utilizada à luz da sua função social. Nos dizeres dos sempre festejados Farias, Braga Netto e Rosenvald: Na relação jurídica de direito real, o proprietário titulariza o direito subjetivo de exigir dos não proprietários um dever genérico de abstenção, como colorário da garantia individual da propriedade (art. 5º, XXII, CF). Todavia, a coletividade é titular do direito subjetivo difuso de exigir que o proprietário conceda função social ao direito de propriedade, à luz do art. 5º, XXIII, da Constituição Federal. (manual de direito civil – volume único, Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, pág. 1.406)
A função social da propriedade urbana está prevista no artigo 182, §2º, da CF: Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.”
Tal norma constitucional é concretizada também pela Lei 10.257/01, conhecida como Estatuto da Cidade. Dessa lei vale ser lido o artigo 2º, que trata da política urbana, que tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, e o artigo 5º que estabelece que as propriedades não edificadas, subutilizadas e não utilizadas não cumprem a função social. Já a função social da propriedade rural está prevista no artigo 186 da Constituição Federal: Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III -
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”
Para concluir, vale a advertência de Farias, Braga Netto e Rosenvald: “Apesar da abordagem constitucional da propriedade, é um equívoco acreditar que o seu regramento foi subtraído pelo Direito Público. A propriedade ainda é formalmente privada, porém, materialmente social. É privada na forma e estrutura, pois o domínio é exclusivo; mas é social na destinação e controle de legitimidade e merecimento.” (manual de direito civil – volume único, Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, pág. 1.411).
Multipropriedade O que é multipropriedade (ou time sharing)? Trata-se de “relação jurídica de aproveitamento econômico de uma coisa móvel ou imóvel, coisa esta repartida em unidades fixas de tempo, de modo a permitir que diversos titulares possam utilizar-se daquela coisa com exclusividade, cada um a seu turno, de maneira perpétua ou não” (Farias, Cristiano Chaves de; Braga Netto, Felipe e Rosenvald, Nelson; manual de direito civil – volume único, Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, pág. 1.396). De forma simplificada, “Time-sharing ocorre quando um bem é dividido entre vários proprietários sendo que cada um deles utilizará a coisa, com exclusividade, durante certo(s) período(s) de tempo por ano, em um sistema de rodízio”. 112 Trata-se de instituto que não possui regramento definido em lei. Contudo, a doutrina entende que se pode utilizar, no que couber, a normativa do Código Civil. Nesses termos é o enunciado 89 do Conselho Nacional de Justiça - CJF: O disposto nos arts. 1.331 a 1.358 do novo Código Civil aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedade imobiliária e clubes de campo. Por fim, sobre o tema, cita-se interessante julgado do Superior Tribunal de Justiça sobre esse instituto: ROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA (TIME-SHARING). NATUREZA JURÍDICA DE DIREITO REAL. UNIDADES FIXAS DE TEMPO. USO EXCLUSIVO E PERPÉTUO DURANTE CERTO PERÍODO ANUAL. PARTE IDEAL DO MULTIPROPRIETÁRIO. PENHORA. INSUBSISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. O sistema time-sharing ou multipropriedade imobiliária, conforme ensina Gustavo 112
(CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Invalidade da penhora sobre a integralidade de imóvel submetido a time-sharing. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 03/10/2018).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Tepedino, é uma espécie de condomínio relativo a locais de lazer no qual se divide o aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé, apartamento) entre os cotitulares em unidades fixas de tempo, assegurando-se a cada um o uso exclusivo e perpétuo durante certo período do ano. 2. Extremamente acobertada por princípios que encerram os direitos reais, a multipropriedade imobiliária, nada obstante ter feição obrigacional aferida por muitos, detém forte liame com o instituto da propriedade, se não for sua própria expressão, como já vem proclamando a doutrina contemporânea, inclusive num contexto de não se reprimir a autonomia da vontade nem a liberdade contratual diante da preponderância da tipicidade dos direitos reais e do sistema de numerus clausus. 3. No contexto do Código Civil de 2002, não há óbice a se dotar o instituto da multipropriedade imobiliária de caráter real, especialmente sob a ótica da taxatividade e imutabilidade dos direitos reais inscritos no art. 1.225. 4. O vigente diploma, seguindo os ditames do estatuto civil anterior, não traz nenhuma vedação nem faz referência à inviabilidade de consagrar novos direitos reais. Além disso, com os atributos dos direitos reais se harmoniza o novel instituto, que, circunscrito a um vínculo jurídico de aproveitamento econômico e de imediata aderência ao imóvel, detém as faculdades de uso, gozo e disposição sobre fração ideal do bem, ainda que objeto de compartilhamento pelos multiproprietários de espaço e turnos fixos de tempo. 5. A multipropriedade imobiliária, mesmo não efetivamente codificada, possui natureza jurídica de direito real, harmonizandose, portanto, com os institutos constantes do rol previsto no art. 1.225 do Código Civil; e o multiproprietário, no caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento espaço-temporal (time-sharing), tem, nos embargos de terceiro, o instrumento judicial protetivo de sua fração ideal do bem objeto de constrição. 6. É insubsistente a penhora sobre a integralidade do imóvel submetido ao regime de multipropriedade na hipótese em que a parte embargante é titular de fração ideal por conta de cessão de direitos em que figurou como cessionária. 7. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1546165/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/04/2016, DJe 06/09/2016 - destaquei)
QUESTÃO-TREINO USUCAPIÃO – Registro de Imóveis João Rupestre é possuidor, há 12 anos, de um terreno urbano de 600 metros quadrados onde estabeleceu sua moradia habitual. Tinha justo título e estava de boa-fé. Antônio Rábula, advogado e amigo de João, tentava o convencer, há dois anos, a ajuizar ação de usucapião para ter declarado judicialmente seu direito de propriedade. João negava-se. Era hoplofóbico (fobia de armas de fogo); temia desesperadamente ter que ir ao Fórum da Cidade e ver os policiais que protegiam o local, com seus revólveres, metralhadoras e espingardas. Antônio Rábula, o advogado, então, foi informado por sua estagiária de que havia uma alternativa não judicial ao reconhecimento da propriedade. Diante do exposto, responda: a) Pensando no que disse a estagiária, há alternativa ao reconhecimento da propriedade por outro meio que não o judicial, isto é, a ação de usucapião?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo b) A ação judicial ficará prejudicada caso tal alternativa, se existente, seja improcedente?
Resposta: a) Antônio, o advogado, poderá pedir o reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório de registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, representando João e a seu requerimento. É o que permite a Lei de Registros Públicos, em seu art. 216-A. b) O pedido extrajudicial não prejudica o posterior ajuizamento de ação judicial de usucapião.
Parcelamento e regularização do solo
1) Leis relacionadas ao tema Lei n. 6.766/79 (Parcelamento dos imóveis urbanos) (Alterado pela Lei n. 13465/17) Decreto-lei n. 58/37 (Parcelamento dos imóveis rurais) 2) Súmulas dos Tribunais superiores Súmula 76 do STJ - A falta de registro do compromisso de compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o devedor. Súmula 239 do STJ: O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no Cartório de Imóveis. Súmula 1 - TJSP: O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem. Súmula 2 - TJSP: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição. Súmula 3 - TJSP: Reconhecido que o compromissário comprador tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção. 3) Jurisprudência - Compete à Corregedoria do Tribunal de Justiça ou ao Conselho Superior da Magistratura (e não a órgão jurisdicional de segunda instância do Tribunal de Justiça) julgar recurso intentado contra decisão de juízo que julga impugnação ao registro de loteamento urbano. Quem define se é a Corregedoria ou o Conselho Superior é o Regimento Interno do TJ ou a Lei de Organização Judiciária do Estado. Esse recurso é um recurso administrativo (não se trata de apelação). STJ. 4ª Turma. REsp 1.370.524-DF, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 28/4/2015 (Info 572). - o município tem o dever de fiscalizar tudo que se faz em seu território NÃO basta multar ou embargar, devendo impedir a concretização do loteamento ilegal, sob pena de responsabilidade solidária, inclusive pelos danos ambientais (STJ, REsp 124.714/SP e REsp 252.512/SP). - Deve ser extinto sem resolução de mérito o processo decorrente do ajuizamento, por loteador, de ação ordinária com o intuito de, em razão da suposta inadimplência dos adquirentes do lote, rescindir contrato de promessa de compra e venda de imóvel urbano loteado sem o devido registro do respectivo parcelamento do solo, nos termos da Lei 6.766/1979. STJ. 3ª Turma. REsp 1.304.370-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/4/2014 (Info 543). - (...) A promessa de compra e venda identificada como direito real ocorre quando o instrumento público ou particular é registrado no cartório de registro de imóveis, o que não significa que a ausência do registro retire a validade do contrato. (...) (STJ. 4ª Turma. REsp 1185383/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 08/04/2014). - O promitente comprador, amparado em compromisso de compra e venda de imóvel cujo preço já tenha sido integralmente pago, tem o direito de requerer judicialmente, a qualquer tempo, a adjudicação compulsória do imóvel. STJ. 4ª Turma. REsp 1.216.568-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/9/2015 (Info 570).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo - É abusiva a cláusula de distrato, fixada no contrato de promessa de compra e venda imobiliária, que estabeleça a possibilidade de a construtora vendedora promover a retenção integral ou a devolução ínfima do valor das parcelas adimplidas pelo consumidor distratante. STJ. 4ª Turma. REsp 1.132.943-PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/8/2013.
4) Breves comentários sobre a matéria - parcelamento do solo urbano em lotes destinados à edificação (servidos de infraestrutura básica de loteamento). - o loteamento depende de registro especial, pois há oferta pública, envolvendo riscos aos adquirentes. + segundo STJ, o registro especial é obrigatório mesmo quando o loteador for o município (STJ, REsp 247.261/SP), mas em SP a CGJ entende não ser cabível. - ampliação do núcleo urbano é obrigatória a destinação de áreas institucionais = para oferecimento dos serviços públicos (escolas, hospitais, delegacias...). * como há intenção de lucro, os custos de infraestrutura devem ser arcados pelo loteador NÃO pode ser repassado à municipalidade ou aos adquirentes. - O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento. Loteamento: subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. Desmembramento: subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique a abertura de novas vias e logradouros públicos, nem prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes. Outras definições: - desdobro, desdobramento: mera divisão física do lote; dispensa registro especial (basta a averbação na matrícula do lote dividido) - Lote: terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos no plano diretor. - Infraestrutura básica: constituída por equipamentos urbanos de (i) escoamento das águas pluviais, (ii) iluminação pública, (iii) esgotamento sanitário, (iv) abastecimento de água potável, (v) energia elétrica pública e domiciliar e (vi) vias de circulação
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QUESTÃO-TREINO Diferenciar loteamento, desmembramento e loteamento de acesso controlado.
Resposta: O loteamento necessita de abertura, ampliação ou alteração de vias públicas; ao passo que o desmembramento é a divisão de gleba que aproveita o arruamento (sistema viário) já existente. O loteamento de acesso controlado, por seu turno, é a modalidade de loteamento em que existe controle de acesso (das pessoas), e que será regulamentado por ato do poder público Municipal, sendo vedado o impedimento de acesso a pedestres ou a condutores de veículos, não residentes, devidamente identificados ou cadastrados.
Direito de Família
Direito Real de Habitação QUESTÃO-TREINO Ana Maria tem dois filhos de outro relacionamento e quando passou a conviver em união estável com Adamastor já possuía um patrimônio de R$1.000.000,00. Se Ana Maria vier a falecer, como ficará a divisão dos bens? Em que consiste o direito real de habitação? O companheiro tem direito ao direito real de habitação?
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Resposta: O direito real de habitação pode ser convencional ou legal, é um direito personalíssimo, que consiste no direito de habitar gratuitamente casa alheia, sendo certo que o titular deste direito não pode alugar, nem emprestar o imóvel, mas simplesmente ocupá-la com sua família, portanto. O direito real de habitação concretiza a chamada teoria do patrimônio mínimo, entabulada pelo ministro Luiz Edson Fachin, segundo a qual, o direito real de habitação é o direito para habitar, não podendo, em tese, alugar o imóvel, ceder em comodato, dentre outras possibilidades. São aplicáveis à habitação as disposições relativas ao usufruto. O artigo 1.831 reconhece ao cônjuge sobrevivente, independentemente do regime de bens, o direito real de habitação em relação ao imóvel destinado à residência do casal, desde que seja o único imóvel desta natureza. Mas, em relação ao companheiro, o entendimento prevalente é no sentido de estender essa regra aos companheiros, não obstante, o artigo 1.790, CC, que dispõe sobre a sucessão do companheiro, não lhe assegure este direito, pois, em regra, o companheiro participará da sucessão do outro. Contudo, recentemente, o STF reconheceu a inconstitucionalidade do artigo 1.790, CC, no RE 878.694, e decidiu no sentido de ser aplicável ao companheiro o regime sucessório dos cônjuges. No mesmo sentido, já havia trilhado o enunciado 117 do CJF , que estendia o direito real de habitação ao companheiro, em interpretação analógica do artigo 1.831, do CC, devendo-se observar que, embora, o enunciado fale em interpretação analógica, o correto é falar em analogia. Quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, a metade já será dele e sobre a outra metade é que recaí a discussão sobre o que irá herdar. Logo, se houver filhos comuns, com eles concorrerá em igualdade de condições com os filhos, e terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho, entretanto, se vier a concorrer com os descendentes apenas do autor da herança, terá direito à metade do que esses descendentes tiverem. Já na hipótese de concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito apenas a um terço da herança e apenas terá direito à integralidade da herança se não houver parentes sucessíveis.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Direito Assistencial. Filhos. Direito Patrimonial.
1) Lei relacionada ao tema Código Civil – arts. 1583 a 1710. 2) Breves comentários Filiação: o art. 227, §6º, da CF trouxe o princípio constitucional da igualdade entre os filhos, segundo o qual: § 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. A filiação pode decorrer da relação biológica, da relação socioafetiva ou de presunção legal (ver art. 1.597 do Código Civil). Dentre as ações vinculadas à filiação temos:
Negatória de paternidade ou maternidade: visa excluir a presunção de paternidade; é imprescritível;
Investigação de paternidade ou maternidade: meio judicial de tentativa de reconhecimento da filiação. É imprescritível. Os efeitos pessoais do reconhecimento retroagem à data de concepção, entretanto os efeitos patrimoniais não retroagem.
Observação: o Ministério Público tem legitimidade para propor a ação (Lei nº 8.560/92).
Perfilhação: reconhecimento voluntário da filiação;
Adoção.
Poder familiar: é exercido independentemente do estado civil dos pais (art. 1634) e consiste em uma série de direitos e deveres dos pais em relação aos filhos. Importante ressaltar que o art. 1584 prevê como regra a guarda compartilhada entre os pais, o que não significa que não será estabelecido um lar de referência com um dos genitores, mas sim que ambos exercerão a mesma influência nas decisões relativas aos filhos. Os artigos 1635 a 1638 dispõem sobre as hipóteses de suspensão (medida de proteção ao filho) e extinção do poder familiar. Dentre as hipóteses de suspensão do poder familiar temos:
Art. 1637: “Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.”
Art. 1637, parágrafo único: “pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.”
A seu turno, são hipóteses de extinção do poder familiar: a morte dos pais ou do filho, a emancipação, o advento da maioridade, a doção ou por decisão judicial em razão de uma das hipóteses do art. 1638.
3) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores
Do direito patrimonial: Súmula 377 do STF, Súmula 380 do STF, Súmula 197 do STJ, Súmula 134 do STJ e Súmula 332 do STJ Dos alimentos: Súmula 226 do STF, Súmula 379 do STF, Súmula 1 do STJ, Súmula 277 do STJ, Súmula 309 do STJ, Súmula 358 do STJ e Súmula 594 do STJ113.
4) Informativos
Do reconhecimento dos filhos
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Informativo nº 557 do STJ – Direito ao reconhecimento da paternidade biológica114.
Informativo nº 581 do STJ – Reconhecimento de paternidade socioafetiva post mortem115.
Trata da legitimidade do Ministério Público para promover ação de alimentos em prol de crianças e adolescentes – aprovada em 2017 114 O filho tem direito de desconstituir a denominada "adoção à brasileira" para fazer constar o nome de seu pai biológico em seu registro de nascimento, ainda que preexista vínculo socioafetivo de filiação com o pai registral. STJ. 3ª Turma. REsp 1.417.598-CE, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/12/2015. 115 É possível o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem, ou seja, mesmo após a morte do suposto pai socioafetivo. STJ. 3ª Turma. REsp 1.500.999-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Dos Alimentos
Informativo nº 587 do STJ – Inexistência de transferência automática do dever de alimentar116.
5) Enunciados CJF
Da Adoção
CJF/Civil 110: É inaplicável o § 2º do art. 1.621 do novo Código Civil às adoções realizadas com base no Estatuto da Criança e do Adolescente.
CJF/Civil 259: A revogação do consentimento não impede, por si só, a adoção, observado o melhor interesse do adotando.
Do Poder Familiar
CJF/Civil 335: A guarda compartilhada deve ser estimulada, utilizando-se, sempre que possível, da mediação e da orientação de equipe interdisciplinar.
QUESTÃO-TREINO Considerando os interesses de criança ou adolescente, que não esteja em situação de risco e resida em Município que tenha Defensoria Pública estruturada, responda: a) O Ministério Público teria legitimidade para propor ação de alimentos que beneficiasse essa criança ou adolescente? b) Eventual ação de investigação de paternidade ou maternidade poderia ser proposta pelo Ministério Público? Em caso positivo, a legitimidade cessaria com o advento da maioridade da criança ou adolescente no curso
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A obrigação dos avós de prestar alimentos tem natureza complementar e subsidiária e somente exsurge se ficar demonstrada a impossibilidade de os dois genitores proverem os alimentos dos filhos, ou de os proverem de forma suficiente. Assim, morrendo o pai que pagava os alimentos, só se poderá cobrar alimentos dos avós se ficar demonstrado que nem a mãe nem o espólio do falecido têm condições de sustentar o filho. Não tendo ficado demonstrada a impossibilidade ou a insuficiência do cumprimento da obrigação alimentar pela mãe, como também pelo espólio do pai falecido, não há como reconhecer a obrigação do avô de prestar alimentos. O falecimento do pai do alimentante não implica a automática transmissão do dever alimentar aos avós. STJ. 4ª Turma. REsp 1.249.133-SC, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 16/6/2016.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo do processo? Se reconhecida a paternidade ou maternidade do caso, como se daria a incidência dos efeitos pessoais e dos efeitos patrimoniais?
Resposta: a. Sim, o Ministério Público tem legitimidade para propor ação de alimentos que tenha como beneficiário criança ou adolescente que não esteja em situação de risco, ainda que no Município exista Defensoria Pública estruturada. A legitimidade nesse caso encontra respaldo no art. 127 da Constituição Federal, segundo o qual ao Ministério Público incumbe a proteção dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Esse entendimento foi esboçado recentemente na Súmula 594 do Superior Tribunal de Justiça117. b. Sim, pode o Ministério Público nesse caso propor ação de investigação de paternidade ou maternidade. A ação de investigação de paternidade é uma ação de estado de pessoa, tendo como objeto direito indisponível, decorrendo a legitimidade do artigo 127 da Constituição Federal. Insta consignar que, por essa razão, o advento da maioridade no curso do processo não faz com que a legitimidade do Ministério Público para prosseguir com a ação cesse118. Se reconhecida a paternidade ou maternidade, os efeitos pessoais retroagirão à data da concepção, ao passo que os efeitos materiais apenas incidirão a partir do reconhecimento, ou seja, não retroagem.
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http://meusitejuridico.com.br/2017/11/06/nova-sumula-594-stj-e-legitimidade-ministerio-publicopara-acao-de-alimentos-como-estimulo-responsabilidade-parental/ 118 https://www.conjur.com.br/2017-mai-17/maioridade-filho-nao-retira-poder-mp-acaopaternidade
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Joana cuida de sua neta Maria desde que a menor tinha três anos de idade. Os pais de Maria nunca lhe deram atenção emocional ou prestaram recursos financeiros, sendo poucos os momentos de contato. Maria atualmente está com quinze anos de idade e se refere publicamente a sua avó como mãe. Depois de longas conversas com seus outros netos e filhos, que anuíram com a decisão, Joana, que é viúva, decide adotar sua neta Maria. Partindo da temática “adoção”, responda, fundamentadamente, às indagações a seguir, apontando, inclusive, os dispositivos legais correlatos. A) A legislação vigente admite a adoção de pessoa maior de dezoito anos? B) Considerando a situação narrada no enunciado, existe a possibilidade legal de Maria ser adotada por sua avó Joana? (OAB – XII Exame de Ordem Unificado – 2014 – 2ª Fase de Direito Civil).
Resposta (Gabarito da OAB): A) É possível a adoção de maiores de dezoito anos, não se aplicando, entretanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente. Quando a pessoa adotanda for maior de 18 anos, a norma aplicável será a prevista no Código Civil e dependerá da assistência efetiva do poder público e formará sentença constitutiva. As normas previstas na legislação especial (ECA) terão aplicabilidade subsidiária. Fundamentação legal: Art. 1.619 do CC. B) Não é possível a adoção na situação narrada no enunciado, ante o óbice previsto no Art. 42, § 1° da Lei n. 8.069/90 (ECA), por meio do qual o legislador estabeleceu que ascendentes não podem adotar descendentes.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Um adolescente de 15 anos recebe da mãe a notícia de que aquele que como pai o criara, e assim consta de seu registro de nascimento, falecido no ano anterior, não é seu pai biológico. O pai biológico, a seu turno, embora reconheça o fato, não tem a intenção de se aproximar do adolescente, de modo a provê-lo de suporte emocional e material. Diante do impasse, o adolescente pretende socorrer-se das vias judiciais para ver comprovada e reconhecida formalmente a paternidade biológica, mas gostaria que fosse preservada em seu registro de nascimento a indicação de filiação daquele que como pai o criou. À luz da Constituição Federal e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria, a pretensão do adolescente é admitida? Justifique (FCC – DPE-AP – 2018 – Adaptada).
Resposta: Sim, a pretensão do adolescente é admitida à luz da Constituição Federal e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, uma vez que, conforme o recente entendimento esboçado em sede de repercussão geral, os parentescos afetivo e biológico merecem tutela jurídica concomitante, para todos os fins de direito. Esse posicionamento tem como fundamentos os princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável.
QUESTÃO-TREINO Responsabilidade dos incapazes Jorge e Cristina são os pais de Isabela e Otávio, respectivamente com 7 e 9 anos de idade, e no divórcio ficou estabelecido que Jorge ficaria com Isabela e Cristina com Otávio, sob guarda compartilhada, com visitas semanais. Os pais foram chamados à escola de Otávio e foram informados que o garoto deliberadamente foi flagrado riscando o carro da professora
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Mariazinha, que havia lhe colado de castigo por ter batido no colega de sala. Amigavelmente, ficou estabelecido que os pais arcariam com as despesas relativas ao conserto da pintura do carro da professora Mariazinha. Após saírem da escola, Jorge culpa Cristina pela má conduta do filho e se recusa em ratear as despesas causadas pelo filho, sob a alegação de que já paga pensão para o garoto e que Otávio não mora com ele. A conduta de Jorge está correta? Fundamente sua resposta.
Resposta: O art. 932 determina que os pais são responsáveis pelos atos praticados pelos filhos que estejam sob a sua autoridade e sob a sua companhia. Trata-se de responsabilidade civil objetiva (artigo 933), com a aplicação da teoria do risco criado, pois, para que os pais respondam é necessária a demonstração de que houve culpa na conduta praticada por seus filhos. Se o ato ilícito foi praticado por um incapaz, o responsável por ele irá responder de forma principal e o incapaz terá apenas responsabilidade subsidiária e mitigada, isto é, o incapaz apenas responderá pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não tiverem meios suficientes para tanto, devendo a indenização ser equitativa, não podendo privar o incapaz ou as pessoas que dele dependem do essencial. A letra da lei dispõe que os pais só respondem pelo filho incapaz que esteja sob sua autoridade e em sua companhia (art. 932, I, do CC), o que daria a entender que se um dos pais não exerce a autoridade de fato sobre o filho, embora ainda detenha o poder familiar, não responde por ele (Inf. 575, STJ). Contudo, compreende-se que a ausência de um dos pais no momento em o filho incapaz provoca danos a terceiro, mesmo na hipótese de filho que não resida com um de seus genitores, isoladamente, não constitui excludente de responsabilidade civil.
QUESTÃO-TREINO Poder familiar Quais os efeitos do poder familiar?
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Resposta: Em decorrência do poder familiar os pais são os usufrutuários dos bens dos filhos, podem gozar dos bens, mas não lhes é lícito alienar os bens dos filhos ou gravá-los com ônus reais, exceto se houver necessidade ou se for melhor para o filho, o que requer autorização judicial, sob pena de anulação da alienação realizada.
QUESTÃO-TREINO Renata, 21 anos, foi diagnosticada como portadora de “retardo mental leve e epilepsia”. Sua mãe, ao mesmo tempo que entrou com ação para obter benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência do INSS, ingressou com ação de interdição para declará-la incapaz e obter sua curatela. As demandas foram instruídas com laudos médicos que atestavam as doenças, mas não descreveram Renata como alguém incapaz de gerir a própria vida. O benefício previdenciário foi concedido, mas o juízo cível negou a concessão da curatela em tutela antecipada, uma vez que entendeu necessária maior instrução processual. A decisão do juízo se encontra correta? Justifique.
R: Sim. A curatela é o instituto criado para proteção daqueles que a lei considera como incapazes, que são descritos em rol presente no artigo 1.767 do Código Civil. O instituto pelo qual se avalia judicialmente a capacidade da pessoa de
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo gerir a sua vida e seus bens é a interdição. Segundo Nelson Nery, a proteção legal da interdição “se impõe ao maior incapaz para que não seja prejudicada a execução de suas obrigações sociais, comerciais e familiares e para que haja proteção efetiva de seus bens e de sua pessoa119”. A curatela difere-se da tutela, pois, segundo o artigo 1.728 do Código Civil, esta busca a proteção dos filhos menores, enquanto aquela busca proteger todos aqueles que a lei considera inaptos de praticar dos atos da vida civil. O Estatuto da Pessoa com Deficiência (lei 13.146/15), ainda, incluiu no Código Civil uma nova forma de auxílio para aqueles portadores de deficiência que necessitam de apoio para a tomada de certos atos da vida civil: a tomada de decisão apoiada, presente no artigo 1.783A e seguintes do Código em questão. No caso, em que pese Renata ser acometida de doenças graves, não há provas suficientes de que deve ser submetida à curatela. A realização da instrução, em especial de perícia médica, é essencial para a concessão da medida buscada. Ressalte-se que a decisão do juízo não é vinculada ao entendimento do órgão previdenciário, bem como que a existência da doença, por si só, não torna a pessoa incapaz. Nesse sentido: Interdição - Improcedente - Pretensão do genitor desacolhida, em razão da demonstração de que a interditanda, sua filha, possui capacidade para gerir a sua vida e bens, sozinha, apesar de quadro de retardo mental leve - Julgamento convertido em diligência. TJSP. 9ª Câmara de Direito Privado. Processo n. 9134029-58.2005.8.26.0000. Relator: Grava Brazil. Data de registro: 05/04/2006. Outros números: 4017684200”.
Bem de Família
QUESTÃO-TREINO Sandro foi denunciado pelo crime de roubo majorado em face do Banco X. O dinheiro supostamente auferido por Sandro no crime, teria sido utilizado para compra de um simples apartamento para sua moradia, seu único bem imóvel. Regulamente processado, ao final da instrução, Sandro foi absolvido do crime ao argumento de que não existiam provas de ter ele concorrido para a infração penal. Diante do exposto, indaga-se: a) É possível que o banco X proponha ação no âmbito cível visando a reparação dos danos? b) Caso a ação seja analisada e o Juiz Cível constate a responsabilidade do acusado, o imóvel de Sandro poderia ser penhorado?
119
JUNIOR, Nelson Nery. Código Civil Comentado, 9ª edição. Editora revista dos Tribunais, 2012. p. 1492.
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Respostas: a) Sim. Embora a Sentença criminal tenha transitado em julgado, a responsabilidade civil pode ser apurada de forma independente, já que o Juiz Criminal não negou categoricamente a inexistência do fato ou de sua autoria, o que não impede análise do Juízo Cível, numa interpretação a contrário sensu do artigo 935 do Código Civil. b) Sim. Por se tratar de imóvel auferido como produto de crime, poderia o Juízo Cível reconhecer a penhorabilidade do mesmo, nos termos do art. 3º, inciso IV, da Lei 8009/90, por ser essa uma das exceções da impenhorabilidade do bem de família. QUESTÃO-TREINO Ricardo, 16 anos, possui em seu nome uma sala comercial que herdou de seus pais. Atualmente a sala comercial encontra-se alugada. Ricardo vive de aluguel sozinho em uma pequena casa e todo o proveito obtido com o aluguel da sala comercial é revertido para o pagamento do aluguel referente ao imóvel em que reside. Ricardo está sendo executado. O exequente postulou a penhora da sala comercial. O Juiz abriu vista ao Ministério Público para parecer. Qual deve ser o teor da manifestação do Ministério Público, levando em conta a jurisprudência dos Tribunais Superiores?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo R: O Ministério Público deverá dizer que conforme entendimento do STJ (RESP 1616475) é impenhorável o único imóvel comercial do devedor que esteja alugado quando o valor do aluguel é destinado unicamente ao pagamento de locação residencial numa interpretação ampliativa da Súmula 486 do próprio STJ.
Alienação Parental
1) Legislação relacionada ao tema
Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010 Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017 Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 Lei nº
8069, de 13 de julho de 1990
2) Leituras importantes Artigos do IBDFAM Julgado do Superior Tribunal de Justiça, no CC nº108689 / PE.
QUESTÃO-TREINO A Lei nº 12.318, de 25 de agosto de 2010, dispõe sobre a alienação parental, como marco de proteção ao direito fundamental da criança ou adolescente ao convívio familiar saudável. a) Nesse sentido, conceitue alienação parental e dê, ao menos, um exemplo. b) É possível aplicar medidas protetivas em prol da criança ou adolescente vítima desse tipo de violência?
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Respostas: a) Como a própria lei descreve, a alienação parental é a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, que poderá ser causada ou induzida por um dos pais, avós ou os que tenham as crianças ou adolescentes sob guarda, autoridade ou vigilância, a fim de que repudie o genitor ou, ainda, cause prejuízo à manutenção ou criação de vínculos com este. b) A Lei nº 13.431/17 estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, de forma que passou a prever a alienação parental no rol que prevê as formas de violência psicológica. De igual modo, a norma assegura a aplicação de medidas protetivas em prol da criança e do adolescente vítimas de alienação parental contra o autor da violência, aplicando-se, no que couber, a Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e a Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha).
BREVES COMENTÁRIOS:
1. Para fins de prova, é importante saber o conceito de alienação parental, sobretudo porque a própria lei vem definir o instituto. Tente criar o seu conceito, a partir do entendimento daquele delimitado pela lei. 2. Não é necessário “decorar” o número da lei, mas é de importância, ao menos, citar que o instituto é regulamentado pela lei, bem como no que reporta às medidas protetivas cabíveis. 3. Leitura recomendada: Maria Berenice Dias: “Finalmente, alienação parental é motivo para prisão” (Disponível em:https://www.conjur.com.br/2018-abr-05/maria-berenice-diasagora-alienacao-parental-motivo-prisao)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO A Lei nº 12.318, de 25 de agosto de 2010, além de conceituar a alienação parental, também enumera atos que caracterizam contra a convivência familiar saudável de crianças e adolescentes. a) Os atos enumerados na lei são taxativos? b) Quais os atos descritos na lei que caracterizam a alienação parental?
Respostas: a) O parágrafo único, do artigo 2º, da Lei 12.318/2010, traz um rol exemplificativo acerca das formas de alienação parental, possibilitando ao juízo defini-los a partir de sua própria análise ou por meio de perícia. b) O mesmo dispositivo legal enumera formas de alienação parental, dentre elas: realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade, dificultar o exercício da autoridade parental; dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente e mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avó. BREVES COMENTÁRIOS: 1. No que respeita à letra “b”, observo que dificilmente o examinador cobrará o rol dos atos de alienação, mas é importante compreende-los. Em verdade, todos são complementares.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Providências na configuração da alienação parental De acordo com a Lei n°12.318/2010, havendo indício da prática de ato de alienação parental em ações que tramitam pelas Varas de Família, quais providências poderão ser adotadas pelo magistrado?
Constatados indícios de ato de alienação parental, nos termos do artigo 4º120 da indigitada lei, de ofício ou a requerimento das partes, o processo terá tramitação prioritária, devendo o magistrado determinar, após oitiva do representante do Ministério Público na qualidade de custos legis, as medidas provisórias adequadas à preservação da integridade psicológica da criança ou adolescente. Referidas medidas visam ainda assegurar a convivência do menor com o genitor alienado (ou quem ostente esta condição) ou permitir a aproximação entre ambos. O artigo 6º121 da lei traz um rol meramente exemplificativo dos instrumentos que poderão ser adotados pelo juiz, inclusive de forma cumulativa e sem prejuízo da utilização de outras medidas processuais, a saber: 120
Art. 4o Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso. Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas. 121 Art. 6o Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; II ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo a) b) c) d) e)
declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; estipular multa ao alienador; determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; f) determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; e g) declarar a suspensão da autoridade parental. Na hipótese de mudança abusiva de endereço que inviabilize ou dificulte a visitação, o juiz também poderá determinar a inversão de levar para ou retirar o menor da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar. Em sendo o caso, deve o magistrado determinar ainda a elaboração de perícia psicológica ou biopsicossocial, realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, que poderá compreender, dentre outros, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos constantes dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame do comportamento do menor frente à acusação contra o genitor. O laudo respectivo deverá ser apresentado no prazo de 90 (noventa) dias, prorrogáveis apenas por autorização judicial, se presente justificativa plausível, conforme prevê o artigo 5º122 da Lei n° 12.318/10. Direito das Sucessões
1) Leis relacionadas ao tema Artigos 1.829 e 1.790 do Código Civil; Artigos 1.845 e 1.831 do Código Civil; Artigos 1.723 e 1.659 do Código Civil; parental. Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar. 122 Art. 5o Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial. § 1o O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor. § 2o A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental. § 3o O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Leis da União Estável (Lei n. 8.971/94 e Lei n. 9.278/96); 2) Jurisprudência dos Tribunais superiores Jurisprudência em Teses n. 50 – União Estável
5) Informativos Informativo do STF n. 864 Informativo do STJ – n. 533; n. 622; Breves comentários As balizas do Direito das Sucessões foram em grande parte pacificadas recentemente pelos Tribunais Superiores (STF e STJ). Precisaram-se de anos até que a sucessão causa mortis regulamentada pelo Código Civil de 2002 apresentasse pontos firmes, isto porque os dispositivos causavam interpretações múltiplas e passíveis de complicações não só práticas, mas também acadêmicas e jurisprudencial. E neste ponto surge o interesse do tema em provas discursivas, pois a matéria sucessória está se consolidando em jurisprudência do Supremo e STJ. Como regra, a prova apresenta um caso concreto que exige do candidato o conhecimento jurisprudencial, para além do mero conhecimento da lei. Tentaremos abordar a partir de questões de concursos as decisões de relevo, apontando os julgados e respectivo informativo. Neste ponto específico, pensamos que a leitura do informativo via Dizer o Direito seja o suficiente, uma vez que os acórdãos são longos e, como era de se esperar, contém posicionamentos acirrados, razão pela qual a síntese do decidido nos parece ser o mais importante para fins de concurso. Ao mérito. BOA SORTE! QUESTÃO-TREINO – CONTEXTUALIZADA COM A PRIMEIRA FASE! (XXVI Concurso para ingresso na Carreira da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro – ADAPTADA123) João e Pedro viviam em união homoafetiva desde 2013, situação esta rompida pela morte prematura de Pedro, vitimado por um acidente de trânsito ocorrido em maio de 2018. João e Pedro residiam no apartamento adquirido por Pedro em 2014. Maria, irmã de Pedro, sua única parente viva, ajuíza ação de reintegração de posse em face de João, sustentando tratar-se de mero comodato tendo, inclusive, notificado o réu previamente. Não havia escritura comprovando a união ou qualquer disposição sobre partilha de bens entre os companheiros.
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http://concursos.defensoria.rj.def.br/informe/caderno_perguntas_prova_preliminar.pdf
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo C) Pressupondo que o imóvel onde eles moravam foi adquirido durante o curso da união estável, mediante esforço comum, João teria participação sucessória no imóvel? D) O companheiro sobrevivente tem direito real de habitação, de acordo com Código Civil? E) Discorra sobre a sucessão do(a) companheiro(a), à luz da jurisprudência atual do Supremo Tribunal Federal.
Resposta: A) A questão foi fruto do concurso público recém realizado da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Exigiu do candidato conhecimento sobre a jurisprudência e, em especial, do leading case que aborda o reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal acerca das uniões homoafetivas. Também era esperado pelo gabarito oficial o posicionamento (veiculado no ano 2017) da Suprema Corte sobre os precedentes com repercussão geral de n. n. 646.721 e 878.694 que declararam inconstitucional a distinção do regime sucessório entre cônjuge e companheiro. Como se sabe, a união estável por ser um fato social – um constatado da vida – uma família de fato (na medida que não se requer para seu reconhecimento nenhum pacto formalizado prévio) – foi apontada no enunciado como incontroversa. Daí se pode reconhecer que João e Pedro preenchem os requisitos legais para o reconhecimento da união convivencial (art. 1.723 do Código Civil), transcrevemos: Art. 1.723 do CC. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família. Sublinhado acima “homem e a mulher” justamente para enfatizar que referida disposição legal teve rearranjo interpretativo pelo Supremo Tribunal Federal. O Tribunal Constitucional brasileiro no julgamento da ADI 4.277/DF e ADPF 132/RJ assentou que124: EMENTA: (...) 2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. 3. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO ‘FAMÍLIA’ NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. (...) DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO REDUCIONISTA. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por parres homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão ‘família’, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. (...). 4. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO NO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE ‘ENTIDADE FAMILIAR’ E ‘FAMÍLIA’. (...) A constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. 6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA ‘INTERPRETAÇÃO CONFORME’). RECONHECIMENTO DA 124http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESCLA%2E
+E+4277%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+4277%2EACMS%2E%29& base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/bkxmaby
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica da ‘interpretação conforme à Constituição’. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetivas.
Assim, concluiu-se que é reconhecida pelo ordenamento jurídico brasileiro a união estável entre casais heteroafetivos e homoafetivos. De tal modo, configurada convivência pública, continua e duradoura entre duas pessoas, chancelada estará a união estável (sem querer entrar na polêmica, segue no rodapé decisão do CNJ125 sobre a impossibilidade de se lavrar escritura pública pelo Tabelião de Notas de famílias poliafetivas). Como o problema menciona a ausência de pacto de convivência, pelo teor do art. 1.725 do Código Civil, aplica-se às relações patrimoniais o regime da comunhão parcial de bens. Isto é, o regime de bens da união estável sem regulamentação se realiza como comunhão parcial. Explicando ainda mais, bem como no casamento sem pacto antenupcial (art. 1.640 do CC), a união estável sem contrato escrito é regida pelas disposições dos artigos 1.658 até 1.666 do Código Civil. Neste regime vige a ideia geral de que os bens adquiridos onerosamente no curso da união/casamento – conforme dispõe o art. 1.658 do CC – fará parte do acervo patrimonial dos conviventes, ainda que registrado em nome de um só deles (art. 1.660, inc. I do CC). Para não perder o rumo: concluímos a partir do enunciado que João e Pedro viviam em união estável, sob o mesmo teto, e que o regime patrimonial entre eles é da comunhão de bens. À guisa de conhecimento, vale a pena ler as exceções de comunicabilidade dispostas no art. 1.659 e incisos do Código Civil. Disso é possível extrair que, como o imóvel havia sido adquirido por Pedro durante a convivência estável (união começou em 2013, alienação datada do
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http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/87073-cartorios-sao-proibidos-de-fazer-escrituras-publicasde-relacoes-poliafetivas
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo ano de 2014), ainda que o registro perante o Cartório de Registro de Imóveis estivesse só no nome do de cujus: João tem direito à meação neste imóvel. Neste sentido a tese ‘13’ do compilado Jurisprudência em teses: Comprovada a existência da união homoafetiva, é de se reconhecer o direito do companheiro sobrevivente à meação dos bens adquiridos a título oneroso ao longo do relacionamento. Mas aqui não se completa a questão arguida! Não se deve confundir o direito patrimonial da convivência (meação que é consequência do regime de bens); com o regime sucessório (direito que se valora a partir do implemento da morte). E a resposta é sim, João também tem participação sucessória nos bens deixados pelo seu companheiro. Analise pormenorizado do quantum se fará no item “C”. É direito próprio do companheiro sobrevivente metade dos aquestos, ou seja, daquele imóvel adquirido onerosamente metade pertencerá a cada um dos conviventes. Mas isso não se confunde com o direito sucessório. Deste modo, por direito próprio, adquirido ainda em vida com a aquisição do imóvel, poderíamos dividir este patrimônio imobilizado assim:
A partir disso, conclui-se que Pedro levará para sucessão mortis causa 50% do imóvel. Agora, resta analisar o destino sucessório desta outra metade do patrimônio que é reclamada pela irmã (colateral em 2º grau). E para arrematar esta pergunta, transcrevemos recente julgado do STJ sobre o tema – acatando e reproduzindo ideia que se verá adiante e julgada sob a sistemática da repercussão geral: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. UNIÃO ESTÁVEL. ART. 1.790 DO CC/2002. INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1.829 DO CC/2002. APLICABILIDADE. VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. PARTILHA. COMPANHEIRO. EXCLUSIVIDADE. COLATERAIS. AFASTAMENTO. ARTS. 1.838 E 1.839DO CC/2002. INCIDÊNCIA.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 2. No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regime de sucessórios entre cônjuge e companheiros, devendo ser aplicado em ambos o regime do artigo 1.829 do CC/2002, conforme tese estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento sob o rito da repercussão geral (Recursos Extraordinários n. 646.721 e 878.694). 3. Na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge ou companheiro sobrevivente, ressalvada disposição de última vontade. 4. Os parentes colaterais, tais como irmãos, tios e sobrinhos, são herdeiros de quarta e última classe na ordem de vocação hereditária, herdando apenas na ausência de descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro, em virtude da ordem legal de vocação hereditária. (REsp 1.357.117/MG, INFORMATIVO 622/STJ). A conclusão que se chega é que, João terá participação à título de meação (proveniente do regime de bens) e também sucessória. Deferindo-se a propriedade de todo imóvel: metade por meação, e a outra por sucessão (conforme será pormenorizado do item “c”). Ademais, sem nenhuma razão a reclamação possessória realizada pela colateral (irmã). Uma vez que o convivente supérstite é proprietário do imóvel (art. 1.784 combinado com art. 1.829, inciso III, ambos do CC126).
Resposta: B) Na atual sistemática, o companheiro tem direito real de habitação de acordo com o Código Civil. Neste quesito, o maior entrave doutrinário é a base legal que dá razão ao direito de habitação. A celeuma se criou na medida que a Lei da 9.278/96 prevê: Art. 7º, p. único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união estável ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família. A par desta matéria, diz o Código Civil no art. 1.831 do CC: Art. 1.831 do CC. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao
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Art. 1.829 do CC. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: INCISO III – ao cônjuge ‘e ao companheiro’ sobrevivente [leitura constitucional do dispositivo].
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar. Justifica-se, a teor da jurisprudência do STJ127 (REsp n.1.203.144/RS), que o art. 1.831 do Código Civil tem aplicação em detrimento da lei específica, isto porque é mais protetivo ao convivente supérstite. Neste sentido é a tese ‘8’ do compilado Jurisprudência em teses: O companheiro sobrevivente tem direito real de habitação sobre o imóvel no qual conviva com o falecido, ainda que silente o art. 1.831 do atual Código Civil. Resposta: C) Se o livro das sucessões é o que mais sofreu críticas, uma das maiores controvérsias dentro dele, isso desde a entrada e vigor do Código Civil de 2002, diz respeito às distribuições sucessórias diferenciadas entre cônjuges e companheiros. O tema foi recentemente objeto de análise de constitucionalidade perante o STF e se reconheceu – por maioria – a inconstitucionalidade de regimes desiguais para pagamento da deixa sucessória para cônjuges e companheiros. O informativo n. 864/STF assim discorreu sobre a matéria enfrentada pelo plenário do Supremo, sob o rito da repercussão geral128: No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a diferenciação de regimes sucessórios entre cônjuge e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do Código Civil. (RE n. 646.721/RS e RE n. 878.694/MG, Informativo 864/STF, repercussão geral). A doutrina especializada muito discutia sobre a inconstitucionalidade do Art. 1.790 do CC, e dizia129: A questão fundamental para análise do art. 1.790 é saber se a Constituição Federal permite ao legislador infraconstitucional tratar de forma diferenciada o cônjuge e companheiro em matéria sucessória. A diferenciação no atual Código é gritante, bastando tomar como exemplo o fato de que, pela disciplina literal do art. 1.790, o companheiro só tem direito hereditário, em concorrência com os 127
https://drive.google.com/file/d/0B4mQkJ-pSXwqRzJ1bVdHd3Y5U00/edit (Dizer o Direito - Informativo 533/STJ) 128 https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2017/06/info-864-stf.pdf 129 Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência: coordenador Cezar Peluso – 6 ed. rev. e atual. – Barueri, SP: Manole, 2012, página 2141.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo descendentes, em relação aos bens onerosos adquiridos na constância da união estável, ou seja, sobre os aquestos, bens sobre os quais já tem direito à meação. Ao passo que o art. 1.829, como será visto nos respectivos comentários, só admite a cota hereditária do cônjuge supérstite, quando concorre com descendentes, nos bens particulares, em relação aos quais não tem meação.
Usemos a pergunta posta no enunciado para esquadrinhar a questão e pormenorizar como, em situações patrimoniais idênticas, o regime de sucessão era completamente diverso: a depender se casado ou se convivente em união estável. O foco a ser dado é do regime vigente, ou seja, após o filtro de constitucionalidade do Supremo que declarou inconstitucional o art. 1.790 do CC (sucessão do companheiro diferenciada). Se João fosse casado com Pedro, à luz do que dispõe do art. 1.829 do Código Civil, em virtude da ausência na vocação hereditária de descendentes e ascendentes (ordem de chamada para se receber a herança conforme art. 1.829, inc. I e II) o cônjuge sobrevivente receberia todo o patrimônio (art. 1.838 do CC130). Porém, e aqui se chama atenção, ANTES DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE do art. 1.790131 (isso é, se este fosse aplicado ao caso concreto do enunciado, pois nem sempre se declarava sua inconstitucionalidade incidental) o regime sucessório teria a seguinte lógica: 1) O companheiro teria direito à meação normalmente, assim, 50% do patrimônio adquirido onerosamente no curso da união estável já seria dele por decorrência do regime de bens (conquistado em vida à título oneroso); 2) O companheiro – ao contrário da pessoa casada – apenas teria sucessão sobre aqueles bens onde tivesse meação; 3) Como no caso narrado no enunciado o apartamento foi adquirido onerosamente no curso do estágio convivencial, POR MEAÇÃO teria metade do patrimônio, certo? Por logo, estaria habilitado a concorrer na outra fração; 4) PORÉM, a convocação para suceder a ½ (outros 50%) de Pedro teria concorrência da irmã. Veja o que dizia o inc. III do art. 1.790: se concorrer com outros parentes sucessíveis (irmã é colateral em segundo grau), terá direito a um terço da herança.
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Art. 1.838 do CC. Em falta de descendente e ascendente, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente. 131 Art. 1.790 do CC. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: (caso do enunciado – antes da declaração de inconstitucionalidade, regia-se pelo inciso III) Inc. III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 5) Assim, João teria 66,66%: sendo 50% decorrente do regime de bens (comunhão parcial) acrescido de 16% recolhido por herança (1/3 sobre a metade do companheiro) 6) De outro lado a irmã, teria 33,33% do apartamento à título sucessório. 7) Vejam a discrepância do resultado final, isto é, considerando a meação e a transmissão causa mortis do apartamento se: Casado:
Em união estável:
Vendo assim as coisas, para concluir, vale agora saber os fundamentos, a argumentação usada para declarar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC. (1) Dignidade da pessoa humana: considerar a sucessão diferenciada entre cônjuge e companheiro viola a máxima kantiana (imperativo categórico), na medida que rebaixa em direitos a pessoa a depender da modalidade de família que ela ‘escolhe’, redução da autonomia da pessoa (“quando se trata a companheira em posição de inferioridade em relação à esposa, diz-se que ela em valor intrínseco menor”). E aqui é importante saber que a disposição do art. 226, §3º da CRFB, ao cuidar da união estável não a tratou como um minus, mas sim em igualdade com qualquer outra modalidade de família (seja do casamento, monoparental etc.); não há hierarquia entre estas modalidades de família. (2) Igualdade/Isonomia – há manifesto tratamento diferenciado para situações pares. Pois se aquinhoa diferentemente quem vive em casamento e união estável sem qualquer razão justa. Aqui se invocou a ideia da discriminação negativa sem justa causa que desse ensejo a isso. (3) Proporcionalidade, na perspectiva da vedação a proteção deficiente (untermassverbot) – segundo o voto do Ministro Barroso, a partida da ideia da proporcionalidade, não se protege à contento (desprotege-se) a sucessão a partir de uma premissa não fundamental. Proteger de maneira inferior “a companheira sem fundamento constitucional legítimo incide na 132 desproporcionalidade indesejada pela Constituição” .
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Sem querer ser mais realista do que o rei, porém, vale a menção de que nem sempre quem vivia em união estável teria uma visão mais prejudicial sucessória do que aquele que estava casado.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (4) Vedação do retrocesso – a legislação ordinária anterior ao Código Civil (Leis n. 8.971 e n. 9278) já previa a igualdade sucessória em grande parte133. O CC/2002 – logo posterior às Leis da União Estável, que são da década de 90 – reduziu esta proteção. Deste modo, retrocedeu-se em direitos às pessoas que viviam em união estável. É isso!134 Em linhas gerais, a partir do enunciado e com as devidas fundamentações com base na jurisprudência e lei, esse era o raciocínio que se exigiria para responder a estes itens. Óbvio que na prova não se esperava que se escrevesse tanto, nem muito menos mencionasse a jurisprudência ipsis litteris. O que buscamos fazer foi desenvolver o raciocínio necessário – com destaques – para o esperado pela prova. A prova da DPE/RJ tinha um viés mais de atuação do defensor público enquanto representante de João (assistido pela defensoria em procedimento possessório), por isso adaptamos, com vistas a formatar mais consentaneamente à atuação do Parquet enquanto custos juris.
Sucessões e Família 1) Leis relacionadas ao tema Artigos 1.829 e 1.830 do Código Civil; Artigos 1.832 do Código Civil; Artigos 1.723 e 1.659 do Código Civil; 2) Jurisprudência dos Tribunais superiores REsp n. 1.368.123/SP, julgado pela 2ª Seção do STJ; REsp n. 1.332.773/MS;
3) Informativos Informativo do STF n. 864
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Art. 2. As pessoas referidas no artigo anterior participação da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições: Inc. III – na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança. (art. 2 da Lei 8.971/94) 134 Anota à guisa de contraditório que o parecer emitido pela Procuradoria-Geral da República era no sentido de reconhecer a constitucionalidade do art. 1.790 do CC, sob o fundamento de que igualar os regimes sucessórios violaria a autonomia privada das pessoas que “optaram” em viver em união estável, tolhendo desta aptidão de escolha entre casamento e união estável.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Informativo do STJ – n. 563; n.573; n. 598; n. 609; Retiramos questão da própria primeira fase do concurso de Analista sobre Direito das Sucessões que cobrou jurisprudência atualizada dos Tribunais Superiores, como era de se esperar. Conforme dito acima, paulatinamente, tem-se pacificado as grandes polêmicas sucessórias por meio de decisões do STJ e STF, razão pela qual elas merecem destaque. Apesar de já ter incidido na 1ª Fase do concurso, não me surpreenderia se reiterasse na próxima etapa, justamente porque a questão sobrepôs ideias jurisprudenciais sem exigir do candidato expressamente uma manifestação sobre os fundamentos. De qualquer forma, o conhecimento deste tema é sempre válido, tanto é assim que os concursos em geral têm cobrado a matemática sucessória do art. 1.829 do Código Civil reiteradamente. SUPERQUESTÃO CONTEXTUALIZADA! APRENDA A RACIOCINAR NA QUESTÃO! 2. (IV Concurso para ingresso na Carreira de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo – ADAPTADA) Mélvio saiu do lar conjugal no ano de 2013, indo morar sozinho em outra localidade, após ter descoberto atos de infidelidade de Helena, sua esposa, com quem era casada pelo regime da comunhão parcial de bens, e tinha dois filhos, João e Maria. No ano de 2018, Mélvio iniciou um relacionamento amoroso, público e notório, com o objetivo de constituir família, com Caio. Entretanto, Mélvio sofreu um acidente automobilístico e faleceu, deixando como único bem, um apartamento, adquirido no de 2017. O apartamento foi alienado, mediante autorização judicial, pelo valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).
Particularmente, para não me perder, costumo desenhar na prova. Nesta questão não foi diferente, fui lendo e cheguei ao seguinte esboço: (1) Primeiro momento casamento
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (2) Separação de fato (“indo morar sozinho em outra localidade, após ter descoberto atos de infidelidade de Helena, sua esposa”); (3) Antes de constituir nova união estável (adquiriu apartamento, no valor de R$ 1 milhão – ano 2017); (4) Nova união estável com Caio:
Em síntese, o problema queria saber como se daria o pagamento sucessório. Para responder isso teríamos que enfrentar as seguintes questões: (a) a separação de fato e “culpa”; (b) constituição de nova união estável; (c) aquisição de novo apartamento entre os relacionamentos – já estava separado de fato; (c) ordem de vocação hereditária e regime sucessório de concorrência. Respira! Vamos por partes. É do texto legal que a ruptura fática da sociedade conjugal pode dar ensejo à constituição de uma nova união estável (veja, não é imprescindível o divórcio: com a consequente dissolução do vínculo; ou a separação: rompimento da sociedade conjugal):
Art. 1.723, §1º do CC. A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso da pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. Art.1.521, inc. VI do CC. Não podem casa (VI) as pessoas casadas.
Até aqui tudo OK? Ou seja, a “saída do lar” (não gosto de “abandono do lar”, pra mim, soa muito CC/16) pode ensejar a constituição de nova união estável. Este dado, aliás, estava no enunciado. NOTA MENTAL: não discuta com os dados do enunciado! Simples assim.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A própria pergunta nos dá a informação de que o apartamento foi adquirido após a ruptura da sociedade conjugal (separação de fato) indicando que a aquisição foi de forma particular, ou seja, sem concorrência da primeira esposa Helena. Em outras palavras, a ideia fundamental para responder a questão que se tira daí é que o apartamento é um bem particular de MÉLVIO. Além disso, este apartamento foi adquirido antes do início da união estável estabelecida entre Mélvio e Caio. Agora nos restava saber: Caio é herdeiro? Em caso positivo, Caio concorreria com os filhos João e Maria ao patrimônio sucessível deixado pelo de cujus? E sob qual regime jurídico? Vamos partir do pressuposto que já lemos a questão anterior e que sabemos que o regime sucessório único vigente hoje equipara cônjuge e companheiro, incidindo assim para qualquer modalidade de família a matemática sucessória disposta no art. 1.829 do CC, né? Quem concorrerá a herança deixada por Mélvio? A resposta desta pergunta tem como premissa a disposição do art. 1.830 do Código Civil, pois: Art. 1.830 do CC. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente [ou companheiro] se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente. Ainda que a doutrina discuta os termos deste dispositivo, recentemente o STJ135 confirmou sua plena vigência e eficácia (REsp n. 1.513.252/SP), este artigo trata da polêmica culpa mortuária, vejamos a ementa: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. SUCESSÕES. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. SEPARAÇÃO DE FATO HÁ MAIS DE DOIS ANOS. ART. 1.830 DO CC. IMPOSSIBILIDADE DE COMUNHÃO DE VIDA SEM CULPA DO SOBREVIVENTE. ÔNUS DA PROVA. 1. A sucessão do cônjuge separado de fato há mais de dois anos é exceção à regra geral, de modo que somente terá direito à 135
https://www.dizerodireito.com.br/2015/12/informativo-esquematizado-573-stj_28.html
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo sucessão se comprovar, nos termos do art. 1.830 do Código Civil, que a convivência se tornara impossível sem sua culpa E ele tem grande valia no caso enunciado, isto pois Mélvio e Helena já estavam separados de fato há mais de 2 anos, além do que por “culpa” 136 (com pesar escrevo isso) de Helena (veja que o enunciado diz ter sido reconhecida infidelidade por parte dela). Deveras, com incidência do art. 1.830 do CC, afasta-se por completo a participação sucessória de Helena sobre o apartamento. Tudo bem? Perdeu-se? Não desiste! Respira, volta do começo que vai dar certo! Então quem concorrerá? Ora, o companheiro e os filhos de Mélvio concorrerão na herança deste bem particular (veja, este é o dado do enunciado, sucessão só sobre o apartamento). Por quê? Porque já sabemos que o regime jurídico que se aplicará é aquele do art. 1.829, inc. I do CC, uma vez que regulamenta a sucessão do cônjuge e do companheiro: Art. 1.829 do CC. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: Inc. I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente [companheiro sobrevivente], salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares. Tiramos do enunciado que tem bem particular (apartamento), há descendentes e há companheiro. Leia só o negritado aí em cima – penso que pode ajudar. E este inciso I, do art. 1.829 do CC, como se interpreta? Disse recentemente o STJ137, por meio da 2ª Seção (é com “ç” mesmo): RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. REGIME DA COMUNHÃO 136
A questão da “culpa” pelo fim do matrimônio é tema muito polêmico, notadamente após o implemento da EC 66/2010. Mas penso que com o informativo no link aí do dizer o direito ajuda a entender a polêmica. 137 https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2015/07/info-563-stj.pdf (caso prefira, tá aí o informativo que cuidou da questão, vale MUITO a pena ler)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo PARCIAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO. EXISTÊNCIA DE DESCENDENTES DO CÔNJUGE FALECIDO. CONCORRÊNCIA. ACERVO HEREDITÁRIO. EXISTÊNCIA DE BENS PARTICULARES DO DE CUJUS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. 1. (...). 2. Nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado pelo regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens particulares. 3. Referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus. (REsp n. 1.368.123/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 22/abril/2015)
Neste sentido já enunciava o CJF: Enunciado 270. O art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados no regime da comunhão parcial ou participação final dos aquestos, o falecido possuísse bens particulares, hipótese em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente entre os descendentes.
A redação é triste mesmo. Entendeu? Certo de que sim, vamos resumir: Helena está afastada da sucessão; O apartamento é bem particular; sendo bem particular existe concorrência entre descendentes e companheiro. Para encerrar, qual é o pagamento sucessório de cada um dos concorrentes? Melhor: quanto cada um leva da herança? A resposta está em texto expresso de lei, nem precisa desenhar: (Art. 1.832 do CC) Em concorrência com os descendentes caberá ao companheiro quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça138.
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CONHEÇA A REDAÇÃO DO ART. 1.832, pois pode ser cobrado:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo [LEMBRE-SE de ler este artigo como: ‘companheiro’, em virtude da leitura constitucionalizada do art. 1.829 do CC]. Logo, a resposta adequada era que João, Maria e Caio receberão a herança em partes iguais. (de ponto final) Eu desenvolvi o raciocínio de modo pausado, com reflexões, delongas, mencionando os informativos e artigos de lei para tentar deixar mais simples e “mastigado”, possível. Caso você ainda não seja habituado ao direito das sucessões pode parecer que a resposta está bem longa, porém, depois de praticar verá que os casos em sua maioria seguem este roteiro e, com o treino, o cálculo vai se tornando mais intuitivo. Outro detalhe, não achei essa questão simplória ou trivial. Questão que exigia um conhecimento mais do que básico (para não dizer elevado). Espero que tenham entendido. Boa Sorte!
Art. 1.832 do CC. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I do CC) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 6. Direito Processual Civil Normas processuais civis: normas (regras e princípios) fundamentais; interpretação e aplicação. Função Jurisdicional: jurisdição, limites e cooperação internacional. Cooperação nacional. Competência interna: critérios determinativos. Competência absoluta e relativa. Modificação da competência. Incompetência. Sujeitos do processo. Partes e Procuradores. Capacidade processual. Deveres das partes e dos procuradores. Responsabilidade por dano processual. Sucessão, substituição e representação. Gratuidade da justiça. Litisconsórcio. Intervenção de terceiros. Intervenção voluntária e provocada. Assistência. Denunciação da lide. Chamamento ao processo. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Amicus curiae. Outras intervenções. Ministério Público. Perfil constitucional. Intervenção como parte. Intervenção como fiscal da ordem jurídica. Poderes investigatórios. Responsabilidades. Impedimentos e suspeição. Métodos de resolução dos litígios individuais e coletivos. Conciliação, mediação, negociação e formas alternativas de resolução dos litígios. Ação. Direito de ação. Teorias. Direito de defesa. Exceções e objeções materiais e processuais. Processo. Atos processuais. Forma, tempo e lugar. Atos das partes. Pronunciamentos do juiz. Prazos. Penalidades e preclusões. Comunicação dos atos processuais. Fatos jurídicos processuais. Atos, fatos e negócios processuais. Pressupostos processuais. Invalidades processuais. Tutela jurisdicional. Formas de tutela. Classificações. Tutela provisória. Tutela definitiva. Jurisdição contenciosa: Ações possessórias; Inventário e partilha; Embargos de terceiro; Habilitação; Ações de família; Processos contenciosos de divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação, Jurisdição voluntária: Disposições gerais; alienações judiciais; divórcio, separação, extinção consensual de união estável e alteração do regime de bens do matrimônio; testamentos e codicilos; herança jacente; bens dos ausentes; coisas vagas; interdição, tutela e curatela e estatuto da pessoa com deficiência; Organização e fiscalização das fundações. Procedimento comum: petição inicial e seus requisitos, registro e distribuição, valor da causa, cumulação de pedidos; deferimento, indeferimento e emenda da
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo inicial; improcedência liminar do pedido; audiência de conciliação ou mediação; transação e homologação; contestação e reconvenção; revelia e seus efeitos. Procedimento comum 2: providências preliminares e saneamento; julgamento conforme o estado do processo; saneamento e organização do processo; audiência de instrução e julgamento; provas; provas ilícitas. Sentença. Coisa julgada. Cumprimento provisório e definitivo da sentença. Processo de execução: execução em geral; partes; competência; requisitos; formação, suspensão e extinção da execução; responsabilidade patrimonial; fraudes; Espécies de execução: para entrega de coisa, das obrigações de fazer ou de não fazer e por quantia certa; execução de alimentos; execução contra a Fazenda Pública. Oposição à execução: impugnação ao cumprimento de sentença; embargos à execução; defesa por simples petição. Recursos: disposições gerais; apelação; agravo de instrumento; agravo interno; embargos de declaração. Recursos para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça. Recurso Ordinário Constitucional. Recurso Extraordinário. Recurso Especial. Embargos de Divergência. Noções gerais e hipóteses de cabimento. Julgamento dos recursos repetitivos. Precedentes e julgados vinculantes. Precedente, jurisprudência e súmula. Efeito vinculante. Limites do efeito vinculante. Fundamentos relevantes. Distinção e superação. Incidente de resolução de demandas repetitivas. Incidente de assunção de competência. Ação de usucapião. Mandado de segurança individual e coletivo. Mandado de injunção. Habeas data. Ação Popular.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Processo Civil. Normas fundamentais. Competência. 1) LEGISLAÇÃO Artigos 1º a 60 do Código de Processo Civil O que é a regra da kompetenzkompetenz? Embora o nome possa causar algum tipo de tensão, trata-se de instituto de fácil compreensão. Essa regra estabelece que todo órgão jurisdicional tem sempre uma competência mínima, qual seja, a de definir sua própria competência. Nesse sentido, vale citar a conclusão de Didier “todo juízo tem competência para julgar a sua própria competência. O juiz é, sempre, o juiz da sua competência” (DIDIER Jr., Fredie, curso de processo civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento, 19ª edição, Salvador: Ed. Juspodivm, 2017, pag. 224).
QUESTÃO-TREINO Ação de cobrança João, pessoa idosa, propôs ação de cobrança em face de Fernando. A ação foi distribuída no dia 04 de outubro de 2018. Citado, Fernando apresentou contestação. Após, os autos foram conclusos. Então, de ofício, sem qualquer alegação do réu Fernando, o magistrado constatou a ocorrência da prescrição da pretensão do autor e prolatou sentença julgando improcedente o pedido, nos termos do artigo 487, II, do Código de Processo Civil. Pergunta-se a) A r. sentença violou o princípio do contraditório? É possível a prolação de decisão sem que seja ouvida a parte contrária? b) A competência é determinada em qual momento? c) João é pessoa idosa, então, o foro do seu domicílio tem competência absoluta para processar e julgar a ação proposta?
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RESPOSTAS a) Sim. Em primeiro lugar, deve-se dizer que o princípio do contraditório está previsto no artigo 5º, LV, da Constituição Federal. Com efeito, “o princípio do contraditório é reflexo do princípio democrático na estruturação do processo. Democracia é a participação, e a participação no processo opera-se pela efetivação da garantia do contraditório” DIDIER Jr., Fredie, curso de processo civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento, 19ª edição, Salvador: Ed. Juspodivm, 2017, pag. 91). Por seu turno, o artigo 10 do CPC estabelece que o juiz não poderá decidir com base em fundamento a qual não se tenha dado as partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria que deva decidir de ofício. Com efeito, apesar da prescrição ser matéria de ordem pública, podendo ser reconhecido em qualquer grau de jurisdição, o magistrado não pode decidir sem ouvir as partes e oportunizar as suas manifestações sobre o tema. Ademais, no caso de prescrição e decadência, nos termos do artigo 487, parágrafo único, não serão reconhecidas sem que antes as partes apresentem manifestação. Contudo, como se sabe, há determinadas situações, decorrente da própria urgência da demanda ou das características, em que o contraditório seria ineficaz ou acarretaria gravames à parte. Pensando nessas situações, o legislador, no artigo 9º, parágrafo único, trouxe exceções, diferindo o contraditório a momento futuro: Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica: I - à tutela provisória de urgência; II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III; III - à decisão prevista no art. 701.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo a) Nos termos do artigo 43 do CPC, a competência é determinada no momento do registro ou da distribuição da petição inicial. Art. 43. Determina-se a competência no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.
b) Não. O artigo 53, III, “e”, do CPC estabelece que a competência será o domicílio do idoso quando a ação versar sobre direitos previstos no Estatuto do Idoso. No caso da pergunta, não se trata de bem tutelado por essa legislação, devendo ser proposta no foro do domicílio do réu, como regra geral.
Cooperação internacional Quanto a cooperação internacional, quais podem ser seus objetos e quais suas formas? A cooperação internacional está prevista entre os artigos 26 e 41 do CPC. Nos termos do artigo 27 do CPC, a cooperação internacional terá por objeto a citação, intimação e notificação judicial e extrajudicial; colheita de provas e obtenção de informações; homologação e cumprimento de decisão; concessão de medida judicial de urgência; assistência jurídica internacional; e qualquer outra medida judicial ou extrajudicial não proibida pela lei brasileira. Ademais, essa cooperação se dá de três formas: auxílio direto, carta rogatória e homologação de sentença estrangeira. O auxílio direto será cabível “quando a medida não decorrer diretamente de decisão de autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de delibação no Brasil.” (art. 28). A carta rogatória “serve como forma de cooperação entre jurisdições de países (Estados) diferentes, sendo dirigida da autoridade judiciária brasileira à autoridade judiciária estrangeira, para que esta pratique o ato, em território estrangeiro (carta rogatória ativa); ou da autoridade estrangeira para a brasileira, para que, no território nacional, seja praticado ato necessária à jurisdição estrangeira (carta rogatória passiva). (Novo código de processo civil – CPC para concursos: doutrina, jurisprudência e questões de concurso, coordenador Fredie Didier, 6ª edição, Salvador: Juspodivm, 2016, pág. 70). Já a homologação da sentença estrangeira é prevista no artigo 960 e seguintes do CPC. Sobre o tema, merece ser transcrito a seguinte lição:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A forma de tratamento da decisão estrangeira junto ao ordenamento jurídico brasileiro varia conforme o seu conteúdo, daí porque, em se tratando de decisão não definitiva, o STJ se limitará à concessão do exequatur nas cartas rogatórias, ao passo que, em se tratando de decisão definitiva, com encerramento do feito, dar-se-á sua homologação (Novo código de processo civil – CPC para concursos: doutrina, jurisprudência e questões de concurso, coordenador Fredie Didier, 6ª edição, Salvador: Juspodivm, 2016, pág. 73)
QUESTÃO-TREINO Herança e competência John, músico, morava em São Paulo e foi vítima de um tiro perdido e faleceu. Deixou como herança, dois imóveis. Um na cidade de Salvador, Estado da Bahia, e outro na cidade do Rio de Janeiro. Pergunta-se qual o foro competente para processar seu inventário, partilha ou disposições de última vontade?
Nos termos do artigo 48 do CPC, o foro competente será o do domicílio de John. Estabelece esse artigo: Art. 48. O foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, é o competente para o inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade, a impugnação ou anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro. (destacamos).
Chamamos a atenção para a parte final do texto, que afirma que se o autor da herança (pessoa falecida) tiver domicílio no Brasil aqui será processado seu inventário, mesmo que venha a falecer em outro país.
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Já o parágrafo único do artigo traz as regras subsidiárias, em caso da pessoa falecida não possuir domicílio certo, quais sejam a competência será do foro da situação dos bens imóveis; na hipótese de haver imóveis em foros diferentes, qualquer deles será competente, e, por fim, caso a pessoa não deixe imóveis, será o foro do local de qualquer dos seus bens. QUESTÃO-TREINO Divórcio e competência Luis Gustavo pretende se divorciar de Maria Illma. Dessa relação, surgiu Fernando, que possui atualmente 8 anos e está sob guarda de sua mãe. Pergunta-se qual o foro competente para processar a ação de divórcio do casal?
O artigo 53, I, CPC estabelece que nas ações de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável, o foro competente, em primeiro lugar, será do domicílio do guardião de filho incapaz, no caso da questão, portanto, o domicílio competente será o de Maria Ilma. Não por ser mulher, mas sim porque possui a guarda de Fernando. Aqui cabe uma observação importante. O CPC/73, no seu artigo 100, I, estabelecia para as ações semelhantes ao artigo 53, I, o foro da mulher como competente. Ou seja, nas ações de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável deveriam ser processadas no foro da mulher. Esse dispositivo, na vigência do antigo código, era muito criticado pela doutrina, que restou satisfeita com a nova mudança:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo No CPC/1973, o critério definidor da competência era o do domicílio da mulher (art. 100, I, CPC/1973). Isso desaparece. Primeiro porque, de maneira geral buscou-se dar tratamento isonômico ao casal: não há mais razão para essa distinção, privilegiando-se a mulher em detrimento do homem. Além disso, e talvez o fator mais importante para essa mudança, seja a percepção de que as uniões (e, consequentemente, eventuais rupturas) há tempos deixaram de estar limitadas ao binômio homem-mulher. As uniões homoafetivas são uma realidade, reconhecidas tanto no âmbito do direito material, quanto (por exemplo, nesse ponto) também agora no processual. (Temas essenciais do novo cpc, análise das principais alterações do sistema processual civil brasileiro de acordo com a Lei 13.256/2016, coord. Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Arruva Alvim Wambier, pag. 63) Agora, caso não haja filho incapaz, a competência será do último domicílio do casal. Caso nenhum deles residam nesse domicílio, o foro competente será a regra geral, qual seja, domicílio do réu. QUESTÃO-TREINO Margarida EIRELI, com sede na comarca de Fernandópolis, realizou contrato de prestação de serviço com a empresa de publicidade Descolados Ltda, com sede na comarca de Santo Anastácio. Nesse contrato constava cláusula expressa elegendo como foro de eleição a comarca da Capital, São Paulo. Pergunta-se: a) O juiz pode reconhecer a abusividade da cláusula de eleição de foro mesmo que não seja contrato de adesão? b) A abusividade da cláusula pode ser reconhecida a qualquer momento?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A eleição de foro especial está prevista no artigo 63 do CPC. Essa cláusula só produzirá efeito quando constar de instrumento escrito e referir-se expressamente a determinado negócio jurídico. Dito isso, vamos responder as questões. a) Sim. Trata-se de importante mudança trazida pelo CPC/15. Anteriormente, no CPC/73, o juiz só era autorizado a reconhecer a abusividade da cláusula em contrato de adesão. Agora, o CPC/15 não restringe o controle da eleição de foro ao contrato de adesão. Contudo, o juiz somente pode realizar esse controle de abusividade até a citação, nos termos do parágrafo terceiro do artigo 63. b) Como parcialmente respondido no item anterior, o juiz poderá realizar o controle de abusividade até a citação do réu. Após sua citação, o demandado tem que suscitar a abusividade da cláusula na sua contestação, caso contrário, haverá preclusão e a prorrogação da competência.
Partes e Procuradores e responsabilidade no Processo Civil QUESTÃO-TREINO Sobre a responsabilidade das partes por dano processual no Código de Processo Civil de 2015, responda: a) Quais as sanções aplicáveis ao litigante de má-fé? b) É necessária a comprovação do dano (prejuízo) para que haja a condenação ao pagamento da indenização e aplicação da multa previstas no artigo 81 do CPP?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo R: a) Responde por perdas e danos no processo civil aquele que litigar de má-fé como autor, réu ou interveniente139. Nos termos do artigo 81 do CPC, caracterizada a litigância de má-fé140, o juiz condenará a parte a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento, do valor corrigido da causa; a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. b) Não. Segundo entendimento firmado pelo STJ, o dano processual não é pressuposto para a aplicação da multa por litigância e má-fé141. Do mesmo modo, não obstante o caráter reparatório da indenização prevista no artigo 81 do CPC, não se exige a comprovação do prejuízo para que ela seja fixada 142. Para esta Corte, dentre outros argumentos, a comprovação do prejuízo é demasiadamente dificultosa, e sua exigência inviabilizaria a aplicação dessas sanções, comprometendo sua eficácia.
QUESTÃO-TREINO A incapacidade processual deve ser suprida, em algumas situações, pela designação de um representante processual ad hoc, denominado curador especial. Sobre o tema, responda: É possível que o Ministério Público exerça, simultaneamente, as funções de custos legis e de curador especial no processo de interdição?
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Art. 79 do CPC/2015 Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI - provocar incidente manifestamente infundado; VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório. 141 STJ. 3ª Turma. REsp 1.628.065-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. p/acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 21/2/2017 (Info 601) (Fonte: Dizer o Direito) 142 STJ. Corte Especial. EREsp 1.133.262-ES, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/6/2015 (Info 565) (Fonte: Dizer o Direito). 140
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R: Não. O atual sistema jurídico brasileiro não mais permite a possibilidade de o Ministério Público exercer, concomitantemente, as funções de fiscal da ordem jurídica e de curador especial em processos de interdição. Segundo o recente entendimento firmado pelo STJ, a função de custos legis é a de fiscalizar a estrita aplicação da lei, o que não necessariamente se compatibiliza com o interesse pessoal do interditando. Consequentemente, a cumulação de funções pelo Ministério Público pode levar à prevalência de uma das funções em detrimento da outra143. Nestes casos, diante da existência de previsão expressa acerca necessidade de participação do Ministério Público como fiscal da ordem jurídica (Art. 752§1º do CPC144), cabe à Defensoria Pública atuar em favor dos interesses do interditando.
Ministério Público e Processo Civil Determinado banco ajuizou ação de reintegração de posse contra Rogéria Casanova, pedindo que o imóvel onde ela reside com seus dois filhos menores fosse desocupado, já que ela não teria pago as prestações do financiamento realizado. O juiz julgou o pedido procedente, tendo ocorrido a reintegração. O Ministério Público alegou que houve a nulidade do processo, considerando que o feito envolveria interesse de incapazes (pessoas menores de 18 anos) e não houve intimação do Parquet para atuar como fiscal da ordem jurídica. O pedido do MP deve ser aceito?
143Fontes:http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/N
ot%C3%ADcias/N%C3%A3o-compete-ao-Minist%C3%A9rio-P%C3%BAblico-afun%C3%A7%C3%A3o-de-curadoria-especial-de-interditando (Acesso em set/18) https://www.conjur.com.br/2017-out-20/mp-nao-competencia-curador-especial-interditando (Acesso em set/18). 144 Art. 752. Dentro do prazo de 15 (quinze) dias contado da entrevista, o interditando poderá impugnar o pedido. § 1o O Ministério Público intervirá como fiscal da ordem jurídica.
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O Ministério Público é instituição pública autônoma, permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, nos termos do que dispõe o artigo 127 da Constituição Federal. Trata-se do grande defensor dos interesses do conjunto da sociedade brasileira, atuando na defesa do interesse público, conduzindo-se com isenção em todas as demandas. No que tange à sua atuação no âmbito do Código de Processo Civil, intervirá, além de outras hipóteses previstas em Lei e na Constituição Federal, quando houver interesse de incapaz. A ausência de intimação do Ministério Público para acompanhar os feitos em que deveria intervir ensejará a nulidade do processo. Tal nulidade somente poderá ser decretada após a intimação do Ministério Público, que se manifestará sobre a existência ou inexistência de prejuízo. Não obstante, neste caso, não se vislumbra hipótese de intervenção obrigatória do Ministério Público. O fato de Rogéria residir com seus filhos menores no imóvel não torna, por si só, obrigatória a intervenção do Ministério Público na aludida ação de reintegração. Com efeito, o que legitima a intervenção do Ministério Público nas causas em que houver interesse de incapazes é a possibilidade de desequilíbrio da relação jurídica e eventual comprometimento do contraditório em função da existência de parte absoluta ou relativamente incapaz. Nesses casos, caberá ao Ministério Público aferir se os interesses do incapaz estão sendo assegurados e respeitados a contento, seja do ponto de vista processual ou material. Na hipótese em tela, a ação de reintegração de posse foi ajuizada tão somente contra a genitora dos menores, não veiculando, portanto, pretensão em desfavor dos incapazes. A simples possibilidade de os filhos virem a ser atingidos pelas consequências fáticas oriundas da ação de reintegração de posse não justifica a intervenção do MP no processo como custos legis. O STJ entendeu que o interesse dos menores na causa é meramente reflexo. Não são partes ou intervenientes no processo, tampouco compuseram qualquer relação negocial. Se a tese do MP fosse aceita, ele deveria intervir em toda e qualquer ação judicial relacionada a imóveis em que residem crianças ou adolescentes, o que seria um desvirtuamento da sua missão constitucional. A ausência de intimação do Ministério Público para acompanhar os feitos em que deveria intervir ensejará a nulidade do processo. Tal nulidade somente poderá ser decretada após a intimação do Ministério Público, que se manifestará sobre a existência ou inexistência de prejuízo. Importante salientar, por fim, que o Ministério Público, quando intervier na condição de fiscal da ordem jurídica, terá vista dos autos depois das partes, poderá produzir provas, requerer medidas processuais e, inclusive, recorrer das decisões, ainda que não haja recurso dos próprios litigantes. Ademais, em suas manifestações, gozará de prazo em dobro, salvo quando a lei estabelecer, de forma expressa, prazo próprio.
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Legislação relacionada ao tema
Constituição da República, artigo 5, inciso LXXIV Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): artigos 98 a 102 Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1960 (observar artigos revogados) 2)
Sumula 481, do Superior Tribunal de Justiça
Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais 3) Leituras importantes Dizer o direito: “ O autor da ação de usucapião especial urbana goza de presunção absoluta de hipossuficiência para fins de gratuidade da justiça?” (Disponível em:https://www.dizerodireito.com.br/2017/05/o-autor-da-acao-de-usucapiaoespecial.html). “ A pessoa que pediu justiça gratuita e esta foi negada, para que possa recorrer terá que pagar as custas do recurso no momento da interposição?” (https://www.dizerodireito.com.br/2015/08/a-pessoa-que-pediu-justica-gratuitae.html).
QUESTÃO-TREINO O artigo 98, do CPC, dispõe que a pessoa (natural ou jurídica), com insuficiência de recursos para pagar as despesas processuais, as custas e os honorários advocatícios, tem direito à gratuidade da justiça conforme a lei. a) Em qual momento processual poderá ser requerida a gratuidade da justiça? b) Acaso o beneficiário seja vencido na ação, os efeitos da gratuidade da justiça cessarão? Justifique. c) Quando declarada a insuficiência de recursos e requerida a gratuidade da justiça, pode o juiz indeferir o pedido? E no caso de o requerente ser assistido por advogado particular? Justifique. Respostas:
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a) De acordo com o dispositivo legal, o requerimento de gratuidade da justiça poderá ser formulado em qualquer momento processual, ou seja: pelo autor na inicial, pelo réu na contestação, bem como pelo terceiro quando do seu ingresso na ação. Ademais, a parte pode formular o pedido quando da interposição de recurso, bem como por petição simples em outra fase do processo. b) Mesmo sucumbente, o beneficiário será condenado ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, mas a exigibilidade ficará suspensa pelo prazo de cinco anos, a contar do trânsito em julgado. Contudo, se houver alteração da situação econômica do, poderão ser executadas as obrigações decorrentes das verbas de sucumbência antes de decorridos os cinco anos, sob pena de ser extinta tal obrigação. c) No que se refere à pessoa natural que declara a insuficiência de recursos, há presunção de veracidade do alegado, ainda que seja assistido por advogado particular, mas tal presunção é relativa. Assim, ela poderá ser afastada se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos para a concessão. Entretanto, antes mesmo de indeferir, o juízo determinará à parte que comprove os pressupostos. Quanto à pessoa jurídica, não há presunção e deverá haver comprovação cabal da hipossuficiência econômica.
QUESTÃO-TREINO “João” interpôs recurso de apelação contra sentença que o condenou à obrigação de fazer. Embora não tenha requerido em primeira instância, “João” pugnou pela concessão de gratuidade da justiça em segundo grau, deixando de comprovar o recolhimento das despesas processuais. “João” atuou corretamente? Qual a consequência acaso indeferido o pedido?
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Resposta: Sim, “João” atuou corretamente, uma vez que o Código de Processo Civil permite ao recorrente requerer a concessão de gratuidade da justiça na instância recursal e, inclusive, é dispensado de comprovar o recolhimento do preparo. No caso de indeferimento pelo relator, haverá prazo para o recorrente realizar o recolhimento e, se não o fizer, o recurso será julgado deserto.
QUESTÃO-ESTUDO Contra a decisão que concede a gratuidade da justiça à parte poderá haver impugnação pela parte contrária com pedido ao juízo que a revogue. A partir dessa premissa, responda: a) Como é o procedimento da impugnação contra o benefício requerido na inicial? E quando é requerido e deferido em sede recursal? b) Quando o benefício é requerido em outro momento processual, por simples petição, como se processa a impugnação? Haverá suspensão do curso do processo? c) Quais as consequências do deferimento da impugnação, em especial se comprovada a má-fé do beneficiário? Respostas a) Quando a gratuidade da justiça é deferida no limiar da ação, a parte ré deverá impugnar o deferimento em sede de contestação, como preliminar. Em relação ao pedido deferido em sede recursal, deve a parte contrária apresentar a impugnação quando do prazo para as contrarrazões recursais. b) No caso de o benefício ser requerido e deferido em outro momento processual, a impugnação também será realizada por meio de petição simples, no prazo de 15 dias, nos próprios autos do processo, sem que ocorra a suspensão do seu curso. c) Acaso o juízo defira a impugnação e revogue o benefício, a parte deverá arcar com as despesas que tiver deixado de adiantar e, em havendo má-fé, arcará com até o décuplo da despesa a título de multa. Tal valor será revertido em favor da Fazenda Pública no ente onde se processa a ação e poderá ser inscrita em dívida ativa.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO O artigo 98, do CPC, dispõe que a pessoa (natural ou jurídica), com insuficiência de recursos para pagar as despesas processuais, as custas e os honorários advocatícios, tem direito à gratuidade da justiça conforme a lei. A partir dessa premissa, responda: a) Se o juízo indeferir o pedido de gratuidade da justiça, qual(is) o(s) recurso(s) cabível(is)? b) Sobrevindo o trânsito em julgado da decisão que revoga o benefício, a parte deverá recolher todas as despesas, cujo adiantamento foi dispensado. No caso de a parte não efetuar o recolhimento, qual a consequência processual?
Respostas: a) Se o juízo indeferir a gratuidade antes de proferir a sentença, deverá ser interposto agravo de instrumento no prazo legal. Contudo, se o indeferimento foi decidido na sentença, a parte deverá impugnar por meio de apelação. b) Acaso a parte não recolher as despesas, em virtude da revogação do benefício, o processo será extinto sem resolução do mérito quanto à ação proposta pelo autor. Em relação aos demais casos, não haverá a realização de qualquer diligência ou ato processual enquanto a parte não recolher o valor das despesas. QUESTÃO-TREINO Antes da entrada em vigor no CPC/2015, o argentino Dieguito, residente em Buenos Aires, propôs ação de cobrança no Brasil. Para tanto, Dieguito pleiteou a concessão da gratuidade da justiça sob o fundamento de insuficiência de recursos para pagar as despesas processuais. Contudo, o juízo negou o pedido em virtude de ele não residir no Brasil, com esteio, à época, no artigo 2º, da Lei nº 1060/50: “Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho.” Dieguito não se conformou com o indeferimento e recorreu. Antes que o Tribunal de Justiça
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo decidisse acerca da questão, o CPC/2015 entrou em vigor. a) Conforme caso hipotético acima, poderá o Tribunal de Justiça conceder a gratuidade da justiça? b) Cabe a concessão da gratuidade da justiça à pessoa jurídica estrangeira?
Respostas: a) Sim, poderá o Tribunal de Justiça conceder ao recorrente a gratuidade da justiça. A lei n 1060/50, especificamente o seu artigo 2, limitava o benefício ao estrangeiro apenas quando residente do Brasil. Ocorre que o CPC de 2015 revogou vários artigos, inclusive o citado artigo o2, de modo que passou a cuidar da matéria e, assim, prevê que o direito à gratuidade da justiça cabe a toda pessoa natural, brasileira ou estrangeira. Neste último caso, o não residente no Brasil também poderá obter a gratuidade da justiça, como informou o Superior Tribunal de Justiça em julgado recente. b) A gratuidade da justiça poderá ser concedida à pessoa natural ou jurídica, incluindo-se a estrangeira. Contudo, quando se trata de pessoa jurídica, não há presunção da hipossuficiência econômica, a qual deverá ser comprovada para o deferimento do benefício.
BREVES COMENTÁRIOS:
1. Sobre a gratuidade da justiça a estrangeiro não residentes no Brasil: A gratuidade da justiça passou a poder ser concedida a estrangeiro não residente no Brasil após a entrada em vigor do CPC/2015. STJ. Corte Especial. Pet 9.815-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 622). RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA INDEFERIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS - PESSOA ESTRANGEIRA RESIDENTE NO EXTERIOR - ART.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 2º, LEI 1.060/50 REVOGADO PELO NOVO CPC - NORMA PROCESSUAL APLICAÇÃO IMEDIATA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Hipótese: Trata-se de pedido de concessão do benefício da justiça gratuita por estrangeiro residente no exterior, o qual fora negado pelas instâncias ordinárias ao fundamento de que se trata de pessoa estrangeira não residente no país. 1. O artigo 2º da Lei 1.060/50 fora revogado pelo Novo Código de Processo Civil, cuja matéria passou a ser disciplinada no artigo 98 do CPC/2015, in verbis: "A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei." 1.1. Trata-se de norma de direito processual, portanto, a sua incidência é imediata, aplicando-se aos processos em curso, consoante dispõe o artigo 14 do CPC/2015. 2. Em que pese à época da apreciação da matéria pelo Tribunal de piso, a legislação em vigor não prever a possibilidade de concessão da assistência judiciária ao estrangeiro residente no exterior, com a vigência das novas regras processuais passou-se a admitir tal hipótese. 2.1. O caput do artigo 98 do Código de Processo Civil vigente ampliou o rol dos sujeitos que podem ser beneficiados pela concessão da assistência judiciária, em relação ao disposto no revogado artigo 2º da Lei 1.060/50. Portanto, não há qualquer impeditivo legal à pessoa estrangeira residente no exterior de postular a assistência judiciária gratuita e ter deu pedido apreciado pelo juízo. 2.2. A análise dos demais requisitos exigidos pela legislação para obtenção do benefício devem ser aferidos pelas instâncias ordinárias, visto que o presente apelo fora proposto nos autos de agravo de instrumento. 3. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (STJ. 4ª Turma. REsp 1225854/RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 25/10/2016.)
2. importante saber diferenciar assistência judiciária integral e gratuita e gratuidade da justiça. No site “Dizer o Direito” foi apresentado um quadro sinóptico a respeito145: I – Assistência jurídica integral e gratuita Fornecimento pelo Estado de orientação e defesa jurídica, de forma integral e gratuita, a ser prestada pela Defensoria Pública, em todos os graus, aos necessitados (art. 134 da CF). Regulada pela Lei Complementar 80/94.
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II – Gratuidade da justiça (Assistência Judiciária Gratuita – AJG). Isenção das despesas que forem necessárias para que a pessoa necessitada possa defender seus interesses em um processo judicial. Era regulada pela Lei nº 1.060/50, mas o CPC/2015 passou a tratar sobre o tema, revogando quase toda essa lei.
Disponível em: https://www.dizerodireito.com.br/2018/05/possibilidade-de-concessao-de.html.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Denunciação da Lide
QUESTÃO-TREINO Clóvis Antônio, comprador do espaço para churrascos “Da Jovem” perto do MASP, é réu em uma ação reintegração de posse promovida por Brunão Borja. Bruno tem razão. O imóvel lhe pertencia, de fato. Ocorre que, Clóvis comprou o imóvel de Michel, da “Morada Corretora de Imóveis Ltda.”, celebrando contrato válido e de boa-fé, e não deseja arcar com os efeitos da evicção. Com base no problema, responda: a) Qual o instituto processual cabível para que Clóvis não sofra os efeitos da evicção? b) Se não utilizar tal instituto, caberá outra alternativa? c) Supondo-se que, Michel, da Corretora, havia adquirido regular e legalmente o imóvel, de outra corretora, que, por sua vez, não poderia alienar o bem, qual a alternativa processual que Michel poderá utilizar?
Respostas: a) Clóvis Anthony poderá utilizar a denunciação da lide, prevista no art. 125 do Novo Código de Processo Civil. b) Sim. A denunciação da lide não é obrigatória, e, mesmo que sofra os efeitos da evicção, posteriormente Clóvis poderá intentar ação regressiva, se for o caso. c) Michel, da corretora, caso tenha direito contra o terceiro que lhe vendeu irregularmente o imóvel, poderá utilizar, também, a denunciação da lide. A denunciação da lide sucessiva é cabível, mas apenas uma vez.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Ação de Usucapião QUESTÃO-TREINO Em junho de 2018, Fábio, maior e capaz, residente e possuidor do imóvel X há 03 anos, cuja metragem é de 100 metros quadrados e também proprietário do imóvel Y localizado em zona rural, ajuíza ação de reconhecimento de usucapião do segundo imóvel frente a Ana, sua excompanheira, maior e capaz, argumentando que a mesma teria abandonado o lar, pleiteando o domínio integral do mesmo, já que exerce posse sobre o mesmo há mais de 2 anos. Em sede de contestação, Ana reconhece o abandono do lar há mais de 2 anos, porém, argumenta que a usucapião não pode ser deferida, já que Fabio é proprietário de outro imóvel. O juiz abre vista para o Promotor de Justiça se manifestar. Qual deve ser o teor da manifestação a ser formulada pelo Ministério Público?
Resposta: O Ministério Público deve alegar que com o advento do novo CPC, não há mais necessidade de intervenção do Ministério Público na lide em questão. Na sistemática anterior a intervenção do Ministério Público era obrigatória nas ações de usucapião nos termos do art. 944 do CPC de 1973. Com o advento do NCPC, tal dispositivo não foi reproduzido, logo a intervenção passa a ser relevante apenas se houver enquadramento em algum outro dispositivo legal. No caso presente como os interesses em litigio são disponíveis e não há interesse de incapaz, totalmente despicienda a intervenção ministerial. Não há, igualmente, interesse social apto a justificar a intervenção, pois a matéria não se encontra dentre as de intervenção obrigatória conforme a recomendação 34/2016.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Métodos de resolução consensual
QUESTÃO-TREINO Autocomposição João Silvestre, advogado, cadastrado como conciliador e mediador no Juízo de Araraquara, participou de tentativa de soluçao consensual de conflito entre vizinhos em litígio que restou infrutífera. Ajuizada ação de indenização por uma das partes, João Silvestre foi arrolado com testemunha do Juízo para prestar depoimento sob o caso em questão, em razão do vínculo anterior com as partes. A) Agiu corretamente o Magistrado? Fundamente de acordo com os princípios aplicados à autocomposição. B) Os Advogados podem funcionar como mediadores e conciliadores? Há alguma restrição legal?
Resposta: a) O conciliador e mediador não pode servir como testemunha no caso em apreço. Um dos princípios da conciliação e da mediação é o da confidencialidade (artigo 166), de modo que há vedação expressa para que conciliadores e mediadores deponham sobre os fatos oriundos de seus prévios trabalhos. ( Art. 166, parágrafo 2º, NCPC) b) Sim, os advogados podem atuar como mediadores ou conciliadores. No entanto, os conciliadores e mediadores judiciais cadastrados, estarão impedidos de exercer a advocacia nos juízos em que desempenhem suas funções. (Art. 167§ 5o, NCPC).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Quanto às invalidades processuais, responda: a) Qual a diferença entre invalidade relativa e absoluta? b) Princípios que regem as invalidades processuais?
Em ambas, há inobservância de forma prescrita em lei. A diferença precípua é que, na absoluta, a forma terá sido imposta em observância ao interesse público, e na relativa, aos das próprias partes. Além disso, a nulidade absoluta pode ser decretada de ofício e a qualquer tempo; já a relativa deve ser alegada pela parte interessada na primeira oportunidade que tenha para falar no processo. Causalidade: todos os atos que dependem do ato inválido também serão; instrumentalidade das formas: se o meio atingiu a finalidade não será invalidado; interesse: parte que deu causa à nulidade não pode se aproveitar dela; economia processual; prejuízo: de pas de nullite sans grief; eventualidade ou preclusão; convalidação: somente haverá nulidade se não for possível convalidar o ato; Processo de Execução e cumprimento de sentença
1) Leis relacionadas ao tema Código de Processo Civil (artigos 520 a 538 e 771 a 925) 2) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores Súmula 27/STJ - Pode a execução fundar-se em mais de um título extrajudicial relativos ao mesmo negócio.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Súmula 46/STJ - Na execução por carta, os embargos do devedor serão decididos no juízo deprecante, salvo se versarem unicamente vícios ou defeitos da penhora, avaliação ou alienação dos bens. Súmula 84/STJ - É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro. Súmula 134/STJ - Embora intimado da penhora em imóvel do casal, o cônjuge do executado pode opor embargos de terceiro para defesa de sua meação. Súmula 195/STJ - Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores. Súmula 196/STJ - Ao executado que, citado por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para apresentação de embargos. Súmula 199/S|TJ - Na execução hipotecária de crédito vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação, nos termos da Lei n. 5.741/71, a petição inicial deve ser instruída com, pelo menos, dois avisos de cobrança. Súmula 205/STJ - A Lei 8.009/90 (Lei do bem de família) aplica-se a penhora realizada antes de sua vigência. Súmula 233/STJ - O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título executivo. Súmula 239/STJ -O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis. Súmula 268/STJ - O fiador que não integrou a relação processual na ação de despejo não responde pela execução do julgado. Súmula 279/STJ - É cabível execução por título extrajudicial contra a Fazenda Pública (Aliás, agora o CPC regulamentou). Súmula 300/STJ - O instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial. Súmula 309/STJ - O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo. Súmula 317/STJ - É definitiva a execução de título extrajudicial, ainda que pendente apelação contra sentença que julgue improcedentes os embargos. Súmula 319/STJ - O encargo de depositário de bens penhorados pode ser expressamente recusado.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Súmula 328/STJ - Na execução contra instituição financeira, é penhorável o numerário disponível, excluídas as reservas bancárias mantidas no Banco Central. Súmula 364/STJ - O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas. Súmula 375/STJ - O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. Súmula 410/STJ - A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Súmula 417/STJ - Na execução civil, a penhora de dinheiro na ordem de nomeação de bens não tem caráter absoluto. Súmula 452/STJ - A extinção das ações de pequeno valor é faculdade da Administração Federal, vedada a atuação judicial de ofício. Súmula 478/STJ - Na execução de crédito relativo a cotas condominiais, este tem preferência sobre o hipotecário. Súmula 486/STJ - É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família. Súmula 487/STJ - O parágrafo único do art. 741 do CPC não se aplica às sentenças transitadas em julgado em data anterior à da sua vigência (diz respeito ao atual artigo 525, CPC, cujos §§ 12 e 13 regulamentaram a questão). Súmula 559/STJ - Em ações de execução fiscal, é desnecessária a instrução da petição inicial com o demonstrativo de cálculo do débito, por tratar-se de requisito não previsto no art. 6º da Lei n. 6.830/1980. Súmula 150/STF - Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação. Súmula 228/STF - Não é provisória a execução na pendência de recurso extraordinário, ou de agravo destinado a fazê-lo admitir.
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Informativos
TESE STF - A execução provisória de obrigação de fazer em face da Fazenda Pública não atrai o regime constitucional dos precatórios. Dessa forma, é
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo possível a execução provisória contra a Fazenda Pública, por exemplo, no caso de obrigação de instituir pensão por morte para dependente de ex-servidor. TESE STF - É válida a penhora em bens de pessoa jurídica de direito privado, realizada anteriormente à sucessão desta pela União, não devendo a execução prosseguir mediante precatório. TESE STJ - É possível, em sede de execução de alimentos, a dedução na pensão alimentícia fixada exclusivamente em pecúnia das despesas pagas "in natura", com o consentimento do credor, referentes a aluguel, condomínio e IPTU do imóvel onde residia o exequente. Vale ressaltar que a regra geral é a incompensabilidade da dívida alimentar (art. 1.707 do CC) e eventual compensação deve ser analisada caso a caso, devendo-se examinar se houve o consentimento, ainda que tácito, do credor, e se o pagamento in natura foi destinado, efetivamente, ao atendimento de necessidade essencial do alimentado e não se configurou como mera liberalidade do alimentante. TESE STJ - É possível a aplicação imediata do art. 528, § 7º, do CPC/2015 em execução de alimentos iniciada e processada, em parte, na vigência do CPC/1973. A regra apenas incorpora ao direito positivo o conteúdo da préexistente Súmula 309/STJ (o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo), tratando-se, assim, de pseudonovidade normativa que não impede a aplicação imediata da nova legislação processual, como determinam os arts. 14 e 1.046 do CPC/2015. TESE STJ - Em regra, o prazo para cumprimento voluntário da sentença é de 15 dias úteis (art. 523 do CPC). Se os devedores forem litisconsortes com diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, este prazo de pagamento deverá ser contado em dobro (30 dias), nos termos do art. 229 do CPC/2015, desde que o processo seja físico. TESE STJ - A execução de título extrajudicial por inadimplemento de mensalidades escolares de filhos do casal pode ser redirecionada ao outro consorte, ainda que não esteja nominado nos instrumentos contratuais que deram origem à dívida, porque existe solidariedade legal do casal quanto às despesas com a educação do filho (arts. 1.643 e 1.644 do CC). TESE STJ - Se a parte exequente manifestar desinteresse na adjudicação e na alienação particular do imóvel penhorado, ela poderá, desde logo, requerer sua alienação em leilão judicial (antiga alienação em hasta pública). O CPC confere ao credor a escolha. TESE STJ - Havendo meios executivos mais adequados e igualmente eficazes para a satisfação da dívida alimentar dos avós, é admissível a conversão da execução para o rito da penhora e expropriação, afastando-se o decreto prisional
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo TESE STJ - A pequena propriedade rural é impenhorável (art. 5º, XXVI, da CF/88 e o art. 833, VIII, do CPC) mesmo que a dívida executada não seja oriunda da atividade produtiva do imóvel e mesmo que o imóvel não sirva de moradia ao executado e à sua família. Basta que seja enquadrado como pequena propriedade rural, nos termos definidos pela lei e seja trabalhado pela família. TESE STJ - Dentro do sistema de execução, a fiança bancária e o seguro garantia judicial produzem os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro para fins de garantir o juízo, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida. TESE STJ – É possível a conversão do procedimento de execução para entrega de coisa incerta para execução por quantia certa na hipótese em que o produto perseguido for entregue com atraso, gerando danos ao credor da obrigação. TESE STJ - Se forem penhorados valores que estão depositados em contacorrente conjunta solidária, o cotitular da conta, que não tenha relação com a penhora, pode tentar provar que a totalidade do dinheiro objeto da constrição pertencia a ele. Se conseguir fazer isso, o numerário será integralmente liberado. TESE STJ - não é mais imprescindível, para acertamento de cálculos, a juntada de documentos pela parte executada ou por terceiros, reputando-se correta a conta apresentada pelo exequente, quando a requisição judicial de tais documentos deixar de ser atendida, injustificadamente, depois de transcorrido o prazo legal. Por essa razão, incide o lapso prescricional, pelo prazo respectivo da demanda de conhecimento (Súmula 150/STF), sem interrupção ou suspensão, não se podendo invocar qualquer demora na diligência para obtenção de fichas financeiras ou outros documentos perante a administração ou junto a terceiros. TESE STJ - Na execução de alimentos pelo rito do art. 528 do CPC/2015, o executado pode comprovar a impossibilidade de pagamento por meio de prova testemunhal, desde que a oitiva ocorra no tríduo previsto para a justificação. TESE STJ - Em execução de alimentos pelo rito do art. 528 do CPC, o acolhimento da justificativa da impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações alimentícias executadas desautoriza a decretação da prisão do devedor, mas não acarreta a extinção da execução. Se o juiz acolher a justificativa do executado, ele deverá intimar o credor para que ele informe se deseja: i) desistir da execução; ii) suspender a execução que foi proposta pelo rito do art. 528 aguardando para ver se a situação econômica do devedor se modifica; ou iii) mudar o rito da execução para o do art. 523, que não prevê prisão civil, mas apenas medidas patrimoniais, como a penhora e expropriação de bens. TESE STJ - Arrematado bem imóvel, o Juízo da execução que conduziu a arrematação não pode determinar o cancelamento automático de constrições determinadas por outros Juízos de mesma hierarquia e registradas na matrícula
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo do bem, mesmo que o edital de praça e o auto de arrematação tenham sido silentes quanto à existência dos referidos gravames. Além de o Juízo da execução não deter competência para o desfazimento ou cancelamento de constrições e registros determinados por outros Juízos de mesma hierarquia, os titulares dos direitos decorrentes das decisões judiciais proferidas em outros processos ("credores") têm direito ao devido processo legal, com contraditório e ampla defesa a fim de manterem o bem vinculado a seus interesses. As possíveis falhas nos atos judiciais que antecederam a arrematação, porque não mencionavam as outras constrições de outros Juízos sobre o imóvel a ser arrematado, não possibilitam ao Juízo da arrematação determinar a baixa das constrições. TESE STJ - Em execução de título extrajudicial, o credor deve ser intimado para opor fato impeditivo à incidência da prescrição intercorrente antes de sua decretação de ofício. TESE STJ - A multa por ato atentatório à dignidade da Justiça, prevista no art. 774, IV, do CPC 2015, somente pode ser aplicada no processo de execução, em caso de conduta de deslealdade processual praticada pelo executado. TESE STJ - A genitora possui legitimidade para prosseguir na execução de alimentos proposta na época em que tinha a guarda do filho com o objetivo de ser ressarcida pelas prestações pretéritas. TESE STJ - Em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, o termo inicial para a contagem do prazo de 15 dias para o oferecimento de resposta pelo devedor fiduciante é a data de juntada aos autos do mandado de citação devidamente cumprido (e não a data da execução da medida liminar). O mandado de busca e apreensão/citação veicula, simultaneamente, a comunicação ao devedor acerca da retomada do bem alienado fiduciariamente e sua citação, daí decorrendo dois prazos diversos: a) de 5 dias, contados da execução da liminar, para o pagamento da dívida; e b) de 15 dias, a contar da juntada do mandado aos autos, para o oferecimento de resposta.
Breves comentários Considerando a finalidade do presente trabalho no que se refere à abordagem concisa e objetiva de prováveis temas para prova escrita, mostra-se suficiente a leitura dos artigos do texto de lei indicados e das anotações jurisprudenciais aqui listadas.
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QUESTÃO-TREINO Prescrição intercorrente no Processo Civil É possível a ocorrência de prescrição intercorrente nas Execuções em Processo Civil? Se sim, como se dá? Se não, justifique?
Resposta: Sim. O NCPC inovou ao expressamente prever a prescrição intercorrente (o que antes era admitido pela jurisprudência, mas sem previsão legal). Prevê o NCPC que a execução será suspensa se o executivo não possuir bens penhoráveis (NCPC, art. 921, III). Nesse caso, o processo ficará suspenso pelo prazo de 1ano, durante o qual se suspenderá a prescrição (art. 921, § 1°). Após esse prazo, se ainda não existirem bens penhoráveis, o processo será arquivado (art. 921, § 2°). Se forem encontrados bens, haverá o desarquivamento (art. 921, § 3°). Passado o prazo de 1 ano sem manifestação do exequente, então começa a correr o prazo da prescrição intercorrente (art. 921, § 4°). Ocorrido o prazo da prescrição, após oitiva das partes, o juiz poderá, mesmo de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e extinguir o processo (art. 921, §5° e 924, V).
QUESTÃO-TREINO Fraude contra credores e Fraude à Execução Em Processo Civil, no âmbito das execuções ou cumprimento de sentenças, diferencie fraude contra credores e fraude à execução.
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Resposta: Diante da alienação de bens que poderiam ser objeto de penhora, fala-se em fraudes: a) fraude à execução: é a ineficácia de alienação feita pelo devedor após a citação em processo - de conhecimento ou execução -, que possa levá-lo à insolvência (NCPC, art. 792). A Súmula 375 do STJ pacificou que: "O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente': Para ser reconhecida a fraude à execução, não há necessidade de uma nova ação judicial; o reconhecimento será requerido no bojo do processo que já tramita e no qual já houve a citação. Assim, se o réu, citado no processo judicial, alienar seus bens a ponto de ficar sem patrimônio, poderá ser reconhecida a fraude; b) fraude contra credores: é a alienação realizada pelo devedor, que o levará à insolvência, com finalidade de prejudicar o credor em eventual processo judicial (CC, arts. 158 e ss.). Ocorre antes da citação em qualquer processo judicial. Tem como requisitos o eventum damni (dano - reduzir o devedor à insolvência) e o consilium fraudis (fraude - prejudicar o credor). Há necessidade de um processo judicial (ação pauliana), em que serão litisconsortes passivos quem alienou e quem adquiriu o bem. Trata-se de demanda que tramita pelo procedimento comum ordinário, que necessita de prova dos dois requisitos para que seja reconhecida a fraude e o juiz determine que a situação volte ao status quo ante (ou seja, que o bem deixe a esfera do terceiro e volte à do alienante - para que seja possível, no processo oportuno, ser objeto de penhora). Vale destacar que somente há legitimidade do credor quirografário (CC, art. 158) e somente é possível o ajuizamento por quem já era credor quando da alienação (CC, art. 158, § 2°).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO Documento eletrônico como título executivo extrajudicial O artigo 784, inciso III, do CPC aduz que documento particular assinado por duas testemunhas é título executivo extrajudicial. Não se desconhece que, com o avanço da tecnologia, é perfeitamente possível a contratação de mútuo via internet. Referido contrato pode ser considerado Titulo Executivo Extrajudicial?
Resposta: Sim. A despeito do rol do artigo 784 do Código de Processo Civil ser considerado taxativo, a evolução tecnológica fez com que os meios de celebração de negócios deixassem de ser unicamente por meio de papel. Assim, verificada a autenticidade e a presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade do contrato eletrônico. (REsp 1495920/DF, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 07/06/2018)
QUESTÃO-TREINO Execução de débito e legitimidade passiva Priscila, mãe de Fernando, matriculou o menor em escola particular, celebrando com a instituição de ensino contrato de prestação de serviços educacionais. Posteriormente Priscila veio a ter problemas financeiros, que fez com que ela ficasse inadimplente com o colégio por 6 meses. A escola ingressou com execução de título extrajudicial em face de Priscila que, no entanto, não possuía dinheiro e nem bens para saldar o débito. Sabendo que Rodrigo, pai do menor, não figurou como parte no contrato é possível a instituição de ensino dele cobrar o débito?
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Resposta: Sim. Não se desconhece que a legitimidade passiva para cobrar o débito é daquele que se faz presente no título executivo. Todavia, a regra prevista nos artigos 1643 e 1644 do Código Civil determina que o casal responda solidariamente pelas obrigações domésticas em proveito da entidade familiar. A mensalidade escolar inclui-se nesse rol, mormente porque os pais têm o dever legal de garantir o sustento e a educação dos filhos, sendo certo que devem responder solidariamente pelo pagamento desse débito. (REsp 1472316/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/12/2017, DJe 18/12/2017)
15. Recursos no Processo Civil e Processos nos Tribunais QUESTÃO-TREINO Incidente de resolução de demandas repetitivas Após ter sua pretensão negada em 1º grau, “A” interpõe recurso de Apelação. Durante o seu processamento sobrevém decisão determinando o sobrestamento para aguardar o julgamento de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas em recurso paradigma. a) Discorra brevemente sobre o incidente; b) Qual o prazo de suspensão?; c) Em que condições o Ministério Público atua no IRDR?
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Respostas: a) Conhecido como IRDR, o incidente de resolução de demandas repetitivas é um novo meio de resolução de conflitos repetitivos previsto no artigo 976 a 985 do Código de Processo Civil, de competência originária dos Tribunais, que visa evitar o acúmulo desenfreado de processos nas instâncias superiores sobre temas repetitivos. Assim, a multiplicidade de processos repetitivos sobre uma mesma matéria de direito que implique em ofensa à isonomia e à segurança jurídica (artigo 976, incisos I e II, do CPC146) permite a instauração desse incidente que deverá ser suscitado perante o Presidente do Tribunal competente por um dos legitimados (artigo 977 do CPC147). O julgamento se dará por amostragem e, uma vez proferida a decisão, ela se aplicará aos demais casos idênticos (em curso e futuros). b) Uma vez admitido o IRDR, todos os processos ficarão suspensos pelo prazo máximo de 1 (um) ano (prazo para julgamento), salvo por decisão fundamentada do Relator (artigo 980, parágrafo único, do CPC148). Ressalte-se, por oportuno, que a suspensão é limitada aos processos em curso e submetidos à esfera de jurisdição do Tribunal, podendo assumir alcance nacional se a solução do incidente vier a ser objeto de acórdão de mérito proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de recursos extraordinário ou especial. c) O Ministério Público atuará como fiscal da ordem jurídica, podendo, ainda, ser o próprio requerente ou assumir este papel na hipótese de desistência ou
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Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente: I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. 147 Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente de tribunal: I - pelo juiz ou relator, por ofício; II - pelas partes, por petição; III - pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição. Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente. 148 Art. 980. O incidente será julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. Parágrafo único. Superado o prazo previsto no caput, cessa a suspensão dos processos prevista no art. 982, salvo decisão fundamentada do relator em sentido contrário.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo abandono do processo por aquele que o suscitou originariamente, nos termos do artigo 976, §2º do CPC149).
QUESTÃO-TREINO IRDR Em janeiro de 2018 o Conselho Nacional de Justiça divulgou um gráfico indicando os 10 temas com maior número de processos sobrestados no país, de acordo com o Banco Nacional de Demandas Repetitivas e Precedentes Obrigatórios do CNJ. Em primeiro lugar - com 407.280 processos - está o Tema 731 do Superior Tribunal de Justiça, em que é discutida a possibilidade ou não de a TR ser substituída como índice de correção monetária dos saldos das contas vinculadas ao FGTS. A respeito do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), responda às seguintes perguntas: a) Quais são as hipóteses de cabimento da instauração do incidente? b) Quem são os legitimados para pedir a instauração do incidente e a quem é endereçado? c) Em caso de inobservância da tese adotada no incidente em caso futuro que verse sobre idêntica questão de direito que venha a tramitar no território de competência do tribunal, qual é a medida judicial cabível? Por quem poderá ser requerida?
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Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente: (...) § 2o Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Respostas: a) Para o cabimento do IRDR é necessário que haja, simultaneamente, efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito, e risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. (artigo 976 do CPC) b) Podem pedir a instauração do incidente o juiz ou relator; as partes; e o Ministério Público ou a Defensoria Pública, sendo o requerimento dirigido ao presidente do Tribunal. (artigo 977 do CPC) c) A medida judicial cabível é a reclamação, que poderá ser ajuizada pela parte interessada ou pelo Ministério Público. (artigos 985 e 988 do CPC)
Incidente de Assunção de Competência
1) Lei relacionada ao tema
Código de Processo Civil (Arts. 927 e 947).
2) Enunciados FPPC
FPPC 201. Aplicam-se ao incidente de assunção de competência as regras previstas nos arts. 983 e 984. FPPC 202. O órgão colegiado a que se refere o §1º do art. 947 deve atender aos mesmos requisitos previstos pelo art. 978. FPPC 334. Por força da expressão “sem repetição em múltiplos processos”, não cabe o incidente de assunção de competência quando couber julgamento de casos repetitivos. FPPC 467. O Ministério Público deve ser obrigatoriamente intimado no incidente de assunção de competência (g.n.). FPPC 469. A “grande repercussão social”, pressuposto para a instauração do incidente de assunção de competência, abrange, dentre outras, repercussão jurídica, econômica e política. FPPC 600. O incidente de assunção de competência pode ter por objeto a solução de relevante questão de direito material ou processual.
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Breves comentários
O incidente de assunção de competência, previsto no artigo 927 e definido no artigo 947, ambos do Código de Processo Civil, é aquele no “qual um órgão colegiado fracionário superior e de maior composição, indicado pelo regimento interno dentre os responsáveis pela uniformização de jurisprudência (o disposto no art. 978 aplica-se à assunção de competência, conforme diz o Enunciado 202 do FPPC, assume a competência anteriormente atribuída a outro órgão colegiado fracionário do tribunal, para o julgamento de um recurso, de uma remessa necessária ou de uma ação de competência originária. Trata-se de deslocamento da competência de um órgão para outro do mesmo tribunal, sem que ocorra violação ao princípio do juiz natural, pois os critérios para a sua realização são previstos previamente e de forma abstrata”150. Os requisitos do incidente de assunção de competência são: “a. Existência de recurso, remessa necessária ou processo de competência originária m tribunal; b. relevante questão de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou composição de divergência entre órgãos colegiados do tribunal (...); c. grande repercussão social (...); d. ausência de repetição em múltiplos processos”151. Por fim, importante consignar que o procedimento terá início por proposta de redirecionamento do relator, de ofício ou a requerimento da parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública.
QUESTÃO-TREINO Determinado recurso especial que diz respeito a uma relevante questão de direito, com grande repercussão jurídica, econômica e política, mas sem repetição em múltiplos processos, foi distribuído para determinada turma do Superior Tribunal de Justiça. Em razão do interesse social da matéria, a Defensoria Pública requereu o julgamento do recurso por órgão colegiado indicado pelo regimento do tribunal. O pedido foi acolhido, tendo o relator proposto que o julgamento fosse realizado por determinada seção, a qual 150
In. Novo Código de Processo Civil – CPC para concursos: Doutrina, Jurisprudência e questões de concurso / Coordenador Ricardo Didier – 7 ed. Rev. Ampl. e atual. – Salvador: Juspodivm, 2017, p. 1132. 151 Ibidem, p. 1133.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo proferiu acórdão, sem revisão de tese, que passou a vincular todos os juízes e órgãos fracionários. Considerando-se essa situação hipotética, qual o instrumento processual suscitado pela Defensoria Pública e proposto pelo relator do recurso especial? Quais são os requisitos necessários para a utilização desse instrumento? (CESPE – DPE-AL – 2017 – Adaptada).
Resposta: Na situação hipotética mencionada, o instrumento processual suscitado foi o incidente de assunção de competência, o qual é utilizado visando a uniformização de jurisprudência e como forma de impedir divergência sobre o assunto pelos órgãos fracionários. Para que esse instrumento seja utilizado, são necessários os seguintes requisitos: existência de relevante questão de direito; grande repercussão social; inexistência de múltiplos processos; questões não passíveis de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR, Recurso Especial ou Recurso Extraordinário.
Mandado de Segurança QUESTÃO-TREINO Mandado de segurança Carlos é servidor público municipal cuja remuneração é de R$ 6.000,00. Em 03/07/2017, por determinação do Prefeito, a remuneração de Carlos passou a ser de R$ 4.000,00. Referida redução entrou em vigor no mês seguinte. Em 01/03/2018, Carlos impetrou mandado de segurança por meio de seu advogado, perante o Tribunal de Justiça contra o Prefeito, sob o fundamento de inconstitucionalidade da redução salarial. Negada a liminar pelo Tribunal de Justiça, a ação prosseguiu regularmente, sendo, no entanto, o acórdão julgado procedente. A acórdão transitou em julgado em
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo setembro de 2018, de modo que Carlos voltou a receber a remuneração mensal de R$ 6.000,00. Conforme recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o mandado de segurança impetrado pelo advogado de Carlos abrange tanto o período correspondente à data da propositura do mandado de segurança (01/03/2018) à data da efetiva implementação da verba (setembro de 2018), quanto o período da redução salarial (03/07/2017) até a propositura da ação (01/03/2018)? Há necessidade de ajuizamento de alguma outra ação?152
RESPOSTA: Não é necessário o ajuizamento de ação autônoma para cobrar os valores vencidos durante a tramitação do mandado de segurança, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça. Contudo, será preciso a propositura de ação judicial para cobrança dos valores atrasados do período anterior à data da propositura do mandado de segurança. Duas súmulas do Supremo Tribunal Federal justificam a questão: Súmula 269/STF: “O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança”; e Súmula 271/STF: “Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”. O art. 14, §4º, da Lei 12.016/2009 (Lei do Mandado de Segurança) assim determina, verbis: “O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial”. A questão trata, portanto, do termo inicial de produção de efeitos financeiros de sentença concessiva de Segurança. A respeito do tema, julgou recentemente o Superior Tribunal de Justiça: “Segundo a atual e predominante jurisprudência do STJ, os efeitos financeiros, por ocasião da concessão da segurança, devem retroagir à data de sua impetração, devendo os valores pretéritos ser cobrados em ação própria” 152
Questão adaptada do site: https://www.dizerodireito.com.br/2018/08/efeitos-financeiros-daconcessao-de.html. Acesso em 05/10/2018.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1481406/GO, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 17/04/2018). Veja também o seguinte julgado: “(...) 1. Cinge-se a controvérsia a definir o termo inicial de produção de efeitos financeiros de sentença concessiva de Segurança. (...) 4. O legislador fez clara opção por manter a sistemática consolidada nas Súmulas 269/STF ("O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança") e 271/STF ("Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria"). 5. Em que pese a existência de corrente contrária, merece prevalecer a jurisprudência amplamente dominante, em consonância com as Súmulas 269/STF e 271/STF, por se tratar da única forma de preservar a vigência do art. 14, § 4°, da Lei 12.016/2009. (...)” (STJ. Corte Especial. EREsp 1087232/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 07/12/2016).
QUESTÃO-TREINO Mandado de segurança “A”, inconformado com decisão proferida pelo Juiz de Direito da (X) Vara da Fazenda Pública Estadual, impetra Mandado de Segurança no Tribunal de Justiça de São Paulo, cujo mérito foi devidamente apreciado por ocasião do seu julgamento. Pergunta-se: a) qual a natureza jurídica e hipóteses de cabimento do mandado de segurança?; b) em sendo denegatório o v. acórdão, qual o meio de impugnação cabível e o respectivo prazo para sua formalização?
Respostas: a) O mandado de segurança, previsto no artigo 5º, incisos LXIX e LXX da Constituição Federal153, regulamentado pela Lei n° 12.016/2009, é uma ação 153
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo constitucional de natureza civil e residual, que visa tutelar direito líquido e certo, individual ou coletivo, efetivamente lesado ou na iminência de ser lesado por ato de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público, desde que não amparado por habeas corpus ou habeas data. b) Nessa hipótese, o meio de impugnação cabível é o Recurso Ordinário Constitucional, previsto no artigo 105, inciso II, alínea “b”, da Constituição Federal154, que deverá ser interposto no prazo de 15 (quinze) dias perante o Tribunal de origem e cujo julgamento compete ao Superior Tribunal de Justiça.
Processo Civil. Mandado de injunção. QUESTÃO-TREINO Quanto à disciplina do mandado de injunção, detalhada na Lei 13.300/2016, descreva os aspectos determinantes da disciplina legal, no que se refere: a) à legitimidade para o mandado de injunção coletivo; b) às providências passíveis de determinação ao Poder Público; c) aos efeitos da sentença; d) à consequência jurídica no caso em que sobrevenha uma lei regulamentadora do direito em debate num mandado de injunção que esteja tramitando.
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados; 154 Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) II - julgar, em recurso ordinário: (...) b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão;
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Respostas: a) a lei normatizou em detalhe o mandado de injunção coletivo, atribuindo com legitimidade inclusive à Defensoria Pública e ao Ministério Público. Entes federados não têm legitimidade. b) o juízo pode determinar ao Poder competente um prazo para editar a norma; pode estabelecer condições para o ajuizamento de ação pelo titular do direito após o escoamento do prazo; pode, desde já, determinar as condições para o exercício do direito. c) em regra, a sentença terá efeitos “inter partes”. Só haverá efeitos “ultra partes” ou “erga omnes” quando isso for inerente ao direito em discussão. Nada obstante, o relator pode estender os efeitos aos casos análogos, por decisão monocrática. d) a norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos “ex nunc”, salvo se for mais favorável aos beneficiados do que a sentença do mandado de injunção. Se a norma regulamentadora for editada, estará prejudicada a impetração, e o mandado de injunção será extinto.
Habeas Data
I.
HABEAS DATA
i.
Leis relacionadas ao tema: Constituição Federal e Lei nº 9.507/97
ii.
Jurisprudência Sumulada dos Tribunais Superiores
Súmula 2 STJ – "não cabe habeas data se não houver recusa de informações por parte da autoridade administrativa". iii.
Informativos
790 STF – O contribuinte pode ajuizar habeas data para obter seus dados que constam nos sistemas dos órgãos fazendários. Breves Comentários O habeas data é garantia constitucional que tem por objeto a defesa dos direitos fundamentais à privacidade e de acesso à informação, visa assegurar o conhecimento, retificação, complementação de informações pessoais constantes de registros de dados, quando o interessado não preferir fazer por processo sigiloso, judicial ou administrativo.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo O procedimento do habeas data, com caráter civil e sumário, foi disciplinado pela Lei nº 9.507/97. QUESTÕES QUESTÃO-TREINO Uma pessoa jurídica pode impetrar habeas data? É cabível habeas data coletivo?
Resposta: A ação de habeas data é personalíssima e sua tutela é limitada em relação a informações relativas à pessoa do impetrante. A Lei nº 9.507/97 não dispõe sobre a legitimidade ativa, mas tem se admitido o habeas data de forma ampla, inclusive com impetração por pessoa física (nacional ou estrangeira), bem como por pessoa jurídica, privada ou pública, em razão de assegurar direitos fundamentais. Contudo, por se tratar de ação personalíssima, o habeas data coletivo não tem sido admitido.
QUESTÃO-TREINO O Ministério Público possui legitimidade para impetrar habeas data? Pode haver transferência de legitimidade ativa?
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Resposta: A legitimação extraordinária para impetração de habeas data não é pacífica na doutrina, em virtude da ação ser personalíssima. O Superior Tribunal de Justiça decidiu ser parte legítima para impetrar habeas data por terceiros, somente no caso de herdeiros e sucessores do titular das informações, a fim de evitar o uso ilegítimo e indevido dos dados do falecido. Trata-se de hipótese excepcional (STJ – HD 147/DF). Nessa senda, conclui-se não ser possível a legitimação extraordinária, logo, não se admite a impetração de habeas data pelo Ministério Público para a defesa de interesses de terceiros, a ação limita-se a seus interesses.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo 7. Direito da Criança e do Adolescente Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 1990). Princípios e direitos fundamentais. Entidades de atendimento. Medidas de proteção. Família natural. Família substituta. Guarda, tutela e adoção. Apuração de ato infracional atribuído à criança e ao adolescente. Medidas socioeducativas. Medidas pertinentes aos pais ou responsável. Conselho tutelar. Acesso à Justiça. Princípios gerais. Competência. Serviços auxiliares. Da perda e da suspensão do poder familiar: procedimento e recursos. Da destituição da tutela. Colocação em família substituta. Do Ministério Público. Crimes e infrações administrativas. Proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos da Área da Infância e da Juventude.
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Princípios e Direitos Fundamentais
1) Leis relacionadas ao tema
Constituição Federal de 1988 Lei 8.069/90
2) Súmulas dos Tribunais superiores Súmula 265 do STJ: É necessária a oitiva do menor infrator antes de decretarse a regressão da medida socioeducativa. Súmula 338 do STJ: A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas. Súmula 342 do STJ: No procedimento para aplicação de medida socioeducativa, é nula a desistência de outras provas em face da confissão do adolescente. Súmula 383 do STJ: A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicílio do detentor de sua guarda. Súmula 492 do STJ: O ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente. Súmula 500 do STJ: A configuração do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal. Súmula 605 do STJ - A superveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso, inclusive na liberdade assistida, enquanto não atingida a idade de 21 anos. 3) Jurisprudência STJ – recurso especial repetitivo: O MP tem legitimidade ativa para ajuizar ação de alimentos em proveito de criança ou adolescente, independentemente do exercício do poder familiar dos pais, ou de o infante se encontrar nas situações de risco descritas no art. 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ou de quaisquer outros questionamentos acerca da existência ou eficiência da Defensoria Pública na comarca.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo STJ – “é necessária a expedição de alvará judicial para que menores possam participar de programas televisivos na condição de atores ou figurantes e para que possam desempenhar outra atividade assemelhada, ainda que acompanhadas” pelos pais (AgRg no Ag 702.704/RJ)
4) Breves comentários sobre a matéria - direito da criança e do adolescente (prioridade absoluta) dever da família, da sociedade e do Estado = doutrina da proteção integral da criança ou adolescente sujeitos de direitos (pessoas em desenvolvimento). - possuem mais direitos do que os próprios adultos direitos específicos (ex: não trabalho aos menores de 16 anos; inimputabilidade penal; convivência familiar e comunitária). - superior interesse da criança e do adolescente na tomada de qualquer decisão, deve-se observar o melhor interesse do infante (ex: adoção a brasileira - a doutrina da proteção integral surgiu em superação à doutrina da situação irregular (prevista no revogado Código de Menores). Na doutrina da Situação Irregular, o “menor” era objeto da intervenção estatal, ou seja, ele não podia expressar sua opinião, nem participar de qualquer medida, de qualquer ato que fosse praticado; já pela doutrina da Proteção Integral, crianças e adolescentes são consideradas sujeitos de direitos, e isso significa que a criança e o adolescente, têm o direito de serem ouvidas, de participarem do processo (respeitado o grau de desenvolvimento – ex.: adoção).
PRINCÍPIO DA PRIORIDADE ABSOLUTA (Previsão Legal - art. 4 do ECA (e art. 227 da CF). O princípio da prioridade absoluta determina que os direitos das crianças e dos adolescentes devem ser protegidos em primeiro lugar em relação a qualquer outro grupo social.
Princípio da Excepcionalidade: as medidas restritivas de liberdade são excepcionais, sendo aplicadas tão somente quando medidas em meio aberto não forem suficientes à educação. As hipóteses de restrição da liberdade são taxativamente previstas em lei, não admitindo interpretação extensiva. Antes, no Código de Menores, o juiz podia agir de ofício e determinar o abrigamento daquele que estava em situação de risco, agora qualquer medida – acolhimento ou medida socioeducativa, deve seguir procedimentos estabelecidos no ECA.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo P. da Brevidade: a medida privativa de liberdade (internação e semiliberdade) durará o tempo necessário para a educação; acolhimento familiar ou institucional demorará apenas o tempo necessário para retorno da criança e adolescente ao seio familiar ou colocação em família substituta. P. da dignidade da Pessoa Humana: O ECA tutela a privacidade das crianças e adolescentes, sua intimidade e imagem. Privacidade: artigo 100, V – ex.: as ações de guarda, tutela e adoção são sigilosas; Imagem: criança e adolescente não podem ser submetidos a situações constrangedoras – artigo 143, §ú, ECA; Princípio da Participação Popular: (1) Doutrina da Situação Irregular – gestão administrativa e políticas públicas eram autoritárias e centralizadoras; (2) D. Proteção Integral – sociedade participa dos Conselhos de Direitos das Crianças e Adolescentes (Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional), podem sugerir a criação de mais de um Conselho Tutelar na Comarca. O ECA incumbiu aos Municípios boa parte das atribuições pertinentes aos infantes, uma vez que os interesses são melhor atendidos por aquele ente que está mais próximo do sujeito de direito. Princípio Do Melhor Interesse Da Criança: Segundo Antônio Carlos Gomes Costa, o princípio do melhor interesse da criança deve ser compreendido como o fundamento básico de todas as ações direcionadas às crianças e aos adolescentes, sendo que, qualquer orientação ou decisão, envolvendo referido grupo, deve levar em conta o que é melhor e mais adequado para satisfazer suas necessidades e interesses, sobrepondo-se até mesmo aos interesses dos pais, visando assim, a proteção integral dos seus direitos. Princípio da Condição Peculiar De Pessoa Em Desenvolvimento: Este princípio estabelece que a criança e o adolescente estão em desenvolvimento, devendo ter um tratamento diferenciado considerando sua condição peculiar. Dessa forma, possuem todos os direitos de que são detentores os adultos, desde que sejam aplicáveis à sua idade, ao grau de desenvolvimento físico ou mental e à sua capacidade de autonomia e discernimento. Princípio da Convivência Familiar: Segundo esse princípio, toda criança ou adolescente tem o direito de ser criado pela sua própria família, como regra geral e, excepcionalmente, por família substituta. Ressalta-se que tal princípio é reconhecido constitucionalmente e assegurado pelo ECA.
DIREITOS FUNDAMENTAIS - são indisponíveis, pois tutelam não só o indivíduo, como de toda a sociedade = dupla titularidade (ninguém pode dispor do que não é só seu) permite-se que o MP promova ACP para tutela de interesse individual homogêneo. VIDA e SAÚDE
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo - atendimento médico e psicológico à gestante no período pré e perinatal, de modo a evitar o estado puerperal (ECA, art. 8º - incluído pela Lei nº 12.009/2008) o ECA protege a vida intrauterina. Ressalta-se que para garantir o direito à vida e à saúde das crianças e adolescentes necessário se faz proteger a gestante, pois esta é o veículo que garante o nascimento. Dessa forma, através da Lei 13.257/2016, a gestante teve ampliados seus direitos e sua proteção. Ressalta-se que a Lei do SINASE reforçou a garantia de proteção aos filhos de mães que cumprem medidas privativas de liberdade ao prever que devem ser proporcionadas condições adequadas à mãe-adolescente para amamentar seu filho. LIBERDADE, RESPEITO e DIGNIDADE - liberdades (ECA, art. 16): a) ir, vir e ficar nos espaços públicos e coletivos. * toque de recolher: Portaria do Juízo da Infância e Juventude estabelecendo a proibição de ficarem nas ruas desacompanhados após certo horário o art. 149, § 2º, do ECA não permite designações de caráter genérico, o que só pode ser realizado por lei (STJ, HC 207.720) = o juiz pode disciplinar, por portaria, fundamentando caso a caso, a entrada e permanência de criança ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsáveis em estádios, bailes, boates, teatros, etc, sendo vedadas determinações de caráter geral (STJ, REsp 1.292.143/SP). b) opinião e expressão = qualquer decisão que for tomada em seu respeito deve contar com sua opinião. c) participação da vida política = possibilidade de os internos poderem votar.
- o juízo da infância e juventude tem funções judiciais e administrativas: ALVARÁ¹
PORTARIA
+ destina-se à concessão de autorização para que criança ou adolescente entre e permaneça, desacompanhado de seus pais ou responsáveis, dentre outros locais, em estúdios cinematográficos, de teatro, de rádio e de televisão.
+ destina-se a disciplinar atividades que envolvam a participação de crianças e adolescentes, dentre elas, em espetáculos públicos e em certames de beleza.
+ poder de polícia.
+ poder regulamentar.
¹ os programas de televisão têm natureza de espetáculo público, o que impõe a exigência de alvará judicial para que deles participem crianças e adolescentes (ECA, art. 149, II) a presença dos pais não supre a necessidade de alvará
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo para a participação de crianças em espetáculos públicos ou certames de beleza (STJ, AgRg no Ag 537.622/RJ e AgRg no Ag 702.704/RJ). * a expedição de alvará e de portaria, nas situações disciplinadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, deverá ser fundamentada, consoante o caso concreto.
PROFISSIONALIZAÇÃO e PROTEÇÃO NO TRABALHO - os adolescentes possuem os mesmos direitos previdenciários e trabalhistas que os adultos, vedadas normas discriminatórias (ex: salários menores). * direito ao não-trabalho para os menores de 16 anos (o ECA fala em 14 anos), salvo na condição de aprendiz. * proibição do trabalho noturno, insalubre, perigoso ou penoso.
EDUCAÇÃO, CULTURA E DESPORTO - ECA, arts. 53 a 59; CF, art. 208; e LDB. - creche impossibilidade de se alegar a reserva do possível para fins de se escusar ao cumprimento dos direitos da criança e do adolescente (REsp 1.185.474). A reserva do possível não se aplica aos direitos que representam o mínimo existencial. - educação básica + infantil + fundamental = duração de 9 anos, iniciando aos 6 anos de idade (obrigatório e gratuito) + médio = progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio - “o não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente” (ECA, art. 54, § 2º). - geo-referenciamento direito de ter a escolar próximo a sua casa = deve-se interpretar em favor da criança, isto é, pode ela optar por estudar mais longe de casa - melhor interesse da criança (ECA, art. 53, V).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-TREINO No que consiste o chamado “depoimento sem danos”?
DEPOIMENTO SEM DANO: consiste na oitiva judicial de crianças e adolescentes que foram supostamente vítimas de crime contra dignidade sexual por meio de um procedimento especial que consiste em a criança ou adolescente permanecerem em uma sala reservada, o depoimento é colhido por um técnico (psicólogo ou assistente social), que faz as perguntas de forma indireta, por meio de uma conversa em tom informal e gradual, à medida que vai se estabelecendo uma relação de confiança entre ele e a vítima. O juiz, promotor, defensor/advogado, acompanham em tempo real a conversa, por meio de sistema audiovisual, que grava o ato. Evita novo trauma (vitimização secundária – novo dano em razão de reviver os fatos). Esta forma de depoimento pode ser usada no processo ou IP; trata-se de recomendação do CNJ (32/2010). Pode ser realizado como forma de prova antecipada. Devido à importância do tema, o depoimento sem danos foi consagrado pela Lei Federal n. 13.431/2017, que estabeleceu obrigações ao poder público de medidas de assistência e proteção à criança e ao adolescente, seguindo a diretriz da Constituição Federal, que em seu artigo 227 estatui ser dever do Estado (e também da família e da sociedade) assegurar ao infante, com absoluta prioridade, direitos como a vida e a dignidade, além de colocá-lo a salvo de toda forma de violência. Importante novidade albergada pela lei foi a definição das formas peculiares de ouvida de criança ou adolescente acerca da situação de violência (artigo 4º, parágrafo 1º), quais sejam: A) escuta especializada; B) depoimento especial.
Escuta especializada: é o procedimento de entrevista sobre situação de violência com criança ou adolescente perante órgão da rede de proteção, limitado o relato estritamente ao necessário para o cumprimento de sua finalidade (artigo 7º).
Depoimento especial (ou depoimento sem dano): é o procedimento de oitiva de criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo perante autoridade policial ou judiciária (artigo 8º). É realizado de forma multidisciplinar (com auxílio especialmente de assistente social ou psicólogo), permitindo um ambiente menos constrangedor e mais propício para a busca da verdade. Cabe destacar, por fim, a existência de um novo crime tipificado pelo artigo 24 da Lei 13.431/17: Art. 24. Violar sigilo processual, permitindo que depoimento de criança ou adolescente seja assistido por pessoa estranha ao processo, sem autorização judicial e sem o consentimento do depoente ou de seu representante legal. Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Questão-treino Em relação ao direito à educação, responda a seguinte questão: Jorge e Ana são pais da criança Ademar. Descontentes com o ensino oferecido nas redes pública e privada, decidem que não irão matricular o pequeno Ademar na escola, uma vez que Jorge e Ana são pós-doutores em educação e resolvem contratar os melhores professores da cidade para darem aulas particulares ao filho, na residência familiar. À luz do ordenamento jurídico e da jurisprudência, essa decisão dos genitores, escudadas no livre exercício do poder familiar, é permitida?
Resposta: A prática adotada pelo casal Jorge e Ana é denominada pela jurisprudência de “homeschooling”, ou “educação domiciliar”. Trata-se da hipótese em que as crianças não vão para a escola e são educadas pelos pais, em casa. O Conselho Nacional da Educação (CNE) é contra a prática. Em termos legislativos, o Estatuto da Criança e o adolescente estabelece expressamente a obrigação de os pais ou responsáveis matricular seus filhos ou pupilos na regular de ensino (ECA, art. 55). Há, portanto a vedação ao homeschooling (STJ, MS 7407), uma vez que cabe o controle da educação ao poder público. O tema foi objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal em 12/09/2018. Trata-se, portanto, de recentíssima orientação jurisprudencial adotada em sede de repercussão geral, publicada no Informativo n. 915. Devido a importância do tema,
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo transcrevemos trecho extraído do aludido informativo (RE 888815/RS, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 12.9.2018. (RE-888815) Educação domiciliar – 2 O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, ao apreciar o Tema 822 da repercussão geral, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia a legitimidade da educação domiciliar (Informativo 914). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes (redator para o acórdão), no sentido da inexistência de vedação absoluta ao ensino domiciliar, conforme depreendeu da análise dos dispositivos da Constituição Federal (CF) que tratam da família, criança, adolescente e jovem [artigos 226 (1), 227 (2) e 229 (3)] em conjunto com os que cuidam da educação [artigos 205 (4), 206 (5)e 208 (6)]. A CF, apesar de não o prever expressamente, não proíbe o ensino domiciliar. O próprio texto constitucional permite e consagra a coexistência de instituições públicas e privadas como um dos princípios regentes do ensino [art. 206, III (7)]. Estabelece, também, parceria obrigatória entre família e Estado na educação, em seu sentido amplo. Não o faz para criar rivalidade entre eles, e sim a união de esforços para maior efetividade na educação das novas gerações. Em um viés democrático e de proteção à criança, ao adolescente e ao jovem, a solidariedade do dever de educação tem como finalidade precípua a defesa integral dos seus direitos. O Estado não pode abrir mão dessa parceria, nem a família. A Constituição estabelece princípios, preceitos e regras aplicáveis ao ensino, que integra a educação lato sensu. Isso vale para o Estado e para a família. Independentemente do ensino a ser trilhado, o texto exige alguns requisitos inafastáveis: a necessidade de ensino básico obrigatório entre quatro e dezessete anos [art. 208, I (8)]; a existência de núcleo mínimo curricular [art. 210 (9)]; e a observância de convivência familiar e comunitária (art. 227). Aparentemente, a CF veda três das quatro espécies mais conhecidas do ensino domiciliar: a desescolarização radical, a moderada e o ensino domiciliar puro. Isso porque elas afastam completamente o Estado do seu dever de participar da educação, o que não ocorre com a quarta espécie, denominada homeschooling ou ensino domiciliar utilitarista ou por conveniência circunstancial. Essa modalidade pode ser estabelecida pelo Congresso Nacional. Para o redator, o ensino domiciliar carece de regulamentação prévia que firme mecanismos de avaliação e fiscalização, e respeite os mandamentos constitucionais, especialmente o art. 208, § 3º (10). Nesse sentido, é necessário que a lei prescreva o que será a frequência. Diversamente do ensino público
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo regular, essa frequência possui, também, o fim de evitar a evasão, garantir a socialização do indivíduo, além da convivência com a pluralidade de ideias. No entendimento dos ministros Luiz Fux e Ricardo Lewandowski, que negaram provimento ao recurso, a educação domiciliar é incompatível com a Constituição. Para o ministro Luiz Fux, além de inexistir fundamento constitucional, a autonomia da vontade dos pais não pode se sobrepor ao direito da criança de estudar com todas as externalidades positivas que decorrem do ambiente escolar. O ministro Ricardo Lewandowski salientou que o ensino domiciliar não encontra guarida na Constituição, particularmente em face do contido no princípio republicano e no art. 205. Vencidos o ministro Roberto Barroso (relator), que deu provimento ao recurso extraordinário, e, em parte, o ministro Edson Fachin, que o proveu parcialmente. O ministro Roberto Barroso concedeu o direito de a recorrente ser educada em casa, obedecidos os parâmetros fixados em seu voto. O ministro Edson Fachin entendeu legítima a pretensão, mas, em razão de a medida ainda depender do reconhecimento de sua eficácia pelos órgãos oficiais, lançou apelo ao legislador para que discipline sua forma de execução e de fiscalização, no prazo máximo de um ano. (1) CF: “Art. 226 - Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.[...]”. (2) CF: “Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”. (3) CF: “Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. (4) CF: “Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”. (5) CF: “Art. 206 - Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:[...]”. (6) CF: “Art. 208 - Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:[...]”
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo (7) CF: “Art. 206, [...] III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;” (8) CF: “Art. [...] 208, I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria” (9) CF: “Art. 210 - Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.”. (10) CF: “Art. [...] 208, §3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.” RE 888815/RS, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 12.9.2018. (RE-888815)
QUESTÃO-TREINO Com a superação do Código de Menores e o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, a criança deixou de ser considerada um objeto para ser considerada sujeito de direitos, diante da doutrina da proteção integral. Nessa linha de raciocínio, indique a inovação conceitual no âmbito da proteção infantil trazida com a Lei nº 13.257/16, conhecida como Marco Legal da Primeira Infância, apontando sua importância para a concretização dos princípios previstos no ECA.
R: De acordo com a Marco Legal da Primeira Infância, a criança passou a ser reconhecida como “cidadã” (art. 4º, I, V e parágrafo único), o que lhe assegura, ou ao menos visa assegurar e dar efetividade, à prioridade absoluta e ao direcionamento de políticas públicas que abordem diferentes formas de expressão infantil. “Também ganhou espaço a ideia de que a ação pública deve
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo fundamentar-se não no assistencialismo ou na benemerência, mas sim no direito da criança como cidadã.155”
Entidades de atendimento
Entidades de Atendimento
6) Leis relacionadas ao tema Artigos 86 a 102 do Estatuto da Criança e Adolescente Artigo 9º a 17 da Lei do SINASE (Lei nº 12.594/2012)
7) Jurisprudência Sumulada dos Tribunais superiores (Ainda pesquisando)
8) Informativos (Ainda pesquisando)
Breves comentários
A superação da doutrina da situação irregular implicou o surgimento do novo paradigma da proteção integral, cujos pontos básicos podem ser encontrados no art. 227 da Constituição Federal. A doutrina da proteção integral prevê uma série de direitos e ações para a promoção desses direitos, que implica e requer um conjunto articulado de ações por parte do Estado e da sociedade, de que faz parte a “Política da Proteção Especial”. A proteção especial se dá quando há crianças e adolescentes em situação de ofensa à integridade e situação peculiar de pessoas em desenvolvimento.
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Cadernos de Trabalhos e Debates: Avanços do Marco Legal da Primeira Infância, Câmara dos Deputados. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/acamara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-marco-legal-da-primeira-infancia p. 11
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Em alguns casos, surge a necessidade de aplicação de medidas de proteção e socioeducativas, às crianças (só as de proteção) e adolescentes violados ou ameaçados de violação em seus direitos, bem como, aos adolescentes em conflito com a lei em razão do cometimento de ato infracional. A execução eficaz dessas medidas se dá por sistema estruturado de atendimento, de que fazem parte as Entidades de Atendimento. O que caracteriza uma entidade de atendimento? É o regime de atendimento, isto é, as bases éticas, políticas, pedagógicas e operacionais que devem presidir a estruturação dos programas protetivos e socioeducativos do art. 90 do ECA.156
QUESTÃO-TREINO As entidades de atendimento responsáveis pelo planejamento e execução de programas socioeducativos destinados a crianças e adolescentes, em regime de colocação familiar, acolhimento institucional, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, dentre outros. a) Aponte alguns dos princípios que tais entidades devem adotar no desenvolvimento dos programas de acolhimento institucional ou familiar. b) Quais os órgãos responsáveis pela fiscalização de tais entidades?
Resposta:
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Os regimes de atendimento no Estatuto da Criança e do Adolescente. Perspectivas e desafios. Presidência da República. Secretaria especial dos Direitos Humanos. Fonte: http://ens.sinase.sdh.gov.br/ens2/images/Biblioteca/Livros_e_Artigos/material_curso_de_formacao_da _ens/Os%20Regimes%20de%20Atendimemto%20no%20Estatuto%20da%20Crian%C3%A7a%20e%20do %20Adolescente.pdf..
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo A) Dentre outros, nos princípios aplicáveis às entidades que desenvolvam programas de acolhimento familiar ou institucional, estão: a preservação dos vínculos familiares e promoção da reintegração familiar; a integração em família substituta, quando esgotados os recursos de manutenção da família natural ou extensa; atendimento personalizado e em pequenos grupos, o não desmembramento de grupos de irmãos e a preparação gradativa para o desligamento. (Art. 92, incisos I a IX do ECA) B) As entidades de atendimento, governamentais e não-governamentais, serão fiscalizadas pelo Judiciário, pelo Ministério Público e pelos Conselhos Tutelares (Art. 95 do ECA)
Medidas de proteção. Família natural, extensa e substituta. Guarda, tutela e adoção. QUESTÃO-TREINO-ESCREVA! TEMA IMPORTANTE! Adoção Com relação à adoção: a) Aponte a natureza jurídica do instituto, indicando os seus efeitos. b) É possível a adoção de maior de 18 anos? Em caso positivo, considerando que o adotando tenha plena capacidade civil e vínculos socioafetivos com os adotantes, é necessário o consentimento do genitor biológico que o abandonou? Justifique, à luz do entendimento jurisprudencial consagrado. c) Júlio mantém relacionamento amoroso com Marta, grávida de relacionamento anterior. Advindo o nascimento de criança, Gabriela, Júlio providencia o registro da infante em seu nome, tendo pleno conhecimento da ausência de vínculo biológico e incorrendo na chamada “adoção à brasileira”. Muitos anos depois, desentende-se com Marta, rompe com ela o relacionamento afetivo e ajuíza ação almejando a desconstituição da parentalidade em relação à Gabriela, sob argumento de não ser o seu pai biológico e que o registro espontâneo atentou contra a verdade real e se deu por mera indulgência. Deve ser acolhido o pleito de Júlio? Justifique, com amparo no atual entendimento jurisprudencial. d) Em que consiste a “adoção intuitu personae” e em que hipóteses vem ela sendo admitida pela jurisprudência?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Respostas: a) A adoção é uma modalidade de colocação em família substituta regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (notadamente, o art. 39 e seguintes), consistindo em ato jurídico pelo qual adotando e adotantes constituem entre si um vínculo de parentalidade-filiação, independentemente de qualquer liame biológico, de maneira irrevogável e irretratável. Ou seja, a pessoa adotada tornase filha dos adotantes para todos os fins, inclusive, patrimoniais e sucessórios, vedada qualquer discriminação em relação aos filhos não adotivos (art. 226, §6º, CF/88). Da mesma forma, são estabelecidos vínculos de parentesco do adotado com as famílias dos adotantes. Com relação ao(s) genitor(es) original(is)/consanguíneo(s), como regra, a adoção implica rompimento do vínculo de parentalidade-filiação, por conseguinte, extingue o poder familiar, subsistindo apenas os impedimentos matrimoniais em relação aos genitores originais e familiares respectivos, por razões de ordem biológica (art. 41, caput, do ECA). Todavia, há de ser ressalvada a adoção unilateral, situação em que um cônjuge adota o filho unilateral do outro, que não perde a filiação em relação ao cônjuge genitor, decaindo apenas a parentalidade em relação ao outro genitor biológico (§1º do art. 41, ECA). b) Sim. Admite-se a adoção do maior de 18 anos, que, desde o advento do Código Civil de 2002, exige provimento judicial, e tem aplicadas “…no que couber, as regras gerais da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente” (art. 1.619 do Código Civil). Sobre a adoção de forma geral, o consentimento expresso dos genitores biológicos é exigido como regra, salvo se estes forem desconhecidos ou tiverem sido destituídos do poder familiar (art. 45, caput e §1º, do ECA). Todavia, com relação aos adotandos maiores, tal requisito é dispensado. À luz do entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, “o exercício da autonomia da vontade do maior de dezoito anos não depende mais do consentimento de seus pais ou de seu representante legal”; ademais, o art. 48 do mesmo Estatuto assegura ao maior de 18 anos o direito de conhecer a sua origem genética, de forma que, por interpretação teleológica, entendeu-se que também tem direito à constituição de novos liames de parentalidade-filiação sem consentimento dos pais biológicos (REsp 1.444.747DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 17/3/2015, DJe 23/3/2015). Ou seja, havendo vínculo socioafetivo entre adotando maior e adotantes, e configurado abandono pelo pai biológico, desnecessário é o consentimento deste para a adoção, mesmo que não tenha sido destituído do poder familiar durante a infância ou adolescência do filho. c) Não. O pleito de Júlio não deve ser acolhido. Para se chegar a essa resposta, três circunstâncias devem ser consideradas:
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
findou-se o relacionamento com a genitora biológica, o que não repercute no estado de filiação da prole, independentemente de qualquer vínculo biológico entre pai e filha;
houve presumida consolidação de vínculo socioafetivo, considerando o decorrer dos “vários anos” desde o nascimento, período no qual houve relacionamento afetivo com a genitora da infante;
Júlio voluntariamente registrou como sua filha sabidamente de outrem, sem se submeter ao procedimento para habilitação e inserção em cadastro de adoção, a chamada “adoção à brasileira”, inclusive, incorrendo em tese na prática de crime (art. 242, CP), mas nenhum vício de consentimento eivou sua conduta, de modo que, pela proibição do comportamento contraditório, não pode agora pretender beneficiar-se da ilegalidade a que deu causa.
Diante dessas circunstâncias, deve ser mantido o vínculo paterno-filial, conforme entendimento da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 709.608/MS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 05/11/2009, DJe 23/11/2009; REsp 1613641/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 29/05/2017).
QUESTÃO-ESTUDO Adoção internacional O casal Mirna e Vladimir, brasileiros domiciliados no exterior, deseja adotar uma criança brasileira no Brasil. a) Se efetivada, a adoção por Mirna e Vladimir configurará uma adoção internacional? Em que medida a situação do casal difere da de estrangeiro(s) interessado(s) em adotar uma criança brasileira? b) Aponte, sinteticamente, os requisitos da adoção internacional. c) Suponha que Mirna e Vladimir tenham adotado criança estrangeira no próprio país em que estão domiciliados, que não ratificou a Convenção de Haia de 1993, e almejem a recepção do ato no Brasil. Como devem proceder? E se o país houvesse ratificado a mencionada Convenção?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo a) Sim, consistirá o ato em uma adoção internacional, ainda que os adotantes sejam brasileiros, sendo suficiente que os postulantes sejam residentes ou domiciliados fora do Brasil, em outros dizeres, que o país de acolhida da criança ou adolescente não seja o Brasil (art. 51, caput, ECA). Ademais, a nacionalidade brasileira confere a Mirna e Vladimir preferência em relação a estrangeiros interessados, conforme o §2º do mesmo art. 51 do ECA. b) A adoção internacional tem por requisitos (art. 51, §1º, ECA):
Necessidade de colocação do infante em família substituta, comprovado o esgotamento das possibilidades de manutenção da filiação original, inclusive, mediante atribuição da guarda ou tutela a outrem que não os pais;
Esgotamento de todas as possibilidades de colocação do infante em família adotiva “brasileira” (leia-se, residente em território nacional), “com a comprovação, certificada nos autos, da inexistência de adotantes habilitados residentes no Brasil com perfil compatível com a criança ou adolescente”, após consulta a cadastros referidos no ECA;
No caso do adolescente, que seja consultado sobre a adoção por meio de equipe interdisciplinar, e demonstre, na medida de seu grau de discernimento, que está preparado para a medida.
c) Pelo fato de o país estrangeiro não ter ratificado a Convenção de Haia de 1993, para lograrem obter a recepção da adoção no Brasil, Mirna e Vladimir necessitam pleitear a homologação da respectiva sentença pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 52-B, §2º, do ECA). Se o país estrangeiro houvesse ratificado a mencionada Convenção, a recepção da adoção no Brasil seria automática com o reingresso no país, desde que, no procedimento de adoção, as Autoridades Centrais daquele país e do Brasil estivessem de acordo em que se prosseguisse com a adoção (art. 17, alínea “c” da referida Convenção); caso contrário, ainda seria necessária a homologação da sentença pelo STJ (art. 52B, §1º, do ECA).157
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DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Medidas de proteção
1- Dispositivos legais Artigos 19 a 52-D do Estatuto da Criança e do Adolescente
Breves comentários Nos últimos anos o Estatuto da Criança e do Adolescente sofreu inúmeras mudanças, que devem receber a atenção dos candidatos. As questões trazidas abaixo trazem as principais mudanças que vocês devem ficar atentos.
SUPERQUESTÃO-TREINO Acolhimento institucional FRIDA criança de 8 anos de idade, está em acolhimento institucional porque seus pais estão cumprindo pena pelo cometimento de crime e não possui qualquer outro parente, seja da família natural ou extensa. Diante desse cenário, pergunta-se: a) qual o prazo máximo que FRIDA poderá ficar em programa de acolhimento institucional? Há alguma exceção a esse prazo?
b) qual o prazo de reavaliação do acolhimento institucional?
c) FRIDA possui direito de convivência com seus pais, mesmo ela estando em acolhimento institucional e eles, em cumprimento de pena?
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo d) a condenação criminal dos pais implica a perda da sua responsabilidade parental?
e) É possível que a mãe de FRIDA queira manter seu nascimento em sigilo?
RESPOSTAS a) Segundo o artigo 19, §2º, do ECA, estabelece-se como prazo máximo para o acolhimento, 18 meses. Anteriormente esse prazo era de 2 anos. Com a entrada da Lei 13.509/17 o prazo foi modificado. Observo que não é correto falar 1 ano e meio, pois o texto legal expressamente diz 18 meses. Assim, caso sejam indagados, escrevam 18 meses. O próprio dispositivo prevê a possibilidade de extensão desse prazo caso seja comprovada a necessidade que atenda ao interesse da criança ou adolescente, desde que devidamente fundamentada pela autoridade judicial. b) o artigo 19, §1º, determina que a reavaliação da situação da criança e adolescente inseridos em programa de acolhimento institucional deve ser, no máximo, a cada 3 meses. Anteriormente, o prazo máximo era a cada 6 meses. c) Sim, nos termos do §4º do artigo 19, a criança e adolescente em acolhimento institucional tem o direito de convivência com seus pais que estão em situação de cárcere. In verbis: “§ 4o Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial.” d) Trata-se de mudança legislativa novíssima. A lei 13.715/18 modificou a redação do artigo 23, §2º, do ECA, nos seguintes termos: § 2º A condenação criminal do pai ou da mãe não implicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese de condenação por crime doloso sujeito à pena de reclusão contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar ou contra filho, filha ou outro descendente. Aproveito a oportunidade e trago a informação que essa mesma lei acrescentou parágrafo único no artigo 1.628 do Código Civil: Perderá também por ato judicial o poder familiar aquele que: I – praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar: a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher; b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão; II – praticar contra filho, filha ou outro descendente: a)
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher; b) estupro, estupro de vulnerável ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão.” e) Sim. É possível. No artigo 19-A, §9º, do ECA. §9o. É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei. SUPERQUESTÃO-TREINO Acolhimento institucional Sabendo que Hannah está em acolhimento institucional, Pergunta-se: a) Ela pode participar do programa de apadrinhamento afetivo?
b) quais os requisitos para adolescentes e crianças fazem parte desse programa?
c) Quais os requisitos para ser padrinho ou madrinha de uma criança?
d) Pessoa jurídica posse ser padrinho de uma criança ou adolescente?
RESPOSTAS a) Sim. Somente as crianças e adolescentes que estão em programa de acolhimento institucional ou familiar poderão participar de programa de apadrinhamento afetivo. O parágrafo primeiro do artigo 19-B traz a definição
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo legal de apadrinhamento, nos seguintes termos: “§ 1o O apadrinhamento consiste em estabelecer e proporcionar à criança e ao adolescente vínculos externos à instituição para fins de convivência familiar e comunitária e colaboração com o seu desenvolvimento nos aspectos social, moral, físico, cognitivo, educacional e financeiro.” b) Como dito no item anterior, o apadrinhamento visa proporcionar a criação de vínculos externos às instituições de convivência familiar ou comunitária. Assim, terão prioridade para participar desse programa aquelas crianças e adolescentes que têm remotas possibilidades de reinserção familiar ou adotadas, conforme estabelece o parágrafo quarto do mesmo artigo 19-B. c) Nos termos do parágrafo segundo do artigo 19-B, os padrinhos ou madrinhas deverão ser maiores de 18 anos, não inscritos nos cadastros de adoção e cumprir os requisitos exigidos pelo programa de apadrinhamento de que fazem partes. d) Sim. A lei expressamente garante que pessoa jurídica pode participar do programa de apadrinhamento. SUPERQUESTÃO-TREINO Adoção Sobre adoção, pergunta-se: a) É possível revogação da adoção unilateral?
b) É possível a adoção do neto pelos seus avós?
c) É possível adoção post mortem mesmo que não iniciado o procedimento formal enquanto vivo?
d) Dois irmãos pode adotar conjuntamente?
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e) A ordem cronológica do cadastro o cadastro de adotantes é de observância obrigatória? Há exceções?
RESPOSTAS a) Em regra, não, nos termos do artigo 39, §1º, ECA: “§ 1o A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei.” Contudo, em caso excepcional, o STJ relativizou esse artigo, quando a revogação da adoção unilateral for melhor para o adotando: PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO UNILATERAL. REVOGAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. A adoção unilateral, ou adoção por cônjuge, é espécie do gênero adoção, que se distingue das demais, principalmente pela ausência de ruptura total entre o adotado e os pais biológicos, porquanto um deles permanece exercendo o Poder Familiar sobre o menor, que será, após a adoção, compartilhado com o cônjuge adotante. 2. Nesse tipo de adoção, que ocorre quando um dos ascendentes biológicos faleceu, foi destituído do Poder Familiar, ou é desconhecido, não há consulta ao grupo familiar estendido do ascendente ausente, cabendo tão-só ao cônjuge supérstite decidir sobre a conveniência, ou não, da adoção do filho pelo seu novo cônjuge/companheiro. 3. Embora não se olvide haver inúmeras adoções dessa natureza positivas, mormente quando há ascendente - usualmente o pai - desconhecidos, a adoção unilateral feita após o óbito de ascendente, com o conseqüente rompimento formal entre o adotado e parte de seu ramo biológico, por vezes, impõe demasiado sacrifício ao adotado. 4. Diante desse cenário, e sabendo-se que a norma que proíbe a revogação da adoção é, indisfarçavelmente, de proteção ao menor adotado, não pode esse comando legal ser usado em descompasso com seus fins teleológicos, devendo se ponderar sobre o acerto de sua utilização, quando reconhecidamente prejudique o adotado. 5. Na hipótese sob exame, a desvinculação legal entre o adotado e o ramo familiar de seu pai biológico, não teve o condão de romper os laços familiares preexistentes, colocando o adotado em um limbo familiar, no qual convivia intimamente com os parentes de seu pai biológico, mas estava atado, legalmente, ao núcleo familiar de seu pai adotivo. 6. Nessas circunstâncias, e em outras correlatas, deve preponderar o melhor interesse da criança e do adolescente, que tem o peso principiológico necessário
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo para impedir a aplicação de regramento claramente desfavorável ao adotado - in casu, a vedação da revogação da adoção - cancelando-se, assim, a adoção unilateral anteriormente estabelecida. 7. Recurso provido para para, desde já permitir ao recorrente o restabelecimento do seu vínculo paterno-biológico, cancelando-se, para todos os efeitos legais, o deferimento do pedido de adoção feito em relação ao recorrente. (REsp 1545959/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/06/2017, DJe 01/08/2017) b) Em um caso excepcionalíssimo, o STJ concedeu a possibilidade dos avós adotarem os netos, que merece ser lembrado: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ADOÇÃO C/C DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR MOVIDA PELOS ASCENDENTES QUE JÁ EXERCIAM A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. SENTENÇA E ACÓRDÃO ESTADUAL PELA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. MÃE BIOLÓGICA ADOTADA AOS OITO ANOS DE IDADE GRÁVIDA DO ADOTANDO. ALEGAÇÃO DE NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. SUPOSTA VIOLAÇÃO DOS ARTS. 39, § 1º, 41, CAPUT, 42, §§ 1º E 43, TODOS DA LEI N.º 8.069/90, BEM COMO DO ART. 267, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA. DISCUSSÃO CENTRADA NA VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 42, § 1º, DO ECA. COMANDO QUE NÃO MERECE APLICAÇÃO POR DESCUIDAR DA REALIDADE FÁTICA DOS AUTOS. PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DA GARANTIA DO MELHOR INTERESSE DO MENOR. ART. 6º DO ECA. INCIDÊNCIA. INTERPRETAÇÃO DA NORMA FEITA PELO JUIZ NO CASO CONCRETO. POSSIBILIDADE. ADOÇÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. 1. Ausentes os vícios do art. 535, do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. 2. As estruturas familiares estão em constante mutação e para se lidar com elas não bastam somente as leis. É necessário buscar subsídios em diversas áreas, levando-se em conta aspectos individuais de cada situação e os direitos de 3ª Geração. 3. Pais que adotaram uma criança de oito anos de idade, já grávida, em razão de abuso sexual sofrido e, por sua tenríssima idade de mãe, passaram a exercer a paternidade socioafetiva de fato do filho dela, nascido quando contava apenas 9 anos de idade. 4. A vedação da adoção de descendente por ascendente, prevista no art. 42, § 1º, do ECA, visou evitar que o instituto fosse indevidamente utilizado com intuitos meramente patrimoniais ou assistenciais, bem como buscou proteger o adotando em relação a eventual "confusão mental e patrimonial" decorrente da "transformação" dos avós em pais. 5. Realidade diversa do quadro dos autos, porque os avós sempre exerceram e ainda exercem a função de pais do menor, caracterizando típica filiação socioafetiva. 6. Observância do art. 6º do ECA: na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo desenvolvimento. 7. Recurso especial não provido. (REsp 1448969/SC, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/10/2014, DJe 03/11/2014) c) É possível adoção post mortem mesmo que não iniciado o procedimento formal enquanto vivo? c) Sim, é possível. O artigo 42, §6º, admite a adoção quando o adote faleça durante o procedimento judicial. O STJ ampliou a abrangência desse artigo, entendendo que se o adotante, ainda quando vido, manifestou de forma inequívoca a vontade de adotar a criança ou adolescente, poderá ocorrer a adoção post mortem, mesmo que ainda não se tenha iniciado o procedimento de adoção. “CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO PÓSTUMA. VALIDADE. ADOÇÃO CONJUNTA. PRESSUPOSTOS. FAMILIA ANAPARENTAL. POSSIBILIDADE. Ação anulatória de adoção post mortem, ajuizada pela União, que tem por escopo principal sustar o pagamento de benefícios previdenciários ao adotado - maior interdito -, na qual aponta a inviabilidade da adoção post mortem sem a demonstração cabal de que o de cujus desejava adotar e, também, a impossibilidade de ser deferido pedido de adoção conjunta a dois irmãos. A redação do art. 42, § 5º, da Lei 8.069/90 - ECA -, renumerado como § 6º pela Lei 12.010/2009, que é um dos dispositivos de lei tidos como violados no recurso especial, alberga a possibilidade de se ocorrer a adoção póstuma na hipótese de óbito do adotante, no curso do procedimento de adoção, e a constatação de que este manifestou, em vida, de forma inequívoca, seu desejo de adotar. Para as adoções post mortem, vigem, como comprovação da inequívoca vontade do de cujus em adotar, as mesmas regras que comprovam a filiação socioafetiva: o tratamento do menor como se filho fosse e o conhecimento público dessa condição. O art. 42, § 2º, do ECA, que trata da adoção conjunta, buscou assegurar ao adotando a inserção em um núcleo familiar no qual pudesse desenvolver relações de afeto, aprender e apreender valores sociais, receber e dar amparo nas horas de dificuldades, entre outras necessidades materiais e imateriais supridas pela família que, nas suas diversas acepções, ainda constitui a base de nossa sociedade. A existência de núcleo familiar estável e a consequente rede de proteção social que podem gerar para o adotando, são os fins colimados pela norma e, sob esse prisma, o conceito de núcleo familiar estável não pode ficar restrito às fórmulas clássicas de família, mas pode, e deve, ser ampliado para abarcar uma noção plena de família, apreendida nas suas bases sociológicas. Restringindo a lei, porém, a adoção conjunta aos que, casados civilmente ou que mantenham união estável, comprovem estabilidade na família, incorre em manifesto descompasso com o fim perseguido pela própria norma, ficando teleologicamente órfã. Fato que ofende o senso comum e reclama atuação do interprete para flexibilizá-la e adequá-la às transformações sociais que dão vulto ao anacronismo do texto de lei. O primado da família socioafetiva tem que romper os ainda existentes liames
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo que atrelam o grupo familiar a uma diversidade de gênero e fins reprodutivos, não em um processo de extrusão, mas sim de evolução, onde as novas situações se acomodam ao lado de tantas outras, já existentes, como possibilidades de grupos familiares. O fim expressamente assentado pelo texto legal - colocação do adotando em família estável - foi plenamente cumprido, pois os irmãos, que viveram sob o mesmo teto, até o óbito de um deles, agiam como família que eram, tanto entre si, como para o então infante, e naquele grupo familiar o adotado se deparou com relações de afeto, construiu - nos limites de suas possibilidades - seus valores sociais, teve amparo nas horas de necessidade físicas e emocionais, em suma, encontrou naqueles que o adotaram, a referência necessária para crescer, desenvolver-se e inserir-se no grupo social que hoje faz parte. Nessa senda, a chamada família anaparental sem a presença de um ascendente -, quando constatado os vínculos subjetivos que remetem à família, merece o reconhecimento e igual status daqueles grupos familiares descritos no art. 42, §2, do ECA. Recurso não provido. (REsp 1217415/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 28/06/2012) d) Pelo texto frio da lei, não seria possível dois irmãos adotarem conjuntamente. Isso porque o artigo 42, §2º, ECA estabelece que a adoção conjunta somente será possível quando os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família, o que, obviamente, não é possível entre irmão. Contudo, o STJ relativizou esse dispositivo para permitir adoção conjunta por irmãos: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO PÓSTUMA. VALIDADE. ADOÇÃO CONJUNTA. PRESSUPOSTOS. FAMILIA ANAPARENTAL. POSSIBILIDADE. Ação anulatória de adoção post mortem, ajuizada pela União, que tem por escopo principal sustar o pagamento de benefícios previdenciários ao adotado - maior interdito -, na qual aponta a inviabilidade da adoção post mortem sem a demonstração cabal de que o de cujus desejava adotar e, também, a impossibilidade de ser deferido pedido de adoção conjunta a dois irmãos. A redação do art. 42, § 5º, da Lei 8.069/90 - ECA -, renumerado como § 6º pela Lei 12.010/2009, que é um dos dispositivos de lei tidos como violados no recurso especial, alberga a possibilidade de se ocorrer a adoção póstuma na hipótese de óbito do adotante, no curso do procedimento de adoção, e a constatação de que este manifestou, em vida, de forma inequívoca, seu desejo de adotar. Para as adoções post mortem, vigem, como comprovação da inequívoca vontade do de cujus em adotar, as mesmas regras que comprovam a filiação socioafetiva: o tratamento do menor como se filho fosse e o conhecimento público dessa condição. O art. 42, § 2º, do ECA, que trata da adoção conjunta, buscou assegurar ao adotando a inserção em um núcleo familiar no qual pudesse desenvolver relações de afeto, aprender e apreender valores sociais, receber e dar amparo nas horas de dificuldades, entre outras necessidades materiais e imateriais supridas pela família que, nas suas diversas acepções, ainda constitui a base de nossa sociedade. A existência de núcleo
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo familiar estável e a consequente rede de proteção social que podem gerar para o adotando, são os fins colimados pela norma e, sob esse prisma, o conceito de núcleo familiar estável não pode ficar restrito às fórmulas clássicas de família, mas pode, e deve ser ampliado para abarcar uma noção plena de família, apreendida nas suas bases sociológicas. Restringindo a lei, porém, a adoção conjunta aos que, casados civilmente ou que mantenham união estável, comprovem estabilidade na família, incorre em manifesto descompasso com o fim perseguido pela própria norma, ficando teleologicamente órfã. Fato que ofende o senso comum e reclama atuação do interprete para flexibilizá-la e adequá-la às transformações sociais que dão vulto ao anacronismo do texto de lei. O primado da família socioafetiva tem que romper os ainda existentes liames que atrelam o grupo familiar a uma diversidade de gênero e fins reprodutivos, não em um processo de extrusão, mas sim de evolução, onde as novas situações se acomodam ao lado de tantas outras, já existentes, como possibilidades de grupos familiares. O fim expressamente assentado pelo texto legal - colocação do adotando em família estável - foi plenamente cumprido, pois os irmãos, que viveram sob o mesmo teto, até o óbito de um deles, agiam como família que eram, tanto entre si, como para o então infante, e naquele grupo familiar o adotado se deparou com relações de afeto, construiu - nos limites de suas possibilidades - seus valores sociais, teve amparo nas horas de necessidade físicas e emocionais, em suma, encontrou naqueles que o adotaram, a referência necessária para crescer, desenvolver-se e inserir-se no grupo social que hoje faz parte. Nessa senda, a chamada família anaparental sem a presença de um ascendente -, quando constatado os vínculos subjetivos que remetem à família, merece o reconhecimento e igual status daqueles grupos familiares descritos no art. 42, §2, do ECA. Recurso não provido. (REsp 1217415/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 28/06/2012) e) As pessoas que têm objetivo de adotar devem ser cadastradas em um cadastro nacional, conforme estabelecido no artigo 50 do ECA. Assim, seguindo a ordem cronológica de habilitação, as pessoas são convocadas segundo a disponibilidade de crianças e adolescentes. Nesse sentindo, é o artigo 197-E do ECA: “Art. 197-E. Deferida a habilitação, o postulante será inscrito nos cadastros referidos no art. 50 desta Lei, sendo a sua convocação para a adoção feita de acordo com ordem cronológica de habilitação e conforme a disponibilidade de crianças ou adolescentes adotáveis.” Contudo, apesar desse artigo, o STJ relativizou a ordem cronológica em um caso específico, com fulcro no parágrafo 1º do artigo 197-E: RECURSO ESPECIAL - ADOÇÃO - CADASTRO DE ADOTANTES RELATIVIDADE - PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO MENOR - VÍNCULO AFETIVO DA MENOR COM CASAL DE ADOTANTES DEVIDAMENTE CADASTRADOS - PERMANÊNCIA DA CRIANÇA POR APROXIMADAMENTE DOIS ANOS, NA SOMATÓRIA DO TEMPO ANTERIOR
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo E DURANTE O PROCESSO - ALBERGAMENTO PROVISÓRIO A SER EVITADO - ARTIGO 197-E, § 1º, DO ECA - PRECEDENTES DESTA CORTE RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1.- A observância do cadastro de adotantes, ou seja, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança, não é absoluta. A regra comporta exceções determinadas pelo princípio do melhor interesse da criança, base de todo o sistema de proteção. Tal hipótese configura-se, por exemplo, quando já formado forte vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que no decorrer do processo judicial. Precedente. 2.- No caso dos autos, a criança hoje com 2 anos e 5 meses, convivia com os recorrentes há um ano quando da concessão da liminar (27.10.2011), permanecendo até os dias atuais. Esse convívio, sem dúvida, tem o condão de estabelecer o vínculo de afetividade da menor com os pais adotivos. 3.- Os Recorrentes, conforme assinalado pelo Acórdão Recorrido, já estavam inscritos no CUIDA - Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo o que, nos termos do artigo 197-E, do ECA, permite concluir que eles estavam devidamente habilitados para a adoção. Além disso, o § 1º, do mesmo dispositivo legal afirma expressamente que "A ordem cronológica das habilitações somente poderá deixar de ser observada pela autoridade judiciária nas hipóteses previstas no § 13 do art. 50 desta Lei, quando comprovado ser essa a melhor solução no interesse do adotando". 4.- Caso em que, ademais, a retirada do menor da companhia do casal com que se encontrava há meses devia ser seguida de permanência em instituição de acolhimento, para somente após, iniciar-se a busca de colocação com outra família, devendo, ao contrário, ser a todo o custo evitada a internação, mesmo que em caráter transitório. 5.- A inobservância da preferência estabelecida no cadastro de adoção competente, portanto, não constitui obstáculo ao deferimento da adoção quando isso refletir no melhor interesse da criança. 6.- alegações preliminar de nulidade rejeitadas. 7.- Recurso Especial provido. (REsp 1347228/SC, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/11/2012, DJe 20/11/2012) QUESTÃO-TREINO Entrega à adoção Joana está grávida de Simone, mas pretende entregá-la para adoção. Pergunta-se a) De quem é a competência para conhecer do interesse de Joana em entregar a filha? b) qual o procedimento a ser adotado pelo juízo? c) É possível a desistência da entrega da criança à adoção?
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RESPOSTAS a) Nos termos do artigo 19-A, a gestante ou mãe que manifestar interesse em entregar o filho para adoção deverá ser encaminhada à Justiça da Infância e Juventude. b) Assim que recebido o pedido, a mãe será ouvida por equipe interprofissional do juízo da infância e juventude, que apresentará relatório ao juiz, considerando, inclusive, eventual efeito do estado gestacional ou puerperal. Diante desse relatório, o magistrado poderá determinar o encaminhado dessa mãe ou gestante à rede pública de saúde e assistência social, se assim desejar. Ato concomitante, haverá por eventuais parentes da família extensa, pelo prazo máximo de 90 dias, improrrogáveis. Ademais, caso não haja genitor ou não havendo família extensa, e persistindo a vontade de entregar o filho, o magistrado extinguirá o poder familiar colocando a criança sob guarda provisória de quem estiver habilitada para adotá-la ou entidade que desenvolva acolhimento familiar ou institucional. Havendo pai ou familiar representante da família extensa e não comparecerem a audiência para confirmar a intenção de exercer o poder familiar ou guarda, o magistrado suspenderá o poder familiar da mãe, e a criança será colocada em guarda provisória de quem esteja habilitado a adotá-la. c) Sim, é possível. Essa possível a manifestação dessa vontade em audiência ou perante equipe interprofissional. Nesse caso, a justiça da infância e juventude determinará o acompanhamento familiar pelo prazo de 180 dias. ECA. Da perda e da suspensão do poder familiar: procedimento e recursos. Da destituição da tutela. Colocação em família substituta.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-ESTUDO Estabeleça os principais aspectos procedimentais previstos no ECA para: a) a perda e suspensão do poder familiar; b) a destituição da tutela; c) a colocação em família substituta. Resposta: a) O procedimento para perda ou suspensão do poder familiar é deflagrado pelo MP ou por pessoa que demonstre legítimo interesse (nesse caso, o MP participará do processo como custos legis). O procedimento é sumário e tem prazo de 120 dias para encerramento. Já na inicial deve haver indicação do rol de testemunhas. Pode haver liminar para suspensão do poder familiar. Com a citação, há um prazo de dez dias para defesa, entretanto, não incide efeito material da revelia, pois o direito em questão é indisponível. Após a realização de estudo social, há a designação de audiência para oitiva dos pais e da criança. Por fim, é prolatada sentença e determinada averbação à margem do registro civil. O recurso adequado é a apelação, que não tem efeito suspensivo. Mencione-se, por fim, que caso o procedimento seja ajuizado pelo Ministério Público, não haverá necessidade de nomeação de curador especial para formalização de defesa da criança. b) A destituição da tutela segue o rito previsto no Código de Processo Civil para a remoção de tutor. O procedimento pode ser iniciado pelo MP ou por legítimo interessado, havendo o prazo de 5 dias para defesa. Havendo necessidade, será designada audiência e, em casos de extrema gravidade, pode haver suspensão da tutela e nomeação de um tutor interino. c) A colocação em família substituta, pelas modalidades de guarda, tutela ou adoção, ocorre quando esgotadas as possibilidades de permanência da criança junto à família extensa. Quando os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos do poder familiar ou então quando eles concordarem com a medida, o procedimento será simplificado, na própria secretaria do juízo da infância, dispensando-se a exigência de advogado. No caso de consentimento dos pais, tal consentimento deve ser confirmado em audiência, na presença do magistrado e do membro do MP, e pode ser retratado até a publicação da sentença. Sempre que possível, a criança/ adolescente é ouvido. Havendo discordância dos pais com relação à medida, o procedimento será litigioso, sendo necessária a defesa técnica e, nesse caso, é recomendável que se decida sobre guarda provisória e convivência no curso do procedimento. Em todos estes procedimentos, a falta de participação ministerial (como parte ou fiscal da lei) gera nulidade absoluta.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo Apuração de ato infracional e medidas socioeducativas QUESTÃO-TREINO
Medida socioeducativa de semiliberdade O que é a medida socioeducativa de semiliberdade? Existe prazo determinado?
Respostas: Nos termos do artigo 120, do ECA, o regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início ou como forma de transição para o meio aberto, havendo possibilidade de realização de atividades externas que prescindirão de autorização judicial. Cuida-se de medida que não comporta prazo determinado.
QUESTÃO-TREINO Adolescente em privação da liberdade e entrevista pessoal O art. 124, do ECA, traz um rol de direitos do adolescente privado de liberdade. Dentre eles está previsto o direito de entrevistar-se pessoalmente com o representante do Ministério Público, bem como entrevistar-se reservadamente com seu defensor. Diante disso responda: O adolescente tem direito à entrevista pessoal com seu defensor antes da audiência de apresentação? Em caso afirmativo, a ausência da entrevista gera alguma consequência?
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Resposta: Sim, o adolescente tem direito a entrevista pessoal com seu defensor antes da audiência de apresentação, sendo certo que a não observância desse direito, se evidenciado prejuízo a defesa importa em nulidade, ante a ofensa ao princípio da ampla defesa. (STJ, 5ª Turma, HC 345. 390/DF)
As medidas de proteção previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente são aplicáveis em quais hipóteses? Resposta: Nos termos do artigo 98, do ECA, as medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável ou em razão de sua conduta.
QUESTÃO-TREINO Ocorrendo as hipóteses do art. 98, do ECA, o Magistrado pode aplicar diversas medidas acerca de proteção. a) Dentre elas, cite três exemplos de medidas de proteção. b) Alguma ou algumas das medidas de proteção possuem caráter excepcional? Explique.
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Respostas: a) As medidas de proteção encontram-se previstas no artigo 101, do ECA. São elas: encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; orientação, apoio e acompanhamento temporários; matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; acolhimento institucional; inclusão em programa de acolhimento familiar e colocação em família substituta. Vale lembrar que o rol do art. 101, do ECA é taxativo. b) Sim. Nos termos do §1º, do art. 101, do ECA, o acolhimento institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e excepcionais. São excepcionais tendo em vista a finalidade de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.
QUESTÃO-TREINO É possível a aplicação de medidas de proteção de ofício pelo Juiz?
Resposta: Sim, com base no artigo 153, do ECA, o juiz da vara da infância e juventude pode determinar, de ofício, providências em favor de adolescente ou criança em situação de risco. REsp STJ – 2ª Turma – RMS – 36949-SP Rel. Min. Humberto Martins, jugado em 13/03/2012.
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo
QUESTÃO-TREINO Ato infracional Tarike, adolescente com 17 anos, foi surpreendido pela polícia com 3 kgs de cocaína, 50 eppendorfs vazios, uma balança de precisão e um caderno com anotações referentes à traficância. Após a lavratura do auto de apreensão em flagrante e a realização de oitiva informal na Promotoria de Justiça, o menor foi internado provisoriamente por 45 dias e liberado após o decurso do referido prazo. Após o regular curso do processo e instrução processual, o Juiz de Direito prolatou sentença "condenando" Fulano pela prática de ato infracional equiparado ao crime do artigo 33 da Lei 11.343/06, aplicando ao adolescente a medida socioeducativa de internação, e fundamentou a imprescindibilidade da segregação de liberdade em virtude hediondez do ato infracional por ele cometido. a) O entendimento do Magistrado está em consonância com o entendimento sumulado do STJ a respeito do tema? Justifique. b) Quais são as três hipóteses excepcionais que autorizam a aplicação da medida socioeducativa de internação previstas no artigo 122 do ECA?
Respostas: Não. De acordo com o enunciado da Súmula 492 do STJ, “o ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente”. NOTA: Observa-se com frequência, na prática, diversas sentenças que aplicam a medida de internação ao adolescente pela prática de tráfico de drogas, valendo-se como único argumento o de que tal ato infracional é muito grave e possui natureza hedionda. O STJ não concorda com este entendimento e tem
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo decidido, reiteradamente, que não é admitida a internação com base unicamente na alegação da gravidade abstrata ou na natureza hedionda do ato infracional perpetrado. O tema revelou-se tão frequente que a Corte decidiu editar a Súmula 492 expondo esta conclusão. Por esse regime, o adolescente fica recolhido na unidade de internação. A internação constitui medida privativa da liberdade e se sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Pode ser permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário. A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. Se o interno completar 21 anos, deverá ser obrigatoriamente liberado, encerrando o regime de internação. Fonte: site Dizer o Direito.
Medidas aplicáveis aos pais ou responsáveis e Conselho Tutelar
QUESTÃO-TREINO Conselho Tutelar O conselheiro tutelar Tadeu recebeu uma denúncia de maus-tratos praticados por Roberto contra suas enteadas, Ana e Maria, respectivamente, com 8 e 10 anos de idade. Soube-se, também que Roberto tomava para si todo o valor da pensão recebida pelas enteadas, bem como os valores provenientes do aluguel de uma casa de praia, deixada pelo falecido pai das crianças. A par destas informações, Tadeu compareceu à escola onde as crianças estudavam e constatou que ambas apresentavam diversas marcas de queimadura pelo corpo e hematomas recentes, bem como relataram abusos sexuais cometidos por Roberto. Tadeu, então, entendeu por bem imediatamente proceder ao acolhimento institucional de Ana e Maria, comunicando a medida à autoridade judiciária, que abriu vista do expediente ao Ministério Público. Pergunta: O conselheiro tutelar Tadeu agiu corretamente? Justifique, com a respectiva fundamentação e indique quais as providências o Ministério Público deve tomar na sequência.
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Resposta: Sim, o conselheiro Tadeu agiu corretamente, pois, não obstante, seja da competência privativa da autoridade judiciária proceder ao afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar, nos termos do artigo 101, § 2º, ECA, em casos excepcionais, quando constatada a falta dos pais (artigo 98, II, ECA), ou em situações extremas, envolvendo violência, opressão ou abuso sexual, poderá o conselho tutelar aplicar esta medida. Preferencialmente a criança ou o adolescente deve ser colocado sob os cuidados da família natural, sob os cuidados de pessoas que com elas possuam laços afetivos, ou, subsidiariamente, encaminhá-los à entidades que desenvolvam programa de acolhimento institucional, comunicando-se incontinenti o fato ao Ministério Público, prestando-lhe informações sobre o motivo de tal conduta e as providências tomadas para a orientação, o apoio e os motivos de tal conduta e as providências tomadas para a orientação, o apoio e a promoção social da família (artigo 136, parágrafo único, ECA), bem como à autoridade Judiciária, em no máximo 24 horas, após o ato (analogia ao artigo 93, ECA). O Ministério Público deverá ajuizar uma ação de destituição do poder familiar, visto que há indícios de que a mãe se mostrou omissa no dever de cuidado de suas filhas (artigos 1.637 e 1.638, CC). A ação para a destituição do poder familiar possui natureza cautelar. Na hipótese de apelação, ou de agravo de instrumento o magistrado, antes de determinar a remessa dos autos à superior instância, proferirá despacho, mantendo ou reformando a decisão, no prazo de cinco dias (artigo 198, VII, ECA).
QUESTÃO-TREINO Dever parental O descumprimento do dever parental de prestar assistência material e afetiva aos filhos produz danos morais? É possível a compensação pecuniária por eventuais danos morais causados aos filhos?
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Resposta: Sim. A jurisprudência tem assinalado à possibilidade de reconhecimento os danos morais e materiais causados pelo abandono dos filhos, o que pode ser reconhecido como um ilícito civil, passível de compensação pecuniária. Neste sentido, a seguinte decisão do STJ: “A omissão voluntária e injustificada do pai quanto ao amparo material do filho gera danos morais, passíveis de compensação pecuniária. Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a condenação em danos morais do pai que deixa de prestar assistência material ao filho. Inicialmente, cabe frisar que o dever de convivência familiar, compreendendo a obrigação dos pais de prestar auxílio afetivo, moral e psíquico aos filhos, além de assistência material, é direito fundamental da criança e do adolescente, consoante se extrai da legislação civil, de matriz constitucional (Constituição Federal, art. 227). Da análise dos artigos 186, 1.566, 1.568, 1.579 do CC/02 e 4º, 18-A e 18-B, 19 e 22 do ECA, extrai-se os pressupostos legais inerentes à responsabilidade civil e ao dever de cuidado para com o menor, necessários à caracterização da conduta comissiva ou omissiva ensejadora do ato ilícito indenizável. Com efeito, o descumprimento voluntário do dever de prestar assistência material, direito fundamental da criança e do adolescente, afeta a integridade física, moral, intelectual e psicológica do filho, em prejuízo do desenvolvimento sadio de sua personalidade e atenta contra a sua dignidade, configurando ilícito civil e, portanto, os danos morais e materiais causados são passíveis de compensação pecuniária. Ressalta-se que – diferentemente da linha adotada pela Terceira Turma desta Corte, por ocasião do julgamento do REsp 1.159.242-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi – a falta de afeto, por si só, não constitui ato ilícito, mas este fica configurado diante do descumprimento do dever jurídico de adequado amparo material. Desse modo, estabelecida a correlação entre a omissão voluntária e injustificada do pai quanto ao amparo material e os danos morais ao filho dali decorrentes, é possível a condenação ao pagamento de reparação por danos morais, com fulcro também no princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88).” (REsp 1.087.561-RS, Rel. Min. Raul Araújo, por unanimidade, julgado em 13/6/2017, DJe 18/8/2017-informativo 609).
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Curso popular de questões para a segunda fase do Concurso de Analista Jurídico do Ministério Público do Estado de São Paulo QUESTÃO-ESTUDO Conselho Tutelar Disserte sobre o Conselho Tutelar.
Resposta: O Conselho Tutelar é órgão municipal, permanente e autônomo, não jurisdicional, que zela pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente (artigo 131, ECA). As atribuições do conselho tutelar estão previstas no artigo 136, ECA, e foi criado com a finalidade de realizar o