P. Coletivo 3.1

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DISCIPLINAS COMPLEMENTARES Direito Processual Coletivo Fernando Gajardoni Aula 03

ROTEIRO DE AULA

2. Objeto da ACP (arts. 1º, 3º e 11 da LACP)

No Brasil, um autor que estudou muito o tema das espécies de tutela, inclusive da divisão entre tutela preventiva e tutela reparatória, é o Prof. Luiz Guilherme Marinoni. O Marinoni explica a diferença entre tutela preventiva e tutela reparatória. a) Tutela preventiva (inibitória e de remoção do ilícito) A tutela preventiva é aquela tutela que quer evitar a ocorrência do ilícito e, consequentemente, do dano. A doutrina aponta a existência de duas espécies de tutela preventiva, quais sejam a tutela inibitória e a tutela de remoção do ilícito. Tutela inibitória: É uma tutela preventiva que evita ou pretende evitar a ocorrência do próprio ilícito. Ela inibe a prática do ilícito. Remoção do ilícito: É aquela que é empregada quando o ilícito já ocorreu, sendo seu objetivo cessar ou minorar o dano. Ex.: Sujeitos começaram a desmatar uma área. Contudo, não desmataram tudo. É ajuizado um pedido de tutela remoção do ilícito para que cesse o desmatamento. Ex.: Sujeitos estão vendendo um medicamento ilicitamente. É ajuizado um pedido de tutela remoção do ilícito para que cesse a venda do medicamento com o recolhimento das amostras que se encontram nas farmácias. b) Tutela reparatória: A tutela reparatória é aquela em que o ilícito e o dano já ocorreram, não sendo possível mais evita-los. O que resta, portanto, é um ressarcimento em virtude do dano. i)

Específica – art. 84 CDC (preferência legal)

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Consiste na reparação do dano in natura, ou seja, restabelecer a situação no status quo ante, como se o ilícito e o dano nunca houvessem sido praticados. Busca-se o próprio bem da vida. Ex.: Se houve o desmatamento da área, a tutela específica é o reflorestamento da área. Ex.: Se houve uma propaganda lesiva ao consumidor, a ideia é fazer uma contrapropaganda instrutiva ao consumidor. ii) Genérica (dano material/moral) É uma tutela que se caracteriza, basicamente, pelo ressarcimento in pecunia. O que vai ser obtido não é mais o próprio bem da vida. Busca-se uma reparação por dano material e moral. Exemplos: Ex.: É possível evitar que seja desmatada uma área de proteção ambiental, ou seja, evitar o ilícito e o dano (tutela preventiva). Mas também é possível, caso o desmatamento já ocorreu, ajuizar uma ação com o objetivo de fazer com que haja um replantio, uma reparação, daquela área ambiental que foi destruída (tutela reparatória). Ex.: Um medicamento estava sendo produzido, distribuído e vendido no Brasil. A ANVISA proibiu a comercialização do medicamento. Assim, é possível o ajuizamento de uma ação para inibir a produção do medicamento (tutela preventiva inibitória), porque quer evitar a ocorrência do ilícito (produção do medicamento). Ao mesmo tempo, é possível uma tutela de remoção do ilícito para tirar de circulação os medicamentos que já estão sendo comercializados. Sem prejuízo, é possível uma tutela reparatória na modalidade ressarcitória, e não específica, vez que as pessoas já tomaram o medicamento, o que não pode ser revertido. No pedido de tutela reparatória ressarcitória, pede-se reparação por danos materiais e morais em favor das vítimas do medicamento que não funciona.

c) Dano moral coletivo Obs. 1: A expressão “dano moral coletivo” é uma expressão equívoca, porque, a rigor, há que se falar em dano moral difuso, dano moral coletivo stricto sensu e dano moral individual homogêneo. A expressão “dano moral coletivo” não representa que existe dano moral apenas na tutela dos direitos coletivos. A expressão “coletiva” aqui é utilizada lato sensu, ou seja, abarca tanto os direitos difusos, direitos coletivos e individuais homogêneos. Obs. 2: O STJ, até hoje, não pacificou a questão do dano moral coletivo. Há, na doutrina e na jurisprudência, grande divergência sobre o tema. i)

Individuais homogêneos (pacífico) É pacífica a jurisprudência dos Tribunais Superiores no sentido de que cabe danos morais pela violação da personalidade e da dignidade das vítimas de um dano individual homogêneo. Ex.: Medicamento que não funciona comercializado. É possível uma ação civil pública para a tutela dos individuais homogêneos consistente na reparação material (prejuízos causados pelo medicamento que não funciona) e moral (reparação à honra e à dignidade daquelas pessoas que fizeram uso do medicamento sem efeito). A dignidade da pessoa é ofendida no momento em que ela recebe um medicamento que não funciona. Ex.: Pessoas que foram enganadas por uma propaganda. Além de terem o direito a receber de volta o dinheiro pago pelo produto adquirido indevidamente, é possível pensar em uma reparação por danos morais, porque elas foram enganadas, o que gera uma ofensa à honra, à dignidade.

ii) Difusos e coletivos (controvertido) 2 www.g7juridico.com.br

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O STJ ainda não pacificou a questão. Existem duas posições diametralmente opostas: 1ª – Não existe dano moral difuso e coletivo 2ª – Sim, existe dano moral difuso e coletivo •

1ª – Não existe dano moral difuso e coletivo: (Resp. 971.844) e (Resp. 821.891) Nesses julgados, entendeu-se que a coletividade difusa e a coletividade coletiva não têm honra nem personalidade. Consequentemente, não há falar em reparação por dano moral, porque, dentro da ideia clássica de dano moral, entende-se que a reparação se dá pela ofensa à honra ou à personalidade.



2ª – Sim, existe dano moral difuso e coletivo: (Resp. 1.057.274) e (Resp. 1.203.573) Nesses julgados, foi pronunciada a ocorrência de dano moral nos difusos e nos coletivos. A ideia é que não se pode interpretar a ocorrência do dano moral à luz do direito civil e daqueles conceitos clássicos de que dano moral só existe nas violações da personalidade. Esses julgados sustentam que se pode falar em dano moral coletivo para sancionar condutas tidas por ilícitas, principalmente naqueles casos em que se objetiva, com a reparação do dano moral, uma finalidade educativa. No primeiro caso (Resp. 1.057.274), a ação pretendia fazer com que o atendimento a cadeirante, gestante e idoso fosse realizado no primeiro andar, e não no segundo. A condenação por danos morais, neste caso, pretendia fazer com que o banco pensasse na acessibilidade quando fosse construir novas agências. No segundo caso (Resp. 1.203.573), a ação coletiva, além da tutela inibitória ou da tutela da remoção do ilícito, contra a cobrança indevida de pacote de serviço, buscou uma indenização à coletividade por conta da referida prática. Entendeu-se que a indenização era necessária para que a empresa de telefonia aprendesse que, se ela praticasse novamente a conduta, seria condenada a outra indenização por dano moral.

Obs.: Não existe posição majoritária no que diz respeito à existência ou não de dano moral difuso e coletivo.

iii) Danos sociais Os civilistas têm apontado que, além do dano material e do dano moral, seria possível pensar em um terceiro tipo de dano, que seria o dano social. O dano social é o dano para punir (caráter punitivo) condutas exemplarmente negativas. Toda vez que o juiz verificar, a pedido do autor, que alguém praticou algo ignóbil, ele poderia, além de fixar o dano material e moral, fixar dano para a sociedade, por conta do comportamento inadequado do demandado. Ex.: Pastor chutou uma escultura de uma santa em rede nacional e disse que aquilo não valia nada. Não se pode ofender a crença alheia. Neste caso, poderia se pensar em um dano social pela prática do pastor. Ex.: Sujeito, em rede nacional, ateou fogo na bandeira do Brasil. Obs.: O dano social tem única e exclusiva finalidade punitiva. Obs.: O dano social serviria, talvez, para resolver o problema dos difusos e coletivos. Como visto, o STJ tem duas posições quanto aos danos morais difusos e coletivos. Se, eventualmente, o STJ pacificar o entendimento de que não tem que existir dano moral difuso e coletivo, prevalecendo aquela primeira posição (a reparação se dá apenas pela ofensa à honra ou à personalidade), existiria a saída/resolução pelo dano social, porque o caráter pedagógico daqueles que admitem dano moral nos difusos e coletivos é alcançado pelo dano social. Obs.: O STJ já pacificou o entendimento no sentido de que o juiz não pode fixar dano social de ofício.

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Obs.: O STJ entendeu que o dano social só pode ser pedido em ação coletiva. O indivíduo não tem legitimidade para pedir dano social.

iv) Destinatários das indenizações. •

Nos individuais homogêneos, em regra, a indenização vai para as vítimas e para os sucessores. Exceção: Art. 100 do CDC.



Nos difusos e coletivos, a indenização vai para o fundo de reparação de bens e direitos lesados (Art. 13 da LACP).



Nos danos sociais, o juiz decide o destino da indenização. Ele pode direcionar ao fundo, santa casa, entidade beneficente etc.

d) Cumulação de pedidos (art. 3º) (STJ, Resp. 652.249 – PR) É pacífico o entendimento de que é possível, na mesma ação civil pública, cumular pedidos na forma do art. 3º. O art. 3º da LACP dispõe sobre a possibilidade de cumulação de pedido de dano moral e material, mas, mais do que isso, ele não apenas permite a cumulação de dano moral e material, mas também permite, na mesma ação civil pública, pedidos de tutela preventiva, de natureza inibitória e de remoção do ilícito, bem como de tutela reparatória, com pedido de dano material e dano moral. Ex.: Um medicamento estava sendo importado e vendido no Brasil. A ANVISA proibiu a comercialização do medicamento. Assim, é possível o ajuizamento de uma ação para proibir a importação do medicamento (tutela preventiva inibitória). Ao mesmo tempo, é possível uma tutela de remoção do ilícito para tirar de circulação os medicamentos que já estão sendo comercializados. Sem prejuízo, é possível uma tutela reparatória na modalidade ressarcitória, e não específica, vez que as pessoas já tomaram o medicamento, o que não pode ser revertido. No pedido de tutela reparatória ressarcitória, pede-se reparação por danos materiais e morais em favor das vítimas do medicamento que não funciona.

e) Proteção ao patrimônio histórico e cultural e tombamento Objeto da ACP (arts. 1º, 3º e 11 da LACP) l - ao meio-ambiente; ll - ao consumidor; III - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo (STJ, Resp. 706.791-PE) VI - por infração da ordem econômica VI - à ordem urbanística VII - à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos. (Incluído pela Lei nº 12.966, de 2014) VIII -ao patrimônio público e social (Incluído pela Lei nº 13.004, de 2014)

Sabido que o tombamento é um atestado administrativo de que determinado bem tem valor artístico, estético, histórico, turístico ou paisagístico. O tombamento é uma restrição administrativa ao exercício da propriedade. Questiona-se: Para proteção por ACP, o bem de valor artístico, estético, histórico, turístico ou paisagístico precisa estar tombado?

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Resposta: É possível o ajuizamento de ação civil pública para proteção de bem de valor artístico, estético, histórico, turístico ou paisagístico ainda que não esteja tombado. Questiona-se: O que muda entre proteger por ação civil pública um bem que esteja tombado e proteger por ação civil pública o patrimônio histórico e cultural que não esteja tombado? Resposta: O que muda é uma questão de ônus da prova. Ambas ações civis públicas são possíveis, de bem tombado e de bem não tombado. A diferença é que, quando o bem for tombado, o autor não precisa provar o valor histórico e cultural, pois já há um atestado administrativo neste sentido. Contudo, quando se tratar de bem não tombado, o autor da ação civil pública, antes de tudo, tem que comprovar que o bem tem valor histórico e cultural para fins de proteção. f)

ACP X ADI e ADC (STJ, Resp. 728.406-DF) A questão já está pacificada, porém, durante muito tempo, houve uma discussão no Brasil se, na ação civil pública, seria possível discutir a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de ato normativo. Existia um medo, na doutrina e em parte da jurisprudência, de se permitir que se discutisse em ação civil pública a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo por conta da previsão do art. 16 da ACP de que a eficácia da sentença é erga omnes. Assim, na visão de alguns, se o juiz da ação civil pública declarasse a inconstitucionalidade de uma lei, como tal declaração teria eficácia erga omnes, a decisão valeria para várias ou para todas as pessoas. Isso implicaria, por via oblíqua/tangencial, usurpação da competência do STF, já que, como é sabido, no modelo constitucional brasileiro, somente o STF tem, com base no art. 102 da CF, competência para declarar a inconstitucionalidade de lei com eficácia erga omnes. Esta visão, todavia, é completamente deturpada, porque a ACP não usurpa a competência do STF tampouco pode fazer o controle abstrato de constitucionalidade da lei. A jurisprudência superior é pacífica em afirmar que: •

quando se tem uma ação de controle de constitucionalidade, sendo as principais a ADI e a ADC, que são privativas do STF, existe um pedido que sempre é a declaração de inconstitucionalidade ou de constitucionalidade, sendo a causa de pedir também a constitucionalidade ou inconstitucionalidade. Notase que as ações de controle abstrato de constitucionalidade têm o mesmo pedido e a mesma causa de pedir. Portanto, o Supremo faz, efetivamente, um controle abstrato, ou seja, ele não analisa um caso concreto. Não há, no âmbito do controle abstrato de constitucionalidade, controle do direito subjetivo. O controle é unicamente do direito objetivo.



quando se tem uma Ação Civil Pública, que, em regra, é em primeiro grau, a causa de pedir é a inconstitucionalidade da lei, mas o pedido é sempre uma providência concreta. Não há, portanto, um pedido abstrato de declaração de inconstitucionalidade, mas sim um provimento concreto em virtude da inconstitucionalidade. Assim, aqui, há controle do direito subjetivo, ligado a um caso concreto.

Ex.: Suponha-se que existe uma Lei Federal que doa, sem nenhum tipo de licitação ou contrapartida, uma área para construção de uma indústria. Um dos legitimados do art. 103 pode entrar com uma ação declaratória de inconstitucionalidade desta lei, com o fundamento de que esta lei é inconstitucional, porque dispõe do patrimônio público sem nenhum tipo de concorrência ou contrapartida. O pedido será: “declara-se inconstitucional”. A causa de pedir: “porque a lei é inconstitucional”. Nota-se que o controle é unicamente abstrato. Por outro lado, suponha-se que esta mesma situação enseje o ajuizamento de uma ação civil pública em primeiro grau. Neste caso, o legitimado para a propositura da ação civil pública alegará que aquela lei é inconstitucional, todavia fará um pedido concreto: “impeça o início das obras; destrua o muro que foi construído etc.”. Percebe-se que, neste último caso, há um pedido concreto, de modo que a inconstitucionalidade na ação civil pública é declarada apenas incidentalmente, ou seja, não tem efeito erga omnes como tem nas ações de controle de constitucionalidade. Conclusão: Há plena compatibilidade entre ação civil pública e ação de controle abstrato de constitucionalidade.

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g) Vedação do objeto (falta interesse processual) (art. 1º, pu, LACP) O art. 1º, parágrafo único, da LACP era, antigamente, uma hipótese de impossibilidade jurídica do pedido, mas, como no NCPC, a impossibilidade jurídica do pedido deixou de existir, a doutrina, automaticamente, reviu a questão e colocou como uma hipótese de falta de interesse processual ou de falta de interesse de agir. Portanto, existem 4 situações em que não é cabível ação civil pública. São elas as pretensões que envolvam: • • • •

Tributos Contribuições previdenciárias Fundo de garantia por tempo de serviço Outros fundos institucionais de titularidade determinada

Obs.: Se algum legitimado coletivo entrar com ação civil pública para discutir uma dessas pretensões, o juiz vai indeferir a inicial por falta de interesse processual adequação, porque a via eleita, em virtude da disposição legal, é vedada. Obs.: Nota-se que o referido dispositivo não é bom para a defesa do sistema coletivo, porque a ideia dele é proteger o poder público do alcance da ação civil pública. i) legalidade e constitucionalidade (STJ Eresp 771.460 – DF e Resp 850.718-DF) Alguns autores sustentam que esta vedação do objeto violaria o princípio do acesso à justiça (art. 5º XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça de direto). Contudo, esta discussão está superada, porque o STJ e o STF reconhecem com tranquilidade a legalidade e a constitucionalidade do art. 1º, pu, da LACP. Sustentam que não existe impedimento constitucional ou legal algum para que o legislador obste a via. Não se proíbe que cada indivíduo discuta as referidas matérias. O que se impede é apenas a via da tutela coletiva. A vedação do objeto, com o passar do tempo, começou a causar alguns problemas. Assim, com o passar do tempo, a própria jurisprudência acabou fazendo um temperamento jurisprudencial da vedação. ii) temperamento jurisprudencial (proteção ao patrimônio público e à higidez tributária (Exs. Anulação da TARE e certificado de assistência social) O legislador começou a separar a discussão meramente tributária, previdenciária, de FGTS e sobre fundos de natureza institucional da as situações em que a ação, na verdade, teria por escopo proteger o patrimônio público ou a higidez tributária. Ex.: (Resp 1.010.130 – MG e Resp 1.101.808 -SP) – Fazem a distinção correta entre o que é discussão tributária e o que é discussão relacionada à defesa do patrimônio público. Suponha-se que determinada empresa teve um regime tributário diferenciado. Deram para ela a possibilidade de recolher tributos só depois de 10 anos. Suponha-se que determinada lei municipal estabeleceu uma isenção tributária para aqueles que pintem suas casas da cor usada pelo Prefeito na campanha. Nota-se que, quando qualquer legitimado ajuíza uma ACP para declarar a impossibilidade das referidas situações, ou seja, para fazer com que não haja o desconto em matéria tributária, fazer com que não seja concedido o TARE, não se está, propriamente, discutindo matéria tributária, mas sim protegendo o patrimônio público, já que, quando a administração pública deixa uma empresa sem pagar tributos por 10 anos ou quando ela cria uma isenção tributária desarrazoada, o que, na verdade, está acontecendo é uma renúncia fiscal com impactos negativos ao patrimônio público. Ex.: O órgão público emite um certificado falso de assistência social, fazendo com que a empresa pare de recolher tributo por ser considerada assistencial. Neste caso, seria possível uma ACP para anular o certificado de assistência social. Não se está discutindo matéria tributária, mas sim protegendo o patrimônio público.

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iii) ACP em matéria previdenciária Durante muito tempo, houve uma discussão sobre se era possível ACP em matéria previdenciária, porque, quando consideradas aquelas vedações (FGTS, cont. previdenciária, tributos e outros fundos...), alguns compreendiam, erradamente, que contribuição previdenciária entrava aqui. Contudo, hoje, a jurisprudência do STJ é largamente dominante no sentido de que não se pode discutir contribuição previdenciária, porque existe a vedação legal, mas nada impede que se discuta, por ação coletiva, benefícios previdenciários. Ex.: ACP para rever os índices de atualização dos beneficiários de tanto a tanto; obrigar o INSS a atender com preferência idosos e gestantes; discutir a atualização monetária nos salários de contribuição para o cálculo do valor total do benefício.

3. Legitimidade Ativa (art. 5º LACP e 82 do CDC) a) Definição ope legis (públicos/privados/sociedade civil) Apenas o legislador pode dizer que m pode propor e quem não pode propor ACP. Obs.: Como visto na aula passada, em outros sistemas, como, por exemplo, no sistema norte-americano, qualquer cidadão pode propor ação coletiva. Contudo, para tanto, a pessoa tem que provar uma série de requisitos. No Brasil, é diferente, o legislador não permite que o cidadão possa propor ação coletiva, ele elege quem são as pessoas que podem falar em nome da coletividade (players). O sistema brasileiro, ao eleger os players, preocupou-se em colocar entre os players vários segmentos da sociedade, dando um bom equilíbrio representativo para todos esses segmentos. Ex.: Órgãos públicos, como MP, Defensoria Pública, Administração Pública; órgãos privados, como as sociedades de economia mista e as empresas públicas; e entidades representativas da sociedade civil, como associações, sindicatos e etc. Ao eleger todos esses players, o legislador acabou permitindo que qualquer tipo de interesse possa ser objeto de uma ACP. b) Legitimidade concorrente e disjuntiva De acordo com a doutrina, a legitimidade para a propositura da ACP é, ao mesmo tempo, concorrente e disjuntiva. Legitimidade concorrente: significa que existe mais de um legitimado, ou seja, mais de um que pode entrar com ACP. Legitimidade disjuntiva: significa que não há ordem preferencial entre os legitimados para propositura da ACP. Significa dizer que um não depende da vontade do outro. Ex.: O MP, para entrar com ACP, não precisa pedir autorização para a Defensoria Pública; a associação, para entrar com ACP, não precisa pedir autorização para nenhum outro legitimado. c) Natureza da legitimação a) Extraordinária (art. 18, parágrafo, CPC) Esta primeira posição, sem ter que mudar o modelo do processo individual, estabelece que a legitimação para as ações coletivas é extraordinária, ou seja, os legitimados do art. 5º da LACP e 82 do CDC estariam defendendo, em nome próprio, direito alheio. Pela legitimação extraordinária, desde que o ordenamento autorize, alguém pode, em nome próprio, defender direito alheio.

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Ex.: Art. 1.314 do CC – Os condôminos podem, em nome próprio, defender o direito de todos os demais condôminos. Crítica: quando, por exemplo, o MP entra com uma ACP, de fato, a atuação se dá na defesa dos direitos alheios (Ex.: meio ambiente). Contudo, não se pode negar que, nesta situação, o MP não está defendendo apenas direito alheio, mas também prerrogativas próprias, já que o MP foi criado, também, para tutelar o meio ambiente. b) Autônoma para a condução do processo (ou coletiva) A partir da lição do direito alemão, construiu-se a ideia de que, no âmbito do processo coletivo, a legitimidade não é nem ordinária (defesa de direito próprio em nome próprio) nem extraordinária (defesa de direito alheio em nome próprio), porque elas são espécies de legitimação exclusivas do processo individual. Para os adeptos desta segunda posição, a legitimação seria autônoma para a condução do processo ou, simplesmente, coletiva. Seria uma forma de legitimação exclusiva do processo coletivo que renega a aplicação das regras de legitimação do processo individual. Sustenta que a legitimação é autônoma por que ela é desprendida da titularidade do direito material. Na ação coletiva, a lei elege players (legitimados ativos) sem se preocupar se eles têm ou não a titularidade do direito material. Obs.: A tendência em provas é entender que, quando for difuso e coletivo, a legitimação é a autônoma para condução do processo, porque, desta forma, foge-se da discussão se o meio ambiente é direito dos cidadãos ou das atribuições institucionais do MP; quando for individual homogêneo, em que os direitos são dos indivíduos (vítimas e sucessores), a legitimação é extraordinária.

d) Litisconsórcio ativo, facultativo e unitário entre co-legitimados (art. 5º, §§ 2º e 5º, LACP) É perfeitamente possível a formação de litisconsórcio entre os players (legitimados ativos do art. 5º da LACP). Aqui, o litisconsórcio ativo se caracteriza pela facultatividade. Ninguém, nem mesmo o juiz, pode determinar que alguém atue em conjunto com outrem. Sendo a legitimação concorrente, o litisconsórcio é, necessariamente, facultativo. Além disso, o litisconsórcio, aqui, é unitário, porque a decisão proferida no processo coletivo fará com que todos os legitimados coletivos sejam vencedores ou todos sejam perdedores. Ex.: Se o MP Estadual e o MP Federal entrarem com a mesma ACP, não se admite que seja procedente para um e improcedente para outro, ou é procedente para ambos, ou é improcedente para ambos. e) Controle judicial da representação adequada (pressuposto) Conforme estudado na aula passada, existe um princípio do processo coletivo chamado de princípio da adequada representação presumida ou do controle judicial da legitimação. Como, no Brasil, é a lei que determina quem são os legitimados, surge a discussão: há ou não controle judicial da representação adequada? O Juiz verifica se o MP, associação, entidade de classe, administração direta e indireta é um bom porta-voz? Como visto, existem duas posições: i) ope legis, salvo art. 5º, V, da LACP (associações)- Os adeptos desta posição, capitaneada, dentre outros, pelo Prof. Nelson Nery Junior, entendem que o legislador brasileiro fez uma opção, qual seja ele já elegeu os porta-vozes. Portanto, não é o juiz, no caso concreto, que vai decidir se aquela pessoa é ou não é o porta-voz. Obs.: o Juiz teria controle só no caso da associação, já que a lei prevê tal controle. ii) ope legis e ope judicis para todos os legitimados - De acordo com esta posição, que é majoritária, a representação adequada no Brasil, de fato, é ope legis, já que o cidadão não está legitimado (salvo ação popular). Apenas os legitimados que o legislador previamente elegeu que podem. Porém, os adeptos desta posição entendem que, sem prejuízo disso, ela também é ope judicis, ou seja, o juiz também controla, e não apenas no caso das associações. O juiz teria o poder de 8 www.g7juridico.com.br

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controlar para todos os legitimados se há ou não representação adequada quanto ao interesse que está em jogo. Ex.: juiz decide que a Defensoria não é um porta-voz adequado pelo fato de o interesse fugir completamente das suas atribuições.

Adotando a posição dominante, será considerado, para se dar continuidade ao presente estudo, que existe controle judicial da representação adequada. Assim como na aula anterior, aqui será considerado que isso é um pressuposto processual, ou seja, legitimação é daqueles elencados no art. 5º, mas, às vezes, quem entra com a ação não preenche o pressuposto processual da representação adequada, e o juiz, constatando isso, convidará outro legitimado para assumir a titularidade ou extinguir o processo sem análise do mérito.

3.1. Ministério Público É o mais importante de todos os legitimados ativos, porque o perfil constitucional do MP já foi moldado a partir da ideia de que ele é o principal player na tutela dos interesses metaindividuais. a) Finalidade institucional (art. 127 da CF e Lei 8.625/93) • • • •

Defesa da ordem jurídica Defesa do Regime democrático Defesa dos interesses sociais Defesa dos direitos individuais indisponíveis

Obs.: O MP é um porta-voz adequado dos quatro interesses acima, tendo em vista que eles correspondem as suas finalidades institucionais. Assim, dentro deles, o MP pode propor qualquer ACP. Caso a posição adotada seja no sentido de que o juiz não tem controle adequado, é o Promotor que decidirá se a atuação dele está dentro desses quatro interesses. Caso a posição adotada seja no sentido de que o juiz tem controle adequado, o Promotor ajuíza a ação, e o juiz faz o filtro para verificar se aquilo que está sendo objeto da atuação do MP está dentro desses quatro interesses.

i) Difusos e coletivos: sempre representa (indivisibilidade/interesse social) Tem-se entendido que, toda vez que o interesse for difuso e coletivo, ou seja, naturalmente coletivo (Ex.: propaganda enganosa; tutela do meio ambiente; tutela do patrimônio público; da moralidade administrativa; mensalidade escolar - Súm. 643 do STF; etc.), o MP sempre será um representante adequado desses interesses, porque o direito é indivisível (ou todo mundo ganha ou todo mundo perde). Diz-se que, por conta da indivisibilidade, o interesse é social. ii) Individuais homogêneos: controvertido/casuística (tendência em admitir) Nos individuais homogêneos, é possível verificar que o traço característico é a divisibilidade. Como o traço característico é a divisibilidade, não dá para afirmar, como se faz nos difusos e coletivos, que existe o interesse social. Assim, há que se verificar caso a caso se o MP, naquela ação civil, é ou não um bom portavoz da coletividade. Para se chegar à conclusão de que ele é ou não um bom porta-voz, há que se verificar se o objeto da ação está dentro das quatro finalidades institucionais. Ex.: O MP quer entrar com uma ação para discutir o índice de reajuste dos contratos de compra e venda dos imóveis de alto padrão em uma região rica da cidade. Ao que parece, o MP não seria um bom porta-voz neste caso, já que não estaria presente nenhuma das referidas finalidades institucionais.

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Ex.: O MP quer entrar com uma ação para discutir o índice de reajuste das casas adquiridas no sistema financeiro da habitação. Ao que parece, neste caso, o MP seria um bom porta-voz, já que se vislumbra um interesse social relativo ao fato de se tratar de moradia popular, que é uma das atribuições do MP. Ex.: O MP quer entrar com ação para garantir tratamento para Alzheimer para os doentes. O MP seria um bom porta-voz, já que saúde é um direito individual indisponível. Obs.: Diante da dúvida se está presente ou não alguma das finalidades do MP, o ideal é admitir a ação proposta pelo MP, já que esta é a tendência devido à expansão dos legitimados (quanto mais legitimados, melhor). (Lembrar do caso em que o STF entendeu que, diante da dúvida se o MP era ou não um bom portavoz para pedir a devolução ao Estado de dinheiro recebido pelas seguradoras e não repassado para os segurados do DPVAT, o melhor seria optar pela admissão, contrariando Súm 470 do STJ, posteriormente cancelada).

b) ACP em favor de uma única pessoa (súmula 594 do STJ) (perplexidade) Como está entre as finalidades institucionais do MP tutelar direitos individuais indisponíveis, às vezes, o MP é procurado por apenas uma pessoa para poder tomar alguma atitude em razão da violação desses direitos indisponíveis dessa pessoa. Ex.: Criança pedindo alimentos; idoso pedindo vaga em asilo; pessoa precisando de atendimento à saúde; etc. É possível encontrar julgados tanto admitindo a atuação do MP em ACP ajuizada em favor de uma única pessoa quanto dizendo que o MP não pode propor ACP em favor de apenas uma pessoa, porque seria atribuição da Defensoria Pública. Apesar da grande divergência jurisprudencial, que durou por muito tempo, recentemente, o STJ pacificou a questão, através da Súmula 594, no sentido de que o MP tem plena legitimidade para atuar em favor de uma pessoa só. Alerta: Toda essa discussão se o MP pode ou não pode propor ação civil pública em favor de uma única pessoa é derivada de um comportamento processual equivocado do MP. O MP, em algum instante da evolução da história do MP brasileiro, passou a entender que tudo aquilo com que tem contato no cível vira ACP. (Ex.: Se ação é para uma criança, é ACP para garantir creche para criança; se ação é para um idoso ou para medicamento, é ACP para garantir medicamento ou vaga em asilo para idoso). Contudo, a atribuição constitucional do MP é muito maior do que a ACP. Quando o art. 127 da CF dispõe que o MP tem atribuição para atuar na defesa dos direitos individuais indisponíveis, ele não diz que tem que ser pela via da ACP. Então, o MP não só pode como deve propor ações corriqueiras para defesa dos direitos individuais indisponíveis. Assim, ao invés de propor ACP para garantir vaga em creche para criança, o MP pode propor Mandado de Segurança, ação de obrigação de fazer etc. Conclusão: A concepção, adotada por alguns, que é possível extrair da Súm 594 do STJ, parece ser a ideal, pois caminha no sentido de que a ACP é para a tutela de direitos metaindividuais, o que, entretanto, não afasta a possibilidade de o MP propor qualquer outro tipo de ação na defesa dos direitos individuais indisponíveis. c) Obrigatoriedade da atuação (MITO?) Por muito tempo há o entendimento de que o MP tem o dever de obrigatoriedade na atuação, por conta do princípio da indisponibilidade mitigada da ação coletiva. Obs.: Cada vez mais, essa ideia de que o MP é obrigado a atuar tem sido questionada. Boa parte dos autores reconhece, no papel do MP, uma enorme função política, e o fazem para admitir que tem que ser reconhecida ao membro do MP, como agente político que é, uma certa discricionariedade em definir se atua ou não atua. Muitas vezes o MP consegue resolver o problema através de recomendações, por exemplo. Muitas vezes, a atuação do MP pode ser pior para o sistema do que melhor para a tutela dos direitos. A obrigatoriedade, assim, seria um mito. Este entendimento ainda é minoritário. 10 www.g7juridico.com.br

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d) Atuação para obrigar o funcionamento dos órgãos internos de controle Hoje, é voz corrente no MP que, ao invés de atuar para tutelar o próprio direito metaindividual, tem sido reconhecida a possibilidade de o MP atuar para obrigar o funcionamento dos órgãos internos de controle da administração pública. Antigamente, a atuação padrão do membro do MP era, por exemplo, na defesa do patrimônio público, ajuizar ação civil pública para corrigir grave problema de desvio de materiais em um almoxarifado do ente público; ajuizar ação civil pública para resolver caso de descaso com a educação infantil. Hoje, a atuação do MP é, no mais das vezes, voltada para garantir o funcionamento dos órgãos internos para que haja atendimento às demandas coletivas. Assim, o MP não vai entrar com ação contra o sujeito do almoxarifado, mas sim obrigar a Prefeitura a melhor organizar o almoxarifado; vai obrigar a Prefeitura a fiscalizar as creches municipais ou as creches particulares para saber se não há negligência. O MP teria, então, um papel subsidiário, ou seja, ele só atuaria se, eventualmente, não fosse capaz de obrigar o funcionamento dos órgãos internos de controle. Ex.: Ao invés de ajuizar ação contra o Estado, MP faz TAC (termo de ajustamento de conduta) para que se aperfeiçoassem os mecanismos internos da secretaria de administração penitenciária. 3.2. Defensoria Pública a) Finalidade institucional (arts. 5º, LXXIV, e 134, da CF, e LC 80/1994) • •

Promoção dos direitos humanos Defesa dos necessitados

Obs.: Dentro das referidas finalidades, a Defensoria Pública pode atuar livremente. Obs.: A legitimidade da Defensoria Pública na promoção dos direitos humanos é amplíssima, ou seja, não interessa se é rico, se é pobre, se é miserável, se é milionário, se é branco, se é negro. Tratando-se de direitos humanos, a Defensoria Pública pode atuar. b) Conceito de hipossuficiente/necessitado i) Econômico (art. 5º, LXXXIV, CF) – Posição minoritária De acordo com esta posição, que é bem restritiva, o conceito de hipossuficiente da CF é o conceito de hipossuficiente econômico, e, portanto, a Defensoria só poderia atuar na defesa jurídica de pobres, seja no processo individual, seja no processo coletivo. Os adeptos desta primeira posição se apegam ao art. 5º, LXXXIV, da CF, porque o art. 134 da CF dispõe que a Defensoria Pública atuará na defesa dos necessitados na forma do art. 5º LXXXIV, que, por sua vez, fala de necessidade econômica (quem comprovadamente não tiver recursos para custear o processo).

ii) Econômico e organizacional (jurídico – incapacidade de auto-organização) – Posição dominante Prevalece, na doutrina e na jurisprudência, a posição no sentido de que o conceito de hipossuficiência é um conceito duplo: de hipossuficiência econômica ou organizacional. A hipossuficiência organizacional é vista como uma hipossuficiência jurídica, derivada da incapacidade do interessado ou dos interessados de se defenderem ou de se auto-organizarem. Assim, ainda que o interessado tenha recursos, se ele não tem capacidade de defesa ou se ele não tem condições de defesa ou de auto-organização, seja no plano individual, seja no plano coletivo, a Defensoria Pública pode atuar.

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Ex.: Art. 4º da LC 80/84 – Defesa daqueles que foram citados por edital e não apresentaram resposta (curadoria especial). O réu que não apareceu pode ser milionário, mas o simples fato de ele não ter sido citado pessoalmente, mostra que ele não tem capacidade jurídica de se defender. A Defensoria Pública faz curadoria especial. Ex.: Quando réu não quer, no processo penal, constituir advogado, mesmo sendo milionário, será nomeado um Defensor Público para atuar em defesa dele, porque a defesa, no processo penal, é obrigatória. c) Atuação em sede coletiva i) só nos individuais homogêneos (Min. Teori Zavascki) Está superado o entendimento no sentido de que a Defensoria Pública só poderia atuar na defesa dos direitos individuais homogêneos. O Min. Teori Zavascki sustentava que, como a CF diz que a Defensoria Pública só atua na defesa dos necessitados, era importantíssimo definir se as vítimas do evento eram ou não eram necessitadas, porque não existe pobre por presunção. ii) todos (potencialmente necessitados) (STF ADI 3943) (STJ Resp. 912.849) Na ADI 3943, o Supremo entendeu que a Defensoria Pública pode atuar na defesa de todos os necessitados. Assim, a Defensoria Pública pode atuar no difuso, no coletivo e no individual homogêneo. Foi trabalhada, no referido julgado, uma questão no sentido de que existem grupos sociais que são presumidamente vulneráveis. Ex.: A Defensoria Pública pode entrar com uma ACP para defender a população carcerária. Ex.: A Defensoria Pública pode entrar com uma ação para garantir o direito coletivo dos compradores de um imóvel de verificar os índices de atualização monetária dos contratos de um empreendimento habitacional de caráter social. Obs.: A atuação da Defensoria pode, eventualmente, beneficiar não necessitados, principalmente nos difusos e coletivos, em que o direito é indivisível.

3.3. Administração direta e indireta A administração direta é composta pela União, Estados, DF e Municípios. A administração indireta é composta pelas Autarquias, Fundações de Direito Público, Empresa Pública, Sociedade de Economia Mista. Tanto a administração direta quanto a administração indireta podem propor ACP. a) Finalidade institucional Obs.: Há dificuldade em se dizer qual é a finalidade institucional da administração pública direta e da administração pública indireta, porque isso não é revelado claramente pelo texto constitucional. i) União, Estado, DF e Município (representantes universais?) Como há dificuldade em se dizer qual a finalidade institucional da administração pública direta, a doutrina tem feito a análise da finalidade institucional da União, dos Estados, do DF e dos Municípios para reconhecer que,

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talvez, de todas elas, seja a representação adequada mais ampla que existe (representação/finalidade institucional amplíssima). A União, os Estado, o DF e os Municípios servem para tutelar o bem comum. Se é para tutelar o bem comum, eles poderiam propor ACPs praticamente em qualquer tema. Assim, é possível que alguns examinadores afirmem que as pessoas da administração pública direta são representantes universais da coletividade. Este entendimento é dominante. Crítica: Principalmente para uma prova dissertativa, é importante o aluno saber que existem aqueles que não concordam com o entendimento de que os entes da administração pública direta são representantes universais. Alguns defendem que a representatividade dos entes da administração pública direta tem que ser analisada a partir do art. 20 e seguintes da CF, já que eles atribuem quais são as competências e quais são os bens da União, dos Estados, do DF e dos Municípios. Dentro deste ponto de vista, os referidos entes só poderiam atuar dentro de suas respectivas atribuições constitucionais. Ex.: A CF dispõe que compete à União explorar serviço postal. Deste modo, uma ACP com o tema “serviço postal” não poderia ser objeto de atuação pelo Município ou por Estado-membro. Ex.: A CF dispõe que a organização do trânsito local é atribuição do Município. Assim, uma ACP com o tema “trânsito” só poderia ser discutida pelo Município. ii) Demais (leis criadores e estatutos/contratos sociais) Os entes da administração indireta não podem tratar de qualquer tema. São as leis que criam os órgãos da administração pública indireta. Além disso, no caso das pessoas jurídicas de direito privado (Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista), existem os estatutos e os contratos sociais. A lei criadora, o estatuto e o contrato social trazem o objeto social do órgão. O objeto social é o que define a pertinência temática e a finalidade institucional do órgão. Ex.: O INSS pode propor ACP dentro do tema previdência; a Petrobrás pode propor ACP dentro do tema recursos naturais; o IBAMA pode propor ACP dentro do tema meio ambiente etc.

b) Personalidade judiciária (art. 82, III, do CDC) O Art. 82, III, do CDC não se aplica exclusivamente às entidades de defesa do consumidor. Por conta do microssistema, este dispositivo se aplica a todas as espécies de entes que têm por objetivo a proteção dos direitos coletivos. Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: (...) III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código; (...) O referido dispositivo nasceu para permitir que os PROCONS pudessem propor ACP. A maioria dos PROCONS dos municípios são pastas (órgão interno) da administração municipal. O legislador quis permitir que o PROCON, mesmo sendo parte da Prefeitura, pudesse propor ação em nome próprio. Assim, o PROCON tem personalidade judiciária para ajuizar ACP. Por conta do microssistema, é possível pensar em ACP pela secretaria do meio ambiente, por órgãos internos de saúde pública etc. Nota-se que o art. 82, III, do CDC tem que ser lido expansivamente. Desde que o órgão, ainda que vinculado à administração direta, tenha prerrogativas próprias a defender, ele pode propor ACP em nome próprio.

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3.4. Associações a) Amplitude da expressão (sindicatos, entidades, partidos políticos, grêmios, OAB, etc) Apesar de o art. 5º da LACP e o 82 do CDC só fazerem referência às associações, não dá para negar que esta expressão abrange sindicatos, entidades, partidos políticos, grêmios, OAB, etc

b) Expressa disciplina do controle judicial da representação mediante: Diferentemente dos demais legitimados coletivos, as associações correspondem ao único legitimado em que se tem disciplina expressa do controle judicial da representação. Assim, as associações sempre podem propor ACP, porque são legitimadas. Contudo, para reconhecer se há representação adequada ou não (pressuposto processual), são necessários dois requisitos: i) Constituição ânua (dispensa: art. 5º, § 4º, LACP) Para dar um mínimo de seriedade, viabilidade e coerência, a Lei diz que a associação só pode propor ACP se ela tiver regularmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 ano. A ideia é evitar a constituição de associações ad hoc, com o escopo de só ajuizar Ações Civis Públicas. Quando o direito em debate for de grande relevância social, o art. 5º, § 4º, da LACP autoriza que o juiz dispense este requisito. § 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido Leading case : ADESF (Associação de Defesa dos Fumantes) – ajuizou ação um mês após sua constituição para obrigar empresas de cigarro a indenizar quem fuma. Todas as instâncias entenderam que era caso de dispensa da constituição ânua por conta da abrangência e da amplitude que tinha aquela ação coletiva. ii) Finalidade institucional (pertinência temática) Verifica-se o estatuto social da associação, dentro do qual o objeto da ação tem que estar entre as finalidades institucionais. Em nenhum momento a LACP diz que a associação só pode propor ACP na sua principal finalidade institucional. Ela diz que a associação pode propor a ação se o objeto estiver entre as suas finalidades institucionais (Art. 5º, V, b)). c) A questão dos IH e do art. 2º-A parágrafo único da Lei 9.494/97 X art. 5º, XXI, da CF) (STF RE 573.232 e 612.043 - sindicato/substituição X associação/representação) •

Ressalvas:

1ª – Entendimento que será abordado a seguir diz respeito apenas aos individuais homogêneos. Não aplica para os difusos e coletivos. 2ª - Entendimento que será abordado a seguir aplica-se apenas para as ACPs por associações. Sindicato fica fora porque tem regime próprio do art. 8º, III da CF). 3ª - Entendimento que será abordado a seguir aplica-se apenas para as ACPs. Não aplica para mandado de segurança coletivo, para o mandado de injunção coletivo e para ação popular.

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O STF entendeu que o art. 2º, a), da Lei 9.494/97 é constitucional e eficaz, o que significa dizer que nas ações coletivas ajuizadas por associações para defesa dos interesses individuais homogêneos, a decisão do processo só será válida para aquelas pessoas que deram expressa autorização assemblear para a propositura da ação, e que, além disso, estejam filiadas à respectiva associação na data da propositura da ação de conhecimento. Art. 2º-A. A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator. Parágrafo único. Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços. O referido entendimento do STF é totalmente oposto ao que o STJ entendia. O STJ entendia que, como se tratava de ACP, a legitimação das associações era autônoma para condução do processo, ou seja, desprendida do direito material, de modo que não precisava de autorização de ninguém para poder propor ACP na defesa dos associados. A autorização, na verdade, já teria sido dada no momento em que houve a filiação. Nota-se que o STJ entendia que o caso era de substituição processual. Contudo, tal entendimento do STJ caiu diante do referido entendimento adotado pelo STF.

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P. Coletivo 3.1

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