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Resumo das Xerox de Direito Ambiental {Atenção: lembre-se que as xerox são antigas. Quando você ler algo sobre Lei Complementar prevista no parágrafo único do art. 23 da CF/88, saiba que ela JÁ FOI editada, que é a Lei Complementar n° 140/2011} 1. Livro “DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA E PROTEÇÃO AMBIENTAL”, Andreas J. Krell 2.1 Capítulo 5: A nova função do judiciário na realização dos valores constitucionais Quanto à ponderação de princípios e interesses: De acordo com o autor, princípios constitucionais devem guiar o exercício da discricionariedade administrativa não apenas no quesito mandamental da norma (como agir), mas também no lado do preenchimento da sua hipótese (se agir), e isso se aplica especialmente no princípio da precaução e no princípio da prevenção, já que os mesmos, para serem utilizados, dependem da interpretação do que seria o “perigo ao ambiente” e a “probabilidade do dano ecológico”; tal processo interpretativo é decisivo para o juiz, por ex., quando precisar tomar alguma medida processual. O autor também faz uma crítica, ao afirmar que boa parte do Judiciário ainda não lida com princípios costumeiramente, porque costuma adota uma atitude formalista; como consequência, as bases axiomáticas (valorativas) do sistema jurídico dificilmente conseguem influenciar a interpretação dos juízes quanto à legislação ordinária. Mesmo assim, o fato é que a aplicação prática do Direito sempre vai se basear em grande parte num pensamento orientado a valores (obviamente, isso remonta aos princípios), razão pela qual é indevido achar que o pensamento jurídico se esgota numa mera subsunção do fato à norma ou em deduções lógicas! Ao mesmo tempo, os princípios também funcionam para neutralizar as posições e anseios pessoais do julgador, que fica, por sua vez, obrigado a motivar o seu convencimento ao lidar com qualquer questão. MESMO sendo um tema de grande importância (por tais motivos anteriormente listados), muitos operadores acham que princípios e dispositivos legais de densidade mandamental reduzida são meras normas programáticas de efeito ético ou moral, sem causarem vinculação no ato de aplicar a lei: um grande engano! Para comentar a importância dos princípios, o autor lembra, por ex., que os juízes realizam sopesamento (ponderação) dos princípios e de tais dispositivos legais de densidade mandamental reduzida quando lidam com colisões entre interesses econômicos e ambientais, situação em que assumem a condição de “intérpretes do bem comum”. Para realizarem tal sopesamento, julgadores precisam compreender o problema e os reflexos das decisões administrativas concretas que façam referência à proteção do meio ambiente, para que só então seja feita uma interpretação coerente dos conceitos legais ora discutidos. Uma das maiores dificuldades desse sopesamento é JUSTAMENTE entender o que é e qual a importância da “PONDERAÇÃO dos DIREITOS e dos INTERESSES envolvidos no conflito”, e começamos com a necessidade de distinção dos “interesses individuais”, “interesses coletivos/difusos” e “interesses gerais/públicos”, categorias estas que devem ser harmonizadas, até para que cada um desses interesses seja melhor atendido. • • •
Interesses individuais: autor não comenta, mas o conceito parece óbvio; Interesses coletivos/difusos: somatório dos interesses individuais; Interesses gerais/públicos: somatório dos interesses individuais e coletivos. Necessário considerar que tais interesses lidam com a pluralidade e contraditoriedade entre interesses de diversos integrantes da sociedade, razão pela qual o interesse público não pode ser entendido como um produto cumulativo de vontades individuais ou como um mero valor neutro! Interesse público surge ao longo de um processo gradual de confronto entre diversas preferências de grupos ou sociais, submetidas a princípios definidos anteriormente. Há quem também faça a distinção entre “interesse público primário” (interesse da coletividade como um todo) e “interesse público secundário” (interesse público visto pelo Estado), demonstrando um desencontro entre a interpretação governamental e o efetivo interesse da coletividade ==> não se esqueça de que a própria relação entre a sociedade e o Estado é marcada por conflitos.
Essas distinções todas são importantes para compreender o fato de que o sistema político abandonou aquele antigo entendimento limitado entre “interesse individual cidadão” como contraposto à vontade geral do povo, que sempre ficava plasmado nas leis e atuação administrativa (que atuava em defesa de um aparente interesse público unânime); desde então, foi reconhecida a legitimidade de interesses grupais intermediários (e a necessidade de tutelá-los), que não podem ser considerados “egoísticos”. O autor ressalta que muitos países centrais entendem que órgãos administrativos têm a função de defender o interesse público (prestando serviços ou aplicando políticas públicas); já o sistema brasileiro faz uma divisão entre interesses públicos comuns (nível alto de emprego, garantia de receitas públicas) e os interesses difusos específicos (defesa da criança, do meio ambiente etc.), os quais entram em colisão entre eles mesmos, acabando por demonstrar que há desconfiança do próprio sistema com relação à eficiência dos órgãos administrativos na prestação dos serviços públicos.
O autor ressalta que a noção própria do interesse público é muito vinculada à defesa dos interesses do Estado enquanto estrutura burocraticamente organizada, e não para a defesa dos interesses dos cidadãos considerados como “comunidade”, o que é muito ruim para o Direito Ambiental, que tem o Direito Administrativo como uma das principais fontes. Resolver esse conflito descrito na primeira linha deste parágrafo é muito importante para que seja compreendido o papel desempenhado pelos institutos do Direito Administrativo quando forem necessários para a solução de um conflito de Direito Ambiental. Depois dessas explicações, o autor é enfático ao afirmar que ainda é possível observar um tipo de PONDERAÇÃO deformada, na qual os Tribunais costumam dar ampla preferência aos interesses públicos tradicionais (marcados por interesses econômicos), pondo em segundo plano os interesses difusos; ocorre que, nesse processo de decisão, NÃO se pode jogar uma geração de direitos contra outra! Para o autor, direitos fundamentais são normas principiológicas, o que torna proibido excluir inteiramente um princípio para privilegiar outro; é necessário fazer a COMPATIBILIZAÇÃO, o que vai ser feito através de um processo de avaliação material dos valores e interesses implícitos, sejam públicos ou privados, com base no raciocínio da razoabilidade e proporcionalidade! Assim sendo, NENHUM princípio tem preferência absoluta; é a situação concreta que dirá. O autor acentua que o ordenamento jurídico brasileiro conferiu uma maior preferência à proteção de valores que expressam interesses difusos, o que fica muito claro se visualizarmos o caso da AÇÃO CIVIL PÚBLICA, que só passou a existir porque um destaque maior foi dado aos interesses difusos dentro do interesse público comum. O grande problema é que muitos juízes realizam a ponderação sem levar em consideração a situação e condições concretas; isso fica muito claro na hipótese criada pela Lei n° 7.347/1985, que basicamente permitiu ao juiz (Presidente do Tribunal, no caso) responsável por conhecer o recurso suspender uma execução de uma medida liminar concedida, a fim de evitar graves lesões à ordem, saúde etc. Essa previsão foi muito utilizada pelos juízes para suspenderem efeitos das liminares concedidas contra empresas poluidoras, o que significa dizer que os juízes deram preferência aos interesses públicos tidos como “tradicionais”, em prejuízo dos interesses difusos que justificam posições em defesa do meio ambiente e do patrimônio cultural. Essa situação de suspensão de medidas liminares também é um problema no âmbito da Ação Civil Pública, e até contraria a lógica: ora, se o legislador previu sanções administrativas ou judiciais como embargo para atividades poluentes ou demais atividades que degradam o meio ambiente, não faz sentido o sistema permitir a dissolução dessas sanções sob argumento da defesa dos interesses da sociedade! Diante desse problema, conclui o autor que o juiz SÓ pode suspender a execução de liminares em situações excepcionais, apenas previstas na norma, sendo inaceitável que essa medida seja aplicada como regra! De toda forma, entende o autor que essas correições (i.e., suspensão de execução de medidas liminares) deveriam ser possíveis apenas nos casos de desproporcionalidade entre as consequências das sanções ante as ameaças ao meio ambiente, o que é uma situação bem rara de ocorrer, até porque hoje vem sendo muito valorizado e melhor entendido o PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO, que é hoje o princípio fundamental do Direito Ambiental. Ainda assim, o que muitos Tribunais brasileiros vêm fazendo é exigir a ocorrência de um dano real, sem observar o princípio da cautela na matéria ambiental, exigindo que os danos ambientais sejam atuais e concretos. Ainda assim, é preciso reconhecer que as dificuldades na aplicação do Direito Ambiental também resultam de antigos problemas do desempenho dos órgãos públicos, como a falta de vontade política, corrupção etc. Voltando ao tema dos “interesses difusos”: o próprio reconhecimento de tais interesses pelo legislador pátrio representou uma tentativa de criação de novos meios de proteção para determinadas subáreas do interesse público em geral (cuja realização é a maior função do Poder Público), ao se verificar que existem áreas setoriais desse interesse público cujos atos de promoção e defesa não vêm sendo feitos de forma bacana pelos órgãos da Administração Pública; por tais razões de descontentamento, o Poder Judiciário fica incumbido de sindicar atos (mais ou menos) discricionários dos órgãos administrativos, a fim de verificar se interesses difusos e valores constitucionais implícitos estão sendo realizados de forma devida/adequada. Todo esse controle judiciário NÃO se confunde com a sindicância da interpretação correta dos conceitos jurídicos indeterminados das leis ambientais: nesses casos em que as decisões administrativas envolvem juízos discricionários técnicos/valorativos/de prognose, o Judiciário deve abster-se. Lembre-se: controle da aplicação (que é feita pelo Executivo) de conceitos jurídicos indeterminados das leis ambientais deve-se limitar a aspectos procedimentais e de obediência aos princípios gerais e específicos, o que também significa assumir que decisões não podem ser tomadas de forma arbitrária. De toda forma, conclui o autor que o Judiciário normalmente deve se limitar a anular atos discricionários impugnados, sem poder exceder a isso. Quanto ao controle judicial de omissões administrativas na área do saneamento ambiental: entende o autor que uma das maiores dificuldades da proteção ambiental provavelmente reside na omissão dos órgãos ambientais dos entes federativos, que não desenvolvem atividades fiscalizatórias eficientes ou deixam de realizar obras e prestar serviços públicos. Essas omissões obviamente violam DIRETAMENTE deveres constitucionais do Poder Público nos três níveis federativos, já que violam os deveres, por ex., expressos nos artigos 225, caput, 196 e 23, VI, VII, todos da CF. Tais deveres correspondem, obviamente, a direitos fundamentais das pessoas atingidas, e admitir isso significa questionarse se é possível a construção de direitos subjetivos do cidadão para poder exigir do Estado a realização de prestações
positivas (como a garantia de determinados padrões na proteção e preservação, ou até na recuperação e saneamento do meio ambiente). Para tentar responder a tal questionamento, o autor ressalta que havia uma forte corrente jurisprudencial que NÃO admite que o Judiciário imponha à Administração cumprimento de obrigação de fazer (como adoção de medidas positivas de proteção ambiental), razão pela qual muitos juízes se recusam a condenar governos estaduais ou municipais a adotarem determinadas políticas ou medidas de proteção ou saneamento ambiental, utilizando como justificativa o princípio da separação dos poderes (atenção: o autor também frisa que utilizar esse princípio para justificar a não condenação é uma técnica equivocada, já que tal princípio tem sua origem na defesa dos direitos humanos contra estado autoritário; no caso em questão, o princípio está sendo utilizado para sustentar que o Poder Público possa se omitir na realização de direitos fundamentais ao meio ambiente ecologicamente equilibrado!); juízes também costumam utilizar o chamado “princípio discricionário”, segundo o qual não cabe uma indevida ingerência dos Tribunais nas opções de ordem técnica e política dos governos e órgãos administrativos, os quais teriam poder exclusivo de apreciar se as medidas administrativas segundo os quesitos da oportunidade e conveniência (= mérito). De toda forma, é cada vez mais presente um entendimento jurisprudencial que admite a condenação de órgãos estatais a tomarem medidas ativas para promover saneamento básico e prestar serviços de alta relevância para a sociedade, o que é um grande ganho! Mesmo assim, mesmo diante desse progresso, AINDA é muito presente no Judiciário uma atitude formalista, que hesitam em condenar o Poder Público a tomar medidas cabíveis para fazer cessar violações ao meio ambiente. Assim sendo, o autor aduz que tais correições que os Tribunais podem pronunciar em direção ao Executivo omisso devem ser encaradas como um exercício da função do Judiciário que assume um “contrapoder”, o que leva ao entendimento de que ações administrativas (nesses casos de omissão do Executivo) não podem ser postergadas por razões de “oportunidade” e “conveniência”, NEM se o Executivo alegar “contingenciamento financeiro”, porque argumento da reserva do possível NÃO é capaz de impedir efetivação judicial de normas constitucionais! Na solução desse tipo de impasse, o Ministério Público pode utilizar-se de alguns instrumentos de defesa, como “Inquérito Civil”, “Recomendação” ou até “Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta”, através dos quais pode ser efetivada a implantação de políticas públicas. Não se pode duvidar que decisões judiciais causam efeito moralizador e conscientizador nos órgãos governamentais, sendo de suma importância! Ao fim e ao cabo, a questão narrada envolve a própria questão da SUPREMACIA da Constituição, pois, se o texto da CF/88 declara proteção ao meio ambiente e a promoção da saúde pública como DEVERES do Poder Público, também tem que ser dada ao Judiciário a possibilidade de corrigir possíveis omissões de outros poderes. Frise-se que, basta, para que haja correição do Judiciário, um descumprimento de um dever legal, mas que também pode haver condenação judicial no caso da abertura legal de um juízo discricionário para a Administração. De toda forma, grave: o controle judicial deve se restringir à questão da escolha entre AGIR ou NÃO AGIR, e não “como agir”1. A proibição do juiz de administrar no lugar do governante deve conduzir à cautela na formulação técnica do pedido! Na essência, discute-se o que o autor chama de justiciabilidade das políticas públicas (conjuntos organizados de normas + medidas + atos tendentes à realização de determinados objetivos e unificados pela sua finalidade); condutas da Administração Pública voltadas para a consecução de programas/metas previstas em normas constitucionais ou legais; assim, é fácil perceber que promulgar tais leis de políticas públicas NÃO significa um “fim em si mesmo”, mas um começo de uma obrigação que DEVERÁ ser cumprida pela Administração! É preciso que se tenha em mente que o juiz NÃO cria uma política pública, mas impõe aquela já estabelecida na Constituição e na lei. Também há omissões dos órgãos administrativos ambientais nas atividades de licenciamento e fiscalização, o que provoca o não-impedimento de atos ofensivos ao meio ambiente cometidos por particulares; nesse caso, a jurisprudência então dominante vinha aceitado a responsabilização solidária do Estado por omissão administrativa somente nos casos de culpa grave. Ainda assim, já era expressiva a jurisprudência que, nesses casos, responsabilizava o Estado independentemente de qualquer culpa. Trata-se de um avanço, portanto. 2.2 Capítulo 6: “A aplicação efetiva das leis: o verdadeiro problema do Direito Ambiental brasileiro” Um dos aspectos mais fundamentais no estudo do Direito Ambiental é a eficácia das suas normas, lembrando que há a eficácia jurídica (potencialidade da norma ser aplicada ao caso concreto) e a eficácia social (adequação como consequência da produção concreta de efeitos reais na sociedade), também chamada de “efetividade”; no caso das normas ambientais, tem-se que elas ainda não exprimem um “querer coletivo”, possuindo validade formal, mas não eficácia espontânea. No Direito Ambiental brasileiro, a despeito de possuir uma legislação ambiental moderna e bem elaborada, sofre de graves momentos no momento da sua aplicação, motivo pelo qual tem quem diga que as leis de proteção ambiental servem mais para legitimar o sistema político do que para serem executadas... o autor assume: é 1
Tipo assim: o Judiciário pode determinar que a Administração CONSTRUA uma estação de tratamento de esgoto, mas NÃO pode determinar COMO ela vai fazer isso (“ah, a administração pública tem que adotar a tecnologia X, no lugar Y...” --> isso ela não pode!).
certo que existem leis que são criadas por forças políticas, só para exprimirem uma “boa vontade”, mas que muito dificilmente serão aplicadas; chama-se “programação de ineficácia da norma”. Tendo isso em consideração, conclui-se pela necessidade de reflexão pragmática sobre o Direito Ambiental brasileiro, que ultrapasse a norma legal e passe a examinar complexos fenômenos jurídicos, políticos e socioeconômicos. Inicialmente, toda a problemática das dificuldades de implantação de políticas ambientais reside na reduzida “eficácia de comportamento” das referidas leis, porque há uma FALTA DE CONSENSO SOCIAL SOBRE AS MESMAS, o que faz com que o Estado exerça um alto esforço burocrático pra controlar, para alcançar um certo grau de “eficácia de sanção”; ao mesmo tempo, a falta de efetividade da legislação ambiental do Brasil sofre com as estruturas administrativas responsáveis por fiscalizar e executar as leis, já que as mesmas são inadequadas. Levando esses pontos em consideração, advém a importância de estudar a questão das COMPETÊNCIAS e das RESPONSABILIDADES para a correta aplicação das leis ambientais nos três níveis de governo (federal, estadual e municipal). Desde já, o autor avisa que é comum que boa parte dos órgãos ambientais dos diferentes níveis de governo desenvolvam atividades e programas em paralelo, sem estarem integrados num único sistema de cooperação recíproca! É certo que, até aquele tempo, administrações municipais fizessem pouco para colaborarem junto aos órgãos superiores. Essas deficiências são agravadas pelo próprio comportamento das pessoas responsáveis pela política, já que muitas das vezes os cargos administrativos (dentre os quais se inserem os ambientais) são distribuídos segundos critérios subjetivos (clientelismo, nepotismo...). O que há é um gritante déficit de execução na área ambiental. 2.3 Capítulo 7: “As competências comuns do art. 23 da Carta Federal” Sobre o sistema de separação administrativa e celebração de convênios: um dos dispositivos mais importantes da CF para solucionar problemas é o art. 23, que listou competências materiais comuns de municípios, estados e União. Lembre-se que o sistema administrativo brasileiro tem a base no princípio da execução imediata: os funcionários mantidos por cada ente federativo executam exclusivamente dispositivos legais da própria esfera. Como exemplo, a CF/67-69 dispunha que a competência administrativa resultava direta e necessariamente da correlata competência legislativa, razão pela qual a Administração não poderia executar normas de oura esfera política; logo, um estadomembro jamais poderia prescrever aos seus municípios um procedimento administrativo. Apenas em casos de emergência era concedido ao município o direito de executar leis superiores. Além dos casos de urgência, a execução planejada de leis de uma outra esfera estatal no Brasil SEMPRE em sido a celebração de convênios administrativos, que hoje representam importantes instrumentos de colaboração entre a União, Estados e Municípios. Apesar de serem tão importantes, a CF/88 em seu texto original nada previa sobre convênios, o que foi acrescentado através da Reforma Administrativa, que fez inserir o art. 241. Quanto à natureza, a doutrina brasileira entende que convênios não são contratos, mas, sim, ACORDOS JURIDICAMENTE NÃO-OBRIGATÓRIOS ou ATOS ADMINISTRATIVOS COMPLEXOS, mediante os quais uma entidade pública concorda com outra sobre execução de determinada tarefa ou atividade da sua competência. De todo modo, convênios são negociados individualmente entre prefeituras e o estado ou União, contendo geralmente ajuda financeira e técnica para municípios (que geralmente são lascados). Até a elaboração do capítulo, não havia modelos normativos padronizados que poderiam ser aplicados aos convênios de mesmo gênero; essa instabilidade institucional dos convênios, aliada à precariedade da sua administração, vinha criando dificuldades para a sua operatividade. Era uma verdadeira “administração por convênios”, em que os governos estaduais geralmente transferiam somente parte pequena, quase ínfima, dos seus poderes; perceba: o que se cria é um verdadeiro cerco político, ao invés de MUNICIPALIZAR! Diante de tais constatações, o autor entende que o número grande de convênios e acordos celebrados entre diferentes entes federados demonstra uma ausência de um verdadeiro federalismo cooperativo no Brasil! No lugar da cooperação federativa, o Brasil possui uma espécie de federalismo em que as esferas pactuam livremente a fim de superar dificuldades, em que tal colaboração não tem seu fundamento numa parceria equilibrada, mas sim um relacionamento de subordinação, de jogos políticos! Quanto à atribuição própria de competências materiais a todos os entes estatais: o art. 23 da CF, ao definir competências comuns de todos os entes federados, enumera várias tarefas setoriais, cujo cumprimento cabe aos três entes federados ao mesmo tempo (em especial, observe os incisos VI, VII, XI, III e IV). Logicamente, o art. 23 regulamenta competência material, envolvendo realização de medidas administrativas e dizendo respeito à prestação de serviços referentes àquelas matérias. Há autores que pensam que tal artigo é uma constituição expressa de um poder de polícia reventivo e repressivo para municípios nessas áreas; outros autores entendem que a listagem das competências neste artigo serve mais de “medida pedagógica”. Para Maukai (um autor aí), o artigo 23 é expressão do desejo dos membros constituintes de alcançarem um federalismo cooperativo no Brasil, ao mesmo tempo em que tal dispositivo não significa que a lei federal possa ordenar que Estados e Municípios se abstenham ou ajam em determinado sentido (isso constituiria um desrespeito ilícito à autonomia do ente federado, que é garantida pela CF).
Antes de 1988, a maioria dos municípios do Brasil desenvolviam as atividades nas áreas enumeradas no artigo 23, mas com base no “poder de polícia”, e não em uma previsão constitucional (a CF/88 foi a primeira a sistematizar tais competências num artigo). Houve, porém, falta de clareza quanto às possibilidades de ação de esfera local. A CF/88 teve a intenção de abandonar a separação administrativa estrita entre diferentes entes federativos, mas os convênios administrativos continuaram lícitos também nessa nova CF. Esse cenário caótico gera o questionamento: “em que medida a celebração de convênios ainda é pressuposto obrigatório para que municípios apliquem e executem normas jurídicas dos entes estatais superiores?”. De toda forma, na prática, nunca se obedeceu rigorosamente ao princípio de que cada ente federado podia somente aplicar as próprias normas; como ex., há muito tempo municípios aplicaram legislação superior (federal, estadual). Hoje em dia, legislação de alguns municípios preveem expressamente execução e implementação de normas superiores de proteção ambiental. A patente diferença entre COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS e COMPETÊNCIAS ADMINISTRATIVAS também não faria sentido se cada esfera política continuasse podendo executar apenas as próprias normas; se assim fosse, os incisos do art. 23 seriam inúteis! Também não é possível que o art. 23 se refira apenas às tarefas de interesse local que JÁ são de competência exclusiva do município, segundo art. 30, I, CF. Logo, sob o novo regime constitucional, os municípios devem atuar também nas áreas onde não são competentes para editar normas legais (o art. 24 não os autoriza a legislar sobre, no caso). Em razão disso, diz-se que o sistema tradicional da separação administrativa foi parcialmente revisado pela CF/88, já que agora há possibilidade de as prefeituras executarem também normas federais ou estaduais, quando necessário for. Há quem entenda que o art. 23 é, na verdade, norma de atribuição de competências de legislar supletivamente, já que o exercício de algumas competências legislativas exigiriam poder de legislar sobre a matéria; para o autor Krell, esse posicionamento não é correto, porque também é admissível que uma atuação administrativa se dê com base em leis superiores (ou seja, o município pode, sim, exercer uma das competências do art. 23 valendo-se de uma lei estadual ou federal; não precisa criar uma lei municipal só para isso!). Admitir esse posicionamento errado seria violar os próprios arts. 24 e 30 da CF, que listam competências legislativas. De toda forma, a definição dos limites da competência de cada ente federativo (e especialmente do interesse local) deve ser realizada mediante critérios contextuais da realidade de CADA município, dentro de um processo interpretativo. Ainda assim, ressalta o autor que essa maior liberdade na aplicação por parte do município de leis federais e estaduais NÃO diminuiu a importância dos famosos “convênios”, pois somente por meio destes podem ser estipuladas regras e condições para execução do Direito superior e, ainda, seja concedido apoio técnico e financeiro. Quanto à previsão do parágrafo único do art. 23: tal parágrafo previa que uma Lei Complementar futura fixaria normas para cooperação entre os três entes federas, com o objetivo de equilibrar o desenvolvimento e o bem-estar em âmbito nacional. Até hoje, não há essa lei. Para um doutrinador, essa lei só ia servir para interferir a autonomia dos entes federados. Assim, os convênios CONTINUAM sendo o meio mais adequado para a cooperação intergovernamental. Atente que o que o art. 23 fez foi estabelecer trinta funções concorrentes para os três entes federados executarem concorrentemente, mas não criou uma hierarquia cooperativa dentro da federação, e nem disse qual era a titularidade dos serviços! A vagueza do dispositivo tem pontos positivos, mas também tem pontos negativos; em face disso, entende o autor que a edição da lei complementar prevista no p.u. do artigo 23 é imprescindível para que os órgãos ambientais de cada ente federativo atuem segundo uma repartição racional de cada competência material. 2.4 Capítulo 8: “O Sistema Nacional do Meio Ambiente: falhas jurídicas e estruturais” Sobre a formação dos sistemas nacionais e estaduais de administração: como se sabe, o princípio constitucional da autonomia administrativa dos municípios e estados federados faz com que não se possa impor às Administrações municipais um comportamento ativo, tipo criação de secretarias e conselhos/elaboração de planos/criação de cargos/etc. Segundo a ordem brasileira, leis de níveis federativos superiores NÃO estão juridicamente autorizadas a darem ordens administrativas aos órgãos dos entes estatais interiores; por isso, muitas leis preveem tão somente uma integração dos Estados e municípios brasileiros a sistemas administrativos nacionais ou a integração dos municípios aos sistemas estaduais. O que ocorre é que a estrutura de muitos desses Sistemas Nacionais não corresponde aos ditames da divisão administrativa entre os entes da Federação brasileira; por isso, tem-se que as estruturas jurídicas não passam de esboços que precisariam ser preenchidas através de convênios celebrados entre União, estados e municípios. Geralmente, órgãos federais e estaduais não desenvolvem iniciativas necessárias para a celebração de tais acordos com os governos inferiores, para que estes executem e controlem normas superiores (leis, decretos, resoluções de conselhos nacionais e estaduais). A CF/88 apenas se refere à competência da União para instituir o SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS (art. 21, XIX) e o SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (art. 200), mas não menciona que no âmbito desses sistemas a União poderia prescrever regras sobre competências e formas de organização administrativa dos
órgãos estaduais e municipais deles participantes... assim, tudo indica que continua valendo aquela antiga regrinha de que qualquer dos três entes federados pode executar as próprias leis e também pode determinar organização e funcionamento interno de seus respectivos âmbitos administrativos. Saiba que, com a criação de cada vez mais sistemas administrativos, o governo federal e estadual estará reconhecendo a importância do papel dos estados e municípios na prestação dos serviços públicos. Nem tudo são flores, já que muitos dos sistemas administrativos criados apresentam estruturas tecnocráticas, e possuem caráter centralizador, por não respeitar as competências legislativas e administrativas, especialmente dos municípios; por isso, muitos políticos locais (dos municípios) consideram-se incompetentes para solucionar problemas locais, e tentam, assim, desviar a responsabilidade para órgãos administrativos superiores. Logicamente, órgãos políticos do município devem assegurar, no momento de elaborarem suas normas, que os dispositivos locais NÃO entrem em choque com a legislação superior! Saiba que também que a execução concreta das leis pelas prefeituras municipais NÃO pode ser influenciada pelo estado ou para a União, já que esferas superiores SÓ podem tomar medidas através de seus próprios órgãos. Sobre a configuração legal deficiente e o funcionamento peba do SISNAMA: ano de 1981, entra em vigor a Lei 6.938, que criou o projeto de uma Política Nacional do Meio Ambiente, a ser executada mediante um SISTEMA NACIONAL que abrangeria o país inteiro, nascendo, assim, o SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (SISNAMA), servindo hoje de um grande referencial para leis ambientais federais e estaduais. Tal sistema busca integrar órgãos regionais e locais na execução das regras estabelecidas pelo CONAMA, cuja fiscalização e o controle da aplicação das normas e padrões de qualidade ambiental serão executadas pelo IBAMA apenas supletivamente em relação aos órgãos estaduais e municipais (obs.: até hoje, não há uma definição clara dos papeis dos órgãos estaduais e municipais dentro do SISNAMA). Bom, de todo modo, uma quantidade boa dos juristas acha que a instituição do SISNAMA é inconstitucional, já que ele obriga municípios a obedecerem a leis superiores. Assim, em face da falta de obrigatoriedade jurídica da participação ativa dos órgãos seccionais e locais, os sistemas nacionais ou estaduais só funcionam mediante meios indutivos (oferta de ajuda material através de programas e fundos, contanto que o governo interessado tome providências administrativas concebidas nas leis superiores). De toda forma, toda a estrutura do SISNAMA é uma moldura que PRECISA ser preenchida por convênios livremente celebrados entre União, estados e municípios, e também é importante que se diga que NÃO HÁ possibilidade jurídica da instalação obrigatória do SISNAMA, já que continua valendo aquela velha regra de que qualquer uma das três esferas estatais pode executar as próprias leis e também determinar organização e funcionamento dos seus corpos administrativos. De todo modo, as falhas na implementação das normas jurídicas também se manifestam na implementação deficiente da legislação ambiental de todos os entes federados. É LÓGICO que, no Brasil, a fiscalização descentralizada da aplicação das leis ambientais seja melhor, já que apenas no âmbito regional e local é possível ter uma informação precisa das partes concretas do meio ambiente; não se perca de vista que somente as ações da prefeitura são diretamente submetidas ao controle da população. Assim, a lei do SISNAMA partiu da premissa correta de que qualquer política ambiental terá maior probabilidade de resolver problemáticas regionais e locais se puder contar com o apoio da União e dos Estados, sem deixar de incluir diretamente os municípios, pois todos os problemas ambientais surgem localmente. De toda forma, TODO o sistema ainda é viciado pela tecnocracia, e ainda peca por ser CENTRALIZADORA. Essas são as duas críticas feitas pelo autor Krell. Necessário também citar que, no geral, a harmonização entre órgãos ambientais estaduais e as prefeituras ainda não ocorre de maneira satisfatória. No fim, a falta de definição prévia e exata das funções de cada componente do SISNAMA faz com que importantes esforços sejam feitos de forma inadequada, sem produzir o resultado esperado. Quanto ao exercício desarticulado do licenciamento ambiental: o mais importante instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente é a outorga das licenças ambientais. Em 1975, o primeiro Decreto concedia poderes aos estados e municípios para que estes criassem os próprios sistemas de licenciamento; após a criação do SISNAMA, também criou a obrigatoriedade de outorga de licença por parte de órgão estadual competente integrante do SISNAMA. O autor ressaltou que somente aos órgãos do estado (e supletivamente ao IBAMA) foi atribuída a competência de fixar restrições para as atividades poluidoras, sem fazer referência ao município! Quanto à construção normativa do SISNAMA, o autor ressalta que ela tem um principal defeito, que é o que crer que uma lei federal possa criar, de cima para baixo, um sistema completo que defina de maneira exata os campos de atuação de diferentes níveis de governo; NÃO HÁ respaldo legal para isso! Várias prefeituras, por ex., estão elaborando procedimento próprio de licenciamento, já que as novas Leis Orgânicas consideras a concessão de licenças ambientais um instrumento básico da política municipal. De toda forma, SEMPRE o licenciamento ambiental no Brasil foi cumulativo, o que significa dizer que um mesmo empreendimento precisa ser licenciado pelo órgão estadual, municipal, e, às vezes, pelo federal. Saiba que, mesmo que um órgão estadual licencie um empreendimento,
a prefeitura municipal pode avaliar os impactos do projeto e NÃO outorgar o licenciamento! Diante disso, não convém falar por enquanto de um “sistema nacional” na área do licenciamento ambiental! O autor também ressaltou que, no Brasil, o princípio da subsidiariedade não está sendo respeitado suficientemente nos atos de licenciamento ou fiscalização de atividades potencialmente degradadoras do ambiente, já que, segundo tal princípio, entidades estatais superiores SOMENTE devem assumir tarefas que entes menores não possam cumprir eficientemente. Um outro problema da possibilidade de diferentes licenciamentos ambientais superpostos é a cobrança de diferentes taxas; segundo o princípio do Direito Tributário, é vedada a tributação bis in idem: poder estatal não pode cobrar mais do que um tributo na base do mesmo fato gerador. Virtudes e defeitos da Resolução 237 do CONAMA: em face dos problemas acima descritos, a resolução tentou estabelecer um SISTEMA NACINAL DE SUBSIDIVISÃO DAS ATRIBUIÇÕES NAS ATIVIDADES DE LICENCIAMENTO AMBIENTA ENTRE AS TRÊS ESFERAS GOVERNAMENTAIS, cujo objetivo era evitar duplicidade de procedimentos. No entanto, tal resolução não tem o condão de alterar repartição constitucional das competências administrativas, e NEM consegue obrigar órgãos estaduais ou municipais a n-a-d-a, razão pela qual deve ser tida como (ao menos parcialmente) inconstitucional. ENTENDA: Não cabe nem à União, nem ao estado, definir competências dos entes locais! O objetivo de um licenciamento ambiental em um único nível de competência somente pode ser feito através da celebração de convênios. Município possui competência de licenciar qualquer empreendimento ou atividade no seu território, independentemente de se o mesmo será desenvolvido em áreas pertencentes ou sob controle especial da União ou do Estado; ora, é lógico que qualquer atividade vai afetar justamente e imediatamente o seu interesse local! O fato é que a tradição da autonomia administrativa dominante no BR nunca permitiu restrição das tarefas e serviços municipais pela legislação estadual ou federal; para mudar isso, somente por LEI COMPLEMENTAR (p.u. do artigo 23). Entenda que não faz muito sentido exigir convênio para licenciamento local para atividades cujos impactos se limitam ao território municipal, onde o município JÁ É competente para atuar; celebrar convênio com órgão ambiental estadual se faz necessário nos casos em que prefeituras licenciam atividades com impactos regionais, atingindo interesse do ente federativo superior. Uma questão interessante também é a possibilidade do município negar licença ambiental com base em normas principiológicas; o autor entende que há, sim, esse direito até mesmo nos casos em que todos os pressupostos legais foram atendidos: mesmo ciente de que tal margem de discricionariedade possa entrar em colisão com direitos à propriedade privada e à livre iniciativa empresarial... para solucionar tal conflito, basta que a decisão administrativa não infrinja o princípio da legalidade e esteja bem justificada. Quanto ao Estudo de Impacto Ambiental e discricionariedade administrativa: o art. 225, parágrafo 1°, IV, prevê o ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL (EIA), que deve ser elaborado previamente por equipe especial para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de degradação significativa ao meio ambiente. A decisão da Administração (se exige ou não o EIA) é discricionária, pois envolve juízo técnico-valorativo quanto à questão se a possível degradação causada pela atividade é ou não significativa. Essa decisão deve ser norteada pela Resolução 01/86 do CONAMA. Ressalta o autor que não se pode dizer que a exigência do EIA é um ato plenamente vinculado, porque, mesmo se a atividade estiver prevista na lista do art. 2° da resolução supracitada, pode ser que não seja capaz de causar impactos relevantes, de modo que nem seja obrigatória a elaboração do EIA. Bom, por envolver um risco de dano ao meio ambiente, a decisão administrativa entendendo pela desnecessidade do EIA pode ser alvo de ação judicial, podendo ser sindicado pelo juiz, que vai considerar valores constitucionais inerentes à proteção ambiental. Observe, entretanto, que só caberá ao Judiciário analisar a SUSTENTABILIDADE das razões que motivaram o ato administrativo. 2.5 Capítulo 9: “O poder de polícia ambiental” Quanto à evolução do conceito “poder de polícia” e da Adm. Pública: o poder de polícia é hoje uma faculdade excepcional de delimitar direitos subjetivos dos administrativos, com o fim de salvaguardar segurança, salubridade e moralidade públicas. É preciso ressaltar, entretanto, que no Estado de Direito contemporâneo, liberdades e direitos fundamentais garantidos constitucionalmente SOMENTE poderão ser limitados por normas legais que atribuam à Adm. Pública explicitamente os poderes necessários. A doutrina moderna faz relevante distinção entre poder de polícia como manifestação do Poder Legislativo e a atividade de polícia como função da Administração Pública que se faz através dos atos de polícia. No BR, não é muito costumeira tal divisão. Ao fim e ao cabo, entenda que poder de polícia é uma ATIVIDADE, e não uma faculdade! No BR, a competência de polícia (aplicação da lei) pertence normalmente à esfera federativa que tiver o direito de regular a matéria; mas, como certas atividades interessam simultaneamente aos três entes federados, o poder de regular e de policiar se difunde entre todas as administrações interessadas! Macete: a regra é a exclusividade do policiamento
administrativo; a exceção é a concorrência. Saiba também que o mesmo órgão administrativo pode ser eclético no exercício do poder de polícia, e passar, dentro das suas competências, da atividade policial preventiva para a repressiva. Para o autor, não é certo entender que o poder de polícia administrativa autorize que municípios sempre sejam obrigados a executar qualquer lei federal ou estadual quando o seu interesse local for atingido... para certos autores, os órgãos das prefeituras são obrigados a tomar imediatamente as suas medidas e executar todas as leis existentes (sejam locais, estaduais ou federais); essa tese de que a norma atribui aos três níveis de governo o poder para atuar em áreas enumeradas, mas também o dever de tomar medidas necessárias, SÓ PODERIAM SER MANTIDAS ONDE HOUVESSE DENSIFICAÇÃO DO DEVER DE AGIR DO PODER PÚBLICO (como nos casos de vinculação do Executivo em efetivar direitos fundamentais e que deve, por isso, executar serviços públicos essenciais); no caso ambiental, isso não existe, já que o art. 23 apenas atribui competências concorrentes aos três entes federados, que devem cumprir certas tarefas e prestar certos serviços. Obs.: existe uma exceção em que o município pode ser obrigado a fiscalizar (policiar) área de atuação regulamentada pelo estado ou pela União, que é o caso da existência de um estado de necessidade (situações de perigo de grave dano ao meio ambiente de interesse local, desde que haja urgência e inércia, ou por negligência ou por desaparelhamento estatal das adm. superiores). Sobre a competência municipal para aplicar normas ambientais superiores: município brasileiro pode aplicar sanções sobre ilícitos previstos nas legislações federal e estadual, que é justamente o exercício do poder de polícia. A condição para assim agir é a urgência do caso e ausência do órgão fiscalizador formalmente responsável. Logo, admite-se atividade policial-administrativa pelo município também em matérias alheias à sua regulação legislativa, quando ela se vê diretamente interessado na matéria, e o órgão competente encontra-se desaparelhado pra exercê-la de forma eficaz. De outro vértice, é problemático entender que qualquer um dos entes públicos seja competente para aplicar legislação ambiental de qualquer outro nível federativo. De toda forma, a maioria dos estados já possuem legislação ambiental estruturada para fundamentar os seus atos, sem caber ao administrador “escolher” qual norma quer aplicar. Sobre a aplicação de sanções administrativas entre órgãos públicos de diferentes entes federados: óbvio que é possível, até porque a imunidade recíproca dos entes federativos só existe no âmbito tributário; logo, faz parte das competências administrativas dos municípios fiscalizar áreas de propriedade estadual ou federal que são importantes para o meio ambiente. Assim sendo, todo órgão público deve respeitar leis de outras esferas estatais; quando isso não ocorrer, órgãos legalmente previstos para a proteção e aplicação das leis devem ter o direito de lavrar autos de infração. Conclusão em tópicos: • • • •
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Diferenciação categórica no BR entre “atos vinculados” e “atos discricionários” acarreta dificuldade para que se compreenda quais são as principais características de tais atos. No Brasil, também existe responsabilidade primordial dos órgãos da Administração Pública pela aplicação efetiva das leis. Há direitos individuais cujo exercício sempre vai colidir com a sua função social, em detrimento do interesse público e de interesses difusos. No caso do direito ambiental especificamente, o controle judicial realmente deve ser mais intenso e sensível; ainda assim, o autor aduz que não se pode atribuir aos juízes todo o poder do mundo. Na apreciação do caso concreto, o julgador deve se anular decisões administrativas insustentáveis ou que colidem com princípios constitucionais, casos em que ele fará ponderação de valores jurídicos e interesses sociais. Conceito de poder de polícia serve somente para descrever ato da aplicação da lei, mas não é capaz de gerar competências de atuação do Executivo. Lembre-se: um verdadeiro poder-dever jurídico de atuação dos órgãos ambientais só pode ser construído através de uma interpretação sistemática das normas constitucionais que estabelecem direitos fundamentais. 2. Livro: “ESTADO SOCIOAMBIENTAL E DIREITOS FUNDAMENTAIS”, com org. de Andreas J. Krell. 3.1 Capítulo 3: A relação entre proteção ambiental e função social da propriedade nos sistemas jurídicos brasileiro e alemão
Conforme artigo 225 da CF/88, propriedade privada deve estar pautada no valor da proteção ao meio ambiente.
Quanto à função social da propriedade e proteção ambiental no BR: utilização da propriedade (que é livre, a priori), deve atender à função social (art. 5°, XIII, CF), e se conformar às restrições determinadas pelo Poder Público, com o objetivo de que o seu uso não coloque em risco valores ou garantias outras asseguradas à coletividade. O autor também frisa que não se trata de instituto com inspiração socialista, mas, sim, capitalista, pois configura execução da atividade do produtor de riquezas. De toda forma, a função social passou a integrar o conceito da propriedade, justificando-a e legitimando-a. Após colacionar o art. 1.228 do CC/02, o autor explica que o atendimento à função social é um dever ínsito, de caráter absoluto e integrante do próprio conteúdo do direito de propriedade, correspondendo a esse dever “o direito do alter (sujeitos ativos totais) a que o uso da propriedade atenda à sua função social e à finalidade econômica”. Após os anos noventa, surgiu no BR um movimento sociopolítico e jurídico no sentido de substituir reconhecimento incondicional dos direitos individuais de propriedade plena pela noção da FUNÇÃO SOCIAL E AMBIENTAL DA PROPRIEDADE E DA CIDADE, significando dizer que o exercício do direito ambiental SEMPRE SERÁ limitado pela sua FUNÇÃO AMBIENTAL; ou seja, o conteúdo da noção da propriedade privada está limitado pela função ambiental. Tem-se, portanto, no âmbito dos bens e valores ambientais/urbanísticos, um direito que já nasce limitado. Ademais, saiba que o Estatuto da Cidade desempenha papel interessante na fixação e cumprimento da função social e ambiental da propriedade privada, que antes ficava a cargo do município. Quanto às bases constitucionais da definição e restrição do direito à propriedade em prol do meio anbiete no sistema da Lei Fundamental Alemã: na ALE., a garantia constitucional da propriedade é regulada em artigo próprio, o art. 14, que possui dois principais elementos: determinações de conteúdo e limites (concretizam a função social da propriedade fixando possibilidades de uso e disposição desta última, consistindo em uma determinação geral e abstrata de direitos e deveres através do legislador a respeito de bens jurídicos // em regra não há pagamento de indenizações em razão de tais medidas) e a desapropriação (dá-se quando um direito patrimonial protegido é subtraído de um particular total ou parcialmente por meio de ato soberano para realizar tarefa pública). Além de tais normas sobre a propriedade, foi introduzida na LF o art. 20, que entendia que o Estado protegia por sua responsabilidade para com gerações futuras, bases naturais da vida e os animais; segundo entendimento alemão jurisprudencial e doutrinário, tem-se aí uma norma-fim, que não representa direito fundamental, mas uma norma de efeito jurídico objetivo, que tornou proteção ambiental uma tarefa estatal fundamental, a ser observada permanentemente pelo Poder Público. De todo modo, no sistema alemão de hoje, construção dogmática de uma “vinculação ecológica” NÃO pode ser entendida como prolongação apenas da sua função social; para que surta efeitos, entretanto, o seu conteúdo deve ser colocado em uma relação razoável com a garantia constitucional do art. 14 da LF, no sentido de que ele modifica a função social da propriedade. De toda sorte, a propriedade imobiliária possui vinculação social especial, pois sua finitude e imprescindibilidade do solo não permitem entregá-la às forças livres do mercado e ao arbítrio do indivíduo. Costuma prevalecer no direito alemão o entendimento de que tantos leis parlamentares, como normas gerais editadas pelo Executivo, são aptas a concretizarem o conteúdo e definirem os limites da função social da propriedade, podendo também haver restrições de uso econômico de bens imóveis de particulares, as quais, em princípio, devem ser indenizadas por aprte do Estado. Ainda assim, a fixação de limites legais do direito à propriedade não pode esvaziar o seu “âmbito nuclear”; de acordo com BVerfG (?!), de acordo com objeto de propriedade, a competência de regulamentação do legislador encontra limites diferentes ==> onde a propriedade assegura liberdade individual no âmbito patrimonial, ela goza de uma proteção especial. Em geral, o legislador, ao determinar conteúdo e limites da propriedade, é obrigado a colocar interesses do proprietário e aspectos do bem comum em relação de equilíbrio. Para além, determinação de conteúdo/limites pode ser interpretada como medida desapropriatória, já que envolve caso concreto e pagamento de indenização. Por consequência, todas as questões legais de uma possível restrição de uso de um bem por razões ecológicas DEVEM SER RESOLVIDAS NO PRÓPRIO ÂMBITO DAS DETERMINAÇÕES DO CONTEÚDO/LIMITES DA PROPRIEDADE; aliás, em princípio, a compensação não deve ser prestada em dinheiro preferencialmente, mas e m concessão legal de discricionariedade aos órgãos administrativos ou previsão de prazos transitórios, bem como por normas que ajudam a tentar soluções inadequadas para determinadas constelações fáticas em casos concretos. Ao mesmo tempo, só se pode falar de desapropriação nos casos onde houver previsão legal expressa. Em 1999, BVerfG acrescentou detalhes quanto aos contornos jurídicos da propriedade e sua função social, permitindo indenização também nos casos de concretização do conteúdo da propriedade “definição indenizável de conteúdo”; decidiu que, nos casos em que o legislador queira definir conteúdo e limites da propriedade, teria ele de fixar também condições, formas, etc., da compensação de possíveis encargos desproporcionais de proprietários. Ao mesmo tempo, determinou obrigação da Adm. Pública de decidir sobre compensação já no momento da concretização da restrição da propriedade.
Sobre as indenizações polêmicas do Direito alemão no âmbito da proteção da natureza: Em casos específicos, o direito alemão entende que podem ser cumpridas condições materiais de uma desapropriação sujeita à indenização, especialmente quando medidas estatais de proteção ambiental tornam inviáveis ou pouco rentáveis formas de uso agroflorestal nas respectivas áreas; para tais medidas de efeito desapropriatório, legislação prevê pagamento de indenização; além disso, introduziu-se uma compensação de equidade para casos em que não atingissem o grau de uma desapropriação, mas nos quais os beneficiados pelas limitações do regular uso dos terrenos devam pagar justa compensação financeira pelas desvantagens econômicas causadas aos proprietários. No geral, deve ser frisada a dificuldade prática de fixação exata das possíveis perdas de produção nos diferentes setores agrários e florestais, já que existem, muitas vezes, alternativas para manter aproveitamento econômico do solo; por isso, deveriam ser pagas compensações monetárias apenas em casos de distorções evidentes da concorrência dos produtores da mesma região. Referência oportuna para avaliar adequadamente a obrigatoriedade de uma compensação monetária pela restrição do uso do solo é saber se a utilização anteriormente exercida era lícita; esta, por sua vez, depende enormemente da maneira como foi cunhado o conteúdo ecológico do terreno. Quanto à situação doutrinária e jurisprudencial da definição e restrição da propriedade privada no Brasil e os pontos de divergência: o princípio da função social da propriedade foi introduzido formalmente pela CF/88, que prevê a garantia da propriedade em diferentes dispositivos, como no art. 5°, XXII e XXIII. O art. 170 também o inclui como princípios gerais da ordem econômica. A propriedade urbana é regulamentada no art. 182, ao tempo em que a propriedade rural tem o art. 5°, XXVI, e arts. 184-186. As limitações ao direito de propriedade ocorrem mediante LEIS PARLAMENTARES e MEDIDAS DO EXECUTIVO (limitações administrativas), estabelecidas por normas gerais e abstratas; até hoje, há autores que entendem equivocadamente que a função social da propriedade é meio para justificar apenas limitações da propriedade privada em prol do interesse público por meio do “poder de polícia”, desconhecendo que a função social NÃO APENAS LIMITA o direito de propriedade, mas O DEFINE E O ESTRUTURA nas diversas áreas de incidência. Entretanto, efeitos das limitações ao direito de propriedade no BR são distintos das determinações de conteúdo e limites da LF alemã, e uma das principais razões para isso se deve à aplicação da proteção do direito adquirido (art. 5°, XXXVI da CF) ao direito de propriedade Para o autor, ainda são várias as decisões judiciais baseadas em noção equivocada do direito adquirido, que entra em contradição com a função ambiental intrínseca ao direito de propriedade e o respectivo dever constitucional em relação ao meio ambiente; era, portanto, vedado ao legislador modificar possibilidades de uso e disposição da propriedade no decorrer do tempo, uma vez que seu conteúdo era definido no momento de sua aquisição, sem possibilidade de alteração posterior. Em algumas decisões do STF, foram utilizados argumentos de que a proteção ambiental seria requisito intrínseco ao exercício do direito de propriedade privada, e, portanto, condição para realização de sua função social. Até hoje, o autor ressalta que a teoria da função social da propriedade não tem tido eficácia prática e previsível; em geral, a fórmula de ampliação interpretativa da função social da propriedade mostrou-se insuficiente, tanto na doutrina, como na jurisprudência. No ramo da proteção à natureza, são comuns intervenções na propriedade, inclusive na rural; ainda assim, não há uniformidade na legislação brasileira em relação às normas indenizatórias de proteção ambiental; o que existem são leis que preveem indenizações para limitações específicas, relacionadas à localização da propriedade, sem necessidade de um exame da desproporcionalidade da limitação sofrida! Ao fim e ao cabo, entende o autor que é duvidoso condicionar decisão sobre indenização do proprietário de um imóvel apenas ao fato de que este tem sido enquadrado (ou não) em algum regime jurídico especial de proteção ambiental. Por fim, é IMPRESCINDÍVEL que o julgamento seja orientado por critérios concretos do caso! 3. Livro: “DIREITO CONSTITUCIONAL AMBIENTAL” 4.1 Capítulo 1: A dimensão ecológica da dignidade da pessoa humana e a dignidade da vida em geral Quanto à dimensão ecológica da dignidade da pessoa humana: a fim de discorrer sobre o tema, o autor cita que é de Kant a fórmula mais utilizava pelas conceituações jurídico-constitucionais da dignidade da pessoa humana, já que ela coloca a ideia de que o ser humano não pode ser usado como simples objeto (um meio), mas, sim, como um fim em si mesmo, como um sujeito, em qualquer relação; assim, atribui-se um valor intrínseco à cada existência humana, pois ter o indivíduo como um fim em si mesmo significa dotá-lo de autonomia, liberdade, racionalidade! Dessa forma, o autor entende que a proteção ética e jurídica do ser humano é uma manifestação da concepção Kantiana de dignidade da pessoa humana. Como cediço, tal valor está previsto no art. 1°, III, da CF, e é um verdadeiro ponto de partida para a ordem estatal, sendo também considerado uma “matriz axiológica do ordenamento jurídico, pois é a partir dele que demais princípios e regras se projetam”; ainda assim, ATENÇÃO: a dignidade NÃO é o único valor a ser perseguido, e
também há direitos fundamentais que não encontram fundamento direta e exclusivamente na dignidade da pessoa humana! De toda forma, a dignidade humana foi e continua sendo o princípio de maior hierarquia na CF/88. Na seara do Estado Socioambiental de Direito (consagrado na CF/88), a dignidade da pessoa humana é o principal, mas não é o único fundamento da comunidade estatal, e projeta toda sua luz para o ordenamento jurídico-normativo, vinculando entes públicos e privados. Para além dessa força como princípio e valor jurídico, a dignidade da pessoa humana projeta reflexos tanto em direitos de natureza defensiva (negativa), como de natureza prestacional (positiva); em face de tamanha importância, entende o autor que é necessário reconhecer eficácia dos direitos fundamentais (principalmente da dignidade humana) também nas relações entre particulares, e também é importante o reconhecimento da dimensão normativa do princípio constitucional da solidariedade e dos deveres jurídicoconstitucionais. É a partir desse princípio que se projeta uma gama de posições jurídicas subjetivas e objetivas, com a função de tutelar condição existencial humana contra violações do seu âmbito protetivo. O princípio da dignidade da pessoa humana, apesar de ser muito utilizado numa perspectiva individual, também possui uma dimensão social, pois o indivíduo e a comunidade são elementos integrantes da mesma realidade político-social; assim, a dignidade do ser não é nunca a do indivíduo isolado ou socialmente irresponsável, devendo também ser exigida dignidade de todos os integrantes do corpo social! Após falar dessa dimensão social, o autor arremata: NÃO É POSSÍVEL PENSAR EM TAL PRINCÍPIO SEM CONSIDERAR O SEU CARÁTER MULTIDIMENSIONAL, o que torna também necessário atribuí-lo uma DIMENSÃO ECOLÓGICA DA DIGNIDADE HUMANA, que vai muito além de uma dimensão meramente biológica ou física, pois essa dimensão ecológica abrange A VIDA COMO UM TODO, tendo como objetivo garantir um padrão de qualidade e segurança ambiental amplo. Perceba que há uma lógica evolutiva e cumulativa nas dimensões da dignidade da pessoa humana: em cada etapa histórica, formava-se uma materialização da proteção e promoção da dignidade humana; antes, os direitos liberais e sociais formavam o conteúdo do princípio, ao tempo em que hoje também se tem os direitos de solidariedade... enfim, hoje se tem uma nova dimensão para o princípio da dignidade da pessoa humana, que é justamente a DIMENSÃO ECOLÓGICA. {O autor é claro em afirmar que adota a concepção kantiana (antropocêntrica) como uma “moldura conceitualnormativa aberta”, de modo a justificar a inclusão da dimensão ecológica no princípio da dignidade da pessoa humana. Após afirmar isso, ele já antecipa que a reflexão feita no capítulo é no sentido de apontar a necessidade do reconhecimento de uma dignidade da vida EM GERAL, e não apenas da vida humana!} Há dignidade da vida para além da vida humana? O autor inicialmente se dedica a repensar a concepção kantiana de forma individualista e meramente antropocêntrica, afirmando que deve ser vedada qualquer prática de objetificação de inúmeras outras formas de vida, e não apenas a vida humana! Ou seja, o autor trabalha numa expansão da concepção kantiana (que fica restrita ao INDIVÍDUO apenas), a fim de que seja reconhecido que outras formas de vida também devem ser reconhecidas como UM FIM EM SI MESMO, dotadas de VALOR PRÓPRIO e não meramente instrumental! Para trabalhar na extensão do conceito, o autor ressalta que, para Kant, dignidade era atributo exclusivo do ser humano, já que todo o “universo não humano” estaria enquadrado no conceito de coisas, e não de “pessoas”; obviamente, o autor discorda desse entendimento limitado de Kant, já que deve ser considerada não apenas a vida humana, mas, sim, o reconhecimento da proteção do ambiente como um verdadeiro valor ético-jurídico fundamental, de forma a preservar TODOS os recursos naturais, incluindo as formas de vida existentes no planeta! Após discorrer sobre esse ponto, o autor cita doutrinadores, e inclusive cita uma tese de que “a ideia de dever moral de um tratamento não cruel dos animais deve buscar fundamento não mais na dignidade humana ou na compaixão humana, mas, sim, na própria dignidade inerente às existências dos animais não humanos, e às outras formas de vida em geral”. Também cita uma corrente filosófica antiga que entendia que os animais não possuíam razão, o que veio a ser reforçado após Descartes, que definitivamente SEPAROU a relação do ser humano com a natureza, o que tornou possível a instrumentalização e apropriação da natureza e dos recursos naturais; como consequência, hoje vivemos um estágio preocupante de degradação ambiental e do risco existencial. {Entende o autor que é INSUSTENTÁVEL pensar o ser humano sem relacioná-lo com o espaço ambiental e com a cadeira de vida, e é uma relação recíproca: ao fragilizar as bases naturais que dão suporte à vida humana, a própria vida humana torna-se vulnerável!} Ao passar do discurso filosófico para o jurídico, o autor ressalta que há vários documentos legislativos internacionais e de direito comparado que abordam a temática do valor intrínseco de todas as formas de vida não humanas, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos dos Animais da UNESCO (1978). O autor chega a citar até a Constituição Suíça e o idealizador Peter Saladin, que formou uma concepção de justiça ecológica pautada por três princípios: *princípio
do respeito humano pelo ambiente não humano; *princípio da solidariedade; *princípio da responsabilidade para com as futuras gerações. A Constituição do Equador também tem capítulo sobre Direitos da Natureza (Pacha Mama). A Lei Fundamental Alemã também cita “bases naturais da vida”, privilegiando outras formas de vida e não somente a humana. Ou seja: INDUBITÁVEL que as discussões recentes da ética animal também vêm impactando as estruturas do Direito. Há até quem trabalhe a ideia de direitos humanos ecológicos, que buscam reconciliar a base filosófica dos DH’s com os princípios ecológicos! Perceba a relação: o indivíduo interage não apenas com o ambiente social, mas, também, com o ambiente natural, o que significa dizer que o Estado Democrático de Direito também é um Estado Socioambiental, razão pela qual o indivíduo também deve respeitar valor intrínseco de outros seres. O referencial dos DH’s também é utilizado por doutrinadores como base para traçar evolução histórica e cultural dos direitos dos animais, e é importante frisar que a luta em defesa de novos valores NÃO deve servir para deslegitimar direitos humanos, mas, sim para reforçar desenvolvimento pleno da vida. Assim, um defensor dos direitos dos animais ou da vida em termos gerais deve, antes de tudo, ser também defensor dos direitos humanos! Ao término de tudo que foi exposto, é INQUESTIONÁVEL que a consagração da proteção ambiental e o reconhecimento da qualidade da vida como elemento normativo que integra o princípio da pessoa humana se traduzem na NECESSIDADE de reformulação conceitual da “dignidade da própria pessoa humana”; deve ser superada a noção individualista, “especista”, de forma a atribuir dignidade para outras formas de vida e para a natureza como um todo. Sobre a ética animal: tal área questiona a condição moral dos animais, se eles possuem direitos e interesses, e se há deveres dos seres humanos para com os animais não humanos. Diversos autores, ao observarem tais questionamentos, posicionaram-se num movimento mundial em defesa do bem-estar dos animais, bem como um reconhecimento dos direitos dos mesmos. Resumo dos posicionamentos citados pelo autor: • •
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Para Hans Jonas: outras formas de vida também devem ser reconhecidas como “fim em si mesmo”. O dever humano deve ser ampliado para além da sua própria dimensão, para incluir o respeito pelas coisas extrahumanas. Para Peter Singer: atribui condição moral dos animais não humanos, o que nos obriga a ter igual consideração para com tais animais. Igualdade é ideia moral, e não afirmação de um fato, e, já que os animais são sencientes e independentes, não podem ser apenas um meio para fins humanos. Não interessa se animais não humanos não podem se comunicar; se eles são capazes de sentir sofrimento, também devem gozar de proteção e de consideração pelos humanos. ParaRegan: animais humanos e não humanos são sujeitos de uma vida, o que os torna iguais do ponto de vista moral, devendo possuir o mesmo respeito e consideração.
Quanto à superação do antropocentrismo clássico e reconhecimento da dignidade do animal não humano e da vida em geral: o autor cita outro doutrinador que admite um “antropocentrismo alargado”, com a finalidade de tutelar o ambiente independentemente da utilidade direta ou benefícios ao homem, que deve colaborar com a natureza. Importa assinalar que a própria CF consagrou a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais (art. 225, parágrafo 1°, I) e tal formulação traz a ideia de que tais processos ecológicos seriam aqueles essenciais à sobrevivência do PLANETA, para além da sobrevivência do homem! Há quem defenda o termo “antropocentrismo ecológico”, que entende que a natureza é muito mais do que mero instrumento, razão pela qual deve ser valorizada pelo Direito. O autor também cita parte da doutrina que entende que não é possível dar direitos aos animais, uma vez que os animais existem em face de um interesse do ser humano; outro doutrinador entende assim também, mas com base em outra premissa, que é a de que o Direito só pode regular relações entre seres livres e responsáveis. Bom, mesmo nesses últimos casos, não se pode afastar a necessidade ética e jurídica de se questionar se a tutela do meio ambiental pode se dar de forma autônoma, ao se reconhecer “dignidade” à vida não humana e aos animais. A resposta: se a dignidade é um valor PRÓPRIO e distintivo, é possível o reconhecimento de tal valor como inerente a outras formas de vida não humanas... a própria “vida”, de um modo geral, traz consigo a dignidade! A tendência contemporânea é a de reconhecer proteção constitucional e infraconstitucional da fauna e da flora, bem como da natureza em si, contra atos predatórios e de crueldade, os quais carregam “indignidade”! {Nem todas medidas de proteção dos animais e da natureza buscam assegurar aos seres humanos sua vida com dignidade, mas, sim, buscam assegurar a preservação da vida em geral do patrimônio ambiental; deste modo, reconhece-se que a dignidade é um valor em si, algo intrínseco!} Nesse sentido, a CF/88, em seu art. 225, parágrafo 1°, VII, sinaliza que o legislador reconheceu o valor inerente a outras formas de vida não humanas, protegendo-as das próprias ações humanas; ou seja, é lógico que não é apenas o ser humano que está sendo protegido. Desta feita, o constituinte demonstra preocupação com o bem-estar dos animais não humanos, refutando a noção de que os mesmos são apenas instrumentos. Outro argumento para sustentar a dignidade da vida de
um modo geral como valor PRÓPRIO/AUTÔNOMO é a proteção constitucional de espécies ameaçadas de extinção, porque, se formos analisar bem, a extinção de determinada espécie não traz malefício direto ao ser humano! O autor também cita a Lei dos Crimes Ambientais, que criminaliza condutas de degradação ecológica ou de maus-tratos aos animais. Na jurisprudência brasileira, são encontradas grandes decisões no âmbito do Supremo Tribunal Federal, como por exemplo a vedação da farra do boi em SC e da caça amadora no RS, em que o juiz reconheceu valor intrínseco ao ambiente, rompendo com o antropocentrismo clássico. Há um novo contrato político-jurídico ecológico? A ampliação da noção da dignidade da pessoa humana e o reconhecimento de uma dignidade de vida não humana apontam para uma releitura do conceito de “contrato social”, de forma a alcançar uma espécie de “contrato ecológico”/”contrato natural”, em que o ser humano abandona condição de dominador e assume em face do mundo natural uma postura de reciprocidade na relação entre indivíduoambiente. Assim, como a Declaração dos Direitos do Homem buscou dar fim ao “parasitismo” entre seres humanos, atualmente é a hora de, através de um contrato natural, acabar ou minimizar o impacto maléfico causado pelo homem na natureza! O autor registrou também a importância da conscientização e sensibilização do ser humano acerca do respeito à vida do animal e dos entes naturais em geral, até porque os valores fundamentais do Estado (dignidade, liberdade etc) devem ser ampliados para além do espectro humano. Conclusões do artigo em tópicos: 1. Compreensão multidimensional e não reducionista da dignidade da pessoa humana = reconhecimento de uma dimensão ecológica da dignidade humana, que não pode ser restringida a uma dimensão puramente biológica/física. 2. Lógica evolutiva e cumulativa nas dimensões da dignidade da pessoa humana pode ser também compreendida a partir de uma compreensão histórica. 3. Vedação de qualquer prática de coisificação não deve ser limitada apenas à vida humana, também devendo contemplar outras formas de vida. Defendeu-se a consagração do status moral dos animais sensitivos. Falou-se na dignidade do animal não humano. 4. Consagração da proteção ambiental no âmbito jusfundamental e reconhecimento da qualidade de vida como elemento normativo próprio do princípio da dignidade da pessoa humana. 5. CF/88 traz em seu bojo a tutela da função ecológica da flora e da fauna, o que dá uma dimensão de sistema ou ecossistema ambiental. Assim, a CF tenta superar ou relativizar o antropocentrismo kantiano e reconhece valor à vida e à natureza. 6. Livro: “DIREITO CONSTITUCIONAL AMBIENTAL” 6.1 Capítulo 6: O papel do poder judiciário brasileiro na tutela e efetivação dos direitos (e deveres) socioambientais O art. 225 da CF traz em si um “direito-dever fundamental”, que traça um modelo de tutela ambiental que tem como guardiões o Estado e atores privados (“toda coletividade”), os quais ficam responsáveis pela tutela e promoção do ambiente; diante de tal responsabilidade, é lógica a necessidade de que seja dada a oportunidade de tais atores protetivos levarem as lesões ao patrimônio ambiental à apreciação do Judiciário. Há até instrumentos jurisdicionais e administrativos que são aptos a fazerem isso (como a Ação Civil Pública e a Ação Popular). A CF/88 foi tão inovadora em ampliar o dever de cidadania e a proteção ao meio ambiente que o número de causas judiciais ambientais cresceu assustadoramente após a sua promulgação, sendo este o maior reflexo da “constitucionalização das questões ambientais”. Considerando essa crescente judicialização ambiental, o autor busca refletir no texto acerca de COMO o Poder Judiciário pode atuar de forma a efetivar a proteção ao meio ambiente e para efetivar direitos e deveres socioambientais. Sobre a atuação do Judiciário brasileiro na tutela e efetivação dos direitos e deveres socioambientais: o Estado Socioambiental de Direito Brasileiro delineado na CF/88 é também um Estado protetor e promotor de direitos fundamentais, razão pela qual se diz que todos os poderes e órgãos estatais estão vinculados à concretização do direito fundamental a viver em um ambiente sadio, sem prejuízo da responsabilidade dos particulares. Essa tarefa coloca para o Brasil a missão constitucional de promover e garantir o desfrute ao DIREITO AO AMBIENTE.
{TODOS os poderes estatais estão constitucionalmente obrigados a atuar (no âmbito da sua esfera de competências) no sentido de obter maior eficácia e efetividade dos direitos e deveres fundamentais socioambientais.} A não adoção de medidas protetivas (legislativas e executivas) por parte do Estado constitui-se numa PRÁTICA INCONSTITUCIONAL, que pode vir a sofrer CONTORLE JUDICIAL (abstrata ou difusa). O Poder Judiciário, mesmo com tantas outras alternativas (como o Inquérito Civil e o Termo de Ajustamento de Conduta), tem atuado como um agente privilegiado na esfera da proteção ambiental, o que não poderia deixar de ser, considerando a garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional de qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5°, XXXV, da CF/88). Ou seja: o controle judicial de políticas públicas ambientais deve ser visto como mecanismo conferido ao cidadão, de feição nitidamente democrático-participativa, principalmente no que diz respeito a exigir do Estado uma maior tutela ambiental. A ação judicial também pode ser vista como instrumento de atuação política, o que é comum numa democracia direta e participativa, o que também vem sendo reconhecido em grandes acordos internacionais (os quais possuem uma intenção de conferir aos juízes e Tribunais a função de “revisar” – no sentido de controlar e fiscalizar – as ações ou omissões praticadas por particulares ou pelo Estado em prejuízo ao ambiente). Isso vem sendo internalizado no Brasil; como exemplo, há o caso das ações civis públicas ambientais, em que o juiz assume tarefa mais participativa, o que é uma inovação (se considerado o princípio do impulso oficial). Assim, há de ser enfatizado o dever dos órgãos judiciais de interpretar o processo e técnicas processuais no sentido de sua adequação à tutela ambiental eficaz e constitucionalmente exigida. Quanto à proteção do ambiente na jurisprudência do STJ e STF: antes de falar das decisões, o autor comenta acerca do regime jurídico dos direitos e deveres fundamentais socioambientais e sua consagração pelo Poder Judiciário. Nesse sentido, o autor ressalta que o Judiciário, ao reconhecer o direito ao ambiente como um verdadeiro direito e garantia fundamental (mesmo não estando presente no rol do art. 5°), valendo-se da cláusula de abertura no parágrafo 2° do art. 5° da CF, deu uma grande contribuição para a tutela e promoção dos direitos e deveres socioambientais! Ao ser assim reconhecido, o direito fundamental ao ambiente ganha algumas peculiaridades, tal como os demais D.F.’S: • • • • •
Possui aplicabilidade direta e imediata; Constitui-se numa cláusula pétrea; Sujeita-se à proibição do retrocesso social; Normas constitucionais em matéria ambiental passam a gozar de eficácia plena, não podendo ter sua aplicação restringida por regulamentação legal; O direito fundamental ao ambiente deu origem ao “dever de solidariedade” (reconhecido pelo STF), segundo o qual há um dever de tutela ambiental por parte da coletividade (= atores privados), para além do Estado.
Em um segundo momento, o autor ressalta que a proteção ambiental tem em seu conteúdo um teor econômico forte, já que a implementação da proteção ambiental gera limitação ao exercício do direito de propriedade, da autonomia privada e até da livre inciativa. Reconhecer uma função social e uma função ecológica da propriedade (o que fez a CF/88 - arts. 5°, XXIII, 170, III e VI, 186, caput e II) significa dizer que há uma ORDEM JURÍDICO-ECONÔMICA VINCULADA AO DEVER DE UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, de modo que o direito de propriedade necessariamente sofrerá limitações em prol do meio ambiente. O STJ vem aplicando tais preceitos de forma satisfatória, principalmente no que diz respeito à responsabilidade objetiva do proprietário da área degradada; ainda assim, vinha aplicando segundo uma compreensão mais civilista do que constitucional (como ex.: o STJ entende que a reserva legal e a área de preservação permanente caracterizam hipótese de obrigação civil de natureza propter rem, e não dever fundamental de proteção ambiental dos particulares proprietários ou possuidores de certo bem). Ressalta-se também que o judiciário (principalmente STJ) também vinha reconhecendo a dimensão prestacional (positiva) do direito fundamental de proteção ambiental, ao determinar, por ex., que o proprietário repare o dano ambiental causado. O autor também citou o instrumento processual da inversão do ônus da prova, que é um dos grandes responsáveis pelo equilíbrio de fato entre as partes nos processos judiciais; tal instrumento vem sendo aplicado pelo STJ nos casos de Ação Civil Pública de natureza ambiental, admitindo extensão das regras de proteção do consumidor para a tutela ecológica. Aliás, o autor ressalta que a própria aplicação do princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, já que compete ao promotor do dano ambiental comprovar que não causou o dano ou que a substância lançada no meio ambiente não é lesiva. O STJ, ao admitir a inversão do ônus da prova em matéria ambiental, também estimulou, ainda que indiretamente, indivíduos e ONGS a acionarem o Judiciário, nos casos de danos ao ambiente. Perceba que há um fortalecimento da democracia! Já no caso das Ações Civis Públicas, o Juiz deve assumir postura participativa, relativizando o princípio do impulso oficial, já que o tema é de extrema relevância social e envolve direito indisponível! Vê-se, portanto, que a intervenção judicial não é um poder, mas sim um DEVER constitucional.
No que diz respeito à crueldade contra animais e a tutela do bem-estar dos bichanos e da dignidade da vida, a CF no art. 225, parágrafo 1°, VII, já enunciava o reconhecimento de outras formas de vida não humanas, protegendo-as! Assim, deixou transparecer tutela da vida em geral, e a preocupação ante o bem-estar dos animais não humanos. Fala-se, então, da tutela da função ecológica da flora e da fauna, fazendo com que haja proteção integrada dos recursos naturais! Na jurisprudência brasileira, tem-se visualizado grandes feitos, a saber: • •
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A vedação de práticas cruéis contra a vida animal tem muita aplicação no STF, que vem reconhecendo a vida animal como um fim em si mesmo, superando o antropocentrismo clássico! Já no que se refere ao saneamento ambiental: uma outra forma de governança judicial em matéria ecológica é o caso do saneamento básico, que permeia a tutela dos direitos sociais quando da proteção do ambiente. Tem-se, então, permitido a fiscalização da esfera de discricionariedade da Administração Pública em tais situações; como ex., o autor cita o caso em que o Judiciário impôs à Administração Pública a realização de obra de recuperação de solo imprescindível à proteção ambiental, destacando a possibilidade de controle judicial da conveniência e oportunidade do ato administrativo discricionário. Caso no STJ em que a Corte Superior manifestou-se sobre a possibilidade de controle judicial em razão da prestação descontinuada de coleta de lixo (serviço essencial desempenhado pela Administração): o julgado entendeu que a omissão acarretou prejuízo ao direito fundamental à saúde, ambiente e dignidade humana, e que NÃO HÁ DISCRICIONARIEDADE DO ADMINISTRADOR FRENTE AOS DIREITOS CONSAGRADOS CONSTITUCIONALMENTE, razão pela qual era possível controlar judicialmente discricionariedade administrativa em face de descumprimento de dever. No TJRS, apontou-se a configuração de um núcleo protetivo mínimo comum entre direitos sociais (direito à saúde, no caso) e a proteção do ambiente. No caso, reconheceu-se um direito fundamental ao mínimo existencial socioambiental como conjunto de medidas mínimas em termos de qualidade ambiental. STF entendeu como CONSTITUCIONAIS as portarias do Departamento de Operações de Comércio Exterior (DECEX) e da Secretaria de Comercio Exterior (SECEX), e as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), que proibiram a importação de pneus usados, uma vez que tal prática viola a proteção constitucional conferida ao ambiente! Entenda de uma vez por todas que, a despeito de se configurar uma patente violação à livre iniciativa, temos hoje um verdadeiro Estado Socioambiental de Direito, que é regulador da atividade econômica e é capaz de dirigi-la e ajustá-la aos valores e princípios constitucionais. O princípio do desenvolvimento sustentável (art. 170, VI, da CF) também desmistifica a noção de que vivemos num capitalismo liberal-individualista, já que tal princípio garante a leitura das normas à luz de princípios e valores socioambientais constitucionalmente resguardados.
Voltando ao tema do SANEAMENTO AMBIENTAL, deve ser entendido que o Judiciário não está criando uma política pública, mas impondo políticas públicas já previstas e determinadas pela própria Constituição e leis infraconstitucionais. Como ex., tem-se o saneamento básico: ele delineia uma ponte entre o mínimo existencial social e a proteção ambiental, porque é o exemplo mais claro que direitos fundamentais sociais convergem ao direito fundamental ao ambiente (ora, o saneamento básico conjuga em um só tempo a saúde, água potável e moradia com o meio ambiente). Em resumo: toda vez que a Administração atua de forma negativa, abstendo-se de adotar comportamento imposto pela CF, ela deve ser corrigida jurisdicionalmente. Fala-se de uma garantia e direito ao mínimo existencial socioambiental. {Fala-se de uma garantia e direito ao mínimo existencial socioambiental, em que se aplica a noção de conjunto de direitos subjetivos originários e definitivos, que poderão prevalecer MESMO em face de outros princípios e direitos fundamentais, a depender das circunstâncias, ainda mais no que se refere às manifestações concretas da dignidade da pessoa humana e da vida em geral; observe que isso nada mais é do que uma ponderação de princípios em colisão, valendo-se da técnica de Alexy} Como se sabe, ao Judiciário cabe: *examinar ameaça ou lesão a direito pelos Juízes e Tribunais; *apreciar questão, seja na hipótese de ação, seja no caso de omissão por parte de demais poderes ou violações. Entendendo-se como possível exigir prestações básicas na área ambiental em face do Estado, acaba-se tendo que lidar com a justiciabilidade dos direitos fundamentais em geral: aqui, lidamos com uma perspectiva mais integrada e ampliada dos direitos socioambientais, o que também nos leva a considerar o custo dos direitos e os custos da possibilidade de superação de limitações financeiras e orçamentárias que desde sempre acabam limitando a efetivação dos direitos fundamentais, principalmente no que diz respeito às prestações materiais. O autor adere à posição de que as restrições orçamentárias NÃO devem servir de barreira intransponível às prestações materiais mínimas de preservação do ambiente natural (e de outros direitos socioambientais), de forma que apenas a exigibilidade de bens e serviços em matéria ambiental que não integram o conteúdo do mínimo existencial socioambiental poderão ser condicionadas à lógica de progressiva implementação, de acordo com prévia projeção e regulamentação
orçamentária. Ou seja: a chamada “reserva do possível” não pode ser utilizada a torto e a direito para barrar a efetivação de direitos e deveres socioambientais, pelo menos no que diz respeito ao mínimo! Conclusão em tópicos: • • • • • • • •
Judiciário tem papel importante e possui um cunho bem corretivo, já que geralmente atua de forma interventiva; Mesmo com tantos avanços, há muito o que fazer, já que ainda são comuns situações em que o grande poder econômico prevalece ante os princípios e valores socioambientais; Uma coisa é atuar segundo uma tutela preventiva ou inibitória (sentido negativo), buscando proteção dos bens ambientais ante agressões aos bens socioambientais; outra coisa é impor ao Estado e aos particulares obrigações de fazer; Intervenção do Judiciário deve ser sempre limitada e ajustada aos parâmetros definidos pelo sistema constitucional de freios e contrapesos; Atuação jurisdicional, não obstante seja importante, deve se dar de maneira excepcional e subsidiária, já que cabe principalmente ao legislador o mapeamento legislativo de políticas públicas e depois cabe ao administrador a execução de tais políticas! Discricionariedade administrativa e liberdade de conformação legislativa encontram-se sujeitas sempre a um controle com base em princípios e regras constitucionais; Mesmo sendo considerado o princípio da separação de poderes, ele não pode ser usado pelo administrador para não concretizar um direito socioambiental mínimo! A possibilidade de acionar o Judiciário para intervir numa situação ambiental também encontra base na própria democracia, já que se trata de um direito à participação inerente aos direitos fundamentais, ao se conferir um importante instrumento à sociedade. 7. Livro: “COMENTÁRIOS À CONSTITUIÇÃO DO BRASIL” Comentários ao caput do art. 225 (Andreas J. Krell)
Quanto a proteção ambiental nas CF’s anteriores: o autor ressalta que o artigo 225 estabelece um DIREITO FUNDAMENTAL, mesmo não estando no rol do art. 5° (ora, é só você lembrar da cláusula aberta do art. 5°, parágrafo 2°, que admite a existência de direitos fundamentais que não façam parte do Título II da CF/88). Como reflexo do princípio da indivisibilidade dos direitos humanos fundamentais, tem-se que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado estende e reforça o significado dos direitos à vida, à saúde, bem como a própria dignidade da pessoa humana, a fim de garantir uma vida saudável e digna de ser vivida. Importante que se saiba que constituir o direito ambiental como um DIREITO FUNDAMENTAL é uma decisão axiológica importantíssima em favor de um bem imaterial (natureza, ué), já que a efetiva proteção depende essencialmente da ação e cooperação de vários atores sujeitos às respectivas obrigações legais; também é importante que haja alterações no uso dos instrumentos normativos e administrativos, a fim de que seja privilegiada a perspectiva da SOLIDARIEDADE! De toda forma, entenda que o relacionamento entre meio ambiente equilibrado direitos fundamentais do homem é RECÍPROCO, pois o primeiro é requisito fundamental para a eficácia destes últimos, uma vez que o desenvolvimento do homem ocorre no meio ambiente. Mesmo possuindo tamanha importância, as CF’s anteriores não mencionavam especificamente quanto à tarefa estatal na tutela ambiental; hoje, há uma gama de normas (constitucionais e infraconstitucionais) prevendo a forma com que tal tutela será efetivada. Quanto ao meio ambiente nas Constituições estrangeiras e no Direito Internacional: quanto à questão ambiental, e após discorrer acerca das influências de Constituições estrangeiras (como a de Portugal, a da Espanha...) na Constituição brasileira, o autor ressaltou que é extremamente importante o papel do Direito Internacional na evolução e formulação do direito ao meio ambiente, uma vez que as consequências do desenvolvimento econômico na era da globalização ultrapassam a própria capacidade de solução do Estado nacional e exigem uma cooperação crescente entre países. Como exemplos, cita-se a Declaração de Estocolmo, Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (OEA), o Acordo-Quatro sobre Meio Ambiente (Mercosul) etc. Quanto ao âmbito de proteção do art. 255: o objeto de proteção de tal artigo é o próprio MEIO AMBIENTE, que abrange elementos naturais e elementos artificiais e culturais (como estética da paisagem natural, ambiente construído pelo homem etc)... a Lei Federal 6.938 definiu o conceito de “meio ambiente” no art. 3°, I. De toda forma, o fato é que o termo deve ser compreendido em função de seu emprego na área jurídica. Após tais
explicações, o autor ressalta que as leis ambientais não protegem o meio ambiente contra qualquer intervenção, mas, sim, contra os efeitos que tais atos causam nos recursos naturais! Comentando o caput, o autor admite que a fórmula “qualidade de vida” relaciona o direito ao ambiente à saúde física e psíquica e o bem-estar do ser humano, unindo conceitos antropocêntricos, biocêntricos e até ecocênticos; assim, veja que tal norma expressa antropocentrismo alargado, assumindo que a proteção ambiental tem uma íntima relação com o bem-estar das pessoas, mas não se resume à mero instrumento! De acordo com tal visão, o meio ambiente é BEM JURÍDICO AUTÔNOMO, produto da combinação de elementos do ambiente natural e da sua relação com a vida humana ==> é um verdadeiro conjunto de fatores que influenciam o meio, no qual seres humanos convivem, mas não se confunde com entidades singulares (meio ambiente não é a mesma coisa que rio, mar...); saiba que tais elementos podem ser, sim, utilizados para fins econômicos, desde que o uso não leve a uma apropriação individual. Bom, como se sabe, o meio ambiente é bem público, da coletividade, em que o Estado possui a guarda e gestão; assim, sujeita-se a um regime jurídico especial (inapropriabilidade, inalienabilidade etc.). Quanto ao termo “ecologicamente equilibrado” que adjetiva “meio ambiente”, saiba que se trata de um conceito dinâmico, relacionado às ciências da natureza. {O meio ambiente NÃO ocupa posição de preferência absoluta ante outros bens e interesses; ele é, na verdade, um direito prima facie, como todos os direitos fundamentais! De forma a reconhecer isso, o STF exige que conflitos entre valores constitucionais do desenvolvimento nacional e valores constitucionais da preservação ambiental sejam superados mediante ponderação concreta, em cada caso concreto.} Titulares e destinatários do direito fundamental difuso ao meio ambiente: os titulares são tanto pessoas físicas, como a sociedade (brasileiros residentes, estrangeiros, pessoas com cidadania suspensa etc). É direito fundamental da terceira geração, já que encontra sustento na fraternidade e na solidariedade! A sua base reside nos interesses coletivos ==> “direito à integridade do meio ambiente constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva”. Lembre-se que direitos difusos pertencem a um número indeterminado de pessoas que se encontram na mesma situação fática! Ademais, saiba que há um dever de proibição de alteração irreversível de ecossistemas, até para que se permita às “futuras gerações” (potenciais sujeitos de direito) viverem com dignidade! De toda forma, é indispensável ressaltar que a integridade ambiental NÃO pode ficar à mercê de interesses empresariais, nem depender de motivações unicamente econômicas! Quanto aos animais, o autor ressalta que a doutrina dominante os entende como “entidades dotadas de valor especial”, o que os distingue de coisas. Direito subjetivo e objetivo, e deveres do Estado e da coletividade, no art. 225: tal artigo não apenas consagrou a proteção ambiental como atividade do Estado (norma-fim), mas também como um direito público subjetivo, já que tal artigo também possui função negativa (garante aos indivíduos defesa contra agressões ilegais em seu Âmbito material) e positiva (impõe ao Poder Público atuar para efetivá-lo). Ao fim e ao cabo, tal artigo prevê direitos prima facie (=princípios) e direitos definitivos (=regras), dando ao indivíduo o direito de exigir do Estado que este não cometa atos contra o meio ambiente. •
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No que diz respeito ao dever: o art. 225 constitui um dever fundamental não autônomo, já que está vinculado ao direito fundamental de usufruir de um meio ambiente equilibrado! A imposição do dever de defender e preservar o ambiente tanto ao Poder Público como à coletividade expressa a superação da antiga divisão entre Estado e sociedade. A associação do referido dever ao direito fundamental explica o porquê de o direito ao meio ambiente equilibrado ser considerado “direito circular”, cujo conteúdo vem a ser definido em função do interesse comum. De todo modo, tal dever fundamental possui natureza multifuncional: ele impõe ao Estado um comportamento ativo (obrigação de prestar proteção ao meio ambiente), e também um comportamento negativo. No que diz respeito ao direito: os direitos fundamentais de 2a e 3a geração deixam espaços mais abrangentes, que irão ser preenchidos pelo legislador ordinário, concretizando e conformando a implementação dos direitos sociais e difusos, cuja densidade mandamental é menos expressiva que a dos direitos fundamentais de 1a geração (liberdade). Ao mesmo tempo, o art. 225 é DIREITO DE APLICABILIDADE IMEDIATA, VINCULANDO TODAS AS ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS!
Por que é tão importante entender o direito ao meio ambiente como direito fundamental/constitucional? R: Um dos aspectos mais importantes da consagração formal/constitucional do direito ao meio ambiente consiste na possibilidade de anulação/não aplicação de leis ou regulamentos, com base no PRINCÍPIO DA HIERARQUIA NORMATIVA (norma constitucional ambiental serve de guia para compreensão dos dispositivos infraconstitucionais, e também pode
ser considerada na ponderação de interesses conflituosos); também tem o lado positivo de que nenhum agente poderá tratá-lo como valor subsidiário; leis deverão obrigatoriamente considerar aspectos da proteção ambiental na regulamentação de atividades; é um dado importante para interpretação axiológica das leis ordinárias e do exercício discricionário da Administração Pública (sempre deverá optar pela alternativa menos danosa ao meio ambiente); proibição do retrocesso ambiental; o cidadão passa a ter “direito a um mínimo existencial ecológico”... Respondido o questionamento, perceba que as normas da CF sobre proteção ambiental exercem dupla função: limitam e impulsionam Poderes Legislativo e Executivo, já que fazem com que órgãos estatais responsáveis pelas políticas públicas não possam agir em contrário a tal dispositivo, e também ficam obrigados a tomarem medidas administrativas e políticas para efetivá-las!! Princípios constitucionais de direito ambiental: eles são MUITO importantes no Direito Ambiental porque é pequena a previsibilidade dos efeitos dos atos humanos em relação ao meio ambiente natural, até porque tais efeitos costumam ser irreversíveis; logo, os princípios são capazes de dar flexibilidade à concretização hermenêutica. Após entender isso, perceba que princípios dão bases conceituais para sistematização e harmonização do Direito Ambiental como um todo, o que se reflete na prática da aplicação do Direito Ambiental. Para além dos nossos princípios constitucionais, também são juridicamente importantes os princípios que emanam de Declarações Internacionais Ambientais! • • • • •
Princípio da precaução: exige tomada de medidas para proteção dinâmica no plano coletivo, ao aplicar princípio da proporcionalidade dos riscos, o que significa dizer que uma avaliação responsável da probabilidade de ocorrência de danos ambientais DEPENDE da sua potencial gravidade! Princípio da prevenção: ganha maior importância no nível individual (imediata e concretamente), o qual postula redução das exigências em relação à aceitação de um perigo ao ambiente e a probabilidade de um dano ecológico. Princípio da cooperação: fundamenta atuação conjunta do Estado e da sociedade, principalmente no que diz respeito à elaboração e implementação de normas jurídicas e de políticas públicas de proteção ambiental. Princípio do poluidor-pagador: internaliza custos econômicos ligados ao uso de recursos ambientais, onerando diretamente usuário destes através de mecanismos próprios (ex.: taxa), reduzindo o seu consumo e desperdício. Desenvolvimento sustentável: também é princípio, no sentido de que as normas da legislação ordinária de todos os entes federados devem ser interpretadas de acordo com o seu valor! O STF, ao dispor sobre o status do princípio que estamos comentando, afirmou que ele é impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontrando suporte em compromissos internacionais assumidos pelo BR e representando fator de obtenção do justo equilíbrio entre exigências da economia e ecologia.
O autor também ressalta a importância do instrumento da Ação Civil Pública em defesa dos interesses difusos (Lei n° 7.347/85), que foi uma verdadeira revolução no sistema jurídico-processual brasileiro. Ademais, também cabe ao Judiciário corrigir erros cometidos por órgãos administrativos, até porque o grande problema no Brasil é a questão da omissão dos órgãos públicos nos três níveis federativos. Comentários ao parágrafo 1° do art. 225 (Andreas J. Krell) É esse parágrafo que se refere à efetividade de um direito, que pode ser entendido como eficácia jurídica (capacidade/potencial de uma norma constitucional para produzir efeitos legais) ou como eficácia social (desempenho concreto da função social do Direito, representando materialização). No mundo inteiro, o Direito Ambiental tem um GRANDE déficit de execução das normas, pelas seguintes razões: • • • •
Crescente densidade regulamentar; Falta de coerência interna e harmonização da legislação; Habituais dificuldades de sua interpretação; Problemas antigos no desempenho dos órgãos públicos.
A análise do grau de efetividade do art. 225 só pode ser feita mediante análise concreta dos diferentes parágrafos e incisos, que são dotados de densidade mandamental variável. Tal parágrafo 1° prevê diferentes instrumentos de defesa ecológica, como o licenciamento, o Estudo Prévio de Impacto Ambiental etc. Tais dispositivos vinculam o Estado nas posições de degradador agente (empreendedor), conivente (licenciador, incentivador) e omisso (não fiscalizador). Comentários ao parágrafo 1°, inciso I, do art. 225 (Andreas J. Krell)
É uma das incumbências do poder público, a fim de efetivar o direito assegurado pelo art. 225. Assim, os poderes públicos têm a atribuição de preservar processos fundamentais da biosfera, cuidando para que o comportamento humano não degrade o ambiente. O termo “restaurar” aplica-se a um processo, o que parece permitir dinâmica de restabelecimento. Quanto ao manejo ecológico: é a utilização dos recursos naturais pelo homem, baseada em princípios e métodos que preservam a integridade dos ecossistemas, com a redução da interferência humana nos mecanismos de autorregulação dos seres vivos e do meio físico. 8. ARTIGO ONLINE SOBRE MÉTODOS INTERPRETATIVOS 8.1 “Entre desdém teórico e aprovação na prática: os métodos clássicos de interpretação jurídica”, de Andreas J. Krell Já na introdução, o autor esclarece que o artigo não ignora os vícios e abusos de uma interpretação jurídica fixada apenas nos métodos tradicionais, e ressalta que os quatro cânones interpretativos NÃO são métodos próprios, mas, sim, técnicas, diretivas, critérios, a serem utilizados para a correta aplicação e interpretação da norma jurídica. Para justificar a importância de estudá-los, o autor narra que a Teoria do Direito de outros países está rediscutindo os cânones clássicos, ao tempo em que há uma parcela da doutrina que os entendem como desnecessários, inúteis, ou de importância reduzida. Quanto às diretrizes constitucionais para interpretação jurídica: ciência do direito é pragmática, orientada a decisões práticas, razões pelas quais deve ser sempre mantida em contato com a realidade social. Antigamente, entendia-se que o método científico purificava o objeto do Direito, de forma que o intérprete se tornava apenas um instrumento, como se ele atuasse no interesse DO método! Bom, na área do DIREITO, a interpretação jurídica deve ocorrer em ambiente especializado, já que aqui se pretende gerar a noção de obrigatoriedade; logo, o Direito deve evitar a subjetividade e toda a imprevisibilidade e insegurança. Além disso, importante que se saiba que a metodologia jurídica não pode ser reduzida à “questões de linguagem”! A aplicação de normas legais busca dar fim aos conflitos entre as partes, mas também busca produzir decisões corretas e justas, e são justamente tais expectativas que devem guiar a atuação do aplicador do Direito no momento de sua decisão. Demais disso, importante que se saiba que não é porque o operador do Direito está aplicando um dos métodos que a interpretação jurídica terá um resultado correto, até porque, conforme Kelsen já explicava, todos os métodos de interpretação conduzem a um resultado possível, e não a um único resultado correto! Saiba também que as questões metodológicas são, no Brasil, também questões constitucionais, já que toda a atividade estatal fica sujeita à lei (o que é até objeto do art. 5°, II, da CF/88); logo, a própria produção de decisões por parte do Poder Público deve também se ater às normas jurídicas vigentes no Estado Democrático de Direito. Nesse contexto, o objetivo maior do método é reduzir a subjetividade do intérprete, permitindo o seu autocontrole; para cumprir tal objetivo, é necessário que as etapas da aplicação da lei sejam reveladas pelo intérprete, até para que se permita a um terceiro sindicar a relação entre a norma abstrata editada pelo Legislativo e a inferência/decisão concreta do Judiciário. No caso em si da interpretação da Constituição, a importância dos métodos tradicionais decai, já que a CF também possui em seu íntimo diversas relações políticas e sociais, exigindo que a interpretação seja realizada de acordo com um conjunto de métodos reciprocamente complementares! Quanto à importância da conciliação entre teoria - prática da interpretação e aplicação do Direito: metodologia jurídica tem como alvo o desenvolvimento de padrões que permitam um controle dos aplicadores do Direito, a fim de aferir os acertos e os erros na utilização dos métodos. O autor também ressalta que a viabilidade de um método deve ser demonstrada na solução dos casos comuns, no dia a dia jurídico, mesmo diante dessa tendência atual de só achar que a teoria só serve para resolver casos difíceis! Há julgadores que afirmam que não há vinculação do intérprete à lei, a fim de perseguir fins políticos, ideológicos etc... ao reconhecer tais dificuldades, o autor reafirma que os métodos tradicionais servem justamente para servir boas razões no processo da argumentação, e não para levar uma “verdade”. O processo da tomada de uma decisão jurídica é feito por diversos elementos, que se integram e se complementam! A interpretação não pode surgir como mero arbítrio, mas, sim, como processo que tem reflexões como base; nesse sentido, os critérios jurídico-racionais são importantes porque criam motivos suficientes para que se critique ou justifique decisões jurídicas. Lembre-se que a decisão jurídica não pretende estar só conforme à lei, mas, também, ser objetivamente correta. A própria interpretação é processo argumentativo de escolha, tendo base formal (Regras de raciocínio) e consensual. Ao final do tópico, o autor ressalta que não se pretende negar o fato de que o Direito realmente se abre a padrões morais e certas valorações pessoais, o que é inevitável, mas isso só pode ser admitido DENTRO de regras argumentativas do método jurídico, até para que se evite a arbitrariedade. Quanto aos quatro métodos clássicos da interpretação jurídica: fala-se dos métodos gramatical, sistemático, histórico e teleológico; há quem também fale no “método comparativo” (comparação entre normas, instituições, doutrinas etc). Há
quem critique tais métodos, falando que só servem para justificar uma decisão pré-concebida, atuando como instrumento de “fachada”; ocorre que, conforme o autor explica, mesmo diante de tanto desprezo por parte de quem fala tão mão dos métodos, eles CONTINUAM sendo utilizados, PORQUE NÃO HÁ ALTERNATIVA AOS MÉTODOS CLÁSSICOS! Saiba que as regras metódicas têm a função de transmitir ao público a vinculação do intérprete ao texto normativo, que pode ser lacunoso, vago etc.! Já saiba que NÃO existe uma ordem pré-estabelecida para aplicação dos métodos clássicos, até porque eles se interpenetram! Por que métodos jurídicos são indispensáveis? Tais métodos podem até sofrer descrédito por parte de alguns, mas o autor reforça que eles FUNCIONAM, tanto é que continuam sendo utilizados. Eles buscam diminuir arbitrariedade subjetiva do intérprete, norteando todo o processo de raciocínio jurídico! São eles que podem conferir uma segurança relativa. •
Método gramatical: É o ponto de partida, já que é o texto legal que transporta as prescrições vinculantes para o seu aplicador. O intérprete primeiro vai se valer da sua intuição linguística. Ocorre que nem sempre essa linguagem comum é suficiente para interpretação adequada de um texto legal... o limite dessa interpretação reside no “sentido ainda possível da palavra”, momento em que o Judiciário precisa integrar tal método a outros parâmetros normativos. Essa importância tamanha que é dada à palavra faz com que, no Brasil, a jurisprudência, a doutrina e a comunidade jurídica busquem referenciar a palavra, podendo haver a necessidade de que se argumente em favor ou contra o uso de determinada palavra em determinado sentido. Saiba: um preceito legal deve ser considerado determinado quando não surgir dúvidas sobre o entendimento acertado. Aliás, vários juristas se preocupam demasiadamente com o pretenso significado das normas, porque se o tal significado depender de um contexto, jamais se chegará à segurança ou à previsibilidade!
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Método sistemático: a unidade sistemática é um dos ideais mais elevados a serem perseguidos, sempre com base na consistência (ausência de contradições) e coerência (estrutura interna de referência) ==> isso é a base do método sistemático, porque se reconhece que a norma legal está inserida em um conjunto regulatório formado por regras e princípios inseridos na mesma lei. O autor ressalta que a interpretação a partir de normas principiológicas da Constituição costuma envolver ponderação entre diferentes valores e interesses reconhecidos pela ordem jurídica. Método histórico: quando surgem dúvidas sobre o significado de um texto legal, busca-se entender o contexto histórico e a intenção do legislador no momento de editá-lo. Essa interpretação histórica mais genérica não se concentra taaanto em esclarecer a intenção de certos termos, mas, sim, de recapitular a situação social, política etc., no momento de aprovação da lei. Método teleológico: não guarda relação direta com o texto da lei, mas procura desvendar algo externo, que é a orientação instrumental da norma; observe que isso dá uma imensa flexibilidade ao intérprete. Já se sabe que a norma deve servir a um determinado fim razoável, e a discussão sobre tal fim normativo não pode ser arbitrário, e deve contar com fundamentação consistente! Esse elemento aumenta a racionalidade da decisão. Para definição do fim da norma concreta, intérprete pode pautar-se pela teoria objetiva (finalidade da lei não tem nada a ver com intenção do criador, mas, sim, deve ser fixada de acordo com as necessidades atuais e valores sociais presentes no momento de sua aplicação) ou pela teoria subjetiva (pergunta a vontade do legislador histórico).
a. Sobre a relação argumentação jurídica e resultado desejado: é lógico que o intérprete, ao lidar com um caso, vai utilizar preferencialmente o método que mais seja compatível com a sua intuição, ou com o seu “sentimento jurídico”, que lhe permita antecipar o resultado que considera mais satisfatório. Ou seja: também há uma précompreensão na questão do método, de forma que o método, embora deva ser algo “pré-dado”, não pode ser determinado sem que se tenha desde o início certa pré-compreensão acerca da solução que é adequada ao caso. Ainda assim, qualquer argumentação a partir do resultado deve ser metodicamente vinculada, transparente e consistente, de forma que a escolha do método não poderá ser arbitrária/subjetiva/intuitiva, mas necessita de fundamentação racional! Ele cita também “conjectura” (captação ingênua de sentido do texto) e “validação” (modo sofisticado de compreensão apoiado em procedimentos explicativos). Entenda que os métodos interpretativos clássicos NÃO desobrigam o intérprete a proceder a uma valoração do conjunto... eles são meros aspectos norteadores do processo interpretativo, cujo peso pode variar bastante de caso em caso. Perceba, PORTANTO, a importância da pré-compreensão para a escolha do método interpretativo. b. Sobre a relação método jurídico e argumentação: argumentar é “indicar razões”. Para Alexy, cânones interpretativos são MAIS do que instrumentos aptos a legitimarem decisões já formadas; como formas argumentativas que são, cânones interpretativos são a própria estrutura da argumentação jurídica, são a gramática do seu discurso, de forma que NÃO basta o intérprete alegar que determinada interpretação
surge do teor linguístico de uma lei. Tradicionais recursos metodológicos da interpretação nada mais são do que argumentos usados no debate jurídico para alcançar convicção, persuasão, como degraus de um raciocínio jurídico. E olhe que eles não buscam acabar com todas as indeterminações próprias do Direito... eles só buscam diminuí-las! Aliás, somente uma boa PONDERAÇÃO de argumentos metódicos pode levar a uma decisão racional e justificada. Sobre a argumentação jurídica em específico: ela não é mero elemento da metódica do Direito, mas vai muito além disso, ultrapassando o emprego dos métodos. Conclusão em tópicos: • • • •
Retórica e argumentação não podem substituir metódica jurídica. Cânones clássicos NÃO garantem resultados certos/verdadeiros, mas representam meios de apoio ao trabalho jurídico. Metodologia jurídica fornece aspectos e fórmulas que estruturam melhor processo interpretativo. Uma decisão correta deve estar fundamentada de acordo com os cânones. Não existe “verdade” ou “retidão jurídica” fora do procedimento metódico de interpretação.